Teoricos Da Autogestão Socialista

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TOMO III

O Principio da Autogesto Comunal

( Tericos e Terias da autogesto )

CLAUDIO NASCIMENTO

I Indice
Introduo:

Parte 1=A Dialtica das Derrotas:

a. SISIFO= uma metfora proletaria das derrotas ?


b. Revoluo: uma tragdia moderna ?
c.August Blanqui: A dialtica infernal das derrotas
d.Walter Benjamin: temporalidades da autogesto

II) . tipos de Desenvolvimento


Revoluo Industrial e Revoluo Industriosa.
(Raymond Williams,Giovanni Arrighi,Celso Furtado)

III) Teorias da Autogesto :

. Istvan Mszaros
. G.Gurvitch
. Daniel Moth ( a corrente autogestionaria na Frana)
. Thomas Coutrot
. Henry Lefebrev
. Joo Bernardo
. Nicos Poulantzas
. Andre Gorz

.Petrl Uhl
.Rudolf Bahro
.Jacek Kuron e Karol Modezelwsky
-Rosa Luxemburgo
-Mario Pedrosa
-Che Guevara
-Mariategui

Parte 2=

- Autogesto : palavra e idia

. Kardej: origem yugoslava

. os caminhos da autogesto:

. P.Naville e A. Bayat : teorias e conselhos operrios

- Autogesto e Utopia

.Michael Lowy e Daniel Bensaid : sobre Walter Benjamin


.Ernst Bloch: a utopia concreta
.Boaventura Santos: a utopia estetica
.Paulo Freire: A Pedagogia da Utopia
.Paul Singer: A Utopia Militante

- Autogesto e Espao

. Milton Santos : o espao da autogesto


. Mario Pedrosa , Angel Rama: a autogesto do espao
. M. Bookchin: municipalismo e autogesto
. Henry Lefebrev: espaos e modo de produo

- A dialetica do possivel:

Lucien Goldmann: o Deus oculto (a aposta )

. o novo esprito utopico

. o tempo descontinuo:
( E.Bloch, A.Blanqui e W.Benjamin )

l- Histrico da autogesto,idias:

. autogesto, a toupeira subversiva

- Socialismos utpicos
. As utopias sociais

. Ernst Bloch:sistematizao das utopias

. Rudolf Rocker
e Pierre Naville: os utpicos

. Preobrajensky: os utpicos e 1917

. Amrica Latina (sculo XIX); as comunas utopicas

- Socialismo,marxismo e utopia

. T. Shanin: O ltimo Marx


- Raya Dunaevskaya :
: O Capital e a Comuna de Paris
. Michael Lowy: Auto-emancipao do proletariado
. Yvon Bourdet : Marx e a autogesto

-CONCLUSES

-verso 1
- verso 2

- Bibliografia

O principio da autogesto comunal


(teorias e teoric@s)

I. Introduo=

A Odissia de Sisifo
( uma Metfora Proletria )

O pequeno ensaio de Albert Camus , includo em seu livro L Mythe de Sisyphe.


Essai sur lAbsurde.(Gallimard,1942), vem de encontro a nossa reflexo sobre as
experincias e lutas dos trabalhadores pelo socialismo autogestionario.Como veremos
adiante, o balano destas lutas nos do,inicialmente,a impresso de um amontoado de
derrotas.A cada experincia se sucede uma derrota,por varias razes.
Em seu estudo sobre a Sociologia das Revolues, Andr Decoufl aborda a questo
das sucessivas derrotas das lutas operarias, em capitulo nomeado de sociologia da
Contra-Revoluo:

Inicia-o afirmando que ,A represso constitui uma das categorias familiares da


memria coletiva das revolues

E, prossegue atravs da marxista que ps pela primeira vez a questo das derrotas:O
que nos ensina a historia das revolues modernas, pergunta Rosa Luxemburgo no
artigo de Die Rate Fahne (A Bandeira Vermelha, porta-voz dos espartaquistas
berlinenses de 1918-1919), redigido na vspera de seu assassinato pelos soldados de
Noske e ao qual ela dersa este trgico titulo: Reina a desordem em Berlim : A
primeira labareda da luta de classes na Europa extinguiu-se numa derrota. O saldo da
sublevao dos operrios da indstria de seda em Lyon wm 1831 foi um pesado
fracasso. Derrotado tambm o movimento cartsita na Inglaterra. Esmagado o levante do
proletariado parisiense no decorrer das jornadas de junho de 1848. A Comuna de Paris
terminou sofrendo terriveld errota. O caminho do socialismo , se considerarmos as lutas
revolucionarias , est juncado de derrotas.(Decoufl.p.113)

Decoufl, ento, traa uma cronologia destas derrotas: Realmente, quase todos os
movimento revolucionrios acabaram na historia sufocados por uma represso violenta;
mesmo sem nos reportarmos ao aniquilamento pelas legies romanas de Crasso, o Rico,
dos bandos de escravos rebelados e de gladiadores reunidos sob o comando de
Espartacus ( 71 a.C.), podemos recordar que as Cruzadas populares foram
sistematicamente abandonadas por seus chefes polticos e religiosos aos massacres dos
infiis ou dizimadas desdo o inicio ( como as Cruzadas de crianas e a Revolta dos
Pastoureaux nos emados do sculo XIII ); lembramo-nos tambm de que os prncipes
alemes dos culo XVI. Apoiados pelas imprecaes de \Lutero contra os
campopneses bandidos e assassinos, entregam-se ao extermnio total dos movimentos
munzerianos (batalha de Frankenhausen 1525); que os levantes populares da primeira
metade do sculo XVII na frana so castigadas de maneira exemplar ( para
realmente, constituir exemplos) pelas tropas reais postas por vezes , como na Rouen
libertada dos nu-pieds numa cidade morta e recebe de Richelieu o seguinte satisfecit:
Haveis to bem comeado que no duvido que continues vossa viagem para um final
feliz que de tal forma acomodar a Normandia, que nada mais haver a recear nessa
provncia nem em outras ques e mantero certamente dentro de seu dever, pelo temor de
semelhante castigo. Basta recordar de passagem, por serem mais conhecidos, os
Terrores brancos da Frana (1795, 1797, 1814-1815 ), da Russia (1905, 1917-1919 ),
da Espanha (1936-1940),as Semanas sangrentas de Paris (junho de 1848, maio de
1871 ),de Berlim (janeiro de 1919),de Canto (novembro de 1927).

Veremos como Auguste Blanqui ,na priso, chamava a este fenmeno de Dialtica
Infernal ,e,como Walter Benjamin vai tentar decifrar este enigma do Sisifo moderno,o
proletariado.

Michael Lowy,em seu ensaio { para o Seminrio Walter Benjamin et Paris


(juin1983)},sobre W.Benjamin critico do progresso; busca da experincia

perdida,afirma que:

o pior inferno o da mitologia grega em que agonizam Sisifo, Tntalo e as


danaides,condenados ao eterno retorno da mesma punio. o destino do
operrio,prisioneiro da cadeia de montagem, que Benjamin (citando Engels)compara
Sisifo.De onde a analogia entre a inscrio entrada das fabricas (mencionadas por
Marx) e as das portas do Inferno de Dante.

* SISIFO= Rei legendrio de Corinto na mitologia grega. Condenado a seguir Tanatos,


deus da morte, aos infernos, por ter denunciado Zeus, raptor de Egina, rogou a sua
mulher, dia a lenda, que no lhe prestasse as honras fnebres. Chegado aos infernos, ele
lamentpu-se a Hades, deus dos infernos e dele obteve a permisso de voltar
momentaneamente terra para castigar o culpado.Uma vez de volta a Corinto, ele
recusou voltar moradia dos mortos. Novemente preso por Mercurio, que o conduziu
sob boa guarda aos infernos, foi condenado por Hades a empurrar eternamente sobre a
encosta duma montanha um rochedo que sempre rolava antes de atingir o cume. Eda
que vem a expresso: um trabalho de Ssifo, para designar um trabalho penoso, que
necessrio recomear sem cessar.

Camus ,tambm,recorre imagem do operrio,ao nos descrever o mito : os deuses


condenaram Sisifo a empurrar, sem fim ,uma pedra at o pico de uma montanha, de
onde a pedra ,por seu prprio peso, rolava montanha abaixo.

Os deuses acreditavam ser esse o castigo mais terrivel: o trabalho intil e sem
esperana.

Camus chama Sisifo de o trabalhador inutil do inferno.


Compreendemos que Sisifo o heri absurdo.Por suas paixes e por seu tormento.Seu
desprezo pelos deuses,sua raiva da morte e sua paixo pela vida, lhe valeram esse
suplicio indizvel em que todo o ser se empenha em nada acabar. o preo que se deve
pagar pelas paixes desta terra.

A Camus lhe interessa,sobretudo, o que acontece com Sisifo quando,ao descer a


montanha,chegando na plancie,em baixo,o que faz com esta pausa,este retorno.

Essa hora,diz Camus, que como uma respirao e que se repete tal qual sua
infelicidade, A HORA DA CONSCIENCIA(grifo nosso).Para Camus,em cada um
destes momentos Sisifo superior a seu destino.Ele mais forte que sua pedra.

E,conclue que :Se este mito trgico, porque seu heri


consciente.Camus,ento,traa uma analogia:

O operrio de hoje trabalha,t odos os dias de sua vida, nas


mesmas tarefas e esse destino no menos absurdo. S trgico
nos raros momentos em que ele se torna consciente. Sisifo,
proletrio dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda
amplitude de sua miseravel condio.
De sua condio humana, explorado e oprimido no inferno do capital, os
trabalhadores tentaram varias vezes o assalto aos cus.Em lutas memorveis,subiram a
montanha carregando suas utopias e esperanas,construindo formas de luta e de
organizao novas,desde a Comuna de Paris at a Comuna de Gdansk.

Rosa Luxemburgo tambm fez referencias similares : A revoluo proletria s


pode chegar uma total lucidez e maturidade ,galgando passo a passo,por degraus,o
amargo Galgotha de suas prprias experincias, passando por derrotas e vitorias .

E, como dizia Blanqui o eterno retorno do mesmo :o velho sempre novo e o


novo sempre velho,a Eternidade dos astros. A repetio de derrotas,o terrivel castigo
de no ter alternativas sociedade do capital.

Na America Latina ,os povos tm repetido o feito de Sisifo.Por exemplo,lvaro


G.Linera analisa a luta em Cochabamba:

Creio que na Amrica Latina esto se inventando coisas


novas,que s vezes parecem antigas,mas que no fundo so muito
novas(...)
Passamos de uma forma de organizao territoriallizada-fabricas
,grande empresa- a um tipo de ao coletiva
desterritorializada,usando abusadamente de seu poder. a
mobilizao de El Alto, a mobilizao do altiplano aymara,a
mobilizao dos cidados de Cochabamba.estas grandes
mobilizaes no partiram de uma fabrica,nem de um
bairro,mas de mltiplos atores:
Operrios,microempresrios,camponeses,intelectuais.
Atores que,a partir de redes locais terrirotiais,criaram outra rede
flexvel,mvel,que se deslocou ao largo da sociedade e que
ocupou o territrio,porque no pertencia a um territrio
especifico e podia se mover comos e atotalidade do territrio
fosse prpria.
Na Bolvia no existem movimentos sociais de base territorial:
pode-se dizer que o que h so movimentos sociais com
temticas transversais. O tena da gua e o tenma do gs unem
camponeses,intelectuais,pequenos produtores,
comerciantes,operrios assalariados, que se mobilizam em torno
de um objetivo. Uma vez conquistado o objetivo,cada um
regressa sua atividade local,territorial,para sem eguida ser
convocado novamente para outra ao coletiva,por outra
mobilizao e por outra demanda.

Essa a pisada dos novos Sisifos da Indo-afro-america !

Na parte mais focada nas experiencias histricas , vimos como a autogesto enquanto
estratgia de movimento dos trabalhadores, os leva a subir montanha e,l em cima,nos
momentos pr e/ou revolucionrios,de convulses sociais profundas,vislumbram,
elaboram e atingem ,em cada conjuntura histrica,o maximo de conscincia
possivel,de seus projetos histricos ,de longa durao,o projeto socialista.

Do ludismo ( quando quebravam seus prprios instrumentos de trabalho,nas fabricas


de satans,como diria William Blake), at o movimento grevista (greve como a praa
ou espao publico em que os operrios se encontravam para paralizar a produo,a
busca da esfera publica,o sair das entranhas do inferno fabril em busca da luz publica),
Comuna de Paris em que elaboram um Projeto Poltico de 13 pontos,abarcando o
conjunto da Cidade luz,e,at Comuna de Gdansk(1980),(passando pela Revoluo na
Hungria,1956 ,a Primavera de Praga 1968 ),com a Rede de autogesto, e a idia sada
do longo Congresso de Solidarnosc,da Republica Autogestionaria da Polnia,a
autogesto em toda uma nao.Nesta pisada,longa e tortuosa, trabalhadores construram
os seus projetos de autogesto socialista.
A volta ao cotidiano,a plancie,tal qual Sisifo, o momento da aprendizagem da
autogesto,como pedagogia do socialismo. o momento da conscincia ,do fazer, da
experimentao para preparar novas subidas montanha.Novos assaltos ao cu !

Nesta perspectiva, a repetio pedagogia,com ela se aprende:cada luta,cada


subida,cada asecenso, permiti avanar e ver mais longe o horizonte utpico,o inedito
viavel (P.Freire), o ainda-no-realizado(Bloch),a utopia concreta.

Mas, na descida,no recuo e ,sobretudo,na plancie do dia a dia,que se aprende a


gerir;como diz Rosa Luxemburgo: Exercendo o poder,a massa deve aprender exercer
o poder.No h outro meio de aprender a cincia... Sua educao se faz quando eles
passam a ao.No inicio,era a Ao,tal a divisa.

Portanto,Os trabalhadores aprendem a gerir, experimentando ,no h outro meio. A


autogesto pedagogia e praxis do socialismo.

Gramsci falava de como, Em cada levante dos movimentos sociais


modernos,particularmente dos que se estendem de 1789 a 1917, mostra como crescentes
segmentos das classes trabalhadoras conquistam uma autoconscincia mais elevada
de si e a capacidade de direo da sua prpria historia.

Esta a outra face da moeda da dialetica inferrnal.

E,que enxergam os trabalhadores quando chegam ao pico deste monte Galgatoa ? O


paraiso terreste? A sociedade Comunista?

Yvon Bourdet,tambem se valendo de uma metfora, em seu La Dlivrance de


Promthe ,conclue assim:

...uma comunidade sem deuses separados em um Olimpo,uma sociedade auto-


organizada. Mostramos as contradies da heterogesto, as possibilidades tericas de
uma autogesto generalizada e como esta reivindicao que, sob a forma poltica dos
conselhos operrios, j apareceu varias vezes na historia em perodos de crise
revolucionaria e comea a aparecer como reivindicao fundamental no horizonte de
muitas greves operarias.

Claro,ns no possumos a equao feita dseta nova forma de vida humana em


comum,pois tal forma no existe e no deve existir.Contrariamente aos que s acreditam
por ouvir falar, MARX no tentou formular uma doutrina definitiva que ,de
inicio,segundo ele,fundamentalmente em contradio com a essncia em devenir dos er
e que,em seguida, roubada pelos clrigos, constitui o segredo de um poder que acorrenta
Prometeu,portador do fogo,esse Lcifer que a Igreja quis tornar o inimigo dos
homens(...)

Gosto mais,de minha parte, de imaginar que sero os homens que o libertaro,que se
libertaro pelo fogo, pai das artes e das tcnicas e que eles montem ao assalto ao
cu,como disse MARX sobre os comuneros, vendo que o pico das montanhas e os
espaos interestelares so vazios de deuses e que, igual as crianas das quais disse
PASCAL, eles ficaro espantados com as vises que eles mesmos tinham
imaginado.

Como diria Mario Pedrosa: a Comuna,o Socialismo.Haveremos de amanhecer! E,


veremos,ento,Sisifo sorrir;como diz Camus: Devemos imaginar Sisifo feliz!

Esta metfora nos servir de ilustrao de algumas idias sobre a


autogesto,sobretudo,a viso construda por Daniel Moth a respeito da autogesto-
gota-a-gota,e suas conseqncias para estratgia e pedagogia autogestionarias.

De que,enfim,a pedagogia da autogesto e a autogesto da pedagogia, so duas faces de


uma s e mesma moeda: A Experimentao Autogestionaria.

E,do mesmo modo,para uma reflexo sobre a revoluo como tragdia,nos passos de
Raymond Williams.E,sem duvidas,da idia da Dialtica infernal do velho enrag
Auguste Blanqui,retomado e salvo por Walter Benjamin.

R.Williams= Revoluo, tragdia moderna ?

O estudo da historia das lutas pela autogesto e pelo socialismo apontam mais
para barbrie ?
Veremos no estudo das lutas autogestionarias que,aparentemente e por vrios
motivos e razes,h uma sucesso de derrotas.Seria um jogo do tipo perde e ganha ?
Ou, se em cada conjuntura histrica, a autogesto reaparece sob novas
formas,escapando ao retorno do mesmo ? Mas, no geral como se fosse condenada a
ciclos caracterizados por uma sucesso de experincias de curta durao e, de derrotas
,seja por represso das classes dominantes ou por varias outras razes internas
(burocratizao,etc) `a dialtica do prprio movimento.
Estaramos condenados a uma viso trgica do mundo ? A tragedia moderna ,
pensando no desenlace das revolues socialistas,nos lana em um mundo sem Deus
? Ou de um Deus Oculto ,em que, estamos lanados ao destino de nossa prpria
prxis , sem certezas ou iluses de vitrias inelutaveis? E,assim, condenados a
traarmos uma dialetica das possibilidades abertas da historia ?
De qualquer forma, as mutaes do final do sculo XX jogaram por terra muitas
idias do campo das esquerdas.Como ,por exemplo,a idia da inevitabilidade do
socialismo; o carter emancipador universal conferido ao proletariado; a viso do
tempo homogneo e linear,entre outras.
Todavia,para muitos pensadores socialistas, acontecimentos marcantes na segunda
metade do sculo XX, (anos 50) j tinham assinalado a falncia de alguns paradigmas,
provocando rupturas em suas estruturas de sentimento e vises de mundo. Chegando
mesmo a ter o significado de Tragedias Modernas.
A tradio e/ou a fortuna da autogesto no estaria marcada por uma serie de
tragdias ? Este jogo de perde e ganha , este mito de sisifo moderno ? Essa dialtica
infernal ?
Quais so os caminhos das tragedias modernas? Tomemos a trajetria de
pensadores como Raymond Wiiliams,na Inglaterra,e de um pensador romeno,exilado na
Frana, Lucien Goldmann.

R.Williams , em Tragdia e Experincia, diz que Chegamos tragdia por


muitos caminhos.Ela pode ser uma experincia imediata, um conjunto de obras
literrias,um conflito terico,um problema acadmico.Este livro foi escrito a partir do
ponto em que tais caminhos se cruzam numa vida especifica.
R.Williams estuda a tragedia moderna referenciada profunda crise social de
guerra e revoluo,no meio da qual todos nos temos vivido. Em Socialismo e
Revoluo Williams afirma que Vejo a revoluo,dessa forma,de uma perspectiva
tragica,.
No devemos identificar a revoluo com violncia ou com uma sbita tomada
de poder.Mesmo em lugares em que tais acontecimentos ocorrem,a transformao social
,na verdade, uma LONGA REVOLUA (grifo nosso).Mas a prova categrica,por
meio da qual a revoluo pode ser reconhecida, a mudana na forma de atividade de
uma sociedade,na sua mais profunda estrutura de relaes e sentimentos.
A longa revoluo contra a alienao humana ,produz em circunstancias
histricas reais, as suas prprias e novas formas de alienao.Os agentes mais ativos da
revoluo podem se tornar seus inimigos efetivos. A ao tragica a compreenso e a
resoluo dessa desordem.
Em nossa prpria poca, esta ao geral e o seu nome usual revoluo. O
que ordem no capitalismo a produo metdica da desordem
(desigualdade,humilhao,violncia,etc),enquanto a desordem a ser produzida pela
revoluo tem por finalidade a criao de uma nova ordem.
R.Wiiliams defende que esta viso trgica da revoluo a nica maneira de
faz-la persisitir.
Essa viso de Wiiliams est assentada em sua vivncia de crises da
esquerda,sobretudo nos anos 50 : o colapso do estalinismo com o XX Congreso do
PCUS. Williams elaborou,ento,um duplo diagnostico:
as principais organizaes que no sculo XX se apresentaram para o combate ao
capitalismo na direo do socialismo passaram a fazer parte do complexo de foras de
sustentao da sociedade capitalista.Esse um dos principais aspectos da tragdia do
nosso tempo.

M.Lowy,que foi aluno de L.Goldmann, tentou traar a trajetria do mestre.


Afirma que, aps 1958 a evoluo poltico-ideologica de Goldmann ser
complexa.Pouco a pouco,Goldmann abandonou a idia marxista sobre o papel
revolucionrio do proletariado.No entanto, difcil de precisar quando ocorre esta
mudana.Lowy relata que, nos seminrios em Paris,em 1961,Goldmann tratava a
historia do marxismo dividida em duas tendncias principais:
1= a corrente que acredita com Marx,que a classe operaria uma classe
essencialmente ou virtualmente revolucionaria: Rosa,Trotsky, Lukacs em 1923.
2= a corrente que chegou a concluso que o proletariado no em-si-mesmo
revolucionrio,tirando da concluses distintas: aceitao da sociedade burguesa
(Bernstein) ou substituindo a classe pelo partido (Lenine).
Estas ideias,Goldmann publicou em artigo datado de 1963. Para Lowy, esta
problemtica revisionista tem por pano de fundo um contexto histrico preciso: a
derrota profunda do movimento operrio com a ascenso ao poder por De Gaulle em
1958,com apoio da SFIO* e sustentao eleitoral massiva, incluindo os setores da classe
operaria ligados ao PCF*.
Essa teorizao de Goldmann encontra apoio nas teses de Serge Mallet sobre a
nova classe operaria,de 1959-1961 e,em sua estratgia decorrente: caminho
progressivo para o socialismo atravs de reformas na gesto das empresas;uma teoria da
conquista gradual do poder econmico e social,atravs da evoluo pela autogesto,
estrategia tambm chamada de reformismo revolucionrio.
Goldmann comeou a se interessar pela obra de Blaise Pascal em 1948.Em 1949-
50 , Pascal,Racine,o Jansenismo e a viso trgica do mundo absorvero inteiramente o
interesse de Goldman. Lowi afirma que esta mutao (abandono da pesquisa sobre as
origens da dialtica em Pascal-Goethe-Marx,pelo eixo Pascal-Racine) deve ser
compreendida por um deslocamento das preocupaes de Goldman,explicvel pelas
condies histricas dos anos 1949-53:
Grandes processos estalinistas,ruptura do movimento operrio entre um
estalinismo sectrio e enfurecido e uma social-democracia direitista e fortemente
anticomunista,ausncia ou fragmentao das correntes revolucionarias,guerra fria
internacional,guerras imperialistas na sia,etc.
A relao entre essa conjuntura e sua orientao para obra de Pascal
implicitamente reconhecida por Goldmann:
Mais uma vez as foras sociais que permitiram no sculo XX a superao da
tragdia no pensamento dialtico e revolucionrio, chegaram por uma evoluo que no
podemos analisar aqui, a subordinar o humano e os valores eficcia,mais uma vez os
pensadores mais honestos so conduzidos constatar a ruptura que chocou Pascal entre
a fora e a justia,entre a esperana e a condio humana.
Goldmann escrevia,em 1952,as seguintes palavras:
essa situao que suscitou,no somente a conscincia aguda da ambigidade
do mundo e do carter inautentico da vida cotidiana, mas tambm o interesse renovado
pelos pensadores e escritores trgicos do passado.
Para Lowy,Goldman refere-se ao estalinismo que, os intelectuais socialistas , no
mundo inteiro,durante longos anos, sofreram como uma fatalidade trgica e inelutvel.
Neste contexto histrico,Goldmann elaborou a obra L Dieu Cach.Mas,a
viso de mundo de Goldmann no trgica nem existencialista. Goldmann se situa
noutra perspectiva: a da dialetica marxista.Mas,existe uma convergncia
importante,mesmo decisiva:Goldmann no concebe mais a comunidade socialista
como um futuro iminente e irresistvel: ele perdeu de vez suas iluses de 1944-45.Para
ele,a viso do mundo dialtica agora fundada sobre uma aposta no triunfo da opo
entre o socialismo e a barbrie.
Essa aposta comporta,como em Pascal, risco, possibilidade, fracasso, esperana
de vitoria,diz Lowy. Acrescentado que, em relao a Pascal, a diferena capital est no
carter imanente, material e histrico do objeto da aposta dialetica de Goldmann, que
uma aposta no futuro ,dimenso totalmente ausente do pensamento trgico, que
somente conhece o presente e a eternidade.
M.Lowy afirma que Goldmann emprega o termo f: A f marxista uma f no
futuro histrico que os homens fazem eles mesmos,ou mais extamente, que nos
devemos fazer por nossa ao, uma aposta na vitria de nossas aes.
Esta a grande lio de Goldmann . Seu principal biografo Mitchell Cohen lhe
dedicou uma obra sintomaticamente intitulada:
A aposta de Goldmann,Tragdia, Dialtica e um Deus Oculto. J vimos
algumas idias desta obra,no que diz respeito autogesto no pensamento
goldmanniano.
Voltemos a Daniel Moth, que nos apresenta algumas idias que portam
afinidades com a idia da aposta goldmaniana.Por exemplo,em seu livro
Autogesto,gota-a-gota,afirma que :
A autogesto somente possvel condio de reconhecermos a indeterminao
relativa quanto as decises dos atores,isto ,de reconhecer que no existe teoria geral do
comportamento social.
A autogesto s possvel porque aceitamos que a zona de
incerteza,consideravelmente vasta neste domnio,seja preenchida no mais por uma
teoria ou uma pseuro-ciencia (em que o marxismo constitui entre outras a mais
ilustre),mas pelo vontade concreta dos interessados.
De qualquer forma, ou pela represso do Estado,como disse Marx,ou,por razes
oriundas do processo de burocratizao ocorrido quando as esquerdas chegam ao
aparato estatal, as experincias que vamos ver adiante , so exemplos destes vrios
processos de tragedia e revoluo.
Neste sentido,a recorrencia que fizemos a obra de C.Racovsky foi
fundamental,por explicar como este processo ocorreu na revoluo sovitica. Seu ensaio
intitula-se, significativamente, degenerao do partido e do aparato do Estado.
BLANQUI: a dialtica infernal

A mesma monotonia, o mesmo imobilismo nos astros estranhos. O


universo se repete sem fim e sapateia sem sair do lugar. A eternidade encena
imperturbvel, no inifinito, os mesmos espetculos .
( A.Blanqui )

1830-1848-1870 : 1870-1917 :ciclo que incorpora as primeiras grandes lutas


operarias dos anos 30 do sculo XIX (a partir de 1830),,passando pela revoluo de
1848 na Europa, quadno a clase operaria descobre sua autonomia de classe, pela
Comuna de Paris (1870),quando a classe operaria encontra,enfim,sua forma de
Estado, ate a revoluo de 1917 na Rssia,que abre um novo perodo na historia
moderna,pois a classe operarai sem eu antagonismo com o Capital,se estrutura de forma
autnoma como Poder-Estado,torna-se dirigente.1848-1870 : 1870-1917
A derrota da Comuna de Paris*, primeira grande experiencia de autogesto da
classe trabalhadora na poca moderna , provocou um choque na viso de mundo de
muitos intelectuais da Frana e de outros paises. Por exemplo: Van Gogh, Coubert,
Zola, Flaubert ou em Herzen e Heine.
O acontecimento marcou uma nova relao entre os intelectuais e o movimento
operrio.Mas,tambm no campo especifico dos ativistas revolucionrios daquela poca,
a derrota da Comuna foi um choque.
Auguste BLANQUI, encarcerado no Monte Sait-Michel , preso ao luto,pela morte
de sua jovem esposa,,e melancolia,preso aos tormentos sem fim de quem, durante 33
anos e meio, sofreu a provao de prises repetidas, o velho conspirador de Paris,
desenvolveu uma idia , um verdadeiro enigma:
A idia da revoluo misteriosamente associada a uma viso infernal da
repetio.
Em ensaio intitulado Blanqui,comunista hertico,Lowy e Bensaid
contextualizam o enrag: Blanqui aparece como um revolucionrio de um tempo de
transio,formado na primeira metade do sculo XIX,em uma poca em que a critica do
Capital ainda estava em construo. Um revolucionrio das Revolues de 1830 a
1848.
Blanqui tinha clareza da natureza da emancipao social: A Republica seria uma
mentira se fosse somente a substituio de uma forma de governo por outra.No
suficiente mudar as palavras, preciso mudar as coisas.A Republica a emancipao
dos moperarios, o fim do regime de explorao, a chegada de uma nova ordem que
libertar o trabalho da tirania do capital.
Lowy-Bensaid apontam as afinidades entre Blanqui e o Walter Benjamin da IX
Tese sobre a Filosofia da Historia:
O processo histrico no ,para Blanqui,o fundador da Sociedade das
Estaes,uma evoluo predeterminada,mas um movimento aberto,que se reveste,em
cada momento critico,na forma de uma deciso,de uma bifurcao nos
caminhos.Segundo uma bela imagem de seu biografo Gustave Geffroy, Blanqui
colocava em uma encruzilhada de Revoluo a visvel e atraente bandeira de sua
incerteza.
Para Blanqui , A historia humana pode,ento,ao mesmo tempo,conduzir tanto
emancipao quanto catstrofe.
O velho revolucionrio,tendo vivenciado as revolues de 1830 a 1871, se
interroga sobre o futuro,em sua dialtica histrica de progresso e regresso:
A humanidade nunca est estacionada.Ela avana ou recua.Sua marcha
progressiva a conduz igualdade.Sua marcha retrograda atinge, por todos os graus do
privilegio, at a escravido pessoal,ultima palavra do direito de propriedade.Antes de
retornar a esse ponto, evidente,a civilizao europia estaria em perigo.Mas por qual
cataclisma?.
Nestes tempos de crise estrutural do Capital (Meszaros),Blanqui certamente
ampliaria sua colocao para toda a Humanidade,e no apenas a Europa.
Lowy-Bensaid ,categrica e acertadamente,afirmam: J ,meio sculo antes,a
idia da alternativa Socialismo ou Barbrie enunciada por Rosa Luxemburgo.
MIGUEL ABENSOUR , em seu O Novo Esprito Utpico , tem um capitulo
dedicado a esta questo. Sigamos algumas de suas idias.
O revolucionario melancolico Walter BENJAMIN , tentou decifrar este
enigma blanquiano.Em 1936-37, Benjamin se defrontou com as idias deste inslito
revolucionario.Para Abensour: Revela-se uma relao entre Nietzsche e Baudelaire.
Por seu tema do eterno retorno , o texto mantm com Nietzsche a mais notvel das
relaes; com Baudelaire ela mais secreta e mais profunda.
Benjamin reconhece que Blanqui pertence mesma configurao histrica que
aquela em que esto engastados Baudelaire e Nietzsche. Nesta configurao
historica, pela idia fixa do novo e do retorno do mesmo, as Flores do Mal de
Baudelaire se aproxima de A Eternidade dos Astros de Blanqui, e da Vontade da
Potencia ( O Eterno Retorno) de Nietzsche.
Blanqui ,por essncia, o pensador da catastrofe (spleen).Nietzsche e baudelaire
por vias transversais , um filosofo e um poeta, tm de ver com o problema da
revoluo.
Para Abensour, a descoberta de Blanqui produziu em Walter Benjamin um
choque irreprimivl.A imagem dialtica benjaminiana deve,ento,ser pensada tanto
como idade de ouro como tambm como inferno.
Deste modo, Blanqui foi introduzido nas Teses de Filosofia da Historia de
Benjamin.Este,de inicio, assinalou um antagonismo entre a Social-Democracia e
Blanqui. Para Benjamin, a Social-Democracia ps Blanqui num ostracismo de 30 anos.
Na viso de Benjamin trs grandes questes se destacam neste campo de antagonismo:
1- Contra a idia de homogeneidade do tempo histrico;
2- Contra a idia de progresso;
3- Contra o esquecimento da tradio dos oprimidos.
Ento, W. Benjamin iniciou uma operao de salvamento do velho revolucionrio,
ou seja, a sua reabilitao.
E, nesta ao de Benjamin, h uma certa imagem da classe trabalhadora que est em
jogo(Abensour); o nome de Blanqui o nome de um vencido e,ao mesmo tempo, um
nome proprio e um nome coletivo:
No mais uma classe destinada a herdar o universo, o domnio da natureza, contanto
que nade a favor da corrente, mas uma classe a ser considerada como portadora de
cadeias radicais.A classe dos humilhados e dos ofendidos, no mais voltada para uma
reapropriao mas para a reparao dos males sofridos e das feridos infligidas.
Assim, O messias no vem apenas como redentor mas como vencedor do Anticristo
(Tese VI Sobre o conceito de Historia ).
dio, impulso vingador,vontade de sacrifcio, tal o complexo de atitudes, o nervo,de
uma classe revolucionaria que se mantm apartada de qualquer modelo da conservao
de si.

Visando a poliica de esquerda em seu conjunto,Benjamin prope que trs motivos


devem ser introduzidos nos fundamentos da concepo materialista da historia:
1) a descontinuidade do tempo histrico,
2) o poder destruidor da classe trabalhadora,
3) a tradio dos oprimidos.
Para Abensour,O desafio no nada menos que a produo de uma nova concepo
da historia. Benjamin,partindo da frase de Blanqui, um novo sempre velho e um
velho sempre novo, insiste primeiramente sobre a violncia destruidora de LEternit
par les Astres,
viso infernal,pois o eterno retorno do mesmo significa para Blanqui,a catstrofe
permanente: 1830, 1839, 1848, 1871 ou a eterna derrota do proletariado. O extremismo
dessa viso conserva bem alguma coisa do radicalismo revolucionrio de Blanqui.
Em um primeiro nvel, a m-nova que Blanqui revela possui uma qualidade
emancipadora.Discernindo sob o vu do novo o eterno retorno do mesmo, Blanqui
denuncia ao mesmo tempo as fantasmagorias que assombram seu sculo: a comdia
sempre repetida dos programas, a iluso de que a revoluo proletria teria por misso
continuar a de 1789,as iluses do progresso;em resumo, todos os emolientes que
enfraqueceram a energia revolucionaria (Abensour).
...a hiptese da repetio proposta por Blanqui,longe de quebrar o ardor
revolucionrio,teria antes o efeito de estimul-lo,at mesmo de lev-lo a seu regime
mais intenso...essa teoria do eterno retorno do mesmo no atinge igualmente a resoluo
de agir na historia ?
Como efetivamente, professando essa tese em 1872,depois da Comuna, Blanqui teria
podido continuar a sustentar a proposio que enunciara em maro de 1869: A
engrenagem das coisas humanas no em absoluto fatal como a do universo.
modificvel a cada minuto ?
Aos olhos de Benjamin, Blanqui,vitima da repetio sem esperana,teria caido no
circulo encantado do retorno eterno.Esse escrito apresenta a idia do retorno eterno das
coisas dez anos antes de Zarathustra; apenas de modo menos pattico e com extremo
poder de alucinao.
Para M.Abensour, O projeto de W.Benjamin,mesmo que em certos momentos ele
reconhea em Blanqui uma alma da mesma famlia,no salvar Blanqui mas salvar a
idia e a possibilidade de libertao...essa imagem de Leternit par les Astres,
organizao do pessimismo e no fantasmagoria da repetio,deve metamorfosear-se
em utopia negativa;que cesse a catastrofre.
Abensour finaliza seu ensaio; a bssola de Benjamin,sob a atrao da dupla
imantao,no cessa,qual corao descontrolado,de oscilar no entrecruzamento de duas
galerias, a da MELANCOLIA e a da REVOLUO.
Paul-Laurent Assoun,em seu livro, Marx e a repetio histrica,retoma sem eu ltimo
capitulo a relao entre Marx e Blanqui (a repetio como metfora da histria).
Assouan pe a mesma questo de Abensour: Mas como pode o homem da prtica
extremada conceber tal imobilismo no final de sua vida ?.Para Assoun, h coerncia:
de fato, a teoria da repetio e do eterno retorno est ligada em profundidade ao
estatuto blanquista da prxis.A virtude do golpe de mo provm do fato de que ele
intervm como o lance de dados num mundo que no possui outra racionalidade que
no a absoluta contingncia de sua repetio, acontecimento puro que vem preencher o
infinito vazio do espao e do tempo (...) O hino blanquista repetio no , portanto,
desesperado: ele exprime a verdadeira filosofia de uma pratica sem referente externo
alm de sua exigncia o querer revolucionrio para alm da esperana e do
desespero, ao mesmo tempo perptuo fracasso e renicio obstinado.
Assouan define o estatuto materialista da repetio, na viso de Marx:
O movimento do progresso da historia revela-se ao mesmo tempo pelo exato regresso
das repeties e pelo fracasso delas cuja sano a degenerescncia em farsa. pela
repetio falhada, ao mesmo tempo repetio e repetio falhada, que se alimenta o
palco da historia. neste sentido uma lio para a prxis que, em vez do lanar de
dados sobre o tablado das coexistncias e das simultaneidades, se educa pela referencia
materialidade histrica. isso que d a frase de Marx um valor de pedagogia histrica
para uso da prxis revolucionaria.Conhecer as artimanhas da historia que lhe compem
a realidade informar e fundamentar a pratica;ora, a repetio uma de suas figuras
dominantes.

W.Benjamin e as temporalidades da autogesto

Benjamin produziu uma nova teoria da historia que portadora de afinidades como
nossa analise dos ciclos longos das lutas de autosgesto dos trabalhadores.
Recorremos a um texto dos Cadernos do Crcere, de A, Gramsci, na busca de uma
metodologia para a analise dos ciclos de longos perodos histricos. Do ponto de vista
filosfico-epistemolgico, a obra de Walter Benjamin nos forneceu elementos
preciosos.Sobre este aspecto,a teoria benjaminiana da historia se especifica em uma
teoria que busca colher o modo como o passado pode tronar-se um momento critico da
experincia presente.Uma atualizao do possivel na linguagem de Daniel Bensaid.
A conscincia histrica implica a relao que a classe oprimida, como sujeito
histrico,no momento de sua ao poltica de ruptura da continuidade histrica,tem com
o passado. As revolues anti-passivas implicam uma cosnciencia do passado distinta
da imposta pela classe dominante.
Portanto,nas teses de Benjamin, h a exigncia de um novo modo de apropriao do
passado. O que passado nem por isso est irremediavelmente concludo: a estrutura
doa contecer histrico no est apenas aberta para o futuro, mas tambm em direo ao
passado.
Gramsci dizia que todo grupo social tem uma tradio, um passado...Aquele grupo
que, compreendendo e justificando este passado, souber identificar a linha de
desenvolvimento real, contraditria, mas na contradio possvel de superao,
cometer menos erros, identificar mais elementos positivos, sobre os quais criar
uma nova historia.
Estas palavras de Gramsci, implicam uma nova relao com o passado e ,tambm, uma
nova hegemonia. A referencia classe operaria,como sujeito de uma revoluo anti-
passiva,impe uma periodizao histrica distinta da oficial.A luta de classes tem como
conseqncia o por em discusso cada vitria dos dominadores(Benjamin). A
originalidade das Teses de Benjamin em termos de prxis historiogrfica,est numa
nova leitura da temporalidade histrica.
Segundo Benjamin, o movimento histrico determinado por impulsos desiguais e
assimtricos. A historia dos oprimidos uma descontinuidade no continuum que a
historia dos opressores.A historia das classes dominadas dessimtrica; A sua historia,
assim, est ligada sociedade civil, uma funo desagregadora e descontinua da
historia da sociedade civil,e por este tramite,da historia dos Estados ou dos grupos de
estados (Gramsci).
C.Buci-Glucksmann afirma que a historia de uma autonomizao dessemetrica que
visa a construo de novas formas polticas, tipo conselhos, sindicatos e partidos.

Olgaria Matos analisou de forma muito brilhante as Teses de Benjamin em sua obra
Os Arcanos do inteiramente Outro.Vejamos alguns elementos:

Na Tese XIV, Benjamin trata a relao com o passado sob uma dupla possibilidade;
- uma,que se efetiva imediatamente relao de identificao-,e,
- outra que extrai o excedente de significado no interior deste mesmo passado,o que
permaneceu virtual.
O salto do tigre no passado pode conduzir a sadas de sentidos contrapostos,
conforme advenha na arena onde manda a classe dominante (identificao),ou sob o
cu livre da historia.
tal como a moda, a historia revivida, mas segundo esta duplicidade: como repetio
ou como sentido imediato,como catstrofe ou como redeno.O que subjaz a abordagem
de Benjamin, a critica a noo de continuidade temporal : A historia o objeto de
uma construo cujo lugar no o tempo homogneo e vazio,mas, forma um tempo
pleno de jetztzeit,como interrupo do devir abstrato do tempo.A idia segundo a qual
a historia sempre escrita pelos vencedores a idia da catastrofe como continuidade
da historia.
A continuidade da historia, a dos opressores; a historia dos oprimidos uma
descontinuidade.
Podemos afirmar que,aparentemente,as inmeras derrotas das lutas operarias pela
autogesto e pelo socialismo,parecem constituir um rosrio de derrotas,uma
catstrofe,uma dialetica infernal do mito de sisifo.Mas,a descontinuidade intrinsica a
estas lutas,ao contrario,nos indicam um acumulo desigual mas combinado,em diversos
campos: militar,idoelogico,direitos,organizao,cultural,etc.
Prossegue Olgaria Matos; As tarefas revolucionarias benjaminianas exigem,portanto,
um salto tigrino,exigem a exploso da continuidade e no seu embelezamento.Para
Matos, o instante aristotlico e o jetztzeit benjaminiano so,por assim falar, um
recolhedor histrico do tempo(Tese XV),recolhedor das experincias e dos contedos
utpicos quando se do como repetio do no-realizado.
O presente,nesta concepo benjaminiana,opera sobre a historia homogenea de
maneira constitutiva e diferenciadora,mediante cortes sincrnicos
monadologicos,como se fora um modelo de tempo messinico,contendo a historia
inteira da humanidade numa enorme abreviao...de todo modo, o essencial que a
Tese XIV exprime a necessidade da interrupo temporal,com a extrao de um
momento do passado,extrao detranquilidade do passado,momento este que
necessariamente revolucionrio.
Para Matos, Benjamin ps o materialismo historico servio de uma teoria da
experiencia e,no o contrario.Neste horizonte,no existe distino entre historia e
memria;mas sim,entre o historigrafo e o cronista.O cronista repete um passado em
sua literalidade,o historigrafo o repete em sua singularidade, recolhendo o excedente
de significao de que portador,melhor diznedo, o nico e irrepetivel.

Nesta perspectiva, Ernst Bloch nos fala de no-temporalidade do tempo: sempre


com vantagens e de forma fecunda que recorremos na historia ao que tende para ns, em
virtude do status paradoxal que lhe vale justamente de ser ainda um futuro no passado.
este elemento portador da significao utpica ,esta substancia seminal da historia, o
fermento nico que subsiste nas intenes passadas,mas no acabadas e,sobretudo,nas
obras.
o excedente utopico.

Para Bloch,Benjamin desenvolveu,para a esfera da vida historica e social,a noo de


um a-presente fazendo explodir o continuum da historia, de tal forma que, no lugar
desta continuidade,ressalta um passado carregado de a-presente...Na medida em
que,do passado capaz de subsistir uma tenso do tempo em direo ao futuro, o
homem pode voltar a este passado,seja para a lembrana ou interpretao,para o
reabilitar em parte ou melhora-lo de forma revolucionaria.

Michael Lowy e Daniel Bensaid , a partir de analises das Teses de Filosofia da


Historia de Walter Benjamin, e dos conceitos de Utopia e Esperana,remetendo ao
prprio Ernst Bloch, desenvolveram reflexes que so fundamentais para o campo das
convergncias e afinidades entre autogesto,utopia e socialismo. Muitas destas idias
esto presentes na obra conjunta de Lowy e Bensaid, Marxismo, Modernidade ,
Utopia.
A atualizao destes conceitos implica uma nova viso radical da temporalidade, o que
nos remete ao debate que vnhamos fazendo acima,a partir da obra de A.Blanqui. Esta
nova viso ocorreu com Benjamin sobre o tempo historico e,na concepo de
possibilidade na obra de Bloch.

Todavia, fundamental remarcar que Arno Munster destaca em suas obras as diferenas
de vises entre Benjamin e Bloch,mesmo que ambos estejam alocados no campo de
uma viso messinica da historia.
As pocas revolucionarias para Bloch,so momentos de rejuvenescimento da historia,
que abrem objetivamente as portas chegada de uma nova sociedade...Esta qualidade
de aurora se manifesta no somente nas irrupes revolucionarias dos tempos
modernos.Ela se encontra substancialmente presente nas primeiras utopias sociais e
polticas da humanidade... Todas estas utopias tm uma funo subversiva e
estimuladora para a chegada de revoluo burguesa do sculo XVIII e para a futura
poca dominada pela cincia e pelo progresso tcnico.E como forma tpica de
concretizao histrica desta mesma tendncia na historia, Bloch cita tambm a poca
do Sturm und Drang,e do Vormatz, quer dizer; os anos que precedem a agitao
revolucionaria de maro 1848 e tambm o movimento dos Narodniki na Rssia,antes
da Revoluo de outubro.Cada um destes exemplos dados demonstram ,no entender de
Bloch,o elevado nvel de aspirao e de transformao renovadora que a conscincia
histrica das massas pode atingir,e at que ponto esta grande onda de conscientizao
pode abalar o sistema cultural,poltico e social existente.

Munster expe a viso de Benjamin: Nas Teses sobrea filosofia da Historia,Benjamin


define,entre outros,a teoria do conhecimento do novo materialismo historico enquanto
esforo e tentativa de de fazer saltar e escolher da continuidade histrica um epriodo
especifico, caracterstico e tpico para a interrupo do progresso e do desenvolvimento
histrico,para demonstrar que o tempo da historia contempornea conserva estes fatos
singulares do passado e que o prprio curso verdadeiro da historia conservado na
poca. Essa a razo profunda que leva Benjamin a considerar as tentativas
revolucionarias dos oprimidos e dos explorados como breves e instantneas paradas
messinicas da historia,de uma historia que no cessa de se repetir pelo eterno retorno
do mesmo,e que caminha na direo de uma grande catstrofe.
J vimos que Abensour tem uma viso distinta sobre esta questo em Benjamin.
Vejamos o ponto central levantado por Munster:
Transferida para o nvel das lutas sociais do sculo XX,essa desmistificao das
aparncias significa,todavia,considerar as lutas sociais:

1) enquanto expresso da vontade da humanidade oprimida concentrada


num s momento histrico para liberar o mundo de seu desvio(
Enstellung);

2) enquanto expresso da fraca fora messinica dos oprimidos durante


sua luta quase desesperada contra a opresso e a explorao.A
interpretao da historia sob este aspecto ( o da demsistificao de suas
aparncias ) significa procurar e determinar tambem a sua substancia
escondida nas imagens fugidias que podem revestir a forma de momentos
fulminantes que interrompem a continuidade da historia; e isso significa
para Benjamin considerar a matria e os fatos da historia exclusivamente
sob o aspecto dos estados de exceo, inscritos na historia da
humanidade como raros momentos de desafio fatalidade catastrifica da
historia, de uma historia que corre inevitavelmente,como W.benjamin
indica nas suas Teses sobre o conceito da Historia,rumo a uma nova
barbrie.
Para Munster,!E.Bloch recusa tambm a reduo feita por Benjamin da
esperana revolucionaria imagem das breves paradas messianicas que
interrompem a continuidade da historia,produtos de uma concentrao
extraordinria da fora opositora dos oprimidos em momentos precisos da
historia das lutas sociais.
interessante assinalar como esta discordncia pode ter alguns elementos
de afinidade com a viso traada por Daniel Moth,entre a autogesto
como o grande diluvio e a autogesto gota-a-gota.No sentido
benjaminiano, a autogesto social ocorre apenas em alguns momentos da
historia das lutas sociais.No sentido blochiano, um elemento permanente
destas lutas,mas que vem superfcie nos momentos de aurora,de
rejuvenescimento da historia.

Em sua obra principal sobre W.Benjamin, M.Lowy ( Avertissement dincendie.Une


lecture ds theses Sur l concept dhistoire),remarca:
Benjamin se inspira em textos como os Manuscritos de 1844, os escritos sobre a
Revoluo de 1848-1850 ou a Comuna de Paris ou ainda a Critica do Programa de
Gotha(...)O resultado deste trabalho uma reelaborao, uma reformulao critica do
marxismo,integrando na massa do materialismo histrico os clares messinicos,
romnticos, blanquistas,libertrios e fourieristas.Ou, antes, a fabricao, a partir da
fuso destes materiais, de um marxismo novo, hertico e radicalmente distinto de todas
as variantes ortodoxas ou dissidentes- de seu tempo.Um marxismo messinico...Mas
tambm e acima de tudo um marxismo da imprevisibilidade: se a historia aberta, se o
novo possvel , porque o futuro no conhecido de antemo.
A advertncia de incndio de Benjamin guarda uma grande atualidade: a ctastrofe
possvel seno provvel- menos que...
O que significa: o pior inevitavel, a historia permanece aberta, ela comporta outras
possibilidades, revolucionarias, emancipatorias e/ou utpicas,conclue Michael Lowy.
Retomemos nossa citao inicial de M.Lowy:
Em seu ensaio Marxismo e Utopia, Lowy se reclama de diversas fontes do
socialismo: O socialismo cientifico precisa mais uma vez tornar-se utpico buscando
sua inspirao no Principio Esperana( Bloch ) que reside nas lutas, sonhos e
aspiraes de milhes de oprimidos e explorados,os vencidos da historia,em Jan Hus e
Thomas Munzer,nos soviets de 1917-1919 na Europa e coletivos de 1936-1939 em
Barcelona.Nesse nvel ainda mais indispensvel abrir amplamente as portas do
pensamento marxista gama de intuies sobre o futuro, desde os socialistas utpicos
de ontem at os crticos romnticos da civilizao industrial, desde os sonhos de Fourier
at os idiais libertrios do anarquismo.

Por sua vez,D.Bensaid ,em Marx,o Intempestivo, nos chama tambm Uma Nova
Escala do tempo:
(...) pela evocao das conjunturas passadas, Abordar a Outrora significa ,portanto,
que ela seja estudada,no mais como antes, de maneira histrica, mas de maneira
poltica, com categorias polticas-W.Benjamin.
Tratar politicamente a historia pensa-la do ponto de vista de seus momentos e de seus
pontos de interveno estratgicos(...).A citao do passado a comparecer contradiz o
postulado de um tempo irreversvel e no modificvel. A historia critica no pode anular
aquilo que foi, mas pode redistribuir-lhe o sentido.

Bensaid assinala,em relao a recolocao do passado,duas direes contrarias:


Uma ontolgica e outra poltica. Na linha de W.Benjamin e Gramsci, nesta ltima, O
tempo granuloso da historia no para eles nem o cumprimento de uma origem nem a
perseguio de um fim. O primado do futuro desenha em Ernst Bloch o hprizpnte
utpico da esperana.Em Heidegger a direo ontolgica- ele assombra a meditao
antecipada do ser-para-a-morte.(...)As categorias benjaminianas do tempo ordenam-se
triplamente no presente: presente do passado, presente do futuro,presente do presente.
Todo passado renasce no presente tornando-se passado. Todo presente esvanece-se no
futuro tornando-se presente(...).
Em seu livro Walter Benjamin,Sentinelle Messianique,D.Bensaid define o conceito
do tempo histrico: o presente do passado responde ao presente do futuro, a memria
espera: Ns somos esperados. Prever este presente carregado de dividas messinicas
a tarefa poltica por excelncia.
Encarar a funo antecipadora, no s em ns,subjetivamente,mas no mundo,
objetivamente.O passado j era antecipao do presente,o mesmo que este o do
futuro,e isto o que valoriza para ns a recordao. Quando no h antecipao, o
passado est concludo,est condenado,desapareceu,se acha aniquilado.Tudo o que nos
move na ordem da civilizao antecipador: de nobis fabula narratue, afirmou Bloch
no debate sobre as noes de estrutura e gnese,no Colquio de Ceresy-La-Salle.
Arrancar a tradio ao conformismo a tarefa revolucionaria por excelncia. O
conceito fundamental do materialismo histrico no o de progresso,mas o de
atualizao: atualizao das potencialidades.

J vimos como M.Lowy, em seu estudo sobre Benjamin,afirma que: A abertura do


passado significa dizer que os nomeados julgamentos da historia no tm nada de
definitivo e de imutvel.O futuro pode reabrir os dossiers histricos fechados,
reabilitar as vitimas caluniadas, reatualizar as esperanas e as aspiraes vencidas,
redescobrir os combates esquecidos ou julgados utopicos, anacronicos e a contra-
corrente do progresso.Lowy cita a obra de E.P.Thompson sobre formao da classe
operaria inglesa como uma manifestao clara desta reabertura do passado.

Deste modo, as lutas dos trabalhadores pela autogesto,s aparentemente, repetem os


mesmos espetaculos,no dizer de Blanqui.Cada ciclo histrico,cada luta,cada
experincia, representam acmulos,avanos,apesar das derrotas,seja no campo das
idias e projetos polticos,seja no campo das formas de luta e de organizao. isto que
veremos ao analisarmos as lutas pela autogesto socialista.

ALAIN BADIOU : A LIO DAS DERROTAS

Em sua obra sobre A Hiptese Comunista, Alain Badiou elabora uma teoria das
derrotas. Por vrios elementos,essa teoria impoortante para nosso trabalho,pois,alm
de operar com uma idia prxima a de ciclos, busca na experincia da Comuna de Paris
um de seus elementos fundantes.
Badiou : As experincias de novas formas polticas foram numerosas e apaixonantes
nos 3 ultimos decnios.Citemos:
O movimento Solidarnosc na Polnia dos anos 1980-1981;
A 1 sequencia da revoluo iraniana;
A organizao poltica na frana;
O movimento Zapatista no Mxico;
Os maoistas no Nepal.
Para Badiou, A partir da metade dos anos 70 dos culo passado,comeou o refluxo do
decnio vermelho inicado pela quadrupele ocorrncia das lutas de libertao ancional
(Vietnam e Palestina,singularmente),do movimento mundial da juventude estudantil
(Alemanha,Japo,USA,Mxico...), das revoltas de fabrica (Frana e Itlia) e da
Revoluo Cultural na China.
.Na longa hitoria das lutas pela emancipao,Badiou assinala trs tipos distintos de
fracassos:
1= o mais claro,ou a mais circunscrita, o fracasso de uma experiencia em
que,detentores momentneos de um poder em um pais ou uma zona,tentando
estabelecer novas leis,os revolucionrios so massacrados pela contra-revoluo
armada.
Neste caso,muitas insurreies so relevantes,as mais conhecidas so=
-dos Spartakistas na Berlim do aps-guerra de 1914,ou morreram Rosa Luxemburgo e
Karl Liebknetch,e as de Shangai e Canton na China dos anos 20.
O problema posto por esse tipo de fracasso sempre o da relao das foras.
Para Badiou,O balano positivo da derrota est no tratar imediato das novas disciplinas
requisitadas para o sucesso da insurreio.Destas discusses,o exemplo paradigmtico
o encaminhamento histrico do balano da Comuna de Paris.De Marx ate hoje,passando
por Lissagaray,Lenine,ou os revolucionrios chineses at 1971,esse balano est
aberto.

2= O segundo tipo de fracasso o de um vasto movimento,onde se engajam as foras


disparatadas mais numerosas,sem que se fixem um objetivo de poder,mesmo que
ponham as foras do Estado reacionrio na defensiva.Quando esse movimento
reflui,toda a questo,em vista da completa restaurao da velha ordem,ao menos suas
grandes linhas, de saber qual a natureza da ao,e quais so as conseqncias.

Talvez o 1 movimento deste tipo a Fronda no inicio dos culo XIX na Frana.O
movimento de 1919 na China tem traos tambm desse tipo.Um modelo mais recente
sem duvidas o mtico Maio 68,que ainda d lugar a inumers publicaes e a furiosas
discusses quando de seu 40 aniversario.

3= O terceiro tipo de fracasso concerne a tentativa de transformar o Estado,que se


declara oficialmente socialista,para o ordenar mais diretamente na direo associativa
livre que,aps Marx,parece prescrever a hipotese comunista.O fracasso que o
resultado vai nos entido inverso:ou a restaurao do terrorismo do Estado-Partido,ou o
abandono puro e simples de toda referencia ao socialismo ou ainda ao comunismo,e o
alinhamento do Estado as condies de desiguladade do capitalismo,ou ento as duas,o
primeiro preparando o segundo.
Os exemplos,o Socialismo com rosto humano na Thecoslovaquia aniquilado pela
armada sovitica em 1968.E,h formas bem mais significativas,como o movimento
operrio polons Solidarnosc entre o 14 agosto 1980 (desencadeamento da greve nos
canteiros navais de Gdansk) e o 13 dezembro 1981 (istituio do estado de sitio).
Aqui,Badiou cita tambem a Grande revoluo Cultural Proletria,na China entre 1966
e 1968.
E,sobre a atual conjuntura vivida pelos revolucionrios,nos diz Badiou:
isolados ,como Marx e seus amigos no momento do retrospectivamente famoso
Manifesto do Partido Comunista de 1847,ns somos de mais em mais numerosos a
organizar os processos polticos de tipo novo nas massas operarias e populares,e a
buscar todos os meios de sustentar no real as formas renascentes da Idia Comunista(...)
O que importa,de inicio, sua existncia e os termos de sua formulao(...)
E,sobre a Prxis :
Combinando as construes do pensamento,que so sempre globais e universais,e as
experimentaes de fragmentos de verdades,que so locais e singulares,mas
universalmente transmissveis,no podemos assegurar a nova existncia da hiptese
comunista,ou antes,da idia do comunismo,nas conscincias individuais.

AUTOGESTO: ESTRATEGIA DE DESENVOLVIMENTO

A autogesto engloba o conjunto do metabolismo social: o Estado (cidade,Nao),o


Trabalho e o Capital.Diz respeito a todos os campos de estruturao da Sociedade.
,sobretudo,uma Viso de Mundo (cultura,filosofia,tica,ertica,pedagogia ).*
*Ver meu ensaio Paixes Pedaggicas.2010.

Assim,iniciaremos esta parte,abordando a tematica dos Tipos de Desenvolvimento,o


que significa,abordar Projetos de Sociedade.
G.Arrighi,em seu recente estudo sobre a China, nos fala de um tipo de
desenvolvimento:O , INDUSTRIOSO

Tipos de desenvolvimento
(Revoluo industrial e industriosa)

A autogesto engloba o conjunto do metabolismo social: o Estado (cidade,Nao),o


Trabalho e o Capital.Diz respeito a todos os campos de estruturao da
Sociedade.,sobretudo,uma Viso de Mundo (cultura,filosofia,tica,ertica,pedagogia ).
Assim,iniciaremos esta primeira parte,abordando a tematica dos Tipos de
Desenvolvimento,o que significa,abordar Projetos de Sociedade.
G.Arrighi,em seu recente estudo sobre a China, nos fala de um tipo de
desenvolvimento:O , INDUSTRIOSO , em contraposio ao INDUSTRIAL.
Vamos nos debruar em duas obras de Raymond Williams,Culture and Society 1780 -
1950(1961) e Keywords: a vocabulary to culture and society(1976) ,em busca do
significado de algumas palavras.
No prefacio da primeira obra citada, R.Williams destaca 4 palavras que O tema deste
livro a descoberta que a idia de cultura ,e a palavra mesma ,nos seus usos comuns e
modernos tiveram no pensamento ingles no perodo comumente definido da Revoluo
industrial.O livro uma tentativa de demonstrar como e porque isto aconteceu e traar o
desenvolvimento desta idia at os nossos dias.
Adverte que o livro prossegue a pesquisa iniciada na revista Politics and Letters,de
1946 a 1948.
Em longa citao,extrada da Introduo ao livro e que nos permite assimilar s idias
de R.Williams, vejamos como o autor nos aporta elementos preciosos para nosso
objetivo,de refletir sobre Tipos de Desenvovlimento ligado questo da Revoluo
Industrial.
Nos ltimos anos do sculo 18 e na primeira metade do sculo 19,numerosas
palavras,que hoje tm importncia fundamental,entraram pela primeira vez em uso na
Inglaterra,ou,onde j erama dotadas comumente, adquiriram significados novos e
importantes.(...)
Cinco palavras representam pontos chaves sobre a base das quais possvel traar este
guia.Estas so: industria, democracia, classe,arte e cultura.A importncia destas
palavras,na nossa moderna estrutura de significados, obvia.
As mudanas no modo de uso verificadas neste perodo critico so a prova de uma
mudana geral no modo caracterstico de considerar a vida comum: as instituies
sociais,poltica e economica.(...)
Portanto, A primeira palavra INDUSTRIA,e o perodo em que mudou de significato
foi o perodo que hoje nos chamamos da Revoluo industrial.Industria,antes desse
perodo, era o nome de um particular atributo do homem,nome que poderia ser
parafraseado com habilidade,assiduidade,perseverana,diligencia. claro que esse
significado da palavra industria ainda sobrevive.Mas,nos ltimos decnios do sculo
18,industria tambm significou outra coisa;torna-se um nome coletivo para a instituio
manufatureira e produtiva,e para a atividade geral deste campo.
ADAM SMITH em The Wealth of Nations(1776), um dos primeiros escritores a
usar a palavra neste significado,e deste momento em diante o desenvolvimento em tal
sentido ficou assegurado.A Industria,com maiscula, considerada uma coisa que se
basta uma instituio, - mais que um atributo do homem isolado.
A INDUSTRIOSO,que qualifica uma pessoa,se acrescenta no sculo
19,INDUSTRIAL,que qualifica instituies.
A importncia rapidamente crescente desta instituio evidente pelo fato que criaram
um novo sistema,o qual no terceiro decnio do sculo 19 vem pela primeira vez
definido como INDUSTRIALISMO.
Em parte, a sano a uma serie de mudanas tcnicas de grande importncia,e da
transformao destas levadas aos mtodos de produo.Mas, tambm um
reconhecimento do efeito destas mudanas sobre a sociedade em seu conjunto,que
ocorre gradualmente.
A expresso REVOLUO INDUSTRIAL o confirma amplamente,desde que,usada
pela primeira vez por escritores franceses no segundo decnio do sculo 18 e adotada
pouco a poucoo pelos escritores ingleses no curso do sculo, modelada explicitamente
sobre uma analogia com a REVOLUO FRANCESA do 1789.Como esta
transformou a Frana,aquela transformou a Inglaterra,os meios so diferentes,mas o
resultado anlogo: produziu,mediante um certo tipo de mudana,uma nova
sociedade.
A sociedade capitalista,baseada no trip Capital,Trabalho assalariado e o Estado, que se
articulam dialeticamente em um Tipo de Desenvolvimento com base no
industrialismo,na acumulao de Capital.E,em um Modo de Vida,na esfera
cultural,como cultura comum,na expresso do prprio R.Williams.
R.Wiiliams voltou a estas idias na segunda obra citada acima,Keywords.
No titulo INDUSTRIA ( industry ), R.Williams afirma que H dois sentidos
principais de industry:
1) a qualidade humana de aplicao ou esforo sistemticos;
2) uma instituio ou um conjunto de instituies para a produo e o comercio.Os dois
sentidos dividem-se nitidamente sem eus adjetivos modernos industrioso e
industrial.

A obra de G.Arrighi ,sobre Adam Smith e a China, nos leva a reflexo sobre como
estes dois conceitos se articulam em um tipo de Desenvolvimento.Um que adevem com
a revoluo industrial e caracteriza o modo de produo capitalista; outro, que advm de
civilizaes milenares e que caracteriza um tipo de desenvolvimento com caractersticas
antagnicas ao do Capital e da industrializao.
Voltemos etimologia destas expresses na obra citada de R.Williams:
industry existe no ingls desde o Sculo 15, da p.i. francesa industrie,da p.r. latina
industria (diligencia).(...)
Industrioso,com o sentido de habilidoso ou assduo,era o adjetivo derivado comum a
partir de meados do Sculo 16,mas nesse mesmo sculo surgiu industrial,em uma
distino entre frutas cultivadas (industriais) e naturais.Assim, industrial era raro ou
esteve ausente at o final do Sculo 18,quando teve inicio o DESENVOLVIMENTO
(grifo nosso) que o tornou comum por volta de meados do Sculo 19,talvez em um novo
emprstimo do francs.
Sem duvidas, com a Revoluo francesa (1789) que a Burguesia se torna classe
dominante-hegemonica.
R.Williams segue; Foi a partir do sculo 18 que o sentido de industria como
instituio ou conjunto de instituies comeou a manifestar-se.
Assim,como Tipo de Desenvolvimento , cujo metabolismo social formado pelo
Capital,Trabalho assalariado e o Estado,tal qual o define I.Meszros em sua obra Alm
do Capital.
R.Williams: desde o periodo de seus principais usos originais,o sentido de industria
como instituio foi radicalmente afetado por duas outras derivaes:
- industrialismo,introduzido por Carlyle na dcada de 1830 para indicar uma NOVA
ORDEM DA SOCIEDADE, baseada na produo mecnica organizada,
- e a expresso revoluo industrial, termo to central hoje.Revoluo industrial
especialmente difcil de rastrear.
Mas,Williams,fornece pistas: A transio crucial, no sentido desenvolvido de
revoluo como instituio de uma nova ordem na sociedade,ocorreu na dcada de
1830,notadamente com Lamartine: L 1789 du commerce et de lindustrie, que ele
descreveu como a verdadeira revoluo.
Assim, Lamartine capta muito claramente o sentido poltico do processo: o 1789.
Prossegue R.Williams: Wade (History of the Midlle and Working Classes,1833)
escreveu em termos semelhantes sobre essa extraordinria revoluo.
E, essa percepo de uma grande mudana social,equivalente a uma nova ordem de
vida,era contempornea ao sentido relacionado de INDUSTRIALISMO de Carlyle
e,como definio,dependeu de um conjunto de reflexes distinguveis,tanto em ingls
como em francs,desde a dcada de 1790.
A idia de uma nova ordem social baseada em importantes mudanas industriais era
clara em Southey e em Owen,entre 1811 e 1818, e j estava implcita em Blake no
inicio dos anos 1790 e em Wordsworth na virada do sculo.Na decadade 1840,tanto em
ingls como em francs (uma completa revoluo industrial,Mill,Principios de
economia poltica,III,xvii,1848 logo revisado e convertido em uma espcie de
revoluo industrial; lre ds rvolutions industrielles,Gilbert,1847), a expresso
tornou-se mais comum.entretanto,os usos decisivos foram provavelmente os de Blanqui
(Histoire de leconomie politique,II,38,1837): la fin du dixhuitime sicle(...) Watt et
Arkwirght (...) la rvolution industrielle se mit em possession de lAngleterre,e os de
Engels (A situao da classe trabalhadora na Inglaterra;escrito em alemo ,1845): estas
invenes(...) desencadearam uma revoluo
industrial,que,simultaneamente,transformou a sociedade burguesa no seu conjunto.
Ernst Bloch,no primeiro volume de seu monumental Principio Esperana nos fala da
herana das sociedades pr-capitalistas:
a filosofia marxista a do futuro, portanto tambm a do futuro no passado.Para
Bloch, devemos tomar conhecimento do antecpatorio com base em uma ontologia do
ainda-no.
Assim,entramos no campo propriamente da filosofia.

A Autogesto e o Deus Oculto


( a dialtica do possivel )

O pensador romeno, mas que viveu na Frana exilado at sua morte,Lucien


Goldmann ,em sua ultima etapa de vida, teceu fortes consideraes sobre a autogesto e
o socialismo.
Goldmann mais conhecido por seus estudos culturais com base no
estruturalismo genetico.Contudo,se analisarmos atentivamente suas ltimas obras(
),veremos que formulou idias sistemticas sobre a autogesto, a partir dos estudos da
poca sobre a nova classe operaria e da experincia na Yugoslavia. A relao que
estabeleceu entre estes dois elementos,talvez,seja a sua especifica contribuio s idias
autogestionarias. Mais adiante voltaremos a esse ponto.
Goldmann tambm realizou reflexes importantes sobre epistemologia e
sociologia poltica.Desta forma, analisou a importncia da categoria do possivel para
uma sociologia positiva. Para Goldmann, um grupo define-se por um campo de
possibilidades, de variaes possveis dos eu pensamento e do seu comportamento. E
que , estudar positivamente uma realidade social estuda-la no conjuntoi do devir da
sociedade como um processo em que toda uma serie de grupos se enfrentam. E, na
historia e at hoje, o homem se define antes do mais por duas dimenses: o real e o
possivel.O homem o que ,mas tambm o ser que faz a historia,que tende a realizar
os seus projetos, que se empenha no possvel e supera aquilo que hoje.
Em sua principal obra, L Dieu cach ( O Deus oculto),Goldmann estuda o
pensamento de Pascal. J Pascal disse, num fragmento celebre, que no se pode definir
o homem,porque ele infinitamente maior do que aquilo que , e o pensamento
dialetico nos diz que no se pode definir qualquer fenmeno humano, uma vez que ele
sempre o resultado do comportamento de um sujeito que caracterizado,por um
lado,pelo real, e por outro,pelo possvel,que cria o real a partir do possvel anterior e
modifica este possvel alterando o real.
Goldmann definia o capitalismo organizado como uma sociedade tecnocrtica
,concentradora das decises nas mos de uma camada relativamente reduzida.
Colacavase uma questo importante:
O problema importante que se coloca s sociedades industriais moedrnas, saber
se existe ainda alguma possibilidade de defender e de desenvolver o domnio da
liberdade, o domnio do possvel, no inetrior do qual se situa no s o conjunto da
criao espiritual e cultural, mas tambm a esperana de um mundo onde a
solidariedade humana seja verdadeiramente real e importante,ou ento, ao contrario,j
estamos embrenhados de maneira irreversivel numa evoluo que conduz ao homem de
uma s dimenso.
Respondia que a primeira resposta importante no plano terico foi,
creio,elaborada por um pequeno pais cuja experincia social muito complexa, mas
apresenta um extraordinrio interesse terico: a Yugoslavia.
Assim, Goldmann no final dos anos 60, voltava seu olhar em busca do
socialismo autogestionario. Mesmo com um olhar cheio de questionamentos frente a
experiencia Yugoslava,defendia a ideia da autogesto, quer dizer, da participao de
todo o pessoal da empresa nas decises e nas responsabilidades.. Quando se observam
as coisas de peerto percebemos de que na Yugoslavia, a autogesto abarca apenas uma
pequena parte dos investimentos,sendo o resto controlado,atravs do credito,pelas
autoridades centrais...resta,contudo, o valor da idia e o fato de que o nico programa
realmente possivel que at hoje foi formulado pelo pensamento socialista para assegurar
as nossas sociedades uma evoluo diferente da esboada pelos tericos pessimistas da
escola de Frankfurt o da cogesto e da autogesto enquanto possibilidades de
assegurar ptrogressivamente aos operrios e tcnicos os meios que lhe permitam no
serem apenas executantes ...mas a participarem do conjunto das decises.
Seu principal biografo, M. Cohen analisa a relao de Goldmann com a
autogesto.
Goldmann no escreveu um programa detalhado da autogesto. O ensaio sobre O
problema do controle operario seu testamento neste campo. Contuo,em vrios
debates e ensaios , Goldmann abordou o tema da autogesto.Podemos falar do debate
com S.Mallet para revista Autogestion ,realizado em jukho 1968,aps o Maio francs.
Goldmann viajou para Yugoslavia com a finalidade de elaborar um Roteiro para
um filme,isto em 1964, quando visitou varias fabricas.Seu objetivo,era conhecer de fato
a experincia dos trabalhadores na autogesto daquele pais.
Em Project dum filme ,descreveu seu objetivo: Para mostrar a autogesto
como uma sada revolucionaria para resolver os problemas humanos e notavelmente a
relaes entre o individuo e a comunidade, encontram-se muitas dificuldades, devidas
parcialmente a insuficiente maturidade e inadequada adaptao psicolgica dos
trabalhadores participantes; esperamos que, contudo,(page 269).Goldmann reconhecia
as enormes diferenas entre a subdesenvolvida base econmica da Yugoslavia e os
paises do ocidente europeu.A experincia surgiu da luta travada pelo PCY contra o
estalinismo; mas, para Goldmann ,Tito era to estalinista quanto Estalin
A Yugoslavia compunha um cenrio do que chamava de reformismo
revolucionario.Esperava que neste pais, a experiencia construsse as bases para uma
sntese de consciencia histrica socialista e toelerancia e liberdade individuais.E que,
a supresso da propriedade privada no era imcompativel com o mercado.
Para Goldmann, os antecessores da noo de autogesto eram Proudhon e o
anarquismo espanhol.E figuras do romantismo anarcosocialista, como Gustav
Landauer.. Em sua opinio, autogesto sinonimo de supreso do Estado.
Analisando o livro de Oskar Lange, Tratado de Economia Poltica,ento
traduzido ao francs,Goldmann reconhecia mesmo que esta era uma aspirao utopica.
Sintetiza em alguns pontos o que seria uma sociedade autogerida:
Goldmann recorre tradio socialista,para quem a sociedade socialista
devia,pela supresso do mercado,pela socializao dos meios de produo e a realizao
de uma produo planificada,realisar uma sntese entre:
1- organizao racional da produo de bens;
2- realizao integral dos valores de liberdade individual , da igualdade e da
comunidade.
3- aspectos qualitativos da vida psquica e das relaes inter-humanas que
caracterizavam as sociedades pr-capitalistas
4- ausncia de explorao e de diviso de classes sociais que caracterizavam o
comunismo primitivo;
Cada um destes elementos deve se encontrar ,de forma articulada, em um nvel
superior a tudo o que a historia conheceu..

7= A Comuna de Paris e a Utpia

M.Abensour refez a historia das utopias,sobretudo,em relao ao pensamento


socialista.Vejamos as idias expostas em seu livro O Novo Espirito Utpico. Elabora
mesmo uma Tipologia da Utopia.
Abensour afirma categoricamente que, A teoria de Marx no o lugar onde vem
extinguir-se a energia utpica para ceder lugar cincia, mas o lugar onde se opera um
transcrescimento da utopia socialista-comunista no sentido do conhecimento
critico.Marx no o coveiro da utopia: ele retomou e colocou sua energia em outro
nvel,projetando-a no movimento real do comunismo, principio energtico do futuro
proximo.
Em relao as teorias do socialismo dito utpico,Abensour diz que , tambm a
falta de uma teoria da historia falta alis que precisa ser nuanada- que constitui a
fraqueza das outras formas de socialismo ou de comunismo,e no a falta de um
modelo cientifico.Ns s conhecemos uma nica cincia; a cincia da historia,afirmam
com efeito,Marx e Engels na Ideologia Alem.
Desde o inicio,Marx critica a utopia de um ponto de vista revolucionrio: a seus
olhos a qualificao de utopia cabe a todo projeto parcial que ataca apenas as
determinaes secundarias de um fenmeno e deixa subsistir a essencia.Aquilo que
distingue para Marx a utopia no o demais,o excesso,o extremismo,mas antes o
insuficiente.
Na viso de Abensour, A comuna de Paris constitui um ponto de inflexo
(plaque tournante) na historia do movimento utpico:
-Para trs ela lana uma luz viva sobre o lento trabalho de germinao doutrinaria
que, no segredo ou no exlio, preparou a ecloso da primavera de 1871 (...).
-Para frente,a Comuna,atividade de tipo romantico-revolucionario, se eleva
como um farol para todos aqueles que vram a o anuncio de uma experincia positiva
conservando para o futuro possibilidades infinitas e ainda insuspeitas,e no os signos do
primitivismo revolucionrio.
Critica em face da utopia, a Comuna fez passar nos fatos e elevou a um nvel
superior a intencionalidade positiva dos grandes utopistas.Na sua vontade de romper
com a continuidade histrica, a Comuna inaugurou uma pratica utpica nova.Sua carga
utpica ainda no se extinguiu. ela que paira sobre todas as revolues ulteriores.
Abensour define uma tipologia da utopia:
2- o socialismo utpico;
3- o neo-utopismo;
4- o novo esprito utpico

Nos interessa uma aproximao com o terceiro tipo,que,aparece aps 1848.E,no qual se
distingue duas tendncias;
1. Um novo esprito utpico com desenvolvimento autnomo que nasceu de um
trabalho critico espontneo da utopia sobre ela mesma, acrescido de uma reflexo
critica sobre a pratica revolucionaria de 1848;
2. Surgiu no interior do marxismo ou mais exatamente nas correntes de oposio
ou marginais do marxismo. Uma constelao de fenmenos utpicos em relao
com Marx, no arco de tempo de fins dos culo XIX at os anos 1930.
Seu principal fundador;no como herdeiro que se prossegue um movimento,
como critico.As manifestaes so ou terico-praticas ( William Morris,certas
tendncias do surrealismo), ou puramente tericas ( Ernst Bloch,Walter
Benjamin).
A pratica do desvio sobre a qual repousa o novo esprito utpico o oposto
do procedimento clssico...Trata-se de colocar a obra marxiana em um novo
espao,no mais no espao marxista clssico delimitado por Kautsky, Plekanov,
Lenine,Trotsky etc, mas no espao socialista-comunista desenhado pelos
grandes utopistas, Fora Tristan ,a Liga dos Comunistas, o movimento
comunista-materialista francs,etc..
Para Abensour, o novo esprito utpico est freqentemente ligado ao
romantismo revolucionrio...Proximos das vanguardas ou membros delas (noo
que alis recusam) , os partidrios do novo esprito utpico so bastantes
conscientes da crise da cultura moderna e do declnio da arte na sociedade
burguesa.
Ou,Sua pratica utopica,que responde igualmente vontade de substituir a arte
tradicional por uma atividade de tipo novo, um momento constitutivo de uma
pratica revolucionaria global,assim como a simulao da revoluo constitui um
momento essencial de sua projeo utpica.

Teorias da Autogesto:

Autogesto : lutas para alm do Capital

inconcebvel tornar
irreversvel a ordem social alternativa sem a plena participao dos produtores
associados na tomada de deciso em todos os nveis de controle poltico, cultural e
econmico ( I.Meszros).

POLITICAS E TEORIAS DA AUTOGESTO

1) Istvan Meszros:

O filosofo hngaro,procedente da chamada escola Lukacsiana de Budapeste, Istvan


Mszros um dos poucos pensadores socialistas contemporaneos a por na ordem do
dia a questo da estratgia socialista , como forma antagonica ao Capital,e no apenas a
sua forma historica atual, o sistema capitalista.Em duas obras fundamentais ,O Poder
da Ideologia (1989) e,sobretudo,em Para Alm do Capital(1996),Meszros tratou do
tema do socialismo na perspectiva de uma sociedade constituda por produtores
livremente associados,ou seja,da autogesto socialista.
Esta temtica ,vem de O Poder da Ideologia e foi retomada no livro de ensaios
intitulado O Desafio e o Fardo do Tempo Histrico( 2006).
Meszaros parte da idia da crise estrutural do capital como marca fundante desta
nova poca,que alguns chamam de globalizao.E,por varias razes,nos mostra que a
nica alternativa a barbarie do capital uma hegemonia radical socialista antagnica ao
Capital.
Esta hegemonia tem por objetivo a construo de um novo tipo de sociedade,que
Meszaros sempre chama em suas varias obras,de Livre associao dos produtores,ou
seja, o que na cultura socialista significa Autogesto Social.
As lutas dos trabalhadores nos sculos XIX e XX ,na perspectiva da autogesto social,
portam a radicalidade antagnica contra os trs eixos do ncleo central do metabolismo
social:o Capital,o Trabalho Assalariado e o Estado.
Na parte conclusiva deste nosso trabalho,vamos aprofundar esta questo: o carter e a
natureza das lutas autogestionarias como experincias radicais contra o Capital,ou
seja,para alm do capital.Sem dvidas,por isto,tenham sido massacradas a ferro e fogo
pelas personificaes historicas do Capital,isto , em ciclos distintos do capitalismo.
Estes ciclos de lutas autnomas e autogestionrias foi sistematizado por Joo
Bernardo,em sua obra intitulada A Economia dos Conflitos Sociais.Bernardo
qualifica tanto em termos de forma quanto de contedo estas lutas pela autogesto.Seu
trabalho mostra claramente o que so lutas antagnicas ao Capital,para alm do Capital.
Neste sentido,a obra de Meszaros fundamental .
Em relao autogesto,Meszaros j em O Poder da Ideologia (1989) , traou
elementos muito importantes,e tambm pondo questes sobre a transio socialista
que aprofundaria em Para Alm do Capital(1995).
No Poder da Ideologia h um ensaio em que analisa a viso otimista de Marx sobre
a Comuna de Paris, intitulado Revoluo Social e diviso do trabalho; aqui,Meszaros
afirma que Uma revoluo da classe trabalhadora como Marx via a Comuna- s em
uma escala histrica de longo prazo tambm ,ipso facto, uma revoluo contra o
prprio Estado.
Em seguida ,seguindo as definies de Marx ,em Guerra civil na Frana,Meszaros
define a natureza da tarefa: realizar a emancipao econmica do trabalho
mediante a forma politica finalmente descoberta, para que o trabalho livre e
associado assuma a forma de sociedades cooperativas unidas a fim de regulamentar a
produo nacional segundo um plano comum.
Noutro ensaio, Ideologia e Autonomia,Meszaros fala abertamente em autogesto:
...Os socialistas afirmam que a nica autoridade capacitada para a tarefa de
administrao dos seres humanos como os recursos vitais do progresso social e
econmico a autoridade autoconstituida dos produtores associados. A autogesto
por eles considerada no apenas praticamente vivel,mas tambm historicamente
necessria,tendo em vista as crescentes contradies internas do sistema reprodutivo
socialista e a crise de autoridade agora abertamente admitida at por seus defensores
mais agressivos.
Analisando o capitalismo em relao a fabrica e ao mercado,Meszaros busca suas
alternativas: A segunda alternativa ao sistema de despotismo prevalecente no local de
trabalho e anarquia na diviso do trabalho voltada para o mercado na sociedade em
geral ainda menos compatvel com o modo de controle capitalista que a primeira.Ela
exige a total eliminao do capital,tanto nas microestruturas em cujo interior as praticas
produtivas e distributivas da sociedade so realizadas,quanto do modo como esto
articuladas em um todo crescente.Sem isto, a AUTO-ATIVIDADE
CONSCIENTEMENTE PLANEJADA dos produtores associados no plano de seus
intercmbios abrangentes se tornaria impossvel,o que por sua vez prejudicaria
inevitavelmente seus esforos para instituir a AUTOGESTO AUTONOMA da
atividade produtiva do local de trabalho.
Prossegue Meszros: Esta radical eliminao do capital pelos individuos auto-
emancipados de sua presente dominao do metabolismo social O EXATO
CONTEUDO DO PROJETO SOCIALISTA (grifo nosso).Em oposio ao modo como
se exerce o dominio do capital sobre a sociedade, a concepo socialista vislumbra,nas
palavras de Marx, UM PLANO GERAL DE INDIVIDUOS LIVREMENTE
ASSOCIADOS... o que se quer dizer com a proposta de TRANSFORMAO DO
TRABALHO EM AUTO-ATIVIDADE.
Transformar esta viso em realidade presupe obstaculos imensos.Para
Meszaros,Permanece a questo,como antes,de como romper as cadeias do capital l
onde so forjadas,substituindo-as em um sentido positivo pelos LAOS
COOPERATIVOS conscientemente adotados que ligam e fortalecem a
todos,concedendo e determinando a cada um direitos e deveres- mediante os quais
possam ser implementadas as necessrias alteraes pelos produtores asssociados.
Mais adiante ,Meszaros volta a mesma questo; A concepo socialista da atividade
produtiva como no apenas um meio de vida,mas a principal necessidade da vida(...)
compatvel to somente com a forma de autoridade correspondente,isto ,com a
AUTORIDADE DIRETORA LIVREMENTE AUTOCONSTITUIDA dos prprios
produtores associados.
E,categoricamente,reafirma,a atualidade do projeto de autogesto,na perspectiva de
Marx:
Neste sentido,o programa marxiano de transferncia do controle do metabolismo social
para os produtores associados no perdeu nada de sua validade desde a poca de sua
formulao.Ao contrario,surgiu de novo,mais forte do que nunca,na agenda histrica de
nossos dias,visto que somente os produtores associados podem elaborar,por si
prprios,as modalidades praticas com as quais pode ser resolvida a dupla crise,hoje
omnipresente, da autoridade e do desenvolvimento.
Na mesma obra,no ensaio A constituio da solidariedade,Meszaros analisando o que
chama de a tragdia de Rosa Luxemburgo,j tinha dito o mesmo que em relao
Marx:
Assim sendo,em todas as questes de importncia vital para o movimento,Rosa
Luxemburgo apresentou um conjunto de idias coerente,profundamente dialtico
e,apesar das complexidades,exposto com notvel clareza; conjunto de idias que,com
relao s PERSPECTIVAS A LONGO PRAZO da transformao socialista vindoura,
ainda no foi superado.
Enfim,no por acaso,Meszaros ,de forma inspirada ,cita Rosa no inicio do capitulo
Ideologia e Emancipao:
O socialismo no pode ser e no ser inaugurado por decreto; no pode ser
estabelecido por qualquer governo,ainda que admiravelmente socialista.O socialismo
deve ser criado pelas massas, deve ser realizado por todo proletrio.Onde as cadeias do
capitalismo so forjadas,ai existem cadeias a ser rompidas.Somente isto socialismo, e
s assim ele pode nascer. As massas devem aprender a usar o poder usando o poder.
No h outro modo.
Alm,da obra de Meszaros,tentaremos construir o que podemos chamar de ideario da
autogesto,atravs de vrios pensadores que foram atrados pelo projeto socialista
autogestionario.Atraves de suas idias,poderemos construir as bases e/ou princpios de
um marco teorico da autogesto.
Em seguida,ento,mergulharemos nas experincias autogestionarias, ocorridas em
vrios paises.Nelas,atravs de suas formas Istvan Mszros,autor de obras como
Alm do Capital, um dos raros pensadores socialistas contemporaneos a por na
ordem do dia a questo da estratgia socialista ,de forma inovadora,ao toma-la como
forma antagonica ao Capital,e no apenas a sua forma historica atual, o sistema
capitalista.

Poltica da Autogesto

Vamos,ento,retomar algumas idias de Meszaros que apresentamos na introduo


deste trabalho,e,acrescentar outras que sero importantes para nossas concluses.
Ricardo Antunes sintetizou,de forma brilhante, as 3 teses mais originais do pensamento
de Meszaros:
1) Meszaros diferencia capital e capitalismo.O primeiro antecede ao capitalismo e
a ele tambm posterior.O capitalismo uma das formas de realizao do capital, a
forma dominante nos ltimos trs sculos.Mas,assim como existia capital antes do
capitalismo, h capital aps o capitalismo (o capital ps-capitalista), vigente na URSS
e demais paises do Leste Europeu,durante varias dcadas do sculo XX.Estes
paises,embora ps-capitalistas,foram incapazes de romper com o domnio do capital.
Para Meszaros, o sistema de metabolismo social do capital tem seu ncleo central
formado pelo trip capital, trabalho assalariado e Estado.So trs dimenses
fundamentais e interrelacionadas,sendo impossvel superar o capital sem a eliminao
do conjunto dos elementos que compreendem este sistema.
2) sendo um sistema que no tem limites para a sua expanso,o capital acaba por
tornar-se incontrolvel e essencialmente destrutivo.
3) qualquer tentativa de superar esse sistema de metabolismo social que se restrinja
esfera institucional e parlamentar esta fadada derrota.S um vasto movimento de
massas,radical e extraparlamentar,pode ser capaz de destruir o sistema de domnio
social do capital e sua lgica destrutiva.
Meszaros parte da idia da crise estrutural do capital como marca fundante desta
nova poca,que alguns chamam de globalizao.E,por varias razes,nos mostra que a
nica alternativa a barbarie do capital uma hegemonia radical socialista antagnica ao
Capital.
Esta hegemonia tem por objetivo a construo de um novo tipo de sociedade,que
Meszaros sempre chama em suas varias obras,de Livre associao dos produtores,ou
seja, o que na cultura socialista significa Autogesto Social.
Como vimos nas experincias histricas, as principais lutas dos trabalhadores nos
sculos XIX e XX ,na perspectiva da autogesto social, portam a radicalidade
antagnica contra os trs eixos do ncleo central do metabolismo social:o Capital,o
Trabalho Assalariado e o Estado.
Este carter e a natureza das lutas autogestionarias como experincias radicais contra o
Capital,ou seja,para Alm do Capital, explicam o porque tenham sido massacradas a
ferro e fogo pelas personificaes historicas do Capital, em ciclos distintos do
capitalismo.
Estes ciclos de lutas autnomas e autogestionrias foi sistematizado por Joo
Bernardo,em sua obra intitulada A Economia dos Conflitos Sociais.Bernardo
qualifica tanto em termos de forma quanto de contedo estas lutas pela autogesto.Seu
trabalho mostra claramente o que so lutas antagnicas ao Capital,para Alm do
Capital.
Neste sentido,aproximar as idias de Bernardo com a obra de Meszaros fundamental .
A relao da Autogesto com a Economia Solidria outro desafio deste ensaio. claro
que,a Ecosol porta princpios da autogesto ,contudo, como veremos,suas formas de luta
e de organizao no portam (pelo menos na conjuntura atual ) a radicalidade e o
antagonismo das lutas historicas da autogesto em relao ao Capital.Suas lutas so de
resistencia dentro do capitalismo.
As experincias historicas de lutas autogestionarias mostram que estas comeam nos
locais de trabalho,nas empresas heterogeridas,de submisso do trabalho assalariado ao
Capital,e vo assumindo formas radicais de organizao e programas em relao a
organizao capitalista do Trabalho,e , em relao ao Estado (forma poltica articulada
de expresso do Capital) .
J a ecosol tem suas experincias mais articuladas no territrio,nas cidades ,e,h um
segmento especial: o das Empresas recuperadas,mais prximo das experincias de
controle operrio.
As lutas pela autogesto ocorreram em conjunturas e ciclos pr ou mesmo
revolucionrios.por sua vez, com poucas excees,as experincias da Ecosol ocorrem
em conjunturas de baixa intensidade de lutas sociais, periodos de poucas convulses
sociais.
Em momento de crise das lutas nas empresas ,nos locais de trabalho, a Ecosol a nica
forma de expresso da autogesto na poca atual do Capital ? Define,em si mesma,uma
alternativa ao atual modo de produo e mesmo ao prprio metabolismo social do
Capital ? Que articulaes seriam necessrias entre as lutas e formas de organizao das
experincias da ecosol e as do movimento operrio nas empresas,atravs de formas
associadas de organizao (sees sindicais,comisses de fabrica,conselhos
operrios,etc.) ?
Seria,ento,a Ecosol um novo reformismo ? Ainda cabe nesta poca do Capital,a
distino entre reforma e revoluo ? Neste ponto, vamos recorrer as analises de
Mszaros,quando remarca que a linha de menor resistencia ao Capital est
definitivamente sepultada nesta nova poca.
Tambm, o velho militante da autogesto,Daniel Moth,ensaiou superar essa dicotomia:
autogesto geral (revoluo) e autogesto gota-a-gota (reforma).
Moth buscou articular dialeticamente a autogesto como meta estratgica de longo
prazo e a economia solidria, principal forma em curso da autogesto (mas,no a
nica),como movimento social e experimentao ?
Ou,ser que teremos ,nesta epoca do Capital, novos ciclos revolucionrios de lutas
autogestionarias,no sentido assinalado por Joo Bernardo ? O proprio Bernardo remarca
que na etapa atual do capitalismo,os prprios ciclos so alterados.
A nova caracterstica de crise estrutural do Capital no determinar ,tambm, nova
poca para as lutas sociais ? Tal qual,no se prev mais ciclos econmicos do Capital,
no seria esta a nova lgica das lutas envolvendo Capital x Trabalho,em suas formas de
existencia atualmente.
Poder a Ecosol desenvolver a radicalidade e o antagonismo ao Capital presentes nas
lutas histricas pela autogesto e pelo socialismo ? Ela porta de forma intrinsica este
potencial ?
So questes fundamentais que s a prpria historia dos trabalhadores poder
responder.

Ainda Meszros ,
Sobre a idia do fenecimento do Estado

Logo mais, veremos ,com Lefrebrev e Bernardo , que as lutas radicais contra o
Capital e com base na autogesto,igualitarismo ,coletivismo,e de carter ativo,
conduzem a um anatgonismo frente ao Estado. Por sua vez, Meszaros aprofunda esta
questo.
Meszros ,em seu ensaio sobre O Socialismo do Sculo XXI ,analisa a postura
de Marx frente Questo do Estado;
Marx era explicito em sua defesa inflexvel do Fenecimento do Estado com
todos os seus corolrios.Somete a conduo inexorvel realizao de uma sociedade
de igualdade substantiva pode fornecer o conteudo social exigido ao conceito de
democracia socialista.um conceito que no pode definir-se apenas em termos
polticos,porque deve ir alm da prpria poltica tal como herdada do passado.
Assim a igualdade substantiva tambm o principio orientador fundamental da
politica de transio em direo ordem social alternativa.Quer seja explicitamente
reconhecido ou no,a principal ao da poltica de transio colocar-se fora de ao
pela transferncia progressiva dos poderes de deciso aos produtores
associados,capacitando-os,desse modo, a se tornarem produtores LIVREMENTE
associados (grifo nosso).
Meszros,mais adiante aprofunda esta questo,atravs da idia de unificao das
esferas da reproduo material e da poltica. Em varias experincias histricas da
autogesto,vamos encontrar essa idia no Programa dos Conselhos Operrios.
Ao expor as condies para libertar o movimento socialista da camisa-de-fora
do parlamentarismo (democracia representativa),pondo a primeira condio como sendo
a participao real , Meszros retoma a questo do Estado:
H tambm uma outra dimenso,que concerne ao desafio muito mais amplo e
fundamentalmente to inevitvel a que se normalmente se refere na literatura socialista
como o fenecimento do Estado.As dificuldade aparentemente proibitivas desse projeto
marxiano vital se aplicam com a mesma relevncia e peso tanto a participao como
a auto-administrao plenamente autnoma de sua sociedade pelo produtores
livremente associados em todos os domnios,muito alm das restries mediadoras (por
algum tempo necessrias) do Estado poltico moderno quanto ao modo duradouro de
unificao das\esferas de reproduo material e poltica como alternativa radical visada
ao parlamentarismo.
Com efeito,prossegue Meszros, quando consideramos a tarefa histrica de
tornar real o fenecimento do Estado, a auto-administrao por meio da plena
participao e a superao permanentemente sustentvel do parlamentarismo por uma
forma positiva de deciso substantiva em oposio formal/jurdica politicamente
limitada so inseparveis.
Neste sentido,Meszros assinala as experincias dos ltimos 15 anos ocorridas na
Venezuela e na Bolvia,em que,as tentativas de grandes mudanas sociais foram
acompanhadas de uma critica substancial do sistema paralamentar e pelo
restabelecimento de assemblias constitucionais.Como veremos adiante, as experincias
dos Governos Alvado,no Peru; do Governo Torres,na Bolvia ,e,Allende ,no Chile,elm
das mais recentes de Chaves e Morales,trouxeram esta marca de critica radical
democracia representativa e parlamentar.
Na verdade,uma retomada contempornea da idia da Comuna Popular.Meszaros
tambm aborda esta idia to cara Grande revoluo Francesa :
Ao criticar deturpao tendenciosa das idias de Rosseau,Meszaros diz que
Contudo,a verdade do problema que, por um lado, o poder de deciso fundamental
no deveria jamais ser separado das massas populares.Ao mesmo tempo,por outro lado,
o cumprimento das funes administrativas e executivas especificas em todos os
domnios do processo socioreprodutivo pode ,com efeito,ser delegado por um
determinado perodo de tempo aos membros de dada comunidade,contanto que isso se
faa sob regras estabelecidas de modo autnomo,pelos produtores livremente
associados e por eles controladas em todos os estgios do processo substantivo de
deciso.
Meszaros situa a questo central;
Pois o desafio inevitvel nesse sentido requer a soluo de um problema
extremamente desnorteador:a saber,que o capital uma fora extraparlamentar por
excelencia de nossa ordem social e,contudo,ao mesmo tempo domina completamente
o parlamento de fora,embora pretenda ser simplesmente uma o parte dele,professando
operar em relao com as foras polticas alternativas do movimento da classe
trabalhadora de um modo plenamente igualitario.
Para o pensador hngaro,Em uma ordem socialista,o processo legislativo teria
de se fundir com o prprio processo de produo de tal modo que a necessria diviso
horizontal do trabalho fosse complementada de maneira apropriada por um sistema de
coordenao autodeterminada do trabalho,dos nveis locais ao global
essa relao est em agudo contraste com a perniciosa diviso vertical do
trabalho do capital,complementada pela separao de poderes em um siatema
poltico democratico alienado e inalteravelmente imposto sobre as massas
trabalhadoras.
Em outro momento,Meszros afirma categoricamente:
por isso que a reconstituio radical historicamente vivel da unidade
indissolvel da esfera poltica e de reproduo material em uma base permanente , e
permanece , a exigencia essencial do modo socialista de controle sociometablico.
Para Meszaros,ou a sociedade de produtores associados aprende a controlar a
riqueza alianada e reificada,com foras produtivas emergentes do trabalho social
autodeterminado de seus membros individuais- porm no mais isolados.
Seguindo Marx,Meszaros diz que as condies objetivas de trabalho no
aparecem subsumidas ao trabalhador; antes,este aparece subsunido a elas.Capital
emprega trabalho.mesmo essa relao em sua simplicidade uma personificao das
coisas e uma reificao das pessoas
O capital a fora extraparlamentar por execelencia cujo poder de controle
sociometabolico no pode de maneira alguma ser restringido pelo parlamento. por essa
razo que o nico modo de representao poltica compatvel com o modo de
funcionamento do capital aquele que efetivamente nega a possibilidade de contestar
seu poder material.
Assim, o nico desafio que poderia afetar de maneira sustentvel o poder do
capital seria aquele que tivesse simultaneamente o objetivo de assumir as funes
produtivas chave do sistema e adquirir o controle sobre os processo polticos de deciso
correspondentes em todas as esferas,em lugar de restringir-se de modo incorrigvel pela
limitao circular da ao poltica institucionalmente legitimada de legislao
parlamentar.
Faamos longa citao,em que Meszaros retoma o problema do fenecimento do
Estado,concluindo seus pensamento:
Nesse sentido,em vista da questo inevitvel que emerge do desafio das
determinaes sistmicas,com relao tanto reproduo socioeconomica quanto ao
Estado,a necessidade de uma transformao politica abrangente em estreita conjuno
com o exerccio significativo das funes produtivas vitais da sociedade sem o qual uma
mudana politica duradoura e de longo alcance inconcebvel torna-se inseparvel do
problema caracterizado como fenecimento do Estado.
Em seguida,Meszaros, define o contedo,sem duvidas ,de autogesto,desse
processo:
Por conseguinte,na tarefa histrica de realizao do fenecimento do Estado,a
auto-administrao pela plena participao e a superao permanentemente sustentvel
do parlamentarismo or uma forma positiva de deciso substantiva so inseparveis...
Essa uma preocupao vital,e no uma fidelidade romntica ao sonho
irrealizvel de Marx, como algumas pessoas a procuram desabonar e descartar.Na
verdade,o fenecimento do Estado no se refere a algo misterioso ou remoto, mas a um
processo perfeitamente tangvel que deve iniciar-se j em nosso prprio tempo
histrico.Isso significa em uma linguagem franca,a reaquisio progressiva dos poderes
alienados de deciso pelos indivduos sem eu empreendimento de mover-se em direo
a uma sociedade socialista genuna.
E,remarca que: Sem a reaquisio desses poderes (...) no possvel conceber
nem o novo modo de controle poltico da sociedade como um todo por seus
indivduos,nem tampouco a operao cotidiana no-conflitual/adversa
e,portanto,coesiva/planejvel das unidades produtivas e distributivas particulares pelos
produtores livremente associados e auto-administrados.
Enfim,que: A suplantao radical da conflitualidade/adeversidade e a
conseqente seguridade do fundamento material e objetivo do planejamento global
vivel (...)so sinnimos do fenecimento do Estado como um empreendimento
histrico continuo.
Meszros avana na definio do sujeito revolucionario altura dessa tarefa
histrica.
Obviamente, uma transformao dessa magnitude no pode realizar-se sem a
dedicao consciente de um movimento revolucionrio mais desafiadora tarefa
histrica,capaz de sustentar-se contra toda a adversidade,j que seu engajamento tende a
despertar a hostilidade feroz de todas as maiores foras do sistema do capital.
Vimos esta barbrie das foras do Capital contra os trabalhadores,por exemplo,na
Comuna de Paris e,quase um sculo depois,no Chile de Allende.
Por essa razo, o movimento em questo no pode ser simplesmente um partido
poltico orientado a fim de assegurar conceses parlamentares, que em via de regra
acabam por anular-se mais cedo ou mais tarde pelos interesses extraparlamentares
autovantajosos da ordem estabelecida vigente tambm no parlamento.O movimento
socialista no pode obter xito diante da hostilidade dessas foras a menos que seja
rearticulado como um movimento revolucionrio de massa conscientemente ativo em
todas as formas de luta social e poltica: local,nacional e global/internacional,
utilizando plenamente as oportunidades parlamentares quando disponveis, por mais
limitadas que possam ser,sobretudo sems e esquivar de asseverar as demandas
necessrias da desafiadora ao extraparlamentar.
Meszaros aponta elementos da estrategia: Assim,em relao a ambos os
dominios de reproduo material e poltico,a constituio de um movimento socialista
extraparlamentar de massa estrategicamente vivel em conjuno com as formas
tradicionais de organizaes polticas do trabalho, ora irremediavelmente
desencaminhadas, que precisam com urgncia da presso e do apoio radicalizantes de
tais foras extraparlamentares uma precondio vital pra a contraposio ao poder
extraparlamentar macio do capital.
Adiante,em no mesmo ensaio sobre O Socialismo no sculo XXI, Meszaros
afirma que O sujeito social capaz de regular o processo de trabalho com base no
tempo disponivel s pode ser a fora conscientemente combinada da multiplicidade
de indivduos sociais : os produtores livremente associados, como so habitualmente
denominados.
Para cumprimento destas tarefas de atualizao da proposta socialista,Meszaros
pe algumas questes de mtodo:
A constituio urgentemente necessria da alternativa radical ao modo de
produo do metabolismo social do capital no ocorrer sem um reexame critico do
passado. necessrio examinar o fracasso da esquerda histrica em concretizar as
expectativas otimistas expressas por Marx quando ele postulou,em 1847,a associao
sindical e o conseqente desenvolvimento poltico da classe trabalhadora paralelamente
ao desenvolvimento industrial de vrios paises capitalistas.
Desde que o Capital controla realmente todos os aspectos vitais do
metabolismo social, o capital capaz de definir separadamente a esfera constituda da
legitimao poltica como uma questo estritamente formal,excluindo a priori a
possibilidade de qualquer contestao legitima em sua esfera substantiva de operao
reprodutiva socioeconmica,para Meszros;
A reconstituio da unidade da esfera material reprodutiva e poltica a
caracterstica essencial definidora do modo socialista de controle do metabolismo
social.
E,neste sentido, a experincia histrica ps-capitalista um relato triste e
premonitrio,conclue Meszaros.Faltou a instituio de um controle democrtico
substantivo. Se,o capital nada sem o trabalho,e de sua explorao permanente;se a
relao entre capital trabalho ser no-seimetrica;isto quer dizer : enquanto o capital
depende absolutamente do trabalho,a dependncia do trabalho em relao ao capital
relativa,historicamente criada e historicamente supervel.
Esta relao entre capital e trabalho, conduz Meszaros a considerar a possibilidade
e apenas a possibilidade- de uma evoluo positiva dos acontecimentos que conduz a
uma importante mudana histrica na confrontao entre capital e trabalho,e traz
consigo a necessidade de buscar uma nova forma de afirmar os interesses vitais dos
produtores livremente associados.
E,portanto, do Socialismo com base na Autogesto Social !

2) G. GURVITCH : pioneiro da autogesto

A experincia sempre humana... o esforo do homem, do grupo,da sociedade para se


orientar neste mundo,se adaptar, para se modificarem eles-mesmos; a prxis coletiva e
individual, sobre a qual insistiu o jovem Marx. [Gurvitch]

Na Introduo de A Idia de direito Social [1932], Gurvitch analisa sua poca


nestes termos: Ns vivemos numa poca de transformaes profundas da vida
jurdica em seus fundamentos os mais ntimos.Fixados pela Declarao dos direitos e
do Cdigo,ainda mais ou menos estvel na segunda metade do sculo XIX, os velhos
quadros jurdicos se espedaaram e continuam a se desagregar a cada dia; os quadros
novos apontam ainda para o futuro ,do qual s percebemos os primeiros
esboos.Instituies inditas e imprevistas, incompreensveis para o pensamento
jurdico tradicional, surgem de todos os lados, com uma espontaneidade elementar e
sempre crescente.
Gurvitch tinha iniciado sua reflexo sobre o direto social, mesmo antes da
revoluo russa de 1917; viveu diretamente este processo revolucionrio. No final da
dcada de 20, veria o crack da economia dos EUA. E, os embries do Nazi-fascismo .
Na verdade,uma poca de transformaes profundas, que explicam sua analise do
quadro jurdico de ento.Como diria, um conflito entre o direito e a realidade.
Nas ultimas dcadas, o mundo contemporneo tambm tem vivido transformaes
profundas; e, tal qual o momento do qual nos fala Gurvitch, tambm tem visto os
primeiros esboos de novas praticas e idias.
No Brasil, particularmente, as experincias que se situam no campo chamado de
ECONOMIA SOLIDARIA POPULAR, esto nesta perspectiva de um novo mundo.
Gurvitch analisou profundamente um movimento que tem afinidades profundas com a
Economia Solidria,inclusive as vezes se confundem, a AUTOGESTO,com base nos
conselhos operrios surgidos aps a primeira Guerra. Em sua obra sociologia,Gurvitch
nos fornece muitos elementos para analise da Economia Solidria, como uma pratica
que se desenvolve no campo da autogesto social.
A Economia Solidria no Brasil ,aps as eleies de 2002,que levaram Lula a
Presidncia, est defronte a uma nova conjuntura, carregada de novas
possibilidades.Ao se tornar objeto e sujeito de Polticas Publicas,a nvel Federal,novas
questes so postas;entre elas,sem duvidas, as do campo jurdico, do direito social, do
direito publico.
Neste contexto, a obra de Gurvitch pode ser um estimulo fecundo reflexo sobre a
autogesto no Brasil. Podemos destacar alguns aspectos:

A idia do direito social;


A idia dos conselhos operrios e da fabrica constitucional;
A idia dos eltrons sociais,ou os microcosmos de sociabilidade;
A idia de uma sociedade do Coletivismo Pluralista Descentralizador
A idia,enfim, da multiplicidade dos tempos,sobretudo para o campo da hegemonia
cultural.

Vamos apenas traar alguns elementos sobres esses pontos que, sem dvidas,
mereceriam uma analise mais aprofundada.

Gurvitch: a sociologia da autogesto

Georges Gurvitch pode mesmo ser considerado o pioneiro da autogesto .Sua


prxis inclui momentos como ,em 1917 , a participao na formao de conselhos
operrios na revoluo russa; nos anos 60, tomou a iniciativa de criao da Revista
francesa Autogestion et Socialisme, conhecida como a Enciclopdia militante da
autogesto.
No Dictionnaire Critique du Marxisme [ verbete autogestion] , encontramos um
breve esboo das questes sobre a autogesto na Frana, pais onde Gurvitch se exilou.
Os acontecimentos do ano 1968 aceleraram as maturaes tericas e praticas e fizeram
da autogesto uma palavra de ordem e um slogan mobilisador.
A referencia aos acontecimentos de 1968 se impe para situar e compreender os
sucessos as vezes equivocados desta velha idia nova [Edmond Maire e Claude
Perrignon, Demain lautogestion , Paris, Seghers , 1976]. Antes desta data, apenas
alguns grupos militantes e intelectuais de obedincia muito diversa se interessaram
autogesto: anarquistas, conselhistas , marxistas antiestalinistas
,socialistas,trotskistas,etc; esta referencia comum fundada numa serie de recusas: do
burocratismo como modo de gesto do socialismo, do modelo bolchevique da
revoluo sovitica, das experincias social-democratas de mudana social. A
perspectiva autogestionaria se alimentou de uma certa idealizao das experincias
algeriana e yugoslava e um espao de reflexo foi criado passo a passo em que
confluam estas diferentes correntes de pensamento, cada uma delas conservando
todavia uma concepo especifica do referencial comum. Esta situao permitiu que
vrios debates fundamentais que atravessavam tradicionalmente o movimento operrio
por exemplo, a polemica entre marxistas e proudhonianos fossem retomadas e
enriquecidas de experincias e de conceitualizaes tericas novas {cf. Yvon Bourdet
,Pour lautogestion, Paris, Anthropos, reedio 1977].
O trabalho de reflexo engajado por estes grupos e divulgados por revistas como
Arguments, Socialisme ou Barbrie ,ou , Internationale situationiste, contriburam para
reatualizar a questo da autogesto operaria, a desenhar os contornos e explorar as
condies de uma autogesto econmica que poderia permitir a construo de um
socialismo democrtico. Podemos igualmente reter que em 1966, por iniciativa de
GEORGES GURVITCH um dos principais socilogos franceses que viveu a
experincia dos Conselhos operrios na Rssia em 1917, antes da chegada ao poder
dos bolcheviques -, foi criada a revista Autogestion ; sei eixo principal o
aprofundamento desta idia fora de uma construo socialista da sociedade fundada
na democracia operaria.
No por acaso, os primeiros Encontros/Seminrios/Conferencias internacionais sobre
autogesto , sero iniciativas de socilogos.Por exemplo, a I Conferencia Internacional
dos socilogos sobre a Autogesto e a Participao, ocorreu na cidade de Dubrovinik
na Yugoslavia, entre 13 e 17 de dezembro 1972,com a presena de socilogos de 30
paises e de vrios continentes.
Foi no final de 1965, por ocasio de um encontro realizado em Bruxelas, sob o titulo
Atualidade de Proudhon, que D.Guerin, J.Bancal e G.Gurvitch tiveram a idia de
uma revista especialmente consagrada autogesto. Gurvitch dizia,ento, que O
tempo trabalha pela autogesto operaria. A morte sbita de Gurvitch, o verdadeiro
iniciador do projeto da revista,em 12 dezembro de 1965, no retardou o aparecimento
do primeiro numero dos cadernos da Autogesto: dezembro de 1966. Este primeiro
numero foi dedicado a Gurvitch , trazendo extratos de sua obra em relao ao tema da
autogesto . A partir de 1970 a revista tomou o nome de Autogestion et Socialisme
e, at o inicio da dcada de 80, tinha publicado 43 nmeros. Em dezembro de 1986,
quando faria 20 anos, tinha sido planejado um numero especial de
comemorao,todavia, por razes financeiras a revista foi suspensa .
Dos vrios encontros internacionais,dos debates e reflexes,surgiria o CICRA
[Centro Internacional de Coordenao de Pesquisas sobre a Autogesto],com sede na
Escola Pratica de Altos Estudos,em Paris.

A Experincia Russa

No Colquio realizado em Bruxelas, para homenagear Proudhon, dias antes de sua


morte, Gurvitch deu um testemunho sobre sua experincia russa:

A Frana, portanto, no o nico pais em que os problemas do sindicalismo


revolucionrio foram postos. Penso em particular em um outro pais, de onde sou
originrio, a Rssia, e onde estes problemas tomaram forma desde 1905 com a criao
dos primeiros conselhos operrios. Eles surgiram uma segunda vez sob o governo
provisrio de Kerensky, e uma terceira vez sob o governo sovitico e eu posso
testemunhar da extraordinria penetrao das idias de Phoudhon, tanto entre os
intelectuais russos quanto nos sindicatos operrios russos. De minha parte, no foi na
Frana, mas na Rssia, que eu me tornei proudhoniano,e se eu vim para Frana, foi
para aprofundar meu conhecimento de Proudhon, Eu porto,portanto, um testemunho
pessoal direto: os primeiros soviets russos foram organizados pelos proudhonianos ,
proudhonianos que vinham dos elementos de esquerda do partido socialista
revolucionrio ou da ala esquerda da social-democracia russa. No foi em Marx que
eles tomaram a idia da revoluo pelos soviets de base, pois uma idias
essencialmente, exclusivamente proudhoniana. Como eu sou um dos organizadores
dos soviets russos de 1917 , posso falar com conhecimento de causa. Recordo-me dos
primeiros soviets organizados na fabrica de Poutilov antes da chegada ao poder dos
comunistas e testemunho que os seus organizadores estavam tomados, como aqueles
que se organizaram, das idias proudhonianas. A um ponto tal, que Lenine no pode
evitar esta influencia. Acreditem-me, Sorel no pode servir de intermedirio ! Foi uma
influencia proudhoniana direta que vinha dos distintos meios revolucionrios, russos.
Em seus primeiros discursos, Lenine tinha proclamado que uma planificao, que uma
revoluo social no so possveis que se fundadas em uma representao direta dos
operrios na base. E posso mesmo revelar um segredo: que o programa do partido
comunista , o segundo programa , absolutamente desaparecido vocs podem
procura-lo em toda a Rssia, procurar em todas as livrarias da Frana, a menos de t-lo
comprado em maio de 1917, vocs no vo encontra-lo este segundo programa do
qual no sei se todos os exemplares foram queimados ou eliminados, o que posso lhes
dizer, que ele reproduzia como pontos principais as prprias palavras de Lenine:
nenhuma revoluo, nenhuma planificao coletiva no possvel sem uma
participao direta dos soviets de base e de seus representantes. Vocs podem ver que
a idia da autogesto operaria est toda ai. O que no impediu Trostsky e Stalin, que
nesta poca eram os amigos ,de pressionar Lenine no curso da guerra contra os
guardas brancos e de conduzir suprimir temporariamente eu conheo muito bem
o texto os conselhos de base, sob pretexto que eles impediam uma produtividade
crescente de armamento. A rssia, notem bem, ficou neste paradoxo que seu
campesinato , sempre muito reservado frente ao governo comunista, que se beneficiou
da democracia econmica [ kolkhozes, sovkhoses ], ao passo que seu proletariado, que
domina oficialmente, no obteve ainda aquilo pelo qual tinha comeado a revoluo
social: a autogesto operaria.
Os grupamentos microscosmos

Como bem salientou Jean Duvignaud, no se trata de fazer de Gurvitch um pensador


dogmtico.Ele no optou por um modelo ideal de autogesto,mas, a descobriu e
designou como uma das possibilidades da presente conjuntura. Portanto, o aparelho
conceitual de Gurvitch no uma tabua de categorias reificadas,fixas. Portanto,
seria errado buscar na obra de Gurvitch uma idia da autogesto como o modelo ideal
da historia dos trabalhadores. Quando Gurvitch evoca a autogesto, significa uma das
possibilidades que aparecem ao humana.
Gurvicth trouxe da obra de Proudhon a oposio entre a sociedade e o Estado.
Insistia na capacidade espontnea da vida social para criar suas prprias formas
jurdicas e assumir suas prprias formas de regulao.O conceito de direito social
resulta desta oposio entre a criatividade da vida social e o aspecto parcial de todo e
qualquer tipo de Estado. O pluralismo jurdico defendido por Gurvitch resulta do
esforo para propiciar vida coletiva sua autonomia e sua fora libertadoras.O direito
social expresso de revestir diversos aspectos da vida social, enraizados na vida
real e capaz de fundar a vida de grupos que possam,em nome da prpria sociedade,
gerir seja a sociedade global,ou,ao menos, o setor que lhes concerne diretamente.
Gurvitch analisou sociologicamente as varias formas de grupamentos
microscopicos, e de solidariedades viventes, que chamava de eltrons sociais.
Estes grupamentos no podem se reduzir formas abstratas que possam ser
constitudas por decreto estatal. Os elementos componentes destes grupos
microscpicos, formam as atitudes coletivas continuas, realizam uma obra comum
que caracteriza uma sociabilidade ativa. Esta se expressa na capacidade destes
grupos em assumir tarefas que expressam liberdade coletiva, capazes de modificar as
formas de organizao e as estruturas globais.
Ressalta-se em Gurvitch, a importncia excepcional dos grupos ativos,
voluntrios,permanentes que em todos os nveis da sociedade e particularmente no
contexto da produo industrial,permitem ao individuo exercer coletivamente uma
ao de controle e de orientao.Estes eltrons sociais, estes grupos escapam
arbitrariedade e a cadaverizao administrativa ou estatal porque dispem de uma
capacidade infinita e indeterminada de liberdade criadora.
Estes grupos ativos podem surgir independentemente do nvel de conscincia ou de
maturidade de uma classe;podem surgir no importa onde,tudo cede frente
criatividade destes grupamentos microscpicos.
Para Gurvitch, nas sociedade modernas ,o papel dos conselhos/comits so
fundamentais para contrabalanar o poder crescente da burocracia estatal. Devem
chegar no apenas ao controle das fabricas e das industrias pelos prprios
trabalhadores,mas gesto efetiva das empresas por eles,e da a todos os escales da
economia.
No ps Guerra,anos 40, Gurvitch defendia a tese de socializar sem estatizar. Busca
em suas teses do Droit Social , fundamentar uma democracia social que pudesse
resolver os problemas deixados pela Guerra mundial: dado que o Direito Social um
direito de integrao, os direitos sociais proclamados pelas declaraes devem ser os
direitos de participao dos grupos e dos indivduos decorrendo de sua integrao nos
conjuntos sociais e garantindo o carter democrtico destes ltimos. Significa, o
direito dos produtores e dos consumidores uma participao efetiva em todos os
aspectos da vida, do trabalho,da segurana, da educao,da criao cultural, assim
como em todas as manifestaes possveis da autonomia jurdica, do controle
democrtico pelos prprios interessados, do auto-governo e da ao judiciria.
Portanto, Gurvitch prope uma definio moderna e original da democracia direta
com base no controle generalizado de todos os poderes pela base e fixando por
objetivo a participao generalizada de todos os membros da sociedade na vida social.
A autogesto, para Gurvitch , expresso de um droit social e instrumento possvel
para o exerccio da liberdade sempre em expanso.
A idia do direito social [1932] traz uma longa reflexo sobre o direito,o
pensamento jurdico e os pensadores sociais. Esta reflexo, Gurvitch a iniciou antes da
revoluo de 1917 e se enriqueceu com a experincia revolucionaria. Gurvitch no era
bolchevique, talvez, esquerdista avant la lettre defendia uma posio original situada
entre a social-democracia,o bolchevismo e o anarquismo libertrio. Seu pluralismo
social, seu recurso espontaneidade e diversidade dos grupos e das classes ,
procurando conciliar Marx e Proudhon, lhe opem rapidamente ao monolitismo do
sistema que se erguia na Rssia.

O Direito Social

Em sua Tese principal de Doutorado [Lide de droit social, ditions Sirey,Paris


1931] , Gurvitch traou uma definio exata da noo de droit social , a partir de um
vasto trabalho histrico que lhe conduziu de Grotius e Leibnitz Maurice
Hauriou.Nesta obra, as teses gurvitchianas sobre a autogesto surgem a partir de um
exame critico da Teoria do Direito Econmico de Proudhon.
Para Gurvitch o droit social o direito autnomo de comunho, no qual se
integra toda totalidade ativa,concreta e real encarnando um valor positivo , direito de
integrao,em oposio ao direito de subordinao e de coordenao [ordem do direito
individual],nicos reconhecidos pelos sistemas de individualismo jurdico e do
universalismo unilateral.
Todo direito de subordinao uma deformao e uma perverso do direito de
integrao social, do direito de comunho, de colaborao e de cooperao por
excelncia...Por exemplo, o direito de subordinao vontade comandante do patro
que regula a organizao interior de uma fabrica ou de uma empresa capitalista, no
que uma perverso do direito de integrao social [direito de comunho oriundo
diretamente do corpo social, do todo imanente da fabrica] pela ordem heterognea do
direito individual da propriedade, fundado na relao coordenadora do patro com
outros proprietrios.O direito de subordinao,caracterizando a ordem constitucional
de um Estado anti-democrtico [autocrtico,aristocrtico,ditatorial ou outro], no que
uma deformao do direito de integrao social de uma comunidade poltica,direito
integrativo de colaborao e de comunho,pervertido por sua submisso ordem do
direito individual, de um monarca ou de um grupo privilegiado no poder.
Gurvitch assinala a estrutura jurdica de toda uma serie de novas instituies ou
figuras de direito: convenes coletivas de trabalho, democracia industrial,federalismo
econmico,parlamentarismo social,primazia do direito internacional sobre o
nacional,Sociedade das naes e Organizao internacional do trabalho,socializao
sem estatizao, propriedade cooperativa e mais geralmente federalista.Enfim, um
pluralismo de ordem jurdica que s poderia ser construdo com o recurso a idia do
direito social.
O direito social tem uma tendncia claramente igualitria e se ope toda estrutura
hierrquica da Sociedade.Ele est ligado idia de uma totalidade e de uma ordem no
hierrquica.
Por sua vez, em sua Tese complementar do Doutorado, [ Le temps prsent et lide
du droit social,Paris,Vrin,1932], Gurvitch analisa o surgimento dos conselhos de
fabrica nos paises industrializados aps 1914. Nesta obra Gurvitch estuda o direito
constitucional nas empresas, abordando o que chamou de a empresa constitucional,
como resultado de um instrumento antigo dos trabalhadores, as convenes coletivas
de trabalho, desta vez associadas aos novos instrumentos surgidos na guerra,os
conselhos operrios.
Gurvitch estuda as varias formas histricas de conselhos:
- conselhos de fabrica organizados pelo Estado,por via legislativa ou administrativa;
- organizados por outorga patronal;
- organizados por conveno coletiva de trabalho, contendo em suas clausulas a
instituio do controle operrio.
Estes conselhos de controle e de gesto resultam da existncia do droit social e so os
nicos capazes ,em uma organizao pluralista da sociedade ,de garantir a liberdade
humana.

Os Conselhos Operrios

Em La Declaration des Droits Sociaux[New York,1944],Gurvitch buscou inserir na


ento sociedade efervescente do ps Guerra, uma sociedade favorvel realizao do
droit social. Nesta obra,Gurvitch aborda a questo da realizao concreta da
autogesto operaria.
Na viso de Gurvitch, toda sociedade um microcosmo de grupos particulares,o que
caracteriza a trama da vida social por um pluralismo fundamental de fato, que pode
servir ao bem e ao mal, liberdade e escravido.
Uma Declarao dos Droits Sociaux deveria completar a Declarao dos Droits
Politiques.Como o droit social um direito de integrao,os droits sociaux devem ser
os da participao dos grupos e dos indivduos decorrente de suas integraes na
sociedade e garantindo o seu carter democrtico: direito do produtor,do consumidor e
do homem participar e a colaborar em p de igualdade com o cidado;direito de
exercer o controle sobre todo o poder de qualquer forma.
Para Gurvitch, os conselhos de fabrica servem de base fabrica constitucional e
foram experimentados no perodo entre as duas guerras sob varias formas e em diversos
paises.Contudo, ser aps sua viagem a Yugoslavia, em 1957, e precisamente em uma
Conferencia sobre o tema dos Conselhos Operrios,que Gurvitch aborda mais
concretamente a questo da autogesto,suas formas e caminhos. Este texto desenvolve
as opes revolucionarias de Gurvitch no que diz respeito aos paises capitalistas e, sua
viso reformista frente a introduo da autogesto nos paises de economia socialista.A
Yugoslavia tinha comeado sua experincia autogestionria em 1950.
Gurvitch marca a disputa da poca: uma luta mortal entre a tecnocracia burocrtica e o
coletivismo pluralista fundado na democracia direta realizada na autogesto dos
trabalhadores. Em seguida analisa os conselhos operrios.
Sobre a competncia destes organismos operrios,Gurvitch marca 5 aspectos:
1. rgos de controle;
2. rgos de gesto;
3. rgos para aumento da produtividade;
4. rgo de repartio [salrios];
5. rgos de participao na planificao geral.

Gurvitch define sua concepo de Controle Social: o conjunto de modelos


culturais, smbolos sociais, significados espirituais coletivos, valores, idias e ideais,
assim como tambm, as aes e os processos diretamente relacionados com eles,
mediante os quais toda sociedade, todo grupo particular e todo membro individual
componente vencem as tenses e os conflitos interiores prprios e restabelecem um
equilbrio interno temporrio, o que lhes d a possibilidade de seguir adiante com
novos esforos de criao coletiva.

Gurvitch assinala mltiplas vias para autogesto :

1. os Conselhos Operrios surgem espontaneamente no fogo da prpria revoluo


social.
2. os Conselhos Operrios podem ser instaurados por um governo poltico sado da
revoluo social.;
3. os Conselhos Operrios podem se desenvolver por etapas, modificando a longo
prazo a organizao autocrtica e burocrtica da economia imposta pelo governo
poltico resultante de uma revoluo social de grande envergadura.Este processo
pode ser lento,ou ao contrario, mais acelerado a depender da estrutura concreta do
poder poltico e das conjunturas internas e externas.Assim, embrionrio na URSS,
na Thecoslovaquia, na Bulgria e na Romnia. mais pronunciado na Hungria e
sobretudo na Polnia.No tenho elementos suficientes de informao para falar
sobre a China.Mas o que me parece essencial, ressaltar as razes imperiosas que
me fazem crer em uma evoluo iminente para autogesto pelos conselhos operrios
e para a planificao descentralizada de todas as economias nacionalizadas e
planificadas, ps-revolucionarias....Ao assegurar a classe operaria que ela est no
poder, o regime coletivista se contradiz se ele aceita que ela permanece submissa, na
vida cotidiana das fabricas,das empresas e da execuo dos planos, as ordens no
controladas dos burocratas; ele arrisca a longo prazo de provocar, desorientao e
descontentamento nas massas operarias.

Neste ponto, Gurvitch foi proftico em relao a Polnia,onde em 1980 surgiria


um imenso movimento social chamado Solidarnosc, que marcaria o inicio do
fim das experincias do socialismo estatal do Leste europeu. Em seu primeiro
Congresso, Solidarnosc elaborou o Programa da Republica Autogestionaria da
Polnia, contendo elementos afins s idias da Sociedade do Coletivismo
Pluralista defendida por Gurvitch.

Cada uma das 3 vias para autogesto dos conselhos operrios tem seus defeitos
e suas qualidades...Estas vias se impem de acordo com as circunstancias, elas se
combinam ou,as vezes, se substituem umas as outras.
Em seguida,Gurvitch para cada uma das 3 vias, fornece exemplos concretos:

1.Quanto a primeira via, foi a Revoluo Russa que experimentou ,-


infelizmente por um perodo muito curto! o surgimento espontneo dos Conselhos
Operrios no fogo mesmo da revoluo social;
2. A segunda via, da outorga dos Conselhos Operrios por um governo poltico
estabilizado mas oriundo de uma revoluo a via Yugoslava presupe uma
conjuntura favorvel.
3.A terceira via para autogesto dos Conselhos Operrios a via lenta e
procedendo por etapas . a via da Hungria e da Polnia e,tambm, da URSS.

Gurvitch finaliza a Conferencia remarcando algumas diferenas:


Como perceberam, sou anti-reformista quando se trata da passagem do regime
capitalista ao regime coletivista;sou reformista quando se trata das modificaes que
podem e devem ocorrer nos sistemas de organizao de economia nacionalizada e
planificada ps-revolucionaria...Devemos sempre lembrar que no problema da
autogesto operaria tal qual se pe hoje, joga-se a sorte do coletivismo,pois o
nico meio de evitar a tecnocracia.
Por fim, Gurvitch fala de um Direito a autogesto a nvel local: A forma de
direito social mais geralmente divulgada... o direito do auto-governo local, do corpo de
administrao local descentralizado.O agrupamento de localidades,
comunas,municipalidades,conselhos de bairro e de municpio,etc,na medida em que eles
se governam,sob um regime de descentralizao administrativa. Este foi um dos
aspectos mais relevantes da experincia de autogesto social na Yugoslavia, iniciada
muitos anos aps a tese de Gurvitch.

A Sociedade do Coletivismo Pluralista

Vamos partir dao trabalho de Fridolin Saint-Simon ,que, em obra de 2005, sistematizou
as idias de Gurvitch em relao s sociedades histricas.A obra de fridolin intitula-se
claramente G.Gurvitch e a sociedade autogestionaria.No Capitulo VI,analisa os
diversos Exemplos de sociedades histricas.

Em A Multiplicidade dos Tempos Sociais,[1958], podemos encontrar uma


exposio sistemtica das concepes gurvitchianas sobre as condies de insero da
autogesto na vida social. Gurvitch explica as caractersticas da Sociedade planificada
segundo os princpios do Coletivismo Pluralista e descentralizador, relacionando com
uma Escala de Tempos que lhe particular. Esta idia j tinha sido abordada em ,La
Dclaration des Droits Sociaux[1944] e , em Dterminismes Sociaux et Liberte
Humaine [ 1955] e ser retomada em obras posteriores,a saber: na obra pstuma, Les
Cadres Sociaux de la Connaissance [1966]. Tentamos uma sntese das varias
exposies feitas por Gurvitch em relao a este tipo de sociedade,que sintetiza as suas
idias sobre a autogesto social.
Inicialmente nosso Autor esclarece que no se trata de maneira nenhuma dum tipo de
sociedade e duma estrutura idealizados; o coletivismo descentralizador sistematiza e
realiza as tendncias reais,observveis hoje em certas democracias populares,
principalmente na Yugoslavia. Este tipo de sociedade e de estrutura no foi ainda
experimentado at o momento histrico. Ouamos Gurvitch:
A estrutura da sociedade global que tentaremos esboar os traos, seria fundada em
uma busca de equilbrio entre democracia industrial e democracia poltica. Uma procura
de equilbrio equilbrio a estabelecer e restabelecer incessantemente -- entre o Estado
coletivista democratizado e a planificao econmica, fundada sobre a autogesto de
todos os trabalhadores e agricultores, uma vez que os tcnicos propriamente ditos esto
submetidos ao duplo controle deste Estado e duma organizao econmica que seria
independente e que os prprios operrios e agricultores dirigiriam.Foi o que Proudhon
pressentiu de forma genial ao articular a democracia econmica e a democracia
poltica nova. A economia seria planificada de baixo para cima de uma forma
descentralizada, iniciando pelos conselhos de controle e de gesto das empresas,
passando pelos conselhos de industria e os conselhos das regies econmicas,para
chegar um conselho econmico central. A propriedade dos meios de produo social
seria federalista,isto ,pertenceria a todos os conselhos mencionados, a partir de
conselhos de gesto de empresa e at o conselho econmico central e a todos os
interessados operrios e consumidores que participam em grupos ou individualmente. O
Estado, tambm descentralizado, seria equilibrado por esta organizao econmica
independente, gerido diretamente pelos interessados, e vice-versa.Os organismos
paritrios resolveriam os conflitos entre a organizao econmica e o Estado. evidente
que a democratizao do Estado coletivista presupe o retorno pelo menos a dois, ou a
vrios partidos polticos, reforados pela sua ligao com as novas divises da
democracia econmica,exigindo esta a instaurao dum federalismo econmico que
apresente pelo menos quatro aspectos diferentes para chegar participao e gesto
efetiva de todos os interessados:
1- um federalismo das oficinas, das fabricas ,das empresas industriais e seu
conjunto,com todas as organizaes agrcolas [cooperativas de produo
agricola, kolkozes ,zadrugas ,etc], elas prprias agrupadas em federaes;
2- um federalismo econmico, constitudo por regies e incluindo
simultaneamente a industria e a agricultura unidas;
3- um federalismo das planificaes por empresas e por localidades,
conduzindo a um federalismo unificante que atinge a sua finalidade num
plano econmico de conjunto do pas;
4- uma propriedade federal dos meios de produo industrial e agrcola, que
pertenceriam assim,ao mesmo tempo, totalidade da sociedade econmica, a
cada regio, a cada grupo particular de operrios e de agricultores e,
finalmente, a qualquer entidade que participe no processo econmico; os que
ficam parte,individualmente ou por grupos,desta propriedade coletiva,no
poderiam evidentemente dissolve-la, e o efeito no diria respeito seno aos
que,indivduos ou grupos,dela se tenham retirado.
Os rgos de autogesto operaria e camponesa comeam por conselhos de controle,
completados por conselhos de gesto e de produtividade,perante os quais so
responsveis os diretores das empresas,sempre suscetveis de serem despedidos por
estes conselhos.Em seguida, vm os conselhos econmicos regionais, responsveis
pela planificao e compostos pelos representantes dos conselhos de gesto e de
produtividade,assim como,em numero mais reduzido, os representantes dos diretores
tcnicos,dos consumidores e do governo poltico.Por fim, existe o Conselho econmico
central do pais, do qual fazem parte todos os conselhos regionais e cujas decises
cabem aos operrios e camponeses,delegados por conselhos de gesto e de
produtividade,que constituem a maioria,porque neste conselho econmico central,que
elabora a planificao econmica global,os representantes do governo poltico e dos
tcnicos s representam,em principio, a minoria.
Gurvitch sintetiza os principais traos desta Sociedade:

a) Equivalncia da organizao econmica planificada e do Estado poltico


coletivista, controlando-se e equilibrando-se reciprocamente,ambos fundados numa
democracia aperfeioada.
b) Desaparecimento das antigas classes sociais e aparecimento de novas classes
sociais, tendentes a corresponder s diversas funes e profisses e gozando de
compensaes de diferentes gneros, destinadas a afirmar e a manter a sua
igualdade.Existncia de dois ou vrios partidos polticos ligados com as novas
classes sociais,ou com as localidades e regies.
c) No aspecto micro-sociolgico, predomnio das comunidades e das comunhes
ativas, recuando tanto quanto possvel a importncia das massas.
Dos nveis em profundidade,vm primeiro as planificaes elaboradas pelos prprios
interessados e penetradas de idias e de valores criados; seguem-se os papeis sociais
inovadores e imprevistos, as organizaes econmicas e polticas abertas a todos, as
regulamentaes jurdicas, no estabelecidas segundo modelos ou regras, mas fazendo
sobretudo apelo ao direito espontneo existente.A base ecolgico-morfolgica,
profundamente transformada marcada pela descontinuidade, aproxima da frase de
Marx do 18 Brumario que citamos acima.

Bernardo nos fala das CONDIES de VITORIA destas lutas;


Os processos revolucionrios podem considerar-se vitoriosos na medida apenas em
que demonstram praticamente a possibilidade de um novo modo de produo,coletivista
e igualitrio. So eles que mant~em o comunismo como algo do presente, e no como
um vago projeto futuro.NESTA PERSPECTIVA TEM HAVIDO UM EFETIVO
PROGRESSO NO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES (grifo nosso).
E de que: A afirmao pratica da possibilidade de outras relaes sociais,solidrias e
igualitrias,tem-se clarificado de ciclo para ciclo,e os eu radical antagonismo com o
capital tem-se aprofundado numa multiplicidade de novas facetas.trata-se de um
indesmentivel progresso do movimento dos trabalhadores,nos entido da crescente
presena do comunismo como alternativa.
Entretanto,Bernardo poe uma condio fundamental para um avano mais radical do
movimento:
Mas as formas autnomas de luta cairo sempre em colapso enquanto a estrutura
orgnica da classe trabalhadora no tender a unificao.E assim, assimiladas pelo
capitalismo depois de degeneradas, essas arruinadas solidariedades so outros tantos
marcos de derrota.
d) por todos estes elementos assim como pelo desenvolvimento duma tcnica cada
vez mais aperfeioada, s tem uma importncia secundaria.
e) O sistema cognitivo , despolitiza-se ao mximo. Conhecimento, o ensino, a
moralidade [criadora , das virtudes,imperativa], a arte, o direito lutam para
estabelecer o seu predomnio na hierarquia das regulamentaes sociais.
f) Uma nova civilizao triunfa, em que o homem, os Ns, os grupos e as
estruturas conseguem retomar e dominar inteiramente as tcnicas mais avanadas e
os engenhos mais poderosos.A ameaa da tecnocracia est afastada, no somente
graas autogesto de todos os interessados e ao poder prprio a esta estrutura, mas
igualmente graas vitria do humanismo sobre o tecnicismo.Humanizao de
qualquer tcnica no limite do possvel, tal seria a vocao do coletivismo
descentralizador.

A multiplicidade dos tempos

No Brasil, em outro campo da sociologia,o dos estudos sobre os camponeses , a


influencia das idias de Gurvitch sobre a multiplicidade dos tempos foi importante.
Flora Susssekind [A Voz e a Srie,1998], nos fala da influencia de Gurvitch sobre
A.Candido:
Afirmando igualmente a multiplicidade dos tempos sociais, mas descartando o tempo
uniforme dos historiadores, medida geral de todos esses fenmenos,conforme
Braudel, est outra das possveis fontes de Antonio Candido ao tratar da
pluridemensionalidade temporal como problema fundamental para a historiografia
literria: o pensamento sociolgico de Georges Gurvitch.E se Braudel influencia
inevitvel, bastando lembrar,nesse sentido, que lecionou na USP de 1935 a 1938, no
difcil imaginar a repercusso de Gurvitch nos meios universitrios brasileiros, j nos
anos 50, quando se observa,por exemplo,ao longo de vrios nmeros da revista
Anhembi em 1959, a publicao de vrios nmeros de um ensaio sobre a sociologia de
Marx.
Flora Sussekind remarca a importncia das tematizao contrastada da
multiplicidade temporal,via historia e sociologia,via Braudel e Gurvitch foram ao que
parece contribuies fundamentais para a reflexo de Antonio Candido sobre as
temporalidades distintas no interior da historia cultural latino-americana. Flora refere-
se especialmente a obra Os Parceiros do Rio Bonito,Tese que Antonio Candido
defendeu em 1954, e que aborda entre outros aspectos , a vida cultural dos caipiras do
interior paulista.
M. Isaura Pereira Queiroz, estudiosa dos camponeses brasileiros,prestou homenagem
a Gurvitch com um ensaio sobre Le Paysan Brsilien Traditionnel et la Perception des
tendues.Neste ensaio a autora tambm se apia na obra de A Candido. Isaura Queiroz
cita , de Gurvitch, o ensaio Les variations des perceptions collectives des tendues,in
Cahiers internationaux de sociologie,vol. XXXVII,1964.
O ensaio de Isaura P.Queiroz foi publicado na obra coletiva em homenagem a
Gurvitch, Perspectives de la sociologie contemporaine[ PUF,Paris,1968].

Pelo fato que , a obra de Gurvitch no tem grande divulgao no Brasil, vamos adiantar
dados de sua biografia e sua bibliografia.

Vida e Obra:
Georges Gurvitch nasceu em 2 dezembro de 1894 em Novorossik [Rssia],onde seu
pai era diretor do banco russo-asitico. Faleceu no final de dezembro de 1965, na
Frana. Doutor em Direito pela Universidade de Petrogrado [1917]; foi profesor de
Direito Publico na Universidade de Petrogrado [1919-1920]. Professor associado
Universidade de Praga [1921-1924];professor de Filosofia Social [1924];Conferencista
no Instituto Slavonico de Paris [1925-1927]; Conferencista na Sorbone [1928-1932];
Cidado francs naturalizado,em 1928;Doutor em Letras pela Sorbone [1932];Professor
no College Svign, Paris [1932-1934];professor agregado de Sociologia na
Universidade de Bordeaux [1934-1935]; professor de Sociologia na Universidade de
Estrasburgo, Frana [1935].
Professor associado de Sociologia na New School for Social Research, New York
[1940-1943];conferencista na universidade de Columbia, New York [1942-
1943];professor em Rutgers University [seo francesa] em 1943; professor pesquisador
na Universidade de Harvard, seo Sociologia [1944-1945]; diretor do Instituto
Sociolgico Francs; diretor de estudos na cole des Hautes Etudes [1942].
Foi secretario geral do Instituto Internacional de Sociologia do Direito [Paris, 1931-
1940]; editor de Archives de Philosophie du Droit et de Sociologie Juridique [Paris,
1931-1940];Nos Estados Unidos foi Redator-chefe do Journal of Legal and Political
Sociology.
Em 1924 publica em Tubingen o seu primeiro livro, consagrado filosofia de Fichte.
Fixado na Frana, faz o doutorado em Letras com as suas duas teses A idia do
direito social [tese principal] e O tempo presente e a idia do direito social [tese
complementar].
Professor de sociologia na Universidade de Estrasburgo , de 1935 a 1948, foi a partir
desta data chamado Faculdade de Letras de Paris,onde ensinou sociologia at sua
morte ,em 1965. Foi diretor dos Cadernos internacionais de sociologia e da
Biblioteca de sociologia contempornea.
Alm da Frana e Estados Unidos, Gurvitch nos anos 50 lecionou na USP.

Obras :

- La Philosophie Sociale de Rousseau. 1917


-La Morale concrte de Fichte. 1925 -[ Fichtes System der konkreten Ethik. Tubingen,
1924].
-Les Tendances actuelles de la philosophie allemande.Paris,Vrin,1930
-Le temps prsent et lide du droit social.Paris,Vrin,1931
-Lide de droit social.Paris,Librairie du Recueil Siry,1932
-Lexperience juridique et la philosophie pluriel du droit.Paris,Ed. A. Pedone,1935
-Morale thorique et sciences des moeurs.Paris,Alcan,1937
-Essais de sociologie [les formes de sociabilit].Paris,Librairie du Recueil Sirey, 1938
-Elments de sociologie juridique.Paris,Aubier, 1940
- Sociology of Law . Philosophical Library. New York. 1942
-La dclaration des droits sociaux. New York, Ed. De la Maison Franaise, 1944
-La vocation actuelle de la sociologie,tomo 1.Paris,PUF,1950
-Determinismes sociaux et libert humaine.Paris,PUF,1954
-Le concept des classes sociales de Marx nous jours.Paris,CDU,1954
-Les fondateurs franais de la sociologie contemporaine: Saint-Simon, P.-J.
Proudhon.Paris,CDU,1955
-La vocation actuelle de la sociologie,tomo 2.Paris,PUF, 1957
-La multiplicit des temps sociaux.Paris,CDU, 1958
-La sociologie de Karl Marx.Paris,CDU,1961
-Dialectique et sociologie.Paris,Flamarion, 1962
-Proudhon,sa vie,son ouvre,avec un expos de sa philosophie.Paris,PUF, 1965
-Les cadres sociaux de la Connaissance. Paris, PUF, 1966 [livre posthume].

Autobiografia:

- Mon itinraire intellectuel ou lexclu de la horde. In Lettres nouvelles, 1958

Sobre Gurvitch:

- Gurvitch . Editions Seghers , 1969.


- Perspectives de la sociologie contemporaine. Hommage Georges Gurvitch.PUF,
Paris, 1968
- Bolzan de Morais, Jos Luis. A Idia de Direito Social: o plualismo jurdico de
G.Gurvitch.Livraria do Advogado, 1997
-Saint-Louis,Fridolin- Georges Gurvitch et la socit autogestionnaire.
LHartmann.Paris.2005

Bibliografia usada:

-Saint-Louis, Fridolin.-Georges Gurvitch et la socit


autogestionnaire.LHarmattan.Paris.2005
- Labica, Georges Bensussan, Grard. Dictionnaire critique du Marxisme.PUF,1982
- Autogestion, cahier n. 1.dcembre 1966
- Qui a peur de lautogestion ? Cause commune.1978/1.UGE - 10/18.
- Perspectives de la sociologie contemporaine, homage georges gurvitch. PUF,
1968
- Sussekind, Flora. A voz e a srie. Sette Letras.editora UFMG, 1998
- Autogestion et socialisme. Cahier n. 22/23 . jan.mars 1973
- Bourdet, Yvon. La Dlivrance de Promthe , pour une theorie politique de
lautogestion. ditions anthropos , paris, 1970.

3) As Constelaes da esquerda na Frana

A Frana um pais em que a autogesto se desenvolveu de forma


paradigmtica,mesmo no sendo de modo institucional,como na Yugoslavia.Todavia,
a experincia do socialismo francs,ou melhor dizendo,das esquerdas francesas torna-
se significativa para a cultura da autogesto.
Os historiadores das esquerda centram suas tipologias e classificaes em
agrupamentos como partidos,clubes,tendncias,correntes,etc.outros,com mais base
filosfica,como ,por exemplo,Michael Lowy dedica-se h muito tempo pesquisa de
Constelaes que se agrupam por afinidades eletivas.Desta forma,traou a viso de
mundo que chama de romantico-revolucionaria com suas varias formas de
existncia.
Neste sentido, no pais de Proudhon, fala-se em constelaes de esquerdas,pliades
de pensadores socialistas que podem ser postos em redes por afinidades, com suas
diferenas e seus pontos comuns.Por exemplo,no primeiro Governo Miterrand, falava-
se e escrevia-se muito sobre La DEUXIEME GAUCHE, em contraposio a
PREMIERE GAUCHE.Recentemente, M.Lowy e D.Bensaid nos apresentaram uma
TROISIEME GAUCHE.
Nos interessa muito buscar os pontos de contatos e de diferenas entre estas
constelaes de esquerda na Frana,
E relacion-las com o tema da autogesto.
Lowy e Bensaid,em ensaio sobre Auguste Blanqui*, afirmam: H na historia do
socialismo francs, uma CORRENTE SUBTERRANEA HERETICA MARGINAL E
ESQUECIDA. Constitui uma sensibilidade oculta entre as tendncias que
prevaleceram na esquerda do fim do sculo XIX at hoje tendncias representadas
pelos pares rivais e complementares Jaurs e Guesde, Blum e Cachin, Mollet e Thorez,
Mitterrand e Marchais.
Se olharmos a historia do socialismo sob o ngulo do corte entre uma Primeira e
uma Segunda esquerda uma centrista, estatista,anticapitalista, a outra mais social,
reformadora, democrtica seria uma Terceira esquerda mais radical,que ficou,por
muito tempo,fora do jogo poltico,parlamentar e ministerial.
Lowy e seu colega definem,ento,esta Terceira esquerda: No se trata de um
grupo ou de uma tendncia organizada,ainda menos de um partido: mais que tudo
uma CONSTELAO INTELECTUAL E POLITICA,em que as estrelas mais
visveis so AUGUSTE BLANQUI(1805-1881),GEORGES SOREL ( 1847-1922),
CHARLES PEGUY ( 1873-1914) e BERNARD LAZARE ( 1865-1903).E,Apesar de
sua evidente diversidade,heteregoneidade e particularidade,acreditamos que os quatro
autores citados compartilham, desigualmente, algumas caractersticas que permitem
considera-los um conjunto.
As caractersticas definidoras dessa Constelo so afins a corrente do
Romantismo revolucionrio,que Lowy tem pesquisado em suas principais
obras.Vejamos:

1- A rejeio do positivismo, do cienticismo e do determinismo mecnico;


2- A critica da idologia do progresso, de uma filosofia evolucionista da historia e de
sua temporalidade linear;
3- A percepo aguda dos danos provocados pela modernidade;
4- A oposio irreconcilivel ao capitalismo, considerado intrinsicamente injusto;
5- Uma sensibilidade rebeldee que conduz rejeio do reformismo, do cretinismo
parlamentar e dos arranjos da poltica comum;
6- Uma tendncia antiautoritaria e antiestatal;
7- Um estilo profetico,no sentido bblico do termo,que procede por meio de
previses condicionais e apelos ao a fim de evitar o perigo da catstrofe;
8- Uma viso mistica e intransigente profana e laica- da poltica como ao
inspirada pela f, pela paixo,pela moral em oposio ao horizonte emsquinho e
restrito da poltica cotidiana;
9- Uma concepo aberta, no linear,no cumulativa dos eventos,deixando lugar a
alternativas,bifurcaes e rupturas.

Adiante veremos como Daniel Moth trabalha a ideia da corrente da autogesto na


Frana.Como essa corrente autogestionaria se situa nestas contelaes ? Pensamos
que,frente Primeira esquerda ( centralista,estatista) contrape-se a Segunda
esquerda ( reformadora,social,democrtica) e que, podemos aproximar por algumas
afinidades a corrente autogestionaria de alguns pensadores desta constelao,por
exemplo,de Jean Jaurs , com sua idia da propriedade social.Da mesma forma,essa
corrente autogestionaria,enquanto viso de mundo,se aproxima na constelao da
terceira esquerda,de Sorel e Blanqui,na critica a temporalidade vazia do
industrialismo capitalista.
Como A.Blanqui j est integrado ao nosso ensaio,no que diz respeito ao que
chamamos da dialtica infernal que caracterizaria as lutas de emancipao dos
trabalhadores, vejamos,ento,algumas idias de Jaurs que iram compor o iderio da
autogesto,isto ,das lutas que os trabalhadores travaram no sculo XX pela
instaurao do socialismo autogestionario.

A segunda cmara autogestionaria


( de Jaurs Comuna de Gdansk )

Encontramos na experincia autogestionaria polonesa ,dos anos 80, o ultimo ciclo de


lutas pela autogesto, a idia da Republica Autogestionaria da Polnia ,traada no
Congresso de Solidarnosc. Essa idia j vinha da Revoluo Hngara de 1956*. Dizia
Mario Pedrosa que,quando buscamos,sempre encontramos referencias passadas aos
acontecimentos presentes,vale para as artes,campo predileto do velho Pedrosa,
quanto para a poltica.Desta forma,encontramos nas idias do conselhista da Bavria
Gustave Landauer ,germens da idia da Greve Ativa,que tanto marcou a experincia
polonesa de Gdansk,no inicio dos anos 80.Parece haver,um tipo de Ontologia Social
no antagonismo capital x trabalho, que ,nas formas de luta e organizao dos
trabalhadores ,sempre vem tona.Isto desde a Comuna de Paris at a Comuna de
Gdansk,um arco temporal de mais de um sculo.
Vejamos as idias de Jean Jaurs sobre a Propriedade Social.
A obra de P.Chanial ,em um conjunto de ensaios sobre a critica melanclica da
esquerda, centra-se nas idias de Jaurs. Os organizadores deste livro *, analisando a
historia do socialismo francs,remarcam a persistncia das tenses entre os
socialismos por baixo e por cima.Propostas de formulas medianas.O caso de Jaurs
pode ser examinado sob esse ngulo,como inidcam os textos sobre a propriedade
social,escolhidos e apresentados por P.Chanial.
Inicialmente,Chanial afirma que O projeto coletivista de Jaurs no se limita a um
socialismo de Estado, o que j traa uma afinidade com a autogesto social.
Se o socialismo consiste em estender todas as industrias privadas o regime das
industrias Estatais e a administrao do Estado, eu serei adversrio do
socialismo,afirma Jaurs,em 1893.
Chanial assinala na critica jauresiana,uma critica que seria tempos depois,dirigida ao
sistema sovitico estatal;Deixar aos homens de Estado e aos governantes ,j
senhores da nao armada e da diplomacia nacional, a direo efetiva do trabalho
nacional,lhes dar o direito de nomear em todas as funes diretrizes do trabalho (...)
seria dar queles homens uma potencia frente a qual os dspotas da Asia nada seriam.
E,que,Jaurs nunca cessou de precisar que esta propriedade,estes bens apropriados
coletivamente,a Nao deve delega-los,sob condies determinadas,aos indivduos ou
aos grupos de indivduos.E,mais; a propriedade soberana que o coletivismo atribui
nao no exclui de modo nenhum a propriedade dos indivduos ou das associaes
particulares.
Como articular propriedade social com propriedade individual,eis uma questo
central para democracia socialista.
Para jaurs,o dever do Estado assegurar a todo cidado a copropriedade dos meios
de trabalho tornados propriedade coletiva(Estudos Socialistas,1901).
Como articular estes dois aspectos da questo do trabalho associado? De um lado,a
propriedade social e,de outro, a propriedade particular-individual. Eis a idia de
Jaurs:

Se supomos realizado o comunismo democrtico,se representa-se o conjunto das


industrias das uma cooperao universal, cada um dos cidados, cada um dos
produtores ser investido de um direito sobre o conjunto da propriedade social.Mas,em
qualquer ponto do campo representativo onde ele exerce praticamente esse
direito,somente o exercer sob a lei da cooperao e da democracia,que torna o acordo
das vontades a condio da ao,funda e limita o direito de cada vontade individual.
Chanial sintetiza esse ponto: A antinomia do coletivismo e do individualismo,Jaurs
sugere assim a sua superao pela democracia.O coletivismo de Jaurs repousa com
efeito por uma dupla dimenso da propriedade social.
Eis o exemplo que Jaurs nos oferta: A mina torna-se propriedade da Nao,ser
duplamente propriedade dos mineiros.Primeiro,porque o esforo dispensado por cada
um retornar individualmente `a cada um (mais apropriao do valor,do produto do
trabalho ), em seguida, porque cada um ter sua parte no governo de minha
mina(mais apropriao do poder). por essa dupla articulao que a propriedade
social realiza o direito individual; substituindo a justia espoliao; a Republica
industrial,onde, todos tm sua parte no governo economico ao absolutismo,onde
alguns governam despoticamente.(ibid).
A.Robinet (Jaurs-Seghers) diz que ,para Jaurs:O coletivismo a formula
concreta do scoialismo.Coletivismo e socialismo se unem como o corpo a alma,como
o universo a deus.A nao deve substituir aos particulares para gesto e posse dos bens
de produo e ela deve zelar por sua harmoniosa distribuio.Em termos econmicos,o
coletivismo realiza a passagem zero do papel do capital;ele anula a mais-valia.Dai,o
trabalho fornecido estimado sem eu valor inteiro;toa a quantidade de trabalho
fornecido pelo trabalhador voltar para ele;so haver um proprietrio : a nao.
E que: O coletivismo no regulamentao mas liberdade;a liberdade ser a arma
mesmo do esprito de fogo da ordem socialista.O coletivismo o contrario do
funcionarismo: o livre jogo das aptides e das vocaes se desenvolver,permitindo
cada um empreender,no domnio do trabalho e do lazer,da produo e da esttica,o
exame de suas faculdades e as provas de suas contribuies.
Para Chanial, sobre esta dimenso poltica da propriedade coletiva que deve-se
insistir.A propriedade social para jaurs,no apenas uma propriedade comum,posta
em comum e,a este titulo,propriedade dos sem-propriedade, mas sobretudo uma
propriedade cvica e,assim,o paralelo poder dos sem poder.Pela propriedade social
se realiza tanto o ideal de justia social quanto o de imperativo da liberdade.
Em termos contemporneos,afirma Chanial: propriedade cvica, a propriedade
social significa no a extenso do poder do Estado,mas sobretudo a do domnio ou
do espao pblico. Ela ,deste modo,indissocivel da reivindicao de uma cidadania
social. Assim, ela supe uma extenso da democracia, uma incluso da esfera
econmica no espao poltico.Propriedad comum,a propriedade social constitui uma
propriedade cvica. No se tornando patro que o Estado realizar o socialismo,mas
preparando a abolio completa do patronato(...)sob todas as formas,sob a forma
publica como a forma privada.(ibid).
Sem duvidas, Jaurs uma das fontes precursoras da autogesto socialista !
Nas palavras de Chanial ,eis como Jaurs se aproxima da idia autogestionaria das
Duas Cmaras:
recusando tanto o estatismo, a concepo autoritaria e ditatorial ( ou
funcionarista,como ele a chama ento) de Louis Blanc, quanto o egoismo
corporativo, a concepo anrquica de Proudhon,Jaurs prev em seu Esboo
provisrio da organizao industrial que cada grupo industrial
(extrativismo,transportes,metalurgia,fiao,pintura) ter seu conselho eleito ao
sufrgio universal e em cada uma das industrias destes ramos os principais
responsaveis sero igualmente eleitos. Um Conselho nacional, agrupando o
conjunto,compreender os delegados eleitos das diferentes corporaes e os
representantes diretos da nao,guardies da soberania nacional contra as
pretenses egoistas das corporaes.

4) A experiencia da corrente autogestionaria francesa


( Daniel Mothe)

No que diz respeito as transformaes sociais,isto ,as revolues,o campo


socialista sempre foi marcado pela discusso sobre a sua estratgia,principalmente,como
articular dialeticamente Reforma e Revoluo,titulo de uma obra fundamental de
Rosa Luxemburgo.No campo da autogesto,esta questo tem suas particularidades,sua
prpria historia.
Nestes sentido,vamos buscar este debate tal qual se deu na Europa,especialmente
na Frana. rara a obra sobre Economia Solidria ou sobre Autogesto, que no se
debruce sobre esta questo: a autogesto possvel apenas numa sociedade socialista ou
pode existir dentro do capitalismo;e, se pode,que sentido tem ,para qual horizonte deve
apontar ?
Paul Singer,em seu Utopia Militante ps esta questo em forma do que chamou
de implantes de socialismo.
Eis um dos principais dilemas da autogesto:
- trabalharmos a experimentao autogestionaria do dia-a-dia,
- ou construirmos a barca de Ne,aguardando o Grande Dia,a Revoluo ?
Reforma ou Revoluo ,diriam outr@s; Tudo ou nada ? Nas palavras de Mothe:
diluvio ou gota-a-gota ?
Entre as varias experiencias histricas da autogesto,podemos assinalar duas que
so paradigmticas:
1) a da Yugoslavia,por seu carter institucional;e,
2) a da Frana,por seu carter de movimento (no entendemos que o primeiro
Governo Miterrand signifique uma chegada ao poder da chamada corrente
autogestionaria).
A experincia Yugoslava ,no fosse o grau de dilaceramento deste pais ocorrido
no inicio da dcada de 90, sem duvidas seria o principal campo de pesquisas para
aprofundamento de um serie de aspectos do socialismo autogestionario.
Penso,sobretudo,no campo da formao e da aprendizagem dos produtores
associados,pois este regime durou algumas dcadas,ao contrario de outras experincias
que foram de curta durao.Albert Meister ,pesquisador profundo desta
experiencia,destacou a importncia do trabalho da formao realizado nos conselhos
operrios neste pais.
Tambm,no campo da Pesquisa houve um trabalho.Meister ,em sua
pesquisa,iniciada em 1959*,um convenio realizado entre a Ecole Pratique ds Hautes
etudes-Paris e o Institut ds Sciences Sociales da Universidade de Belgrado,Meister
dizia que:
Diversas instituies de pesquisa notadamente em Zagreb,em Ljubljana e em
Belgrado foram criadas para responder as necessidades de uma observao continua
do funcionamento dos organismos da autogesto.
Como experincia do Leste europeu,junto com as tentativas de autogesto na
Hungria,sobretudo em 1956,a Yugoslavia deve ter marcado o pensamento de Meszros.
Por sua parte , a experincia francesa nos interessa de perto,seja por termos vivido
uma parte dela (estagio de 3 anos na CFDT),seja por ter aprofundado teoricamente a
poltica da autogesto.De certa forma,neste pais houve uma convergncia de idias
oriundas de vrios paises e experiencias,por seus intelectuais e militantes terem fundado
instituies de pesquisa ,debates e estudos sobre a autogesto.O exemplo principal,foi o
CRIDA* e sua Revista Autogestion et Socialisme.
Esse processo chegou a constituir uma Corrente Autogestionaria,na Frana.
Esta experincia francesa,claro,marcou profundamente a obra de Moth e de
Lefebrev.
Estes 3 pensadores,mais Joo Bernardo, tm grande influencia neste
trabalho.Bernardo acompanhou e sistematizou ,alm da prpria experincia de Portugal
dos cravos,as outras lutas por autonomia e autogesto.
Daniel Moth,um dos mais fecundos militantes, e terico da autogesto na Frana,
reconstruiu a historia da corrente autogestionaria francesa.
Em um capitulo pequeno de sua obra lautogestion goutte goutte (1980),
significativamente intitulado A estratgia do tudo ou nada, Mothe afirma:
Pensamos que a corrente autogestionaria apareceu entre os anos 60 e 70,
buscando uma resposta original ao problema da democracia e da centralizao.Mas essa
corrente no conseguiu suficientemente se separar de suas origens marxistas para
oferecer uma resposta pertinente.
Faamos um breve parntesis para contextualizar o debate na Frana.
J no inicio dos anos 60,como vimos com a iniciativa de G.Gurvitch ,foi fundada
a Revista Autogestion et Socialisme (1966),.Neste mesmo processo, cabem a
realizao de duas Conferencias famosas:
a. A primeira Conferencia internacional dos sociologos sobre a
autogesto e a participao, realizada em DUBROVINIK
Yugoslvia- em dezembro de 1972.
b. A segunda Conferencia internacional sobre a autogesto, realizada
em Paris ,em setembro de 1978.
Esta segunda foi decorrncia da primeira.Na Yugoslvia, houve a deciso de
fundao de um centro internacional da autogesto, tarefa que coube ao Grupo de
Estudos da Autogesto de Paris. Este Centro foi fundado em novembro de 1976,com
o nome de CICRA ( centre international de coordination ds recherches sur
lautogestion),agregado ao CNRS de Paris. Tendo toda documentao arquivada
na Biblioteca da Maison ds Sciences de lHomme.
O que nos interessa,particularmente,em relao corrente autogesto da Frana,
que Yvon Bourdet,sem duvidas o principal animador destas Conferencias,junto com o
Yugoslavo Rudi Supek, escreveu ensaio para Revista Autogestion et Socialisme (
cahier n.22-23,Jan-Mars 1973),pondo em pauta a seguinte questo:
Autogesto, objetivo longnquo ou meio imediato da revoluo?
E,afirma: devemos diferenciar os que vm a autogesto enquanto objetivo final, dos
que a entendem e praticam imediatamente como meio eficaz das lutas atuais
Este dilema ser enfrentado por Daniel Mothe.
Bourdet,em seu relatrio ,na Revista autogestion et socialisme. (n.41-42,juin-sept.
1978), da 2 Conferencia analisa a questo:
primeira vista, os reformistas das condies de trabalho nas fabricas ,no parecem
poder dialogar utilmente com os revolucionarios da autogesto maximalista que
rejeitam tanto o capitalismo privado quanto o modo de produo estatal dos paises do
Leste em favor de uma utopia que, tudo indica, recusa todo paradigma.
Todavia,uma compreenso mais modesta ( e mais sociolgica) do que ocorre atualmente
nas sociedades industriais em evoluoo permite uma relativizaoo dos posntos de
vista que conduz as interrogaes comuns.
Os que fazem profisso de revolucionarios no deixam de defender que a
participaoo e a democratizaoo das relaes de trabalho so os meios de tornar
tolervel a exploraoo capitalista e portanto de a perpetuar.
Mas,podemos igualmente dizer,no sentido inverso, (sem mais,nem menos meios de
verificao) que os operrios graas participao,tomam puco pouco
consciencia de suas capacidades auto-organizativas e correlativamente,da
inutilidade dos atroes e mais geralmente das estruturas hierrquicas do Saber-
Poder de todas as minorias dirigentes.
Pode-se saber para quem trabalha a velha toupeira e essa tomada de conscincia
auto-organizacional no constituie,pouco pouco,uma acumulao primitiva que
permitir uma mutao radical? . (grifo nosso).
E,conclue Bourdet: A autogesto generalizada supe um longo processo de
transformao dos instrumentos,isto ,de todas as condies de trabalho E E
NESTE SENTIDO que o revolucionarismo radical no pode ser separado de um
reformismo ilimitado.
Emfim,Bourdet segue a linha de Rosa Luxemburgo,para quem:
os trabalhadores devem aprender a usar o poder usando o poder.No h outro modo.

A Autogesto Homeoptica
Voltando a Daniel Moth,um velho militante da autogesto,desde sua participao
com Castoriadis no grupo Socialisme et Barbrie, que tentou superar essa dialetica
diabolica atravs da idia da autogesto gota-a-gota. Refletia sobre a ideia dominante
nas esquerdas de que a autogesto algo apenas para o Grande Dia ,para a Revoluo ,
a Grande Alternativa. Moth contrapunha a esta viso , a idia das experincias
realizadas no cotidiano, a Autogesto Gota-a-Gota.
Seria uma espcie de dialtica luxemburgiana de reforma e revoluo? Muitos a
dialetizam diabolicamente como reforma OU revoluo? Tudo ou nada ? Ao que a
prpria Rosa respondia : quem quer tudo ou nada,termina com nada!
As experincias recentes de economia popular e solidria,em toda sua diversidade
e extenso geogrfica, parece-nos trazer `a tona a dialtica apontada por Mothe: a
autogesto uma ideal e tambm uma estratgia e,como tal,realiza-se engravidando os
processos histricos atravs de experimentaes , articulando as experincias
cotidianas com os sonhos e as utopias.Voltaremos as idias de Moth.
A reflexo de Paul Singer,a partir de nossa experincia brasileira, retoma ou vai
no mesmo sentido,quando nos fala de implantes de socialismo ou de utopia
militante.A autogesto trabalha em torno do Real,isto ,de sua totalidade enquanto
realidade e possibilidades. Desta forma,poderemos aborda-la numa dialetica no
diabolica.

5- THOMAS COUTROT

T.Coutrot , que tem acompanhado a experiencia brasileira de economia


solidria,desde os tempos do Governo Olvio Dutra no RS (1999-2002), em sua obra
Democratie contre Capitalisme (2005) aponta uma estratgia similar. Retoma o titulo
da obra de P.Rosanvallon (A poca da autogesto) dando-lhe um novo sentido : A
nova poca da autogesto.
Estas idias sobre a autogesto nos remetem a obra de Miguel Abensour sobre O
novo Esprito Utpico.Enfim, uma nova poca da autogesto em correspondencia um
novo esprito utpico: renascimento da autogesto e da utopia.
muito interessante que na Frana,pais como j vimos, em que a autogesto se
tornou quase um senso comum, um militante marxista retome a questo,desta
vez,relacionando-a com os debates que esto se processando sobretudo no Brasil.
Em finais de 2004,um grupo de sindicalistas,militantes e outros setores da
esquerda francesa se reuniu sob o nostlgico titulo de A autogesto: o que sobrou de
nossos amores, retomando uma musica clssica e popular francesa dos anos 40-50 (
que reste-y-til de nous amours ?,cantada por Charles Trenet) , para tentar entender o
por que do abandono por eles mesmos da autogesto, no momento em que ela
renasce em varias experincias em curso em diversos paises.
Mas,novos pensadores esto abordando estas questes.Por exemplo,
parodiando a obra de Pierre Rosavalon ( L age de l Autogestion, 1976) ,
Thomas Coutrot em obra recente traz um capitulo intitulado A Nova Idade da
Autogesto.
Mas, o principal capitulo em que aborda uma estratgia autogestionaria atual
,intitula-se A Democracia Econmica Participativa.
A renovao da democracia s poder ocorrer com um movimento de
responsabilizao dos indivduos em suas atividades cotidianas de trabalho: os cidados
devem poder tomar as decises elementares frente produo, as condies de trabalho
e de remunerao,o emprego,as relaes de trabalho,etc.A autogesto o horizonte
deste movimento de responsabilizao fundamental ter um horizonte...A renovao
sindical,a ao de negociao coletiva sobre uma base de relao de foras, o
desenvolvimento de novos direitos e de alianas sociais,so objetivos mais imediatos e
operacionais para avanar.Mas, a perspectiva autogestionaria pode ser o horizonte
destas lutas. Com a condio de superar o nvel da empresa,para oferecer democracia
poltica um projeto credvel de controle do desenvolvimento social em seu conjunto.
A questo de saber qual modelo econmico e social global pode dar corpo este
triangulo pos-liberal que religaria socialismo autogestionario, liberdades polticas e
democracia substancial.
Para Coutrot, esboa-se uma possvel estratgia de transformao social global
com base em uma complementariedade dos papeis de diversos atores: poderes pblicos
nacionais e internacionais;ONGs de vrios tipos; assalariados,movimento
altermundialista;etc.Esta estratgia est em curso nas orientaes atuais do movimento
social mundial e pode ter uma grande adeso popular. Vista isoladamente , ela no
questiona a fundo o capitalismo , mais um tipo de restrio aos limites do capital.Ela
requer uma forte mobilizao popular,uma onda de politizao e de constestao social
ainda mais forte que a de 1968.A hiptese que,as atuais manifestaes
altermundialistas so apenas as premissas deste movimento.
Esta perspectiva tem originalidades em relao as estratgias clssicas socialistas
e comunistas . Nenhuma fora social especifica detm a hegemonia: assalariados e
organizaes tm um papel decisivo,mas lado a lado e igualmente com os movimentos
campons, ecolgico,feministas, culturais, unidos em uma aliana com base em
consensos. Ela porta uma dimenso mundial.
Para T.Coutrot , Nesta guerra de posio, a economia solidria e o controle
cidado combinam suas conquistas para limitar o poder do capital.Poderiam,desta
forma, por suas aes complementares, fazer emergir uma alternativa hegemonia
capitalista no campo econmico. Trata-se de uma alternativa anti-capitalista: no se
trata de reformar este ou aquele ponto. Trata-se de germinar hoje um modo alternativo
de funcionamento da economia e da sociedade.
O socialismo autogestionario significa,ento,para T.Coutrot, uma democracia
econmica socialista caracterizada pela autogesto das empresas, pela propriedade
social,pela politizao dos mercados e pela socializao das decises de
investimento.Podemos chamar de democracia econmica participativa.
Na esfera econmica dois movimentos so decisivos: as resistncias contra as
empresas multinacionais e seus laos polticos; a emergncia de uma economia
solidria,exoressando aspirao popular pela autogesto.
Frente questo da propriedade privada do capital ,no h outra resposta para o
movimento social que aprofundar as exigncias de democracia em todos os domnios,e
incluindo a economia. Apropriao social dos principais meios de produo e definio
democrtica das prioridades de investimento; um projeto socialista.
mas,diz Coutrot, a gramtica socialista-comunista est em profunda crise e no
seguro que ser reapropriada pelos movimentos sociais no futuro.De toda forma, o
projeto socialista deve ser profundamente renovado luz da experincia das lutas atuais
e passadas.
Coutrot analisa a obra do Secretario da Ecosol no Governo Lula,Paul Singer :
nos prope uma reflexo fundada sobre a historia do movimento operrio
internacional e dos avanos da economia solidria no Brasil e na Amrica Latina.Sua
concepo de uma transio para economia solidria me parece particularmente
pertinente :
A conquista de uma economia socialista ser provavelmente o fruto do avano
do movimento operrio e socialista em varias frentes:
1. a extenso da democracia do domnio poltico ao
domnio econmico e social;
2. a participao da populao organizada na
elaborao denoramentos pblicos e na gesto de
equipamentos esoclares ou sanitrios;
3. a conquista de governos locais e regionais pelas
coalizes de esquerda que executem imediatamente
politicas socialistas,notadamente,de apoio e de
incentivo criao de empresas autogeridas;
4. novos direitos para a representao operaria nos
locais de trabalho,como,por exemplo,
5. o direito ao exame das comtas das empresas e a
participao nos seus centros de deciso ;
6. enfim, a construo de um setor de economia
solidria na cidade e no campo,principalmente nas
terras conquistadas com a reforma agrria,ou a
produo, a distribuio e o consumo,o credito e a
previdencia, formando um conjunto harmonioso em
que os diversos elementos se reforam mutuamente.

Frente a um capitalismo mundializado, tentei mostrar neste trabalho que esta


estratgia participativa no pode,entretanto,confinar-se em um quadro nacional nem
depender s do movimento operario e socialista,mas deve ter uma viso
internacionalista e uma base social muito ampla.
Assim,emerge uma verdadeira estrategia participativa para sair do capitalismo e
construir um socialismo democrtico,conclue Coutrot.

Enfim, deste modo, podemos refletir com menos aperreio existencial sobre a
frase nos muros do estaleiro Lenin, reivindicando esta ou aquela estao . Talvez,
tenhamos que afirmar a frase do movimento social brasileiro: Podem destruir uma flor
mas no a primavera! E,assim o mostra a historia dos trabalhadores: a autogesto
como uma fonte subterrnea que em certas conjunturas aflora a tona .
Talvez, a caracterstica principal do novo ciclo,o da economia solidaria,seja a
permanncia,mesmo que de forma precria,das experincias que portam princpios da
autogesto,em conjunturas que no so revolucionarias ou de crises,e que tm como
pano de fundo e cenrio,a crise estrutural do capital(Meszros).O que no uma
soluo,mas um grande problema para os que lutam pela emancipao social.
E,tambm podemos afirmar a partir destas experincias: vem pelas margens !
realiza suas rupturas nos pontos fracos do sistema dominante,como veremos adiante
na reflexo de Henry Lefebrev.
E,sem duvidas,por iniciar nestes pontos fracos, as experincias da economia
solidria portam imensa necessidade de sustentao de polticas publicas por Governos
Democrticos,desde o nvel local at o nacional.

Voltando a Daniel Moth .Ele divide a Corrente Autogestionaria em duas


categorias de populao:
1) Os intelectuais de origem marxista,que viviam fora dos
aparelhos polticos e que criticavam o leninismo com o objetivo de
elaborar um projeto de funcionamento autogestionario.Era uma
corrente maximalista que ps muito alto seu ideal.
Neste sentido,Moth cita Bourdet e Guillerm: Ao passo que a
participao,o controle operrio e as cooperativas apenas dizem
respeito a produo e a economia, a autogesto uma
transformao radical,no apenas econmica,mas da poltica (
como gesto reservada uma casta de polticos ),para criar um
outro sentido da palavra poltica: a saber, a tomada em mos
sem intermedirios e em todos os nveis de todos os negocios
para todos os homens.
Os maximalistas construiram seu projeto
autogestionario,polindo sua utopia at perfeio.A revista
Socialisme ou Barbrie,em seus ltimos anos dedicou uma
parte de sua pesquisa a este respeito.
Na mesma linha de abordagem,Mothe cita,alm de Bourdet et
Guillerm (Clefs pour lautogestion), as obras de Castoriaids
(L Contenu du Socialisme);e,Daniel Chauvay
(Autogestion).Todas dos anos 70: 1977, 1979 e
1970,respectivamente.
2) A outra categoria que formava a corrente autogestionaria ser
sobretudo composta de militantes sindicais ou polticos,uma grande
parte de origem crist,buscando construir um caminho entre o
totalitarismo estaliniano do PCF e o oportunismo da SFIO*.
As idias expressas pelos maximalistas lhes ajudaram a
formular sua orientao,tanto na CFDT* quanto no PSU*.Mas
a fraca margem poltica na qual se engajaram estes
militantes,limitou consideravelmente o rigor e a originalidade
de sua poltica.
A CFDT um caso a parte.Para Mothe,que militou nesta
Central Sindical,buscando se diferenciar da poltica da SFIO,e
se aproximando da CGT,levou a CFDT a buscar uma linha
prpria de ruptura com o capitalismo; O que conduziu em
definitivo os militantes da CFDT se proibirem toda dinmica
reivindicativa que permitisse a realizao dos principios
autogestionarios que defendiam.Se,os maximalistas recusam o
reconhecimento de quaisquer experincias de autogesto no
capitalismo,como poderiam estes militantes sindicais se lanar
em experiencias de autogesto ?,pergunta Mothe.
Deste modo,no podiam levar em conta os problemas
concretos dos militantes nas empresas nem a necessidade que
tinham de construir uma nova estratgia.
Os maximalistas ficaram presos idia de uma ruptura brutal
com o sistema capitalista e ,assim,retomaram a idia da
Grande Noite.Como conseqncia,ningum podia ajudar o
pragmatismo dos militantes da CFDT a sair do campo terico
do leninismo;nem os reformistas nem os autogestionarios
maximalistas.O que explica,mas no desculpa,que a corrente
autogestionaria tenha ficado apegada ao leninismo e que no
deu origem a nenhuma estratgia poltica verdadeiramente nova
na Frana.
A racionalidade da sociedade autogestionaria era pensada para
alm do capitalismo e ,assim,virou uma utopia abstrata.A
autogesto foi concebida para uma economia totalmente
socializada:propriedade privada e autogesto eram consideradas
como totalmente incompatveis,o que levou o projeto uma
etapa distante e interditou toda experimentao.
A autogesto ficou como uma teoria universal que somente
poderia existir fora da influencia do capitalismo.Pouco se
poderia ajudar os militantes dentro das fabricas,nas sees
sindicais;pois,a nica resposta ao sistema global do capital era
outro sistema tambm global.Conclue Moth.

A retomada das praticas de autogesto,na dcada de 90,em


muitos paises,significa a abertura de um campo imenso de experimentaes,sob o
nome de economia popular e solidria.Sem duvidas,isto se passa em um novo ciclo do
sistema capitalista e das lutas dos trabalhadores.
Como nestas novas experiencias , articulam-se estes dois espritos
: o do projeto estratgico a longo prazo,a utopia concreta ;e, a experimentao
cotidiana de milhares de cooperativas,associaes,redes,cadeias produtivas,etc, ?
Estas experincias em curso portam a radicalidade de lutas antagonicas ao
capital ? So lutas que apontam para Alm do Capital ? Questionam radicalmente os 3
eixos do sistema do capital: o prprio Capital, o Trabalho Assalariado e o Estado ? Em
caso contrario,pelo menos portam potencialidades nesta perspectiva.Podemos mesmo
afirmar que a Ecosol engravida a historia de elementos da autogesto.
Este ensaio buscou inspirao na historia dos trabalhadores , na
perspectiva de traar elementos para construo de uma sensibilidade socialista com
base na autogesto social,enquanto movimento e estratgia radicais em relao ao
Capital.
Ou,em nvel metodologico,na linha de Daniel Bensaid , citada em epigrafe: a
atualizao de potencialidades da historia de lutas dos trabalhadores no sentido da
autogesto socialista.
Acreditamos com Michael Lowy , que O socialismo cientifico precisa mais uma
vez tornar-se utpico buscando sua inspirao no Principio Esperana (Bloch) que
reside nas lutas, sonhos e aspiraes de milhes de oprimidos e explorados, os vencidos
da histria, em Jan Hus e Thomas Munzer, nos soviets de 1917-1919 na Europa e
coletivos de 1936-1939 em Barcelona. Nesse nvel ainda indispensvel abrir
amplamente as portas do pensamento marxista gama de intuies sobre o futuro,desde
os socialistas utpicos de ontem at os crticos romnticos da civilizao
industrial,desde os sonhos de Fourier at os idias libertrios do
anarquismo.(Marxismo e Utopia)
Na histria das lutas operarias pela autogesto,em suas inspiraes e formas de
luta e organizao,em seus programas e idais, suas vitorias e derrotas, encontramos
muitos destes elementos apontados por M.Lowy.A autogesto nestas lutas est
associada `a marxismo,socialismo e utopia.
Como diz Joo Bernardo,este novo ciclo do capitalismo altera radicalmente as
formas de luta e de organizao dos dominados, possivelmente,tambm, alterando o
desenvolvimento dos ciclos de lutas para o futuro.
Bernardo nos pe questo de metodo importante. As lutas pela autogesto portam
elementos comuns,independentemente dos ciclos e pocas
histricas.Mas,tambm,apresentam um aprofundamento de suas
questes,problemas,impasses e construo de alternativas em relao ao trip Trabalho
assalariado,Capital e Estado.
Bernardo diz que: a analise do desenvolvimento das novas relaes sociais, se
tem como material emprico de privilegiada observao as lutas contemporneas,aplica-
se a toda a historia anterior da autonomia no movimento dos trabalhadores.
Por isto que,nos anos 80 ,escrevemos uma brochura intitulada Da Comuna de Paris a e
luta,organizao e projetos,poderemos identificar a proposta socialista radical de base
autogestionaria, que pode ser uma perspectiva para nossa poca de crise estrutural do
Capital.
A relao da Autogesto com a Economia Solidria outro desafio deste ensaio. claro
que,a Ecosol porta princpios da autogesto ,contudo, como veremos,suas formas de luta
e de organizao no portam (pelo menos na conjuntura atual ) a radicalidade e o
antagonismo das lutas historicas da autogesto em relao ao Capital.Suas lutas so de
resistencia dentro do capitalismo.

Daniel Mothe
Autogesto em tempos de Crise Revolucionaria
A reflexo que nos traz Daniel Mothe fundamental porque aborda as
experincias de autogesto a partir de diversas conjunturas .Por exemplo, em
conjunturas revolucionarias,inclusive com aspectos de luta militar;e,tambm,em
conjunturas de relativa estabilidade.
Daniel Moth, ex-membro do grupo Socialisme et Barbrie, ex-metalurgico
da Renault, membro do grupo da revista Autogestion et Socialisme, traou graus e/ou
niveis de existncia da autogesto .
1) Diz respeito relao do operrio com seus instrumentos e com a matria-
prima;para Moth,certas formas de trabalho em cadeia e em peas no podem ser
autogeridos. Necesitam uma modificao dos instrumentos e do aparelho de
produo.Neste primeiro nvel, a autogesto requer o trabalho do tipo de um
arteso ou de um artista,significa,superar o taylorismo.Como diz Jef Ulburghs:
A autogesto comea com as mos !
2) o do trabalho em equipe, da cooperao entre os trabalhadores,em pequenas
unidades de base,como equipes autonomas ou semi-autonomas.Veja-se a
experiencia dos CQ no Japo,antes de serem assimilados no toyotismo.
3) Caracteriza-se por uma gesto coletiva mais numerosa,por exemplo,de
oficinas.
4) o nvel da empresa.
5) No ltimo nvel, o objetivo o conjunto da sociedade.
Estes nveis podem existir de forma articulada ou de forma isolada: assim,
podemos falar de autogesto em tratando apenas de uma empresa ,ou, de varias
empresas , que articuladas formam uma rede autogestionaria(por exemplo, o
caso da Polnia em 1980-81); no nvel ou grau mais amplo e sistemtico, a
autogesto entendida como forma generalizada, o caso de um pais (por
exemplo, Yugoslavia, Arglia,etc).
Contudo, de modo geral,Moth aborda 2 tipos de experincias autogestionarias,a
saber:
No capitulo A validao da teoria pela historia, Moth assinala que as
experincias autogestionarias so to raras que no nos permitem verificar a
pertinncia e a eficcia de seu funcionamento(...)Todos os tericos do movimento
operrio mostraram como,nas grandes crises,a classe operaria tem manifestado
violentamente o desejo de gerir as empresas e a sociedade constituindo
organismos de poder democraticamente eleitos do tipo soviet,ou conselhos.
necessrio,portanto,examinar como se verifica esta tendncia dos trabalhadores na
base dos princpios que correspondem suas necessidades de autogesto.
Os fatos histricos aos quais se referem os autogestionarios so limitados um
certo numero de acontecimentos que se desenvolveram aps um
sculo.So,principalmente: a Comuna de Paris de 1871, a Revoluo russa de
1905e 1917,a Revoluo da Alemanha em 1918,a Comuna hngara de 1919,a
sublevao de Turim em 1920,os acontecimentos da Catalunha em 1936,a
revoluo hngara de 1956.
Moth divide estas revolues em duas categorias:
1) Compreende fatos que provam a capacidade dos trabalhadores gerir eles-
mesmos suas lutas.
Trata-se de acontecimentos que demonstraram como os trabalhadores sabem
se organizar entre eles para se opor as presses que sofrem nas empresas,por
greves,manifestaes,e as vezes mesmo por lutas armadas,mas tambm outros
acontecimentos que demonstram como os trabalhadores participam ativamente
em inssurreies armadas,criando organizaes para-militares que funcionam
democraticamente com a eleio de seu chefe.

2) Compreende fatos histricos que provam a capacidade dos trabalhadores


gerir o funcionamento social na base da igualdade de poder.
Trata-se de acontecimentos que demonstram como os trabalhadores,durante os
perodos de crise e de luta,sabem por em funcionamento suas empresas,mas
tambm fatos que mostram como os trabalhadores tendem se organizar para
substituir o velho aparelho de Estado e o substituir por um outro sistema
instituindo uma democracia perfeita.

Moth analisa estas duas categorias de acontecimentos.


1) A primeira categoria de fatos sempre atual e dificilmente
contestvel,bem que a maioria dentre eles sejam animadas pelas organizaes
sindicais que nem sempre esto do lado dos autogestionarios e
revolucionarios.De todo modo, estes conflitos,mesmo se so negociados pelos
sindicatos,se realizam na Frana atravs de assemblias
democrticas,destinadas a mostrar que as lutas operarias podem ser
controladas pelos prprios trabalhadores.Nos paises em que o sindicalismo
muito forte,este controle menor,as vezes mesmo inexistente.Mas,as greves
selvagens indicam que existe uma propenso dos trabalhadores a se opor as
regras do jogo ditadas pela empresa e pela instituio sindical.
Todavia, importante destacar que estas lutas geralmente so em torno de
salrios e que praticamente nenhuma delas no reivindica a gesto das
empresas,salvo quando a vacncia da direo no caso de fechamento de
empresa (LIP ,por exemplo).
Moth analisa as lutas com aspecto militar:Os outros acontecimentos
histricos que provam que os trabalhadores sabem se organizar militarmente
contra o poder,no acontecem nos paises industriais,ou quando ocorrem,
atravs de movimentos nacionais como a Resistencia na Frana e como os
acontecimentos na Hungria e na Thecoslovaquia,aps a segunda guerra
mundial.
As lutas armadas do Vietnam so lutas nacionalistas que dificilmente cabem
nos quadros da analise marxista clssica.
importante destacar que, estas organizaes para-militares escapam muito
rapidamente ao controle dos grupos de base,e que elas so dominadas pelos
partidos fortemente estruturados e hierarquizados.
Assim, os Conselhos de soldados na Alemanha e na Rssia escaparam
rapidamente ao controle da base para serem dominadas pelos partidos.Na
Espanha,as organizaes militares foram divididas segundo os partidos.
Finaliza categoricamente Moth; A organizao militar no pode,portanto,ser
um exemplo de pratica autogestionaria,pois recorre tcnicas que so muito
difceis de serem compatveis com a necessidade de debates democrticos e a
exigncia de tolerncia de opinies.Com efeito,quando se trata de responder a
um ataque ou de tomar uma deciso em alguns minutos,a rapidez da resposta e
o segredo das estratgias se opem as discusses que so caractersticas das
praticas da autogesto.

2) J a segunda categoria de fatos tendem provar as capacidades dos


trabalhadores gerir a empresa e o Estado,mas de uma grande pobreza;a
historia s reteve fatos pitorescos e no nos forneceu detalhes sobre o
funcionamento real das fabricas, diz Mothe.
fundamental que estas experincias se desenvolvem todas em um clima de
crise.(...) Em um perodo de crise revolucionaria,os gestores-tecnicos detm o
poder tcnico,mas no o poder poltico que defendido pelas organizaes
operarias.Para ser tolerado,o quadro tcnico-gestor tem todo interesse em se
apoiar nas foras revolucionarias..
Para Moth, Esta situao entretanto excepcional e no se percebe que,
quando destas crise,so os problemas exteriores empresa que dominam todas
as preocupaes e mais particularmente o problema do poder do Estado.
O funcionamento das empresas no constitui que um dos instrumentos da
Revoluo,em que os objetivos prioritrios esto ,na realidade,centrados no
poder central.
Nestes casos,as experincias se desenvolvem em um clima de forte
motivao.A crise um elemento unificador,mas que orienta tambm todas as
energias para um mesmo objetivo: a defesa militar da Revoluo.A
organizao interna da empresa puramente instrumental.Os problemas de
presses so regulados por uma autodisciplina de grupo,fortemente mantida
por uma motivao conjuntural.
O pouco tempo de durao destas experincias no nos permite saber como a
empresa pode assumir seu funcionamento quando a presso da crise diminui.
Moth, finaliza dizendo que os perodos de crise constituem
freqentemente,deste ponto de vista,os mais ruins laboratrios.

Esta viso porta conseqncias fundamentais para uma poltica de formao


em economia solidria.Assim,se nas grandes lutas de carter revolucionrio a
prxis dos trabalhadores questiona radicalmente o trip do sistema do Capital ,
no sentido de para Alm do Capital, nos perodos que chamamos de
Experimentao que os trabalhadores desenvolvem um conhecimento mais
profundo da autogesto.

6) Henri Lefebrev
O filsofo Henri Lefebvre tentou sistematizar os problemas tericos da
autogesto. Suas idias so estimulantes e importantes na perspectiva de tentarmos
situar em um quadro terico as experincias histricas.
Para Lefebrev, O conceito e a pratica da autogesto contribuem com uma
resposta original ao problema posto por Marx da socializao dos meios de
produo.Todavia, a partir das experincias existentes da planificao autoritria e
centralizada nos paises do Leste e na URSS, a autogesto no d conta desta
problemtica.Lefebrev,ento,salienta que a autogesto nada tem de mgica,que no
uma panacia,que pe mais problemas do que soluciona.
Em um mundo que tende para o global, s a autogesto torna efetiva a
participao. Mas, a autogesto no pode se isolar.Ela contm implicitamente um
projeto global,destinado a preencher o vazio,mas s se ele explicitado.Ou bem o
contedo da autogesto,seu contedo social e poltico,se desenvolve e torna-se
estratgia.Ou bem o projeto fracassa.Pode se tornar uma palavra vazia ou,o que
mais perigoso, tornar-se cogesto,adverte o filosofo.
Qual a contribuio da autogesto ? Lefebrev aponta 3 pontos fortes;
1) Uma brecha no sistema existente, no dos centros de deciso que geram a
produo e organizam o consumo sem deixar aos produtores e aos consumidores a
menor liberdade concreta,a menor participao nas verdadeiras opes;
2) Um risco; a possibilidade de uma degenerao, de uma recuperao,sobretudo
nas formas j bastardas e degeneradas da cogesto.Na autogesto em si-mesma, os
interesses parciais ou locais podem dominar os interesses gerais da sociedade;
3) O anuncio de um processo que passa pela brecha aberta e que atinge a
sociedade inteira.
falso limitar este processo gesto dos negcios economicos ( empresas,ramos
de industria,etc ).A autogesto implica uma PEDAGOGIA SOCIAL.Ela supe uma
nova pratica social,em todos os graus e nveis ... o processo de autogesto, pratica social
e teoria desta pratica, implica a construo na base de uma rede de organismos; a pratica
e a teoria modificam o conceito clssico na democracia formal de representao e de
representatividade.os interesses mltiplos da base devem estar presentes e no
representados ,isto delegados mandatrios separados desde ento da base.A
autogesto e a participao efetivas no podem se separar de um sistema de
democracia direta ....
Quanto ao conjunto e sua gesto,as tcnicas novas podem intervir.Automatizao
base nas foras produtivas uso dos meios eletrnicos (computadores e calculadoras)
para fornecer uma gesto descentralizada as informaes ascendentes e
descendentes,estas novas tecnicas fundam possibilidades novas.A condio que sejam
usadas para assegurar o enfraquecimento do Estado e da burocracia,e no para
fortalecer tecnocraticamente as instituies.
Por fim,Lefebrev retoma seu eixo central: a propsito da autogesto,
importante relembrar a importncia da vida cotidiana ? Sem duvidas. O processo
revolucionrio comea pelo abalo da cotidianeidade e termina pelo seu
restabelecimento.A autogesto mostra a via de uma transformao da vida
cotidiana.Mudar a vida,assim se define o sentido do processo revolucionrio.
Lefrebev afirma que : A experincia social (prtica social) mostra que as
associaes de autogesto surgem nos pontos frgeis da sociedade existente. Toda
sociedade tem seus pontos fortes que, no conjunto, formam a armadura, a estrutura da
sociedade.
O Estado repousa sobre estes pontos fortes. A poltica estatal tem por tarefa
soldar as possveis fissuras. Em volta destes espaos reforados nada acontece. Todavia,
entre estes pontos fortes, consolidados pelo Estado, encontram-se as reas frgeis e
as lacunas. ai que ocorrem fatos novos. As foras sociais intervm nestas lacunas, as
ocupam, as transformam em pontos fortes, ou, ao contrrio, em outra coisa.
Os pontos frgeis, os vazios, s se revelam na prtica ou iniciativas de
indivduos capazes ou s pesquisas de grupos capazes de agir. Os pontos frgeis
podem resultar de um abalo ou de uma desestruturao do conjunto.
Lefebvre nos oferece exemplos muito ilustrativos de suas idias:
2) Em 1870, Paris o ponto fraco do Imprio Bonapartista. No incio de 1871, a
capital o ponto fraco da Frana. Devido industrializao, ao crescimento do
proletariado, em razo da guerra, derrota da proclamao da Republica, ao
estado de stio, e tambm, devido segregao social feita por Hauussmann,
repartio dos operrios nos bairros perifricos, ao emburguesamento e ao incio
da deteriorao no centro.
Sob a Comuna, os operrios projetam realizar a autogesto nas fbricas
abandonadas pela burguesia de Versalhes, porm no tiveram o tempo necessrio. Por
infelicidade, a burguesia e seu Estado e as relaes de produo capitalistas ficaram
fortes fora de Paris; Thiers pode reconstituir rapidamente em Versalhes o aparelho de
Estado e a Armada.
Lefebvre aponta o ponto fraco onde surgiu a autogesto: as fbricas
abandonadas pelos patres. fundamental perceber sua noo de fraqueza: surge de um
campo complexo de contradies, tal qual apontou inicialmente. importante tambm
notar que o Programa da Comuna traz 13 pontos apontando para o conjunto da
sociedade francesa, no se restringindo ao campo da produo (ver abaixo).
3) Em 1917, durante a derrocada do Tzarismo, antigos pontos fortes de sua
armadura scio-poltica, isto , a armada e a cidade, tornam-se pontos fracos.
Juntam-se, assim, as empresas capitalistas que uma burguesia mal situada no
conseguiu consolidar. Por sua vez, os setores fracos se juntam: os Soviets de
soldados, de camponeses, de operrios, se uniram em um imenso movimento, o da
Revoluo. Lembremos que Lnin proclamou a palavra-de-ordem: Todo o Poder
aos Soviets, vendo neles mais que rgos representativos ou destinados eleger
os representantes, mas grupos de trabalhadores associados, gerindo livremente e
diretamente seus negcios. Conjuntura surpreendente. Nunca a autogesto
generalizada foi to possvel.
4) O exemplo recente da Arglia confirma nossa anlise. Onde se instalou a
autogesto? Nas fbricas abandonadas pelos patres (colonos).
Para Lefebvre, a autogesto no surge em qualquer lugar, conjuntura ou momento.
necessrio uma conjuntura, um lugar privilegiado. Onde e quando ela surge porta,
necessariamente, seus elementos possveis: a tendncia generalizao e
radicalizao. Para que a autogesto se consolide, se amplie, ela deve ocupar os
pontos fortes da estrutura social que operam contra ela.
A principal contradio que a autogesto introduz e suscita, sua prpria
contradio com o Estado; ela pe em questo o Estado: Desde que aparea um raio de
sol, em uma fissura, esta simples planta cresce, e o enorme edifcio estatal ameaado.
Para se generalizar, para se transformar em sistema, em escala de toda a
sociedade unidades de produo, unidades territoriais, instncias e nveis superiores - a
autogesto no pode evitar o choque com o sistema estatal-poltico, seja ele qual for.
A autogesto no pode evitar esta difcil tarefa: constituir-se em poder que no seja
estatal. O Estado da autogesto, isto , o Estado no qual a autogesto se eleva ao
poder, s pode ser de um tipo: um Estado em extino.
A autogesto deve ser estudada de duas formas diferentes: como meio de luta,
abrindo caminho, e, como meio de reorganizao da sociedade, a transformao de
baixo para cima da vida cotidiana e do Estado.

Henry Lefebrev: A Dialtica Estado x Autogesto

A Autogesto como possivel e o Modo de Produo Estatal

Recorremos Henri Lefebrev para a caraterizao do que o filosofo francs,em


seu longo estudo sobre O Estado*,chamou de novo ciclo do capitalismo,e que
corresponde aproximadamente fase que marca o ultimo ciclo das lutas pela
autogesto.
Falando de globalidade,j em 1978,Lefebrev diz: Dem-me um nome a esta
globalidade,chame-a de capitalismo ,imperialismo ou modo de
produo,etc.Lefebrev tentava,ento,definir o que chamava de Mundial.Numa
primeira aproximao define-o assim:
a) pelo MPE (modo de produo estatal), conceito novo...;
b) pela situao que engendram o capitalismo de Estado e o
socialismo de Estado,unidos no duplo fracasso de suas pretenses
assim como nos sistemas dos Estados...;
c) o campo da revoluo mundial,conjunto de momentos e
experincias que temos que fazer um
balano.Virtualidades,potencialidades e realizaes,fracassos,s o
conceito da revoluo reintroduz a universalidade na prxis,atravs
do utpico e da ao para o possvel.
H.Lefebrev tenta definir os elementos que caracterizam a via nova, o
possivel.Traa os vrios elementos que compem a Experiencia Mundial.Analisando
o MPE, um dos pontos O fracaso da planificao autoritria e centralizada da
(URSS)...O que nos traz uma inverso de situao.O socialismo e o marxismo se
transformam em seus contrrios:dominao absoluta do Estado, ideologia do Estado,
carter opressivo do Estado,etc.
A este fracasso relativo do MPE com componentes socialistas corresponde o
fracasso relativo do MPE com componentes capitalistas (...)
O fracasso do MPE com componentes socialistas implica o fracasso de uma sociedade
(de uma cultura de umacivilizao ) fundada no trabalho e na valorizao
(tica,esttica) do trabalho produtivo material (manual).O fracasso correspondente do
MPE com componentes capitalistas implica o fracasso de uma sociedade fundada no
formalismo da arte,do discurso,etc.
Outro aspecto destacado por Lefebrev: A mundializao do Estado como morfologia
hierrquica traz possibilidades de ruptura e no a estabilidade do conjunto.A experincia
mundial compreende as irupes,os afundamentos,aprodecimentos,pulverizao das
unidades estatais (recentes exemplos; o Portugal... ou ainda o Chile.
Aqui,o filosofo francs faz referencias a Revoluo dos cravos em Portugal,dentro do
ultimo ciclo das lutas pela autogesto,e a experiencia latino-americana do Governo
S.Allende,no inicio dos anos 70.
Outro aspecto: A revoluo cultural considerada como revoluo poltico: assalto da
base contra os aparelhos hierrquicos (partido,administrao,instituies) se erigindo
acima da sociedade.
A autogesto (a partir da pratica yugoslava) com sua problemtica:relaes das
unidades autogeridas com o mercado e os investimentos ,- extenso da pratica
autogestionaria a todo o espao social .
Na parte final de seus 4 tomos sobre O Estado Moderno,suas Contradies,Lefebrev
declara:
A teoria explora o possvel-impossivel e declara que preciso (imperativo terico e
no tico) desejar o impossvel para realizar o possvel.nada mais prximo e nada mais
distante que o possvel.A utopia assume um carter de urgencia.A utopia Urgente
define um estilo de pensamento que busca o possivel em todos os domnios.O que busca
re-definir o socialismo e o comunismo no pelo estatal e o poltico,mas pela critica
do estatl e do poltico,de uma parte,e,de outra parte,como produo,apropriao,gesto
do espao.Nem o individuo,nem o grupo,no existem sem um espao apropriado
(produzido como tal).
O pensamento conceitual explora as vias,avana pelos caminhos. Ele pode preceder a
pratica,mas no se separar dela.S a pratica,livre da obsesso poltica e livre da presso
estatal pode efetivamente realizar o que anuncia o emprego simultneo do conceito e da
imaginao (utopia).A teoria abre o caminho, prepara a via nova; a pratica se engaja, ela
produz a rota e o espao,conclue Henri Lefebvre.
Para Lefebrev, Duas vias se abrem e a diferena entre elas se acentua.Do lado do
socialismo de Estado,o Estado no tornar-se que mais rico ,mais potente,mais
fortemente equipado e armado, mais policial; do lado capitalismo de Estado,o Estado
no pode que apodrecer ou tentar tambm se reforar tiranicamente.
Este duplo modelo estatal se condena a si prprio, ao passo que, discernimos,olhando o
horizonte,uma outra via,uma via verdadeiramente nova.Abolio imediata do Estado ?
No,mas para evitar o reforo pela esquerda ou pela direita,democracia
aprofundada,incluindo segundo Marx,a ditadura do proletariado e sua
extino.Portanto,estratgia poltica implicando a critica da poltica,da representao
poltica.Principal perigo: a ambigidade.Palavra de ordem: nem converso (ao estatal
em si) nem simulao (da via nova).
Henri Lefbrev traa as caractersticas das duas vias:
3) Dinmica segundo o modelo estatal:
autoritarismo,centralizao.Concentrao do spoderes.Gigantismo:
armamentos,tecnicidade, empresas,cidades.Reforamento da cpula
(o MPE reforo com o risco de cair nas mos dos colonizadores,as
firmas mundiais,cf. La Capitulation Silencieuse,livro de
K.Levitt,que explicou plenamente essa questo).
Por uma mistificao poltica que lembraria sem o reproduzir a do
nacional-socialismo,a submisso as firmas multinacionais pode se
acompanhar de um nacionalismo que esta submisso engrendra e
que a justifica.(...).Um tal Estado forte pode fazer o povo
aceitar,em seu prprio nome,as austeridades,os sacrificios,e no
final das contas,o funcionamento da economia dominada pelas
multinacionais e a burguesia racionalmente associadas.
4) Dinmica da nova via: apelo direto ao povo e classe
operaria, superando os partidos de tipo centralizador
(jacobinos).No o Estado do povo inteiro ,que no significa;
mas,pelo controle democrtico pela base de todo o aparato
estatal,portanto,mandatos imperativos e limites,no apenas aos
representantes mas ao Estado mesmo (ao contra as
multinacionais).Fim do segredo de Estado.Divulgao de todos os
dossiers.Descentralizao efetiva .Autogesto da produo e do
territrio (com sua problemtica)...Deve-se quebrar o estado
existente,seus aparelhos e isntituies ? respondemos assim: Isto
depende.De que ? Das conjunturas.Uma tal ao no se quer.Ela se
realiza.Como ? Por vias
diversas,quebra,deteriorizao,aprodecimento.Pelo povo que se pe
em movimento,que supera as vontades e os programas
polticos.Nems empre,forosamente,pela violncia terrorista e o
golpe de Estado.Em que consiste a reverso da situao ? Em
uma atividade da base em todos os pontos de
vista.Importancia,portanto,dos contra-poderes em todos os
nveis,em uma luta real contra o poder poltico existente,mesmo e
sobretudo se ele se diz democratico,pois esta luta (dialtica) o
critrio da democracia aprofundada.O que no significa sem
dificuldades (ver a Yugoslavia).Enfim,tendncia inverso
(supresso) das relaes dominantes-dominados,inverso que
determina a orientao de um novo processo.
Para Lefebrev, a primeira dinamica tem sua lgica; ela tem por
ela a lgica.Ela pode reclamar a patronagem da tradio
autoritria,jacobina e marxista,na verdade lassaliana.Ela impe
a coerencia pelo alto,pela violncia e pelo terror se preciso,segundo
o modelo sovitico.Ela tende ao fetichismo do Estado e at a
idolatria da poltica absoluta.No seria ela que conduz at a
violncia absoluta ?
A segunda dinamica pode se reclamar a titulo justo das
declaraes de Marx,Engels,Lenine.Ela comporta a critica da
poltica,que compreende o momento da critica radical,terica e
pratica ,do Estado e da sociedade civil;aps a Comuna de Paris,ela
requer mais e melhor que um programa: um projeto.Opomos
fortemente o projeto ao programa,como a via ao modelo.(...).esta
dinmica retoma os argumentos novos,na situao mundial atual,a
tese da ditadura do proletariado com extino do Estado pela
democracia aprofundada . O que implica um tal movimento de
base,uma tal pulsao das foras sociais que a amea da violncia
poderia tornar intil a violncia,sem certido preestabelecida..
Enfim,para Henri Lefebrev,a segunda dinamica difere das
proposies de Marx,em que ela atribui uma importncia decisiva
ao espao,seja como produto (foras
produtivas:trabalho,tcnicas,conhecimentos) e como obra ( no
sentido da criao esttica implicando a imaginao e o imaginrio,
a utopia concreta e a realizao efetiva)...Deste modo, se constri
uma via nova.

7) Joo Bernardo
Autogesto e Estado = as duas vias

Joo Bernardo tem estudado os movimentos operrios na perspectiva da


autonomia e da autogesto.Em obras como Para um Modo de Produo Comunista
(1975 ), A Economia dos Conflitos Sociais (1989 ),e,ultimamente, Labirintos do
Fascismo (2003 ), desenvolveu a idia das duas formas do marxismo e dos ciclos
autogestionarios.Estes ciclos j o vimos antes de estudarmos as experincias histricas
das revolues pela autogesto.
Para Bernardo, O mundo contemporneo sustenta-se numa tenso permanente
entre:
- a esfera do Estado, que corresponde sempre para os trabalhadores a formas de
hetero-organizao e que reproduz e avoluma o capital, e,
- a esfera da auto-organizao dos trabalhadores, em que se processam as lutas
coletivas e ativas contra o capital e onde existe em grmen o modelo de uma sociedade
diferente,de um novo modo de produo.
Estas duas vidas dos trabalhadores supem os princpios antagnicos de duas
sociedades inteiramente opostas,uma assente na desigualdade e na explorao, e outra
onde se reproduzem e amplificam os elos de solidariedade, de igualitarismo e de esprito
coletivo que presidem s manifestaes de luta mais avanadas.
Em sua obra sobre o Fascismo , Bernardo concebe que Na sociedade atual uma
classe domina na medida em que dita a organizao interna da classe dominada.
Principio de auto-organizao das classes capitalistas, o Estado ao mesmo tempo o
principio da hetero-organizao da classe trabalhadora. Bernardo transfere o conceito
de alienao para o plano econmico ,em que se desdobra na mais-valia ,e no plano
poltico ,a noo de hetero-organizao caracteriza a situao de quem alienado
culturalmente e explorado economicamente.
Bernardo dialetiza a relao classe em si e classe para si diante da luta de
classes, fundamentando a idia de ciclos:
A longo prazo, nos movimentos amplos e mais profundos, a luta de classes
consiste na oscilao da classe trabalhadora entre as fases da dissoluo da sua
existncia para si e as fases em que, depois de uma reorganizao interna mais ou
menos demorada,ela apresenta novos tipos de existencia para si. Nas rupturas
revolucionarias a classe trabalhadora surge com uma enorme coeso poltica interna e
uma conscincia fortssima da sua identidade sociolgica e cultural, enquanto a
burguesia e os gestores se mostram internamente repartidos e inseguros quanto aos
padres culturais e polticos que devem seguir. Reciprocamente ,durante os seus longos
priodos de apatia a classe trabalhadora limita-se a uma existncia econmica e,
deixando de ter referencias polticas e culturais prprias, os seus membros procuram
em vo imitar formas de comportamento dos membros das classes dominantes.
Para Bernardo, nesta dialtica ininterrupta os trabalhadores no levam uma vida
nica , mas duas vidas. Ao mesmo tempo em que se inserem no capital e o fazem
funcionar, os trabalhadores entram em choque com ele, e esta dualidade to
sistemtica que os administradores de empresa, situados no prprio cerne dos
antagonismos sociais, sabem que gerir a atividade produtiva consiste acima de tudo em
administrar conflitos.
Aqui, nosso autor retoma idias da obra Economia dos Conflitos
Sociais.Muitas vezes a instituio dos trabalhadores no ultrapassa os limites da
iniciativa individual,e mesmo a mobilizao comjunta de um bom numero de pessoas
manifesta-se na grande parte dos casos de maneira passiva, sendo toda a conduo do
processo entregue a dirigentes polticos ou sidnicais. Enquanto os trabalhadores
circunscreverem os movimentos de luta ao quadro das burocracias j existentes,ou
quando deixarem burocratizar as lutas, no conseguiro assumir o controle das suas
formas de organizao.Neste caso os trabalhadores continuam hetero-organizados e a
sua existncia enquanto classe no plano econmico no se manifesta no plano
sociolgico.Por isso, em vez de romperem com o Estado, eles reproduzem-no em novas
modalidades.
Bernardo,ento,caracteriza os momentos revolucionarios:
S quando os trabalhadores, alm de se movilizarem coletivamente,pem em
causa os princpios de organizao hegemnicos e criam modelos novos,derivados do
prprio contexto da luta e refletindo as necessidades a sentidas e s neste caso
podemos dizer que eles combatem o capital,porque comeam ento a auto-organizar-se,
rompendo o Estado capitalista e tecendo noutro plano as suas relaes de
solidariedade.
Nas pocas em que os trabalhadores detm a iniciativa, o crescimento das
formas de organizao coletivas e ativas implicam uma crise do capital, que v
comprometidas as suas possibilidades de reproduo. Em ltima analise, so os critrios
de organizao a decidir o destino destes confrontos.Triunfa a classe que atinge um grau
superior de coerncia interna e, apesar dos interesses contraditrios que os dividem e da
concorrncia em que se defrontam, os capitalistas tm-se revelado cada vez mais
estreitamente unidos pela concentrao econmica ,desenvolvida hoje no plano
transnacional.
Por seu lado, os proletrios,embora com freqncia tenham conseguido por de
parte a concorrncia que os separa no mercado de trabalho, s muito raramente deram
mostras de ultrapassar as distines de nacionalidade, de lngua,de religio,de tradies
culturais,a prpria cor da pele. A incapacidade de atingir uma dimenso internacional
tem sido a causa ltima a comprometer o progresso da esfera de auto-organizao dos
trabalhadores e a assegurar o restabelecimento da hetero-organizao em modalidades
sempre mais avassaladoras.Neste vaivm entre os dois princpios organizativos,
definem-se os ciclos longos da reproduo do capital
De cada vez a esfera do Estado tem conseguido assimilar e recuperar sem eu
beneficio instituies que haviam sido criadas na esfera da auto-organizao dos
trabalhadores durante as fases em que estes se haviam mostrado coletivamente capazes
de atividade e de iniciativa prpria.A pssagem de uma para outra esfera corresponde a
uma burocratizao dessas instituies e consiste na inverso dos eu funcionamento e
dos seus objetivos sociais. A historia do movimento operrio feita de inspiraes
emancipadoras que, mal comearam a ser realizadas, depararam com os obstculos
erguidos generalizao da luta, definharam e degeneraram,para serem reconvertidas
pelo capitalismo em novos quadros de opresso e de valorizao do capital (..)
Desde a reivindicao da igualdade jurdica e o reconhecimento do direito de
coligao no mercado de trabalho, desde as cooperativas eoutras formas de
solidariedade,passando pelo sufrgio universal, a instruo para todos e a coletivizao
da propriedade, at as mais recentes manifestaes praticas de autonomia e capacidade
para gerir diretamente a produo e a vida social, todos estes grandes temas da
emancipao dos trabalhadores e do fim da explorao,depois de verem um comeo de
realizao enquanto modalidades de auto-organizao,foram absorvidos pelo
capitalismo,que lhes deu um carter de hetero-organizao e portanto os transformou
num sustentculo do Estado.
A historia do capitalismo,ou seja, o desenrolar da luta de classes,consiste na
mirade de vias e de modalidades que permitem a passagem da auto-organizao para o
seu contrario, a hetero-organizao.
O velho G.Lukacs,em ensaio de 1968,aps a experiencia da Primavera de
Praga na Thecoslovaquia, dizia que seria impensvel um retorno de movimentos tipo
conselhos operrios.E, o que vimos nos anos seguintes: experincias conselhistas na
Europa ocidental e na do Leste.Assim,por exemplos: a Revoluo dos cravos,em
Portugal e,o grande movimento social de massa que foi Solidarnosc,nos anos 80.
Mas, o que fica claro que as lutas dos operrios poloneses marcaram o ultimo ciclo
deste tipo.Talvez,Lukacs estivesse intuindo esta perspectiva.
fundamental mostrar que essa aparente cadeia de derrotas,essa dialetica infernal
apenas aparente.Na verdade,Benjamin, quando afirma que A historia dos oprimidos
marcada pela descontinuidade, aproxima da frase de Marx do 18 Brumario que
citamos acima.

Bernardo nos fala das CONDIES de VITORIA destas lutas;


Os processos revolucionrios podem considerar-se vitoriosos na medida apenas em
que demonstram praticamente a possibilidade de um novo modo de produo,coletivista
e igualitrio. So eles que mant~em o comunismo como algo do presente, e no como
um vago projeto futuro.NESTA PERSPECTIVA TEM HAVIDO UM EFETIVO
PROGRESSO NO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES (grifo nosso).
E de que: A afirmao pratica da possibilidade de outras relaes sociais,solidrias e
igualitrias,tem-se clarificado de ciclo para ciclo,e os eu radical antagonismo com o
capital tem-se aprofundado numa multiplicidade de novas facetas.trata-se de um
indesmentivel progresso do movimento dos trabalhadores,nos entido da crescente
presena do comunismo como alternativa.
Entretanto,Bernardo poe uma condio fundamental para um avano mais radical do
movimento:
Mas as formas autnomas de luta cairo sempre em colapso enquanto a estrutura
orgnica da classe trabalhadora no tender a unificao.E assim, assimiladas pelo
capitalismo depois de degeneradas, essas arruinadas solidariedades so outros tantos
marcos de derrota.

Joo Bernardo:
As lutas ativas e coletivas

Joo Bernardo,alm de analisar seus ciclos, tambm caracterizou as formas de luta e


organizao caractersticas das lutas autogestionarias para alm do capital.
Em Economia dos Conflitos Sociais,Bernardo afirma: Apresentando-se como
alternativas s relaes capitalistas,as relaes sociais surgidas nas lutas coletivas e
ativas tem-se distinguido por um aspecto que todos parecem considerar como a melhor
sntese da sua novidade.(...).A revogabilidade permanente a forma bsica de
funcionamento das instituies regidas pelo igualitarismo e pelo coletivismo.Enquanto

permanecem estas caractersticas,os eleitos so delegados,mas no dirigentes. O


movimento autnomo,ao longo do sculo XIX e do atual (sculo XX),tem evoluido ema
spectos decisivos,(...)e assumido formas consideravelmente diferentes.Todas
elas,porm,aparecem como realizaes distintas de um quadro comum,caracterizado
pelo igualitarismo e o coletivismo e cujo funcionamento tem como eixo principal a
revocabilidade dos delegados. esta Constancia para alem das diferenas que permite
definir as relaes sociais surgidas nas formas de luta coletivas e ativas,no s como
antagnicas do capitalismo,mas ainda como constituindo,desde j,o germe de um futuro
modo de produo.
E,aponta uma questo central para os dias atuais: O problema crucial que se levanta no
conjunto dos vrios processos de luta ,portanto,o seguinte:
COMO SE TORNA POSSIVEL A PASSAGEM DAS OUTRAS FORMAS DE
CONFLITO S FORMAS COLETIVAS E ATIVAS ? .
Atualizando a pergunta: COMO A ECONOMIA SOLIDARIA PODE ATINGIR O
GRAU DE RADICALISMO E ANTAGONISMO DAS LUTAS HISTORICAS PELA
AUTOGESTO ? .
Sem dvidas, aqui cabe bem a idia diretriz de Raymond WLLIAMS do Principio
Mximo da Autogesto, nas fabricas e nas comunidades locais,atravs de Governos de
esquerda e movimentos autogestionarios em varias escalas.
Para Bernardo,as lutas coletivas e ativas,apresentam duas caractersticas
fundamentais:
1) permite aos trabalhadores entrar em contato com o fulcro do
capitalismo.E,se o conhecimento da globalidade econmica no pode
resultar,para os trabalhadores,seno de um processo radical de luta,ento esse
conhecimento tem forosamente de ser critico.Por isso toda a teoria econmica
elaborada sob o ponto de vista do movimento da classe trabalhadora constitui uma
critica da economia.Mas,para que o pensamento se torne radical, previamente
necessrio conduzir a luta de forma coletiva e ativa.
2) Ao desenvolver as formas radicais de luta em relaes coletivistas e
igualitarias,a classe trabalhadora apresenta um modelo social alternativo do
capitalismo.
O coletivismo e o igualitarismo,a substituio da alienao perene dos
poderes pela sua permanente revocabilidade,implicam por si mesmos a
abolio da diviso da sociedade entre os condenados submisso e os
defensores da autoridade. Exigindo o controle ativo dos processos por
todos que nele intervm,as formas autnomas requerem a abolio das
classes,ou seja,a incluso do corpo social num sistema nico.
Bernardo assinala uma caracterstica fundamental das lutas pela
autogesto:
As formulaes ideolgicas radicais do movimento dos
trabalhadores,ao longo da historia,TM SEM EXCEO (grifo nosso)
apresentado a emancipao dos explorados como uma anulao de
qualquer diviso em classes,como a emancipao do corpo social.
Ora,sem duvidas,a autogesto social como vimos na dinmica das lutas
que analisamos acima.
E,que: a extraordinria repercusso das relaes surgidas na luta
coletiva e ativa resulta do fato de que as minorias radicalmente
anticapitalistas apresentarem um modelo de reorganizao global da
sociedade e,ao mesmo tempo,demonstrarem na pratica que no se trata
de um mero projeto ideologico,de nenhuma utopia simplesmente
desejavel,mas de algo que se constitui na realidade, de maneira
verificvel,nas relaes coletivistas eigualitarias que entre si estabelecem
os participantes nestas formas de luta.
Bernardo assinala os limites histricos destas lutas;
Embora a classe trabalhadora constitui a enorme parte da
populao,NUNCA AT HOJE (grifo nosso) uma luta radical ocupou,ao mesmo
tempo,mais do que diminutas fraes da classe,em escala mundial.
Entre os dois grifos que fizemos , Tm sem exceo e Nunca at
hoje,
nas frases de Bernardo,h uma dimenso quase inifinita, que se
expressa nas palavras,como vimos,de Blanqui : a dialtica infernal, o Spleen.
Bernardo assinala uma vocao totalizante nestas lutas; tendem a se
expandirem alm do local em que se deflagram.Uma vez desencadeados,e se
conseguirem assentar no mbito das empresas um fundamento firme,os seus princpios
organizativos manifestam-se como alternativa,no apenas no interior de dadas empresas
em particular , mas perante a globalidade da sociedade capitalista..So muito fortes as
presses para que o coletivismo e o igualitarismo extravasem os problemas da disciplina
do trabalho e se defrontem com os levantados na esfera familiar,na escola e no contexto
urbano em geral.
Vimos como,desde a Comuna de Paris at a Comuna de Gdansk ,esta uma
caracterstica das lutas histricas pela autogesto.
Em longa citao,vejamos como Bernardo nos aponta dois exemplos histricos mais
recentes:
Quando as lutas coletivas mobilizam simultaneamente os trabalhadores de um grande
numero de empresas e quando a sua durao lhes permite manifestarem-se como
alternativa,podem ento desenvolver-se instituies que consolidam a articulao entre
o ambito inicial do conflito e a sua extenso alm da esfera empresarial.
Foi o que sucedeu em maio e junho de 1968 em NANTES,por exemplo, ou ainda na
POLONIA,no segundo semestre de 1980.A,comits de greve interempresas,formados
autonomamente,coordenavam e controlavam a distribuio de bens e servios
essenciais,fiscalizavam preos praticados na venda a varejo e impediam
aambarcamentos,cobrindo com esta atividade reas por vezes muito vastas.
Bernardo fala,ento,das condiies para luta chegar a esse nvel: S e possivel chegar
a uma situao desse tipo quando a populao trabalhadora se encontra autonomamente
otganizada tambm no nvel dos bairros e quando a mobilizao social inclui os
camponeses.
Nestes caos,afirma Bernardo,o processo se iniciou no ambito das empresas,mas que
apenas a sua extenso lhe permitiu atingir formas to desenvolvidas.O modelo das
relaes sociais surgidas na luta coletiva e ativa abarca assim, na sua proposta pratica, a
reeorganizao da globalidade da sociedade. este o percurso concreto que seguem ,a
partir do local da sua ecloso. esta a base pratica da sua vocao totalizante.De
relaes sociais de luta, desenvolvem-se em relaes gerais.
Vimos como no movimento polons Solidarnosc , seu Congresso construiu um
programa intitulado A Republica Autogestionaria da Polnia.Uma proposta global de
sociedade.
Joo Bernardo analisa questes importantes destes movimentos, relativos questo do
Mercado. At agora, o estagio superior nestes processos parece-me ter ocorrido
naqueles POUCOS- (grifo nosso) casos em que trabalhadores de empresas
diferentes,tendo desencadeado simultaneamente movimentos de luta autnoma e
tomado em mos a produo,reorganizando-a segundo as novas relaes sociais,trocam
ento entre si os produtos assim fabricados.S mediante a generalizao deste tipo de
trocas podero os emrcados de solidariedade incluir,no apenas bens de uso corrente,
mas todo gnero de produtos. Bernardo,arremata: Estamos certamente ainda muito
longe desse estagio, que hoje mal comea.
Bernardo assinala questes cruciais para estas lutas: Apenas o simultneo
desencadeamento de processo coletivos e ativos de contestao generalizada pelos
trabalhadores de um numero crescente de paises poder fazer recuar o emrcado mundial
e comear a por em xeque os seus critrios de produtividade.A partir de ento,o
desenvolvimento das relaes sociais surgidas na luta radical poder obedecer a
percursos diferentes daqueles que aqui sistematizai.Mas essa ser to-somente uma
ETAPA FUTURA (grifo nosso).At agora, diz Bernardo,mesmo quando se
desencadeiam em unidades de produo de empresas transnacionais,estas lutas tm-se
confinado localmente,sem se alastrarem s unidades da mesma empresa situadas em
outros paises.Isto implica uma ENORME FRAQUEZA TATICA DOS
TRABALHADORES(grifo nosso)....
E,fica assim de p uma questo crucial,retoma Bernardo:
a de saber por que essa internacionalizao dos focos de origem das lutas autnomas
no ocorreu.
Sem duvidas, nesta poca de crise estrutural do Capital (Meszros),os trabalhadores
tero que responder na sua prxis essa questo . Ou isto ou a Barbrie !

8= NIKOS POULANTZAS :
Estado ,Socialismo e Autogesto.

No Seminario organizado em homenagem a Poulantzas ( 27 e 28 de novembro


1981,em Paris VIII-Saint-Deni), condensado na obra La gauche, Le pouvoir et Le
socialisme- Hommage a Nicos Poulantzas (PUF,Paris,1983),varias analises apontam a
idia de Poulantzas sobre a autogesto como contedo do socialismo democrtico.
Assim,por ex., Chantal Mouff diz : Um projeto em que a esquerda quer articular esse
potencial no pode consistir em propor mais inteveno do Estado ,mas bem ao
contrario, a criar de mais em mais as esferas de auto-determinao e de autogesto para
os indivduos e cidados. E,finaliza seu texto : No se trata de um aps-socialismo
,mas de OUTRO SOCIALISMO,ou seja, a construo de uma SOCIEDADE
AUTONOMA E AUTOGERIDA.
Christine Buci-Glicksman,que organizou a publicao,na Introduo situa a obra e os
desafios enfrentados pelo pensador grego radicado na Frana:
No centro, um ponto de partida , um diagnostico e uma constatao paradoxal: o
fracasso ou ao menos a redescoberta dos limites histricos e tericos das estratgias
democrticas elaboradas nos ltimos quinze anos ( estamos em 1981,grifo nosso) .Quer
tenham assumido a forma das amplas unies da esquerda do euro-comunismo
governamental ou que tenham buscado como Nicos e tantos entre ns- ARTICULAR
democracia direta e democracia representativa com o fim de evitar as hegemonias de
gesto do tipo social-democratica,e a oferecer alternativas democrticas aos
stalinismos medocres.Tais limites so perceptveis na crise da forma-partido, na
ascenso de um pluralismo de sujeitos da transformao social, das inadequaes das
estratgias sidnicais frente s mutaes da classe operaria, as formas de corporativismo
social e um remanejamento da diviso do trabalho em troca de uma sociedade civil
multinacionalizada,cada vez mais autnoma em relao aos Estados-naes.
Mas, eseses limites se afirmam no momento mesmo em que a QUESTO
DEMOCRATICA se repe com uma grande urgncia
Aqui,C-Buci cita os exemplos da America central (El Salvador,Nicaragua) ,da Polonia
do Afeganisto ,como as experincias trgicas.
E que, o paradoxo da situao= repor a questo democrtica numa fase de crise aberta
ou em potencial da democracia.H que se desenvovler todas as dimenses de tal
paradoxo seus jogos e alternativas-, a buscar as matrizes de leituras mltiplas que este
livro apresenta.(...)Os instrumentos construdos por Nicos Poulantzas so um
PARTIR DE, UM ALM (au-del).
Com efeito, sem eus ltimos textos,o desafio democrtico do scoialismo se torna
lancinante, apelando a uma verdadeira Revoluo Coperniciana na poltica que se
esboa em sua ultima Entrevista a Rinascita (outubro de 1979).Todo um espao se
abre: relao entre as analises de Marx e os elementos estalinistas do leninismo,
refelxo sobre a necessidade terica do exerccio democrtico do poder, esboo de um
NOVO SOCIALISMO QUE VAI BEM ALM DA ESTRATEGIA DE
ARTICULAO DEMORACIA DE BASE-DEMOCRACIA REPRESENTATIVA
(grifo nosso),que fecha a obra LEtat , lepouvoir,Le socialisme....Todo ume spao que
Nicos no pode que balisar com intuies tericas , criticas isto ,polticas -, que so
as suas e que nos fazem falta.
Esse Espao aberto por Nicos,para C-Buci, repousa sobre uma idia fundamental
que circula em todos os textos: vivemos o FIM DE TODO UM CICLO HISTORICO
que comeou no aps- guerra com o Estado Keynisiano e a partilha de Yalta.
E que,Este fim de ciclo ps em pauta um novo ainda impreciso em diferentes
planos, Nicos abordou um certo numero de elementos: a apario de novas formas
estatais,que chamou de estatismo pluralismo autoritrio; a construo de uma
hegemonia do capital multinacional e seus efeitos sobre o Estado-Nao; a
deslocalizao da produo;a crise do Welfare ;a emergncia histrica de uma nova
pequena-burguesia (1968 e 1981 na Frana) cujos interesses no so muito ao
contrario- antagonistas com os da classe operaria; o desenvolvimento de novos
movimentos sociais..Ele tinha tambm pressentido os riscos possveis dessa fase: crise
dos partidos, ascenso do corporativismo, exploso do Sul, esmagamento das
dimenses democrticas do socialismo real.
dizemos que esse espao a caracterizao do fim de um ciclo e estas novas
perspectivas que se apresentam definem o audro desse trabalho coletivo, seu
laboratrio.
O ensaio de C-Buci nesse livro do Seminario em Homenagem a Poulantzas (ensaio
intitulado Qual Socialismo ? ) como porta de entrada a viso do pensador grego
sobre a autogesto.
C-Buci inicia seu ensaio com a frase famosa de Nicos: Uma coisa certa= o
socialismo ser democrtico ou no ser!
praticamente com estas palavras , sobre os riscos inerentes qualquer transformao
scoial radical : institucionalizao estatal social-democrata ou contra-revoluo
autoritria, que se fecha o ltimo livro de Nicos Poualantzas, LEtat, Le pouvoir, Le
socialisme (...).Tal o desafio do socialismo autogestionario, ao qual a vitoria da
esquerda na frana (1981) como na Grcia as duas ptrias de N.Poulantzas- repe toda
sua atualidade seus dilemas.
C-Buci,refeltindo sobre a recem experincia de governo de esquerda Frances, iniciada
em 1981 com a vitoria de F.Miterrand, aposta ou defende a passagem de um Bloco
Eleitoral de esquerda ,para um Bloco Social da Transfromao.
E que, ... a descentralizao poltica em curso,no se limite um simples reforo dos
eleitos locais ou das assemblias representativas eleitas.mas, que elas se articulem com
as novas formas de democracia de abse (papel das associaes, dos grupos de inciativas,
dos cosnelhos de oficinas, e mesmo os conselho de bairro ),que crim novas instancias de
socializao, de politizao, de inteveno.Frente dimenso individuo-Estado,elas
construam a dimenso nova de um Espao Pblico ( no sentido de Habermas )
pluralista e democrtico
Pelas mesmas razes o sucesso futuro das nacionalizaes no depende apenas de sua
eficacia industrial,mas das modalidades de poder novo que os trabalhadores tero na
pesquisa, nos investimentos, nas condies de trabalho. Todas orientaes que
socializam sem estatizar.
Para C-Buci ,o criterio dareal democratizao diz respeito as relaes entre dirigentes e
dirigidos,o papel e o lugar da classe operaria e dos movimentos sociais no conjuntoda
sociedade.O que exige igualmente que os partidos e sindicatos se abram essa lgica
autogestionaria e no privilegiem o poder o poder centralziado- em relao a essa
via socializante.
Vamos ,enfim obra principal de N.Poulantzas sobre a Autogesto e o Socialismo.E,
centraremos nosso trabalho no capitulo intitulado Por um Socialismo Democratico,o
ultimo do livro em questo (LEtata,Le pouvoir ,Le socialisme- PUF-1978).
Poulantzas , inicia esse capitulo afirmando o eixo central de sua analise: a relao
entre socialismo e democracia na questo das transformaes do Estado.
Poulantzas parte de duas experincias histricas a serem evitadas: a social-democracia
tradicional,tal qual existia na Europa, e os regimes dos pases do Leste europeu, os
socialismos reais.Ambos tm um ponto comum,apesar das muitas diferenas:
o ESTATISMO e a desconfiana profunda em relao s inicitaivas das massas
populares,enfim,a suspeita em relao as exigncias democrticas.
Na Frana ,Poulantzas situa historicamente dois plos histricos: de um lado, a estatista
e jacobina,de Lenine eda revoluo de Outubro III internacional e ao movimento
comunista,de outro lado,aautogestionaria e de democracia direta na base.Para realizar o
socialismo democrtico,deve-se romper com a primeira e se situar na segunda.
Num primeiro momento,Poulantzas faz uma analise rigorosa da tradio leninista-
estatal.Mas,sempre advertindo que cada Polo contem muitas correntes e que,no
suficiente romper com o primeiro Polo e correr para o segundo,o da autogesto.
Poulantzas situa o dilema:
ou manter o Estado atual,se limitar democracia representativa com mudanas
secundarias,o que leva ao estatismo social-democrata e ao parlamentarismo dito
liberal,ou,
Se limitar democracia direta na base ou movimento autogestionario,o que conduz
inelutavelmente, mais ou menos tempo, um despotismo estatal ou a uma estrutura
dos experts.
Como ter uma transformao radical do Estado articulando aampliao e o
aprofundamento das instituies da democracia representativa e das liberdades (que so
uma conquista das massas) com o desenvolvimento das formas de democracia direta na
base e a experiemntao dos espaos autogestionarios, aqui est o problema essencial de
uma via democrtica ao socialismo e de um socialismo democratico,conclue
Poulantzas.
Na medida em que se trata de assinlar direes, essse problema diz respeito toda
transio ao socialismo,no se limita aos pases desenvolvidos,e se apresenta de forma
consideravelmente diferente segundo cada pais, com as estratgias se adaptando as
particularidades de cada pais,mas,s pode haver socialismo que seja democrtico.
Essa transio, Poulantzas chama de via democrtica ao socialismo, e define seus
elementos:
A via democrtica ao socialismo um longo processo, no qual a luta das massas
populares no visa a criao de um efetivo duplo poder, paralelo ao existente e exterior
ao Estado, mas se aplica as contradies internas do Estado.
A tomada do poder supe certamente uma crise do Estado (o que existe hoje em alguns
pases da Europa),mas essa crise,que acentua precisamente as contradies interas do
Estado, no se reduz uma crise de afundamento do Estado.Tomar ou conquistar o
poder no significa um simples confisco das peas da maquinaria estatal,com vistas a
sua substituio em pr de um segundo poder.
O poder no uma substancia quantificavel detida pelo Estado e que seria arrancada
dele.O poder consiste em uma serie de relaes entre as diversas classes sociais, por
excelncia concentrada no Estado, que, ele mesmo constitui a condensao de uma
relao de fora entre as classes.
O Estado no nem uma coisa-instrumento que se surrupia ,nem uma fortaleza onde
sepenetra atravesde estratagemas nem um cofre-forte que ss e abre arrombando-o: ele
o centro de exerccio do poder poltico.
Tomar o poder do estado significa que seja desenvolvida uma luta de massas tal que
moridfique a relao de foras internas dos aparelhos de estado que so, em si, o campo
estratgico de lutas polticas(...)
Esse longo processo de tomada do poder numa via democratica para o socalismo
constitui-se no essencial em desenvolver, fortalecer,coordenar edirigir os centros de
resistncia difusos de que as massas sempre dispoem no seio das redes estatais, nelas
criandoe desenvolvendo outras,detal maneira, que esses centros tornem-se,no campo
estratgico que o Estado,os efetivos centros de pdoer real.
Sobre o risco do reformis ,poulantzas afirma que ; Qualquer que seja, modificar a
relao de foras internas ao Estado no significa reformas sucessivas numa continua
progressividade, conquista de pea por pea de uma maquinaria estatal ou simples
ocupao de postos ou cpulas governamentais.
Significa exatamente um movimento de RUPTURAS REAIS , cujo ponto culminante,
e certamente existir um, reside na inclinao da relao de foras em favor das massas
populares no campo estratgico do Estado.
Esta via democrtica para o socialismo no significa portanto simples via parlamentar
ou eleitora. Alcanar a maioria eleitoral ( no parlamento ou na presidncia ) seria apenas
um momento, por mais importante que fosse:A modificao da relao de foras no seio
do Estado diz respeito ao cnjunto de seus aparelhos e seus dispositivos: no diz respeito
apenas ao parlamento ou,como exaustivamente se repete hoje em dia,aos aparelhos
iedologicos do Estado,considerados detentores doravante do papel determinante do
Estado atual.
Esse processos e amplia igualmente, e em primeiro lugar, aos aparelhos repressivos de
Estado,aqueles que detm o monopolio da violncia fsica legitima: o exercito e
particularmente a policia.
Para Poulantzas, essa alternativa no a de uma luta interna nos aparelhos do
Estado.No setrata de se inserir nas instituies estatais.E que,
As lutas populares devem sempre se manifestar tambm pelo desenvolvimento de
movimentos e na proliferao de dispositivos de democracia direta de base e de centros
autogestionarios.(...).A questo: quem est no poder,e para que fazer, no pode ficar
alheia a essas lutas autogestionarias ou de democracia direta.
(...)Estas lutas e movimentos,por mais polticos que sejam, mesmo que se coloquem
fora espao fsico do Estado, no so fora do Estado: elas esto,de todo mod,sempre
situadas em seu campo estratgico.Esta a alternativa real e no aquela de uma simples
luta interna frente a uma luta externa.Em uma via democrtica para o
socialismo,essas duas formas de luta devem ser combinadas.
S uma articulao entre as duas tentativas, a detransformao da democracia
representativa e a do desenvolvimento de formas de democracia direta na base ou
movimento autogestionario, pode evitar o estatismo autoritrio.
Poulantzas,ento, aponta como um termo indicativo,a transformao radical do
aparelho de Estado numa transio ao socialismo democrtico.E,que no significa o
velho termo de destruio ou quebra do aparelho de estado,NE, de uma mudana
estatal deste emsmo aparelho de Estado.So dois caminhos a serem evitados.
Uma transformao do aparelho de Estado indo no sentido de sua abolio s pode
se apoiar em uma interveno crescente das massas populares no Estado,pela via de
seus representantes sindicais e polticos,mas tambm pelo desenvolvimento de suas
inciiativas porprias no seio do Estado.
Isto deve ser companhado pelo desenvolvimento de novas formas de democracia
direta na base e a proliferao de redes e de focos autogestionarios(...)Mas h tambm o
outro lado da questo: o deslocamento unilateral e univoco do centro de gravidade para
o movimento autogestionario no lograria evitar, em prazo mais ou menos curto, o
estatismo tecnoburocratico e o confisco autoritrio do poder pelos experts-
especialistas.
Poulantzas aponta dois caminhos para essa perda do poder da revoluo:
1= na linguagem neo-tecnocratica,a de um Estado mantido em razo da complexidade
das atrefas de uma sociedade pos-industrial,gerido por especialistas de esquerda e
controlado simplesmente pelo dispositvos da autogesto.;
2= na linguagem neo-libertaria =um poder disseminado, espalhado e pulverizado numa
pluralidade infinita de micropoderes exteriores ao Estado e que se ganharia muito
ocupando-os , para escapar ao estatismo (guerrilha frente ao Estado).
Nos dois casos,o resultado o mesmo:
mantem-se inatcto o Estado-Leviat, negligenciam-se as necessrias tarnsformaes do
Estado sem as quais o movimento de democraciadireta continua fadado ao
fracasso.Mais anida: chega-se a excluir ainterveno domovimento autogestionario
das prprias tarnsfromaes do Estado e a situar as duas num simples paralelismo.
Como,por exemplo, estabelecer uma relao orgnica entre as comisses de cidados e
asmblias eleitas pelo sufrgio nacional, elas mesmas transformadas em funo dessa
relao ?.
Qual a questo central,ento,para poulanztas?
No se trata ,na verdade,de fazer a sintese entre as duas tradies do movimento
popular,a estatista e a autogestionaria,que seria necessrio juntar. Trata-se de situar-se
NUMA PERSPECTIVA GLOBAL DE ABOLIA DO ESTADO,perspectiva que
comporta DOIS processos articulados:
A transformao do Estado eo desenvolvimento da democracia direta de base
Finalizando seu ensaio,Poulantzas chama a ateno para dois perigos:
1) A reao do adversrio,a burguesia.E,extraindo lies da experincia da Unidade
Popular,do Chile de S.Allende.
2) As formas de articulao dos dois processo da via democrtica ao socialismo(
Estado e Autogestode base).extraindo lies da experincia da revoluo dos
Cravos em Portugal.
No primeiro caso,Poulantzas afirma que A atitude clssica da estratgia do
duplo poder frente a esse perigo foi precisamente da destruio do aparelho do
Estado.Atitude que, no caso que nos concerne,em um certo sentido,tambm
vlida: no podemos ficar em modificaes secundarias do aparelho do Estado;
preciso fazer rupturas profundas.
Mas,s vale em um sentido: na medida em que no seja apenas a destruio do
aparelho do Estado e sua substituio pelo segundo poder , mas, sua
transformao em um longo processo que implique o desenvolvimento e
ampliao das liberdades e da democracia representativa.
No sendo assim,oferecemos oportunidades ao adversrio, seja para boicotar
uma experincia de socialismo democrtico, seja para intervir brutalmente para
acabar a experincia.A via democrtica para o socialismo no ser,certamente,
uma simples passagem pacifica.
S possvel enfrentar esse perigo se ativamente apoiando em um amplo
movimento popular.Falamos claramente: de toda forma,ao contrario da
estartegia vanguardista do duplo poder.(...).Se este movimento desenvolvido e
ativo, ( a revoluo ativa, dizia Gramsci, opondo-o revoluo passiva ),se a
esquerda no o realiza, nada poder impedir a social-democratizao dessa
experincia.(...)
O amplo movimento popular constitui uma garantia frente reao do
adversrio, mesmo que no seja suficiente e deva sempre estar aliado a
transformaes radicais do Estado.
Essa a dupla lio que tiramos do Chile. O fim da experincia de Allende no
se deve apenas ausncia dessas transfromaes,mas tambm a que, a
interveno da burguesia, implcita nessa ausncia, se tronou possvel pela
ruptura das alianas entre as classes populares ( clase operaria-pequena
burguesia principalmente ), o que j tinha ento quebrado o lan em favor do
governo da UP.

A segunda questo corresponde as Formas de Articulo dos dois processos (


mudanas no Estado e implantar a Autogesto).Problema novo,desde que no se
trate de substituir um pelo outro.Ou tornar um paralelo e/ou justaposto ao outro.
Pergunta ento Poulantzas :
Em quais reas, a propsito de quais decises, em que momento, um deve
ultrapassar o outro (as assemblias representativas ou os centros de democracia
direta, o parlamento ou os comits de fabrica, os conselhos municipais ou as
comisses de cidados, etc) ?
Situao de pdoer duplo que concerne, esta vez, dois poderes de esquerda
(governo de esquerda e poderes populares organizados como segundo poder ).
uma das lies que podemos tirar do caso de Portugal:
Uma situao de duplo poder, mesmo entre dois poderes de esquerda, no no
se parece em nada a um jogo de poderes e contra-poderes que se equilibram
mutualmente para o crsecimento do socialismo e da democracia.
Esta situao conduz rapidamente uma oposio aberta entre os dois, com os
riscos de eliminao de um em favor do outro.Em um caso a social-democratizao (
Portugal),no outro (eliminao da democracia representativa) que no a abolio do
Estado nem a vitoria da democracia direta,mas,a prazo mais ou menos longo ,uma
ditadura autoritria de novo tipo.
Nos dois casos,quem sair ganhando ser o Estado,conclui N.Poulantzas.
E,para concluir sua obra, Qual a soluo e a resposta a tudo isto ?
Afirmando que suas indicaes no so soluo-receita,pois a resposta a estas questes
ainda no existem,Poulantzas diz que:
A historia no nos forneceu ate agora experiencia vitoriosa de uma via democrtica ao
socialismo: em troca, ela nos deu as experincias negativas a evitar e os erros a meditar,
o que no negligenciavel(...).mas,uma coisa certa: o socialismo ser democrtico ou
no ser .

9= Andre Gorz:

Experimentao Autogestionria

- A Experimentao Social com base na Autogesto.


(As idias de ANDRE GORZ )

O ncleo poltico central da obra de A,Gorz tem como foco uma nova critica da
razo economica.Neste sentido,Gorz assume a herana marxista no-ortodoxa ,com
nfase para a corrente quente do marxismo que gira em torno da proposta de um Eco-
Socialismo com base na autogesto social.

Um estudioso da obra de Gorz nos fornece elementos fundamentais da sua


evoluo poltico-intelectual:
A virada que se produz no pensamento de Gorz,2 anos somente aps os fatos de
Maio 68...uma ruptura em que H.Marcuse,E.Bloch e J.P.Sartre tiveram influencia...Seu
pensamento passa,ento,de um marxismo revolucionrio anti-estalinista (com forte
influencia das idias de Llio Basso),no perodo 1964-1969, para um ECO-
SOCIALISMO AUTO-GESTIONARIO...em uma nova estratgia socialista ecologica
de base e de ruptura com o capitalismo.Essa nova concepo inclui a mobilizao do
movimento ecologista enquanto movimento anti-capitalista,na perspectiva da
construo,a longo prazo,de uma sociedade melhor,COOPERATIVISTA E
AUTOGESTIONARIA.
Para Munster,uma influencia decisiva sobre Gorz foi a do educador Ivan Illich:
Gorz usa certos conceitos chaves de Ivan Illich,a critica do produtivismo,do
mito do crescimento e do gigantismo dos instrumentos industriais.Mas,alm destes 3
temas,Ilicch tambm exerceu uma influencia determinante na gnese de sua teoria dos
espaos sociais autnomos e dos espaos de cooperao auto-gestionaria,como
alternativa ao mundo da produo e as formas de vida e de trabalho da sociedade
industrial capitalista.
Aqui,Gorz articula a critica ao processo de produo questo da educao,isto
,trabalho e educao.A revoluo cultural que prope, siginifica a destruio da
distino,da hierarquia e da separao entre trabalho intelectual e manual,concepo e
execuo,e a liberao das capacidades criadoras de todos os trabalhadores.Para Gorz,
o ataque contra a hierarquia na fabrica deve se prolongar para o ataque contra o
sistema escolar que a sua matriz.(...).Ensino e produo,formao e trabalho foram
separados da pratica,o operrio separado dos meios de produo,da cultura e da
sociedade civil.Por isto (...), a reunificao da educao e da produo,do trabalho e da
cultura uma exigncia essencial.
Em seu perodo marxista (1964-1970),Gorz defendia a autonomia e a auto-
organizao dos trabalhadores,a espontaneidade das massas e a autogesto.
Em O Socialismo Difcil, Gorz explicita sua contribuio questo da
estratgia e das lutas :
a estratgia alternativa socialista revolucionaria e ecolgica que preconiza
Gorz,concebida como alternativa gesto aocial-democrata (que tornou-se,com o
tempo,uma fora neo-capitalista), significa deve visar o rompimento do equilbrio do
sistema e aproveitar essa ruptura para concretizar o processo,revolucionrio,da transio
ao socialismo,coisa que s se pode fazer quente(Gorz)
Como bem salienta Munster, evidente que uma estratgia deste tipo s
praticvel em perodos de movimento,sobre a base de conflitos abertos e de aes
sociais e polticas amplas. impossvel concebe-la como uma batalha de usura em uma
guerra de posio.pois,se o movimento social se estabiliza,se instaurado um equilbrio
de foras,ento a batalha da ruptura que uma estratgia socialista tem por funo
prepara-la -, adiada(Gorz).
Munster cita exemplos histricos em que essa transio foi bloqueda:
Chile de S.Allende,em 1970-73;Frana da Frente Popular em
1936;Inglaterra,anos 50;Itlia,aps 1947 e 1963.
Em nosso trabalho ,Beco dos sapos aos canaviais de Catende,traamos
inmeras experincias do campo das lutas autogestionarias ,ao longo da historia.*
Gorz tinha posio muita clara em seu perodo marxista (1964-1970) em favor
da autonomia e pela auto-organizao dos trabalhadores,pela espontaneidade das massas
e pela autogesto(Munster)
Desse modo, para Andre Gorz, essa poltica de transio socialista implica uma
profunda mudana na relao de foras:
pelas aes de massa diretas que, organizadas e guiadas pelos partidos da
classe operaria poeem em crise a poltica do governo em questo.E,estas luta
dependem no mais do Parlamento,mas da capacidade mostrada pelos trabalhadores de
mobilizar,pelas lutas extra-parlamentares,as classes trabalhadoras contra a poltica
vigente.
Movimento desse tipo foi a ocupao massiva e esponatanea pela base das
fabricas na Frana em 1968.Gorz tirou lies dessa experincia marcante:
o poder soberano dos trabalhadores de auto-determinar eles prprios as
condies de sua ao social,de submeter sua vontade coletiva o contedo,o
desenvolvimento e a diviso social de seu trabalho.
Na perspectiva estratgia de Gorz,so reformas revolucionarias:reformas
impostas,aplicadas e controladas pelas massas mesmas e que repousam sobre a
iniciativa e sobre sua capacidade de auto-organizao.
A.Munster assinala as afinidades entre Gorz (de As Metamorfoses do
trabalho) e a viso de Hanna Arendet:
O prprio movimento operrio,seus sindicatos e partidos,so sados de crculos de
cultura operaria e de associaes de ajuda mutua,ou seja,de um trabalho de reflexo e de
auto-formao frente s idias dominantes;as formas de auto-organizao e de vida
esboam uma alternativa organizao social e ao modo de vida dominante: UMA
UTOPIA CONCRETA.
uma reflexo que faz eco as teses de H.Arendt,notadamente sua definiop da
essncia mesma da poltica como faculdade espontnea dos atores de se fazerem
entemder na Agora e de se organizar espontaneamente,no espao publico comum,para
defender seus interesses,na pluralidade e sua concepo de uma cultura
democraticamente autentica(Munster)
Essa utopia Concreta se expressa na obra de A.Gorz, no que Munster chama de
Uma Prxis Auto-gestionria e numa sociedade autogerida de produtores livres.
Tendo por presuposto que o fracasso do sistema do socialismo real no exclui
uma alternativa socialista,Gorz sustenta que um outre socialismo negao positiva do
capitalismo e alternativa ao socialismo autoritrio da planificao centralizada- s pode
se concretizar na EXPERIMENTAO SOCIAL DE NOVOS MODOS DE VIVER
EM COMUNIDADE, DE CONSUMIR, DE PRODUZIR E DE
COOPERAR.E,segue,em um modo novo de produo,organizado partir de
tecnologias alternativas que permitam fazer mais e melhor com menos,tudo em
ampliando a AUTONOMIA DOS INDIVDUOS E DAS COMUNIDADES DE
BASE.
Gorz,ento,presenta 4 pontos urgentes:

1= a subordinao da racionalidade econmica uma racionalidade ecolgica e social;

2= o decrescimento da produo das mercadorias graas a uma auto-limitao das


necessidades;

3= a criao, graas uma durao do trabalho cada vez mais reduzida, de uma esfera
de compatilhamento comunitrio, de cooperao voluntria e auto-organizada;

4=o direito uma renda derivada do trabalho

A.Munster comenta estas proposies de Gorz:

Lutam em favor, sem contestaes, em favor de uma UTOPIA CONCRETA ,de uma
nova sociedade, fundada na auto-organizao voluntria dos produtores(..) Um modo de
produo ecologista e cooperativista em que a durao do trabalho ser fortemente
reduzida.

O caminho que leva a esse socialismo de uma sociedade ecologista autogerida ,diz
Munster,capaz de superar o capitalismo liberal , s poder resultar de um longo
processo, de uma ao cosnciente e a longo prazo em que o inicio poder ser a
realizao de um escalonamento coerente de reformas, mas em que o desenrolar s
poder ser uma sucesso de rupturas,mais ou menos violentas, vitoriosas ou
derrotadas, em que no conjunto contribuir para formar e organizar a vontade e a
conscincia das classes trabalhadoras (A.Gorz).
A. Munster comenta essa passagem : Desafiando uma velha doutrina social-
democrata que j tinha sido desconstruida por WALTER BENJAMIN ,em suas Teses
sobe o conceito de Historia(1940),Andr Gorz no cessa de lembrar que no possvel
uma passagem gardual e insensvel do capitalismo ao socialismo(...).

Essa alternativa proposta por A.Gorz, estava calcada em experincias sociais ocorridas
em 1968 e nos anos seguintes;entre elas,Munster cita A formao da fabrica de
relgios LIP em uma cooperativa auto-gerida pelos trabalhadores.
Estas formas de experimentao de uma vida e de um modo de produo
ALTERNATIVAS, alm do modo de produo imposto pelo capitalismo, em nome
do lucro maximo, so explicitamente valorizadas por Gorz.

Neste sentido, Gorz est absolutamente persuadido que essa nova fora produtora
liberar cedo ou tarde a alternativa emancipatoria ao sistema existente;Munster
cita Gorz:
A experimentao com novos modos de vida e de outras formas sociais, nas
brechas de uma sociedade em plena desagregao, subverter e desligitimar o
controle que o Capital exerce sobre o esprito e o corpo das pessoas.

As antecipaes sociais anteciparo um mundo no mais fundado no trabalho e na lei do


capital e do lucro.As experimentaes sociais favorecem uma vasta escala (pelo
caminho da prxis alternativa das redes de cooperativas autogestionrias) a
propagao e a extenso da conscincia critica que dever um dia se ampliar s grandes
empresas, as administraes e aos aparelhos polticos(...)Com esta convio to forte
em favor das experimentaes sociais Gorz se aproxima ,em certos aspectos,ao
pensamento de Bloch de uma Utopia Concreta.Os laos se explicitam de forma ampla
entre seu pensamento e os do autor de O Esprito da utopia e do Principio
Esperana (notadamente no que concerne a experimentao do mundo, nas categorias
esboadas e elaboradas por Bloch em 1975,em sua ultima obra chamada
Experimentum mundi*).

Andr Gorz,junto com sua esposa,se suicidou em setembro de 2007. Dois anos
aps, em 2009,a editora La Decouverte lanou uma obra reunindo diversos emsaios
sobre a obra de Gorz: Andr Gorz, um penseur pour l XXI Sicle. Nessa
homenagem, vamos encontrar muitas idias sobre a relao Gorz-Autogesto.
Assim,por ex., Jean Zin afirma que , na obra Misrias do presente , riqueza do
possvel ( 1997 ),Gorz aprofunda sua alternativa:
Nessa obra diz G. Fourel Gorz traz uma nova perspectiva para ecologia
poltica, das alternativas locais globalizao mercantil ( a era da informao e da
economia imaterial ),alternativas que juntam os principais instrumentos: renda
garantida ( ou alocao universal de uma renda suficiente ), oficinas cooperativas
(ou ateliers comunais de autoproduo) e moedas locais ( ou moedas-tempos )
.

Por sua vez, Carlo Vercellone aborda a evoluo das idias de Gorz em relao
superao do fordismo:
Durante os anos 1980 e at a metade dos anos 1990, a reflexo de Gorz sobre a
dinmica do capitalismo conheceu umabifurcao: a racionalidade econmica do
capital e seu modo de organizao dotrabalho na esferada heterenomia so
consideradas por gorz como um horizonte insupervel devido a inapropiabiliadde
das massas dos saberes necessariamente espeializados que combina a produo
social.
Mais anida, sob a influencia de IVAN ILLICH ,esta tese ampliada ao conjunto
das isntituies que estruturam o funcionamento da megamaquina industrial
burocratica,e,abrangendo os servios coletivos do WelfareState. Decorre
,ento,uma mudanaa profunda no modo de pensar a emancipao do trabalho
assalariado.
A autogesto e, mais geralmente, a emancipao no trabalhose efetuam diante da
constatao que aonivel microeconmico a logia do capital seria a nica forma
deraionalidadee conomica pura e que no h outra forma economicamente racional
para conduzir um empresa que a gesto capitalista.A saida do capitalismo no pode
portanto ser pensada como a reverso da diviso capitalista do trabalho.
Esta viso cede lugar um aporte que se inspira em POLANY, em que a superao
da dominao do capitalismo concebida como o encaixe e a subordinao
restritiva das atividades econmicas regidas pela racionalidade do capital aos
valores e aos objetivos societais e ecolgicos.

Para Carlo Vercellone, vrios fatores explicam essa virada.As desiluses polticas
ligadas ao esgotamento do ciclo das lutas nascidas em 1968 e os ensinos tirados do
afundamento dos sistemas planificados do scoialismo rela que tiveram,sem
duvidas,um papel importante.
Mas o impacto decisivo veio da interpretao da evoluo do capitalismo que, sob
efeito combinado das polticas de desinfleo competitiva eda revoluo
microeletrnica,conduziram a disperso da sociedade do trabalho
Foi o fim irreversvel do modelo fordista do pleno emprego e,com ele,da
centralidade da classe operaria como sujeito histrico do projeto de emancipao do
assalariado.Disto,decorre um dualismo econmico e social cada vez mais forte entre
uma elite de trabalhadores qualificados,apegados a sua empresa e beneficioo da
seguridade do emprego, e uma massa crescente de desempregados e de
trabalhadores desqualificados.
A refelexo de Gorz sobre o sentido e os desafios dessa evoluo leva a um projeto
de socieddae que se prope suprimir o dualismo regressivo garantido/no garantido
para substitui-lo ,como disse Denis Clerc, por uma sociedade dualista de outra
natureza.

Uma sociedade em que a empresa da esfera da arcionalidade econmica o


trabalho heternomo e da necessidade seria drasticamente reduzida, graas
notadamente uma reduo generalizada do tempo liberado, a favor da expanso de
uma sociedade dotempo liberado assegurando o desenvolvimento do trabalho
privado por si e das atividades autnomas no mercantis.
O ensaio de Marie-louise duboin-mon, analisa a posio de Gorz em relao ao campo
da moeda,dovalor moenetario.
Para Gorz, se o valor de troca, o preo no pode ser determinado pelo
mercado,(...),devem ento ser fixados ex ante por um contrato cidado entre
consumidores,empreendedores e poderes pblicos(...).O modelo distributivista tem
sem duvidas o grande emritode por em evidencia o carter anacrnico da forma valor,ou
seja,da forma dinheiro,da forma mercadoria,assim,do capitalismo.
Gorz explica esta economia distributivista:
A diviso do trabalho orgaizada na economi distributiva por seus atores mesmos,
para que essa cooperao lhes permita economizar seus esforos,e no mais pela
dominao capitalista.Quando o acesso as riquezas partilhadas uma renda social ( a
no o dinheiro ganho ),os interesses em jogo nada tm em comum com as relaes
mercantis.No.a alocao de uma renda individual, salario de autonomia, no impede de
forma nenhuma o desenvolvimento de redes cooperativas de auto-reproduo,pois um
contrato pode ser proposto por um coletivo que se auto-organiza(...).
Um ultimo ponto sobre o qual estamos de acordo:
O que permite no permite o dessespero, so as inmeras EXPERIENCIAS DE
ECONOMIAS PARALELAS E DE COOPERATIVAS detodosos tipos9por exemplo,as
AMAP-associao para segurana agrofamiliar), em particular aquelas que, usando as
MOEDAS PARALELAS,dazem refletir as verdadeiras riquezas,porque elas preparam a
porta de sada.

10) Teoricos da America latina

=.Mario Pedrosa
Iniciaremos esta parte de nosso ensaio sobre os tericos e as teorias da
autogesto socialista, com o pensamento de Mario Pedrosa,pioneiro destas ideias em
nosso pais.
Todavia, a fonte na qual M.Pedrosa foi beber, foi o pensamento de Rosa
Luxemburgo*.Portanto, importante traar algumas ideias sobre a mulher com quem
Pedrosa se despediu do europesmo,como Ele costumava falar.

ROSA LUXEMBURGO (greve de massas e autogesto )


Entre os tericos da II Internacional (1889-1919) Socialista, Rosa foi a nica a
defender o socialismo baseado na autodeterminao dos trabalhadores, isto , na
autogesto social.Para Rosa, o socialismo implica o controle dos trabalhadores no
conjunto da vida social.deste modo,Ela retoma a via de Marx,e estabelece um filo
Marx-Rosa, que no campo da prxis revolucionaria da autogesto,corresponde ao filo
Comuna de Paris Comuna de Gdansk,como reatualizao (D.Bensaid) da
autogesto como contedo do socialismo.
Na concepo de Rosa, o socialismo deve relacionar a socializao dos meios
de produo e a liberdade individual.Rosa retoma Marx: O triunfo do socialismo
implica o pleno desenvolvimento do individuo.a principal caracterstica da concepo
socialista luxemburgiana a autogesto coletiva da vida social.
Oskar Negt afirma que
como quer que definamos as formas de organizao que se orientam para a
autogesto, a autodeterminao e o controle da democracia pelos operrios,
elas so em toda sua multiplicidade formas de emancipao dos oprimidos,
dos explorados e dos deserdados deste mundo, caracteristica de todo um
perodo histrico. Partidos ou outras organizaes que no tenham como
fundamento e como parte constitutiva deles abandonam a via da democracia
proletria.deste ponto de vista, ROSA LUXEMBURGO FORMULOU UM
PROGRAMA HISTORICO QUE PERMANECE ATUAL AT OS DIAS
DE HOJE (grifo nosso).
Sobretudo, aps a derrocada do socialismo estatal, na Rssia e Leste da
Europa, aps o fracasso dos regimes neoliberais pelo mundo afora, e, a perspectiva
estratgia aberta ao socialismo autogestionario, mais fortes ficam as palavras de Negt
em relao vigncia da obra de Rosa.

Dualidade de Poder e Hegemonia


Segundo Norman Geras O pensamento de Rosa engloba um conceito de duplo
poder, embora de forma embrionria. No perodo de luta de classes,domina a tendencia
para cada ao de massas transbordar os seus objetivos iniciais e gerar outras
reivindicaes e lutas.Deste modo,supera-se,na pratica da greve poltica de massas, a
diviso entre a luta poltica e a luta econmica. A greve torna-se uma arma poltica.
Por exemplo, foi o que ocorreu no Bltico de Gdansk, na Polnia, em agosto de
1980. O sentido global da estartegia de Rosa visava, atravs da luta de massas, uma
situao em que se pusesse a questo da transio para o socialismo. na noo de
greve de massa que a essncia positiva do duplo poder se manifesta.Vejamos como
Rosa definia este tipo de greve,e,que papel tinha em sua estratgia revolucionaria.
A Luxemburgo dizia que,num perodo de lutas de classes, h uma tendncia
para que toda a ao de massa transborde seus objetivos imediatos e gere outras
reivindicaes.assim,supera-se a barreira que o capital ergue entre luta econmica e luta
poltica.As reivindicaes econmicas e polticas convergem.Os conflitos parciais se
generalizam.desenvolve-se uma dinmica em que as lutas parciais,as preocupaes
imdeiatas se unificam num desafio revolucionrio ordem vigente. Adiante veremos
como Joo Bernardo fala das lutas ativas e coletivas e, I.Meszros de lutas alm do
capital.
Essa estratgia , num sentido global , projeta uma situao caracterizada pela
dualidade de poder, pondo em cena a questo da transio socialista. na noo de
greve de massa que o duplo poder foi teorizado por Rosa.Mtodo de ao das massas e
forma de luta revolucionaria dos operrios, a greve de massa era uma forma de libertar
suas energias.Rosa dizia os operrios tm de se reunirem em massa... sair das fbricas,
das oficinas, das minas e das fundies,tm de superar a runa a que esto condenados
sob o jugo cotidiano do capital.
Para Rosa, o socialismo exige o controle dos trabalhadores sobre o conjunto do
processo social,isto ,a autogesto social.isso s possvel pela ao direta e pela
participao dos trabalhadores em movimento de amplitude e de vigor sem precedentes.
Assim, Rosa teoriza para um perodo de convulses sociais ,de revolues;mas,
tambm desenvolveu sua prxis em conjunturas de calmaria e, em vrios paises com
formaes sociais diversas (Polnia,Alemanha e Russia).
Para Rosa, a revoluo social tem as suas prprias formas especificas para os
seus objetivos exclusivos e,so essas formas e objetivos que se contrapemr ao poder
institucionalizado da burguesia, construindo uma contra-hegemonia. Atravs de suas
aes, os trabalhadores fundam suas prprias instituies autnomas, com base na
democracia direta e operaria; os Conselhos operrios, que so a base do pdoer contra-
hegemonico.
Rosa Luxemburgo detectou estas formas no prorpio processo de luta de
masas.Escreveu em 1906:
durante os perodos pacficos e normais do desenvolvimento da sociedade
burguesa...a luta poltica no conduzida pelas massas de forma direta, mas
em correspondncia com a forma do Estado burgues,de modo
representativo[...] logo que se inicia um perodo de luta revolucionaria, logo
que as massas surgem no teatro de batalha[...] cessa a forma parlamentar
indireta de luta poltica.

Essa a dialtica de todas as lutas autnomas e autogestionrias,no arco


histrico de mais de um sculo: da Comuna de Paris (1871) Comuna de Gdansk
(1980). Deste modo, no processo da revoluo,cria-se um duplo poder. As
organizaes que a classe operaria funda no curso revolucionrio das lutas ativas e
coletivas, portando antagonismo com os trs eixos do metabolismo social
(Estado,Trabalho e Capital), lutas Alm do Capital.podemos caracterizas estas
organizaes do seguinte modo:
1) as organizaes permanentes partidos, sindicatos, existentes nos perodos
normais;
2) as organizaes que surgem no perodo de crise comits de fabrica, de bairro,
sovietes,etc.
O que caracteriza a revoluo social que estas organizaes destinam-se a
dirigir a luta revolucionaria e a constiturem rgos de poder dos trabalhadores.da
distribuio de seus poderes,depende a forma futura que tomar o socialismo.essas
praticas de organizao,prefiguram a organizao da sociedade socialista ainda no seio
da sociedade do capital.
Rosa via esboadas na greve de massa as formas da democracia operaria
necessria para superarr o Estado burgus. Pensando em Lnin, N.Geras afirma: neste
sentido, pode-se dizer que o conceito de greve de massas o Estado e Revoluo de
Rosa Luxemburgo. Todavia,o prprio Geras,nota que Rosa s falava da manifestao
direta e democrtica do poder operrio no processo das aes revolucionarias de
massa.e,no falava ainda da natureza e da importncia dos rgos da democracia
operaria das formas institucionais do poder operrio.Pelo menos,em sua obra Greve de
Massa,Partido e Sindicato,de 1906, no h referencias aos Sovietes ou conselhos
Operrios; mas, no Programa da Liga Spartacus,Rosa os coloca como centro do poder
dos trabalhadores.
Para Rosa, o poder da burguesia s podia ser destrudo pelas mais vastas e
profundas mobilizaes dos trabalhadores.cumpre assinalar a nfase que ps na
democracia socialista,baseada em rgos genunos da democracia operaria, como os
conselhos de trabalhadores e as aes de massa. Esses Conselhos desarticulam e
enfraquecem o poder do Estado capitalista, pondo de um modo material a questo de
uma forma alternativa de poder. O poder do capital no pode, ento, tolerar por muito
tempo uma situao de luta de massas em que se desenvolvem instituies de
democracia operaria. A dualidade de poder e o seu prolongamento enfraquecem o poder
vigente. A burguesia utiliza todos os meios para liquidar o poder revolucionrio.
Rosa dizia que O socialismo no ser institudo por decreto,nem poderia s-
lo,no pode ser estabelecido por nenhum governo por mais socialista que seja.O
socialismo criao das massas,tem de ser obra de todos os operrios. Segundo
N.Geras,
Rosa Luxemburgo faz a distino entre um socialismo que seria institudo
por uma vontade burocrtica e um socialismo que as massas conquistam
atravs de suas vitrias e derrotas,dos seus erros nas aes e dos seus erros de
julgamento,mas tambm por novas aquisies polticas e intelectuais: um
socialismo que institui o controle consciente e coletivo sobre o conjunto do
processo social.
Enfim, a autogesto coletiva da vida social. Rosa fala, ento, da educao
poltica dos trabalhadores como base indispensvel da hegemonia operaria e da
aprendizagem poltica intensa,necessria para se estar altura das tarefas gigantescas
de uma revoluo social. Deste modo, o socialismo autogestionario implica a
hegemonia operaria,atravs de um longo processo de lutas,com avanos e recuos,no
qual a tomada do poder apenas um mometo culminante,o salto de qualidade.
atravs da mais amppla democracia socialista, baseada em novas instituies
de democracia direta, que se desenvolver a nova sociedade socialista. Combinando
hegemonia com dominao, no sentido gramsciano,com a ultima subordinada
hegemonia e em processo de extino. Quanto mais desenvolvida for a
hegemonia,atravs de instituies de um poder alternativo,no prprio processo
revolucionrio,menos violento ser o momento da tomada de poder,e mais rpido o
processo de extino do poder politico na transio socialista.
Para Rosa, a conquista do poder, a vitria da revoluo socialista no podem ser
vistas como o ato de um s momento o da toamda do poder -,como confronto
violento. A tomada do poder poltico s pode ser o resultado de um perodo mais ou
menos longo de lutas sociais gigantescas. Ela entende a tomada do poder como um
processo de longa durao: A tomada do poder no pode realizar-se de um golpe,mas
progressivamente,penetrando no Estado burgus,at ocupar todas as posies e defende-
las com unhas e dentes.
A sociedade socialista aparece na concepo luxemburgiana como uma
coletividade de homens responsveis que se autogovernam. Essa concepo socialista
retoma a linha de Marx. Para o autor de O Capital, a revoluo socialista implicava a
libertao da humanidade de toda forma de alienao, de fetichismo e dominao. Uma
revoluo desse porte presupe que o proletariado adquira uma conscincia de classe
autentica no curso de uma luta longa,em que se forma o homem novo capaz de gerir
uma sociedade socialista, baseada no controle social dos produtores associados
livremente e que se forje ainda no interior das velhas relaes sociais capitalistas como
resultado do processo revolucionrio.
A revoluo apresenta caractersticas prprias: em primeiro lugar,deve
transformar e amadurecer a conscincia dos homens,deve ser um processo longo,dentro
da lei do desenvolvimento desigual e combinado,no significando que deva esperar uma
homogeneidade em termos de conscincia do conjunto social. Em Rosa Luxemburgo,
sinnimo de processo revolucionrio.No Congresso de fundao do Partido Comunista
Alemo,ela polemizou com os extremistas; Vocs dizem; ou metralhadoras ou
parlamentarismo. Ns defendemos um radicalismo um pouco mais complexo.No
apenas esse grosseiro ou-ou. mais cmodo,mais simples,contudo uma simplificao
que no serve formao e educao da massa.
Assim,Rosa no se limitava via inssurrecional ou via eleitoral,pura,mas a
uma tenaz sistemtica e progressiva ao de baixo,abrangendo a formao dos
conselhos de operrios e soldados. Dizia: Devemos trabalhar por baixo,isto
corresponde ao carter de massa da moderna revoluo operaria que implica a tomada
do poder por baixo,no pelo alto.
De acordo com esta estratgia, a democracia socialista comea junto com a
destruio da dominao de classe e da construo do socialismo. Para Tony Clif, Rosa
tinha convico de que a democracia operaria inseparvel da revoluo proletria e do
socialismo. Rosa escreveu que
[...]a democracia social no algo que comea somente na Terra Prometida,
depois que os fundamentos da economia socialista foram criados, no
aparece como uma espcie de presente de Natal para as pessoas valiosas que
no inetrregno apoiariam lealmente um punhado de socialistas autoritrios.A
democracia socialista se incia simultaneamente com o inicio da destruio do
poder de classe e da construo do socialismo.Comea no momento da
tomada do poder pelo Partido Socialista e a mesma coisa que a ditadura do
proletariado.
fundamental dizer que, Rosa entendia por ditadura do proletariado o que
atualmente podemos chamar de hegemonia operria,incorporando a terminologia de
Gramsci. Para Rosa, essa ditadura no era a negao da democracia, mas o princpio
da democracia socialista, porque a hegemonia de toda uma classe e no de um partido.
Representa o pleno desenvolvimento da democracia socialista, a mais ampla e ilimitada
democracia, a liberdade de quem pensa diferente. Assim se expressa Rosa:
Sim,ditadura! Mas essa ditadura consiste no modo como se aplica a
democracia e no na sua eliminao,consiste em ataques enrgicos e
resolutos contra as suas relaes econmicas,sem os quais no se realizar
nenhuma transformao socialista.Esta ditadura deve ser trabalho da classe e
no de uma pequena minoria diretora em nome da classe.

E que,
Quando tomar o poder...o proletariado tem de levar a cabo, imediatamente,
medidas socialistas de maneira mais enrgica, mais decidida e sem trguas.
Por outras palavras,tem de exercer uma ditadura de classe no de um partido
ou de uma classe a ditadura de classe significa ditadura sob a forma publica
mais aberta,com base na mais ativa e ilimitada participao da massa do
povo,na democracia ilimitada.

E
O idealismo revolucionrio...s pode manter-se por um perodo de tempo
indefinido por meio de intensa vida ativa das prprias massas,em condies
de liberdade poltica sem limites.
fato conhecido e indiscutvel que sem uma imprensa livre e isenta de
travas,sem o direito ilimitado de associao e reunio,o domnio das amplas
massas do povo totalmente impossvel
Todas essas citaes de Rosa so do seu folheto sobre A Revoluo
Russa.

Sua critica ao Partido Bolchevique est nas melhores tradies do marxismo, do


lema bsico de Marx: Critica desapiedade de todo o existente.
Podemos dizer que a critica de Rosa se dirige ao grupo dirigente da Revoluo
Russa, ao Partido Bolchevique e no Revoluo Sovitica, que ela cantou como uma
revoluo proletria de porte histrico mundial. A estratgia luxemburgista implica,
portanto, a hegemonia dos trabalhadores e revoluo cultural como condies
fundamentais de construo do socialismo.
No Programa da Liga Spartacus, Rosa definiu a autogesto como contedo do
socialismo:
A essncia do socialismo reside no fato de a maioria das massas
trabalhadoras deixar de ser uma massa dominada, para tornar-se uma massa
que vive por si mesma a vida em toda sua plenitude poltica e econmica,em
consciente e livre auto-determinao.Assim, desde as mais elevadas
secretarias do Estado at o menor municpio, a massa proletria ter de
substituir os rgos do poder ultrapassados da classe burguesa conselhos
federais,parlamentso,conselhos municipais pelos seus prprios rgos de
classe, os conselhos operrios e de soldados.Mais do que isto, ter de ser a
massa proletria a ocupar todos os postos, a fiscalizar todas as funes, a
avaliar todas as exigncias sociais em funo dos seus prprios interesses de
classe e das tarefas do socialismo. S com uma constante e ativa interrelao
entre as massas e os seus rgos, os conselhos operrios e de soldados, pode
assegurar a evoluo da sociedade no esprito socialista[...] Numa luta corpo
a corpo, tenaz, contra o capitalismo em cada fabrica e empresa, por meio da
presso direta das massas e das greves, criando os seus prprios rgos
representativos, os operrios podem ascender ao controle sobre a produo
e,por fim, direo real[...] A classe operaia s pode adquirir todas [...] as
virtudes civicas socialistas, assim como, a capacidade de gerir as operaes
socialistas pela sua prpria atividade, pela sua prpria experincia [...] A
socializao da sociedade s pode ser realizada pela tenaz e infatigvel luta
da classe operaria em todas as frentes[...] A emancipao da classe operaria
ser obra da prpria classe operria.

Aqui, neste fecho, Rosa retoma as ideias de Flora Tristan e de Karl Marx sobre a
autoemancipao dos trabalhadores. Para N.Geras, a sua concepo reivindica a
liberdade para uma pluralidade de tendncias e partidos no seio da ditadura do
proletariado.
Conclumos com Kurt Lenk:
O conceito de revoluo em Rosa pode caracterizar-se por: um alto grau de
instruo politica e amplas lutas com participao das mais amplas massas,
inclusive das no-organizadas, um certo grau de maturidade das condies
econmicas e polticas ,e um marcado e intenso sentimento de classe,que tem
que ser transformado em conscincia de classe. Uma organizao que deve
desenvolver-se raiz da luta revolucionaria e cujas aes expressam o
comeo da runa da sociedade burguesa.Uma greve geral de massas que
inicia a revoluo e deve resultar das prprias lutas sociais.

Socialismo, Nao e Hegemonia Cultural


Rosa foi vista como uma internacionalista que nunca levou em conta a questo
nacional. Em 1989,visitando a Polnia, para intercambio com militantes de
Solidarnosc,pude ver muito bem essa distoro da obra de Rosa. Em visita a um velho
militante socialista polons,fundador do antigo Partido Socialista , xxxxx, nos dizia que [X1] Comentrio: Conferir nome do
autor.
no apreciavam a obra de Rosa, porque ela nunca deu importncia as lutas nacionais
polonesas. O mesmo sentimento encontrei entre os metalrgicos de Cracovia, Nowa
Huta, ao lhes apresentar o livro que tinha escrito ,intitulado Rosa Luxemburgo e
Solidarnosc (editora Loyola), com a hiptese de que a prxis dos operrios poloneses
portavam afinidades com as ideias de Rosa sobre a greve de massas.
Contudo, encontramos o sentimento nacional em uma serie de textos que Rosa
escreveu em 1908-1909,publicados na revista terica da SDKPil. Em sua integra,estes
textos foram publicados na Frana apenas em 2001 ( la question national et
lautonomie-2001), Claudie Weill, na introduo, o define como O elo que faltava na
obra de Rosa:
[...] um texto maior nas reflexes de Rosa Luxemburgo sobre a questo
nacional, um pivot conhecido sobretudo atravs da critica de Lenine,pouco
compreensvel se no temos o original.Ele permite,assim,corrigir a viso de
Rosa Luxemburgo como internacionalista intransigente o que
incontestvel que teria sub-estimado,mesmo desconhecido o fator nacional.

Nesta obra, encontramos definies luxemburgistas sobre o socialismo,desta


vez,relacionado a questo nacional, ao territrio. Rosa analisa o surgimento histrico da
auto-administrao em vrios Estados modernos: Frana, Inglaterra, Alemanha, ustria,
Rssia e Polnia. No Capitulo IV, intitulado Centralizao e Auto-Administrao,
Rosa explica a dialtica entre capitalismo, cidade, industria, cultura e Estado.
Sigamos o raciocnio de Rosa Luxemburgo:
O centralismo dos Estados modernos vem acompanhado necessariamente do
burocratismo.No Estado medieval,no sistema de servido,as fun~es pblicas
decorriem da propriedade fundiria,sob a forma de impostos.O absolutismo no fim da
Idade-media separou as funes pbicas da propriedade do solo,criando uma nova
categoria social: os funcionrios da Coroa.
A auto-administrao social torna-se,ento, uma adaptao das funes concentradas no
Estado as necessidades locais e induz a participao da populao. ,deste modo,uma
das formas de democratizao do grande Estado centralizador. [X2] Comentrio: citao?

O centralismo estatal-administrativo e burocrtico foi introduzido na Frana


pelo absolutismo sob o Ancien regime.A supresso da independncia
comunal das cidades,em particular Paris...criaram no tempo de Richelieu um
potente aparelho de Estado.
A Grande Revoluo agiu em dois sentidos:
1- aboliu totalmente os restos territoriais feudais;
2- no lugar de uma administrao provincial burocrtica designada pelo
governo,ela criou uma administrao local com representantes eleitos pela
populao.
Todavia,Napoleo de uma penada aboliu toda participao da populao na
administrao local e transferiu a totalidade do poder para as mos de
funcionrios designados pelo governo central: prefeito,vice-prefeito e
delegado.
As grandes tradies da Comuna de Paris, de 1793 a 1871, trouxe um medo
profundo as camadas do poder dominante. Na Terceira Republica, a
populao voltou a participar na administrao,transformando as comunas e
departamentos de instrumentos exclusivos do governo central at aquele
momento, em rgos da auto-administrao democrtica.

Especialmente no captulo V (A Nao e a Autonomia) e no captulo VI ( A


Autonomia do Reino da Polnia ), Rosa relaciona a questo do socialismo com o
desenvolvimento da sociedade capitalista, principalmente, no campo cultural e no da
auto-administrao nacional.
Lembra-nos,sem duvidas, as ideias de Gramsci sobre a hegemonia cultural, de forma
bem mais clara que em A Liga Spartacus. Sigamos seu raciocnio dialtico:
Por um lado,
O capitalismo transforma a vida e as formas sociais ,dos fundamentos
materiais at a cpula,as formas culturais.Produz toda uma serie de
fenmenos econmicos inteiramente novos:a grande industria,a produo
mecanizada,a proletarizao,a concentrao da propriedade,as crises
industriais,os trustes capitalistas,a industria moderna domicilio,o trabalho
das mulheres e das crianas, etc.

Por outro, ao mesmo tempo, o capitalismo produziu uma nova cultura,um novo
centro da vida social emergiu: a grande cidade,assim como uma nova classe social: a
inteligensia profissional.
Da mesma forma, a sociedade capitalista tem necessidade da sade,da educao
e da formao profissional, a comunicao,as artes.assim, O capitalismo cria uma
cultura espiritual nova e a cultura espiritual da sociedade burguesa constitui em si-
mesma um ser vivo e autonomo at certo ponto.
Aqui, Rosa chega a sua viso da democracia: no somente as formas polticas
modernas, a democracia, o parlamentarismo, mas tambm uma vida pblica aberta,
uma troca aberta de vises e de concepes contraditrias, uma vida intelectual intensa
que permitea luta de classes e dos partidos (grifo nosso).
E,a questo central:
O capitalismo no cria esta cultura no ter ou no vazio,mas em um territrio
dado,em um ambiente social definido,em uma lngua precisa,no quadro de
certas tradies,enfim,em condies nacionais precisas. [...] esta cultura se
transforma em cultura nacional dotada de uma existncia e de um
desenvolvimento que lhes so prprios.

Para Rosa, a tendncia do desenvolvimento contemporneo vai no sentido de


uma comunidade sem cessar crescente da cultura internacional. Mas, sobre o fundo
desta cultura burguesa altamente cosmopolita,a cultura francesa se distingue claramente
da cultura inglesa,a cultura alem da cultura dinamarquesa,a cultura polonesa da cultura
russa,como de tantos outros tipos separados.
E, o sistema capitalista leva todos os Estados modernos ao desenvolvimento
histrico da auto-administrao local. O que singular cada Estado
[...] a especificidade da vida nacional-cultural, que cria uma esfera de
interesses comuns especficos ao lado dos interesses puramente econmicos e
sociais. A auto-administrao nacional conforme ao esprito da democracia se
funda na representao da populao e seu poder legislativo local nos
quadros das leis do Estado,para satisfzaer as exigncias scio-economicas
nacionais e nacionais-culturais.

Numa perspectiva histrico-dialetica, estas instituies do e o proprio


desenvolvimento capitalista,formam um fenmeno com duas faces:
Os meios do desenvolvimento e da dominao de classe da burguesia so ,ao
mesmo tempo ,os meios para reforar o proletariado enquanto classe em sua
luta pela emancipao e pela abolio da dominao da burguesia(...).estas
mesmas instituies democrticas,este mesmo parlamentarismo burgus so,a
um certo nvel, uma escola indispensavel maturao politica e de classe
do proletariado, uma condio para organiza-lo em um partido social-
democrata,para o preparar para luta de classe aberta [grifos nossos].

Para Rosa, a mesma escola popular,a educao elementar,que servem


burguesia para ter braos adequados para o trabalho, para criar o consumo de massa,
no campo da cultura espiritual, esta mesma escola e esta educao tornam-se
instrumentos intelectuais de base do proletariado enquanto classe revolucionaria(...),no
sentido do saber como alavanca da luta de classe,como conscincia revolucionaria das
massas trabalhadoras.
Enfim,para Rosa:
O socialismo que relaciona os interesses operrios enquanto classe ao
desenvolvimento e ao futuro da humanidade como grande fraternidade
cultural produz uma finidade particular entre a luta proletria e os interesses
da cultura em seu conjunto e no seu conjunto,engendra o fenmeno
aparentemente contraditrio e paradoxal que faz do proletariado consciente
hoje em todos os paises o porta-voz mais ardente e o mais idealista do saber e
da arte desta mesma cultura burguesa na qual ele hoje o bastardo deserdado.

No capitulo VI,Rosa retoma suas ideias ,agora,em relao a Polonia.


Inicialmente,valoriza a disputa de hegemonia , contrapondo-se ao anarquismo:
nosso proletariado deve simultaneamente tomar distncia da desiluso e da
indiferena anarquistas frente as formas burguesas de desenvolvimento sob
pretexto que elas so burguesas(...). Compreender que a libertao da
dominao de classe no possvel que graas ao desenvolvimento o mais
amplo e mais livre que seja, graa uma luta de classe cotidiana, tenaz,e
tirando desse desenvolvimento todos os instrumentos e todas as perspectivas
de vitoria.

A liberdade cultural e nacional que servir nossas camadas possuidoras de


einstrumentos eficazes ao servio de seus interesses de classe,aportar ao mesmo tempo
ao proletariado todo um arsenal de armas forjadas para sua contra-ofensiva de classe.
Enfim, a autonomia territorial pode, em diferentes graus,constituir um avano
da mesma ordem,segundo as diferentes formas que tomaro as instituies do governo
local.
Agora, sim, podemos adentrar nas ideias de Mario Pedrosa, a quem dedicamos
um estudo mais aprofundado no livro Mario Pedrosa: um tipo curioso*.

MARIO PEDROSA: A Revoluo Ativa de Massa e a Autogesto

Em Mario Pedrosa vamos encontrar elementos fundamentais sobre o conceito


gramsciano de revoluo ativa, em sua obra de 1966, A Opo Imperialista) , mas
que retoma ensaios da poca em que estava exilado nos EUA.A Opo Imperialista
traz um capitulo intitulado Reformas contra-revolucionarias . Nele, Mario assinala
que ,
O FATO DECISIVO, realmente, de toda essa poca que se poderia
chamar de nazi-rooseveltiana foi a transformao no somente poltica mas
econmica por que passou o mundo.No se pode coomprender na sua
essncia e na sua dinmica o complexo scio-economico capitalista ocidental
de hoje sem a conscincia clara e objetiva das transformaes iniciadas com a
grande depresso de 1929-30 e o Plano Marshall de 1947. Que se passou
ento? O capitalismo liberal, impotente para vencer a depresso e repor em
marcha o mecanismo produtivo e econmico mundial, cedeu lugar a regimes
transitrios e totalitarios,cujo obscurantismo politico,moral e cultural
revelava profundo retorcesso da propria civilizao ocidental. O terrivel
paradoxo foi que,no plano economico e financeiro,aqueles regimes
quebraram varias ortodoxias intocaveis do capitalismo classico decadente. A
epoca atual provem,em grande parte,daquele paradoxo.Conhece-lo
indispensavel a comprenso dos acontecimentos e de muito dos traos
caracteristicos de agora. o que nos propomos demonstar neste capitulo.
A mais importante daquelas ortodoxias era a irremovibilidade do padro
ouro como fundamento sine qua non de todas as transaes
comerciais,financeiras do sistema capoitalista dentro e fora das fronteiras
nacionais dos paises.Nos Estados Unidos,Roosevelt quebrou o padro
monetario do dolar,desligando-o do ouro,interveio nos bancos para contorola-
los,lanou,segundo a receita keynesiana,vasto programa de obras pblicas em
pleno recesso,para absorver o desemprego em amssa,enquanto na Alemanha
Hitler,sem um tosto em ouro nos cofres do Tesouro Nacional,cria varias
especies de marcos,controla bancos,poe fbricas em funcionamento,mesmo
sem levar em conta sua rentabilidade contabil e milhes de trabalhadores
desempregados a abrir e pavimentar estradas para os futuros
exercitos,contentando assim militares e oficiais ociosos e dando satisfao
aos grandes magnatas do ferro e do ao, do carvo, da industria quimica e da
eletricidade que o financiaram e cuja febril atividade encheria o pais de
quarteis, depositos, fbricas, minas, armamentos de toda sorte. A Alemanha
sai da depresso,apresenta-se forte,com aparencia de prospera.Hitler fez
reformas, Mussolini fez reformas,mas essas reformas tinham
socialmente,culturalmente,politicamente carater anti-historico e
obscurantista:eram o que me permiti,ento,chamar de "reformas contra-
revolucionarias.

Em nota de p-de-pagina Pedrosa acresce,


A ascenso da classe operaria,que se fazia em nome dos direitos
democraticos que ela ia conquistando, um a um, numa luta de sacrificios
durante mais de um seculo, deixou de ser sua obra, para o ser de um punhado
de especialistas e funcionarios, de burocratas que em nome dela decidiam de
tudo, sem consulta-la. Ao contrario, mistificando-a. Eis a essencia das
reformas contra-revolucionarias da epoca. Eis ai porque fascistas e nazistas
puderam organizar partidos de estrutura analoga a dos partidos comunistas e
com tais metodos e instrumentos puderam fazer amplas incurses no seio do
movimento operario,com os resultados que se sabe.

Para Pedrosa, as reformas contra-revolucionarias definiram toda uma epoca


entre as duas guerras.Pedrosa define as alternativas politicas que surgiram nessa epoca;
de um lado,"a soluo fascista", que
consistiu precisamente em deformar a economia do mercado livre,mas ao
preo da extirpao das instituies democraticas. Os fascistas criaram as
moedas dirigidas,intervieram no mercado de trabalho para impedir as greves,
controlaram os bancos e, finalmente, para repor em marcha a economia,
entregaram-se ao surto armamentista que constituiu o grande mercado para as
foras produtivas, inativas ate ento por falta de escoadouros. Essa foi a
reforma contra-revolucionaria dos paises fascistas totalitrios.

Em relao a Unio Sovietica,Pedrosa afirma:


Essas economias que prolificaram ate a Segunda Grande Guerra, tiveram a
sua expresso mais acabada sob o fascismo italiano e o nacional-socialismo
alemo. No foram, contudo, liquidadas com a guerra. Dariam lugar a
formaes idnticas, embora em graus de acabamento diferentes e de origens
as vezes opostas. Hoje temos, sob outras formas politicas e com outra
ideologia, sistemas economicos semelhantes. A economia mais acabada nesse
sentido a da prpria Unio Sovietica[...].
Na Russia, deu-se uma evoluo no serntido da totalitarizao da economia
e da sociedade[...]. O Estado tornou-se senhor de todos os meios de
produo.Nesta base,uma nova casta dominante surgiu[...]Todas as formas de
organizao economica e politica perderam a sua autonomia, integradas no
aparelho estatal.No existe ali nenhum contrapeso de controle democratico.O
estado dispe ao mesmo tempo da totalidade do poder economico e do poder
politico (PEDROSA, 1948).

Pedrosa analisa o resultado dessa situao, no campo teorico,


Nos partidos comunistas imperavam o monolitismo safaro e, no fundo,
retrogrado do stalinismo, a mais terrivel estreiteza teorica e uma combinao
do oportunismo com um sectarismo organizatorio do mais completo feitio
totalitario. A Unio Sovietica fazia ento uma politica de feroz realismo
nacional russo nos paises ocupados (amigos ou inimigos) e no jogo com as
outras grandes potencias de um oportunismo realmente digno delas. Os
socialistas(ou comunistas) restantes pelo mundo, quando lucidos, eram
impotentes; quando carreando ainda poderosas massas trabalhadoras atras
deles, no tinham independencia em face de seus respectivos governos
nacionais e ainda mais rotineiros e sem principios,no seu oportunismo
visceral, que os stalinistas. Da resultou a impotncia terica generalizada no
mundo imenso do socialismo numa prtica, consequentemente,
inconscistente, contraditria, do mais baixo empirismo.
[...] Quanto a Unio Sovietica,[...] retomava sua politica de intensificao
da industria pesada,tentando aqui e acola conquistar novas posies no
exterior,na base da mesma velha estrategia de antes da guerra e de velhas
formulaes teoricas num mundo que assistia ao desmentido mais acabado as
perspectivas socialistas,comunistas,marxistas quanto ao futuro do
capitalismo; [...] O mundo est pagando caro essa impotncia terica.

Mario Pedrosa expo,em detalhes o que chama de "arsenal totalitario das


reformas contra-revolucionarias":
Sob o regime das reformas contra-revolucionarias
institucionalizadas,inclusive nos paises democraticos ocidentais,a eficiencia
produtiva aumentou,a racionalidade economica cresceu,a cultura chegou as
"massas",mas tudo em detrimento do homem,do homem com seus fins e
aspiraes contraditorias,substituidos esses por jornadas de trabalho cada vez
mais curtas mas infinitamente mais intensas e um dia cada vez mais cheio de
mata-tempos,distraes e divertimentos organizados,sistemas de informaes
crescentes em quantidade e relativa diminuio do valor,propaganda das
vantagens da melhor democracia,da melhor cerveja,do melhor calista,do
melhor negocio,da melhor igreja,do melhor cinema,circo ou jogo,do melhor
politico,do melhor campeo,do melhor governo,do melhor trabalhador ou
patro,do melhor doutor,da melhor me,etc,etc.O melhor no pior tambem
objeto de admirao.Todas as manifestaes culturais de nosso tempo
participam desse otimismo,desse enfechamento sobre o presente - o opio do
povo.

Conclui Pedrosa,"As categorias sociais desaparecem,o homem atomizado; o


ideal da democracia, da boa, isto , representativa. Esse ideal foi criado pelo fascismo.
o que impera nos Estados Unidos". Essa a essencia do neocapitalismo; neste contexto,
qual o problema fundamental? Como repensar a estrategia revolucionaria?
Diz-nos Mario Pedrosa: "Por vezes,de certos circulos inesperados veem
luminosas observaes que ajudam a colocar o problema fundamental - de paises
subdesenvolvidos e massas trabalhadoras com suas aspiraes sociais- em face do
neocapitalismo,quer dizer,o problema da reforma ou revoluo." Mario fala da obra de
E.Staley, "O Futuro dos Paises Subdesenvolvidos"(1963). Entretanto, ser na obra de
Myrdall,"An International Economy"(1956) que Pedrosa extrair elementos
fundamentais. Assim, Myrdal situa a questo:
[...]mas, mesmo assim, as reformas no so provavelmente dadas as pobres
massas populares s por causa da racionalidade e benevolncia das classes
privilegiadas; como sempre previamente na histria,as reformas tm de ser
conquistadas pela luta, vencendo a resistncia tenaz da maioria dos que tm
aceitar sacrificios. E sem diminuir a importancia dos conselhos e da presso
de fora, como exemplificados pelos vrios grupos das Naes Unidas, a luta
decisiva tem de ser travada no terreno domstico. As reformas tero de vir
como resultado de um processo poltico de eficcia crescente.

Comenta Mario:
que esssas lutas, acarretam em si mesmas uma preparao,um exercicio
educacional insubstituivel na democracia [...] Esse processo cumulativo em
carter e, do ponto de vista oposto, nada mais apto a fortalecer a base para
os frgeis comeos da democracia poltica nos pases no desenvolvidos do
que embarcarem com sucesso nas reformas necessrias para quebrar as
desigualdades sociais e econmicas.

Essa viso de Mario Pedrosa est inspirada nos trabalhos de Andre Gorz,
basicamente em "Estrategia Operria e Neo-Capitalismo"(1964): "Num livro sob muitos
aspectos novo e construtivo pela originalidade e sobretudo pela maneira de repor o
problema capital da estrategia da revoluo socialista em nossa poca[...]".Vamos
seguir o pensamento de Pedrosa:
O problema da revoluo nos paises subdesenvolvidos diferente,sem
duvida,do da revoluo nos paises de alta industrializao. A diferena
maior,quanto a forma,est em que a velha alternativa entre a luta pelas
reformas e a insurreio armada deixou praticamente de existir,
principalmente nos velhos paises altamente industrializados do Ocidente.
Mario fala do desenvolvimento tecnologico e as mudanas no que Marx
chamava de "assalariados produtores".

A revoluo socialista opoe ao consumismo alienante do neocapitalismo


outra concepo das necessidades. uma gigantesca tarefa social,
econmica, cultural, tica, desalienante[...]. A reforma revolucionria nos
paises de neocapitalismo a transformao deste,por dentro,em
socialismo.Este se vai impondo e introduzindo na estrutura daquele ate
transforma-lo,fazendo dele o seu contrario.As nossas reformas so a
revoluo dos subdesenvolvidos- revoluo mais ampla e menos
definivel,mais contraditoria e complexa,mais impetuosa e mais plebeia,mais
popular,isto ,menos homogenea socialmente...Ela tambem visa a dar as
populaes que vivem no interior de seu territorio um sentimento novo,o de
uma participao coletiva num todo nacional cultural enfim acabado ou
completo,capaz de falar,entender-se,comunicar-se com o mundo num acento
que lhe proprio.

Mario Pedrosa: Um projeto nacional Cultural


O Poder Nacional no pode antecipar-se ao estado fluidico da
propria sociedade,e s alcancar a plenitude de sua fora e de
sua coeso quando aquelas classes
( as classes oprimidas)encontrarem,dentro do todo nacional,o
seu lugar ao sol.
(Mario Pedrosa)

Retomando o livro de Mario Pedrosa, A Opo Imperialista, vemos que Mario


volta a um texto de 1948( Os socialistas e a guerra),em que analisa os fenomenos do
nazi-fascismo,do americanismo-fordismo,do stalinismo,emprega o conceito de
reformas contra-revolucionarias, para chegar a definio das revolues nos paises do
chamado Terceiro Mundo.
Vimos que este conceito tem afinidades com o gramsciano de Revoluo
Passiva,elaborado,sobretudo,no seu estudo sobre o americanismo,no QC numero
22(1934).Gramsci pe o americanismo como uma das formas de revoluo passiva,e
pensa o seu corolario: a revoluo ativa socialista.
Tal qual Gramsci nos anos 30,Pedrosa nos anos 40,tenta repensar a questo da
revoluo no neocapitalismo,incluindo a questo dos paises subdesenvolvidos.O velho
debate Oriente x Ocidente. Pedrosa caracteriza o pensamento marxista e socialista no
quadro da revoluo passiva imperante em todo o periodo entre as duas guerras .
Nos partidos comunistas imperavam o monolitismo safaro e,no
fundo,retrogrado do estalinismo,a mais terrivel estreiteza teorica e, uma
combinao do oportunismo com um sectarismo organizativo do mais
completo feitio totalitario...Dai resultou a impotencia teorica generalizada no
mundo imenso do socialismo numa
pratica,consequentemente,inconsistente,contraditoria,do mais baixo
empirismo.

Para Pedrosa, a URSS agia na


base da mesma velha estrategia de antes da guerra e de velhas fornulaes
teoricas num mundo que assistia ao desmentido mais acabado as perspectivas
socialistas, comunistas, marxistas quanto ao futuro do capitalismo; este era,
com efeito, capaz de novo surto de desenvolvimento de suas foras
produtivas,por uma notavel transformao de suas estruturas. O mundo est
pagando caro essa impotencia terica[...] No h, assim, por que se admirar
se se d com um mundo na mais formidavel revoluo tecnologica e mesmo
cientifica de que h memoria - mas engolfado ainda num primarismo politico
positivamente indecente.

Dai,a necessidade de repensar a questo da transformao social. Assim,Pedrosa


afirma que o problema fundamental -de paises subdesenvolvidos e massas trabalhadoras
com suas aspiraes sociais- em face do neocapitalismo, o problema da reforma ou
revoluo.
Citando Myrdal, Pedrosa avana sua reflexo:
(...) Como sempre na Histria, as reformas tm de ser conquistadas pela
luta,vencendo a resistencia tenaz da maioria dos que tm de aceitar
sacrificios. Ento, a luta decisiva tem de ser travada no terreno domstico. As
reformas tero de vir como resultado de um processo politico de eficacia
crescente.

Diz Pedrosa, Assim, em lugar de condenar as lutas pelas reformas como um


mal,o economista europeu socialmente consciente tende a considera-las como
inevitaveis e tambem fecundas. que essas lutas,diz ele,acarretam em si mesmas uma
preparao,um exercicio educacional insubstituivel na democracia.Myrdal que no
marxista,aproxima-se aqui do velho Marx na sua maneira propedeutica de educar
democraticamente os povos e os homens na ao e pela ao.
S reformas dessas que no so contra-revolucionarias,mas reformas
revolucionarias. Para os subdesenvolvidos no h outras. Pedrosa afirma a
necessidade, a fecundidade da interveno ativa do povo na efetivao das reformas
verdadeiras, estruturais; sem essa interveno no podero elas vingar[...]. A
experincia histrica tem mostrado que ao concorrer para a melhor organizao dos
elementos de defesa e afirmao social das camadas populares e proletarias da
sociedade vai a luta de classes perdendo em violncia, em virulncia, em exploses
sbitas, como outrora,de rebeldes famintos, de escravos oprimidos,de negros
perseguidos (nos EUA e na Africa,e outrora no Brasil, no Haiti) e a se desenrolar em
processos de luta organizados, bem delimitados, viris mas disciplinados.
Adiante define que As reformas de estrutura de que tanto se fala,precisam de
dois requesitos para assim serem definidas: participao direta,cooperao ativa na sua
execuo,do povo,das camadas de rendas baixas e medias,ao contribuirem para
controlar o consumo dos ricos,e trmino da explorao das massas proletarias pelo
imperialismo.
Aqui, Pedrosa aproxima-se da definio de hegemonia.Citando o velho
marxista Karl Kautsky,do Caminho do Poder(1909):
a revoluo proletaria seria dirigida - nos paises de alto desenvolvimento
naturalmente- por uma classe operaria senhora de seus destinos, tendo o que
perder, rica em quadros experimentados em todos os setores da vida social e
cultural,forte de suas poderosas organizaes sindicais, polticas,
culturais,etc...A luta de classes,assim -e o pensamento vem direto de Marx e
de Engels- no necessariamente um processo de agravamento de violencias
e subverses,nem de caos,mas pode ser um processo de
disciplinao,educao e criatividade das massas proletarias.

Neocapitalismo, mundo do trabalho e autogesto


Pedrosa dialoga com Gorz (Estrategia Operaria e neo-Capitalismo-1964),para
retomar suas questoes sobre revoluo e reforma, Ocidente e Oriente.
Num livro sob muitos aspectos novo e construtivo pela originalidade de
conceitos e sobretudo pela maneira de repor o problema capital da estrategia
da revoluo socialista em nossa epoca,Andre Gorz retoma de alguma forma
a questo da natureza das reformas e contra-reformas,revoluo e contra-
revoluo de que to cheia nossa epoca...Gorz trata o problema posto por
ns nos idos de 40: a natureza de certas transformaes havidas ou por haver
no funcionamento ou nas estruturas do capitalismo.Gorz dirige-se
especialmente ao movimento socialista nos paises desenvolvidos da Europa
ocidental. Dir-se-ia no nos tocar. Engano.
O problema da revoluo nos paises subdesenvolvidos diferente,sem
duvida,do da revoluo nos paises de alta industrializao. A diferena
maior, quanto a forma,est em que a velha alternativa entre a luta pelas
reformas e a insurreio armada deixou praticamente de
existir,principalmente nos velhos paises altamente industrializados do
Ocidente.Quanto a fora motriz dos movimentos, contrariamente ao que se
pensa,continua nos paises de alto desenvolvimento, a poder ser representada
pela classe trabalhadora redefinida. Os assalariados produtores a que se
referia Marx no podem mais ser confinados a noo de trabalhadores
manuais,criadores de mais-valia , pagos por pea ou hora.O desenvolvimento
tecnologico e produtivo ampliou extraordinariamente essa noo.

No capitalismo global, diz Pedrosa,


a alienao que outrora recaia sobre os operarios,como produtores mutilados
pela sua concentrao nas tarefas parceladas na fabrica,agora se completa
quando ele aparece como consumidor,ao qual a publicidade arrebatou a
possibilidade de escolher ou mesmo de reconhecer suas proprias
necessidades pessoais.

Para Pedrosa, esse capitalismo global resultante das reformas contra-


revolucionarias dos anos 20 e 30.
Sob o regime das reformas contra-revolucionarias
institucionalizadas,inclusive nos paises democraticos ocidentais,a eficiencia
produtiva aumentou,a racionalidade economica cresceu, a cultura chegou as
massas, mas tudo em detrimento do homem, do homem com os seus fins e
aspiraes contraditrias, substituidos estes por jornadas de trabalho mais
curtas mas infinitamente mais intensas e um dia cada vez mais cheio de mata-
tempos, distraes e divertimentos organizados, sistemas de informao
crescentes em quantidade e relativa diminuio do valor, propaganda das
vantagens da melhor democracia, da melhor cerveja, do melhor calista, do
melhor negocio, da melhor igreja, do melhor cinema, circo ou jogo, do
melhor politico, do melhor campeo, do melhor governo, do melhor
trabalhador ou patro, do melhor doutor, da melhor me, etc, etc...Tudo isso
vem do arsenal totalitario das reformas contra-revolucionarias. As categorias
sociais desaparecem, o homem atomizado; o ideal da democracia, da boa,
isto , representativa. Esse ideal foi criado pelo fascismo. Eo que impera nos
Estados Unidos.
Claramente, v-se que Pedrosa assimilou profundamente sua vivencia nos EUA.
Nos Estados Unidos, o mecanismo da produo em massa do neocapitalismo
criou uma suprema categoria social, medida pelo maior numero de bens
duraveis que possui um cidado. A classificao do homem na sociedade
tende a desligar-se de seu trabalho e de sua funo na produo para
caracterizar-se pelo grau de seu consumo(...). Ao fabricar em massa as coisas
mais espontaneas ou casuais, por definio artesanais ou do fazer manual, so
institucionalizadas,como a torta, a maionese, a pipoca, o sorvete, o
brinquedo, a gravata, o bonde, o berimbau, o saxofone, a esteira, o rosrio, o
santo, a imagem, a lembrana,o amor,o casamento,etc. Assim,a populao
inteira,todos os dias,de norte a sul, de leste a oeste do pais,come a mesma
torta, a mesma salada,nas mesmas horas,de alto a baixo da escala social.

Para Mario,
a revoluo socialista ope ao consumismo alienante do neocapitalismo outra
concepo das necessidades. uma gigantesca tarefa social, economica,
cultural, tica, desalienente. A equipe dos trabalhadores cientistas representa
papel primordial. Onde o trabalho percelado, subordinado a norma de
rendimento, onde produz fadiga nervosa e fisica, periodicamente,
sistematicamente, onde se faz um ambiente de massa ou coletivo, seriado,
mas no qual no tem o trabalhador uma viso de conjunto do produto em
elaborao, onde o estatuto pessoal do trabalhador subsumido no grupo ou
categoria na fbrica, no laboratrio, no escritrio, na empresa, no
empreendimento, onde as relaes pessoais entre o trabalhador, o assalariado
individual e o diretor, o gerente, o patro, no existem mais - estamos em
face do produtor assalariado, seja um trabalhador manual, um operario
qualificado, um tcnico, um engenheiro, um pesquisador, um sbio. E na
categoria de produtor assalariado so todos membros,potencialmente,
essencialmente, da classe operria. No o capitalismo,nem mesmo o
neocapitalismo que dispe ainda de fronteiras abertas. O mundo do trabalho
o mundo de fronteiras abertas;ele no pode,porem,como mostra Belleville
(Une Nouvelle Classe Ouvriere-1963),esperar passivamente que suas
fileiras crescam.Tem ele,em compensao,a possibilidade de reivindicar as
fronteiras novas.Compete a ao sindical moderna esse reivindicar de novas
fronteiras para o trabalho.

Uma civilizao do trabalho, obra da praxis da classe operaria e a alternativa a


civilizao neocapitalista.

Bases de um Projeto nacional cultural


Pedrosa retoma sua questo da reforma.
A reforma revolucionaria nos paises de neocapitalismo a transformao
deste,por dentro,em socialismo...As nossas reformas so a revoluo dos
subdesenvolvidos -revoluo mais ampla e menos definivel,mais
contraditoria e complexa,mais impetuosa e mais plebeia,mais popular,isto
,menos homogenea socialmente.Ela etodo um processo de mudanas
continuas nas estruturas da sociedade,desde uma alterao profunda no
dinamismo social das populaes rurais,em que uma velha classe de
proprietarios fundiarios desaparece para dar lugar a uma nova classe de
capitalistas agricolas em face de um novo proletariado rural direta e
organizadamente assalariado,a uma modificao no menos radical na ordem
economica geral,com crescimento consideravel do setor da propriedade
publica ate colocar sob o seu controle as principais alavancas de comando da
economia nacional.O peso especifico da classe trabalhadora tende a aumentar
e o crescimento das foras produtivas ir depender de mais a mais das
tecnicas de planejamento e de uma politica de investimentos de carater
acentuadamente social.Ela tambem visa a dar as populaes que vivem no
interior de seu territorio um sentimento novo,o de uma participao coletiva
num todo nacional cultural enfim acabado ou completo,capaz de falar,
entender-se,comunicar-se com o mundo num acento que lhe prprio (grifo
nosso).

Segue Pedrosa,
Esse o modelo que a historia e a experincia empirica tm elaborado para o
Terceiro Mundo. As revolues dos paises do Terceiro Mundo tendem a
refletir-se umas sobre as outras e a revelar uma face internacional cada vez
mais pronunciada. As revolues nacionais dos subdesenvolvidos tm no s
problemas comuns mas tambem inimigos comuns.Elas no podem vencer
sem uma reforma profunda na estrutura do comercio internacional e,logo,da
economia internacional[...]A revoluo dos subdesenvolvidos
absolutamente antiimperialista. A luta antiimperialista,para ser vitoriosa,tem
de ser levada a efeito numa frente comum dos paises subdesenvolvidos,como
sua politica permanente,independentemente de conjunturas nacionais crticas
ou crnicas[...]. Nessa poltica externa estacontida a condio fundamental
para a realizao do objetivo nacional permanente - a emancipao.As tarefas
internas urgentes sero irrealizaveis -ou para realiza-las o esforo e o
sacrificio sero ainda mais penosos- sem uma ao coletiva das naes
incompletas em marcha para a integrao nacional no plano regional e no
plano internacional.

A Revoluo Dupla (Anti-imperialista e Anti-capitalista)

A revoluo dos subdesenvolvidos assim dupla: a emancipao nacional em


face dos interesses imperialistas alheios e contrarios.A emancipao social
das classes oprimidas e de baixos e medios rendimentos,internamente.No
basta que desenvolvamos ou criemos uma industria,equipando-a com todos
os recursos de que precise,arrancando os capitais onde estiverem para aquele
fim,mas -nas proximas decadas-j no se poder tolerar que essa tarefa se
faa exclusivamente as custas da miseria das nossas populaes.Epreciso
que ao mesmo tempo se alimente o povo,se vista o povo,se abrigue o povo,se
o eduque,para uma nao moderna e modernamente equipada.O controle das
rendas ter de ser severo,o controle dos investimentos implacavel,a reduo
dos ganhos improdutivos ser uma necessidade,a estandardizao dos bens de
consumo e duraveis uma imposio social ,o monopolio do comercio exterior
e do cambio sem brechas,prioridade absoluta dos instrumentos publicos de
ensino e educao tecnologica para o povo(inclusive guerra ao
analfabetismo); destruio do velho aparelho estatal e sua remodelao
completa para servir as transformaes da economia e da sociedade,abolio
das forcas armadas e sua substituio por milicias populares,aproveitamento
de seus servios tecnicos e industriais para aplicaes civis no
desenvolvimento das infra-estruturas sociais e economicas.

No h, assim, reformas de meio termo para contentar alguns grandes


Estados ricos e protetores. Toda reforma que nos paises subdesenvolvidos se
confinar a alteraes administrativas, tecnicas ou legais de ordem interna,
ser reforma tipicamente contra-revolucionaria, pois visa a enquistar ou
calcificar a subordinao da economia primaria a do Estado ou Estados
imperialistas,controladores dos recursos financeiros internacionais.
No emancipa o pas. Ao contrario. E implica a permanencia no estagio da
estagnao ou dos niveis do subconsumo ou da mediocridade. Quer dizer da
dependencia.
Nos paises altamente industrializados, o problema da revoluo ou reforma
contra-revolucionaria diferente. Andre Gorz o coloca nos seguintes termos:
possvel do interior do capitalismo - quer dizer, sem antes o ter abatido - impor solues
anticapitalistas que no sejam incorporadas e subordinadas ao sistema?. E ele volta
velha questo: reforma ou revoluo? Era questo primordial quando o movimento
parecia ter a escolha entre a luta pelas reformas ou a insurreio armada. No mais o
caso da Europa Ocidental. E por isso mesmo a questo j no tem a forma de
alternativa. A questo agora diz respeito a reforma. Mas, sustenta Gorz, trata-se de saber
se so possiveis o que chama de reformas revolucionarias, ou reformas que vo no
sentido de uma transformao radical da sociedade.

A Autogesto Socialista

Onde a liberdade individual subjugada ? no


setor mais importante da vida moderna, no local
de trabalho, na oficina, na fabrica,na
empresa.Como possvel reinar a a autocracia e
a liberdade em outras partes ?

Eis o Socialismo. Mas deixemos o galo cantar ainda na


madrugada.
(PEDROSA, 1966)

Podemos afirmar que toda a obra de M.Pedrosa, intitulada A Opo


Imperialista(1966), tenta responder a pergunta que citamos acima;e que, sua resposta
ao aplicar o marxismo de O Capital ao processo de produo capitalista da grande
corporao norte-america,ponta de lana,vanguarda do Capital, a do socialismo com
base na autogesto. o que veremos adiante!
Para Mario, a grande crise de 1929 e o advento dos regimes fascistas na Europa
trouxe um fenomeno novo,que causou perplexidades nas arraiais dos socialistas e
comunistas. Nessa atmosfera surgiram as reformas-contra-revolucionrias, inditas:
eram dirigidas contra o capitalismo liberal, eram reformas anti-capitalistas, de alguma
forma.
Gorz, segundo Pedrosa, fala de reformas revolucionarias: as que vo no
sentido de uma transformao radical da sociedade. Ele tomou a questo pelo seu lado
positivo, e ns, pelo negativo, numa situao anterior, bem diferente da em que
escreveu seu livro,em 1964. Na verdade, nos anos 40, Pedrosa analisou o fenomeno
das revolues passivas e, Gorz, nos anos 60, analisa seu corolrio, as revolues
ativas.
As reformas estruturais, revolucionrias, no tratam de delegar ao Estado a
tarefa de emendar o sistema. Diz Mario:
Emendar o sistema no a tarefa dos subdesenvolvidos: estes o que tm a
fazer CRIAR um sistema, o sistema deles,um sistema novo.A reforma de
estrutura para o autor aqui comentado uma reforma aplicada ou
controlada pelos que a reclamam. O que importa que surjam de todos os
campos novos centros democraticos de poder - ao nivel das
empresas,escolas,municipalidades,regies,orgos de planejamento,etc. [grifo
nosso]

Aqui, Pedrosa nos fala da autogesto social,um dos elementos da revoluo


ativa de massa.
Izabel Loureiro,em texto para o Seminrio do centenrio de Pedrosa,captou
muito bem a proposta de Mario,inclusive,mostrando como est aprofundada em relao
poca da Vanguarda Socialista.
Numa critica ao socialismo burocrtico,Mario defende a ideia de que uma
sociedade socialista aquela em que os indivduos se autodeterminam a
partir da esfera da produo: portanto em primeiro lugar em torno da
empresa e na empresa que gira a luta pelo socialismo.A verdadeira
transformao econmica socialista s ocorrer no momento em que a
empresa for uma comunidade cooperativa e no uma organizao
antagnica (A Opo Imperialista ,pg. 394), em outras palavras, no
momento em que deixar de existir a separao entre dirigentes e executantes,
ou seja, quando for implantada a autogesto ou gesto coletiva da produo
(...).

Segue Loureiro:
As ideias de Mario a respeito da autogesto so bastante rpidas,mais
indicativas de uma direo do que propriamente de uma reflexo original, em
que retoma a tradio conselhista,alis mencionada por ele (revoluo alem,
conselhos de fabrica de Turim,Frente Popular na Frana, Barcelona da
Guerra Civil e,bem entendido,os sovietes russos (p. 354-5).

E o que garantiria a vitria da revoluo, tanto na metrpole como na periferia,


que ela seria feita e controlada pelo poder popular. So necessrio novos centros
democraticos de poder (empresas, escolas, municpios, regies, etc.), ou seja,
descentralizao do poder de deciso, restrio aos poderes do Estado e do capital,
uma extenso do poder popular,quer dizer, uma vitria da democracia sobre a ditadura
do lucro (p. 324). Assim como no VS, Mario continua a pensar que o controle dos
trabalhadores sobre toda a vida social o caminho para o socialismo democrtico, e este
comea j, antes da tomada do poder.
verdade o que nos diz Loureiro sobre sobre a ausencia de uma reflexo
original sobre a autogesto por parte de Pedrosa. Todavia, Mario sempre escreveu de
uma forma barroca, nos obrigando a um olhar muito apurado embaixo da nevoa
embruxadora, termo que gostava de usar,de seus escritos. Deste ponto de vista, na parte
III de seu livro, intitulada Os rgos Supremos do Imperialismo, no capitulo
dedicado a grande corporao norte-americana, que o velho Pedrosa, baseado em O
Capital, mostra como a autogesto o contedo do socialismo. assim,analisando a
principal criao do Capital, que Mario desenha o que deveria ser o futuro do trabalho
liberto do capital.
Mario no chega autogesto, apenas ou somente, atravs das lutas operarias,
mas o que fundamental, analisando as relaes entres os 3 eixos do ncleo de
metabolismo do Capital (Meszaros), o Estado, o Trabalho e o Capital. Sem duvidas,uma
influencia do mtodo dialtico dominante na Tendncia dirigida por CLR James e Raya
Dunayevskaia, em seus estudos sobre o movimento operrio norte-americano. Com uma
leitura deste tipo,Joo Bernardo definiu A Opo Imperialista , entre as mais
notveis da literatura marxista mundial.
Possivelmente, Loureiro, como aconteceu em sua leitura de Mario, na Tese
sobre vanguarda Socialista, em que o classifica de marxismo ecltico, como diz o
prprio Mario em relao a James Burnham: Ouviu cantar o galo , mas no soube
onde!
Para Pedrosa a questo do destino da grande corporao na prpria sociedade
americana de importncia incomesuravel,e que,O problema sai do campo de uma
tcnica econmica para um campo bem mais vasto da teoria social ou organizatria da
sociedade.Nesta pisada,o pernambucano de Timbaba nos leva Autogesto Social.
Mario inicia dizendo que por toda parte, a burocracia tende a usar o Estado
como sua prorpiedade privada, nos EUA, uma formao social, seno nova,
amadurecida e consciente de seu poder,a oligarquia dos dirigentes das grandes
corporaes,tende a dar aos negcios do Estado a tonica de sua presena. Para ele, a
essncia da corporao moderna guardar as relaes capitalistas de produo e ao
mesmo tempo enredar em torno de si mesma a trama das relaes pblicas.
Baseado em uma ampla literatura norte-americana da poca*, Mario mostra
como a corporao levanta incessantemente problemas de poder, alm de identificar
um padro de distribuio de seus lucros que sugere uma eventual socializao no-
estatal desses lucros [grifo nosso].
Em sua analise, Mario traa uma contradio fundamental na dinmica da
grande corporao; a crescente separao entre a Propriedade e o Controle. Contradio
que,no Direito americano da poca, se traduz em aplicar corporao quase pblica a
tradicional lgica da propriedade. Para Pedrosa, A evoluo do processo ,como se
v, no sentido de desapropriar os proprietarios capitalistas em beneficio do pessoal
de dentro da sociedade [grifos nossos].
A propriedade privada vai sendo expelida da grande unidade produtiva, que a
corporao. Mas, para Mario, na Forma jurdica, o grupo de direo continua a gerir e
controlar a corporao para o beneficio dos proprietarios. Cita, ento, o jurista francs
George Rippert: o direito civil no conhece a empresa, mas s o proprietrio. E que a
lei no cobre a complexidade dessa entidade nova que a corporao...Os tribunais no
estavam capacitados para julgar. Ou Berle, quando diz que Separam-se propriedade e
direo(controle). Os acionistas so os proprietrios da explorao, mas no podem
dirigi-las eles prprios. Assim o proprietrio no mais o empresrio.
Essa contradio, segundo Mario, tornaria o processo histrico irreversvel
[por] tornar independente, autnoma a corporao como um todo e dentro dela, dar o
poder ao grupo controlante. Marx previu e descreveu o processo quase 70 anos antes.
Veremos adiante [grifos nossos], conclui Pedrosa.
Marx, h cem anos afirmava que o capitalista investidor derivava a pretenso
ao lucro da empresa [...] no de sua propriedade de capital mas de sua
funo na produo distinta da forma na qual ela apenas propriedade
inerte.Isso aparece como contraste onde quer que ele trabalhe com capital
emprestado,de modo que lucros e interesse da empresa cada qual vai para
diferentes pessoas.

Em nota de p de pgina, Mario esclarece:


Ora, precisamente esta a grande tese de Marx.Ainda aqui foi o primeiro a
ver no funcionamento moderno das sociedades por aes, no
desenvolvimento prodigioso do sistema de crditos,as premissas
organizatrias, tcnicas, polticas e funcionais para a nova ordem de
produo. As paginas condensadas de O Capital sobre as sociedades por
aes assim demonstram.

Citando Hilferding (Das Finanzkpital):


Em sua obra clssica,ao tratar da questo e referindo-se contribuio de
Marx,escreve: Nossa concepo da economia da sociedade por aes vai
alm da exposta por Marx.Marx apreende em seu esboo genial a parte da
execuo que lhe ficou infelizmente vedada o apel do credito na produo
capitalista, a formao da sociedade por aes como conseqncia do credito
e traou suas conseqncias. E com toda a razo,Hilferding conclui o que
Marx considerara antes de tudo foram as conseqncias econmico-politicas
do papel da sociedade por aes.

Mais adiante :
Como se v, o segredo da direo empresarial das grandes corporaes
velho com a S e o velhssimo Marx o define em termos que o presidente da
DuPont Company, Sr. Crawford H. Greenewalt, repetiu, quase cem anos
depois, como se o tivesse lido: Talvez a melhor analogia com o trabalho do
executivo o condutor de sinfonia sob cujas mos uma centena ou por ai de
especialistas altamente qualificados e muito diferentes se ajustam num nico
esforo de grande eficcia.

Assim, diz Pedrosa:


Marx reconhece ser isso uma espcie de trabalho produtivo que tem de ser
exercido em todo modo de produo que requeira uma combinao de
trabalho[...], esse trabalho de superintendncia necessariamente surge em
todos os modos de produo, que se baseiam no antagonismo entre o
trabalhador como produtor direto e o dono dos meios de produo.

Para Mario, citando Philosophy of Manufacturers de Ure: As fbricas


cooperativas fornecem a prova de que o capitalista se tornou justamente to superfluo
como agente na produo,como ele mesmo,na sua forma mais desenvolvida ,acha
suprfluo o proprietrio da grande propriedade territorial.
Mario considera,ento,dois planos da grande corporao:
1) a autonomia da empresa em relao ao mundo exterior;
2) a sua evoluo internamente para chegar a ser uma comunidade
cooperativa e no uma organizao antagnica [grifos nossos].
Levando-se o pensamento at mais adiante poder-se-ia dizer o comunismo
no a norma de cada um, segundo suas necessidades, mas antes, dentro da
empresa,o momento em que a vigilncia ou a superintendncia se socializa,em outras
palavras, a autogesto.
Assim, A analise de Marx sobre o processo de produo capitalista na empresa
de maior alcance que a dos economistas e mesmo juristas que se debruaram sobre o
problema. Afastando o enredado de relaes puramente jurdicas e financeiras, que
encobrem o fenmeno social que se est processando com a famosa separao da
propriedade e do controle do capital, o processo de produo simplesmente um
processo de trabalho.
Para Mario, neste debate, Marx traz um elemento novo O Trabalho. A seu
modo irnico de ir s realidades concretas, pergunta: Que tem com efeito,o trabalho
com essas altas questes de propriedade, de lucro, de juros, de interesses e e direo nas
corporaes em que so dezenas,centenas de milhares? Nada. So instrumentos [...] de
trabalho.
Pedrosa destaca a originalidade da anlise de Marx:
No estudo especifico da sociedade por aes,em seu aparecimento
moderno,Marx introdua outras categorias que lhe vo permitir encara-la no
seu dinamismo e no estaticamente.nela o capital apia-se num modo
socializado de produo e de fora de trabalho e se reveste diretamente da
forma de capital social (capital diretamente de indivduos associados)
distinto do capital privado. A sociedade por aes assume a forma de
empresas sociais distintas das individuais. a abolio do capital como
propriedade privada dentro dos limites da prpria produo capitalista
[grifos nossos].

Seguindo com as ideias de Marx, Mario continua sua anlise:


Nas sociedades por aes a separao que se verifica no apenas a funo
que separada da propriedade do capital,mas e Marx insiste em dizer e
incluir tal separao na analise de todo o processo o trabalho
naturalmente separado por completo da propriedade dos meios de
produo e da mais-valia do trabalho.

Segundo Mario, desde 1865, quando Marx escrevia as linhas acima, at 1890,
quando ENGELS editou o terceiro volume. O colaborador e editor da obra resume a
anlise:
Isto a abolio do modo capitalista dentro da prpria produo capitalista e
acrescenta,numa expresso que vai inspirar Schumpeter (Capitalism,
Socialism and Democracy,1914) a formular sua talvez tese bsica sobre o
desenvolvimento do capitalismo uma autodestrutiva contradio, que
representa em sua face mera fase de transio a nova forma de produo... a
produo privada sem o controle da propriedade privada.

Enfim, ainda na pisada de Marx,Pedrosa fecha essa parte de sua analise:


As companhias por aes,prossegue Marx, pem a nu o antagonismo, o
tornam visvel: se os meios sociais da produo so propriedade privada, a
converso nova forma de aes ainda permanece nos limites do
capitalismo. Assim, em lugar de superar o antagonismo entre o carter social
da riqueza e seu carter privado, aquelas companhias desenvolvem o
antagonismo at uma nova forma. As fbricas de cooperativas dos proprios
trabalhadores representam dentro da velha forma os primeiros comeos
da nova, embora elas naturalmente reproduzam e tenham de reproduzir, por
toda parte, na pratica da organizao, todas as limitaes do sistema
prevalecente. Nestes, contudo, o antagonismo entre capital e trabalho
superado, pois os proprios trabalhadores se fazem seus proprios
capitalistas, o que lhes possibilita usar os meios de produo para o emprego
de seu prprio trabalho.Eles mostram o caminho pelo qual um novo modo
de produo pode naturalmente surgir de um velho, quando o
desenvolvimento das foras materiais da produo e das formas
correspondentes da produo social alcana um certo estagio. As companhias
por aes capitalistas, bem como as fbricas cooperativas podem ser
consideradas como formas de transio do modo capitalista ao modo
associado, com esta distino o antagonismo enfrentado negativamente
numa, positivamente noutra.

E, tenta, via Marx, explicar essa forma dupla de antagonismo: Marx tenta
explicar essa formula algo vaga de distinguir as duas formas de produo em que o
capital j se apresenta socialmente e no privadamente. O salario de superintendncia,
tanto do gerente comercial como do industrial, aparece completamente separado dos
lucros da empresa nas fbricas cooperativas dos operrios como nas sociedades por
aes. A separao dos salrios da superintendncia dos lucros da empresa, que em
outros casos acidental, aqui constante. Na fbrica cooperativa o carter antagnico do
trabalho de superintendncia desaparece, uma vez que o gerente pago pelos
trabalhadores em lugar de representar o capital contra eles.
Fechando esse capitulo 12, Mario Pedrosa pe os pontos nos ii,numa verdadeira
Proclamao da Autogesto:
Os tericos e panegiristas da corporao pretendem ter ela ultrapassado a
esfera do capitalismo econmica, social, cultural, cientfica, tecnolgica do
pais, o mvel intimo que a impele, que a dirige e a pe em movimento
ainda privado. Sua finalidade intrinsica em ultima ratio o lucro, o lucro
que,se dispersa em parte,se acumula tambm,se concentra em relativamente
poucas mos, estas as dos priprietarios de fato, os grandes,os que decidem
dos destinos da corporao; , pois, ainda um lucro de fato privado,
personalizado.

E, arremata:
No , pois, socialista, mas feudalista. Assim, para transformar-se no
ser preciso muito, apenas uma alterao nas relaes jurdicas que a regem,
redefinindo-a na ordem do Estado; dentro dela, h que faz-la passar gesto
coletiva, segundo o princpio de que no pode mais haver separao entre
direo e execuo, dirige quem executa, executa quem dirige, so dirigentes
os que trabalham,so trabalhadores os que dirigem.dentro dela os que
trabalham so todos, em maior ou menor grau,trabalhadores produtivos. Os
trabalhadores no querem mais ser um parafuso mecnico na engrenagem
produtiva. Querem saber o que esto fazendo,ter participao no processo
total, tomar conhecimento de para onde vo,deixar de ser alienados no
processo social do trabalho de que so, peas.

E conclui, na linha da autogesto,inclusive citando a experincia da Yugoslavia:


A direo capitalista da corporao, com toda a sua abertura progressista,
alienante, antisocial e reacionria,privatista. Se ela quer fazer do Estado seu
Estado, mas sem intermedirios, sem representantes, isso corresponde,em
planos paralelos, reivindicao mais profunda e de maior alcance social e
cultural dos trabalhadores dos paises de alto desenvolvimento, na Rssia
como nos Estados Unidos, na Inglaterra como na Alemanha, Sucia e at na
Yugoslavia, onde h um esforo conscientemente oficial nesse sentido: o de
que as funes gestionrias sejam coletivas, no havendo mais lugar para
medianeiros e representantes seus na produo, mas eles mesmos, como
trabalhadores, como produtores, com sua experincia, seus
conhecimentos,seu ngulo de viso prprio. A democracia direta que
proclama Rosseau como meio de exprimir a vontade do povo ou da maioria
a que se manifesta ou se pode realizar. O conceito de representao da
vontade do povo, da maioria, deve ser arquivado num museu de antiguidades
pertenceu a uma outra civilizao, civilizao de minorias que encontrou no
mecanismo das representaes o segredo da perpetuao do seu poder, de sua
riqueza e propriedade. A vontade da maioria no o monstro abstrato
incapaz de expressar-se a si mesmo inventado por Rosseau. hoje um
conceito manejvel, sociologicamente verificvel, que se exprime
diretamente de mil maneiras e em mil escales, nos limites dos vrios todos
sociais de que se compe a sociedade. Mas sempre uma relao direta e
mtua,como corrente e contra corrente, entre dirigentes e executantes. Quer
dizer sempre intercambivel. Eis o socialismo. Mas deixemos o galo cantar
ainda na madrugada [grifos nossos].

O braseiro revolucionrio dos sovietes

Mas, em paginas anteriores, Pedrosa se pergunta sobre esse processo nos


Estados Unidos.
O que estamos vendo nos Estados Unidos no propriamente tentar-se fazer
da cooporao empresa j socialista ou socializante. Mas proclamar o
sistema econmico americano como um sistema tendo ultrapassado o
capitalismo e se transformado num sistema tambm social ou com as
vantagens, apenas proclamadas, apenas tericas do socialismo, j realizadas.
Ento o que se tornou superfluo no foi o capitalista mas a revoluo
socialista, a expropriao dos expropriadores.
Analisando a revoluo tecnolgica da informtica e da automao, Mario
diz que, O que Marx descreve o capitalismo chegado ao apogeu de seu
desenvolvimento tecnolgico, dos novos mtodos de produo (Grundrisse
der Kritik der politischen Oekonomie, Rohenentwurf,1857-
1858.Dietz,Berlim,1953).

Pedrosa faz referencias as lutas operarias,os CONSELHOS OPERARIOS na


Alemanha.
Ao sair da guerra vencido e emprobecido,a social democracia alem assumia
timidamente o poder, sob presso de um proletariado que iniciava mal e
atabalhoadamente,na empresa,na fabrica,uma luta insurrecional pelo
poder,atravs dos cosnelhos de empresa que se espalharam por toda a
Alemanha e acabaram por ter a chancela, no papel, de um artigo da nova
constituio democratissima de Weimar.A luta,vitoriosa na letra da lei
constitucional,foi perdida realmente nas ruas,nas fbricas.Os conselhos de
empresa tinham, ento, uma colorao vermelha,reflexos do braseiro
revolucionrio dos sovietes na Rssia de Lnin e Trotski.

Na Itlia,
Antes de Mussolini,comunistas e socialistas ,em face a este problema,deram
com GRAMSCI a expresso acabada terica revolucionaria desses conselhos
(...) Quando, em 1936, em Frana,com Leon Blum como primeiro-
ministro,os operrios entraram em greve pelo pais inteiro, criando uma
modalidade nova de greve, greve com ocupao em massa da empresa.Ao
ocuparem as fbricas,os operrios no tinham o menor sentimento de atentar
contra a propriedade alheia.Era a sua fabrica que ocupavam. Abusavam?
dizer que abusavam de seu direito j reconhecer que tinam um direito
(RIPPERT).

Na Europa os aspectos sociais mais profundos da empresa, quer dizer, seu


destino em outro modelo de sociedade, tomavam vulto,em virtude do clima
revolucionrio, anticapitalista, ali presevalecente. A ideia de sovietes ainda estava no
ar, como a suprema aspirao da classe operria. Os operrios, por seus partidos e
lideres, queriam disputar ao capitalista, ao industrial, o domnio sobre a empresa. Todo
o poder aos sovietes, lanado ento pelos comunistas e socialistas independentes,
queria dizer extamente isto: o controle operrio sobre a empresa capitalista. Aqui,
em p de pagina, Pedrosa cita Gramsci: Antonio Gramsci,o lder terico e
revolucionrio italiano que passou em priso, e nela nela morreu, enquanto Mussolini
reinava sobre a Itlia, em relatrio de julho de 1920 sobre o movimento turinense dos
conselhos de fbrica, assim o descrevia:
[...] os conselhos de fabrica cedo criaram razes.As massas acolheram
voluntariamente esta forma de organizao comunista, se juntaram em torno
dos comits executivos e apoiaram energicamente a luta contra a autocracia
capitalista...Os conselhos e comits obtiveram notvel xito: esmagaram os
agentes e os espias dos capitalistas, ataram relaes de ordem financeira e
industrial nos negcios fazendrios; concentraram em suas mos o poder
disciplinador e demonstraram s massas desuinidas e desagregadas o que
significa a gesto direta dos operrios na indstria (Gramsci, 1963, p. 46).

Prossegue Mario:
A nova ordem revolucionaria socialista viria. Quando a vaga insurrecional na
Europa central e na Itlia refluiu, a empresa capitalista,campo de batalha
decisivo entre classes em conflito a classe trabalhadora e a patronal foi
largada sua sorte: voltou a ser a fabrica do patro. A Frana da Frente
Popular em 1936, onde a vaga revolucionaria das massas operarias chegou
bem depois, em virtude, provavelmente, dos despojos da vitria terem
concorrido para estabilizar a situao econmica do pais por mais tempo, e a
Espanha, em face do assalto internacional fascista com Franco frente das
tropas mouriscas, foram os ltimos palcos polticos onde os sovietes voltaram
a ser objeto de luta. Alis, tambm em Barcelona, lideradas pela Federao
Anarquista, os operrios ocuparam as fbricas. Depois veio a guerra,com a
ocupao de toda a Europa pelo nazismo e fascismo, e a derrota generalizada
de comunistas e socialistas de todos os matizes.O capitalismo em debandada
conseguiu reerguer-se no ocidente e inaugurar no ps-guerra fase de
verdadeira restaurao na Europa,graas em grande parte ao macio auxilio
norte-americano. Deu-se um veradadeiro renascer do capitalismo e nos
Estados Unidos a grande corporao ressurgia como o centro de toda a vida
econmica do pas. Mas o problema da empresa, da corporao, no deixou
por isto de existir.desta vez,porm, o que se v uma fase de evoluo do
lado de c,isto ,do lado patronal-capitalista,quando,em outra etapa,ela mera
vista do lado de l, isto , do lado dos babaros, ao de fora da cidadela. Da
comuna.

Assim, Pedrosa fecha sua ideia com chave de ouro: A Comuna de Paris !

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Che Guevara e a Bruxa Yugoslava

O Socialismo econmico sem a moral comunista no me


interessa.Lutamos contra a misria, porm lutamos ao mesmo
tempo contra a alienao.
(Che Guevara, 1963)

Esse pequeno ensaio tem por hipotese que Guevara em relao a autogesto
,apesar de uma praxis no campo do Principio da Autogesto,teve seu pensamento
desviado da questo central devido a forma de existncia histrica (aps uma viagem a
Europa do Leste ) que encontrou na experincia da Yugoslvia e nas reformas tentadas
nos pases do chamado socialismo real.
O sistema chamado de Calculo Econmico vigente na URSS e no leste
europeu, nada tinha de autogestionario, e, principalmente, a autonomia das empresas no
campo financeiro ( a tal autogesto financeira), tal qual existia na Yugoslvia. Em um
ou outro momento o Che aborda outros aspectos da experincia yugoslava, como, por
exemplo, a gesto das empresas pelos Conselhos Operarios.Mas,no passa de um toque
na questo.
Em seus Apuntes criticos a la Economia Poltica, Guevara vrias vezes
destrincha a dialtica de particular x universal, em relao URSS. Como o faz todo o
tempo em relao as particularidades de Cuba frente URSS. Habitualmente neste
livro se confunde a noo de socialismo com o que ocorre praticamente na URSS,
criticando a propriedade cooperativa koljosiana.
Sobre o Clculo econmico: (...)O calculo econmico constitui um conjunto de
medidas de controle, de direo e de operao de empresas socializadas, em um pas
dado, com caracteristicas peculiares.
Sobre a agricultura sovitica: falso, isto caracterstica da URSS,no do
socialismo. Pena que Guevara no tenha feito o mesmo processo em relao a
autogesto financeira da Yugoslvia!
Neste sentido, como veremos adiante,Mandel e Eder Sader tm plena razo
quando falam que o Che no se reportou longa experincia dos Conselhos Operarios
na historia do socialismo.
E, na biografia que escreveu de Marx e Engels, em seus Apuntes crticos a Economia
Poltica, vrias vezes faz referncias experincia da Comuna de Paris!
J o Sistema de Planificao proposto e executado pelo Che portava elementos
do campo autogestionario,desde a gesto das empresas ate a viso filosofica do trabalho.
Nos anos 1963-64,Guevara a frente do Ministerio da Industria cubano, promoveu um
evento que ficou conhecido como O Grande Debate Econmico.
O marxista belga Ernst Mandel, participe do debate econmico em Cuba,
escreveu a respeito na revista francesa Partisans, em 1967. Em primeiro lugar, situa o
debate:
Entretanto, preciso reconhecer que este debate,mal conhecido no
Ocidente,ocupa um lugar particular na historia do pensamento
marxista,sobretudo em funo das contribuies do camarada Guevara.A
originalidade pratica da Revoluo cubana precedeu amplamente seu aporte
original teoria marxista contempornea.Porm,o Che Guevara expressou
sua contribuio no s no que respeita guerra de guerrilha,seno tambm
no campo da teoria econmica.

Mandel pe as questes que fizeram parte do Debate econmico de 1963-1964


em Cuba: Quatro questes,alm de algumas questes subsidiarias.Duas questes so
de ordem pratica;versam sobre problemas de poltica econmica do governo:
1)A organizao das fbricas industriais;
2) importncia relativa dos estmulos materiais na construo do
socialismo.

As outras duas questes so de ordem terica:

3) o papel exato da lei do valor na poca de transio do capitalismo ao


socialismo;
4) a natureza estrita dos meios de produo estatizados nessa poca (so ou
no mercadorias?), representam uma propriedade social ,ou so apenas em
parte socializados, permanecendo parcialmente como propriedade das
empresas ? etc.

Qual a originalidade do pensamento do Che a respeito destas 4 questes ?


Mandel assinala que
O mrito da contribuio de Che Guevara est em ter expresso claramente a
particularidade da Revoluo cubana, sem ter cado nunca em um
pragmatismo vulgar.A Revoluo cubana se distingue pelo fato de que tem
logrado conquistar e manter o apoio da grande maioria das massas populares
para a obra revolucionaria.

Esse fato permite falar de uma linha de massas na direo cubana. Mandel,
todavia, apresenta uma contradio profunda na sociedade cubana: H, no obstante,
uma contradio entre essa linha de massas e a pratica cotidiana do governo
revolucionrio cubano. O campo da gesto da economia e mais claramente, o da
gesto da industria-,estevo totalmente imunizado contra toda interveno direta das
massas.
Assim, o debate econmico surgiu de uma necessidade da pratica,em torno da
gesto das empresas,a relao entre as direes das empresas e as massas
trabalhadoras,e,a questo dos estmulos morais e materiais relacionados a esse debate.
Como diz Mandel,
A industria nacionalizada em Cuba estava,em grande parte,organizada
segundo o sistema de trusts (empresas consolidadas) por ramos da
industria,muito prximo ao que serviu de modelo organizao da industria
sovitica durante todo um perodo.O financiamento destes trusts se fazia por
oramentos;o controle financeiro se efetuava em nvel dos ministrios ( o de
Industrias e o de Finanas).O banco no cumpria seno um papel
intermedirio de importncia secundaria.

Mandel situa a questo pratica do debate em Cuba:


Um dos objetivos prticos da discusso economica de 1963-1964 estava,portanto,seja
na defesa deste sistema de organizao foi o caso do camarada Guevara e de todos os
que tinham apoiado,em geral,sua tese-, seja na postulao de sua substituio por um
Sistema de Autonomia Financeira das empresas autogesto financeira tese defendida
por Carlos Rafael Rodriguez e muitos outros participantes do debate.
Mandel conclui: Ignoramos que soluo se deu na poca em Cuba ao problema
da organizao da gesto das empresas,enos parece que de qualquer maneira se est
muito longe de um modelo econmico definitivo nesse pas. E,explicita sua posio:
Continuamos sendo partidrios de um sistema de autogesto
democraticamente centralizado, em que o duplo perigo de burocratizao,
emana de uma centralizao excessiva, mais que da utilizao excessiva dos
mecanismos de emrcado e pode ser amplamente neutralizado pela passagem
da gesto as mos dos trabalhadores,nos locais de trabalho, submetidos a
uma disciplina estrita imposta por uma autoridade central surgida diretamente
dos conselhos operrios.

Eder Sader em ensaio (junto com Carmen Castillo), intitulado Che Guevara1,
destaca esse ponto: o porque o Che no avanou na linha da Autogesto Socialista!
Procurando evitar as deformaes do modelo sovitico expressivo que o Che
notenha feito uso de toda uma experincia terica e prtica dos
conselhos operrios como fundamento, da transformao das relaes
sociais. O novo Estado baseado na rede desses rgos de democracia direta,
seria a expresso de um processo de reapropriao da vida social pelo
conjunto da populao trabalhadora. E por isso mesmo tenderia a extinguir-
se. Existe a a convico de que o exerccio mesmo no poder pelas massas
age no sentido de acelerar sua tomada de conscincia, a criao de novos
valores e relaes.

E acrescenta Eder Sader: Mas o Che vai apostar sobretudo nas decises centrais
dos revolucionrios que do o exemplo, e sobre as mudanas produzidas pela pratica
dos valores da solidariedade.
Nos parece que Eder Sader ainda no tinha uma viso mais sistemtica da obra

1
Texto escrito para Coleo dos 100 anos do PSF - Les feux de lAmerique Latine. Paris: editora, 1978.
do Che; sem duvidas, pela militncia na POLOP, estarem no exlio francs, e pela longa
e profunda amizade entre os dois,conhecia o livro de M.Lowy. Mas, Lowy ainda no
tinha conhecimento do conjunto da obra de Guevara.
Identificar o Princpio da Autogesto na obra de Guevara no fcil. A razo
principal que em suas obras, mesmo sobre economia, o Che no trat desta questo de
forma explcita. Ela lhe foi oculta por uma nuvem embruxadora que estava presente na
forma de augesto que o Che chegou a conhecer diretamente, a autogesto financeira
da Yugoslvia, que o Che criticava de forma radical.
Entretanto, nas Atas 2das varias reunies que coordenou como Ministro da
Industria, podemos encontrar as ideias do Che sobre a autogesto,de forma
explicita,seja no Programa de cooperao industrial, a proposta dos Cilos (comits
industriais locais) que desenvolveu, seja, na teoria do Presuposto Oramentario que
contrapunha ao Clculo Econmico vigente na URSS e nos pases do Leste europeu,
ou na teoria que punha em prtica no seu Ministrio da relao entre dirigentes e base.
Ou, de forma implcita, na sua viso da qualificao dos trabalhadores, na viso
filosfica do trabalho e no papel do trabalho voluntrio e os valores morais numa
sociedade socialista, e do valor e os estmulos materiais, a ideia da construo do
scoialismo, o papel do partido e o futuro do Estado.
A publicao posterior 3do chamado Caderno de Praga traz de forma mais
sistemtica a viso do Che sobre o Planejamento democrtico. Por exemplo, a obra de
seu auxiliar Orlando Borrego (Che El caminho del fuego-2001), encontramos, em
uma reunio do seu Ministerio, em 1962, a seguinte fala de Guevara:
Qual esse passo futuro ? A construo do socialismo.Ao socialismo e dos
socialismo ao comunismo.Em quanto tempo realiza-lo? No vamos por
anos.Agora, claro que no podemos planificar nem por quatro anos.No
vamos falar em que anos vamos entrar no comunismo,porm,h uma coisa,
temos que ir preparando as condies para que se v construindo a
autogesto dos organismos,no a autogesto financeira [...].

Em uma outra longa reunio com sua equipe no Ministrio da Indstria (2


outubro 1964), Che faz uma belssima exposio 4, em que aborda os erros da
construo do socialismo na URSS, desde a NEP nos anos 20, e no ps-Guerra, nos
outros pases do Leste da Europa e na sia (China), respondeu uma questo posta por

2
Estas atas, tempos depois, foram publicadas e/ou inseridas em obras de seus auxiliares da poca, ou em
obras como as de P.Vuskovic,ou de C.Tablada.
3
Apuntos crticos a La Economia Poltica.
4
Este texto, carregado de heterodoxia, marca de Che, mereceria uma publicao a parte,como a carta que
resultou em O socialismo e o Homem em Cuba.
um tecnico da thecoslovaquia,ento em Cuba:
recebo uma revista que no se distribui aqui,uma revista de uns tericos
norteamericanos, o melhor deles penso que era marxista, PAUL
BARAN, j morreu, porm SWEEZY, que esteve aqui convidado pelo
governo,escreveu um livro que vocs conhecem,uma analise de um posio
chinesa, de que, Yugoslvia era um pas capitalista. Ento, Sweezy faz uma
anlise das colocaes dos chineses e as destri, uma a uma, vai destruindo-
as dizendo que h colocaes subjetivas, colocaes dogmticas e formais,
mas depois de destruir os argumrntos chineses, no obstante,diz que:
Yugoslavia sim, vai para o capitalismo. E vai pro capitalismo por que? a
primeira vez que o vejo,o vejo nomeando assim, expressamente,pelo
reconhecimento e a plena vigncia da lei do valor.Ento,explica como o
sistema yugoslavo ao implantar a lei do valor comea a criar,isto , a recriar
objetivamente,o capitalismo,precisamente uma coisa muito interessante,
porque considera que o sistema yugoslavo est dado aparentemente pela
autogestao operaria, sem dvidas, a autogesto operaria no tem nada de
revisionista, e uma colocao leninista, Lenin a colocava.

Cita a Lenin no perodo anterior revoluo, que muitas vezes onde fala do
controle operrio. Guevara fala de sua visita a fbricas yugoslavas: na Yugoslvia
ia comprar umas sementes e tratores ,ento me achei com uma coisa nica,a
concorrencia entre fbricas,inclusive nos baixavam os preos para uma ou outra ganhar
o pedido,isto ,uma cosia tipicamente capitalista. Contudo, diz que onde de verdade
h alguns aspectos da questo yugoslava muito interessantes , enquanto participao
que tm os operrios e que pelo menos lhes pretendem dar,eu no sei se a tm ou
no,porm lhes pretendem dar na direo da fabrica.
Na mesma reunio Che responde a outra questo de um colaborador que falou
da relao entre a direo das empresas e os trabalhadores na autogesto das
experincias de construo do socialismo na URSS e no leste europeu:
Ento,essa ligao que tu falas,da Autogesto entre a massa , mentira.Na Autogesto
o que h uma valorizao do homem pelo que rende, que isso o capitalismo o faz
perfeitissimamente,mas tampouco h alguma ligao entre a massa e o
dirigente,nenhuma.
E,mais adiante pe seu principal exemplo,a Yugoslavia :
na Yugoslvia h a lei do valor;na Yugoslvia se fecham fbricas por serem
inviaveis,na Yugoslvia h delegados da Suia e Holanda que buscam mo
de obra ociosa e a levam para seu pais para trabalhar em quais condies,nas
condies de um pais imperialista com a ma de obra estrangeira,onde h
uma serie de regras e regulaes para que seja a ultima coisa.Assim,vo estes
companheiros yugoslavos a trabalhar como agricultores ou como operrios
nestes pases onde escasseia a mo de obra e expostos ,com certeza,a ficar em
qualquer momento na rua.Praticamente so,nesse sentido,portoriquenhos nos
Estados Unidos.

Michael Lowy e Olivier Besancenot,em obra sobre Che,uma chama que


continua ardendo, aps definirem o que a autogesto socialista, afirmam:
Essa autogesto socialista a forma mais democratica da sociedade.Embora
estivesse consciente disso, Guevara se opunha autogesto a partir do
momento em que a descentralizao das empresas rimava com autonomia
financeira das unidades de produo,pois ele via ai uma forma inelutvel de
concorrncia.

Entretanto, estudando as Atas das reunies que Che coordenava no Ministerio da


Industria, e os vrios Programas que implementou em Cuba, possvel ver que o Che se
opunha a autogesto financeira, a autogesto das fbricas isoladas, da mesma forma
no chamado Caderno de Praga, em que anotou suas criticas ao modelo econmico
vigente na URSS e demais pases do Leste europeu,incluso a reforma Yugoslava que se
declarava autogestionria. Prosseguem Lowy e Olivier:
Com razo, ele combatia todos os resduos e todos os espaos remanescentes
da economia de mercado.A autogesto coloca fundamentalmente a questo
da propriedade dos grandes meios de produo dos quais se dota um
sistema.Pois,nesse nvel,a propriedade o poder.Quem decide ? Uma
democracia que no desequilibrada aquela que permite decidir todas as
escolhas,igualmente na rea econmica,nos bancos das assembleias
democraticamente eleitas. ( e aqui nossos autores acertam em cheio) Nessa
perspectiva o planejamento, caro a Che, no contradiz a autogesto.O
socialismo,se no se limitar a palavras vs ,no se pode resumir a um
governo que troca de mos.Pois o Estado no neutro.E para estabelecer
novas instituies, que funcionem de baixo para cima e no em sentido
inverso, preciso livrar-se da antiga estrutura estatal e criar mecanismos de
controle democrtico.Guevara chegara concluso,por sua prpria
experincia,que era impossvel mudar a sociedade sem mudar o Estado.esse
tipo de mudana implica,por fim,a substituio do Estado por formas de
poder no estatais,fundadas na participao popular direta-
conselhos,assemblias.

Clarissimo, nesta ideia da substituio do Estado esto os principio da a


autogesto. M. Lowy j em seu Prefacio edio da Expresso Popular ,do seu O
pensamento de Che Guevara ( 1999 ), fazia as seguintes correes:
Este livro foi publicado em portugus*,em meados dos anos 70,por uma
editora portuguesa (Bertrand).A ditadura militar impediu que o livro
circulasse no Brasil.Agora,passados mais de 30 anos, ele chega ao publico
brasileiro,por iniciativa da editora expresso Popular. Em que medida ainda
atual um trabalho publicado h tanto tempo?

Lowy ento diz que Ao contrrio, a segunda parte,sobre o pensamento


econmico de Che e os problemas da transio para o socialismo,apresenta
deficincias.Menos pelo que diz,mais pelo que deixa de dizer,sobre a questo da
democracia socialista. Em 2005, no Prefacio que Lowy fez para o livro de
N.Kohan(Che,o sujeto y el poder), volta a afirmar esta ideia sobre o pensamento de
Guevara: Sobre muitas questes a democracia na planificao,a luta contra a
burocracia- sua reflexo incompleta.
Fazendo um breve parnteses,Nestor Kohan em seu livro sobre Che (2003-
2005)*,afirma em relao a obra de Lowy:
Houve um estudo anterior,publicado em Frances em 1970 e em espanhol em
1971,que no podemos esquecer: El pensamiento Del Che Guevara de
Michael Lowy (Carlos Tablada o inclui em sua bibliografia). Esse estudo
clssico,traduzido em numerosos idiomas e reeditado muitssimas vezes,tinha
uma virtude fundamental: tomava o pensamento do Che como um todo
armonioso e organico.Abordava tanto o pensamento poltico e a concepo
poltico-militar do Che como suas ideias sociolgicas,sua concepo do
marxismo enquanto filosofia da prxis,suas posies econmicas e seus
debates com as correntes de esquerda.Segundo temos noticias, foi a primeira
tentativa,incluindo as feitas em Cuba, de reconstruo terica do pensamento
do Che em suas mltiplas dimenses.

Todavia, N.Kohan faz a seguinte ressalva importante:


Porm, nessa poca Lowy no conhecia todos os escritos econmicos do Che
nem podia acessar fora de Cuba a todos seus materiais e manuscritos (uma
grande parte compilados em 1966 no Ministerio do Aucar, pelo seu
colaborador, Orlando Borrego ajudado por Enrique Oltusky) em uma
edio cubana de sete volumes; embora, outra parte se seus textos, menor
porm altamente significativa, ainda hoje permanece indita).

Retomando a auto-avaliao de Lowy:


(...) No que os argumentos de Che em defesa da planificao
econmica,contra as classes mercantilistas sejam falsos: pelo contrario,eles
ganham uma nova atualidade face autentica doutrina neoliberal hoje
dominante.mas eles deixam no a questo poltica principal:
Quem planifica?
Quem toma as grandes decises do plano econmico?
Quem determina as prioridades da produo e do consumo?
No ter a verdadeira democracia significa no ter:
a)pluralismo poltico;
b)liberdade de discusso das prioridades e;
c)liberdade de escolha da populao entre as diversas propostas e plataformas
econmicas alternativas a planificao se transforma,inevitavelmente, em
um sistema burocrtico, autoritrio e ineficaz de ditaduras das
necessidades, como mostra claramente a historia da ex- URSS.

E prossegue Lowy: A polemica do Che contra o fetichismo do mercado era


justificada,mas seus argumentos em favor da planificao seriam muitos mais
convincentes se situados em uma perspectiva de controle democrtico dos
trabalhadores sobre as instancias planificadoras.
Lowy recorre a um participante do debate em Cuba:
Como observava Ernest Mandel em outro contexto,existe um tertium datur
alm dos impasses do mercado,de um lado,e da planificao burocrtica,de
outro: a autogesto democraticamente articulada e centralizada, o
autogoverno planificado dos produtores associados [...]. Nesse sentido, as
ideias de Guevara estavam [...] longe de ser suficientes e minha apresentao
de sua posio, bem pouco crtica [...].

Lowy, em seu Prefacio ao livro de Nestor Kohan (2005) reafirma a importncia


de Che Guevara para o marxsimo em nosso Continente: Seu pensamento o faz um dos
mais importantes renovadores do marxismo na America Latina,talvez o mais importante
depois de Jos Carlos Maritegui.

Sistema Oramentrio de Financiamento, Frente a Recuperao das Fbricas

Como pensava Henry Lefebrev, a autogesto surge nas brechas do sistema


capitalista5. Cuba, com sua Revoluo, semelhante, anos depois, Revoluo na
Arglia, teve esse tipo de problema. Como gerir empresas que passaram para o campo
do que chamamos recuperao? Como seriam geridas? Pelo Estado, pelos
trabalhadores? Inclusive, o governo cubano chegou a criar o Ministerio da
Recuperao de Propriedade Roubada.
Vejamos,inicialmente algumas ideias de C.Tablada. Este teve o mrito de ser o
1 a estudar de forma sistemtica o Sistema que Che foi construindo. Quais necesidades
o Che tentou cobrir com suas ideias.
As bases do SPF6 surgiram inicialmente como um conjunto de medidas
praticas (centralizao de fundos bancrios das empresas,etc) frente a
problemas concretos do setor industrial (empresas com recursos financeiros
excedentes e outras sem recursos,por exemplo).Neste momento a Revoluo
enfrentava questes sociais como o desemprego.Essas bases evoluram
progressivamente at formar um corpo coerente de consideraes polticas e
econmicas cuja formulao terica comeou a se desenhar precisamente por
volta dos anos 1962-1963 e cuja aplicao pratica ficou restrita ao setor
industrial.

Tablada mostra o porque da escolha do Che para esse cargo: Che, desde a
epopia da Sierra Maestra,tinha mostrado seu esprito construtor.Para resolver os
problemas de abastecimento do Exercito Rebelde criou varias oficinas como,a de armas,
alfaiataria,padaria,calado, de racionamento carne,tabacos e cigarros, etc.. E,que Com
o triunfo, foi nomeado Chefe da Fortaleza de La Cabana,em Havana onde o novo
poder se instalou),manifestou a mesma inclinao.
Borrego ressalta a experincia em organizao que o Che trazia acumulada:
Quando responsabilizado pelo Governo Revolucionario para a direo do
desenvolvimento industrial do pais,em 7 outubro de 1959,j tinha somado
expedio do Granma sua herica luta na Sierra Maestra,a invasoda Las
Villas com o final vitorioso da tomada da cidade de Santa Clara,e sua
experincia como Chefe do regimento de La Cabana em Havana.Contava em
seu acervo com uma acentuada vocao pelo desenvolvimento industrial que
tinha experimentado em pequena escala,primeiro nas montanhas e depois em

5
No campo da produo,tal se passou j na Comuna de Paris.
6
Esse setor era dirigido pelo Che.Em outubro de 1959,meses aps a tomada do poder ocorrida em
janeiro de 1959 , Guevara foi nomeado como Chefe do Departamento de Industrias do INRA*.
La Cabana,onde,com o objetivo de forjar uma nova mentalidade de suas
tropas,comeou a desenvolver pequenas industrias para no depender
totalmente do oramento estatal.

O guerrilheiro junto com o executivo construtor de instituies. A guerra de


movimentos com a guerra de posies. Tablada aponta as questes praticas que
levaram a construo do departamento de Industrias, que Guevara assumiu:
O DI foi criado para responder ao desenvolvimento industrial que a Reforma
Agraria gerava.Tambem, na pratica, passou a administrar uma serie de
industrias e pequenas oficinas ,chinchales,que provinham,algumas,das
intervenes ditadas porque seus proprietrios,representantes do velho
regime,tinham enriquecido as custas do errio publico,outras,porque seus
donos as tinham abandonado indo para o estrangeiro ou por conflitos
trabalhistas.

As intervenes do Estado nas industrias deste tipo foi um crescendo: na


segunda metade de 1960 atingia o 60% do total do setor industrial da Ilha;e,em
1961,chegou a mais de 70%.
A obra de Bernardo Perics (2004) nos fornece uma serie de dados fundamentais
para entendermos esse perodo da Revoluo cubana,e as tarefas que Guevara
enfrentou.
Em 1954,havia 830 industrias com no maximo 5 trabalhadores, 45% do
total do pais;aproximadamente, 333 pequenas fbricas com 6 a 10
funcionarios, representando 18,2% do geral; outras, apresentando um numero
que variava entre 11 e 15 homens,eram 320, ou 17,3% do total; em torno de
250 industrias operavam com 26 a 100 trabalhadores,o equivalente a 13,6%
das fbricas;eram 67 as que tinham de 101 a 250 operarios, 3,6% do
geral;apenas 26 as que possuam entre seus quadros de funcionrios entre
251 e 500 trabalhadores,ou 1,4%; e s tinham 14 mais de 500,o que
representava 0,8% do total.

Sobre as nacionalizaes, Perics traz os seguintes dados: Enquanto isso,j


vinha ocorrendo um intenso processo de nacionalizao e estatizao de muitas
empresas.Uma serie de industrias passou para as mos do governo,com uma produo
total de US$ 2,933 milhes na poca,Pericas cita algumas destas as empresas:

Empresa Nmero de trabalhadores


Textilera Ariguanabo 3.049 trabalhadores
Concordia txtil 635
fabrica Cubana de Tecidos 589
Cubanitro 270
Rayonera de Matanzas 1.308
neste quadro que Guevara criou o SPF*: O SPF foi o modo como se
organizou e funcionou a economia estatal cubana no setor industrial na fase inicial da
Revoluo socialista.Seus antecedentes esto nesta etapa,no DI do INRA, que foi
dirigido por Guevara. Segue Tablada:
Muitas das fbricas e pequenos chinchales que passaram a ser
administrados pelo Departamento no tinham os fundos para comprar
matrias primas e para pagar aos trabalhadores. Algumas eram necessrias
pelo tipo de produo,outras em menor medida.
Neste momento se tomou a deciso de unir os fundos de todas as fbricas e
chinchales em um fundo centralziado em que todas as empresas
depositariam seus ingressos e do qual extraiam os recursos programados para
sua gesto de acordo com um oramento.

Deste modo, prossegue Tablada,


Che levou a cabo uma poltica encaminhada a fundir os chinchales, a criar
novas oficinas maiores,em que se poderia introduzir a tcnica,aumentar a
produtividade e diminuir os custos. O pessoal que ficava excedente era
realocado no ramo de produo que o requeria;aos desempregados era pago
para que elevassem sua qualifico tcnica e cultural.

Tablada cita o Che, em relao a qualificao:


[...] o que melhor para o Estado; manter a ineficincia absurda de todas
nossas industrias hoje, para que todo mundo trabalhe e receba um salario
disfarado ou aumentar a produtividade ao Maximo e recolher todos os
excedentes de trabalho,que recebam um salario tambm para estudar e para
capacitar-se j como trabalho central,tornar o trabalho central deles a
qualificao?

A seo de finanas,contabilidade e oramento do DI administrava o fundo


centralizado.Para isso,estabeleceu os oramentos e um programa de
execuo, de acordo com um plano anual.Corresponde a esse Departamento
os primeiros passos que se deram em nosso pais na planificao.

O Banco Nacional era o depositrio do fundo centralizado.O Departamento lhe


enviava copia dos oramentos das unidades e as agencias bancarias no efetuavam
pagamentos supriores ao estimado no oramento. Este era o contexto,estes eram os
desafios.
Guevara foi conhecer outras experincias do campo socialista: Em 13 de Junho
de 1959,quatro meses antes de ser nomeado Chefe do DI,Che partiu para o estrangeiro
com uma delegao do Governo ,foi visitar Egito,India,Japo,Indonesia e Yugoslavia.
Desta viagem que durou dois meses, importante o relatorio do Che sobre a
Yugoslavia,que visitou durante 6 dias.
Prossegue Tablada, citando o relatrio de Guevara:
Todas as coletividades da Yugoslavia, camponesas ou operarias
industriais,se guiam pelo principio que chamam de autogesto. Dentro de um
plano geral,bem definido quanto a seus alcances,mas no quanto a seu
desenvolvimento particular, as empresas lutam entre elas dentro do mercado
nacional como uma entidade privada capitalista.

Essa visita Yugoslvia parece ser fundamental para a viso que Guevara
construiu sobre a Autogesto Financeira (vamos ver que,em outra ocasio,Che fazia a
distino entre a Autogesto Social e essa financeira).
Poderia se dizer que,em traos gerais,caricaturando bastante,que a
caracterstica da sociedade yugoslava a de um capitalismo empresarial com
uma distribuio socialista dos ganhos,isto ,cada empresa tomando,no
como um grupo de operarios mas como uma unidade,essa empresa
funcionaria aproximadamente dentro de um sistema capitalista,obedecendo as
leis da oferta e da procura e estabelecendo uma luta violenta pelos preos e
pela qualidade com seus similares,realziando o que em economia se chama a
livre concorrencia.

Essa a viso de Guevara sobre a Yugoslavia. Mas,o prprio Che diz que
complicado definir deste modo: dar um diagnostico definitivo, em minha opinio sobre
esse tipo social, muito arriscado no meu caso.
C.Tablada conclui essa parte:
Para ns estas notas resultam muito importantes porque em data to ceda
como em agosto de 1959, em seu primeiro contato com uma economia regida
pela chamada autogesto financeira, sem conhecimento direto de outros
pases socialistas,nem da literatura econmica especializada;sem ter um posto
no Governo que o obrigar a ocupar-se destes problemas,como teve
depois,Che manifesta sua preocupao pelo sistema conhecido porque [...]
introduzia fatores de desvirtuamento do que presumivelmente seja o esprito
socialista.

Alm disso, Meses depois,ao ter a responsabilidade direta da


administrao,organziao e desenvolvimento da industria cubana, esta experincia
pesou nas decises que foram conformando o SPF.
Definia Guevara o SPF:
criamos um sistema centralizado da direo da economia,com um controle
bastante rigoroso das empresas; e ademais, com um controle consciente dos
diretores de empresas e consideramos o conjunto da economia como uma
grande empresa e tratamos de estabelecer a colaborao entre todos os
participantes como membros de uma grande empresa,em vez de serem lobos
entre si,dentro da construo do socialismo.

Qual a tese central que estrutura todo o texto e nos d a chave para entender o
Che,pergunta Kohan. Cremos que est resumida no seguinte fragmento de Guevara
citado por Tablada exposto em uma das reunies bimestrais do Ministerio de
Industrias: O Sistema Oramentario de Financiamento parte de uma concepo
geral do desenvolvimento da construo do socialismo e deve ser estudado ento em seu
conjunto.
N.Kohan aponta dois temas em torno dos quais gira a viso de conjunto: o primeiro:
possvel e legitima a existencia de uma economia politica da transio ? O segundo: que
politica econmica se necessita para a transio socialista ?
Kohan retoma algumas ideias do livro de C.Tablada:
[...] vale para a explicao que o autor realiza sobre a gnese histrica da
formao do SPF.Este no surgiu da cabea do Che como arte de magia ou
simples capricho.Carlos tablada relata,por exemplo,a negativa impresso que
j em 1959 ! , na oportunidade de um viagem a Yugoslavia,lhe causou a
Che o sistema de autogesto financeira das empresas.Ainda,neste
momento,no conhecia a Unio Sovietica [...].
Prossegue Kohan,
Aparentemente,a desconfiana surgiria do fato de que Guevara se nega a
abordar as relaes sociais prescindindo da subjetividade,da esfera da
conscincia,da formao de valores e da construo hegemnica da ideologia
e da cultura. Por fim, tentando responder a questo Qual a utilidade do
pensamento do Che?, Kohan aponta: o pensamento do Che nos permite
defender as razes de uma planificao democrtica (no exercida
unicamente por tecnocratas especialistas, isolados da massa, mas atravs
de uma crescente participao popular), a partir da qual a politica
revolucionaria possa incidir no natural decurso econmico atravs da
cultura, da batalha das ideias e da luta para recriar cotidianamente a
hegemonia socialista em toda a ordem social.

A Concepo Ontolgica do Trabalho

Semear uma espiga com amor e com graa


(Len Felipe,poeta mexicano)

Esse ultimo ponto fundamental para compreenso das ideias do Che. Fala-se
muito no trabalho voluntario utilizado pelo Che ,que participava desse tipo de trabalho
como exemplo do exerccio da moral comunista. Contudo, por trs e como base
dessa atividade,o Che tinha uma concepo filosfica do papel do trabalho na
construo do socialismo.
Em uma entrevista na Argelia (Julho de 1963 ),Guevara definia como pensava o
socialismo cubano: O socialismo econmico sem a moral comunista no me
interessa.Lutamos contra a misria porm tambm lutamos ao mesmo tempo contra a
alienao.
Em outra entrevista, no Cairo (abril de 1965),Guevara afirmava: De acordo
com o ensino tradicional do socialismo, a resposta a pergunta por que trabalha uma
pessoa : porque se no trabalha no come; porm nossa resposta : porque o trabalhop
a obrigao do ser humano.
importante lembrar que aps esta viagem Argelia, o Che escreveu a Carta
que se transformou no libro O Socialismo e o Homem em Cuba. Guevara, numa
Reunio bimestral do MI* (dezembro de 1963) lembra de um debate com jovens na
Escola de Economia cubana quando,ento,fala de suas leituras que fundamentam sua
viso de mundo:
Ento, ns lamos para os jovens um pargrafo de MARX, porm do que se
chama o Jovem Marx, porque Marx em 1848 quando jovem 30 anos tinha
em 48-, um pouco antes em 1844, tinha escrito as primeiras coisas
econmicas com uma grande ascendncia da filosofia de Hegel, e a
linguagem de Marx era completamente diferente,como linguagem,da
linguagem de O Capital; que o que ns vemos, ou da linguagem das
ultimas obras,sobretudo O Capital que a mais influente.(...)Quando Marx
escrevia como jovem, como filosofo combativo,representante dos ideiais
liberais da poca,escrevia com outra linguagem,que queria dizer o
mesmo,mas que ia para outras pessoas.
Ento nessa linguagem fala mais do comunismo como um fenmeno
consciente,e como a necessidade de que fosse consciente para que pudera
produzir,e como o episodio final da eliminao do que chama a alieno do
homem, isto , a entrega do homem vendido na forma de fora de trabalho,
vendido aos exploradores. Esse pargrafo a explicao da outra parte. Em
nossa posio, o comunismo um fenmeno de cosnciencia e no apenas um
fenmeno de produo.

Esta viso de Guevara percorre toda suas ideias da construo do socialismo em


Cuba e do Sistema de Planificao que estava construindo na Ilha. Segue El Che:
Isso que est definido por Marx como o comunismo e o que se aspira em
geral como comunismo, a isso no se pode chegar se o homem no
consciente. Se no tem conscincia nova frente sociedade; ento, ns
tratamos de dar-lhe essa conscincia nova frente sociedade; buscamos
separar-nos o mais possvel dos estmulos materiais como necessrios neste
momento(...) Ns divergimos da concepo chamada estimulo econmico
do Calculo econmico. Ou seja, falam de eixo do interesse material e ns
falamos do interesse moral como coisa bsica e o interesse material como
mal reconhecido. Por isso, ao fazermos as normas de trabalho,estabelecemos
isso que chamamos de forma um pouco ridcula desestimulo material, mas
que tem um sentido,isto , o estimulo material ns o temos como
negativo,ento atacamos o negativo, isto , atacamos que o homem seja capaz
de ganhar um salrio,estar frente a um trabalho,receber esse salrio e no
cumprir com uma tarefa. Ento, aplicamos a norma desestimulando-o,no
pagando o que no cumpriu,e em certa medida o estimulamos. Porem,para
que chegue o estimulo a converter-se em um estimulo de capacitao ,
necessria essa etapa prevista de uma capacitao para passar a um nvel
superior.Essa a tarefa enquanto capacitao individual de tipo
mecnico,ou seja, tomada de conscincia de tipo mecanico.

Guevara insistia sempre que no era contra o estimulo material,nas condies e


momento que Cuba vivia. Apresentava, ento, alternativa de forma de trabalho:
Enquanto tomada de conscincia de tipo dinmico que ns devemos
fazer,uma das fundamentais, o trabalho voluntario.Os efeitos econmicos
do trabalho voluntario no devem ser medidos pelos efeitos economicos da
quantidade de horas que trabalhou de mais a equipe do ministrio,mas pela
quantidade de horas extras,horas fora de seu local de trabalho para dedicar-se
produo,e desta forma se produza aquilo que uma vez tnhamos falado, a
compulso moral e que mais gente se junte a esse tipo de emulao
socialista.
Quando define o SEF* como um conjunto de aes,entre elas pe: a
conjuno do estimulo material corretamente aplicado e do estimulo moral,dando-se
uma nfase cada vez maior ao estimulo moral.
Em sua obra O Socialismo e o Homem em Cuba,El Che defendia que:
A ltima e mais importante ambio revolucionaria ver o homem liberto de
sua alienao... preciso acentuar sua participao consciente ,individual e
coletiva,em todos os mecanismos de direo e produo e liga-lo ideia da
necessidade da educao tcnica e ideolgica ...isso e traduzir
concretamente na reapropriao de sua natureza atravs do trabalho liberado
e da expresso de sua propria condio humana atravs da cultura e da arte.
Para que se desenvolva a primeira, o trabalho deve adquirir uma condio
nova;a mercadoria homem deixa de existir e se instala um sistema que
outorga uma cota pelo cumprimento do dever social.Os meios de produo
pertencem a sociedade e a maquina s a trincheira onde se cumpre esse
dever...fazemos todo o possivel para dar ao trabalho essa nova categoria de
dever social e uni-lo ao desenvolvimento da tcnica.

Em Uma atitude comunista frente ao trabalho, Guevara expressa a nova


cultura do trabalho:
Hoje em nossa Cuba o trabalho adquire cada vez mais uma significao
nova,se faz com uma alegria nova. [...] O trabalho voluntario a expresso
genuna da atitude comunista ante o trabalho,em uma sociedade em que os
meios de produo fundamentais de produo so de propriedade social.

A viso de Guevara fica claramente exposta ,por exemplo,nas palestras em


reunies com seus quadros do MI e compiladas na obra de seu principal tcnico,
Orlando Borrego (2002):
Quero dizer companheiros: O trabalho, ponto central da atividade humana, da
construo do socialismo, o trabalho, a quem hoje se rende homenagem
indiretamente,est determinado tambm em sua eficcia- pela atitude que
temos frente a ele.
De novo temos que encontramo-nos com o passado,o passado que salta as
barreiras em que se destruiu a velha sociedade e segue na conscincia dos
trabalhadores.Neste caso, o passado que se reflete fazendo que na conscincia
de muitos trabalhadores seja essa necessidade de trabalhar cotidianamente
uma necessidade opressora,uma necessidade que tratam de burlar,que burlam
considerando que a fabrica todavia do antigo patro,ou seja,indo ao
passado.
E nossa atitude deve ser totalmente diferente. O trabalho deve ser uma
necessidade moral nossa, o trabalho deve ser algo para o qual vamos toda as
manhs,cada tarde e cada noite,com entusiasmo renovado,com interesse
renovado.Temos que aprender a tirar do trabalho o que tem de interessante
ou o que tem de criador,a conhecer o mais mnimo secreto da maquina ou do
processo em que nos toca trabalhar [grifo nosso].

So, sem dvidas, palavras que deixariam estasiado o velho G.Lukacs com sua
Ontologia do Ser Social. Em breve parnteses, importante notar que Guevara,ao
procurar se aprofundar na dialtica,foi estudar Hegel e Lenin.N.Kohan cita:
Se lermos detidamente a carta que ele enviou a Armand Hart,Guevara diz:
estou tratando de por-me em tom com a linguagem filosfica. Ento
escreve: ...a segunda,e no menos importante,foi meu desconhecimento da
linguagem filosofica,e agrega,tenho lutado duramente com o mestre
Hegel,e no primeiro round me derrubou duas vezes. [...]
Guevara, segue Kohan,no meio de sua sada do Congo e antes de ir para
Bolvia,se pe a ler nada menos que Hegel ! (Para Bolivia,pe em sua
mochila um texto,que leu completo e anota com cuidado: El jovem
Hegel.Los problemas de La sociedade capitalista,do marxista hngaro
Gyorgy Lukcs).

Sabemos que o livro de Lukacs sobre Hegel,escrito em sua estadia em Moscou


nos anos 30, um passo fundamental na evoluo do filosofo hungaro no sentido da
ONTOLIGIA do SER SOCIAL,em que aprofunda a sua concepo ontolgica do
Trabalho. Orlando Borrego destaca o aspecto que Che coloca no conceito de trabalho
no socialismo:
Sua nfase ser ir avanando na criao das condies subjetivas,isto
,ideologicas para o desenvolvimento do individuo nas novas condies ate
alcanar um estagio tal que o principal seja o cumprimento do dever social
nos produtores,entendendo como produtor a cada trabalhador sem eu posto
de trabalho.Cumprindo o dever social frente ao trabalho,o homem tem o
direito a que a sociedade reconhea sua contribuio retribuindo-lhe
adequadamente,mas sem vincular direta e unicamente com o beneficio
material a receber.deste modo,o primrio o dever para com a sociedade,e
portanto,a primeira satisfao do indivduo. (...)Precisamente, o Che outorga
uma importncia fundamental ao trabalho voluntario porque este se converte
em um dos atos mais conscientes que pode realizar um individuo em
condies de uma sociedade socialista,ao realizar um aporte extra sociedade
sem esperar a menor retribuio pelo trabalho realizado.Constitui o trabalho
voluntario um dos primeiros escales no amplo processode libertao do
homem frente ao trabalho.

Em relao planificao,Guevara tece muitos comentrios em seu seus


Apuntes Crticos a La Economia Poltica. Criticando a viso de planificao do
Manual da Academia de Moscou:
Se trata planificao como um ente mecnico[...] se esquece que a
planificao a primeira etapa na luta do homem para adquirir domnio sobre
as coisas. Quase se pode dizer,que a ideia da planificao um estado de
esprito condicionado pela posse dos meios de produo e a conscincia da
possibilidade de dirigir as coisas,de tirar o homem de sua condio de coisa
econmica.
Frente concepo do plano como uma deciso econmica das massas
conscientes de seu papel,se d a de um projeto,em que os eixos econmicos
decidem seu exito. mecanicista e antimarxista.As massa devem ter a
possibilidade de dirigir seus destinos,resolver quanto vai para acumulao e
quanto ao consumo,a tecnica econmica deve operar com estas cifras e a
conscincia das massas assegurar seu cumprimento.O estado atua sobre o
individuo que no cumpre seu dever de classe,penalizando-o,ou premiando-o
em caso contrario,estes so fatores educativos que contribuiro
transformao do homem,como parte do grande sistema educacional do
socialismo.O dever social do individuo que o obriga a atuar na produo e
no sua barriga. A isso deve tender a educao.

Enfim,o Che define o Socialismo:


Podemos dizer que a definio do socialismo muito simples. Se define pela
produtividade que est dada pela mecanizao,pelo emprego adequado das
maquinas a servio da sociedade,e por um crescente aumento da
produtividade e da conscincia,que est dado ao por os trabalhadores tudo o
que tm de si,em beneficio da sociedade;produtividade,ou seja,maior
produo,mais conscincia;isso socialismo,e ns o temos que fazer agora,
construir o socialismo,aumentar a produtividade e aumentar a consciencia dia
a dia.

Vamos concluir com as palavras de Jos Arico,quando fez ao Prefcio de sua


compilao de ensaios de Guevara para editora Siglo Veintiuno (1976):
(...) e ao perigo da expanso da degenerao burocrtica que toda estatizao
gera e que a debilidade do poder popular alimenta, Guevara destaca a
necessiadade de acentuar a participao consciente, individual e coletiva,dos
trabalhadores cubanos. S uma poltica de massas, plenamente aberta
participao popular, podia ser capaz de cobrir o espao ainda vazio da
institucionalidade revolucionaria. Antes que fabricar desda a cpula modelos
institucionais que em vez de soldar direo revolucionaria com as massas
abriria entre ambas uma ciso insupervel,o Che encontra uma sada,
transitria claro est,na massificao poltica e, portanto, consciente do
trabalho voluntario. Se as noas instituies do poder popular s podem ser
gestadas por baixo pelas prprias massas em movimento,mobilizar s massas
era criar o terreno mais apto para que a capacidade de auto-organizao dos
trabalhadores pudesse abrir espaos. (...) Mobilizao permanente,
participao nas decises, educao tecnica e ideologica, estas eram para
Guevara as palavras que poderiam permitir a Cuba evitar o caminho as vezes
sem retorno da degenerao burocrtica e avanar na construo do
comunismo.

Finaliza rico: Sobre estes pilares deveriam ser estruturados os mecanismos de


gesto da economia socialista cubana. Sem dvidas, na linha do Princpio da
Autogesto!

Maritegui - Uma sensibilidade socialista autogestionria nos Andes

Mariategui ainda se ergue como um farol, que ilumina o


horizonte intelectual e politico dos que querem conferir aos
latino-americanos a opo pelo marxismo
(FERNANDES)

Um ensaio sobre a vida e obra de Maritegui, na atual conjuntura ,marcada


por 2 anos do Governo Lula, no poderia deixar parte algumas consideraes sobre o
momento que as esquerdas vivem em nosso pais. A vitoria do PT ,com uma aliana de
centro , despertou imensas esperanas de superao do que podemos chamar a longa
via passiva predominante na nossa historia. Neste sentido, buscamos as vises de
vrios socialistas expressas no momento do Frum Social Mundial,quando Lula tinha
acabado de tomar posse.
Dizemos isto porque a vigencia da obra de Mariategui adquire mais expresso
nesta conjuntura ,que na verdade, um processo de longa durao, relativo ao
esgotamento em nvel estrutural , de atores, partidos,ideias,etc. Parece que se encerra
todo um longo ciclo,iniciado nos anos 30.Para as esquerdas, significa mais um momento
de reestruturao como os j vivenciados no ps Guerra( 1946) , no ps Golpe Militar
(1964) e no final da ditadura militar (80) , quando surgiu o PT. Nestes vrios momentos,
viradas de pocas, as esquerdas ,em alguns, conseguiu superar o momento histrico de
forma relativamente unitria, noutros , atravs de fragmentaes que tiveram
posteriormente resultados negativos. Mais uma vez, a historia conclama por novas
opes. nesta encruzilhada, que Mariategui traz contribuies fundamentais.
Em 1994, quando da vitria do neoliberalismo , Florestan Fernandes ,antevendo
desafios futuros , escreveu sobre a atualidade de Mariategui, levantando questes que
constituem uma verdadeira agenda ,ainda vlida para os nossos dias. Afinal, os
impasses e problemas estruturais ,postos para as esquerdas em 1994, ainda no foram
superados.

A obra de Mariategui no Brasil


A fortuna da obra mariateguiana no das mais ricas no Brasil, como veremos
adiante. Mas, nos anos 2006-2009, vrios ensaios e livros foram produzidos sobre
Mariategui. Todavia, do ponto de vista qualitativo, podemos afirmar que h um olhar
brasileiro em relao a sua obra.Um dos grandes marxistas do nosso pais,dedicou
carinho especial a obra do Amauta.
Neste sentido, no Brasil, uma das formas mais plenas de possibilidades de
abordagem da obra de Mariategui, atravs das reflexes de Florestan Fernandes sobre
o legado do Amauta. Este o sendero que vamos trilhar.
Em relao a bibliografia brasileira ,de Mariategui existe apenas uma nica obra
traduzida em nosso pais: o famoso Sete Ensaios,publicado em 1975 pela Editora Alfa-
Omega e, prefaciado por Florestan. A Editora Expresso Popular lanou uma edio dos
7 Ensaios em 2009. Mas, sobre Mariategui,h vrios escritos
:REVER ---
uma coletnea de textos do marxista peruano no volume n. 27 da Coleo
Grandes Cientistas Sociais, da Editora Atica. Essa coleo era coordenada por
Florestan;
alm destas iniciativas de Florestan, h na Coleo Encanto Radical, da
editora Brasiliense, uma brochura sobre Mariategui, de autoria do argentino
Hctor Alimonda, publicada em 1983;
na obra coletiva Amrica Latina, historia,ideias e revolues,Editora Xam e
NET, 1998, o celebre filosofo mexicano Adolfo Sanchez Vasquez traz um artigo
: Mariategui, grandeza e originalidade de um marxista latino-americano;
Alfredo Bosi, na Revista Estudos Avanados de janeiro-abril 1990, publicou o
ensaio A vanguarda enraizada (o marxismo vivo de Mariategui). Este mesmo
ensaio foi republicado na Coletnea, organizada por Denis Moraes, intitulada
Combates e Utopias(2004);
Jose Paulo Neto, na poca de seu exlio,nos anos 70, lanou em Portugal uma
brochura sobre o pensamento de Mariategui;
na brochura Marxismo e Socialismo na Amrica Latina,Cludio Nascimento
traz um ensaio intitulado Mariategui, che Guevara e Carlos Fonseca
Amador:fontes da revoluo na Amrica Latina(Ceca-Cedac.1989);
em A Historia do Marxismo,org. por Hobsbawm,h 2 textos nos quais se
aborda o pensamento de Mariategui: um de Jos Arico e outro de Portantiero;
Bernardo Ricupero, em sua obra sobre Caio Prado Jr. E a nacionalizao do
marxismo no Brasil,(Editora 34,2000) dedica varias pginas ao pensamento de
Mariategui;
recentemente, Enrique Amayo e Jos Segatto, publicaram a obra
J.C.Mariategui e o marxismo na Amrica Latina,com o objetivo de
(reintroduzir o pensamento de Mariategui no meio universitrio (e no s)
brasileiro.(Editora Cultura Acadmica.Serie Temas Temas em
Sociologia.Unesp,2002.)Significativamente, esta coletnea traz textos de
Florestan (a introduo aos Sete Ensaios),do peruano Anbal Quijano e de
Antonio Melis;
em Junho de 1994, a revista Amrica Libre n. 5, publicou na seo Amrica
Recuerda,um ensaio de Cludio Nascimento intitulado Mario Pedrosa y
Mariategui.El marxismo embruxado;
em set.-dez. de 2000, a revista Utopia y Prxis Latinoamericana,Ao 5. n. 11,
publicou tambm de Cludio Nascimento,o ensaio Jos Carlos Maritegui e o
especifico nacional;
a Revista Teoria e Debate(do PT) publicou em 2000, dois ensaios sobre
Mariategui: de Michael Lowy, o ensaio publicado quando do Seminrio
realizado em Paris em comemorao ao centenrio de Mariategui: O marxismo
romntico de Mariategui;e, outro de Enrique Amayo;
M..Lowy,em sua Antologia O marxismo na Amrica Latina, de 1900 aos dias
atuais(Editora Fundao Perseu Abramo,1999), faz importantes referencias a
obra do marxista peruano;
M.Lowy, em 2007, lanou pela editora da UFRJ uma coletanea de ensaios do
Amauta,intitulada Por um socialismo indo-americano.

Voltando a Florestan: no ano de 1994, quando se comemorava o centenrio do


Amauta, Florestan voltaria a obra de Mariategui, com um texto publicado no Anurio
Mariteguiano (volume 6, numero 6, de 1994), com o titulo de Significado Atual de
Mariategui.
No ano seguinte, a editora Atica publicou a ultima obra de Florestan, que morreu em
agosto desse mesmo ano, significativamente intitulada de A Contestao Necessria-
retratos intelectuais de incomformistas e revolucionrios.Nesta obra, Florestam busca
responder as novas questes postas para a esquerda brasileira com a vitoria de FHC.

O contexto (ps)neoliberal
No centenrio do marxista peruano, um novo bloco dominante se constitua no
Brasil, articulando uma grande aliana conservadora que unificou o conjunto das classes
dominantes e elegeu FHC Presidncia do pais.
Oito anos aps este fato, uma outra frente poltica,desta vez de centro-
esquerda,elegeu nas eleies de 2002 ,Lula,um ex-operario metalrgico,ex-presidente
da CUT e do PT, Presidncia do pais.Assim, cria-se a perspectiva de superao de
uma onda longa conservadora ,do neoliberalismo. Dizia-se que a esperana venceu o
medo.Na verdade, as expectativas da sociedade,sobretudo,dos setores mais pobres,
imensa.O novo presidente,quando da posse em Braslia, simbolicamente rendeu
homenagem varias geraes da esquerda brasileira: citou na manifestao da avenida
Paulista, a Mario Pedrosa; visitou Celso Furtado ,Maria da Conceio Tavares,Apolnio
de Carvalho;a viva de Sergio Buarque de Holanda.
Nos primeiros meses lanou o combate fome. Durante o III Frum Social
Mundial,realizado em Porto Alegre,em janeiro de 2003,ms da posse de Lula,em
Seminrios e Conferencias, intelectuais de vrios paises discutiram as novas
perspectivas e possibilidades abertas historia pela eleio de Lula.

Possibilidades entre a esperana e a frustrao


Os inmeros debates ocorridos durante o terceiro Frum Social Mundial ,e,
diversos ensaios publicados em jornais, revistas e debates na Mdia, nos permitem ter
uma ideia da perspectiva que se abria no Brasil. As anlises mostram que no se trata
apenas de uma nova conjuntura,mas de uma mudana que est grvida de possibilidades
para transformaes qualitativas. No conjunto, entre otimistas e pessimistas, podemos
ver que se trata acima de tudo de uma aposta pascaliana: ambas as possibilidades, de
derrota e de vitria, esto presentes.
O cientista poltico grego SAMIR AMIN , em debate no Frum Social Mundial
, sobre o tema O novo Brasil no mundo atual, afirmava que a situao do pais
potencialmente revolucionaria e que seria um terceira etapa na historia do pais :
a primeira se encerrou com o fim da escravido;
a segunda contempla desde a Republica, passando pelo populismo de Vargas at
o regime militar;
a eleio de Lula, o inicio da 3a etapa, pois permitir a entrada em cena das
classes populares. Esta tem sido a tnica em relao ao momento atual
brasileiro: uma abordagem que implica temporalidades longas e contradies
profundas.
Nesta mesma perspectiva, o cientista poltico brasileiro Francisco de Oliveira,
escreveria: Na periodizao da longue dure brasileira, a eleio de Lula...tem tudo
para ser uma espcie de quarta refundaao da historia nacional, isto , um marco de
no-retorno, a partir do qual impom-se novos desdobramentos. Ela pode ser a
liquidao do que tem sido chamado a longa via passiva brasileira, essa forma
autoritria da expanso capitalista, uma modernizao sempre truncada pela limitao
da cidadania.
Na periodizao de Oliveira,
a Abolio seria a primeira refundao;
a Republica seria a segunda;
a Revoluo de Trinta, a terceira.

Enfim, o momento atual est marcado pela possibilidade de que as classes


dominadas convertem-se no novo eixo republicano e democratico. No final do ensaio,
nosso Autor adverte que, O resultado eleitoral no significa hegemonia, mas apenas
sua possibilidade. a poltica que ser instaurada que pode transformar o resultado em
hegemonia.O carater do novo perodo que se abre ainda enigmtico.
O critico literario Antonio Candido, tambm fazendo uma analise de onda de
longa durao afirma que h um simbolismo na eleio de Lula: cansado das injustias e
dos erros cometidos pelas elites, o povo brasileiro resolveu confiar o seu destino a
algum da classe operaria. Candido define a singularidade de Lula, pelo fato de que,
continua essencialmente identificado aos intereses da sua classe. Sob esse aspecto, a sua
vitria coroa um PROCESSO HISTORICO iniciado com as lutas sociais do fim do
sculo 19 e acelerado depois de 1930 devido ao incremento da industrializao.
Candido ressalta as esperanas do ps-Guerra, em 1945, e que, talvez, o momento
decisivo veio com as greves do ABC em meados do decnio de 1970.
Candido recorre a analogia com a conjuntura aberta em 1945 , afirmando que a
utopia dos socialistas naquela poca, expressa por Paulo Emilio de juno da classe
media, do campesinato e do operariado, pode agora ser uma realidade: Talvez as trs
foras definidas por Paulo Emilio possam agora compor uma aliana capaz de mudar a
face do Brasil.
Por sua vez, Jose Luiz Fiori declara que dos 3 projetos que disputaram o poder e
as ideias no Brasil, o terceiro est se iniciando agora: nunca ocupou o poder estatal
nem comandou a poltica econmica de nenhum governo republicano, mas teve enorme
presena no campo da luta ideologico-cultural e das mobilizaes sociais.
Nos anos 60, a vertente nacional,popular e democratica do desenvolvimento
chegou a propor uma reforma do projeto. Para Fiori, a historia no se repitir, mas no
nenhum anacronismo retomar velhos objetivos frustados e reprimidos atravs da
historia para reencontrar novos caminhos.
Todavia, com a mesma metodologia da longue dure, encontramos vozes que
alertam para a possvel frustao, titulo do ensaio de Csar Benjamin . Este afirma
que ningum sabe descrever, com um mnimo de preciso, que pais Lula vai governar.O
Brasil que temos pela frente um quebra-cabeas que ainda no foi montado.. E que,
Da trajetria percorrida no sculo 20, at cerca de vinte anos atrs, j temos
interpretaes mais ou menos consagradas. De l para c estamos em vo cego.
Csar afirma que a crise brasileira no apenas uma crise de Estado, mas uma
crise que perpassa o conjunto da sociedade, e que sua soluo implica algo muito difcil:
revolucionar relaes sociais.
Em relao a via passiva brasileira, lembrada por Francisco de Oliveira, Perry
Anderson nos adverte que:
H tambm o peso da tradio cultural que se far sentir sobre os agentes de
qualquer renovao. Muito mais ainda que a Itlia, que lanou o conceito
para o mundo, O Brasil por excelncia o pais do transformismo, a
capacidade que possui a ordem estabelecida de abraar e inverter as foras
transformadoras, at que fica impossvel distingui-las daquilo que se
propunham a combater. o lado sombrio da incomparvel cordialidade
brasileira. O paz e amor , por antecipao, um vocabulrio de indigesto
e derrota. Uma causa pode sobreviver a um slogan, mas , sem slogans
melhores do que este, as presses objetivas no vo demorar a esmagar os
desejos subjetivos.

Um longo ciclo : 1973 2003...

Emir Sader, analisa o momento atual da Amrica Latina a partir do fato de que
2003 promete ser o ano mais importante para o continente desde 1973...A partir de
2003 enfrentamos uma aberta crise de hegemonia na Amrica latina, com o
esgotamento dos blocos no poder, sem que se tenham formado ainda novas foras em
condies de preencher esse vazio.
Se o continente aponta para um horizonte pos-neoliberal, 2003 ter sido um ano
histrico, como foi 1973, porm desta vez, para um patamar de avano das lutas
histricas. Assim, abre-se
Um perodo novo em que os espaos de alternativa esto abertos,
representando para o movimento popular e o movimento de massas
possibilidades novas de interveno, com governos que podem ser expresso
e interlocutores de suas reivindicaes e que, por sua vez, tero seu
significado condicionado pela prpria ao das foras sociais, poltiticas e
culturais que a esquerda latino-americana acumulou nas decadas de
resistncia ao neoliberalismo.

O cientista poltico argentino Atlio Boron, afirma que: a eleio de Lula da


Silva representar o comeo do ciclo histrico pos-neoliberal na America Latina. A
vitoria de Lula constitui,para Boron,
um fato histrico comparvel, no ultimo meio sculo, com o triunfo da
Revoluo Cubana em janeiro de 1959, com o de Salvador Allende no Chile
em setembro de 1970, coma vitria insurreicional infelizmented derrotada
depois- dos Sandinistas e com a irrupo do zapatismo no Mxico em janeiro
de 1974. Contudo, Boron tambm adverte para as enormes dificuldades do
processo. Diz que as reformas propostas no so suficientes para a construo
de uma sociedade pos-capitalista; mas, podem, se forem realizadas sob uma
forma democrtica, auto-gestionria,participativa, constituir um aporte
considervel para avanar em direo a uma nova sociedade.
Revoluo ativa ou iluso de hegemonia ?

Todavia, os primeiros meses de Governo Lula, no corresponderam s


expectativas(...). Sobretudo, a continuidade no campo da poltica economica
,emperrando os projetos de cunho social e as polticas pblicas,eixos fundamentais e
determinantes do Programa de Governo do PT. Alguns Ministrios e Agencias
financeiras foram ocupadas por foras empresariais conservadoras.Ministerio da
Industria e Comercio, Ministrio da Agricultura , Banco Central,por exemplo.Este
processo explicaria algumas dificuldades e mesmo derrotas do campo popular-
democratico: meioambiente com a questo dos transgenicos;a disputa pela
representao do mundo do trabalho, sindical e cooperativo,travada no Frum Nacional
do Trabalho.
O cientista poltico Francisco de Oliveira, profundo conhecedor dos processos
polticos brasileiros tentou analisar o novo momento poltico. Na introduo nova
edio de sua Critica Razo Dualista, o sociologo pernambucano, em ensaio
chamado de Ornitorrinco, conclui que A representao de classe perdeu sua base e o
poder poltico a partir dela estiolou-se. Nas especificas condies brasileiras, tal perda
tem um enorme significado: no esta vista a ruptura com a longa via passiva
brasileira,mas j no mais o subdesenvolvimento
Em um ensaio, significativamente intitulado H vias abertas para a America
Latina?, apresentado como palestra de abertura da Assemblia geral da CLACSO
(Cuba,out. 2003), Chico de Oliveira, faz referencia ao Governo Lula:
A vitria nas eleies e o governo Lula so outros casos de advertncia que
podem dar a iluso de hegemonia das foras do trabalho; mas, examinando-se
o desempenho presidencial, a verdade pode ser o oposto.Toda a longa
acumulao de experincia dos movimentos sociais brasileiros,incluindo-se
nele o prprio movimento sindical do qual originou-se Lula,produziu uma
quase hegemonia nos termos de Gramsci...O governo Lula nega, na pratica,
essa quase hegemonia e, pelo contrario, entrega-se reiterao de tudo que
combateu.Para no cairmos no registro simples da denuncia moral que
continua sendo urgente e continua sendo um elemento da poltica-, faz-se
preciso escavar as causas estruturais de tais desvio [grifo nosso].

Ainda h vias abertas para Amrica latina?, ou tambm podemos nos


perguntar: H, ainda, um grito parado no ar : as possibilidades esto esgotadas ,ou, ser
possvel uma mudana na relao de foras que permita o avano das foras
democrticas e populares?
Por paradoxal que possa parecer, a conjuntura aberta com o neoliberalismo (em
1994) e a conjuntura aberta com a eleio de Lula, ambas portam questes similares
para as esquerdas. Questes que s podem ser respondidas ,seguindo a advertecia de
Chico de Oliveira: escavando as as causas estruturais, analisando ondas de longa
durao. Neste sentido, a reflexo de Florestan Fernandes ,traada em 1994 , tambm
diz respeito aos dilemas atuais .

O retorno a reflexo de Florestan


Logo aps a derrota de Lula em 1994, o sociologo Florestan Fernandes, atravs
de reflexes sobre a atualidade do pensamento de Mariategui, punha varias questes na
ordem-do-dia. Florestan tentava responder as novas questes ento postas para as
esquerdas brasileiras,no contexto da vitria do neoliberalismo com FHC na presidncia.
O centenrio do marxista peruano Mariategui realizou-se no mesmo ano em que, no
Brasil, o novo bloco dominante constitudo por uma grande aliana conservadora,
unificando o conjunto das classes dominantes, chegou ao poder, com FHC, nas eleies
presidenciais de 94.
Como falamos acima, quando do centenrio do Amauta,em 1994,Florestan
voltou ao nosso autor, com um texto : "significado atual de Mariategui". Enfim, em
julho de 1995, tivemos a ultima obra de Florestan, "A Contestao Necessaria-retratos
intelectuais de inconformistas e revolucionrios".
Nesta obra Florestan,num mpeto Benjaminiano,afirmaria :
No Brasil, ocorreu um deslocamento de rumos do socialismo e da social-
democracia.Esta se amalgamou ao controle conservador, interno e externo, da
economia, da cultura e do Estado. Serve como instrumento de continuidade
no poder das elites das classes dominantes e de contemporizao com os
baixos salrios e a excluso de milhes de indivduos da sociedade civil.O
socialismo, porem, encontrou canais de defesa relativa. O pensamento radical
enervou-se e reativou nichos de sobrevivncia construtiva.

No prefacio, escrito em julho de 95, aps situar o contexto, Florestan levanta


algumas questes:
Essas condies novas provocam indagaes sobre os papeis dos intelectuais
nos movimentos sociais ou sobre o destino de sua produo.
Sucumbiram onda conservadora ou ainda contam com os meios para criar
ideias suscetveis de elaborao pratica, no plano poltico - cultural ?
De outro lado, estas tendncias radicais ou revolucionarias do passado In flux
possuem vitalidade suficiente para desencadear novas composies partidrias e
na "transformao do mundo" ?
Por fim, o radicalismo burgus ainda pode ou no suscitar impactos positivos
sobre processos centrpetos de modernizao autctone da ordem social?
A busca de Florestan tem, claramente, um espirito Benjaminiano: "As perguntas
apontam a necessidade de sondagens sobre o passado que se incorporam ao presente e
no podem impedir um futuro com outras perspectivas".
Florestan particulariza a questo em termos de " nossas condies":
O quadro catastrfico no to sombrio . O atraso aninha potencialidades
que esto sendo arrasadas nos pases imperiais.H um vazio poltico que
protege a emergncia ou o reaparecimento de foras sociais que no puderam
ser eliminadas confuso que os controles ultraconservadores impuseram
sobre a inteligncia e o comportamento radical no surge, aqui, com o mpeto
destrutivo que apresenta na Europa e nos Estados Unidos.

Para Florestan, "A periferia,contudo, no esmagou todas as modalidades de


radicalizao social e poltica. A revoluo anticolonial e nacionalista subsiste e o
significado do socialismo preservou-se ou enriqueceu-se em diversas regies".
Prossegue, ento, definindo o papel de seu livro neste contexto:
"A Contestao Necessria" uma tentativa de reter e discutir manifestaes
dessa natureza. Apesar de suas insuficincias, em vista dos materiais
utilizados e da falta de um fio condutor na reelaborao interpretativa
adotada, representa um ponto de partida para outras reflexes de maior
envergadura. O que importa, no momento, que restabelece o valor de uma
herana intelectual e poltica que parecia condenada ao esquecimento ou
supresso pela violncia.
A Contestao Necessria focaliza como seu objeto o eclodir de aspiraes
utpicas, que foram destroadas pelas classes dominantes e pelo recurso
extremo de duas ditaduras. Assinala esperanas frustadas, que se encontram
pairando sobre a sociedade brasileira. O livro no tem a pretenso de ser mais
inclusivo, como ocorre com a obra j clssica de Carlos Guilherme Mota, A
Ideologia da cultura brasileira (1933-1974).

Para Florestan, o titulo "Contestao Necessria",


repe o imperativo de salvar esperanas, que sobrevivem e crescem no
substrato de uma sociedade capitalista fomentadora de contradies que
convertem a radicalidade em estilo de pensamento e de ao, indispensveis
construo de um futuro limpo da canga arcaica e ultraconservadora.

Entre os incorformistas e revolucionarios, Florestan traa uma constelao que


abrange
Antnio Cndido, Caio Prado Jnior, Carlos Marighella, Claudio Abramo, Fernando de
Azevedo, Gregorio Bezerra, Henfil, Herminio Sachetta, Mariategui, Jose Marti, Prestes,
Lula, Octavio Ianni, Richard Morse, Roger Bastide.
No capitulo primeiro, " O Intelectual e a Radicalizao das Ideias",Florestan
inicia-o com a figura de Lula, em seguida aborda Marti, e, a seguir Mariategui. Pontua:
Recorri a uma simulao fecunda: o que faria J.C. Mariategui nesta era de
incerteza para o socialismo? Ele sucumbiria moda e propaganda
demolidora do marxismo nas naes capitalistas hegemnicas?
Minha suposio que Mariategui possua uma personalidade incorruptvel e
indomavel.Baseio-me no fato de que ele foi pioneiro em duas frentes:
1- na pugna com conservadores, que encaravam o marxismo como
iluso;
2- e na critica a companheiros que no avanavam com sua fibra e
perspiccia na interpretao da situao histrica peruana e latino-
americana.No cedeu o passo.Levou seus combates s ultimas
conseqncias, oferecendo a todos as mesmas respostas de quem sabe o que
faz e por que faz.Em conseqncia, sua figura admirvel eleva-se como
exemplo em um universo de oportunismo e capitulao. Exagerava suas
opes tericas ou praticas ? O xito do capitalismo acarretava o abandono
da utopia ? Nada disso. A historia avana por um curso que construdo por
seres humanos, e as contradies que os separam aumentaram sem cessar.Ele
lembra que nossas razes brotam e sobrevivem na Amrica Latina.A escolha
entre o colonial, o privilegio e a rebelio pode medrar segundo ritmos
histricos lentos e sinuosos. Mas ela no se desvanece como as nuvens. A
menos que a subalternizaro penetre e paralise os que sofrem a opresso e a
misria, sucumbindo condio de escravos.

Aps Mariategui, Florestan nos fala sobre Caio Prado Jnior, que "como
Mariategui, portanto, plantou o marxismo na Amrica Latina e esperava deste seu
partido (o PCB) uma orientao revolucionaria especifica e coerente".
Em trs ocasies, Florestan escreveu sobre Mariategui: no Prefacio (escrito em
outubro 1974) aos "7 Ensaios"; no texto para o Anurio (1994) dos 100 anos de
Mariategui, 20 anos aps aquele Prefacio; e em "A Contestao Necessria" (1995), que
de um lado, traz um Prefcio escrito em 1995 e, de outro, retoma o texto escrito para o
Anurio de 1994.
No prefacio aos "7 Ensaios", Florestan Lamentava que "somente agora, depois
de quase meio sculo aps sua publicao original em livro, ela se torne acessvel ao
publico e aos estudioso brasileiros". Para Fernandes, Mariategui teve 2 objetivos nestes
Ensaios: contribuir para a critica socialista dos problemas e da historia do Peru; e
concorrer para a criao de uma verso peruana do socialismo. "Mariategui o nosso "
irmo mais velho", numa CADEIA DE LONGA DURAO, a qual mostrou sua
primeira florada na dcada de 20, atingiu um clmax histrico com a revoluo
cubana[...]".

" O que ficou desse intento revolucionario (...) ? Ficou a proposio de uma tica
revolucionaria, que no um ersatz intelectual, mas uma resultante coerente da
aplicao do materialismo histrico interpretao da realidade peruana (e, por
desdobramento e ampliao, da realidade latino-americana). fcil, hoje, dizer-se que se
poderia Ter ido mais longe nisto ou naquilo e condenar a interferncia de fontes no-
marxistas ou para-marxistas sem eu pensamento.
Tomando-se o "aqui" e o "agora" ,porm : quem foi mais longe ? e quando ? Essas
perguntas no so retoricas.Mariategui no se afirma apenas como pioneiro.Ele
promove as primeiras analises concretas, de uma perspectiva marxista, de vrios temas
cruciais:
a formao do capitalismo na Espanha;
a irradiao do capitalismo da Europa para a Amrica Latina;
as transformaes da dominao imperialista sob o impacto do aparecimento e
fortalecimento da grande corporao ou da presena norte-americana;
e, sobretudo, as relaes entre a base econmica e as estruturas sociais e de poder da
sociedade peruana, nas varias fase do perodo colonial e do perodo nacional.
Naquele momento, outubro de 1974, marcado pelo inicio da " abertura
politica",inicio do fim da ditadura militar no Brasil, Florestan dizia que :
Por fim, coloca-nos diante de um exemplo que , em si mesmo, um desafio.
Mariategui pagou um alto preo sua independncia, honestidade e firmeza
revolucionaria. Ele o tipo de autor que devemos ler e reler com
ateno,numa poca que exige de ns que botemos todo o nosso sangue na
defesa de nossas ideias- e na qual a alternativa para a luta sem trguas por
uma sociedade de homens livres para homens livres a servido.

J o texto para o Anuario,de 1994 e,sobretudo, o Prefacio de 1995 para o livro


"A Contestao Necessria", o momento era outro: o bloco no poder saia vitorioso em
mais um processo de " revoluo passiva" brasileira, iniciado em 1985 ,com a Nova
Republica, e 1989 ,com a derrota de Lula para Collor,em conjunto com a derrocada do
socialismo estatal burocrtico no Leste europeu.Tomava corpo a poltica neoliberal.
Florestan, ento, retoma o Prefacio de 1975, ampliando-o.Mantm o texto para o
Anurio de 1994 e, situa os desafios novos no Prefacio para seu livro sobre os
Intelectuais e Revolucionrios (1995). No texto intitulado " Significado atual de
J.C.Mariategui", Florestan nos d sua viso da obra do Amauta.
No epigafre, citando Anbal Quijano,Florestan capta o ncleo gerador da obra
mariateguiana: "O recurso diversa realidade entre Europa e Amrica Latina, como
defesa perante o eurocentrismo...". Ou seja, a base da reflexo que conduz a dialtica
entre tradio x modernidade. Vejamos em longas citaes as ideias de Fernandes.
J se discutiram muito as contribuies de Mariategui...Nenhum dos assuntos
e atributos chegou a ser esgotado. Ele escapou, entretanto, s falhas da
memria coletiva e sua presena superou todas as formas de isolamento que
ameaaram sua obra ainda em vida.isso aconteceu porque foi mais que ' um
fermento radical' da ordem - um autentico revolucionario, que exerceu
influencias pioneiras com razes profundas na realidade americana.
Interessa-nos o que ele representaria, hoje ,gracas s peculiaridades do seu
pensamento e ao,nesta tragica etapa de negao do socialismo. Parece que
o capitalismo oligopolista automatizado e "global" suprimiu para sempre as
diversas correntes do anarquismo ,do socialismo e do comunismo... uma
aventura arriscar-se s indagaes que proponho... obvio que Mariategui
no engoliria a mistificao do " socialismo est morto". Ele sabia
amadurecidamente que o capitalismo no consegue resolver os " problemas
humanos" , que ele gera e multiplica...Sua convico era clara: os progressos
do capitalismo redundam em aumento geomtrico da barbrie. Essa realidade
sempre foi subestimada de uma perspectiva eurocentrica.Um marxista
peruano, todavia, no tem porque se enganar a respeito.Basta olhar para trs
ou para o presente.Exitos e progressos trazem consigo contradies
crescentes - no extremo fatal, implosivas. Uma civilizao que repousa na
riqueza, na grandeza e no poder, por quaisquer meios exige um sistema social
de excluso, opresso e represso....".

Florestan expe o modo como o peruano via o sistema capitalista, como


expresso de uma civilizao. E no somente um modo de produo.
Por isso, o dialogo com Maritegui deve possuir a natureza de uma opo
lcida. O que est dado como uma "sociedade aberta" ou como uma " ordem
social-democratica" fecha-se para a imensa maioria ( silenciosa ou
contestadora) e s oferece "democracia" s elites no poder (isto , s classes
dominantes). A questo no abarca todas as tcnicas, instituies e valores
sociais dessa civilizao. Mas seus fundamentos axiologicos e tecnolgicos,
asfixiantes e incoercivelmente corrosivos.

Florestan, formula,ento,toda uma serie de questes sobre o capitalismo em sua


etapa atual:
Portanto, nos dias que correm, Maritegui - ao contrario de tantos
anarquistas, social-democraticos, socialistas e comunistas - encontraria
dentro de si a indagao fundamental:
como representar e explicar a totalidade histrica intrnseca ao capitalismo
monopolista automatizado?
O que ele promete de novo evoluo da humanidade e da " civilizao ps-
moderna"?
O que reserva aos de baixo, "escoria", ao "trabalhador mecnico" inativo,
aos estratos inferiores e intermedirios das classes medias? O que ele remete
e arranca da periferia, subcapitalista ou em desenvolvimento capitalista, e
aqueles pases nos quais a lenta transio para o socialismo no foi ainda
arrasada?
Ciencia, tecnologia, tecnocracia racionalizada foram, por fim, colocadas a
servio dos "homens livres e iguais" ou servem apenas concepo romana
de riqueza, grandeza e poder - repetida no "destino manifesto" dos Estados
Unidos e na conglomerao de potncias que encarnam a mesma aspirao
de atingi-la?
E qual a essncia civilizatoria desse mesmo capitalismo ultramoderno ? Ele
contm a propenso para abolir as classes, a dominao de classes e a
sociedade de classes? Ou as oculta por trs de uma miragem pela qual a
"ideologia" escamoteada reaparece com vigor nunca pressentido no
"neoliberalismo"? Sem nenhuma dvida, questes para as quais as esquerdas,
em reestruturao, necessitam escavar nas profundezas.

Para Florestan, Os 7 Ensaios de interpretao da realidade peruana e, Em Defesa


do Marxismo, "delimitam a postura de Mariategui". Florestan critica o erro das ticas
eurocntricas e bolcheviques no seio do marxismo e, v em Mariategui "o intelectual
mais puro e apto para perceber o que sucedeu ,se estivesse vivo, para traar os caminhos
de superao que ligam dialeticamente a terceira revoluo capitalista plenitude
madura do marxismo revolucionrio".
Para Fernandes, no debate de Mariategui com Haya de la Torre, "patenteia-se,
pois, o quanto Mariategui transcendeu a orbita do marxismo triunfante do seu tempo e o
quanto ele compartilha conosco a necessidade de ir mais longe para ver".
Desse angulo, Mariategui o farol que ilumina, dentro da pobreza e do atraso
da Amrica Latina, os limites intransponveis da civilizao capitalista e as
exigncias elementares da "civilizao sem barbrie", que as revolues
proletrias no lograram concretizar.
- Era cedo demais?
- Elas perderam o rumo?
Essas so perguntas que s a historia em processo poderia responder.As
equaes de Mariategui classificaram precises contidas na tradio clssica,
paradoxalmente como se ele fosse um Max Weber a servio do comunismo (
repetindo, de certa maneira, a tragdia de Gramsci).

A "condio de peruano"
Florestan avana na definio do carter do " especifico nacional" em
Mariategui.
natural que o Peru ocupe uma posio privilegiada no pensamento de
Maritegui. Ele procede, no obstante, rente tradio marxista - Peru no se
desloca das varias Amricas e da insero passiva-ativa de todos os
envolvidos nos mundos histricos dos "conquistadores", antigos e modernos
sua condio de peruano bsica.Ele tinha atrs de si e sob seu olhar uma
grande civilizao, o destino dos seus portadores e os seus escombros. Isso o
impelia ao estudo do passado e do presente que nenhum outro marxista de
envergadura poderia realizar. E o obrigava no s a busca de analogias e de
diferenas que procediam ou da situao homologa das "naes emergentes"
das Amricas de matriz ibrica, ou do carter varivel da colonizao e da
independncia como processos de longa durao.

Florestan define esse resumo como "suprfluo e desnecessrio", mas que o fez
para salientar a experincia europia de Mariategui: "Os 7 Ensaio de interpretao da
realidade peruana permitem sondar por que ele mergulhou sem retorno nessas vias
e,depois, ultrapassando-as, props-se enriquecer o marxismo fora e acima dos eixos
eurocentricos".
Enfim, para Florestan,
A atrao de Mariategui pelo marxismo,malgrado outras influencias
divergentes e em dados momentos muito fortes, brota da descoberta de uma
resposta sua ansiedade de observar, representar e explicar processos
historicos de longa durao e de uma proposta revolucionaria
concomitante, que vincula dialeticamente passado, presente e futuro.

A inteligncia de Mariategui "deitava razes mais profundas no esclarecimento


do ser, no entendimento integral de uma civilizao nativa estiolada pela
colonizao e na necessidade de romper com um oprbrio que esta s explicava
parcialmente".
Com o desabamento do socialismo estatal e a ascenso do neoliberalismo ,para
Florestan Fernandes, "encerrou-se um perodo de longa durao da historia recente".
Nosso autor assinala uma "ironia da historia":
O fantasma das sociedade pobres e subdesenvolvidas da Amrica Latina
resultava de uma contradio: fascismo ou socialismo? Neste contexto, as
proposies de Mariategui marchariam como antes, de acordo com a reduo
de Engels: socialismo ou barbrie? So proposies que no foram varridas
pela tempestade. Maritegui ainda se ergue como um farol, que ilumina o
horizonte intelectual e poltico dos que querem conferir aos latino-
americanos a opo pelo marxismo.

Aps esta "abordagem global" por Florestan da obra de Mariategui,voltemos


nossa questo:

Por que Mariategui?


Carlos M. Rama, em sua obra pioneira sobre a Historia Del Movimiento
Obrero y Social Latino Americano , destaca o que chama de uma corrente
desviacionista no socialismo de nosso continente. Assim, afirma que
Desde o ponto de vista ideolgico, interessante destacar como surge uma
constante tendncia latinoamericana a favorecer a heterodoxia , a
marginalidade, em respeito s correntes fundamentais do socialismo
europeu.Isto vem desde o xito inicial dos socialismos utpicos,
saintsimoniano ou fourierista...

C.Rama destaca os progressos estritamente tericos do marxismo


latinoamericano de nosso sculo, que tem personalidades de grande relevo, desde Jos
Carlos Maritegui at Anbal Ponce.
As experincias e lutas revolucionarias da Amrica Latina reencontram o
pensamento de Mariategui. No por acaso. A crise dos sistemas ps-ditaduras
militares e a presso das alternativas democrticas, suscitam mais que questes de
ordem conjuntural; dizem respeito ao carter especifico da realidade latino-americana e
a definio de um "marxismo latino-americano", para o qual Mariategui referencia
obrigatria. Para os revolucionrios do continente, Mariategui , acima de tudo, um
exemplo nico de unidade dialtica entre a especificidade nacional e a perspectiva
mundial.
Um dos mariateguianos , que aprofundou a via do peruano sobre o
socialismo,Csar Germana,na introduo a seu livro El socialismo indo-americano de
Jose Carlos Mariategui(Amauta,1995) , nos fala da vigncia de Mariategui:
Em minha opinio, neste momento crucial da humanidade Mariategui tem
algo que nos dizer. Desde o ponto de vista privilegiado de nossa atualidade ,
possvel por em relevo aqueles aspectos da concepo socialista do Amauta
que no conduzem a aporias socialismo burocrtico nem a passividade das
democracias liberais. bom notar que, apesar do tempo transcorrido desde
sua morte, em sua obra se mantm vivos alguns temas que permitem
contribuir com novas perspectivas ao velho debate sobre o socialismo. [...]A
problematizao do socialismo parece com mais urgncia em um momento
histrico,como o que estamos vivendo, em que se tem a impresso de que um
periodo da humanidade chega a seu fim e que outro est surgindo,sem que as
exigencias de liberdade e igualdade tenham sido realizadas pelo capitalismo e
pela democracia liberal.

Nas palavras de Roland Forgues, "aps a queda do muro de Berlim e a derrocada


do 'socialismo realmente existente' na ex-URSS e nos pases da Europa do Leste,o
redescobrimento da obra de Mariategui tornou-se uma necessidade histrica".
Na apresentao Coletnea J.C.Mariategui e o marxismo na Amrica Latina,
publicada em 2002, podemos ler que
A importncia desta reapresentao,torna-se ainda mais relevante num
momento de crise e de dificuldadess mltiplas enfrentadas pela(s)
esquerda(s) em geral. Seu marxismo, altamente criativo e renovador, pode
oferecer elementos e subsdios, no s tericos e histricos, mas sobretudo
polticos, para todos aqueles que buscam construir uma sociedade mais
democrtica, igualitria e fraterna.

O socialismo, na viso de Mariategui,porta elementos fundamentais na


perspectiva da autogesto socialista: a democracia direta tem um papel importante em
sua viso; o papel das diversas formas de auto-organizao dos trabalhadores.
A reconstruo da esquerda na Amrica Latina, neste contexto de inicio de sculo,
com todas suas questes, "Em muitos sentidos responde [...] a histrica viso do incio
do sculo, que tiveram Marti, Mariategui, Haya de la Torre, Sandino, Zapata,
Recabarren e outros: "nacionalizar a teoria".
Corresponde ao que, no mesmo perodo na Europa, foi sintetizado por Gramsci.
Abordando a situao pos-1917, afirma G.Vacca:
A reelaborao do marxismo e a definio de suas tarefas atuais so uma
necessidade, porque no seu desenvolvimento histrico e no seu estado atual o
marxismo lhe (para Gramsci) aparece largamente imprestvel. O seu
deslocamento do marxismo da Segunda e Terceira internacionais consuma-se
de forma profunda; assim, em aberta polmica com esses que Gramsci
culmina o prprio programa de pesquisa na reelaborao da forma terica do
marxismo.

Dentre os problemas atuais com os quais se defronta a esquerda, cinco fatos de


porte mundial condicionam o debate sobre socialismo e democracia na Amrica Latina:
O colapso do modelo capitalista liberal na Amrica Latina, evidenciado no que
ficou conhecido como " dcadas perdidas";
A desintegrao do modelo do "socialismo estatal burocrtico" na Europa do
Leste e na URSS;
A intensificao da concorrncia inter-imperialista;
O declnio da potncia industrial dos EUA e o aumento da sua influencia
ideologico-militar;
O fim da Guerra Fria, com a abertura de um novo ciclo de conflitos no Oriente e
entre Ocidente e Terceiro Mundo.

Alm disso, os problemas colocados s esquerdas, pelos possveis fracassos ou


vitrias, de superao do neoliberalismo ( governos Lula , Tabor e Chaves,por
exemplo) e a necessidade de referenciais tericos para o novo perodo de reestruturao
das esquerdas tambm so fatores que incidem sobre a discusso latino-americana.
Pensamos que o aporte terico de Mariategui nos d elementos valiosos para
tratar estas questes, como tambm sua insistncia sobre o "sentido herico e criador do
socialismo", combinando com sua defesa da solidariedade internacional.

Marxismo e Eurocentrismo
Estudando o marxismo latino-americano, Portantiero afirma:
A no ser ocasionalmente, em momentos muito pontuais ou parciais da
produo terica e da pratica poltica, os socialismos clssicos ligados a[...]
tradio das Internacionais foram capazes de elaborar um projeto
hegemnico ou de avanar problemticas que pudessem colaborar nesta
direo[...]. Na obra de Mariategui aparece pela primeira vez um projeto
amplo de constituio de uma vontade coletiva nacional-popular[...] As
proposies de Mariategui ficaram no meio do caminho, por sua morte
prematura e pelo bloqueio que a elas fez a III Internacional.

Da mesma forma, para Orlando Nunez e R.Burbach: " necessrio compreender


o legado histrico do marxismo nas Americas. Com a notvel exceo de Cuba e, em
certo sentido, o Chile, nenhum pais capitalista no hemisfrio tem uma tradio marxista
plantada". A triste realidade que o marxismo no tem podido enraizar-se
profundamente nas Americas[...]. Uma possvel explicao poderia ser que o
marxismo[...] no foi capaz de desenvolver uma abordagem teorico-estrategica que
responda [...] as condies histricas especificas que existem nas Amricas.
Em parte, isso se deve as origens europias do marxismo... Ate a Revoluo
Cubana, as Americas tinham poucos estrategistas e teoricos revolucionarios capazes de
formular programas de luta poltica prprios. Um rpido percorrer pela historia dos
movimentos sociais e comunistas nos EUA, Amrica Latina e Caribe, ilustra as
carncias nesse sentido.
A submisso dos PCs nas Americas em relao as propostas polticas da
Terceira Internacional refletem a debilidade fundamental do marxismo no
continente: sua incapacidade para desenvolver uma estratgia revolucionaria
independente e nativa. Durante os anos de seu apogeu (anos 20 e 30) o
movimento comunista fracassou no objetivo de produzir seu prprio corpo de
teoricos marxistas capazes de desenvolver programas e estratgias polticas
especificas em resposta ...as condies polticas especificas enfrentadas pelos
comunistas em seus prprios pases.
Isso no quer dizer que no houve alguns intelectuais nos partidos que
fizeram contribuies valiosas, tal o caso de Mariategui no Peru, ou Julio
Antonio Mella em Cuba. Porem, em geral, o trabalho intelectual surgido nas
Americas era uma mera adaptao das ideias e princpios polticos que se
haviam desenvolvido na Europa.

Onde o socialismo foi vitorioso na Amrica Latina, o foi sob formas originais.
Em Cuba e Nicargua, a luta socialista processa-se dentro de uma matriz de cultura
poltica policlassista, nacionalista e anti-imperialista. Neste processo, o marxismo no
se "esconde", simplesmente se nacionaliza. Trata-se do problema sobre o estilo de como
pensar o marxismo na Amrica Latina. Nas palavras do poeta revolucionrio Ricardo
M.Aviles: "Temos que estudar nossa historia e nossa realidade como marxistas e estudar
o marxismo como nicaraguenses". Nas pistas de Mariategui, no seu sentido de "um
socialismo indo-americano", a revoluo sandinista ps o marxismo sobre os ps.
Para, Jos Arico, um estudioso de Mariategui,
uma genuna e criadora interpretao da doutrina de Marx ocorreu no Peru,
com Mariategui, que sentou as bases para um efetivo processo de
nacionalizao do marxismo. Este processo assumiu caractersticas
contraditrias [...] no como forma acabada de uma teoria sistemtica. Surge
em forma inorgnica de intuies. O que Mariategui produziu foi a
iluminao de um caminho, ao incorporar a experincia europia como lio.

Para Jos Arico, a "via crucis" do marxismo na Amrica Latina, foi sempre a
dificuldade para tratar o "nacional", o que pe questes de ordem estratgica, pois, o
objeto da pesquisa e da analise, "o movimento real", est sempre "nacionalmente"
situado.
Como dizia Mrio de Andrade,
A arte musical brasileira[...] tem inevitavelmente de auscultar as palpitaes
rtmicas e ouvir os suspiros meldicos do povo, para ser nacional e por
conseqncia, ter direito a vida independente no universo (porque o direito de
vida universal s' se adquire partindo do particular para o geral, da raa para
a humanidade, conservando aquelas suas caractersticas prprias, so o
contingente que enriquece a conscincia humana. O querer ser universal
desraadamente uma utopia. A razo est com aquele que pretender
contribuir para o universal com os meios que lhe so prprios e que vieram
tradicionalmente da evoluo do seu povo.

Os comunismos ou marxismos latino-americanos basearam-se mais que numa


confrontao sobre estratgias nacionais, na vontade de "aplicar Lenin, Trotsky, Mao,
etc.". A polmica histrica entre A.Mella e Haya Torre, sobre a criao do APRA, foi
marcada pelo sectarismo: Mella afirma que a revoluo mundial o determinante e que
os processos nacionais so secundrios. Existia uma viso sectria em relao aos
movimentos que tentassem dar vida a um movimento "indo-americano". Mariategui
reagiu contra estes simplismos, afirmando que: "o socialismo na Amrica Latina
impossivel sem resolver a questo nacional".
Usamos o "nacional" diferentemente do "nacionalismo". Assim, nas palavras de
Victor Tirado: "ir a razes da ptria, reivindicar e usar o pensamento nacional como
fonte para construir a teoria revolucionaria prpria, no ser nacionalista, no sentido de
fechar-se em si mesmo".
Como dizia Arguedas: "Por isto no pode surpreendernos que o criador autentico
latino-americano em todos os campos, resulte em ultima instancia, um nacionalista, pelo
simples fato de ser original e autentico". Da mesma forma, Arguedas define o papel de
Amauta, "A revista Amauta instou os escritores e artistas a que tomassem o Peru como
tema".
A experincia dos anos 20, marcada de um lado, pela COMINTERN, e pelo
outro, pelo aprismo, tinha como elemento comum dominante o "estatismo". Para
ambas estratgias, s o poder estatal possibilitaria a transformao social na Amrica
Latina. Por isso, a vigncia de Mari tegui repousa no profundo espirito libertrio que
toma conta de sua obra critico-prtica, suscetvel de "sugerir uma nova cultura poltica
autogestionria para nossos dias. No a partir do protagonismo principal dos partidos
polticos... mas, desde a consolidao do processo de auto-organizao dos explorados
em forma democrtica e unitria. O que supe impulsionar a generalizao das
iniciativas autogestionrias de democracia direta de base, nas diferentes esferas da
atividade social... deste modo, a "criao herica" de que falava Mariategui, significa o
desafio de construir desde baixo, em meio a vida cotidiana, a democracia, a nao e o
socialismo". Eis um "cardpio" contrario a todo tipo de "Socialismo estatal e
burocrtico".

Um pensamento Gramsciateguiano

Em relao a Gramsci, Mariategui evocava, com outras palavras, a preocupao


com a construo de uma vontade nacional-popular, coletiva, e uma reforma intelectual
e moral, como premissas do socialismo. A questo gramsciana, de como se pode
suscitar esta vontade nacional-popular, tanto o aprismo quanto a COMINTERN,
responderam desde a perspectiva do Estado. A sociedade fica excluda do processo. Na
viso do "Amauta", o determinante a sociedade, incluindo a reforma intelectual-moral:
para que a revoluo fosse algo mais que um processo "por cima", uma "revoluo
passiva", deveria previamente modificar a conscincia dos homens e romper a inrcia da
tradio que mantm as massas populares na passividade. Percebemos, aqui, a dimenso
da "Revoluo Ativa de Massa", derivada do conceito gramsciano de "revoluo anti-
passiva".
A relao Gramsci-Mariategui, poderia se encaixar no que M.Lowy chama de
"afinidades eletivas". Vejamos a definio de Lowy:
Designamos por 'afinidades eletivas' um tipo muito particular de relao
dialtica que se estabelece entre duas configuraes sociais ou culturais, que
no reduzvel [...] a determinao causal direta ou [...] 'influencia' no
sentido tradicional. Trata-se, a partir de uma certa analogia estrutural, de um
movimento de convergncia, de atrao reciproca, de confluncia ativa, de
combinao podendo chegar a fuso.

Portantiero define o pensamento de Gramsci como "uma obra aberta a cada


historia nacional, concepo para teoria e pratica polticas que buscam expressar-se em
'lnguas particulares', e conclui: "no e' por acaso que esta abertura de estilo
gramsciano influiu sobre a primeira possibilidade de aplicao criadora do marxismo no
plano intelectual na Amrica Latina: o pensamento de Mariategui".
Como afirmou mais recentemente A.Bosi,
Falar dos ideais polticos de Mariategui nos dias de hoje, em tempos de
Perestroika e Glasnost, e em vias de encerrar-se (ou quase) o escuro ciclo das
ditaduras do Leste europeu, deixa na boca um sabor agridoce de
ambivalncia... Mas, a nossa imagem do pensador peruano no se constri
apenas com aquelas suas expectativas que o socialismo real em parte frustou.
A sua memria e' acre, repito, mas tambm doce. Relendo os "Sete Ensaios"
e outros textos de critica ideolgica, v-se o quanto se exerceu a sua
inteligncia em funo de problemas ainda hoje bsicos para o marxismo e
para a vida publica latino-americana.

Enfim, o que doce e o que acre em Mariategui? O que est vivo e o que est
morto no "Amauta"? No conjunto das questes atuais do marxismo, em que incide mais
o pensamento de Mariategui? Por certo, no h em Mariategui uma teoria do Estado, e,
pouco material sobre o problema da revoluo, o partido, alianas, tticas, etc. Mas,
com certeza, onde sua contribuio mais importante no que diz respeito a analise dos
modos de produo, o campo da teoria das superestruturas: a questo da conscincia
social, os modos de "representao", o problema das ideologias, a teoria da cultura,
contra os mecanicismos, a questo da tica, etc.
Portanto, o marxismo de Mariategui no provinciano, mas antecipatorio, nas
pistas de Gramsci. Talvez, o que poderamos chamar de um "materialismo cultural" ou
na feliz expresso de Z.Bauman, "a cultura como praxis".
Julio Gdio nos chama a ateno para o fato de que
j nos anos 60, sob a influencia direta da revoluo cubana se introduziu a
categoria de Revoluo Continental, Rodney Arismendi e outros
destacados polticos se preocuparam em impedir as simplificaes[...]. A
desigualdade de desenvolvimento econmico,social e poltico, se expressa
em nossos paises atravs de indicadores acerca de situaes de crises ou
estabilidade polticas; de distintas historias culturais; coexistncia de
diferentes lnguas; caractersticas de classe diferentes[...].

Entretanto possvel encontrar um "elo de metodologia poltica" que una a


diversidade. Godio assinala em relao a Revoluo Nicaraguense, "o elo
politico-cultural que uniu organicamente os sandinistas ...as massas
trabalhadoras foi o Sandinismo. Este elo politico-cultural um 'dado' a ser
construdo por todos os revolucion rios da Amrica Latina, um elemento
comum no meio da diversidade continental. Significa construir um 'estilo de
pensar' e de 'fazer poltica', no qual as categorias universais do marxismo se
tornam concretas via categorias politico-culturais nacionais.

Isso, no tem sido prtica corrente entre os teoricos marxistas da Amrica


Latina; ao contrario, atuam anulando e desintegrando as categorias nacionais dentro das
categorias universais, as quais perdem, assim, sua operatividade historico-concreta. A
experincia das revolues em processo e, tambm, as inconclusas da Amrica Latina,
indicam a primeira regra para levar em conta, para formao de um bloco histrico
"Nacional-Hegemonico": verificar na pratica as formulaes tericas, estuda-las em seu
movimento real e, este movimento real das categorias existe na linguagem popular,
como resultado de uma nova praxis. O fundamental consiste em organizar e orientar o
'movimento real' das classes sociais, e neste sentido, o marxismo "um guia para a
ao" e no um conjunto de receitas.
Na verdade, so muitas as afinidades entre Gramsci e Mariategui. Neste sentido,
A.Ibanez realizou uma espcie de "leitura gramsciana de Mariategui". Aponta a
principal convergncia na questo da "hegemonia" e da "reforma moral e intelectual".
Jos rico, outro estudioso de Gramsci-Mariategui, aponta que o significado de
Gramsci para a esquerda argentina dos anos 60, condensou-se na "busca da realidade":
"No fato de que ele contribuiu decisivamente para trazer a cultura marxista para a
concreticidade, para o encontro com uma realidade da qual estvamos alienados".
Como o conjunto da esquerda da Amrica Latina, a Argentina "nasceu e se
desenvolveu sem a herana e o suporte de uma tradio nacional". A exceo, foi
Mariategui. E, conclui Arico: "[...] Mas s descobrimos Mariategui atravs de
Gramsci". S os caminhos divergentes das convergncias. Ora, o comandante Omar
Cabezas "conheceu" Sandino atravs de "Che" Guevara. Arico resume e sintetiza sua
experincia gramsciana:
Gramsci nos permitiu fixar duas orientaes [...] a) a busca do contexto
nacional a partir do qual pensar o problema da transformao e do
socialismo; b) a plena adeso a perspectiva socialista, entendida como um
processo que se desenvolve a partir da sociedade, das massas, de suas
instituies e organismos[...] O tipo de marxismo que buscvamos e para o
qual o pensamento de Gramsci nos ofereceu os mais altos estmulos e
contribuies, no tentava encontrar a razo de sua prpria validade em si
mesmo, mas na sua capacidade de se confrontar com os fatos de uma
realidade em transformao.

Tambm para Mariategui, o marxismo no era uma bblia, mas um instrumento


de analise, um modo de interrogar a realidade. No era um conjunto de definies e
regras. Como lembrava Carlos Fonseca, "O importante no declamar frases dos
grandes revolucionrios universais, mas aplicar a realidade, com criatividade seus
ensinos. Em todo caso, estes revolucionrios no nos legaram meras frases, mas toda
uma ao criadora".
A partir de sua peculiar articulao entre marxismo e nao, Mariategui elaborou
um modo especial, peruano, indo-americano e andino, de pensar Marx; precisamente
por ser mais peruano, converteu-se em universal. Consegui propor um marxismo to
diferente quanto o de Gramsci e Lukacs e, to valioso como o de ambos.
Mariategui usou uma "chave hermenutica" atravs do verbo "agonizar": um
marxismo agonico, elaborado longe de quaisquer academias, envolto nos fatos
cotidianos das multides, das ruas, submerso na vida cotidiana, no senso comum.
"Agonia como smbolo de luta, contra a morte, como 'criao herica'".
O Amauta rompeu o circulo de ferro da Comintern. Pois, para esta, no existia
realidade peruana, to s' os "pases coloniais". Peru, Argentina, Brasil, etc., eram todos
iguais. Existia na Comintern um "assombroso desprezo pelo reconhecimento do campo
nacional". Neste sentido, o "mariateguismo" pode significar a tentativa de articular
socialismo e nao. Nesta perspectiva, dois aspectos se destacam no pensamento de Jos
Carlos Mariategui:
- a relao teoria-pratica, ou seja, o Mtodo;
2) o "Carter Nacional".
Em relao ao primeiro aspecto, Mariategui no encarava a teoria de Marx como
um fetiche, um conjunto de regras que deveriam ser aplicadas "mecanicamente" a
quaisquer realidades. Questionou o mtodo da "aplicao", substituindo-o por uma
"verdadeira recriao da teoria em contato, sempre vivo e novo, com a realidade socio-
historica concreta". Segundo Arico, "A universalidade do marxismo no reside em sua
capacidade de ser aplicado a qualquer circunstancia, mas na possibilidade que tem de
recriar-se em circunstancias determinadas".
Seguindo as "Notas" gramscianas do QC, em termos gerais, uma teoria s' torna-
se organicamente operativa quando e' "traduzida" ao "nacional". Para isto, precisa
apoiar-se em uma forca social de carter estratgico e, mesclar-se na cultura nacional-
popular. Diz Gramsci: "as ideias no nascem de outras ideias, as filosofias no
engendram outras filosofias, so sempre expresso renovada do desenvolvimento
histrico real". A verdade do marxismo se expressou em Mariategui na linguagem da
situao concreta do Peru.
Em relao ao segundo aspecto, do campo nacional, ocorre uma tenso dialtica
e fecunda entre a validade tendencialmente universal da ferramenta "cientfica" do
marxismo e, a necessidade de verificar concretamente o acerto de suas colocaes a
partir de realidades socio-historicas determinadas nacionais".
Portanto, um marxismo metodolgico, criador, nacional e aberto. No caso do
peruano a "captura" do tema indigenista operou a "nacionalizao" e a "peruanizao"
do seu marxismo. Em seu prlogo ao livro "Peruanicemos Al Peru", Csar Mayorga
afirma que, para "peruanizar o Peru", Mariategui operou com dois princpios:
- Conhecer a realidade nacional. classe feudal no lhe interessava nunca o este
conhecimento, a burguesia que intentou faze-lo, em parte com fins particulares, mais
que sociais ou nacionais: conhece-lo um pouco para explora-lo mais. S o socialismo
aspira a conhecer um pais para liberao e servir s classes exploradas e oprimidas. Isto
no exclui o dever inelutvel de conhecer a realidade internacional. "Temos o dever de
no ignorar a realidade nacional; mas tambm temos o dever de no ignorar a realidade
mundial" (Mariategui);
- o conhecimento da realidade peruana deve comear da realidade nacional deve
comear fundamentalmente pelo conhecimento da realidade econmica." No possvel
compreender a realidade peruana sem buscar e sem olhar o fato
econmico"(Mariategui)
Viagem ao Mundo Inca
Entre 1916 e 1923, ocorreu no Peru um novo ciclo de rebelies indigenas
andinas de carater milenarista. O Governo de Leguia (1919-1930), com suas reformas
sociais, possibilitou uma presena ativa de velhos e novos atores sociais, e, entre eles,
os ndios. Os grupos tnicos realizam em Lima, seus primeiros Congresso Nacionais, os
operrios lutavam pela jornada de 8horas e os estudantes viviam as lutas pela reforma
universitria; uma nova intelectualidade surgia com as universidades populares,
debatendo a reflexo nacional em contato com ndios e operrios.
Flores Galindo retrata este momento:
O descobrimento das classes populares esteve acompanhado nestes anos com
o encontro com uma espcie de onda ssmica para empregar uma metfora
do prprio Mariategui que desde os departamentos do sul peruano parecia
irradiar-se ao conjunto do pais:estas massas indgenas aparentemente
resignadas e vencidas, se rebelam e no mundo cinzento da Republica
Aristocrtica defendem uma reivindicao que parece em um principio
absurda ou incompreensvel: querem voltar atrs ,recusam toda a historia que
tem suportado desde a conquista e desejam recuperar um idealizado imprio
Incaico,e assim mostram uma imagem diferente do pais e da Nao. Explode
em fins de 1915 e incios de 1916 em Puno,na provncia de Azangaro, o
efmero levantamento de Rumi Maqui: um sargento maior da cavalaria cujo
nome era Teodomiro Gutierrez Cuevas,de formao, parece, anarquista, que
opta em apoiar as massas camponesas e dirigir uma grande
rebelio.Lamentavelmente, foi descoberta sem seus incios e foi facilmente
sufocada. Porem isto no impediu que fosse uma alternativa que abria os
caminhos da esperana.

Mariategui, escrevendo para imprensa, anotou elementos das rebelies


messinicas.O fracasso de sua experincia jornalstica, ao ter seu jornal invadido pelos
militares,leva Mariategui a fazer uma viagem pelo interior do pais. Assim, viaja durante
20 dias (1918) visitando cidades na serra central, conhecendo de perto com os ndios
huanca.
Esta nica viagem de Mariategui ao interior do pais, foi acompanhado por
Ricardo Martinez de la Torre. Foram ao vale do Mantaro e alguns dias em Huancayo.
Vrios testemunhos falam de um encontro de Mariategui com a vanguarda
indgena, nas vsperas de sua viagem para Europa, no final de 1919. Em Lima, o
Amauta teve encontro com o lder Carlos Conderona, um dos principais dirigentes do
Comit pro direito Indgena Tahuantinsuyo, de orientao anarco-comunista.
Mariategui tambm conheceu os lideres Carlos Qana e Julian Ayar Quispe, animadores
regionais do movimento tahuantinsuyo. Juan H.Perez lembra de ter visitado Maritegui
em sua casa limena; afirmou que Mariategui fazia parte de um grupo de intelectuais que
assessorava o movimento indigena.
Foi de Mariategui a ideia de convocar um Congresso Nacional de dirigentes
indgenas. A viagem a Europa interrompeu esta serie de contatos. Todavia, em sua volta
da Europa(1923) ,Mariategui participa da Universidade Popular Gonzalez Prada
e,assim,retoma contatos com o movimento indigenista peruano.Portanto, busca decifrar
teoricamente o problema indigena,e formular as bases de um projeto socialista indo-
americano.
Quando volta ao pais, Mariategui encontra o fim de uma grande convulso
agrria,que afetou sobretudo os departamentos do sul andino. A ocorrncia quase
simultnea de motins e revoltas rurais no altiplano puneno, nas alturas de Cuzco,tanto
em Ocongate como em Espinar,a onda rebelde chega a Andahuaylas,inclusive
Ayacucho ,Cailloma e as alturas de Tacna. Por exemplo,em 1921,em Tocroyoc os
comuneros das alturas tomam ao povoado ,pedindo a expulso dos mistis dos
fazendeiros e defendem a restaurao do Tawantinsuyo.As noticias destas rebelies
chegam a Lima,sobretudo, quando da realizao de Congressos da raa Indgena,que
Mariategui chegou a assistir;em um destes,conhece,ento,o lder puneno Ezequiel
Urviola. Estas rebelies fazem parte de um amplo ciclo, iniciado desde o sculo XVI,na
resistncia nativista a conquista,prolongado depois na revoluo de Tupac Amaru.
Mariategui descobre que o termo tradio no exclusivo do pensamento
reacionrio,mas que, existe uma relao diferente com o passado que no passiva
venerao dos mortos,mas que luta pela defesa de uma cultura que resiste a morrer.
Aps a represso a rebelio indgena em Puno,a Universidade Popular acolheu
alguns lideres.Carlos Conderona levou Mariano Lario a casa de Mariategui. Em
1923,Hiplito Salazar fundo a FIORP (Federao Indgena Operaria Regional Peruana,
junto com dirigentes comunais de Puno, Arequipa, Huancavelica e Lima. Hipolito foi
um dos lideres sobreviventes da rebelio de 1923,em Huancane. Estes lideres indgenas,
estavam em contato permanente com Mariategui Este ctiticava a orientao anarco-
comunista da FIORP,contudo,reconhecia sua franca orientao revolucionaria da
vanguarda indgena.
A casa de Mariategui era um espao de traduo do castelhano e,do quchua e
do aymara. Nesta dcada de 20, um elemento foi importante no Peru; as Escolas
Comunais, autogestionrias, bilnges e bicultarais. Em Cuscus, Francisco
Chuquiwanka Ayulo tinha um escola segundo o modelo de Ferrer Guardi, que defendia
a volta ao ayllu, a comunidade livre,ao municpio comunista. Todo este trabalho entno-
cultural permitiu a resemantizao do socialismo.O lider andino Manuel Camacho
Alga afirma que o Amauta semeou palavras,e,dizia que Os 7 Ensayos foram escritos
para mim.
Ricardo Bao, afirma que
o prprio Mariategui lembrado como um homem de conhecimento no
sentido no ocidental do termo,embora ao mesmo tempo se reconhea sua
outredade,isto , suas evidentes ligaes com a cultura urbana criolo-
mestia.No contexto aymara, a sabedoria tem,sem duvidas,de forma anloga
a outras culturas andinas, conotaes mgico-religiosas.Mariategui um
bruxo, um laika para los quecguas,ou um yatiri para os aymaras.

Se os Amautas desapareceram com o fim da civilizao incaica, pela ao


devastadora da colonizao espanhola, os bruxos e os ancios,como homens de
conhecimento, sobreviveram no seio dos espaos comunais.
A verso de Mariategui,como bruxo,foi veiculada por Ezequiel Urviola,lder
mestio(1895-1925),que fez juramento ante a memria de Pedro Vilca Apaza (1741-
1780),lder do movimento Tupac Amaru,nas vsperas da insurreio andina de 1923.
Muitos dirigentes indgenas,vinculados ao projeto socialista mariateguista,eram bruxos
em suas comunidades, alem de dirigentes sindicais e polticos.
Lario lembra que
Ezequiel Urviola falava que Mariategui,conhecia bem tudo o que tinha
acontecido. Tinha lido muito Mariategui; dizia que pegava um livro de
Mariategui e bastava toca-lo, e j sabia o que tinha dentro, quando lia as
folhas do livro era exatamente igual ao que tinha pensado, era um Yatiri Jose
Carlos Mariategui.

A Vida *
A Agonia de Mariategui
Jos Carlos Mariategui nasceu em Moquegua , no Sul do Peru, em 14 de Junho
de 1894. O pas andino tinha sado ha pouco tempo do desastre da guerra do Pacifico
(1879-1883), tendo sido humilhado pela coupao militar do Chile e perdido parte de
seu territrio. Nesses anos, Manuel Gonzalez Prada acirrava o debate poltico chamando
a ateno do pais para a presena dos ndios,como elemento fundamental da
nacionalidade.
Mariategui filho de Francisco Javier Mariategui, descendente de uma das
famlias mais ilustres do Peru, e de Amlia La Chiora, que pertencia a uma famlia de
origens indgenas. Logo cedo o pai abandona a famlia, e Marietegui, primeiro de trs
filhos, cresce sob a influncia da me, caracterizada por uma forte religiosidade que
deixar marcas no jovem. Desde a infancia, devido a um acidente de jogo, Mariategui
sofre de um problema na perna, que o obriga a um longo internamento em Hospital.
Neste perodo, de imobilidade forada, se dedica a vastas leituras, que formaram a base
se sua primeira formao. Mariategui um autodidata e ter orgulho desta condio.
Nestes primeiros anos,outro elemento importante ser a experincia precoce do
trabalho.Aps a mudana de sua famlia para Lima,comea a trabalhar,com 15 anos, na
Tipografia do dirio La Prensa.Aps o exercicio de varias funes no jornal, passa da
crnica policial a cronica poltica do Parlamento.Isto o leva a uma profunda averso a
politica crioula,dominada pela mediocridade.
Nesta mesma poca, com o pseudnimo de Juan Croniquer, dedica-se a
crnica da vida mundana da capital.Colabora em Lulu,dirigida a um publico
feminino. coeditor de El Turf,revista de hipismo,onde publica crnicas de costumes
das corridas dominicais,e contos inspirados no ambiente dos cavalos.Estas atividades,
do ponto de vista estilstico,lhe permite afinar sua prosa; do ponto de vista das relaes
sociais, lhe d ocasio de conhecer profundamente o ambiente oligrquico e snobe de
Lima.
Alm deste mundo frvolo de cavalos, cafs e teatros, existe um outro Peru
subterrneo que no aparece nas crnicas.Aps trabalhar em El Tiempo, 1916 ,
Mariategui comea a escrever peas em que o ndio aparece como sujeito.No
Departamento de Puno, na fronteira entre Peru e Bolvia, ocorre uma revolta camponesa
de carter tnico.Entusiasmado,Mariategui aborda as gestas de Teodomiro Gutirrez
Cuevas, militar do exercito que liderou a revolta e que assume o nome quchua de Rumi
Maki ( Mo de Pedra ).No plano mundial Mariategui aprecia de forma favorvel
Revoluo na Rssia,em 1917.
Nesta fase de sua vida, prevalece o interesse pela atividade artstica e pela vida
boemia. Participa da revista Colonida, dirigida pelo dannunziano Abraham
Valdelomar.Escreve poemas. Realiza um retiro em um Convento, onde escreve versos
msticos.Neste clima contraditrio, em 1917, com amigos organiza uma dana noturna
no cemitrio de Lima, que tem como protagonista uma bailarina chamada Norka
Rouskaya,e que provoca grande escndalo nos setores tradicionais da capital.Mariategui
obrigado a se defender publicamente,alegando motivos estticos.
Em 1918, junto com Csar falcon e Felix del Valle, cria uma editora de
orientao socialista. Publica a revista Nuestra poca,que assinala a sada de
Mariategui a campo aberto,inclusive sendo agredido por um grupo de militares,devido a
um artigo sobre gastos militares. Participa de uma comisso de propaganda e
organizao socialista,da qual se afastar quando caminha para formao do Partido
socialista, cuja fundao considera prematura. Nestes anos, surgem grande movimentos
de massa.Os trabalhadores,sob hegemonia anarquista,lutam pela jornada de trabalho de
8 horas e contra a alta do custo de vida. Nas Universidades, sob impulso da experincia
iniciada em Crdoba(Argentina), desenvolve-se um movimento pelo reforma
universitria. No inicio de 1919, Mariategui,ento,abandona o jornal El Tiempo,e
funda um dirio que possa acompanhar estes acontecimentos: La Razn,que se torna
um ponto de referencia para estas lutas. Assim, Mariategui torna-se uma figura publica;
surge o lder poltico e desaparece o artista refinado e decadente.

O Exlio na Europa
As classes dominantes perseguem este novo Mariategui: o Governo e a Igreja
fecham seu dirio. Neste ano, assume o poder o populista Augusto B. Legia , no
incio com um confuso programa populista que despertou atenes. Todavia, sua
Presidncia, chamada de Oncenio, uma verdadeira ditadura. Mariategui e seu amigo
Csar Falcon so obrigados a deixar o pais.Em fins de 1919, ambos partem para Europa.
Inicialmente, passam por New York,onde entram em contato com a luta operaria dos
porturios; em seguida, chegam a Frana, onde encontram intelectuais e
polticos,como,Henri Barbusse.
Ao passo que Falcon vai para espanha, Mariategui parte para Itlia,onde
permanecer trs anos, que sero fundamentais em sua formao poltica e intelectual.
A Itlia vivia os anos excepcionais de turbulncia da primeira ps-guerra: uma
crise do movimento operrio dividido entre a ala reformista e a maximalista.Mariategui
acompanha o surgimento da ala comunista no PSI e participa,como jornalista,do
Congresso de Livorno ,em janeiro de 1921;portanto, assiste a fundao do PCI,com a
presena de Gramsci.Segue de perto a evoluo dos catlicos e do Partido Popular de
Luigi Sturzo, e seus laos com os trabalhadores rurais.Analisa a emergncia do
fenmeno fascista.
No terreno cultural, acompanha as ideias de Benedeto Croce,a experincia do
Ordine Nuovo de Gramsci, s revistas de Piero Gobeti,e,as ruidosas proclamaes do
futurismo de Marinetti Da Itlia ,Mariategui estabelece vasta correspondncia com
peruanos,que envia ao dirio El Tiempo de Lima. Em 1969, esta correspondncia ser
publicada com o titulo de Cartas de Itlia.
Da Itlia, Mariategui pensa na fundao de um PCP,junto com Csar Falcon,entre
outros.Assim, em 1922,realizam um encontro na cidade de Ligur,em que se redige um
documento constitutivo de uma clula comunista,com o objetivo de futuramente
constituir um partido.Voltando ao Peru,Mariategui ver que este plano muito abstrato
e ideolgico, sua concretizao seria uma aplicao de receitas abstratas a realidade
peruana.
Na segunda metade de 1922 at o comeo de 1922,Mariategui realiza uma
viajem a diversos paises da Europa.Sobretudo, sua estadia na Alemanha,onde estuda o
alemo e tem acesso aos clssicos do marxismo em lngua original. Neste itinerrio,j
est acompanhado de sua esposa Anna Chiappe,com quem se casou em 1921,e da qual
j tinha um filho,Sandro,nascido em Roma.

A Volta ao Peru
Em maro de 1923,a famlia desembarca em Lima,aps de mais de trs anos de
ausncia.
Sua volta vida poltica e cultural peruana ocorre atravs das aulas que
ministrou na Universidade Popular Manuel Gonzalez Prada, criada pelo lder estudantil
e futuro fundador do APRA,Victor Raul de la Torre,para criar um dialogo entre
estudantes e operrios.Mariategui proferiu aulas sobre a historia da crise mundial,a
partir de sua vivenvia europia.So 17 aulas,entre junho de 1923 e janeiro de
1924.Tinha como objetivo fornecer uma viso internacional aos trabalhadores peruanos.
O eixo central do discurso mariateguiano a conjuntura nova criada pela guerra
mundial, que est caracterizada por uma grande mutao. Mariategui conclui que, o
aparato conceitual das vanguardas dos trabalhadores resultou tinha caducado.Povos
europeus e no-europeus redescobrem suas identidades e reivindicam sua presena
autnoma na nova ordem mundial.
Ao lado da historia poltica, Mariategui dedica amplo espao aos movimentos
sociais e ideolgicos do ps-guerra. E,deste quadro, surge sua simpatia pela corrente
revolucionaria,distanciando-se das correntes da social-democracia Pois, para isto,sua
vida na Itlia lhe permitiu conhecer o marxismo ,assimilado em sua verso italiana,com
um forte acento antipositivista, to comum a Segunda Internacional. Lnin uma forte
atrao,sendo que Mariategui poe ao seu lado a figura de Georges Sorel,que apresenta
como um inovador do marxismo,precisamente pela sua ruptura com o imobilismo
positivista.J nesta fase, encontramos elementos irracionalistas e voluntaristas no
pensamento do peruano.
Estas aulas, s sero publicadas em 1959,com o titulo de Historia de la Crisis
Mundial. Nesta poca, Mariategui comea a colaborar nas principais revistas semanais
de Lima: Variedades e Mundial. Seus ensaios analisam a situao internacional e,
faz recenses dos textos mais importantes da literatura contempornea. Tambm,assume
a direo da revista Claridad. Toda esta atividade o torna um ponto de referencia da
cena poltica e cultural do pais.Mas,em 1924, volta a ter problemas com a perna doente,
tendo que amputa-la.At o fim de sua vida, ficar em cadeira de rodas, sem poder viajar.
Mariategui, ento, recebe em sua casa inmeras visitas e revistas de vrios
paises. No quer ficar alheio ao mundo; recebe lideres das provncias peruanas e,
estabelece uma ampla correspondncia no Peru e com vrios outros paises.Um grupo de
estudantes tenta lhe conseguir uma ctedra universitria, recusada pelas autoridades
acadmicas devido ao seu carater extra e anti-universitario.
Mariategui publica seu primeiro livro: La escena contempornea,em 1925
,pela editora Minerva,fundada por ele prprio. Nesta obra,retoma os temas de suas
aulas.
Mariategui planeja criar uma revista prpria. Chama-a inicialmente de
Vanguardia; posteriormente, aps contatos com os indigenistas, chama-a de
AMAUTA7. A mudana de titulo reflete a reflexo sobre a realidade nacional
andina,que estava desenvolvendo aps seu retorno ao Peru. Aps seu retorno, se deu
conta do papel fundamental da questo indgena no problema nacional. Na verdade,foi
na Europa que passou a conhcer profundamente a Amrica Latina. O problemas das
nacionalidades , vivido na Europa, leva Mariategui a ler o marxismo em uma chave
peruana, seu aporte mais original ao pensamento poltico latinoamericano.Seus ltimos
anos de elaborao estaro dedicados a questo indgena.
A partir de 1924, nas paginas da revista Mundial escrever uma seco
chamada Peruanicemos al Peru. Estes ensaios sero publicados em 1970.
No numero inaugural de Amauta, aparece a traduo de um texto de Freud e,
nos nmeros seguintes,vrios ensaios e textos sobre a literatura de vanguarda de cada
pais.Assim,Amauta frente ao publico peruano e latinoamericano,desperta horizontes
muito amplos, tornando-se ,portanto, um fato originalssimo da cultura latinoamericana.
A revista foi fechada ,mas reapareceu em dezembro de 1927. Amauta traz um encarte
chamado de Boletin de Defensa Indigena,dedicado a luta contra o latifndio.

7
Os amautas, no perodo incaico,eram os sbios.
Os 7 Ensayos
Mariategui conclue sua reflexo sobre os problemas nacionais e a questo
indigena,em 1928, quando publica sua obra mais conhecida: Siete Ensayos de
Interpretacion de la realidad peruana. Este segundo livro, ultimo dos que viu ser
publicado em vida, com o tempo se tornou um dos textos mais universais da cultura do
continente, no sculo XX.Est traduzido nas principais lnguas do mundo,inclusive em
japons e chins. Para A.Melis, uma obra aberta,que aguarda de seus leitores e
interpretes aquele desenvolvimento que Mariategui no pode realizar devido a sua
morte precoce.
Ainda em 1928, Mariategui rompe com o APRA (Alianza popular
revolucionaria americana) de Haya de la Torre. Enquanto o APRA se definia como uma
frente unitria progressista e anti-imperialista, Mariategui deu seu apoio;mas,quando se
transformou em um partido poltico (o Pap -partido aprista peruano),apresentando a
candidatura de Haya presidncia do Peru, Mariategui rompeu as relaes.
Mariategui tinha formado muitos quadros polticos em sua volta e precisa
salvaguarda-los.Assim,em outubro de 1928, aps um perodo de preparao,funda o
Partido Socialista Peruano,uma formao original que no assume o nome de
comunista,mas que adere a Terceira Internacional.Buscava criar um socialismo ligado
especificidade do contexto andino, uma linha muito difcil de se realizar no contexto da
poca.
A partir de novembro de 1928, Amauta enriquecida pelo jornal Labor;
quinzenrio dedicado aos problemas sindicais,com um horizonte semelhante ao de
Amauta: ao lado de lutas, h temas culturais. Labor foi atacado pela censura,e
fechado em setembro de 1929.Nesta poca, surge a ideia de fundao da Confederao
de Trabalhadores do Peru CGTP.
O PSP tem pela frente a represso , a hostilidade do APRA e o conflito com a
ortodoxia da COMINTERN. Duas reunies latino americanas ,realizadas em
1929,oferecem a ocasio para os ataques. Em maio, em Montevideo,se desenvolve o
Congresso Constituinte da Confederao Sindical Latinoamericana,no qual a delegao
peruana apresenta um documento em que Mariategui reconstri a historia do
movimento operrio de inspirao classista no Peru.Em Junho, Buenos Aires aloja a I
Conferencia Comunista Latinoamericana. Para esta ocasio,Mariategui escreveu o texto
Problema das raas em Amrica latina,em que denuncia o uso do problema racial para
ocultar a questo de fundo do continente: a liquidao do feudalismo.Mariategui afirma
que o comunismo agrrio primitivo pode constituir a base para a instaurao de uma
sociedade comunista.
Outro texto, Ponto de vista antiimperialista, fala da negao das burguesias
latinoamericanas ,da vontade de lutar pela segunda independncia: a econmica.
Polemizando com as posies apristas,afirma que o anti-imperialismo por si s,no
pode constituir um programa poltico,porque no anula o antagonismo entre as classes.
Estas ideias sero fortemente refutadas pelos setores mais dogmticos,liderados
por Victorio Codovilla,lder do PC argentino.Mariategui no estava presente,pois no
podia viajar. Seu chamado a uma realidade peruana tido como uma heresia.Seus
Siete Ensayos eram desconhecidos pela ortodoxia.
Em 1929, a ditadura de Legia fecha um cerco em torno a Mariategui. Em
setembro,a policia faz uma batida em sua casa;o pretexto um complot
comunista.Mariategui pensa,ento,em deixar o Peru para continuar sua luta em Buenos
Aires,deslocando para esta cidade a redao de Amauta.Tambm,esperava poder usar
uma perna ortopdica,que lhe permitiria deslocar-se.
Enquanto prrepara sua viagem,inicia a publicalo em Amauta e no
Mundial dos captulos de um trabalho intitulado Defensa del marxismo.Polemiza
nesta obra com ,de um lado,a reviso do marxismo levada a cabo pelo belga Henri De
Man;e,por outro,contesta a verso ultraesquerdista de Max Eastman. Defensa del
marxismo ser publicada aps a morte do autor. Em muito pontos,em especial nas
aluses ao fordismo,encontram-se profundas analogias com as reflexes de
Gramsci,mesmo que o peruano s tenha conhecido os escritos gramscianos de Ordine
Nuovo. Talvez, as fontes da cultura italiana,vivenciados por ambos autores,explique as
afinidades entre eles.
No ltimo perodo de sua vida, em meio a uma frentica atividade de escritura e
organizao, Mariategui acha tempo para voltar criao literria. Reelabora um caso
da crnica italiana: o caso Bruneri-Canella,em que reconstri o ambiente italiano do
ps-guerra.Chama-se La novela y la vida,em que expe sua concepo da arte,
antagnica ao chamado realismo socialista.
No final de 1930,enquanto preparava sua viagem a Buenos Aires , ocorre uma
recada de sua doena. Morre no 16 de Abril,com menos de 36 anos, em plena
criatividade.Seu enterro contou com uma grande participao de massa.
Logo aps sua morte, se desencadeia uma violenta ofensiva contra sua herana
poltica e cultural. J h dois meses antes de sua morte, tinha sido substitudo na
secretaria do Partido por Eudocio Ravines,um homem da Comintern,formado em
Moscou. Amauta no ter longa vida. Muda-se o nome do PSP para PCP,que dirige
uma raivosa campanha contra o mariateguismo e o amautismo.
Nos anos 40,este PCP tentou se reapropriar da figura de Mariategui,tido
ento,como um populistaApenas no final dos anos 60,ocorrer uma efetiva
reapropriao critica de Mariategui. A partir de ento,Mariategui passou a ser um
pensador que cresce com o passar do tempo.
O trabalho de traduo de suas obras foi iniciado em 1943,com uma nova
proposta dos Siete Ensayos.Todavia, ser a partir de 1959,com o inicio da publicao
das Obras Completas em edio popular(20 pequenos volumes),que a difuso de seu
pensamento deu um salto de qualidade.A partir de 1987,os filhos de Mariategui
iniciaram a publicao de sua obra juvenil ,do perodo anterior a viagem para Itlia.
Por ocasio do seu centenrio (1994), em diversos paises ocorreram
seminarios,palestras,cursos sobre a obra do amauta peruano.Durante muitos anos foi
publicado o Anurio Mariateguiano,coletnea de ensaios sobre Mariategui publicados
pelo mundo afora.

* Leyendo Mariategui, de Antonio Melis

A Obra O REVOLUCIONRIO INTUITIVO

Os escritos de Mariategui so realmente sedutores. A sua postura de


independncia intelectual contrasta com a reverencia que costumamos devotar a tudo
aquilo que vm do alm-mar. A forma como interpretou as peculiaridades da realidade
peruana e as questes de sua poca, no nos autoriza acus-lo de provinciano ou mesmo
de nacionalista romntico, caractersticas comuns de boa parte dos intelectuais que lhes
foram contemporneo.
O autodidatismo e seu estilo ensatico, pouco adaptado com os rituais do
cerimonial acadmico, tornam seus escritos mais literrios e artsticos do que tericos.
Pode-se at afirmar que a Mariategui primeiro viveu uma imaginao artstica depois
terica. Em seus ensaios, constantemente brinca com as palavras e os conceitos,
participa do livre jogo da escrita, liberando subjetividade e emoo, desta combinao
resulta uma obra grvida de sentimento e ideologicamente enrgica.
Avesso a qualquer comportamento dogmtico e principista, convencido da
provisoriedade e dos limites do conhecimento la verdad de hoy no ser la verdad de
manaa. Una verdad es vlida slo para una poca. Contentmonos com na verdad
relativa - , formulou um pensamento operante, em profundo dialogo com a realidade e
em permanente interlocuo com as pessoas com as quais compartilhava as mesmas
ideias e sobretudo com quelas que pretendia seduzir e conquistar para o grande projeto:
acelerar o relgio da revoluo no Peru.
Quem deseja encontrar clareza, objetividade e um pensamento sistemtico, que
autorize interpretaes e afirmaes seguras, certamente ir decepcionar-se, pois os seus
escritos, assim como a realidade sob a qual se debruou, so demasiadamente ambguos
e contraditrio. Entretanto, as ambigidades e contradies no o diminuem nem
tampouco elimina a validez do seu pensamento. Pelo contrrio, revelam um pensamento
angustiado que rejeita a iluso tranqila dos modelos apriorsticos.
O desafio de pensar as peculiaridades da realidade latinoamericana, a postura
autnoma frente aos modelos europeus, etc. singularizam o pensamento de Mariategui,
todavia, essas virtudes no so exclusividades suas, encontramos em uma certa tradio
de intelectuais libertrios e socialistas do perodo pr stalinista, perodo em que era
possvel ser "herege" sem correr risco de vida. Essa tradio foi enormemente podada
pela censura stalinista que aterrorizou o campo intelectual da esquerda no ps-30. (...)
Mariategui navegou sem constrangimentos sobre uma variedade de temas: arte,
literatura, teatro, cultura, poltica, religio etc. demostrando sutilmente que o marxismo
no s economia e teoria, mas tambm vida e arte. Em todos esses campos
encontramos intuies brilhantes e preciosas que abrem possibilidades para vrios
estudos temticos, por exemplo: a concepo de histria, a questo do mito, do ndio, da
religiosidade, da educao, da hegemonia, da organizao sindical, do papel do
intelectual etc.

O " Romantismo Revolucionario " de Mariategui


O "gramsciateguiano" Antnio Melis, aps 30 anos de estudos sobre a obra do
Amauta,definiu "um ncleo gerador no pensamento do autor peruano em sua
maturidade": "Trata-se,essencialmente de sua elaborao sobre a relao entre
MODERNIDADE x TRADIO,que atravessa toda sua obra".
Nessa direo, Melis destaca na obra de Mariategui, sobretudo, os artigos de
"Peruanicemos o Peru" (tomo 11 das Obras Completas), e que alimentam os " 7
Ensaios".
Melis esboa um histrico da aproximao de Mariategui a esse tema gerador. A
analise de Melis vem de encontro a reflexo de Michael Lowy ,sobre o " romantismo
revolucionario" do peruano.
Antes de seguirmos com a reflexo de Melis, faamos um breve parnteses para
definio de M.Lowy sobre o " romantismo revolucionario". Para Lowy, "a
caracterstica essencial do anticapitalismo romntico uma critica radical moderna
civilizao industrial (burguesa),incluindo os processos de produo e de trabalho, em
nome de certos valores sociais e culturais pre-capitalistas". Em Marx,
a concepo de socialismo est intimamente ligada a sua critica radical da
moderna civilizao industrial capitalista: muito mais que propriedade
coletiva e economia planificada. Implica uma mudana qualitativa, uma nova
cultura social, um novo modo de vida, um tipo diferente de civilizao que
restabeleceria o papel das "qualidades sociais e naturais" na vida humana e o
papel do valor de uso no processo de produo.

Aps a morte de Marx,


a tendncia dominante no marxismo foi a "modernista"; ela tomou s um
lado da herana marxiana e desenvolveu um culto acritico ao progresso
tcnico, ao industrialismo, ao maquinismo, ao fordismo e ao teylorismo. O
Estalinismo, com seu produtivismo alienado e sua obsesso pela industria
pesada, uma caracterstica deplorvel desse tipo de "corrente fria" no
marxismo.

Podemos afirmar que o "ncleo gerador" assinalado por Melis o elemento


constitutivo fundamental do "ncleo irredutivelmente romntico" (Lowy) da viso de
mundo romantico-revolucionaria de Mariategui. Esse nucleo,tambm,define o "trao
essencial do marxismo" de Mariategui,isto ,"a recusa da ideologia do progresso e da
imagem linear e eurocentrica da historia universal, superando dialeticamente o dualismo
entre o universal e o particular. Isto , " Mariategui rejeita e critica todas as tentativas
"romnticas" (no sentido regressivo da palavra) de volta ao Imprio Inca. Sua dialtica
concreta entre o passado, o presente e o futuro lhe permite escapar tanto aos dogmas
evolucionistas do progresso quanto as iluses ingnuas e passadistas de certo
indigenismo".(Lowy).Neste sentido, como vimos acima, tambm vai a abordagem de
Florestan Fernandes.
Esse ncleo gerado lhe permite assinalar a especificidade do " romantismo
revolucionario" na Amrica Latina: o anti-imperialismo. A recenso de Carlos Arroyo
ao livro " Leyendo Mariategui" , nos permite uma viso global da reflexo de Melis.
A partir de vrios de seus trabalhos Melis afirma que o tema da tradio joga um
papel sumamente importante dentro das reflexes de Mariategui.Sua ideia que o mais
original do pensamento de Mariategui se articula justamente em torno a esta
problematica.Arroyo cita Melis:
Um papel importante, em todos meus ltimos trabalhos, tem o tema da
tradio. Progressivamente cheguei a concluso de que o ncleo mais
original do pensamento de Mariategui justamente sua reflexo sobre este
tema.Seu projeto de uma "tese revolucionaria da tradio", me parece um dos
pontos mais altos do pensamento latino-americano contemporneo.

Foi na Europa que Mariategui adquiriu o conhecimento mais profundo sobre a


Amrica Latina. A reflexo sobre a questo das nacionalidades, suscitada pelo encontro
com os acontecimentos europeus foi aplicada ao caso peruano. Outra questo que esteve
na reflexo de Mariategui foi a polemica entre a cidade e o campo. Reconhecendo que o
espirito revolucionario reside nas cidades, rechaa uma equao banal .Pensa que o
socialismo subestimou o trabalho dos camponeses, sem chegar a realizar a unidade entre
trabalhadores urbanos e rurais. Esta polemica da realidade italiana, foi importante
quando refletiu sobre a modernidade e sua relao com a tradio no Peru. Recusa a
viso linear da historia e, ressalta o carter plural da tradio no Peru.
Seguindo Carlos Arroyo:
Em toda a obra de Mariategui, como Melis recorda, se manifesta a relao
com a modernidade. Assim, no prlogo aos 7 Ensaios, escreve que no h
salvao para Indo-America sem a ciencia e o pensamento europeus ou
ocidentais. Mas, para o peruano, a aceitao da modernidade no implica
nenhuma atitude acritica frente a mesma. ocorre que sua preocupao e a de
inserir seu pais no contexto da poca. Isto significa um ajuste de contas com
a realidade do Peru, oculta nas analises dominantes. Desta forma, retomando
a linha traada com as intuies de Manuel Gonzalez Prada, reafirma o
carter plurietnico e pluricultural do pais. Dentro deste enfoque, se impe
progressivamente uma nova considerao do tema da tradio. Sua ideia
que um projeto revolucionario autentico no pode desconhecer a tradio. de
modo que, para Mariategui, a reivindicao da tradio indgena implica uma
nova confrontao com a modernidade (LM:193-194).

Melis considera que justamente nos artigos que Mariategui dedica ao tema
da tradio onde se capta todo o alcance de seu processo de reformulao do
marxismo em termos peruanos. Sua ideia que nestes textos o grande
pensador peruano chega a uma autentica subverso do tema da tradio.
nos fins de 1927 que Mariategui se enfrenta diretamente com o tema, a partir
de umas reflexes aparentemente marginais.Trata-se do artigo "reivindicao
de Jorge Manrique", publicado na revista Mundial, onde as celebres
COPLAS do poeta tardomedieval espanhol representam uma nova ofensiva
contra os passadistas. Atravs da contextualizao dos versos do antigo
poeta, Mariategui volta a por a distino entre tradio e tradicionalistas.
Contra o que desejam os tradicionalistas, afirma que a tradio viva e
mvel e que a criam os que a negam, para renova-la e enriquece-la; enquanto
que a matam os que a querem morta e fixa, ou melhor, os que a vm como
uma prolongao do passado em um presente sem foras (LM:197-198).

Mariategui repete de forma integral esta viso no artigo " Heterodoxia da


tradio", aparecido na semana seguinte em Mundial. Sua "tese revolucionria da
tradio", refuta toda a viso iconoclasta dos revolucionrios. Explica que as afirmaes
mais extremadas de rechao ao passado devem entender-se em termos dialticos. Deste
modo, o tradicionalismo no se identifica com a tradio, e mesmo seu maior
inimigo, pois sua tentativa de compendiar a tradio em uma formula simplista, ignora
seu carter heterogneo e contraditorio.Na realidade, os passadistas entendem o passado
menos que os futuristas. Para Mariategui, isto significa que quem no pode imaginar o
futuro, tampouco pode, no geral, imaginar o passado (LM:198).
Mariategui adverte que o destino do Peru no pode ser a modernizao
indiscriminada, que resulta ao mesmo tempo veleidosa e inadequada. Para Melis a
palavra tradio, em Mariategui, se transforma em
na reivindicao firme e positiva das razes, para usar uma palavra que tem
no Mariategui maduro uma freqncia enorme. Em sua viso no se pode
construir para o pas um futuro novo olhando para o passado como um
modelo. Mas, ao mesmo tempo, no se pode edificar um Peru
autenticamente renovado prescindindo das razes. No contexto especifico do
mundo andino, isto significa, justamente, enfrentar-se com o problema
indgena, em seu presente e com a herana do passado que porta. Em outras
palavras, significa o rechao de todo eurocentrismo, incluindo o que do
eurocentrismo segue existindo dentro do prprio marxismo (LM:179-180).

Quando funda o PSP, sua "finalidade era a da construo do socialismo peruano


a partir das tradies comunitrias do mundo indgena (LM:186). Enfim, como bem
assinala Carlos Arroyo, "a poltica que Mariategui planeja parece a realizao em
termos andinos do conceito gramsciano de hegemonia" (LM:214).
O histrico da aproximao de Mariategui ao par dialtico/ncleo gerador
Modernidade x Tradio, feito por Melis, ilustrativo dos elementos que constituem a
viso de mundo romantico-revolucionaria. Por exemplo, nos ESCRITOS JOVENS,
Mariategui aparece como um intelectual urbano, vinculado com a bomia literria e
com os ritmos caractersticos da sociedade capitalista. Sem duvidas, dentro deste
contexto predominante, se percebe algumas aberturas parciais em relao ao pais
profundo. Mariategui atrado pelas noticias confusas que chegam a Lima, a respeito
das rebelies indgenas do interior. H uma manifestao de desgosto em relao a
ordem vigente.
De outro lado, v-se em Mariategui os signos da modernidade, pois Ele capta o
carter irreversvel do progresso, em termos de ciencia e tecnologia. Este fenmeno
produz uma acelerao no ritmo de vida. Mariategui elabora uma forma de escrever que
corresponde rapidez dominante. Considera o cinema como a arte mais representativa
dos novos tempos.
Para Melis, o peruano mantm em toda sua obra uma relao com a
modernidade: "Fiz na Europa meu melhor aprendizado. E creio que no h salvao
para Indo-America sem a ciencia e o pensamento europeus e ocidentais".
Melis volta a questo cidade x campo. Para Mariategui " falar de cidade
revolucionaria e provncia reacionria seria, sem duvidas, aceitar uma classificao
demasiado simplista para ser exata". Frente aos pressgios desfavorveis sobre o futuro
da cidade, Mariategui afirma que "A cidade que adapta os homens convivncia e a
solidariedade, no pode morrer. Seguir alimentando-se da rica savia rural. O campo,
por sua vez, seguir encontrando nela seu frum, sua meta e seu mercado".

A heterodoxia da Tradio
Osvaldo F. Diaz afirma que a obra mariateguiana "Em Defensa del Marxismo",
significa um avano na definio do "socialismo indo-americano". A polemica com o
belga Henry del Man visa, na realidade, responder questes da conjuntura peruana
(Haya de la Torre, o PSP, a Internacional).
A obra corresponde a mudana de Amauta, expressa no editorial "Aniversario e
Balano" e busca caracterizar o "especifico nacional". Nesta obra, Mariategui dialoga
com/e amplia o conceito de ortodoxia. Continua o esforo feito nos " 7 Ensaios". A
Questo central : o que o marxismo indo-americano?
Mariategui busca atualizar o marxismo via critrios heterodoxos, revisionismo e
heresias. Responde a Haya e a Internacional atraves de sua critica a H.del Man. Diaz
estabelece nveis de leitura na obra do Amauta.
O marxismo que vai emergindo deste esforo terico, alm de contra arrastar
a critica, e de tentar corrigir o que lhe parecia abusivo e sem propsito nela,
perturba o prprio campo da ortodoxia...a explicitao do marxismo se refere
a um debate europeu sobre a " crise do marxismo"...e no programa
explicitamente a questo sobre o marxismo latino-americano. [...] Por trs da
superfcie da resposta a De Man, mais escondido, um segundo nvel, nos
mostra o assedio ortodoxia contido nestes ensaios de " defesa", que culmina
na pergunta pelo marxismo latino-americano.

Se Mariategui assume a ortodoxia,


No obstante, o texto responde tambm III Internacional e a Haya de la
Torre a propsito do socialismo no Peru. Todo um esforo que vem dos 7
Ensayos [...]. Neste segundo momento, a pergunta pelo marxismo abordada
atravs de um assedio direto ortodoxia. Neste assedio Mariategui reconstroi
uma verso alternativa que atualiza o marxismo, desde critrios heterodoxos.

Diaz assinala o uso que faz de revisionismo.


Neste uso produtivo do revisionismo, como "sade do dogma", introduz a
oposio heresia x dogma, cujas correspondncias e aluses parelha
heterodoxia x ortodoxia, vo a criar no interior da oposio marxismo x
revisionismo, uma zona de transito semiolgico, em que a metfora dir
aquilo que a teoria no se atreve a expressar. Nesta mesma perspectiva,
Mariategui far de Lenin e Sorel, militantes heterodoxos.

Se bem podemos ler neste exerccio uma resposta terica III Internacional,
que nestes momentos, representava a ortodoxia, o critrio de transparncia
que emprega para desvelar a trajetria de Henry de Man, diz muito de seu
prprio empenho para fazer visveis seus presupostos.Neste sentido o ensaio,
" Rasgos y espirito del socialismo belga", revelador de um processo
hermenutico, que em seu prprio caso deveria culminar em um capitulo
sobre o Peru.

Se o texto nos autoriza a ler atras da referencia a Henry de Man, uma aluso
a Haya de la Torre e III Internacional, que nos faculta para ir alm, e
afirmar que estes 16 ensaios entram na zona inexplorada, absolutamente
nova, quase contra natura do marxismo latino-americano ?". Para Diaz, a
pergunta no foi formulada de maneira aberta. Portanto, deve ser deduzida do
texto...O assedio ortodoxia parece ser a chave desta operao terica.

Diaz conclui seu texto,


A importncia que tem a heterodoxia, nestes escritos, deveria
proporcionarmos a transformao do instrumento de analises, que j estava
em germem nos "7 Ensaios".Nesta obra, desde uma problemtica peruana
precisa, situada no contexto histrico de uma conjuntura tambm precisa,
Mariategui produz a insero do marxismo na realidade latino-americana.
Fica porm pendente, sua explicitao que s ser abordada, de uma maneira
obliqua, nos ensaios de " Defensa Del Marxismo...Assim, sua postulao de
um socialismo "indo-americano", exposta nos "7Ensaios", anunciava ao
marxismo "indo-americano", que se acha em estado germinal nos artigos de
"Defensa del Marxismo".

Pensando na Amrica Latina, particularmente nos sujeitos histricos, E.Dussel


afirma que "A ampla historia do 'sujeito' histrico fundamental, dos "de Baixo", e' a
historia de seus rostos pobres, "dos pobres", do "outro" de nossa historia invertida. E' a
historia das resistncias e rebelies, das lutas e esperanas de vrios sujeitos,ou seja:
1) os ndios, os primitivos habitantes, ate hoje;
2) os negros trazidos da frica, desterrados e marcados como animais, como
mercadorias, ate hoje;
3) os mestios, filhos de Cortes (o pai dominador) e de Malinche (a me que traiu seu
povo): filhos de ningum;
4) os camponeses, que aps a emancipao no inicio do sculo XIX, sero a grande
maioria da populao pobre, explorada;
5) os operrios industriais que, desde o final do sculo XIX, se ajuntam nos bairros
industriais de Buenos Aires, So Paulo ou Mxico e, depois um pouco por todas as
partes, os explorados pelo capital;
6) os marginais, por ultimo, que deixando o campo, chegam as cidades para engrossar
um imenso exercito de trabalho de reserva, que nunca podero trabalhar, porque o
capital "perifrico" e' "dbil", por ser, por sua vez, explorado pelo capital "central".

Mariategui e a Revoluo
Robert Paris outro estudioso de Gramsci e Mariategui, afirma que "o marxismo
teorico-pratico de Mariategui tinha por vocao o enraizamento na realidade nacional".
Isto significou uma praxis dialtica, aberta [...] articulada [...], especfica, complexa e
desigual, de elemento diversos em uma formao social. Resultou em uma estratgia
revolucionaria, alheia a modelos universais, pre-fabricados e, opondo-se a rigidez
"etapista" e ortodoxa dos PCs.
Para F. Guibal (parceiro de Ibanez em textos sobre Mariategui),
a opo socialista de Mariategui, no sonhava com aes golpistas ou
insurrecionais imediatas; muito menos, defendia uma transio longa,
pacifica e legal para o socialismo. Conforma-se em indicar que a nica
alternativa fundamental da poca estava entre o capitalismo imperialista e a
criao do socialismo.
Sem entrar em precisas "profticas", Mariategui advertia apenas que, na
teoria e na pratica, o carter necessariamente integral e radical de um
verdadeiro processo socialista e revolucionario, no basta tomar o poder,
assaltando e conquistando as instituies do aparato estatal, tinha,
simultaneamente, que modificar, desde as razes, as relaes sociais,
substituindo o predomnio da velha oligarquia e da moderna burguesia, pela
criao de uma alternativa hegemnica global, popular, poltica e cultural.

Enfim, com Arico,


se no podemos afirmar que Mariategui chegou a completar um sistema de
conceitos novos, sua reflexo sobre as caractersticas da revoluo peruana e
latino-americana, sobre o papel do proletariado, das massas rurais e dos
intelectuais na revoluo, e' hoje indiscutvel que estava no caminho certo.

Infelizmente, no se sabe que caminhos tomaram os textos de Mariategui sobre a


revoluo, a cultura e a poltica no Peru; esta obra "desconhecida", talvez, preenchesse a
lacuna da qual nos fala Arico. Nas palavras de Hugo Neira "No caso da herana
ideologico-socialista de Mariategui ha' um agravante substancial: o ensaio mais
significativo do fundador no chegou nossas mos.
De Mariategui conhecemos seus esquemas econmicos, histricos, culturais.
Porem, seus mais elevados interesses se orientavam para poltica da revoluo (e a
revoluo da poltica).E' neste domnio onde sua contribuio fica inacabada, ao
extraviar-se entre Montevidu e a Espanha republicana, o manuscrito de seu ultimo
livro. Varias vezes Mariategui havia assinalado que preparava um trabalho 'sobre
poltica e ideologia peruana que seria a exposio dos pontos de vista sobre a revoluo
socialista no Peru e a critica do desenvolvimento poltico e social e, sob este aspecto, a
continuao da obra cujos primeiros elementos so os Sete Ensaios...".
Mariategui e a Crise da Civilizao

Para Oscar Teran, a produo do Amauta, entre 1923-1924, girou em torno de


dois grandes ncleos:
1. verificao emprica, atravs de sua estadia na Europa, da crise da civilizao
burguesa;
2. resposta a crise, vivida tambm empiricamente, na Europa revolucionaria dos
anos vinte, atravs do socialismo.

Crise de civilizao e resposta socialista formam duas caras da mesma moeda.


"A crise mundial , portanto, crise econmica e crise poltica. E, e' ademais, crise
ideolgica". Nesta poca, reinava a crise de ceticismo, que levou Mariategui a declarar:
"Este e' o indicio mais definido e profundo de que no esta' em crise apenas a economia
da sociedade burguesa, mas de que esta' em crise integralmente a civilizao capitalista,
a civilizao ocidental, a civilizao europia...".
Era a crise de fim de sculo da racionalidade ocidental, exacerbada pelos efeitos
culturais da I Guerra. Este contexto conduz Mariategui a posio anti-economicista e de
anti-progressismo, rompendo com a tradio da ideologia dominante do marxismo
vulgar da II Internacional socialista e, tambm, da posterior Comintern.
Anti-economicismo e anti-progressismo aparecem em algumas passagens de
Mariategui: uma moral de produtores como a concebe Sorel, como a
concebia Kautsky, no surge mecanicamente do interesse econmico, mas,
forma-se na luta de classes, travada com animo herico, com vontade
apaixonada. [...] Tanto o proletariado quanto a burguesia dos tempos pre-
belicos, inspirando-se na filosofia evolucionista, historicista e racionalista...
coincidiam na mesma adeso a ideia do progresso...".

Estes elementos contribuiram em Mariategui para recusa do "etapismo" e para


afirmao positiva de elementos oriundos da formao pre-capitalista peruana: O
Imprio INCA "Tahuantisuyo". Neste sentido, Mariategui se inscreve na corrente
socialista revolucionaria dos anos vinte, nitidamente estruturada pela vertente anti-
evolucionista, na qual figuram Lukacs, Korsch, Pannekoek, Rosa Luxembourg
Benjamin, Bloch e Gramsci.

Socialismo: criao herica na praxis


Para Mariategui, o uso do mtodo marxista foi sempre um processo criador, uma
praxis transformadora, que tinha em conta as condies reais e no uma transmisso
esquemtica de formulas dogmticas. Afirmava:
No queremos, certamente, que o socialismo seja na Amrica imitao nem
copia. Deve ser criao herica. Temos que dar vida, com nossa prpria
realidade, em nossa prpria linguagem, ao socialismo indo-americano. Eis
aqui uma misso digna de uma gerao nova. [...] O marxismo em cada pais,
opera e age sobre o ambiente, sobre o meio, sem descuidar de nenhuma de
suas modalidades.

Criao herica significa para Mariategui, "uma renovao critica e autocrtica


de seu pensamento".

Socialismo e Autogesto

" A perdurao de uma escritura


consiste, talvez, em sua aptido de produzir ou
de mostrar sentidos novos, inclusive inslitos,
em cada angulo do tempo ou em cada convulso
da historia "(Anibal Quijano)

Como vimos, na analise de Fernandes Diaz, h uma ausncia do tema


socialismo na analise da obra de Mariategui. A tese de doutorado de Csar Germana
explicita os elementos do socialismo indo-americano de Mariategui. Germana afirma
que o socialismo de Mariategui tido como algo dado e por isto no foi discutido.
Inicialmente Germana assinala a matriz bsica do pensamento mariateguiano ,
" A singularidade de sua proposta poltica s pode ser compreendida se levarmos em
conta que o conjunto de sua obra foi o resultado do encontro de uma dupla herana: a
cultura ocidental, em particular o marxismo que teve um papel central na constituio
de seus pontos de vista tericos e polticos; e de outro, a cultura andina, verdadeiro
substrato de suas reflexes e de suas orientaes vitais".
Para Csar Germana,
A singularidade do pensamento poltico de J.C.Mariategui s pode ser
entendida se for situada na relao com as tendncias mais profundas da
sociedade peruana que ele soube apreender e em funo das quais
desenvolveu seu projeto poltico. O conhecimento que tinha da cultura
ocidental e do marxismo lhe serviu de ferramenta para descobrir as
caractersticas do Peru e suas tendncias de mudana.Sem duvidas, no
"aplicou" o marxismo ao estudo do Peru, pois considerava que essa
concepo no era uma doutrina completa, fechada e de validez universal.
Antes bem, teve que refazer o caminho percorrido por Marx e reelaborar
conceitos e categorias em funo da especifica realidade do objeto de seus
estudos, at alcanar sua prpria tica de reflexo e de investigao.

Em seguida, analisa o debate triplo que Mariategui teve com as correntes


polticas e ideolgicas mais importantes de sua poca, o que lhe permitiu chegar a uma
concepo original do socialismo, o "socialismo indo-americano".
A controvrsia com os intelectuais representativos da cultura criola-organica -
dominante em sua poca-;
A discusso com os idelogos do nacionalismo radical - em particular com Victor Haya
dela Torre;
A polemica com os dirigentes da terceira Internacional na Amrica Latina.
Os pontos 2 e 3, como vimos, foram desenvolvidos atravs da polemica aparente
com Henry de Man, na obra " Em Defesa do Marxismo".
Assim, atravs destes debates, Mariategui descarta a modernizao peruana
segundo 3 vias: a democracia liberal, o capitalismo de Estado e o socialismo de Estado.
Muitos mariateguianos j assinalaram a importncia da obra de Mariategui para a
conjuntura que se abriu com a derrocada das experincias do socialismo burocrtico e a
crise em curso no mundo capitalista. Neste sentido, adquire grande fora as palavras de
Anibal Quijano, de que "A perdurao de uma escrita consiste, talvez, em sua aptido
de produzir ou de mostrar sentidos novos, inclusive inslitos, em cada virada do tempo
ou em cada convulso da historia".
Para Germana, 3 instancias definem a atualidade do projeto socialista de
Mariategui:
a socializao dos meios de produo, implicando a abolio da propriedade
privada dos recursos produtivos e sua substituio pela propriedade social;
a socializao do poder politico,a participao dos cidados livres e iguais na
formao coletiva de uma vontade poltica e no exerccio direto da
autoridade;enfim , a democracia direta;
a transformao do mundo das relaes intersubjetivas no sentido da afirmao
da solidariedade.
Nesta perspectiva, adquire seu verdadeiro valor a nfase posta por Mariategui
no papel das diversas formas de auto-organizao dos trabalhadores. As associaes que
surgissem desse processo formariam o tecido social da nova sociedade. a caracterstica
principal que ele encontrava nelas era sua capacidade para tratar todas as questes
praticas de interesse coletivo mediante a discusso livre. Nestas organizaes, mediante
a pratica da deliberao e da deciso se formaria a vontade poltica.
Mas, para que fosse possvel o exerccio dessa democracia direta, a condio
indispensvel deveria ser a erradicao do poder administrativo e do
dinheiro...para ele, a sociedade socialista se orientaria para o logro de um
mximo de comunicao e um mnimo de institucionalizao.
Germana mostra que o
projeto socialista de Mariategui portava uma radical subverso das relaes
intersubjetivas. Em nota de rodap, Germana nota que "Mariategui prestou
ateno particularmente a toda uma rea da vida social descuidada pela
corrente do marxismo oficial da III Internacional. Esta rea correspondia ao
que ele descreve como "[...] os costumes, os sentimentos, os mitos- os
elementos espirituais e formais destes fenmenos que se designam com os
termos de sociedade e de cultura ...(7Ensayos).
Mariategui pensava a sociedade socialista, na qual se constituiriam novos
padres culturais e orientaes valorativas, cognoscitivas e motivacionais;
enfim, uma sociedade com um novo sentido da vida. O socialismo no era,
assim, a continuidade da sociedade do trabalho, surgida com o capitalismo. O
concebia como outra forma de racionalidade, no centrada na tcnica e no
lucro mas na solidariedade e na comunicao.

Germana assinala que este o substrato mais profundo de suas reflexes e que
abarcava os outros elementos do socialismo: a socializao dos meios de produo e a
socializao do poder poltico. o ncleo ao redor do qual se articula o pensamento de
Mariategui. Elemento tambm assinalado por Florestan Fernandes, em seu texto para o
Anurio Mariateguiano.
Mariategui esteve atento as mudanas nas relaes intersubjetivas de seu tempo
.Uma nova sensibilidade poltica e cultural emergia no Peru desde o final do sculo
XIX. Tratava-se de um "complexo fenmeno espiritual". Trs campos especiais
apresentavam este fenmeno.
Os movimentos sociais, especialmente o movimento operrio e o movimento
campons indgena. Alem destes dois, o movimento estudantil com a reforma
universitria;
Uma mudana no campo das orientaes de valores e nas atitudes individuais.
No peru dos anos 20 ocorria uma lenta mutao nos mecanismos de socializao e nas
motivaes pessoais. Germana destaca algumas questes: a educao, a religio , que
expressam a tendncia de apario de um espirito moderno;
O nvel da expresso cultural do mundo das relaes intersubjetivas. Como se
traduzia esta nova sensibilidade no pensamento, nas artes e na literatura?

Aqui, Mariategui adverte 3 caractersticas de como pensava e sentia a nova


gerao artstica do Peru:
a preocupao em conhecer a realidade do Peru; rompendo com o critrio
colonialista de desconhecer a realidade peruana; o estudo da realidade do pais,
que significava "a reivindicao do ndio";
o internacionalismo da nova gerao; a preocupao central pelo peruano no os
levou a um nacionalismo estreito e xenfobo. Dizia Mariategui que " o
internacionalista sente, melhor que muitos nacionalistas, o indgena, o peruano";
a existncia de um espirito de renovao, a "vontade de criar um Peru novo
dentro de um mundo novo" A fuso do " sentimento autctone" e do "
pensamento universal".

Estes trs aspectos portam um elemento unificador: um novo sentido da


existncia social, uma nova racionalidade.
Para Mariategui a modernizao peruana foi um processo incompleto. O
moderno se inseriu na sociedade colonial e desta mistura desigual, surgiu um tipo de
sociedade que j no era tradicional, mas tampouco ocidental moderna. Assim, como
diz Germana, " A alternativa socialista mariateguiana apontava para uma direo
diferente da modernidade capitalista. Estava firmemente convencido da crise da
civilizao ocidental e no encontrava nela nenhuma soluo possvel para os
problemas do Peru. por isso, dedicou muita ateno aos problemas do mundo ocidental
e em particular aos da civilizao andina...da que sua proposta aparea como uma
imperiosa necessidade da integrao dos elementos libertadores de ocidente cultura
andina.E foi esta especifica simbiose a que denominou " socialismo indo-americano".
Mariategui pensava este socialismo como uma "criao orgnica cujo eixo
articulador seria constitudo pelas relaes de solidariedade.Em minha opinio, a se
acha o ncleo central de suas reflexes", diz Germana.
"O que Mariategui sublinhava na herana do mundo andino era a
sobrevivncia das relaes de cooperao e solidariedade. Estas no
correspondiam apenas ao mundo do trabalho e da produo, mas constituam
uma parte viva da alma indgena, pois estavam profundamente enraizadas em
todos os aspectos de sua vida". Mariategui advertia que este tipo de relaes
se reproduzia entre os trabalhadores das fbricas, fortalecidas pela
cooperao no trabalho.

Nesta perspectiva,vejamos um pouco o tipo de roganizao social desta


civilizao ancestral. Em sua obra, Mariategui, frente ao reto de La pobreza, M.Arce
Zagaceta assinala elementos fundamentais,para as lutas deste ionicio de sculo em
Nuestra America:
Erradicada a fome mediante sua tecnologia produtiva,tendo aprendido a
superar os desastres telricos,a seca ou a inundao,o homem andino se
dedicou criao artstica e cultural em todas as esferas. [...] Esforo de
sculos e milnios para se impor a uma geografia dificl e pouco propricia em
terras de cultivo gerou,em tempos muito remotos, um conjunto de relaes
solidarias de produo e trabalho. Em virtude delas,o esforo demandado
era equitativamente distribudo ; e os frutos do mesmo,no se concentravam
em um determinado setor da populao.Todos tinham acesso ao bem estar
logradoo com o esforo comum [grifo nosso].

As tecnicas e instituies solidarias,desenvolvidas pelas culturas que lhes


antecederam, no s foram mantidas pelos Incas, mas tambm difundidas e
reforadas pela administrao de um governo Imperial, por sua comprovada
eficincia para obter o bem estar,mediante o permanente rquilibrio entre a
crescente populkaoo e as terras cultivadas. Graas a este equilbrio se alijou
o fantasma da fome, e a produduo deixava abundantes excedentes para sua
redistribuioo posterior pelo governo central.
O principio da reciprocidade, criado pela cultura andina para enfrenbtar o
desafio geogrfico, era observadoo no s entre indivduos e famlias entre si.
Tambem regia entre estes e sua comunidade e era seguido pelo Inca em
relao aos autoridades locais.

Vejamos as 3 formas de organizao social:


A reciprocidade entre indivduos e familias era o AYNI, ou lei da irmandade
como a chamou Garcilaso. Devido a ela as famlias e seus membros componentes se
prestavam mutua ajuda nas atividades de utilidade individual,tais como a construo de
suas moradias e os trabalhos agrcolas de suas respectivas parcelas,quando elas
requeriam mo de obra adicional.
A reciprocidade entre as famlias e sua comunidade se expressou na instituio
da MINKA. Consistia na ajuda de trabaljo para as obras de cosntruo e mantimento
permanente das guas, caminhos vizinais, casas comunais, edifcios cvicos e, enfim, em
tudo em que o uso comum era necessrio.
A terceira forma de reciporocidade foi a MITA ou trabalho por turnos.Em
virtude dela,cada comunidade era obrigada a enviar um certo numeroo de trabalhadores
para as obras de envergadura imperial como as estradas,pontes,aguadutos ou
servios,como o requerido pelas guerras (mita guerreira) o para o cultivo das terras do
Estado ou do Sol,cuja produo se destinava aos depositos estatais e a manuteno do
culto.Esta contribuio de trabalho dos povos era retribuda pelo Estado mediante a
redistribuio dos bens armazenados,seja em forma de doaes aos povos e senhores
participantes ou em forma de auxilio aos povos que,por alguma razo imprevista no
tinham produzido o suficiente para suas necessidades ou tinham perdido por alguma
catstrofe.
Maria Rostwoski esclarece que a
mita ou prestao de servios rotativa um conceito muito andino(...)Toda
obra continhaa ideia de mita, de repetio a seu tempo.(...) Todo o trabalho
no mundo andino se cumpria como uma prestao de servios rotativa,seja
para a ateno dos TAMBOS,os caminhos,as pontes,os cuidados com os
depsitos,e tudo mais. (...) O termo mita vai mais alm de um sistema
organizativo do trabalho,porta consigo um conceito filosfico andino de um
eterno retorno (...) A mita diurna sucedia noturna em uma repetio que
refletia um ordenamento do tempo que os originrios conceituavam como um
sistema cclico de ordem e caos.

Enfim, O esforo social de produzir cada vez mais e melhor constituiu o grande
projeto desta sociedade. O sistema educativo estava a seu servio. Na obra Historia
Del Tahuantinsuyo, de M.R.Diez Canseco, encontramos elementos valiosos sobre a
composio social e a organizao dos Incas. Por exemplo:
No mbito costenho existiuuma classe social que se ocupou da troca e do
intercambio;estes especialistas foram chamados pelos espanhis de
mercadores,(...)porem necessrio entender a palavra em seu contexto
indgena,isto dentro de uma economia alheia ao uso da moedae na qual
s existia o intercambio e as equivalencias [grifo nosso].

Ou,de que
Os Incas no contavam suas idades pelos anos e que as pesoas se
classificavam no pela idade cronologia mas por suas condies fsicas e sua
caapcidade para o trabalho.(...) isto significava que um sujeito se classificava
de acordo ao tempo biologico,isto ,segundoo as etapas de seu estadoo
fsico(...)as idades no seguem uma ordem cronolgica,no se inciam com a
infncia para avanar atravs da vida.(...) A idade mais importante no mundo
andino,a idade de maior potencialidade e mxima energia de trabalho
desenvolvida pelos er humano: os 25 a 50 anos,quando o homem alcana a
plenitude de suas faculdades.

Voltemos as ideias de germana sobre o socialismo indo-americano do Amauta.


Neste sentido, Germana assinala outro aspecto da civilizao ocidental que constitui
parte central do socialismo de Mariategui e que se integra harmonicamente com o
espirito da cultura andina: a tica do socialismo.
Para Mariategui as relaes de solidariedade, sobre as quais se constituia o
socialismo, implicavam uma moral diferente do capitalismo, uma moral da
solidariedade em contraposio a moral do interesse; questo que exps no
texto " tica y Socialismo". Esta proposta convergente com suas criticas s
interpretaes tecnocracias e positivistas do marxismo.

Csar retoma e amplia sua reflexo: o socialismo aparece nas reflexes de


Mariategui em redor de 3 eixos:

socializao dos recursos produtivos, isto , estabelecimento de relaes de


cooperao e solidariedade na produo;
socializao do poder poltico, no sentido do exerccio direto do poder pela
sociedade sem eu conjunto;
um novo sentido da vida, uma racionalidade alternativa do capitalismo.
O fundamental da proposta mariateguiana tratava, portanto, da socializao dos
recursos da produo com uso e usufruto ficaria nas mos dos prprios produtores, ou
seja, a autogesto.
Segundo Germana,
O exame da participao dos camponeses indgenas na comunidade e dos
operrios no sindicato, o levou a considerar outro tipo de organizao
poltica, em que as funes estatais no se autonomizariam em relao com a
sociedade. Estas organizaes de democracia direta... constituam a via pela
qual o poder se iria socializando, at deixar de ser uma funo especializada e
separada da sociedade. As organizaes autonomas dos trabalhadores
seriam os rgos da democracia direta. Por isso, a formula da " conquista do
Estado" traduzia para Mariategui o longo processo pelo qual a experincia
associativa dos trabalhadores os levaria a uma forma de autogoverno e do
exercicio direto do poder.
Ou, em outra formulao:
esta postura de Mariategui punha em evidencia uma concepo do processo
revolucionrio profundamente ancorada em suas reflexes sobre a revoluo
socialista; a via como as lutas que desenvolviam as massas trabalhadoras,
que, iriam controlando as diversas esferas da vida social at alcanar o poder
global.Deste ponto de vista , o poder no seria tomada mas iria se
configurando no longo caminho da autoemancipao dos prprios
trabalhadores.Nas fbricas, nas minas,nas fazendas, em todos os lugares onde
se encontraro os trabalhadores,estes iro organizando e formando os
ncleos de novo poder.Portanto, a revoluo no seria como uma mudana de
poder poltico do Estado- dirigido por uma vanguarda esclarecida,mas
como uma transfromao da ordem social inteira produzida pelas massas
trabalhadoras.

Toda esta viso socialista implica tambm que o socialismo significa um


reencantamento do mundo, no sentido do restabelecimento de uma relao harmoniosa
dos homens entre si e dos homens com a natureza. A modernidade ocidental se traduziu
na fragmentao da vida social em esferas autnomas (economia, poltica, cultura,
moral, por exemplo), nas quais cada uma delas funciona como um sistema
independente; a sociedade moderna aparece como um mundo atomizado.
Mariategui define o espirito indgena sobrevivente como um " estilo particular de
vida". As relaes entre os membros da comunidade se regem pela reciprocidade. Esta
implica o intercmbio que estabelecem os indivduos nas diversas esferas da vida social:
trabalho, festas. Este dar e receber traduz o "espirito comunista" do indgena.
Nos 7 Ensayos, Mariategui define a alma indgena:
H pocas em que parece quer a historia parou. E uma mesma forma social
perdura, petrificada, muitos sculos. No aventureira, portanto, a hiptese
de que o ndio em quatro sculos tem mudado pouco espiritualmente. A
servido tem deprimido,sem duvida, sua psique e sua carne. O tornou pouco
mais melanclico, um pouco mais nostlgico. Sob o peso destes quatros
culos,o ndio se curvou moral e fisicamente. Mas o fundo escuro de sua
alma quase no mudou.

Outro aspecto caracterstico do "espirito" andino a relao entre o ndio e a


natureza. Para Mariategui, "o sentimento indgena que sobrevive na serra est
profundamente enraizado na natureza". Da, o "animismo" que caracterizou a religio
incaica, pois "povoava o territrio do Tawantinsuyo de gnios ou deuses locais". Os
elementos do socialismo pratico e o sentimento cosmico dos camponeses ndios
aram a chave para a reorientao do sentido da existncia social.
Mariategui usa a noo de "mito" no sentido que lhe permitia refletir sobre "a
criao de uma ordem social nova em que as orientaes e os valores no seriam
impostos desde fora, mas que, os impulsos da libertao dos oprimidos e humilhados
lhes permitiria descobrir um novo sentido moral". O mito para Mariategui pode ser
considerado como um projeto revolucionario,que surge da atividade pratica dos
trabalhadores e que d sentido a sua ao. a crena e a f pelas quais lutam. Dizia que
"A vida, mais que pensamento, quer ser ao, isto , combate. O homem contemporneo
tem necessidade da f. E a nica f, com que pode ocupar seu eu profundo, uma f
combativa".
Enfim, para Csar Germana, Mariategui percebeu "a revoluo como um
processo social que significava uma mudana no modo de produzir, de consumir, de
governar, de sentir e de pensar. No era um fato poltico: o assalto ao poder do Estado e
sua utilizao por uma nova classe social".
Vamos concluir com a reflexo de Miguel Mazzeo, autor que tem se dedicado a
atualizar a obra do Amauta a partir das experincias dos anos 2000 em Nuestra
America. Mazzeo condensa as ideias de Mariategui na categoria de socialismo prtico.
Que entende Mariategui por elementos de socialismo pratico ?
Em linhas gerais podemos responder o seguinte: um conjunto de praticas
sociais que se ratificam em torno ao comunal, o publico e os valores de
uso,tambm uma mentalidade,um espirito,enfim ; uma prxis. Para isso, o
Amauta refuta o economicismo e parte de seres humanos concretos e suas
experincias.

Isto j mostra o interesse de Mariategui pelo cotidiano (espao de


reproduo),como espao de explorao, opresso e espao de resistncia e luta por uma
contrahegemonia.
Deixemos a palavra com M.Mazzeo:
Os elementos do socialismo pratico remetem s tradies coletivistas da
economia e da sociedade aborgenes, a praticas ,concepes,
subjetividades,etc, hostis aos modos de ser do gamonalismo * e do
capitalismo(...). Porm, no so para Mariategui elementos puramente
reativos, mas, so proativos, idneos para outras conexes, geradores de
tenses e contraposies dialeticas que instalam o futuro no presente. Um
presente que se assume como uma instancia de emdiao ou ponto de partida
concreto para uma ordem superadora e universal.
A comunidade, rgo especifico do comunismo campones-indigena, era para
Mariategui a instituio nacional autoctona que se erigia em alternativa ao
latifndio, feudalidade e tambm ao capitalismo.
Para Mariategui o esprito coletivista dos povos originrios vai mais alm da
existncia das comunidades na serra peruana.Seu Espirito de
cooperao,seus mecanismos morais,para o Amauta,se punham de
manifesto em infinidade de praticas extra comunitrias e em distintas
regies de Nuestra America.
A economia comunista indgena,o comunismo agrrio do Ayllu,e os
elementos de socialismo pratico remetem a princpios de reciprocidade e
redistribuio das riquezas e consistem em hbitos e formas de cooperao e
solidariedade e em um conjunto de expresses empricas de um esprito
comunista.

Em outros povos originrios podemos encontrar estes elementos. Mazzeo


cita,por exemplo,entre quchuas e aymaras: La minga, El ayni o ayne, El rama, El techa
o pararaico, que significam: trabalho comunitrio, colaborao no trabalho, colaborao
mutua para distintas tarefas; remetem, portanto, tradies scio-culturais e as
experincias dos povos originrios.
Para Mariategui, o socialismo germen de auto-governo que disputa o
controle produtivo e reprodutivo do capital, como espao de produo de agentes
experimentados na mudana social, a partir do cotidiano.
E o comunismo agrrio do Ayllu serve a Mariategui como padro de um socialismo
no-estatal. As comunidades servem como exemplo de socializao concebida como
propriedade social (coletiva) e usofruto dos meios de produo por parte dos
produtores diretos e que abrange a socializao do poder.
Mazzeo aponta outros elementos do socialismo pratico enquanto elementos
de anticapitalismo pratico: os que vo Alm do capital. Ou seja, o tipo ideal da
organizao comunal refuta os princpios bsicos do sistema capitalista:
a propriedade privada dos meios de produo (incluindo sua redistribuio);
a estratgia do esforo individual frente ao esforo coletivo de que falava El
Che;
a dominao classista (e toda forma de dominao e explorao),
a logica da concorrenciado lucro e da acumulao que atomiza as classes
subalternas,
o fundamento da emrcantilizao,etc.

O socialismo pratico subordina todos esses elementos do capital uma logica


solidaria.
Assim,
A organizao comunal contem o embrio do alternativo. Ao individualismo
ope o coletivismo, propriedade privada ope a propriedade coletiva,as
relaes sociais mediadas pelos laos mercantis contrape as relaes
solidarias,a organizao vertical ope a organizao autnoma e de base.

Em relao ao processo de trabalho, organizao comunal tem os princpios


comunitrios bsicos, entre outros: a emancipao do trabalho, a cogesto, a autogesto,
o trabalho fraternal em associaes voluntarias, etc., vai mais alm da comunidade
camponesa-indigena e so extensivos ao conjunto da sociedade.
Mazzeo tambm ponta dois outros elementos do socialismo pratico:
Os elementos do socialismo pratico resgatam um paradigima ecolgico,ao
propor um vinculo com a natureza que se contrape propenso faustica do
Capital;
Os elementos do socialismo pratico tambm propem uma serie de valores e
uma moral antagnica moral burguesa: uma moral de produtores,como
disse Mariategui inspirado em Georges Sorel.

Por fim,vejamos como Mazzeo define a Economia Comunista Indgena:


Mariategui cita a Csar Ugarte para explicar essa economia: A propriedade coletiva da terra cultivada
pelo Ayllu ou conjnto de famlias aparentadas,embora dividida em lotes individuais intransferiveis;
propriedade coletiva das guasterras de pasto e bosques pela marca ou tribo,ou seja,a federao de
Ayllus estabelecidos ao redor de uma mesma aldeia;cooperao comum no trabalho;apropriao
individual das colheitas e frutos....

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11) TEORICOS DO LESTE EUROPEU
Nos pases do lesta da Europa,desde o ps Guerra campo de experimentao dos
regimes que ficaram conhecidos comosocialismoreal, vimos no 1 volume que foram
palco de muitas lutas,revoltas,rebelies e mesmo revoluces ,dos
trabalhadores.Iniciadas em 1953 na Alemanha oriental,passando pela Hungria em
1956,a Thecoslovaquia em 1968 e,enfim,chegando a Polonia em 1980-81.
Esse longo processo permitu que varios intelectuais elaborassem vises e leituras
tanto da natureza desses regimes quanto,sobretudo,de alternativas a sua existncia.Neste
aspecto,a autogesto foi um eixo mesmo fundante destas Alternativas.De um
lado,porque esses regimes ps-capitalistas tinam em suas Constituies a propriedade
social dos meios de produo alm d se autoproclamarem socialistas;de outro lado,a
experincia que os trabalhadores foram acumulando ao longo do tempo foi
desenvolvendo propostas de autogesto que correspondia as organizaes alternativas
que fundaram nestas lutas .
Destacamos 3 obras entre tantas=
1=a da dupla polonesa J.Kuron e K.Modzelewski ,a Carta Aberta ao partido
operario polones ( 1965) ;
2= a do theco PETR UHL,elaborada aps a Revoluo dos Conselhos Operarios
thecos,em 1968;
3=e,a do alemo oriental RUDOLF BAHRO, dos anos 70,logo em seguida ao
choque provocado pela invaso da Thecoslovaquia pela URSS.
Outros autores tambm tm obras fundamentais nessa perspectiva.E,muitos
foram por ns usados para fundamentao de princpios da autogesto,por exemplo,os
thecos KAREL KOSIK,J ZELENY,a Escola de Budapest de Lukcs,a Escola Praxis da
Yugoslavia, o polons Adam Schaff.
Suas idias est espraiadas em nossos dois volumes deste trabalho.
Alm destes podemos citar, M.Djillas, Marc Racovsky,,Andreas Hegedus,Miklos
Haraszti,George Konrad/Ivan Szelenyo , o grupo theco de Radovan Richta.
Suas obras esto em nossa Bibliografia Geral.
Enfim, fundamental dizer que estes Programas alternativos construdos nos
pases do Leste europeu,como reflexo das lutas e revolues desenvovlidas pelos
operrios e povos destes pases, enquanto Programas baseados na Autogesto Social,
foram transformados em Estategia e Ao concretas pelo movimento Solidarnosc em
1980.O Congresso nacional de solidarnosc resultou pela aprovao de seus delegados
operrios de um Programa pela Republica Autogestionaria da Polonia *.
Como diz Joo Bernardo,foi o ultimo ato de um ciclo de lutas inicado no ps-
Guerra.
Tivemos a oportunidade de acompanhar essa experincia nos anos 80,quando
estvamos na Frana,atravs da CFDT.Inclusive,a pedido do movimento pela
autogesto de Portugal,BASE-FUT,fizemos uma pesquisa que resultou na publicao
Movimento pela Autogesto na Polonia (1983).
Em outro nosso trabalho,Leste europeu,a dialtica da revoluo passiva*
tratamos de forma mais sistemtica a experincia dos trabalhadores na Polonia.
Na 1 parte deste nosso trabalho,apresentamos a historia daquela experincia
ocorrida na Polonia entre agosto de 1980 e dezembro de 1981,e o Programa de
Solidarnosc.
Esse Documento do Solidarnosc, seria,ento,a 4 obra que apresentaramos aqui.

1= A Carta aberta ao poup.

Em 1964,K.Modezelevsky e J. Kuron elaboraram um Informa sobre a situao


da Polnia que trazia um projeto de programa revolucionrio.Esse informe foi
apreeendido pela policia e os dois foram expulsos do POUP e tambm da Universidade
de Varsovia.
Ento,ambas escreveram uma Carta Aberta ao POUP.Para muitos analistas essa
Carta Aberta a primeira critica global e revolucionaria do sistema chamado de
socialismo real,e que vem do prprio campo dos pases do leste europeu.
considerado um documento superior politicamente as Teses da Oposio
Operaria de A.Kollontai e aos Manifestos sados da rebelio de Kronstadt,e
mesmo,as Teses da Oposio de Esquerda trotskista.
o texto de Modzelevsky e Kuron vai muito mais longes na analise do sistema e
sem ua explicao histrica.Isto perfeitamente lgico desde um ponto de vista
cientifico.Indepenedentemente do valor intelectual de uns e outros, resulta facilmente
compreensvel que desde 1924 Cronstadt- at 1964,a soma de experincias e de
analises,permite uma explicao mais profunda e rigorosa do fenmeno( Lorenzo
Torres,introduo edio espanhola).
Sem duvida,no leste europeu, com as lutas, rebelies e mesmo revolues
iniciadas em 1953, foi se acumulando experincias e teorizaes que permitiram em
1980-81 ao movimento Solidarnosc elaborar um Programa Autogestionario.
Para Lorenzo Torres (pseudnimo de Fernando Claudin) O que se desprende
fundamentalmente da leitura ds carta aberta - e que vem confirmar nossas
precedentes hipoteses- que os sistemas burocrticos formam na
realidade,FORMAES SOCIAIS NOVAS.No so capitalistas,nem socialistas.
Kuron e Modezelvsky,na Introduo a Carta Aberta fazem
esclarecimentos importantes:
Chegamos a nossa posio atual progresssivamente e mediante uma lenta
evoluo de nossas idias,parcialmente no curso do trabalho sobre nosso texto,ao qual
dedicamos 6 meses...O texto no foi finalziado (faltam dois captulos e,os captulos
econmicos constituem um esboo que algo definitivo da analise e teriam que ser
corrigidos).
No capitulo VII,Jacek e karol dizem que Nosso texto deveria conter um capitulo
dedicado a analise da luta de classes durante os anos 1956-1957.Devido a interveno
dos rgos da MSW (segurana) ,no tivemos tempo de escreve-lo.mas,como tem uma
importncia considervel para compreenso de nossa posio poltica e que alem disso
nosso objetivo de reflexo sobre os fatos de outubro e as causas da queda da tendncia
das esquerdas assim como sobre a derrota da revoluo de 1956, foi o ponto de partida
da evoluo de nossas idias, consideramos oportuno apresentar brevemente as teses
fundamentais do capitulo no escrito.
Durante os anos 50 estalou a crise internacional do estalinismo, primeira fase da
crise geral da ditadura da burocracia. Isso teve como conseqncia as primeiras
manifestaes revolucionarias da classe operaria: a greve geral na RDA, as
manifestaes e os combates de rua do 17 junho de 1853 em Berlim, uma serie de
greves nos campos de concentrao na URSS, os acontecimentos de junho de 1956 em
Poznan e as primeiras revolues anti-burocraticas na Polonia e na Hungria.
No primeiro volume desse nosso trabalho, abordamos todo esse processo de lutas.
Na 1 parte,intitulada O poder da burocracia,nossos dois autores analisam,de um
ponto de vista marxista, a natureza do regime polons,e,por extenso dos pases do
leste da Europa.A questo central a forma de propriedade:
Segundo a doutrina oficial, vivemos em um pais socialista.Esta tese se baseia na
identificao da propriedade de Estado dos meios de produo com a propriedade
social. O ato de nacionalizao teria transferido a industria,os transportes e os bancos
para sociedade em plena propriedade e as relaes de produo abseando-se na
propriedade social seriam por definio socialistas.
Este raciocnio parece ser marxista.Na realidade,se introduziu na teoria marxista
um elemento que lhe profundamente extranho,isto , a concepo formalista e jurdica
da propriedade.A noo de propriedade de Estado pode dissimular contedos diferentes
segundo seja o carter de classe do Estado.O setor estatal da economia nacional nos
pases capitalistas no tem nada em comum com a propriedade social.
A historia conhece exemplos de sociedades de classes, com seus antagonismos,
nas quais a propriedade estatal dos meios de produo era predominante ( O MODO
DE PRODUO ASIATICO ).
Como podemoremos ver abaixo,R.Bahro tambm trabalha na hiptese de Modo
de produo Asiatico para classsifcar os regimes do socialismo real.
A propriedad estatal dos meios de produo no que uma das formas da
propriedade.Pertence aos grupos sociais aos quais pertence o Estado(...)O poder poltico
est ligado ao poder sobre o processo de produo e de distribuio.
A quem pertence o poder em nosso Estado ? A um s partido, praticamente
monopolista,o POUP.Todas as decises essenciais se tomam primeiro no partido e
somente aps nos organismos oficiais do pdoer.nenhuma deciso importante pode ser
tomada e realziada sem ter sido primeiro aprovada pelas autoridades do partido.
O partido que governa possui o monoplio do poder afirmam Karol e Kuron.
Que denominam = chamamos essa elite do poder partido/estado... ,a
BUROCRACIA POLITICA CENTRAL (...) .A burocracia poltica central,possuidora
dos meios de produo.
Passemos ao capitulo que nos interessa frente autogesto. o numero
X,chamado de O Programa.
No inicio, Karol e Kuron pem a seguinte questo: Se a classe operaria,por sua
natureza e por ser afora principal da revoluo, capaz de propor um programa vlido
? .
O interesse de classe do porletariado exige a supresso da propriedade privada
dos meios de produo (...).Em regime de democracia operaria, ser tambm necessrio
subtrair do produto do do trabalho dos operrios uma parte destinada acumulao,a
sustentar e desenvovler os servios sanitrios,o ensino,a cultura; outra parte estar
destinada s despesas sociais, administrao, e ao aparato do pdoer.
A supresso da explorao significa a criao de um sistema em que a classe
operaria organizada ser dona de seu trabalho e do produto do mesmo, determinar os
objetivos da produo social e decidir da distribuio do produto nacional.
(...) Ento, a classe operaria exercer o pdoere conomico, social e poltico no Estado
Como dever a classe operaria criar sua organizao propria, e o Estado para
poder dominar seu trabalho e sua produo ? Se a democracia operaria no existi na
fabrica, no pode existir a fortiori, no Estado(...) A classe operaria no pode ser dona de
seu trabalho da produo se no controla as condies e os objetivos do seu trabalho na
fabrica. Neste sentido, deve organizar-se nas fabricas e formr Conselhos Operarios
para dirigir a empresa.
Neste ponto,Karol e Kuron apontam elementos importantes,diferenciando-se por
exemplo da autogesto na Yugoslvia:
Para a tecnocracia,a independncia da empresa significa a plenitude do poder para a
direo.
Para a classe operaria, essa noo significa a independncia dos trabalhadores.
Por isso, a classe operaria no pode limitar-se a dirigir a empresa por meio dos
Conselhos(...) As decises principais referentes distribuio e utilizao da renda
ancional apresentam,por definio, um carter econmico geral, ou seja, se situam ao
nivelda economia nacional ; dito de outro modo,s podem ser adotadas pelo poder
central.
Por isto, preciso que a classe operaria organize ,alem dos Conselhos Operarios nas
empresas, delegaes das empresas, isto , que organiza Conselhos de Delegados
Operarios encabeados por um CONSELHO CENTRAL de DELEGADOS.
Por este sistema de Conselhos, a classe operaria decidir do plano da economia
nacional,isto , fixar os objetivos da produo social, tomar as decises necessrias e
controlar em todo momento a execuo do plano.
Sobre os PartidosPoliticos, karol e Kuron defendem sua pluralidade:
Para que o sistema dos conselhos possam refeletir vontad ,a opinio e a atividade das
massas operarias, estas devero organizar-se na base da pluralidade de partidos.Que
significa na pratica a pluralidade de partidos operrios ?
A pluralidade de partidos operrios exige a liberdade de palavra, de imprensa e de
reunio, a supresso da censura previa, uma liberdade absoluta para a invetigao
cientifica e a criao literaria e artstica.
O carter operrio da pluralidades de partidos refelte o carter do poder de Estado,
organizado segundo o sistema dos Conselhos.
Karel e Kuron fazem a critica ao parlamentarismo: No sistema de democracia operaria,
se a representao do conjunto dos cidados toma a forma parlamentar, a classe operaria
se encontrar por cimo do parlamento, organizada em Conselhos, e dispondo da base
material da existncia da sociedade,ou seja, do produto do seu trabalho.

2= PETR UHL O Socialismo Aprisionado

A obra de P.Uhl Ceskolovensko a Socialismus( 1968-1969) e Program


Spolecenske SamospravY (1979) ,editions clandestines. A dio francesa tem por
titulo Le Socialisme emprisionn.Une alternative socialiste normalization (Stock
La Brche, 1980).
Como vemos P.Uhl ,aps analisar o socialismo existente em seu pais , prope
uma Alternativa ao socialismo real . A 1 parte A Thecoslovaquia e o
Socailismo(publicada em 1968-1969) e a 2 parte Programa da Autogesto Social
(em 1979).
Vamos nos ater a 2 parte ,sobre a autogesto social.
Sobre os partidos polticos,P.Uhl se manifesta pelo pluralismo poltico: O
pluralismo poltico que propomos no tem nada em comum com o exerccio do poder
por partidos polticos.No sistema autogestionario, quaisquer grupos ou indivduos tem,
naturalmente ,o direito de criar uma organizao, ou at varias, que podem ser um grupo
de opinio ( por exemplo, clubes de discusso ) ou de ao, de interesses, etc.Algumas
dessas organizaes sero, sem duvidas, partidos polticos.Essas organizaes
expressaro ,antes de tudo, os interesses dos grupos sociais em questo ( operrios ou
mesmo grupos de operrios formados, por exemplo, segundo a natureza do trabalho ou
de especializao, estudantes, grupos vrios da inteligensia, de agricultores, etc ).
Outras delas sero sindicatos independentes, clubes profissionais e de lazer, ou
ainda associaes culturais, religiosas ou nacionais;elas tambm podem corresponder
aos interesses de diferentes categorias de idade, etc..
P.Uhl afirma que no futuro, o desenvolvimento da autogesto social e da
democracia direta torna inutis os partidos politicos , no sentido clssico da expresso.
E, conclui essa parte afirmando que o poder poltico e econmico pertencer,
desde o inicio da evoluo autogestionaria da sociedade, aos prprios trabalhadores, e
no aos partidos poltiicos.os partidos s atuaro como conselheiros e defensores de
concepes polticas diferentes.podem tambm desempenhar um papel significativo no
controle do poder e na luta contra a burocratizao ou qualquer outra degenerao do
sistema autogetionario.
Em relao a questo da organizao do trabalho,P.Uhl assume a posio de que
Enquanto durar a alienao do trabalho e ela no ir desaparecer imediatamente- ns
consideraremos as condies e relaes de produo, como as mais importantes.Por
conseqncia, a democracia e,antes de mais nada, uma democracia da produo, d onde
se originou o sistema democrtico de tomada de decises nos terrenos do consumo, da
cultura, etc. A importncia da esfera produtiva e das relaes de produo
motadamente no inicio do processo revolucionrio- diminuir proporcionalmente a
estabilizao do pdoer dos trabalhadores no sistema autogestionario, ao aumento do
tempo livre,a satisfao dos mais diversos interesses dos er humano e conseqente
reduo da diviso do trabalho.
P.Uhl especifica suas propostas no campo da Administrao autogestionaria e a
democracia social:
-Todas as deliberaes polticas devem ser publicas;devem ter acesso a elas os
trabalhadores, os delegados dos partidos polticos, a imprensa escrita,falada e
televisada,etc.O conjunto da vida politica ficar sob controle do publico.
Os trabalhadores e os cidados que sero eleitos para as instancias da autogesto,
podero dedicar a esta atividade no mnimo a metade de seu horrio de trabalho durante
um perodo dado ( trs meses, pore semplo ).Sero remunerados como se estivessem
trabalhando normalmente.
-Nos casos em que houver mudana freqente dos delegados,ser necessrio
propiciar-lhes um perodo de aprendizagem de 1 a 2 meses. A substituio dos
delegados deve se desenrolar d modo continuo: muda-se apenas uma parte de cada vez,
um quarto da unidade de autogesto,por exemplo.A norma da eleio direta deve ser
observada a todos os nveis(...).Os mandatos dos delegados sero revogveis por seus
eleitores em qualquer momento.
- outro principio importante o direito de minoria: caso uma parte dos eleitores
(20% , 10%, talvez 5% ) de uma empresa, comuna, setor de atividade ou do conjunto da
sociedade concordar coma cassao do mandato de um certo delegado ou com a
revogao de uma deciso tomada em relao a seu terreno de atividade, esta resoluo
deve ser executria(...). o que chamamos de direito da minoria ativa.
Sobre As Formas de Administrao Autogestionaria, P Uhl prope uma
mudana social radical: consiste,primeiro,numa transferencia dos pdoeres para baixo (
legislativo, executivo, judiciario), para as amplas massas de trabalhadores e da
popula~o. Por conseguinte, no vemos razo para uma separao estrita dessas trs
formas de gesto da sociedade (aqui,j trs formas de autogesto).
Ainda estamos,com certeza, muito longe do objetivo,ou seja,da participao de
todos do exerccio desses trs poderes, mas os elementos dessa participao da ampla
maioria dos cidados (e sobretudo dos trabalhadores) devem se manifestar desde o
inicio do processo revolucionrio.A seguir, devem aprofundar-se continuamente.
A participao generalizada, baseada na igualdade, um principio da democracia
direta que substituir pouco a pouco a democracia indireta.O conjunto das normas de
vida de trabalho ser escolhido pelos cidados e trabalhadores envolvidos. Os rgos
de autogesto representativos apenas prepararo as solues necessrias para essa
escolha..
A forma mais democrtica de tomar decises a direta.na sociedade autogerida,
todos os cidados tero,com freqncia, a possibilidade de manifestar suas opinies por
meio de referenduns.
Entretanto, com a finlalidade de assegurar o funcionamento continuo e a rapidez
das tomadas de deciso, sobretudo no caso de apenas uma parte da populao participar
da vida poltiica ativa, sero criados rgos representativos autogestionarios.
Entre outras unidades autogestionarias teremos:
-assemblias gerais de trabalhadores a nvel de empresa,de setor;
-assemblias gerais dos residentes de uma certa comuna ou distrito;
-conselhos e suas instancias subalternas;
Estas unidades atuaroemd em diversos campos da vida social:
trabalho,defesa,cultura,consumo,etc. oq eu chamamos de domnios
autogestionarios.Eles tambm sero hierarquizados (graus de
autogesto ).
P.Uhl estabelece uma dialtica entre duas esferas da vida social:
Pensamos que ao menos durante as primeiras fases do processo revolucionrio-
o TERRENO DO TRABALHO e, portanto, da PRODUO, deve ser o pilar do
sistema autogestionario.Trata-se, grosso modo, do encadeamento empresa-setor-
conjunto dos trabalhadores.O cambio e o financiamento tambm dependem desse
domnio e so controlados por suas instancias de autogesto.At a defesa faz parte
dele.
(...).Procuramos harmonizar, de maneira institucional, dois domnios onde se
manifestam problemas diferentes: o da produo, e o que se situa fora da
produo.Embora as vezes seja difcil traar uma separao ntida entre eles, podemos
contemplar duas variantes de organizaes para a tomada de decises:
1) Unidades autogestionarias baseadas no pricnipio territorial correspndentes s
unidades autogestionarias da esfera da produo.
Estas ltimas seguem o esquema da organizao do trabalho ( grosso modo=
empresa-setor-conjunto dos trabalhadores).
As unidades territoriais seguem a linha= comuna-distrito-conjuntoda
sociedade).Elas trataro da soluo dos problemas fora do domnio do
trabalho, exceo da defesa e de uma parte dos problemas jurdicos.
Na democracia representativa- cuja estrutura teria,assim,sobrevivido- o que
corresponde a esse modelo o sistema bicameral.A colaborao entre os dois
tipos de unidades autogestionarias (as da esfera do trabalho e as fora dela )
poderia ser garantida por comisses mistas, com a aprticipao de
representantes destes dosi tipos de unidades.Seriam comisses de
coordenao.

2) Outra possibilidade o sistema de Camara nica.


Neste quadro,poderiam ser constitudas comises de coordenao,por via de
escrutnio direto ou indireto.
Enquanto o poder operrio for fraco, ser necessrio confiar no garu de
cosnciencia dos trabalhadores das grandes unidades e,sobretudo,no dos operrios.Com o
decorrer do tempo, a longo prazo,os interesses dos er humano fora do trabalho se
tornaro cada vez mais plenos,afirma P.Uhl.
Na proposta de P.Uhl cada instancia da autogesto tem suas
competncias,compondo diferentes graus de autogesto,assim:
-Primeiro : As instancias de base ,so formadas pelos trabalhadores da empresa de
produo ou do estabeelcimento,que decidem,e por seu conselho;
-Segundo: esto includas nas instancias intermediarias das organizaes
autogestionariasas unidades que renem varias unidades de base (isto ,conjunto de
trabalhadores e seus conselhos).
-Terceiro: o conselho de trabalhadores tehecoslovacos (CTT) ser a instancia
representativa do conjunto dos trabalhadores. A segunda camara o conselho conjunto
dos cidados- pode ter o mesmo estatuto legal.
A medida que aumente a integrao internacional, se tornar necessrio criar um
sistema autogestionario a essa escala.
P.Uhl aponta alguns elementos para democracia da produo.
O conjunto dos trabalhadores,e no seu conselho autogestionario, decidir no que
tange s seguintes questes:
- o plano de longo prazo da unidade de produo e as outras unidades econmicas;
- apartilha da renda ( da mais-valia ) da unidade de produo entre a remunerao
pessoal dos trabalhadores, as contribuies ao fundo da unidade de produo e as
contribuies ao fundo dos trabalhadores ( da sociedade);
- o conjunto dos critrios para a partilha da renda pessoal;
-o regimento interno da unidade de produo, inclisive a durao da jornada de
trabalho,etc.

Um dos pontos mais interessantes na Proposta sobre a reduo da jornada de


trabalho, incentivos materiais e morais.
Diz P.Uhl Partimos do principio de que ser possvel reduzir de modo radical a
jornada de trabalho imediatamente aps a vitoria dos trabalhadores.Pode-se supor que,
no inicio, haver uma cordo em torno de 30 horas por semana,e depois este tempo
continuar a diminuir.Como ser possvel isso ?
Antes de mais nada, devido a abolio do exercito e da policia do Estado, o que
colocar numerosos trabalhadores disposio dos etor produtivo,pois ali est
concentrada 5% da populao ativa.Parcela igual, talvez maior, da fora de trabalho ser
liberada com a limitao da administrao publica, do aparelho judicirio, e a
dissoluo dos aparelhos de partidos polticos e de outras organizaes.Da mesma
maneira, numerosas profisses se tornaro inteis. A capacidade de produo ser,por
sua vez, aumentada por meio da reduo conforme a situao internacional- da
fabricao de armamento.
Mas as reservas mais considerveis esto presentes na prpria produo e na
organizao do processo de trabalho. Pode-se estimar que, hoje em dia, a utilizao
efetiva do tempo de trabalho varia entre 10 e 90% das possibilidades,segundo os
locais.Para os trabalhadores no manuais, esta utilizao fica numa media de 50%, e ,
para os trabalhadores manuais, cerca de 70%. Esta porcentagem ainda mais baixa na
construo civil, ao passo que se aproxima dos 100% nas linhas de produo.
P.Uhl entra no tema dos valores e da qualificao:
A melhoria da instruo e as inovaes tecnolgicas (automao,etc) tornaro
problemtico o exerccio de ecrtas profisses pouco atraentes, de tarefas simples e
bastante desagradveis.(...).Propomos,por exemplo, a seguinte soluo:
Cada trabalhador dedicaria uma parcela bem definida de sua semana de trabalho
ao exerccio de sua profisso mais ou menos qualificada ( por exemplo, 20 horas
durante os 3 primeiros dias), no quarto dia faria, segundo a necessidade, trabalho no
qualificado (nos setores de comercio, transporte, servios,atividades de controle de
circuito automtico,etc) e os trs dias seguintes seriam livres.
Uma parcela determinada do tempo de trabalho tambm ser dedicada as tarefas
de defesa e a manuteno da ordem; outra ser ocupada pelas decises referentes aos
problemas do local de trabalho, da empresa ou do setor.Com esta finalidade, os
relatrios de especialistas devero estar disponoveis e ser compreensveis.Os
trabalhadores devero receber instruo detalhada sobre a organizao do trabalho, a
tecnologia,etc o que ser feito por meio de conferencias e seminrios durante o tempo
de trabalho.Pode-se estimar em cerca de 10 a 20% da jornada de trabalho o tempo
necessrio para estas atividades.
A liberao da fora de trabalho para a criao dos valores reais tambem est
vinculada politica financeira.Assim, por exemplo, a eliminao do pagamento do
transporte publico, das taxas de comunicao ou dos alugeis (so apenas exemplos)
liberar grande parte da fora de trabalho, que poder se dedicar a tarefas mais
importantes.
E,mais tarde, quando possam Sr abolidos o dinheiro e os circuitos financeiros, as
atividades improdutivas sero ainda amis consideravelmente reduzidas.A relao do
homem com o seu trabalho no ser mais alienada.
O direito ao trabalho ser garantido para todos e a existncia de incentivos
materiais no pdoer entrava-lo.Se houver numero excessivo de trabalhadores em certos
setores ou profisses, a soluo deste problema se basear nos interesses dos
trabalhadores lesados pela situao.Sempre que necessrio, sergaratida a reciclagem
profissional.isto se aplica, evidentemente, aos membros do aparelho burocrtico que
devero deixar seus empregos aps a vitoria dos trabalhadores.
3= RUDOLF BAHRO: A Alternativa Autogestionaria
Rudolf Bahro escreveu A Alternativa nos anos 70, impactado pela invaso
sovietica em Praga no ano 1968. Faz uma reflexo sobre a crise entre a URSS e a
Yugoslavia,a crise sino-sovietica,as lutas do Maio-68 ,os debates marxistas sobre a
natureza da URSS,aproposta do Euro-comunismo.
Sua obra reflete e antecipa as lutas anti-burocraticas no Leste, a experincia da
Primavera de Praga ,e as revoltas no Bltico polons em 1970 e 1976. De certa
forma,encontramos em seu trabalho prefiguraes do que viria a ser o movimento
Solidarnosc em 1980-81 na Polnia.
Em Paris,em 1979,foi realizado um Seminario para debater as idias da obra de
R.Bahro.Participaram por vrios intelectuais da esquerda da. Europa. Christine Buci-
Glucksman disse na ocasio que Para todos aqueles que se proclamam como fazendo
parte de um SOCIALISMO DE AUTOGESTO (grifo nosso), capaz de articular uma
transformao da democracia representativa e de novas formas de democracia de base,a
obra de Bahro uma contribuio teorica de importancia fundamental, para a renovao
do pensamento do socialismo.
E , assinala a herana presente na obra de Bahro condensa Em resumo, tudo o
que estava em gestao, em determinadas indicaes tericas de Rosa Luxemburgo
ou Gramsci, nos vanguardismos mais radicais da Primavera de Praga ( ligao entre
democratizao e conselhos operrios ) e nos novos contedos e formas de luta do
capitalismo desenvolvido (lutas operarias contra a diviso capitalista do trabalho,para o
controle,a democracia ou a luta das mulheres,dos jovens...).
Em uma Autoentrevista (1980),R.Bahro destaca seu itinerrio intelectual para
entender os regimes do leste europeu
: primeiro,carecendo de um claro conceito,me lancei a uma espcie de
preparao global.Comeei a estudar de novo a Marx e a clarificar-me a verdadeira
historia do PCUS e da Unio Sovietica.Essa foi minha fase trotskista.Especialmente a
Isaac Deutscher devo muitos conhecimentos imprescindveis.Ao mesmo tempo me
interessei pela experincia yugoslava e pela via chinesa.....
Quando em meados dos anos 60 ,tive ocasio de ler os Grundrisse de Marx e
em particular o capitulo que j falei ( sobre as Formaes ore-capitalistas ),me dei conta
imediatamente que aquilo podia dizer-nos algo.Ao mesmo tempo relia o livro de
Wittfogel(O Despotismo oriental)...
Bahro v na obra de Wittfogel um certo chovinismo em relao a umperigo
asitico.por isso, Propus intencionalmente em meu livro o exemplo do despotismo
dos Incas.Na realidade,quando Marx fala de modo de produo asitico est pensando
em uma formao social e no em uma zona geogrfica limitada.
Em relao as cartas de Marx para Vera Zassulitch ,Bahro afirma que leu em
particular carta mais extensa,que nunca foi enviada por Marx.

Para Buci Bahro modifica a concepo do marxismo, conferindo-lhe


novamente,de modo paradoxal, sua carga critica e utpica,na medida em que a
UTOPIA HISTORICA uma dimenso nova das lutas (muito especialmente para as
muheres ).
Pensamos que de fundamental importncia, para a sequencia de nossa reflexo,
traarmos alguns pontos da viso de Rudolf Bahro em relao a experincia da Comuna
de Paris.Veremos como sua Alternativa tem inspirao, no campo ontolgico, no
Principio Comunal ,e no campo da estratgia poltica,no Projeto da Comuna de Paris.
Portanto,vejamos como na Introduo a LAlternative,Bahro aborda a
experincia dos trabalhadores franceses em 1871.
A concepo que Marx faz do comunismo data dos Manuscritos econmico e
filosficos ,de 1844.Seu aspecto econmico foi precisado nos esboos do Capital
(grundrisse) no fim dos anos 50,seu aspecto poltico na analise da Comuna de Paris em
1871.No essencial igual a de 1844 at a celebre passagem sobre o reino da liberdade
na terceira parte do Capital,que Engels publicou muito tempo aps a morte de Marx.
Ento,Bahro expe as idias de Marx sobre as 3 principais caractersticas
positivas da produo capitalista:
1= concentrao dos meios de produo nas moes de poucas pessoas,cessando de
ser propriedade dos trabalhadores diretos e se transformando ao contrario em potencias
sociais da produo;

2= organizao do trabalho enquanto trabalho social, pela cooperao,a diviso do


trabalho (no interior da fabrica) e a relao entre o trabalho e as cincias da natureza;
O modo de produo capitalista aboli o trabalho privado nessas duas
direes,mesmo se sob formas contraditrias.

3= criao do mercado mundial.


Podemos resumir isto ao denominador comum de socializao das foras
produtivas,e em escala mundial(ainda no totalmente realizado).
Por sua vez, a abolio da propriedade privada,segundo Marx, compreende os
processos seguintes,articulados entre si:
1= a socializao imediata dos meios e das condies de produo, ou seja,do
trabalho passado,reificado,concentrado at o presente no capital(...).Essa expropriao
portanto idntica abolio da produo de emrcadorias e do dinheiro...A mo-de-obra
perde seu carter mercantil no ato da tomada de posse dos meios de produo.
2= a abolio da velha diviso do trabalho;trata-se de duas coisas: de uma parte,
da superao das contradies,das desigualdades sociais,entre homens e
mulheres,cidade e campo,trabalho manual e trabalho intelectual(...);de outra parte,no
interior da fabrica,no campo das tarefas indispensveis,a superao da diviso tcnica
do trabalho,que deve se realizar por uma integrao da ciencia moderna na produo
regulada por meio de um trabalho cientifico(...).Essa concepo inclui a diminuio do
tempo de trabalho indispensavel reproduo material que a idia segundo a qual todo
mundo teria a partilhar o que ficaria inevitavelmente de tarefas
difceis,sujas,baixas,esquemticas);
3= a apropriao dos meios de produo pelos produtores associados destri a
manifestao mais flagrante,a manifestao poltica da velha diviso do trabalho e da
dominao de classe,ou seja, a maquina,o aparelho do Estado,e assim toda dominao
sobre os homens,ela aboli as funes sociais indispensveis usurpadas pelo Estado,para
chegar a uma administrao no poltica das coisas,incumbindo no mais funcionrios
para essatarefa,mas aos delegados eleitos,responsveis a todo momento e efetivamente
substituveis.;
4= Enfim, pela mediao dos proletrios vitoriosos,o mercado capitalista ser
abolido nos pases mais desenvolvidos,para ser substitudo por uma unio supranacional
da humanidade que usar solidaria e fraternalmente ( o que em um primeiro tempo
inclui ajuda aos povos historicamente menos avanados) os recursos do globo e
transmitirum planeta melhor as geraes futuras.
Eis o que o comunismo de Marx,conclui R.Bahro.
Ento,Bahro passa a analise marxista da Comuna de Paris:
No que concerne ao carter do Estado.. .na Ideologia Alem diz que os
proletrios se acham... em oposio direta com a forma que confere ate hoje uma
expresso coletiva aos indivduos da sociedade,com o Estado,e que eles devem
derrubar o Estado para impor sua personalidade.
R.Bahro diz,ento,E`por isto que imediatamente deve ser instaurado sem eu
lugar a COMUNA,ou se quisermos o Estado-comuna.
E,segue citando Marx:
A Comuna diz respeito libertao do trabalho sua grande viso- de uma
parte,suprimindo a atividade improdutiva e nociva dos parasitas
estatais,eliminando as causas quetornam uma imensa parte do produto nacional
sirva de alimento ao monstro do estado,de outra parte, cumprindo astarefas de
administrao locais e nacionais efetivas por um salrio de operrio.Ela comea
por fazer uma economia incalculvel,uma reforma econmica e uma
reestruturao poltica.A Comuna foi uma revoluo contra o Estado em
si,contra essa falsa camada sobrenatural da sociedade,contra essa abominvel
mquina de dominao de classe
Marx elogiava a Comuna por ter desrevelado a impostura segundo a qual a
administrao e a direo poltica seriam segredos,funes trnascendentes que s
podiam ser confiadas a uma casta formada para essa funo os parasitas do
Estado,(...) Supresso de toda hierarquia estatal e substituio dos chefes
arrogantes por servidores revogveis a todo momento,substituio das falsas
responsabilidades por uma verdadeira,porque eles trabalham sem cessar sob o
controle do publico.
Como,explica Engels,os rgos do Estado sempre fizeram valer seus
interesses especficos,a classe operaria deve se proteger contra seus proprios
deputados e funcionriosPara isso,ela usou na Comuna dois meios infalveis:
de inicio,ele ps em todos os postos administrativos,judicirios,pedagogicos
atravs do voto universal entre os que tomavam parte, esses podiam voltar a cada
momento sobre suas decises.Em seguida, ela remunerou todos os servios,grandes
ou pequenos,com tarifas iguais aos outros trabalhadores....Deste modo,a corrida
aos cargos e o arrivismo se encontravam eficazmente controlados.
Marx tambm explica essas questes: Nada poderia ser mais estranho ao
espirtio da Comuna que substituir o sufrgio universal por uma investidura
hierrquica.O sufrgio universal...est adequado a seu verdadeiro
objetivo:eleger pelas comunas seus prprios funcionrios para administrao e a
justia.
E,isso,indo at o nivel nacional,onde a representao seria um corpo
eleito,como legislativo e executivo,tomando decises e as executando.A nao devia
ser nada mais que a reunio das comunasToda a Frana se organizaria em
comunas autnomas e se governando elas prprias...Suas funes estatais
(centrais) seriam reduzidas a um pequeno numero das necessrias ao conjunto da
nao.E,mesmoas funes publicas do Governo central deveriam ser executadas
pelos funcionaios comunais,e assim sob o controle da comuna.
Deste modo,A Comuna realmente a comuna,ou seja,um corpo comum
publico e no somente um comit e conselho em aparncia eleito.esse sistema
representa a supresso radical da burocracia,e assim,bem entendido,da armada
permanente,da policia centralizada.A Comuna ,portanto,realmente a retomada
do poder do Estado pela sociedade enquanto sua prpria fora viva...,a retomada
do poder de Estado pelas massas populares....
tal qual o edificio da vida social deveria ter as comunas por
fundamento,igual o processo de produo nacional deveria se apoiar em
cooperativas de produo dirigidas pelos cosnelhos operrios.Engels afirma que o
decreto mais importante da Comuna foi de longe o que preconizava uma
organizao da grandeindustria,e mesmo das manufaturas,que repousava em cada
fabrca em uma associao de trabalhadores,e que deveria reunir todas as
cooperativas em uma grande associao.Mas,isso, o comunismo,o comunismo
impensvel !...quando o conjunto das cooperativas regulam a produo nacional
segundo um plano comum....
Marx e Engels noa creditavam que o Leviat poderia ter alguma funo
organizadora em matria de economia,ou educativa e cultural.Eles eram bem
mais de opinio que OS PRINCIPIOS DA COMUNA ERAM ETERNOS E NO
PODIAM SER DESTRUIDOS;que eles continuariam sem parar de se impor, at
que a classe operaria seja libertada.
Numa Conferencia na Espanha em abril de 1980, R.Bahro apresentou sua obra
LAlternative.No que diz respeito a diviso do trabalho,Bahro exps suas idias:

Advertindo que A manuteno dos hbitos dominantes de produo levaria


forosamente no s a uma catstrofe ecolgica,mas catstrofe psquica ,Bahro
responde a questo crucial das lutas socialistas,pelo menos desde a Comuna de Paris :
Como pode se estruturar a organizao social global do trabalho e da
vida,rompendo a velha diviso do trabalho ?

E,responde tal qual exps em sua obra: Para que os homens sejam capazes de
captar as conexes gerais,exercer influencia efetiva na sntese social, h que destruir o
tipo de organizao supercentralizada, que hostil individualidade e a iniciativa (...)
H que encontrar uma forma de regulao econmica que garanta aos homens iniciativa
individual concreta real comunalidade.
Como vemos,R.Bahro se apia tambm no Principio Comunal.
Numa das varias Conferencias que fez na Europa,Bahro ressalta com
nfase: Quero,porm,recordar a conhecida idia de Marx segundo a qual o
comunismo moderno seria uma espcie de regresso ao comunismo primitivo em
um nvel mais elevado(...)A comunidade primitiva foi para ele a formao
primaria.
A soluo,segue Bahro,est na descoberta do principio federativo, que
inerente conhecida idia da Livre Associao e que determinou,por exemplo,a
opo marxiana pela Organizao Comunal.
As unidades bsicas do trabalho unificado e da vida social deveriam ser
combinaes soberanas relativamente autnomas sobre uma determinada base
territorial,atribuindo-lhes o carter de microcosmos sociais.Uma organizao comunal
desse tipo poderia ser tambm o isntrumento adequado para desmantelar a separao
isolante das esferas da educao,a habitao e o trabalho,sem recair nas velhas
limitaes e restries da localidade e da exclusividade.Em particular,ela proporciona
espaos para formas de vida comunal que, do meu ponto de vista, o fundamento
econmico da emancipao das mulheres,e uma condio necessria para garantir as
cranas uma capacidade plena para educao e motivao para a aprendizagem
protegendo-as do perigo da neurose inerente famlia nuclear.
Organizao social segundo o principio comunal significa subordinao (no
liquidao) da regulao hierrquica.Significa coordenao ao invs de subordinao
dos homens em relao com suas diferentes atividades.E significa associao dessas
diferentes federaes interfuncionais em unidades complexas ,ainda quando,como
consequancia da estrutura territorial,sejam ainda contempladas como totalidade.essas
unidades abrangem todos os aspectos do processo de vida, eno se tomaro decises por
cima delas.
As comunas que estaro naturalmente especializadas em determinados aspectos
no marco de uma diviso globalmente social e planificada do trabalho,se associaro por
si mesmas sociedade nacional.E,finalmente,a idia de uma associao entre as naes
(...) penetrar,est penetrando j,no direito dos povos.
A mediao com cada unidade superior ocorrer atravs de delegados eleitos
pela base.,conclui Bahro.
Portanto,vemos claramente como R.Bahro traduz sua Alternativa a partir dos
Principios da Comuna,ou seja,do poder comunal.
Em sua proposta de Alternativa comunista,Bahro prope uma revoluo cultural
em que Se a sociedade organiza a educao e a produo de tal modo que todos os
indivduos possam adquirir por atividades tericas e praticas apropriadas uma formao
geral cientifica e artstica de alto nvel lhes permitindo uma apreenso diferenciada do
todo social,o potencial assim liberado conduz na pratica uma redistribuio e
autogesto de todos os negcios sociais.
Da Alternativa de Bahro,vamos dar destaque a questo da Organizao do
trabalho.Neste campo Bahro prope um Programa em que destaca os seguintes pontos:
1= generalizao de um sistema de autogesto e de auto-administrao como um
processo global que abrange o conjunto dos aspectosda reproduo e estruturado por
uma federao de comunas fundada por conselhos operrios.
2=luta radical contra a diviso vertical do trabalho,luta centrada em dois eixos:
-a reduo radical da durao do trabalho mecnico e repetitivo (trabalho
fisicamente improdutivo),atravs da reintroduo massiva dos empregados no trabalho
industrial e nos servios (comercio,transporte) paor um certo numero de horas semanais;
-generalizao do ensino superior universitario e para-universitario,extenso do
ensino obrigatrio at os 23 anos.

No ponto 5,Bahro expe a construo de estruturas que permitam a iniciativa


individual e uma vida comunitria real: a sociedade como associao de comunas.
Vamos nos deter mais nesse ponto.
Bahro afirma que,de inicio,Devemos sair do dilema entre estruturas
cooperativas e igualitarias e estruturas hierarquicas e elitarias,to comum as
correntes anarco-sindicalistas .Para Bahro, o importante para o homem chegando as
limiar do socialismo-comunismo, que a hirarquia funcional (em que as informaes e
as decises devam circular nos dois sentidos ),indispensvel regulao do processo de
existncia e do trabalho,no tenha mais necessariamente o carter de uma estrutura
social.A humanidade se compe de indivduos com capacidades unievrsais,o conjunto
social deve cessar,sobre a base material construda,de calcar sua estrutura sobre a do
sistema de tratamento das informaes,que ele utiliza e seguir a utilizar as funes
reguladoras. por essa razo que a supresso da velha diviso dotrabalho o tema
central desse livro.A ultima luta de classess justamente a que se d a propsito da
organizao do processo de informao,de conhecimento e deciso,e de sua
subordinao aos indivduos associados como conjunto.O homem no pode desaparecer
em sua funo no seio do sistema piramidial.

Para Bahro O cooperativo,qualquer que seja que tenha,no recobre jamais


totalmente o social.
Esse um ponto fundamental que bahro levanta para o debate sobre a
autogesto.A experiencia histrica nos leva a se perguntar se a alternativa entre
organizao cooperativa e organizao hierrquica no conduz a escolher entre,comear
por livrar o conjunto social poscapitalista uma concorrncia entre capitalistas coletivos
ou o livrar ao diktat do capitalista nico..Entendemos que um socialismo
cooperativo no melhor dos casos uma forma embrionria do socialismo; no
momento em que os trabalhadores se apropriam dos locais de produo no estado de
disperso prprio em que o capitalismo da concorrncia lhes deixou.
Bahro acha muito discutvel que a idia da associao geral se reduza uma
coordenao de similares cooperativas de produo.Como unir o corpo social
inteiro, o conjunto dos indivduos alm do processo de produo? Essa a questo
central da democracia socialista.
Prossegue Bahro: importante se ter cosnciencia que A QUESTO DA
AUTOGESTO numa sociedade altamente complexa no pode ser posta nem
achar soluo apenas do ponto de vista das comunas e ainda menos daquele das
unidades de produo,devemos levar em conta ao mesmo tempo O CARATER
GLOBAL DO PROCESSO DE REPRODUO
A esse carter global,Bahro chama de possibilidade de apreenso das
relaes globais,tido como PROCESSO SOCIO-FISICO E SOCIO-
PSICOLOGICO DE MASSA,e que apossibilidade dele acontecer,torna-se o
CRITERIO DECISIVO DA OPO DA FORMA DE REGULAO
ECONOMICA.
O Exercicio de uma influencia real sobre a sntese social,sobre o plano global
de baixo e do alto e sua garantia torna-se a questo capital suscetvel de achar
enfim uma soluo.
Bahro faz referencia a experiencia Yugoslava: Finalmente,s os valores (morais)
que orientaro a evoluo da associao sero definidos centralmente,ou seja, pelo
conjunto do corpo social.
O comunismo yugoslavo no pode descobrir,a seu tempo,a nica via (que,na
verdade,no existe) deuma evoluo para socializao,mas a idia de deixar uma
relativa autonomia de gesto aos coletivos quase cooperativos de produo abre
seguramente mais perspectivas do ponto de vista da aprendizagem e da
responsabilidades que uma direo assegurada pelos papas da
produo(Marx)...Mesmo nos pases partindo de um alto nvel de organizao
econmica e de cultura,a descentralizao por muito tempo a condio do
desenvolvimento da autogesto.
Em uma sociedade comunista avanada ,diz Bahro,os indivduos estaro
presentes em todas as esferas de interesse da subjetividade.existir um alto eum
baixo,mas segundo um sistema que nesse domnio no determina mais os
homens.Para os de baixo,a inveja perde todo sentido.
Aqui est o sentido profundo da palavra ASSOCIAO escolhida por
MARX.Mais que outras,esta palavra prpria para exprimir a unio voluntaria de
indivduos autnomos,o principio coordenador,federativo,da forma de organizao
social que garante a liberdade dos indivduos ao mesmo tempo que lhes oferece uma
indispensvel estrutura.
Associao dos indivduos nos agrupamentos em que eles prseguems eus
interesses especficos que formam sua vida social;associao desses agrupamentos
especializados no seio de comunas que englobam,enquanto unidade territorial
complexa,os diversos aspectos da vida social;enfim, associao das comunas elas
tambm relativamente especializadas no quadro da diviso do trabalho previsto no plano
em uma sociedade.Tal o comunismo na tica da organizao das relaes sociais em
conjunto.
Quais sero as decises que uma sociedade comunista tomar centralmente,ao
nvel do conjunto da sociedade ?,pergunta R.Bahro.
Inicialmente,deve-se definir o contedo e o volume das necessidades do pontode
vista dos valores ,mesmo que permaneam algumas controvrsias. assim que deve ser
definida a estrutura do plano,estrutura baseada sobre o valor de uso...Um controle
central isto ,comandado pelo interesse geral- dever poder ser exercido tambm nesse
nvel.Pois,a escolha dos produtos no pode e nem deve contrariamente as condies da
produo- ser deixado aos setores ou empresas particulares e depender de seus critrios
internos sejam quais forem.
A definio da estrutura daproduo e de suas modificaes no depende dos c
coletivos da produo mas da sociedade.ESSE PONTO UM DOS QUAIS OS
DEFENSORES DOS CONSELHOS OPERARIOS MENOS ENTENDEM.
Os indivduos associados no podem determinar o plano como produtores com
interesses especficos,mas como seres sociais tendo uma compreenso profunda dos
interesses gerais,de vrios interesses particulares e de seus interesses pessoais,e
buscando integra-los bem nos objetivos do plano.
Osinteresses dos produtores so os inetresses particulares entre outros tantos, por
isso que no pode nascer nenhum plano satisfatrio para o conjunto do corpo social a
partir de interesses mesmo democraticamente definidos de baixo para cima- tendo por
plos as cooperativas de produtores.
Se a concepo cooperativa-igualitaria no abole a condio subalterna do
proletariado oprimido,a viso de uma democracia dos conselhos com base na autogesto
dos produtores fica teoricamente colada um dos traos fundamentais da alienao
capitalista, a autonomia do processo econmico em relao um processo social de
conjunto que ele domina abstratamente (ver a esse propsito a analise dialtica de
Goldman).
AQUI QUE A IDIA DA COMUNA FAZ PROVA DE SUA GRANDE
SUPERIORIDADE
Lembremo-nos do que disse Marx em sua analise da Comuna de Paris:
A constituio comunal devolveria ao corpo social todas as foras que o
Estado,excrescncia parasitaria que se alimenta da sociedade e faz obstculo sua
livre evoluo,absorveu.
A forma de organizao da comuna permite a integrao de TODOS os aspectos
do processo de reproduo que contribuem ao desenvolvimento da personalidade,e
permite a manifestao interna e externa dos desejos e suas satisfaes.
E,aqui,Bahro exemplifica:
Imagine uma populao,sustentada por rgo que ela mesma
construiu,partilhando as diversas atividades,da planificao e da estatstica ao cuidado
dos locais e a retirada do lixo,da pesquisa aplicada expedio dos produtos,do ensino
de todas especialidades e de todos os nveis ao conseryo das maquinas,da construo de
novos imveis distribuio de objetos de uso e ao funcionamento dos servios,tanto
que as artes e as cincias seriam do domnio de cada um que as relaes,mais livres
como nunca,entre as geraes e os sexos,ou em geral,o prazer individual ou coletivo que
buscam as trocas as mais diversas.
Um organismo comunal desse tipo poderia tambm oferecer o quadro que
permiteria remediar a atomizao das esferas dotrabalho,da habitao e da instruo(...).
Em uma tica formal, a organizao comunal (territorial)(...)deveria ser a
instancia intermediaria de planificao e de direo que nenhum controle central das
unidades de base das varias atividades primarias do processo de reproduo no deveria
ignorar.
ESSE PRINCIPIO,a experincia da Comuna de Paris em 1871 no podia
descobrir porque ela foi unicamente parisiense.Um decreto impunha as cooperativas de
produo dos trabalhadores um agrupamento em escala nacional,uma concentrao de
pdoer que domina fatalmente as comunas territoriais e centraliza,mesmo por mais
democrtico que fosse seu fundionamento, o poder exercido sobre a sociedade.
As articulaes em bases territoriais foram sempre,ao longo da historia,mais
facilmente controlveis pelo homem e mais a sua medida que as redes cobrindo todo o
pais.
(...).Enfim,os delegados das comunas Assemblia nacional teriam,devido ao
carter de microcosmo da comunidade que eles representam,as capacidades e as
competncias que lhes permitiriam de observar igualment o plano geral das comunas
associadas.
Uma das preocupaes praticas essenciais da revoluo cultural ser de formar na
populao,ao lado dos coletivos de trabalho e de educao,as comunidades de
habitao(...)
A organizao comum dos habitantes oferece,por sua parte,3 vantagens decisivas:
1=a socializao do trabalho domestico;e,em particular,de suas tarefas de direo
e de planificao;
2=a socializao da educao e da guarda das crianas,de toda a parte do processo
primrio de socializao que a famlia se ocupa hoje (sem que as crianas sejam tiradas
da influencia de seus pais naturais);
3=a possibilidade de uma defesa direta dos intereses detodo,contra a tradio
patriarcal.

A CONSCIENCIA EXCEDENTARIA
Um conceito-chave na obra de R.Bahro o de cosnciencia excedentaria.esta se
divide , de forma complementar,em duas formas diametralmente opostas:
1= de um lado,os interesses de compensao so a reao inevitvel ao fato que a
sociedade limita e bloqueia,muito cedo,o desabrochar,o desenvolvimento e a afirmao
de inmeras pessoas.As necessidades correspondentes so saciadas,por meio de
satisfaes de substituio...;
2= de outro lado, os intereses de emancipao voltam-se para o crsecimento, a
diferenciao e a auto-realizao da personalidade, em todas as dimenses da atividade
humana....( Ingolf Diener,SOREX)

C.-Buci Glucksman em sua palestra no Seminario citado,aborda um ponto


fundamental na obra de R.Bahro,o da conscincia excedentaria, base da prospota de
revoluo cultural.
Que alternativa prope Bahro para as sociedades capitalistas desenvolvidas ? E
privilegiar uma noo que me parece capital: a conscincia excedentaria.Na verdade,
seo vicio profundo das sociedades proto-socialistas-estatais leva a tratar o movimento
social como um simples objeto controlvel , e a ser decidido de cima, convm
reprensar o problema da cosnciencia social,se se deseja reconhecer ao movimento sua
autonomia, como sujeito poltico, lutando contra todas as formas de dominao.
Nesse sentido, a revoluo passa por uma produo macia de consciencia
excedentaria, mobilizvel histrica e socialmente,afirma a Buci.E,adverte que,a
conscincia excedentaria no coincide,exatamente,com a de ideologia
(dominante/dominada).
Buci,ento,busca o conceito :A conscincia excedentaria no localizvel, em
uma camada social (inteligentsia).Ela conduz ao processo historico de
intelectualizao das froas produtivas,que cria um trabalhador coletivo, nos entido
de Marx.
E que,Falando francamente, a verdadeira teoria da cosnciencia excedentaria s
tem sentido em relao s formas de cosnciencia absorvida e, em sentido mais amplo, a
essse fenmeno poltiico fundamental que a subalternidade:
O problema da subalternidade situa-se noc entro de minha concepo da
alternativa,diz Bahro.
C.Buci argumenta recorrendo GRAMSCI:
Pode-se mesmo dizer,segue Buci,que a imensa originalidade marxista de Bahro
consiste em elaborar uma TEORIA da SUBALTERNIDADE, em suas estruturas
objetivas (Estado, aparelhos, burocracia) e sem uas modalidades de aceitao
subjetiva,reatando,assim,com a problemtica gramsciana da hegemonia (expansiva) e da
coscsiencia no hegemnica, subalterna,passiva.bahro relaciona essa subalternidade
com certas estruturas histricas:
-com organizao hierrquica do trabalho (despotismo de fabrica), fruto da
diviso do trabalho e da burocracia;
-com mecanismos de diferenciao social e econmica, criando necessidades
compensatorias e sua satisfao;
-com a paralisia das pulses, efeitos das estruturas patriarcais da sociedade
socialista e do Estado.
E,assim,para C-Buci,Nessas duas acpes mais amplas: conscincia no
subalterna e intelectualizao das foras produtivas, a consciencia excedentaria, como
conscincia democrtica de massa, deveria cimentar um novo bloco historico
socialista.

No final de seu livro,R.Bahro sintetiza a base de toda a sua Alternativa:


A resposta a estas questes se acha na descoberta do PRINCIPIO
FEDERATIVO inscrito na idia da LIVRE ASSOCIAO e prevendo :
A submisso do conjunto informacional estrutura hierrquica;
A associao dos indivduos em lugar de sua subordinao a diversos fins
subjetivos e objetivos;
A associao de suas organizaes (e ,claro,particularmente as de suas
unidades de trabalho) em comunas essencialmente territoriais,elementos
prepnderantes da totalidade;
A associao das comunas em uma comunidade nacional;
A associao das naes em uma comunidade mundial cooperando para paz;
A relao com a unidade imediatamente superior sendo assegurada pelos
delegados eleitos pela base.
Eis,enfim,o principio comunal!

AUTO-GESTO NO BRASIL
Nessa parte, vamos fazer referencia alguns pensadores ou
movimentos.Inicialmente a Mario de andrade, mas incluindo elementos sobre
S.B.de Holanda e A.candido.Outro Mario iremos abordar: Mario Alves fundador
do PCBR.E,outro Mario,j o abordamos junto com Rosa Luxemburgo ,Guevara e
Mariategui l acima. E,a ideia do PT sobre socialismo do V congresso ancional.

A EXPRESSO BRASILEIRA da autogesto comunal


Estudando o que se intitula de a corrente autogestionria na Frana, identifica-
se a existncia de algumas determinaes fundamentais:
- a principal, movimentos sociais, atravs de novos tipos de greves, novas formas de
luta e de organizao;
- intelectuais crticos, que foram os precursores e, antecederam o movimento social.;
manifestaram-se atravs de revistas, jornais; eram marxistas em ruptura com a
chamada linha sovietica de socialismo estatal;
- grupos anarquistas;
- grupos trotskistas;
- um novo tipo de sindicalismo, que teve bases importantes no meio operrio cristo-
JOC (a CFDT).
Se formos pensar em relao ao Brasil esse quadro social que utilizamos para
pensar a corrente autogestionria francesa,poderamos,inicialmente,mergulharmos em
algumas obras clssicas, que formam o chamado campo de formao de Retrato do
Brasil, isto , anlise de nossa Formao Social e Historica, em busca de elementos do
Princpio da autogesto comunal, da questo do trabalho associado,das varias
formas de cooperao e solidariedade.
A 1 obra clssica em que podemos falar do Principio da Autogesto Comunal
Macunama de Mario de Andrade. Pensamos que o poeta da Pauliceia Desvairada
patrono de uma corrente romantico-revolucionaria no Brasil.
O princpio da Autogesto Comunal parte integrante da cultura romntico-
revolucionaria no que diz respeito questo da organizao do trabalho, a critica da
sociedade industrialista. Nessa perspectiva, escolhemos 3 autores ditos clssicos, Mario
de Andrade, Sergio Buarque de Holanda e Antonio Candido. Completamos esses 3
autores, com ideias de Mario Pedrosa, Mario Alves e de documento do PT. Pensamos
que so momentos decisivos da formao de uma cultura romntico-revolucionria
articulada com o Princpio da autogesto comunal, no nosso pas.
A SENSIBILIDADE ROMANTICO - SOCIALISTA

Michel Lowy assinala que


Desde o fim do sculo XIX apareceram duas tendncias no seio
do marxismo, uma corrente positivista e evolucionista, para a
qual o socialismo no era mais que a continuao e o
coroamento da civilizao industrial-burguesa (Plekhanov,
Kautski e seus discpulos da II e na III Internacionais) e (...) uma
corrente que se poderia considerar como romntica, na medida
em que critica as "iluses do progresso" e formula uma dialtica
utpica revolucionria entre o passado pr-capitalista e o futuro
socialista: por exemplo, desde William Morris at os marxistas
ingleses contemporneos (E.P.Thompson, Raymond Williams) e
desde Lukacs e Bloch at Marcuse (passando pela Escola de
Frankfurt). Referente a W.Morris e a tradio romntica,
E.P.Thompson afirma: "[...] a tradio romntica no se define
apenas atravs de caractersticas como conservadora, regressiva,
escapista, utpica[...]. Mas contm recursos de outra natureza,
capazes de fundamentar a transformao independente dos
escritos de Marx e Engels[...]. Tpico da crtica romntica como
regresso e idealismo, a facilidade em deixar de lado a questo
de uma leitura alternativa desta tradio, como temos proposto
em nosso livro, em 1955, e por Raymond Williams em "Cultura
e Sociedade", em 1958.

Em palestra no Seminrio "500 anos", patrocinado pela prefeitura de So Paulo,


em 1992, Michael Lowy assinalou que, ao lado de um pensamento conservador, h uma
tradio crtica e radical presente nos intelectuais latino-americanos: crtica das "iluses
do progresso" da modernidade, determinando uma "perspectiva irnica e romntica" e
utpica-revolucionria.
Para Lowy, " a essa corrente que pertence Mariategui de uma forma original e
no contexto latino-americano"; e "A sensibilidade romntica de Mariategui no
somente poltica, mas tambm cultural".
A esta corrente se filiam, no Brasil, os componentes da "constelao romantica
anti-capitalista e socialista,desde Mario de Andrade, Sergio Buarque de Holanda a
Antonio Candido.
Esta corrente se caracteriza, entre tantas outras do campo da sensibilidade romantica,
pela preocupao com temas marxistas e socialistas.Nela, "a concepo marxiana do
socialismo est intimamente ligada a critica radical da civilizao burguesa moderna, e,
implica uma mudanca qualitativa, uma nova cultura social, um novo modo de vida, um
tipo de civilizao diferente."(LOWY).
A caracteristica essencial do anticapitalismo romantico a
critica radical a moderna civilizao industrial)burguesa) -
incluindo os processos de produo e de trabalho- em nome de
certos valores sociais e culturais pre-capitalistas...A concepo
de socialismo de Marx est intimamente ligada a sua critica
radical da moderna civilizao industrial-capitalista: muito
mais que apropriedade coletiva e a economia planejada.Implica
uma mudanca qualitativa, uma nova cultura social, um novo
modo de vida, um diferente tipo de civilizao que restabeleca o
papel das "qualidades sociais e naturais"na vida humana e o
papel do valor-de-uso no processo de produo (LOWY).

A concepo de romantismo revolucionrio, para Lowy uma "viso de


mundo", isto , "um conjunto de elementos articulados segundo uma lgica [...] como
uma estrutura significativa -no necessariamente consciente (muitas vezes, no
consciente) - subjacente a uma grande diversidade de conteudos e formas de
expresso(literarias, religiosas, filosoficas, politicas, etc). Estrutura significativa,
segundo Goldmann, "uma totalidade coerente organizada em torno de um eixo, de uma
estrutura.O elemento central desta estrutura, do qual dependem os outros, uma
contradio, ou oposio, entre dois sistemas de valores:os do romantico e os da
realidade social dita moderna.O romantismo como viso do mundo se constitue
enquanto forma especifica de critica da "modernidade".
Na perspectiva de Lowy, a modernidade "remete a um fenomeno mais
fundamental e global". Abarcando a modernidade capitalista e a no-capitalista".
Vejamos alguns caracteres enquanto sistema socio-econmico: a industrializao, o
desenvolvimento rpido e conjugado da cincia e da tecnologia, a hegemonia do
mercado, a propriedade privada dos meios de produo, a reproduo ampliada do
capital, o trabalho "livre", uma diviso do trabalho intensificada. A estes, acrescentam-
se fenomenos da "civilizao": a racionalizao, a burocratizao, o predominio de
"relacoes secundarias" na vida social, aurbanizao, a secularizao, a "reificao".
esta totalidade, em que o capitalismo enquanto modo e relaes de produo o
principal unificador e gerador, mas que rica em ramificaes, que constitui a
modernidade.

Os Romantismos
Como j vimos, Lowy assinala 4 correntes romnticas:

1. o romantismo "passadista" ou retogrado, que visa restabelecer o estado social


precedente. Estes termos so preferveis a "reacionrio", que muito restritivo, por sua
referncia direta reao contra a Revoluo Francesa;
2. o romantismo conservador que, contrariamente ao precedente, deseja
simplesmente a manuteno da sociedade e do Estado tal como existem nos pases no
atingidos pela Revoluo Francesa (a Inglaterra e a Alemanha, nos fins do sculo
XVIII) e o restabelecimento das estruturas que existiam na Frana em 1789;
3. o romantismo desencantado, para o qual o retorno ao passado impossvel,
quaisquer que tenham sido as qualidades sociais e culturais das sociedades pre-
capitalistas; o capitalismo industrial, apesar dos seua defeitos e do declnio cultural que
implica, sob certos aspectos, um fenmeno irreversvel, ao qual preciso se resignar;
4. o romantismo revolucionrio (e/ou utpico), que recusa, ao mesmo tempo, a
iluso de retorno as comunidades do passado e a reconciliao com o presente
capitalista, procurando uma sada na esperana do futuro. Nessa corrente [...], a
nostalgia do passado no desaparece, mas se transmuta em tenso voltada para o futuro
ps-capitalista".

H profundas afinidades entre a viso romntica - revo marxista e a cultura da


autogesto. No Brasil, existe um filo romntico-revolucionrio, a partir de seu patrono,
M. de Andrade, passando por Candido, Srgio Buarque de Holanda,Paulo Emilio e,
como j vimos, Mario Pedrosa, que, segundo Candido, criou Uma Esfera Mario
Pedrosa, uma corrente poltico-intelectual em torno do Jornal Vanguarda
Socialista.
Alm deste campo poltico-intelectual, nos movimentos sociais, podemos falar
de experincias diversas em que esto presentes prticas ou elementos da autogesto:
Comuna de Palmares, Comuna de Catende, Formoso das Trombas. Em outra parte
adiante, entraremos nestas experincias clssicas.
Nas correntes e partidos revolucionrios, encontramos poucas ideias e
programas na perspectiva da autogesto, vimos alguns elementos em Mario Alves e, na
pessoa de Erich Sachs,dirigente da POLOP, inspirado em Rosa Luxemburgo. No
poderamos deixar de falar da figura notvel de M.Tragtenberg, com seu Marxismo
heterodoxo libertrio.
Quanto ao PT, organizao para onde convergiram as melhores foras
revolucionrias do Brasil, no final da dcada de 1980, vimos os pontos programticos
do seu V Encontro nacional (1990),considerado por M.Lowy um dos melhores
documentos do movimento socialista mundial.
Por fim, gostaramos de destacar a experincia do exlio nos anos 70,de operrios e
intelectuais brasileiros que em contato com lutas autogestionrias na Europa e
frica,trouxeram na volta com a Anistia,em 1979, uma contribuio fundamental das
ideias autogestionrias.Esse grupo agrupou-se no que ficou conhecio como GAOS.*
Tendo seus integrantes papel de relevo na construo da CUT e do PT.
Identificamos no Filo romntico revolucionrio no Brasil,uma pliade de
pensadores: Mario Pedrosa, Paulo Emilio Sales Gomes, Antonio Candido,Sergio
Buauque de Holanda, Florestan Fernandes,Milton Santos. Todavia, cremos que o
patrono deste filo Mario de Andrade. o que vamos mostrar em seguida.

1= MARIO DE ANDRADE E O "ROMANTISMO REVOLUCIONARIO

"A milhor razo-de-ser do


Modernismo!Ele no era uma
esttica,nem na Europa nem aqui.Era um
estado de espirito revoltado e
revolucionario". ( (Mario de Andrade )

Mrio havia identificado em nosso


passado uma constante BARROCO-
ROMNTICA,que permitiu uma
aproximao constante germanica
agonistica(Jos A. Avancini)

Michael Lowy tem se dedicado ao estudo do "romantismo revolucionario".Em


texto para o Seminario "Reification et Utopie",em homenagem a Ernst Bloch e
G.Lukcs,Lowy teceu consideraes sobre este tema.
O romantismo no ,como muitos acreditam,(a partir das
apresentaes eminentemente superficiais dos manuais de
historia literaria) uma corrente estetica do seculo XIX ou uma
escola alem da literatura.Trata-se de uma verdadeira
Weltanschauung,que se manifesta no somente nas artes e na
poesia,mas em todos os dominios da vida cultural (inclusive na
politica,na filosofia,na religio e nas ciencias sociais) e que
constitui,depois do fim do sculo 18 at os dias atuais,uma das
formas fundamentais do espirito moderno,uma das estruturas-
de-sensibilidade essenciais da cultura europeia e mundial.

O trao comum que permite identificar este campo cultural romntico - apesar
da extraordinria diversidade de suas manifestaes- a critica da civilizao industrial-
burguesa moderna (que comea a constituir aps a metade do sculo XVIII) a partir de
certos valores sociais,culturais,ticos,estticos ou religiosos do passado-pr-capitalista.
Se o romntico um laudator temporis acti, esta viso do mundo no conduz
necessariamente ao passadismo, ao conservadorismo, Restaurao? O romantismo
poltico tem sido frequentemente assimilado as doutrinas reacionrias, mas se trata de
uma interpretao unilateral e reducionista do fenmeno, incapaz de compreender sua
riqueza, sua ambigidade e suas contradies. Depois Rousseau at hoje,sempre chiste
uma corrente romntica revolucionaria,na qual a nostalgia do passado alimentou uma
aspirao utpica,e cujo objetivo no foi o retorno Gemeinschaft pr-capitalista mas
um dtour pelo passado at o mundo novo do futuro.
Lkacs (notadamente nos escritos de juventude) e Bloch pertencem a esta
corrente e esto entre os representantes mais importantes do sculo XX. a partir do
romantismo anti-capitalista que eles vo se aproximar das ideiaideias socialistas e do
marxismo,e suas interpretaes da revoluo -sobretudo nos anos 1917-1923- ficou
profundamente marcada por certos temas romnticos. A qualidade nica de seus escritos
marxistas desta poca,que os distingue to radicalmente da produo "ortodoxa" da II e
da III Internacional,deve certamente muito a esta dimenso romntica/revolucionaria."
Lowy conclui da seguinte forma, sua exposio no Seminrio:
Concluindo este breve esboo, algumas hipteses de trabalho de
carter mais geral:
Contrariamente ao que se cr de costume, o romantismo
revolucionrio no uma figura ideolgica e cultural do sculo
XIX. at nossos dias uma componente essencial da maior parte
das criticas radicais da civilizao industrial/capitalista.Ele se
distingue do romantismo conservador ou restitucionista por sua
mirada utpica em relao ao futuro e pela integrao de
elementos essenciais da Aufklarung,da Revoluo francesa,e do
racionalismo alemo clssico (notadamente Hegel).Sua
nostalgia do passado pr-capitalista se articula com a adeso aos
valores revolucionrios como a democracia,a liberdade,a
igualdade,o socialismo.
Contrariamente a uma convico bem enraizada, o romantismo
revolucionrio no de nenhuma forma contraditria com o
pensamento de Marx, que comporta, ele tambm, uma dimenso
romntica anti-capitalista. Aps um sculo e meio de hegemonia
de um marxismo kantiano e/ou positivista,e/ou darwinista,e/ou
evolucionista (salvo algumas excees como Willliams Morris e
Rosa Luxemburgo) surgiu com Bloch e Lukcs entre os anos
1917-1923 uma possante e original leitura romntica do
marxismo,uma concep,co romntica da revoluo social,que
no desapareceu mais da conscincia critica moderna.

Na Amrica Latina, Lowy aponta Mariategui como uma estrela desta


constelao da cultura romntica revolucionaria. Por nossa parte, pensamos que no
Brasil encontramos vrios membros desta "cultura romntica".
Por varias razoes, mas, sobretudo pela sua viso de mundo centrada na
sensibilidade romntico- socialista,Mario de Andrade desponta como o "patrono" do
filo "romntico socialista no Brasil.Este filo da cultura socialista (marxista e/ou
radical) do Brasil incorpora figuras como Paulo Emilio Sales Gomes, Mario Pedrosa,
Sergio Buarque de Holanda, Antonio Candido.
A obra marioandradiana uma fonte inesgotvel e a cada dia expressa uma
vigncia cada vez maior.Sua "sensibilidade romntica anti-capitalista" toma uma
conotao maior em "Macunama". Sobre Macunama, Gilda Mello e Souza afirma,
"Escrito em seis dias de trabalho ininterrupto, durante umas ferias de fim de ano, em
dezembro de 1926;corrigido e aumentado em janeiro 1927;publicado em 1928 -
Macunaima logo se transformou no livro mais importante do nacionalismo modernista
brasileiro.A impresso fulminante de obra-prima, que os companheiros de Mario de
Andrade tiveram na poca ao tomar contato pela primeira vez com o manuscrito,
permanece at hoje, cinquenta anos depois da sua publio".
Sobre a obra geral de M.de Andrade, diz Antonio Candido, em 1946, Tenho a
impresso de que Mario de Andrade ser um dos escritores mais estudados, comentados
e debatidos na nossa futura historia literria. E possvel (assim aconteceu a Machado
de Assis) que apenas trinta ou quarenta anos depois de sua morte consiga a posteridade
tracar-lhe o perfil de maneira mais ou menos satisfatria.
Com efeito, h muitos Mario de Andrade, alm dos conhecidos, que se iro
revelando aos poucos. Entre estes o Correspondente, o homem que escrevia cartas.A sua
correspondncia encher volumes e ser porventura o maior monumento do gnero,
em lngua portuguesa: ter devotos fervorosos e apenas ela permitir uma vista
completa da sua obra e do seu esprito".
Luis Lafeta afirma que "os muitos rumos da obra de Mario constituem sem
duvida um dos motivos da paralisia de nossa critica, que tem esbarrado na sua espantosa
complexidade, at hoje no assimilada de forma completa".
Em Expresso Plstica e Conscincia Nacional na Critica de Mario Andrade,
Jos Augusto Avancini delineou os trs movimentos efetuados por Mario de Andrade
em sua obra. Estes movimentos mostram a unidade do pensamento mariandradiano.Este
aspecto importante,pois a ultima etapa (1935-1945) do autor de Macunama,parece
representar um corte em sua obra,quando,na verdade representa uma articulao dos trs
movimentos feitos por Mario,buscando materializ-los numa prxis cultural.Nesta
etapa,Mario de Andrade esteve engajado em uma experincia poltica concreta: o
Departamento Municipal de Cultura,em SP.
Avancini conclui sua pesquisa afirmando que Ao construir sua viso do
Brasil, Mario executou trs movimentos diferenciados no tempo, mas complementares.
Estes movimentos expressam elementos da sensibilidade romntica anti-
capitalista, sobretudo, a constante barroco-romantica.

1)O primeiro movimento foi o de voltar-se ao passado buscando nossas razes


que foram localizadas por nosso critico no folclore e nas manifestaes populares, mas
com especial ateno quelas ainda ligadas a uma sociedade rural em vias de profundas
transformaes, da a escolha do nicho nordestino como lcus privilegiado do
estudioso...
2)O segundo movimento, complementar ao primeiro, foi o resgate da cultura
barroca...
Esse movimento para o passado deu-lhe conhecimentos que fundamentaram
suas buscas no presente e lhe direcionaram a projeo do futuro. O barroco e o veio
popular foram para ele as bases sobre as quais construiu sua viso do Brasil,auxiliado
pelas cincias da poca,e lhe garantiram um ponto de partida otimista quanto s
possibilidades do Pais.
3) O terceiro movimento foi o de, observando seu presente, e j informado do
passado, posicionar-se quanto aos rumos tomar em seu trabalho artstico e critico. Para
enfrentar a presena,ento avassaladora,da cultura francesa do fim do
sculo,materializada na hegemonia academico-paranasiana,Mario opta por buscar na
cultura alem os subsdios necessrio a uma reao ordenada e consistente que pudesse
fazer frente ao passadismo.No foi a mera contraposio de uma cultura estrangeira a
outra,mas sim a descoberta de profundas afinidades entre o passado barroco,entre certas
formas populares de expresso artstica,com a cultura germnica e em particular com o
movimento expressionista...Mario havia identificado em nosso passado UMA
CONSTANTE BARROCO-ROMANTICA, que permitiu uma aproximao constante
germnica agonistica.

Enfim, Seu ultimo movimento foi o da projeo do futuro que se materializou


numa POLITICA CULTURAL que ganhou consistncia paulatina aps 1935. Alcanou
uma forte dimenso social coma instalao e o funcionamento do Departamento de
Cultura e foi a prova de fogo qual Mario se submeteu, e pela qual foi devorado.
Para Avancini, O estudo da cultura popular, pedra basilar do pensamento de
Mario, possibilitaria um MERGULHO NAS RAIZES nacionais e sua utilizao na
construo da nacionalidade pela cultura e na projeo de um futuro a ser cumprido.
Plano de ao e utopia se imbricam de forma inquestionvel e permanente. E
que,Contudo,o 10 de novembro acelerou a derrocada do Departamento de Cultura e do
projeto modernista de reforma da sociedade a partir das atividades educativo-culturais.A
semente havia sido plantada.Os frutos foram poucos diante dos esforos e projetos
esboados.Mario perdeu a esperana e a vida,e sua utopia acabou
seqestrada,esperando que outros,em tempos posteriores,a resgatassem.

Trs Foguetes nos Cus: Freud, Weber, Marx

Macunama uma obra de 1926, publicada em 1928. Na dcada seguinte, no


Brasil teramos um jorro de obras de carter civilizatorio.Richard Morse, em a
"Formao do latino-americanista", afirma que, "minha proposta, hertica como sempre,
recuar no tempo algumas dcadas para recuperar algumas alternativas formuladas
pelos prprios brasileiros.Refiro-me Ao perodo 1933-1942, durante o qual, como
afirma Antonio Candido em seu prefacio a 5a edio de Razes do Brasil, de Sergio
Buarque de Holanda, trs foguetes iluminaram o horizonte historiogrfico da gerao
pos-modernista que estava chegando a maturidade.".
Morse retraa o itinerrio dos pos-modernistas :

Quando o grupo ainda estava no ginsio, explodiu o primeiro


foguete: Casa Grande& Senzala (1933), de Gilberto Freyre [...]
Quando nosso grupo pos-modernista chegou ao curso
complementar, explodiu o segundo foguete: um livrinho
discreto, com menos apelo direto a imaginao que Casa
Grande. No obstante,Razes do Brasil(1936),de Sergio Buarque
de Holanda...
O terceiro foguete explodiu quando nosso grupo j chegava
faculdade. Em Formao do Brasil Contemporneo(1942),Caio
Prado Jr.

Assim, Do invertebrado subcontinente brasileiro vieram trs livros que


propuseram diagnsticos bem diversos:

1. Em Casa Grande & Senzala (1933), Gilberto Freire


Tornou-se um freudiano por conta prpria em sua investigao
dos arqutipos que governam o comportamento e as instituies;
em seu fascnio pelas questes da etnia, da sexualidade e da
autoridade; e em sua viso inercial do processo histrico. Assim
como Freud tentou normalizar a ideiaideia da
sexualidade,Freyre tentou legitimar a cultura ibria nos trpicos.

2. Num contraste radical, em Formao do Brasil Contemporneo (1942), Caio


Prado Junior
Ps de lado todo e qualquer sentimento de nostalgia por razes
culturais e apresentaram o passado do Brasil como uma funo
de produo, distribuio e consumo. Sua obra pioneira viria
fortalecer o argumento economicista vinte anos depois,mas,na
poca em que foi publicada,deu pouco apoio a busca da
identidade nacional;

3. Em Razes do Brasil (1936), Sergio Buarque de Holanda

Props uma verso dialtica da historia nacional baseada em


construes de inspirao weberiana. Para ele,a diviso bsica
se dava entre as ligaes afetivas e difusas entre as pessoas no
Brasil e os pressupostos jurdicos do liberalismo ocidental que
visam equilibrar de modo amoral os egotismos individuais.A
afetividade ou "cordialidade",ainda que sirva como terapia para
a racionalizao e a despersonalizao,perde forca fora de um
pequeno circulo humano;no pode solidificar formas de
organizao social nem constitui uma fonte confivel de
princpios normativos.

Apesar de todas as suas diferenas, os escritos examinados ate aqui abordavam


a "realidade nacional pressupondo uma relao de tenso entre o legado ibrico e o
Ocidente em geral. A partir deste intercambio entre localismo e universalismo,novas
"identidades"seriam forjadas.
Assim, temos aqui trs abordagens , -freudiana, weberiana e
marxista-, cada uma delas manqu de diversas maneiras (e,
portanto, originais), e todas muito mais ambiciosas do que o que
estava sendo feito nas universidades norte-americanas por volta
de 1940 [...] Observe-se tambm que nenhum membro do nosso
trio historiogrfico tinha formao de historiador[...] A mente
burocrtica anseia por saber o que teria ocorrido com a vida
intelectual brasileira se estes trs intelectuais exemplares
tivessem encontrado -ou fundado- uma instituio espaosa e
barroca o suficiente para abarcar estas trs vises diferentes, trs
perspectivas criticas que no foram expressas como
"influencias, e sim interpretadas e internalizadas.

Para Morse,
A mensagem de Gilberto em pouco tempo seria rejeitada por
motivos extrnsecos. A de Sergio era difcil de entender. E a de
Caio, a mais transparente, logo sairia vencedora: uma viso de
fora das instituies sem maiores preocupaes com a lgica
cultural, e uma viso linear do processo social orientada no
sentido de objetivos e forcas propulsoras. Nesta tradio,
deixam-se de lado as civilizaes enquanto realizaes de
destinos ou manifestaes de vises do mundo. Porem, ela era
bem adequada s obsesses dos anos 60 e 70 com integrao
nacional, industrializao e urbanizao (e no industrialismo e
urbanismo).

Cordial" e "Malandro"

Morse pergunta-se se a insero do Brasil na "diviso internacional de


trabalho levou a uma impregnao ao "racionalismo ocidental"? Pensa que "o Brasil
ainda conserva em parte o "encantamento" weberiano, a "cordialidade" sergiana ou o
"realismo maravilhoso"dos romancistas".
Em suas analise, Morse traz uma contribuio importante para a viso do mundo
com base na "sensibilidade romntica anti-capitalista; ou seja, sua viso do fenmeno
sergiano do "Homem Cordial. Sergio usou um conceito-chave,de origem
weberiana,expresso num termo muito mal compreendido "o "homem cordial"brasileiro.
Como observa Antonio Candido, a cordialidade pressupe no a "bondade, e
sim o comportamento afetivo; ainda que suas manifestaes sejam muitas vezes
insinceras, no se trata de meros rituais de polidez. Ou seja,o homem cordial
visceralmente inadaptado a relaes impessoais ligadas a categoria hierrquica ou a
funo do individuo,em oposio as afinidades que nascem da intimidade dos grupos
primrios.No se est dizendo que o brasileiro conciliador e avesso a violncia,e sim
que,por razoes histricas,a racionalizao ou intelectualizacao da existncia que Weber
denominou ,num sentido estritamente clinico,de "desencantamento"jamais criou razes
mais profundas na civilizao brasileira e jamais poder faz-lo".
Neste sentido, Macunama um "homem cordial" agnico.
Nos anos 70, Antonio Candido desenvolveria essa perspectiva em sua "Dialtica
da Malandragem, analisando a obra "Memrias de um Sargento de Milcias e
assinalando um perfil de carter presente na formao brasileira: de Pedro Malazartes a
Macunama....

Uma Retomada do Modernismo

A partir dos anos 50 o domnio nas cincias sociais ficou com o marxismo
"vulgar e o cientificismo norte-americano. Morse diz que, "Para encontrarmos uma
alternativa ideolgica ao cientismo,voltamos nossa ateno para um quinto momento da
tomada de conscincia,que simultneo ao quarto.Refiro-me a criao literria e
artstica,embora por uma questo de foco eu me limite ao realismo maravilhoso dos
romancistas.Temos de aceitar o fato de que a partir dos anos 60 Carpentier e Garcia
Mrquez tornaram-se mais conhecidos no Ocidente em geral do que Pablo Gonzalez
Casanova e Fernando Henrique Cardoso.Assim conclumos que a mensagem desses
artistas deve ser igualmente importante.O desafio imaginar que transao poderia
ocorrer entre romancistas e cientistas.
No sculo passado, Marx e Engls fizeram questo de admitir o quanto deviam a
Balzac e Dickens; sem os amplos panoramas sociais dos romancistas, a compreenso da
mercantilizacao e reificacao na Europa burguesa e consumista teria ficado muito
empobrecida. Mas o que viu o cientista latino-americano em "Cem Anos de Solido"
alm de um monumento a imaginao latina?
Nos anos 60, "a cincia e o realismo maravilhoso, ambos se tornaram pblicos,
criaram-se papeis estratgicos para inteligncias ambidestrais tais como filsofos,
antroplogos, um poeta-pensador (Octavio Paz), um poeta-economista (Gabriel Zaid) e
um critico literario-sociologo (Antonio Candido). Mais engajada, a dialtica agora nos
impele mais rapidamente, ao mesmo tempo em que permite -mais ainda, exige- uma
retomada do modernismo".
Esttica e Poltica-Macunaima: Um desencontro entre modernismo e
marxismo

No teria sido neste perodo assinalado por Morse, que a esquerda brasileira
perdeu seu "Muiraquita"? E, em seguida, penetrou num labirinto macunaimico? Pois,
em seguida, a hegemonia do marxismo vulgar quase absoluta. Como recuperar aquelas
alternativas? Quais outros foguetes cruzaram nossos cus ? Ser que o labirinto da
esquerda tem o seu fio de Ariadne? Ou ser um labirinto sem muruiquita?
Mario de Andrade, atravs de Macunama parece ser uma esfinge a nos
questionar: como construir um projeto nacional num pais de tamanha complexidade?
Um pais que no um, mas "trezentos, trezentos e cinqenta"?
Contudo, como poderia a esquerda daquela poca ver algo mais em Macunama
do que a "imaginao latino-americana"?
Neste sentido, a observao de Silviano Santiago sobre a repercusso das
primeiras edies de Macunama, torna-se um dado importante. Em "Historia de um
Livro, Santiago descreve a "fortuna critica do livro marioandradiano. Aponta
elementos que fizeram com que a circulao da obra modernista fosse claudicante (
ausncia de edies sucessivas,alta taxa de analfabetismo no pais,etc.) e que no tivesse
um publico.Assim,a primeira edio de Macunama foi de 800 exemplares,custeados
pelo autor,e por uma editora da provncia.Em 1937,a segunda edio com tiragem de
1.000 exemplares (Jose Olympio Editora).A terceira edio,de 1944,traz 3.000
exemplares.Ate 1978,foram 20 edies do livro.
Do ponto de vista da bibliografia critica sobre Macunama, s 27 anos apos a
primeira edio (ie, 1955) ocorre uma mudana qualitativa. Sobretudo,Manoel
C.Proena publica seu "Roteiro de Macunama".
Portanto, como ento, extrair da imagem marioandradiana, uma estratgia
poltica?
E.Lunn,em "Marxismo y Modernismo",estuda as relaes entre "Esttica e
Poltica", traa os mltiplos contornos do encontro politico-estetico entre marxismo e
modernismo na Europa dos anos 20-30. Lun tem por objetivo, entre outros de:

1. Contribuir a um entendimento mais firme do papel central do modernismo


esttico -sua recepo e analise critica- no renascimento de uma teoria dialtica marxista
"ocidental desde os anos vinte;
Para Lunn, a teoria modernista tem elementos que podem ajudar a superao de
alguns problemas marxistas (f dogmtica na inevitabilidade histrica, teoria mecnica
do reflexo, etc.). Lunn conclui que a compreenso do modernismo,passado e
presente,tem muito que ganhar de uma extenso das perspectivas marxistas.
O fundamental que, as contribuies para uma dialtica marxista estavam
presentes em obras do modernismo, contudo nem sempre foram vistas pelos marxistas
da poca. Ao contrario do que ocorreu na Europa,onde as obras de
Lukacs,Bloch,Adorno e Benjamin ,as vezes por caminhos diferentes,enriqueceram as
ideiaideias estticas e culturais do marxismo.
Macunama parece ser um grande exemplo brasileiro do desencontro entre
modernismo e marxismo. Ao passo que outras possibilidades politico-culturais estavam
presentes na obra de M.de Andrade,do lado marxista,seu principal representante
terico,Octavio Brando,desenvolvia em "Agrarismo e Industrialismo"(1925) a viso
etapista impregnada de uma dialtica linear da historia.
Leandro Konder atesta que "A influencia de Octavio Brando sobre os
comunistas brasileiros foi imensa.. Claro que numa situao "marcada pela extrema
fraqueza terica e poltica do marxismo no Brasil".
O que atestado pelo Depoimento de Paulo Emilio:

Havia um outro fato importante.O nvel terico do partido era


muito baixo.A meia dzia,ou pouco mais,de comunistas
brasileiros com uma verdadeira formao terica,pertencia a
gerao anterior e estavam ou afastados da ao ou ento no
campo da oposio de esquerda(trotskista)...Os jovens
intelectuais no encontravam pois,nos meios comunistas com os
quais colaboravam,um estimulo ou orientao nos estudos
tericos srios.

Na poca, apenas Astrojildo Pereira, mesmo no podendo "desenvolver uma


concepo especificamente esttica a partir do marxismo, realizou analises
fundamentais da obra de Machado de Assis. As diferenas de "sensibilidade
esttica"entre Astrojildo e Octavio Brando aparecem claramente nos enfoques
respectivos sobre a obra de Machado de Assis.Enquanto Astrojildo "admirava Machado
de Assis,O.Brando o desprezava e escreveu sobre ele um livro sintomaticamente
intitulado "O Niilista Machado de Assis"(1958),condenando o nosso maior escritor
porque,tendo vivido na poca de Marx e Engls,ignorou os ensinamentos dos
fundadores do "socialismo cientifico".(Konder)
Nos anos 40, a revista "Literatura (1946-1948), dirigida por Astrojildo Pereira,
abordava o Modernismo como "um trotsquismo literrio e gramatical. Em "O post-
modernismo",Nelson Werneck Sodr (que escreveria uma obra intitulada "Fundamentos
de uma Esttica Marxista") avalia o movimento de 1922,mais pelo que denunciou do
que pelo que trouxe em si mesmo...afirmando que: "A literatura Brasileira comea em
1930 - tudo o que ficou para trs uma espcie de proto-histria, confusa, desordenada
com valores isolados, a que necessrio recorrer, sem duvida, mas que, em conjunto,
muito pouco representa... "(Raul Antelo)
Sodr, em sua Historia da Literatura Brasileira, seus fundamentos
econmicos, apresenta a viso dualista do Brasil feudal-capitalista corroborando o
reformismo desenvolvimentista. Antelo salienta que ,na primeira edio de sua obra
sobre a literatura ( 1938),no que diz respeito ao modernismo,Sodr no menciona sequer
a figura de Mario de Andrade! Contudo, nos anos 50 Sodr aprofunda seus estudos de
literatura marxista e reformula suas posies. Leandro Konder salienta que "na terceira
edio...lanada em 1960,o autor no s se apia em Marx como tambm pioneiramente
no Brasil,se serve das teorias do marxista hngaro George Lukacs...".
Raul Antelo, em "Literatura em Revista", marca a presena de Guerreiro Ramos
como estudioso do "fenmeno literrio, "na trilha de Mariategui e Henrquez Urena;
inclusive, "no dista muito das formulaes que Antonio Candido estabelece em sua
Formao da Literatura Brasileira, obra redigida pouco mais tarde, entre 1945 e 1951".
Antelo nos fala de outro critico, "No se tem destacado suficientemente o
pioneirismo e a acuidade de Carrera Guerra (Emilio) no debate estetico-ideologico. o
primeiro a estudar a obra de Maiakovski em profundidade, e cabe-lhe idntico papel de
descoberta em relao obra de Gramsci, em plena dcada de 40. Sua teoria esttica,
contudo, revela a leitura atenta de outras fontes: Marx, Ingls, Lefebvre, Bachelard,
Christopher Caudwell, parecendo pouco provvel que desconhecesse Lukacs e Della
Volpe".
No Brasil, a critica da arte nem sempre esteve relacionada s questes da
esttica, sendo mais uma sociologia da literatura. O critico Mario Barata pe as
questes,

A critica de arte brasileira tem estado mais ligada ao


corporativismo formalista ou as leis intrnsecas da forma e da
percepo visual e,em alguns casos,a uma mistura dois dois
referidos sistemas bsicos com a literatura,...do que a Esttica
.Todavia,um elemento subjacente de posio esttica inerente
a boa critica de arte.E Luis Washington Vita anotou a presena
desta em seu livrinho sobre a esttica no Brasil,mostrando a
contribuio de Mario de Andrade,Sergio Milliet,Mario Pedrosa
e Ferreira Gullar,neste terreno.

Contudo, no perodo que A.Candido assinala como de forte disputa de


hegemonia cultural no Brasil, em que a "cultura deixou de ser a cultura burguesa, a
esttica assumiu um papel predominante no marxismo. M.Barata assinala que

No inicio dos anos 60 acumularam-se condies para um


desenvolvimento mais profundo do interesse pelos problemas da
esttica. Apos episdios fragmentrios da dcada anterior...
havia, em plano mais generalizado,suscitado discusses sobre
juzos de valor e conceituao de critica,surge com Leandro
Konder, Carlos Nelson Coutinho e Jose Guilherme Merquior -
ligados os dois primeiros a "Civilizao Brasileira"- e com
planejamento editorial de Jorge Zahar,um surto de livros sobre o
fenmeno artstico e a sociologia da arte,de grande amplitude
como desafio cultural...Sem duvidas,toda uma gerao iria
comear o estudo do marxismo pelo vis da esttica,com as
obras de Gramsci,Lukacs,Ernst Fischer,Adorno,Benjamin,entre
outros.

Por fim, escrevendo em 1970, Barata diz que "as condies gerais da vida
intelectual brasileira faziam arrefecer, no final da dcada, as possibilidades de suficiente
repercusso desses livros, certo retrocesso das atividades culturais e de seu livre
exerccio e expanso est impedindo uma colheita proveitosa do espao feito no
decorrer da dcada, no terreno dos estudos estticos".

Mario de Andrade e o Espirito Romantico Revolucionario

Em vrios ensaios de sua vasta obra, M.de Andrade abordou o tema do


romantismo. Por exemplo,na sua "Pequena Historia da Musica"(1944),no capitulo
"Romantismo" o poeta analisa o fenmeno do romantismo numa perspectiva histrica,a
partir da evoluo da "musica artstica profana",originada do canto popular e que fora
gradativamente se aristocratizando,se divorciando do esprito do povo."Chegou assim a
se transformar em manifestao orgulhosamente aristocrtica,com a musica pura,dos
clssicos".
Para Mario de Andrade,

Se tornou por isso a reproduo artstica talvez mais fiel do


esprito poltico do sculo XVIII (...) contra esse estado de
esprito, absolutamente desumano, do sculo XVII, contra essa
espcie de transformao organizada do diletantismo pra dentro
da vida social, verdadeira socializao do diletantismo: as
reaes principiaram aparecendo pouco a pouco. Orientada em
Franca pelo movimento filosfico dos Enciclopedistas, tivera a
sua exploso concreta na Revoluo Francesa (1789) que
modificou o mundo.

Prossegue Mario, "Transformou-se muito a sensibilidade social, e essa


transformao consistiu fundamentalmente na troca do esprito aristocrtico anterior
pelo esprito popular. Criou-se um novo estado de coisas geral que batizaram com a
palavra Romantismo".
O poeta da "Paulicia Desvairada" assinala a existncia de todo um perodo
transitrio mais ou menos de 1790 a 1830, em que os sintomas romnticos foram
aparecendo e se fortificando com certos movimentos e certas personalidades de
esprito romntico. Portanto, a caracterizao de Mario de Andrade do romantismo,
porta todas as caractersticas das mutaes que assinalam uma nova "viso de mundo
ou uma "estrutura de sentimentos".
Mario usava os termos "sensibilidade, "esprito" e, assinala o carter de ruptura
do romantismo, associando-o `as grandes mudanas polticas e scias.
Em "Romantismo Musical",ensaio de "O Baile das Quatro Artes (1943),define
que

O romantismo,ou milhor,a forma social de que ele uma


expresso, realmente um fenmeno de conseqncias to
profundas para a musicalidade ocidental,que se pode falar
que,dentro do Cristianismo,a musica sempre evolucionou por
construo,ao passo que no Romantismo ela s pode se expandir
por destruio.

O autor de "Macunama" associa o romantismo ao "potico:

nos romnticos que a gente vai encontrar a larga esse potico


musical, essa aura divagante e indefinvel... esse valor que
encontramos com tanta freqncia nas criaes dos artistas que
independem da tcnica, os primitivos em geral, os desenhos de
crianas, os poemas os loucos: um profundo saber evocativo.
Para Mario, o romantismo toma a feio de uma sensibilidade romntica, uma
estrutura de sentimento. Aqui,torna-se importante uma breve divagao sobre esse
conceito na obra de Raymond Williams.Em "Marxismo e Literatura",Williams trabalha
com uma categoria fundamental,"estrutura de sentimento".
O critico Fred Pfeil define:

My use of the term structure of feeling is intended to indicate


precisely such a methodological shift,from the study of fixed
and formal internal relations and genealogies to a more
fluid,shifiting social analyses.The term,of course,is Raymond
William"s attempt to do conceptual justice to any set of
circunstances resembling the cultural situation we now face,that
is,the consolidadet emergence of the distinctly new,in both
social life in general and esthetic in particular.

Reconhece Williams:

A mais forte barreira ao reconhecimento da atividade cultural


humana a transformao imediata e regular da experincia em
produtos acabados... A analise se concretiza ento nas relaes
entre essas instituies produzidas, formaes e experincias, de
modo que agora, como naquele passado produzido, somente
formas fixas explicitas existem, e a presena viva se est,
sempre, por definio, afastando... E, ento, se o social fixo e
explicito - as relaes, instituies, formaes, posies
conhecidas-tudo o que est presente e se move, tudo o que escapa
ou parece escapar ao fixo, explicito e conhecido,
compreendido e definido como o pessoal: este, aqui, agora, vivo
ativo, subjetivo".

R.Williams acha na tendncia dominante do marxismo, com seu abuso


habitual do subjetivo e do pessoal.
No obstante, a reduo do social a formas fixas que continua
sendo o erro bsico [...] As formas sociais so, evidentemente,
mais reconhecveis quando so articuladas e explicitas... A
conscincia pratica quase sempre diferente da conscincia
oficial, e isso no apenas uma questo de liberdade relativa ou
controle. A conscincia pratica aquilo que est sendo
realmente vivido, e no apenas aquilo que acreditamos estar
sendo vivido. No obstante, a alternativa real as formas fixas
recebidas e produzidas no o silencio, no a ausncia, o
inconsciente que a cultura burguesa mitificou. um tipo de
sentimento e pensamento que realmente social e material, mas
em fases embrionias, antes de se tornar uma troca plenamente
articulada e definida... Tipos semelhantes de modificaes
podem ser observados nas maneiras, roupas, construes e
outras formas da vida social... So sociais sob dois aspectos que
as distinguem dos sentidos limitados do social como o
institucional e o formal:

-primeiro, pelo fato de serem modificaes de presena


(enquanto est sendo vivida, isso obvio; quando j foram
vividas, essa ainda sua caracterstica substancial);
-segundo, pelo fato de que embora sejam emergentes ou pre-
emergentes, no tm de esperar definio, classificao ou
racionalizao antes de exercerem presses palpveis e fixarem
limites efetivos a experincia e a ao.

Tais modificaes podem ser definidas como modificaes nas estruturas de


sentimento..
R.Williams define, metodologicamente: "portanto, uma estrutura de sentimento
uma hiptese cultural, derivada na pratica de tentativas de compreender esses
elementos e suas ligaes, numa gerao ou perodo, e que deve sempre retornar,
interativamente, a essa evidencia".

O Esprito Revolucionrio Romntico

Em seus vrios escritos sobre musica, Mario de Andrade abordou o fenmeno


do romantismo. Contudo, no famoso ensaio auto-critico sobre "O Movimento
Modernista" que Mario explicita o romantismo como "viso de mundo"e sua relao
com o Modernismo e as vanguardas artsticas.
Na parte sobre a "conquista do direito permanente de pesquisa esttica, Mario
analisa "os espritos coloniais; O problema no complexo, mas seria longo discuti-lo
aqui. Limitarei-me a propor o dado principal. Nos tivemos no Brasil um
MOVIMENTO ESPIRITUAL (no falo apenas escola de arte) que foi absolutamente
"necessrio, o Romantismo. INSISTO: no me referi apenas ao romantismo literrio,
to acadmico como a importao inicial do modernismo artstico, e que se pode
comodamente datar de Domingos Jose Gonalves de Magalhaes, como o nosso do
expressionismo de Anita Malfatti. Me refiro ao "ESPIRITO ROMANTICO",ao
ESPIRITO REVOLUCIONARIO ROMANTICO,que est na Inconfidncia,no Baslio
da Gama do "Uraguai" nas liras de Gonzaga como nas "Cartas Chilenas"de quem os
senhores quiserem".
Mario aponta as "afinidades ("similaridades") do esprito romntico com o
esprito do modernismo. "Este esprito preparou o estado revolucionrio de que resultou
a independncia poltica,e teve como padro bem briguento a primeira tentativa de
Lngua brasileira"."O esprito revolucionrio modernista,preparou o estado
revolucionrio de 30 em diante,e tambm teve
como padro barulhento a segunda tentativa de nacionalizao da linguagem.A
similaridade muito forte".
Ele afirma a relao entre os fenmenos revolucionrios (romantismo e
modernismo) com profundas mudanas poltico-sociais e culturais. Da mesma
forma,identifica os movimentos acadmicos com o conservadorismo das "revolues
passivas".
Por fim, assinala as "afinidades desses movimentos revolucionrios com as
vanguardas artsticas do inicio do sculo.
Esta necessidade espiritual, que ultrapassa a literatura esttica,
que diferencia fundamentalmente Romantismo e Modernismo,
das outras escolas de arte brasileiras. Estas foram todas
essencialmente acadmicas, obedincias culturalistas que
denunciavam muito bem o colonialismo da Inteligncia
nacional. Nada mais absurdamente imitativo (pois si nem era
imitao, era escravido!) que a copia, no Brasil, de movimentos
estticos particulares, que de forma alguma eram universais,
como o culteranismo italo-iberico setecentista, como o
Parnasianismo, como o Simbolismo, como o Impressionismo,
ou como o Wagnerismo de um Leopoldo Miguez. So
superfetaes culturalistas, impostas de cima para baixo, de
proprietrio a propriedade, sem o menor fundamento nas forcas
populares. Da uma base desumana, prepotente e, meu Deus!
Arianizante que,si prova o imperialismo dos que com ela
dominavam, prova a sujeio dos que com ela eram dominados.
Ora aquela base humana e popular das pesquisas estticas
faclimo encontrar no Romantismo, que chegou mesmo a
retornar coletivamente as fontes do povo e, a bem dizer, criou a
cincia do folclore. E mesmo em lembrar folclore, no verso-
livre, no cubismo, no atonalismo, no predomnio do ritmo, no
super-realismo mtico, no expressionismo, iremos encontrar
essas mesmas bases populares e humanas. E at primitivas,
como a arte negra que influiu na inveno e na temtica cubista.

Respondendo a um critico que afirmava no existir uma esttica modernista,


Mario dizia que [...] essa a milhor razao-de-ser do Modernismo! Ele no era uma
esttica, nem na Europa nem aqui. Era um estado de esprito revoltado e
revolucionrio[...]".
Mario desenvolveu uma teoria esttica provocante, embora utpica, na tentativa
de conceituar o "fator nacional" em toda sua complexidade, diz-nos Joan Dassin em seu
estudo sobre o poeta paulista. Dassin define sua fascinao por Mario devido a que nos
EUA no h "nenhum artista e pensador que fosse responsvel por tantas facetas da
experincia nacional".

Macunama: Me do Mato x Maquina

Carlos Berriel foi o primeiro a usar a expresso de "anticapitalismo romntico"


em relao a Macunama. Porem,sem captar o seu aspecto revolucionrio;entendeu a
obra como de "natureza anti-fabril" e de acordo com os interesses e ideiaideias da
oligarquia cafeeira.
Em sua analise da disputa no Capitulo X, de Macunama, Barriel assinala que
trava-se uma disputa entre duas formas de explicao: a mtica, defendida por
Macunama, e a, por assim dizer, "civilizada", defendida pelo mulato. Macunama,
resgatando a explicao mitolgica para os paulistas reunidos no embate, refaz a
unidade posta a perder pela civilizao da Maquina."
Na parte final do livro andradiano, Macunama afirma: "no vim no mundo para
ser pedra. Para Barriel, "Esta frase, quase um epitfio, a nica inteiramente em
maiscula do romance, e uma chave: a transformao em pedra, que a morte pela
civilizao (a semelhana do pensamento histrico de Oswald Splenger), Macunama
prefere viver como tradio".
Assim, Macunama possivelmente a primeira expresso articulada de uma
viso de mundo romntica anti-capitalista no Brasil. Prossigamos com a analise de
Barriel: "Notemos o seguinte: a segunda vez em que foi possvel detectar uma
oposio entre manifestaes de arcasmo versus manifestaes de configurao
burguesa desenvolvida. E ainda com a positividade incidindo sobre o plo pre-
capitalista da relao. Prossegue Berriel:

A primeira, quando Macunama somente pleno na


circunstancia da vida na mata - virgem, e quando passa para o
presente temporal da industrializao brasileira encontra a sua
desintegrao como heri; [...] A segunda, quando Mario de
Andrade opta pelo gnero pre-burgues do romance folclrico.
Note-se, portanto, a coerncia formal da obra.
Enfim:

Esta dupla recusa de objetivaes capitalistas expressa uma


rejeio da prpria sociedade burguesa, ainda que na forma
similar a um ANTICAPITALISMO ROMANTICO, como
Mario de Andrade a pratica. O seu poema "Ode ao Burgus",
lido na Semana de Arte Moderna, pode ser examinado nesta
tica.

Para Berriel, Macunama no pode ser um heri pico:

Alem do texto no se constituir como poema, temos que o


combate de Macunama (pela recuperao da muiraquita) no
um combate da sociedade, mas contra ela. Seria um combate da
sociedade se tomarmos como tal o mundo mtico de onde a
personagem saiu que o mundo dos "matos misteriosos", das
amazonas, dos seres da mitologia indgena e cabocla. Este o
universo que fascina Mario de Andrade, que o tornou folclorista,
e que fornece a ela a referencia de uma sociabilidade sem
diviso social do trabalho e sem os obices humanos do
capitalismo verdadeiro. [grifo nosso]

Para Barriel, Mas este universo mtico de onde Macunama extrado apenas
um constructo erudito a partir da cultura popular, numa operao tipicamente
romntica. Mas tambm o material especifico do ANTICAPITALISMO DE MARIO
DE ANDRADE'.
Prossegue nosso autor,

A dicotomia entre Mato-Virgem orgnico, mgico, e a cidade


ptrea, mortificadora (apenas uma realidade do mundo), a
bem dizer a verdadeira oposio desta obra. So dois cenrios, o
primeiro figurado pela Me do Mato, e o segundo pela
Maquina... Quando Mario de Andrade vacila entre os gneros,
na dana entre romance folclrico e romance moderno, permite-
nos supor que, na verdade, opera-se a no aceitao de um
"capitalismo verdadeiro"para o Brasil, entendido como tal uma
sociedade antagonizada essencialmente entre burgueses e
proletrios, com uma intensa diviso social do trabalho, regida
contratualmente em detrimento dos direitos do costume e da
tradio, societria em vez de comunitria, tendente Ao urbano
em detrimento do rural, e acima de tudo industrializada.

Conclui Barriel que "Na sua viso culturalista da realidade social, Mario de
Andrade entendia que tal forma de vida social no Brasil equivalia liquidao das
possibilidades nacionais de virmos a constituir uma civilizao prpria, autnoma e
original, construda a partir dos elementos da cultura popular".
Diz-nos Mario de Andrade:

Quando, mesmo que aproveitemos da civilizao europia


algumas das suas verdades praticas o que tnhamos e talvez
tenhamos de fazer, criar uma civilizao menos orientada pelo
nosso homem, que pela nossa geografia. Uma civilizao que
sem ser indiana, chim (dar exemplo de civilizao negro-
africana), egpcia, ou incaica, se orientaria pelas linhas matrizes
destas civilizaes antigas, ou pseudo-antigas. Muito menos
economista, muito menos pratica baseada em espiritualismo
exasperado, extasiante, riqussimo em manifestaes luxuriosas
de arte e religio, filosofia eminentemente mstica, concepo
despreziva da vida pratica (...) Tudo isso so sonhos, eu sei.

Arremata Barriel:

Todas estas manifestaes expressam de um modo ou de outro,


mas sempre claramente, a rejeio dos componentes da
sociabilidade capitalista plenamente configurada. E, mais do que
tudo, os elementos indicativos de rejeio da sociabilidade
burguesa so, decisivamente, elementos constituidores da
estrutura formal e conteudistica de Macunama.

Primitivo e Contemporneo: a utopia do bumba-meu-boi

Em termos de anlise, se bem que no usando a expresso "anti-capitalismo


romntico, foi Gilda Mello Souza quem apontou a sensibilidade marioandradiana de
critica da civilizao industrial.
Macunama foi a primeira grande expresso da critica social da modernidade
no Brasil; uma critica nos moldes de uma viso anti-capitalista romntica e
revolucionaria. Seu ncleo central porta tenses dialticas, como:universal e nacional,
velho e novo, antigo e moderno, entre outras.
Em seu "O Tupi e o Alade, Gilda Mello Souza, assinala uma destas tenses:

[...] se a exclamao AI QUE PREGUICA! Exprimia o desejo


ancestral de se ver reincorporado ao mbito do Uraricoera e da
muiraquita -a tudo aquilo,enfim,que nos definia como diferena
em relao Europa-, a metonmia germinada ( Ou o Brasil
acaba com a sava ou a sava acaba com o Brasil") instalava no
discurso a exigncia de uma escolha,que s podia ser feita do
lado dos valores ocidentais do trabalho.Os dois dsticos
resumiam,por conseguinte,as contradies inslitas espalhadas
pela narrativa, tenso entre o principio de prazer e o principio
de realidade.

Sem duvidas, uma tenso dialtica caracterstica da viso de mundo da


sensibilidade romntica anti-capitalista.
Prossegue nossa autora, ... entre a tendncia espontnea a mergulhar no repouso
integral do mundo inorgnico, no Nirvana, e o esforo de obedecer aos imperativos da
realidade, da luta pela existncia, das restries e das renuncias, que caracterizam a
civilizao e o progresso, simbolizados em Prometeu".
Podemos afirmar nos passos de Gilda Mello Souza, que grande utopia em
Macunama "a embrulhada geogrfica proposital" de M.de Andrade. Isto ,"criar uma
espcie de geografia,fauna e flora lendrias que,libertando-se das contingncias
regionais,funcionasse como um elemento unificador da grande ptria to
despatriada..".Para Gilda,os percursos do heri no seguem a lgica dos roteiros
possveis,inventam em contrapartida um itinerrio fantstico,uma espcie de utopia
geogrfica,que corrige o grande isolamento em que os brasileiros vivem,substituindo-o
pelo elo fraterno da vizinhana...a projeo de um desejo profundo do
escritor,manifestado em outros momentos de sua obra: desejo de estabelecer a
identidade entre o habitante rico do sul e o pobre seringueiro do norte,entre as cidades
prosperas e superpovoadas do litoral e o vasto interior,onde ainda a pobreza reina,a
incultura e o deserto".
A utopia marioandradiana porta afinidades com o que Ernst Bloch chamou de
"dialtica do no-contemporaneo (UNGLEICHZEITIGKEIT), ou "a-sincronismo sem
significar anacronismo". No "filosofo da utopia",esse conceito expressa o carter
desigual do desenvolvimento e a no-correspondencia mecnica e imediata entre a
estrutura econmica e os vrios segmentos da superestrutura.
Bloch analisa a dialtica dos desnveis espaciais e temporais: todos vivem no
mesmo tempo cronolgico e na superfcie do mesmo planeta. Mas o tempo e o espao
no so homogneos,iguais para todos.Diversos tempos histricos se condensam e se
inter-relacionam a cada ano e ns somos dispersos,distribudos nestes espaos/tempos
diferentes".
E, assim, "Macunama tanto pode ser o retrato do homem brasileiro, como do
venezuelano (sul-americano) ou do homem moderno universal.

Uma dialtica poliritmica

Numa viso critica da concepo triunfalista, linear e indiferenciada do


progresso, Ernst Bloch, nas pegadas de Walter Benjamin, prope uma dialtica
revolucionaria com vrios fragmentos e muitos ritmos, ou musicalmente, uma dialtica
poliritmica, um contraponto de tempos diversos.
Talvez, dai resulte o carter de "rapsdia de Macunama. Na convico de
Gilda Mello Souza, para quem " no processo criador da musica popular que se deve a
meu ver procurar o modelo compositivo de Macunama".Mario utilizou a conjugao do
"principio rapsodico da sute -cujo exemplo popular mais perfeito podia ser encontrado
no bailado nordestino do Bumba-meu-Boi- e a que se baseia no principio da
variao,presente no improviso do cantador nordestino...".
sintomtico que a sute como processo rapsodico "foi muito difundido no
Romantismo e entre ns tornou-se como que um habito nacional... So formas primarias
de sute todas as nossas principais danas dramticas: os fandangos do sul paulista, os
caterets do Centro brasileiro e no Nordeste os caboclinhos, os cortejos semi-
carnavalescos dos Maracatus, as cheganas e reisados".
A designao do livro de "rapsdia mostra que o autor retomou o processo com
positivo da musica popular. "Esse processo de construir por oposio
discricionria,culmina na forma atual de certas verses principalmente pernambucanas
do Bumba-meu-Boi".
Sobre as afinidades entre Macunama e o Bumba-meu-Boi, Gilda M.Souza
declara:

Quero apenas assinalar que a coincidncia da forma rapsdia


dos dois no ocasional, e que provavelmente Mario de
Andrade quis sugerir, por intermdio das afinidades estruturais,
a identificao entre o livro e o bailado popular que, a seu ver,
melhor representava a nacionalidade. A escolha do Bumba-meu-
boi como modelo, ou melhor,como referencia,tinha uma
inteno ideolgica e se ligava ao complexo sistema de sinais
com que o escritor se habituara a pensar no s a realidade do
seu pais, mas a sua realidade pessoal.
Para Gilda Souza,como no "momento agnico de tirar o canto" dos cantadores
do Nordeste, "Macunama representava esse percurso atormentado,feito de muitas
duvidas e poucas certezas". Podemos dizer que o universo de Macunaima o de "um
mundo sem Deus",do "Deus oculto" , em que apostamos sempre na coexistencia de
possibilidades de vitorias e derrotas.
Na utopia de Mario, prevalece
a indeterminao temporal da rapsdia brasileira... substitui o
conceito de vir-a-ser pela categoria temporal essencial da
coexistncia. Todos coexistem no mesmo tempo homogneo,
sem passado ou futuro, sem diviso de horas separando o
trabalho do cio, sem perodos de apogeu que contrastem com
as pocas de decadncia. O tempo primordial destruiu as
contradies e restabeleceu a justia, nivelando os momentos de
penria a abastana, a civilizao tcnica do Sul a cultura
agrria e arcaica do Nordeste.

A Revoluo Cultural

Em seus ensaios dos anos 60, Mario Pedrosa afirmava, deduz-se de tudo o que
primitivo ou elementar tambm pode ser contemporneo. Contemporneo e
primitivo-brasileiro. O mundo planetrio aberto dos astronautas e o mundo imenso dos
subdesenvolvidos do hemisfrio sul so contemporneos e contraditrios, como o Brasil
por sua vez em face do mundo. O Brasil ao mesmo tempo um anacronismo e uma
promessa. Para certos artistas, a tarefa contempornea consiste em expressar esse
anacronismo, como se se tratasse de uma operao de catarse, para segui-la subsumi-lo
ao universal.
Outros porem, partindo do universal contemporneo implcito na promessa
aceitam, j agora, no seu trabalho criativo, o condicionamento de amanha e no o
condicionamento de ontem.
Prossegue Pedrosa:

A distancia de pontos de partida entre um Francisco Brenand e


mesmo um Rubem Valentim e Ligia Clark ou Helio Oiticica
grande. Mas que h entre eles de comum, alm do fato cultural e
moral de serem brasileiros? A autenticidade de uma vivencia
pessoal por que responde a prpria obra? Antes
responsabilidade por uma ideiaideia ou uma atitude que, se se
mantm se desenvolve e os caracteriza atravs do trabalho
criativo, no veio e fora, por acaso ou por moda, mas brotou
neles do complexo socio-economico-cultural-moral-artistico,
onde se situam, onde vivem, trabalham Recife ou Salvador, So
Paulo, Rio de Janeiro, Brasil... e inevitavelmente o planeta.

Mario Pedrosa via a utopia se concretizar culturalmente, O Brasil artstico


cultural tende, com efeito, a ser cada vez menos um mosaico de regies para ser um
todo cultural, um complexo nacional vivo em formao. Ter sido o Cinema Novo o
acelerador desta integrao de sensibilidade e modos de imagstica atravs de "Vidas
Secas, "Deus e o Diabo, "Porto das Caixas, "O Padre e a Moca", e outros filmes dos
mesmos e de outros diretores do Norte ao Sul do pais, alcanando seu desenlace
emocional unitrio no canto pico de "Vida e Morte Severina"?
Por sua vez, Paulo Emilio definia o Cinema Novo, " parte de uma corrente
mais larga e profunda que se exprime igualmente atravs da musica, do teatro, das
cincias sociais e da literatura. Essa corrente... foi por sua vez a expresso cultural mais
requintada de um amplssimo fenmeno histrico nacional".
O critico norte-americano, Fredrik Jameson relaciona "ungleichzeitigkeit" com
"revoluo cultural, ou seja,

[...] aquele momento em que a coexistncia de vrios modos de


produo torna-se visivelmente antagnica, com suas
contradies orientando-se para o prprio centro da vida
poltica, social e histrica... o conceito de revoluo cultural (...)
pode ento projetar todo um novo quadro para as humanidades,
em que o estudo da cultura, em seu mais amplo sentido, possa
ser assentado em uma base materialista.

Gilda M.Souza, aponta em Mario de Andrade a viso intuitiva, captada pelo


meio da esttica, desta "coexistncia de vrios modos de produo. "Segundo Mario de
Andrade,as naes novas como o Brasil,cuja cultura em formao apresenta grande
variedade de componentes,herdados de fontes muito dispares,tm dificuldade de forjar
uma musica popular nacional bem diferenciada".
Aqui, a imagem esttica traduz a sua maneira o que pode ser uma viso de
estratgia poltica: qual dialtica social domina em uma situao de tal complexidade e,
em paises "novos"? Qual concepo de tempos e de transformao social? Voltaremos a
esta questo, ao abordamos as afinidades entre M.de Andrade e W.Benjamin.
F. Jameson recorre a Bloch, "Pode-se afirmar que a revoluo cultural assim
concebida est alm da oposio entre sincronia e diacronia, e corresponde, grosso
modo, ao que Ernst Bloch chamou de Ungleichzeittigkeit (ou "desenvolvimento no
sincrnico") da vida cultural e social. Ou, a noo de texto como "unidade sincrnica
de elementos estruturalmente contraditrios ou heterogneos,de padres e discursos
genricos ( que podemos chamar,seguindo Ernst Bloch,de Ungleichzeitgkeit ou
"desenvolvimento desigual"sincrnico dentro de uma estrutura textual)...
Concluindo, podemos afirmar com Gilda M.Souza que Macunama representa,
pois, uma meditao extremamente complexa sobre o Brasil... A lucidez da analise
satiriza um estado de coisas, mas no aponta uma soluo. No final de um dos
prefcios, Mario de Andrade sublinha o aspecto sem compromisso do livro, que a seu
ver caracterstico das pocas de transio social, que no desejam a volta do passado,
no sabem o que tem de vir e sentem o presente "como uma neblina vasta".
Gilda M. Souza no aceita a leitura do livro como afirmativa, como "devoracao
acritica dos valores europeus pela vitalidade da cultura brasileira; A leitura que nos
prope distinta: "retoma a indicao pessimista de Mario de Andrade, de que a obra
ambivalente e indeterminada, sendo antes o campo aberto e nevoento de um debate, que
o marco definitivo de uma certeza".
Sem duvidas, um livro essencialmente mariateguiano, isto e, "agnico".

Lampeo, Macunama do Serto

Avancini destacou que ao

Construir sua viso do Brasil,Mario executou trs movimentos


diferenciados no tempo mas complementares. O primeiro
movimento foi o de voltar-se ao passado buscando nossas razes
que foram localizadas por nosso critico no folclore e
manifestaes populares urbanas, mas com especial ateno
quelas ligadas a uuma sociedade rural em vias de profundas
transformaes, da a escolha do nicho nordestino como lcus
privilegiado do estudioso [grifos nossos].

Nesta perspectiva insere-se a atrao que o Cangao, atravs do


ROMANCEIRO DE LAMPEO, exerceu sobre nosso poeta.
Em O BAILE DAS QUATRO ARTES, Mario de Andrade tem um capitulo
sobre este fenmeno. O texto data de 1932, publicado na Revista Nova, de So Paulo
sob o pseudnimo de Leocadio Pereira. A data e muito importante, se pensarmos que o
rei do cangao foi assassinado em 1937.
A preocupao com o campo, com as razes rurais, as lutas religiosas e
messinicas, uma caracterstica do romantismo revolucionrio.
Mario capta o elemento essencial do Romance do cangao:

curioso gente notar que no geral o que interessa os


cantadores so as lutas de Lampeao com a policia, as mortes
descritas simplesmente, ou ento o que liga Lampeao com a
lenda (...) se percebe desde logo que um pudor, ou milhor, certo
lado grego destes rapsodos nordestinos faz eles se
desinteressarem dos casos de sexualidade, e se preocuparem
mais com as lutas e as grandes linhas trgicas em que o Fado
dum heri tem uma finalidade mais social, mais coletiva [...]

Mario fala do cantador nordestino, de suas duas formas de poesia cantada: o


Desafio, a estrutura meldica da rapsdia, como vimos em Macunama e, o Romance.
Se o primeiro e a forma dialogada,do improviso,mas,tambm com versos e frases
extradas,decoradas,do romanceiro ordestino,do cordel. O Romance, por sua vez, e a
forma solista por excelencia, poesia historiada, relatando fatos do dia.
Mario fala do ciclo do romance do cangao e, prev que Lampiao ir suceder e
superar a Antonio Silvino, na poca o cangaceiro mais falado no cordel. Mario cita a
obra de Gustavo barroso,Almas de Lama e de Ao, em que se fala apenas de um
romance sobre Virgulino Lampiao.Mario analisa vrios romances sobre lampiao,sendo
que para cada um ,tece comentrios muito importantes,traando uma verdadeira
biografia do rei do cangao.
Do Romance annimo, HISTORIA DO CAPITAO LAMPIAO, Mario fala da
parte sobre o fechamento de corpo de lampiao.
Vejamos os comentrios de Mario: o encontro de maravilhas como essas que
compensam o estudo da literatura de cordel, mas o exmio colocador de pronomes
desse romance, produziu realmente uma peca interessantssima pelos assuntos
tradicionais com que bordou a sua historia. Nele vm descrio de indivduos
faanhudos to peculiar aos desafios nordestinos; a luta de lampeao com o Diabo, mito
de Orfeu to universalizado e que absolutamente geral na tradio dos cantadores
nordestinos; e a descrio do Marco de lampeao, a sua fortaleza, tradio
singularssima, que tem dado ao romanceiro nordestino alguns dos seus romances mais
notveis como riqueza de inveno.
Lampeao mesmo escapou por milagre. E corre de fato por todo o Nordeste que
ele tem forca fabulosa de feitiaria,voa,tem dom de invisibilidade e de se transportar
num segundo a regies distancissimas.Porem o fim dele j se sabe qual ,

Vai se dar com Lampeao


O que se deu com Silvino

Vemos que a profecia do poeta nordestino no se concretizou, pois, se Antonio


Silvino hoje est na priso, mansinho como um cordeiro. Lampeao encontrou sina
mais trgica!

Mario de Andrade e Walter Benjamin: Imagem e Estratgia

Por fim, o que parece ser apenas uma divagao esttica, tem relaes
profundas com as questes de estratgia poltica. Neste sentido,vejamos um paralelo
entre W.Benjamin e L.Trotsky,que nos remete ao autor de Macunama.
Terry Eagleton em sua obra "W.Benjamin, or Towards a Revolutionary
Criticism, traa afinidades importantes e surpreendentes entre o autor de "Paris, Capital
do Sculo XIX e o autor de "Literatura e Revoluo":

Walter Benjamin e Leon Trotsky revelam um campo de


paralelismos que deve ser seriamente estudado... A viso
poltica dos dois foi em muitos aspectos idntica. Ambos se
opuseram a insanidade ultra-esquerdista do Terceiro Perodo...
ambos, igualmente, rejeitaram a alternativa ilusria da social-
democracia... A concepo de luta antifascista da Frente Popular
contra a qual Trotsky no parou de polemizar foi muito bem
caracterizada por Benjamin como iluses da esquerda sobre o
"progresso e de alianas com a cultura tradicional. A
concepo da historia como uma progresso triunfal de tesouros
culturais, odiada por Benjamin, um trao da Frente Popular.

No seu exlio parisiense, entre 1934 e 1938, Benjamin escreveu "Paris Capital
do Sculo XIX, onde expressa sua viso critica a poltica da Frente Popular Francesa,
sobretudo, em suas "Teses sobre o Conceito de Historia". Para Eagleton, "no campo da
revoluo cultural, Trotsky e Benjamin concordavam [...] ambos rejeitavam a
Proletkult; ambos aceitaram as descobertas de Freud e se aliaram com os surrealistas
[...]. Contudo o mais surpreendente paralelo traado pelo critico ingls,refere-se a outro
aspecto:
William Blake, escrevendo antes da emergncia do materialismo
histrico, fez a critica do capitalismo industrial em termos
teolgicos... Benjamin pode progredir tambm pelo lado
idealista: igual a seu grande mentor, George Lukacs, ele junta os
recursos ambivalentes do idealismo para lutar contra um
pernicioso positivismo. A medida desta faanha pode ser vista
por um simples paralelo. O marxismo do sculo XX conte uma
teoria anti-historicista que fala como Benjamin do amalgama do
arcaico com as formas mais contemporneas, e que concebe o
desenvolvimento histrico no como uma evoluo linear, mas
como uma constelao chocante de pocas desaparecidas. Foi
esta hiptese - a hiptese de Trotsky em "Resultados e
Perspectivas"- que iluminou os destinos da revoluo Russa,e
que,generalizada como teoria da revoluo
permanente,permanece de fundamental importncia para
estratgia socialista atual...A teoria da revoluo permanente
implode em vrios pedaos a homogeneidade histrica,
inserindo na era da luta democratico-burguesa o "fraco impulso
messinico" que gira heliotropicalmente em direo ao sol do
nascente socialismo do futuro.
O que era uma imagem em Benjamin torna-se uma estratgia
poltica em Trotsky: o proletariado assumindo a direo da
revoluo democratico-burguesa em aliana hegemnica com
outras classes e grupos subordinados, efetuam a dinmica que
conduzir a revoluo na direo do poder operrio.

Conclui Eagleton:

Um momento acabado do tempo homogneo da revoluo


burguesa torna-se o estreito porto atravs do qual o proletariado
entrar, o JETZEIT em que historias distintas-feudal, burguesa-
democratica, proletria-so dramaticamente impelidas em
correspondncia contraditria [...] Vista sob a luz da teoria da
revoluo permanente,o anti-historicismo de Benjamin torna-se
muito mais que uma noo atraente.

Se pensarmos na estratgia da esquerda cominterniana do Pc do B na poca em


que Mario de Andrade escreveu Macunama e, extrairmos as lies desta obra na
perspectiva que Eagleton operou em relao a Benjamin e Trotsky, Mario de Andrade
com sua rapsdia traava, do ponto de vista esttico e cultural, uma estratgia
alternativa aquela dominante no Partido Comunista, baseada na viso etapista da
historia e levando a concepo de, uma primeira etapa democratico-burguesa e, noutra
etapa posterior, a revoluo socialista.
E, se o movimento trotskista brasileiro, naquela poca, ainda estava dando seus
primeiros passos (haja vista que Mario Pedrosa estava visitando a Alemanha, em
viagem para Moscou), contudo, num texto de 1930 assinado por Mario Pedrosa e Livio
Xavier (com os pseudnimos de M.Camboa e L.Lyon, respectivamente), chamado de
"Esboo de uma Analise da Situao Econmica e Social do Brasil, publicado na
revista francesa Lutte de Classe, dirigida por P.Naville.
Para Fulvio Abramo,

No Esboo faz-se, pela primeira vez no Brasil, um esforo serio


para compreender a formao nacional a partir de sua situao
de Colnia e, depois, de pais independente. Na ocasio, o
Partido Comunista no levantara qualquer estudo serio sobre a
caracterizao da situao nacional. Bastavam-lhe as
generalizaes antimarxistas de Octavio Brando e os ukases
vindos da III Internacional via Bureau sul-americano.

Podemos assinalar que o "Esboo, possivelmente junto com um texto dos


anarquistas-bem anterior a Macunama e a prpria fundao do PCdoB-: O que e o
Maximismo ou o Bolchevismo-Programa Comunista publicado em 1919 e da autoria
de Helio Negro e Edgar Leuenroth, constituem a afinidade entre a estratgia poltica e a
imagem literria marioandradiana.
Neste aspecto, nota-se outra grande afinidade: entre Mariategui e M.de
Andrade, cada um a sua maneira critica a concepo etapista dos PCs. Andrade como
imagem-estetica e, Mariategui enquanto estrategia-politica.
Nos "Sete Ensaios, o peruano recusa a tese da Internacional com base numa
transformao burguesa e anti-feudal, uma forma de progresso capitalista, como etapa
necessria na revoluo peruana. Mariategui defendia a revoluo socialista como nica
alternativa a dominao imperialista.

As caravanas culturais de Mario de Andrade: Turista aprendiz

Uma das caractersticas dos membros do filo "romntico revolucionrio, foi


o cosmopolitismo a partir dos exlios (voluntrios ou no) vividos. Contudo, Mario de
Andrade uma exceo neste aspecto. Sendo um cosmopolita sem sair do seu pais,o
autor de Macunama teve nas suas "viagens etnogrficas", o elemento que viria a trazes
inflexes em suas reflexes.
Vivian Schelling assinalou a importncia das viagens de Mario de Andrade ao
interior brasileiro para mudana de perspectiva do autor. Em 1927 e 1928, Mario viajou,
primeiro, a Amaznia e , depois, ao Nordeste;o propsito destas viagens era descobrir o
Brasil e Em seu papel como intelectual moderno do Sul mais desenvolvido, ele
comea a formular suas criticas a civilizao e ao progresso.
No desenvolvimento do que Mario chamou de "civilizao tropical", a cultura
brasileira criaria uma sociedade diferente, no baseada numa racionalidade instrumental
e secularizada, nem na tica do trabalho.

Mas o erro principal do Brasil, e possivelmente inamovvel, e'


estarmos querendo recrear em nossas grandezas e violncias
equatoriais, uma civilizao europia, pratica, fria, dominada
pela estupidez duma lgica greco-crista, incapaz de reconhecer
os direitos do corpo preguioso e os sombrais midos e
misteriosos dum filosofismo mistico-sensual.

Para Viviane,
Sendo a civilizao capitalista erigida sobre os valores do
individualismo, da racionalidade instrumental e da tica do
trabalho, Mario de Andrade viria a contrapor uma viso
alternativa de sociedade, governada pelos valores da
comunidade, do cio criativo e de uma ideiaideia de Razo no
como encarnao de uma racionalidade formal, e sim como uma
racionalidade substantiva. Se no fosse assim, a dualidade
civilizao/primitivismo no teria constitudo um elemento to
importante em seu discurso, pois, embora a tentativa de
determinar e explorar a modernidade e de definir a funo
moderna do intelectual estejam no centro do projeto esttico e
ideolgico de M.de Andrade, sua atitude critica em relao Ao
progresso e a civilizao indica que ele no defendia uma
ideiaideia de modernidade identificada com a modernizao [...].

Para nossa autora,

A viagem Ao Nordeste, particularmente a segunda, em 1928,


prenunciava uma nova fase no desenvolvimento intelectual de
M.de Andrade, na qual sua tentativa de definir o PROJETO
NACIONALISTA vem complementada por uma adeso gradual
ao SOCIALISMO e uma preocupao crescente com o papel do
intelectual e a relao entre arte e sociedade.

Enfim, "a construo de uma viso alternativa para o desenvolvimento da


sociedade brasileira, de acordo com um outro PRINCIPIO CIVILIZATORIO, diverso
do principio europeu herdado com a colonizao", eis o objetivo maior de M.de
Andrade.
Nacionalismo e Internacionalismo

Mario Pedrosa nos fala sobre o papel de M. de Andrade:

Sob o impacto produzido nos jovens literatos pelas esculturas de


Brecheret e as pinturas sombriamente dramticas de Malfatti, os
cnones do academicismo literrio de que ainda estavam
impregnados comearam a ceder.Assim, a iniciao modernista
deles comeou a se fazer no atravs da literatura e da poesia
mas atravs das artes especificamente no verbais da pintura e
da escultura.E os progressos dessa iniciao podiam ser
acompanhados no prprio chefe do movimento e seu primeiro e
mais eminente terico, Mario de Andrade [...]

Graas a esse contato, desde os primeiros passos, com a plstica moderna,


puderam os literatos e poetas do modernismo brasileiro ter, de sada, uma viso global
do problema da arte e da criao contempornea [...] Sem a contribuio direta,
primordial das artes plsticas, o movimento modernista no teria marcado a data que
marcou na evoluo intelectual e artstica do Brasil. A sua prpria orientao
nacionalista, de descoberta e revelao do Brasil, no teria tido a sistematizao, a
profundidade, a busca de razes com que se assinalou.Desse clima que surgiu
provavelmente a ideiaideia de Razes do Brasil, o penetrante livro de Sergio Buarque de
Holanda [...]
Por paradoxal que possa parecer, foi pela conscincia do seu "internacionalismo
modernista", na expresso de Mario, que o movimento chegou -outra expresso de
Mario- ao seu "nacionalismo embrabecido".
Aqui, o prprio Mario de Andrade nos adverte: "uma coisa o nacionalismo
como doutrina poltica, corpo de conceitos que tem mil utilizaes e pode ser
manipulado a vontade; outra coisa reconhecer a fisionomia prpria de cada pais, a
lngua com suas peculiaridades, os usos, costumes, crenas e formas de comportamento
das pessoas que o habitam.... sou o que sou, nacionalista no, porm brasileiro...".

Em seu maravilhoso "figurao da Intimidade", Lafet traa paralelos entre o


pensamento mtico e o romantismo. "O recurso magia uma ocorrncia freqente nas
poticas do sculo XIX a nosso tempo, marca constante da revoluo empreendida pelo
romantismo e herdada pelos poetas que adotaram a sua tradio rebelde. O discurso do
mito se ope como metfora, Ao discurso racionalista da cincia... A presena do mtico
e do mgico o modo de resistir ideologia daquele racionalismo que serve a
dominao".
Lafet apoia-se em suas analises na obra de Octavio Paz, "que tambm tentei
seguir neste argumento, mostrou brilhantemente como o fascnio simultneo pela magia
e pela revoluo est entranhado nas poticas vanguardististas e se liga a tradio
romntica e moderna da ruptura. Conclui que Mario de Andrade um dos "Hijos del
Limo, em cuja poesia tambm se tocam os extremos da viso analgica e da viso
irnica.
"Analogia e ironia, magia e poltica, pares opostos que governam a criao
vanguardista de Mario de Andrade...".

Mario de Andrade e a poltica cultural ps 30

de G.Lukacs a tese de que a burguesia europia abandonou o "realismo" na


arte, em paralelo ao abandono de suas principais caractersticas democratico-
revolucionarios, diante dos novos desafios decorrentes do acirramento da luta de classes
nas conjunturas da revoluo de 1848 e da Comuna de 1871.
Nas palavras de R.Schwarz,

No esprito da tradio marxista, digamos que a questo da


honestidade narrativa muda de qualidade e toma a feio atual a
partir de 1848, quando a mar das revolues populares obriga
as burguesias europias a reconhecerem o particularismo do
prprio interesse. A Franca a esse respeito seria paradigmtica
[...].

Nesse perodo, a modernizao capitalista coincide poltica, social e


ideologicamente com a modernidade. O modernismo ser ,ento,combatido pelas
instituies hegemnicas burguesas no campo cultural e artstico. A burguesia europia
combate a arte moderna, reproduzindo em suas instituies de produo hegemnica no
campo cultural o "Ancien Regime".
Nas palavras de Arno Mayer, em "A Forca da Tradio, no Capitulo "Culturas
Oficiais e Vanguardas": As culturas oficiais da Europa espelhavam nitidamente a
perseverana tenaz das sociedades civis e polticas pr-industriais. Na forma, contedo
e estilo, os artesanatos da alta cultura continuavam ancorados e envolvidos em
convenes que transmitiam e celebravam tradies defensoras da antiga ordem. A
reviviscencia e a reproduo eclticas de estilos antigos e tradicionais predominavam
no s na arquitetura e estatuaria como tambm na pintura, escultura e artes cnicas.
Museus, academias, igrejas e universidades promoviam ativamente esse estoicismo
acadmico congruente, o mesmo fazendo o Estado, que utiliza o historicismo para
articular projetos nacionais e regionais. Acima de tudo, as artes e instituies
hegemnicas mantinham suficiente vitalidade interna e coerncia sinttica para
revigorar os anciens regimes.
Evidentemente, entre 1848 e 1914 as culturas oficiais da Europa conheceram
movimentos modernistas dissidentes nas artes, assim como nas igrejas e escolas
superiores. Mas essas defeces eram facilmente controladas,sobretudo por no
constiturem preo para os centros culturais reinantes.Com efeito,a maioria dos
desertores eram experimenta listas e jovens inovadores,espirituosos e agressivos,e
muitos deles afinal obtiveram reconhecimento.Mesmo assim,ondas sucessivas da
vanguarda se chocaram contra as culturas oficiais que,como quebra-mares,sobreviveram
intactas".
Para Arno Mayer, "A burguesia economicamente radical era to subserviente
na vida cultural quanto nas relaes sociais e na conduta poltica. Ao esposar e
consumir as artes convencionais, a burguesia reforava as classes dominantes e as
culturas oficiais voltadas de modo desproporcional para o mundo pr-industrial e pre-
burgues".
(...)A exigncia era a de reproduzir e difundir o que era "nosso conhecido, como
tambm apreciado, admirado ou adorado. Isso significava retratar lendas religiosas e
santos,picos histricos e heris,a vida e os costumes cotidianos com referencias
estudadas a morte de Prometeu,a aflio diedro,ao drama da criao e a cultura das
fabulas populares.Mais do que demandar as artes visuais,plsticas e musicais "novas
impresses,(os artistas) eram solicitados a expressar e reproduzir intensamente as
impresses e crenas j experimentadas e comprovadas".

Mas havia tambm um movimento modernista,uma vanguarda de artistas


radicalmente crticos e opositores da perspectiva histrica.O termo vanguarda fora na
realidade extrado do discurso militar.Para amigos e inimigos,invocava vises de
patrulhas avanadas de artistas liderando ou simpatizantes,que avanavam contra a
fortaleza da cultura oficial.Em cada pais,a vanguarda era constituda de vrios crculos
que se agrupavam e reagrupavam em relao recproca e em reao a suas batalhas
perdidas contra o establishment cultural.

...Mas,quaisquer que fossem as divisoes entre e dentro das varias formacoes da


vanguarda,todas eram movidas pela mesma exasperacao contra a postura historica
enrijecida dos ramos principais da alta cultura.Individual e coletivamente,os
vanguardistas se rebelavam nao contra as instituicoes hegemonicas enquanto tais,mas
contra seu torniquiete asfixiante.Com seus assaltos incessantes,pretendiam forjar uma
abertura desse ponto de estrangulamento,a fim de criar um maior espaco publico e
privado para experimentacao tecnica,estilistica e tematica".

Passemos ao Brasil,para vermos como se deu esta dialetica entre modernismo e


burguesia.
No Brasil dos anos 20 e 30,fracao da burguesia paulista,em disputa com setores
oligarquicos,apoiou a criacao de instituicoes hegemonicas no campo cultural e
educativo.O chamado "desencanto" produzido com a derrota do movimento armado de
1932,levou a uma mudanca de estrategia nessa disputa.Ocorreu,entao,uma "alianca"
entre essa fracao da burguesia e intelectuais do modernismo de
esquerda.Portanto,podemos assinalar os nomes de Paulo Duarte,Mario de
Andrade,Sergio Milliet,etc.

Essa participacao de intelectuais de esquerda nos aparatos de hegemonia da


burguesia paulista tema de visoes diferentes por varios analistas.Tentemos expressar a
conjuntura em que ocorreu este processo.
Florestan Fernandes em "Desenvolvimento Historico da Sociologia no Brasil"
(1958),analisa a conjuntura dos decenios de 30 e 40 em Sao Paulo,expoe a "dialetica da
cultura no Brasil".
Na esfera da cultura,foram a alteracao da ideologia das camadas
dominantes e a compreensao racional das funcoes da educacao
que criaram condicoes propicias ao aparecimento da sociologia
como uma especialidade.A expansao urbana e a industrializacao
se refletiram na composicao das camadas dominantes e na forma
de selecao de suas elites.Estas revelaram certa acuidade,com
referencia a situacao de interesses em formacao,e deram algum
relevo a preocupacoes praticas,de cunho intelectual.
Primeiro, durante a fase de convulsoes politicas,que se seguiu a
Revolucao Constitucionalista, procuravam incentivar o ensino
das ciencias sociais,tendo em vista dois objetivos:
1) educar as novas geracoes para as tarefas de lideranca
economica,administrativa e politica;
2) criar recursos para a solucao racional e pacifica dos
problemas sociais brasileiros - Os objetivos referidos se
revelam,por exemplo,na fundacao da Escola Livre de Sociologia
e Politica-em 1933- e na criacao da Universidade de Sao Paulo-
em 1934.
Segundo,ensaiaram a utilizacao conservadora das descobertas e
dos conhecimentos das ciencias sociais.Instituicoes mantidas
pelo capital privado intervem na divulgacao da economia,da
administracao,da politica e da sociologia e tentam novo estilo de
adestramento de mestres ou de dirigentes(da industria ou do
comercio),com o proposito de assegurar e de manter a "paz
social".
No setor da Inteligencia propriamente dita,foram os educadores
que procuraram enfrentar as necessidades da situacao nova e
propor reformas que ajustassem o ensino brasileiro a ordem
social democratica...
Na esfera da estrutura social,precisam ser apontadas tres
transformacoes paralelas cujas consequencias sao
evidentes.Primeiro,a transicao para o regime de classes sociais
est se processando de modo a alterar o antigo sistema
institucional...
De modo que a transformao das antigas instituicoes ou a
criacao de instituicoes novas constituem processos
simultaneos.Os dois processos afetam de varias maneiras as
possibilidades de integracao da sociologia ao sistema socio-
cultural.De um lado,a transformacao do sistema escolar inseriu a
pesquisa e o ensino da sociologia no corpo das atividades
institucionalizadas.De outro,sob a influencia de interesses
variados ,a sociologia foi incorporada ao funcionamento regular
de varios servicos,departamentos e instituicoes,oficiais e
particulares.Tomando-se uma cidade como Sao Paulo,como
ponto de referencia,verifica-se:a utilizacao da pesquisa
sociologica nas instituicoes oficiais,em fins estritamente
cientificos (como no Departamento de Cultura da Prefeitura
Municipal ou no Museu Paulista);
[...]
Segundo,ao processo de institucionalizacao das atividades de
ensino,de pesquisa ou de aplicacao,relaciona-se a formacao de
status e papeis sociais,que dao suporte estrutural a
transformacao da sociologia em especialidade.O mercado para
mao de obra especializada e' naturalmente pobre.Mas o
especialista encontra,nas diversas instituicoes
mencionadas,certas oportunidades de emprego regular.Os papeis
sociais estruturalmente organizados sao: os de "professor"
(ensino de sociologia nas escolas normais e superiores);os de
"assistente" e os de "auxiliar de ensino" (no ensino superior);os
de "pesquisador" e os de "tecnico"(em algumas instituicoes
oficiais e particulares) [...]
Terceiro,a institucionalizacao das atividades de ensino e de
pesquisa provocou a organizacao em novas bases das tarefas de
producao sociologica e a constituicao de um publico consumidor
organico...o ensino universitario possibilita a associacao do
ensino a pesquisa,cria padroes de trabalho intelectual e orienta
as atividades individuais segundo os moveis basicos da
investigacao cientifica [...]
Na esfera da mudanca cultural e social,podem-se distinguir
duas especies de fatores:os que produziram efeitos
reconheciveis; os que estao operando no presente,cujos efeitos
so' podem ser presumidos.Quanto aos primeiros,cumpre
assinalar que as mudancas na ideologia das camadas dominantes
e a institucionalizacao das atividades sociologicas no nivel do
ensino superior engendraram necessidades que nao puderam ser
plenamente satisfeitas com a mao de obra intelectual existente
no pais.Isso inspirou uma politica inovadora,de aproveitamento
continuo e em escala consideravel de especialistas
estrangeirosa.A colaboracao desses especialistas assumiu o
carater de um poderoso fator de mudanca intelectual.Foi gracas
a ela,principalmente,que a distancia intelectual,que se havia
estabelecido entre o ensino superior brasileiro e o ensino
superior europeu ou norte-americano,se atenuou de modo rapido
e construtivo.

Para Florestan,com esse processo,a analise historico-sociologica da sociedade


brasileira se transforma em investigacao positiva".

O processo se inicia com as obras de F.J.Oliveira Viana...Mas so


se torna completo nas contribuicoes de Gilberto Freire
,considerado por muitos o primeiro especialista brasileiro com
formacao cientifica "Casa Grande & Senzala",1933; "Sobrados
e Mocambos",1936; "Ingleses no Brasil", 1948; etc.) e de Caio
Prado Junior ("Formacao do Brasil
Contemporaneo".Col"nia,1942). As obras de sintese revelam,
igualmente, a mesma intencao de dar fundamento empirico e
sentido teorico interpretacao dos processos historico-sociais
(Fernando de Azevedo,"A Cultura Brasileira",1934.Sergio
Buarque de Holanda,"Raizes do Brasil",1936;Caio Prado
Jr.,"Evolucao Politica do Brasil",1933;Nelson Werneck
Sodr,"Formacao da Sociedade Brasileira",1944).

Nestas Instituicoes fundadas na epoca em SP,se desenvolveu o que Antonio


Candido chama de "pensamento radical" em contraposicao ao "pensamento
conservador" dominante.Candido contextualiza,em "Educacao pela Noite":

(...) depois de 1930 se esbocou uma mentalidade mais


democratica a respeito da cultura,que comecou a ser vista,pelo
menos em tese,como direito de todos,contrastando com a visao
de tipo aristocratico que sempre havia predominado no
Brasil...Para esta visao tradicional,as formas elevadas de cultura
erudita eram destinadas apenas as elites,como equipamento (que
se transformava em direito) para a "missao" que lhes competia,
em lugar do povo e em seu nome.

O novo modo de ver,mesmo discretamente manifestado,pressupunha uma


"desaristocratizacao" (com perdao da m palavra) e tinha aspectos radicais que nao
cessariam de se reforcar ate' os nossos dias,desvendando cada vez mais as contradicoes
entre as formulacoes idealistas da cultura e a terrivel realidade da sua fruicao ultra-
restrita.Por extensao,houve maior consciencia a respeito das contradicoes da propria
sociedade,podendo-se dizer que sob este aspecto os anos 30 abrem a fase moderna nas
concepcoes de cultura no Brasil.
Uma das consequencias foi o conceito de intelectual e artista como opositor,ou
seja,que o seu lugar e' no lado oposto da ordem estabelecida;e que faz parte da sua
natureza adotar uma posicao critica em face dos regimes autoritarios e da mentalidade
conservadora.
No entanto,este processo foi cheio de paradoxos,inclusive porque o intelectual e
o artista foram intensamente cooptados pelos governos posteriores a 1930,devido ao
grande numero das atividades estatais e as exigencias de uma crescente racionalizacao
burocratica.Nem sempre foi facil a colaboracao sem submissao de um intelectual,cujo
grupo se radicalizava,com um Estado de cunho cada vez mais autoritario.Resultaram
tensoes e acomodacoes,com incremento da divisao de papeis no mesmo
individuo.Sergio Micelli estudou os aspectos externos desta situacao num livro
piuoneiro -ao qual seria preciso todavia acrescentar que o servico publico nao significou
e nao significa necessariamente identificacao com as ideologias dominantes.E que uma
analise mais completa mostra como o artista e o escritor aparentemente cooptados sao
capazes,pela propria natureza da sua atividades,de desenvolver antagonismos
objetivos,nao meramente subjetivos,com relacao a ordem estabelecida.A sua margem de
oposicao vem da elastecidade maior ou menor do sistema dominante,que os pode tolerar
sem que eles deixem com isto de exercer a sua funcao corrosiva".
Antonio Candido voltara' a defender sua visao em outros momentos.Assim,tanto
na introducao ao livro citado de S.Micelli, quanto na arguicao a tese de Maria Rita
Galvao,sobre a empresa cinematografica "VERA CRUZ".
O clima da epoca transparece nestas palavras de Araci Amaral,"Choques na Praa da
Se',intentona comunista,intentona integralista,respectivamente em 1934,35 e
36,alimentavam a efervescencia dos animos.No plano cultural,o Clube dos Artistas
Modernos foi,por certo,o nucleo mais vibratil a espelhar o espirito do meio
cultural,sendo o elemento mais audacioso o personificado por Flavio de Carvalho..E a
programacao mesma do Clube para 1933,no setor de "conferencias",e' indicativa do
clima do meio cultural,que apenas comecava a se agitar socialmente falando:de Tarsila
sobre "Arte Proletaria na URSS",de Osorio Cesar sobre os loucos,de Pedrosa sobre
Kollwitz,de Caio Prado Jr. sobre a Uniao Sovietica(na qual a assistencia se prolongava a
mais de 150 metros pela rua"),de Jorge Amado sobre a "vida na fazenda de cacau",de
Pacheco e Silva sobre psiquiatria,de Oswald de Andrade a ler trechos de sua peca O
homem e o cavalo,eventos sempre agitados por debates violentos.A mais memoravel
conferencia do ano,contudo,seria a de Siqueiros,dado que o pintor mexicano,exuberante
e imaginativo,falou durante 4 horas perante um "publico hipnotizado".

A participacao desses intelectuais de esquerda nesta "fenda" no bloco dominante,tinha


como horizonte "democratizar a cultura" e desenvolver uma "politica cultural" a partir
destas instituicoes .Esse movimento permitiu a aproximacao entre Mario de Andrade e
Sergio Milliet,na construcao de uma politica de hegemonia cultural.Antes de 32,esses
dois intelectuais tinham visoes bem distintas do "ato cultural".Milliet mais proximo de
um campo elitista e Mario Andrade do campo popular.Ambos,se encontraram nas
trincheiras destes aparatos ideologicos .

Segundo Lisbeth Repollo,"A Revolucao de 1932 envolve diretamente muitos desses


companheiros,especialmente Paulo Duarte,cunhado de Milliet desde 1926.Assim,"por
camaradagem,mais que por ativismo",Sergio Milliet acaba participando do processo
revolucionario,como contato que transfere informacoes.Desta forma,envolvido
compartilha com os companheiros e outros intelectuais e personalidades do meio
paulistano do "clima de desencanto" ante o grande choque da derrota de 1932,que leva a
necessidade de revisao critica da realidade brasileira,fundada em uma atuacao cientifica
e objetiva.Tal postura desemboca na formacao da Escola de Sociologia e
Politica(1933),da Universidade de Sao Paulo(1934) e do Departamento de
Cultura(1935),todos campos de acao onde Milliet participa ou estabelece vivo contato
com seus principais agentes".
" Homens sem sopro nem movimento"
"escribas vendidos,sem alma nem f".

Sergio Micelli,em sua obra "Intelectuais e Classe Dirigente no Brasil (1920-


1945)",assinala questoes polemicas em relacao a participacao dos intelectuais de
esquerda nos aparatos ideologicos. Por sua vez,Antonio Candido,no prefacio a mesma
obra de S.Micelli,argumenta contra alguns aspectos da analise de Micelli, a partir de
outra "estrutura de sentimentos":
A sua maneira de trabalhar depende do que se poderia chamar a
formacao da perspectiva historica,no suceder de uma geracao
pela outra.Ele fala de homensa catalogados,quase sempre
remotos para ela,autores de livros que leu sem associa-los
figura e ao gesto de quem os escreveu;que se tornaram objeto de
informacao contra ou a favor,e que ele avalia por
comparacao,por reducao aos conceitos,conforme as
necessidades de argumentar.Numa palavra,Micelli j dispoe de
uma perspectiva temporal,que permite certo afastamento
e,portanto,o olhar sem paixao e quem sabe sem "piedade".Mas
uns anos e quase todos esses homens serao vinte linhas
esquematizadas e arbitrarias numa enciclopedia,sem sopro nem
movimento.
Mas eu nao os vejo assim,porque me formei olhando-os na
rua,nas fotografias de jornal,nas salas,no noticiario e na
referencia viva de terceiros.tomei partido,julguei os seus atos em
funcao dos meus,orientei os meus pelos deles.Portanto nao
consigo ve-los de longe e,as vezes,nem aceitar como verdade
manipulavel intelectualmente os dados das suas biografias e
autobiografias.Nao raro eu sorrir quando Micelli se funda para
argumentar em informacoes desse tipo,cujo grau de alteracao eu
ainda posso sentir,mas ele j nao.Como quando menciona que
um pode fazer bons estudos devido a situacao folgada de sua
familia mais ou menos aristocrata,e eu penso logo no protetor
que na verdade os custeou.(...)
Talvez,repito,nao seja grave se pensarmos apenas no resultado
final e e focalizarmos o processo.Mas o fato que no processo
esta'envolvidos os homens,com a sua carne e a sua alma,de
modo que conviria acentuar mais que um Carlos Drummond de
Andrade "serviu"o Estado Novo como funcionario que j era
antes dele,mas nao alienou por isso a menor parcela da sua
dignidade ou autonomia mental.Tanto assim que as suas ideias
contrarias eram patentes e foi como membro do Gabinete do
Ministro Capanema que publicou os versos politicos
revolucionarios de Sentimento do Mundo e compos os de Rosa
do Povo.J um Cassiano Ricardo se enquadrou ideologicamente
e apoiou pela palavra e a acao,porque o regime correspondia a
sua nocao de democracia autoritaria e nacionalista,devido a
motivos que Micelli aponta muito bem no Capitulo I.Outros que
nem vale a pena nomear,para poderem repousar com menos
infelicidade nos eio de deus,eram pura e simplesmente escribas
vendidos,sem alma nem f.

Valores: de classe e universais

Antonio Candido, 4 anos antes do prefacio a obra de S.Micelli,j tinha


trabalhado essa argumentacao em "Feitos da Burguesia",texto oriundo da sua arguicao
a tese de Maria R.Galvao (Cronica do Cinema Paulistano,1975).
Vejamos a argumentacao do autor de "Parceiros do Rio Bonito":
(...)Mas acontece que,como todo produto cultural,por um lado
eles estao ligados sua (digamos) infra-estrutura de classe; por
outro lado desenvolvem autonomia e adquirem uma
personalidade propria,que vai decidir quanto a sua
validade.Porque se apenas espelham a classe a partir da qual se
projetam,sao produtos medianos.Um produto (sem perder as
suas raizes de classe) s se projeta universalmente quando,de
certa maneira,sai fora dessa matriz inicial.Entao,dizemos que ele
adquire um cunho universal.Para usar as suas palavras, o caso
dos "movimentos em profundidade,que fecundaram a burguesia
e atingiram a sociedade global".
[...]
Ora,eu creio que esses valores de limpeza e
clareza,elegancia,nao sao em si mesmos valores burgueses.Sao
tambm valores universais.Portanto,avalia-los sem certas
precaucoes mais sutis que talvez a sra. nem sempre tenha
tomado,d a impressao de que eles sao valores ligados
essencialmente a burguesia como coisa especifica dela,ou da
burguesia paulista em particular.Creio que a sra. Viu bem a
ligacao destes e outros valores com a sua matriz burguesa,mas
nao viu a sua projecao eventual num plano mais alto.

Candido, na melhor linha do "materialismo cultural", aproxima-se das ideias de


E.P.Thompson sobre "experincia" e "valores".

Disputa de hegemonia cultural

Prossegue Candido:

Apesar disso,achei muito interessante a sua analise politica de


apoio.A sra. Descreveu o que foi,quem sabe,o ltimo momento
em que a cultura burguesa reinou incontrastada no Brasil como
sendo "a cultura". O ltimo momento em que a cultura "que
fosse boa para a burguesia,era boa para todos".At entao nao se
tinham manifestado visivelmente fora da burguesia forcas que
impusessem "culturas"paralelas. No fim do decenio de 50 e
comeco do de 60 a coisa comecou a mudar.Naquela altura
comecamos a ver no Brasil,nao de maneira isolada,atraves de
vanguardas,mas como grandes movimentos de
estudantes,populares e intelectuais,um esboco de processo muito
mais intenso,capaz de interessar setores mais vastos da
sociedade em seus diversos niveis.A este respeito se poderia
falar realmente de um tipo de cultura que,embora protagonizada
por pessoas que na maioria eram de origem burguesa,ou
melhor,de classe media,estavam procurando se desprender dos
interesses e mesmo de muitos valores mais especificamente
burgueses.Refiro-me a coisas como o cinema novo,as tentativas
de teatro popular,as caravanas para o Nordeste,que viu surgir a
obra e acao de Paulo Freire e o avanco infelizmente logo
cerceado do admiravel governo de Miguel Arraes.o fenomeno
foi tao importante que os poderes competentes tomaram
providencias imediatas...A partir de 10 de abril de 1964 tais
providencias foram drasticas em relacao a tudo isso,a todo esse
esboco de movimento cultural paralelo e at certo ponto
antagonico ao da burguesia.

Candido fala sobre o decenio 30:

Para esclarecer o que digo vou ao comeco do movimento.A


sra. Mostra que a burguesia paulista tradicional levou um golpe
em 1930,mas que se exprimiu culturalmente a partir de
entao,entre outros fatores por causa da dimensao cultural que
adquiriu.Culturalmente,a data de inicio deste movimento a que a
Vera Cruz pertence foi a fundacao dos intitutos novos de ensino
superior,a Escola de Sociologia e Politica em 1933 e a
Universidade de Sao Paulo em 1934.O movimento continuou
com a atuacao de Mario de Andrade no DMC a partir de
1935.Bem depois,no fim do decenio de 1940, que vao surgir o
TBC e,dele,a Vera Cruz.O que pretendo sugerir que nao se
pode caracterizar secamente esse complexo de acontecimentos
como "cultura burguesa",delimitada e sem mais qualificativos.

Visao radical e "Front Populaire"

Teria sido preciso talvez desenvolver no seu trabalho certas


deixas que semeou,inclusive com base em Levi-Strauss,que foi
professor desta Faculdade entre 1934 e 1938.Strauss percebeu
que a USP dos primeiros tempos,com as suas missoes
estrangeiras e o seu exito mundano,era um luxo da oligarquia e
se prestava a piada (que ele nao economiza).De fato,em nosso
tempo de estudantes havia matines dancantes no Hotel
Esplanada,de que participavam alunos e os professores
estrangeiros;e todo o mundo ia tomar ch na Confeitaria
Vienense.Havia disso, certo,mas eram aspectos contingentes e
acessorios,que nao tiravam a seriedade essencial do que estava
acontecendo.Um historiador atual pode assinalar esses aspectos
mundanos e proceder a analise do seu significado de classe;mas
seria errado concluir dai que se tratava de uma empresa futil da
burguesia.H um aspecto de dependencia burguesa
constritora,mas h outro lado a considerar: a cultura se
construindo nos termos em que isso era possvel [...]
Analisando bem,veremos que era de fato uma inciativa da
cultura burguesa,como nao pdoeria deixar de ser;era a oligarquia
pagando o luxo de construir uma Faculdade de tipo franco-
italiano.Mas com isso,como bem viu Strauss,abriu as
oportunidades para a formacao moderna de um grupo no fundo
inconformado em varios niveis.Grupo crescido no flanco da
sociedade burguesa,construido nao apenas pelos seus rebentos
mais inquietos ou francamente isatisfeitos,que recusavam o
molde aristocratizante das escolas tradicionais,mas de elementos
da pequena burguesia,professores primarios
comissionados,filhos de fazendeiros falidos.assim nasceu a
vocacao critica(no sentido amplo)da Faculdade de Filosofia,que
perdura at hoje e j foi alias ultrapassada por outras formacoes
culturais.Pensando bem,o seu destino foi meio milagroso,porque
ela era uma combinacao dos valores da burguesia,querendo
formar quadros ao seu modo e para seu apoio,e de valores mais
gerais veiculados pelos professores franceses,trazendo a visao
radical daquela era de Front Populaire.Assim se formou na
Faculdade de Filosofia esse radicalismo modesto no proprio seio
dos interesses burgueses e com estipendio do Estado;modesto
radicalismo que ficou sendo uma tradicao e tem produzido
efeitos positivos [...]
Isto dito para sugerir a necessidade de matizar as analises
ideologicas,a fim de compreender que,tanto no caso da USP
quanto no da Vera Cruz,o que era expressao da cultura burguesa
era tambm expressao de cultura,sem mais qualificativos.Era a
cultura que podia haver,e que gerou no flanco a propria
contestacao;que suscitou antagonismo a ela mesma.Por isso
alguns fundadores da USP costumavam dizer com melancolia
que esta nao era a Universidade dos seus sonhos.Claro que no.

Esse texto de Candido foi publicado em "Teresina etc."(1980),com um


"Adendo" composto de dois trechos de entrevista do autor a revista "Trans-form-
acao"em 1974:

(...) Naqueles anos de 30 e 40 formou-se aqui (no Brasil),alm


do pensamento de esquerda,que atingiu setores mais restritos,um
pensamento radical de classe media,que envolveu mesmo a
maior parte dos socialistas e comunistas e a meu ver representou
um enorme progresso.De fato,foi a primeira vez que surgiu de
modo ponderavel uma visao nao-aristocratica do Brasil...Nesse
periodo ns vimos a expansao dos estudos sociais sobre o negro
e em geral sobre as populacoes pobres;vimos minguar o
ufanismo e a ideologia patrioteira dos livros de leitura.Isso
favoreceu a formacao de um pensamento radical. (...) A
Faculdade de Filosofia da USP deu elementos decisivos para a
formulacao daquele pensamento radical que se desenvolveu em
todo o Brasil.
Note-se que ela tem sido quase por instinto fiel a esse tipo de
pensamento,e que leva frequentemente a esquerda a subestimar
o seu papel,achando que ela devia,por exemplo,fazer a
revolucao...Ora,o seu interesse maior (dentro das possibilidades
da ordem burguesa) foi justamente favorecer um pensamento
radical,e nao assumir (uma impossivel) posicao
revolucionaria.(...)

Mario de Andrade nos fornece um belo exemplo desta dialetica da malandragem


da historia.Em Aspectos da Musica Brasileira analisa o trabalho do Conservatorio de
So Paulo como exemplo do dito que atirou no que viu e matou o que no viu.

Observe-se agora um dos nossos mais curiosos casos musicais.A


expanso extraordinaria que teve o piano dentro da burguesia do
Imperio foi perfeitamente logica e mesmo
necessaria.Instrumento completo, ao mesmo tempo solista e
acompanhador do canto humano,o piano funcionou na
profanizaco da nossa musica,exatamente como os seus
manos,clavicimbalos,tinham funcionado na profanizaco da
musica europeia.Era o instrumento por execelencia da musica do
amor socializado com casamento e benco divina,to necessario
familia como o leio nupcial e a mesa de jantar.Mais,eis que
contradizendo a virtuosidade musical de palco,que durante o
Imperio esteve muito principalmente confiada entre ns a
cantores,flautistas e violonistas,o piano pula para o palco e vai
produzir os primeiros genios do nosso virtuosismo musical.
Ora,certamente no foi Chiaffarelli quem produziu a
genialidade intrinsica de Guiomar Novaes e Antonieta
Rudge.Porm,a importaco natural deste grande professor para a
sociedade italianizada de So Paulo,produziu a floraco
magnifica com que a escola de piano da Cafelandia ganhou
varias maratonas na America.Mas que esta floraco pianistica de
So Paulo era uma experincia social,embora logica em nossa
civilizaco e no esplendor do caf,se prova no apenas pela sua
rapida decadencia,como pela pouca funco,pela quase nula
funco nacional e mesmo regional dessa pianolatria paulista.O
proprio, e incontestavelmente glorioso em seu
passado,Conservatorio de So Paulo,justificado por essa
pianolatria,inspirado por ela,dourado inicialmente pelo nome
dos seus professores pianistas(Chiaffarelli,Felix de Otero,Jose
Wancolle),mandando buscar um professor de piano na Euroapa
(Agostinho Cant) quando o que lhe faltava eram o canto,o
violino e mais cordas,formando dezenas e dezenas de pianistas
por ano,propagando abusivamente a pianolatria por todo o
Estado,o proprio Conservatorio,no
entanto,inconscientemente,sem que ningum o pretendesse,e
mesmo contra a sua orientaco voluntariamente pianolatrica,teve
que readaptar-se s exigencias tecnicas e economicas do
Estado,e adquirir uma funco cultural muito mais
pedagogica,profunda e variada que o internacionalismo
industrial da virtuosidade pianistica.E por isso,o que deu de mais
significativo,no foram os seus pianistas,mas produces
outras.Foi uma literatura musical numerosa,com Samuel
Arcanjo dos Santos,Savino de Benedictis,Caldeira Filho,Nestor
Ribeiro e especialmente os primeiros estudos de folclore
musical,verdadeiramente cientificos,com Oneyda Alvarenga e
seus companheiros da Discoteca Publica,todos formados no
Conservatorio(...)
E desse jeito,ao Conservatorio de So Paulo se poder aplicar
exatamente o dito que atirou no que viu e matou o que no
viu.Nascido de intereses financeiros,visando adular a pianolatria
paulista que estava com orei na barriga,um rei que tinha o
cerebro de Chiaffareli e os vinte dedos gloriosos de Antonieta
Rudge e Guiomar Novaes; nascido na excrescencia virtuosistica
sem nenhuma justificaco mais funcional e profunda,que nem
sequer deu `composico paulista obras pianisticas que a
caracterizassem,o Conservatorio de So paulo foi forcado pelas
condices sociais do meio a se tornar um centro de musicologia
e de composico.
que a musica sendo a mais coleivista de todas as
artes,exigindo a coletividade pra se realizar,quer com a
coletividade dos interpetes,quer com a coletividade dos
ouvintes,est muito mais,e imediatamente,sujeita s condices
da coletividade.A tecnica individual importa menos que a
coletiva. perfeitamente compreensivel o aparecimento no
Brasil de um to delicioso classico da prosa portuguesa,no
seculo XVII,como frei Vicente do Salvador,ou de um to genial
escultor como Antonio Francisco Lisboa no seculo XVIII.J
seria de todo impossivel um emulo de Palestrina ou de Bach por
esses tempos coloniais.Dado mesmo que ele surgisse,a musica
dele no existiria absolutamente.Porque a Colonia no poderia
nunca executa-la.Nem tinhamos capelas corais que aguentassem
com as dificuldades tecnicas da polifonia florida,bem ouvintes
capazes de entender tal musica e se edificar com semelhantes
complicaces musicais.

Processos Sociais de Inovao

As analises de Florestan e Candido, explicitam o carater dinamico e agitado


desta epoca.Sao periodos que R.Williams denomina de "processos sociais de inovaces"
e que afetam profundamente a area cultural.A complexidade destes momentos historicos
requer uma metodologia mais "sutil"para analise das mudancas culturais.
Em livro intitulado "Cultura",Raymond Williams analisa alguns aspectos da
"sociologia da cultura".Destacamos o capitulo sobre os "Processos Sociais de
Inovaco",onde encontramos elementos importantes para nossa problematica:

Nas formas culturais,as questoes analiticas mais dificeis


concentram-se no problema dos processos sociais de
inovacoes.Na producao estavel,e em todos os niveis de replica,
comum podermos descobrir relacoes sociais de tipo geral e
ate'institucional.No caso das inovacoes,as relacoes sao
inevitavelnmente mais complexas;
(...)Agora,podemos tentar sugerir um quadro de referencias
teorico dentro do qual se possa analisar esses casos,distinguindo
quatro situacoes dentro das quais a inovacao pode ser
socialmente relacionada.
(1)A ascensao de novas classes sociais,que introduzem novos
tipos de produtor e de interesses e\ou dao apoio a novas obras.

(2)Redefinicao por uma classe social existente,ou por uma


fracao,de suas condicoes e relacoes,ou da ordem geral dentro da
qual essas existem e estao se alterando,de modo que novos tipos
de obras sejam necessarios.
(3)Mudancas nos meios de producao cultural,que oferecem
novas possibilidades formais;estas podem ou nao estar de inicio
vinculadas com (1) ou (2).
(4)Reconhecimento,por movimentos especificamente
culturais,das situacoes indicadas em (1) e (2),em um nivel
precedente ou nao diretamente ligado a organizacao social
sistematizada a que pertencem.

A complexidade da "conjuntura paulista" pos-30 ,reflete os pontos (1) e (2) e


(3) ,como deixam claro as analises de Antonio Candido e Florestan Fernandes.

Mario de Andrade : "organizador da cultura"

Antonio Candido, quando da comemorao do centenario de Mario de Andrade,


ressaltava:

Pela primeira vez e quase unica vez no Brasil um intelectual de


alta categoria inventou um modo de se realizar criando a
promoo cultural de uma cidade por meio de servicos
adequados...No centenario que se comemora este ano, portanto
necessario lembrar o lado de "servico" do grande escritor,
porque ele exprime a sua concepo de
"politica"cultural.Ponho entre aspas para diferencia-la da
politica propriamente dita,que desagua na atividade partidaria e
se organiza em funcao da conquista do poder.
Candido descreve a conjuntura de 30: a polarizacao entre direita e
esquerda(fascismo e comunismo),a ditadura do Estado Novo aproximando liberais e
esquerdistas contra conservadores e fascistas,e a Guerra mundial onde as concepcoes
opostas se exarcebaram.

Nisso tudo Mario ficou sempre a esquerda,contra o


fascismo;depois,a favor dos aliados,contra o Eixo.Alguns
rapazes mais radicais procuraram entao obriga-lo a
manifestacoes concretas,contrarias ao seu temperamento
antipartidario,voltado sobretudo para os aspectos mais amplos
da conduta em sociedade.Ele sofreu com essas pressoes e nunca
se dispos a assumir atitudes de aspiracao
partidaria,porque,repito,a sua ,"politica" consistia em participar
atraves da atuacao na cultura,procurando torna-la o mais
difundida possivel sem barateamento".Para Candido,Mario de
Andrade definia "uma especie de esquerda efetiva,mas bastante
consciente do papel da literatura e da arte na promocao do
homem [...].

Carlos Sandroni,em "Mario contra Macunaima"(1988), realca uma caracteristica


fundamental na obra de Mario: "a constante preocupacao pelo autor em dar-lhe
funcionalidade social,imprimir-lhe uma dimensao coletiva,solidaria". Alm disso,
Sandroni (1988) utiliza o conceito de Gramsci de "organizador da cultura"para definir
essa "dimensao politica"da obra de Mario de Andrade: "Convem distinguir um tipo de
intelectual que atua diretamente sobre as condicoes em que os bens culturais sao
produzidos. Condies: instituicoes culturais,sistema de ensino ou difusao,padrao de
linguagem,gosto do publico,ideologias esteticas". A tentativa de influir conscientemente
sobre esses fatores e'o que permitiria caracterizar Mario de Andrade como "organizador
da cultura".
Para Gramsci,o "valor cultural"est ligado ao chamado problema "intelectual e
moral": inovacao do clima intelectual,'a critica dos costumes;portanto,a construcao de
hegemonia cultural.
Para Sandroni,Mario de Andrade assumindo o Departamento de Cultura nao se tornou
um "militante politico",mas um "organizador da cultura".O periodo de Mario a frente do
DC(1935-1937) nao pode ser visto como "um corte",mas como a culminacao de uma
trajetoria,como bem o demonstrou Avancini.
Entre 1922 e 1935,muita coisa mudou com os modernistas.Sandroni aponta 3
reflexoes:
1- Antonio Candido fala de "rotinizacao do modernismo"ocorrida entre 1920 e 1930;
2- Lafet abordou a "substituicao de um 'projeto estetico'por um 'projeto politico';
3- Eduardo Jardim remete a 1924 o momento desta ruptura:

Para os estudiosos do Modernismo no Brasil conhecida a


reorientaco do rumo do movimento a partir de 1924...A partir
de 1924,ano da publicaco por Oswald de Andrade do
Manifesto da poesia pau-Brasil,o ingresso na ordem moderna
foi concebido de modo novo.Ele passou a depender de uma
mediaco que consistia na afirmaco dos tracos culturais
locais,isto ,na definico do elemento nacional (Limites do
Moderno,1999).

Para Sandroni,duas revistas materializam cada uma das 2 etapas:


- "Klaxon",surgida em seguida a Semana de Arte Moderna,1922;
- "Revista do Arquivo Municipal",orgao oficial do DC.

50 Anos Depois!

Em "Duas derrotas,uma licao",Ina Camargo retoma a experincia do DC a epoca


de Mario,desta vez,relacionando com a gestao de Marilena Chaui,a epoca de Erundina a
frente da prefeitura paulista(1988-1992).

Durante a campanha para o segundo turno das eleicoes


municipais em Sao Paulo,criou-se um comite cultural de apoio
ao candidato petista.Antonio Candido compareceu a
inauguracao e,expondo as razoes de carater politico-cultural do
nosso interesse na vitoria de eduardo Suplicy,fez um rapido mas
importante balanco da administracao Luisa Erundina/Marilena
Chaui.Num dos topicos dava conta do fato -rigorosamente nao-
acidental- de ter sido essa administracao a primeira depois de
mais de meio seculo a retomar alguns dos mais importantes
aspectos do projeto de Mario de Andrade para o Departamento
Municipal de Cultura(MDC),como por exemplo as bibliotecas
Populares,os onibus-Biblioteca,o Projeto Gostar de Ler e a
tentativa de devolucao do Teatro Municipal a uma politica de
administracao publica,democratica e de alto nvel.

Mario de Andrade e Mariategui

Terminaremos este ensaio tracando afinidades entre Mario de Andrade e


Mariategui.Por que? Na America Latina,Mariategui representa a principal expressao
da "sensibilidade romantica anti-capitalista". A obra do "Amauta" porta muitas
"afinidades eletivas"com a obra de Mario de Andrade. Em "Na Ilha de Marapata",
Raul Antelo assinala as possiveis afinidades entre o autor de "Macunaima" e o dos "Sete
Ensaios":
Curioso seria pensar um intercomunicao efetiva entre o
autor dos Sete Ensaios de Interpretao da realidade peruana e
Mario de Andrade.Basicamente pela semelhanca de temas
discutidos:
.literatura americana face os modelos europeus;
.analise de cunho ideologico das tendencias literarias
contemporaneas da metropole (futurismo, surrealismo,
populismo, torre-de-marfim);
.periodizao literaria latino-americana em tres fases (colonial,
cosmopolita, nacional) e de acordo com um criterio moderno-
literario e no sociologico, no dizer de Mariategui;
.finalmente, as diferencas regionais entre as literaturas do
continente e os problemas de uma estetica nacional-
revolucionaria:indigenismo no Peru, primitivismo e literatura de
circunstancia no Brasil (Antelo)

A estas,acrescentamos a das afinidades entre a "imagem"de Macunaima e a


politica dos "Sete Ensaios",enquanto criticas a visao linear e etapista do marxismo
"vulgar". Prossegue Antelo:

Em ambos os casos, percebe-se a hesitao quanto os


modelos adotados:marxismo, irracionalismo bergsoniano,
pragmatismo de james, psicanalise, historicismo de Croce,
relativismo de Ortega y Gasset.Uma ideia como a do mito
multitudinario e unanimista encontra-se tanto em Mario de
Andrade(1893), quanto em Mariategui(1895), e ate_ mesmo em
Gramsci(1891).Poder-se-ia dizer, inclusive, que Vasconcelos est
para o peruano como Romain Rolland para o italiano. Tanto
Mario como Mariategui mostram um empenho quase
misssionario pelos problemas americanos, tentando a unidade
dialetica entre a especificidade nacional de analise e a
perspectiva metodologica internacionalista.

Sergio Buarque de Holanda em seu Raizes do Brasil,assinala:

Uma das conseqncias da escravido e da hipertrofia da


lavoura latifundiria na estrutura da nossa economia colonial foi
a ausncia, praticamente, de todo e qualquer esforo srio de
cooperao nas demais atividades produtoras,ao oposto do que
sucedia em outros paises,inclusive nos da Amrica espanhola.
Pouca coisa existiu ,entre ns, comparvel ao que refere um
historiador peruano a respeito da prosperidade dos grmios de
oficiais mecnicos j existentes no primeiro sculo da conquista
de Lima ,com alcaides jurados e vedores,taxa de jornais,exames
de competncia,inscrio,descanso dominical obrigatrio e
fundaes pias de assistncia mutua nas diversas confrarias de
mesteirais.

E que
No Brasil, a organizao dos ofcios segundo moldes trazidos do
reino teve seus efeitos perturbados pelas condies
dominantes:preponderncia absorvente do trabalho
escravo,industria caseira,capaz de garantir relativa
independncia aos ricos,entravando,por outro lado,o comercio
,e,finalmente,escassez de artificeis livres na maior parte das
vilas e cidades.

Sobre o artesanato, Buarque esclarece que:

Nos ofcios urbanos reinavam o mesmo amor ao ganho fcil e a


infixidez que tanto caraterizam,no Brasil, os trabalhos
rurais.(...).poucos indivduos sabiam dedicar-se a vida inteira a
um s mister sems e deixarem atrair por outro negocio
aparentemente lucrativo(...). Era esse um doss erios empecilhos
constituio ,entre ns, no s de um verdadeiro artesanato,
mas ainda de oficiais suficientemente habilitados para trabalhos
que requerem vocao decidida e longo tirocnio.

Deste modo,

O que sobretudo nos faltou para o bom xito e de tantas outras


formas de labour produtivo foi,seguramente,uma capacidade de
livre e duradoura associao entre os elementos empreendedores
do pais.trabalhos de ndole coletiva espontaneamente aceitos
podiam ocorrer nos casos onde fossem de molde a satisfazer
certos sentimentos e emoes coletivos,como sucede com os
misteres relacionados de algum modo ao culto religioso.

Sobre outros costumes,como muxiro e mutiro,tomados de prefencia ao gentio


da terra, fazem-no mais animados do esprito da caninha do que do amor ao
trabalho.Por outro lado,prossegue Buarque Holanda:

seria ilusrio pretender relacionar a presena dests formas de


atividade coletiva a alguma tendncia para a cooperao
disciplinada e constante.(...)tanto a competio como a
cooperao so comportamentos orientados,embora de modo
diverso,para um objeto material comum: ,em primeiro
lugar,sua relao com esse objetivo o que mantm os indivduos
respectivamente separados ou unidos entre si.(...) Em sociedade
de origens to nitidamente personalistas como a nossa,
compreensvel que os simples vnculos de pessoa a
pessoa,independentes e at exclusivos de qualquer tendncia
para a cooperao autentica entre os indivduos,tenham sido
quase sempre os mais decisivos(...)O peculiar da vida brasileira
parece ter sido,por essa poca,uma acentuao singularmente
enrgica do afetivo,do irracional,do passional,e uma estagnao
ou antes uma atrofia correspondente das qualidades
ordenadoras,disciplinadoras que parece convir a uma populao
em vias de roganizar-se politicamente.

Das ideiaideias de Razes do Brasil,sobre o passado do trabalho de


cooperao,entre ns,podemos concluir que esta modalidade de trabalho no permitiu o
surgimento de uma cultura e uma prxis da autogesto no pais.raramente,nos projetos e
programas dos grupos de esquerda,encontramos propostas de
autogesto.Possivelmente,como veremos,com o surgimento do movimento sindical de
corte anarco-sindicalista,surgiria no Brasil ideiaideias de ajuda mutua,cooperao,etc.

Antonio Candido: Os Parceiros do Rio Bonito

Em outro clssico do pensamento brasileiro, Os Parceiros do Rio Bonito,


Antonio Candido psquisou as formas de solidariedade existentes entre os caipiras. No
capitulo 4 (As formas de solidariedade),Candido define o que um bairo:

pode-se falar de autarquia,portanto,com referencia ao bairro;no


as relaes de famlia nos entido estrito.E um dos elementos de
sua caracterizao era o TRABALHO COLETIVO grifo
nosso - .Um bairro poderia,deste ngulo,definir-se como o
agrupamento territorial,mais ou menos denso,cujos limites so
traados pela participao dos moradores em TRABALHOS de
AJUDA MTUA grifo nosso-. membro do bairro quem
convoca e convovado para tais atividades.A obrigao bilateral
ai um elemento integrante da sociabilidades do frupo,que desta
forma adquire conscincia de unidade e funcionamento.Na
sociedade caipira a sua manifestao mais importante o
MUTIRO, cuja origem tem sido obketo de
discusses.Qualquer que ele seja,todavia, pratica tradicional.

Candido,ento, cita um exemplo descrito por DAlincourt,em 1818,entre Jundia


e Campinas:
(...) numa casa,em que,nesta ocasio havia um grande numero
de pessoas,de ambos os sexos;por ser costume juntaram-se
muitos para o trabalho,a que chamam muchiron,na linguagem
indiana; e assim passam de umas a outras casas, medida que
vo findando as tarefas: o trabalho consiste em prepararem e
fiarem algodo,e fazerem roados para as plantaes.Desta sorte
se empregam a gente pobre,nos meses de setembro,outubro e
novembro;e as noites passam-nas alegremente com seus toques
e folias.

Onde ocorrem os mutires ? Segundo o pesquisador:

As varias atividades da lavoura e da industria domestica


constituem oportunidades de mutiro,que soluciona o problema
da mo-de-obra nos grupos de vizinhana (por vezes entre
fazendeiros),suprimindo as limitaes da atividade individual ou
familiar.E o aspecto festivo,de qus e reveeste,constitui um dos
pontos importantes da vida cultural do caipira.

Mais adiante ,Candido,baseado em Plinio Ayrosa,define: o muchiro no


propriamente um socorro,um ato de amizade,um ato de salvao ou um movimento
piedoso; antes um gesto de amizade, um motivo para folgana, UMA FORMA
SEDUTORA DE COOPERAO grifo nosso- para executar rapidamente um
trabalho agrcola.
Assim,em relao a viso de S.Buarque de Holanda,a viso de A.Candido traz
nuances mais ricas:
A solidariedade vicinal aparece, todavia,mais nitida no trabalho
coletivo em que se convocam no uma,mas varias pessoas
para tarefas impossiveis de bem realizar de outro
modo.Distingue-se do mutiro ( alm de no ser sucedido de
festa) por implicar retribuio equivalente do beneficirio, que
neste caso considerado devedor,embora se reconhea
moralmente empenhado. Um e outro ocorrem em casos como
malhao de arroz e feijo,roada,construo de casas,limpa e
colheita de algodo.

Por sua vez, O mutiro pode ter como objeto qualquer das atividades descritas,
caractrizando-se,todavia,por no possuir o aspecto virtualmente contratual do trabalho
coletivo ou da troca individual de servio. O carter inevitvel da solidariedade
aparece nas formas espontneas de auxilio vicinal coletivo,segundo Candido,
modalidade particular do mutiro propriamente dito, em que

as tarefas de cooperao vicinal podem considerar-se


modalidades de trabalho associado, que os economistas da
escola histrica distinguem,com razo, do TRABALHO
DIVIDIDO grifo nosso-,e que ocorre quando vrios
indivduos se renem para realizar juntos um trabalho,cada um
efetuando a mesma tarefa que os eu vizinho [grifos nossos].
E,citando Franois Perroux,H,todavia,TRABALHO SIMPLESMENTE
ASSOCIADO ,quando cada agente econmico efetua a mesma tarefa sem ligao com
os vizinhos;e trabalho ebcadeado,quando os indivduos que fazem parte do mesmo
grupo ou equipe so submetidos ao emsmo ritmo(La technique du capitalisme, 1939).
Deste modo, como no caso do Brasil poderamos falar da existncia de uma
corrente autogestionria ? Nos parece que tivemos muito mais ,na linguagem de
Antonio Candido (A Formao da Literatura Brasileira) ,algumas manifestaes
decisivas para o que ,atualmente, poderamos chamar de um sistema ou rede
(intelectuais,movimentos,polticas pblicas,etc) com base na autogesto,ou,uma
corrente autogestionria.
E,tambm que, no h o que Candido chama de causalidade interna ,
intelectuais ou movimentos que passem a tocha para os que vm em
seguida,caracterizando uma tradio ou uma herana sistemtica.Outro elemento
importante a definio das fontes e matrizes destas primeiras manifestaes. Em que
experincias de outros paises se inspiraram os seus militantes. Assim,podemos marcar
alguns Mmomentos decisivos (A. Candido) deste processo em que podemos encontrar
elementos do Principio da Autogesto comunal.E,esse o campo das Lutas e
experincias Sociais,em que destacamos tres= a de Palmares e a de Canudos ,e a de
Formoso e Trombas.
=============================

Vamos, agora, abrir um parntese para o ensaio a que fiz referencia nas Notas
metodolgicas sobre Mario Alves e Gramsci.

MARIO ALVES E GRAMSCI:


A "revoluo democrtica ativa"

Mrio Alves...o mais brilhante


intelectual da direo do PCB. Sua
cultura no se limitava ao domnio do
marxismo e se estendia produo
acadmica e literatura. Escrevia com
elegncia e impressionava pela clareza
quase perfeita da exposio oral. Apesar
da graduao em cincias sociais, era um
intelectual antiacadmico e colocava
todo o pensamento a servio da pratica
(Jacob Gorender, in "Combate nas
trevas").

Tornou-se hbito, quando se fala em Gramsci no Brasil, nos referirmos a dois


ciclos gramscianos: no primeiro, esto as publicaes dos anos 60; o segundo, esto os
trabalhos a partir da segunda metade dos anos 70 at a metade dos anos 80. Nesta 1a
fase, Gramsci vinha desvinculado das perspectivas de transformao socialista, e mais
ligado as questes estticas. no segundo ciclo, que encontraremos produes que
tomam Gramsci como referencia para pensar a formao brasileira.
Emir Sader, na introduo Coletnea que organizou para "Brasiliense"
("Gramsci: Poder, Poltica e Partido, 1990), faz um balano da recepo do pensador
italiano em nosso pais.Vale a pena a longa citao:
No Brasil, os textos de Gramsci comearam a ser conhecidos no
transcurso dos anos 60. At ento a teoria poltica marxista se
limitava praticamente aos textos de analise histrica concreta de
Marx, a O Estado e a Revoluo e alguns outros escritos de
Lnin. A prpria crise da linha poltica encarnada pelo PCB e
pelo populismo getulista -assim como fenmenos internacionais
tais como a revoluco cubana e as divergncias sino-sovieticas-
produziram condices para o interesse por autores como
Gramsci, Trotski, Isaac Deutscher, Che Guevara. A difuso
desses autores, rcem-iniciada, foi cortada bruscamente pelo AI-
5 e a conjuntura de endurecimento maior da represso e da
censura, paralelas derrota da resistncia clandestina ditadura
militar.
Quando as condies para a continuidade de sua edio
reapareceram, a conjuntura poltica - nacional e internacional- j
era outra. O neoliberalismo estava em mar ascendente,
reproduzido no Brasil pela teoria do autoritarismo.Da o perfil
baixo das obras de Gramsci, reduzido - quando no silenciado- a
um terico da cultura ou adornando tentativas frustadas de
implantao do eurocomunismo no lado de baixo do Equador.
Quando a transio originada na crise da ditadura desembocou
num regime hbrido entre o velho e uma variante cabocla do
neoliberalismo, que batalha pela despolitizaco geral como
apangio da modernidade tecnocrtica, a luta pela construo de
uma alternativa democratica nacional e popular, centrada na
forca organizada dos trabalhadores, encontra na obra de Gramsci
propostas e sugestes nicas no conjunto do pensamento
poltico".
H uma polemica em torno a estas questes, matizada por ensaios de C.N.
Coutinho e de Edmundo F. Dias. Entretanto, no este o centro do nosso texto.
De qualquer forma, nem tanto a Deus nem ao Diabo. De um lado, o proprio
Coutinho assinala que
a recomendaco gramsciana de que "a tarefa fundamental era
nacional, ou seja, requeria um reconhecimento do terreno e uma
fixaco dos elementos de trincheira e fortaleza representados
pelos elementos da sociedade civil(...) [ esse terreno muda] de
Estado para Estado, como evidente, mas precisamente isso
requer um cuidadoso reconhecimento de carater
nacional"(Q,866).Sem negar os progressos realizados, cumpre
admitir que esse reconhecimento, no caso brasileiro,ainda est
em grande parte por ser feito.

De outra parte, um dos intelectuais hegemnicos no ciclo gramsciano


petista,Emir Sader, afirmou -em uma espcie de balano das esquerdas brasileiras neste
final de sculo-, que :
O texto mais inovador, que teve mais influencia, foi o do Carlos
Nelson Coutinho, sobre o valor universal da democracia. Em um
pais em que a democracia tinha sido uma quimera, em que nem
a esquerda havia enfrentado a questo democrtica em toda a
sua extenso e profundidade, esse texto representou uma
novidade radical. Ele fez o que devia fazer.No se pode esperar
que ele resolvesse todos os problemas que levantou. Houve
leituras que favoreceram uma concepo liberal da transio
democrtica, subestimando sua dimenso social. Essa era uma
leitura possvel do texto. A problemtica gramsciana chegava
por essa via, mas a esquerda no soube integra-la, enraizando na
nossa historia e na nossa luta social, poltica e ideolgica o
conceito de hegemonia, o que teria sido um diferencial marcante
na sua ao nos anos 80 e 90 (...) como muito bem observou
Jos Luis Fiori, a esquerda terminou entrando nos anos 80
desaparelhada para entender a profundidade da crise capitalista
no Brasil, includa a do Estado, esperando que a democracia
resolvesse todos os nossos problemas.

Contudo, aqum e/ou alm destes ciclos, podemos encontrar outros


revolucionrios brasileiros que, de forma no sistemtica e orgnica, usaram algumas
categorias gramscianas em suas anlises de aspectos da formao brasileira.
Neste sentido, gostaramos, especialmente, de explorar alguns elementos em
relao a Mrio Alves, dirigente do PCB e fundador e secretario-geral do PCBR.
Sobre Mrio Alves h uma "conspirao do silncio"; seu corpo est at hoje
desaparecido; suas ideiaideias, sua produo terica, no essencial, desconhecida e,
resgat-la no ser tarefa fcil. Na literatura da esquerda sobre o perodo da luta armada
contra a ditadura militar, pouco se fala sobre Mrio Alves. Por exemplo, uma
publicao do porte do "Dicionrio histrico-biogrfico Brasileiro-1930-1983", apesar
de trazer verbetes sobre Marighella, Mrio Pedrosa, Lamarca, Prestes, no h nenhum
sobre M. Alves.
Assim, quando se tenta reconstruir o pensamento do principal fundador e
secretario-geral do PCBR, apontamos neste texto um elemento importante de suas
ideiaideias: convergncia ou "afinidade eletiva" (M.Lowy) com o pensamento do
marxista italiano Antnio Gramsci; com o conceito de "revoluo passiva", mais
especificamente com o seu corolrio, isto , a critica da revoluo passiva: a "revoluo
ativa de massa" (A Adler).
No Seminrio intitulado Hegemonia y Alternativas Polticas en Amrica
Latina ( realizado em Morelia-Mxico,fevereiro 1980) , coordenado por Jos Arico.,
Emilio de Ipola e Liliana de Riz, em texto conjunto, citam Ch.Buci-Glucksman : a
teoria da revoluo de Gramsci aparece como uma contra-revoluo passiva ou uma
revoluo democrtica ativa.
S uma anlise mais rigorosa do conjunto dos escritos de M. Alves, poderia
determinar se essa afinidade uma intuio no sistematizada ou se foi desenvolvida de
forma orgnica e sistemtica em sua obra, ou se apenas um momento isolado da
mesma.
Em conversa no INCA com Jacob Gorender, seu companheiro desde a
juventude na Bahia, nos afirmou que Mario Alves dificilmente teria conhecido as obras
de Gramsci.
As anlises sobre Gramsci e o Brasil, passam pelos ensaios de Carlos Nelson
Coutinho. Neste sentido, quando Coutinho assinala " a presena de Gramsci no Brasil",
ou o "uso" de suas categorias na analise da formao social brasileira", aponta os nomes
de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes, Luiz Werneck Vianna, Marco Aurlio Nogueira,
etc., no que diz respeito ao conceito de "revoluo passiva". Coutinho destaca, tambm,
o "uso" da categoria de "via prussiana", como complemento de "revoluo passiva".
Sobre a relevncia desta categoria, remetemos aos trabalhos de Coutinho,
especialmente, o ensaio "As categorias de Gramsci e a realidade brasileira".
A partir deste patamar, nosso trabalho abordar os seguintes aspectos:
1. ampliar o leque de pensadores que utilizaram idas no campo deste conceito,
principalmente Mrio Pedrosa e Carlos Marighella;
2. abordar a "critica da revoluo passiva", atravs do conceito de "revoluo
anti-passiva", ou "revoluo democrtica ativa";
3. mostrar como este ultimo conceito est presente, de forma , digamos,
intuitiva-no sistemtica, em Mrio Alves.

GRAMSCI NO BRASIL

Para Coutinho,
Gramsci chegou ao Brasil no inicio dos anos 60... antes ningum
o conhecia efetivamente entre ns... o marxismo da poca tinha
como principais fontes "tericas" os manuais de "marxismo
leninismo'. Assim, nos escritos de Astrojildo Pereira, Caio Prado
Jr., Nelson Werneck Sodre "no h nenhuma meno sua obra
(de Gramsci)". Este s passou a ser conhecido no Brasil, no final
dos anos 50. Com as lutas populares de antes do golpe militar de
64, o marxismo se diversificou, "iniciou um processo, embora
ainda tmido, de abertura pluralista". Foi, ento, que surgiram as
primeiras referencias Gramsci por jovens intelectuais
comunistas, em publicaes culturais ligadas ou influenciadas
pelo PCB.

Neste "primeiro ciclo gramsciano" no Brasil, Coutinho assinala as seguintes


publicaes:
"ngulos" ( Salvador, numero 11, dezembro de 1961);
"Estudos Sociais" (Rio, numero 18, dezembro de 1963)
"Estudos Sociais"" (numero 17, junho de 1963)
Em 1962,Michel Lowy publica a primeira analise sistemtica sobre o
pensamento de Gramsci,na Revista "Brasiliense".
Ainda nos anos 60,temos os livros de Leandro Konder (Marxismo e Alienao,
de 1965) e "Os Marxistas e a Arte" (1967).
As "Cartas do Crcere" e a "Concepo Dialtica da Historia", foram publicadas
em 1966, pela Editora "Civilizao Brasileira", marcando o inicio das obras de Gramsci
no Brasil.
Destaca-se o artigo de Otto M. Carpeaux, "A vida de Gramsci" (Revista
"Civilizao Brasileira", n.7, maio 1966).
Por sua vez, na Amrica Latina, as edies "Lautaro" na Argentina, foram
pioneira na divulgao da obra de Gramsci. Por exemplo:
"Cartas desde el Carcel" data de 1950.
"Notas sobre Maquiavelo, sobre Poltica y sobre el Estado Moderno", data de
1962
"Los Intelectuales y la organizacin de la Cultura", data de1960
"El Materialismo Histrico y la Filosofia de Benedetto Croce", data de 1958
Juntos com "Literatura y Vida Nacional", estes livros constituram as "Obras
Escogidas" de Gramci, na Argentina. Traduzidos da edio Einaudi dos "Cadernos do
Carcere".
Este trabalho pioneiro foi obra de Jose M. Arico e Hctor P. Agosti, sobretudo,
este ultimo. Em 1959, Agosti lanou um livro em que utilizava Gramsci
abundantemente, sobretudo a categoria de "hegemonia". Trata-se de "Nacin y
Cultura", ediciones Projecyn. Este livro era de conhecimento de Astrojildo Pereira: em
1961, Agosti dedicou um exemplar ao comunista brasileiro, onde se l a seguinte
dedicatoria; "Para Astrojildo Pereira, fraternalmente. 21 marzo 1961".
Jos Arico em "Genealogia de uma leitura" nos fala de um texto do escritor
argentino, Ernesto Sabato, "provavelmente o primeiro comentrio em espanhol
dedicado a resgatar a figura de Antonio Gramsci como pensador e revolucionario.Foi
publicado em 'Realidad', a revista de ideiaideias que entre 1947 e 1949 animou Buenos
Aires...".
O texto de Sabato intitulou-se "O Epistolario de Gramsci", em que aborda as Lettere del
Carcere (Turin, Einaudi,1947", ento premiadas com o Premio Viareggio. Sabato
explicita o plano de Gramsci para os "Cadernos do Carcere".
Sobre Hector Agosti, Arico esclarece que "foi em seu livro sobre
'Echeverria'(Futuro,1951) onde pela primeira vez um escritor utilizou as categorias
analiticas de Gramsci para examinar uma poca determinada de nossa historia
nacional". Para Arico, neste livro, Agosti usou "elementos de um esquema
interpretativo que no s evoca Gramsci,seno que nos tres primeiros capitulos
fundamentais de seu livro se nutre abundantemente das ideias e das expresses deste".
A obra escrita de Agosti abarca uns 20 livros,cobrindo um espectro cultural
muito amplo: historia, literatura, estetica, jornalismo. Alm do 'Echeverria" e "Nacion y
Cultura", destacam-se,por sua inspiraco gramsciana,o 'Informe ante la primera
Conferencia de Intelectuales Comunistas(1956) e 'Ideologia y Cultura'(1979).
Entretanto, antes das ideiaideias de Gramsci, em nvel de publicaes, formarem um
"sistema" no Brasil, ocorreram "momentos decisivos", fragmentados e dispersos.
Parafraseando Antonio Candido. Por exemplo:
Dainis Karepovs assinalou a existencia de "referncias Gramsci j nos anos
30: uma brochura de Romain Rolland, "Os que morrem nas prises de Mussolini; A
Gramsci", traduzida no Brasil pela "Udar", So Paulo, 1935. Gramsci aparece, tambm,
em um artigo publicado no jornal "O Homem Livre" (dirigido por Mrio Pedrosa),
assinado por Gofredo Rosini, militante da "Oposio de Esquerda do PCB", intitulado
"Enquanto se prepara o "raid" de Balbo" - como se assassina A Gramsci" (nmero 4, de
17/06/1933).
Em 1947, a revista "Literatura",ligada ao PCB,publica um texto de E.Carrera
Guerra sob "As Cartas de Gramsci".
A atriz Leila Abramo, revela que por volta de 1950,vindo da Itlia trouxe a
edio italiana das "Cartas do Carcere" e os volumes j publicados dos "Cadernos "de
Gramsci; A encomenda era para o trotskista Hilcar Leite.

Mario Alves e Gramsci

Seria provvel que Mrio Alves tivesse conhecimento deste panorama das obras
gramscianas, principalmente, por sua atividade como jornalista e terico do PCB. Ser,
precisamente, na Revista "Estudos Sociais"que escrever o texto que analisaremos
adiante.
C. N. Coutinho, analisando a questo da "revoluo passiva" na obra de Caio
Prado Jr, aponta seus "limites" justamente em "no ter captado os elementos "ativos" no
processo social, o que lhe teria permitido avanar para "revoluo ativa". Afirma
Coutinho que "as analogias entre o Risorgimento italiano e os eventos que constituem o
processo de Independncia e da consolidao do Estado Imperial no Brasil so
significativas, assim, no casual que Caio Prado Junior, escrevendo sobre esses
eventos em 1933 - no mesmo momento, portanto em que Gramsci elaborava seu
conceito de "revoluo passiva"- tivesse chegado a resultados muito semelhantes aos do
pensador italiano".
Caio Prado, estudando movimento populares, como a Balaiada, "se refere 'a
presena em tais elementos de um 'subversivismo espordico e elementar'. Assinala
Coutinho que "Caio Prado indica na ausncia da auto-organizaco e da coeso dos
grupos sociais subalternos, o que os impede de tornarem-se atores polticos efetivos, as
razes da derrota de uma via 'jacobina' para resoluo de nossa questo nacional".
Assim, "Caio Prado Jr. Lanou os fundamentos para uma adequada compreenso
marxista da via no clssica de transio no Brasil para o capitalismo", contudo, "pagou
um tributo s concepes terceiro-internacionalistas da democracia".
Em relao a Florestan Fernandes, C. N. Coutinho assinala que ele usa o termo
de "contra-revoluo prolongada", que outra terminologia para "revoluo passiva".
Nos anos 70, aponta diversos autores: Luiz Werneck Vianna, Jos Carlos Brum Torres,
Marco Aurlio Nogueira, etc.
Um antigo ensaio8 aborda as afinidades entre Mario Alves e Gramsci,
sobretudo em relao ao conceito de revoluo ativa de massa, o corolrio do
conceito gramsciano de revoluo passiva. Alm disso, a experincia de Mario Alves
no PCB dos anos 1950 foi fundamental na sua viso da relao Partido - Massas. Mario
Alves foi um dos autores de textos que refletiam o acmulo de foras atravs das
experincias rurais dos anos 1950 desenvolvidas pelo PCB: Repblica de Formoso e
Trombas, Guerrilha de Porangatu, ambas em Gois e Revolta de Porecatu no Paran.
Em seu livro sobre Formoso e Trombas, Cunha mostra que: [X3] Comentrio: Buscar ano desta
obra. Incluir nas referncias: CUNHA,
Paulo Ribeiro.

Como indicativo dessa reflexo militante e desse


esforo de interveno, temos os Textos dos anos
60, (A questo agrria no Brasil,1980), conjunto de
ensaios elaborados nesse fertil perodo histrico de
incorporao terica e pratica das experincias
acumuladas dos anos 50 por vrios intelectuais
pecebistas, entre eles Mario Alves, Nestor Vera, Rui
Faco, Carlos Marighella, grupo esse que ficou
conhecido por Corrente Esquerdista de
Vanguarda,todos com uma longa ao militante no
movimento comunista e no movimento social.

Nos textos de Mario Alves reconhecemos afinidades com categorias


gramscianas 9.
Para Paulo Ribeiro, em sua obra Aconteceu Longe Demais:

8
Mario Alves e a revoluo antipassiva, Cludio Nascimento - Revista Brasil Revolucionrio So
Paulo: IMA Instituto Mario Alves de Estudos Polticos, 1993
9
Ver tambm O labirinto Gramsciano Gramsci e a Questo da Hegemonia (mimeo)
O objetivo desse debate era a superao e a crtica
necessrias a uma nova compreenso sobre a
questo agrria no Brasil e o papel do campesinato
no processo revolucionrio em que, particularmente
nos ensaios de Mario Alves, Nestor Vera, o
campons adquire centralidade. Nestas leituras,
havia uma reavaliao de alguns aspectos que
comeavam a ganhar relevncia no debate poltico
poca, ou seja, o papel a ser desempenhado pela
burguesia e a questionabilidade da luta armada
(p.44).

Paulo Ribeiro ressalta e utiliza conceitos gramscianos para entender alguns


elementos da experincia de Formoso e Trombas tais como: conselhos, hegemonia,
guerra de posio, guerra de movimento, partido. E podemos mesmo falar de formas
comunais de ao solidria, de autogesto nos mutires (traio), na Associao
dos Lavradores e Trabalhadores Agricolas e sobretudo nos 25 Conselhos de
Crregos fundados pelos atores da experincia.
Paulo Ribeiro remarca:

Talvez possamos sugerir - na linha do exposto na Introduo


deste trabalho - que essa concepo de partido, Associao,
Conselho esteve muito prxima de um enfoque gramsciano
sem Gramsci.

Sem dvidas, Alves incorporou elementos dessa experincia na construo,


primeiro da Corrente Revolucionria e , logo em seguida, do PCBR, do qual foi
fundador e secretrio-geral no final dos anos 1960.

Mario Pedrosa e Carlos Marighella

Carlos Marighella utiliza a expresso de "via prussiana", ao passo que Mrio


Pedrosa explicita, em texto de 1930, de forma brilhante e no campo conceitual do
trotskismo, o carter "passivo" da burguesia brasileira. Em sua "Opo Brasileira"
(1966), Pedrosa traa no capitulo IV, elementos importantes sobre a historia poltica do
Brasil. Usando o conceito de "Bonapartismo", prximo ao de "revoluo passiva",
Pedrosa nos apresenta uma analise prxima ao instrumental gramsciano.
Mrio Pedrosa, ento, cita a analise de "um grupo de jovens marxistas", de
tendncia trotskista, que tentou uma anlise da situao brasileira de 1930. Este texto foi
publicado no nmero de fevereiro-maro da revista "La Lutte de Classes", dirigida por
Pierre Naville.
Este artigo analisa a natureza da burguesia brasileira e mostra que "o enigma da
burguesia brasileira era que nasceu no campo e no nas cidades", assim, "politicamente,
como se sabe, os fazendeiros de caf foram vencidos pela revoluo de 30, cuja tarefa
econmica profunda, embora talvez no consciente, era abolir a hegemonia do
fazendeiro de caf sobre o poder central. A revoluco, porm, no pode completar sua
obra... A burguesia industrial, nascida em grande parte de capitais acumulados na
exportao capitalista do caf, no fez contra ela - a burguesia cafeeira - nenhuma
revoluco; fez com ela um acordo,uma espcie de comodato para juntas,como classe
dirigente desfrutarem o Estado... O tipo social do burgus dominante no Brasil
bifrontal, como uma personagem mtica: ele proprietrio da terra, de um lado, e do
outro, proprietrio do capital... Na base de toda ligao entre agrrio e industriais, uma
condio criada no Brasil, est uma pressuposio essencial: a preservao da
intocabilidade da estrutura agrria... Esperar o surgimento de um conflito fundamental
de classe, que alinhasse os industriais contra seus velhos aliados, seus descendentes, era
esperar milagre... na verdade, se fosse necessrio buscar uma analogia histrica para
situar as posies da burguesia rural e da burguesia industrial do Brasil, seria naquela
"pacifica interpenetrao" verificada na Inglaterra depois da revoluo extremamente
violenta de Cromwell... O processo brasileiro no foi de fuso aps uma revoluo
como na Gr Bretanha (esta sim, democrtico burguesa acabada), mas de membros de
um mesmo tronco familiar que partem para estabelecer suas vidas e negcios em
diversas partes".
Portanto, os autores do texto, Mrio Pedrosa e Livio Xavier, na mesma poca em
que Caio Prado Jr. fez seu trabalho, nos oferecem uma anlise prxima ao campo
conceitual de Gramsci.
Mrio Pedrosa, em seu exlio nos EUA,durante o Estado Novo,voltaria a usar
categorias gramscianas. Desta feita, para analisar todo um longo peridodo histrico
como caracterizado pela "revoluco passiva" ou na sua maneira de falar "reformas
contra-revolucionarias", as quais ope as "reformas revolucionarias".
PEDROSA caracteriza, ento, todo o perodo do ps-Guerra como de "reformas
contra-revolucionarias" e, neste aspecto, junta-se a viso de Giuseppe Vaca, que anos
aps a anlise pedrosiana, chama o mesmo perodo de "ciclo da revoluo passiva"
(L'URSS staliniana nell "nalisi del "Quaderni del crcere", in "Critica Marxista", 1988
e, "Gorbacev e la sinistra europea, Editori Riuniti, 1989).
Alis, em sua Tese sobre "Vanguarda Socialista", jornal dirigido por Pedrosa
aps sua volta dos EUA, Isabel Loureiro mostrou a influencia de Gramsci no
pensamento do autor de "A Opo Brasileira".

Parece pertinente aproximar o conceito de 'ditadura social' de Pedrosa do de


'guerra de posio' de Gramsci, tal como foi lido pelo Eurocomunismo.Na sua "Opco
Imperialista", Pedrosa cita de Gramsci, a "Antologia degli Scritti", editori Riuniti,
Roma,1963, que pode ser encontrada no seu Cafernaum ,hoje arquivado na Biblioteca
Nacional,no Rio de janeiro.
Em seu longo exlio norte-americano, Pedrosa travou conhecimento com a
chamada tendncia "Johnson-Forest", pseudnimos de C. L. R. James e Raya
Dunayevskaya, respectivamente. Pedrosa era muito prximo politicamente de James,
pois tinham participado, como delegados, da fundao da IV Internacional, em 1938
,em Paris. Deslocaram-se para New York ,enquanto membros da direo da Quarta,
ainda em 1938.
Esta tendncia marcou uma nova analise da natureza da URSS. Seu universo
politico-intelectual est marcado por Rosa Luxemburgo, o "Jovem Marx", os Conselhos
Operrios. Iria influenciar o grupo que se chamaria,na Franca, "Socialismo e Barbrie",
dirigido por Castoriadis e Claude Lefort.
sintomtico que,os exemplos de revolucionrios brasileiros, ora apresentados,
centram-se na questo da reforma agrria, na relao latifndio burguesia. Esta uma
questo central para democracia poltica e social no Brasil.
Por sua vez, Marighella utilizando o conceito de "via prussiana" afirma que "As
contradies entre as forcas produtivas e as relaes de produo chegaram a um ponto
crucial. Elas nos do a caracterizao no Brasil de um desenvolvimento moda
prussiana, sob a ao e a influencia do imperialismo". Neste texto, Marighella detm-se
de forma minuciosa na analise da renda da terra no Brasil, especialmente, nas culturas
do caf, algodo e cana. Apenas no final do texto, tenta uma viso explicativa da
questo na sua totalidade.Cita, ento, de Lenin "O Desenvolvimento do Capitalismo na
Russia", de Marx "O Capital", e de Leontiev "A Economia Poltica".
Mesmo que o fundador e dirigente da ALN no amplie o conceito de "via
prussiana" aproximando-o da "revoluo passiva", importante sua contribuio no que
diz respeito a este tema.
Vejamos agora os conceitos gramscianos intuidos por Mario Alves.
Gustavo Falcon escreveu um livro sobre o fundador do PCBR,Do reformismo
luta armada.A trajetria politica de Mario Alves, 1923-1970.Pelo que sabemos, a
nica obra escrita sobre M.Alves.
Falcon nos apresenta o depoimento de um contemporneo de M.Alves
,importante para termos uma ideia de seu aspecto intelectual:
Ao lado da atividade pratica (Mrio) sempre mostrou um grande pendor pelos
estudos tericos centrados na realidade brasileira, nas experincias do movimento
operrio. Sabia vrias lnguas e era um leitor insacivel.Com notvel facilidade de
exposio, voz clara e cheia, expunha numa linguagem acessvel as teses doutrinarias
que orientavam sua atividade. Era todo intelectual, at no fsico: mope, muito magro,
tinha um certo ar monacal. Poderia passar por um mstico que, como Inacio de Loiola
juntasse a f ao: mas detestava o misticismo.Sua produo intelectual se dissolveu
nos artigos para a imprensa partidria, nos informes, nas teses. Essa limitao impediu
que sua lucida inteleigencia desse o que era de esperar dela.A militncia sujeita a um
rigor absoluto pela fria da represso, pelos rachas, pela luta polticia exarcebada, como
que matou o intelectual antes de levar morte o prprio homem.(Moacir Werneck de
Castro).
A importncia de Mrio Alves, reside em ter captado a dinmica ou a "dialtica
da revoluo passiva", se bem que de forma no-sistematica, atravs da critica pratica
da "revoluo passiva" presente nas lutas de massa do perodo anterior ao golpe militar
de 64. Neste sentido, sem utilizar a terminologia gramsciana e sem uso sistemtico,
opera com o conceito "revoluo ativa de massa".
Entretanto, como encontramos, a partir de Gramsci,este conceito de "revoluo
anti-passiva"?
Especialmente nas anlises de C. Buci-Glucksmann e F. Felice, a partir do
Colquio de Florena -1977, destaca-se o conceito de "revoluo passiva" nas obras de
Gramsci, como categoria fundamental da cincia poltica, ampliada em sua
operatividade e enriquecida de novas determinaes.
Alguns analistas da obra gramsciana tinham em baixa relevncia essa categoria,
por exemplo, M.A Macchiocci afirma que "para Gramsci esta expresso de 'revoluo
passiva' tem um sentido pejorativo". Os trabalho de C.B.Glucksmann recuperaram e
projetaram uma nova dimenso estratgica da categoria gramsciana. inclusive, indo
"alm de Gramsci', ao desenvolver a categoria de "revoluo anti-passiva".
Este ultimo conceito, enquanto critica da revoluo passiva, nos permite
assinalar os "momentos organicos"na historia das classes subalternas, em que se
manifestam novas formas de democracia de base, de auto-organizaco, independncia e
autonomia de classe.
A revoluo ativa de massa caracteriza-se pela construo do "consenso ativo",
que repousa na capacidade de uma classe tornar-se hegemnica. Para C. B. Glucksmann
"a estratgia da hegemonia como expansiva, como anti-revoluco passiva, no visa a
constituio de sujeitos por imposio e/ou interpelao ideolgica; ela deve produzir
sujeitos atravs das prticas polticas que permitam o autogoverno democrtico das
massas: a autogesto".
O j citado Seminrio de Morelia , teve como eixo de debates o tema da
Hegemonia, em relao a transformao social na Amrica Latina. Nesse sentido,
delineia-se uma perspectiva de analise da historia politico-social do Brasil, numa linha
de critica da revoluo passiva. Pensamos que Mrio Alves traou elementos
importantes neste sentido, ao assinalar os elementos de auto-organizaco e
independncia de classe nas lutas dos subalternos.
Sem dvidas, Mario Alves levou uma grande vantagem em relao ao perodo
que Caio Prado Jr. analisou. Foi um momento muito diferente daquele que foi objeto da
anlise de Caio Prado nos anos 30. O perodo em que M.Alves analisa a reforma
Agrria, os camponeses, estudantes, trabalhadores apresentavam em sua prxis
elementos de auto-organizao, autonomia, ativos e revolucionrios. Como foi dito, o
perodo da analise de Caio Prado, imperavam os "elementos no ativos", o
"subversivismo molecular". Este perodo, as dcadas de 50 e 60, nas palavras de
Antnio Cndido (analisando uma tese sobre o cinema brasileiro) caraterizado como:

[...] Descreveu o ltimo momento em que a cultura burguesa


reinou incontrastada no Brasil como sendo 'a cultura'. O ltimo
momento em que a cultura 'que fosse boa para a burguesia era
boa para todos'. At ento no se tinham manifestado
visivelmente fora da burguesia forcas que impusessem 'culturas'
paralelas. No fim do decnio de 50 e comeo de 60 a coisa
comeou a mudar. Naquela altura comeamos a ver no Brasil,
no de maneira isolada, atravs de vanguardas, mas como
grandes movimentos de estudantes, populares e intelectuais, um
esboo de processo muito mais intenso, capaz de interessar
setores mais vastos da sociedade em seus diversos nveis A este
respeito se poderia falar realmente de um tipo de cultura que,
embora protagonizada por pessoas que na maioria eram de
origem burguesa, ou melhor, de classe media, estavam
procurando se desprender dos interesses e mesmo de muitos
valores mais especificamente burgueses. Refiro-me a coisas
como o cinema novo, as tentativas de teatro popular,as
caravanas Freire e o avano infelizmente logo cerceado do
admirvel governo de Miguel Arraes. O fenmeno foi to
importante que os poderes competentes tomaram providencias
imediatas... A partir de 1o de abril de 1964 tais providencias
foram drsticas em relao a tudo isso, a todo esse esboo de
movimento cultural paralelo e at certo ponto antagnico ao da
burguesia.

Florestan Fernandes tambm depe sobre esta poca:

Tenho a impresso de que este perodo que vai de 64 a 68 foi o


perodo de verdadeiro amadurecimento da luta por uma
democracia real no Brasil. As contradies se uma sociedade de
classes apareceriam de forma mais profunda,no caso da historia
do Brasil... realmente a sociedade brasileira vivei,naquele curto
perodo de tempo, a tal fase pr-revolucionaria que alguns tinham
colocado no inicio da dcada de 60.

Dois Caminhos da Reforma Agrria: revoluo passiva ou revoluo ativa


de massa
Em texto publicado na Revista "Estudos Sociais" (junho de 1962), Mrio Alves
analisa a reforma agraria no Brasil, assinalando a via da "revoluo anti-passiva".
Assim,

Tomando conscincia de seus interesses reais, os homens


explorados do campo avanam no caminho da luta de sua
organizao, realizam seus Congressos independentes, travam
combates paricias contra o latifndio (Formoso, Galilia, Santa
F, Sap) e irrompem na vida poltica do pais como uma forca
revolucionaria cada dia mais atuante e disposta a anular os
privilgios seculares dos latifundirios.

Assinalando, portanto, a ao revolucionaria dos subalternos, Mrio Alves capta


a dialtica da revoluo anti-passiva. Em relao a este processo das classes subalternas,
afirma: "setores ponderveis das classes dominantes procuram encontrar formulas que
modifiquem a situao no campo sem afetar substancialmente os seus interesses.
Dispem-se a seguir o caminho das concesses, com o intuito de obstar a soluo
revolucionaria do problema da terra".
Sem uso da terminologia de Gramsci, Mrio Alves pe claramente o espirito da
revoluo passiva da burguesia-latifundio. De forma mais clara e eloqente, o dirigente
do PCBR finaliza sua analise afirmando que:

O bloco das classes dominantes que predomina no poder,


composto por burguesia e latifundirio aburguesados, trata a
seguir da via das transformaes lentas e graduais, realizadas
exclusivamente de cima para baixo, atravs de compromissos e
concesses mtuas entre o capitalismo ascendente e a
propriedade latifundiria. Este curso da reforma agraria pretende
excluir a participao ativa e independente das massas
camponesas,precisamente porque se contrape aos seus
interesses fundamentais e se orienta em funo dos interesses da
burguesia e dos latifndios que empregam processos
capitalistas.

Conclui: "A natureza profundamente antidemocrtica da pretenso revela-


se,assim,no fato de que os maiores interessados na transformao da estrutura agraria
acham-se totalmente excludos dos rgos incumbidos de execut-la". Mrio Alves,
avana a outra via, a da revoluo ativa de massa:

outro o caminho que corresponde aos interesses dos


camponeses e do povo brasileiro, no o do compromisso com o
latifndio, mas o da luta revolucionaria para transformar
profundamente a estrutura agrria [...] Deve ser uma reforma
que altere basicamente as relaes sociais no campo e asseste
um golpe demolidor na classe caduca dos latifundirios. Este
curso exige a ao independente das massas camponesas, em
aliana com a classe operaria e todas as forcas progressistas [...]
A reforma agraria s poder ter xito e vencer eficazmente os
obstculos opostos sua concretizao se for baseada na
mobilizao consciente das massas do campo atravs de suas
organizaes [...] A luta pela reforma agraria radical se funde,
portanto, com a luta por um novo poder poltico efetivamente
democrtico [...]. Os camponeses, os operrios, o povo
brasileiro,esto por uma reforma que seja uma revoluo.
Mrio Alves assinala que "O I Congresso Nacional dos Lavradores e
Trabalhadores Agrcolas, realizado em novembro de 1961, formulou os princpios
gerais sobre o carretar dessa profunda transformao na estrutura economico-social do
pais".
O Projeto Poltico de Mario Alves para o PCBR

Nosso papel consiste em elaborar,de


modo autnomo,a orientao
revolucionaria adequada s condies
brasileiras [...] (Mario Alves)

O PCBR foi fundado na 1a Conferencia Nacional,em abril de 1968,em que foi


aprovada sua Linha Poltica.Este documento,tudo indica,foi redigido por MA.
Vejamos alguns aspectos centrais,com foco na parte 3,intitulada de O caminho
revolucionrio no Brasil:
Como quase todas as organizaes da poca, defende-se a luta armada como
forma principal da tomada do poder.Nos interessa mais o processo,ou seja,as formas
de luta e de organizao.
No curso do processo revolucionrio, preciso coordenar varias
formas de lutas de massas,pacificas e no-pacificas,legais e
ilegais.As formas de ao legais ou pacificas devem ser
utilizadas para desenvolver o movimento popular,mas com
emprego exclusivo de tais meios a revoluo no pode ser
vitoriosa.A violncia reacionria s pode ser vencida com a
violncia revolucionaria.Todas as demais formas de luta devem
servir ao desenvolvimento da luta armada e no lhe constituir
obstculo (...)
Colocar a luta armada,sob a forma de guerra de guerrilhas,como
tarefa principal,no exclui mas,pelo contrario,acentua a
necessidade de impulsionar o movimento de massas nas cidades
e no campo.
Em nosso pais,devido existncia de uma industria
relativamente desenvolvida,as grandes concentraes operarias
podem e devem constituir as bases fundamentais do movimento
revolucionrio nas cidades.De outro lado,a luta armada no
campo s poder ter xito se contar com o apoio das massas de
camponeses e trabalhadores agrcolas.
Ao mesmo tempo que preparam e desencadeiam a ao
guerrilheira,cabe,portanto,s foras revolucionarias a misso de
desenvolver as lutas das massas trabalhadoras da cidade e do
campo por seus interesses vitais,contra a ditadura e por
transformaes radicais da sociedade.A luta de guerrilhas dever
entrelaar-se com as greves econmicas e polticas da classe
operaria, com aes camponesas pela terra,com manifestaes
de rua dos estudantes,dos trabalhadores e de todo o povo.(...)
Dentro dessa concepo e ao contrario do que prega a
chamada teoria do foco -, a luta armada no constitui um
processo independente que se baste a si memso.
A mobilizao do povo contra a ditadura e o imperialismo exige
a unidade das foras populares.A frente nica popular,que se h
de forjar no fogo da prpria luta,incluir
operrios,industriais,trabalhadores agrcolas e
camponeses,estudantes e intelectuais,setores das classes
medias,grupos religiosos progressistas,elementos das foras
armadas etc.Esta frente nica ser realizada atravs das aes de
massas e da luta armada ,e no por meio de conchavos de
cpula.por seu contedo social ,dever representar a grande
maioria da nao, excluindo a burguesia e os latifundirios que
constituem a minoria reacionria dominante.Mas s poder ser
conseqente se tiver por base um slido ncleo de foras de
esquerda.(...)
A acumulao de foras e mobilizao das massas exigem a
combinao das formas legais e ilegais de luta e
organizao(...)Devem dotar as organizaes revolucionarias de
uma slida estrutura clandestina,preparando-se para uma luta
rdua e prolongada(...)Entretanto,a necessidade de ligao com
as massas impe a utilizao de todos os meios legais de luta ,de
propaganda e de organizao,que forem viveis nas condies
da ditadura.Cumpre participar dos sindicatos e de outras
organizaes de massas,mesmo que se achem sob controle
reacionrio (...)

No ponto abaixo,MA fala do que depois passou a se chamar de Organizaes


Autonomas de Massa:
O critrio fundamental de organizao das foras populares deve
ser o da organizao pela base,isto ,a criao de organizaes
de massas nas empresas, fazendas,escolas,nos lcoais de trabalho
e residncia.As organizaes de cpula so necessrias apara a
coordenao dos movimentos coletivos,mas o centro de
gravidade de todo o trabalho deve estar nos organismos de
base,diretamente vinculado com o povo.Neste terreno, a ateno
principal dos revolucionrios deve voltar=se para o
funcionamento de organizaes operarias nas empresas e de
organizaes camponesas nas fazendas e povoados.

No ponto seguinte,sobre o Partido de Vanguarda Marxista-Leninista,MA volta a


enfatizar a relao com a base:
Ao empreendermos a reconstruo do Partido,devemos ter em
conta que a tarefa principal a luta armada- s poder ter xito
se for entrelaada com o movimento de massas na cidade e no
campo.(...)Da a necessidade da estruturao partidria nas
fbricas e nas minas,nos transportes e vias de comunicao,nas
fazendas,nos bancos,nas escolas e nos quartis,nos bairros
operrios e populares.
O fato de Caio Prado Jr., Mrio Alves, Mrio Pedrosa, e tantos outros, operarem
com categorias que se situam no universo temtico gramsciano, estabelecendo
determinado tipo de "afinidades", expressa a riqueza e mesmo a universalidade das
categorias do marxista italiano, tais como: hegemonia, bloco histrico, revoluco
passiva, etc., que funcionam como princpios gerais da cincia poltica. Da, a
atualidade de seu pensamento.
Neste sentido, Caio Prado Jr., Carlos Marighella, Mrio Alves, Mrio Pedrosa,
cada um com suas particularidades, junta-se ao primeiro marxista da Amrica latina,
Jos Carlos Mariatgui, para quem "o socialismo latino-americano no deve ser cpia
nem imitao, mas criao herica". Mariategui foi quem realizou o primeiro contato
da America Latina com Gramsci. No por acaso, cedo ou tarde, eles se enfrentaram ao
marxismo dogmtico stalinista.
Apesar da curta experincia de M.Alves frente do PCBR, de abril de 1968 a
janeiro de 1970, foi possvel construir uma nova viso da relao partido-massa. Neste
perodo, M.Alves realizou algumas viagens pela Europa, as quais lhe permitiram a
observao de novas experincias, por exemplo, a Primavera de Praga na
Thecoslovaquia, as lutas de trabalhadores na Itlia do Outono Caldo dos Conselhos
Operrios e tambm em Cuba, ainda sob a paixo de Che Guevara.
No livro de Falcon podemos ler que Mario foi o primeiro membro da direo
do PCB a visitar oficialmente Cuba em 1961, juntamente com Roberto Morena, a
convite das Ligas camponesas, cujo transito com Fidel era livre.(p.216)
O ano 1968 tambm deve ter provocado em Alves novas questes. Alm disso,
ainda nos anos 1950, ele esteve na URSS precisamente na poca do XX Congresso do
PCUS e da Revoluo dos Conselhos na Hungria. Este caldo poltico e cultural lhe
permitiu construir uma nova concepo do papel do Partido e das Organizaes de
Massa dos Trabalhadores.
Mario Alves tambm visitou a China de Mao Tse Tung, no mesmo perodo em
que esteve na URSS, observando uma outra concepo da construo do socialismo. Na
verdade, tudo isto so hipteses, muito provveis. A sua morte assassinado no DOI-
CODI em janeiro de 1970, dificultou tudo isto.

Biografia e/ou algumas hipteses sobre Mario Alves.


A partir da entrevista que concedi ao pesquisador e coordenador do Instituto
Mario Alves de Pelotas/RS, Renato Della Vechia, com o objetivo de fornecer
elementos para sua Tese acadmica, sobre M.Alves: entre o leninismo e a autonomia,
tracei as seguintes hipteses sobre as origens do pensamento poltico do fundador do
PCBR.
MA nasceu em 1923, na vila de Santo S, Bahia, no polgono das secas. Foi
assassinado em 1970, no DOI-CODI RJ.
Em Salvador, capital da Bahia, MA entrou para o PCB, com a idade de
15anos,isto , em 1938. Participa da famosa Conferncia da Mantiqueira em 1943.J
estudava na faculdade de Filosofia, Cincias e Letras. Aos 22 anos [em 1945] foi eleito
para direo estadual do PCB.Em 1947, fugia com sua esposa Dilma, para o Rio de
Janeiro, pois o PCB estava outra vez na ilegalidade. Em novembro deste ano, nascia
Lucia,sua filha.
Fugindo da represso, MA foi morar em SP, onde trabalhou com Jacob
Gorender, na Revista " Problemas". Esta era dirigida por Digenes Arruda e, receberia o
reforo de Apolnio de Carvalho, recm chegado das lutas na Europa, heri da Guerra
Civil Espanhola e da Resistncia Francesa.

Em 1953, MA visitou a URSS, junto com Apolnio de Carvalho e um grupo de


militantes do PCB.Objetivo: participar de um curso sobre o marxismo e conhecer a
experincia sovitica.
Na volta, conversaria com Gorender , que tambm viveu na URSS de 1955 a
1957.
1953 foi o ano da morte de STALIN e das primeiras greves no
Leste,sobretudo,em BERLIM.
Em 1953, no Brasil houve uma greve em SP, de 300 mil operrios. Gorender era
do Comit Estadual e, responsvel nas fbricas de Santo Andre.
Em 1954, foi o suicdio de G VARGAS e, tambm, do IV Congresso do PCB,no
ms de novembro.
Vrios jovens entram no CC,entre eles, MA, Apolnio e Gorender.
Em 1956, com o XX Congresso do PCUS, e a divulgao do RELATORIO
KROUSCHEV ,ocorre a luta interna = uma linha ortodoxa defendia a manuteno da
linha do partido; outra corrente, defendia a dissoluo do partido; MA estava numa
terceira corrente, que defendia mudanas na poltica do partido.
Gorender retornou da URSS em 1957,quando a questo j estava definida.
Prestes e Giocondo formaram uma Comisso para fazer um documento:
Gorender, MA, Armnio Guedes, Alberto Passos Guimares, Giocondo.O documento
se chamou a DECLARAAO DE 1958.
MA foi alado para Comisso Executiva do CC.
Em sua obra autobiogrfica, APOLONIO DE CARVALHO, fala sobre esta
conjuntura de agonia do socialismo. Sobre a conjuntura nacional, o autor analisa:
A sucesso de episdios na segunda metade da dcada de 50
traz uma radical alterao a esse quadro,congelado h quase um
decnio.No Brasil, o suicdio de Vargas expe o completo
divorcio entre a orientao poltica seguida pelo PC e a
populao, e deixa a direo desarvorada.Enquanto a populao
protesta maciamente nas ruas, documentos ainda questes dos
comunistas chamavam derrubada do governo Vargas pelas
armas.

Em relao conjuntura externa, Carvalho afirma:

Na URSS, o XX Congresso do PCUS abre-se com a leitura do


estarrecedor informe secreto sobre as atrocidades cometidas sob
a direo de Stalin.E com um chamamento ao fim de 30 anos de
autoritarismo e culto personalidade.Ao mesmo tempo, os
soviticos alteram suas formulaes tericas e propem ao
movimento comunista internacional que busque a revoluo
atravs de caminhos pacficos.

Carvalho expe a conjuntura pessoal


Estvamos Rene e eu,em Moscou,participando de um curso de
formao poltica.Pudemos sentir entre os professores o clima
de reavaliao critica e autocrtica que se iniciava.Poo
coincidncia, estvamos tambm os dois iniciando nossa quebra
particular do culto personalidade.O que era relativamente fcil
para Rene e seu esprito aberto,de agudo senso critico e,no
raro,caustico. No o era para mim que guardava uma viso
idelaizada da URSS o socialismo j construdo,em transio
para sua fase superior, o comunismo e dificuldades em ver o
socialismo realmente existente autoritrio,sem democracia
nem direitos humanos,com profundas deformaes
polticas,econmicas e sociais.

Rene me ajudaria ,em meu lento retorno ao papel de militante consciente, a ver
os ostensivos problemas de uma sociedade que,quarenta anos atrs, se libertaria dos
grilhes do capitalismo: marcas de atraso;largos desnveis sociais;as duras condies de
vida dos trabalhadores,no campo como na cidade;os privilgios dos altos e medios
escales partidrios;o monopartidismo;a diluio do appel dos sovietes,ou conselhos
populares, sob o peso da fuso Partido-Estado.
A conjuntura do PCB foi abordada por Carvalho tambm:
De volta ao Brasil,encontro o partido imerso numa profunda
crise poltica,que terminar ocasionando sua primeira grande
ciso.Aturdida, a organizao est paralisada.A direo sonega
qualquer informao sobre o Informe Secreto. pela imprensa
tradicional que os militantes tomam conhecimento de seu
contedo, cuja veracidade as direes se recusam a confirmar.A
indignao tantos anos represada explode;jornalistas e
intelectuais abrem, na marra, na Voz Operaria,do PC,o debate
sobre o stalinismo e suas repercusses na organizao e na
poltica do partido.

Conforme Carvalho, a conjuntura governo JK:


Inicia-se uma nova e importante fase do PCB.Sinto-me,no
entanto,intimamente dividido: aplaudo a renuncia orientao
poltica anterior, mas tenho muitas duvidas: estou pouco
vontade dentro da nova orientao traada. J no estamos,
entretanto, na dura clandestinidade anterior. j o governo JK, e
o PCB desfruta de uma semilegalidade.

Em relao aos cursos de formao poltica, Carvalho afirma:


Procurando recuperar as carateristicas de toda minha militncia
anterior, vou buscar estimulo e espaos junto aos
militantes,reproduzindo aqui os cursos de que acabo de
participar em Moscou.Na realidade,essa deveria ter sido minha
primeira tarefa ao retornar : transmitir e desenvolver , luz da
realidade nacional,os ensinamentos que me foram passados.
Assim,com um aval ambguo da direo e entre tarefas
ocasionais(...) dou inicio a um empenho tenaz de formao
poltica junto s bases: nos bairros,nos subrbios,nos
sindicatos,e crescentemente entre os estudantes
universitrios.Surpreendem-me e anima seu interesse e
recptividade.Quase todas as noites dedico-me,pois,a cursos.Vez
por outra,solicito a colaborao de sindicalistas.O Comit
regional dos Martimos vai mais longe: quer um curso de
marxismo, com incurses na economia poltica.Socorro-me de
Rene ,enquanto Pedro Mota Lima se alterna comigo na Historia
do Movimento Operrio.

Na anlise da estratgia de formao poltica, Carvalho considera que


Tanto se alastram os cursos pela antiga Guanabara,que,por
iniciativa de Mario Alves e Jacob Gorender,o comit central
decide assumi-los.Cria-se uma Comisso de Educao Poltica
que,em verdade,ter caractersticas de uma dinmica Secretaria
Nacional.Gorender,Mario Alves,Joo Pedro Francisco e eu
compomos seu ncleo central,e entre os participantes contam-se
operrios,estudantes e outros setores de classe mdia.
Com idntico impulso,comeam a surgir comisses
regionais.Alm disso,diversificam-se as iniciativas sonhamos
agora com cursos de nvel superior.No se trata de
fantasias.Jacob Gorender,por exemplo,dono de vasto saber,j
desenvolve cursos de filosofia no meio universitrio.Mario
Alves promove debates em Recife,Belo Horizonte,Rio e So
Paulo.Com grande audincia,a comisso estende ao Rio Grande
do Sul,a Minas e a Pernambuco ciclos de temas diversos.

Em relao a linha defendida no V Congresso ,Apolnio afirma, sinto-me uma


ilha cercado de impactos e contradies [...]. Antes de tudo, em casa: Rene e nossos
filhos no crem nas novas diretivas polticas.Um texto de sua autoria censurado no
jornal Novos Rumos por atentar contra a linha partidria! Apolnio apela para
Comisso executiva: Em nome dela,vem ter comigo Mario Alves.Lemos na integra a
matria ,e ele acaba por propor apenas alteraes de forma.Eu aceito,ele avaliza.
Tambm ele est dividido, penso, malicioso.

No final dos anos 50,precisamente em 1958, MA viajou para CHINA. Na volta


dirigiu o jornal "Novos Rumos", que substituiu a Classe Operaria. Gorender dirigia a
revista "Estudos Sociais", na qual MA escreveu vrios artigos.
Um fato novo na Amrica Latina : a revoluo Cubana, em 1959 abriria novas
possibilidades revolucionarias. poca do governo JANGO, MA, Apolnio e Gorender
moravam no Rio.Trabalhavam juntos na Secretaria Nacional de Educao do PCB, um
tipo de escola superior de poltica, realizando cursos e debates em todo o Brasil, sobre a
realidade brasileira, o marxismo e que agitava a militncia do PCB.
MA critica a postura dirigente do PCB (de Giocondo Dias} ao escrever o texto
"Duas Linhas na Luta pela Reforma Agrria", publicado pela revista da UNE. Em
1963, MA critica o Plano Trienal de Celso Furtado e empolga a juventude e os
intelectuais do Rio. Em maro 1964, MA volta a ilegalidade e, em julho, preso numa
reunio clandestina em Vila isabel no Rio.Durante um ano ficou preso;foi solto em
meados de 1965. Em 1967, foi condenado revelia a 7 anos e teve seus direitos
polticos cassados por 10 anos.
Nos debates internos da poca no PCB, MA foi destitudo da CE e desloca-se
para MG. Acirra-se a disputa interna no PCB. MA, Gorender, Apolnio, esto frente
das criticas.Em SP,Marighella, Rafael Martinelli ,Cmara Ferreira,Rolando Frati, entre
outros, fundam o Agrupamento Comunista. Criticam o reformismo do PCB. Deste
conjunto de militantes, surge a Corrente Revolucionria. Nesse contexto, MA destaca-
se com suas TESES que circulam dentro do partido como principal documento de
critica a posio oficial.
MA era responsvel pela direo do partido em MG; Apolnio no RJ; Gorender,
no RS; Marighella, em SP. Em julho de 1967, Marighella foi expulso do PCB.MA,
com outros dirigentes protestam e se retiram da reunio. O VI Congresso do PCB
expulsa estes dirigentes. MA, com 44 anos encerrava 29 anos de militancia no PCB. No
segundo semestre de 1967, MA muda-se para SP.
Em abril de 1968, funda-se o PCBR, em reunio na serra da Mantiqueira. Os
principios teoricos e as bases politicas foram estabelecidos num documento redigido por
Mario Alves. No mesmo ano, o novo partido criticava ,em nota aberta, a invso da
Thecoslovaquia pela Rssia,para debelar a Revoluo dos Conselhos
Operrios,sobretudo,em Praga. MA criticava a teoria foquista de DEBRAY.
Em final de 1968, MA viajou para CUBA. Retorna pela EUROPA [Italia} onde
participa de manifestaes politicas ;em inicio de 1969. Em meados de 1969 ,MA volta
para morar no Rio, em um bairro operario, onde conhecido como 'VILA' ,em
homenagem a Martinho da Vila.
No segundo semestre de 1969, MA viajou pelo CC, a PE e BA. poca, MA
criticava a posio do CC de apoio a Frente Rev. Popular. Aps um assalto a banco ,no
Rio, em 17 dezembro 1969,ocorre priso de muitos quadros do Br,que levariam a
priso de MA em 16 janeiro 1970.
A hiptese de que a ideiaideia de autonomia vem a MA a partir de seus
contatos nas viagens feitas a URSS, em 1953 e, a CHINA, em 1958. Os debates que se
seguiram ao Relatorio Kruschev, em 1956, as lutas operarias na Polnia e Hungria
naquele ano, os contatos em Cuba e Italia [das lutas operrias e autonomistas] no final
dos anos 60; a revoluo conhecida como Primavera de Praga, em 1968, fortaleceu a
ideiaideia da autodeterminao dos povos e da busca plural na construo do
socialismo.
Este conjunto de experincias forneceriam a MA os elementos para sua viso da
autonomia,assim como, da necessidade de um novo partido,contrapondo-se ao
foquismo vigente (de Debray a ALN), e ao reformismo e burocratismo do velho
"Partido". MA foi um verdadeiro equilibrista entre a necessidade do partido de
vanguarda e a autonomia. Entre LENIN e ROSA LUXEMBURGO, que possivelmente
conhecia atravs do jornal de MARIO PEDROSA, a VANGUARDA SOCIALISTA;
pois, mesmo sendo uma publicao de um ex-trotskista, MA tinha suficiente autonomia
e curiosidade intelectual para estar a par do que se publicava no campo socialista nos
anos 50.

O Socialismo Petista - 13 teses contra o Muro

Em Outubro de 1997,Michael Lowy ,em debate na sede do PT,em SP,afirmava


que O Documento O socialismo petista,de 1990, um texto fundamental na historia
do movimento socialista mundial. O PT foi em sua construo, espao de convergncia
de varias geraes da esquerda
do Brasil.E,herdou muitas experincias da Amrica Latina.
O PT nasceu em um contexto histrico marcado, de um lado, pelo esgotamento
histrico da estratgia da COMINTERN e pela crise de outras alternativas
(maoismo,guevarismo,trotskismo,eurocomunismo,etc). De outro lado, pelo surgimento
de novas estratgias,que tiveram suas expresses histricas, seja na Revoluo
Sandinista,como pice do ciclo de lutas aberto com a Revoluo Cubana e pelas
retomadas das lutas populares e operarias na Amrica Latina e Central; seja ,na prxis
do movimento social Solidarnocs,representando o acumulo de foras de um lonco ciclo
de lutas dos trabalhadores no leste da Europa,inicado em 1953 e 1956*.

O Socialismo Petista (1990)

Para abordagem dos 13 pontos ,adotamos o mtodo de Ernst Bloch ,no ensaio
que o filosofo alemo analisu as 11 Teses de Marx sobre Feurbach,no livro Principio
Esperana. Na parte chamada Questo de Agrupamento, Bloch define a
reoordenao das 11 teses marxianas segundo um ponto de vista filosfico,
sequenciando-as segundo seus temas e contedos. De nossa parte, reoordenamos as 13
teses petistas segundo um ngulo mais estritamente poltiico (a estratgia socialista) e
dividimos o conjunto em 4 grupos temticos, a saber;
grupo 1. carter democrtico e revolucionrio;
(teses 1,2,3 , 4 e 5 )
grupo 2. Crtica ao socialismo real;
(tese 6)
grupo 3. pedagogia de massa, conhecimento emancipatorio e utopia socialista;
(teses 7 , 8 e 13)
grupo 4. prxis, hegemonia e solidariedade;
(teses 9,10,11 e 12).
O ltimo bloco, na linha de Bloch, significa a senha, o mais importante por
definir o contedo da revoluo anti-passiva (Gramsci). As teses,em cada bloco,se
complementam entre si,e no conjunto dos 4 blocos,formam um todo unitrio.Elementos
de um bloco,ou de uma tese de um certo bloco,podem conter elementos de teses de
outros blocos.Neste sentido,assinalamos alguns casos.
O sentido da senha, o bloco 4, anuncia o novum: O PT uma nova estrela
no firmamento de uma reconstruo socialista que articula liberdade e democracia(23).
Em suas Teses de Filosofia da Historia,Walter Benjamin afirma: [...] como as flores
voltam suas pontas em direo ao sol,assim,pela fora de um heliotropismo secreto,tudo
o que acontece tende a dirigir-se para o sol que est saindo no cu da historia.Dessa
transformao,menos eprceptivel que outras,deve tratar o materialismo histrico(24).
Deste ponto de vista, a verdade histrica do Brasil atual[...] o PT como
penhor do futuro do povo brasileiro(Mario Pedrosa). Como diz o velhoMario: A
marcha do PT larga e longa,como a prpria historia,e com esta se integrar. A relao
com o passado,implica o despertar de uma nova hegemonia.portanto,quando pensamos
no Quase L (25) que foi a campanha de Lula em 1989, podemos afirmar, ainda
com Benjamin, em um mixto de melancolia e esperana,que:todo um passado, que
ainda no foi satisfeito no presente, tende para o futuro (26).
A articulao em blocos das 13 teses,tem seu sentido maior em sua prpria
montagem,do que em uma possvel analise de carter poltico-filosfico. Cada bloco
est formado pelas teses respectivas,por um ncleo definidor e,por eixos ,interno a cada
bloco (destaques),externos (inseres de outros blocos).
------------------------------------------------------
BLOCO 1 - Teses 1,2,3,4,5.
Ncleo: carter democrtico e revolucionrio;
No eixo interno (destaques),
As origens do PT esto na luta democrtica contra a ditadura militar.Alcance da
democracia como valor estratgico,que interessa sobretudo aos trabalhadores e as
massas populares.Objetivo na luta pela construo de uma democracia qualitativa
superior.
Democracia interna como negao do monolitismo e do verticalismo. Externamente,
significa autonomia dos movimentos sociais; pluralismo poltico-ideologico e cultural.
Portanto, PT com sntese de culturas libertarias,distintas correntes de pensamento
democrtico e transformador; cristianismo social, marxismos vrios, socialismo no-
marxistas, democratismo radical, doutrinas laicas de revoluo comportamental.
unidade na diversidade,em torno do projeto socialista. [C4] Comentrio: Este pargrafo e o
anterio so uma citao?
No eixo externo, [C5] Comentrio: O texto abaixo uma
citao?
(insero do bloco 3): o socialismo ,para o PT,ou ser radicalmente democrtico ou no
ser socialismo.
(insero do bloco 4): AUTOGESTO: construo de uma efetiva democracia
econmica;democracia na gesto das unidades de produo;participao das massas em
todos os nveis.Ampliao das liberdades democrticas;validade para todos os cidados
nico limite na prpria institucionalidade democrtica;instrumentod democracia direta
mais democrtica representativa.
-Ncleo revolucionrio. Eixos internos (destaques).
Crtica radical do capitalismo; descoberta emprica da perversidade estrutural do
capitalismo; critica das propostas da Social-Democracia: abandono da perspectiva
socialista. O PT traz ambio histrica socialista;dialogo critico com as correntes social-
democraticas.

BLOCO 2) Tese n. 6.Nceo: critica ao socialismo real internacionalismo.


Eixo interno (destaques ):
Compromisso estrategigo democrtico leva o PT a refutar os modelos do socialismo
real.Denuncia a manipulao da mdia conservadora, que iguala experincias histricas
distintas.Denuncia as caractersticas anti-democraticas do socialismo real,como
negao da essncia mesma do PT.
O processo no Leste Europeu est aberto.As mudanas ocorridas e em curso, tm um
sentido histrico positivo,ainda que o processo seteja sendo hegemonizado por
correntes favorveis regresso capitalista.
Ncleo de Internacionalismo:
Processos revolucionrios,com total independncia.O PT foi o primeiro partido do
Brasil a apoiar a luta do Solidariedade(Solidarnosc),mesmo sem outras afinidades
ideolgicas.denunciou atentados liberdade sindical,partidria,religiosa,etc,nos paises
do socialismo real.denuncias de crimes contra a humanidade,seja o assassinato de
centenas de trabalhadores rurais no Brasil, seja a represso contra o povo de Bucarest ou
na Praa da Paz Celestial.
-Eixo externo= (insero do bloco 4): O PT defende a instaurao de relaes
cooperativas entre todos os povos do mundo.O internacionalismo democrtico socialista
ser sua inspirao permanente.

BLOCO 3) teses 7,8,13.


Ncleo=pedagogia de massa,conhecimento emancipatorio e utopia socialista.
Eixo interno (destaques):
Pedagogia poltica evitando ideologismo1 e o pragmatismo;auto-educao das
massas atravs da luta democrtica;teoria do conhecimento correspondente cultura
poltica real das bases partidrias e sociais.
Conscincia do novo perodo histrico,de maiores desafios estratgicos,exigindo uma
superior criatividade poltico-ideologica para a construo da alternativa socialista
hegemnica.exige um gigantesco esforo em relao aos desafios tericos e prticos e, a
elaborao doutrinaria e as lutas sociais.
Para responder Qual Socialismo ?,algumas respostas brotam da experincia
prpria,contudo,outros aspectos so desafios em aberto,dependem da criatividade
poltica e das aspiraes concretas ds massas oprimidas (insero do bloco 4).

BLOCO 4) Teses 9,10,11,12.


Ncleo= Prxis,hegemonia e Solidariedade.
Eixos internos (destaques): Socialismo processo.
Qual Socialismo ? Nesta questo estratgica, o PT avana algumas
respostas,decorrentes da prpria experincia ativa e reflexiva.Brotam por negao
dialtica das formas de dominao,ou,de convices estratgicas.
Outros aspectos do projeto socialista so desafios em aberto,para os quais seria
presunoso supor que podemos dar respostas imediatas.Sua superao demanda fantasia
poltica e criatividade pratica,legitimidade pelas opes ideolgicas e,sobretudo,pela
aspirao concreta das massas oprimidas.

Socialismo hegemonia
A construo do socialismo exige uma mudana poltica radical; os
trabalhadores precisam transformar-se em classe hegemnica na sociedade civil e no
poder de Estado.
Socialismo Prxis
O socialismo no para o PT um futuro inevitvel,produzido necessariamente
pelas leis econmicas.O socialismo um projeto humano, luta consciente dos
explorados e oprimidos.Recuperar a dimenso tica da poltica condio essencial
para reestabelecer a unidade entre socialismo e humanismo.Portanto,socialismo tica.
Socialismo Solidariedade - A nova sociedade socialista dever fundar-se no
principio da solidariedade humana.Buscar constituir-se como sujeito democrtico
coletivo.Assegurar a igualdade fundamental entre cidados,direito e diferena,seja
poltica,cultural,comportamental,etc.Lutar pela liberao das mulheres,contra o
racismo e todas as formas de opresso.
Socialismo Autogesto e Pluralismo - Pluralismo e auto-organizao
incentivados em todos os nveis da sociedade;formas de antdoto burocratizao do
poder,das inteligncias e vontades.
Socialismo Internacionalismo - Afirmao da identidade e independncia
nacionais.Instaurar relaes cooperativas entre todos os povos do mundo.O
internacionalismo democrtico ser sua inspirao permanente.
Socialismo Autogesto e Partipao Democrtica - Efetiva democracia
econmica.Propriedade social dos meios de produo que,no se confunde com a
propriedade estatal.Superar tanto a lgica perversa do emrcado capitalista quanto o
intolervel planejamento autocrtico estatal de tantas economias ditas
socialistas.Conjugar o incremento da produtividade e a satisfao das necessidades
maetriais,com uma nova organizao do trabalho,superando sua alienao
atual.Democracia nas unidades de produo ( os conselhos de fabrica so referencia
obrigatria ) quanto no sistema em seu conjunto,atravs do planejamento estrategico
sobre controle social.Socialismo bem-estar-social e, controle social autogestionrio.
Socialismo Liberdade - Ampliao das liberdades democrticas, conquistadas
duramente no cpitalismo. Liberdades vlidas para todos os cidados,cujo nico limite
seja a prpria institucionalidade democrtica. Liberdade de opinio,
manifestao,organizao civil e poltico-partidaria. Instrumentos de democracia direta
(garantindo a participao das massas nos vrios nveis de direo do processo poltico
e da gesto econmica) conjungado com os instrumentos da democracia rerpesentativa,
com mecanismos geis de consulta popular,como verdadeira capacidade de expresso
dos interesses coletivo. No pode haver definio mais clara da Autogesto Socialista!
Enfim, a Resoluo petista sobre o Socialismo, sntese de palavras e
sangue,faz jus lutas e esperanas de velhos combatentes e muitas geraes socialistas
brasileiras.Entre estas destacamos a figura de Mario Pedrosa, ficha de filiao N0. 1 do
PT,que analisando a historia da evoluo poltica do Brasil,escreveu nos idos de 1978-
1979 que O PT no um partido como os outros,pois no fundo, um produto
intrinsico da historia real do Brasil contemporneo.No por outra razo que sua
misso mais que poltica, civilizatria (27). hegemnica, tico-politica e
econmica (Gramsci).
Mario Pedrosa, em carta para LULA ,datada de agosto 1978, escrevia referindo-
se ao pujante movimento operrio grevista de So Paulo: Este o movimento histrico
mais importante e fecundo da hora brasileira. Posso agora sorrir e predizer que o Brasil
ser um pais feliz.(28).
Quando da morte de PEDROSA, em novembro de 1981, Hlio Pellegrini, seu
grande amigo, afirmou: Todo grande revolucionrio vive da esperana. Sem dvidas,
Mario Pedrosa nos legou sua esperana libertria.Sem medo de ser feliz !

AUTOGESTO : PALAVRA E IDIA

O proprio da autogesto, de ter sido um movimento social


antes de ser uma doutrina (P. Rosanvallon)

Rosanvallon assinala que falar da autogesto primeiro se interrogar sobre o


destino de uma palavra.Uma palavra nova: apenas h 15 anos fez sua apario em nossa
lngua; apenas se imps a partir de 1968.Uma palavra no sentido etimolgico restrito: a
autogesto a gesto por si mesmo.
Se, surgiu na Frana para identificar a experiencia Yugoslava, rapidamente se
emancipou desta origem para qualificar tudo o que se fazia e se buscava aps 1968.
Rosanvallon chega mesmo a falar de linguagens autogestionarias,apresenta 5
possibilidades:
-Tecnocrtica, libertaria, comunista, conselhista e humanista.
Em Chaves para Autogesto ( 1975 )*,seus autores Alain Guilerm e Yvon
Bourdet , falando sobre o abuso da palavra , afirmam que a palavra autogestion
relativamente recente, tendo aparecido na lngua francesa no inicio dos anos 60.
Explicam que a palavra francesa autogestion no se encontra nos dicionrios ou nas
enciclopdias anteriores 1960.Ela traduo literal da palavra servocroata
samoupravlje ( samo sendo o equivalente eslavo do prefixo grego auto, e
upravlje significando aproximativamente gesto).
Bourdet,em sua tentativa de sistematizar a relao Marx-Autogesto ( 1971 )*,
afirma que o fato da autogesto s ter aparecido recentemente tem seu significado.Isto
testemunha de uma parte, a ignorncia do passado, e , podemos entender porque certos
anarquistas, fourieristas ou proudhonianos,por exemplo, se irritam por que muitos
conselhistas ou autogestionarios pensam ter achado algo novo com uma nova
palavra.
A palavra autogesto foi introduzida na Frana , para designar a experincia
poltico-economico-social da Yugoslavia de Tito,em ruptura com o
stalinismo,esclarecem os dois autores citados.
Em 1980, as edies CLAS ( Cuestiones Actuales Del Socialismo) de Belgrado,
publicou um glossario sobre Autogesto Socialista Yugoslava. Noes
Fundamentais. Nele encontramos uma definio da Autogesto Socialista:
A autogesto antes de tudo, uma relao scio-economica entre os homens que
se funda no principio da distribuio segundo o trabalho e no sobre a base do
capital,dos meios de produo.A autogesto de um modo eloqente uma categoria
socialista. A mesma s pode desenvolver-se no campo da propriedade social,isto ,em
relaes de propriedade em que os meios de produo e o capital social no so
propriedade privada do capitalista enm de grupos de trabalhadores de determinadas
empresas,nem objeto de gesto monoplica do aparato burocrtico ou tecnocrtico do
Estado.
A mesma editora,tambm em 1980, publicou uma obra intitulada A Autogesto
Socialista na Yugoslavia.1950-1980.Documentos.Em ensaio sobre O sistema da
autogesto na Yugoslavia,o principal terico yugoslavo,Edvard Kardelj,assim se
expressa sobre A idia da Autogesto:
A autogesto no uma inveno da teoria e da pratica yugoslavas, segundo
nos atribuem incorretamente,alguns como merecimento,outros como pecado.A idia da
autogesto to antiga como a idia do humanismo e,particularmente como o
movimento operrio internacional, a historia de sua luta de classes e a historia da pratica
socialista.A mesma resultado de aspiraes permanentes do homem em pr da
liberdade e da livre criao,pelo domnio das leis objetivas da natureza e da
sociedade,por uma vida melhor. As idias e aspiraes autogestionarias se expressaram
de distintos modos no mundo,em numerosas lutas da classe operaria e de homens e
movimentos progressista em pr da libertao do trabalho e do homem, e,em todas as
revolues socialistas at o presente(...) A autogesto um processo revolucionrio de
transformao social que s pode se expressar em uma profunda revoluo socialista e
popular.E,assim foi nossa revoluo.A aspirao autogesto imanente a todo
movimento socialista,e sem autogesto no existe sequer socialismo.
Frank Giorgi afirma que sob as mais diversas formulaes, encontramos na
escrita de vrios tericos da autogesto os mesmos elementos de base: a radicalidade da
ambio, que se pretende herdeira do projeto revolucionrio de libertao humana; o
realismo pratico da dinmica;a recusa em separar os meios e os fins, a via e a
saida.Ela ,segundo Victor fay, utopia realista.
Sem dvidas, o termo autogesto relativamente novo.Contudo, se a
PALAVRA recente, a IDIA to antiga quanto o prprio movimento operrio ,
remontando aos incios do
sculo XIX. Sob palavras distintas e doutrinas diferentes, reencontramos a mesma
aspirao na qual se inscreve o projeto da autogesto. A autogesto imanente ao
prprio movimento operrio e a seu movimento de emancipao.
Todavia, esta constante nas lutas de emancipao dos trabalhadores constitui uma
herana que foi ,por varias razes, esquecida. Aqui,cabe totalmente a citao de
Walter Benjamin: Em cada poca,tem-se outra vez de tentar o resgate da tradio
contra o conformismo, que dela quer se apossar.Se o inimigo vencer, tambm os mortos
estaro em perigo.
Neste sentido, as diversas EXPERIENCIAS de concretizao da autogesto ,
expressam as varias formas e sentidos com que ela aparece em determinados momentos
crticos da historia dos trabalhadores. Portanto, a Historia destas experincias
fundamental para desenvolvermos o contedo do projeto socialista autogestionario.
Os CAMINHOS e VIAS da AUTOGESTO
A autogesto na histria, assume caminhos diversos. Georges Gurvitch (um dos
pioneiros do estudo da autogesto) , assinalou tres vias:

1) Os conselhos de trabalhadores podem surgir espontaneamente, dentro da


ebulio de uma revoluo social;

2) Os conselhos de trabalhadores podem ser instaurados por um governo poltico


nascido de uma revoluo social;

3) Os conselhos de trabalhadores podem se desenvolver por etapas, modificando a


longo prazo a estrutura burocrtica da economia imposta por um governo poltico
nascido de uma revoluo social. Este processo pode ser mais lento ou mais
acelerado, a depender da estrutura concreta do poder poltico e das conjunturas
internas e externas.

Estas tres vias da autogesto tm suas qualidades e seus defeitos.


As experincias que vamos apresentar podem ser sistematizadas no quadro
referencial destas vias, por exemplo:
1) -A primeira via, foi a da revoluo na Rssia em 1917, que foi a primeira a
experimentar, por um curto espao de tempo, o surgimento espontneo dos
conselhos operrios, no fogo da revoluo social;
2) -A segunda via, a da experincia do governo da Yugoslavia, a partir dos anos
50;
3) -A terceira via, lenta e por etapas, tem exemplos nas lutas dos operrios na
Hungria e na Polnia, iniciadas em 1953 1956.
Esta classificao de Gurvitch foi feita na poca que proferiu uma srie de
palestras em universidades da Yugoslavia, com o ttulo de Os Conselhos Operrios,
no ano de 1957. Portanto, logo aps as rebelies e revoltas no Leste europeu em 1956.
Sendo assim, Gurvitch (faleceu em 1966) no pode presenciar outras lutas
autogestionrias que ocorreram em anos posteriores. De qualquer forma, por exemplo, a
evoluo da Polnia, desde as lutas de 1956 at o Solidarnosc, na dcada de 80, parece
se inserir na terceira via: um longo perodo de lutas, culminando na desestruturao do
sistema.

Outras experincias, como a da Arglia (a partir de 1962), ou as experincias na


Amrica Latina, Chile de Allende, Peru de Alvarado, Bolvia de Torres, podem ser
inseridas na via nmero dois: iniciativas de Governos polticos em conjunturas
marcadas por grandes lutas sociais.
Contudo, a experincia histrica no ocorre de forma to pura: podemos dizer
que as 3 vias se confundem, se interpenetram, se articulam.
Assef Bayat tentou sistematizar as experincias histricas da autogesto em outro
referencial, utilizando quatro categorias e outros exemplos de experincias historicas:
1) Autogesto sob contexto de dualidade de poder, em conjunturas
revolucionrias;
2) Autogesto nos pases ditos socialistas do Terceiro Mundo;
3) Autogesto em governos populistas do Terceiro Mundo;
4) Possibilidades de autogesto em condies normais na periferia do capitalismo.
A primeira categoria cobre os exemplos da Rssia (1917), da Arglia (1962), do
Chile (1972), de Portugal (1974) e do Ir (1979).
A segunda categoria, cobre os exemplos da China, Cuba, Moambique e
Nicargua.
A terceira categoria cobre os exemplos da Tanznia, Peru, Egito (Nasser) e
Turquia.
A quarta e ltima categoria no se refere a exemplos histricos, mas a
possibilidades. Bayat afirma que o Terceiro Mundo o principal portador das
possibilidades de autogesto, no contexto do capital globalizado.

Os Conselhos Operarios
Pierre Naville, autor que se dedicou ao estudo da autogesto, afirma que os
Conselhos Operrios existem sempre em estado latente nas empresas de todos os tipos.
s vezes, eles entram em atividade sob forma embrionria, durante um curto perodo,
como comits de greve. Outras vezes, eles se inserem nas organizaes existentes, por
ocasio de comisses de reivindicaes; eles existem, em potencial, mesmo nos comits
de empresas legais, com tarefas e funes limitadas. Estas formas embrionrias que
podem assumir os Conselhos ou Comits, agrupando, em geral, trabalhadores de
diversas correntes polticas, dependem de muitas condies:
A primeira que as organizaes polticas, sindicais ou cooperativas existentes no
correspondam mais s exigncias das lutas do momento. Esta condio no se apresenta
em qualquer momento. Pode ocorrer que, as atividades dos sindicatos de massa ou dos
partidos polticos respondam s necessidades de ao. Os Conselhos Operrios no so
e jamais foram os nicos organismos, insubstituveis, totalmente diferentes das outras
formas de organizao dos trabalhadores. Ao contrrio, existem relaes flexveis,
mesmo um parentesco, das diferentes formas de organizao dos trabalhadores. S as
condies da ao mostram quais so as preferidas. No se pode substituir o estudo
destas condies por uma filosofia abstrata, uma teoria pura dos Conselhos Operrios.

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3= AUTOGESTO e UTOPIA

O contrrio da utopia, no a realidade, o pragmatismo


(Georges Labica)

A Revista francesa Autogestion et Socialisme tida como uma Enciclopdia


da autogesto.Sua publicao foi iniciada nos anos 60 e existiu at os anos 80.
Aps o simblica queda do Muro de Berlim (1989) ,surge uma nova
conjuntura,em que o socialismo autogestionario desponta como uma possibilidades de
alternativa ao mundo capitalista e as experincias extintas no Leste e na URSS.
Em 1993, seria retomada a experincia da Revista francesa Autogestion et
Socialisme.Desta vez,com novo nome, Utopie Critique.No primeiro numero ,seu
editorial remarca:
Neste fim d sculo, a miseria do projeto emancipatorio patente. Como nunca,
o dilema socialismo ou Barbrie est posto. Se , por sua atividade, o movimento
social expressou suas aspiraes auto-determinao, ao auto-governo, autogesto
social generalizada, estabeleceu as premissas das transformaes necessrias e
iluminou o germn dos possveis, a utopia mobilizadora deve ser repensada,
refundada luz das revolues e sombra das contra-revolues que abalaram o mundo
e as certezas.
Pensamos que necessrio romper com o capitalismo para lanar os fundamentos
de um socialismo autogerido e que ser atravs de conflitos e de experincias polticas,
sociais,idoelogicas que se desenhar um novo projeto e um programa transitrio.
Esta revista tem por ambio se inscrever em um processo de refundao.Ela se
prope a ser um dos momentos e um dos espaos desta dinmica refundadora que
necessita a confrontao de mltiplas tentativas, de diferentes pontos de vista e um
dialgo entre os atores dos movimentos socais, entre militantes,pesquisadores e
tericos.
Trata-se de contribuir para produo de uma nova cultura critica, novas
representaes,novas praticas e novas instituies estruturando um sujeito e um projeto
revolucionrios.
No mesmo numero,G.Labica fala mesmo de um retorno da utopia, sobretudo,
aps a derrocada das experincias do Leste europeu e das idias de que No H
Alternativas ,e do fim da historia, propagadas pelo neoliberalismo.
Labica afirma que a autogesto aparece,ento,como uma tendencia. importante
precisar que a autogesto como perspectiva e entre as perspectivas possveis- est
inscrita no real.No de modo nenhum um efeito da imaginao.Ela se inscreve no real
na medida em que o desenvolvimento do processo de trabalho relacionado um
desenvolvimento excepcional que um produto da historia- da conscincia
democrtica faz que possamos entrever hoje a possibilidade do que Marx chamou os
trabalhadores associados.
nesta perspectiva que Henri Lefebvre define a autogesto: a abertura ao
possvel. Ou seja, na perspectiva traada por Yvon Bourdet,apoiado na obra de Ernst
Bloch:
Quando Marx fala de encontrar o novo mundo na e pela critica do mundo velho,
a extrao do que presente,e portanto invisivel, pode ser qualificada justamente de
Utopia Concreta.,igualmente,neste sentido que, o que extraordinrio (porque no
percebido correntemente) no pode ser confundido com o impossivel.A utopia
concreta o extraordinario possivel.
Ernst Bloch construiu a idia de um materialismo utpico, com base em uma
ontologia do ainda-no-ser.
A obra de Bloch diz respeito a o estatuto de uma teoria critica da sociedade
renovada e repensada pelo prisma das utopias Segundo, Arno Munster Nos anos
1817-1918,Bloch orientou sua obra na perspectiva da utopia, com o objetivo de
reabilitar esse conceito ,mas no no sentido de esboar uma utopia poltica e social
nova,na linha de T.Morus,de Fourier ou de Cabet, mas de construir uma ontologia
utpica ,completada por uma teoria da funo utpica da conscincia antecipadora
que leva diretamente uma teoria da prxis que tem sua legitimidade nos ensinamentos
da Tese XI de Marx sobre Feurbach.
J sem seus primeiros ensaios, como por ex.,A impulso de Nietzsche,E.Bloch
falava de uma filosofia revolucionaria do futuro,definindo-a como um saber ainda-no-
consciente que torna a obra de arte um espao de experimentao da esperana.
Em o Esprito da Utopia(1918), encontra-se numerosas antecipaes dos temas
maiores da obra da maturidade de Bloch: a teoria do ainda-no-consciente,da prxis
antecipadora das imagens desejadas utpicas e a relao com o pensamento
socialista.Mesmo misturada com uma viso messinica, a utopia comunista de Marx
vista como a realizao de uma comunidade de homens e mulheres iguais,vivendo e
trabalhando, livres das condies alienantes do capitalismo,em estruturas cooperativas.
Bloch de 1935 a 1938 em Paris e Praga, trabalhou em uma obra sobre A Historia
do Materialismo. Segundo Munster,primeiro,a critica sistemtica de todas as
concepes mecanicistas da matria que surgiram,aparentemente no campo do otimismo
cientifico das Luzes,durante todo o sculo XVIII e do seculo
XIX.Segundo,tentar,conforme s premissas tericas de um materialismo no-
dogmatico,uma relao da conscincia do sujeito com o contedo do ato ogjetivo,no
quadro de uma ontologia materialista do ainda-no-ser em que a relao do sujeito ao
mundo determinada como um modo de realizao (manifestao) da possibilidade
objetiva real;e,terceiro,tentar depurar o conceito marxista de matria
das desfiguraes vulgares de uma matria coisificada,privilegiando uma concepo
extremamente dinmica da matria enquanto entelquia inacabada,e quarto, a (re)
fundao de um conceito de matria aberta ,utopica em que a matria definida antes
tudo como o substrato da possibilidade objetiva real.
Na filosofia blochiana, o possivel e o ainda-no-ser so determinaes ontolgicas
fundamentais da nova experincia do mundo.A esperana,o futuro,encontram solo
firme porque se fundamentam na realidade.
Dizia Bloch: O materialismo dialtico s tem sentido se admite que,para entender a
gnese de uma estrutura, preciso ter em conta, no s o passado, o vir-a-ser de tal
estrutura,mas tambm,a categoria do futuro, isto , tudo o que a estrutura contm de
virtualidade a cada instante.

Quando do Seminrio de comemorao dos 25 anos do CEDEC, Boaventura Santos


,com sua idia de Sociologia das Ausencias, assinalava um campo de afinidades com
as idias de Bloch: Procurar o que falta no presente, naquilo que existe.
Ao responder a questo por que pensar,Boaventura Santos afirma que , o
pensamento alternativo caracteriza-se pela centralidade da hermenutica da emergncia
:para credibilizar as alternativas que esto a emergir no mundo precisamos de uma
hermenutica de emergncia, que amplie simblica e politicamente essas inciativas
locais.
H duas grandes idias a ter em conta. A primeira de Prigogine (e de Aristteles), a
idia de que o possvel mais rico que o real. A segunda uma idia de Ernst Bloch,um
filosofo que no hoje muito lido, mas que devia s-lo muito mais: o conceito do
ainda no, entre o ser e o nada, que funda o principio da esperana ! Ns vivemos em
sociedades onde h espera mas onde no h esperana, e para reconstituir essa
esperana, o principio do ainda no, de algo que pode vir, que possvel,porque est
nas possibilidades do real e do presente, cria um efeito de intensificao(...)
Este ainda no exige um elemento subjetivo, e esse elemento subjetivo a
conscincia antecipatria, a idia de que algo pode surgir, em que a ruptura entre o
presente e o passado possvel , a LATNCIA do futuro (grifo nosso), a idia de
incompletude.E,de novo, a idia da sociologia das ausncias aqui muito
importante,porque ela nos leva a mostrar que o que existe est aqum do que pode
existir, que h possibilidades irrealizadas e que so realizveis,so as chamadas
UTOPIAS REAIS (grifo nosso).

Michael Lowy e Daniel Bensaid , a partir de analises das Teses de Filosofia da


Historia de Walter Benjamin e dos conceitos de Utopia e Esperana de Ernst Bloch
,desenvolveram reflexes que so fundamentais para temtica da autogesto.Lowy e
Bensaid apresentam muitas de suas teses na obra Marxismo,Modernidade ,Utopia.
A atualizao destes conceitos implica uma nova viso radical da temporalidade, o
que ocorreu com a viso benjaminiana sobre o tempo historico e, na concepo de
possibilidade na obra de Bloch.

Em seu ensaio Marxismo e Utopia,Lowy se reclama de diversas fontes do


socialismo:
O socialismo cientifico precisa mais uma vez tornar-se utpico buscando sua
inspirao no Principio Esperana (Bloch) que reside nas lutas,sonhos e aspiraes de
milhes de oprimidos e explorados,os vencidos da historia,em Jan Hus e Thomas
Munzer,nos soviets de 1917-1919 na Europa e coletivos de 1936-1939 em
Barcelona.Nesse nvel ainda mais indispensvel abrir amplamente as portas do
pensamento marxista gama de intuies sobre o futuro, desde os socialistas utpicos
de ontem at os crticos romnticos da civilizao industrial, desde os sonhos de Fourier
at os idias libertrios do anarquismo.
Em sua obra sobre Walter Benjamin, (Avertissement d incendie.Une lecture ds
thses Sur l concept dhistorie) ,Lowy remarca :
Benjamin se inspira de textos como os Manuscritos de 1844,os escritos sobre a
revolio de 1848-1850 ou a Comuna de Paris ou ainda a critica do programa de
Gotha(...).O resultado deste trabalho uma reelaborao, uma reformulao critica do
marxismo, integrando na massa do materialismo historico os clares messinicos,
romnticos,blanquistas,libertrios e fourieristas.Ou, antes,a fabricao,a partir da fuso
destes materiais, de um marxismo novo,hertico e radicalmente distinto de todas as
variantes -ortodoxas ou dissidentes de seu tempo.Um marxismo messsanico...Mas
tambm e acima de tudo um marxismo da impresivibilidade: se a historia aberta, se
o novo possvel, porque o futuro no conhecido de antemo.
A advertncia de incndio de Benjamin guarda uma grande atualidade: a catstrofe
possvel seno provvel- menos que ...
O que significa; o pior no inevitvel, a historia permanece aberta,ela comporta
outras possibilidades, revolucionarias,emancipatorias e/ou utpicas,conclue Lowy.

Em seu Marx, o Intempestivo, D.Bensaid nos apela `a Uma nova escuta do tempo:

(...) Pela evocao das conjunturas passadas, Abordar a Outrora significa portanto
que ele seja estudado,no mais como antes,de maneira histrica,mas de maneira
poltica,com categorias polticas W.Benjamin-.Tratar politicamente a historia pensa-
la do ponto de vista de seus momentos e de seus pontos de interveno estratgicos.(...)

A citao do passado a comparecer contradiz o postulado de um tempo irreversvel e


no modificvel.A historia critica no pode anular aquilo que foi, mas pode
redistribuir-lhe o sentido.

Bensaid assinala ,em relao a recolocao do passado, duas direes contrarias: uma
ontolgica e outra poltica.Na linha de Walter Benjamin e Gramsci, nesta ltima, O
tempo granuloso da historia no para eles nem o cumprimento de uma origem nem a
perseguio de um fim.O primado do futuro desenha em Ernst Bloch o horizonte
utpico da esperana.Em Heidegger a direo ontolgica- ele assombra a meditao
antecipada do ser-para-a-morte.(...).As categorias benjaminianas do tempo ordenam-se
triplamente no presente : presente do passado, presente do futuro, presente do presente.
Todo passado renasce no presente tornando-se passado.Todo presente esvanece-se no
futuro tornando-se presente(...)

Em seu livro Walter Benjamin, Sentinelle Messianique, Bensaid define o

conceito dialetico do tempo histrico : o presente do passado responde ao presente do


futuro, a memria espera: Ns somos esperados.Prever esse presente carregado de
dividas messinicas a tarefa poltica por excelncia.Encarar a funo
antecipadora,no s em ns,subjetivamente,mas no mundo,objetivamente.O passado j
era antecipao do presente,o mesmo que este o do futuro, e isto o que valoriza para
ns a recordao.Quando no h antecipao,o passado est concludo, est
condenado,desapareceu, se encontra aniquilado.Tudo o que nos move na ordem da
civilizao antecipador: de nobis fabula narratur,afirmou Bloch no debate sobre as
noes de estrutura e gneses,no Colquio de Ceresy-La-Salle.
Arrancar a tradio ao conformismo a tarefa revolucionaria por excelncia. O
conceito fundamental do materialismo histrico no o de progresso, mas o de
atualizao : atualizao das potencialidades.

Lowy,em seu estudo sobre Benjamin, afirma que: A abertura do passado significa dizer
que os nomeados julgamentos da historia no tm nada de definitivo e de imutvel.O
futuro pode reabrir os dossiers histricos fechados,reabilitar as vitimas
caluniadas,reatualisar as esperanas e as aspiraes vencidas,redescobrir os combates
esquecidos ou julgados utopicos,anacronicos e a contra-corrente do
progresso.Lowy cita a obra de E.P.Thompson sobre a formao da classe operaria
inglesa como uma manifestao clara desta reabertura do passado.

Em A condio operria,Simone Weil j tinha abordado esta dialtica entre passado e


futuro:

Seria vo voltar as costas ao passado para s pensar o futuro. uma iluso perigosa
acreditar que haja a uma possibilidade.A oposio entre o futuro e o passado
absurda.O futuro no nos traz nada,no nos d nada;nos que,para reconstru-
lo,devemos dar-lhe tudo, dar-lhe nossa prpria vida.Mas para dar preciso ter,e no
temos outra vida, outra seiva a no ser os tesouros herdados do passado e
digeridos,assimilados,recriados por ns.De todas as necessidades da alma humana no
h outra mais vital que o passado.

O amor pelo passado no tem nada a ver com uma orientao poltica recionaria.Como
todas as atividades humanas, a revoluo extrai toda a sua seiva de uma tradio.

O proprio M.Lowy nos oferece seu prprio exemplo.Assim.no novo prefacio a nova
edio ,pelas Editions Sociales, de seu livro de 1970 ,ento publicado pelas editions
Maspero,na Collection Bibliotheque Socialiste, La thorie de la rvolution chez l
jeune Marx, clama por uma abertura do ,digamos,dossier Marx:

Aps o fim do socialismo realmente existente(...) De fato,agora que o marxismo


cessou de ser utilizado como ideologia de estado,h uma oportunidade histrica para
redescobrir a messagem marxiana original,e tentar desenvolve-la de forma criadora.No
que me diz respeito,continuo a crer,como em 1970,que a teoria marxiana da revoluo
como autoemancipao dos explorados ainda uma bssola preciosa para o pensamento
e para ao.(...).Para Marx,a democracia revolucionaria o equivalente poltico da
autoemancipao no uma dimenso opcional,mas um aspecto intrinsico do
processo de transio para o comunismo,isto para uma sociedade em que os
indivduos livremente associados tomam em suo prprias mos a produo de sua
vida.

Em outra parte de nosso trabalho,retomaremos as idias de M.Lowy em relao a viso


de Marx da autoemancipao dos trabalhadores,isto ,a autogesto social.

Autogesto e Utopia Concreta

Ernst Bloch,em O Principio Esperana,volume II , analisa a relao entre


marxismo e antecipao concreta.Bloch afirma categoricament que o marxismo no
significa renuncia antecipao (funo utpica); ele o novum de uma antecipao
concreta relacionada ao processo imanente Historia).

Marx ps fim ao dualismo reificado entre ser e dever-ser,entre realidade empirica


e utopia.Para Bloch,o realismo de Marx carregado de futuro: justamente porque a
obra inteira de Marx est a servio do futuro,bem mais, ela s pode ser entendida e
realizada no horizonte do futuro,mas de um futuro que no mais traduzido por uma
utopia abstrata.Pois, uma idia justa do futuro somente pode ser fornecida a partir do
passado e do presente,l onde ele comea a despontar,ele no pode ser deduzido que a
partir das tendncias que operam(...). Este campo do futuro uma interessante
oposio aos falansterios ou New Harmonies puramente imaginarias,esta renuncia a
todas as vises de fantasia de um pretendido Estado do futuro.

Marx consagrou mais de 9/10 de sua obra a analise critica do momento presente,e
designou um lugar relativamente reduzido as determinaes do futuro.Por sua
vez,segundo Bloch, as utopias abstratas dedicaram 910 de seu espao ao desenho,a
pintura,do Estado do futuro e apenas 1/10 a observao critica,freqentemente
negativa,do momento presente.

A utopia concreta tem seu principal elemento no processo histrico ,naquilo que Bloch
chama de Latncia (Latenze),isto :

o correlato das possibilidades objetivas-reais no ainda-realizadas no mundo.

O mundo inteiro percorrido pela grande idia de uma coisa e pela inteno tendendo
ao ainda-no-acontecido: a utopia concreta a teoria-praxis mais importante desta
tendncia.Seu campo socialmente muito vasto,compreende todos os domnios do
trabalho humano,extende-se aos campos da tcnica e da arquitetura,da pintura,da
literatura e da musica,da moral e da religio.

O materialismo utpico blochiano tem por base que apenas um pensamento


orientado para transformao do mundo,portando uma vontade de mudana,diz respeito
ao futuro.Esta viso significa uma mudana no cocneito de ser.Ao abandonar a idia
de um ser fechado e esttico,a verdadeira dimenso da esperana e da utopia se abre,o
mundo se enriquece em disposies-, em tendncias-,em virtualidades-de (Latenze).

Munster assinala a condio ontolgica que permite a existencia da utopia concreta


blochiana:

O mundo no um sistema fechado ou um processo acabado,porque possui um


horizonte aberto e cheio de possibilidades ainda-no realizadas. Os homens e as
mulheres ainda no so o que poderiam ser, e o mundo no atingiu sua autenticidade. O
mundo e os homens que vivem nele ainda no esto realizados.Tudo no mundo
movimento e gestao.O mundo um vasto campo de possibilidades ilimitadas, no
somente por causa das intervenes da vontade humana e da pratica transformadora na
historia e por causa da teleologia especifica das diversas manifestaes da subjetividade
humana,mas tambm por causa da incidncia permanente da categoria de
possibilidade, permitindo sua transformao permanente, concebida como um processo
ininterrupto do prprio devir e do devir-autentico.
Arno Munster sintetiza a obra blochiana: Na obra e no pensamento de E. Bloch a
esperana integrada no projeto mais amplo de uma filosofia da prxis e de uma
filosofia da utopia concreta. E que, E.Bloch,ao seguir a tendncia prpria de seu
pensamento,nos surpreende com sua inteno e sua vontade de ligar a esperana
enquanto afeto da espera e da expectativa com as camadas da categoria
possibilidade,dentro de uma viso filosfica baseada sobre a possvel e salutar
atividade da consciencia antecipadora.

Concluindo seu ensaio sobre O Romantismo Revolucionario de Bloch e Lukacs , M.


Lowy afirma que o romantismo revolucionrio no de modo algum contraditrio
com o pensamento de Marx,que comporta,ele tambm, uma dimenso romntica
anticapitalista. Aps meio sculo de hegemonia de um marxismo kantiano e/ou
positivista, e/ou darwinista , e/ou evolucionista ( com algumas excees como Williams
Morris e Rosa Luxemburgo ) surgiu com Bloch e Lukcs nos anos 1917 e 1923 uma
potente e original leitura romntica do marxismo,uma concepo romntica da
revoluo social, que no desapareceu mais da conscincia critica moderna.

O trao comum que Lowy designa ao romantismo revolucionrio : a critica da


civilizao industrial/burguesa moderna (como foi constituda depois da metade do
seculo XVIII) a partir de certos valores sociais,culturais,ticos,estticos ou religiosos do
passado pr-capitalista.

Nesta perspectiva, Bloch permaneceu fiel e,sobretudo, enriqueceu em obras posteriores


ao Esprito da utopia (1918) suas intuies de juventude; por exemplo, em
Experimentum Mundi (1975), O Principio Esperana( 1953 e 1959) e Herana do
Nosso tempo ( 1962).

Como sabemos, Marx e Engels desconfiaram da utopia e Engel ops o socialismo


utopico ao socialismo cientifico. Bloch mostrou que possvel outra interpretao de
utopia e ciencia.

Em sntese, Bloch define duas formas de utopia.

i.a UTOPIA ABSTRATA: antecipa na imaginao uma outra


realidade; enquanto permanecer imaginaria, esta
antecipao porta um perigo: o de no levar em conta os
meios de sua realizao;

ii.a UTOPIA CONCRETA: contudo, enquanto antecipa um


dever-ser que ainda-no-, ela faz parte da realidade,
imanente ao movimento social, e sso subjetiva de uma
mobilizao real, de uma transformao real do mundo.

Estas definies de Bloch, nos levam a buscar na prxis da autogesto,nas experincias


desenvolvidas ao longo da historia ,nas experiementaes sociais ocorridas em
diversos momentos e lugares, os principais elementos que compem a proposta do
socialismo autogestionario.Sem dvidas que, no campo do chamado socialismo
utopico podemos encontrar muitas idias fecundas,mas compem o que Bloch chama
de utopia abstrata.
Bloch define o marxismo ,no como o contrario de uma utopia, mas como o novum de
uma utopia concreta. Utopia no que traa imaginariamente seus objetivos;em que,
participa na ao transformadora;concreta,no que como representao, ela antecipa o
que j est no real, inscrito no presente como possibilidade. Portanto, a utopia concreta
implica a crena em um dever-ser ainda-no-realizado; a utopia a antecipao
imaginaria de um objetivo.

Bloch fala do conceito de excedente da realidade: a utopia expressa a contradio


presente e o esforo imaginrio para antecipar a resposta concreta; manifesta,assim, um
poder critico frente realidade,enquanto ainda no foram realizadas todas as
esperanas. Este o sentido da noo de excedente: possibilidade ainda-no-
realizada,abertura ao futuro.Neste sentido, a historia humana um oceano de
possibilidades sempre abertas.

Para Bloch, A utopia concreta se encontra no horizonte de toda realidade; a


possibilidade real articula ao objetivo as tendncias-latencias dialticas abertas.

Mais uma vez,recorremos Arno Munster,para fecharmos esta parte sobre o


pensamento de Bloch;

Ligando a dimenso da ESPERANA aos conceitos de ANTECIPAO , de


UTOPIA e de PRAXIS, E. Bloch consegue integrar perfeitamente este conceito
teolgico-filosofico no projeto de uma filosofia da prxis que,diferentemente do
marxismo ortodoxo,no baseia o conceito de prxis revolucionaria e transformadora
exclusivamente sobre a critica materialista da economia poltica,mas sim sobre uma
critica dialtica das relaes entre a base e a superestrutura, e principalmente sobre um
cocneito de ao que, reivindicando amplamente as concluses da 11 Tese de Marx
sobre Feurbach sobre a necessidade de no mais interpretar o mundo filosoficamente,
mas de transforma-lo, redefinido no quadro de uma teoria da CONSCIENCIA
ANTECIPADORA, cujo conceito-chave antecipao das imagens utopicas e o
sonhar-para-adiante (Noch vorwats traumen).

Desta forma,Munster reala o carter ontologico do pensamento blochiano:

Bloch elabora assim,na primeira grande parte de O Principio Esperana, o projeto


global de uma filosofia materialista do futuro cujo mago uma ONTOLOGIA DO
AINDA-NO-SER, que muito mais que todas as outras ontologias da
modernidade,baseia-se na teoria das POTENCIALIDADES imanentes ao SER que
ainda no foram exteriorizadas, mas que constituem uma fora dinmica que projeta
necessariamente o ente para o futuro.

A temtica da utopia foi retomada mais recente nas obras de Boaventura Santos, j
inserida nas questes do campo da economia solidria.

Voltemos a BOAVENTURA SANTOS que analisou as questes relativas a


civilizaco,a crise de paradigmas,as tradices e as utopias. Nos encontramos numa fase
de transico paradigmatica,cujos sinais de crise me parecem evidentes,e um novo
paradigma com perfil vagamente descortinavel,ainda sem nome e cuja ausencia de
nome se designa por ps-modernidade...
Penso hoje que esta transico paradigmatica,longe de se confinar ao dominio
epistemologico,ocorre no plano societal global;o processo civilizatorio instaurado com a
conjunco da modernidade com o capitalismo e,portanto,com a reduco das
possibilidades da modernidade,as possibilidades do capitalismo entrou,tudo leva a
crer,num periodo final.

Para superar este esgotamento do processo civilizatorio capitalista,Boaventura busca


alternativas no pensamento utpico : alis uma das tradices suprimidas da
modernidade e que urge recuperar.

...reinventar o futuro,abrir um novo horizonte de possibilidades,cartografado por


alternativas radicais s que deixaram de o ser...Penso que s h uma soluco: a utopia.A
utopia a exploraco de novas possibilidades e vontades humanas,por via da oposico
da imaginaco `a necesidade do que existe...s duas condices de possibilidade da
utopia so uma nova epistemologia e uma nova psicologia...A nova epistemologia e a
nova psicologia anunciadas e testemunhadas pela utopia assentam na arqueologia virtual
presente. Trata-se de uma arquelogia virtual porque s interessa escavar sobre o que no
foi feito e,porque no foi feito,ou seja,porque que as alternativas deixaram de o ser.
Neste sentido,a escavaco orientada para os silencios e para os silenciamentos,para as
tradices suprimidas,para as experiencias subalternas,para a perspectiva das
vitimas,para as margens,para a periferia,para as fronteiras,para o Sul do Norte,para a
fome da fartura,para a miseria da opulencia,para a tradico do que no foi deixado
existir....

Sobre o paradigma emergente, Boaventura assinala que Em boa verdade no h um


paradigma emergente.H antes um conjunto de vibraces ascendentes,como diria
Fourier,de fragmentos pr-paradigimaticos....Entre outros aspectos,estes fragmentso
tm em comum o saberem que s possivel pensar para alm da modernidade a partir
dela,ainda que na forma das suas vitimas ou das tradices que ela propria gerou e depois
suprimiu ou marginalizou.Neste sentido,pode dizer-se que a modernidade fornece muito
dos materiais para a construco do novo paradigma. S no fornece o plano de
arquitetura nem a energia necessaria para o concretizar.

Boaventura nos aponta algumas pistas: As paixes de Schiller e dos romanticos e a


atraco apaixonada de Fourier so dois campos privilegiados de escavaco arquelogica
da modernidade...O novo paradigma prevalece-se neste dominio de Schiller e da sua
defesa da aparencia estetica (das aesthetische Schein) nas Cartas sobre a Educaco
Estetica do Homem , publicadas em 1795. Alias,Schiller representa,para o novo
paradigma,uma das tradices suprimidas da modernidade e,como tal,suscetivel de
contribuir para a configuraco da nova intelegibilidade.Schiller faz uma critica radical
da ciencia e da deshumanizaco administrativa e da especializaco profissional que ela
promove,uma critica,de resto,bastante semelhante feita por Rosseau.E,tal como
acontece com Rosseau,no anima Schiller nenhuma veleidade passadista,mas antes o
desejo de reconstruir a totalidade da personalidade nas novas condices criadas pela
modernidade.

Neste sentido,podemos dizer que Schiller,expressa claramente,a sensibilidade romantica


anti-capitalista de carater utopico-revolucionario.

Boaventura amplia seu leque de pistas:E ,para escavaco da amplitude concreta da


subjetividade,dois outros campos de escavaco arqueologica se me afiguram
fundamentais: Montaigne e Kropotkin,outros dois criadores culturais cujas ideias foram
suprimidas ou marginalizadas pela concepco hegemonica da modernidade
capitalista.Para Santos,Montaigne insistiu na necessidade de no perder de vista o
individuo concreto,e Kropotkin insistiu na solidariedade concreta,nos laos de ajuda
mutua.

A Pedagogia da Utopia Concreta

Todo amanh , porm, sobre o que se pensa e para cuja realizao se


luta , implica necessariamente o sonho e a utopia .
(Paulo Freire)

Sou esperanoso no por teimosia, mas por imperativo existencial .

(P.Freire)

No Brasil, a partir da experincia no campo da educao popular, PAULO FREIRE


desenvolveu uma profunda e radical reflexo sobre conceitos como utopia, esperana.
Obra recente de Joo Francisco de Souza , coloca a vigncia do pensamento de Freire
no mundo ps-moderno.
Segundo Joo, A proposta pedagogica de Freire se centra na questo cultural e,
dialoga com todos os quadrantes da Terra.

As varias obras sobre pedagogia,por exemplo:


A Pedagogia do Oprimido,
A Pedagogia da Indignao,
A Pedagogia da Autonomia,
A Pedagogia da Esperana,
a Pedagogia da Pergunta,
e ,tambm,o livro sobre Freire,A Pedagogia dos Sonhos Possveis,significam e
constituem uma verdadeira antologia da Pedagogia da Utopia.

Neste ltimo, vemos que a epistemologia de Freire implica a historia como


possibilidade e aes culturais movidas pelos sonhos, a Utopia libertadora. E,que
tem uma base ontolgica: a capacidade do ser humano de sonhar, a , nossa
capacidade ontolgica de sonhar. De projetar para um futuro mais proximo possvel
dias de paz, equidade e solidariedade. Reativar em nossos corpos conscientes as
possibilidades de sonharmos o sonho UTOPICO que Paulo h anos j vinha nos
convidando a sonhar o SONHO POSSIVEL -,(...)

Mas,principalmente,Freire escreveu um pequeno e profundo ensaio sobre Algumas


Reflexes em torno da Utopia:
Nunca falo da utopia como uma impossibilidade que , s vezes,pode dar certo. Menos
ainda, jamais falo da utopia como refugio dos que no atuam ou (como) inalcanvel
pronuncia de quem apenas devaneia.Falo da utopia,pelo contrario, como necesidade
fundamental do ser humano.Faz parte de sua natureza, histrica e socialmente
constituindo-se, que homens e mulheres no prescindam,em condies normais,do
sonho e da utopia.
Freire, critica,ento,de forma indignada aquilo que chama de discurso fatalista de
educadores que em face dos obstculos atuais ligados globalizao da economia
reduzem a educao a pura tcnica e proclamam a morte dos sonhos , da utopia (...) O
meu discurso em favor do sonho , da utopia,da liberdade,da democracia o discurso de
quem recusa a acomodao e no deixa morrer em si o gosto de ser gente, que o
fatalismo deteriora.

Freire fala da capacidade ontolgica de sonhar: Seres programados para aprender e


que necessitam do amanh como opeixe da gua, mulheres e homens se tornam seres
roubados se se lhes nega a condio de participies da produo do amanh.Todo
amanh,porm,sobre o que se pensa e para cuja realizao se luta implica
necessariamente o sonho e a utopia. No h amanh sem projeto,sem sonho,sem
utopia,sem esperana,sem o trabalho da criao e desenvolvimento de possibilidades
que viabilizem a sua concretizao.

Paulo Freire apresenta muitas afinidades com o pensamento de Ernst Bloch.Por


exemplo: vale dizer que o sonho possivel no se trata de uma idelaizao
ingnua,mas emerge justamente da reflexo critica acerca das condies sociais de
opresso cuja percepo no se faz determinista, mas compreende a realidade como
mutvel a partir da participao dos sujeitos que a constituem,sendo igualmente por ela
constitudos. Desse modo, incluir-se na luta por sonhos possiveis implica assumir um
duplo compromisso:

-o compromisso com a denncia da realidade excludente e o anuncio de possibilidades


de sua democratizao,
-bem como o compromisso com a criao de condies sociais de concretizao de tais
possibilidades.

Enfim, trata-se de assumir como um desafio decorrente da pratica educativa libertadora


o que Freire denominou INEDITO-VIAVEL, termo presente desde os seus primeiros
escritos.
Sem dvidas,as afinidades entre este conceito de Freire e o de ainda no-acabado
de Bloch , so evidentes.

Ana Maria Arajo Freire ressalta na Pedagogia da esperana a importncia da


compreenso do inedito-viavel para a assuno da historia como possibilidade. E
que, O risco de assumir a luta pelo inedito-viavel uma decorrncia da natureza
utpica. O inedito-viavel algo que o sonho utpico sabe que existe mas que s
ser conseguido pela prxis libertadora...uma coisa indita,ainda no claramente
conhecida e vivida,mas sonhada.

Assim, A conscincia da incompletude nos seres humanos leva-nos a envolver-nos


em um processo permanente de pesquisa. precisamente esta busca que faz com que a
esperana aparea.
Enfim,a criao do inedito-viavel representa uma alternativa que se situa no campo
das possibilidades e no das certezas.
Para Marx a liberdade se
manifestava na luta, mas no na luta competitiva, mas em uma luta consciente e
cooperativa. (E.Kamenka)

A Utopia Militante

Paul Singer em Uma Utopia Militante, Repensando o Socialismo (Vozes 1998)


tambm nos apresenta uma reflexo em que podemos encontrar afinidades com
alguns conceitos de Henri Lefebvre. Assim, A histria da cooperativa dos Pioneiros de
Rochdale , neste sentido, riqussima em lies. O xito econmico da cooperativa,
que depois foi replicado em numerosas localidades da Gr-Bretanha e de outros pases
em transio ao capitalismo industrial, demonstra que o modo de produo capitalista
apresenta BRECHAS que podem ser aproveitadas para organizar atividades
econmicas por princpios totalmente diferentes dos capitalistas e que, por isso, devem
ser denominados socialistas. Nestas brechas, pontos frgeis, lacunas onde
podemos construir o que Singer chama de implantes de socialismo, que se define na
perspectiva da autogesto:
Mesmo no capitalismo os implantes socialistas desempenham um papel positivo
ao difundir valores essenciais ao convvio em sociedade. Este fato abre um certo leque
de possibilidades de que algumas destas sementes germinem. O que poderia significar
isso? Que a democracia poltica se difundisse do mbito estatal ao das instituies
privadas: empresas, escolas, igrejas, prises, etc; ou que o fortalecimento do
sindicalismo fizesse crescer a influncia sobre a gesto econmica dos representantes de
operrios nas fbricas, bancos e demais empresas; ou ainda que cooperativas de
consumo e de servios se unissem para formar um grande mercado cooperativo
preferencialmente voltado aquisio de produtos de cooperativas de produo.
Na viso de Singer, o socialismo enquanto utopia militante desencadeou o que se
pode considerar ter sido um vasto processo de tentativas e erros no sentido de modificar
o capitalismo, compensando suas tendncias concentrao e destruio. E,assim,
diz Singer, Os implantes socialistas no capitalismo resultam de algo como um processo
de tentativas e erros. E dificilmente poderia ser diferente. A revoluo socialista, por
esta conceituao j em curso h quase dois sculos, no a concretizao de um
projeto mas o resultado de inmeras lutas no plano social e econmico, que se
estenderam por um nmero de naes, medida que a revoluo capitalista foi se
estendendo a novos pases e continentes.
nesta conceituao que Singer fala do ressurgir do cooperativismo e do que
genericamente se chama economia solidria como resposta crescente excluso
social produzida pelo neoliberalismo. A economia solidria formada por uma
constelao de formas democrticas e coletivas de produzir, distribuir, poupar e investir,
segurar. Suas formas clssicas so relativamente antigas: as cooperativas de consumo,
crdito e de produo, que datam do sculo passado (19).
Elas surgem como soluo, algumas vezes de emergncia, na luta contra o
desemprego. Ocupaes de fbricas por trabalhadores, para que no fechem, so
semelhantes ocupaes de fazendas por trabalhadores rurais sem- terra. Ambas so
formas de luta direta contra a excluso social, tendo por base a construo de uma
economia solidria formada por unidades produtivas autogestionrias.
Socialismo , Marxismo e Utopia

O homem sociaista deve se afirmar ,


simultaneamente, utopista e revolucionario
( M. Rubel)
Para Maximilien Rubel, Marx no aboliu a utopia,ao contrario, renovou seu sentido,
ampliando sua esfera de aplicao(...)inicialmente discpulo de Fourier e de Owen e
logo cedo profundamente engajado na luta poltica,Marx no rompera jamais as relaes
espirituais que o ligavam utopia socialista.
A este respeito, suficiente ler as respostas que forneceu, dois anos de sua morte, aos
populistas russos que lhe tinham perguntado sobre as chances e as perspectivas da
comuna camponesa russa diante da ameaa da penetrao do capitalismo na Rssia.
Em nenhum momento desta longa e penivel reflexo Marx no aborda problemas
polticos tais a constituio em classe ou a organizao do partido. Todo seu esforo de
reflexo se concentra nos caracteres originais da instituio arcaica da comuna rural e
sobre sua importncia enquanto elemento regenerador da sociedade russa e como
elemento de superioridade sobre os paises dominados pelo regime capitalista.
Para M. Rubel A utopia e a revoluo so as duas coordenadas histricas do
movimento operrio, os dois modos de intuio do pensamento socialista: a utopia , a
dimenso do espao; a revoluo,a dimenso do tempo. Assim, o movimento socialista
deve se pensar como utopia e como revoluo,um inseparvel do outro.O homem
socialista deve se afirmar simultaneamente utopista e revolucionrio.A revoluo e a
utopia aparecem como os fundamentos normativos da tica socialista,inseparveis um do
outro.Para ser socialista, deve-se desejar a revoluo e a utopia;desejar a abolio dos
tipos de sociedades existentes e desejar a criao da nova cidade.Implcita na maior
parte das doutrinas socialistas, essa tica marcou e continua a marcar numerosos
pensadores que se reclamam do socialismo,do comunismo e do anarquismo.Ela
fecundou em graus diversos o pensamento de Owen, de Fourier e de Saint-Simon, de
Marx e de Engels assim como de Proudhon e de Bakounin, de Sorel e de Kropotkine, de
Rosa Luxemburg e de Gustav Landauer.(...)
Conclue Rubel: O humanismo socialista, a tica da revoluo e da utopia.
Antonio Negri,no final dos anos 70,em seu estudo intitulado Marx au-del de
Marx.Cahiers de travail sur les Grundrisse, ao analisar a grande obra de Roman
Rosdolsky ( gnese e Estrutura de O Capital de Marx ), destaca o papel que
conferido a utopia:
Rosdolsky quando trata o problema do comunismo em Marx,sublinha,postas parte as
duas caractersticas habitualmente valorizadas ( centralidade do comunismo na obra de
Marx e de Engels, luta ao mesmo tempo contra o oportunismo e o utopismo) a
importncia e a pertinencia que tm em Marx,no mtodo dialtico ao mesmo tempo que
seu parentesco e sua divergncia com os utopistas.Isto ,para rosdolsky a dialetica
marxiana inteiramente atravessada pela UTOPIA POSITIVA,pela fora da
utopia,simplesmente temperada pela conscincia de lhe dar necessariamente uma forma
materialista.No espantoso que um Rosdolsky, um marxista formado na escola do
comunismo de esquerda dos anos 20, sabe ver em Marx a funo importante da utopia
positiva!E no podemos negar uma certa fora a essa sugesto: a utopia positiva
delimita sempre de forma muito precisa o campo dos revolucionrios do campo dos
oportunistas,conclue Negri.
O ltimo Marx
Em relao ao pensamento de Marx frente s questes oriundas da Rssia , podemos
nos apoiar na obra de T.Shanin.
Sigamos a reflexo de T.Shanin sobre os ltimos anos de vida de Marx, no qual,em dez
anos, deixou 30.000 paginas de notas escritas. No ltimo perodo de sua obra,Marx deu
um passo adiante em relao a uma conceituao mais complexa e realista da
heterogeneidade mundial das formas sociais,sua dinmica e sua interdependncia.A
mudana na perspectiva de Marx se produziu como uma reflexo sobre O
Capital,Volume I (publicado em 1867) e evidenciou uma nova experincia e
testemunho dos anos 1870.Para Shanin, quatro acontecimentos tiveram grande
influencia sobre Marx,neste perodo:
1) A Comuna de Paris em 1871 ofereceu uma dramtica lio e um tipo de poder
revolucionrio no conhecido at ento;
2) Durante os anos 1860 a 1870, ocorreu um fato fundamental nas cincias sociais:
a descoberta da prhistoria,que mudar a noo de tempo histrico e traria as
sociedades primitivas para o campo da pesquisa combinado com a etnografia;
3) Vinculado com os estudos sobre a prehistoria, a ampliao do conhecimento
sobre as sociedades rurais no capitalistas includas em um mundo capitalista;
4) A Russia e os russos ofereceram a Marx uma poderosa combinao de todos os
3 pontos anteriores: uma evidencia rica em relao com as comunas rurais
(arcaicas,mas evidentemente vivas em um mundo de realizaes capitalistas) e
com a experincia revolucionaria direta,junto com a teoria e a pratica do populismo
revolucionrio russo.
No centro das mudanas na viso de Marx, encontra-se a noo recentemente
percebida de desenvolvimento desigual,assinala T.Shanin.As Notas
Cronolgicas que Marx escreveu em 1880-1882 so claras a este respeito: Marx
volta seu olhar para o problema da interdependncia histrica dos povos e
paises,isto , a unidade sincrnica da historia.Marx agora aceita tambm para o
futuro uma multiplicidade de caminhos de transformao social dentro do marco
mundial de influencias mtuas e diferenciais.
O marxismo teve grande divulgao na Rssia;por exemplo, a primeira traduo de
O Capital foi russa,uma dcada antes da traduo inglesa.
Em 1870-1871,Marx estudou de forma autodidata o russo para conhecer diretamente
os fatos e debates publicados em lngua russa.Marx utilisou os livros dos
revolucionrios radicais russos para aprender o idioma,chegando mesmo aformar o
que ficou conhecida com a biblioteca russa de Marx.
Marx decidiu estudar a lingua russa em Outubro de 1869 ,quando lhe pediram
permisso para traduo de O Capital em russo. Recebeu de presente a obra de
V.V. Bervi-Flerovski, A situao da classe operaria na Rssia.Iniciou a
aprendizagem da lngua para ler este livro e, em fevereiro de 1870, j havia lido 150
paginas.Em 1875 e 1876, Marx seguiu suas leituras .Leu o apndice de Estatismo e
Anarquia de Bakunin, que lhe impressionou muito pelas criticas feitas ao aspecto
patriarcal e o carter fechado das comunas rurais.
T.Shanin carateriza a comuna russa: A atitude dos populistas revolucionarios em
relao comuna russa era coerente com sua concepo de mundo. Cerca de 3/5 da
terra cultivada da Rssia europia estava em mos das comunas camponesas e
cossacas. Nelas, cada famlia possua incondicionalmente s uma pequena parcela
de terra, a casa e uma horta,mais seu gado e ferramentas. A utilizao da terra
cultivvel era cedida a longo prazo a uma famlia pela comuna, a cesso dos campos
se refazia anualmente e,com freqncia, eram trabalhados de forma coletiva, e os
pastos e bosques eram de uso comunal.A diversidade de riqueza dentro da comuna
se devia fundamentalmente existncia de distintas propriedades de gado,diferentes
propriedades no agrcolas e possesso de terra privada adquirida por fontes no
comunais.A utilizao de trabalho assalariado dentro da comuna era limitada.Muitos
servios vitais eram organizados coletivamente pela comuna: um pastor para o
povoado, os guardas locais,o cuidado dos rfos e,com freqncia,uma escola,uma
igreja,um moinho,etc.Uma assembla de representantes de famlia controlava e
representava os interesses comunais:decidia acerca dos servios,elegia seus prprios
agentes e recolhia os impostos ou taxas irregulares.Com exceo de algumas reas
do Oeste (especialmente ex-polacos),a assemblia dividia periodicamente as terras
cultivveis de acordo com a mudana de tamanho das famlias implicadas.Um grupo
de comunas campesinas formava um VOLOST , com funcionrios locais, mas
autorizados e controlados pelas autoridades do Estado.Apesar desta vigilncia
estatal, a comuna desempenhava tambm o papel de uma orgenizao camponesa
politca de facto,uma proteo coletiva contra o mundo externo hostil, que inclua o
fazendeiro, a policia, o coletor de impostos,o ladro,o intruso ou o povoado
vizinho.
T.Shanin expe a posio dos revolucionrios russos frente comuna rural:
Para os populistas revolucionrios,a comuna camponesa era a prova da tradio
coletivista da maioria do povo russo,que permanecia viva apesar de sua supresso
pelo Estado.No tinham uma concepo acritica desta comuna,mas,em ultima
instancia,consideravam a comuna camponesa como o maior ativo com que
contavam para seus planos.Era vista como uma possvel ferramenta para a
mobilizao dos camponeses na luta anti-czarista.Estava destinada a ser a forma
bsica da futura organizao de poder local que eventualmente governaria a Rssia
junto com um governo nacional democraticamente eleito. Para Chernyshevski seria
tambm um marco eficaz para a produo agrcola coletiva na Rssia ps-
revolucionaria,que atuaria junto com a industria de propriedade pblica e uma
minoria de empresas privadas (transitrias ? ).A imagem tinha uma notvel
semelhana com algumas das realidades,imagens e planos da Rssia no perodo da
NEP (Nova Poltica econmica) de 1921 a 1927.
Em 1881, Marx meditou por trs semanas sobre a resposta que daria carta que lhe
enviou a revolucionaria russa Vera Zasulich.Enviou quatro folhas de resposta. Esta
carta fiocu durante 40 anos sem ser publicada.Foi descoberta por D.Riazanov (
primeiro diretor do Instituto Marx-Engels de Moscow ) em 1911, e publicada apenas
em 1924.Segundo Shanin, Estes escritos testemunham sua perplexidade,mas
tambm uma conscincia crescente respeito de um novo problema fundamental e o
primeiro enfoque dado ao mesmo. J em os Grundrisse (1857),Marx tinha
realizado estudos comparativos da agricultura camponesa e a propriedade rural
comunal nos grandes modos de produo pr-capitalista.A comuna camponesa no
era para ele uma questo exclusiva da Rssia.Na carta A Vera Zasulich, analisa a
existncia histrica da comuna rural em vrios paises e continentes.Para Shanin,
Marx no tinha duvidas sobre as limitaes da comuna arcaica: sua pobreza
material,seu provincianismo e sua debilidade contra as foras exploradoras
exteriores.Sua decadncia sob o capitalismo seria necessria.Sem
duvidas,ecidentemente,esta no era toda a historia.A experincia e o entusiasmo da
Comuna de Paris para Marx, a primeira experincia direta de uma nova democracia
popular e de uma organizao revolucionaria- agora,formavam parte do quadro.
Na carta a vera Zasulich,Marx afirma que: H que descer da pura teoria para
realidade russa ,e,no assustar-se com a palavra arcaico,pos,o novo sistema ao
qual tende a sociedade moderna ser a reatualizao em uma forma superior de um
tipo social arcaico.
T.Shanin resume em tres pontos a sintese de Marx sobre a comuna rural russa:
1) Na Rssia, as comunas rurais foram preservadas em uma ampla escala nacional.
2) As caractersticas estruturais da comuna rural: a= propriedade comunal da terra
oferece comuna russa uma base natural para a produo e apropriao coletivas;
b= a familiaridade dos camponeses russos com o ARTEL facilitaria grandemente a
transio da agricultura de parcela individual agricultura coletiva; c= na
explorao dos prados de propriedade comunal dos camponeses russos j praticam
uma forma de produo comunal.
3) Circunstancias histricas: a= a transio da agricultura de parcela individual
para um trabalho cooperativo vital para tirar a agricultura russa de sua crise,porm
as condies materiais desta transio j esto a mo na forma dos logros
tecnolgicos do sistema capitalista; b= o pblico russo referindo-se ao setor
educado,privilegiado desta sociedade-, que por tanto tempo tem existido as expensas
e custos da comuna rural, lhe deve os primeiros avanos necessrios para a
introduo do cultivo mecanizado; e , c= o desenvolvimento da comuna rural por
esta via exatamente o que as tendncias histricas do momento pedem,e prova
disto so as crises fatais que esto sacudindo a produo capitalista na Europa e
Amrica.
Shanin assinala outro ponto fundamental na reflexo de Marx: Outro ponto
importante do primeiro borrador de Marx em sua carta a Zasulich que considera
como uma debilidade da comuna russa sua caracterstica de ser uma espcie de
microcosmos localizado.Marx escreve pela primeira vezque o necessario para
eliminar totalmente esta debilidade abolir o VOLOST,uma instituio
governamental,e estabelecer em seu lugar une assemble de paysans [ Uma
ASSEMBLEIA de CAMPONESES(grifo nosso)] eleita pelas mesmas comunas e
capaz de servir comom instituio econmica e administrativa para proteo dos
interesses das comunas.

Voltemos a M.Rubel,para quem , fcil reconhecer, nesta apologia do microcosmo


localizado que para Marx a comuna russa, a ltima homenagem que ele faz Robert
Owen, pioneiro do socialismo cooperativo e comunitrio(...) No foi por acaso que
Marx aderiu utopia oweniana.A comuna cooperativa que ele imagina responde
problemtica da oposio entre a concepo jacobina (poltica) e a concepo que nos
chamamos atualmente, para mais clareza,comunalista do movimento operrio.
O Comunismo de Marx
Encontramos,tambm,em Eugen Kamenka (Os Fundamentos ticos do marxismo)
uma definio da viso de Marx sobre o que seria a sociedade comunista:
Tento mostrar nesse livro que Karl Marx chegou ao comunismo em busaca da
liberdade e no da segurana...No final de seus Manuscritos Econmico-Filosoficos,de
1814,Marx faz um retrato da sociedade comunista,a sociedade que considera trar a
autentica e definitiva liberdade humana.Os crticos mais benvolos defendem que se
trata de uma sociedade de artistas,que criam livres e conscientemente e que trabalham
em conjunto em perfeita harmonia.Marx pensava que em tal sociedade no haveria
estado,crimes nem conflitos.Cada homem participaria do trabalho produtivo com
outros homens.A luta seria comum; em seu trabalho e em outros seres humanos,o
homem j no encontraria a habitual dependncia e continuas desavenas, mas
liberdade e felicidade,assim como os artistas encontram inspirao em sua prpria obra
e na obra de outros artistas.Deste modo os homens seriam verdadeiramente livres e j
no teriam necessidades de regras impostas de cima, de exortaes morais para que
cumpram com seu dever, de autoridades que ditem o que se deve fazer.(...)Esta viso
do comunismo acompanhou Marx durante toda sua vida.Resulta evidente na Ideologia
Alem,de 1846; nas notas e borradores que preparou entre 1850-1859; em sua Critica
do Programa de Gotha,de 1875. Tambm se pe de manifesto nos trs volumes de O
Capital.Se trata de uma viso de liberdade, de cooperao espontnea, de
autodeterminao consciente dos homens.
Podemos acrescentar: de autogesto !
O Socialismo ,pr-Marx
Em introduo a sua excelente antologia Les socialistes avant Marx, Gian Mario
Bravo define o desafio imposto aos utpicos:
Com a Revoluo francesa e a conquista, pela burguesia,da direo do Estado,ocorre a
passagem de uma concepo ainda parcialmente feudal uma concepo moderna da
sociedade.Aps os utopistas, comunistas e materialistas do Sculo das Luzes, surgem
os revolucionrios,os organizadores do proletariado do sculo XIX: Meisler,
Morelly, Mably, Linguet (menos conhecido mais talvez mais realista) sucedem os
pensdores e os agitadores que fazem frente a um Estado todo potente,ou em vias de o
ser,uma burguesia rica e vigorosa,um proletariado miservel e explorado.De onde o
nascimento de alguns temas que so comuns, sob as formas diversas, aos autores que
estudamos aqui.
O problema da eliminao dos ltimos vestgios da aristocracia feudal e o da limitao
do poder econmico e poltico da burguesia,o problema dos meios de atender as
necessidades da classe nova que se apresenta na cena das naes;questes da
distribuio e da redistribuio das riquezas,questes inerentes a emancipao (por elas
mesmas ou por concesses do alto) das classe oprimidas,questes da renovao,da
substituio ou mesmo da eliminao de uma classe dirigente precocemente
envelhecida;problema da libertao espiritual pelo particular e pelo coletivo,da
emancipao e da liberdade individual,tanto para o homem quanto para mulher, da
imunizao e da harmonizao de todo o conjunto das relaessociais: tudo isto est
na base do pensamento progressista na Europa,nos anos compreendidos entre as duas
revolues (1789 e 1848) ou, de forma mais limitada, no perodo que os Alemes
chamaram de Vormarz, o pr-Quarenta-Oito, que cobre os anos indo da Restaurao
aos movimentos sociais revolucionrios que F.Engels nomeou de o Furao de 48.
E, enquanto que os escritores puramente democratiucos e republicanos se limitavam
propor formas de substituio dos governos do momento, agindo apenas no campo
poltico,se desinteressando dos problemas sociais ( ou apenas abordando de forma
indireta),os reformadores considerados na atual antologia fazem do momento social o
centro de suas observaes e de suas atividades,subordinando a elas o momento poltico
e dominando este ultimo,no sentido de no o considerar como o tema limitado um s
pais,mas geral,prprio humanidade inteira;no como um tema egosta e particular a
um povo, mas que interessa fraternalmente (segundo o conceito de Robespierre) a
todas as raas.Em 1844,August Becker dizia a este respeito em seu Que querem os
comunistas?:
Enquanto falamos de libertao da humanidade,no significa que a liberdade que
reclamamos,seja uma liberdade alem ou francesa ou norte-americana: ns queremos a
verdadeira liberdade do homem.
Esta a tese central que se apresenta no conjunto dos escritos de todos os que so
nomeados geralmente,e erradamente, utpicos,segundo uma falsa interpretao da
definio mais restrita de Engels,mas que, seguindo o sub-titulo desta
antologia,englobam os reformadores, revolucionrios,comunistas,socialistas e mesmo,
em alguns casos, os utpicos.
A questo principal,comum , sem duvidas nica: procurar para o homem liberdade
de viver,os meios,isto ,as condies necessrias para viver em uma sociedade na qual
todos os homens tenham as mesmas possibilidades.(...) O conceito iluminista e
racionalista se encontra superado,e substitudo pelo conceito que tem por base uma
realidade nova: a realidade de classe e o comunismo.(...).Em todos os pensadores, o
tema da comunidade ou do comunismo, portanto relacionado ao tema da liberdade(...).
A coincidncia dos trs termos: liberdade-reformas sociais-comunismo (ou socialismo)
representa a linha sobre a qual evoluem os diversos atores que, seja agindo
isoladamente,seja participando ativamente nas lutas sociais, fazem parte deste grupo
mais vasto dos precursores do socialismo cientifico e do movimento operrio em suas
organizaes atuais.
Eis o ponto de partida,para Babeuf e o movimento revolucionrio e jacobino do fim do
sculo XVIII: no se quer negar a influencia no desenvolvimento posterior do
movimento e da ideologia socialista, das duas grandes linhas representadas de uma parte
pela tradio do utopismo que,partindo da antiguidade clssica,tem seus sucessores em
Campanella e Morus,e de outra parte pela filosofia francesa,e particularmente o
comunismo utpico do sculo XVIII,que encontra no abade Meslier (1664-1769),em
Mably (1709-1785) e em Morelly seus principais representantes , finaliza Mario
Bravo.

Manifesto Comunista
(Marx e Engels )
Os sistemas autenticamente socialistas e comunistas, os sitemas de Saint-Simon, de
Fourier, de Owen,etc, surgem na primeira fase,ainda rudimentar, da luta entre o
proletariado e a burguesia.
Os inventores destes sistemas percebem, verdade,o antagonismo das classes,como
tambm a ao dos elementos dissolventes na sociedade dominante.Mas, eles no
discernem do lado do proletariado nenhuma espontaneidade histrica, nenhum
movimento poltico que lhe seja prprio.
Como o desenvolvimento do antagonismo de classes caminha passo a passo com o
desenvolvimento da industria,eles no descobriram as condies materiais da
emancipao do proletariado...Suas invenes pessoais deveriam suprir o que o
movimento social no produzia;as condies histricas da emancipao proletria, a
historia que lhes fornece,mas eles preferiam tira-las de suas imaginaes; em lugar da
organizao gradual e espontnea do proletariado em classe,eles queriam organizar a
sociedade segundo um plano especialmente imaginado para este efeito.A historia futura
do mundo se resolveria para eles na propaganda e na pratica de seus planos sociais.
Forjando seus planos, tinham conscincia de defender antes de tudo o interesse da classe
operaria que eles conheciam a imensa misria.E, unicamente sob este aspecto do
sofrimento extremo que o proletariado existia para eles. ..Eles desejam melhorar as
condies de existncia de todos os membros da sociedade , mesmo os mais
favorecidos...Estas pinturas imaginativas da sociedade futura nascem em uma poca em
que o proletariado,ainda em sua infncia, s consegue imaginar confusamente sua
prpria posio.
Mas os escritos socialistas e comunistas reafirmam igualmente os elementos
crticos.Eles atacam a sociedade existente em todos seus fundamentos. Forneceram, por
conseqncia, materiais de um grande valor para educar e esclarecer os trabalhadores.
Suas teses positivas sobre a sociedade futura, tais como a supresso da oposio entre
cidade e campo, a abolio da famlia, do ganho privado, do trabalho assalariado; a
proclamao da harmonia social, a transformao do Estado em uma simples
administrao da produo todas estas teses antecipam a desapario do antagonismo
de classes que est em seu inicio e que,em seus escritos,se apresenta sob suas primeiras
formas,ainda vagas e confusas.Assim, estas teses apresentam um sentido puramente
utpico. (Manifesto,1848)

Marx e a Autogesto
A relao entre marxismo e autogesto,sobretudo na obra de Marx, complexa. Roger
Garaudi encontra em Marx um dos defensores do cooperativismo e da autogesto.Por
sua vez,Henry Lefebrev afirma que o que encontramos na obra de Marx no suficiente
para defini-lo como um defensor da autogesto.
Sem duvidas,a questo no de ordem filolgica ou terminologia,mas poltica: ao
analisar a relao entre a construo da obra marxiana e as lutas operaris,vemos
claramente a presena da autogesto,enquanto objetivo da auto-emancipao dos
trabalhadores, na obra de Marx.
Todavia, a idia da autogesto perpassa a obra de Marx.Neste sentido, M. Rubel afirma
: O postulado da auto-emancipao proletria subentende a obra de Marx como um
leitmotiv, desde o manifesto antihegeliano e a Sagrada Familia de 1844 at a
Declarao Inaugural da I Internacional com seu lema: A emancipao da classe
operria ser obra da prpria classe operaria- , a Declarao sobre a Comuna de Paris e
as ltimas meditaes sobre o destino da comuna camponesa na revoluo russa.
Raya DUNAIEVSKAYA assinalou a relao intrinsica entre a obra de Marx e as lutas
dos operrios, mostrando como,sobretudo em O Capital, a obra de Marx atravessada
pelas lutas emancipatoria e autogestionarias dos trabalhadores.
Neste sentido, Raya analisa as relaes entre O Capital e a luta operaria na conjuntura
da Independncia norte-americana;e, a mesma relao frente a experincia da Comuna
de Paris.

MARX= 1848 e a Comuna de Paris

H uma relao profunda na viso metodolgica de analsie das lutas operaris ente o
grupo de M.Trointi e o norteamenricano de Raya e CLRJ (ver Harvey).Ambos grupos
reflete no campo terico as afinidades das formas de luta e de organizao do mov.
Operrio dos EUA e da Italia,diferentes do qus e passava na Frana e Alemanha,por
exemplo.

A Guerra Civil e O Capital

Em capitulo chamado de A Incidncia da Guerra Civil Americana na estrutura de O


Capital, Raya afirma os anos entre 1860 e 1870 so determinantes para estrutura da
maior obra terica de Marx, O Capital. Compara ento duas obras: Encontramos na
Critica da economia Politica o sinal dos limites de um trabalho terico, quando os
trabalhadores no esto em movimento.O Capital,ao contrario, uma prova do
impulso criativo da massa em movimento sobre a teoria.
As lutas operarias so mais que um simples pano de fundo das obras de Marx,
mostram mesmo como Marx chegou a reconstruir sua principal obra. A conjuntura de
longa durao marcada pela Guerra civil nos EUA, a insurreio polonesa, das greves
na Frana,e da demonstrao de massa na Inglaterra, que culminaram com a fundao
da AIT (1864).
O principal ponto da Guerra civil que Marx aborda o da reduo da jornada de
trabalho:
Nos EUA do Norte o movimento operrio independente estava paralizado enquanto
a escravido deturpava uma parte da Republica. O trabalho dos pele branca no pode
emancipar-se em um pais em que est marcado a fogo quando se de pele negra.mas,
aps a morte da escravido germinou uma vida nova e rejuvenescida.O primeiro fruto
da guerra civil foi a agitao pelas oito horas...O Congresso Operrio de Baltimore (16
de agosto 1866) declarou: A primeira e grande necessidade do presente, para libertar o
trabalho desse pais da escravido capitalista, a promulgao de uma lei pela qual deve
constituir-se a jornada de trabalho normal em todo os Estados da unio
americana.Estamos decididos a empregar todas nosssas foras para conseguirmos esse
glorioso resultado (O Capital, vol. 1,cap.1,a jornada de trabalho).
A influencia da guerra civil americana sobre a Europa (Comuna de Paris) est afirmada
no fim do inicio de O Capital, onde Marx , no prefacio, escreve que : Como a guerra
de independncia americana do XVIII sculo soou o martelo para classe media
europia, tambm a guerra civil americana do sculo XIX soou o martelo para classe
operaria europia.
Raya analisa a relao estrutura de O Capital e a Guerra civil nos EUA. Entre o 1861
e o 1867 o manuscrito da Critica, torna-se O Capital, e sofre duas mudanas
fundamentais,uma em 1863 e outra em 1866. Podemos retraar estas mudanas seja
confrontando o Capital com os manuscritos no ponto em que Marx os abandonou
(Engels nos fala no prefacio ao segundo volume de O capital) seja estudando as cartas
de Marx. Em carta a Engels de 15 agosto 1863, afirma de ter refeito tudo:
...Quando examino esta compilao ( o manuscrito de A Critica, que estava
reelaborando sob o titulo de O Capital) vejo que tive de refazer tudoe que tive que
rever tambm a parte histrica do material em parte desconhecido....
Quando,tres anos depois,tem tudo pronto para editar,Marx informa Engels de que tem
acrescido outra parte: para parte histrica,desenvolvi o capitulo sobre a jornada de
trabalho que no estava no meu primeiro projeto (10 fevereiro 1866).
Raya revela seu estranhamento em que parece incrvel que no final de 1866 Marx
ainda no tivesse elaborados as setenta paginas sobre a jornada de trabalho,mesmo
quando reelaborou a Critica para escrever o Capital,nem dessa vez figurava um capitulo
sobre a jornada de trabalho. comprensivel que Ricardo no se ocupasse da jornada de
trabalho,porque tinha excludo todo o problema da origem da mais-valia.Que os
socialistas, dos utpicos a Proudhon e a Lassale,no sentiram a importncia desta
questo,se explica facilmente,porque estavam muito ocupados com seus planos,para
estudar o movimento real dos trabalhadores.
Inclusive, Marx j havia escrito sobre a acumulao primitiva de O capital ,que
descreve a legislao sanguinria contra os expropriados ,tratando tambm da lei
sobre o aumento da jornada de trabalho.
Marx afirma que A fixao da jornada de trabalho normal o resultado de uma luta
multisecular entre capitalistas e operrios. Como conseqncia Marx revolucionou seu
mtodo de analise: enquanto na Critica, historia e teoria estavam separadas,com uma
explicao histrica acrescentada a cada capitulo,em O Capital teroia e historia so
inseparveis.Enquanto na Critica a historia historia da teoria, em O Capital a
historia historia da luta de classes. Assim, o pnesamento terico alimentado pelas
lutas e pelos pensamentos dos trabalhadores.
Quando o Capital foi publicado,em 1867, encontramos esse tributo ao pensamento
autnomo dos trabalhadores:
Ao pomposo catalogo dos direitos inalienveis do homem faz parte a modesta
Magna Carta de uma jornada de trabalho limitada por lei, que esclarece finalmente
quando termina o tempo vendido pelo operrio,e quando comea o tempo que pertence
ao prprio operrio.(Capital)
Portanto, o conceito da teoria da mais-valia implica a diviso da jornada de trabalho em
trabalho pago e trabalho no pago.A lei da reduo da jornada expressa esse elemento, a
partir da prpria experincia de luta dos trabalhadores.
.Para Raya,O movimento real do proletariado,nesse estagio especifico do
desenvolvimento capitalista,revela no apenas o lado negativo da luta pela jornada de
trabalho a luta contra a ilimitada explorao capitalista- mas tambm os aspectos
positivos: o caminho da liberdade.
O capitulo intitulado Historia da Teoria,que no primeiro plano deveria vir em seguida
ao capitulo sobre a compra e a venda da fora de trabalho, foi colocado para o final do
livro IV de O Capital. Raya: Ao invs de conduzir um discurso continuo com os
teoricos, ele enfrenta diretamente o proceso de trabalho,e assim,a jornada de trabalho
Desta forma,Marx cria uma nova dialetica: Essa nova dialtica o conduz a
enfrentar,teoricamente, a resistncia dos trabalhadores no interior da fabrica ou fora
desta.Resultou um novo capitulo do Capital,sobre a Jornada de Trabalho.

Neste sentido, Raya analisa as relaes entre O Capital e a luta operaria na conjuntura
da Independncia norte-americana;e, a mesma realo frente a experincia da Comuna
de Paris.

A Comuna de Paris e O Capital

Raya analisa como A Comuna de Paris ilumina e aprofunda o contedo do Capital.


Marx tinha iniciado a sua analise do capitalismo cerca de trinta anos antes da Comuna
de Paris (1871).O trabalho foi o fio condutor de sua teoria. O conceito de trabalho
alienado lhe permitiu escavar a fundo o mecanismo interno da produo capitalista.A
primeira edio do Capital, de 1867, mostrava que para Marx o eixo terico do Capital
o ncleo central i- o problema do plano; o plano desptico do capital contra o plano
cooperativo do trabalho livremente associado.
Os comunardi, reorganizando totalmente a sociedade* , lanaram novas luzes sobre a
perversidade das relaes em regime capitalista.destruram o estado do velho tipo e o
substituram com a Comuna,pondo fim a diviso hierrquica do trabalho, e tambm
diviso entre poltica e economia...O proletariado demonstrava como se exprime a
forma absolutamente nova de cooperao.
Antes da Comuna,Marx escreveu que s o trabalho livremente associado poderia
infrigir o fetichismo da mercadoria.Agora,que os comunardi o punham em pratica, a
teoria se ampliava no fato concreto...Marx prepara uma nova edio,para Frana,do
capital e que, como adverte no prefacio,mudou de modo significativo o capitulo sobre
o fetichismo da mercadoria.
Em 1867,ano da primeira edio do Capital,Marx pe o fetiche da mercadoria como
forma. Insiste sobretudo na fantastica forma de aparncia das relaes de produo
como troca de coisas. S aps o esboo da Comuna de Paris a edio francesa tira o
acento da forma fantstica para necessidade da forma de aparncia,porque esta ,em
verdade, o que as relaes entre os homens so,no momento da produo: relaes
materiais entre pessoas e relaes sociais entre coisas.
A novidade foi essa: a Comuna,liberando o trabalho dos limites da produo de
valor,mostrou como o povo se associou livremente sem o despotismo do capital ou a
mediao da coisa(...) A Comuna transformou todo o problema da forma,do debate
intelectual a concreta atividade dos trabalhadores (...)A riqueza humana revelada na
Comuna,mostrou claramente que o fetichismo da mercadoria nasce da forma de valor
seja como desenvolvimento lgico ou como fenmeno social. A novidade foi a
concreo que isto trouxe ao conceito marxista de relaes entre ideal e real.
* ver ,Tomo I ,O Programa da Comuna de Paris.

Em seu livro sobre as teorias da autogesto,Roberto Massari ,aps longo estudo das
obras de Marx,conclui:
Cremos ter mostrado com suficincia acontinuidade que oferece a reflexo do jovem
Marx sobre a problemtica da autoemancipao, a formulao mais concreta que o
problema assume no curso da elaborao marxista mais madura: a eutogesto dos
produtoresa ssociados,entendida como controle e participao direta dos trabalhadores
sobre o conjunto da atividade econmica e social, a forma que dever distinguir
sociedade comunista de todas as precedentessociedades de classe ou de caricaturas
utopistas do sculo XIX.
Massari,em relao ao texto Chamamento Inaugural da AIT,de 1864, declara que
Uma leitura do texto pode seu til,neste ponto, para demonstrar,sem a menor duvida,
que a temtica da autogesto orgnica dentro do pensamento de Marx, chegado a um
determinado nvel do prprio desenvolvimento.
Massari destaca neste desenvolvimento o periodo dos Anais Franco-Aemes
(1844),em que o sujeito social aparece para Marx em suas mobilizaes de massa
atravs dos teceles da Silesia. Os contatos de Marx com os operrios de Paris, em um
momento em que as organizaes operarias parisienses conhecem um processo de
rpido desenvolvimento,que,iniciado em 1839-1840,prosseguir sem interrupes at a
catstrofe de 1848.E como sempre ocorre na historia do movimento operrio, o periodo
de cresceimento organizativo dos anos 40 coincide tambm com uma fase de intenso
debate terico e de rpido amadurecimento poltico de uma parte da vanguarda que
anima o jovem socialismo francs.J no so alguns cenculos de burgueses cultos que
se renem para conspirar ou para dissertar sobre os destinos do mundo, mas centenas e
centenas de quadros operrios que, junto aos mais radicais dos intelectuais proveninetes
das fileiras da burguesia,organizam escolas de formao ideolgica, centros de debates
e de estudo, formulam programas de reivindicaes para os trabalhadores
e,sobretudo,constroem as estruturas organizativas que por um certo tempo seriam
conhecidas com o nome de associaes operarias.Ao mesmo tempo,s e assiste tambm
a um processo de proletarizao.
Prossegue Massari: pouco depois,no mesmo perodo (maio de 1843),quando aparece
em Frana LUnion Ouvrire de Flora Tristan,em que,sob a influencia do cartismo e
do movimento owenista ingls, formula-se a necessidade de superar o velho
associativismo artesanal,muito ameaado pelos perigos corporativos,com o objetivo de
fundar uma grande Unio Operaria...O que nos interessa notar como o tema da
autoorganizao, j implcito na Union Ouvriere,foi tomado e desenvolvido por Marx,
que seguramente devia conhcer a obra de Tristan durante sua primeira estadia em
Paris.

Em seu livro sobre as teorias da autogesto,Roberto Massari ,aps longo estudo das
obras de Marx,conclui:
Cremos ter mostrado com suficincia acontinuidade que oferece a reflexo do jovem
Marx sobre a problemtica da autoemancipao, a formulao mais concreta que o
problema assume no curso da elaborao marxista mais madura: a eutogesto dos
produtoresa ssociados,entendida como controle e participao direta dos trabalhadores
sobre o conjunto da atividade econmica e social, a forma que dever distinguir
sociedade comunista de todas as precedentessociedades de classe ou de caricaturas
utopistas do sculo XIX.
Massari,em relao ao texto Chamamento Inaugural da AIT,de 1864, declara que
Uma leitura do texto pode seu til,neste ponto, para demonstrar,sem a menor duvida,
que a temtica da autogesto orgnica dentro do pensamento de Marx, chegado a um
determinado nvel do prprio desenvolvimento.
Massari destaca neste desenvolvimento o periodo dos Anais Franco-Aemes
(1844),em que o sujeito social aparece para Marx em suas mobilizaes de massa
atravs dos teceles da Silesia. Os contatos de Marx com os operrios de Paris, em um
momento em que as organizaes operarias parisienses conhecem um processo de
rpido desenvolvimento,que,iniciado em 1839-1840,prosseguir sem interrupes at a
catstrofe de 1848.E como sempre ocorre na historia do movimento operrio, o periodo
de cresceimento organizativo dos anos 40 coincide tambm com uma fase de intenso
debate terico e de rpido amadurecimento poltico de uma parte da vanguarda que
anima o jovem socialismo francs.J no so alguns cenculos de burgueses cultos que
se renem para conspirar ou para dissertar sobre os destinos do mundo, mas centenas e
centenas de quadros operrios que, junto aos mais radicais dos intelectuais proveninetes
das fileiras da burguesia,organizam escolas de formao ideolgica, centros de debates
e de estudo, formulam programas de reivindicaes para os trabalhadores
e,sobretudo,constroem as estruturas organizativas que por um certo tempo seriam
conhecidas com o nome de associaes operarias.Ao mesmo tempo,s e assiste tambm
a um processo de proletarizao.
Prossegue Massari: pouco depois,no mesmo perodo (maio de 1843),quando aparece
em Frana LUnion Ouvrire de Flora Tristan,em que,sob a influencia do cartismo e
do movimento owenista ingls, formula-se a necessidade de superar o velho
associativismo artesanal,muito ameaado pelos perigos corporativos,com o objetivo de
fundar uma grande Unio Operaria...O que nos interessa notar como o tema da
autoorganizao, j implcito na Union Ouvriere,foi tomado e desenvolvido por Marx,
que seguramente devia conhcer a obra de Tristan durante sua primeira estadia em
Paris.
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Marx e a Auto-Emancipao dos Trabalhadores
( Filosofia da Prxis e Autogesto )

A emancipao dos trabalhadores ser obra dos prprios trabalhadores ( Marx ).

Michael Lowy,em sua obra sobre A teoria da revoluo no jovem Marx,sistematiza a


relao da vida e obra de Marx,de sua Prxis,seu itinerario politico-filosofico,com as
correntes radicais do movimento operario de sua poca.
Lowy caracteriza o perodo 1789-1830 ,na historia do movimento operrio e do
socialismo moderno,como sendo uma fase de transio entre o messianismo burgues
e a idia da auto-emancipao operraia, transio que se manifesta sob duas formas
caractersticas:
1- o socialismo utpico
2- as sociedades secretas.
E que,Os fundamentos historicos destas formas devem ser buscados no estado ainda
embrionario do movimento operrio e do proletariado,no sentido moderno do termo.
Para Lowi, as condies para emergncia da idia da auto-emancipao podem ser de
ordem conjuntural uma situao revolucionaria- ou estrutural a condio proletaria.
a coincidncia destas duas ordns que a transforma em idia-fora das grandes massas
populares.
Nas conjunturas revolucionarias: a atitude dos trabalhadores traduz o carter
eminentemente pratico da tomada de conscincia:
- a experincia da ao popular armada;
- a acentuao dso conflitos sociais;
-a desmistificao dos grandes homensdas camadas dominantes;
em uma palavra, a praxis revolucionaria,se traduz ao nvel da conscincia da
vanguarda e das massas pela radicalizao das aspiraes igualitrias e pela ecloso do
projeto de auto-libertao.
Aqui,encontramos as afinidades entre as idias de Lowy e as de Joo Bernardo sobre
as lutas coletivas e ativas caracteristicas das conjunturas
revolucionarias.Tambm,Moth analisou estas conjunturas de crise revolucionaria e
seu papel para a autogesto,no sentido do processo de aprendizagem coletiva dos
trabalhadores.
Para Michael Lowy,a conjuntura tem um grande peso:Em regra geral, somente no
curso do desenvolvimento de grandes crises revolucionarias que as grandes massas do
proletariado se identificam com as grandes linhas da (auto)emancipao.
Lowy recorre a Daniel Guerin,para caracterizar que durante as lutas reolucionarias
dos anos II e III na Frana,o mesmo genro de conflitos se estabeleceu entre os
representantes mais combativos dos sans-culottes,e a ditadura jacobina.Os
enrages,sob o lema de Povo salva-te a ti mesmo,incitavam as massas a no esperar
sua salvao pelas autoridades constitudas,mas de um tremor revolucionario de um
movimento espontneo.
Lowy destaca o papel do movimento britnico do Cartismo na obra de Marx.
Marx conheceu o cartismo atravs da obra de Buret,Da misria das classes laboriosas
na Inglaterra e na Frana(1840); na obra de Carlyle sobre o
Cartismo(1840),e,sobretudo,na obra de Engels,A Condio da classe operaria na
Inglaterra(1845).
Nestas obras,Marx orienta,ento,sua obra no sentido de considerar :o movimento
comunista como expresso autnoma das massas operarias.
Mas,ser na obra de FLORA TRISTAN,que desenvovleu as cocnepes da auto-
organizao e da auto-emancipao dos operrios,que Marx se inspira.
Foi durante sua quarta viagem a Inglaterra,em 1839,que Flora Tristan descobriu o
cartismo,do qual traou um perfil pleno de entusiasmo em seus Passeios em
Londres(1840).
Lowy sintetiza em dois temas centrais a obra de Flora:
1= A unificao do proletariado:
2= A auto-emancipao do proletariado.
Vale ressaltar que a palavra-de-ordem da AIT,adotada por Marx,de que A libertao
dos trabalhadoress era obra dos prprios trabalhadores, lema da autogesto, de Flora
Tristan.
Em relao ao primeiro, Flora comea pela critica radical das associaes artesanais
(que apenas ameniza os sofrimentos individuais,mas que no melhora em nada a
posio material e moral da classe operaria);critica do corporativismo (que divide a
classe operaria em uma multido de pequenas sociedades particulares).
A esta diviso dos operrios,causa verdadeira de seus males,Flora Tristan ope a
UNIO OPERARIA, cujo objetivo central constituir a UNIDADE
compacta,indissolvel da CLASSE OPERARIA.
Em relao ao segundo, Flora o deduz a partir de uma comparao entre a revoluo
francesa burguesa de 89 e a emancipao futura do proletariado:
na verdade,se os burgueses estavam na cabea, tinham por braos o povo do qual
eles sabiam se serviam habilmente.Quanto a vs,proletrios,no tens ningum para vos
ajudar.Tens que ser ao mesmo tempo a cabea e os braos.
M.Lowy destaca a influencia que teve na obra de Marx, uma Revolta da poca : a
insurreio dos teceles de junho 1844 na Silsia, acontecimento que teve um papel de
catalizador,de mutao terico-pratica ,de demonstrao concreta e violenta do que se
desenhava j de suas leituras e contatos parisienses: a tendncia potencialmente
revolucionaria do proletariado.Pois,Tratava-se de um conflito entre proletrios e
capitalistas e no de um movimento ludista de artesos contra as maquinas.Era contra
os burgueses e no contra as maquinas que a insurreio se fez; de outra parte,as
repercusses do fato em toda a Silsia,a Boemia,em Praga e mesmo em Berlim,onde
greves e revoltas operrias se sucederam durante junho,julho e agosto 1844,indicando
que no se tratava de um simples acontecimento local....
Para Lowy,Foi esta insurreio dos teceles que ,de uma certa forma,desencadeou em
Marx o processo de elaborao terica que levou em 1846 ruptura definitiva com
todas as implicaes do jovem hegelianismo,e mesmo Feurbach.
A sintese terica dialtica,Marx a realizou atravs de ,
a) superao das limitaes de carter social (artesanal,pequeno-burgues),nacional ou
terica das experiencias e ideologias;
b) sua confrontao coma realidade socio-economica do capitalismo e da sociedade
burguesa.
Neste processo de conservao e superao,as tendncias que formam o ponto de
partida histrico e concreto so mltiplas:
- a tradio revolucionaria do babouvismo;
- o comunismo materialista dos anos 1840 ( Dzamy );
- o esforo de auto-organizao e de auto-emancipao operaria ( cartismo, F.Tristan);
- a prxis da ao revolucionaria de massas (revoltas cartistas,insurreio dos teceles
silesianos).(M.Lowy).
No campo terico, Sob a influencia de suas leituras histricas e econmicas,e de seus
primeiros contatos com o movimento operrio de Paris, Marx adere definitivamente ao
comunismo Os Manuscritos(1844) so o primeiro escrito onde ele se proclama
comunista -,abandona a temtica jovem hegeliana da filosofia ativa,e esboa uma
analise econmica da condio proletria.Neste obra,Marx tece consideraes sobre a
alienao do trabalho.
Mas,nos Manuscritos,Marx no se ocupa praticamente do problema das relaes entre
os operrios e o comunismo,nem da revoluo emancipatoria.E que, A partir de seus
contatos com o movimento opearrio,a partir da revolta dos teceles,Marx conclui,em
artigo do Vorwarts,que o proletariado o elemento ativo da emancipao.De qual
atividade se trata ? Evidentemente, da atividade revolucionaria dos operrios em luta
contra o estado de coisas existente.
Esta prxis revolucionaria tem,de inicio,para Marx,uma significao poltico-social:
reverso da estrutura social pela ao das massas;mas,se ele pe o termo entre aspas,
porque lhe d um sentido mais amplo,que inclui a transformao da natureza pela
atividade humana: O TRABALHO (grifo nosso).
Enfim,para Lowy: A categoria da prxis revolucionaria o fundamento teorico da
concepo marxista da autoemancipao do proletariado pela revoluo.
Na teoria, a ruptura decisiva,em nivel do problema da conhecimento,entre Marx e a
filosofia do sculo XVIII (ou toda a filosofia anterior) dada com a Tese XI (sobre
Feurbach): Os filsofos tm simplesmente interpretado o mundo de forma
diferente,trata-se de transforma-lo.
Uma atividade humana total,atividade critico-pratica,na qual a teoria j prxis
revolucionaria,e a pratica,carregada de significao terica.As Teses sobre Feurbach,
esboam uma estrutura significativa global: a filosofia da praxis fundamento
terico geral da idia da auto-emancipa revolucionaria do proletariado.
Lowy situa o papel central desta idia na vida de Marx: A teoria da auto-emancipao
do proletariado no um episodio da juventude ,um momento transitrio,abandonado
pelo Marx da maturidade.Foi, durante todo o periodo indo de 1848 at a morte de
Marx,uma das presuposies fundamentais de sua atividade.Ela ilumina e contribui a
dar seu verdadeiro significado seus grandes combates polticos e poltico-ideologicos:
a revoluo alem de 1848-1850, a luta contra Lassalle e contra Bakounin, a Comuna de
Paris,a critica do oportunismo da social-democracia alem.
Lowy centra-se no Adresse ao Conselho da Liga Comunista(1850),em que Marx
define o conceito de revoluo permanente,contrario a definio de revoluo que o
prprio Marx fez em 1848,no Manifesto Comunista,com Engels.Desta vez,Mar prega
a autonomia da luta operaria frente burguesia,por no crer que esta possa ter uma
atitude revolucionaria.
Segundo Lowy,O Adresse ,sem duvidas,uma previso genial das revolues
socialistas do sculo XX,comeando pela de 1917....Uma leitura com ateno do
Adresse mostra que o sujeito da ao revolucionaria no mais a Liga dos Comunistas
ou uma minoria de estilo jacobino,mas os OPERARIOS(grifo nosso).
Michel aborda a questo das formas de luta: Quais formas deveria tomar a luta
revolucionaria e autolibertadora das massas proletrias ? Segundo o Adresse,os
proletrios devem constituir seu prprio poder frente ao poder burgus,pela formao de
CONSELHOS OPERARIOS (grifo nosso):
Deve-se ao lado novos governos oficiais,estabelecer ao mesmo tempo seus prprios
governos operrios revolucionarios seja sob a forma de municipalidades ou de
conselhos municipais,seja pelos clubes ou os comits operrios, de tal forma que os
governos democrticos burgueses,no apenas percam o apoio dos trabalhadores,mas se
sintam,primeiro,controladose ameaados pelas autoridades que tm apoio de toda a
massa dos operrios.
Michel sublinha a extraordinria similitude entre esse programa e os acontecimentos
de 1917: organizao dos soviets,dualidade de poder,etc.Evidentemente,o poder destes
conselhos no pode ser exercido sem o armamento dos operrios,sem a formao de
uma guarda vermelha.
Para Michel,No fundo, o Adresse retoma,sob uma forma pratica,precisa e concreta os
principais temas revolucionrios das obras da juventude: a teoria da revoluo
permanente de 1844, a teoria da revoluo comunista proletaria de 1845-1845, a teoria
do partido operrio de 1847-1848.Ela lhes responde luz de uma experincia histrica
real a revoluo alem de 1848-1850 e o conjunto,com seus desenvolvimentos
estratgicos e tticos,constitui a mais extraordinria prefigurao das revolues
socialistas do sculo XX.
Em relao Comuna de Paris,O povo agindo por si e para si mesmo(Marx),Marx
mostra, que a revoluo comunista,obra dos prprios trabalhadores,deve quebrar esse
aparelho o Estado, adequado dominao parasitaria sobre o povo- e substitui-lo por
instituies adequadas ao auto-governo popular.E que, Marx viu na Comuna a
primeira manifestao real desta auto-emancipao revolucionaria e comunista do
proletariado e que ele prefigurou a forma desde 1846.
Para complementar estas idias de M.Lowy,voltemos as obras de M.Rubel, em que
mostra como Marx chegou a idia de Associao.
Em seu livro Essai de Biographie Intellectelle, Rubel em capitulo intitulado Une
Vocation,poque et mileu, inicia afirmando que Como toda obra do esprito, a de
Marx se enraza na vida social e intelectual de sua poca e de seu meio().O
pensamento de Marx se formou nos anos 40 dos culo 19 e seu pais, de todos os paises
alemes,era o mais apto servir de espao para as novas idias sociais que, da Frana,
cobria toda a Europa ocidnetal.Com efeito,a Renania ,terra natal de Marx,prestava-
se,por sua situao geogrfica,a ser o lugar de encontro das correntes intelectuais vindas
da Frana e da Outra-Mancha;dai sua ascendncia sobre a Alemanha em geral.
Na epoca o grande mal da civilizao industrial era o pauperismo,a miseria social que
atingia as camadas urbanas e rurais.
Rubel examina a trgica figura de georg Buchner,poeta,naturalista e
conspirador,morot aos 24 anos,se destaca claramente do cinzento meio liberal alemo
dos anos 30. Formado na escola de Babeuf,de Saint-Simon e de Fourier,Buchner foi o
primeiro proclamar na Alemanha a luta de classes.Sob efeitos da Revoluo
Francesa,Buchner tinha,como nenhum outro esprito alemo,a viso do trgico na
historiaEm tudo o que Buchner escreveu existe um pesado pressentimento, uma
sensibilidade extrema s ameas da poca.
O manifesto que redigiu em 1834 fornece os dados sobre a explorao dos
camponeses pobres pelos governos alemes,os burocratas e as casatas militares,mas no
h a mnima tentativa de analise social ou esboo de um plano de reformas.Buchner,era
a voz da revolta pura,o protesto em ato de uma classe desafortunada e sem plano
histrico: o campesinato da poca.Mesmo assim,Buchner fundou uma Sociedade dos
direitos do Homem,mas a policia prendeu todos seus membros.
Rubel aponta o nome de Ludwig Gall ( funcionrio em Trves desde 1816 e morto em
1863),como o pioneiro das idias de auto-emancipao operaria na Alemanha;
Foi da Frana que penetrou na Alemanha a idia da associao como meio servio
da luta de classes e da emancipao operaria.Ela acha em L.Gall um protagonista
ativo,dotado de capacidade de inveno extraordinrias () A causa fundamental da
misria das classes deserdadas, ele a descobriu na desvalorizao do trabalho humano
em rela ao dinheiro que domina todos
Em 1819,uma sociedade de imigrantes o enviou aos EUA para adquirir um terreno para
construo de uma colnia.Em 1820 voltou Trves e publicou um volume relatando
sua experincia.a partir dai,seu credo ser a socializao das classes trabalhadoras e
seus escritos defenderam a cooperao operaria e camponesa.
Foi a primeira vez que tal idia fez sua apario na Alemanha,e isto na cidade natal de
Marx,conclue Rubel.
Marx e a Autogesto
Aprofundemos a relao entre o autor de O Capital e a Autogesto.Bourdet tentou
uma sistematizao destas questes.
Bourdet afirma,de modo paradoxal,que Marx o melhor terico da autogesto.Porm,
isto no evidente: h o que Marx escreveu;o que existia antes de 1848 (textos
jovens),sobretudo,a correspondencia com Engels que so cartas muito vivas,cheias
de vida; h o que se fala como marxismo.
Em seu ensaio Karl Marx e a autogesto (1971),Bourdet precisa que : Se Marx no
utilisa a palavra autogesto, ele se interessa (vamos prova-lo por numerosos textos) ao
que esta palavra designa e que podemos chamar de cooperativas de produo.
Vamos tomar a tentativa de sistematizao de Bourdet como base para esta parte de
nosso trabalho. Bourdet tomou como base de seu trabalho a obra de M.Rubel. Bourdet
realizou uma operao que chamou de re-leitura : no para projetar entre as linhas, o
que Marx no escreveu . Ao contrario, para dar vez aos textos
esquecidos,negligenciados,rejeitados ou simplesmente jamais lidos. Ou que , Para
escapar de dedues a partir de uma montagem hbil de alguns textos, necesssario
ver exatamente o que Marx disse ,ele mesmo,.
Yvon Bourdet tomou como fonte bibliogrfica , a edio das Obras de Marx pela
Biblioteca da Pliade . Entretanto, podemos encontrar os mesmo textos em :
1-Pages de Karl Marx:
- Pour une thique socialiste: vol.1.
-Sociologie Critique. / vol.2.
2- Rvolution et Socialisme. Choisis,traduites et prsentes par M.Rubel. Petite
Bibliothque Payot, 1970.
3-Marx Critique du Marxisme . Payot . 1974.
4- Chronologie de Marx.ditions Gallimard.1963
5- Karl Marx.Essai De Biograpfie Intellectuelle.M.Rivire.1971

- No Manifesto Comunista ( 1848) , Marx afirmava sobre os meios da revoluo:


Todos os movimento do passado foram de minorias ou favoreceram minorias.O
movimento proletrio o movimento autnomo da imensa maioria no interesse da
imensa maioria.
Bourdet= Quando o proletariado,classe universal, tiver tomado o poder, no haver
mais classes e por conseqncia mais de lutas entre elas :
A velha sociedade burguesa, com suas classes e conflitos de classe, deixar espao
para associao em que o livre desenvolvimento de cada um a condio para o livre
desenvolvimento de todos.
Se o capital transformado em propriedade comum pertencendo a todos os membros
da
sociedade, isto no significa que a propriedade pessoal se transforme em propriedade
social. Apenas muda o carter social da propriedade: ela perde seu carter de classe.
Bourdet= Notamos, de passagem , que Marx d assim a definio exata de uma
sociedade autogerida.
- Bourdet,comentando a polemica de Marx com Bakunin:
Marx no queria que seu partido fosse um partido como os outros,nem sua ao um
conjunto de pequenas astcias construdas no segredo dos aparelhos dirigentes.Os
trabalhadores deveriam,segundo Marx, autogerir suas lutas. um tema constante que
aparece,com intervalos, em seus escritos e em sua ao.Vejamos os seguintes exemplos:
1848= O movimento operrio o movimento autnomo da imensa
maioria.(Manifesto Comunista);
1864= A emancipao da classe operaria deve ser obra dos proprios trabalhadores
(Estatutos da AIT).Rubel identifica neste solgan, Marx formulou em s frase o
postulado implcito de todo verdadeiro pensamento socialista, enunciado desde 1844
por Flora Tristan.
1866= A obra da Associao Internacional de unificar os movimentos espontneos
da classe operaria, e no de preescrever ou de impor um sistema doutrinrio qualquer
que seja.(primeiro Congresso da AIT)
1868= A AIT (...) no filha nem de uma seita nem de uma teoria.Ela o produto
espontneo do movimento proletrio.( citao de M.Rubel);
1871= aps a Comuna, seria desconhecer completamente a natureza da Internacional o
falar de instrues secretas vindas de Londres(...) de qualquer centro pontifical de
dominao e de intrigas(...).De fato, a Internacional no de modo nenhum o governo
da classe operaria, uma relao, no um poder ( idem);
1879= Ns formulamos,quando da fundao da Internacional, o lema de nosso
combate: a emancipao da classe operaria ser obra da prpria classe operaria.no
podemos,por conseqncia, caminhar juntos com pessoas que declaram abertamente
que os operrios so muito incultos para se libertarem por eles mesmos,e que eles
devem ser libertados por cima,isto , por grandes e pequenos burgueses filantropos.(
carta circular de Marx-Engels aos chefes da social-democracia alem).
Bourdet apresenta um aspecto fundamental: O movimento cooperativo
(autogestionario) enquanto abertura de uma brecha na sociedade capitalista.
No Livro I do Capital,e no Livro III, Marx cita a Society of Equitable Pioneers,
ROCHDALE ,na periferia de Manchester. Inicialmente, sociedade cooperativa de
consumo,ela torna-se uma cooperativa operaria de produo. Antes de lembrar o que
Marx pensa destas empresas, podemos citar o espanto dos observadores burgueses
frente a estas empresas que parecem poder viver sem os capitalistas:
Um jornal ingls arqui-burgues,diz Marx,o Spectator do 26 maio 1866, afirma que
aps o estabelecimento de uma espcie de sociedade entre capitalistas e operrios na
Wirework Company de Manchester, o primeiro resultado aparente foi uma diminuio
rpido dos des gastes. Os operrios no viam porque eles destruiriam sua propriedade, e
o desgate talvez, com os maus credores, a maior fonte de perda das manufaturas. Este
mesmo jornal descobre, nas tentativas cooperativas de ROCHDALE, um defeito
fundamental:
elas demonstram que as associaes operarias podem conduzir e administrar com
sucesso as oficinas,as fabricas em todos os ramos da industria,e,ao mesmo tempo,
melhorar extraordinariamente a condio dos trabalhadores,mas ! ... mas,no vemos
com qual o lugar que elas deixam para o capitalista ? Que horror!.(Capital,Livro I
,cap. 13-Pliade I,p. 870).
adiante, no livro III, abunda o gnero humorstico com que Marx observa: a
produo capitalista chegou a um ponto em que o trabalho de direo, completamente
separado da propriedade do capital, foi para as ruas, se bem que,entretanto, o
capitalismo no tem mais necessidade de preencher esta funo (Capital,livo III.
Pliade,II,p.1147).
Bourdet= Para Marx, a excluso do capitalista equivale supresso do poder alienante
e expropriador.Desde ento, a dominao capitalista suprimida, Marx parece supor que
a nica alternativa a associao igualitria da cooperativa.Com efeito, para Ele, no
apenas as cooperativas de produo mostram que o capitalista tornou-se (...) suprfluo
como agente de produo(idem,p.1147), mas,reflexo ainda mais importante ainda:
na cooperativa de produo, o carter contraditrio do trabalho de direo desaparece
poraue o diretor retribudo pelos trabalhadores em lugar de representar,face a eles,o
capital(Capital,Livro I,Pliade,t.I,p.870).
A produo capital chegou a tal ponto em que o trabalho de direo,completamente
separado da propriedade do capital, suprfluo, se bem que, ademais, o capiatlsita no
tem mais necessidade de preencher ele mesmo esta funo. Um chefe de orquestra no
deve de forma nenhuma ser o proprietrio dos instrumentos musicais,e no e a ele que
cabe se ocupar do salario de seus msicos.As cooperativas de produo so a prova
que o capitalista tornou-se suprfluo como agente de produo(...).,ento,que
personagem suprfluo, o capitalista desaparece do processo de produo e s subsiste o
funcionrio..
No Capital , Em relao as cooperativas operarias,elas representam, no interior do
velho sistema, a primeira brecha feita nele, mesmo que elas reproduzam
necessariamente, e em tudo, em sua organizao real, todos os defeitos do sistema
existente.
Todavia, nas cooperativas , o antagonismo entre o capital e o trabalho se encontra
superado,mesmo se ainda em uma forma imperfeita: enquanto associao, os
trabalhadores so seu prprio capital,isto ,eles utilizam os meios de produo para
valorizar seu prprio trabalho (Capital,Livro III,Pliade,II,p. 1178)
Ainda no Capital, Marx reflete sobre a vida de Robinson em sua ilha:.
Representemos,enfim, uma reunio de homens livres trabalhando com os meios de
produo comuns e operando, dentro de um plano consensuado, suas numerosas froas
individuais como uma s e mesma fora de trabalho social.Tudo o que falamos sobre
Robinson se reproduz aqui, mas desta vez em escala social e no em escala
individual.Todos os produtos de Robinson so produtos pessoais e exclusivos
e,consequentemente, objetos de utilidade imediata para ele.O produto total dos
trabalhadores associados um produto social. Uma parte serve como meio de
produo e assim social.Mas, a outra parte consumida e,por conseqncia,deve se
repartir entre todos.O modo de repartico variar segundo o organismo produtor da
sociedade e o grau de desenvolvimento histrico dos trabalhadores.(Capital, Livro I,
PLIADE,p. 610)
Bourdet,ento, nos lembra os textos de Marx quando da AIT.
Em seu Documento Inaugural da AIT (outubro 1864),Marx fala das Cooperativas de
produo:
Queremos falar do movimento cooperativo e, especialmente, das manufaturas
cooperativas fundadas pelos esforos espontneos de algumas mos ousadas.O valor
destas grandes experincias no pode ser subvalorizado. No foi por argumentos mas
por aes, que eles provaram que a produo em grande escala e de acordo com as
exigncias da cincia moderna pode ser exercida sem a existncia da classe dos patres
utilizando mo-de-obra; que os meios de trabalho para portar frutos no tm
necessidade de serem monopolizados nem desviados em meios de dominao e de
explorao contra o trabalhador e que o assalariado, tanto quanto o trabalho dos
escravos, como o trabalho dos servos,no passa de uma forma transitria e inferior que
est destinada a desaparecer frente ao trabalho associado,executando sua tarefa com
uma mo gil, um esprito disposto, um corao alegre.(Pliade,economie,t.I,p.466)
Assim ,Marx pensava em uma nova organizao dos trabalhadores associados que
formaria uma sociedade sem classes.Dois anos aps, nas resolues,escritas por sua
mo para o primeiro Congresso da AIT,de Genebra em 1866, Marx tomou partido
claramente em um dos debates mais acirrados,einda hoje: o problema da eficcia das
tentativas de autogesto como meio revolucionrio.A polemica posta assim: uma
organizao igualitria da sociedade com certeza desejvel como objetivo ltimo,mas
as tentativas de auto-organizao , na sociedade de opresso atual,longe de ser os
Meios de Emancipao seriam uma razo de enfraquecimento; a autogesto s pode
ser instaurada aps a revoluo,ela no serve aos proletrios na atual luta de classes.
Neste debate, Marx toma posio com a maior clareza:
O trabalho da Associao Internacional de generalizar e unificar os movimentos
espontaneos da classe operaria, no de prescrever ou de impor um sistema doutrinrio
qualquer que seja.Por isto, o Congresso no deve proclamar um sistema especial de
cooperao,mas,deve se limitar enunciar alguns princpios gerais.
a= Ns reconhecemos o movimento cooperativo como uma das foras
transformadoras da sociedade presente, baseado sobre o antagonismo das classes. Seu
grande mrito de mostrar praticamente que o sistema atual de subordinao do
trabalho ao capital, desptico e pauperizador, pode ser suplantado pelo sistema
republicano da associao dos produtores livres e iguais.
b= Contudo, o sistema cooperativo,restrito as formas minsculas a partir de esforos
individuais dos escravos assalariados, impotente para transformar por si-proprio a
sociedade capitalista.Para converter a produo social em um amplo e harmonioso
sistema de trabalho cooperativo, as transformaes gerais so indispensaveis. Estas
mudanas no sero jamais obtidas sem o uso das foras organizadas da sociedade.
Portanto, o poder do Estado,arrancado das mos dos capitalistas e dos proprietrios de
terra, deve ser gerido pelos prprios produtores.
C= Ns recomendamos aos operrios de encorajar mais a cooperativa de produo que
a cooperativa de consumo, esta atinge apenas a superfcie do sistema econmico atual,
aquela ataca sua base.
D= Recomendamos a todas as cooperativas de consagrar uma parte de seus fundos
propaganda de seus princpios,de tomar iniciativas de construir novas sociedades
cooperativas de produo e, de realizar esta propaganda tambm por palavras e pela
imprensa.
E= Com o objetivo de impedir as sociedades cooperativas de degenerar em sociedades
ordinrias burguesas ( sociedades por ao), todo operrio deve receber o mesmo
salrio,associado ou no.Como compromisso puramente temporrio, aceitamos a
admisso de um beneficio muito pequeno aos associados.
( Resoluo Primeiro Congresso da AIT,Genebra 1866 ou 1868 ?).

Bourdet nos fala da Enqute Operaria , feita por Marx:


trs anos antes de sua morte, Marx redigiu um questionrio com tiragem de 25.000
exemplares,enviado as sociedades operarias, aos grupos e crculos socialistas, a todos os
jornais franceses e,mais geralmente, a todas as pessoas que faziam parte da demanda.O
questionrio compreendia 101 questes.A de numero 98 dizia:
H sociedades cooperativas em sua profisso ? Como elas so dirigidas ? Elas
empregam operrios da mesma forma que os capitalistas o fazem ? Envie seus estatutos
e regulamentos.
Bourdet conclue: compreende-se pela prpria formulao da questo, que Marx via
bem que podia existir cooperativa e cooperativa, e que sua eficcia
revolucionaria,segundo ele supunha, presupunha condies muito precisas.
{ O questionrio ,publicado sem nome do autor, na Revue socialiste ( n.4, 20 avril
1880) foi objeto da seguinte meno em uma carta de Marx Sorge: Eu redigi ...o
questionario que, impresso de inicio na Revue socialiste, foi difundido a um grande
numero de exemplares em toda a Frana.( 5 novembro 1880,Paris,costes 1950,t.I,pp.
253-254).
O texto da enqute sociolgica foi reproduzido por M.Rubel na
Pliade,economie,T.I,pp.1527-1536.}

Em parte chamada de manipulaes e recuperao das cooperativas, Bourdet cita


uma carta de Marx Engels:
O governo prussiano no pode tolerar nem as colizes nem os sindicatos operrios.
evidente.Em troca, dar subvenes governamentais (sublinhado por Marx) a algumas
horrveis sociedades cooperativas, isto arranja bem seus negcios sujos. Para Marx, as
sociedades cooperativas s tm valor quando so criaes autonomas dos trabalhadores
e no protegidas nem por governos, nem por burgueses( Pliade,t.I,pp.1426-1428)
Sobre a condio para um desenvolvimento revolucionrio do movimento cooperativo
, que ele atinja uma dimenso nacional.
Por excelente que ela seja sem em seus princpios, e til na pratica, a cooperao dos
trabalhadores,se fica circunscrita em um circulo estreito, se apenas alguns operrios se
esforam...,ento, esta cooperao no ser jamais capaz de parar os monoplios que
crescem em progresso geomtrica; ela no ser capaz de libertar as massas nem mesmo
melhorar de forma perceptvel o fardo de sua misria(...)Para que as massas
trabalhadoras sejam libertadas, a cooperao dever tomar uma amplitude nacional,e,
em conseqncia, se favorecer com os meios nacionais(Pliade,p.467).
Para Bourdet: De forma clara, significa que a realizao da autogesto da produo
no pode ser,ao mesmo tempo, que a destruio do Estado.isto aparece claramente na
resoluo sobre o Trabalho Cooperativo do primeiro Congresso da AIT,em
genebra,em 1866:
O sistema cooperativo limitado as formas minsculas sadas dos esforos individuais
dos escravos assalariados, impotente para transformar por si-mesmo a sociedade
capitalista.Para converter a produo social em uma largo e harmonioso sistema de
trabalho associado, as mudanas gerais so indispensveis.
Na poca da Comuna,5 anos mais tarde,Marx desenvolve,em outro tom,o mesmo tema:
(A Comuna) queria fazer da propriedade individual uma realidade,transformando os
meios de produo,a terra e o capital, hoje essencialmente meios de sujeio e de
explorao do trabalho, em simples instrumentos de um trabalho associado.mas, o
comunismo!(...) Mas,se a produo cooperativa no deve ser uma armadilha; se ela deve
superar o sistema capitalista; se o conjunto das associaes cooperativas deve reger a
produo nacional segundo um plano comum, tomando-a assim sob sua prpria direo
e pondo fim anarquia constante e as convulses peridicas que so o destino
inelutvel da produo capitalista, que seria,senhores,seno o comunismo, o muito
possvel comunismo ?.
(A Guerra Civil na Frana,1871).
Enfim, em 1875,marx confirma ainda o mesmo ponto de vista nas Glosas Marginais
sobre o programa do partido do trabalho alemo,dito de Gotha:
A emancipao do trabalho exige as transformaes dos meios de trabalho em
propriedade comum da sociedade; e que o conjunto das atividades seja regulamentada
por meio de cooperativas com partilha equitavel do produto do trabalho.
Marx se pergunta o que significa a partilha equitavel ?
Se tomamos as palavras renda do trabalho no sentido de produto do trabalho, a renda
cooperativa do trabalho ento a totalidade do produto social. Ora, temos que separar ;
primeiramente: um fundo destinado a substituir os meios de produo usados;
em segundo: uma frao adicional para ampliar a produo.
Em terceiro: um fundo de reserva ou de previdncia contra os acidentes,as perturbaes
devidas `fenmenos naturais,etc.
(...) Fica outra parte do produto total, a destinada ao consumo. Antes de proceder a sua
repartico entre os indivduos, deve-se dividi-la:
Primeiramente: os custos gerais de administrao que no entram na produo.
Esta frao, comparativamente ao que se passa na sociedade atual,encontra-se reduzida
e decresce a medida que se desenvolve a sociedade nova.
Sem egundo: o fundo destinado satisfao das necessidades coletivas tais como :
escolas,instalaes snaitarias,etc.
Esta frao aumenta imediatamente em importncia comparativamente o que se
passa na sociedade atual e cresce medida em que se desenvolve a sociedade nova.
Em terceiro: o fundo destinado sustentar os que so incapazes de trabalhar,etc, enfim
o que hoje nomeamos , na linguagem oficial, assintencia publica.
Agora, temos a frao dos objetos de consumo que repartida entre os produtores
individuais da sociedade cooperativa.
No seio desta ordem social cooperativa, fundada sobre a propriedade coletiva dos
meios de produo, os produtores no trocam todos seus produtos...
O produtor individual recebe ento ...o equivalente exato do que ele d `a sociedade.O
que ele d sociedade, sua quantia individual de trabalho.Por exemplo, a jornada
social do trabalho representa a soma das horas de trabalho individual;o tempo de
trabalho individual de cada produtor a poro que ele fornece da jornada social de
trabalho,a parte que ele realizou.Ele recebe da sociedade um bonus certificado que ele
forneceu tal soma de trabalho (tirando-se o trabalho efetuado para o fundo coletivo)e,
com este bnus,ele retira das reservas sociais uma quantidade de objetos de consumo
correspondente quantidade do trabalho fornecido.A mesma quantia de trabalho que ele
deu sociedade sob uma forma, ele recebe dela sob uma outra forma.
( Pliade,t.I, p.1416 e 1719).
E, um pouco adiante no mesmo texto: os operrios querem instaurar as condies da
produo cooperativa em escala da sociedade e ,(...), em escala nacional. Isto s
significa uma coisa: os operrios trabalham para a transformao das condies de
produo atuais.Isto no tem nada a ver com a criao de sociedades cooperativas com
ajuda do Estado (Pliade,pp.1427-1428)
Yvon Bourdet conclue seu texto: Parece-me que tudo deve estar muito claro agora: as
cooperativas autogeridas so as primeiras realizaes concretas da utopia de uma
sociedade sem classe; mas estas cooperativas no podem verdadeiramente se
desenvolver,confor a sua essncia,enquanto subsiste um Estado central,dominador ou
mesmo protetor. uma outra organizao igualitria e cooperativa da sociedade em seu
conjunto que constituir a revoluo.

Autogesto e Espao

4= O ESPAO DA AUTOGESTO

Apesar das dimeses novas que a revoluo cientifica moderna


vem criando e as novas tecnicas esto pondo em uso , desmantelando
irremediavelmente as nossas arraigadas concepes e hbitos mentais,continuamos a
teimar em viver num espao renascentista .
(Mario Pedrosa, 1952)
Yvon Bourdet escreveu alguns ensaios para pensar a questo do Espao da
Autogesto.Em uma pequena obra publicada em 1978, Lespace de lautogestion,
surpreendeu por ir buscar fundamentos da autogesto em experincias do campo, na sua
terra natal,a Ocitania francesa.
Inicia sua reflexo em torno a questo da autogesto enquanto espao da produo
e espao da cidadania. Por sua etmologia, a palavra autogesto parece designar o
controle das condies de trabalho pelo operrios;as referencias histricas,notadamente
experincia yugoslava,ampliam o sentido e a dimenso da autogesto: se o
funcionamento do sistema yugoslavo est ainda longe do modelo de uma auto-
administrao do conjunto do corpo social...reconhecemos que a autogesto geral
implica o desaparecimento do Estado e de todas as hierarquias centralistas.
Bourdet questiona a noo de uma estrutura natural de uma organizao
universal tendo por principio a dominao de um centro sobre a periferia e a relao
hierrquica dos centros-secundarios ao centro dos centros onde reinam Deus, o rei ou
o secretario-geral dos sovietes.
A reflexo de Bourdet sobre a idia de centro e a idia de margem.Ele parte
do conceito de talvera,do verbo talverar: o primeiro quer dizer margem do campo
que no pode ser trabalhada; o segundo, trabalhar nas bordas do campo. Na verdade,
que deve ser trabalhado de outra maneira.
A experiencia da talvera de que devemos procurar uma estrutura social e
poltica que invalide toda pretenso de privilegio de um lugar em relao aos outros. A
heterogesto centralis (que privilegia o centro ) presupe um espao
abstrato,homogneo,continuo e ilimitado e hierarquizado pelo centro. A talvera
presupe que o espao existencial,no qual os homens vivem e trabalham,no
homogneo,nem ilimitado,e que sua autogesto presupe levar em conta as
especificidades e a heterogeneidade estrutural.
Bourdet chama nossa ateno para revoluo tecnolgica: a complexidade
crescente das telecomunicaes,por exemplo,que elimou a funo de centro e d a
qualquer ponto da periferia as mesmas oprotunidades de atingir qualquer ponto da
rede.
Em outro capitulo Bourdet distingue entre as cidades-labirintos e as cidades-
daumier. A s primeiras formadas,no essencial, por vias envelopadas,concntricas e
sobretudo encadeadas; as segundas so geometricamente repartidas segundo uma
quadrilhagem ortogonal.A primeira vista, as primeiras so o signo de uma estrutura
social hierrquica (que contribuem a manter e desenvovler),as segundas presupem e
talvez portem uma maior igualdade devido a paridade dos espaos recortados e
atribuidos a cada uma(todas as linhas de uma quadrilhagem so paralelas,como os
angulos so os mesmos.No plano radiocentrico (que diferente de um labirinto) todos
os raios convergem para o centro e todos o atingem;os crculos so mais ou menos
distanciados e giram em torno do centro sem jamais o atingir...Um significa igualdade,o
outro hierarquia,como uma cidade proibida.
Bourdet faz a leitura poltica do labirinto: o labirinto da mitologia a projeo
espacial do medo e da servido: no centro do labirinto reina o monstro com cabea de
animal,que simboliza a violncia sem lei.O homem encoujado para marchar at o
centro na esperana de uma epifania de um milagre.Assim, o o labirinto significa a
vontade desptica de deslocamento ao centro inatingivel do poder absoluto.
A cidade labirinto,em sua essncia,significa a negao da autogesto poltica
,pois seu fundamento de poder o mistrio. E, probe a compreenso do conjunto do
corpo social,fundamento de toda possibilidade de democracia..
A urbanizao com estas caractersticas de cidade-labirinto segue o processo de
industrializao da modernidade. O habitat perde,ento,seu carter sagrado,devido
ao progresso tecnologico e a explorao do capital.
Os romnticos se rebelaram contra esta quantificao da vida que acompanha a
lgica da civilizao industrial. Esta mesma lgica poe principalidade no centro
,quando se trata de pensar o espao. Refletindo sobre a arte e a literatura Octavio Paz
,tal qual Yvon Bourdet, proclama que a atualidade que me seduz no tanto a que
divulgam os mdios de publicidade, mas a que vive namargem,longe e conta ascorrentes
em voga a arte e a literatura de afora ou , mais exatamente, das imediaes.
Como a talvera: as margens ! O que no significa marginal mas
alternativo,de outra maneira. A talvera no um espao onde no h trabalho, mas
uma outra forma de trabalhar.
Angel Rama, em seu ensaio sobre A Cidade das Letras explica a origem das
cidades na Amrica Latina e sua relao com a filosofia dos conquistadores europeus.
Os proprios conquistadores que as fundaram perceberam progressivamente,no
transcurso dos culo XVI, que se haviam afastado da cidade organica em que haviam
nascido e crescido para entrar em uma nova distribuio do espao,que enquadrava um
novo modo de vida,que j no era o que haviam conhecido em suas origens
peninsulares. E,Ainda que preparado pelo esprito renascnetista que o desenha,este
molde de cultura universal que se desenvovle no sculo XVI somente adquiriria seu
aperfeioamento nas monarquias absolutas dos Estados nacionais europeus, a cujo
servio militante se somaram as Igrejas, concentrando rigidamente a totalidade do poder
numa corte,a partir da qual se disciplinava hierarquicamente a sociedade.A cidade foi o
mais precioso ponto de insero na realidade desta configurao cultural e nos deparou
com um modelo urbano de durao secular: a cidade barroca.Para Rama, A Amrica
foi a perimeira realizao material desses sonhos e,seu ligar,central na edificao da era
capitalista.
Surgiro cidades reguladas por uma razo ordenadora que se revela em uma
ordem social hierarquica transposta para uma ordem distributiva geomtrica.Este
projeto exige para sua concepo e execuo, um PONTO de mxima
CONCENTRAAO do PODER (grifo nosso) que possa pensa-lo e realiza-lo.A palavra
de todo este sistema a palavra ORDEM, (grifo nosso) desenvolvida pelas trs meiores
estruturas institucionalizadas: a Igreja, o Exercito,a Administrao.
No caso da fundao das cidades, a trasladao da ordem social implicava o
desenho urbanstico prvio.O resultado na AL foi o desenho tipo tabuleiro de damas,
que reproduziram ( com ou sem plano estruturado ) as cidades barrocas e que se
prolongou ate nossos dias.Poderia ter sido outra a constituio geometrica,sem que por
isso ficasse afetada a norma central que regia a trasladao.De fato, o modelo freqente
no pensamento renascentista...foi circular e ainda mais revelador da ordem hierrquica
que o inspirava,pois situava o PODER no PONTO CENTRAL (grifos nossos)l e
distribua a seu redor,em sucessivos crculos concntricos,os diversos estratos
sociais.Obedecia aos mesmos princpios reguladores do tabuleiro de damas: unidade,
planificao e ordem rigorosa,que traduziam uma hierarquia social.Tanto um quanto
outro modelo eram apenas variaes de uma mesma concepo de razo ordenadora.
Angel Rama explica que a trasladao foi facilitada pelo vigoroso
desenvolvimento das matematicas,com sua aplicao na geometria analtica. O
principio retor assegura um regime de transmisses: do alto para baixo, da Espanha
Amrica; da cabea do poder (atravs da estrutura social que ele impe) constituio
fsica da cidade, para que a distribuio do espao urbano assegure e conserve a forma
social.
Antes de ser uma realidade de ruas, casas e praas, que s podiam existir e ainda
assim gradualmente, no transcurso do tempo histrico, as cidades emergiam j
completas por um parto da inteligncia nas normas que as teorizavam....
A ordem devendo ficar estabelecida antes de que a cidade exista,para impedir
assim toda futura desordem.Assim,da fundao de Lima por Pizarro,em 1535,foia
ssentada e traada a cidade conforme a planta e o desenho se fez para isso no papel.
Ou,O sonho de uma ordem servia para perpetuar o poder e conservar a estrutura scio-
economica e cultural que esse poder garantia.E,alem disso,se impunha a qualquer
discurso opositor desse poder,obrigando-o a transitar,previamente,eplo sonho de outra
ordem.Assim,o carater anti-utopia das cidades-labirintos.
Deste modo,A primeira aplicao sistemtica do saber barroco,instrumentado
pela monarquia absoluta ( a Tiara e o Trono reunidos),se fez no continente
americano,exercitandos eus princpios: abstrao,racionalizao,sistematizao,opondo-
se individualidade,imaginao,inveno local. Pois,Deviam preservar no Novo
Mundo o carter carismatico da autoridade,que est baseado na crena de que os reis o
eram pela graa de Deus.
No conjunto do sistema capitalista,diz Angel Rama: Por definio, toda ordem
implica em uma hierarquia perfeitamente disciplinada,de tal forma que as cidades
americanas comearam,desde o inicio,a ter uma estratificao que ,apesar de suas
mudanas,foi coonsistentemente rgida e inspirada pelos maiores ou menores vnculos
com o poder transoceanico. Ocupavam o primeiro nvel as capitais do vice-reinado
(apesar de que o Mxico, Lima e o Rio de Janeiro continuavam sendo as primeiras
dentre elas);eram seguidas pelas cidades-portos do circuito da frota e depois pelas
capitais de Audincia; logo vinham se escalonando as restantes
cidades,povoados,vilarejos,no somente em hierarquia decrescente,mas em
subordinao direta imediata anterior da qual dependiam.As cidades construam uma
pirmide...Todas sabiam que acima delas estavam Sevilha,Lisboa e Madri,mas
praticamente ninguem pensou que ainda mais acima destas se encontravam Genova ou
Amsterdam.
A Espanha j estava em decadencia no momento da descoberta da Amrica em
1492,e portanto, economicamente Madri constitua a periferia das metrpoles europias,
as cidades americanas constituram a periferia da periferia.
Angel Rama ,estudando o pensamento do libertador Simon Rodriguez conclue
que este tipo de cidade ,em seus desdobramentos enquanto cidade letrada, revela a
incapacidade para formar cidados, para construir sociedades democrticas e
igualitrias.
Angel faz uma reflexo fundamental para o espao da autogesto: A
conseqncia direta da politizao que sofre a cidade ser uma nova concepo
funcional do partido poltico: o partido ser o instrumento para a tomada do
poder,porque no se enxerga nenhuma outra via para gerar uma mudana na sociedade
que no seja A OCUPAO DO PODER CENTRAL (grifo nosso).
Encontramos idias semelhantes em Raizes do Brasil,do historiador Sergio B. de
Holanda,que ressalta este papel do Centro na vida das cidades.
Estudando a primazia acentuada da vida rural em relao ao esprito de
dominao portuguesa no Brasil,Buarque de Holanda enfatiza : A construo da cidade
comearia sempre pela chamada praa maior.Quando em costa de mar, essa praa
ficaria no lugar de desembarque do porto; quando em zona mediterrnea,ao centro da
povoao.A forma da praa seria a de um quadriltero,cuja largura correspondesse eplo
menos a dois teros do comprimento,de modo que,em dias de festa,nelas pudessem
correr cavalos.Em tamanho,seria proporcional ao numero de vizinhos e,tendo-se em
conta que as povoaes podem aumentar,no mediria menos de duzentos ps de largura
por trezentos de comprimento,nem mais de oitocentos ps de comprido por 532 de
largo; a mediana e boa proporo seria a de seiscentos ps de comprido por
quatrocentos de alrgo. A praa servia de base para o traado das ruas: as quatro
principais sairiam do centro de cada face da praa.De cada ngulo sairiam mais duas,
havendo o cuidado de que os quatro ngulos olhassem para os quatro ventos.Nos
lugares frios, as ruas deveriam ser largas; estreitas nos lugares quentes.No entanto,onde
houvesse cavalos,o melhor seria que fossem largas.
Assim, a povoao partia nitidamente de um centro ; a praa maior representa
aqui o mesmo papel do cardo e do decumanus nas cidades romanas.

Mario Pedrosa ,em seus estudos sobre arquitetura e sobre a construo de Braslia,
nos aporta reflexes importantes sobre as cidades. No ps Guerra,aps voltar do seu
longo exlio nos EUA, Pedrosa desenvolveu uma viso com base na idia da
autogesto,a partir da obra de Rosa Luxemburgo.
Em um pequeno ensaio ,Crescimento da Cidade (1959),Mario relaciona cidade
e capitalismo,em uma reflexo prxima a de Angel Rama:
Com efeito, a decadncia das atividades sociais da cidade se acentuou medida
que a economia capitalista se desenvolvia. A Carta de Atenas, do Centro Internacional
de Arquitetos Modernos CIAM-, se baseou,alis,nessa verificao histrica. O
Capitalismo, tanto o privado quanto o de Estado,desmantelou por dentro,num longo
processo histrico, a ordem urbanstica,intrinsicamente harmnica e solidria.O
resultado foi a dissoluo do carter eminentemente comunitrio da cidade.O organismo
coletivo,to sua caracterstica,perdeu toda a antiga coeso social.O desenvolvimento
dela tomou a feio fabril,anrquica,mais prximo do processo de uma clula cancerosa
que devora todo o organismo,que de qualquer coisa. Este desenvolvimento desordenado
e chamado espontneo como um pedao da natureza selvagem dos trpicos deixada a
si mesmo.Em pouco tempo, o mato tudo invade. que o progresso do laissez faire o
inimigo do esprito comunitrio.
A cidade perdeu com isso o esprito do exclusivismo localista da idade
barroca,quando os prncipes absolutistas encontraram uma atividade nova: a construo
de suas cidades residenciais em lugares afastados das metropolis tradicionais que eles
mesmos escolhiam.A cidade barroca freqentemente ebela,j no
mais,entretanto,como a polis grega ou a comuna burguesa medieval.A agora grega
volatizou-se, e o corao comunal cessou de existir; a partir do barroco a cidade passou
a ser cada vez mais um aglomerado urbano sem direo,emborade poder extremamente
centralizado.
Todo o desenvolvimento ulterior s fez levar gua ao moinho do PODER
CENTRALIZADO (grifo nosso) e da anarquia inarmnica nas reas vitais ou adjacentes
ao Poder. A praa central deixou de ser o centro da vida comunal,onde os cidados se
encontram, boquejam e discutem,para ser o pedestal da grandeza do Principe.
Em relao a fundao das cidades no Brasil,Pedrosa tambm revela em sua
analise grandes afinidades com Angel Rama. Em suas analises sobre a nova
Capital,Braslia,Mario se pergunta : Braslia ou Maracangalha ?.
Wooringer , no seu estudo sobre o antigo Egito, desenvovle a tese dos povos
surgidos artificialmente, filhos de uma CIVILIZAAO OASIS (grifo nosso),e para cujo
conhecimento no se necessita de saber sua historia natural,praticamente inexistente.E
os diferencia daqueles que,ao contrario,tm no curso dessa historia como que o
paradigma de sua prpria historia poltica e cultural.o Egito dos faras,ele od efiniu
como o maximo caso de osis da historia universal, ou uma colnia sobre base
artificial.
Num osis se impe uma alta disciplina civilizadora...A caracterstica naior dessa
civilizao de osis a extremamente natural facilidade com que recebe as formas
culturais mais externas e mais altas e a naturalidade extrema com que nega a prpria
natureza.Nela o natural negar a natureza.
Eis por que, americanos,brasileiros,estamos condenados ao moderno.O
moderno vai sendo cada vez mais nosso habitat natural. A Amrica no era osis entre
desertos, era simplesmente nova: lugar onde tudo podia comear do comeo.Os colonos
ingleses que desembarcaram ao norte do Continente o que encontraram em matria de
cultura e civilizao no lhes apreceu digno de conservao. Fizeram,ento,tabula
rasa,e,assim,puderam transplantar,por assim dizer,intatas suas formas culturais mais
adiantadas,como se se tratasse de uma transplantao para osis.Sendo nova, sendo
vasta, no havendo no seu solo seno a virgindade do mato e do solo (caso especifico
nosso,os do lado e c da banda atlntica meridional),a Amrica se fez com essas
transplantaes macias de culturas vindas de fora: que estilo, que forma de arte foi
imediatamnete transplantada para o Brasil mal descoberto ? A ltima, a mais moderna
vigorante na Europa o barroco.
Para Pedrosa, A cidade ideal moderna no se coaduna mais nem com a
centralizao militar do poder la barroca, nem com o gosto pequeno-burgues do
subrbio, nem com o desenvolver ao deus-dar do liberalismo.Ela quer uma estrutura
humana atravs da qual expandir-se e restaurar a coeso social perdida.

A AUTOGESTAO DO ESPAO

Entre os intelectuais que refletiram profunda e radicalmente o que poderemos


chamar de Retratos do Brasil,encontra-se um geografo que dedicou sua vida a
reflexo do espao.
Milton Santos realizou reflexes fundamentais para o campo da autogesto. O fato
de ter centrado sua obra em torno de conceitos como territrio, espao e tempo,
cidades, que numa primeira vista parecem no ter relao com nossa questo.Mas,
se partirmos das reflexes de Bourdet sobre o carter do espao da autogesto (a partir
da talvera de sua terra natal),veremos que o saudoso gegrafo baiano traou pontos
que so fundamentais para reflexo sobre a autogesto.
So reflexes importantes para analisarmos as experincias de autogesto alm do
campo da produo econmica.Muitas experincias avanam para o campo do que
podemos chamar de autogesto territorial.Haja vista , o que Bourdet chama-nos a
ateno sobre a experiencia que houve na Yugoslavia,de autogesto generalizada.Ou
mais recentemente, as experincias na Amrica Latina,seja da propriedade social das
empresas,mas principalmente de desenvovlimento territorial,que na experincia em
curso na Venezuela chamada de desenvolvimento endogeno.No Brasil,temos varias
experincias deste tipo,combinando produo e territorio: por exemplo, a Usina
Catende, o banco Palmas ,para falar de duas mais conhecidas.
Poderemos tambm notar as afinidades eletivas entre Santos e Lefebvre em
alguns elementos como: a questo dos pontos fortes e fracos, no segundo, e, no
primeiro, os tempos lentos e os espaos opacos.
Por exemplo, em duas obras de pocas diferentes:
1. O Espao Dividido. Os dois circuitos da economia urbana dos pases
subdesenvolvidos (edio francesa de 1970; no Brasil, 1978)
2. A Natureza do Espao: tcnica e tempo - razo e emoo (1996)
Para Milton Santos, nos pases subdesenvolvidos, sobretudo no ps-Guerra, as
cidades adquiriram um aspecto crtico: tornaram-se cidades sem cidados. O que
antes era um todo, um teatro da existncia de todos os seus moradores, tornou-se
uma cidade seletiva, tcnico-cientfica-informacional.
Este processo foi agravado com as polticas neoliberais da dcada de 90. A cidade
j vinha criando os seus excludos e os seus irracionais. O processo de globalizao, sob
a batuta neoliberal, acelerou esta tendncia. Para Milton Santos, a cidade plstica,
herdeira dos primrdios da histria metropolitana, sucede a uma cidade rgida.
Todavia, a cidade resiste difuso da racionalidade, graas ao meio ambiente
construdo pelos homens, que um retrato da diversidade das classes sociais, das
diferenas de renda e dos modelos culturais. A cidade informatizada, as vias de
transporte e comunicao, os espaos inteligentes que sustentam as atividades exigentes
de infraestruturas sequiosas de rpida mobilizao opem-se maior parte da
aglomerao onde os tempos so lentos, adaptados s infraestruturas incompletas ou
herdadas do passado, e os espaos opacos que, tambm, aprecem como zonas de
resistncia.
Para Santos: So nestes espaos constitudos por formas no atualizadas que a
economia no hegemnica e as classes sociais hegemonizadas encontram as condies
de sobrevivncia. So nessas condies que as grandes cidades do terceiro mundo so,
por um lado, rgidas na sua vocao internacional e, por outro, so dotadas de
flexibilidade, graas a um meio ambiente construdo que permite a atuao de todos os
tipos de capital e, desse modo, admite a presena de todos os tipos de trabalho.
Nestas cidades, existem as reas luminosas, modernizadas e que se sobrepem
ao resto da cidade, onde vivem os pobres, nas zonas opacas. Para Santos, estes so
os espaos do aproximativo e no (como nas zonas luminosas) espaos de exatido, so
espaos inorgnicos, abertos e no espaos racionalizados e racionalizadores, so
espaos da lentido e no da vertigem.
As metamorfoses do trabalho dos pobres nas grandes cidades cria a flexibilidade
tropical. Nestas zonas situam-se os tempos lentos, no hegemnicos.
Santos usa o conceito de tempo em duas perspectivas:
O eixo das sucesses e, o eixo das coexistncias. H uma sucesso de fenmenos
ao longo do tempo, uma seqncia. E, temos tambm, o eixo das coexistncias, da
simultaneidade. Em um lugar, uma rea, o tempo das diversas aes e dos diversos
agentes, a maneira como utilizam o tempo no a mesma. Os respectivos fenmenos
no so apenas sucessivos, mas concomitantes, no viver de cada hora. Para os diversos
agentes sociais, as temporalidades variam, mas se do de modo simultneo.
Para Santos, o tempo como sucesso abstrato e, o tempo como simultaneidade
o tempo concreto, j que o tempo da vida de todos. A vida social nas suas
diferenas, desigualdades e hierarquias opera segundo tempos diversos e que se casam,
unem-se, entrelaam-se no viver comum, que se d no espao de escalas distintas:
lugarejo, metrpoles, regio, pas e mundo.
Nos anos 30, analisando o fenmeno do nazismo, o filsofo alemo Ernst Bloch
falava sobre a dialtica dos desnveis espaciais e temporais;dizia que, todos vivem
no mesmo tempo cronolgico e na superfcie do mesmo planeta, mas o tempo e o
espao no so homogneos, iguais para todos. Diversos tempos histricos se
condensam e se interrelacionam a cada ano e ns somos dispersados, distribudos nestes
espaos/tempos diferentes.
Bloch chamava esta dialtica de no-contemporaneidade, isto ,
desenvolvimento no-sincrnico.
Com o processo de excluso e de desemprego estrutural, h uma necessidade de
repensar a questo do trabalho, pois se no h emprego para todos, h muito trabalho
desde que pensamos a partir das necessidades diversas da sociedade.
Nas cidades dos pases subdesenvolvidos o modo particular de organizao do
espao articula as mais variadas formas de capital, trabalho e tecnologia. Esta
organizao do espao urbano caracteriza-se pelo Espao Dividido em dois circuitos
da economia urbana:
1. Um circuito superior que tem sua origem diretamente na modernizao
tecnolgica onde operam os monoplios;
2. O circuito inferior que formado por atividades de pequena dimenso e tem suas
razes nas populaes pobres.
Para Santos, a relao entre ambos dialtica: o circuito inferior, sendo produto
da lgica do circuito superior ,ao mesmo tempo, condio de entrave a sua expanso.
Nestas cidades proliferam zonas de resistncia na forma de atividades voltadas a
atender as necessidades concretas e imediatas de sobrevivncia: pequenas empresas que
atendem a um circuito de produo, distribuio e consumo que opera distante do
universo da economia racionalizada e informatizada.
Portanto, h de um lado, uma economia globalizada, produzida por cima, e um
setor produzido por baixo e que, nos pases pobres, um setor popular e, nos pases
ricos, inclui os setores desprivilegiados da sociedade, incluindo os imigrantes.
neste caldo cultural, espacial/temporal e urbano que se criam as condies para
as condies iniciais da Economia Popular e Solidria, em muitos pases da
Amrica Latina e Central.
Bookchin e o Municipalismo Autogestionario

Uma das principais contribuies para o tema da autogesto e cidades, nos


vem do pensamento libertrio de M.Bookchin, que desenvolveu diversas teses acerca da
ao direta do cidado na vida e na gesto da cidade.
Bookchin j havia assinalado o deslocamento ou associao das lutas nas fbricas
em direo aos municpios,da produo em relao ao territrio.Ele critica a viso da
autogesto centrada exclusivamente na economia.Afirma que: a autogesto, conceito
fundamental uma administrao libertaria da vida e da sociedade, foi preterida a favor
de uma estratgia de gesto eficaz e rentvel.Nada to atual quanto esta idia,nesta
poca de hegemonia neoliberal em que as esquerdas aderiram ao
pragmatismo,sepultando a utopia.
A autogesto, entendida somente em termos econmicos,pode ocultar e diferir
outras interpretaes da palavra, nomeadamente aquelas que se prendiam com as idias
de federalismo municipal da sociedade medieval, das sees revolucionarias de 1793 e
da Comuna de Paris. Aqui,nos retomamos nossa reflexo anterior,a partir de Daniel
Guerin e da experincia da Comuna.
Bookchin associa diretamente autogesto, sindicalismo e tecnologia: Mas, para
j, cada vez mais evidente que hoje,quando falamos de autogesto,falamos,de uma
forma ou de outra,de sindicalismo.Falamos de uma formao econmica que se
relaciona com a organizao do trabalho, o emprego dos materiais e das mquinas, bem
como com a repartico social dos recursos materiais.Em suma,ns falamos das tcnicas
ou da tecnologia.
Para Bookchin, a idia de autonomia,entendida enquanto forma de
autogoverno,aplica-se sociedade enquanto um todo, e no apenas economia...a
autogesto significa hoje,antes de tudo, a gesto das aldeias,dos bairros e das
cidades...Nas duas grandes revolues que abriram a poca moderna, a Revoluo
francesa e a da Independncia americana,ns assistimos ao emergir de uma autogesto
popular,nas assemblias de cidados,de Boston a Charleston,e nas sees de bairro de
Paris.
Nesta viso libertaria, a fabrica como reino da necessidade no pode ser o
lugar da autogesto: ela uma escola de hierarquia,de autoridade e de submisso e no
de emancipao.Inspirado em Fourier,nosso autor conclama que dada a situao da
fabrica, necessrio,para ouvirmos os apelos da autogesto,irmos aos bairros e aos
movimentos de moradores,aos movimentos feministas e ecolgicos...A nova tecnologia
pode ser o resultado de uma nova sensibilidade, de uma nova competncia e de uma
nova conscincia.
Esta nova tecnologia (que Bookchin chama de tecnologia popular ),uma nova
tcnica,tem como fundamento que uma pequena cooperativa alimentar,um pomar
comunitrio,um pequeno moinho a vento, se podem ou no substituir,respectivamente,
um supermercado,uma empresa agricola industrial, uma central nuclear,no a questo
central.Para Bookchin,O que importa que estas cooperativas,estes pomares e estes
moinhos so,de certo modo,o ressurgimento de uma capacidade de autodeterminao
pessoal,inacessvel s coisas maximizadas,e ainda ao ressurgimento de um sentimento
de auto-competencia,que em geral, negado ao cidado comum.
Nesta perspectiva,Bookchin construiu a idia de municipalismo libertrio,no
qual,uma nova poltica implica a criao de uma esfera pblica de base extremamente
participativa,em nvel da cidade,e do campo,das aldeias e bairros.Seus fundamentos
esto na idia helnica de autonomia,na idia de autogoverno.A autonomia ligada a
governo social e cidadania ativa, sociedade e no apenas economia.
O Autogoverno Popular

A palavra economia significava a gesto da casa (oikos) e no da sociedade,e era


por isso tida como uma atividade inferior,ainda que necessaria gesto e participao
na comunidade e na polis.Exercer um poder social , e dessa forma,adquirir uma
individualidade (um eu),pressupunha uma certa forma de lazer e uma liberdade
material,adquiridas atravs de uma boa gesto do meio(...) A noo de autogoverno
implicava,desde logo,o reconhecimento da competncia do individuo...a democracia na
cidade estava assente sobre um principio bsico de que qualquer cidado podia exercer
o poder,visto que possua uma competncia pessoal e uma lealdade indiscutvel.A
educao poltica do cidado era,por conseguinte,uma educao da competncia
pessoal,da inteligncia e,sobretudo,da retido cvica e moral.A chamada eclesia de
Atenas,espcie de assmblia popular de cidados,que se reuinia pelo menos 40 vezes
por ano,era ento o espao privilegiado para testar essa capacidade educativa.Mas , a
agora,praa pblica onde os atenienses tratavam de todos os seus problemas, que era
no fundo,a sua verdadeira escola,conclui Bookchin.
Bookchin nos remete historia.Mesmo que no exista na historia,cidades que
sejam modelo perfeito deste tipo de espao pblico,porm,algumas cidades no eram
predominantemente sociais (no sentido domstico) nem estatais,mas,deram origem a um
ordenamento social totalmente novo.Os casos mais marcantes foram os da antiga
Helde e das cidades comerciais e artesanais da Itlia medieval e da Europa
central(...).O que deve ser realado,como de importncia vital, o fato destas cidades
terem criado a esfera pblica.Na agora das democracias gregas, no frum da republica
Romana, no centro da cidade das comunas medievais,ou na plaza da cidade
renascentista, os cidados podiam congregar-se.Surgiu uma rea radicalmente nova
nesta esfera pblica na rea poltica baseada em formas de democracia,limitada mas
muites vezes participada,e um novo conceito de personalidade cvica: o cidado.
Bookchin enfatiza ainda a formao de carter (a noo grega de paideia): Era
necessrio um ideal de servio pblico que contrabalanasse os impulsos mesquinhos e
egostas ed esenvolvesse o ideal de interesse geral.
Em suma, o municipalismo libertrio visa recuperar praticas e qualidades de
cidadania de forma a que,homens e mulheres,possam responsabilizar-se coletivamente
pelo governo das comunidades em que esto inseridos,de acordo com uma tica de
partilha e cooperao,ao invs de dependerem de elites.Uma vez criadas democracias
diretas, os municpios democratizados poderiam unir-se em confederaes que,em
ultima analise,consttuiriam um desafio ao capitalismo e ao Estado-nao,conduzindo a
uma sociedade libertaria.
Contrapondo ao artesanato a maquinaria,Bookchin destaca o papel
desestruturador da maquinaria:Se a maquinaria contribuiu para o processo de alienao
do trabalho,foi sobretudo a racionalizao sistemtica do trabalho que demoliu a
estrutura tcnica das sociedades autogeridas. Para Bookchin, o artesanato assenta sobre
a habilidade pessoal e um reduzido campo tcnico.A habilidade a sua base de
existncia real.Com efeito, o artesanato assenta sobre a mobilidade das tarefas,a
avriedade,a motivao pessoal e o empenho de todo o corpo(...)A premissa que d
origem ao artesanato ,ento, a seguinte:uma virtuosidade pessoal que passa por um
saber to tico,espiritual e esttico como tcnico.
Em sua avaliao do mundo tcnico informatizado,Bookchin encontra-se com
algumas idias de Milton Santos:
A recente evoluo tecnolgica social e cultural e seu desenvolvimento futuro
poder alterar a tradicional estrutura de classes dada pela revoluo industrial e permitir
que,da redefinio do interesse geral da resultante,possa emergir novamente a plavra
povo no vocabulrio radical.No como abstrao obscurantista, mas como expresso
de extratos desenraizados, fluidos e tecnologicamente deslocados, no integrados numa
sociedade ciberntica e automatizada.
Para Bookchin, uma obrigao tentar opor a esta evoluo social estatizante a
ao poltica municipal.Um olhar atento sobre a historia nos mostra que a revoluo
traduz-se sempre pelo aparecimento de um poder alternativo sindicato,soviete,comuna
orientado contra o Estado.
Sem duvidas, o que constatamos ao entrarmos na historia das expeirencias
autogestionarias.
As idias de bookchin no significam a busca de um retorno impossvel
experincias passadas. Nesta perspectiva diz que :No poder, evidentemente, haver
qualquer espcie de retorno a estes perodos.As suas limitaes,de toda a ordem,so
bem conhecidas.Mas as trocas materiais que contriburam para os eu desaparecimento
definitivo so, tambm elas , mais transitrias do que se pensa.
Podemos afirmar que Bookchin um dos muitos membros da sensibilidade
romntica socialista e anti-capitalista(Michael Lowy).
Tambm,nos apresenta uma viso clara dos limites do municipalismo: bvio
que um municpio pode ser to paroquial como uma tribo.por isso, qualquer movimento
municipal que no seja confederal que no entre numa rede de obrigaes mutuas com
cidades e vilas da sua regio no pode ser considerado uma entidade poltica mais
verdadeira do que um bairro que no funcione conjuntamente com outros bairros da
cidade.
Enfim,Bookchin v na cidade e no municpio os espaos potencializadores do
autogoverno e da cidadania ativa.Como diria der Sader,so elos perdidos na historia e
que,sempre podem retornar como possibilidades concretas para reconstruir a historia.
Cidade e Cotidiano
Henri Lefebrev ,em seu livro sobre o Estado,traou as origens das cidades:
Antes do capitalismo,a cidade era j um espao de encontros,de acolhimento,de
convergncias,dotado deste modo de um carter sagrado que se expressava nos locais
religiosos: templos, cpulas e fontes,catedrais,etc.No momento da formao do
capitalismo,que se constituiu fora das cidades mais antigas,a reunio das unidades de
produo ainda artesanais na cidade anloga a reunio dos instrumentos e mquinas
(ofcios a tecer,etc) no atelier e na manufatura.A cidade j era fora produtiva.Ela no
fica fora das relaes de produo,muito menos das relaes de propriedade. O espao
produzido tambm produtor : instrumento e no forma passiva,inerte,indiferente ao
contedo.
Nunca demais insistir na alta complexidade das relaes entre a sociedade,
cidados e habitantes,e a cidade,o urbano,o espao.Para o individuo, a cidade que o
cerca ao mesmo tempo lugar de desejo (dos desejos:o que os desperta,os multiplica ,os
intensifica) e o conjunto das presses que pesam sobre os desejos,que inibem o desejo.
no urbano que se instala,se instituie o cotidiano.Entretanto, a cidade suscita o sonho e
o imagianrio (que exploram o possivel e o impossivel,os efeitos da riqueza e da
potencia).As relaes consideradas so ao mesmo tempo formais e reais, praticas e
simbolicas.A cidade e o espao tm funes mltiplas,mas estas funes no esgotam o
real;de modo que,o espao e a cidade so ao mesmo tempo ser potico e presso
duramente positiva.Os comportamentos se descrevem,os desejos se dizem,se
expressam; a cidade e o urbano suscitam ao mesmo tempo um saber e um lirismo.O
urbano ,a cidade e seus contornos,o espao concerne e circundante, FORMAM UMA
TOTALIDADE PARCIAL E ABERTA grifo nosso-,ela mesma nvel de totalidades
mais vastas (a nao, o territrio nacional,o Estado).
Lefebrev chega a falar de uma Historia do espao.Prope uma classificao do
espao que corresponde ,aproximativamente, seqncia de modos de produo
segundo Marx:
- espao analgico: - a comunidade primitiva:
Foi mais complexa do que Marx a analisou, com combinaes de formas
sociais;padres e feiticeiros,chefes de guerra,linhagens,consaguinidades e
territorialidades se cruzavam.Podemos,no conjunto,caracterizar a ocupao do espao
o espao ocupado por estas sociedades- como espao analgico.A cidade e sua
organizao representam ou reproduzem um corpo divino,que projeo do corpo
humano.
- espao cosmolgico: modo de produo antigo:
est ligado a um espao cosmolgico.Os objetos monumentais se agrupam de
forma a propor uma imagem do cosmos.A cidade um imago mundi.A cidade
compreende,no modo de produo antigo ou asitico,um lugar marcado por um
monumento,obelisco ou pedra,considerado como o centro do mundo,em torno do qual
se constri uma representao do espao dominado.
- espao simblico: modo de produo feudal:
A cidade medieval detm uma outra forma de espao,o espao simblico.O
espao destas cidades,o das catedrais preenchido por smbolos religiosos.A passagem
do espao cosmolgico ainda marcado pelas igrejas romanas ao espao simblico das
catedrais gticas.estas simbolizam a emergncia da cidade acima do solo e o lan da
sociedade inteira para a claridade tida como o Logos,o Verbo,o Cristo.
- espao perspectivo:se bem que no entra na classificao dos modos de
produo,esse espao merece que analisemos pois entra em nossos hbitos,em nossa
linguagem, e na aurora dos tempos modernos h crise de todos os referenciais. um
error ainda pensar em termos de espao perspectivo,pois desde 1910,a pintura de
Kandinsky,a de Klee e a do cubismo analtico,nos adverte que h ruptura do espao
perspectivo. A linha do horizonte desapareceu nos pintores como o encontro de
paralelas ao infinito.
O espao perspectivo nasceu com o Renascimento , em Toscana,onde as cidades
adquiriam importncia: Florena,Siena,Lucques e Pisa.Sobre a base do capital
comercial se instala nas cidades um capital bancrio.Os banqueiros de Florena,Siena
ou de Pisa adquirem dos senhores feudais seus domnios e os transformam. explorao
pelos servos,a substituem pela explorao dos meieiros que dividem a colheita com os
proprietrios.O meeiro um progresso em relao ao servo;livre,ele divide sua colheita
com o proprietrio da terra;ele tem,portanto,interesse em produzir o mais possvel.Os
banqueiros,donos das cidades toscanas,tm necessidade de colheitas grandes para
alimentar o mercado das cidades.Por sua posio,eles so beneficirios deste progresso
que os camponeses.Estes banqueiros,como os Medicis, constroem no campo seus
palcios;
- espao capitalistico: para o espao perspectivo, o espao da catstrofe ser o
espao capitalistico.Com um comea a runa do outro.O fenmeno visvel desde o
cubismo analtico de Picasso e a pintura de kandinsky.Esta runa do espao perspectivo
caracterizada pelo fato que um monumento,uma arquitetura,um objeto qualquer se
situa em um espao homogneo e no mais em um espao qualificado (qualitativo): em
um espao visual que permite o olhar e circular em volta.Picasso, Klee e os membros da
Bauhaus tm simultaneamente descoberto que podemos representar os objetos no
espao,de modo que eles no tm mais face ou fachada privilegiada.
Para Lefebrev, O modo de produo atual se caracteriza pelo espao de controle
estatal,simultaneamente espao de trocas.O Estado tende,por seu controle, acentuar o
carter homogneo,quebrado pelas trocas.Um tal espao pode tambm ser definido
como tico e visual...No espao moderno, o corpo no tem mais presena;ele apenas
representado, no meio espacial reduzido aos componentes ticos.este espao tambm
flico...Flico,tico,visual,lgico-logistico,homogneo e quebrado,global e
fragmentado,assim se nomeam e se concebem os carateres do espao do MPE.

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AUTOGESTO: A TOUPEIRA SUBVERSIVA

Voltemos ao incio de nossa reflexo: os ciclos longos das lutas pela autogesto.
Como vimos acima, Paul Singer ao definir os implantes socialistas no
capitalismo, afirma que A revoluo socialista, por esta conceituao j em curso h
quase dois sculos, no a concretizao de um projeto, mas o resultado de inmeras
lutas no plano poltico, social e econmico que se estenderam por um nmero crescente
de naes, medida que a revoluo capitalista foi se estendendo a novos pases e
continentes. Traar elementos fundamentais das inmeras lutas destes quase dois
sculos de luta pelo socialismo, significa buscar elementos para um balano histrico-
crtico deste processo de tentativas e erros.
Nesta perspectiva da historia , o arco que vai da experincia da Comuna de Paris
(1871) Comuna de Gdansk (1980), a histria das lutas dos trabalhadores em vrios
continentes, mostra que em momentos crticos, caracterizados por conjunturas de
carter pr e/ou revolucionrio, a autogesto surge como prxis de auto-emancipao da
classe operria e como o horizonte do socialismo.
Yvon Bourdet: Nossa hiptese fundamental que o movimento igualitrio de
expresso da liberdade de todos os homens ( s vezes reprimido, contido pelas
instituies,pelos poderes,pelos Estados,suas policias,seus tribunais,suas prises ) flue
como um rio subterrneo e que transborda cada vez que a camada que est sobre ele
,por uns tempos, perde seu peso ou se quebra.
Lissagarey, analisando a experiencia da Comuna de Paris , de certa forma,
poetizou este fenmeno:
O 18 de maro de 1871, a mais alta onda do sculo, a mais surpreendente
manifestao desta fora popular, que toma a bastilha, reconduz o rei a Paris e assegura
os primeiros passos da revoluo francesa; sangra no Campo de Marte; invade as
Tulherias; expulsa o Prussiano; aniquila a Gironda; alimenta com idias a Conveno,
os jacobinos, a Cmara Municipal; afugenta os padres; curva-se sob Robespierre,
levanta-se no Prairial e dorme vinte anos para despertar aos canhes dos aliados;
mergulha de novo no sono, mas ressucita em 1830; enche de sobressaltos os primeiros
anos do reinado orleanist; ataca-lhe as fraudes em 48; sacode durante trs dias de junho
a Repblica ----; rechaada, irrompe novamente em 69; esvazia as Tulherias em 70;
oferece-se para combater o invasor; desdenhada, espizinhada at o dia em que esmaga
a mo que a quer asfixiar; a onda revolucionria corre, ininterruptamente, na nossa
histria, ora a luz do dia, ora subterraneamente, como os rios que caem de repente nos
abismos, ou nos areiais, para reaparecerem mais majestosos ao sol maravilhoso.Vou
narrar a ltima irrupo e extrair as guas vivas dos lagos pantanosos.

A quebra desta camada sobre o rio subterrneo, se expressa em ondas de fluxo


que inundam,por uns tempos, a historia das lutas pela autogesto. Patrick Viveret, em
prefacio ao livro de Andr Chazalette sobre a historia do socialismo, analisa o que
chama de desapario criativa,isto , a seguinte questo : Como explicar o paradoxo
entre a desapario do tema autogestionario, e, de sua vitalidade subterrnea que
continua a estruturar nosso debate contemporneo ? .
Assim, levando em conta as experincias principais do movimento operrio,
caracterizadas por diversas formas de socializao dos meios de produo, do poder e
por revolues culturais do cotidiano, podemos extrair um contedo coerente do
socialismo autogestionrio como alternativa tanto s vrias formas de capitalismo
quanto s de socialismo estatal.
Esse ensaio explora conhecimentos sobre estas vrias experincias, com enfoque
sobre alguns aspectos que so fundamentais para concepo da autogesto. Procura
traar a existncia de uma constelao de lutas pela autogesto, demonstrando que
constituem uma existncia real que a prpria histria das lutas do movimento popular
e operrio.
A autogesto existe e se manifestou em vrias formas. til conhecer como ela
combateu, como foi desviada de seus objetivos, sabotada, derrotada. Desta forma, a
autogesto deixar de ser uma palavra vazia e ser vista como uma experincia plural e
uma estratgia de luta.
As experincias ensinam lies fundamentais para a histria dos trabalhadores.
Rosa Luxemburgo foi a primeira socialista a dizer que os trabalhadores devem aprender
com os erros e as derrotas. Assim, nestas experincias no buscamos receitas ou
modelos acabados, mas exemplos de organizaes dos trabalhadores. Cada momento
histrico tem suas particularidades e solues que so especficas. Todavia,
fundamental o conhecimento do movimento operrio internacional, suas diferentes
formas de luta e de organizao, suas idias e suas experincias.
Podemos buscar apoio em algumas idias de Hanna Arendt, que articulou seu
pensamento sobre as Revolues em dois plos extremos: o primeiro que toma a
revoluo como abertura e momento de incandescncia do poltico, onde a histria se
entreabre brevemente para liberdade e ao. O segundo, em que aborda o
totalitarismo como eclipse do poltico. Hanna Arendt aborda a dimenso da
comunicao,nestes processos, como revelao:
A revelao de perda do espao pblico pela cassao da palavra, o que
ocorre na situao-limite do totalitarismo. A revelao da recuperao da palavra viva
e da ao vivida, que surge em certas situaes especificas, das quais, so exemplos:
os soviets, as comunas, os conselhos, que so, na expresso de Hanna Arendt, os
tesouros perdidos a serem novamente resgatados das experincias dos movimentos
populares.

Nosso prximo passo ser em relao s lutas no sculo XIX. Destacamos alguns
momentos fundamentais: o nascimento do Cooperativismo autogestionrio na
Inglaterra, a revolta dos Canuts e a grande insurreio da Comuna de Paris,
possivelmente, a primeira luta mais ampla de carter autogestionrio. Em que os
trabalhadores elaboraram a forma politica finalmente descoberta , para realizar a
emancipao econmica do trabalho(Marx).
A palavra UTOPIA signica ( o que no existe ainda em algum lugar).Ao
contrario,o ttulo do ensaio, com um certo corte barroco, tenta dar conta de dois
lugares muito concreto: o beco dos sapos, onde surgiu a cooperativa em Rochdale, e,
os canaviais da zona da mata pernambucana, onde est localizada a Usina Harmonia
Catende , com seus milhares de camponeses e operrios,construindo uma Utopia
Concreta.

Bloch, Em O Princpio Esperana,obra escrita entre 1938 e 1947, no exlio dos


EUA, relata em sua linguagem barroca, a situao da classe operria nos incios do
capitalismo.
a misria no perdia seu tempo,proliferava de forma
desconcertante. Aps os camponeses foi a vez dos trabalhadores
de conhece-la. Mais um pais era economicamente avanado,e
mais atroz era a situao dos pobres.O servo tinha uma vida
dura, no plano dos sofrimentos,a medida parecia
completa.E,portanto, a misria dos primeiros operrios das
fbricas supera a pior angustia da Idade Media. As primeiras
fbricas eram verdadeiras galeras;um operrio
esfomeado,privado de sono e desesperado achava-se acorrentado
as maquinas.O lucro do capitalista no conhecia nem o respeito
nem o descanso. O trabalho dirio, vergonha imunda sem
paralelo, durava 18 horas ou mais.Nunca um numero to grande
de homens tinha sido to infeliz como na Inglaterra no fim do
sculo XVIII.

No ensaio A jornada de oito horas, Bloch afirma que


o escravo grego era melhor tratado que o servo,e este por sua
vez, era melhor tratado que o assalariado dos tempos
modernos(...) Em 1525 o servo alemo que desejava a liberdade
do cristo era enforcado. Ou era condenado a andar pelas ruas
do Santo-Imperio romano estrebuchando, os olhos furados, a
lngua arrancada, at tombar e morrer em uma fossa. A situao
dos compagnons artesos , no fim da Idade Mdia, se
aproximava a dos camponeses,e na medida em que o mestre
mesmo, de contramestre patriarcal que foi, mudava pouco a
pouco em explorador precapitalista.Em Dantzig, cerca de 1500,
os compagnons que entraram em greve, tiveram suas orelhas
cortadas; em Florena, eram marcados a ferro e fogo pelo
carrasco,e expulsos da cidade golpes de foice.

At aparecer a livre circulao e que o homem torne-se


possuidor de sua fora de trabalho.Signatrio igual em direitos
do contrato de trabalho concludo com o capitalismo; olhos nos
olhos ,e dente por dente.Surgiram,ento, os direitos
sociais,descritos por Engels, na primeira fase da industria; aps
o escravo, o servo, o compagnon arteso pouco a pouco
eliminado, aparece o proletrio. Se at ento, a situao da
classe dos trabalhadores foi miservel, ela tornou-se infernal.
Por volta de 1800 , o proletrio inaugura as
galeras.Freqentemente, crianas de 4 anos em trabalho forado
nas escuras corredores das minas ou nas fbricas de algodo ,
abafadas, midas e sem higiene; em mdia,a criana comeava a
trabalhar com a idade de 8 ou 9 anos.Sua durao de jornada era
de 6 a 10 horas;com o tempo se elevava para 12 horas. Para que
seus patrons tivessem lucros, os homens e as mulheres de mais
de 18 anos trabalhavam de 5 horas da manh at 8 horas da
noite,e as vezes, por mais tempo.As mulheres amamentavam
seus bebes sem parar sua atividade,e no havia pausa para o
repouso,a maior parte do salrio miservel era para o aluguel.
Mais conservador que o senhor feudal, o capital se opunha a
toda mudana neste inferno;o lucro no tinha piedade.

O nico e s meio de esquecer esta misria sem paralelo era a cachaa ,as
vezes, um ato desesperado explodia, e se quebrava as maquinas, incendiava as
fbricas,o que apenas tinha o efeito de conduzir a pena de morte,que aps 1811 punia
este gnero de convulso social. [C6] Comentrio: Vrias citaes sem
comentrio.
D.DESANTI, em seu estudo sobre os socialistas utpicos, aborda as revoltas
contra a miseria existente na Frana , poca da revoluo de 1848.

A situao econmica da Frana explica que a revoluo no se


limitara a Paris. Tomemos como testemunho uma cidade da
Bretanha muito longe do movimento das idas: BREST, situada
a beira-mar, atingida com grande atraso, pelas turbulncias
parisienses. Desde 1845 at a revoluo de 1848, as colheitas
tinham sido deficitrias: os mendigos socorridos passaram de
192 em 1845 para 309 em 1855 (dez anos depois).No inverno de
1845 os cereais sofrem uma geada e no ano seguinte os
especuladores se apoderam das escassas colheitas; nesse inverno
ocorrem 18.676 mortes, a maioria devido fome. A Sociedade
de Beneficiencia socorre a 4.120 habitantes e serve 420 litros de
sopa por dia, 140 dos quais destinados unicamente ao baiiro de
Recouvrance. O preo do po sobe de 160 para 3 francos.Os
alimentos so distribudos por uma ssociao de personalidades
locais.Em 1845, funda-se uma associao de beneficiencia e de
socorro mtuos, que confessional e paternalista. A misria
crescente favorece o xodo para ultramar.Por acrscimo, a partir
de fevereiro de 1848, o desemprego cresce incessantemente e
torna-se preciso abrir os talleres de caridade,com subveno de
4.000 francos,embora a inscrio j proporcione 6.000 francos:
cada um dos operrios que trabalha entrega o valor de uma
jornada de trabalho.

O chefe do partido dos operarios era um nativo de


Recouvrance, Victor Rossel (1807-1868)Foi ele quem, no dia
3 de abril, dirigiu a greve dos operrios do Arsenal.O coronel da
Guarda nacional,Lacrosse,neto de Convencional, se apresentar
com ele e outros 21 candidatos na lista republicana: 5 deles
sero eleitos. [C7] Comentrio: Confirmar se a
citao termina aqui.

A alma da revoluo em Brest foi Jacques-Armand L Dor,pai do futuro


communard Constant L Dor (que tinha ento 8 anos).Era membro da Associao
dos Direitos do Homem, dirigia o clube que contava com 10.000 membros,em sua
maioria operrios porturios. Tambm,dirigia A Solidariedade Republicanae,em
1849, projeta uma luta sangruenta j que a aristocracia domina. Em dezembro de
1850 (ser preso alguns meses mais tarde e aps sua priso se exilar no Brasil) ao
solicitar a fundao de uma associao operaria ,escreveu: O qualificativo de socialista
que adotei me parece demasiado honrvel para tentar ostenta-lo abertamente: s o
otorgamos aos defensores dos oprimidos... se um crime... que nos persigam
legalmente....Ser o chefe da cooperativa operaria de Brest.,portanto, um socialismo
cooperativista com uma ideologia sincrtica, que concilia Babeuf, Cabet e Proudhon
que a orienta.Diz de sua associao operaria: Seu aspecto poltico consiste na
independncia completa das convies de cada associado.
O caso de Brest tpico. Uma cidade espontaneamente revolucionaria, em que
uma burguesia forte que, ao utilizar a Igreja para manter a ordem favorece na realidade
o movimento ( o que no impedir a existncia de uma forte seo da Internacional
dirigida pelo filho L Dor,Constant,nem da Comunne de Brest).Os operrios desta
cidade manifestaram uma viva solidariedade quando chegaram, em 8 de agosto de 1849,
os prisioneiros da insurreio de junho e, na geraos eguinte, 1.500 communeux.
Examinemos tambm a situao de uma regio fortemente industrializada, antes
da revoluo de 1848: o Departamento do LOIRE. Em 1831 ocorrem as primeiras
greves entre os teceles de Saint-Symphorien-em-Laye,e em 1832,nas minas e
cristalerias de Rive-de-Giers. Dois anos mais tarde, por influencia dos canuts, os
semanais se amotinam.Entre 1840 e 1844 , agitam-se e combatem os mineiros de
Rive-de-Giers, primeiro,e de Firminy e Roche-La-Molire, depois. Em 1846 explode a
trgica greve dos mineiros de Saint-tienne.
Os semanais, teceles e coureiros do Loire levam uma existncia comparvel
dos Canuts de Lyon. O chefe do taller possui os talheres e teares; o capital
proporcionado pelo cliente-fabricante que produz 33% do produto.Mas, o capital do
chefe do taller no produz nada e o desgaste de suas mquinas no contabilizado nos
preos. O dficit anual, na poca de produo, de 438 francos. O operrio permanece
de p durante 18 horas em uma atmosfera viciada, o que proporciona 140 francos
dirios operaria na montagem 9para urdir) e de 50 a 80 centavosao operrio que faz
os cintos.Uma tera parte dos homens e 10% das mulheres sabem ler.Organiza-se o
contato entre os Canuts de Lyon agrupados em associao mtualista, os chefes de
taller e os desorganizados habitantes de Saint-tienne.Em Saint-tienne h tal grau de
misria que um tenente da policia escreve ao sub-prefeito: Deve proclamar-se a
verdade, o operrio sofre. E o procurador do rei ao ministro da justia: Sua miseria
muito grande...embora estejam longe da audcia e do esprito de insubordinao que
sempre se faz notar entre os operrios das fbricas de canhes. O que no impede que,
em 1833, as sociedades de Socorro Mtuo dos chefes de taller se organizem e os
delegados reclamem uma tarifa mnima. A partir do ms de julho, os operrios se negam
a entregar 13 medidas por dzia. O partido republicano no tem influencia alguma entre
os operrios e chefes de taller; recusam falar de politica em suas reunies.
No 5 de abril de 1844, por ocasio da greve de mineiros ( no 15 fevereiro ,
reduziram seus salrios em 60 centavos como media, com o pretexto da m venda de
carvo), a tropa ataca primeiro e atira depois sem aviso prvio. No 10 de abril, L
Chivari publica: Em Rive-de-Giers se dispara sobre os operrios que pedem po para
suas famlias; um meio excessivamente expeditivo de faze-los perder o gosto pelo
po.
Em 1846,em Saint-tienne a greve trgica se inciia com uma descarga de
fuzilaria: uma mulher, aps alcanar o general com uma pedra,cai com a cabea
destroada.Disparamse de 400 a 500 balas, que ocasionam 6 mortes,entre elas 2
mulheres. No 31 de maro, bacias mineiras de Saint-tienne, A Ricamarie e
Terrenoire somam 2.000 mineiros em greve duramente reprimida.Mas, o tribunal de
Justia ,em um total de 22 lideres acusados,absolve 14 e condena o resto a penas
inferiores a dois meses de priso. O conselho municipal de Saint-tienne acusa a
companhia mineira.As greves se iniciaram novamente durante o Imprio, at a lei de
1864 que as legalizar...,o que no impediu outras descargas de fuzilaria sobre os
grevistas de La Ricamarie em 1869.
Nos anos 30, a ideologia socialista apenas aparece explicita: trata-se do que
qualificaramos como greves selvagens surgidas por causa da excessiva misria ( os
mineiros trabalham de 15 a 16 horas no fundo das minas para conseguir um pagamento
de 325 francos e,ao mesmo tempo em que as crianas com menos de 16 anos de idade
arrastam vages com 35 hectolitros de carvo por 175 francos de pagamento real).
to escandaloso que, em 1852 o Imperador ( que no gosta da companhia monoplista)
recebe seus delegados. Mas, as promessas que lhes faz no sero realizadas.
Sem dvidas, o nvel de conscincia e de organizao aumenta devido ao influxo
das ideiaideias de 1848. Em 1864, forma-se a Associao de Trabalhadores e a
Internacional recruta seus membros.Por ocasio da greve sangruenta de 1869 (que
quebrou a lealdade ao Imprio na regio) as reivindicaes incluem uma caixa de
socorros central, uniformizao dos salrios e a reduo da jornada de trabalho para 8
horas.Estas reivindicaes nos separam de nossos construtores de sociedades no-
violentas.O movimento reivindicativo est influenciado pelos idelogos da violncia,
Blanqui,pore xemplo, e da anarquia (Proudhon, Bakunin e Kropotkin )...
No obstante, era necesario expor as linhas de fora da condio operaria. Com
efeito, se os intelectuais fourieristas, saint-simonianos e cabetianos conseguiram
audincia de muitos artesos, foi devido a que estes retrocediam frente ao pesadelo dos
atades, das fbricas de tecido para priso e das minas-presidio. Se houve ebanistas,
ferreiros, fundidores, coureiros, tipgrafos, pticos, etc, que se inscreveram
voluntariamente nas Novas Iarias de cabet e nas Novas Harmonias de Considerant e se
Enfantin arratou arteso e operrios, no apenas para seu convento-falansterio de
Menilmontant,mas tambm ao Egito, deve-se a que o sonho do trabalho desejado
voluntariamente crescia a medida que a industrializao tornava menos criadora a
obteno do sustento cidado.
Todas estas correntes de ideiaideias e esperanas circulavam com maior rapidez
a medida que as ferrovias, at 1840, se estendiam ligando as regies.(...). Os peridicos,
os folhetos,os clubes e as associaes mais ou menos secretas se multiplicaram ao
mesmo tempo que piorava a condio operaria.

AS UTOPIAS SOCIAIS NA AMERICA LATINA


(O ciclo dos anos 40 )

No sculo XIX muitas foram as tentativas de realizao de experincias


comunitrias na Amrica Latina.Abramson assinala o impacto na Amrica latina das
revolues de 1848 na Europa. Em toda utopia social em latinoamericana, h um
momento em que a cultura francesa dos americanos se relaciona com a fascinao pelo
Novo Mundo dos utopistas franceses ou, mais geralmente, dos europeus.
Em seu estudo sobre os socialistas utpicos na Amrica latina, Abramson
analisa o pensamento de vrios socislistas utpicos, as revolues de 1848 e a tentativa
de implantao de experincias comunitarias.
Em Anexo nos apresenta uma Lista de Comunidades Utopistas da Amrica
Latina no sculo XIX. Vamos nos limitar neste trabalho essa lista,apresentada em
ordem cronolgica, destacando os socialistas que influenciaram e a localidade.
Quadro 1. [C8] Comentrio: Criar ttulo para o
quadro.
Ano Comunidade Localidade Utpicos
1799 Repblica dos Homens Livres. Guyana Francesa. Saint-Simon e G.Babeuf
1817 Campo de Asilo Texas Bonapartismo
1840 Union Industrial(falansterios) Brasil-SC Fourier
1850 Sociedad Comunista Mxico Fourier
1850 Falansterios El Esfuerzo Mxico Fourier
1853 Colonia Los Buenos Amigos Peru Anarquismo
1857 Colonia San Jos Argentina Proudhon
1865 Escuela de la Razn y del Socialismo Mxico Fourier,Proudhon
1879 Crdit Foncier Mxico Saint-Simon,Fourier
1888 Jewish Colonization Association Argentina Th. Hertzka
1888 Colonia La Cecilia Brasil- Parana Fourier,Anarquismo
1893 La Nueva Australia ( y Colonia Cosme) Paraguai Owen, Tradeunionismo
Fonte: [X9] Comentrio: Conferir fonte destes
dados.

1 10= AS UTOPIAS SOCIAIS

Retomemos nosso fio da meada, atravs de pensadores do campo chamado de


Socialismo Utpico.Para esse objetivo, vamos nos apoiar em alguns estudiosos destes
precursores do socialismo e do marxismo.
Na Frana,em 1791, a lei Chapelier proibe todo tipo de organizao dos
trabalhadores.Em 1794, os armazns de Paris so saqueados : uma critica concreta
propriedade privada.Os cidados lutam contra a taxao dos alimentos, contra a lei da
oferta e da procura e do mercado livre.
Em 1795, a Conspirao dos Iguais,pela primeira vez fala publicamente,atravs de
seu lder, Gracchus BABEUF, da Propriedade Coletiva e da Igualdade Social.
Com o desenvolvimento das contradioes internas do capitalismo, surgem as
formulaes dos chamados Socialistas utpicos:
Charles Fourier (1772-1837), reage contra uma civilizao em que a pobreza nasce da
abundancia e, em que , o trabalhador , simples meio a servio do patro,no mesmo
assegurado de um trabalho degradante e repugnante; os discpulos de Fourier tentaram
realizar as idias do mestre.
Muitos Falansterios foram criados,tanto no Oeste deserto dos Estados Unidos quanto
nos centros industriais da Frana.Sobretudo,em Lyon,cidade industrial por excelencia
da Frana desta poca. Nela se deselvolveram diversos tipos de movimentos socialistas
utpicos que criavam sempre novas organizaes,como uma Cooperativa de Produo
chamada de Organizao Fraterna dos Operrios Marceneiros em agosto 1848.
O Prembulo de seu Programa afirma: Uma nova era se abre para ns,a vitria de
fevereiro vai enfim coroar os esforos pelo socialismo.Pelo direito de
associao,estabeleceremos entre ns a solidariedade...viveremos juntos,no mais como
inimigos,mas como verdadeiros filhos de Deus.
Os Estatutos definem que o associados devem contribuir com seus instrumentos e uma
participao de 100 francos;ele pode ser excludo por roubo, bebedeira,preguia ou
imoralidade.Os benefcios,partilhados por 4/5 entre os associados,servem para os que
ficam individuais, para pagar impostos,para alimentar uma caixa de socorro dos idosos
e uma de socorro aos desempregados, para participar na fundao de um banco mutual e
para distribuir aos melhores operrios os prmios de encoragamento.
Uma outra Cooperativa, a Associao Fraterna da Industria Francesa ,foi fundada em
setembro de 1848 , pelos Republicanos e Trabalhistas.Defendiam aque bilhetes aos
portadores seriam pagveis em mercadorias ou em servios, um Banco do Povo
deveria completar o sistema e permitir o funcionamento fora da sociedade capitalista, de
um mundo de associaes e de fraternidade.
Em Paris Ouvrier (2003), Alain Rustenholz remarca ,em sua Introduo:
Audiganne, em suas Memrias de um operrio de Paris, 1871-1872, descreve As
trs aspiraes dominantes na classe operaria:
A primeira consiste em combater a ignorncia, a segunda em combater a misria , a
terceira em se ajudar uns aos outros. A primeira foi realizada com as Universidades
Populares, a segunda com os Sindicatos, a terceira com as Cooperativas. Imaginemos
uma Paris onde, nos bairros operrios, comprava-se seu po, sua carne, seus
condimentos, seu carvo, seus sapatos e vestimentas em cooperativas, onde comia-se
em restaurantes associativos, onde na frente das lojas se lia os nomes de ,a
Reivindicao ,a Igualdade,os Probos, a Evoluo social,a Proletria.
Na mesma obra, no vocabulo Cooperativas: Paris foi portanto,tambm,no inicio do
sculo XX,a sede de trs potentes cooperativas de consumo, associadas s cooperativas
de produo fabricando produtos que compartilhavam entre si,como a
Moissonneuse,com suas 19 sucursais no faubourg Saint-Antoine e seus 17.000
socios,a Bellevilloise,com suas 40 reparties e seus 14.000 socios, a Igualitria,
nas margens do canal Saint-Martin,com seus 17 magasines e seus 6.000 associados, a
Avenir de Plaisance com o mesmo numero de aderentes.

3= Utopias : federativas e centralistas ( por Ernst Bloch)

Ernst Bloch um dos raros pensadores a diferenciar as diversas vises no campo do


socialismo utopico.

Em seu Principio Esperana( volume II), E.Bloch no capitulo que chama de Os


sinais de um mundo melhor e tour do horizonte das Utopias Sociais, analisa e divide
as utopias socias em vrias categorias: federativas (Owen e Fourier), centralistas (
Cabet e Saint-Simon) , individualistas ( Stirner ), anarquicas (Proudhon e Bakouni) e
proletarias.( Weitling).

Tendo em vista os objetivos de nosso trabalho,vamos dedicar algumas paginas viso


blochiana sobre algumas delas.

1- Federativas : Owen e Fourier

Antes das consideraes de Bloch, vamos resumir a idia de Owen: propunha a


criao de comunas com 1.200 membros que viveriam em grandes edifcios com
cozinhas e comedouros comunitrios, cercados de 1.000 a 1.500 acres de
terra.Cada casal disporia de uma habitao.As crianas a partir da idade de 3
anos seriam educadas em comum.O trabalho e as diverses tambm seriam
coletivas.

E. Bloch assinala : Robert Owen descobriu que um operario bem alimentado e


alegre pode , em duas vezes menos de tempo, fornecer o mesmo trabalho ,que
um forado das galerias. Owen foi um dos primeiros utopicos do seculo XIX a
conceber um objetivo de socialismo federativo..Entre seus numerosos escritos,
citemos as obras remarcaveis: O Sistema Social de 1820 e O Livro do Novo
Mundo Moral de 1836.
No primeiro livro,Owen se separa das Instituies de assistencialismo do
sistema patriarcal para se dirigir em direo ao comunismo. Mas, se o utopista
sabia a base sobre a qual se assentava o capitalismo,pedir aos capitalistas
aprovassem suas utopias, indicava muita imaginao.Owen ainda pensava poder
chegar a mudana social pelas reformas;era adversario da greve e mesmo da luta
pelas liberdades politicas,buscava a reconciliao e esperava que os duques,os
ministros,os industriais fossem razoveis e renunciassem ao capitalismo pelo
altruismo. Ademais, o industrial Owen subestimava espantosamente o papel
futuro da industria; se reclamava a introduo da fora motriz vapor e a
utilizao da maquina na empresa,e se no aceitava a destruio selvagem das
maquinas , a grande industria no ocupava ainda papel preponderante nos
sonhos futuros do industrial de New Lanark.

Apesar destas fraquezas,Owen organiza seu comunismo filantropico,faz contato


com os Quakers por intermedio dos quais descobre as obras de
Winstanley,defensor do comunismo agrario na revoluo
inglesa.Mas,sobretudo,Owen adota para si a teoria de Ricardo: a do valor do
trabalho,adotando plenamente com todas suas consequencias .Ricardo descobriu
que a nica medida de valor de um produto era a quantidade de trabalho que ele
implicava; foi sobre esta teoria que Owen fundou o projeto de um comunismo
do futuro,no qual cada um acede plena satisfao da quantidade de trabalho
que produz,ao passo que desaparece o lucro capitalista procedente do trabalho
no pago.

O caminho conduz ainda a comunidade passada pela reforma: todo fabricante


deve ter a possibilidade,graas a edificao de um grande armazm (magasin),de
por os bens de consumo que ele produz, emd eposito.Em compensao, ele
recebe um bilhete de trabalho,correspondente ao valor do trabalho
representado pelo produto depositado e dando direito retirar mercadorias no
valor equivalente.

Tal magasin foi fundado por Owen ,em Londres em 1832,tipo Bolsa do
Trabalho em que os fabricantes se reuniam sem passar pelo intermedio dos
capitalistas e buscavam escapar ao aumento que determinava o desjo do
lucro.Esta utopia ainda pr-capitalista fracassou,pois,queria regular a economia a
partir da repartio e no da produo.

Entretanto, mais radical que este projeto de Cooperativa de Consumo,foi o da


Comunidade do Futuro.Aps a abolio da propriedade privada, um novo
sistema de produo ser fundado nas Cidades Cooperativas, sistema que ser
baseado sobre o trabalho agricola e artesanal e no qual nenhuma produo em
grande escala ser autorizada. E tudo isto, com a supresso da Familia;Owen se
insurger mais violentamente que outros utopistas contra a forma existente de
casamento. Owen via na propriedade privada, no casamento e na religio
positiva o que chama de santissima trindade, so idolos e semeiam a
infelicidade entre os humanos.

O fundamento agrario e artesanal no reproduz as antigas formas sociais, apesar


do projeto da antiga habitao em cidade.Grupos federados de 300, num total de
2.000 familias trabalham a terra,ajudando-se em um mesmo grupo e a outras
comunidades.A nica cidade deste tipo, New Harmony, em Indiana, relacionada
etica de vizinhagem da poca dos pioneiros americanos, fracassou mais
fortemente que o magasin de Londres;pois,a poca das Colonias de Seitas j
tinha passado.Numa poca em que o capitalismo tinha atingido sua plena
maturidade,este tipo de pequena estrutura no podia superar seus vizinhos
capitalistas,e lhe era mesmo inferior, ao menos no plano tecnico da produo.

Owen pretendia,primeiro,purificar o proprio Homem: o meio de produo mais


nobre.O que explica que se atenha aos grupos pequenos e,sobretudo, o grande
sonho pedagogico de Owen e sua enorme envergadura moral: modelar uma nova
humanidade.Foi precisamente, em vistas desteb ideal pedagogico e humano que
centrou suas propostas em contatos humanos limitados.

Todas estas coisas boas aconteceriam,seriam instauradas, de um s golpe. O


pensamento de Owen no se preocupava com a Historia.Isto o distingue de outro
grande utopista partidario da federao: Charles Fourier.

Fourier,desde sua primeira obra, Teoria do Quatro Movimentos (1808),funda


sua critica do presente em uma base historica.Mesmo que,depois,tenha criticado
essa obra, no Tratado da Associao Domstica Agricola (1822) e no O
Novo Mundo Industrial(1829), reafirma como na primeira obra,uma critica da
poca,consideraes de ordem historica e exaltao do futuro.

Para Fourier, existiam 4 periodos;cada periodo anterior tende sempre para o


periodo seguinte ,cuja evoluo irreversivel.O primeiro periodo da poca de
felicidade do instinto e da comuna primitiva; o segundo o da pirataria e da
economia direta de troca;o terceiro, o do patriarcado e da expanso do
comercio;o quarto, da barbarie e dos privilegios economicos. Este se perpetua no
quinto periodo (que coincide com o quarto): o seculo da civilizao capitalista,
que o presente.

Isto testemunho da consciencia historica de Fourier, que ele critica o presente


no como o tinham feito os utopistas anteriores,na otica do Estado ideal,mas que
ele o desenha como um produto de degenerao,reconhecivel hic et nunc,e como
uma insuportavel barbarie que chegou a seu paroxismo. Ao se basear na historia,
ele torna-se no apenas um autor satirico mas tambm dialetico.

Mesmo que Fourier represente muito pouco em relao a Owen,os interesses de


classe do proletariado,no sentido da luta de classes, ele no acredita que a
sociedade burguesa seja reformavel.Sem conhecer Hegel e a uma boa gerao de
distancia de Marx, Fourier descobre esta tese extraordinaria segundo a qual em
toda civilizao,a pobreza engrendada pela propria abundancia. A miseria o
reverso dialeticamente necessario da gloria capitalista,no pode ser dissociada e
se instala com ela,cresce com ela;eis porque a civilizao capitalista no
eliminar jamais a pobreza.

No que diz respeito ao futuro mais proximo do capitalismo, Fourier predizia j


em 1808 o fim da livre concorrencia,a formao de monopolios. Espera que uma
transformao social poderia por fim anarquia comercial antes mesmo que os
monopolios se formassem, trazendo uma existencia melhor para humanidade
aps o capitalismo.Ao fim da critica, Fourier rompe bruscamente a mediao
historica e dialetica, e desde ento, uma imaginao optativa subjetiva povoa
suas imagens.O objetivo uma organizao cooperativa da produo e da
repartio dos bens; de forma curisosa, Fourier enxerga seus primeiros
fundamentos nas caixas de poupana j existentes,nas sociedades de seguros
cooperativistas e noutras caricaturas burguesas .

O ponto-de-vista e a apreciao de Fourier,neste plano, so pequeno-


burguesas;como Owen ele projeta pequenas comunas que batisa com o nome de
flansterios,sem mesmo abolir a propriedade privada,o que constitui uma
anomalia nas utopias. Estes falansterios so puras comunidades individualmente
autonomas,comunas confiadas a 1.500 pessoas ou um pouco mais.cada falange
preserva em seu interior um equilibrio entre individuo e coletividade.Entre eles,
tambm os falsnterios so associados,sob a direo de um governo;o socialismo
,assim,uma federao de pessoas.A atividade agricola e artesanal nos
falansterios,a ausencia da grande industria , faz reinar na comunidade uma
doura pastoral,em plena frente socialista.Duas horas de trabalho so suficientes
para que o trabalho seja um prazer,a troca das ocupaes prevista em grande
escala... para responder paixo borboleante dos homens e sua queda por
umas 30 profisses. Neste ponto, Fourier torna-se um quase americano.

A civilizao capitalista porta em si-mesma a tendencia em direo a um novo


estado social,apesar dos monopolios,que o socialismo deve esmagar j dentro do
ovo: portanto, com uma necessidade mais que historica,com uma necessidade
geometrica, o Estado do futuro de Fourier decorre do principio supremo do
cristianismo,Fourier representa sua comuna tal qual uma musica feita de
harmonias crists.. Fourier,atraves da ideia das pulses, esboou uma especie de
contra-ponto antropologico,com doze paixes e no menos que dezoito
caracteres;todos se realizo na ecloso do amor universal, condio que a
sociedade harmoniosaelimine toda mentira disonante. O homem nasceu para
harmonia,sua riqueza e sua universalidade,harmonia para ele mesmo e entre ele
e o mundo.

2- Centralistas: Cabet e Saint-Simon

Ao contrario de Owen e Fourier, para os centralistas,os mais proximos da


industria,fazem da liberdade um fato de organizao e tornam a solidariedade
toda-potente. No pensam em escala da colonia mas do grande complexo
exonomico, e as comisses de inspeco de Owen cedem lugar uma
administrao rigorosa.Ordem e rigor resurgem em plena liberdade, uma
liberdade que no mais acolhida como a da economia individual,mas como
liberdade social,orientada para objetivos comuns.Estes utopistas centralistas no
povoam seus sonhos com campos, casas e oficinas,equipes de camponeses e
artesos; este um fenomeno revelador e determinante:eles acolhem os meios de
produo coletivos da industria.

Cabet foi um dos precursores em defender os trabalhadores,um dos primeiros


tambm a se sentir como seu porta-voz . Tambm acreditava que a tensa entre
pobre e rico repusava em um tipo de malentendido que se dissiparia sem precisar
da luta de classes. Esperava que as crises fariam os capitalistas tomarem
consciencia. A utopia de Cabet desprovida de sentimentalismos.Sua Viagem
em Acaria(1839),apenas na aparencia sonha com uma ilha e sua colonia: sua
Icaria moderna e complexa.Cabet utiliza pela primeira vez o termo
comunista no programa de 1840. Foi Heine quem introduziu os neologismos
comunista e comunismo na lingua Alem.

No so mais comunidades parciais que cobriro a terra, Icaria um edificio


unitario e homogeneo, altamente industrializado, habitado por uma nao
potente de trabalhadores. Cabet glorifica aindustria e sua fora revolucionaria.O
Estado do futuro que sairia da organizao industrial era imaginado com toda a
elegancia e a preciso do sistema decimal.No novo projeto, o pais dividido em
cem provincias;cada uma

das provincias se subdivide em dez comunas;as provincias e as comunas so


governadas pelo cerebro de sua cidade, na cupula por Icaria, o centro, o orgo
inteiramente racionalizado,comparavel a um cristal. A jornada minuciosamente
regulada, se compoe de sete horas e comea cedo, inteiramente marcada por uma
populao de uniforme de trabalho e de comites. Engenheiros e empregados
dirigem um mundo de especialistas o contraste com o falansterio de Fourier
no pode ser mais marcante.

Em nenhuma outra utopia, a influencia do relogio regulando a hora de


trabalho,com uma venerao pela exatido.Entretanto, -elemento realista ao lado
da idolatria o programa da economia socialista que aplicado em
permanencia: um comite industrial determina ,previamente,o numero e a
natureza dos bens que devem ser produzidos no ano.

Deste modo, a produo escapa s crises que arruinam a prosperidade e torna o


sistema um inferno para os proprios capitalistas.

Icaria foi concebida como um brilhante Estado de trabalhadores com sua


metropole,em seu centro; na realidade, foi uma pequena colonia que se construiu
penivelmente perto dos rios do Missouri por pioneiros comunistas. Apesar de
sua fora motriz ( o vapor ), de sua mecanizao em grande escala e de suas
experiencias de empresas modelos, ela afundou,engolida pelas mares e praias.

A verdadeira Icaria deveria ser as margens do Sena, era a Frana perfeita no


sistema decimal e nos departamentos.

O vapor transforma as coisas mais rapido e mais profundamente do que se podia


sonhar.Saint-Simon foi o campeo desta esperana,mais que Cabet, ele era um
entusiasta da via industrial. Ele cria a utopia para o capitalista (empreendedor) e
para o trabalhador.No tinha a perspicacia ndialetica de Fourier.No entendia
que a miseria fosse fruto da riqueza,no oposio entre proletariado e
burguesia.Por isto, poe numa classe de trabalhadores,tida como o conjunto
dos membros ativos do povo : todos que no tinham herdado privilegios
feudais.Ainda no considerava a burguesia como uma classe-em-si,e mesmo
que se colocasse ao lado dos mais pobres e mais numerosos,um equilibrio
pacifico entre o capital e o trabalho lhe parecia possivel.
Trabalhadores e capitalistas ficariam asssim lado a lado , separando-se da
feudalidade apodrecida.A propriedade adquirida pelo traalhos eria distinta
daquela herdada da nobreza da terra.

Na obra reorganizao da Sociedade Europeia( 1814),Saint-Simon estima que


o proletariado de ento, ainda fraco e imaturo, completamente passsivo.Assim,
chama os herois da industria para transformar o proletariado do estado de
objeto explorado ao,no menos passivo, de objeto pleno na progresso da
revoluo industrial.

Saint-Simon glorifica a capacidade administrativa dos representantes ativos da


classe burguesa ascendente; os banqueiros,sobretudo,representantes das
instituies centrais da vida economica moderna, deveriam ajudar o povo e se
tornarem os funcionarios publicos da comunidade popular industrial. Bazard, o
teorico da escola,declarava que os banqueiros poderiam tirar as posses e dinheiro
dos reis e dos parasitas feudais;as instituies bancarias seriam os germens
organicos do sistema social do futuro.

Bazard renegou o industrialismo centralista de seu mestre, Louis


Blanc,discipulo tardio de Saint-Simon, acreditava poder transformar as
instituies capitalistas em orgos socialistas,substituindo-as pelo Estado.Assim,
ao ateliers nacionais responsaveis da produo de bens, seriam abertos graas
aos creditos do Estado,o proprio Governo seria o organizador supremo da
produo.Desta forma,surgiu a idia de um socialismo governamental, que
seria construido atraves de um golpe de Estado e no de uma revoluo.

Em Louis-Blanc, a admirao pela capacidade administrativa dos banqueiros


no aparece mais como um socialismo de Estado,masa como um capitalismo de
Estado, tendo por misso,paradoxal, de funcionar sobre um modo socialista.

Todavia, em Saint-Simon no seria mais a industria a responsavel da explorao


ou da opresso,mas exclusivamente o habitus feudal ,transposto na
industria.Este habitus, metamorfoseado e retomado por Saint-Simon que se
manifestar no liberalismo economico.Saint-Simon previu e qualificou de forma
magistral a nova cavalaria de pilhagem assim como os ideologos neo-feudalistas
da classe dominante e as manifestaes de luxo do capitalismo do seculo XIX,e
mesmo do seculo XX.

O profeta da industria no fazia concesses ao feudalismo,mas o profeta da


industria coletiva centralista via na Idade Media,epoca de servido, a imagem
de uma Europa melhor.

No saint-simonismo se constitui um encontro dos mais ricos de consequencias,


dos mais paradoxais tambem, entre a reao e o socialismo,unidos em uma
mesma raiva da liberdade economica individual.e isto no levar apenas a
caricatura do socialismo feudal,o pernicioso paradoxo restou vivo at a atitude
de um Lassale frente a Bismark, at nas multiplas combinaes de prussianismo
e de socialismo, de capital de Estado e de socialismo.

Como Fourier, Saint-Simon dividia a historia em algumas fases: no caso, so


tres as fases; a primeira, uma fase teologica, o mundo criado pelos deusas;uma
fase metafisica,deduzida a partir das foras naturais abstratas ou ideias , e uma
terceira fase,chamada de positiva,a partir da analise dos fatos e de causas
imanentes.

Nesta perspectiva, a sociedade moderna a sociedade positiva,ela subtraida


mitologia religiosa esemi-religiosa das duas primeiras fases. A industria e a
ciencia substituiram a feudalidade e a Igreja;a materialidade substituiu a
metafisica religiosa.

O sistema industrial de Saint-Simon (1821).como sua ultima obra,O Novo


cristianismo(1825),visam uma estrutura rigorosamente hierarquizada das
funes industriais e uma centralizao que por fim liberdade de perturbao,
liberdade se manifestando sob a forma de anarquia.A autoridade intelectual
que detinha o clero na Idade media agora tarefa dos sabios e dos
pesquisadores;o Estado industrial organizado torna-se
irrevogavelmente,eternamente.. Igreja da inteligencia.

Estas so as idias que uma gerao posterior, resurgindo no ultimo periodo da


filosofia de Auguste Comte, e que alimentaram os sonhos fantasticos de
casamento entre um socialismo santo e um Vaticano profano.

A utopia de Saint-Simon consideravelmente mais proxima de Campanella e de


More e apresenta todas as vantagens mas tambm todos os perigos de um
pensamento coletivista em que a organizao centralizadora desprovida de
elementos democraticos e federativos,e que no serve pois para edificar na
solidariedade o rigor da propria organizao.

Enfim, Bloch faz o Balano: fraquezas e valor das utopias racionais.

Se bem que alguns utopistas como Fourier e Saint-Simon tenham estudadocertas


mediaes historicas etiveram intuies das tendencias existentes, so,apesar de
tudo,consideraes de ordem essencialmente privada e abstrata conduzindo
elocubrao de um Estado independente da Historia e do presente (desembaraado das
impurezas do presente) que predominam.Fourier, o nico dialetico da serie, ainda o
que mais procupado das tendencias reais;e ,portanto,nele tambm, trata-se mais de
decreto que de conhecimento, de UTOPIA ABSTRATA que de UTOPIA CONCRETA
(grifos nossos).

mais justo dizer que se a idia no vinha realidade, era porque a realidade da poca
no vinha idia. A industria no era ainda desenvolvida, o proletariado no estava
maduro, a nova sociedade era apenas perceptivel na velha.Sobre isto, Marx fez
consideraes na Miseria da Filosofia,(sem dvidas dirigida unicamente contra
Proudhon,mas valendo para todos os utopistas da velha gerao):

Isto no impede que todos estes sonhadores so de uma classe que ningum pode
negar. Incontestavelmente, tinham a vontade de transformao,e apesar de suas vises
abstratas,no foram unicamente contemplativos. oq eu diferencia os utopistas de seus
contemporaneos,os economistas politicos,mesmo os mais criticos.Fourier,justamente,
disse que os economistas (Sismondi e Ricardo) se contentavam de lanar luz sobre o
caos,ao passo que ele buscava um meio para sair do caos. Esta vontade de pratica no
teve ocasio de se concretizar.em razo da ausencia de contato com o proletariado,e
tambm pela insuficiencia de analise das tendencias objetivas existentes na sociedade da
epoca.

No volume I, falamos da corrente quente do marxsimo, da libertao de uma


objetivao inadequada. Se o marxismo no descobre seu humanismo dialetico
materialista em uma antecipao em emergencia no horizonte da Historia e que recolha
igualmente herana do passado,no poderemos jamis falar de alienao capitalista,
de deshumanizao.

A obra dos sonhadores sociais autenticos foi honesta e grande; assim que ela deve ser
compreendida e apreciada, com todas as fraquezas de suas abstraes e de seu
otimismo muito expeditivo,mas tambm com sua vontade urgente e infatigaevl de paz,
de liberdade e de po.

5= RUDOLF ROCKER ,em Idias Absolutistas no Socialismo (1946), concorda em


muitos aspectos com Bloch,sobretudo, na vontade de mudana.

Muitos daqueles chamados utopicos desempenharam um papel importante nas


conspiraes das sociedades secretas contra os Bourbons. Entre eles acham-se
precisamente os que , mais tarde, como representantes da nova doutrina,nada esperavam
das insurreies revolucionarias. Bazard, Leroux,Buchez,Cabet e muitos outros foram
os membros mais ativos da Carbonaria francesa. Alguns deles tinham estado filiados
sociedade secreta dos Amigos da Verdade. Buchez,que, depois da fracassada tentativa
da sublevao de 1821,fora detido e julgado,escapou morte graas a um s voto. Foi a
sua amizade com Saint-Simon que o levou a outros caminhos.O prprio Saint-
Simon,em sua juventude,tinha participado da sublevao nas colnias norte-americanas
contra a Inglaterra,e tinha combatido sob as ordens de Washington.

Portanto,dificilmente podia afirmar-se que as inclinaes revolucionarias foram


completamente alheias queles homens. O fato de que, depois de experimentar ume
sclarecimento interior por meio do socialismo, deixaram de confiar no xito dos
movimentos insurrecionais explica-se tendo-se em conta a nova direo de seu
pensamento,assim como pelas condies que prevaleciam em seu tempo. Tinham
reconhecido que as razes do mal social eramd emasiadamente profundas para que fosse
possvel elimina-las to-s mediante medidas violentas; ademais, no se podia
esperar,ento, apoio algum das massas esgotadas pelas longas guerras e suas
conseqncias.

Assim sucedeu que a educao das massas se converteu,para a amioria dos antigos
socialistas, em campo essencial de sua atividade.

Em outro ponto, Rocker encontra-se com as idias de Bloch:

Tambm a escola socialista de Esteban, Cabet, Louis Blanc, Contantin Pecquer e de


outros mais, est impregnada de pensamentos absolutistas. S em Fourier e seus
partidrios encontramos freqentemente idias liberais e tendncias conscientemente
federalistas.

Sobre Saint-Simon:

Mas os discipulos de Saint-Simon no souberam aproveitar as idias luminosas do


mestre, que Proudhon aolheu e desenvolveu,e se converteram no s em representantes
de um novo catolicismo, mas tambm de uma nova hierarquia , qual chamaram de
Igreja saint-simoniana.O fim a que aspiravam era uma teocracia social, na qual os
representantes da arte, da cincia e do trabnalho constituiriam a estrutura interna do
Estado.

6= Saint-Simon e Fourier
(por Pierre Naville )

A relao Saint-Simon-Marx, recebeu destaque nas obras de Pierre Naville (Le


Nouveau Leviathan, 1o tomo),em que analisa a gnese da sociologia do trabalho em
Marx e Engels; na obra de Pierre Ansart, (que buscou uma aproximao, a partir dos
estudos de Georges Gurvitch, entre Saint-Simon,Proudhon e Marx ), intitulada Marx et
lAnarchisme.
Vamos nos concentrar na viso de Pierre Naville.
Kautsky dizia que Sant-Simon teve uma influencia enorme sobre Marx. Atravs dele,
Marx compreendeu que no so a Lei nem o Estado que constroem a Sociedade;mas,ao
contrario, a sociedade relacionada com o processo econmico que cria a lei e o Estado.
No seu Anti-Duhring,Engels consagra pagina entusistica Saint-Simon: uma
genial viso,graas a qual h em seu pensamento os germens de todas as idias no
estritamente econmicas dos socialistas posteriores.Para Engels,Fourier era um mestre
da dialtica comparvel a Hegel; e, compara Saint-Simon a Hegel no domnio das
cincias naturais.
Podemos sublinhar que Saint-Simon em particular foi til a Marx no debate contra a
esquerda hegeliana e contra Stirner(...) se o papel de Saint-Simon na elaborao do
pensamento de Marx no foi muito analisado por ele mesmo, ele foi altamente
reconhecido.Podemos dizer,hoje,que no foi reconhecido em seu verdadeiro valor.A sua
maneira,com a desordem, o profetismo e o dogmatismo que lhe caracterizam,Saint-
Simon foi um Hegel do socialismo primitivo,sbio e metafsico , religionario mesmo,
e o regime futuro dos produtores e dos industriais que ele descreveu tem relaes com o
Estado hegeliano mas o Estado dos funcionrios da monarquia tornou-se para os
socialistas franceses a nacionalizao da industria graas desapario do Estado
poltico.
Na grandeza de Saint-Simon, o jovem Marx reconheceu e encontrou um antidoto
grandeza de Hegel,e antes de tudo,uma critica do Estado e de suas relaes com a
produo , o trabalho e a industria.Estas relaes,Hegel buscou no conhecimento dos
economistas ingleses,e lhes deu uma forma soberana e definitiva no quadro do Estado
burgus.Saint-Simon lhe deu um fin distinto: o trabalho organizado superar o prprio
Estado.Esta critica permitiu a Marx traar as relaes entre o Estado e a sociedade.
(...) O que Marx e Engels imediatamente admiraram em Saint-Simon,como em
Fourier,foi o carter no filosfico de seus projetos e de sua ao. Saint-Simon um
herdeiro dos enciclopedistas e no de Kant. Como todos os primeiros socialistas, Saint-
Simon acredita numa potencia formadora das circunstancias e da educao.A vida no
concebida , mas criada, forjada, produzida.A cincia social no pode ser
especulativa,mas ativa.A cincia ao instrumental e teoria.Fourier cr na cincia
tanto quanto Saint-Simon...Em Fourier, a cincia revelao,para saint-Simon um
progresso.Para ambos,ela tem um s nome: Newton.Em Fourier o Newton da
maa,em Saint-Simon o conselho de Newton,reunio de sbios capazes de dirigir o
novo mundo industrial.Mas,Newton sempre o smbolo da cincia pratica,e no da
teoria especulativa,contrariamente o que acreditavam os exegetas alemes do
verdadeiro socialismo,Karl Grun e os outros. A cincia deve ser ligada produo:
este axioma napolenico,Saint-Simon o fez seu. Toda a reforma social,para ele,gira em
torno da produo...Ele ops os interesses dos industriais aos dos parasitas e dos
ociosos.Sublinhou,como Fourier,que a atividade e a alegria devem ser reunidas em cada
homem e na sociedade,e no repartidas entre as classes.
(...)Os produtores,os industriais devem cessar de ser puramente passivos.Eles devem
substituir a direo dos parasitas pela administrao das coisas,que assegura o governo
dos homens.Do Estado gendarme deve se passar ao Estado gestionario,do regime
governamental ao regime administrativo, ou industrial-societario.Assim, poder se
aplicar o principio: de cada um segundo suas capacidades cada um segundo seu
trabalho..Assim,cessar a explorao do homem pelo homem,outra formula retomada
por Marx Saint-Simon.
() A oposio entre senhores e servos.entre governantes e governados,dominantes e
dominados oposio poltica- deve desaparecer em pr da administrao das
coisas,cujo principio a competncia tcnica e no a fora.
Para Saint-Simon, a classe industrial seria formada pelosa elementos produtivos da
nao opostos nobreza e ao clero,e a burguesia ociosa:
maons,carpinteiros,ferreiros,serralheiros,costureiros,fundidores, marceneiros. Definia
os artesos: todos os que se ocupam de produtos materiais,como:
cultivadores,fabricantes,comerciantes,banqueiros e todos os operrios que eles
empregam. Para este era o Partido do Trabalho,dos homens teis e produtivos.
Do mesmo modo,Fourier tinha a produo como a resultante do trabalho, do capital e
dos talentos.Para Saint-Simon: A classe industrial a classe fundamental da
sociedade,a classe que alimenta de toda a sociedade,aquela sem a qual nenhuma outra
poder sobreviver.
O povo,para Saint-Simon,estaria dividido em duas classes: a dos operrios ocupados
nos trabalhos do campo e a dos homens empregados pelos fabricantes e
negociantes.Para ele, a classe dos proletrios equivale aos no-proprietariosTodos os
trabalhadores devem estar unidos em um grande partido, que englobara os sbios e os
artistas de uma parte,os cultivadores,os fabricantes e os negociantes de outra,que
formam o verdadeiro corpo da nao.Este partido se ope a todos os que vivem do
trabalho dos outros,nobres ou burgueses. Para Saint-Simon, os burgueses no so os
capitalistas,estes so os proprietrios ociosos,os que vivem de rendas,os soldados e os
legisladores,que vivem as custas dos industriais. O parasitismo est no Corte e na
burocracia do estado.
Desta forma, Naville assinala algumas teses de Catecismo dos Industriais, de A
Organizao Social e de Sistema Industrial,obras de Saint-Simon.
Marx aprende com o esquema de classes sociais de Saint-Simon e escapa as
determinaes especulativas da sociedade civil na viso de Hegel. Em Paris e
Bruxelas,Marx se familiarisou com os escritos de Saint-Simon,de Fourier,de Cabet,de
Leroux,e de outros, o que podemos ver em A Ideologia Alem. Marx lembra que,
Saint-Simon tentou sistematizar a estrutura de classes da sociedade inteira,da
humanidade,ao menos a dos paises industriais.As trs classes fundamentais so:
1. os sbios e os artistas e todas as pessoas de profisso liberal;
2. os adversrios de toda inovao,isto ,os proprietrios,que no esteja ligados
primeira classe;
3. o excedente da humanidade que se junta a palavra: Igualdade.
Estas trs classes formam o mundo. A esta diviso esboada em 1802,Saint-Simon
substitui em 1819 por uma outra diviso tripartite: as classes feudais,intermediarias e
industriais,e Marx sublinha que , em Saint-Simon, fazem parte dos industriais,alm dos
operrios,igualmente os fabricantes,os negociantes,enfim,todos os capitalistas
industriais, quem ele se dirige de preferncia.
Os discpulos imdediatos de Saint-Simon,sobretudo Bazard,alm de sistematizarem e
desenvolveram suas idias sobre as classes sociais,sobre seus antagonismos e,um
verdadeiro esboo da historia da luta de classes que ser amplamente transposta por
Marx no Manifesto Comunista.Marx declara que o periodo de Julho o periodo que
coincide com o desenvolvimento terico mais importante do Saint-Simonismo,pois seus
discpulos passam da utopia e do sectarismo critica do estado de coisas existente.
Para Marx,conhecer a obra de Saint-Simon implica no somente conhecer as suas
obras,mas os jornais e as conferencias de seus discpulos,notadamente l Globe.
Segundo P.Naville ,Marx reconhece na Escola Saint-simoniana um partido ativo,que
age diretamente sobre a opinio publica.No o partido direto dos trabalhadores,como o
Cartismo na Inglaterra.Seus discpulos levaram adiante a analise sobre os modos
histricos de produo e sobre o trabalho.Neste aspecto, estavam a frente sobre os
socialistas e mesmo em relao aos grupos operrios.defenderam a abolio da
propriedade individual e a transformao do Estado.
A propriedade no seria mais privada,mas social. Para Naville, A historia da luta de
classes que Marx encontrou na Exposio da Doutrina, to luminosa que lhe
inspirou diretamente para o Manifesto Comunista. Claro que, os Saint-simonianos,nem
o jovem Marx, nesta poca,no podiam derivar os antagonismos sociais de uma mesma
raiz: a forma sob a qual a mais-valia era extrada dos produtores diretos (..)Apenas com
a lenta assimilao dos trabalhos da economia poltica inglesa,Marx concentrou sua
analise no processo de trabalho,centrando na questo fundamental: como a mais-valia
do trabalho produzida e apropriada ?.
Nem Fourier,nem mesmo Saint-Simon,ou Hegel em outro sentido, deram respostas
satisfatrias para esta ultima questo(...) Ao menos, Fourier,como Saint-Simon e todos
os utopistas, lanaram o esprito de investigao cientifica no estudo do modo de
produo da sociedade nova(...)Fixaram um ideal que Marx nunca renegou.Bem mais
tarde,em 1871(ano da Comuna de Paris),Marx glorifica mais uma vez os sectarios que
esclareceram os caminhos em sua juventude :
Os fundadores de seitas utpicas,anunciando por suas criticas da sociedade de seu
tempo,o objetivo do movimento social,a abolio do assalariado e de todas as condies
econmicas de dominao de classe, no encontraram na sociedade mesma as condies
materiais de sua transformao,nem na classe operaria o poder organizado e a
conscincia do movimento.Pensavam de eliminar as condies histricas do movimento
atravs de projees e de planos quimricos de uma nova sociedade;propagar as idias
lhes parecia ser o verdadeiro meio de salvao.
A partir do momento em que o movimento social da classe operaria torna-se
realidade,as quimerias utpicas desapareceram no porque a classe operaria tenha
abandonado o objetivo indicado por estes utopistas, mas porque tinha descoberto os
meios reais de torna-lo realidade. No lugar das utopias apareceu uma percepo real das
condies histricas do movimento e uma organizao militar cada vez mais forte da
classe operaria.Mas,os dois fins ltimos do movimento que tinham proclamado os
utopistas so os que proclamam a revoluo parisiense e a Internacional.S os meios
diferem,e as condies reais do movimento no se perdem mais nas nuvens das fabulas
utpicas.
Marx-Engels precisariam estudar a situao da classe trabalhadora,sobretudo na
Inglaterra,o que ocorrer com o estudo engelsiano intitulado A situao da classe
operaria na Inglaterra,de 1845.Com esta obra, se precisar a concepo de trabalho
que servir de ncleo ao materialismo histrico(Naville).
Em 1844,Marx abandona o estudo sobre o Estado,a partir da obra de Hegel,e se dedica
diretamente ao problema central da economia,do trabalho.Pierre Naville,em um capitulo
intitulado Trabalho,propriedade e comunismo, assinala o caminho feito por Marx:
A oposio dialtica dos senhores e escravos descrita por Hegel forneceu uma
referencia filosfica; as analises de Saint-Simon e de Fourier forneceram uma
outra,dogmatica, verdade,mas que ia direto ao sujeito,reinventando o regime de
trabalho sem se preocupar com a lgica filosfica.De outra parte,os fatos esto l; isto ,
as reivindicaes operarias se apresentam elas mesmas todos os dias;os escritos dos
socialistas,operrios ou escritores profissionais se multiplicam, a organizao do
trabalho uma palavra de ordem publica, a industria progride sem parar e as
locomotivas gozam do prestigio que em nossos dias tm os avies e a energia
atmica.O empirismo da sociedade civil bate porta.
O quarto Estado j fez em 1831,em Lyon,uma entrada decisiva na cena social e
poltica ( Os CANUTS ).As enquetes sobre o pauperismo,sobre a situao das classes
operarias,sobre a legislao do trabalho,a determinao de mais em mais precisa de
uma esfera do direito chamada direito do trabalho,trazem uma documentao muito
precisa e detalhada. Tudo isto empurra imperiosamente Marx e Engels a melhor definir
sua prpria concepo do trabalho e de toda a economia poltica(...) E, o fruto deste
primeiro contato serio com a economia poltica que nos deu os textos conhecidos sob o
nome de Manuscritos Econmico-Filosoficos de 1844.

Para Naville, Babeuf, Saint-Simon e Fourier estavam apegados a idia de que o


Homem um ser social. Dezamy,Gay,Owen tambm defendiam esta idia,mas em
uma poca em que o desenvolvimento econmico tinha transformado a sociedade,em
que o materialismo critico do proletariado,fundado em novas relaes de
trabalho,superou o materialismo triunfante da burguesia.
Na obra em que Marx faz uma analise social de Os mistrios de Paris(1844),obra
literria de Eugene Sue, Encontra-se uma serie de temas, j amplamente tratados pelos
socialistas franceses e em particular Fourier ( no qual se inspira A sagrada famlia de
Marx e Engels), que apresentam a perverso e a destruio dos sentimentos naturais
pela sociedade burguesa. E Feurbach alimentado por Fourier, Flora Tristan e muitos
outros, at Georges Sand e o proprio Eugene Sue .
Em A ideologia Alem, Engels critica duramente os defensores do O verdadeiro
socialismo (vrai socialisme),sobretudo, o desprezo filosofico e pequeno-burgues que
tinham pelos socialistas franceses: Estas pessoas no compreendem o significado real
dos primeiros sistemas, os de Cabet,de Owen,de Fourier;eles no vm que nasceram no
inicio do movimento comunista e propagavam seus romances populares que respondiam
absolutamente conscincia no ainda desenvolvida dos proletrios que se punham em
movimento.... Com o desenvolvimento do partido real,estes sistemas perderam sua
importncia.
Em suas origens, encontramos o desenvolvimento anterior da nao, a formao
histroica das relaes de classe com suas conseqncias polticas, morais,filosficas e
outras.Dizer que estes sistemas so dogmatico-ditatoriais no rima com nada.temos
que ver a qual etapa do movimento real eles correspondem, e em seguida, estudar
diretamente este movimento real e sua organizao pratica (partido),e no se opor,como
fazem os verdadeiros socialistas,uma ideologia filosfico-moral que ela tambm no
pode deixar de expressar alguma coisa: a pequena burguesia alem, que se cr eterna. Se
o comunismo francs tem uma aparncia ditatorial, sistemtica, porque ele reflete a
oposio inicial a uma verdadeira pratica, uma sociedade burguesa ditatorial mas
anrquica.
Naville remarca as vises de Marx e Engels sobre a teoria de Max Stirner: Ao passo
que a doutrina societaria de Fourier, o soicialismo de Saint-Simon,e mesmo as
associaes de Proudhon tm por base uma critica profunda da sociedade burguesa
(propriedade privada,concorrncia,etc, e,somam-se assim, as pesquisas da economia
poltica, a aasociao dos egostas de Stirner uma simples mascarada filosfica em
que o movimento operrio nada tem a ganhar.Engels critica a idia de aasociao de
Stirner: mais uma vez uma m parodia de Fourier,e de seus falanterios e grupos de
trabalho e de jogo.Mas,em Fourier,a constituio em grupos voluntrios presupe uma
transformao radical da sociedade burguesa e uma critica sem piedade de suas formas
de associao reais,ao passo que em Stirner , trata-se de uma reconstituio pequeno-
burguesa da sociedade atual,com suas categorias econmicas e seus tipos prprios.
Em relao ao mtodo dialtico, Naville afirma que A idia de um mtodo dialtico
estava no ar. Ela existia implicitamente em Fourier, sobre quem Engels escreveu com
nfase que ele manejava a dialtica to magistralmente como seu contemporneo Hegel.
Ela existia tambm em Kant e mesmo nos Enciclopedistas,como Diderot.Mas ela estava
menos visvel em Saint-Simon ou em Comte,em que ela dominada pela idia de
srie,de evoluo.Portanto, a noo de progresso,de evoluo,nascida nas cincias
biolgicas e sociais no curso do sculo XVIII incontestavelmente a matriz da dialtica
moderna.Foi a que Vico , hegel,goethe a buscaram.A historia se introduzia na cincia,
apelando as sries distribudas por ordem de contrastes (segundo o termo de Fourier) ou
contradies (segundo Hegel),Proudhon participava a uma corrente geral...no avanou
nada de muito original ao falar de lei serial.

7= Os utpicos no crivo da Revoluo Sovitica de 1917


( por Eugen Preobrazhenski )

Uma viso muito interessante sobre o socialismo topico foi traada pelo
revolucionrio e terico bolchevique Eugen PREOBRAZHENSKI. O elemento
especifico da obra deste revolucionrio russo, que buscou nos utpicos elementos que
pudessem ser teis para construo do socialismo na Rssia aps a Revoluo de
1917.Neste sentido, nos traz uma viso diferenciada de tantas outras sobre este tema.
Um enfoque terico da primeira situao histrica em que a construo do socialismo
abandonou o campo da especulao para passar ao das preocupaes polticas
cotidianas. Ao analisar as idias dos utpicos, Preobrazhenski separa o que h de
antecipao do socialismo e de fantasia literria e humanitria.Assim,esta sua
contribuio especifica ao estudo sobre os socialistas utpicos.
Preobrazhenski previu escrever em dois tomos seu estudo terico do sistema econmico
sovitico.O primeiro, constava de dois volumes: um terico , A Nova Economia , e
outro histrico,anunciado pelo autor no prefacio de A Nova Economia(1926),como
um breve passeio pelo horizonte das idias socialistas e comunistas sobre o
socialismo.
Este segundo volume de A Nova Economia foi publicado sob o titulo de Por uma
Alternativa Socialista (1926).
Preobrazhenski tambm publicou um obra que tem relaes com a consciencia
utpica: Da NEP ao Socialismo, em que imagina um professor dando aulas no ano
2000 ,e fazendo referencias ao processo ocorrido entre 1917 e 2000.
Na segunda edio de A Nova Economia ,final de 1926, trazia uma advertncia da
Academia Comunista ,esclarecendo que a obra trazia pontos de vista que o Comit de
edio no compartia,e que serviam de fundamento terico a um grupo de camaradas
cuja posio difere do PCUS.
Em 1927, E.P. foi expulso do Partido junto com os demais dirigentes da oposio de
esquerda.Com o inicio da coletivizao forada, E.P. estava junto com cerca de 400
dirigentes deportados. Apesar de tentar voltar ao Partido e mesmo aceitar algumas
imposies, E.P. foi preso e executado em 1938. At o final do stalinismo, sua obra foi
condena ao silencio.Foi reabilitado aps o XX Congresso do PCUS,em 1956,mas sua
obra no foi reeditada.
E.P inicia sua obra com um conjunto de perguntas :
- Como ser , no concreto, a sociedade socialista ?
- Como se levar realmente pratica a supresso da regulao espontnea do mercado e
sua substituio pela planificao socialista ?
- Qual ser a estrutura dos rgos criados pelos trabalhadores para dirigir a economia ?
- Qual ser o sistema de distribuio de bens na sociedade socialista ?
- Em que relao se situar o setor socialista da economia respeito s formas pr-
revolucionarias, e como se produzir a extino destas ltimas ?
- Em que se diferenciar o homem surgido na poca da produo de mercadorias do
trabalhador da sociedade socialista ?
- Ter a economia socialista uma base tcnica distinta da capitalista, e qual ser esta ?
E.P. aborda os seguintes pensadores e movimentos:
1)Os grandes utpicos : Saint-Simon , Fourier,Cabet,Robert Owen
2)Os comunistas : August Blanqui, Marx e Engels.
3) O sindicalismo francs
4) Marx e Lnin.
Vejamos passo a passo as observaes de E.Preobrazenky sobre os grandes utpicos:
1) Saint-Simon

S com extrema dificuldade pode incluir-se Saint-Simon entre os socialistas.Melhor


dito: consider-lo socialista seria um equivoco. O primeiro ponto de destaque nele, a
necessidade de uma economia planificada. Precisamente porque tinha uma viso to
clara desta questo central do socialismo, teve que chegar ( e chegou a abordar e a
resolver de forma sumamente interessante ) a uma serie de problemas isolados do
socialismo:
O fim da luta de classes e, em relao com isto,as vantagens da sociedade sem classes, o
consumo improdutivo, o sistema educativo, o papel da cincia na economia planificada
e outros.
As opinies de Saint-Simon sobre a organizao da economia mostram a seguinte base :
a produo a atividade principal dos seres humanos,dela depende a existncia de toda
a sociedade. A classe fundamental e produtiva,sem duvidas, so tanto os seres que
trabalham fisicamente como seus organizadores e dirigentes,isto , os manufatureiros
(industriais),os homnes de cincia e os tcnicos.
Na socieda moderna capitalista, Saint-Simon manifesta que a classe dominante, a que
governa e manda, constituda por uma camarilha dirigente parasitaria e feudal-
aristocratica. Esta classe deve ser tirada do poder e em seu lugar devem governar os
industriais,utilizando o aparato do poder monrquico. S sob o domnio desta
classe,no unicamente na produo, mas tambm no Estado, possvel organizar um
novo tipo de economia: o principio da planificao, o fim da luta de classes , o fim do
consumo improdutivo, a aplicao intensa das cincias produo e a organizao
cientifica da totalidade da sociedade, um novo sistema educatvo e outras questes
similares.
Para saint-Simon, a Frana sendo uma nao industrial estava sob um governo feudal.
As pessoas que trabalham fisicamente formam o fundamento da pirmide de toda
sociedade moderna,e nesta camada,esto os organizadores da produo, os sbios e os
artistas,mas que a camarilha dirigente no poder e na burocracia so os parasitas do
organismo produtivo. Assim, o poder deve passar para estes dirigentes do moderno
sistema industrial,aos mais importantes agricultores,
fabricantes,comerciantes,banqueiros.Eles devem formar um Conselho Industrial, que
deve manejar as finanas e dirigir todo o sistema seria um tipo de governo dos
conselhos !
Saint-Simon apesar de suas simpatias para com as classes trabalhadoras e os pobres da
sociedade, considerado como um socialista baseado em um equivoco. Era muito mais
um idelogo da burguesia industrial mais progressista de seu tempo, que a nobreza
mantinha distanciada do poder no perodo da Restaurao;e ,sobretudo, foi portavoz da
inteligncia tcnica e industrial.
Apesar disto suas idias so interessantes para a historia das concepes socialistas, pois
muitas superam o capitalismo. Tampouco, Walther Rathenau foi mais que um
representante das aspiraes burguesas para superar a anarquia na economia
capitalista,uma das pessoas mais inteligentes do mundo burgus, cujas utopias sobre a
organizao centralizada da produo e a distribuio capitalistas no so mais que um
melanclico suspiro de agonia do organismo doente que a sociedade burguesa.
Saint-Simon chamava de trabalho produtivo o que est orientado incidncia do ser
humano sobre as coisas.Ao contrario, a ao do homem sobre a natureza representa um
duplo desperdcio de foras,e somente pode ser til quando por este caminho pode agir
diretamente sobre a natureza.
Os profundos pensamentos de Saint-Simon foram postos a prova pela experincia dos
primeiros anos de construo socialista na URSS. A origem de suas idias sobre a
economia planificada levou Saint-Simon lgica e inevitavelmente uma concepo do
papel do Estado,que est em contradio flagrante com as posies do manchesterismo
na Inglaterra e de todos os fisiocratas na Frana,isto , com a concepo tipicamente
burguesa do Estado no perodo do incipiente desenvolvimento do modo de produo
capitalista.
Em uma sociedade em que o objetivo do sistema poltico no est radicado na defesa
dos interesses de uma minoria,mas em uma colaborao para obter o bemestar da
maioria dos trabalhadores , as funes estatais de opresso e administrao devem
reduzir-se.
No que diz respeito questo do sistema de distribuio mais adequado e dos incentivos
ao trabalho, Saint-Simon defendia o ponto de vista de que o principio da maximizao
do lucro til para sociedade,por criar uma conexo entre o interesse pessoal e o social.
Considera o lucro uma funo da produo; quando se torna um obstculo
produo,deve ser extinto. Apenas uma burguesia muito jovem,plena de fora e
confiana em seu prprio futuro,ou sua inteligentsia tcnica , poderia ter o luxo desta
defesa.
( Em defesa da NEP foram utilizados entre ns freqentemente argumenos similares aos
de Saint-Simon). Mas, Saint-Simon defendia com muita seriedade a questo dos
incentivos ao trabalho e do nexo entre interesse individual e interesse social.Esta
questo tem uma importncia realmente enorme para o socialismo.
A questo dos incentivos ao trabalho em uma economia socialista,isto ,planificada,pe-
se de forma totalmente diferente da produo burguesa sem eu perodo de
desenvolvimento.Deveremos reforar ,posteriormente, o problema na sociedade
socialista,colocado por Saint-Simon.Tanto a forma de colocar a questo quanto a
resposta a mesma, so totalmente distintas para sociedade socialista.
Queremos observar apenas que, a proposta de Saint-Simon para impor a reorganizao
do sistema existente ( ou seja, mediante a entrega de uma petio ao rei, assinda por 25
milhes de franceses) se diferencia muito pouco da utopia de Kautsky e de outros
socialdemocratas,que sonhavam com a tomada do poder pelo proletariado
apresentando uma petio em forma de listas de candidatos. Tanto em um caso como no
outro, se utiliza o presuposto de que um sistema substitudo por outro sem revoluo.

2. Fourier.

Para o historiador que observa as idias concretas dos socialistas sobre o socialismo,
Fourier muito mais interessante que Saint-Simon. Na obra de Fourier, encontramos
coisas desnescessarias que fazem com que muitas muitas passagens paream pouco
serias por serem exemplo de doutrinarismo utpico e de pedanteria. Juntos com
passagens geniais, cheias de profundidade e de materialismo histrico ,encontramos
teorias e esquemas nati-mortos. Por isto, s trataremos suas questes relativas ao
socialismo,aquelas que conservam interesse atual.
- A organizao do trabalho.
Fourier via as insuficincias fundamentais da sociedade de sua poca na inadequao
da organizao do trabalho, no carter inadequado da distribuio e na incapacidade de
utilizar em proveito da sociedade todos os aspectos positivos e negativos do carter
humano.
Para Fourier, a insuficincia bsica na organizao da produo era a parcealizao do
trabalho, a discordncia absoluta entre os vrios trabalhos.A que Fourier atribua esta
insuficincia ?
O trabalho assalariado servido indireta. Carrega atrs de si a ausncia de toda
economia mecnica, a fraude,o latrocnio e a desconfiana geral,as intermitncias da
industria por falta de meios,o conflito de empresas contrarias,a contrariedade do
interesse individual e o coletivo, a ausncia de unidade nos planos e na execuo.
O sistema de distribuio permite a existencia de grande quantidade de parasitas,entre
os quais Fourier inclua as mulheres,as crianas e o pessoal de servio ( parasitas
domsticos).Tambm, inclua o exercito e a armada,os cobradores de impostos,os
fabricantes,os comerciantes,os agentes de transportes,os agentes da criao negativa
(parasitas sociais).
Mas, o que Fourier contrape sociedade contempornea no campo da produo e da
distribuio ?
Fourier propunha uma associao sobre a base da ampliao da produo, de sua
mecanizao,da diviso do trabalho mais conveniente possvel, e de sua organizao
segundo um plano determinado.Como sabido, Fourier considerava como forma
concreta de organizao mais conveniente o Flansterio, a Comuna autosuficiente,
autrquica, que se compunha de uma mdia de 300 familias,formada aproximadamente
por 1.500-1.6000 pessoas,entre adultos e crianas.
O Falansterio no deveria compor-se apenas de pessoas de diversos ofcios, tanto do
ramo industrial como agrcola,mas tambm de distinta posio social.O Falansterio
devia unificar o Trabalho, o Capital e o Talento.
Vamos nos deter no que mais no interessa em sua teoria.A idia do falsnterio constitui
um dos exemplos mais patentes de quanta falta de rigor se revela na conscincia
,inclusive, dos idelogos mais geniais e progressistas de uma classe progressista,quando
tenta libertar-se das cadeias que lhe impem as condies de sua existncia, e quando
estas condies de sua existncia no empurram para frente a idia.
O Falansterio de Fourier no a industria pesada,com uma ampla diviso do
trabalho,no a empresa que pertence a uma grande cadeia de grandes empresas
semelhantes,que formam um complexo unificado de economia socialista em um
determinado territrio.No. O Falansterio de Fourier a combinao do tipo
manufatureiro da industria e da pequena agricultura intensiva em uma comuna
autosuficiente.
o desejo de suntrair-se em teoria as condies de produo imperantes na
Frana,composta em 5/6 partes de artesos e em 1 parte de manufatura.Mas,com estes
meios artesanais,Fourier no podia avanar at a concepo da economia mundial como
organismo unificado ( e,realmente em seu tempo,no existia uma unidade deste tipo)
nem sequer inclusive at a idia da economia francesa como sistema internamente
relacionado,o qual sem duvidas j existia.
Neste ponto, Fourier d um passo atrs em comparao com Saint-Simon.Portanto, em
Fourier no encontramos nada nem tampouco devemos buscar algo que responda
questo da nova base tcnica do socialismo, questo da organizao de um complexo
econmico unificado,dirigido de forma socialista,e menos ainda questo da
organizao socialista da economia mundial.Seu socialismo era em todos estes aspectos
um socialismo artesanal.
Nas teorias de Fourier conservam sua importncia (e no s histrica) os seguintes
problemas:
1. a luta contra o consumo improdutivo;
2. em especial, a luta contra os imensos gastos originados pelo sistema de
circulao, inevitveis em uma economia mercantil;
3. a liquidao da contradio entre a cidade e o campo, mediante a unificao do
trabalho industrial e agricola;
4. a organizao da alimentao coletiva e a liquidao da cozinha individual;
5. a formao politcnica e a revonverso do trabalhador de um trabalho a outro;
6. a combinao da educao infantil com o trabalho;
7. a aplicao de estmulos ao trabalho e atividade socialmente til, que no
sistema capitalista no puderam aplicar-se ou se viram estrangulados.
No que diz respeito a luta contra o consumo improdutivo,em particular contra os
gastos do apararto de distribuio comercial, no fundo Fourier via a soluo no
trabalho associado,segundo o modelo do falansterio.Porque,para Fourier,uma
comuna seria autosuficiente,o falansterio tornaria suprflua a mediao do comercio
com a envergadura anterior e o sistema de intercambio capitalista em sua totalidade,
se bem que mantinha o intercambio comercial entre os falansterios.A soluo de
Fourier a esta questo consistia na nacionalizao da economia, o que era um
principio correto desde o ponto de vista so socialismo,se bem que sua economia
nacionalizada no era socialista nos entido atual.O problema permanece de p.
(...). Na unificao da industria e da agricultura,Fourier intui uma tendncia ao
socialismo. Em seu falansterio deveriam participar 1/8 de capitalistas ,sbios e
artistas,enquanto os restantes 7/8 de membros deveriam ser trabalhadores industriais
ou agricultores.
As oficinas de produo,as instituies sociais e a sala de estar se acham em ume
dificio construdo especialmente para isto. Os campos de cultivo, as hortas de
verduras e os jardins de flores rodeiam este centro industrial e ao mesmo tempo
agrcola, que no nem cidade nem campo no sentido contemporneo. Os
trabalhadores do falansterio vendem uma parte de sua produo a outros falansterios
e lhes compram o que no podem produzir em absoluto ou em medida suficiente
devido s condies naturais locais ou outras razes.
Mesmo que as necessidades dos trabalhadores da associao se satisfaziam em sua
maior parte no seio do falsnterio, Fourier tinha uma clara viso de todas as
vantagens que traria uma unificao da industria e da agricultura,no apenas no
sentido da imensa economizao no transporte de produtos, na armazenagem,etc,
mas tambm na relaio com a higiene e a assistncia sanitria.(...)
Fourier defende com muita convico as vantagens de uma cozinha e uma
alimentao coletivas frente cozinha individual e domestica, questo que mantm
inteiramente sua atualidade no perodo da construo socialista.Est convencido de
que uma organizao deste tipo no s muito mais til desde o ponto de vista
scio-economico isto est claro para todos-, seno que lhe parece muito mais
atrativa para os membros da famlia,os quais antes se reuniam unicamente ao redor
de sua mesa.
Fourier atribua grande importncia questo da organizao do trabalho tanto em
sua diversidade como em suas reconverses (rodzios) de um oficio a
outro.Defendia que o melhor meio para aumentar a intensidade e o atrativo do
trabalho era a troca de tipo de trabalho dentro da mesma jornada.Fourier
considerava ademais que para conseguir reforar o amor ao trabalho e incrementar
seu poder de atrao eram indispensveis as seguintes condies:
1. Que cada trabalhador seja associado, retribudo com o dividendo e no com o
salrio.
2. Que todo homem , mulher ou criana seja retribudo em proporo s trs
faculdades: capital , trabalho e talento.
3. Que as sees industriais sejam trocadas (rodzio) aproximadamente 8 vezes
vezes por dia,pois o entusiasmo no pode manter-se maid e 1 hora e meia ou 2 horas
no exerccio de uma funo agrcola ou manufatureira.
4. Que sejam exercidas em companhia de amigos espontaneamente reunidos,
intrigados e estimulados por ativssimas rivalidades.
5.que as oficinas e cultivos presenteim ao operrio os atrativos da elegncia e da
limpeza.
6.que a diviso do trabalho seja levada ao grau supremo, a fim de proporcionar a
cada sexo e a cada idade as funes mais adequadas.
7.que nesta distribuio, cada um, mulher ou criana,goze plenamente do direito ao
trabalho ou direito de intervir em cada ramo de trabalho que lhe convenha
escolher,sempre que tenha aptides e probidade.Enfim, que nesta nova ordem goze
o povo de uma garantia de bemestar, de um mnimo suficiente para o presente e para
o futuro e que esta garantia o livre de toda inquietude para si e para os seus.
Deixando de lado o fantstico sistema de retribuio do ponto 2, podemos
comprovar que os pontos restantes so ainda do mximo interesse para uma
sociedade socialista em construo. obvio, que a mudana de um trabalho para
outro a cada hora e meia inconcebvel no nvel da tcnica atual e da organizao
cientifica do trabalho,surgida com esta tcnica.Neste aspecto, a fantasia de Fourier
estava absolutamente dominada pelo tipo de produo semi-artesanal de sua
poca.Mas, a linha fundamental das propostas de Fourier totalmente
correta.Necessariamente, deve dirigir-se formao politcnica e a facilitar ao
trabalhador pelo menos a reconverso de um oficio a outro.
A economia socialista (...) tem que se servir como reserva da fora de trabalho a
capacidade do trabalhador para executar diversos tipos de trabalho,sua qualificao
polivalente.Os outros pontos de vista de Fourier mantm sua importncia:
A idia de um ambiente de trabalho agradvel e o projeto de combinar a variedade
de trabalho para o trabalhador individual com a diviso do trabalho mais
conseqente para a associao.
Fourier teve o mrito de ter posto corretamente a questo da educao social e do
trabalho infantil (desde o ponto de vista socialista e pedaggico).A separao entre
educao e trabalho caracterstica do sistema educativo da burguesia e dos
latifundirios.Muito ao contraio, o sistema educativo socialista deve ter por base a
unificao da educao e trabalho, a transio do jogo infantil ao trabalho, a
eliminao do abismo existente entre o livro de contos e o banco de trabalho,e antes
de tudo,na anulao do direito dos pais sobre a educao de seus prprios filhos.
A questo dos incentivos ao trabalho tem um papel muito importante em todo o
sistema das concepes de Fourier. Sua associao presupe dada sua constituio
(associao voluntria), e devido a seu sistema de direo (um aeropago), cujas
decises ,no obstante,no serem vinculantes,posto que deve atuar exclusivamente
em base autoridade de seu conselho-,no somente um nvel muito alto de
conscincia e instinto social, mas tambm um interesse pessoal de cada individuo no
trabalho,inclusive justamente naquele trabalho que til para todos.
Desta forma, resulta compreensvel porque jogam um papel to imenso os
incentivos internos ao trabalho,em lugar da obrigao externa. Fourier enumera
estes estmulos:
Eleio voluntria do trabalho;
Ambiente de trabalho atrativo;
Um dividendo acima do mnimo de existncia;
Competncia individual ( entre o grupo de trabalho);
Competncia coletiva (os falansterios entre si);
Reconhecimento social;
Desenvolvimento e utilizao de todas as vocaes humanas, de todas suas
singularidades em beneficio do trabalho.
Muito importante tambm o novo ngulo desde o qual Fourier considera as
paixes e os vcios humanos.Como resultado de sua analise encontrou que muito
dos chamados vcios se transformam ,com uma organizao adequada da sociedade,
em estmulos ao trabalho e atividades teis para sociedade. Vejamos as opinies
concretas de Fourier a respeito.Diziamos que apenas pelo fato de apontar estas
questes muito importante para o socialismo.(...).Todas as questes so problemas
que a classe operaria junto com sua vanguarda dirigente tero que refletir muitas
vezes aps a vitria.
Finalmente, quero mencionar ainda um aspecto do pensamento de Fourier que o
coloca muitas milhas adiante dos socialistas da II internacional,que entendiam por
humanidade apenas a parte civilizada da humanidade, por classe operaria apenas
a classe operaria da Europa e da Amrica, por socialismo apenas o produto do
aacordo parlamentar pacifico entre a aristocracia operaria e a classe capitalista,um
acordo fechado nas costas das massas operarias atormentadas nas colnias.
Sobre estes povos, que no pertencem famlia dos povos civilizados e que, ao
mesmo tempo, representam maioria da humanidade, escreveu Fourier:
Autores de cincias inexatas que pretendeis trabalhar em bem do genero humano,
acreditais que seiscentos milhes de brbaros e selvagens no formam parte dessa
humanidade ? Sem duvidas, sofrem. Ah! Que tens feito por eles ? Nada. Vossos
sistemas s so aplicveis civilizao....
Sem duvida, as simpatias de Fourier pelos povos no civilizados coincidiam em sua
maior parte com as de Rosseau.Fourier,por exemplo,considerava como uma
vantagem dos povos no civilizados o fato de conservar durante milhares de anos as
bases de sua estrutura social, enquanto que nos povos civilizados nascem toda serie
de inovaes sem chegar a alcanar jamais seu pleno florescimento.Seu protesto
contra a civilizao burguesa-latifundiaria no deixava de ter um certo gosto
reacionrio.(...)
Na historia acontece com freqncia que uma teoria social qualquer ou uma idia
surgida em, algum lugar como reao, como protesto contra um sistema econmico
dado e seu desenvolvimento progressivo, tome em outra etapa histrica,em que tal
sistema se transforma em obstculo para o desenvolvimento, novo alento vital.
Comea a golpear o sistema existente, se me permitem expressa-lo assim,
historicamente por trs.Introduze-se ento como um elo individual na cadeia das
idias de uma nova critica revolucionaria, dirigida contra aquele sistema.

2) Cabet
A utopia de Cabet ,Viagem por Icaria, tem interesse para ns porque o autor nos
oferece uma imagem completa do modo de produo comunista, tal e qual o imaginava
um socialista francs dos anos 1840.
Comparado com Fourier, Cabet d um grande passo para frente,principalmente porque
suas concepes da sociedade futura no apenas se formaram sob a impresso da
economia francesa daquela poca,em que a grande produo capitalista ainda mostrava
um desenvolvimento relativamente dbil,mas tambm sob a impresso da industria
mecanizada da Inglaterra, que Cabet conheceu durante sua estadia nesse
pais.Compreende-se que o comunismo de Cabet seja extremamente primitivo, como o
era precisamente a base tcnica deste comunismo.(...) Cabet no oferece aqui a
imagem do que existir na sociedade comunista,mas aquilo que carecia a Frana dos
anos 40.(...)
Vejamos as passagens mais interessantes para ns da utopia de cabet.Em sua descrio
dos fatos fundamentais da estrutura social na Iaria comunista, Cabet escreve:
Assim como ns (os icarianos) no formamos mais que uma s sociedade, um
povo,uma s famlia,do mesmo modo nosso territrio,com suas minas subterrneas e
suas construes superiores,no forma mais que um Domnio, que nosso domnio
social.
Todos os bens moveis dos associados, em unio com todos os produtos da terra e da
industria,formam um s Capital Social.(mais adinate veremos que Cabet introduz aqui
sem inteno um conceito do qual no podero prescindir nossos economistas ao
proceder ao analise do capitalismo de Estado.Se bem este conceito no necessrio em
relao com a sociedade comunista, ser no obstante muito difcil substitui-lo por outro
em uma economia de transio.).Este domnio (domaine) e este capital sociais
pertencem indivisivelmente ao povo, que os cultiva e os explora em comum, que os
administra por si mesmo ou por seus mandatrios, e que participa igualmente de todos
os produtos.
Ao considerar sociedade futura como um nico coletivo de produo, como uma nica
grande comuna com uma populkao de muitos milhes, e ao construir,como veremos
adiante,tambm um sistema de distribuio correspondente, Cabet d um imenso passo
a frente , em comparao com os falansterios de Fourier,que comerciam entre eles e so
autnomos na produo;tambm, descarta as exigncias do pequeno capital de Fourier
que pretendia participar na produo e na distribuio sobre uma base privada.
A industria de Cabet uma mescla de fabrica inglesa e da manufatura francesa dos anos
40; (...).Porm, no que respeita as fontes de energia do movimento, Cabet est ainda
totalmente sob o domnio do vapor,no sabe nada e no imagina nada sobre o papel da
eletricidade como base tcnica da sociedade futura.
A agricultura da sociedade futura,no obstante, a imagina o utpico em forma de
pequena produo baseada em granjas naturalmente sem empregar a fora de trabalhoa
assalariada,mas com utilizao do maximo de todas as maquinas possiveis.Que este
maximo,desde o ponto de vista de uma agricultura racional em grande escala ,no deixa
de ser um mnimo, algo fcil de supor. A agricultura de Iaria no mais que a
pequena economia racionalizada do campsinato mdio francs.(...)
A sociedade comunista se equipa de forma extremamente precria no que diz respeito
aos meios de transporte.O maximo de aquisies so 12 trens, se voa um pouco com
globos, trechos curtos se percorrem com carros e inclusive se transportam produtos com
ces.
O governo da republica determina a magnitude da comuna com base em um calculo
estatstico.temos,portanto, j completo o sistema de economia planificada,que seguir
produo e ao intercambio de mercadorias.
O sistema de distribuio de produtos da republica recorda desde o ponto de vista
organizativo (tudo vai para uns grandisoissimos armazns e depois se distribuem entre
os cidados) o sistema de distribuio Narkomprod (Comit de Economia para a
Produo) no perodo de nosso comunismo de guerra.Se no fosse notrio que nossa
organizao de distribuio durante o perodo do comunismo de guerra era uma parte
inevitvel da economia na guerra civil,poderia se pensar que entre 1918-1920 tinhamos
realizado a mais pura copia de Cabet.Em geral,Cabet se interessa mais pelos problemas
da distribuio que pelos da produo.
(...)Neste terreno se refletem muito bem certos traos caractersticos do burocratismo
francs tradicional no campo do socialismo ,um produto da fantasia de cabet.
certo que, nas oficinas ,os prprios trabalhadores estabelecem as regras do trabalho,e
elegem tambm seus funcionrios,aspecto que toma tanta importncia nas teorias dos
socialistas corporativistas.
Das particularidades que podem interessar-nos da utopia de Cabet deve reter-se o
seguinte:
1. existncia de um governo sem que existam classes,de forma que o governo s
tem que cumprir a funo de um Veshenka (Conselho Superior de economia
Poltica);
2. a competncia no marco dos concursos organizados pela republica, joga um
papel muito importante na realizao do trabalho;
3. o sistema educativo bastante reacionrio,tem lugar fundamentalmente na casa
paterna,no publico e comunitrio. As tradies familiares reacionrias so
efetivas at chegar a abusos tais, que,para se casar a uma mulher,deve se
conseguir um acordo prvio entre os pais.
4. O ocupar-se das cincias, a arte,etc,no um trabalho adicional que representa
um oficio de especialistas deste ramo,isto , perdura em Cabet a separao entre a
cincia e o trabalho fsico,tpica dos sistemas exploradores. Pode-se acrescentar que
a sociedade comunista de Cabet no pode subsistir sem a adorao de Deus, isto ,
sem a religio,sem padres,cujo trabalho se considera socialmente til e se
remunera lanando mo dos cofres do estado.
A idia de um perodo de transio do capitalismo ao comunismo no alheia a
Cabet.Em todo caso, desde a Revoluo de Outubro em Iaria at a organizao
do comunismo acabado, se passaram 50 anos.No obstante, Cabet imagina as
particularidades deste perodo,especialmente interessante para ns, s de forma
muito confusa e geral.No que respeita transio at este perodo de transio,isto
,a possibilidade da ruptura com a sociedade capitalista,Cabet permanece em geral
no nvel dos demais utpicos: no combina o destino do socialismo com a luta de
classes do proletariado e a vitria da revoluo operaria.Por esta razo nenhum dos
utpicos,sem exceptuar a Cabet, pode dizer algo razovel sobre a estrutura
econmica do perodo de transio.
Apesar de que Iaria nasce de uma guerra civil,e nisto radica precisamente a
genialidade de seu prognostico,Cabet no a leva totalmente a serio e no se deixa
guiar por ele em sua luta pratica pelo socialismo.
3) Robert Owen
Se bem que os trabalhos de Robert Owen so,enquanto a fantasia,bastante inferiores s
obras de Fourier e Cabet, tm sem dvidas outra vantagem, relacionada com a
influencia exercida pela base econmica de um capitalismo mais desenvolvido sobre a
ideologia de Owen.
S nos interessa as questes que Owen apontou que tenham relao com a construo
do socialismo.Portanto, trataremos os pontos de vista de Owen sobre:
o sistema de produo na sociedade futura,
o sistema de distribuio,
o sistema educativo e, finalmente,
as vias de superao da sociedade capitalista pelo socialismo.
Para Owen , a sociedade futura perfeita deve estar organizada conscientemente
segundo princpios altamente racionais, que devem substituir a estrutura da sociedade
atual surgida espontaneamente, para Owen a organizao cientifica de toda a
sociedade.Assim mesmo, considera imprescindvel a organizao cientifica da
produo.
Para uma sociedade desta ndole, trata-se em primeiro lugar de eliminar a contradio
entre a cidade e o campo.Como outros socialistas,Owen tambm um defensor
ardoroso da unificao entre industria e agricultura, a pesar de que,como habitante de
um pais capitalista altamente desenvolvido,poderia ter reconhecido com especial
facilidade as dificuldades existentes para aplicar uma medida deste tipo(combinar a
grande produo mecanizada e especializada em alto grau com a agricultura).Veremos
que Owen considerava possivel, por este e por outros motivos (reduo dos gastos de
circulao),que no se levariam os alimentos e mercadorias ao homem,mas que o ser
humano se acercaria aos alimentos e demais bens.
( Quando se falava entre ns em 1918-1920 de que levaramos os seres humanos ao po
em lugar de levar o po aos seres humanos, esta forma de falar era um plagio de Owen).
No podia compreender que este problema poderia ser resolvido por uma revoluo no
sistema de transportes,que possibilitaria,em vez de um traslado da aldeia cidade ou
vice-versa,o transportar com rapidez seres humanos ou produtos da cidade ao campo e
vice-versa; isto , no reduz a distancia no espao,mas sim no tempo,entre a cidade e o
campo.
Em respeito s condies tcnicas, Owen considerava imprescindvel o uso das
mquinas mais aperfeioadas e a completa aplicao da cincia a produo.Era
contrario ao intecambio monetrio e a produo de lucro,isto , ao sistema mercantil da
economia.O trabalho alcanaria a produtividade mxima quando a produo est
orientada diretamente ao consumo e no para o lucro a venda ou revenda.
A organizao da sociedade e da produo estaria assentada numa diviso do pais em
partes determinadas.A produo agrcola eindustrial deveriam ser combinadas,distribuir
as pessoas segundo os postos de trabalho, tendo em conta ao Maximo suas inclinaes
naturais e seus desejos. Este processo aumentaria a produo,economizaria os gastos
com a administrao e, eliminaria as classes e os grupos parasitrios da sociedade.
No campo da distribuio,Owen era um grande inimigo dos sitema de intercambio e
distribuio capitalista;considerava o dinheiro como instrumento de intercambio
desnecessario. com o sistema atual, a distribuio dos bens pesa como uma carga morta
sobre os produtores e se manifesta como o principio mais desmoralizador para a
sociedade...Com uma organizao cientifica razovel da sociedade podem evitar-se as
perdas relacionadas com o transporte prolongado e o armazenamento irracional no
comercio e armmazens. ( The look on the new moral world . 1849).
Como alternativa, Owen propoe uma estreita interconexo entre o processo de
produo, a distribuio e o consumo. Sua bandeira de por um mnimo de circulao e
de gastos de circulao recolhe o problema mais atual da recionalizao
socialistareferido distribuio da industria sobre um territrio e reduo de gastos
para o aparato de distribuio. Este problema,contudo, muito mais complicado e
difcil para industria socialista do que pensava Owen.
A racionalizao da produo e da distibuio no se atinge sem eliminar a sociedade
mercantil e a totalidade do sistema monetrio da sociedade capitalista.Owen observou
isto, mas ao igual que todos os socialistas que no tinham entendido a mutua
dependncia de todas as partes do sistema capitalista e a primazia da produo, se
dirigiu para aspectos isolados do sistema monetrio capitalista, especialmente sobre o
problema do dinheiro.
Assim,Owen pensava que a produo socialista era uma produo para o consumo.
Todos os utpicos tratam com muita seriedade a educao do novo ser humano.Owen
trata com mxima ateno o problema da educao. Seu pensamento bsico que a
natureza humana de todas as pessoas igual. Seu carter se forma no processo
educativo.
Owen pregava a reeducao da humanidade por via pacifica, recusando a via
revolucionaria na luta pelo socialismo.
Em relao ao sistema educativo da sociedade futura, no perodo de transio,as
crianas so separadas de seus pais no instrudos, que podem influir negativamente na
formao de seu carter e so reunidas em instituies de ensino especiais. As crianas
s voltam para seus pais pela noite. A educao est relacionada ao trabalho: as crianas
que superam todos os nveis de trabalho,convertem-se em trabalhadores de todos os
ramos da industria e da agricultura.
A questo que mais dificuldades oferece o sistema educativo de Owen de como os
velhos professores podem educar o novo ser humano.
As opinies de Owen sobre a organizao da produo, a distribuio, a autogesto,se
aproximam muito s idias dos socialistas corporativistas na Inglaterra.
Enfim, o socialismo terico alemo jamais esquecer que se sustenta sobre os ombros
de Saint-Simon, Fourier e Owen trs pensadores que apesar de seu carter fantstico e
de todo o utopismo de suas doutrinas,pertencem s mentes maiores de todos os tempos,
tendo antecipado genialmente uma infinitude de verdades cuja exatido estamos
demonstrando agora de um modo cientifico(Engels , prefacio a Guerra dos
camponeses na Alemanha).
CONCLUSES

(21 paginas)

A EXPERIMENTAO AUTOGESTIONRIA

-estrategia da autogesto
-pedagogia da autogesto

Autogesto : lutas para alm do Capital.

inconcebvel tornar
irreversvel a ordem social alternativa sem a plena participao dos produtores
associados na tomada de deciso em todos os nveis de controle poltico, cultural e
econmico ( I.Meszros).

O poder poltico deve apoiar-se na capacidade


gestionria da sociedade .
( Gramsci )

As massas devem aprender a usar o poder usando o poder. No h outro modo .


(Rosa Luxemburgo )

Retomando o que escrevi em meu caminho para autogesto, estas concluses


tomam como base tanto o conhecimento emprico da Economia Solidria,a partir da
vivencia ,desde o inicio dos anos 80, com experincias germinais de autogesto,cursos
de formao e debates no CEDAC (1978-1988),e viagens a outros paises para
intercambio;
Vivencia de 3 meses (1981) em Besanon,marcado por visitas e debates com os
trabalhadores da LIP;
Acompanhamento direto de algumas experincias ,como a da Polnia nos anos 80 e,
que resultou numa pesquisa sobre o Movimento pela Autogesto ,a Rede
Autogestionaria,na Polnia, determinante na minha minha viso de mundo baseada na
autogesto.
Estagio na CFDT-Frana,de 1981 a 1983.Central que tomou para si o tema do
socialismo autogestionario ;
Experincias como a da Confederao Nacional dos Metalrgicos-CUT (Programa
Integrar),de 1996-1997,em torno de trabalho com desempregados atravs da
qualificao scio-profissional,que tinha como horizonte o novo cooperativismo
popular.
Como afirmei anteriormente, o Integrar tornou-se Integrao da CUT,a partir de
1998 e at 2001 desenvolvemos suas atividades na poltica de formao da CUT,na
regio Sul do pais ;
Neste perodo, tambm,desenvolvemos atividades de formao da ADS-CUT ,como
eixo o tema da autogesto.
Vivencia em Governos : o gaucho de Olvio Dutra,em 2002, e, de 2003-2007 .No
Governo Federal, na SENAES,acompanhando as suas lutas,formas de
organizao,debates diversos,Conferencias e Plenarias, e suas polticas publicas em
diversos campos (educao e estudos,fomento,comercializao );
A coordenao de aes formativas e na construo da PNF* dna RECID-Talher
nacional em torno da construao de Poder Popular, desde 2008..
E,no ultimo ano,participao, em atividades de formao dooos CFES ,sobretudo o
CFES nacional,junto com Ainda Bezerra ,da Capina,e nas atividades de formao da
propeia Capina,numa linha que podemos chamar de autogesto da pedagogia.
As aes na RECID e no CFES se do em torno da construo de Redes de educao
(popular). E,ambas buscam ,por razes e natureza distintas,a construo de pedagogias
autogestionarias.
Os debates e trocas de idias com Maria Clara B.Fischer e Lia Tiriba,em torno da
pedagogia da autogesto,tem nos fornecido elementos importantes para nossas
concluses.
Leitura de diversos ensaios e teses acadmicas sobre esta temtica.
Enfim, no que diz respeito a questo da pedagogia da autogesto,ou da formao em
economia solidaria,a participao em oficinas de formao que a SENAES realizou em
2005 e 2007,foram fundamentais para construo de elementos
metodolgicos,pedaggicos e de contedo nesta rea.
Buscamos em Gramsci algumas idias relativas formao e a questao da hegemonia.
Mas , estas concluses , sobretudo,tm por base idias de alguns pensadores do campo
que podemos chamar de cultura socialista autogestionaria:
- de Joo Bernardo,desenvolvidas em sua vasta obra,sobretudo,em A Economia dos
Conflitos Sociais;
em dois pensadores franceses da autogesto:
Henry Lefebrev,em seus ensaios sobre a autogesto na Revista Autogestion et
Socialisme,e sobre o Modo de Produo Estatal,em sua obra de 4 tomos sobre o
Estado;
- e, Daniel Moth ,sobretudo,em seu livro Autogestion goute-a-goute;
- por fim,nas idias do filosofo hngaro Istvan Meszros ,procedente da chamada
escola Lukacsiana de Budapeste.
- importante salientar a importncia das obras de Bloch,Freire,no que diz respeito a
questo do possivel e da utopia concreta.Assim como,Goldmann sobre a aposta.
Istvan Mszros,autor de obras como Alm do Capital, um dos raros pensadores
socialistas contemporaneos a por na ordem do dia a questo da estratgia socialista ,de
forma inovadora,ao toma-la como forma antagonica ao Capital,e no apenas a sua forma
historica atual, o sistema capitalista.
Vamos,ento,retomar algumas idias de Meszaros que apresentamos na introduo
deste trabalho que sero importantes para nossas concluses.

Ricardo Antunes sintetizou,de forma brilhante, as 3 teses mais originais do pensamento


de Meszaros:
1) Meszaros diferencia capital e capitalismo.O primeiro antecede ao capitalismo e
a ele tambm posterior.O capitalismo uma das formas de realizao do capital, a
forma dominante nos ltimos trs sculos.Mas,assim como existia capital antes do
capitalismo, h capital aps o capitalismo (o capital ps-capitalista), vigente na URSS
e demais paises do Leste Europeu,durante varias dcadas do sculo XX.Estes
paises,embora ps-capitalistas,foram incapazes de romper com o domnio do capital.
Para Meszaros, o sistema de metabolismo social do capital tem seu ncleo central
formado pelo trip capital, trabalho assalariado e Estado.So trs dimenses
fundamentais e interrelacionadas,sendo impossvel superar o capital sem a eliminao
do conjunto dos elementos que compreendem este sistema.

2a)sendo um sistema que no tem limites para a sua expanso,o capital acaba por
tornar-se incontrolvel e essencialmente destrutivo.

3) qualquer tentativa de superar esse sistema de metabolismo social que se restrinja


esfera institucional e parlamentar esta fadada derrota.S um vasto movimento de
massas,radical e extraparlamentar,pode ser capaz de destruir o sistema de domnio
social do capital e sua lgica destrutiva.
Meszaros parte da idia da crise estrutural do capital como marca fundante desta
nova poca,que alguns chamam de globalizao.E,por varias razes,nos mostra que a
nica alternativa a barbarie do capital uma hegemonia radical socialista antagnica ao
Capital.
Esta hegemonia tem por objetivo a construo de um novo tipo de sociedade,que
Meszaros sempre chama em suas varias obras,de Livre associao dos produtores,ou
seja, o que na cultura socialista significa Autogesto Social.
Como vimos nas experincias histricas, as principais lutas dos trabalhadores nos
sculos XIX e XX ,na perspectiva da autogesto social, portam a radicalidade
antagnica contra os trs eixos do ncleo central do metabolismo social:o Capital,o
Trabalho Assalariado e o Estado.
Este carter e a natureza das lutas autogestionarias como experincias radicais contra
o Capital,ou seja,para Alm do Capital, explicam o porque tenham sido massacradas a
ferro e fogo pelas personificaes historicas do Capital, em ciclos distintos do
capitalismo,desde a Comuna de Paris (1871) at a experincia da Frente Popular de
Allende no Chile(1970-73).
Estes ciclos de lutas autnomas e autogestionrias foi sistematizado por Joo
Bernardo,em sua obra intitulada A Economia dos Conflitos Sociais.Bernardo
qualifica tanto em termos de forma quanto de contedo estas lutas pela autogesto.Seu
trabalho mostra claramente o que so lutas antagnicas ao Capital,para Alm do
Capital.
Neste sentido,aproximar as idias de Bernardo com a obra de Meszaros fundamental .
A relao da Autogesto com a Economia Solidria outro desafio deste ensaio. claro
que,a Ecosol porta princpios da autogesto ,contudo, como veremos,suas formas de luta
e de organizao no portam (pelo menos na conjuntura atual ) a radicalidade e o
antagonismo das lutas historicas da autogesto em relao ao Capital.Suas lutas so de
resistencia dentro do capitalismo.
As experincias historicas de lutas autogestionarias mostram que estas comeam nos
locais de trabalho,nas empresas heterogeridas,de submisso do trabalho assalariado ao
Capital,e vo assumindo formas radicais de organizao e programas em relao a
organizao capitalista do Trabalho,e , em relao ao Estado (forma poltica articulada
de expresso do Capital) .
J a ecosol tem suas experincias mais articuladas no territrio,nas cidades ,e,h um
segmento especial: o das Empresas recuperadas,mais prximo das experincias de
controle operrio.
As lutas pela autogesto ocorreram em conjunturas e ciclos pr ou mesmo
revolucionrios.por sua vez, com poucas excees,as experincias da Ecosol ocorrem
em conjunturas de baixa intensidade de lutas sociais, periodos de poucas convulses
sociais.
Em momento de crise das lutas nas empresas ,nos locais de trabalho, a Ecosol a nica
forma de expresso da autogesto na poca atual do Capital ? Define,em si mesma,uma
alternativa ao atual modo de produo e mesmo ao prprio metabolismo social do
Capital ? Que articulaes seriam necessrias entre as lutas e formas de organizao das
experincias da ecosol e as do movimento operrio nas empresas,atravs de formas
associadas de organizao (sees sindicais,comisses de fabrica,conselhos
operrios,etc.) ?
Seria,ento,a Ecosol um novo reformismo ? Ainda cabe nesta poca do Capital,a
distino entre reforma e revoluo ? Neste ponto, vamos recorrer as analises de
Mszaros,quando remarca que a linha de menor resistencia ao Capital est
definitivamente sepultada nesta nova poca.
Tambm, o velho militante da autogesto,Daniel Moth,ensaiou superar essa dicotomia:
autogesto geral (revoluo) e autogesto gota-a-gota (reforma).
Moth buscou articular dialeticamente a autogesto como meta estratgica de longo
prazo e a economia solidria, principal forma em curso da autogesto (mas,no a
nica),como movimento social e experimentao ?
Ou,ser que teremos ,nesta epoca do Capital, novos ciclos revolucionrios de lutas
autogestionarias,no sentido assinalado por Joo Bernardo ? O proprio Bernardo remarca
que na etapa atual do capitalismo,os prprios ciclos so alterados.
A nova caracterstica de crise estrutural do Capital no determinar ,tambm, nova
poca para as lutas sociais ? Tal qual,no se prev mais ciclos econmicos do Capital,
no seria esta a nova lgica das lutas envolvendo Capital x Trabalho,em suas formas de
existencia atualmente.
Poder a Ecosol desenvolver a radicalidade e o antagonismo ao Capital presentes nas
lutas histricas pela autogesto e pelo socialismo ? Ela porta de forma intrinsica este
potencial ?

- Politica da Autogesto:

No que diz respeito as transformaes sociais,isto ,as revolues,o campo


socialista sempre foi marcado pela discusso sobre a sua estratgia,principalmente,como
articular dialeticamente Reforma e Revoluo,titulo de uma obra fundamental de
Rosa Luxemburgo.No campo da autogesto,esta questo tem suas particularidades,sua
prpria historia.
Nestes sentido,vamos buscar este debate tal qual se deu na Europa,especialmente
na Frana. rara a obra sobre Economia Solidria ou sobre Autogesto, que no se
debruce sobre esta questo: a autogesto possvel apenas numa sociedade socialista ou
pode existir dentro do capitalismo;e, se pode,que sentido tem ,para qual horizonte deve
apontar ?
Vimos que,Paul Singer,em seu Utopia Militante, ps esta questo em forma do
que chamou de implantes de socialismo.
Eis um dos principais dilemas da autogesto:
Trabalharmos a experimentao autogestionaria do dia-a-dia ou construirmos a
barca de Ne,aguardando o Grande Dia,a Revoluo ? Reforma ou Revoluo
,diriam outr@s; Tudo ou nada ? Nas palavras de Mothe: diluvio ou gota-a-gota ?

Moth nos mostrou que as experincias em epocas de revoluo tendem


provar as capacidades dos trabalhadores gerir a empresa e o Estado,mas de
uma grande pobreza;a historia s reteve fatos pitorescos e no nos forneceu
detalhes sobre o funcionamento real das fabricas
fundamental que estas experincias se desenvolvem todas em um clima de
crise.(...) Em um perodo de crise revolucionaria,os gestores-tecnicos detm o
poder tcnico,mas no o poder poltico que defendido pelas organizaes
operarias.Para ser tolerado,o quadro tcnico-gestor tem todo interesse em se
apoiar nas foras revolucionarias..
Para Moth, Esta situao entretanto excepcional e no se percebe que,
quando destas crise,so os problemas exteriores empresa que dominam todas
as preocupaes e mais particularmente o problema do poder do Estado.
O funcionamento das empresas no constitui que um dos instrumentos da
Revoluo,em que os objetivos prioritrios esto ,na realidade,centrados no
poder central.
Seguindo as idias de Mothe, podemos constatar que as nossas experincias
de economia solidria se desenvolvem em uma conjuntura j longa ,mas de
uma relativa estabilidade em relao as lutas sociais,sobretudo,dos
trabalhadores.Numa conjuntura de ofensiva do capital.Com raras
execes,talvez a experincia da Venezuela,ou alguns momentos rpidos
como a luta em Cochabamba,Bolvia,em 2001,tivemos e ou tenhamos
conjunturas de alta mobilidade social das populaes trabalhadoras.
Portanto,o que est em curso um quadro de experimentao em termos da
Autogesto gota-a-gota,que porta, como vimos ,suas potencialidades em
termos de aprendizagem de gesto pelos prprios trabalhadores.Se no traz a
realidade revolucionaria das pocas de crise (que,como vimos,no permitem
pela curta durao que geralmente as marca, grandes aprendizagens em termos
de gesto democrtica ), permitem aos produtores associados a construo
sistemtica de uma Pedagogia da Autogesto.
Esta viso porta conseqncias fundamentais para uma poltica de formao
em economia solidria.Assim,se nas grandes lutas de carter revolucionrio a
prxis dos trabalhadores questiona radicalmente o trip do sistema do Capital ,
no sentido de para Alm do Capital,contudo, nos perodos que chamamos
de Experimentao que os trabalhadores desenvolvem um conhecimento
mais profundo da autogesto.
Na perspectiva de Rosa Luxemburgo,apenas gerindo coletivamente os
trabalhadores aprendem a gerir,no h outro caminho.E, Daniel Moth nos
mostra como esta aprendizagem torna-se quase impossvel em conjunturas
revolucionarias,seja devido a sua curta durao (como vimos nas experincias
histricas da autogesto) seja pela dinmica das formas de luta destes
perodos,marcadas por grandes manifestaes de massa,etc.
Enfim, esta aprendizagem construda no cotidiano das varias experincias de
autogesto da economia solidria,seja no cho de fabrica das empresas
recuperadas seja nos diversos locais de trabalho dos outros segmentos do
trabalho associado.
Todavia,os momentos revolucionrios so ,sem duvidas,fundamentais para os
trabalhadores construrem seus projetos estratgicos que fundamentam uma
contra hegemonia alternativa ao Capital: formas de luta,propostas de
superao da diviso entre a esfera produtiva e a poltica,fenecimento do
Estado,organizao nos locais de trabalho para superar radicalmente a diviso
da organizao vertical do trabalho subsumido ao Capital,formas de gesto
das Cidades,etc.
Este conhecimento acumulado pelos trabalhadores atravs de suas varias
tentativas de revolues fundamental para o atual processo educativo da
economia solidria.
No Brasil,um trao da Economia Solidria,enquanto estrategia de
desenvolvimento ,,exatamente,incorporar os desafios da conjuntura iniciada
em 2003,com a eleio de Lula Presidncia,isto , de levar a disputa ao
campo da construo de alternativa de hegemonia : o poder e o Estado,as
Polticas Pblicas.Esta caracterstica j vinha de experincias desenvolvidas
em Prefeituras do campo democrtico popular* ,e de Governos
Estaduais,como o principal exemplo,o de Olvio Dutra no RS (1999-2002) .
Isto pe a questo da formao na ecosol em outro patamar,ampliando seu
universo temtico as questes oriundas dos problemas de gesto das
cidades,do poder estatal em seus vrios niveis,do local ao global.
Joo Bernardo,alm de analisar seus ciclos, tambm caracterizou as formas de
luta e organizao caractersticas das lutas autogestionarias para alm do capital.
Retomemos suas idias.Em Economia dos Conflitos Sociais,Bernardo afirma:
Apresentando-se como alternativas s relaes capitalistas,as relaes sociais surgidas
nas lutas coletivas e ativas tem-se distinguido por um aspecto que todos parecem
considerar como a melhor sntese da sua novidade.(...).A revogabilidade permanente a
forma bsica de funcionamento das instituies regidas pelo igualitarismo e pelo
coletivismo.Enquanto permanecem estas caractersticas,os eleitos so delegados,mas
no dirigentes. O movimento autnomo,ao longo do sculo XIX e do atual (sculo
XX),tem evoluido ema spectos decisivos,(...)e assumido formas consideravelmente
diferentes.Todas elas,porm,aparecem como realizaes distintas de um quadro
comum,caracterizado pelo igualitarismo e o coletivismo e cujo funcionamento tem
como eixo principal a revocabilidade dos delegados. esta Constancia para alem das
diferenas que permite definir as relaes sociais surgidas nas formas de luta coletivas e
ativas,no s como antagnicas do capitalismo,mas ainda como constituindo,desde j,o
germe de um futuro modo de produo.
E,aponta uma questo central para os dias atuais: O problema crucial que se levanta
no conjunto dos vrios processos de luta ,portanto,o seguinte:
COMO SE TORNA POSSIVEL A PASSAGEM DAS OUTRAS FORMAS DE
CONFLITO S FORMAS COLETIVAS E ATIVAS ? .
Atualizando a pergunta: COMO A ECONOMIA SOLIDARIA PODE ATINGIR O
GRAU DE RADICALISMO E ANTAGONISMO DAS LUTAS HISTORICAS PELA
AUTOGESTO ? .
Sem dvidas, aqui cabe bem a idia diretriz de Raymond WLLIAMS do Principio
Mximo da Autogesto, nas fabricas e nas comunidades locais,atravs de Governos de
esquerda e movimentos autogestionarios em varias escalas.
Para Bernardo,as lutas coletivas e ativas,apresentam duas caractersticas
fundamentais:
Bernardo assinala uma caracterstica fundamental das lutas pela
autogesto:
As formulaes ideolgicas radicais do movimento dos
trabalhadores,ao longo da historia,TM SEM EXCEO (grifo nosso)
apresentado a emancipao dos explorados como uma anulao de
qualquer diviso em classes,como a emancipao do corpo social.
Ora,sem duvidas,a autogesto social como vimos na dinmica das lutas
que analisamos acima.
E,que: a extraordinria repercusso das relaes surgidas na luta
coletiva e ativa resulta do fato de que as minorias radicalmente
anticapitalistas apresentarem um modelo de reorganizao global da
sociedade e,ao mesmo tempo,demonstrarem na pratica que no se trata
de um mero projeto ideologico,de nenhuma utopia simplesmente
desejavel,mas de algo que se constitui na realidade, de maneira
verificvel,nas relaes coletivistas eigualitarias que entre si estabelecem
os participantes nestas formas de luta.
Bernardo assinala os limites histricos destas lutas;
Embora a classe trabalhadora constitui a enorme parte da
populao,NUNCA AT HOJE (grifo nosso) uma luta radical ocupou,ao mesmo
tempo,mais do que diminutas fraes da classe,em escala mundial.
Entre os dois grifos que fizemos , Tm sem exceo e Nunca at
hoje,
nas frases de Bernardo,h uma dimenso quase inifinita, que se
expressa nas palavras,como vimos,de Blanqui : a dialtica infernal, o Spleen; a
repetio incessante do mesmo.
Bernardo assinala uma vocao totalizante nestas lutas; tendem a se
expandirem alm do local em que se deflagram.Uma vez desencadeados,e se
conseguirem assentar no mbito das empresas um fundamento firme,os seus princpios
organizativos manifestam-se como alternativa,no apenas no interior de dadas empresas
em particular , mas perante a globalidade da sociedade capitalista..So muito fortes as
presses para que o coletivismo e o igualitarismo extravasem os problemas da disciplina
do trabalho e se defrontem com os levantados na esfera familiar,na escola e no contexto
urbano em geral.
Vimos como,desde a Comuna de Paris at a Comuna de Gdansk ,esta uma
caracterstica das lutas histricas pela autogesto.

Bernardo nos aponta dois exemplos histricos mais recentes,que levaram as lutas a
pontos altos de ao e organizao:
Quando as lutas coletivas mobilizam simultaneamente os trabalhadores de um grande
numero de empresas e quando a sua durao lhes permite manifestarem-se como
alternativa,podem ento desenvolver-se instituies que consolidam a articulao entre
o ambito inicial do conflito e a sua extenso alm da esfera empresarial.
Foi o que sucedeu em maio e junho de 1968 em NANTES,por exemplo, ou ainda na
POLONIA,no segundo semestre de 1980.A,comits de greve interempresas,formados
autonomamente,coordenavam e controlavam a distribuio de bens e servios
essenciais,fiscalizavam preos praticados na venda a varejo e impediam
aambarcamentos,cobrindo com esta atividade reas por vezes muito vastas.
Bernardo fala,ento,das condiies para luta chegar a esse nvel: S e possivel chegar
a uma situao desse tipo quando a populao trabalhadora se encontra autonomamente
otganizada tambm no nvel dos bairros e quando a mobilizao social inclui os
camponeses.
Nestes caos,afirma Bernardo,o processo se iniciou no ambito das empresas,mas que
apenas a sua extenso lhe permitiu atingir formas to desenvolvidas.O modelo das
relaes sociais surgidas na luta coletiva e ativa abarca assim, na sua proposta pratica, a
reeorganizao da globalidade da sociedade. este o percurso concreto que seguem ,a
partir do local da sua ecloso. esta a base pratica da sua vocao totalizante.De
relaes sociais de luta, desenvolvem-se em relaes gerais.
Vimos como no movimento polons Solidarnosc , seu Congresso construiu um
programa intitulado A Republica Autogestionaria da Polnia.Uma proposta global de
sociedade.
Joo Bernardo analisa questes importantes destes movimentos, relativos questo do
Mercado. At agora, o estagio superior nestes processos parece-me ter ocorrido
naqueles POUCOS- (grifo nosso) casos em que trabalhadores de empresas
diferentes,tendo desencadeado simultaneamente movimentos de luta autnoma e
tomado em mos a produo,reorganizando-a segundo as novas relaes sociais,trocam
ento entre si os produtos assim fabricados.S mediante a generalizao deste tipo de
trocas podero os emrcados de solidariedade incluir,no apenas bens de uso corrente,
mas todo gnero de produtos. Bernardo,arremata: Estamos certamente ainda muito
longe desse estagio, que hoje mal comea.
Bernardo assinala questes cruciais para estas lutas: Apenas o simultneo
desencadeamento de processo coletivos e ativos de contestao generalizada pelos
trabalhadores de um numero crescente de paises poder fazer recuar o emrcado mundial
e comear a por em xeque os seus critrios de produtividade.A partir de ento,o
desenvolvimento das relaes sociais surgidas na luta radical poder obedecer a
percursos diferentes daqueles que aqui sistematizai.Mas essa ser to-somente uma
ETAPA FUTURA (grifo nosso).At agora, diz Bernardo,mesmo quando se
desencadeiam em unidades de produo de empresas transnacionais,estas lutas tm-se
confinado localmente,sem se alastrarem s unidades da mesma empresa situadas em
outros paises.Isto implica uma ENORME FRAQUEZA TATICA DOS
TRABALHADORES(grifo nosso)....
E,fica assim de p uma questo crucial,retoma Bernardo:
a de saber por que essa internacionalizao dos focos de origem das lutas autnomas
no ocorreu.
Sem duvidas, nesta poca de crise estrutural do Capital (Meszros),os trabalhadores
tero que responder na sua prxis essa questo . Ou isto ou a Barbrie !

Vimos que , ao responder a questo fundamental:Qual a contribuio da


autogesto ? Lefebrev aponta 3 pontos fortes;
1) Uma brecha no sistema existente, no dos centros de deciso que geram a
produo e organizam o consumo sem deixar aos produtores e aos consumidores a
menor liberdade concreta,a menor participao nas verdadeiras opes;
2) Um risco: a possibilidade de uma degenerao, de uma recuperao,sobretudo
nas formas j bastardas e degeneradas da cogesto.Na autogesto em si-mesma, os
interesses parciais ou locais podem dominar os interesses gerais da sociedade;
3) O anuncio de um processo que passa pela brecha aberta e que atinge a
sociedade inteira.
Se formos passar o movimento da economia solidria por esses 3 pontos,podemos
afirmar que,relativamente,a ecosol abriu uma brecha no sistema existente ,e que,
atinge grande parcela da populao brasileira,mas no a sociedade inteira.O segundo
ponto,podemos encontrar na ecosol uma serie de interesses corporativos (de
Instituies,de redes varias,de empreendimentos,etc0 com dificuldades de serem
articulados em um Projeto Global,mesmo que j tenha uma Plataforma
programtica,sada da I Conferencia Nacional.
Enfim,podemos sintetizar nossa concluso ,em torno de dois eixos:
1=da estratgia da autogesto, sua caracterstica propria de luta alm do capital ;
2=da pedagogia da autogesto, do processo de aprendizagem prprio a autogesto.
Se as lutas caractersticas da Economia Solidria,nesta etapa histrica, no tm as
mesmas caractersticas de radicalidade das lutas dos ciclos histricos da autogesto ,ou
seja, antagonismo crescente em relao ao trip do socialmetabolismo (Capital,Trabalho
e Estado),tal qual definido por Meszros,elas portam possibilidades fundamentais
nessa perspectiva.
Tambm ,na etapa atual de crise estrutural do capital,ainda na viso de
Meszros, no podemos chamar a economia solidria de reformismo e a autogesto
histrica de revoluo.Como bem diz Meszaros,a linha de menor esforo do reformismo
est sepultada.A poca atual pe a alternativa Socialismo ou Barbrie.
Deste modo,as experimentaes,na linha de D.moth,da economia solidria
significam um espao estratgico de construo coletiva de aprendizagem
autogestionaria dos produtores associados.So nestas experimentaes que os
trabalhadores constroem sua aprendizagem de gesto coletiva e igualitria,de forma
ativa.
Nos grandes momentos revolucionrios traam suas linhas ideolgicas e
estratgicas de uma sociedade com base no socialismo autogestionario.Ambos so
momentos que se alimentam de forma dialtica,em seus avanos e recuos,em suas
apostas nas possibilidades que marcam o processo histrico.

Outra Verso=

CONCLUSES:

EXPERIMENTAO AUTOGESTIONARIA
-autogesto da pedagogia
-pedagogia da autogesto
Pedagogia da Autogesto e Hegemonia

A autogesto a pedagogia do socialismo e de si mesma


(Michel Raptis)

Paul Singer,com esprito luxemburgiano, afirma que A Economia Solidria


um ato pedaggico em si mesma, na medida em que prope uma nova pratica social e
um entendimento dessa pratica.A nica maneira de aprender a construir a economia
solidria praticando.
Neste sentido,traaremos alguns elementos sobre a pedagogia da autogesto.
Bogdan Suchodolski,em seu Fondamenti di Pedagogia Marxista, diz que A
concepo da relao de educao e trabalho produtivo apenas um dos elementos
fundamentais do programa cultural e educativo dos fundadores do socialismo
cientifico.O segundo elemento fundamental o principio da relao entre instruo e
educao como atividade revolucionaria da classe operaria.
Este segundo elemento,nos remete questo da disputa de hegemonia.Neste
campo,vamos nos alongar em algumas idias a partir de Gramsci.
Hegemonia, significa a construo de uma democracia de massa, alterando as
relaes de dominao entre as massas e o poder, abrindo uma transio no estatal,
articulando a democracia representativa e a de base, direta, na produo (Conselhos,
autogesto, etc.).
Expressa a autogesto da vida coletiva, desde os escritos "ordinovistas" at suas
ltimas reflexes, o eixo que percorre a obra de Gramsci :
o poder poltico deve apoiar-se sobre a capacidade gestionria da
sociedade.

Giovanni Urbani , em sua Introduo monumental antologia intitulada


Antonio Gramsci, La Formazione DellUomo ( Editori Riuniti, 1967 , 1974) , aborda
a relao entre autogesto autogoverno e hegemonia na evoluo do pensamento
gramsciano.
Urbani reflete a questo da tomada de cosnciencia pelos trabalhadores a
partir de seus locais de trabalho,pelos conselhos operrios fundados nos anos 20 em
Turim.Por si s,estes trabalhadores desenvovlem espontaneamente uma conscincia
para si, ou h necessidade de uma formao mais dirigida para chegarem a este nvel
de conscincia revolucionaria.Urbani nos mostra como Gramsci articula dialeticamente
estes dois momentos do processo de formao da conscincia.

Vejamos ,em longa citao ,que nos permite entender as conexes feitas por Urbani:

Ser nos escritos sobre Materialismo Storico e la filosofia di Benedetto Croce que
Gramsci se empenhar na busca para desenvolver o marxismo como uma concepo
integral do mundo que seja em conjunto uma ideologia e uma religio ( em sentido
crociano).Ele sublinhar com grande insistncia,que seu trao peculiar deve consistir no
fato de possuir a caracteristica formal da mais complexa filosofia,e em conjunto, de ser
capaz da mxima difuso nos mais amplos estratos populares para eleva-los intelectual
e moralmente.Neste duplo carter se reflete teoricamente a tarefa histrica de
transformar a conscincia da classe operaria,fazendo-a passar, tambm no plano da
ideologia, de uma postura subalterna a uma postura dirigente;e, define-se em
conjunto,o aspecto educativo da poltica que destinado a assumir o mais grande
relevo nos Quaderni.

Esta transformao,porm,como veremos, concebida sempre como um processo


realista,que atua no campo da ao e assim destinado a criar a mxima tenso
dialtica,prprio ao mbito da conscincia, entre o objetivo modo social de ser e a
conscincia critica que se adquiri no plano da ideologia.Esta tenso produz a
vontade,isto , o concentrar-se e organizar-se de todas as energias vitais para um s
objetivo que d direo e significado a existncia; e, vontade racional e no arbitraria
enquanto consciente da prpria ao e da dos outros, da prpria posio no mundo no
complexo das relaes sociais e humanas;e sobretudo, enquanto o que se quer,e o como
se quer,correspondam `a necessidade histrica objetiva.

Conscincia revolucionaria podemos tambm chamar essa vontade consciente,no


significado elaborado da tradio marxista e depois do leninismo;mas,foi talvez
Gramsci quem deu o desenvolvimento mais original e completo a esse conceito,pondo a
luz o universal significado criativo de novos valores humanos e de civilizao, enquanto
se punha a tarefa de renovar e formar a cosnciencia revolucionaria do movimento
poltico da classe operaria italiana,aps a derrota sofrida para o fascismo.

Este aspecto educativo da poltica no exclusivo dos Quaderni; nos Scritti do perodo
jovem j tinha assumido, como j sublinhamos, um relevo particular.Presente tambm
com toda sua clareza a idia que o objetivo desta ao educativa devia ser no apenas
um genrico melhoramento ou direcionamento dos militantes e mais genericamente das
classes populares,mas a aquisio da plena conscincia da prpria funo histrica
dirigente e da capacidade de realiza-la.

Mas,como se formaria a conscincia revolucionaria no mbito da classe (e em gnero


em quaisquer agrupamentos humanos) ?Como se elabora esta capacidade dirigente que,
como vimos,so intelectuais e morais,terico e pratico ao mesmo tempo,com outras
palavras, quals era a dinmica do processo pelo qual a classe subalterna torna-se
dirigente quando surgem as condies histricas objetivas para que isto acontea ? A
questo de maximo interesse porque constitui o ncleo da poltica de Gramsci e
tambm da sua intuio do devenir histrico como real processo dialtico de formao
humana: nesta questo, h as maiores discusses e dissensos.

A soluo que Gramsci prope circula atravs todas as paginas dos Quaderni,mas acha
sua elaborao especifica na Note sulla poltica, em que ele desenvolve a sua
concepo do partido.
Ademais famosa a definio que Gramsci d do partido: moderno prncipe,o qual
em conjunto, o organizador e a expresso ativa e operante ... de uma vontade coletiva
nacional popular , que se reconhece e se forma na ao ;e,ainda, o propagandista e
organizador de uma reforma intelectual moral a sua vez capaz de criar o terreno para
um posterior desenvolvimento da vontade coletiva nacional popular para o
cumprimento de uma forma superior total de civilizao moderna.

(...). O que conta por em destaque como encontra expresso terica a especifica
soluo que Gramsci d ao problema concreto da formao de um novo organismo
dirigente das classes subalternas,cuja chave mestra,como veremos,est no conceito de
organicidade da relao entre classe e partido.A reconstruo da gnese deste
conceito, por muitos aspectos fundamental,mostra que nos escritos do perodo jovem a
exigncia da direo sentida em forma muito enrgica,mas quase genrica: no posta
ainda como problema de construo de um organismo especifico de formao dos
dirigentes sistematicamente predisposta; a conscincia revolucionaria e a vontade
coletiva so j reconhecidas,ao menos implicitamente, como condies indispensveis
da ao poltica revolucionaria; mas isto parece desenvolver-se segundo um processo
natural luta concreta da classe,como expresso da vida que acontece.isto em
particular vale para os ensaios do Grido e DellAvanti,em que o acento posto no lado
expansivo do movimento espontneo da massa que,provocado por razes objetivas,se
afirma segundo uma lei que lhe prpria e que enquanto se manifesta,pela fora mesmo
do impulso do qual nasce,reflete a forma constituda da organizao social e civil e no
cria algo novo.

A obra de direo pura reivindicada,e que deve dar a conscincia ao movimento,e


assim,a funo do partido partido,so vistas em termos fortemente ideiais; educador da
personalidades dos militantes singulares, o partido representa sobretudo o momento do
estudo,do debate e da difuso de uma concepo socialista da vida.Com LOrdine
Nuovo a necessidade de formar um grupo dirigente capaz j sentida como a tarefa
primordial: a funo do partido e sua prpria fisionomia so aprofundadas e
precisadas;todavia,isto ainda visto como um organismo voluntario,
contratualistico, no orgnico e mesmo no necessrio, da classe.O partido assim no
expressa ainda a conscincia,mas, a estrutura orgnica fundamental da classe
identificada no Conselho de fabrica,porque este nasce do intimo do processo
produtivo em que socialmente a classe determinada.

Destes acenos se pode afirmar que a exigncia da direo se apresenta e se desenvolve


nos escritos do perodo jovem,em presena de outra exigncia,em certo sentido oposta,
da espontaneidade.Mais precisamente espontaneidade e direo consciente so dois
momentos do processo histrico que Gramsci teve sempre presentes e nos quais
identifica os termos da sua dialtica; todavia, nos diversos modos de conceber a sua
relao recproca,est a linha de desenvolvimento do pensamento gramsciano.
Em sntese,pode-se dizer que nos Scritti Giovanili prevalece um momento
espontaneista,que expressa o entusiasmo pelo papel libertador da classe operaria,que
na no movimento da luta social instaura uma ordem nova ,radicalmente
democratica,porque, possibilidade de atuao integral da prpria personalidade
humana ampliada a todos os cidados,em que a liberdade de cada individuo coincide
com seu elevar-se conscincia e autonomia.

Esse momento no , todavia, espontaneista em sentido vulgar, quase expresso de


primitivismo poltico e cultural, mas pela acentuao que tem o valor e o significado da
iniciativa de baixo e pelo modo como concebido o mecanismo pelo qual essa
iniciativa torna-se produtiva de valores humanos superiores; talvez,deveria-se falar
mais, no tanto da espontaneiddae, quanto de momento de AUTOGOVERNO (grifo
nosso)

Mas, em Ordine Nuovo direi que esta oposio no superada; bem mais, convive
com a reconhecida necessidade,que sempre se impe, da iniciativa enrgica e consciente
dos dirigentes:mas, as duas exigncias permanecem,digo assim,justapostas,no
encontram ainda um nexo que as unifique dialeticamente;a mesma incerteza que se
encontra em Ordine Nuovo,a propsito do modo de conceber o partido e as relaes
deste com os sindicatos e os Conselhos de fabrica,mostran quanto intensamente
Gramsci sentia o problema fundamental de construir um organismo dirigente
eficiente,sem trair a exigncia, essencial,de alimenta-lo perenemente com a fonte do
movimento real da massa, de mante-lo fiel,por assim dizer, lei intima do processo
histrico.

Nos Quaderni,ao invs, em que reelaborada a complexa experincia terico-pratica


vivida por Gramsci aps o 1921, o momento da iniciativa dos dirigentes,ou da
autoridade, encontra a sua mxima acentuao e desenvolvimento mais
conseqente;mas, a exigncia oposta da impetuosa iniciativa de baixo, ou da liberdade
ou do autogoverno no se perde.Ambas,ao invs,se conectam em uma intuio mais
compreensiva do futuro histrico,que se precisa no conceito de hegemonia.Conclui
Urbani.

Gramsci mostra bem como os chamados momentos de espontaneidade ou de


autogoverno a partir de
lutas radicais necessitam de outros momentos que chamou de vontade , direo ,e,
como ambos se articulam dialeticamente.

Trazendo esta reflexo para o campo da autogesto,nos apoiamos em Maria Clara


Bueno Fischer e Lia Tiriba ao dizerem que:

As experincias historicas de autogesto ( bem o vimos na segunda parte de nosso


trabalho grifo meu )- revelam que,no embate contra a explorao e a degradao
do trabalho,no suficiente que os trabalhadores apropriem-se dos meios de
produo. Estas praticas indicam haver a necessidade de articulao dos saberes
do trabalho fragmentados pelo capital e de apropriao dos instrumentos terico-
metodologicos que lhes permitiram compreender os sentidos do trabalho e
prosseguir na construo de uma nova cultura do trabalho e de uma sociedade de
tipo novo.
E,retomando Gramsci,concluem:
Em seus escritos sobre o movimento operrio ocorrido em Turim,entre 1919 e
1921,Gramsci analisa os conselhos de fabrica,afirmando que as experincias nas
quais os trabalhadores tm o controle sobre a produo representam uma escola
maravilhosa de formao dee xperiencia poltica e administrativa.
E que,Na escola do trabalho e,em especial nas vivencias de trabalho associado,as
pessoas atribuem sentidos ao vivido ou realizado;assim,de forma mais
abrangante, fundamental que transformem suas vivencias pregressas e atuais em
experincias propriamente formadoras.

Aqui,est sintetizada a dialetica da experimentao autogestionaria,a pedagogia


da autogesto e a autogesto da pedagogia.

A Experimentao no campo pedaggico dever articular estes dois elementos: o


espontaneo e a vontade-direo.

Nesta perspectiva, a Experimentao deve ser considerada como um procedimento


prprio a dinmica da autogesto,como diz Moth:
O espirito de experimentao consistir em considerar que um ecrto numero de idias
pertencem as hipteses e podem ser postas em duvida ou rejeitadas no curso da
experimentao.
Portanto,aceitar a incerteza da deciso coletiva e da analise da experincia implica um
estado de esprito militante totalmente diferente daquele no qual somos habituados
social-democracia,o estalinismo e suas variantes esquerdistas.
O militante deve ser mais o mediador que permite aos grupos experimentar;aquele
que em qualquer situao experimenta os valores da experimentao . o mediador que
ajuda,reenvia aos grupos seus prorpios analises como sendo as analises e no
certezas,interpretaes entre outras.Estes educadores e militantes tm um grande papel
na valorizao do saber acumulado pelos prprios trabalhadores em seus locais de
trabalho.
Para Mothe, a valorizao do vivido de cada um no pode se fazer unicamente atravs
da ajuda do dircurso,mas atravs de seu prprio saber e tambematraves da valorizao
de sua prpria vida.
Como esta experimentao,com o papel destes militantes animadores,em lugar de
militantes profetas e/ou militantes soldados,poderia fazer avanar as esperiencias de
economia solidria no sentido do que Bernardo chama de aes coletivas e ativas ?
O papel da formao ,da educao popular,neste campo fundamental,desde que
provida destes instrumentos da autogesto.

, de inicio, pelas mos e pelo corao que se forga a autogesto


(Jef Ulburghs)

Jef Ulbrughs desenvolveu um intenso trabalho de animao de base numa perspectiva


autogestionaria.Vejamos suas idias, que so importantes para a idia de uma pedagogia
da autogesto.

Ulburghs fez parte do MAB* e suas idias foram apresentadas em seu livro Pour une
Pedagogie de lAutogestion(1980).Como diz na apresentao:Este livro nasceu de
uma longa experiencia.Anos de luta fizeram amadurecer um mtodo e construir uma
pedagogia para uma mudana social nova na perspectiva autogestionariaChamo esse
mtodo de indutivo.
Sua obra porta inspirao em tres pedagogos= Paulo Freire,Oskar Negt,educador e
sociologo da Escola de Frankfurt, e Joseph Cardjin,fundador da JOC.
Jef diz que muito se escreveu sobre a autogesto,mas muito pouco sobre sua pedagogia:
O movimento autogestionario,ao mesmo tempo, pedaggico e poltico, portador de
uma dinmica permanente,de um processo constante de evoluo em que o pensamento
e a ao permitem o aprofundamento do contedo ideolgico.O que revolucionrio
no o resultado,mas o processo para autogesto.
A experincia de autogesto na educao ,para Ulburghs,parte da idia de que A
autogesto se parece um canteiro de construo onde os operarios tm o direito de
experimentar.
A construo de um movimento pela autogesto requer animadores-educadores de base
muito bem formados.Na Blgica,desta necessidade surgiu uma Universidade
Operaria,com o objetivo de formar militantes de base prontos se tornarem
animadores na perspectiva de um socialismo autogestionario.
Neste campo , situa-se a tomada de conscincia da base (a conscientizao,segundo
Paulo Freire),como uma etapa importante de um novo tipo de sociedade democrtica: a
autogesto.Os dois pilares desta tomada de conscincia so, uma organizao
autnoma e a formao permanente.
Ulburghs fala de uma cultura operaria original relacionada a uma cultura indutiva:
sua linguagen concreta e direta rica em smbolos...sua luta inspira tambm a poesia,a
cano,a literatura,a religio popular,a filosofia e a poltica.Ela permite que uma nova
forma de vida e de pensamento possa se desenvolver.A aprendizagem,o modo de
adquirir uma cultura,seja por transferncia (deduo),seja por auto-libertao (induo)
determinante para seu contedo.
Deste modo, Ulburghs parte de trs mestres do pensamento indutivo:
Cardjin,fundador da JOC;
Paulo Freire,com seu mtodo da conscientizao atravs da qual o oprimido cria sua
prpria linguageme,esta linguagem um meio de dar um nome ao futuro e permite ao
oprimido de tomar em mos sua prpria vida.Ulburghs esteve algumas vezes com Paulo
Freire em genebra,quando este estava exilado.
Oskar Negt,educador sindical na Alemanha.
Tambm,podemos encontrar em Ulburghs,idias de Gramsci,no sentido e que as
formas de luta de base constituem uma luta cultural.
Qual a concepo de Ulburghs deste tipo de socialismo:
o atrativo da autogesto est no fato que a base mesma pode gerir coletivamente sua
prpria vida.Claro,os comits de base em todos os setores e em todos os nveis da
sociedade devem ser criados.A produo assim gerida pelos comits de trabalhadores
eleitos por um tempo determinado e para uma funo delimitada: os critrios de opo
so a competncia e a honestidade;estes comits so regularmente controlados,so
revogveis e substituveis.Eles representam os diversos ateliers,as varias categorias de
idade e cada tipo de trabalho.Os comits de fabrica estudam a repartico do
trabalho,controlam a formao dos trabalhadores assim como as grandes opes da
produo.Regularmente,convocam assemblias para prestar contas de suas aes.
Para Ulburghs,no setor da re-produo,a popuilao dever se organizar em comits
nos setores da sade,do bairro,dos esportes ,da formao.
Alm dos vrios setores,dever haver uma intercomunicao entre os diferentes tipos
de atividades sociais: um delegado do meio ambiente visitar um comit de fabrica e
vice-versa.A autogesto coerente e digna desse nome compreender de inicio um
primeiro escalo,os comits de base nos diferentes setores de produo e de re-
produo.Ems egundo lugar, os comits se interarticulam de uma forma horizontal e
intersetorial.Em terceiro lugar,eles se organizam nos diferentes biveis da
sociedade:regional,nacional e internacional.
Entre as condies da autogesto,Ulburghs coloca uma educao permanente:
O grande perigo da autogesto a possibilidade de concorrncia,por exemplo,entre
unidades de produo...A tentao corporativa pode opor os setores fortes aos setores
fracos.Para evitar este risco necessrio combinar a autogesto com uma formao
permanente.ao passo que a durao do trabalho diminui e que as tarefas duras so
repartidas ou feitas pelas maquinas,o tempo assim ganho pode ser utilizado para a
formao dos trabalhadores.
Esta abrange uma formao ao alcance de todos (facilitada pela computao),uma
qualificao tcnica pluriforme (para evitar o trabalho nico e mecanico),analises
polticas (para situar o objetivo da produo),e a formao moral (para favorecer a
solidariedade).
Portanto,conclue Ulburghs; A autogesto ,assim,impossvel sem uma formao
permanente que ponha o conhecimento fisposio de todos...Esta formao supe uma
dimenso poltica solidaria e global.
As experimentaes de autogesto mobilizam os trabalhadores para uma tarefa
concreta,e,assim,adquirem no processo e de modo indutivo uma formao para
autogesto.
Ulburghs sintetiza sua proposta:

-uma formao permanente:


1- formao tcnica: autogesto comea pelas mos;
2- formao social e politica: analises da sociedade;
3- formao cultural e moral:educao para solidariedade.

A proposta educativa de Ulburghs vai de encontro a linha estratgica de Mariategui,que


apresenta acima,ou seja ,os 3 eixos de uma proposta socialista de autogesto:
1- a socializao dos meios de produo;
2- a socializao poltica;
3- as relaes intersubjetivas,afirmao da solidariedade,um reencantamento da vida.

O teorico yugoslavo, Edvard Kardejl falava de um sistema de autogesto que


abrangia:
- o homem autogestor no trabalho;
- o homem autogestor na cultura;
- o homem autogestor na vida social em geral.

Finalmente, um movimento autogestionario de base requer trs elementos:


1- um movimento de base com um numero grande de grupos de
base com ao em diversos setores da sociedade;
2- um campo de formao de animadores de base: tipo
Universidade Operaria;
3- um movimento de animao poltica que conscientiza a
base,coordena as lutas e inspira a autogesto por suas idias,seus
mtodos,sua estratgia e seu estilo de vida.
A rede Internacional do MAB articulava seminrios internacionais para troca de
experiencias que mostravam exemplos concretos de autogesto que
inspiravam,motivavam e formavam diretamente os trabalhadores.

Ainda a Comuna : a lio de um Communard.

Finalizamos com longa citao de um ensaio recente,de Joo Bernardo,que nos


traz o exemplo histrico do communard Louis-Eugne VARLIN:
De cada vez as lutas sociais colocam num patamar superior, mais amplo e mais
complexo, problemas que nos seus traos fundamentais permanecem identicos, porque
continuam sem soluo.O encardenador Varlin foi uma das figuras mais lcidas e mais
corajosas do movimento operrio,aos 25 anos de idade secretario da seo francesa da
AIT,um dos redatores dos estatutos da Internacional dois anos mais tarde,e fuzilado
com 32 anos no derradeiro dia da Comuna de Paris,que ele servia enquanto membro do
Comit Central da Guarda Nacional e delegado s Finanas,depois s Subsistncias e
Intendncia.Um ano antes da insurreio que daria origem Comuna, Varlin explicou
que uma poltica socialista que no transformasse profundamente as relaes de
trabalho s levaria instaurao de um novo autoritarismo:
Se no quisermos reduzir tudo a um Estado centralizador e autoritrio, que
noemaria os diretores das fabricas, das manufaturas,das agencias de distribuio, os
quais por sua vez noemariam os subdiretores,os contramestres,etc,acabando assim por
se organizar hierarquicamente o trabalho de alto a baixo e deixando-se o trabalhador
como uma mera engrenagem inconsciente, sem liberdade nem iniciativa, se no
quisermos nada disto temos que admitir que os prprios trabalhadores devem dispor
livremente dos seus instrumentos de trabalho Possi-los ,com a condio de trocarem os
seus produtos ao preo de custo, para que haja reciprocidade de servios entre os
trabalhadores das diferentes especialidades(...)Para isso no bastam alguns homens
inteligentes,dedicados ,enrgicos
E,Varlin toca na questo principal:
sobretudo necessrio que os trabalhadores,convocados assim para trabalhar em
conjunto,livremente e em p de igualdade, estejam j preparados para a vida
social.(...)Pois bem,as sociedades operarias,quaisquer que sejam as formas em que hoje
existam,tm j o imenso mrito de habituar os homens vida em sociedade e de os
preparar assim para uma organizao social mais ampla.(...)Mas as sociedades
corporativas (de resistncia,de solidariedade,sindicatos) so dignas do nosso
encorajamento e da nossa simpatia porque so elas que formam os elementos naturais
da edificao social do futuro.So elas que podero finalmente transformar-se em
associao de produtores.So elas que podero pr em funcionamento a utensilagem
social e a organizao da produo.
( L.-E.Varlin.Les Socits Ouvrires, La Marseillaise,numero 81,11 maro
1871,citado em J.Rougerie(1968).Vide Bibliografia}.

E que, A associao no tem por objetivo organizar os trabalhadores para


sustentar uma luta contra os detentores do capital.Ela visa mais alto.Ela se prope a
realisar a emancipao completa do trabalho,conduzindo os trabalhadores posse dos
instrumentos sociais e os elementos naturais indispensveis produo(Le Commerce,
29 aot 1869-citado em Michel Cordillot).
Cordillot nos traz uma reflexo fundamental sobre a praxis de varlin:
O exame que fizemos da atitude de Varlin ilustra tambm tudo o que pode
existir de reducionismo na postura de abordar a historia operaria por alto, em termos de
debates entre correntes ideolgicas ou entre lideres de tendncias,recusando de ver que
o essencial est menos nos congressos,mesmo que tenham sua importncia, e mais na
pratica cotidiana dos militantes os mais diretamente envolvidos.e conclue sobre Varli:
Nem marxista nem bakunista,Varlin acima de tudo a incarnao do
movimento operrio de Paris.sem duvidas,neste sentido,Daniel Moth Ed evedor das
idias de Eugene varlin,com sua idia da autogesto-gota-a-gota.
Segue Bernardo: Ao apresentar a gesto direta dos organismos de resistncia
como o principal meio para aprender a gerir a sociedade,Varlin salientou o nexo
existente entre a alienao da conduo das lutas e a formao de uma camada de
tcnicos e de administradores que viria a converter-se numa nova classe dominante
capitalista.

Conclue,ento,Bernardo:
Decerto impossvel edificar o socialismo em pequenas esferas isoladas.Mas
aqui a questo consiste em INSTAURAR NESSAS PEQUENAS ESFERAS
RELAES SOCIAIS E DE TRABALHO QUE CONSTITUAM UM
APRENDIZADO PRATICO DE SOCIALISMO,E QUE POSSAM LEVAR ADIANTE
A EXPERIENCIA.A forma da organizao determina o contedo poltico da
organizao. este o dilema em que nos encontramos hoje, e enquanto os trabalhadores
no o resolverem o sistema de explorao capitalista continuar em vigor.
Enfim, permanecer na nostalgia de velhos ciclos revolucionrios,esperando O
Grande Dia da Revoluo,ou,seu contrario,limitar-se as linhas de menor
resistencia,as lutas tticas sem horizonte estratgico, ambas so polticas que esto
fadadas a possveis fracassos.
A Idia de experimentao social foi tratada por Pierre Naville,em sua obra
intitulada Le temps, La techhinique, lautogestion ( 1980),matria de uma entrevista
para a Revista Critique Socialiste(1979).
Para Naville o que experimental o que no natural,espontaneo.Nos cabe
descobrir as formas de experimentao que possam ser conduzidas de forma
cientifica,pelo mtodo de ensaios e erros,isto ,que possamos corrigir,ou abandonar,ou
melhorar.Desta forma,a experiemntao pode torna-se democrtica.Um poder
socialista experimental deve ser democraticoo,traar hipteses e buscar verifica-
las.Experimentar muito diferente de criar o caos.Devemos buscar os modos de
experimentao diferentes segundo os setores emm jogo,buscar os domnios
prioritrios..Para mim,os socialistas devem comear pelos setores da produo,do
trabalho.A experimentao social no pode nem deve suprimir os conflitos sociais,as
lutas entre classes e grupos.
Experimentar significa,primeiro,poor um problema corretamente,de tal forma que
se posssa ter uma soluo.E,para isto,precisamos de mtodo, e justamente um mtodo
experimental.
Autogesto significa um principio,no uma regra,uma instituio ou uma
soluo.Significa que um objeto social deve se determinar a si mesmo..Para determinar
as formas da autogesto segundo certos nveis,ou conjuntos,deve-se justamente realizar
experimentaes sociais.Por exemplo, o acontecimento LIP e numerosos conflitos nas
empresas produtivas hoje,so tipos de experincias sociais que abriram as vias uma
reflexo sobre a autogesto.
E conclue Naville : O campo educativo e escolar foi sempre um terreno de
experimentao, de inovao, de contestao; um dos campos principais em que a
experimentao para autogesto deve se exercer.
Para concluir, enfim,vejamos,ento,como Daniel Moth aborda a questo da
EXPERIMENTAO AUTOGESTIONRIA.

Moth traa como objetivo central ver como os locais de competncia dos atores
podem se tornar locais de aprendizagem da gesto coletivaInicialmente esclarece que
O conceito de aprendizagem mais amplo que o profissional...tratando-se de
aprendizagens mltiplas..As aprendizagens dos trabalhadores dependem da natureza da
funo e da tecnologia de uma parte, e da estrutura de organizao ,de outra
parte.Mas,alem destas aprendizagens, os trabalhadores tm um campo de aprendizagem
mais rico,,que decorre de aprendizagens de comportamentos sociais,que lhes permitem
recusar ,combater e ou aceitar as estruturas de organizao.
H uma grande diferena se so estruturas hierrquicas autoritrias ou estruturas
democrticas,formadas por grupos autnomos que discutem ,analisam,decidem,etc.
As aprendizagens so baseadas essencialmente sobre praticas que pem os
operrios em situaes concretas e que lhes incitam buscar respostas a estas
situaes. Assim,A aprendizagem uma atividade que se efetua no nvel do
fazer,conclue Moth.
E que,desta forma, a autogesto depende de que os trabalhadores estejam em
organizaes as mais participativas.
Moth cita Rosa Luxemburgo: Para parafrasear Rosa Luxembourg,diremos que
funcionandoo coletivamente que as massas aprendem se autogerir;no h outro
meio de aprender a cincia.Sua educao se faz quando elas passam ao.
Moth traas algumas linhas sobre a relao militncia e pesquisa:
Os pesquisadores no devem testemunhar sua afeio ao mundo do trabalho
pela apologiua sistemtica da luta militante problemas dos sindicalistas- ,mas por
uma analise critica das experincias sindicais.
A aprendizagem pelo lado sindical deveria se efetuar por uma ocupao
sistemtica do terreno da experimentao de modo que essa enriquea seu ponto de
vista e possa se inserir em sua estratgia(...).Deste modo, poderamos achar um terreno
favorvel de colaborao entre pesquisadores,sindicalistas,educadores e tambm
trabalhadores que participam destas aes
A partir da experincia francesa,Mothe defende ,Equipes,formadas por
universitrios,sindicalistas,operrios,pesquisadores,educadores,ergonomosd,j
experimentaram este caminho,o da pesquisa-ao nas empresas.
Por fim,D.Moth entra no campo das empresas de autogesto:
Se relacionamos os procedimentos experimentais s empresas de autogesto,a
experimentao autogestionria consiste em enriquecer seu patrimnio de fatos, de
praticas, a partir dos quais o mundo sindical e cientifico possam refletir,modificar seus
procedimentos,afirmar suas dinmicas e constituir deste modo todo um arsenal de
tcnicas autogestionarias que lhes so prprias.
A experimentao dever ser considerada como um procedimento prprio ao
funcionamentoo autogestionario; os procedimentos experimentais nas empresas
consistem a por em movimento temporariamente novas organizaes,novas
tcnicas,novas divises de tarefas,novas relaes interpessoais.
O novo funcionamentoo dever verificar ou INFIRMER as expectativas,as
hipteses e as esperanas que foram formuladas pelos autogestionarios.
Trata-se,assim,de utilizar novos procedimentos que contenham uma certa parte
de incertezas,mas que seroo auto-controlados durante seu desenvolvimentoo.No se
trata de quaisquer tipos de experincia efetuada por profissionais da
experimento,mas,no campo da autogesto,dee xperiencias em que os
experimentadores,em particular os atores,objetos eles mesmos da
experincia,participem no controle e na dinmica da experincia.
A experimentao permitir ir alm da simulao ao proceder por passos
sucessivos,por ensaios e erros,atravs do estabelecimento de um dialgo em que o
conjuntoo dos atores ter a possibilidade concreta de participar,porque veremos os
efeitos concretos no terreno da ao.
o que temos chamado,nas atividades dos CFES,de Espao Publico
epistemologico e tico,a partir de idias formuladas por Maria Clara Bueno Fischer
,partindo das pesquisas do Grupo Frances de ergologia animado por Yves Schwartz,
grupo que o prprio Moth cita em seu livro Autogestion et Conditions de
Travail(1976),o LEST ( laboratoire dconomie ET de sociologie Du travail,de
Aix-em-Provence).Trata-se do Dispositivo de 3 Polos.*
Seguindo com Moth,A experimentao coletiva deve ser vista como um
instrumento,uma tcnica necessria ao funcionamento autogestionario.
Os obstculos esta forma de experimentao,o sabemos,vm de vrios lugares
,e em primeiro lugar dos poderes estabelecidos.Aqui,Mothe faz referencia aos
aparatos dos sindicatos e dos partidos.
Sobre a Frana,Mothe diz de forma antecipatria de varias experincias que
iriam surgir nos anos 90, ( sua obra data de dezembro 1980 ):
As experimentaes nas empresas so difceis de realizar porque o patro que
detm o poder e no os sindicatos.
Mas porque no experiemntar estes funcionamentos coletivos no interior de
instituies perifricas controladas pelos sindicatos,nos organismos em que as
Comises de Empresa se tornaram patres: as cantinas,os rgos de esportes,de
lazer,os centros culturais,etc;em todas as municipalidades conquistadas pela esquerda
e nos servios municipais que ela controla ?,pergunata-se D.Mothe.
O que diria e nos disse ao nos visitar no Frum das Cidades e participar do
Frum de economia Solidaria de SP,quando nos visitou,das posibilidades abertas pelas
aes no campo da economia solidaria,das empresas recuperadas para autogesto?
J vimos,paginas acima como Moth aborda qual o perfil do militante desta
experimentao de autogesto,diramos nos cursos dos CFES,o papel do educador,
que Mothe chama de espirito experimental

Portanto, as experimentaes so o campo estrategico, contudo, somente se


constituem um aprendizado pratico de novas relaes de trabalho , articuladas com
outros campos de lutas do sujeito plural, que Meszaros chama de produtores
livremente Associados.
No inicio era a Ao! Dizia-nos Rosa Luxemburgo.E Marx,em 1871,respondia em
carta a Kugelman,quando este questionava a oportunidade da insurreio da Comuna de
Paris porque a derrota privaria mais uma vez os operrios de seus chefes:
A desmobilizao da classe trabalhadora teria sido uma desgraa maior que a
perda de uma quantidade de chefes (virgulas de Marx).
Yvon Bourdet ,analisa estas palavras de Marx ,nos entido de que E impossvel
insistir mais do que fez Marx sobre as caapcidades de auto-emancipao da classe
operaria que pode, no somente auto-dirigir seu combate,mas auto-dirigir a
produo,que o meio mais radical de suprimir a alienao e a explorao.Deste modo,
nesta dialtica, a realizao do objetivo final inseparvel da execuo dos meios
especficos para alcana-lo.
A autogesto das lutas uma condio da autogesto da produo e
reciprocamente. certo que esta conquista da autonomia ativa no pode ser que
progressiva e impura,tal como Marx explicou a Bakunin,mas a tarefa do revolucionrio
consiste em esclarecer esta tarefa.
Como disse Marx:
Hic Rhodus, hic salta ! Aqui est a rosa ,aqui temos que danar !

E, retomando a Rosa :

As massas devem aprender a usar o poder usando o poder , no h outro modo.


Sua educao se faz quando elas passam ao!

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BIBLIOGRAFIA
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388 pginas
( Concluses, 2 verses= 21 paginas)
= 367 paginas

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