Tutela Provisória
Tutela Provisória
Tutela Provisória
Tutela Provisria
Para explicar o que vem a ser o instituto da tutela provisria de forma
simplria, nada melhor do que trabalhar em cima de um exemplo totalmente
hipottico e que acontece, infelizmente, frequentemente na prtica.
Supondo que voc um renomado advogado de um dos diversos escritrios
de advocacia que temos no nosso vasto territrio brasileiro e certo dia adentra
uma senhora com seus noventa anos e comea a lhe relatar o seguinte caso
a voc:
Doutor, tenho problema de sade, no qual necessito de uma medicao para
continuar sobrevivendo. No possuo condies financeiras para adquirir
mensalmente os remdios e o SUS (Sistema nico de Sade) negou o
fornecimento. Por favor, me ajude, se no comear a tomar o medicamento o
quanto antes certo que falecerei dentro de alguns dias.
O que voc faria?
O sistema judicirio brasileiro falido, inclusive algo incontroverso, no
venham me dizer que no pois algo que qualquer pessoa tem cincia.
O lapso de tramitao de um processo enorme, inclusive possvel contar
em uma mo quantos processos duram menos de meio ano entre a
propositura da petio inicial at a prolao da sentena.
A tutela provisria busca acima de tudo, no atual cenrio judicirio brasileiro,
confrontar o lapso temporal de tramitao de um processo.
Nas lies de Humberto Theodoro Jnior, a tutela provisria uma "tcnica
de sumarizao, para que o custo da durao do processo seja melhor
distribudo, e no mais continue a recair sobre quem aparenta, no momento,
ser o merecedor da tutela" ("Curso de Direito Processual Civil - Volume I". 57
ed. Rio de Janeiro: GEN | Editora Forense, 2016. P. ).
O que o grande mestre Humberto Theodoro Jnior busca transmitir em sua
brilhante obra que a tutela provisria nada mais do que um instituto do
direito brasileiro que busca antecipar um provimento jurisdicional ou
assegurar o direito de uma parte.
A tutela provisria dividida em tutela provisria de urgncia e tutela da
evidncia, enquanto na primeira busca-se inibir qualquer dano que a demora
na prestao da tutela jurisdicional possa causar, seja por via asseguratria
(tutela cautelar) ou via antecipatria (tutela antecipada), a segunda busca
conceder um direito incontroverso da parte.
Novamente, a fim de frisar o que cada uma, de forma simples, a forma de
antecipao da deciso de mrito ou tcnica asseguratria de um direito.
A importncia desse instituto enorme, sobretudo porque garante a
dignidade da pessoa e outros diversos direito fundamentais assegurados pela
nossa Constituio Federal de 1988.
Ainda no entendeu? No se preocupe, existem muitos operadores do direito
que sequer fazem ideia do que seja e como se aplica na prtica o instituto!
O processo civil divido em quatro fases, notadamente postulatria,
saneamento, instrutria e decisria, e dever obedecer necessariamente essa
ordem, sob pena de nulidade. Ora, lembram daquele caso meramente
hipottico da senhora com problema de sade? Ento, imagine essa senhora
ter que esperar todo esse tramite para conseguir o remdio, certo que ela
falecer no curso do processo dependendo se o lapso temporal daquela
demanda judicial for grande, at porque, caso no venha a falecer, o quadro
de sade poder agravar muito!
A tutela provisria, no exemplo, demonstra-se na concesso dos
medicamentos sem a necessidade de tramitao de todas as fases do
processo, isso, sem qualquer prejuzo de posterior tramitao, portanto,
buscando evitar o prejuzo da parte de modo a antecipar o provimento
jurisdicional final ou de um futuro provimento jurisdicional o qual ser
assegurado, podendo ser revogado e modificado a qualquer tempo contato
que no curso do processo.
Importante destacar que se d por meio de cognio sumria, ou seja, no h
cognio exauriente na deciso do juiz, em outras palavras, no faz coisa
julgada material, at porque violaria garantias constitucionais, notadamente o
devido processo legal (art. 5, inc. LIV, da Constituio Federal Brasileira).
Tutela da Evidncia
Art. 311. A tutela da evidncia ser concedida, independentemente da
demonstrao de perigo de dano ou de risco ao resultado til do processo,
quando: I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto
propsito protelatrio da parte; II - as alegaes de fato puderem ser
comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento
de casos repetitivos ou em smula vinculante; III - se tratar de pedido
reipersecutrio fundado em prova documental adequada do contrato de
depsito, caso em que ser decretada a ordem de entrega do objeto
custodiado, sob cominao de multa; IV - a petio inicial for instruda com
prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que
o ru no oponha prova capaz de gerar dvida razovel. Pargrafo nico. Nas
hipteses dos incisos II e III, o juiz poder decidir liminarmente.
Humberto Theodoro Jnior esclarece que "A tutela da evidncia no se funda
no fato da situao geradora do perigo de dano, mas no fato de a pretenso
da tutela imediata se apoiar em comprovao suficiente do direito material da
parte" (THEODORO, Humberto. Jnior. "Curso de Direito Processual Civil -
Volume I". 57 ed. Rio de Janeiro: GEN | Editora Forense, 2016. P.689)
Isso significa dizer que, enquanto na tutela provisria fundada na urgncia, a
necessidade de demonstrao de perigo de dano ou risco ao resultado til do
processo requisito indispensvel, aqui, na tutela provisria fundada na
evidncia, apenas a demonstrao do fumus boni juris, juntamente com um
dos incisos do art. 311, o que nada mais so do que requisitos alternativos,
autoriza a concesso de tal medida.
Art. 311. I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto
propsito protelatrio da parte;
O requisito alternativo constante nesse inciso o dolo da parte, de modo a,
vez que demonstrado o fumus boni juris e cumulando os dois requisitos,
possvel a concesso pautando-se no referido inciso.
Um observao importante que fao ao inciso supracitado que no
especifica qual parte que agir com dolo, de modo a deixar margem a
compreenso de que, tanto requerente, quanto requerido, podem ser
desfavorecidos com a tutela provisria da evidncia.
Art. 311. II - as alegaes de fato puderem ser comprovadas apenas
documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos
ou em smula vinculante;
Vejam, para a concesso da referida tutela necessrio que as alegaes
feitas sejam comprovadas via documento, em outras palavras fumus boni
juris, cumulando com a existncia de tese firmada em julgamento de casos
repetitivos ou em sumula vinculante.
Fao uma observao quanto ao primeiro requisito, busca-se restringir a
comprovao das alegaes fticas por via documental a fim de que se tenha
uma proteo sumria e imediata para o direito, a qual vem a ser comprovada
de forma satisfatria por via documental, de modo a no inibir a comprovao
por outros meios, sobretudo porque em regra a tutela da evidncia
concedida antes do trmino da instruo probatria do processo.
Ao meu ver, o inciso II serve para maior favorecimento do requerido, no
obstando que seja aplicado em favor do requerente.
Art. 311. III - se tratar de pedido reipersecutrio fundado em prova
documental adequada do contrato de depsito, caso em que ser decretada a
ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominao de multa;
No Cdigo de Processo Civil de 1973 existia um procedimento especial,
medida liminar, que visava o depsito de um bem mvel, com a vigncia do
novo cdigo a referida medida foi incorporada no procedimento comum, de
modo que a principal funo do inciso III do art. 311 suprir essa mudana.
Em suma, o referido inciso serve especificadamente tutela da pretenso
pautada no contrato de depsito.
Novamente, aqui no necessrio a demonstrao do periculum in mora,
apenas o fumus boni juris, a qual resta demonstrada por meio dos
documentos carreados ao processo, para sua concesso.
Art. 311. IV - a petio inicial for instruda com prova documental suficiente
dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o ru no oponha prova
capaz de gerar dvida razovel.
O ltimo inciso do art. 311 destina-se exclusivamente em favor do requerente
da demanda. Em suma, quando a exordial carrear documentao suficiente
dos fatos constitutivos do direito do requerente, no tendo o requerido
causado dvida razovel acerca do fumus boni juris do requerente, ser
concedida a tutela fundada na evidncia.
A exemplo, esses tempos no trabalho peguei um processo curioso, sendo que
apliquei o referido inciso. Um advogado postulava em causa prpria contra
uma rede de ensino por ter concludo sua especializao em direito de
famlia, porm, mesmo aps sua defesa de questionrio e defesa de trabalho
de concluso de curso, a rede de ensino no emitiu seu ttulo, sendo que j
havia pago o curso integralmente.
Determinei a citao da parte adversa, inclusive para se manifestar sob a
tutela provisria da evidncia e, de fato, apliquei o disposto no art. 311, inciso
IV, do CPC, a parte requerida no trouxe provas suficientes a, em sede
cognitiva, deixar dvidas quanto a qualquer ponto da especializao, seno a
omisso da rede de ensino quanto emisso da certificao.
Por fim, gostaria de tratar acerca do pargrafo nico do art. 311 do CPC.
Art. 311. Pargrafo nico. Nas hipteses dos incisos II e III, o juiz poder
decidir liminarmente.
O porqu de eu querer tratar sobre esse pargrafo com vocs para deixar
claro que a tutela da evidncia no necessariamente ser concedida em
carter liminar, podendo ser concedido incidentalmente at o final da
instruo probatria processual, em especial nos casos dos incisos I e IV.
Pela simples leitura dos incisos I e IV e II e III, de forma separada, cedio a
necessidade do contraditrio no segundo caso.
Concluso
O presente artigo buscou apresentar e explicar o instituto da tutela provisria
aos que no a conheciam e, dirimir qualquer dvida aos que j tinham uma
base sobre ela. um instituto do direito processual brasileiro que merece
uma ateno em especial por todos os juristas.
A atual falncia que enfrentamos no Poder Judicirio Brasileiro no deve
recair de forma alguma sobre o direito das partes e menos ainda sobre as
prprias partes. A situao se deu por toda uma evoluo de um contexto
social pautado na litigiosidade, na ausncia de dilogos e na esperana que a
palavra de um Juiz teria uma fora maior s palavras das prprias partes
sobre o conflito de interesses existentes entre elas, palavras e decises que
as acompanharo para o resto de suas vidas.
Desde a reforma de 1994 na Lei n 5.869/73, a tutela provisria vem sendo
utilizada como forma de afrontar a falncia do Poder Judicirio, notadamente
pelo lapso temporal (in) comum de tramitao de um processo jurisdicional,
visando evitar prejuzos parte hipossuficiente de um direito.
At que as formas de resolues adequadas dos conflitos sofrerem alteraes
culturais no modo de pensar dos litigantes, de modo a optar pela conciliao,
mediao ou arbitragem, a tutela provisria permanecer como um refgio
para aqueles que so considerados hipossuficientes de um direito, contra o
sistema judicirio falido que temos.
Aps a superao da falncia, o tutela provisria continuar sendo utilizada,
porm, deixando a viso de refgio de lado e passando a ser encarada como
um instituto de cautela processual.