Leach As Ideias de LeviStrauss0001
Leach As Ideias de LeviStrauss0001
Leach As Ideias de LeviStrauss0001
DE LVI-STRAUSS
Edmund Leach
um dos mais
complexidade"
de que se reves-
Escrito
ao leitor as bases
Edmund Leach
EDITORA
CULTRIX
mestres da modernidadejcultrix
Ttulo do original:
LVI-STRAUSS
Publicado na srie Fontana Modern Masters,
dirigida por Frank Kermode
Copyright
NDICE
2." edio
primeira
edio
deste livro
Editora
da Universidade
foi co-editada
COIll
de So
Paulo
li
1.
fi)
O Homem
23
37
4.
53
6.
Palavras e Coisas
As Estruturas Elementares do Parentesco
89
~
(])
7.
'--../
Notas
Referncias
MCMLXXVIl
Direitos de traduo para a lngua portuguesa
adquiridos com exclusividade pela
EDITORA CUL TRIX LTDA.
Rua Conselheiro Furtado, 648, fone 278-4811, S. Paulo,
que se reserva a propriedade literria desta traduo
Impresso no Brasil
Printed in Brasil
79
105
113
Leituras Adicionais
115
118
Agradecimentos
119
1.
Claude
Lvi-Strauss,
O HOMEM
Professor
de Antropologia Social no
unnime, o mais notvel
expoente dessa particular atividade acadmica que pode ser
encontrada em qualquer parte, fora do mundo de fala inglesa;
mas os especialistas que a si prprios se intitulam antroplogos
sociais so de duas espcies.
O prottipo da primeira espcie
foi Sir James Frazer (1854-1941),
autor de The Golden Bough
(O Ramo Dourado).
Era um homem de monumental erudio
que no tinha um conhecimento direto da vida dos povos primitivos a cujo respeito escreveu.
Frazer esperava descobrir
verdades fundamentais sobre a natureza da psicologia humana
comparando os detalhes da cultura humana num mundo observado em vasta escala.
O prottipo
da segunda espcie foi
Bronislaw Malinowski
(1884-1942),
nascido na Polnia mas
naturalizado ingls, o qual passou a maior parte de sua vida
acadmica analisando os resul tados das pesquisas que pessoalmente realizara, num perodo de quatro anos, numa nica e
minscula aldeia da longnqua Melansia.
O seu propsito era
mostrar como essa extica comunidade "funcionava"
como um
sistema social e como os seus membros individuais viviam suas
vidas, do bero sepultura.
Malinowski estava mais interessado
nas diferenas entre culturas humanas do que em sua semelhana global.
A maior parte dos que atualmente se intitulam antroplogos sociais, tanto na Gr-Bretanha
como nos Estados Unidos,
afirmam ser "funcionalistas";
de um modo geral, so antroplogos no estilo e tradio de Malinowski.
Em contraste, Claude
Lvi-Strauss um antroplogo social na tradio de Frazer mas no ao seu estilo.
A sua preocupao bsica consiste em
intelectuais,
estudiosos da literatura,
da poltica, da filosofia
antiga, da teologia e da arte. A .finalidade deste livro for~ecer
algumas indicaes sobre os motivos que c?ncorreram para ISSO.
Mas, primeiro, devo declarar um preconceito pessoal.
Eu fui um discpulo de Malinowski e ainda sou, no fundo,
um "funcionalista",
conquanto reconhea as limitaes da teoria
peculiar a Malinowski.
Embora tenha empregado, ocasionalmente os mtodos "estruturalistas"
de Lvi-Strauss para esclarecer caracteristicas particulares de determinados sistemas culturais a diferena entre a minha posio geral e a de Lvi-Strauss
muito profunda.
Essa diferena de ponto de vista certam~nte
se manifestar ao longo das pginas que se seguem. A minha
principal tarefa proceder a uma descrio do~ mtodos e ,opinies de Lvi-Strauss, e no oferecer ao leitor comentanos
pessoais; mas no posso fingir que sou um observador neutro
e desinteressado.
O meu interesse pelas idias de Lvi-Strauss e no pela
sua biografia mas, como a sua bibliografia, a partir de 1936,
j inclui dez livros e mais de 100 artigos substanciais, no h
dvida de que tenho uma formidvel tarefa pela frente. Ningum
poder analisar essa avalancha sem introduzir algumas distor~es
e eu vou tornar as coisas ainda piores ignorando a cronologia.
Comearei pelo meio e dai trabalharei ora para trs, or.a. para
diante. Existe uma justificao pessoal para essa excentricidade
que precisa ser explicada.
Podemos considerar os escritos de Lvi-Strauss como uma
estrela de trs pontas irradiando em torno do livro autobiogr~fico, etnogrfico e itinerante Tristes Tropiques (195?). As tres
pontas da estrela seriam ento rotuladas: (1), teoria de parentesco, (2) lgica do mito e (3) teoria de classificao primiti~a.
Em minha opinio tendenciosa, a primeira destas, que tambem
a mais antiga, a de menor importncia.
Isto um juzo. de
valor de que o nosso autor no compartilha.
Em seus escritos
ulteriores, Lvi-Strauss reporta-se freqentemente
aLes
Structures lmentaires de Ia parent (As Estruturas Elementare~ .do
Paren tesco) (1949) como se esse livro fosse um marco decisivo
na histria da antropologia social e, recentemente, ele publicou
uma edio substancialmente
revista (1967), a qual inclui um
II
1932-34
1934
1934-37
1934?
1936
1938-39
12
A.
Cronologia
da Vida de Claude
1939:40
1941
1945
Lui-Strauss a
Acontecimento
Nasce na Blgica (Bruxelas) .
Vive com seus pais (o pai era um artista) nos arredores de
Versalhes.
Estudante na Universidade de Paris, onde se forma em Direito e faz concurso para professor de Filosofia. Suas leituras
incluam as obras dos "mestres da Escola Francesa de Sociologia" presumivelmente, Saint Simon, Comte, Durkheim
e Mauss. b
Trabalha como professor num lyce.
Graas ao patrocnio de Celestin Bougl, c Diretor da cole
Normale Superieure, -lhe oferecido um cargo de Professor
de Sociologia na Universidade de So Paulo, Brasil.
Professor de Sociologia da Universidade de So Paulo. d Durante esse perodo, parece ter voltado Frana em numerosas
ocasies.
Realizou tambm vrias visitas breves ao interior
do Brasil, para se dedicar a investigaes etnogrficas.
No
final do perodo, totalizara uns cinco meses de experincias
de campo.
L em ingls Primitive Society (1920), de Lowie ; foi o seu
primeiro contato com uma obra antropolgica, escrita por
um especialista na matria. A traduo francesa do livro de
Lowie, por E. Metraux, s seria publicada em 1935.
Primeira publicao antropolgica: um artigo de 45 pginas
sobre a organizao social dos ndios Bororos.
Tendo se demitido do servio da Universidade de So Paulo,
obteve apoio financeiro do Governo francs para uma expedio mais extensa ao Brasil Central.
Os detalhes dessa
expedio so difceis de determinar.
Inicialmente, Lvi-Strauss teve dois companheiros cientficos empenhados em
outras espcies de pesquisa. O grupo deixou sua base em
Cuiab, em junho de 1938, e atingiu a confluncia dos rios
Madeira e Machado no fim desse ano.
Segundo parece,
1946-47
1948
1949
1950
1950
1952
1953-60
1955
1958
1959
1960
1962
1964
1967
1967
1968
13
T
c
Um outro fato biogrfico que se reflete em numerosos escritos de Lvi-Strauss, notadamente na Introduo (."Ouverture")
e nos ttulos intricadamente
arranjados dos captulos de Mythologiques, ele ser um msico talentoso.
A Nota b do Quadro A merece maior desenvolvimento.
Em
Tristes Tropiques (1955), Lvi-Strauss descreve a Geologia, a
Psicanlise e o Marxismo como suas "trs amantes", deixando
muito claro que a Geologia foi o seu primeiro amor.
Reverterei Geologia dentro de instantes mas, primeiro,
analisemos sucintamente o seu Marxismo. O prprio Lvi-Strauss
observou que:
"O Marxismo parecia-me evoluir no mesmo sentido da geologia
e da psicanlise ... Todos os trs mostravam que o entendimento
consiste na reduo de um tipo de realidade a um outro; que a
verdadeira realidade nunca a mais bvia das realidades ...
em todos esses casos, o problema o mesmo: a relao ... entre
a razo e a percepo sensorial. .. " (W. W.: 61) .
14
15
do Existencialismo
do que
sobre
Os pressupostos
dos antroplogos
do sculo XIX eram
proto-histricos
evolucionistas ou difusionistas, segundo os
casos.
Mas o sentido de tempo de Lvi-Strauss geolgico.
Embora parea, como Tyler e Frazer, estar interessado nos costumes de povos primitivos
contemporneos
somente porque
pensa que eles so, em certo sentido, primevos, Lvi-Strauss no
argumenta, como Frazer teria feito, que o que primevo
16
17
inferior.
Numa paisagem, rochas de imensa antiguidade podem
ser encontradas a par de sedimentos de uma origem relativamente recente mas. nem por isso argumentamos que umas so
inferiores s outras.
O mesmo ocorre com as coisas vivas (e,
por implicao, com as sociedades humanas):
Por vezes... de um lado e do outro de uma fenda oculta, encontramos duas plantas verdes de diferentes espcies. Cada uma
delas escolheu o solo que lhe convm; e apercebemo-nos de que,
dentro da rocha, esto duas amonitas, uma das quais tem involues menos complexas que a outra.
Compreendemos, num
relance, que isso significa uma diferena de muitos milhares de
anos; o tempo e o espao misturam-se, de sbito; a diversidade
viva desse momento justape uma idade outra e perpetua-as
(W.W.: 60).
Essa busca das propriedades fundamentais um tema constante em todos os escritos de Lvi-Strauss mas no se trata,
meramente, de uma questo de curiosidade de antiqurio.
O
ponto , outrossim, que tudo o que fundamental e universal
deve constituir a essncia da nossa verdadeira natureza e podemos utilizar uma compreenso dessa natureza para nos aperfeioarmos:
... a segunda fase do nosso empreendimento que, embora no
nos apeguemos a elementos de qualquer sociedade, em particul.ar,
fazemos uso de todos eles para distinguir os princpios da vida
social que podem ser aplicados com o objetivo de reformar os
18
Como esta passagem nos mostra, Lvi-Strauss um VISlQnrio e o problema com os que tm vises que acham muito
difcil reconhecer o mundo prosaico e trivial que o resto dos
mortais v sua volta. Lvi-Strauss empenha-se na sua antropologia porque concebe os povos primitivos
como "modelos
reduzidos" do que essencial em toda a humanidade; mas os
nobres selvagens resultantes, maneira de Rousseau, habitam
um mundo muito distante da imundcie e da misria que o
terreno normalmente pisado pelo antroplogo de campo.
Isto importante.
Um estudo cuidadoso de Tristes Tropiques revela que, em todo o curso de suas viagens brasileiras,
Lvi-Strauss nunca pde permanecer num lugar por mais de
algumas semanas de cada vez e jamais esteve em condies
de cenversar facilmente com qualquer dos seus informantes nativos, na linguagem nativa deles.
Existem muitas espcies de investigao antropolgica mas
o trabalho intensivo de campo, no estilo de Malinowski, empregando o vernculo, que hoje a tcnica normal de pesquisa
utilizada por quase todos os antroplogos sociais anglo-americanos, um procedimento
inteiramente
diferente da cuidadosa
mas menos abrangente descrio de maneiras e costumes, baseada
no uso de informantes e intrpretes especiais, que foi a fonte
or}g!nal para a maioria das observaes etnogrficas em que
Lvi-Strauss, como os seus predecessores
frazerianos, preferiu
confiar.
perfeitamente
verdade que um antroplogo experimentado, visitando uma "nova" sociedade primitiva pela primeira
vez e trabalhando com a ajuda de intrpretes competentes, poder ser capaz, aps uma estada de alguns dias, apenas, de
desenvolver em sua prpria mente um "modelo" razoavelmente
abrangente de como funciona o sistema social; mas tambm
ve~dade que, se permanecer a seis meses e aprender a falar
a linguagem local, muito pouco restar desse "modelo" original.
Com efeito, a tarefa de compreender como o sistema funciona
19
21
2.
Lvi-Strauss distinguido entre os intelectuais do seu prprio pas como o expoente mximo do "Estruturalismo", uma
palavra que passou a ser usada como se denotasse toda uma
nova filosofia de vida, em analogia com "Marxismo" ou "Existencialismo". O que e o que pretende o "Estruturalismo"?
O argumento geral formulado mais ou menos nos seguintes termos: O que sabemos sobre o mundo externo apreendido atravs de nossos sentidos. Os fenmenos que percebemos
tm as caractersticas que lhes atribumos por causa do modo
como os nossos sentidos operam e do modo como o crebro
humano est organizado para ordenar e interpretar os estmulos
que recebe. Uma caracterstica muito importante desse processo de ordenao que cortamos o contnuo de espao e
tempo que nos cerca em segmentos, pelo que estamos predispostos a conceber o meio circundante como se este consistisse
num vasto nmero de coisas separadas, pertencentes a determinadas classes, e a pensar sobre a passagem do tempo como
se fossem seqncias de eventos separados. Correspondentemente, quando construmos, como homens, coisas artificiais
(artefatos de todas as espcies), ou inventamos cerimoniais, ou
escrevemos histrias do passado, imitamos a nossa apreenso
da Natureza; os produtos da nossa cultura so segmentados e
ordenados.
Darei um exemplo muito simples do que quero dizer. O
espectro cromtico, que vai do violeta, passando pelo azul, at
ao verde, ao amarelo e ao vermelho, um contnuo. No existe
um ponto natural em que o verde muda para amarelo e o ama-
23
24
mesma "estrutura";
um a transformao do outro.
pare-se como chegamos a essa transformao:
a. o espectro cromtico
b.
existe na Natureza
Mas re-
como um contnuo;
como se consis-
humano
e busca
e. retoma ento ao contnuo natural e original e escolhe o amarelo como sinal intermdio, porque o crebro capaz de
perceber o amarelo como um segmento descontnuo intermedirio entre verde e vermelho;
f. assim, o produto
25
COMPRIMENTO
DE ONU,\
Pare
Ateno
Siga
vermelho
amarelo
verde
vermelho
amarelo
amarelo
verde
verde
verde
vermelho
verde
amarelo
vermelho
amarelo
verde
vermelho
vermelho
amarelo
(movimento)
seqncia
CURTA4.-------..
(andeI
(no ande
rmudana
(Ateno)
BAIXO
VERDE
(Siga)
mo mudana)
FIGURA
I.
Tringulo
cromtico
dos
----
faris
VERMELHO
i Pare)
de
trnsito
. ..
As equivalncias:
f vermelho
-arnarelo-verde
PARE _ ATENO
- SIGA
26
outras seqncias
possveis
LUMINOSIDADE
rcont inuidadc
AMARELO
ALTO
real
LONGA
mtodo
I.
2.
construir
mos;
3.
adotar essa tabela como objeto geral de anlise, o qual, somente nesse nvel pode produzir as ligaes necessrias, sendo
os fenmenos
empricos
considerados
no incio apenas uma
possvel combinao
entre outras, cujo sistema completo deve
ser construdo
de antemo
(T.:
16).
que
uma
adotamos...
tabela
das
consiste
permutas
nas
seguintes
uma
relao
possveis
entre
operaes:
entre
dois
esses ter-
27
fatos
importante
compreender
o que est sendo_ pr?posto.
Num sentido supercial, os produtos de cultura sao imensamente variados e, quando um antroplogo se dispe a comparar,
digamos, a cultura dos aborgines austral~anos com a d.os ~squims ou a dos ingleses, ele impressionado,
em pnme1':0
lugar, pelas diferenas.
Entretanto, com~ t.odas as culturas sao
o produto de crebros humanos, deve existrr, algures sob a superfcie, uma srie de caractersticas que so comuns a todos.
Isto no propriamente o que se possa chamar uma idia
nova. Uma gerao muito mais antiga de antroplogos, notadamente Bastian (1826-1905) na Alemanha, e Frazr (1854-1941) na Inglaterra
sust~ntou que, pertencendo
todos os
homen~ a uma espci~, devem existir universais psicolgicos
(Elementargedanken)
que se manifestem na ocorrncia de costumes semelhantes entre povos "que alcanaram a mesma fase
de desenvolvimento
evolucionrio"
no mundo inteiro.
Frazer
e seus contemporneos
compilaram, assiduamente,
imensos catlogos de costumes "semelhantes"
que pretendiam exp.or esse
princpio evolucionrio.
No isso (l que os estruturalistas
se
propem.
A repetio de um pormenor de costume em duas
partes diferentes do mapa no uma questo a que Lvi-Strauss
atribua uma importncia especial. Em sua opinio, os universais
28
1965 ).
Lvi-Strauss comea com uma breve
Jakobson, nos seguintes termos:
referncia
tese de
29
INTENSIDADE
o que poderemos
GRAVE
t
bal xn
freqncia)
(alt;)
COMPACTO
VOLUME
(cnerJ!ia do rudo)
rJGUR.~
/~
\I
DIFUSO
consoante":
Consoante (C)
(rudo de baixa energia)
(baixa; difusa)
2.
Tringulos
lkl
Ipl ------
Primrios de Vocal-Consoante,
111
de J;lkobs0J\
AGUDA
Ir eq n c ia
'--
NORMAL
(no-elaborado)
(no-marcado)
ESTADO DO MATERIAL
(grau de elaborao)
3.
CRU
TRANSFORMADO
(elaborado)
Imarcado)
FIGURA
NATUREZA
O Tringulo
Culinrio
COZIDO ------
PODRE
(Forma Primria)
30
discriminadas
como
(-)
Ar
(-)
gua
(+)
defumado
COZINHADO
FIGURA 4.
dona
32
O Tringulo
(+ )
cozido
PODRE
Culinrio
(Forma
Desenvolvida)
Em seu artigo original (T. c.: 1965), Lvi-Strauss condia generalidade desse esquema, ao assinalar que o nosso
33
* O Queijo Stilton um queijo de espcie superior, tradicionalmente produzido em Stilton, no condado ingls de Huntingdonshire, e
semelhante ao Roquefort. (N. do T.)
34
--~~----
35
d?
DE
PRIMOS
CRUZADOS,
CASAMENTO
MATRILATE-
36
CRUZADOS,
3.
O ANIMAL
HUMANO
E SEUS SMBOLOS