O Cuidador Familiar de Doentes Com Câncer

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ARTIGO ORIGINAL

O cuidador familiar de doentes com cncer


The family caregiver of patients with cancer
Aline F. Ribeiro1; Clia A. de Souza2
1
Acadmica de Enfermagem*; 2 Enfermeira Docente*
* Faculdade de Medicina de So Jos do Rio Preto FAMERP.

Resumo

Palavras-chave
Abstract

Keywords

Introduo: Considerando-se o cncer como uma doena crnica e tratvel e que, em muitos casos pode ser
curada, principalmente quando diagnosticada precocemente, ainda uma doena bastante estigmatizada,
cheia de mistrios e sofrimento no s para o paciente, mas para sua famlia. Objetivo: Este estudo descritivo
teve como objetivo investigar as dificuldades vivenciadas pelos cuidadores familiares de doentes com
cncer. Mtodo: A coleta de dados foi realizada no perodo de Agosto de 2008 Fevereiro de 2009 em uma
central de quimioterapia de um hospital de ensino do interior do estado de So Paulo. Utilizamos um questionrio
contendo 14 questes fechadas abordando questes do apoio familiar para o cuidado, autoestima do cuidador,
problemas financeiros, atividades dirias interrompidas pelo cuidador, problemas de sade e desgaste do
cuidador. Resultado: Verifica-se predominncia de mulheres (60%) que em sua maioria so donas de casa
e cnjuge do paciente. Dos quinze entrevistados 80% (n=12) responderam interromper suas atividades
dirias para dar ateno ao doente. 60% (n=9) dispem da colaborao da famlia. 66% (n=10) dos entrevistados
responderam no ter escolhido cuidar, mas tem que cuidar. Concluso: A escolha do cuidador familiar nem
sempre dialogada podendo se fazer de maneira espontnea ou por indicao dos membros da famlia,
considerando-se os quesitos de laos afetivos, proximidade residencial, suporte financeiro e disponibilidade
de tempo.
Cuidadores; Cncer.
Introduction: Considering cancer as a chronicle and tractable disease and that in many cases it can be cured,
especially when it is diagnosed earlier, cancer is still a very stigmatized disease, full of mysteries and suffering
not only to the patients, but also to their families. Objective: This descriptive study was to investigate
objectives difficulties experienced by family caregivers of patients with cancer. Method: Data collection was
conducted from August 2008 to February 2009 in a central chemotherapy in a teaching hospital of the state
of So Paulo. We used a questionnaire containing 14 closed questions addressing issues of family support
in caring, the caregivers self-esteem, and financial problems, daily activities disrupted by the caregiver,
health problems and burnout of the caregiver. Results: It is verified the predominance of women (60%) that
in their majority are housewives and married to the patients. Of the fifteen interviewed people, 80% (n=12)
said to have had interrupted their daily activities to pay attention to the patient. 60% (n=9) have the family
collaboration. 66% (n=10) of the interviewed people said they did not choose to take care of the sick person,
but they had to. Conclusion: The choice of a familiar caregiver not always is discussed; it can be done in
a spontaneous way or by the family members indication considering requirements such as ties of affection,
residential proximity, financial support and readiness of time.
Caregivers; Cancer.

Introduo
Atualmente, o cncer considerado uma doena crnica e
absolutamente tratvel e que, em muitos casos pode ser curada,
principalmente quando diagnosticada precocemente. No
entanto, ainda uma doena bastante estigmatizada, cheia de
mistrios e sofrimento. O enfrentamento a esta doena depende
de atributos pessoais: sade e energia, sistema de crenas, metas
de vida, autoestima, autocontrole, conhecimento, capacidade
Recebido em 05.02.2010
Aceito em 19.03.2010

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de resoluo de problemas e prticas e apoio sociais. Assim,


quando se estuda o processo de enfrentamento de uma pessoa
ou famlia preciso considerar suas caractersticas
socioculturais1.
O apoio multidisciplinar no cuidado dessas pessoas h de se
levar em considerao o ncleo familiar como unidade cuidadora.
A constituio familiar no formada apenas por parentes (pais,
filhos, irmos, primos, etc), mas tambm por outros que se junta
No h conflito de interesse

Arq Cinc Sade 2010 jan-mar; 17(1):22-6

famlia com vnculo e laos entre si. A esfera familiar uma


unidade formada por seres humanos ao longo de sua trajetria
de vida, cuidando de si prprios e de outros, sendo que as
maneiras de cuidar variam de acordo com os padres culturais
e se relacionam com as necessidades de cada individuo 2 .
A doena oncolgica tem um impacto negativo na vida das
pessoas, no s pela sua repercusso social e econmica, mas
tambm pelo sofrimento do paciente e sua famlia. Sabemos que
80% dos casos de neoplasias so diagnosticadas tardiamente,
quando os recursos disponveis para o tratamento so s
paliativos. Esta situao limita a esperana de vida, contribui
com a deteriorao da autoimagem e sustenta o estigma de que
cncer uma doena incurvel 3 .
Abordar a famlia implica examinar o individuo concebendo a
individualidade como processo construdo socialmente a partir
de um contexto heterogneo; ou a partir da necessidade de
reconhecer a existncia de processos de coordenao de
diferentes subjetividades pessoalmente construdas. Tal
processo, ocorrendo primariamente na famlia, imprime moldes,
selos e estilos ao longo do desenvolvimento humano,
qualificando resultados e contribuindo diretamente para a
qualidade de vida do grupo familiar 4 .
Tomando como base essa preocupao com a famlia, a ateno
deve ser voltada para aquele que ser definido como cuidador,
que poder ser algum com bases tcnicas e cientficas, definido
como cuidador formal, ou algum que tenha ou no experincia
por tentativas de erro e acerto, definido como cuidador informal.
O cuidador tambm poder ser classificado de acordo com o
cuidado que ir prestar, primrio se assumir as responsabilidades
diretamente relacionadas aos cuidados mnimos como higiene
e alimentao. Secundrio aquele que auxiliar em eventuais
necessidades do paciente caracterizado como no sendo
primordial para a recuperao do paciente5 .
So diversos os motivos que levam a delegao do cuidador,
este pode ter grau de parentesco ou afim, ter relao afetiva,
estar mais prximo do ambiente em que se encontra o paciente,
por falta de outra possibilidade, autodelegao, entre outras.
Se o cuidador for informal, com grau de parentesco, alm da
funo de cuidar do doente, seu estado emocional poder ficar
mais comprometido, seja pela dor de presenciar o sofrimento do
ente querido, seja pelo sentimento de incmodo, de se sentir
obrigado, entre outros motivos 5.
Atualmente, as publicaes tm considerado como cuidadores
todos os que dispensam cuidados a terceiros sendo ento
utilizada uma classificao para as multi qualificaes desses
indivduos 6 .
Segundo a classificao de Wanderley existem vrios tipos de
cuidadores, listados abaixo com suas particularidades, porm a
autora ressalta que no so categorias excludentes, mas sim
complementares, podendo o cuidador apresentar mais de uma
classificao: cuidador remunerado: recebe um rendimento pelo
exerccio da atividade de cuidar; cuidador voluntrio: no
remunerado; cuidador principal: tem a responsabilidade
permanente da pessoa sob seu cuidado; cuidador secundrio:
divide, de alguma forma, a responsabilidade do cuidado com
um cuidador principal, auxiliando-o, substituindo-o; cuidador

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leigo: no recebeu qualificao para o exerccio profissional da


atividade de cuidar; cuidador profissional: possui qualificao
especfica para o exerccio da atividade (enfermeiro, terapeuta,
etc.); cuidador familiar: tem algum parentesco com a pessoa
cuidada; cuidador terceiro: no possui qualquer grau de
parentesco com a pessoa cuidada7 .
Assim, o cuidador que denominamos formais pode ser entendido
nesta classificao como cuidador remunerado, principal, leigo,
profissional e terceiro uma vez que nesta classificao
sobrepem-se grau de parentesco, remunerao e formao6.
Isto posto, a questo a ser trabalhada recai sobre esses
cuidadores informais, qual o perfil desses cuidadores, suas
inquietaes e quanto exigem pelo trabalho de cuidador.
Objetivo
Investigar as dificuldades vivenciadas pelos cuidadores
familiares de doentes com cncer em tratamento quimioterpico.
Casustica e Mtodo
Trata-se de uma pesquisa descritiva. O campo de estudo foi em
um hospital de ensino de capacidade extra no interior de So
Paulo. A unidade escolhida foi uma central de quimioterapia
onde so atendidos pacientes adultos com cncer. O estudo foi
submetido autorizao formal da instituio e do Comit de
tica e Pesquisa (parecer n 187/2008) Os dados foram coletados
mediante a aceitao do cuidador por meio do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido e aplicao de um
questionrio estruturado contendo 14 questes. Para facilitar a
utilizao e o posterior entendimento do instrumento de coleta,
as questes foram agrupadas por categorias: apoio familiar;
problemas financeiros; atividades dirias interrompidas;
problemas de sade/desgaste.
Participaram desta pesquisa os indivduos que preencheram os
critrios de incluso: cuidadores de ambos os sexos maiores de
18 anos, membro da famlia do paciente com doena oncolgica,
sem prejuzo da comunicao verbal.
Os dados obtidos nas quinze entrevistas foram analisados pelo
pesquisador com ajuda do programa Excel 2003 e relacionados
segundo os objetivos desta pesquisa.
No que se refere ao instrumento de coleta as questes foram
agrupadas por categorias, que so:
Apoio Familiar
A minha famlia colabora na diviso dos cuidados com ele (a)?
Minha famlia me deixou sozinho (a) para cuidar dele (a)?
Tem dispensado quantas horas por dia no cuidado com ele (a)?
Autoestima
Voc, alguma vez, j se sentiu ofendida e com raiva durante o
cuidado com ele?
Eu escolhi cuidar dele?
Cuidar dele (a) me faz sentir bem?
Sinto-me capaz de cuidar dele (a) como ele (a) realmente merece?
Problemas financeiros
Voc tem tido dificuldades financeiras para cuidar dele (a)?

23

Atividades dirias interrompidas


Minhas atividades dirias esto centradas em torno de cuidados
com ele (a)?
Algumas vezes tenho que parar no meio das minhas tarefas
dirias para dar ateno a ele (a)?
Apesar da ateno que tenho que dar a ele sobra tempo para
cuidar de mim?
Problemas de Sade/ Desgaste
Muitas vezes no me sinto saudvel para cuidar dele (a)?
Muitas vezes me sinto cansado (a) para cuidar dele (a)?
As minhas foras fsicas esto no cuidado com ele (a)?
Resultados
A faixa etria do cuidadores estudados variou de 35 a 74 anos,
a caracterizao deles se fez pelo sexo, grau de parentesco,
tempo de dedicao ao cuidado e ocupao.
Tabela 1- Caractersticas dos cuidadores estudados. So Jos do Rio Preto, SP, 2009.
DADOS DE IDENTIFICAO

sentem saudveis para cuidar do paciente. 60% (n=9) dos


entrevistados no se sentem cansados para exercer o cuidado.
67% (n=10) responderam ter suas foras fsicas no cuidado.
100% (n=15) dos cuidadores afirmaram se sentir bem cuidando.
80% (n=12) responderam no ter sofrido o abandono dos
familiares para o cuidado com o doente.
Para facilitar a anlise dos resultados, perguntas com mais de
duas respostas foram tabuladas em suas respectivas categorias.
A tabela 2 evidencia que 60% (n=9) dispem da colaborao da
famlia. 53% (n=8) responderam no ter apresentado sentimentos
de ofensa e raiva de maneira alguma durante o cuidado. 66%
(n=10) dos entrevistados responderam no ter escolhido cuidar,
mas tem que cuidar. 86% (n=13) dos cuidadores afirmaram
cuidar do doente como ele realmente merece. 60% (n=9)
afirmaram ter as atividades dirias centradas em torno do
cuidado. 73% (n=11) dos entrevistados responderam exercer o
cuidado durante um dia inteiro. 74% (n=11) tm disponibilidade
para o autocuidado.
Tabela 2 - Agrupamento por categorias. So Jos do Rio Preto, SP, 2009.
CATEGORIAS

Sexo

Apoio Familiar

Masculino

40

Colaborao da famlia

Sim

60

na execuo dos

No

27

cui dados.

Parcialmente

13

Total

15

100

Feminino

60

Total

15

100
Auto-Estima

Grau de Parentesco
Marido/Esposa
Irmo ()
Filho (a)

8
2
4

53,3
13,3

Sentimentos de ofensa

De maneira alguma

53

e raiva durante a

Algumas vezes

27

execuo do cuidado.

Rarament e

20

Frequentemente

Total

15

100

26,7

Outros

6,7

Total

15

100

Eu escolhi cuidar dele?

Sim

27

No, eu tenho que

10

66

cui dar.

Tempo de dedicao ao cuidado


Menos de 6 meses

40

De 6 meses a 11 meses

26,7

Um a no a dois anos

33,3

Total

15

100

No, eu fui escolhido.

Total

15

100

Capacidade de executar

Sim

13

86

o cuidado como o

No

doente merece.

s vezes

Total

15

100

Atividades dirias interrompidas

Ocupaes

Atividades dirias

Sim

60

Do lar/Aposentado

46,6

cent radas em torno do

No

13

cui dado

Concilio dessas

27

Servios G erais/Secretria/Faxineira

20

Pedreiro

6,7

Motorista
Professor

2
1

13,3

Total

15

100

Horas dispensadas na

Perodo da manh ou da

20

execuo do cuidado.

tarde.

6,7

Some nte noite.

Um dia todo.

11

73

Total

15

100

Msico

6,7

Total

15

100

Dos quinze entrevistados 80% (n=12) responderam interromper


suas atividades dirias para dar ateno ao doente. 60% (n=9)
afirmaram no ter tido dificuldade financeira. 67% (n=10) se

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atividades com outras.

Problemas de Sade/Desgaste.
Tempo para cui dar de si

Sim

11

74

apesar da ateno que

No

13

tem que dar ao

s vezes

13

paciente.

Total

15

100

Arq Cinc Sade 2010 jan-mar; 17(1):22-6

Discusso
Em relao ao perfil dos cuidadores, verifica-se na tabela 1
predominncia de mulheres (60%) que em sua maioria so
donas de casa e cnjuge do paciente. Esse dado corroborado
com um estudo realizado no departamento de oncologia de um
grande hospital escola de Melbourne, na Austrlia8. Dos 51
cuidadores que participaram da pesquisa, 56,9% (n=29) eram
mulheres e 27,5% (n=14) eram esposas do paciente com cncer
avanado7. Um estudo realizado no Hospital de Caridade de
Carazinho/RS, durante o ano de 2004, tambm evidenciou que
89 (76,1%) dos 117 cuidadores eram mulheres9.
Cuidar do doente de cncer, em especial, na fase avanada da
doena descrita como tarefa que provoca desequilbrio,
sobrecarga fsica, social e econmica 10,11. O estudo realizado
no Hospital de Caridade de Carazinho/RS mostra que a principal
dificuldade no ato de cuidar o desgaste fsico e emocional
evidenciado por 41 (35%) dos 117 pesquisados e a menor
dificuldade atribuda s dificuldades financeiras e falta de
apoio 9 . Porm, no presente estudo, 67% (n=10) dos
entrevistados afirmaram se sentir saudveis para cuidar do
paciente e 60% (n=9) desses entrevistados alegaram no sentir
cansao, sendo que 67% (n=10) dos cuidadores tm suas foras
fsicas no cuidado. J no trabalho realizado pela Universidade
Estadual de Cincias da Sade de Alagoas UNCISAL, numa
ONG com pacientes oncolgicos e seus cuidadores, 87% (n=
46) dos entrevistados responderam que a situao econmica
piorou12. O trabalho de Carazinho/RS corrobora com os 60%
(n=9) dos cuidadores desse estudo que afirmaram no ter tido
dificuldade financeira e com os 80% (n=12) que responderam
no ter sofrido o abandono dos familiares para o cuidado com o
doente. As divergncias encontradas no campo financeiro
provm do paciente ser o responsvel pelo oramento familiar e
ter seus custos elevados pelo adoecimento, no encontrando
outro parente que assumisse essa responsabilidade 9 .
O significado da palavra famlia tem se modificado ao longo do
tempo de forma mais ou menos intensa. Nos tempos passados,
a famlia era vista no contexto da criao dos filhos sendo
organizada de acordo com esta atividade principal e a mulher
ocupava um papel importante pelas funes de me e esposa 13
.
Atualmente, o interesse de vrias reas do conhecimento pela
discusso sobre a famlia crescente. Segundo Althoff a famlia
uma unidade social complexa, e a diversidade dos aspectos
que a envolve nos faz reconhecer que conhecemos somente
parte de sua realidade 2. A enfermagem vem se preocupando
com a famlia no sentido de assisti-la criando instrumentos
prprios e valorizando as pesquisas nas situaes concretas
vivenciadas pela famlia em seu cotidiano, compreendendo as
suas relaes com o meio em que vivem e como elas correm na
realidade14.
Em um estudo de famlias de pacientes dependentes (idosos)
mostra que a escolha do cuidador no costuma ser ao acaso e
que a opo pelos cuidados nem sempre do cuidador, mas,
muitas vezes, expresso de um desejo do paciente, ou falta de
outra opo, podendo, tambm, ocorrer de um modo inesperado
para um familiar que, ao se sentir responsvel, assume este

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cuidado, mesmo no se reconhecendo como um cuidador 15 .


comum a pessoa que se torna a cuidadora principal afirmar ter
assumido essa responsabilidade espontaneamente, sem um
questionamento prvio ou discusso com o restante do grupo
familiar sobre quem desempenharia os cuidados. Nesta deciso
costumam ser explicitados fatores como relacionamento afetivo,
grau de parentesco, morar junto ou prximo, maior
disponibilidade de tempo ou indisponibilidade dos demais16.
Essas afirmaes corroboram com os 10 (66%) entrevistados
que responderam no ter escolhido cuidar, mas tem que cuidar,
numa forma de obrigao por motivos no explicitados.
A funo de cuidador da famlia concretiza-se atravs de uma
misso de proteo e socializao dos indivduos, pois
independente da forma e desenho que a famlia contempornea
apresenta, ela se constitui nos espao de iniciao e aprendizado
dos afetos e das relaes sociais17.
Aps o aparecimento da doena, as relaes familiares ficam
abaladas. Quando a estrutura familiar slida, a unio surge e
traz tona sentimentos de carinho, cuidado, ateno, respeito e
amor, que podem estar esquecidos ou pouco demonstrados.
Entretanto, essa forma positiva de influncia familiar pode no
estar presente em todos os casos18. No presente estudo, 100%
(n=15) dos cuidadores familiares afirmaram se sentir bem
cuidando, 53% (n=8) responderam no ter apresentado
sentimentos de ofensa e raiva de maneira alguma durante o
cuidado e 86% (n=13) dos cuidadores afirmaram cuidar do
doente como ele realmente merece. Esses achados fazem crer
que os participantes da pesquisa exerciam o cuidado de maneira
respeitosa e amorosa para com o doente. O estudo realizado
pela UNCISAL afirma que 83% (n=44) dos cuidadores
informaram que melhorou a relao com o paciente, estreitando
os vnculos aps a doena, 13 % (n=7) disseram que no houve
alterao e apenas 4% (n=2) disseram que ficou mais difcil se
relacionar afetivamente com o familiar doente e que, portanto a
relao piorou. No que se refere aos demais membros da famlia,
63% (n=33) dos cuidadores afirmaram que a relao afetiva entre
eles melhorou 12.
H significativos estudos sobre o comportamento e as
necessidades do cuidador no perodo de adoecimento do
paciente com cncer, desde o diagnstico, passando pelo
tratamento inicial, recidiva da doena, retratamento, sucessivas
internaes, at o encaminhamento para os cuidados paliativos.
Essa etapa final, em geral, rdua e penosa, motivada por
esperana de cura, mas tambm com desiluses, sofrimentos e
importante carga de trabalho dispensada ao paciente, vivncias
que tendem a se intensificar com a evoluo da doena19.
O cotidiano do cuidador abordado na literatura abundante,
estudos demonstram a sobrecarga que ele tem com sua estafante
e estressora atividade de cuidados dirios e ininterruptos.
O trabalho realizado com 133 cuidadores de pacientes sem
possibilidades curativas, internados no Centro de Ateno
Integral Sade da Mulher em Campinas, avaliou a freqncia
de ansiedade e depresso desses cuidadores. Observou-se,
entre outros fatores, que 84% referiram mudana na rotina pelo
fato de cuidar. Este dado corrobora com os 80% (n=12) dos
cuidadores que responderam interromper suas atividades dirias

25

para dar ateno ao doente e com os 60% (n=9) dos cuidadores


que afirmaram ter as atividades dirias centradas em torno do
cuidado 20.
No que se refere, no presente estudo, ao tempo que os
cuidadores se dedicavam ao paciente, 73% (n=11) dos
entrevistados informaram que passavam o dia inteiro com o
paciente e 27% (n=4) apenas um perodo. Esses achados
condizem com o estudo da UNCISAL no qual 77% (n=41) dos
entrevistados tambm cuidavam o dia inteiro do paciente e os
demais 23% (n=12) durante um perodo (manh, tarde ou noite)12.
Concluso
Diante do exposto, evidencia-se, pela pequena amostra, o papel
de cuidadora que a mulher exerce perante a sociedade. A escolha
do cuidador familiar nem sempre dialogada podendo se fazer
de maneira espontnea ou por indicao dos membros da famlia,
considerando-se os quesitos de laos afetivos, proximidade
residencial, suporte financeiro e disponibilidade de tempo. O
apoio familiar depender de como se desenrola a relao do
cuidador e do doente com os demais membros da famlia, a
afetividade primordial para que haja o apoio.
A mudana no cotidiano evidente pelas atividades dirias
interrompidas e pelo tempo dispensado para o cuidado, s vezes
a rotina mudada por completo. A fadiga e o desgaste fsico e
emocional no foram um fator de destaque relacionado a esse
novo cotidiano. Apesar de todas as mudanas, tanto na rotina
quanto no campo financeiro, os cuidadores se sentem satisfeitos
em cuidar e o afeto entre cuidador e paciente notado pela
ausncia de sentimentos de raiva e ofensa durante o cuidado.
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Rua: Atlio Luiz Fazanelli, 385. Ap 22 Jd. Panorama
15091-300 So Jos do Rio Preto - SP

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