Poesia Feminina Subalterna Negra: Uma Voz de Resistência
Poesia Feminina Subalterna Negra: Uma Voz de Resistência
Poesia Feminina Subalterna Negra: Uma Voz de Resistência
Mestranda do Programa de Ps-graduao em Crtica Cultural UNEB/ Campus II. Pesquisadora/FAPESB. Email: [email protected].
socio-cultural issues around the black woman and this whole process of exclusion and muting,
through that mechanism. With that we seek to show how the poetic voices of these women
become tools that can deconstruct stereotypes, "swing" with sociocultural structures
historically fixed, and with the potentiality of his poetry they can fight oppression, exclusion
and denial of its alterities, echoing their voices as a protest, resistance, in search to be heard
orally and to intervene against an exclusion patriarchal historically constructed around the
woman, mostly black. To theoretical basis this work roleing in authors as Miriam Alves
(2010), Vera Soares (2000), Ana Rita Silva (2010), Michel Foucault (2000), Roland Walter
(1999), Rita Schmidt (1995), among others. So the poetry is constituted as a form of political
and social raising awareness, showing that these black women, are fighting, denouncing and
are seeking transform a dominant hegemonic system that in various ways the subalternizam,
thus destabilizes traditional concept of subalternity and giving a new approach to literature., Is
precise then pay attention to the voices that were and still are sometimes silenced, "muffled"
by hegemonic discourses, fixed, hardened, pervade, effectively working through a cultural
construction that these black feminine voices are recognized in its otherness and autonomy.
Key-words: poetic voices; black women writers; subalternity; resistance.
Diante de uma conjuntura histrica construda tradicionalmente pelo vis masculino e
hegemnico, por vezes a mulher ainda no tem sua voz reconhecida e visibilizada, sendo esta,
na maioria das vezes, abafada por outros discursos pautados e normatizados sob a tica
patriarcal. Nesse contexto de opresso, a escrita das mulheres, foi por muito tempo ignorada e
socialmente no aceita, sendo ainda, as mulheres negras e suas escritas marcadas pelo
preconceito em duas instncias: a de gnero e a de raa.
Sendo assim, a quebra de um silenciamento imposto voz feminina, especialmente a
negra, constitui um difcil processo de luta, de enfrentamento, de incluso sociocultural e
poltica, que vem, paulatinamente, se desenvolvendo ao longo do tempo.
Diante do exposto, preciso, ento, atentar para as vozes que foram e ainda por vezes
so silenciadas, abafadas por discursos hegemnicos, fixos, enrijecidos, perpass-las,
trabalhando por meio de uma construo cultural em que essas vozes femininas negras sejam
reconhecidas em sua alteridade e autonomia.
Desse modo, torna-se necessrio cultivar a voz feminina negra, visibiliz-la,
elucidando as potencialidades de seus discursos em meio a outros j perpassados e institudos.
Portanto, podemos perceber que: Ser mulher e escritora no Brasil romper com o silncio, a
no-fala e transpor os espaos que definem procederes e funes preestabelecidas.
(ALVES, 2010-2011, p.183)
Essa questo do poder de fala nos faz pensar nos jogos circunscritos de poder
presentes na interdio, depreciao de algumas vozes, discursos e em contrapartida na
vontade de verdade que h em outros discursos, (FOUCAULT, 2000) e nesse entremeio
refletir sobre o processo histrico de silenciamento, subalternizao de mulheres/escritoras
negras. Para tanto, preciso refletir sobre essa questo da subalternidade, e nos perguntar,
quem esse ser subalterno, ele fala ou no, ele age ou no? No texto Estudos subalternos
(1997) do grupo latino-americano de estudos subalternos, Guha, um dos membros do referido
grupo, opera uma desconstruo de uma noo passiva do sujeito subalterno, que
naturalmente perpassada, mostrando que o sujeito subalterno, apesar das foras que incidem
contra ele, est em ao e produz efeitos sociais visveis, seja na escrita, na literatura, na
educao etc., ou seja, ele reconhece um papel ativo do subalterno. Deste modo, podemos
afirmar que:
[...] o prefixo sub de sub-alternidade no implica um estar abaixo de, um
obedecer a algum, mas uma espcie de devir revolucionrio (num indivduo,
tribos, naes, culturas, instituies, etc.) capaz de irromper-se e jogar com as
alternncias de poder. (SANTOS, 2008, p. 5).
Sendo assim, podemos dizer que o sujeito subalterno se move a partir de micro
revolues, atravs de sua fala, sim, atravs de suas aes, no caso de escritoras negras
subalternas, como Alzira Rufino
A escritora Alzira dos Santos Rufino nasceu em Santos SP, em 1949. Comeou os estudos na rea de sade,
graduando-se em enfermagem. Notria ativista do movimento negro e especialmente do Movimento negro
feminino, fundou o Coletivo de Mulheres Negras da Baixada Santista, em 1986 e a Casa de Cultura da
Mulher Negra, em 1990, Para mais detalhes consultar www.letras.ufmg.br/literafro.
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A escritora Conceio Evaristo de Brito nasceu em Belo Horizonte MG, 1946. Graduou-se em Letras pela
UFRJ. Mestre em Literatura Brasileira pela PUC do Rio e Doutora em Literatura Comparada pela
Universidade Federal Fluminense. Participante e ativista dos movimentos em favor da cultura afro-brasileira e
negra. Para mais detalhes consultar www.letras.ufmg.br/literafro.
e
fome.
A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.
A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem o hoje o agora.
Na voz de minha filha
se far ouvir a ressonncia
o eco da vida-liberdade.
O poema Vozes mulheres, de Conceio Evaristo uma amostra de como a mulher
subalternizada, por um sistema de excluso contnuo e de longo tempo, utiliza a escrita para
fazer lembrar esse processo de opresso, sufocamento e emudecimento das vozes das
mulheres, especialmente as negras. A voz potica do texto, atravs do movimento
memorialstico e histrico, que relembra os processos de excluses, opresses, silenciamentos
passados de geraes em geraes por mulheres negras, nos faz refletir o quanto somos
subalternizadas a cada momento, a cada poca e o quanto necessrio lutar, falar, escrever,
pelas mulheres de hoje e por aquelas que foram alvo desse sistema de subalternizao. Afirma
como o ato de falar, de poder exprimir sua voz uma verdadeira forma de libertao, de
emancipao por parte da mulher por tanto tempo e de diversas formas subjugadas. Sobre isso
a autora Zilda Freitas (2002, p.122) nos diz que: As mulheres, atualmente, escrevem tambm
por todas aquelas que nos sculos anteriores e mesmo hoje em dia, em culturas mais
restritivas, so silenciadas.
A escrita feita da perspectiva de mulheres negras e que tem como temtica a luta e a
vida das mesmas tornou-se ferramenta de transgresso dos espaos, dos limites, por muito
tempo impostos s mulheres, e, com isso, um processo gradativo de conquista de autonomia e
de quebra do silenciamento, permitindo, ao mesmo tempo, o empoderamento destas,
especialmente por meio da literatura:
A literatura no para as mulheres uma simples transgresso das leis que lhes
proibiam ao acesso criao artstica. Foi muito mais do que isso, um territrio
liberado, clandestino. Sada secreta da clausura da linguagem e de um pensamento
masculino que as pensava e as descrevia in absentia. (FREITAS, 2002, p.119).
A apropriao da escrita, por parte das mulheres, foi fundamental nesse processo de
rompimento de um silncio imposto a estas, durante longo tempo, por parte de uma sociedade
patriarcal. Foi justamente atravs dos escritos de mulheres transgressoras que percebemos,
pouco a pouco, a revelao de vozes que infundiram em nossa literatura um novo modo de ver
e reconhecer a mulher, e muito mais outros sujeitos marginalizados por um cnone literrio.
Isso resultado de um longo processo de luta exercido por mulheres, como as
poetisas, aqui abordadas, que souberam transgredir um sistema literrio rgido, em que a
negao da presena das mulheres, principalmente negras, sempre fora perpassada em suas
entrelinhas. Esse movimento de transgresso e de ratificao da presena e resistncia das
mulheres negras o que podemos apreciar no poema Boletim de Ocorrncia, de Alzira
Rufino (1988):
Mulher negra,
No para
Por essa coisa bruta
Por essa discriminao morna,
Tua fora ainda segredo,
mostra tua fala nos poros
O grito ecoar na cidade,
Capinam como mato venenoso
a tua dignidade, [...]
Tua negritude incomoda
Teu redemoinho de foras afoga
No querem a tua presena
Riscam teu nome com ausncia.
Mulher negra, chega
Esse pode ser considerado um trabalho potico revolucionrio tanto para a literatura
em geral, como para a feminina, uma vez que insere na arte da escrita outro discurso
autnomo, que irrompe em uma estrutura discursiva historicamente canonizada.
Os discursos proferidos pelas escritoras Alzira Rufino e Conceio Evaristo nos levam
a inferir sobre o termo subalternidade um novo sentido, uma vez que fazem da escrita potica
uma forma de denncia, revoluo, contestao dos parmetros sociais estabelecidos, uma
forma de testemunho e: o testemunho acirra a discusso dos gneros e radicalmente abre
espao para os que foram silenciados: (...), subalternos e marginalizados. (REIS, 1996,
p.175).
Os poemas das escritoras Alzira Rufino e Conceio Evaristo trazem tona a imagem
emancipada da mulher, que se insere em seu contexto social, como sujeito crtico e autnomo,
como pessoa. Nessa perspectiva Fonsca (2011, p. 202) nos diz que: (...) Nos textos de
autoria feminina geralmente a mulher representada como elemento partcipe do contexto
social, um indivduo capaz de construir uma vida baseada em princpios particulares. Ou seja,
a mulher representada como sujeito. Alm disso: A escrita de autoria feminina marcada
por uma alteridade que lhe peculiar, pois, por meio de uma linguagem prpria, diferenciada,
cheia de smbolos, faz emergir sujeitos femininos descentralizados, em relao aos padres
dominantes. (MOURA, ZOLIN 2009, p.41). necessrio ratificar a importncia da mulher
no campo literrio, j que:
Falar sobre a instituio "literatura" e a presena da mulher no espao dos discursos
e saberes , pois, um ato poltico, pois remete s relaes de poder inscritos nas
prticas sociais e discursivas de uma cultura que se imaginou e se construiu a partir
do ponto de vista normativo masculino, projetando seu outro na imagem negativa do
feminino. (SCHMIDT, 1995, p. 135).
A mulher insere em sua escrita as suas prprias vivncias. Seja de forma direta ou
indireta suas marcas experienciais influenciam naquilo que ser dito, por isso a escrita
feminina negra torna-se mais relevante para se conhecer e entender a prpria mulher negra, j
que suas escritas so permeadas por suas subjetividades, o que podemos conferir no poema
Resgate, de Alzira Rufino (1995):
Sou negra ponto final
Devolva-me a identidade
Rasgue minha certido
Sou negra sem reticncias
Sem vrgulas e sem ausncias
No quero mais meio-termo
Sou negra balacobaco
Sou negra noite cansao
Sou negra ponto final.
Podemos perceber como a escritora por meio da voz potica de Resgate lana sobre si
enquanto mulher negra um novo olhar, uma afirmao identitria que vai contra outras
representaes ou formas estereotipadas de conhecimento da mulher negra. um poema em
que a subjetividade, a vivncia e experincia de quem diz e escreve esto entrelaadas com o
que expressa a voz potica do texto, entrelaamento que potencialmente poltico, em um
sentido crtico de pensar a existncia e importncia da mulher negra. Assim, a voz potica
A noite no adormece
nos olhos das mulheres,
a lua fmea, semelhante nossa,
em viglia atenta vigia
a nossa memria.
A noite no adormece
nos olhos das mulheres,
h mais olhos que sono
onde lgrimas suspensas
virgulam o lapso
de nossas molhadas lembranas.
A noite no adormece
Evaristo,
que
podemos
empreender
uma
literatura
legitimamente
REFERNCIAS
Alzira.
Poemas.
Disponvel
em:
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