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A REPRESENTAÇÃO DA MULHER NEGRA NA LITERATURA

BRASILEIRA
Liliane Nogueira Monteiro1

Introdução

A presença da mulher negra na literatura brasileira, sempre foi


apresentada por escritores brancos com seus discursos bastante negativos.
Quando são representadas por esses escritores a maioria das vezes, são
explorados temas como sedução, beleza, resistência física, pois as qualidades
que são apresentadas sempre estão ligadas ao corpo da mulher, nunca é
mencionado o que ela pensa, ou o que deseja. Conforme Campos (2008, p.03),
percebe-se ainda que a mulher negra também não aparece como musa,
heroína ou romântica. A representação literária da mulher negra é ainda
ancorada nas imagens de seu passado escravo, de corpo-procriação e/ou
como corpo-objeto de prazer.
Essa representação da mulher negra na literatura ao longo da história foi
feita com base nas construções dos escritores brancos, que integraram uma
tripartição de algumas funções socialmente atribuídas as mulheres negras
elaboradas pelo imaginário masculino euro descendente. As figuras negras que
produziam a literatura afro-brasileira, serviram como uma amostra bem
pequena de um momento histórico da nossa literatura, já que eram produzidas
pelas mãos feministas afrodescendentes. As escritoras negras figuram como
as mulheres precursoras da literatura elaborada por mulheres negras
brasileiras. Conceição Evaristo, Maria Firmina dos Reis e Carolina Maria de
Jesus. É evidente que existem outras, no entanto o destaque maior tornou
Maria Firmina do Reis e Carolina Maria de Jesus como referências das letras

1
Graduada em História licenciatura pela Universidade Federal do Acre – UFAC.
[email protected]
negras femininas do Brasil. Elas servem de parâmetro e de “herança de tantas
outras ancestrais”. Claro que Discutir sobre a mulher negra no contexto da
literatura afro-brasileira é percorrer duas vertentes: a primeira, a das próprias
mulheres negras que produzem literatura, e ao mesmo tempo reescrevem na
história; e, a segunda, a da representação dessas mulheres na literatura. De
todo modo, é entender quem são o que produzem e como se comportam
mediante as relações de gênero e etnicidade que lhes são impostas no
contexto dessas produções. Diante de tal abordagem, as relações e discussões
de gênero (mulher negra) vêm acompanhadas das questões da raça e da
etnicidade, a literatura produzida por elas também passará pelo mesmo campo
de discussão.
Dessa forma, ao se pensar em um contexto geral da literatura e da
participação das mulheres, entende-se, segundo Schmidt e Navarro (2007)
que: a cultura literária constitui parte integrante do campo cultural e seu
desenvolvimento foi, até há pouco tempo, regulado e controlado
ideologicamente pela hegemonia patriarcal e seus pressupostos sobre
diferenças assimétricas e hierárquicas de gênero, o que significa dizer que as
mulheres que atuaram, no passado, no campo das letras, ficaram à margem da
literatura, esquecidas e silenciadas nas histórias literárias. Nesse sentido, uma
visada crítica às culturas literárias nacionais ilumina as conexões entre cultura
e poder, entre instituição intelectual e dominação, entre privilégio e exclusão
(SCHMIDT; NAVARRO, 2007, p. 85).
Para as mulheres negras ou brancas, a literatura foi por muito tempo
espaço de exclusão e muitas vezes de negação de sua participação. Essas
mulheres eram restritas aos espaços domésticos ou religiosos. Essas mesmas
mulheres eram vitimas de uma sociedade patriarcalista e sexista, enquanto os
homens eram quem dominavam as letras da literatura que circulavam. O sexo
feminino teve seus discursos negados e rejeitados à inclusão no cânone por
muitos anos. Em geral “a negação da legitimidade cultural da mulher, como
sujeito do discurso exercendo funções de significação e representação foi, no
contexto dessas literaturas, uma realidade que perdurou até, mais ou menos, a
década de 1970” (SCHMIDT; NAVARRO, 2007, p. 86). É fato que anterior a
1970 já existia literatura produzida por mulheres em vários países, mas é a
partir desse período que Rita Schmidt e Márcia Navarro concebem como sendo
o centro das discussões sobre essas literaturas, “quando houve uma
verdadeira explosão de investigações centradas na relação entre literatura e
mulher” (op. cit).
No que diz respeito à mulher negra no contexto da literatura brasileira,
podemos encontrá-la, bem como o negro no geral, de duas formas: primeiro
sendo representada, depois ela mesma se escrevendo e participando dessa
literatura. Portanto, temos sua representação e sua auto representação. “Se
antes as representações das mulheres negras estavam restritas a descrições
como as de Bernardo Guimarães com sua escrava branca, A Escrava Isaura
(1876); ou a imagem da mulata sensual de Aluísio de Azevedo em O cortiço
(1890), com sua Rita Baiana e a animalidade e falta de inteligência de
Bertoleza; ou em imagens poéticas como em “Essa negra fulô” (1958), de
Jorge de Lima, em que encontramos uma mulher negra lasciva e pronta aos
serviços sexuais do seu senhor, aos poucos essas imagens e estereotipias na
literatura nacional foram sendo reinventadas e resinificadas por meio da
produção de afrodescendentes, negros e negras no país que buscaram sua
identidade e autoafirmação por meio da literatura.”
Desta forma, muitas das imagens representadas da mulher negra na
literatura nacional eram, em sua maioria, fundadas nas ideologias racistas e
sexistas e, principalmente, com base em seu passado escravo. Essas
mulheres eram representadas a partir da imagem da negra vista como:

[...] coisa pau pra toda obra, objeto de compra e venda em razão de sua
condição de escrava. Mas é objeto sexual, ama de leite, saco de pancada
das sinhazinhas, porque, além de escrava, é mulher. Evidentemente, esta
maneira de viver a chamada ”condição feminina” não se dá fora da condição
de classe... e mesmo de cor (GIACOMINI, 1988, p. 87-88, Grifo da autora).
Desenvolvimento

1- Escritoras negras e a busca da identidade e da autoafirmação

A partir a década de 1970 foi que houve uma explosão da literatura que
tinham mulheres como vanguardistas. A partir desta década de fato foi que houve a
expansão da literatura negra propriamente dita, com produções tanto de mulheres
quanto de homens negros comprometidos com as causas da negritude. Buscando
sua auto representação e a quebra de imagens negativas essas mulheres acabam
se aglutinando em movimentos literários e passam assim a expressarem seus
próprios desejos poéticos, suas dores, lutas, histórias, anseios e memórias. Com
isso aos poucos essas mulheres vão se apresentando por suas próprias mãos e
rompem com os estereótipos literários que erram atribuídos a elas na historia e
tradição da literatura brasileira.
Com essa proposta de buscar essa autoafirmação da identidade feminina
negra pela linguagem literária, podemos elencar algumas poetisas negras quem vem
produzindo textos literários e por meio de suas produções tem conquistado novos
espaços e instigado uma revisão nos conceitos sobre o sujeito negro feminino
brasileiro. São essas vozes que surgem e novas imagens passam a existir, uma
poética construída agora sobre as próprias mãos, outrora amordaçadas, e pelas
vozes emudecidas de Maria Firmina dos Reis, Conceição Evaristo e Carolina Maria
de Jesus. Para vencer as barreiras de gênero e da cor, que vão além de “sexo
frágil”, essas mulheres negras optaram pela escrita e produziram sua própria
literatura lírica, que relevam as subjetividades desse segmento social. A escrita da
mulher (escrita feminina) já traduz por sim só um significado particular, nesse
contexto essa mesma escrita assume conotações de gêneros sobre mulheres
brancas e negras, da escrita feminina e negra. A respeito da escrita das mulheres
negras, Miriam Alves concebe esta da seguinte forma:

É de um lugar de alteridade que desponta a escrita da mulher negra. Uma


voz que se assume. Interrogando, se interroga. Cobrando, se cobra.
Indignada, se indigna. Inscrevendo-se para existir e dar significado à
existência, e neste ato se opõe. A partir de sua posição de raça e classe,
apropria-se de um veículo que pela história social de opressão não lhe seria
próprio, e o faz por meio do seu olhar e fala desnudando os conflitos da
sociedade brasileira (ALVES, 2010, p. 185).

É por meio do olhar e da fala que se tece as letras negras femininas, é


possível afirmar que as mulheres negras afro descendentes tem sua auto
representação manifestada por meio por meio de um duplo devir
literário.Apresentamos aqui uma escritora negra a romancista e poetisa Conceição
Evaristo que nasceu em 29 de dezembro de 1946 numa favela da zona sul de Belo
Horizonte, Minas Gerais. Filha de uma lavadeira que, matinha um diário onde
anotava as dificuldades de um cotidiano sofrido, Conceição cresceu rodeada por
palavras. Teve que conciliar os estudos com o trabalho como empregada doméstica,
até concluir o curso Normal, em 1971, já aos 25 anos. Uma das principais expoentes
da literatura Brasileira e Afro-brasileira atualmente, Conceição Evaristo tornou-se
também uma escritora negra de projeção internacional, com livros traduzidos em
outros idiomas. Publicou seu primeiro poema em 1990, no décimo terceiro volume
dos Cadernos Negros, editado pelo grupo Quilombhoje, de São Paulo. Desde então,
publicou diversos poemas e contos nos Cadernos, além de uma coletânea de
poemas e dois romances. A poetisa traz em sua literatura profundas reflexões
acerca das questões de raça e de gênero, com o objetivo claro de revelar a
desigualdade velada em nossa sociedade, de recuperar uma memória sofrida da
população afro-brasileira em toda sua riqueza e sua potencialidade de ação. É uma
mulher que tem cuidado de abrir espaços para outras mulheres negras se
apresentarem no mundo da literatura.
Foto 1: Conceição Evaristo.

Dividida entre sensações tais como dor, apaziguamento, vingança,


desafio, silêncio e esperança Conceição Evaristo tece considerações sobre a sua
escrevivência. Escrever para ela é mais que transpor artifícios poéticos e ficcionais
ao papel é, principalmente, “um gesto de teimosa esperança”, que se reverbera na
senha pela qual ela “acessa o mundo”. Conceição Evaristo diz:

Gosto de escrever, na maioria das vezes dói, mas depois do texto escrito é
possível apaziguar um pouco a dor, eu digo um pouco... Escrever pode ser
uma espécie de vingança, às vezes fico pensando sobre isso. Não sei se
vingança, talvez desafio, um modo de ferir o silêncio imposto, ou ainda,
executar um gesto de teimosa esperança. Gosto de dizer ainda que a
escrita é para mim o movimento de dança-canto que o meu corpo não
executa, é a senha pela qual eu acesso o mundo (EVARISTO, 2005a, p.
202).

Refletindo sobe o depoimento de Evaristo, podemos observar que existe


uma certa dor que acaba por revelar um tom de vingança. Podemos perguntar: no
que consiste a escrita da mulher negra brasileira? Qual o processo identitário essas
escritoras traçam na escrita? Claro que poderíamos tomar o discurso da autora
como generalizante a todas as escritoras brasileiras, mas cabe observar os
principais aspectos literários contemporâneos que movem a escrita de cada uma
delas, destacando assim, sobretudo, os traços da identidade e da autoafirmação
dessas afro descendentes.
Dando sequência as escritoras negras falaremos agora sobre Maria
Firmina dos Reis,nascida em São Luís, no Maranhão, no dia 11 de outubro de 1825.
Filha bastarda de João Pedro Esteves e Leonor Felipe dos Reis. Foi uma escritora
brasileira, e é considerada a primeira romancista brasileira. Em 1847, aos 22 anos,
ela foi aprovada em um concurso público para a Cadeira de Instrução Primária,
sendo assim a primeira professora concursada de seu Estado. Maria demonstrou
sua afinidade com a escrita ao publicar “Úrsula” em 1859, primeiro romance
abolicionista, primeiro escrito por uma mulher negra brasileira.

Foto 2: Maria Firmina Dos Reis.

O romance “Úrsula” consagrou Maria Firmina como escritora e também foi


o primeiro romance da literatura afro-brasileira, entendida esta como produção de
autoria afro descendente.
Podemos observar que este livro que a consagrou, também possuía uma
temática forte e uma reivindicação clara de uma mulher negra, pobre e que queria
vencer paradigmas diante de uma sociedade escravocrata e patriarcal. Não apenas
como um passatempo literário inocente, conforme os romances dedicados à leitura
feminina por muito tempo, Úrsula vai além de uma simples história de amor
impossível com final feliz. É em si, incontestavelmente, um grito, uma denúncia aos
absurdos impostos pela sociedade ao negro e a mulher no Brasil oitocentista.
Provavelmente ciente das dificuldades que encontraria ao publicar tal obra, Maria
Firmina adotou medidas preventivas ao tratar de sua própria obra.
Úrsula não foi publicado sob o nome de Maria Firmina dos Reis e sim sob
o pseudônimo “Uma Maranhense”. Já no prólogo, a autora afirma que “pouco vale
este romance, porque escrito por uma mulher, e mulher brasileira, de educação
acanhada e sem o trato e conversação dos homens ilustrados.” Por trás da modéstia
da autora, sincera ou não, pode-se observar a subserviência necessária à mulher ao
publicar um livro, ou seja, o exercício de uma atividade comum apenas entre
homens brancos, ricos e com acesso a educação europeia.

Foto 3: Capa do Livro Úrsula, de Maria Firmina Dos Reis.

Maria Firmina era sim uma mulher muito a frente do seu tempo, sempre
lutando por uma educação melhor e por melhores condições para os negros e as
mulheres e que ela seria a responsável pela composição do Hino da Abolição da
Escravatura. Maria Firmina morreu em 1917 aos 92 anos na cidade de Guimarães.
Teve em vida o privilégio de presenciar a Abolição da Escravatura e a Proclamação
da República. Porém, infelizmente, não pode presenciar o devido reconhecimento
dos críticos de sua época pelas suas obras e lutas. “Revelada” ao grande público
apenas na década de 1970, Maria Firmina dos Reis ainda é pouco presente na
historiografia da literatura canônica brasileira. É válida portanto, indubitavelmente,
toda a menção honrosa a memória dessa grande brasileira. Negra, nordestina,
pobre, bastarda, mulher.
E a nossa ultima e não menos importante escritora negra Carolina Maria
de Jesus, nascida em Sacramento (MG), Carolina mudou-se para a capital paulista
em 1947, momento em que surgiam as primeiras favelas na cidade. Apesar do
pouco estudo, tendo cursado apenas as séries iniciais do primário, ela reunia em
casa mais de 20 cadernos com testemunhos sobre o cotidiano da favela, um dos
quais deu origem ao livro “Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada”, publicado
em 1960. Após o lançamento, seguiram-se três edições, com um total de 100 mil
exemplares vendidos, tradução para 13 idiomas e vendas em mais de 40 países.
Moradora da favela do Canindé, zona norte de São Paulo, ela trabalhava como
catadora e registrava o cotidiano da comunidade em cadernos que encontrava no
lixo. Ela é considerada uma das primeiras e mais importantes escritoras negras do
Brasil.

Foto 4: A escritora brasileira Carolina Maria de Jesus é autora de "Quarto de Despejo"


Carolina foi descoberta pelo jornalista Audálio Dantas em 1958. Ele a
descobriu quando estava na comunidade para fazer uma reportagem sobre a favela
do Canindé. “Pode-se dizer que essa foi a primeira favela que se aproximou do
centro da cidade e isso constituía o fato novo”, relembrou. Ele conta que Carolina
vivia procurando alguém para mostrar o seu trabalho.
“Audálio recorda Carolina nos primeiros encontros como uma mulher
briguenta que ameaçava os vizinhos com a promessa de registrar as discórdias em
um livro. “Qualquer coisa ela dizia: Estou escrevendo um livro e vou colocar vocês
lá. Isso lhe dava autoridade”, relatou. Ao ser convidado por ela para conhecer os
cadernos, o jornalista se deparou com descrições de um cotidiano que ele não
conseguiria reportar em sua escrita. “Achei que devia parar com a minha pesquisa,
porque tinha quem contasse melhor do que eu. Ela tinha uma força, dava pra
perceber na leitura de dez linhas, uma força descritiva, um talento incomum”,
declarou. Entre descrições comuns do cotidiano, como acordar, buscar água, fazer o
café, Audálio encontrou narrativas fortes que desvendavam a vida de uma mulher
negra da periferia. Ela conta que tinha um lixão perto da favela, onde ela ia catar
coisas. Lá, ela soube que um menino, chamado Dinho, tinha encontrado um pedaço
de carne estragada, comeu e morreu. Ela conta essa história sem comentário,
praticamente. Isso tem uma força extraordinária, exemplificou. Para Carolina, a vida
tinha cores, mas, normalmente, essa não é uma referência positiva. A fome, por
exemplo, é amarela. Em um trecho do primeiro livro, a autora discorre sobre o
momento em que passa fome. Que efeito surpreendente faz a comida no nosso
organismo! Eu que antes de comer via o céu, as árvores, as aves, tudo amarelo,
depois que comi, tudo normalizou-se aos meus olhos. Para Audálio, o depoimento
ganha ainda mais importância por ser real. Um escritor pode ficcionar isso, mas ela
estava sentido, disse ele.”
Carolina Maria de Jesus é a representação da mulher negra
marginalizada que tem seu papel social estabelecido como suporte e, em dadas
circunstâncias, como fetiche passageiro e alegórico. Se num primeiro momento
Carolina ganhou visibilidade e apreço público, é certo que isso se deu por conta de
uma manifestação literária que trazia a vida do negro e do pobre a partir de uma
visão interna, experimental, testemunhal pela primeira vez o que representava a
satisfação de uma curiosidade, de um novo modelo, não a importância com a
verdade trazida por ela.
“Carolina é a própria complexidade da mulher negra. Ela traz consigo a
luta da raça, a luta do gênero, a luta da classe, a luta da maternidade e também a
contradição, a distorção, o abandono, a imposição, o empoderamento, a força. É a
mulher que mesmo acompanhada era só, a mãe que criou seus filhos sozinha, a
catadora de papelão, a mão que ergueu seu próprio barraco, a mão que escreveu
para erguer sua casa de alvenaria, a poeta, a sambista.
Trazida como uma das primeiras e mais importantes escritoras negras do
Brasil, o que se nota de fato é que Carolina não é lida tampouco estudada, refletida,
debatida. Ela não só escreveu sobre si e aqueles que a cercavam, também produziu
poesia, produziu música. Carolina é mais um fenômeno, uma atração, não tratada
com o respeito e a dignidade de uma produtora de material não só literário, mas
intelectual e cultural. Ela reflete o que ocorre com a grande maioria dos negros que
tem suas produções limitadas a um espaço e período de tempo. Deslegitima-se toda
a universalidade, genuinidade produtiva e inovação de sua obra. Carolina é uma
grande escritora desconhecida pela grande maioria da população e quando citada é
comparada com escritoras brancas como maneira de justificar a aparência de seu
nome. Não há uma preocupação acadêmica em compreendê-la a partir de seu lugar
de fala e a relevância de sua criação para um pensamento que questione as
populações marginalizadas, as mulheres negras, seu papel social e, inclusive,
dentro do feminismo, como também o significado intelectual do modelo de escrita
que ela traz inserida numa realidade de baixa escolaridade e muito autodidatismo.”
É preciso rever a existência, a produção e a verdade dessa mulher. É
preciso superar as contradições canônicas e aceitar que Carolina de Jesus é
contemporânea talvez não no que se estabelece pela ordem cronológica, mas
através de um pensamento que ultrapassa aquele momento histórico e reflete ainda
hoje a realidade de uma série de mulheres negras, chamadas mães solteiras,
catadoras de lixo, moradoras de favela. É preciso compreender que Carolina
simboliza a marginalização do negro mesmo nos espaços em que o colocam como
aclamado. Tendo certo que se aceita a voz do negro que quando não faz rir, gera
pena ou submissão. Mas se nega prontamente a voz do negro que aponta a
contradição, a subversão, a realidade opressora.

Considerações finais

No Brasil os estudos sobre mulheres negras tem se ampliado, porém


ainda levará algum tempo para que a complexibilidade dos problemas que envolvem
mulheres negras na sociedade brasileira sejam revelados. A mulher negra é invisível
para a sociedade, e isso vem desde a formação do país. Podemos constatar isso na
história, na politica, no entanto essas mulheres vem ocupando seu espaço aos
poucos e quebrando barreiras na literatura. Podemos observar que a partir da
autoria feminina negra, as mulheres negras traçam seu caminho de inserção na
literatura brasileira. Investindo contra várias formas de silenciamento, as mulheres
negras continuam buscando se fazer ouvir na sociedade brasileira, perpetuadora de
um imaginário contra o negro. Imagens nascidas desde uma sociedade escravocrata
perpassam, até hoje, profundamente, pelos modos das relações sociais brasileiras.

Referências bibliográficas

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