Resenha O Mestre Ignorante

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Vera M.

Pallamin

OBR e

e NSINO e APR e NDIZAG e M


D e ARQ u IT e T u RA e u RBANISMO:
AS LI e S D e O M e STR e
IGNORANT e

ps-

052

Re sumo
Prope-se pensar alguns aspectos significativos sobre ensino e
aprendizagem em arquitetura e urbanismo, a partir de um
comentrio do livro O mestre ignorante (1987), do filsofo
Jacques Rancire.

Palavras-chave
Ensino de arquitetura e urbanismo, princpio de igualdade,
emancipao intelectual.

ps n.22 so paulo dez embro 20 08

SOBRE LA ENSEANZA Y EL APRENDIZAJE


DE LA ARQUITECTURA Y URBANISMO:
LAS LECCIONES DE EL MAESTRO
IGNORANTE

Resume n
En el texto se propone pensar algunos aspectos significativos
de la enseanza y el aprendizaje de la arquitectura y
urbanismo, a partir de un comentario sobre el libro El maestro
ignorante (1987), del filsofo Jacques Rancire.

Palabras clave
Enseanza de arquitectura y urbanismo, principio de la
igualdad, emancipacin intelectual.

artigo s p. 052-06 0

053

ps-

O N TEACHING

AND LEARNING ABOUT

ARCHITECTURE AND URBANISM:


LESSONS FROM THE IGNORANT
SCHOOLMASTER

ps-

054

Abstract
This article addresses some teaching and learning practices
concerning architecture and urbanism based on a commentary
in Jacques Rancires book The ignorant schoolmaster (1987).

Key words
Teaching of architecture and urbanism, equality principle,
intellectual emancipation.

ps n.22 so paulo dez embro 20 08

(2) Idem, p. 18.


(3) Idem, p. 20.

artigo s p. 052-06 0

ps-

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(1) Publicao original: L


matre ignorant , Librairie
Arthme Fayard, 1987. O
mestre ignorante Cinco
lies sobre a
emancipao intelectual .
Traduo de Llian do
Valle. 2 ed. Belo
Horizonte: Autntica,
2004.

Nessa reunio voltada para a reflexo sobre o ensino e a aprendizagem em


arquitetura e urbanismo, abre-se uma oportunidade relevante para um comentrio
sobre o livro O mestre ignorante Cinco lies sobre a emancipao intelectual,
escrito pelo filsofo Jacques Rancire, em 19871 . Trata-se de uma obra feita do
entrelaamento de filosofia, educao e poltica, cuja dissonncia j aparece em
seu prprio ttulo: o que isso que o mestre ignora? Para as respostas rpidas:
no se trata de um chamado humildade, em uma verso atualizada do sei que
nada sei dito em um tom quase religioso nem de remeter-se dificuldade ou
impossibilidade de apreenso pari passu das crescentes e mltiplas ramificaes
epistmicas envolvidas na ao profissional, atualmente. Em que termos, ento,
essa escrita reflete sobre a relao entre ignorncia e emancipao intelectual, a
qual diz respeito a todos ns, sem exceo?
Embora a questo filosfica implicada no livro refira-se educao e
aprendizagem de modo abrangente, creio que ela pode ser proveitosamente
debatida em relao a alguns aspectos especficos do ensino superior de
arquitetura, que o que nos interessa neste encontro.
O livro nos conta a aventura intelectual do francs Joseph Jacotot, professor
de retrica, lnguas antigas, matemtica e direito, nascido em 1770. Aps a
revoluo de 1789 e com a restaurao da monarquia, ele foi exilado nos Pases
Baixos, onde passou a lecionar, no incio do sculo 19. Sem conhecer o holands
e com a tarefa de ensinar francs, ele estabeleceu um elo comum com seus
alunos, utilizando o livro intitulado Telmaco, publicado em Bruxelas, em edio
bilnge de 1699. Essa obra, da autoria de Franois de Salignac de La Nothe,
tambm chamado Fnelon, conta as aventuras de Telmaco, filho de Ulisses, o
heri grego.
Por meio de um intrprete, Jacotot solicitou aos jovens alunos que
aprendessem o texto francs, apoiando-se na traduo. Ao chegarem na metade
do livro primeiro, mandou dizer-lhes que repetissem sem parar o que haviam
aprendido e, quanto ao resto, que se contentassem em l-lo para poder narrlo 2 . Assim preparados, ele pediu-lhes, em seguida, que escrevessem, em
francs, o que pensavam sobre o texto. Tendo em vista a total ausncia de suas
explicaes prvias sobre a lngua, Jacotot ficou esperando por erros grosseiros ou
at pela impotncia de seus alunos. O resultado, no entanto, foi absolutamente
surpreendente: eles se saram notavelmente bem diante dessa difcil tarefa. Essa
experincia provocou uma revoluo no pensamento de Jacotot sobre o ato de
ensinar, j que seus alunos tinham aprendido sem que ele lhes tivesse dado
nenhuma explicao sobre a lngua e seus fundamentos. Esse fato de
importncia capital: eles, por si mesmos, haviam buscado as palavras francesas
que correspondiam quelas que conheciam e aprendido a combin-las para fazer
frases, cuja ortografia e gramtica tornavam-se cada vez mais exatas medida em
que avanavam na leitura do livro (...)3 .

O que passou a ser elaborado por Jacotot, a partir dessa experincia, foi
uma maneira completamente provocadora quanto ao pensamento pedaggico
tradicional e lgica do que ele denominou como sistema explicador. Este supe
a relao de uma inteligncia que sabe o mestre e a inteligncia do aluno,
que depende de suas explicaes. A explicao, diz-nos Rancire, divide o
mundo em dois, entre os sbios e os ignorantes, os maduros e os imaturos, os
capazes e os incapazes 4 . A lgica desse pensamento pedaggico tradicional
pauta-se em uma relao de desigualdade, de superioridade e inferioridade. O
explicador, nesses termos, institui o incapaz, na medida em que lhe interrompe o
movimento da razo e sua confiana em si mesmo.
Esse modo, para Jacotot, reduz-se a um verdadeiro mtodo de
embrutecimento, e seus avanos, sempre pautados na manuteno do princpio
da desigualdade, preocupam-se em esmerar mais e mais as explicaes, em uma
progresso infinita. O embrutecedor, ele diz, esclarecido e de boa f, e
parece-lhe bvia e indubitvel a necessidade de suas explicaes. Seu aluno ir,
pouco a pouco, entend-lo e mais tarde poder, este tambm, converter-se em
mais um explicador.

ps-

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(4) Idem, p. 24.


(5) Entretien avec Jacques
Rancire. Disponvel em:
<http://
www.multitudes.samizdat.net/
Entretien-avec-Jacques
Ranciere.html>.
(6) O mestre ignorante ,
p. 60-61.

No esquema tradicional pedaggico (...) desenvolve-se pouco a pouco


a inteligncia e, depois, o indivduo pouco a pouco se emancipa, se
libera, etc. [Inversamente,] A idia de Jacotot que a emancipao
precede sempre a aprendizagem. A emancipao a deciso
simplesmente de que se um igual. Na base de toda
aprendizagem intelectual h a deciso de que se um igual, que se
pode saber porque se um igual. O essencial a tomada de
conscincia da igualdade de todas as inteligncias . 5 (grifo nosso)
Contrapondo-se ao sistema explicador, Jacotot desenvolveu uma prtica de
ensino pautada na idia no de duas inteligncias, mas de uma s, e da vontade
como motor dessa inteligncia. A vontade a ao segundo um movimento
prprio, o fazer por necessidade interna, o que empurra frente a
inteligncia, essa habilidade em relacionar, observar, comparar, calcular, fazer e
dizer como se fez. Nesse olhar de Jacotot, o ser humano uma vontade munida
de inteligncia. E o oposto disso, o idiotismo, ser entendido por ele no como
uma ausncia de capacidade, mas como sonolncia da vontade, sono da
inteligncia atenta.

Toda a prtica do Ensino Universal [nos diz Rancire] se resume na


questo: o que pensas disso? Todo seu poder est na conscincia da
emancipao que ela atualiza no mestre, e suscita no aluno. O pai
poder emancipar seu filho, se comear por se conhecer a si
prprio, isto , por examinar os atos intelectuais de que o
sujeito, por observar a maneira como utiliza, nesses atos, seu
poder de ser pensante . 6 (grifo nosso)
O pressuposto da desigualdade tem alimentado modos de ensino, at hoje,
que se baseiam na idia de cada um em seu lugar, com sua inteligncia prpria.

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Esses modos confirmam as incapacidades no momento mesmo em que pretendem


reduzi-las. Contrariamente, afirma Rancire, a instruo pode significar o oposto:

[pode] forar uma capacidade que se ignora ou nega a se reconhecer


e desenvolver todas as conseqncias deste reconhecimento. O
primeiro ato se chama embrutecimento, o segundo emancipao. 7

(7) Jacques Rancire. Sur


Le matre ignorant (2).
Disponvel em: <http://
www.multitudes,samizdat.
net/Sur-le-Maitreignorant-2.html>.
(8) O mestre ignorante ,
p. 110.

Hobbes fez um poema mais atento do que Rousseau: o mal social no


vem do primeiro que pensou em dizer isso me pertence; ele vem do
primeiro que pensou em dizer: no s igual a mim. A desigualdade
no a conseqncia de nada, ela uma paixo primitiva
primitiva; ou mais
exatamente, ela no tem outra causa, a no ser a igualdade. A paixo
pela desigualdade a vertigem da igualdade, a preguia diante da
enorme tarefa que ela [a igualdade] requer (...). 8

(9) Idem, p. 30.


(10) Idem, p. 36.

Assim, opondo-se ao mtodo do embrutecimento, Jacotot praticou o que


chamou de mtodo da vontade 9. Paradoxalmente, diz-nos Rancire, seu mtodo
o mais velho de todos, j que no h algum que no tenha aprendido algo por
si mesmo. Cada um de ns, nesse momento, pode rememorar algo que aprendeu
sem que ningum tenha lhe explicado nada, e como isto, assim aprendido, age
ou agiu, muitas vezes, como matriz para a aprendizagem de muitas outras coisas.
O aprendizado da lngua materna o melhor exemplo do axioma dessa
inteligncia igualitria em ao. Jacotot quer, justamente, empregar esse modo
para instruir: todos praticam este mtodo, mas ningum quer enfrentar a
revoluo intelectual que ele implica, afirma Rancire 1 0.

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Respondendo pergunta feita inicialmente neste texto, o mestre ignorante


ignora a distribuio de superioridades e estabelece sua experincia pedaggica
no plano da igualdade das inteligncias, incluindo a sua. Nesse pensamento
filosfico, educacional e poltico trabalhado por Rancire a partir de Jacotot, a
igualdade no um efeito produzido, mas sim o ponto de partida, o
pressuposto de nossas atividades, o princpio fundante a ser atualizado em todos
os campos de nossa ao social e poltica. Esse o pilar central desta
argumentao. O mestre ignorante exerce no um saber que se impe diante da
ignorncia do outro, mas que aciona no outro a vontade do saber, de verificar a
prpria inteligncia. nesse sentido que ele fora uma capacidade a
reconhecer-se. Nesse processo, a vontade a mola propulsora do trajeto da
emancipao intelectual do aluno, um trajeto praticamente sem fim. preciso,
portanto, ressaltar que nas palavras de Rancire, nenhum saber traz, por si
prprio, a igualdade. H uma lgica de aplicao da inteligncia na manuteno
das razes da desigualdade, e uma outra lgica, alimentada na verificao
constante do pressuposto da igualdade, lgica essa que tem conseqncias
diretas em relao emancipao, tomada em termos mais abrangentes. H uma
analogia direta entre a emancipao intelectual e a ao poltica, entendida como
prtica de ruptura do funcionamento da desigualdade. Aqui se situa a questo
filosfica envolvida no ensino que nos fundamental. Como coloca Rancire,

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(11) Idem, p. 57.

Os procedimentos didticos praticados por Jacotot orbitam em torno dos


ncleos das seguintes perguntas: O que vs? O que pensas disso? O que fazes
com isso? Evidentemente, tal prtica no traz, em seu bojo, nenhuma
desautorizao da cincia. Ao colocar a igualdade em primeiro plano, ela trata da
atitude moral e poltica fundante na instruo de qualquer coisa a qualquer um.
O mestre ignorante no , necessariamente, um professor, mas pode ser
qualquer pessoa a exercer este princpio da igualdade das inteligncias. Na
escola, sobretudo naquela do ensino superior, esse mtodo no significa o
abandono da relao mestre-aluno nem a adoo de um vnculo frouxo entre
eles, pelo qual, em nome de sua prpria liberdade, o aluno tornar-se-ia um
pequeno tirano. Trata-se, antes, da ntida rearticulao dessa relao no sentido
da emancipao daquele que aprende. Para tanto, o mestre ignorante verificar
se o aluno buscou, ponderar sobre o que este descobriu, de modo que o aluno
mostre ter estudado com ateno, uma exigncia a qual, para aquele que
aprende, infindvel. O trabalho rduo est praticamente todo do lado do aluno.
muito importante que isso seja compreendido. O mestre verifica se o
estudante est investigando continuamente, ou se sua vontade est
adormecida...1 1
No ensino de arquitetura essa ao crucial. A dimenso da autopedagogia,
no campo do ensino de arquitetura, deve ser entendida no como fragilizao ou
desmembramento de contedos, mas sim como movimento de investigao, isto ,
projeto como pesquisa
aprendizagem como ao de busca; em sntese: projeto
pesquisa,
sempre
sempre. Este aspecto essencial aos estudantes de arquitetura, desde o incio de
sua formao: h enorme proximidade entre os verbos projetar e pesquisar. Para
um aluno da graduao desta escola, a palavra pesquisa pode lhe parecer
corriqueira, pois a todo momento ouve-se a expresso ensino e pesquisa. No
entanto, a conjugao do verbo pesquisar significa a entrada em um novo
domnio, no qual se lida com as indeterminaes do projeto. Ter um exerccio de
projeto pela frente significa, antes de mais nada, encarar um exerccio de busca,
cuja intensidade ser dada, para utilizar as referncias que temos visto at aqui,
pelo movimento prprio da vontade de cada aluno. nesse momento que entra
em ao a autopedagogia falada por Jacotot e Rancire, capaz de produzir uma
reviravolta nos resultados esperados. A conjugao de ambos os verbos projetar
e pesquisar deveria ser feita em conjunto durante todos os anos da graduao:
eu projeto/eu procuro/eu pesquiso. A prpria noo de pesquisa iria, pouco a
pouco, aprimorando-se, saindo do estrito levantamento de dados com o qual,
quase inevitavelmente, ser confundida no comeo, para ir se tornando um
campo de articulao de preceitos, um patamar do qual se consegue visualizar
limites, impasses, contradies e possibilidades do objeto estudado.
Um segundo aspecto a ser compreendido pelos alunos : projeto no se
explica
explica
explica, no sentido anteriormente mencionado desse termo. No h
metodologia, por mais apurada que seja, a dar conta, sem restos, da concepo
projetual ou do ensinar projeto. E no h como escapar dessa angstia, pela
prpria natureza do ato de projetar. Isso que, inicialmente, para o aluno, parece
ser o mesmo que enfrentar um mar aberto sem bssola, vai, gradualmente,
mudando de conotao, medida mesma de sua imerso no mundo da
arquitetura, este mundo no qual ele esteve envolvido desde sempre, como leigo, e

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(12) Idem, p. 7.

que passar a reaprender a v-lo, como arquiteto. No entanto, embora no seja


possvel explicar como projetar, aprende-se projeto, uma afirmao no to
bvia assim, neste contexto. Mais que isso, podemos dizer, sem grande margem
de erro: cada arquiteto acaba configurando o seu modo de projetar. Muito do
aprendizado da linguagem do projeto enquanto raciocnio depende dessa
autopedagogia da qual nos fala Jacotot, exercida por seus alunos ao se
aproximarem de uma lngua que desconheciam totalmente. Como vimos, a
entrada nesse domnio foi feita de traduo e contratraduo do no-sabido para
as significaes conhecidas, refazendo, continuamente, os pontos de passagem
entre um e outro. Houve uma instruo por eles conquistada e no a eles
concedida. Essa analogia pode ser til para introduzir o movimento
compreensivo dos estudantes de arquitetura, projeto aps projeto, quanto ao
espao e seus sentidos.
A arquitetura, hoje, menos definida por um conjunto de mtodos e objetos
que lhe seriam especficos, e muito mais por uma transversalidade de domnios
os quais permitem pensar e atuar sobre o espao e os objetos que nele definem
mtuas relaes e modos de identificao. Diante disso, ao vermos estudantes no
final do curso que, apesar de entenderem a linguagem do projeto, no a
possuem (uma forma de subordinao), ou outros a demonstrarem enorme
dificuldade terica em definir ou mesmo expressar seu trabalho final de
graduao, no h como evitar se pensar o quanto de embrutecimento no
sentido dito anteriormente ainda praticamos nesta escola. Nunca conseguiremos
apontar com o dedo o motivo exato desse processo, pois todos ns, docentes e
discentes, estamos a envolvidos. Cabe lembrar, contudo, que, para os alunos de
Jacotot, a sada foi dada pelo modo como os alunos se relacionaram com o
saber que lhes foi apresentado
apresentado. preciso ficar claro: foram eles que se
emanciparam de modo surpreendente, como visto no foi o professor a
emancip-los. A posio deste foi a de assumir a universalidade da igualdade das
inteligncias (no a dos saberes), recusando a lgica do superior-inferior12. Cabe
destacar, contudo, que o passo fundamental da emancipao intelectual foi dado
pelos prprios alunos, refazendo os limites de sua autodeterminao, o que, como
vimos, acabou transformando decisivamente a maneira como o professor passou a
atuar a partir de ento.
Esses dois autores, o filsofo e o professor, colocam na ordem do dia a
exigncia de pensarmos sobre a maneira pela qual temos exercido as
prerrogativas da desigualdade em nossos papis de docentes e alunos, e como a
temos alimentado em nossas prticas. Isso toca em dois extremos: por um lado, a
aura do especialista e seu campo de fora e empoderamento e, por outro, a
idia que se deve partir da realidade do aluno, a qual ningum, de fato,
conhece de antemo melhor que ele mesmo.
O processo de emancipao intelectual, repito, o caminho do exerccio de
autodeterminao no pensar, da autonomia do sujeito intelectual, uma via sempre
pessoal que percorre um relevo escarpado. Como sabemos, ningum se emancipa
de uma vez para sempre. Trata-se de um movimento sem fim tanto para
professores quanto para alunos deparar-se continuamente com novos atritos e
rugosidades, ligados a situaes e enfrentamentos cada vez mais complexos. H,
contudo, os que decretam para si mesmos terem atingido o saber, e

(13) Idem, p. 9.
(14) Idem, p. 142.

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abandonando a busca, descansam suas certezas sombra da sonolncia ou


distrao da vontade. Conforme adverte Rancire, a atualidade [de Jacotot]
lembrar que a hora sempre essa, que a hora da emancipao agora, que
sempre h a possibilidade de afirmar uma razo que no a razo dominante,
uma lgica de pensamento que no a lgica da desigualdade 13.
Essa emancipao de que nos fala o filsofo no tem a ver com uma ou outra
doutrina, mas sim com o modo de lidar-se com o saber, neste se verificando toda a
potncia da vontade e da capacidade intelectual. Um trabalho de cada um e para
o qual no h substitutos, [pois] jamais um partido, um governo, um exrcito, uma
escola ou uma instituio emancipar uma nica pessoa 14.

Obs.:
Texto apresentado no Seminrio Ensino Arquitetura e Urbanismo, realizado na
FAUUSP, em maio de 2007.

Vera M. Pallamin
Graduada em arquitetura e urbanismo (1980) e em filosofia pela USP, mestra e doutora
pela mesma faculdade. Cursou ps-doutorado na University of California, Berkeley, e na
Universit degli Studi di Firenze. professora doutora da USP, nos cursos de graduao
e ps-graduao.
e-mail: [email protected]

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