Tese Sandra Aparecida Silva
Tese Sandra Aparecida Silva
Tese Sandra Aparecida Silva
UM ALEPH:
BORGES, SEGUNDO O LIVRO DAS MIL E UMA NOITES.
ESTUDO COMPARATIVO DA POTICA RABE COMO
ELEMENTO DE CONSTRUO DA POTICA NARRATIVA DE
JORGE LUIS BORGES.
So Paulo
2008
UNIVERSIDADE DE SO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS
PS-GRADUAO EM TEORIA LITERRIA E
LITERATURA COMPARADA
UM ALEPH:
BORGES, SEGUNDO O LIVRO DAS MIL E UMA NOITES.
ESTUDO COMPARATIVO DA POTICA RABE COMO
ELEMENTO DE CONSTRUO DA POTICA NARRATIVA DE
JORGE LUIS BORGES.
So Paulo
2008
FOLHA DE APROVAO
Sandra Aparecida Silva
Teoria
Literria
Agradecimentos.
RESUMO
Palavras-chave: Jorge Lus Borges; Livro das mil e uma noites; El Aleph; El
libro de arena; Potica.
ABSTRACT
This study compares the poetic mimesis of the Arabic-Islamic world, specially the
book of tales The Arabian Nights, with the poetic mimesis of the AmericanHispanic world in Jorge Luis Borges literary production. The anonymous literary
composition The Arabian Nights became the main reference to speculate both the
form and the narrative construction strategies as well as the thematic contents
as a poetic creation of the Argentinian author. Due to the magnitude of the
borgesian literary production, this study has only considered the book El Aleph
(1946) and three narratives of El libro de arena (1975) El espejo y la mscara,
Undr and El disco. As a result, the study proposes to state that the ArabicIslamic Poetics, albeit a universal cultural patrimony, constituted itself in one of
the vital elements to the construction of Jorge Luis Borges Narrative Poetics.
SUMRIO
INTRODUO........................................................................................
10
16
Introduo.................................................................................................
1.1. O conceito de Oriente em Borges........................................................
1.2. Alguns conceitos metafsicos orientais em Borges...............................
16
17
20
22
29
32
34
39
44
47
54
57
60
62
66
71
Introduo.................................................................................................
2.1. A mmese potica rabe no perodo Pr-Islmico................................
2.2. A mmese potica com o Isl..............................................................
2.3. Relaes/ Oposies: o poeta urbano e corteso x o narrador nas
Noites........................................................................................................
2.4. Relaes do real x imaginrio, na Poesia e nas Noites. ....................
2.5. Elementos da mmese potica rabe em o Livro das mil e uma
noites. .....................................................................................................
71
72
75
84
91
95
98
108
109
112
120
Introduo. ..............................................................................................
3.1. Algumas pegadas nas areias de El libro de arena..............................
3.2. Trs contos de El libro de arena: El espejo y la mscara, Undr, El
disco. .......................................................................................................
120
121
124
124
129
133
89
91
144
151
3.5.1.
3.5.2.
3.5.3.
3.5.4.
152
156
159
162
168
170
172
174
178
182
183
184
187
188
189
193
196
199
204
206
210
215
221
221
225
228
231
Sobre Borges.............................................................................................
Sobre As mil e uma noites.........................................................................
Geral.........................................................................................................
Sites .........................................................................................................
ANEXOS.
1. Supplemental Nights Volume 2 Tale of the Two Kings and the Wazirs
Daughters. (Noite 602). Verso Burton......................................................
2. Nights 566578 - The story of the City of Brass/ A Cidade de Bronze.
Verso Lane. ............................................................................................
3. Don Rodrigo y la prdida de Espaa......................................................
233
237
254
10
INTRODUO
BORGES, Jorge Lus. El inmortal. In El aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1 :1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.544.
2
O uso de Noites pelo nome completo da obra, Livro das mil e uma noites, est baseado no texto de
JAROUCHE, Mamede Mustaf. Borges, autor das Mil e Uma Noites. In CULT Revista Brasileira de Literatura.
Ano III, n. 25, 1999, p 67-71.
3
JAROUCHE, Mamede Mustaf. Borges, autor das Mil e uma noites .In CULT Revista Brasileira de Literatura.
ano III, n. 25, 1999, p 68.
11
Com base em: Borges se resisti siempre a un uso poltico de la literatura. Los textos de Borges se colocan
en un campo histrico de fuerzas donde se enfrentam ideologas polticas. Siempre confes su aversin a una
literatura que fuera sensible a las presiones de las ideologas. SARLO, Beatriz. Borges, un escritor en las
orillas. Buenos Aires: Compaia Editora Espasa Calpe Argentina S.A/ Ariel, 1995, p.177-178, 189.
5
CHIAMPI, Irlemar. Rodrguez Monegal : crtica e inveno. In MONEGAL, Emir R. Borges :uma potica da
leitura. So Paulo : Perspectiva, 1980, p.10.
6
SARDUY, Severo. Barroco. Traduo de Maria de Lurdes Jdice e Jos Manuel de Vasconcelos. Lisboa: Veja,
1989, p.8-9, 62.
7
ADAB um conceito amplo e complexo na cultura rabe. Trata-se, em linhas gerais, do conjunto de
conhecimentos necessrios ao homem corteso como parte do decoro. Envolve diversos campos do saber:
literatura, tradio proverbial, filologia, filosofia, histria, geografia, etc. Ver a respeito desse conceito p. 7879 deste trabalho.
12
leitor ou do
ouvinte.
Tratando-se de um trabalho em literatura, na rea de Teoria Literria e
Literatura Comparada, a metodologia a comparativa, tendo em vista o universo
que se pretende abarcar. Foram necessrias leituras crticas acerca dos dois
objetos de estudo para poder compar-los. Houve, portanto, um levantamento
bibliogrfico de vrios campos temticos:
1) O universo de Borges reunido em suas Obras completas, em espanhol e
em portugus.
13
Borges,
mundo
literrio,
intertextualizado,
cujas
fontes
de
14
y una noches (Siete noches, 1980) e o poema: Metforas de Las mil y una
noches (Historia de la noche, 1977).
O segundo captulo - As mil e uma noites, segundo a Potica rabe - trata
mais de perto do processo de construo e de criao literria rabe. O captulo
visa a nos capacitar enxergar a potica do mundo rabe para alm do vu que
recobre nossa mentalidade ocidental bipartida e fragmentada; reconhecer que
desconhecemos em grande parte o mundo oriental rabe com fins ideolgicos;
perceber como Borges deve realmente ter ido beber naquelas fontes, como a
mesma gua de rios diferentes.
No terceiro captulo - Borges, segundo o Livro das mil e uma noites fazse um recorte da obra borgeana em que se estudam o livro El Aleph e apenas
trs contos de El libro de arena. O recorte adota o prprio princpio do objeto
aleph, que prope divisar o universo num nico ponto. Com isso, pretende-se
perceber a intrincada rede de textos borgeanos os quais contm, citam,
transformam, camuflam o texto de As mil e uma noites.
verdade que muitas vezes a leitura pareceu-nos um labirinto, em que
no sabamos mais a razo de estarmos ali, julgvamos ter perdido o fio de
Ariadne que deveria nos conduzir comparao com As mil e uma noites. O que
houve foi a mais pura seduo, um m que atraa sem saber muito direito para
onde. Esse captulo d o nome ao trabalho, como forma de reenviar a parte ao
todo, e certamente maneira de Borges.
A inteno ao estudar todo El Aleph foi fundamental para ter uma viso
global e no fragmentada de ao menos uma de suas obras. Todas as leituras que
existem da obra do autor, tomam-no aos pedaos: um conto que contm algo
que aparece tambm em x ou y. Tivemos o propsito de verificar a possibilidade
de organizar o livro El Aleph ao modo de As mil e uma noites em que uma
histria contada em muitas noites. Talvez Borges possa ter articulado suas
histrias assim, formando blocos narrativos, disfarados, podendo os contos
serem lidos isoladamente, como ocorre em As mil e uma noites, sem a
necessidade de ser a primeira ou a ltima narrativa, podendo-se ler o livro da
metade para a direita ou da metade para a esquerda, estando essas narrativas
organizadas em temas maiores. Isto justifica a leitura dos trs contos de El libro
de arena como se fossem pertencentes a um nico bloco narrativo.
Tentamos com certo atrevimento, como escalando os muros de duas
cidades, A Cidade de Bronze e A Cidade dos Imortais, ler Borges pelo vis de As
15
16
CAPTULO I.
A POTICA DO LIVRO DAS MIL E UMA NOITES, SEGUNDO BORGES.
Introduo
Trata-se dos textos El pucntual Mardrus e Las 1001 noches que no foram exatamente reunidos para resultar
em Los traductores de las mil y una noches, uma vez que o texto final foi acrescido de algumas passagens
novas para justificar o ttulo. Cf. LOUIS, Annick. Jorge Luis Borges: oeuvre et manoeuvres. Paris : LHarmattan,
1997, p.293-300.
9
Histria da eternidade (1936), em Obras completas de Jorge Luis Borges, volume 1.So Paulo: Globo, 2000,
p.438-457.
10
Histria da noite (1977), em Obras completas de Jorge Luis Borges, volume 3. So Paulo: Globo, 1999,
p.186-187.
11
Sete noites (1980), em Obras completas de Jorge Luis Borges, volume 3. So Paulo: Globo, 1999, p.256268.
17
Em Las mil y una noches, texto contido no livro Siete noches e o mais
tardio quanto a este assunto especfico, Borges faz um tipo de balano ou sntese
de seu conhecimento sobre as Noites. Por se tratar de outra retomada do
assunto, expe com mais clareza o seu conceito de Oriente que, para ele,
originou-se a partir do Livro das mil e uma noites. Diz, por exemplo, sentir
intimamente que las connotaciones de esa palabra [Oriente]... las debemos al
Libro de las mil y una noches12, implicando a questes de ordem filolgica,
geogrfica, histrica, filosfica, religiosa, cultural e poltica.
Na palavra
indicar el lugar en que sale el sol... ya en ella est, por una feliz casualidad, el
oro ... sentimos la palabra oro, ya que cuando amanece se ve el cielo de oro.
inegvel que a imagem paisagstica dessa natureza impressiona, que h uma
fora pictrica de cor e luz no vocbulo e um valor eterno conferido pelo metal
precioso. Contudo, mais que descrever o que o termo sugere ou atentar para as
suas conotaes sinestsicas, Borges define o que seja oriente e ocidente
12
Todas as citaes desta parte do trabalho foram retiradas de: BORGES, Jorge Luis. Las mil y una noches. In
Siete noches (1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas 3.1975-1985. 13 ed. Buenos Aires: Emec, 2005,
p.254-264.
18
19
Amrica Latina feita, muito embora ele nunca tenha deixado de ser um homem
e um escritor americano europeu, fundado na cultura ocidental, especialmente a
anglo-saxnica e mais tardiamente, a eslava 13.
Mesmo que o oriente de Borges seja livresco, dado a se conhecer pelas
tradues do Livro das mil e uma noites que o fascinaram desde menino, h um
13
MONEGAL, EMIR R. Borges :uma potica da leitura. So Paulo : perspectiva, 1980, p.47
20
oriente que ultrapassa esse mundo das letras, dos artifcios e das regras do jogo
literrio, das estruturas e das formas narrativas das Noites. primeira vista,
parece que a potica borgeana incorporou do universo literrio rabe apenas as
ferramentas
que
sustentam
no
estranho,
(n)o
indeterminado,
(n)o
14
15
14
JAROUCHE, Mamede Mustaf. Borges, autor das mil e uma noites. In CULT Revista Brasileira de Literatura.
So Paulo: Lemos Editorial. No. 25, Agosto de 1999, p. 67-71.
15
YOUNES, Ebtehal. Jorge Luis Borges y el patrimonio filosfico oriental. In Variaciones Borges 2/1996.
Denmark: Borges Center/ Aarhus Universitet, p. 87.
21
principal
ATTIE FILHO, Miguel. Falsafa: a filosofia entre os rabes; uma herana esquecida. So Paulo: Palas Athena,
2002, p. 45 e 46. Grifos nossos.
17
ABED AL-JABRI, Mohammed. Introduo crtica da razo rabe/ Mohammed Abed al-Jabri; traduo de
Roberto Leal Ferreira. So Paulo: Editora UNESP, 1999, p.76. (biblioteca bsica).
18
Observa Coleridge que todos los hombres nacen aristotlicos o platnicos. Los ltimos sienten que las
clases, las rdenes y los gneros son realidades; los primeros, que son generalizaciones; para stos, el
lenguaje no es otra cosa que un aproximativo juego de smbolos; para aquellos es el mapa del universo. El
platnico sabe que el universo es de algn modo un cosmos, un orden; ese orden, para el aristotlico, puede
ser un error o una ficcin de nuestro conocimiento parcial. A travs de las latitudes y de las pocas, los dos
antagonistas inmortales cambian de dialecto y de nombre: uno es Parmnides, Platn, Spinoza, Kant, Francis
Bradley; el otro, Herclito, Aristteles, Locke, Hume, William James. BORGES, Jorge Lus. El ruiseor de
Keats. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges. Obras completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos
Aires: Emec, 2007, p.117.
22
muito interessante
Borges.
In his fiction, he makes direct references to aspects of Islamic mysticism,
as well as demonstrates a familiarity with Islamic esoteric writing that
goes beyond superficial, mundane information. That Borges should be
familiar with Islam is in no way surprising. He is an extremely erudite
writer steeped in metaphysical tradition, but also in the Spanish heritage.
That heritage itself reflects eight centuries of close interaction with Arabs
(the Moors) a link between the author and Sufism.21
1.2.1 O sufismo
Para Plotino, os graus de conhecimento so quatro - sensibilidade, razo, intelecto, xtase - assim como
quatro so os graus do ser: matria, alma, nos , Uno. O Uno, Deus - segundo Plotino - a raiz de todo ser e
de todo conhecer, tudo depende dEle. No entanto, Ele transcende toda essncia e todo o conhecimento, de
sorte que inteiramente indeterminado e inefvel, e em torno dEle pode-se dizer apenas o que no - teologia
negativa. O universo deriva de Deus, no por criao consciente e livre, mas por emanao inconsciente e
necessria, que procede de Deus degradando-se at matria. Deus certamente transcende o mundo, mas o
mundo da sua mesma natureza. A primeira emanao representada pelo nos, inteligncia subsistente,
intuitiva e imutvel, que se conhece a si mesma e em si as coisas. A segunda emanao do Uno a alma; ela
procede do pensamento, como este procede do Uno. A alma contempla as idias - que esto no nos (um dos
graus do Ser) - e enforma a matria, segundo o modelo delas. A alma universal, a alma do mundo, por sua vez
se multiplica e especifica nas vrias almas individuais, que esto em escala decrescente do cu at os homens.
Tambm Plotino sustenta que as almas humanas caram de uma vida pr-mundana para o crcere corpreo;
tambm ensina a metempsicose e a converso. Com a alma termina o mundo inteligvel, divino, e comea o
mundo sensvel, material. A matria plotiniana, pois, no apenas potencialidade, indeterminao, mas
tambm mal, irracionalidade. Disponvel em http://www.mundodosfilosofos.com.br/neoplatonismo.htm. Acesso
em 17 dez 2007.
20
ATTIE FILHO, Miguel. Falsafa: a filosofia entre os rabes; uma herana esquecida. So Paulo: Palas Athena,
2002, p.154.
21
Em sua fico, faz referncias diretas a aspectos do misticismo islmico, tanto quanto demonstra uma
familiaridade com a escrita esotrica islmica que vai alm do superficial, da informao mundana. Que Borges
seria familiar com o Isl no uma surpresa. Ele um escritor extremamente erudito apoiado em tradio
metafsica, bem como na herana espanhola. Tal herana em si reflete oito sculos de interao muito prxima
com rabes (os mouros) ... uma ligao entre o autor e o sufismo. Traduo nossa. ELIA, Nada. Islamic
esoteric concepts as Borges strategies. . In Variaciones Borges 5/1998. Denmark: Borges Center/ Aarhus
Universitet., p. 129-130.
23
refere-se a uma prtica como experincia interna com a divindade que se reflete
no modo de viver e de se comportar do homem sufi e no convite experincia
do xtase na unio com Deus.22
Para o sufismo, Deus se manifesta em todas as coisas do universo porque
todos os fenmenos emanam dEle, como concepo de um ser Uno e Eterno,
idias advindas de Plotino: a unidade... que envolve uma multiplicidade, que,
por sua vez, desenvolve o Uno maneira de uma srie.23 El problema filosfico
central del pensamiento de Borges es el de lo uno y lo mltiple24, temas
fundamentais na mstica islmica. Nesses conceitos, do Uno e do Mltiplo, est
posta a questo de Deus, e a partir deles, decorrem outros temas sufistas que os
amplificam e tm eco em Borges.
Trata-se de temas como o do espelho, servindo como reflexo e
multiplicao do mesmo; do zahir e do batin, como o aparente e o oculto; do
sonho, como vida e iluso e o despertar dele, como morte e realidade; do
labirinto, como multiplicidade de caminhos e eternamente se fazendo; do Mesmo
e o Diferente/ Eu e o Outro, como limitao humana na compreenso do
universo.
No ensaio El Enigma de Edward Fitzgerald25, por exemplo, Borges trabalha
esses conceitos, do uno e do mltiplo, que se referendam na fonte rabe, como
apoio e como material argumentativo do texto.
la hertica y mstica Enciclopedia de los Hermanos de la Pureza, donde
se razona que el universo es una emanacin de la Unidad, y regresar a la
Unidad Lo dicen proslito de Alfarabi, que entendi que las formas
universales no existen fuera de las cosas, y de Avicena, que ense que el
mundo es eterno.26
A partir das idias do mstico persa Farid-ud-din Attar (sc. XII) em sua
22
ATTIE FILHO, Miguel. Falsafa: a filosofia entre os rabes; uma herana esquecida. So Paulo: Palas Athena,
2002, p. 56.
23
DELEUZE, Gilles. A dobra: Leibniz e o barroco / Gilles Deleuze. Traduo Luiz B.L.Orlandi.- Campinas, SP:
Papirus, 1991. P.46
24
YOUNES, Ebtehal. Jorge Luis Borges y el patrimonio filosfico oriental. In Variaciones Borges 2/1996.
Denmark: Borges Center/ Aarhus Universitet., p. 88.
25
BORGES, Jorge Lus. El enigma de Edward Fitzgerald. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p. 80.
26
Id, 2007, p.80.
24
Graas traduo, que Borges entende como recriao, sendo quase uma
opinio e uma inveno, os dois poetas, como espelhos diversos e de formas
variadas, refletem a mesma idia que se mostra diferente, porque dependeu de
um ponto de vista, daquilo que o tradutor-autor, Fitzgerald, alcanou ou pde
ver nos versos persas e que repercute infinitamente em outros poetas, no tempo
e no espao, como outros reflexos do mesmo.
En las Rubaiyat se lee que la historia universal es un espectculo que Dios
concibe, representa y contempla; esta especulacin (cuyo nombre tcnico
es pantesmo) nos dejara pensar que el ingls pudo recrear al persa,
porque ambos eran, esencialmente, Dios o caras momentneas de Dios.
Las nubes configuran, a veces, formas de montaas o leones eran muy
27
En el decurso de esta noticia, me he referido al Mantiq al-Tayr (Coloquio de los pjaros) del mstico persa
Farid al-Din Ab Talib Muhmmad ben Ibrahim Attar, a quien mataron los soldados de Tule, hijo de Zinjis Jan,
cuando Nishpur fue espoliada. Quiz no huelgue resumir el poema. (Tambin Plotino Enadas, V, 8,4
declara una extensin del princpio de identidad: Todo, en el cielo inteligible, est en todas partes. Cualquier
cosa es todas las cosas. El sol es todas las estrellas, y cada estrella es todas las estrellas y el sol). El Mantis alTayr ha sido vertido al francs por Garcin de Tassy; al ingls por Edward FitzGerald; para esta nota he
consultado el dcimo tomo de Las 1001 Noches de Burton y la monografa The Persian Mystics: Attar (1932) de
Margaret Simit. Citao em nota de rodap, p. 418. BORGES, Jorge Lus. Dos notas. El acercamiento a
Almotsim. In Histria de la eternidad (1936). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2 ed., 14
reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 414-418.
28
YOUNES, Ebtehal. Jorge Luis Borges y el patrimonio filosfico oriental. In Variaciones Borges 2/1996.
Denmark : Borges Center/ Aarhus Universitet., p. 95.
29
BORGES, Jorge Lus. El enigma de Edward Fitzgerald. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p. 80-81.
25
a existncia de um
mundo inferior como reflexo do superior, onde Deus, neste espelho contempla a
sua prpria imagem. Em havendo espelho, h imagem dupla: a dualidade do
aparente (Zahir) e do oculto (Batin), do implcito e do explcito, emanados da
divindade e que se manifestam no universo, no ser humano e na interpretao
de ambos. Para llegar al sentido oculto Batin hay que interpretar lo explcito
Zahir como se interpretan las apariencias de un sueo, a fin de llegar a su
sentido implcito.31
Ao produzir imagens ilimitadas, o espelho tanto origina quanto inclui todas
as possveis imagens, concretas ou abstratas, provocando
la idea de la esfericidad del universo, de la esfera como metfora de las
metforas, presente tanto en Ibn Arabi como en Borges: el universo es
una esfera cuyo centro es la esencia divina y cuya circunferencia es
ilimitada y absoluta porque abarca todas las cosas, antiguas e nuevas, al
mismo tiempo Segn esta visin circular, el mundo para Ibn Arabi no es
un proyecto cumplido, sino una operacin de creacin infinita, continua y
perpetua.32
30
Ibid, p. 82-83.
YOUNES, Ebtehal. Jorge Luis Borges y el patrimonio filosfico oriental. In Variaciones Borges 2/1996.
Denmark: Borges Center/ Aarhus Universitet., p.92.
32
Ibid, p. 95.
31
26
34
. Na iluso
33
34
Ibid, p. 96.
Ibid, p. 93.
27
37
35
BORGES, Jorge Lus. El zahir. In El aleph(1936). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2 ed.,
14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 594-595.
36
BORGES, Jorge Lus. Del culto de los libros. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p. 112.
37
Id, p. 112.
28
38
os homens.
O mesmo se d com a questo do Tempo, em que todos os dias vividos
podem se reduzir a um nico dia ou a uma nica noite como a noite da
Revelao (Qadr), em que todos os momentos de uma vida inteira se reduzem a
um nico instante, o mais fundamental de todos, como em La otra muerte39.
H, ento, uma diferena especulada
entre
tempo
divino, que
BORGES, Jorge Lus. Los telogos. In El aleph (1936). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 550-556.
39
BORGES, Jorge Lus. La otra muerte. In El Aleph (1936). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 571-575.
40
BORGES, Jorge Lus. El milagro secreto. In Ficciones (1944). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 508-513.
41
Ibid, p. 508.
29
marginalizados
pelo
mundo
ocidental, hace
O nome da obra - Livro das mil e uma noites - considerado por Borges
um dos mais belos de toda a literatura e em si consubstancia duas idias que
aliceram sua potica: a de ser uma experincia com o Tempo e a de significar
Infinito: el infinito tiempo de Las mil y una noches.44
Os nmeros desempenham papel fundamental nessa idia de vastido,
pois sugerem as inumerveis ou incontveis noites. Dizer mil e uma noites
acrescentar mais uma ao infinito e tornar o prprio livro infinito, que
virtualmente o .
Vrias so as explicaes dadas pelos tradutores45 sobre a incorporao do
legendrio nmero. Littmann sugere a influncia turca da expresso bin bir que
literalmente significa mil e um, e conota muitos. Para Lane, h el mgico temor
de las cifras pares entre os rabes, que poderiam trazer mau agouro. Galland, de
sada eliminou a repetio do original e traduziu, desde 1704, como Mil e Uma
42
Borges quem o faz [junta elementos do Ocidente e do Oriente de modo] a fundi-los e harmoniz-los...
mesclando os cenrios de Buenos Aires com os ingleses, coisas que dizem respeito ao mundo oriental medieval
com os da renascena espanhola, e o sculo XX argentino de Borges com o sculo XII andaluz de Averris,
porque ele v todas estas manifestaes como variaes em um nico eixo ou como metforas de um ncleo
central. Traduo nossa. GHAZOUL, Ferial J. Nocturnal poetics. The Arabian Nights in comparative context.
Cairo: The American University in Cairo Press, 1996, p. 126.
43
SARLO, Beatriz. Borges, un escritor en las orillas. Buenos Aires: Ariel, 1995, p.16.
44
BORGES, Jorge Lus. Las mil y una noches . In Siete noches (1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas,
volume 3. 13 edio. Buenos Aires: Emec, 2005, p.264.
45
BORGES, Jorge Lus. Los traductores de las 1001 noches. In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis
Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 406.
30
46
Observemos que Borges escreve Hezar (em Los traductores) e Hazar (em Siete noches).
BORGES, Jorge Lus. Las mil y una noches . In Siete noches (1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas,
volume 3. Buenos Aires: Emec, 2005, p. 260.
47
31
No fictcio, conota o mundo dos mistrios que propcio aos sonhos ou aos
pesadelos, entre luz e sombra; ao irreal como realidade privilegiada; ao fabuloso,
ao mgico e ao fantstico; ao poder de enxergar para alm do que os olhos
vem e a alma acredita. Trata-se do infinito tempo da eternidade da imaginao
transcendental,
Mas o mistrio, o infinito leva a uma imerso na noite. , por isso, que as
histrias so contadas noite; por isso que Muhammad recomenda que
o Alcoro seja lido noite; e por isso que a revelao obtida na noite:
a noite da Revelao. por isso que, no calendrio muulmano, h a noite
do Qaddar (predestinao), ou seja a noite do Destino. O Destino nosso
uma realidade noturna. O Ramadan, com sua lua de Ramadan,
evidentemente, a noite. A viagem que faz Muhammad de Makkah a
Jerusalm a Viagem Noturna. E, ali adiante, na maonaria, no
48
JAROUCHE, Mamede M. Borges, autor das mil e uma noites. In CULT- Revista Brasileira de Literatura. Ano
III, n.25. So Paulo: Lemos Editorial. Agosto, 1999, p. 70.
49
CANSINOS-ASSENS, Raphael. Estudio literario-crtico de Las mil y una noches. In Libro de Las mil y una
noches. tomo I. 5 ed. Mxico: Aguilar, 1993, p.32.
50
GARDET, Louis. Concepes muulmanas sobre o tempo e a histria. In As culturas e o tempo. Estudos
reunidos pela Unesco. Paul Ricoeur [e outros]. Trad. de Gentil Titton, Orlando dos Reis e Ephraim F. Alves.
Introduo de Paul Ricoeur. Petrpolis: Vozes; So Paulo: Edusp., 1975, p. 234-235.
32
55
51
HADDAD, Jamil Almansur. Interpretaes das Mil e uma noites. Palestra de 1986. Disponvel em
http://www.hottopos.com/collat6/jamyl.htm Acesso em 02 nov 2007.
52
BORGES, Jorge Lus. La divina comedia . In Siete noches (1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas,
volume 3. 13 edio. Buenos Aires: Emec, 2005, p.229.
53
BORGES, Jorge Lus. Los traductores de las 1001 noches. In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis
Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 397-413.
54
Um dos primeiros textos crticos de Borges de 1926 a respeito da traduo e no includo em seus livros de
ensaios da dcada de 20 mas que antecipa praticamente toda a sua idia sobre este tema da traduo. Cf.
LOUIS, Annick. Jorge Luis Borges: oeuvre et manoeuvres. Paris: LHarmattan, 1997.
55
Ensaio contido em Discusin, de 1932. In Jorge Luis Borges. Obras completas. volume 1. Buenos Aires:
Emec, 2002, p.239-243.
56
Trata-se da discusso entre Matthew Arnold e John Henry Newman devido publicao da traduo de
Homero por Newman. Arnold critica duramente tal verso em trs conferncias realizadas em Oxford e que se
tornaram um livro, On Translating Homer: Three Lectures Given at Oxford, 1861. Houve resposta de Newman e
Arnold realizou a 4 e ltima conferncia sobre o assunto, que tambm se tornou livro no ano seguinte, 1862:
On translating Homer:last words: a lecture given at Oxford. Traduo nossa. Cf. LOUIS, Annick. Jorge Luis
Borges: oeuvre et manoeuvres. Paris: LHarmattan. 1997, p.319/320.
33
57
BORGES, Jorge Lus. Las versiones homricas. In Discusin (1932). In Jorge Luis Borges. Obras completas,
volume 1. Buenos Aires: Emec, 2002, p.241.
58
PASTORMERLO, Sergio. "Borges y la traduccin" Borges Studies Online. On line. J. L. Borges Center for
Studies & Documentation. Internet: Disponvel em http://www.uiowa.edu/borges/ bsol/pastorm1.shtml. Acesso
em 25 set 2006.
59
Id., Acesso em 25 set 2006.
34
uma dada verso com o original [...], mas como impossibilidade de se ignorar a
necessidade de diferir das tradues j existentes desse mesmo original60.
O espao da traduo, portanto, na concepo de Borges, no o lugar de
reencontro entre o texto estrangeiro e o texto traduzido, mas o lugar onde o
tradutor pode ser considerado um escritor, por se inscrever no texto pela sua
lngua, pela sua cultura, na sua poca e devido ao seu carter particular. uma
leitura do texto que est sendo traduzida ou concebida, sendo quase impossvel
uma traduo autntica. Por isso, a traduo pode ser considerada um campo de
enfrentamento
entre
culturas,
entre
concepes
literrias,
entre
tempos
historicamente demarcados.
A traduo acaba sendo, ento, o terreno em que uma obra apropriada
por outra literatura e, no caso do Livro das mil e uma noites, vai alm porque se
trata de sua incorporao ao Ocidente. O texto Los traductores de las 1001
noches tornou-se o registro da histria desta incorporao e o campo de luta em
que ela se deu.
W.H.Macnaghten
(publicao
de
Calcut,
1839),
John
Payne,
e a conotao de qualidade
negativa ao haver uma traduo fiel e literal. Por isso Los traductores contm a
idia de que o mais difcil e o mais importante numa traduo, a traduo do
esprito do texto.
Ao explorar a questo do gosto esttico do tradutor, o texto fica composto
por trs partes: El capitn Burton; El doctor Mardrus e Enno Littmann. Desde o
incio, o ensaio centra-se na questo das relaes que as diversas verses do
Livro das mil e uma noites, em francs, ingls e alemo (e lateralmente em
espanhol, com a verso de Cansinos Assns) mantm entre si e de como os
tradutores formaram uma dinasta enemiga, uma querendo aniquilar e sobrepor60
SANTAELLA, Lcia. Literatura traduo: J.L.Borges. In
Montoto (orgs.). So Paulo: EDUC, 1999, p.148.
35
A produo de uma
nova verso ou adaptao acaba por valorizar mais a traduo que o prprio
texto original. Los traductores organiza-se, ento, de tal modo que o seu enredo
no mostra o Oriente e nem reala o texto rabe.
El capitn Burton, como parte inicial do texto, estabelece um tipo de
brincadeira como o jogo de domin, em que uma pea pede a outra ao mesmo
tempo que a elimina: Lane tradujo contra Galland, Burton contra Lane; para
entender a Burton hay que entender esa dinasta enemiga.61.
Jean Antoine Galland, sendo o primeiro tradutor do livro para a Europa,
entre 1704-1717, apresentado como o fundador de um texto ocidental que
passa a ser considerado um cnone, inclusive no mundo rabe. Galland ignorava
toda preciso literal e no se preocupava com anotaes.
Utilizou um manuscrito e um texto oral, graas memria de um
maronita, o que o fez incluir contos, provavelmente considerados apcrifos62, e
que foram incorporados tornando-se fundamentais s Noites: el de Aladino, el de
los Cuarenta Ladrones, el del prncipe Ahmed y el hada Peri Ban, el de
Abulhasn el dormido despierto, el de la aventura nocturna de Harn Arrashid, el
de las dos hermanas envidiosas de hermana menor.63
Galland instituiu a tradio de se inscrever no texto traduzido, e no caso
dele, ao gosto francs de sua poca, com sabor adocicado do sculo XVIII.
Utilizou expresses que no caberiam ao espao rabe, censurou o texto por
considerar as baixezas de mau gosto que, segundo Borges, inspiraram-se pelo
decoro, no pela moral.
Los musulmanes de Galland se saludan a la francesa: H Monsieur! H
Madame!; para expresar su asombro exclaman: Bon Dieu! y no Ua-ILah! En sus comidas les sirven manjares franceses, y el dulce de pipas de
granada en la cocina de Galland se convierte en una tarte la crme. Y
finalmente -esta si que es gorda! -, en la Historia del mercader y el efrit
(Noches 1 y 2), que va al comienzo del libro, Galland traduce pellejillo,
pelcula el naua rabe, que significa hueso de fruta, de lo que resulta
que es con un pellejillo o telita de dtil, que el mercader lanza al aire,
61
BORGES, Jorge Lus. Los traductores de las 1001 noches. In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis
Borges. Obras completas, volume 1. Buenos Aires: Emec, 2002, p.397.
62
Las historias de Las mil y una noches eran fondo comn de los narradores antes que se juntasen bajo ese
epgrafe []. Sucede que la distincin entre lo autntico y apcrifo se inspira esencialmente en impresiones
subjetivas. CANSINOS-ASSENS, Raphael. Estudio literario-crtico de Las mil y una noches In Libro de Las mil
y una noches. tomo I. 5 ed. Mxico: Aguilar, 1993, p.37.
63
BORGES, Jorge Lus. Los traductores de las 1001 noches. In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis
Borges. Obras completas, volume 1. Buenos Aires: Emec, 2002, p.397.
36
despus de comerse la pulpa, con lo que hiere en un ojo y mata al hijo del
alifrite, que por ello pide el precio de su sangre.64
numerosas
notas
de
letras
midas
acumulando
um
caos
de
64
CANSINOS-ASSENS, Raphael. Estudio literario-crtico de Las mil y una noches In Libro de Las mil y una
noches. tomo I. 5 ed. Mxico: Aguilar, 1993, p.40.
65
BORGES, Jorge Lus. Los traductores de las 1001 noches. In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis
Borges. Obras completas, volume 1. Buenos Aires: Emec, 2002, p.398.
66
JAROUCHE, Mamede M. Borges, autor das Mil e uma noites. In CULT Revista Brasileira de Literatura. Ano III,
n.25. So Paulo: Lemos Editorial. Agosto, 1999, p. 70.
37
Quanto ao que cabe verso Burton, este parece ser o tradutor preferido
de Borges: o capito Burton, homem legendrio que falava 17 idiomas, que
publicou 70 livros, que venerava Lord Byron e o Isl entre outras coisas. El
Burton de la leyenda de Burton, es el traductor de las Noches.[] Aventuro la
hiprbole: recorrer Las 1001 Noches en la traslacin de Sir Richard no es menos
increble que recorrerlas
por
Simbad el Marino.68
Para Borges, Burton persegue trs objetivos em sua traduo. Justificar e
ampliar sua reputao de arabista, pura redundncia; ser ostensivamente
diferente
de
Lane,
porm
incorre
na
mesma
falta
por
inscrever-se
pblico britnico por uma nova verso dos contos muulmanos do sculo XIII,
idealizando ou esquecendo-se, talvez, de que se dirigia a outras pessoas
totalmente diferentes no tempo e no espao daquele pblico para o qual as
histrias haviam sido elaboradas.
El Doctor Mardrus, como segunda parte do ensaio, foi originalmente El
Puntual Mardrus, pontual como sinnimo de exato. H uma certa ironia nesse
ttulo, porque ao mudar para doutor, fomentou-se a imagem de algum ligado
67
BORGES, Jorge Lus. Los traductores de las 1001 noches . In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis
Borges. Obras completas, volume 1. Buenos Aires: Emec, 2002, p.400-401.
68
Ibid, p. 403.
38
69
LOUIS, Annick. Jorge Luis Borges: oeuvre et manoeuvres. Paris: LHarmattan.1997, p.334. ( traduit dans le
but dadapter les Mille et Une Nuits un genre littraire teint dorientalisme, cest--dire une tradition
occidentale.)
70
BORGES, Jorge Lus. Los traductores de las 1001 noches . In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis
Borges. Obras completas, volume 1. Buenos Aires: Emec, 2002, p.409.
71
Ibid, p. 410.
39
Nas
consideraes
finais
de
Los
traductores,
Borges
ratifica
um
fontica),
uma
questo
lingstica,
um
discurso
40
74
72
41
Quando Borges alega que uno tiene ganas de perderse en Las mil y una
noches
76
Uno sabe que entrando en ese libro puede olvidarse de su pobre destino
humano, porque graas fico possvel evadir-se da inevitvel aceitao do
mundo do real com suas experincias e fragilidades humanas. Assim, esse
mundo hecho de unas cuantas figuras arquetpicas y tambin de individuos,
caminho para um otro lugar e um otro tiempo, nesse mundo da fico.
O pobre destino humano, fadado ao presente e ao (sem) sentido do real,
est ali nas Noites para dar conta do mundo real aqui presente - que no volta
jamais por ocorrer uma nica vez - por isso finito e impossvel de se repetir ou
de restituir o que j foi, por isso capaz de dar distncia para o homem se
enxergar de outro lugar e de outra forma, caso oua o eco de uma voz sbia e
atenta s vicissitudes da vida, que faz o real tornar-se iluso e a iluso tornar-se
real.78
No ensaio La postulacin de la realidad , Borges coloca que
76
BORGES, Jorge Lus. Las mil y una noches . In Siete noches (1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas,
volume 3. Buenos Aires: Emec, 2005, p. 260.
77
ALAZRAKI, Jaime. La prosa narrativa de Jorge Luis Borges. Temas e estilo. Madrid: Editorial Gredos, 1968,
p.88.
78
ROSSET, Clment. A iluso metafsica: o mundo e seu duplo. In O real e seu duplo- ensaio sobre a iluso;
traduo Jos Thomaz Brum. Gallimard, 1976/ SP:L/PM , 1988, p.41-59.
42
Talvez por isto Borges alegue, em Siete noches, que o Oriente real no
existe. O que se tem deste mundo oriental firmado em generalizaes cujo
conceito, estereotipado pelo menos neste texto, est baseado em duas imagens:
a de um mundo real de extremos, em que as pessoas j praticamente foram
transformadas em personagens, e a de um mundo de magia e de tesouros
escondidos.
O problema literrio central para o romance, de acordo com El arte
narrativo y la magia81, diz respeito causalidade, ou seja, ao encadeamento de
79
BORGES, Jorge Lus. La postulacin de la realidad. In Discusin (1932). In Jorge Luis Borges. Obras
completas, volume 1. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 218.
80
MOLLOY, Sylvia. Las letras de Borges. Buenos Aires: Editorial Sudamericana, 1979, p. 111.
81
BORGES, Jorge Lus. El arte narrativo y la magia. In Discusin (1932). In Jorge Luis Borges. Obras
completas, volume 1. Buenos Aires : Emec, 2002, p. 226-232.
43
82
83
44
1.5.1. O fantstico
do que
seja o universo, a sua criao, a existncia de Deus ou a lgica divina para essa
realidade que escapa mente humana, tornam-se smbolos da fora imaginativa
e inventiva humana, verdadeiros elementos ldicos para reconstruir mundos
imaginrios.
Por isso, os vrios elementos alphicos85 se metamorfoseiam em Borges,
desde sempre, simbolizando ou metaforizando a iluso humana da eterna
procura por um sentido para o infinito, para as conseqncias de uma
imortalidade humana, para a instaurao de uma ordem no caos que parece ser
84
BORGES, Jorge Lus. El enigma de Edward Fitzgerald. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p. 81.
85
Termo utilizado por: ABAD, Jose M.Cuesta. Ficciones de una crisis. Potica e interpretacin en Borges.
Madrid: Gredos, 1995, p.36.
45
SOUZA, Eneida Maria de. O sculo de Borges./ Eneida Maria de Souza. Belo Horizonte: Autntica/ Rio de
Janeiro: Contra Capa Livraria, 1999, p.46-47.
87
BORGES, Jorge Lus. Las mil y una noches . In Siete noches (1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas,
volume 3. Buenos Aires: Emec, 2005, p. 260.
46
sonora e visual que expressa ou molda ou procura dar conta de uma realidade
impossvel.
Como estratgia narrativa, o fantstico atenta ao detalhe pequeno ou a
certa mincia despercebida,
determinado, en el corazn de
88
un universo
deserto devido ao exagero de luz pode ter suas relativas compensaes noite,
quando a impreciso, a deformao como acontecimentos onricos ou de loucura
podem ser relatados sob outra luz, a da lua, que mantm o carter de espelho
num eterno jogo barroco entre luz e sombra. Nesta contraposio, inmeros
significados so possveis.
O mundo do fantstico, vido por um mundo de abismos profundos do
sobrenatural, procura extrair da irrealidade, do inconsciente a mais evidente
realidade consciente para ser a descida s profundezas do ser.
La mitad de abajo, la mitad aprisionada, hundida, ntima, comprimida,
inferior, nocturna; el reino de los muertos y de los sepulcros, de los
sueos y de las pesadillas, de los demonios; el lugar de las verdades
indecibles, de los encantamientos oscuros, de los miedos irresistibles, de
las tentaciones inconfesables. La otra mitad, la sobrenaturalaza area de
88
CAILLOIS, R. Fantastique, en C.Grgory (ed), Encyclopaedia Universalis, E.U. Paris, France, VI, 1980, ad
vocem. In CESERANI, Remo. Lo Fantstico. Buenos Aires: Visor Editora, s/d., p. 68.
89
CESERANI, Remo. Lo fantstico. Madrid: Visor Editora, 1999, p. 113.
47
los espritus libres y puros y de los ngeles, de los caelicolae de todas las
religiones, no est concernida por aquel modo; es sustancialmente
extraa a lo fantstico. Muy a menudo las imgenes y presencias que
afloran del abismo del sueo o de la memoria o de la conciencia o de la
mente son fascinantes y sumamente atractiva, pero su belleza tiene
siempre la opacidad, la palidez, la gelidez inquietante del cadver y de lo
inanimado o la incorprea consistencia y la umbratilidad huidiza del
ectoplasma: vienen de la muerte y encarnan un deseo de muerte, Unirse
a ellas significara disolverse, hay que escapar de ellas para vivir. 90
Em La esfera de Pascal
91
no tempo e no
espao do leitor.
Una de las cosas que l [Borges] mantiene es la idea de que en realidad la
literatura es de todos y de que los grandes aciertos literarios se dan un
poco por milagro o por azar. [] la contingencia del juicio histrico no
tiene en cuenta el hecho de que las metforas fundamentales, las
historias bsicas, los aciertos estilsticos, ya estn dados. Ah hay un
platonismo que est construido con toda la gracia, la irona y la
maledicencia con la que Borges se maneja, y que viene a decir que en
realidad la gran literatura en el fondo es annima. [Para Borges] las
90
LUGNANI, L. Verit e disordine, cit., p.248-249. In CESERANI, Remo. Lo fantstico. Buenos Aires: Visor
Editora, s/d., p. 116.
91
BORGES, Jorge Lus. La esfera de Pascal. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p. 16-19.
48
Ver en el da o en el ao un smbolo
de los das del hombre y de sus aos,
convertir el ultraje de los aos
en una msica, un rumor y un smbolo,
92
PIGLIA, Ricardo. Los usos de Borges. In Variaciones Borges, 03/1997. Denmark: Borges Center/ Aarhus
Universitet., 1997, p.24.
93
BORGES, Jorge Lus. Arte potica. In El hacedor (1960). In Jorge Luis Borges. Obras completas 2:1952-1972.
17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p.261-262.
49
como
um
arqutipo,
metfora
se
constri
em
verdades
significativos
so
mais
articulados
explorados
se
houver
94
BORGES, Jorge Lus. La metfora. In Histria de la eternidad (1936). In Jorge Luis Borges. Obras completas
1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 382.
50
como
menciones
pois
ampliam
imaginrio
devido
associao
de
objetos,
95
BORGES, Jorge Lus. Las kenningar. In Histria de la eternidad (1936). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 368-381.
96
HAMORI, Andras. Wasf: two views of time. In On the art of medieval Arabic literature/ Andras Hamori.
Princeton: Princeton University Press, 1974, p.78-98.
97
BORGES, op cit., p. 382.
51
Se, no poema Arte Potica Borges explicita as metforas que ele mais
valoriza, numa espcie de teorizao de seu pensamento sobre a questo, no
poema Metforas de las mil y una noches ele as realiza.
Organizado a partir de quatro metforas, que fazem analogia ao mundo do
Livro das mil e uma noites - rio, trama de um tapete, sonho e mapa do tempo
o poema contm uma escolha de vocbulos que pretende ir sntese da
significao, como reduo no microscpico universo da palavra, o infinito
universo das Noites. O poema, arquitetado como mosaicos, faz da combinatria
das palavras a articulao metafrica de uma imagem, constituda da matria de
que as Noites so feitas seus temas e suas estratgias narrativas.
O poema este:
98
BLANCO, Mercedes. Borges y la metfora. In Variaciones 9/2000. Denmark: Borges Center. Aarhus
Universitet., 2000, p. 29-30.
52
99
BORGES, Jorge Lus. Metforas de Las mil y una noches. In Historia de la noche (1977). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 3.1975-1985. 13 ed. Buenos Aires: Emec, 2005, p.186-187. Grifos nossos.
53
54
tm
imagens
tm
sentido.
procura
da
harmonia
ou
100
SLEIMAN, Michel. Potica do zajal andalus. Panegrico de longa extenso de Ibn Quzman Alqurtubi. 2002.
173 p. 2 volumes. rea de concentrao: literatura portuguesa. Tese Doutoral. Departamento de Letras
Clssicas e Vernculas da FFLCH. Universidade de So Paulo. So Paulo, p. 18.
101
Ibid, p. 20 em nota de rodap.
102
Ibid, p.18.
103
Ibid, p. 21-22.
55
referncias a Tempo e a
56
1)
1- Rio = Tempo
3- Sonho = Infinito
1- Rio = Tempo
3- Sonho = Infinito
2)
3)
1- Rio = Tempo
2- Trama do Tapete = Infinito
3- Sonho = Infinito
4- Mapa do Tempo = Tempo
ocidental. Enfim,
segue-se uma leitura possvel que capte alguma articulao potica borgeana
quanto ao Livro das mil e uma noites.
57
palavras
nesses
versos,
estrutura-se
um
outro
texto,
dobrando
104
ALCORO SAGRADO. 24,35. Verso portuguesa diretamente do rabe por Samir El Hayek. Apresentao de
S.E.Dr. Abdalla Abdel Chakur Kamel, diretor do Centro Islmico do Brasil e Coordenador dos Assuntos Islmicos
da Amrica Latina. Rio de Janeiro : Otto Pierre Editores Ltda, 1990.
58
e, cujo
efecto (que debi ser profundo) es superficial, como una alfombra persa. No
entanto, por estar falando sobre As Noites, estabelece outro jogo no poema, o da
metalinguagem, propcio a arquitetar novos movimentos das peas, a instigar a
imaginao e gerar outras armadilhas literrias.
A primeira estrofe traz duas personagens: Sindbad e Rodrigo. Ambas,
sendo misto de real e de fico, tornam-se smbolos ou alegorias, concentram
em si um universo narrativo, como alephs dentro do poema.
105
BORGES, Jorge Lus. Las mil y una noches . In Siete noches(1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas,
volume II1. Buenos Aires: Emec, 2005, p. 261-262.
106
TODOROV, Tzvetan. Os homens narrativas. In Potica da prosa. Traduo Cludia Berliner. So Paulo:
Martins Fontes, 2003, p. 95-112.
107
BORGES, Jorge Lus. Magias parciales del Quijote. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p. 54-57.
59
formas que varan como nubes,/ sujetas al arbitrio del Destino / o del Azar, que
son la misma cosa...
O cenrio da primeira estrofe, metaforizado em rio, fica delineado como
algo que veio de boca em boca, de mo em mo, resultado e efeito de um dos
108
Uma das figuras mais marcantes nas Noites, alm de Cherazade, Sindbad. Sua identidade fica associada a
ser marujo ou mercador , o que lhe assegura um significado: ele algum que do mar, que vive do mar, faz
fortuna com o mar. H um duplo de Sindbad, quase um seu homnimo, cuja simetria est apenas no nome
mas no no destino: Hindbad, que o proprietrio rural e pobre e quem ouve os relatos de suas aventuras,
durante sete noites seguidas. Ao contar suas faanhas, Sindbad faz praticamente um relato confessional de sua
vida, mostrando seu mundo interior ou interno que, ao ser ouvido e visto, fazem dos olhos e dos ouvidos de
Hindbad, um contorno exterior ou externo para ele. A especificidade de Sindbad est nesta fuso, nesta juno
ou incorporao do narrador com a persona, que a fora movente da ao das histrias h um intercmbio
entre vida e fico. Sindbad parece ter as origens na histria, um misto de realidade e fico. Por um lado,
uma personagem incontestavelmente de origem asitica, verossimilhantemente nascido aproximadamente a
leste da Prsia, ao sul da pennsula indiana, a oeste da China, nas cidades porturias da poca. Ele
provavelmente um composto de indiano, de persa e de grego: rene em um s indivduo as provveis viagens
de um capito persa do sculo IX, com base nos registros de viagens em livros de geografia alm de alguma
lembrana da Odissia de Homero,especialmente no episdio do ciclope (3.viagem). Diferentemente de
Ulisses, Sindbad um heri que parte, no porque haja uma falta (exceto a 1 viagem) mas porque h
abundncia: ele tem tudo o que deseja e, mesmo assim, ele sempre parte. Todas estas histrias de viagem
espalhadas e recontadas na Mesopotmia (e depois fundidas entre os sculos IX e XII, antes de serem
incorporadas mais tarde a As 1001 Noites), terminaram por fazer de Sindbad uma personagem muito rabe,
por sua pertena geogrfica (como cidado de Bagd, a capital dos Abssidas, de onde sempre comeam e
terminam seus priplos), bem como pela religio e comportamentos culturais. Por outro lado, suas proezas
revelam uma dicotomia, ou mesmo uma esquizofrenia: so dois mundos opostos que coabitam suas aventuras
- um ordinrio (dada a uma tal exatido geogrfica em relao s concepes da poca) e o outro
extraordinrio (espao de moradia de criaturas lendrias, monstruosas, estranhas e maravilhosas). A prpria
estrutura narrativa das histrias de Sindbad destaca continuamente a contradio que ele vive, alternada entre
o desejo pelo distante, o perigo a rondar a morte e, o desejo de se estabelecer ou fixar razes em terra firme, a
saudade daquilo que ficou e to familiar. H a tenso constante entre mar flutuante e terra firme, familiar e
desconhecido, vida e morte. Sindbad sempre regressa terra natal. O fim de suas viagens o lugar do comeo
delas, o que garante um outro ciclo. H apenas uma simulao do fim. So sete viagens, nmero emblemtico
que simboliza o eterno retorno. Dividindo 1 por 7, haver uma dzima peridica: 0,1428571..., em que o stimo
nmero retorna ao primeiro - no h como finalizar suas aventuras, talvez sendo por isto que elas mais parem
que terminem. No h morte do heri e nem motivo aparente para a sua desistncia em continuar viajando. As
viagens, a mentalidade e a fortuna de Sindbad pertencem tambm a todos aqueles que o escutam. Ele um
exemplo e, ao mesmo tempo, a representao no apenas dos marinheiros, mas principalmente dos
negociantes do comrcio longnquo da poca e, dos aventureiros virtuais que esto a ler ou a ouvir os seus
relatos. Sindbad faz parte de um mundo rabe real e de realidades exageradas e deformadas que do asas ao
imaginrio, do homem de sempre. Com base em : LAVEILLE, Jean-Louis. Le thme du voyage dans Les mille et
une nuits. Du Maghreb la Chine. Paris: LHarmattan. 1998. p. 11-14 e GHAZOUL, Ferial J. The spiral
metaphor. In Nocturnal poetics. The Arabian Nights in comparative context. Cairo: The American University in
Cairo Press. 1996, p. 68-81.
109
Cf. Anexo 3: Don Rodrigo y la prdida de Espaa. Disponvel em: http://www.phil.muni.cz/ rom/vyuka
/SJIA005/mat12.rtf Acesso em 17 ago 2007.
60
ou
final.
narrar
de
Cherazade,
feito
um
tear,
promove
entrelaamentos das diferenas dos fios, das raas e das histrias, cuja maior
profundidade a sua superfcie.
O cdigo numrico em si tem especial efeito de infinito no Livro das mil e
uma noites, a partir mesmo de seu ttulo. O contar histrias de Cherazade ad
infinitum, uma produo contnua em que o incio j pressupe histrias
anteriormente acontecidas, como repetio de vidas e histrias passadas; o
meio, sendo o prprio transcorrer do tempo, contm transformaes quase
invisveis, imperceptveis, incertas e inseguras, praticamente indefinidas por no
se saber onde tudo vai dar ou pode chegar. O final, que virtual, sempre supe
outra histria em potencial para a noite 1002, e assim interminavelmente.
Shahrazads objective is to reach the infinite through a finite medium, and
to create continuity through an episodic structure. In short, her aim is to
annul the dictates of time through the use of temporal devices. Both in
the frame story and in Sindbads voyages, we have a structure that
symbolizes the infinite. Numbers such 1001 and 7, in this particular
context, signify that which goes on without end. In a number of stories,
the infinite is conjured while reading through an intertextual chain, where
one passage evokes another. This process produces the effect of
endlessness as in the repetitions of motifs in an arabesque providing
the readers with the illusion of the infinite.110
110
O objetivo de Cherazade alcanar o infinito atravs de um meio finito, e criar uma continuidade por meio
de uma estrutura episdica. Em resumo, seu objetivo anular os ditados do tempo atravs do uso de
mecanismos temporais. Tanto no conto-moldura quanto nas viagens de Sindbad, temos uma estrutura que
simboliza o infinito. Nmeros como 1001 e 7, neste contexto particular, significam aquilo que continua sem
fim. Em muitas histrias, o infinito evocado enquanto se l atravs de uma corrente intertextual, em que uma
passagem evoca outra. Este processo produz o efeito de interminvel como nas repeties de motivos em um
arabesco- proporcionando aos leitores a iluso de infinito. Traduo nossa. Os grifos dos nmeros so nossos.
GHAZOUL, Ferial J. Nocturnal poetics. The Arabian Nights in comparative context. Cairo: The American
University in Cairo Press, 1996, p. 82.
61
a respeito de
111
Se As 1001 Noites so uma narrativa que conta sobre o fazer e o contar outras narrativas,
necessariamente tambm um trabalho sobre a relao entre narrativas, ou tipos especficos de narrativas e a
fundao temporal delas. A fora motivadora por trs das narrativas de Cherazade o desejo de adiar a
morte, de impedir o fluir natural do tempo para rechaar o sentido de um fim. Na instncia de sua platia,
estes contadores de histrias devem matar o tempo ou serem mortos por eles mesmos. irnico, mas
essencial que a fim de matar o tempo, e assim evitar o inevitvel fim do tempo, os narradores devem criar
tempo, criar tempo narrativo. Sem surpreender, eles manifestam narrativamente esta ironia ao desenvolver
seus contos conforme estruturas repetitivas de histrias e de discurso os quais se contrapem ao movimento de
avano do tempo e, em assim fazendo, cortam de modo enviesado o impulso fundamental de narrativa.
NADDAFF, Sandra. Arabesque. narrative structure and the aesthetics of repetition in The 1001 Nights.
Evanston, Illinois: Northwestern University Press, 1991, p.95. Traduo nossa.
62
Mesmo que o Livro das noites contenha cifras infinitas como posibilidad de
elegir todos los destinos y de ir viviendo infinitas historias infinitamente
ramificadas112, nos versos y encima de las otras [cifras] la primera / y ltima
cifra del Seor; el Uno, Borges retoma o tema do Uno e do Mltiplo (o qual j
abordamos no item
63
114
64
119
BORGES, Jorge Lus. Avatares de la tortuga. In Discusin (1932). In Jorge Luis Borges. Obras completas
1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.256, 258.
120
Cf. Anexo 1 deste trabalho. Supplemental Nights/ Volume 2: TALE OF THE TWO KINGS AND THE WAZIRS
DAUGHTERS. Texto na verso de Burton. Disponvel em: http://www.wollamshram.ca/1001/Sn_2/vol12.htm
Acesso em 16 jul 2007.
65
Algo parecido ha obrado el azar en Las mil y una noches. Esta compilacin
de historias fantsticas duplica e reduplica hasta el vrtigo la ramificacin
de un cuento central en cuentos adventicios, pero no trata de graduar sus
realidades, y el efecto (que debi ser profundo) es superficial, como una
alfombra persa. Es conocida la historia liminar de la serie: el desolado
juramento del rey, que cada noche desposa con una virgen que hace
decapitar en el alba, y la resolucin de Shahrazad, que lo distrae con
fbulas, hasta que encima de los que han girado mil y una noches y ella
le muestra su hijo. La necesidad de completar mil y una secciones oblig a
los copistas de la obra a interpolaciones de todas clases. Ninguna tan
perturbadora como la de la noche 602, mgica entre las noches. En esa
noche, el rey oye de boca de la reina su propia historia. Oye el principio
de la historia, que abarca a todas las dems, y tambin de monstruoso
modo a s misma. Intuye claramente el lector la vasta posibilidad de
esa interpolacin, el curioso peligro? Que la reina persista y el inmvil rey
oir para siempre la trunca historia de Las mil y una noches, ahora infinita
y circular 121
Por isso, para Borges122, o mximo da proliferao nas Noites fica a cargo
da noite 602123, como repetio infindvel por conter a idia de eterno retorno.
Ao mesmo tempo, trata-se do mximo da reduo das Noites, pois as muitas
ou inumerveis noites do livro se condensam em apenas uma nica.
Com essa estratgia narrativa de duplicao, a mise en abyme, revelada
com a noite 602, As noites se tornam, de fato, infinitas devido sua
circularidade, capacidade de voltar ao ponto de origem j de outro jeito o
mesmo mas diferente, numa retomada em espiral.
121
BORGES, Jorge Luis. Magias parciales del Quijote. In Otras inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p.56.
122
Conforme aponta Evelyn Fishburn, em seu ensaio Readings and re-readings of Night 602 (Critical Essay), h
2 hipteses levantadas quanto a esta noite:
1-Como ela no se encontra disponvel nas verses a que normalmente temos acesso, h por parte de vrios
estudiosos a conjetura de que possa ser uma brincadeira ou uma inveno sagaz de Borges, cujos fins
prprios dariam sustentao s suas idias e prticas sobre a repetio.
2- Por outro lado, h evidncias que confirmam as afirmaes de Borges. Em Los Traductores, Borges diz que
diante dele, no volume 6 da traduo de Burton, esto 300 notas. Entretanto, h muitas edies da traduo
de Burton e nem todas incluem os mesmos textos. Na bibliografia para aquele artigo, duas edies de
Burton so citadas: a primeira especifica o volume 6 de uma edio limitada do Club Burton, embora, muito
inconvenientemente, com um ponto de interrogao a respeito de Londres como seu lugar de publicao sem
nenhuma data. A segunda, marca a seleo abreviada em um volume e, portanto, de nenhum interesse para
esta questo. O recurso de dar uma informao incompleta leva a autora a acreditar que Borges est se
referindo mesma edio catalogada na Biblioteca Britnica sob o cabealho de Sir Richard Francis Burton,
Arabian Nights, 16 volumes (10 volumes e outros 6 volumes de Noites Suplementares), impressa apenas
para assinantes particulares, entre 1885-88. A Biblioteca Britnica tem muitas cpias desta edio, dando
Benares como o lugar de publicao e, nesta, Londres aparece como o lugar da publicao. , portanto,
altamente provvel que Borges tinha diante dele o Volume 6 de uma edio similar, e ainda mais, na pg
199, onde h uma nota de rodap para a Noite 602 chamando a ateno para a repetio a qual Borges
interpretaria com tal riqueza de imaginao.
As Noites, nos Volumes Suplementares de Burton, no so numeradas, mas, devido a uma nota de rodap para
esta Noite (a 602), indicado que ela corresponde ltima Noite (a 1001) na Edio Breslau. A verso
Habicht do texto Breslau a nica que inclui esta histria no corpo principal do texto, na ltima noite, sob uma
verso bem condensada do texto contido em Noite Suplementar, incluindo as palavras de reconhecimento do
Rei quanto Sahrzd. FISHBURN, Evelyn. Readings and re-readings of night 602.(Critical Essay). In
Variaciones Borges. Publication Date: 01-JUL-04. Format: Online. Disponvel em: http://goliath.ecnext.com
/coms2/summary_0199-3540225_ITM Acesso em 19 set 2006.
123
A Noite 602 citada por Borges em Los traductores de las mil y una noches, (Historia de la eternidad);
Magias parciales del Quijote (Otras inquisiciones) e Cuando la ficcin vive en la ficcin (Textos Cautivos).
66
Talvez, como uma apropriao das Noites por Borges, ele utilize a mesma
estratgia. Tambm ele tem uma histria de mesmo nome incrustada
numa
obra a qual, por sua vez, incrusta a historia que a nomeia, geralmente a ltima,
provavelmente para retornar ao comeo. o caso, por exemplo, de El Aleph
(1949), Elogio de la sombra (1969), El informe de Brodie (1970), El oro de los
tigres (1972), El libro de arena (1975), La moneda de hierro (1976), Historia de
la noche (1977), La cifra (1981), etc.
A Noite 602 tem uma posio que descentra as imagens em espelho,
porque ela no corresponde exatamente ao centro de 1001, pelo menos na
verso Burton, pois na verso Breslau ela a ltima histria,
estratgia
Nesta metfora, Borges combina trs palavras de impacto cujo fim causa
uma estranheza de inevitvel prazer esttico alm da percepo potica da
124
A idia de um soberano no meio de um ponto, seja em teologia, cosmologia, arquitetura ou literatura, j
carrega uma significao iconolgica reconhecida que ainda, hoje, um elemento importante do criticismo
estrutural. O peso dado por Borges a esta noite central coincide acertadamente, com aquela descrita como o
centro na composio circularonde considerada to importante, [que] pode carregar o significado do
todo. Em algumas composies circulares ... o significado no se acumula com a progresso da parte, mas se
abre em leque a partir do meio. (Douglas, Mary: Ring Composition, Ancient and Modern). Traduo nossa.
FISHBURN, Evelyn. Traces of the Thousand and one nights in Borges.In Variaciones Borges 17/2004. Denmark:
Borges Center. Aarhus Universitet. 2004, p.152-153.
67
125
BORGES, Jorge Lus. Historia de la eternidad. In Histria de la eternidad (1936). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.353.
126
BORGES, Jorge Lus. Magias parciales del Quijote. In Otras Inquisiciones (1952). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 2:1952-1972. 17 ed. Buenos Aires: Emec, 2007, p. 56-57.
68
essncia
narrativa
de
Cherazade
feita
de
tempo,
uma
das
Gramaticalmente em rabe,
O tempo dos verbos gira no em torno do ato e do estado do agente,
como nas lnguas indo-europias, mas (como nas lnguas semticas) em
torno da prpria ao como tal. No h passado, presente ou futuro
(embora essas noes sejam acentuadas); existe o acabado, a ao
terminada (em suma, o passado sob todas as suas formas), e o
inacabado, a ao aberta, ao mesmo tempo presente ou futura. Os
gramticos, por analogia com as classificaes gregas, chamaro o
acabado de al-md, o passado, e designaro o inacabado como almudr, o semelhante a. 130
127
BORGES, Jorge Lus. Las mil y una noches. In Siete noches (1980). In Jorge Luis Borges. Obras completas
3.1975-1985. 13 ed. Buenos Aires: Emec, 2005, p.256.
128
Ibid, p.256; 264.
129
A espcie humana em As mil e uma noites, representada por Cherazade luta por um fim predestinado a ser
continuamente a no terminar enquanto a espcie humana representada pelo heri na tragdia grega tenta
encarar o destino de uma vez por todas, e isto o porqu dele ser uma figura trgica. A espcie humana em As
Mil e Uma Noites impotente face ao absoluto mas mestre do relativo. A vitria mais fundamental de As Mil e
Uma Noites a transformao do passado e futuro em presente perptuo. O tempo verbal de Sahrzd o
presente do indicativo. GHAZOUL, Ferial J. Nocturnal poetics. The Arabian Nights in comparative context. Cairo:
The American University in Cairo Press, 1996, p. 96. Traduo nossa.
130
GARDET, Louis. Concepes muulmanas sobre o tempo e a Histria. In RICOEUR, Paul e outros. As culturas
e o tempo: estudos reunidos pela Unesco [por] P.Ricoeur. Traduo de Gentil Titton, Orlando dos Reis e
Ephraim Ferreira Alves. Introduo de Paul Ricoeur. Petrpolis: Vozes; So Paulo: Edusp, 1975, p.232.
69
Por este ngulo, possvel pensar que o Tempo nas Noites um contnuo
inacabado que se mede pelas graduales sombras/ y el perpetuo desgaste de los
mrmoles/ y los pasos de las generaciones./ Todo. Podemos dizer que Borges
consegue enxergar as Noites nestes versos quanto ao tempo, pelas idias de
Homero, de Plato e de Aristteles.
De Homero, pela inevitvel transitoriedade, como as guas de um rio, e o
avano do tempo em seu irreversvel envelhecimento e fatal aproximao da
morte. Mas, tambm como sendo a etapa de um ciclo que se vai repetindo de
outro jeito, como um eterno regresso atravs dos passos das geraes, pois
vida sucede a morte, depois a esta a vida, tal como no homem o sono sucede
viglia, depois a viglia ao sono, ou ento na natureza em que os corpos celestes
se levantam, se pem e novamente se levantam131.
Vindas de Plato, a questo da eternidade, da imortalidade da alma, da
durao sem fim: la larga viglia de los astros no significa apenas a medida do
movimento destes corpos celestes, mas que esse movimento o tempo.132,
tratando do mundo como espelhos que se refletem, como las dos opuetas caras
del Bifronte ou mundos de plata y mundos de oro rojo.
De Aristteles, perceber o escoar do tempo pelo reconhecimento de uma
memria que revela a mudana entre o anterior e o posterior, como so las
graduales sombras. O Livro das noites nos remete pura linguagem, ao eco de
vozes ali capturadas no livro, retidas na linha da memria de geraes, porque
todas aquelas narrativas, todos aqueles acontecimentos, todo, ganha existncia
pela linguagem.
Mesmo que a palavra no d conta do objeto que representa, ela quem
faz o registro de um espao e da vida na linha do tempo, pela expresso de sons
que se desdobram como ecos, com a singularidade e a propriedade de significar,
de ter um sentido, de nomear, de designar, de pertencer ao instante do agora de
Cronos que se atualiza no leitor, e inscrito por diversas outras geraes na linha
da eternidade de Aion, que resiste e subsiste, subdividindo infinitamente o
presente.
O tempo deve ser apreendido duas vezes, de duas maneiras
complementares, exclusivas uma da outra; inteiro como presente vivo
131
LLOYD, G.E.R. O tempo no pensamento grego. In RICOEUR, Paul e outros. As culturas e o tempo: estudos
reunidos pela Unesco [por] P.Ricoeur. Traduo de Gentil Titton, Orlando dos Reis e Ephraim Ferreira Alves.
Introduo de Paul Ricoeur. Petrpolis: Vozes; So Paulo: Edusp, 1975, p.145.
132
Ibid, p.164.
70
[como Chronos] nos corpos que agem e padecem, mas inteiro tambm
como instncia infinitamente divisvel em passado-futuro [como Aion], nos
efeitos incorporais que resultam dos corpos, de suas aes e de suas
paixes. S o presente existe no tempo e rene, absorve o passado e o
futuro, mas s o passado e o futuro insistem no tempo e dividem ao
infinito cada presente. No trs dimenses sucessivas, mas duas leituras
simultneas do tempo.133
133
DELEUZE, Gilles. Segunda srie de paradoxos: Dos efeitos de superfcie. In Lgica do sentido. 4.ed. So
Paulo: Editora Perspectiva, 2003, p. 6.
71
CAPTULO II.
A POTICA DO LIVRO DAS MIL E UMA NOITES, SEGUNDO A
POTICA RABE.
Introduo.
134
Com base na seguinte afirmao: Em donnant le langage aux musulmans, Dieu leur tend la cl du monde
et leur permet de nommer le rel et de pressentir lau-del ; il nimpose pas une raison graphique : on pense
toujours, je crois, de la mme faon, mais on met par crit ce que lon pense. BENCHEIKH, Jamel Eddine et
MIQUEL, Andr. Dire. In DArabie et dIslam. Paris; ditions Odile Jacob, 1992, p. 14.
72
135
135
Com base em: En fait, le dbat est contenu dans le mot mme de cration. Lemploi de ce terme quivoque
pourrait provoquer une mprise sur le sens de notre analyse, si nous ne levions immdiatement lambiguit qui
le recouvre. Lusage quen font certains critiques contribue confrer au pote un pouvoir quasi surnaturel.... le
pote imite et dfie la fois le pouvoir crateur divin. Nul homme nest plus compltement fait limage de
Dieu ni plus fatalement son rival que le pote. BENCHEIKH, Jamel Eddine. Potique arabe. Prcde de essai
sur un discours critique. Paris: Gallimard, 1989, p.7
136
Alcoro, Sura 26. Los Poetas; Versculos 225-226. No has reparado en como desvaran sobre todos los
temas/ Y que dicen lo que no hacen? El Sagrado Corn. Traduccin literal, ntegra del original arbigo al
espaol, con comentarios y compendios de las Suras. Autorizado por la Liga Islmica Mundial/ La Meca. Arabia
Saudita. Valencia: Centro Islmico de Venezuela, p. 481.
137
HAMORI, Andras. The pre-islamic qasda: The poet as hero. On the art of medieval Arabic literature/ Andras
Hamori. Princeton: Princeton University Press, 1974, p.3-30.
73
A poet was the pride and ornament of his people, for he alone would
perpetuate the fame of their noble deeds, dignify the memory of their
dead, and trap their enemies in songs of mockery. These functions of
poetry determine the major genres. 138
catalogrfica
com
vrios
temas.
Um
deles,
marcado
pela
sensualidade, aborda a mulher amada, de rara beleza, que acaba de partir com a
tribo ou que se fora h anos, num movimento involuntrio de vazio no tempo
o tema de um caso de amor passado. Outro tema o do territrio abandonado
do reconhecimento do lugar no deserto onde havia o acampamento. Explora-se o
sentimento verdadeiro de solido e desolao em relao estreita com o
nomadismo, que dita encontros e partidas.
A ele, o tema do nomadismo, associa-se um tema de razo lgica,
fundamental para a qasda, que o da sensao do tempo que flui. Trata-se da
inelutvel transitoriedade da vida, indiferente conduta ou razo humanas,
aos fatos e s experincias inexplicveis e incoerentes, como so a vida e a
morte. Constata-se um tempo humano e cclico devido s estaes do ano, um
138
Um poeta era ao orgulho e o ornamento de seu povo, porque ele sozinho perpetuaria a fama dos atos
nobres desse povo, dignificaria a memria de seus mortos, e prenderia (como por armadilhas) seus inimigos
em canes de zombaria. Estas funes da poesia determinam os gneros mais importantes. Traduo nossa.
HAMORI, Andras. On the art of medieval Arabic literature. Princepton, New Jersey: Princepton University Press,
1974, p. 4.
74
139
75
From the very earliest poems on, we often meet the figure of an
anonymous blamer who reproves the poet-protagonist for reckless
behavior. In reply the poet speaks of the inescapability of death, of the
many who find one when the hour is ripe. 140
O tema da morte rondando por perto, como a que ocorre nas guerras,
parte integrante do destino do heri. Mas, na sobreposio dos papis de heri e
de poeta, gera-se um problema dramtico: como falar da morte? Um misto de
desejo e de poder envolve o assunto, e para falar ou refletir sobre ele, dependese de uma distncia oferecida pela morte do Outro.
Tal morte, como possibilidade da sentena potica ganhar profundidade,
expressa-se de diversas maneiras. So os pensamentos ou a rememorao dos
sobreviventes sobre lies difceis e adquiridas a duras penas; tambm como
momentos de desistncia, de renncia ou de perda, voluntria ou no, de
algum ou de algo, no sentido de revelar a generosidade do heri que, por
ultrapassar limites de bondade ou de laos afetivos, abre mo de coisas e de
pessoas que mais tarde ser-lhe-iam teis, evitando problemas futuros para si
mesmo.
A dor e o prazer nunca so estanques e, no balanceamento entre eles, ora
um ora outro ou ambos simultaneamente, a simetria torna-se um tema sobre o
desejo de equilbrio. Seu desenrolar se constri como rotatrias, em que as
sadas podem ser vrias, e nem todas com sucesso. Nas declamaes, os poetas
se oferecem para viver aquela experincia.
140
No fundo, o esprito tortuoso (como retorcido, ambguo) um aspecto do carter herico: da necessidade
do heri jogar o seu jogo com a morte, nunca perder um movimento que possa expor a si mesmo ao perigo.
Desde os mais antigos poemas, sempre encontramos a figura de um culpado annimo que reprova o poetaprotagonista pelo comportamento imprudente. Como resposta o poeta fala de como a morte inescapvel, de
many que encontra qualquer um quando chegada a hora. Traduo nossa. HAMORI, Andras. The preislamic qasda: The poet as hero. In On the art of medieval Arabic literature. Princepton, New Jersey:
Princepton University Press, 1974, p 9.
76
une mme langue, larabe. Peu importe au fond la part de chaque ethnie:
lislam a permis, de faon dcisive, de rassembler tout ce monde. 141
142
devido conquista de
outras terras, de outras gentes e por novas rotas. A vocao tradicional dos
antigos bedunos, dada pela dimenso nmade, torna-se intrnseca e serve de
motor expanso rabe.
De civilizao transeunte e migratria pelo deserto rido, o processo de
sedentarizao na cidade ganha fora, agrupando as pessoas em torno da
mesquita e dos palcios. Enquanto as cidades se tornam centros importantes de
vida poltica, fincando razes sedentrias e tornando-se smbolos de riqueza
econmica e de status social, as rotas martimas, como redes, alimentam-nas. O
141
A noo de rabe modificada pelo Isl. A sociedade que se cria uma sociedade pluri-tnica que faz
referncia a um Livro comum e que lida com uma mesma lngua, o rabe. Pouco importa no fundo a parte de
cada etnia: o Isl permitiu, de modo decisivo, reunir todo este mundo Traduo nossa. BENCHEIKH, Jamel
Eddine e MIQUEL, Andr. Crer. In DArabie et dIslam. Paris; ditions Odile Jacob, 1992, p. 98.
142
Entre la certitude de la rvlation et celle du thologien, il y a place en Islam pour une trs grande
mditation sur ltre BENCHEIKH, J.E.; MIQUEL, Andr. Crer. In DArabie et dIslam. Paris: Editions Odile
Jacob, 1992, p.91.
77
horizonte desse espao fica to ampliado que incita viagem, seja pelo motivo
do comrcio e da expanso poltica, seja pelo da peregrinao religiosa at Meca.
A questo migrante se afirma, cria uma fronteira tnue e um limite mvel,
ajustados
presena
do
Outro,
suportando
atenuando
oposies
145
. Ao
143
..la frontire, la vraie, se situe ailleurs: dans les esprits BENCHEIKH, Jamel Eddine et MIQUEL, Andr.
Vivre. In DArabie et dIslam. Paris: ditions Odile Jacob, 1992, p. 133.
144
A indeciso de fronteiras um fenmeno muito interessante a considerar. Mostra bem que o territrio se
ajusta exatamente presena, quer dizer que no possumos o espao onde podemos encontrar o outro. (...) a
mobilidade dos limites, por exemplo na Andaluzia, muito particular. Esta cria uma espcie de zona fluida onde
se atenuam as oposies, os antagonismos.(...) Podemos temperar o homem pela elasticidade dos confins de
seu espao. Podemos nos aventurar no espao do outro at um certo ponto, sem que isto entre em choques
terrveis, como se faz nos dias de hoje. A fronteira impenetrvel inscreveu, em nossa histria contempornea, a
necessidade da tragdia. Basta ultrapassar um milmetro para que as coisas se transformem em drama.
Traduo nossa. BENCHEIKH, Jamel Eddine et MIQUEL,Andr. Vivre. In In DArabie et dIslam. Paris: ditions
Odile Jacob, 1992, p. 132-133.
145
...les hommes forment une nation lorquils ont une communaut dides, dintrts, daffections, de
souvenirs et desprances, ce qui correspondrait assez bien au paysage mental de lArabe... BENCHEIKH,
Jamel Eddine et MIQUEL,Andr. Vivre.In DArabie et dIslam. Paris: ditions Odile Jacob, 1992, p. 136.
146
... la petite patrie et la grande. Ibid, p. 137.
147
... cela dit non un art de vivre, mais tout simplement, une existence comme nimporte quel tre humains
peut la vivre, quil soit dOrietn ou dOccident. Ibid, p. 139.
78
148
... leur vocation lunit, ce sentiment quils ont de se sentir diffrents et semblables ; le mme rpt
avec des vaiations, le diffrent qui ne cesse davoir des liens avec le mme. Il y a l un tre distendu aux
limites dun espace qui sajuste aux limites de soi-mme. Id., p. 139
149
Ser escritor e literato, no a mesma coisa, em nenhuma civilizao. Mas aqui, ser literato, quer dizer ser
poeta, atingir o objetivo do exerccio literrio, do exerccio do Eu. Ser escritor, significa ter a pena, ter a
funo de transmitir o saber, sem a questo de viver para si, e para si unicamente, a partir do momento que
se sabe qualquer coisa. Este saber deve se transmitir, faz parte integrante da vida de todos. No penso que os
grandes pensadores do mundo rabe-muulmano trabalhavam unicamente para a sua comunidade, mas para
todos os homens. Traduo nossa. BENCHEIKH, Jamel Eddine et MIQUEL, Andr. Vivre. In DArabie et dIslam.
Paris: ditions Odile Jacob, 1992, p. 143.
79
150
, isto , a cultura e o
especialista em determinado
patamares
sociais.
Para
tal,
entretanto,
fundamental
dominar
como
152
matriz
do
discurso;
sabendo-se
fazer
uso
de
formas
MIQUEL, Andr. La littrature de ladab ; La littrature et ladab. In La littrature arabe. Paris : Presses
Universitaires de France. 4e dition, 1993, p.64-75.
151
Com base na seguinte citao: ... Tout cela sappelle, dans le Moyen ge arabe, ladab : savoir, savoirfaire, savoir de maintien aussi, dans la societ, et savoir-connatre. ... Ladab est effectivement un savoir-tre,
un savoir-vivre, un savoir-connatre, un savoir-penser. BENCHEIKH, J.E. e MIQUEL, Andr. crire. In DArabie
et dIslam. Paris: ditions Odile Jacob, 1992, p. 42.
152
Saj uma forma estilstica de expresso da lngua para uma prosa ritmada e rimada, imitao distante da
lngua potica pr-islmica, prova de todo um exerccio de estilo. Saj a prosa utilizada pelo Alcoro que tem
um papel essencial na fixao dos gostos literrios rabes e o dogma de inimitabilidade, porque s ele, o
Alcoro, tem uma linguagem transcendente. Esse ideal estilstico inacessvel requer solues humanas, tanto s
questes lingsticas como aos hbitos culturais que valorizem a memria. A prosa que expressa adab utiliza
saj moderada. So textos que se referem produo literria, que se rendem aos efeitos de ritmo e de rima
como trabalho artstico e literrio, em que nada escapa e tudo merece ser iluminado para apreender
conhecimentos e transmitir mensagens. Quando se trata de textos escritos como registros comuns, dito que
so expressos numa forma de saj inexistente. MIQUEL, Andr. La littrature conqurante. In La littrature
arabe. Paris: Presses Universitaires de France. 4e dition, 1993, p.9-44.
80
poucos, tudo foi sendo incorporado como um conhecimento universal sob a gide
islmica.
Com o passar do tempo, o adab evoluiu como um sistema de cultura tanto
aberto como fechado, alicerando a cultura rabe-islmica na cincia do Texto,
moldando uma razo rabe entendida como o conjunto dos princpios e das
regras de que procede o saber na cultura rabe.153
Il est ouvert en ce sens que, loin de renoncer lun quelconque de ses
lments, il absorbe, digre peu prs tout ce quon lui prsente comme
pouvant relever du bagage intellectuel de lhonnte homme. Il est clos
parce quil oublie peu peu lesprit de recherche et dinvestigation de
lexperience jhizienne pour constituer une sorte de repertoire de la
connaissance profane, quil sagit dacquerir plus que de mditer.154
153
ABED AL-JABRI, Mohammed. Introduo crtica da razo rabe/ Mohammed Abed al-Jabri; traduo de
Roberto Leal Ferreira. So Paulo: Editora UNESP, 1999, p.15. (biblioteca bsica).
154
aberto no sentido que, longe de renunciar a qualquer um de seus elementos, absorve, digere mais ou
menos tudo o que se lhe apresenta como relevante bagagem intelectual do homem honesto. fechado
porque se esquece pouco a pouco o esprito de pesquisa e de investigao jhizianos [de al-Jhiz cuja postura
e conduta eram por uma cultura total e estruturada em pesquisa] para constituir um tipo de repertrio do
conhecimento profano, que trata mais de adquirir que de meditar. Traduo nossa. MIQUEL, Andr. La
Littrature des Rencontres : La littrature de ladab. In La littrature arabe. Paris: Presses Universitaires de
France, 4e. dition, 1993, p.68.
155
Com base em: Ladab na pas seulement model um genre spcifique de connaissance ... on pouvait dfinir
son programme par la formule des lumires sur tout ... on pourrait dire que lesprit quil a mis la mode
consiste mettre un peu de tout dans tout. MIQUEL, Andr. La littrature de ladab. La littrature des
rencontres. In La littrature arabe. Paris: Presses Universitaires de France, 4e. dition, 1993, p.70.
81
156
HAMORI, Andras. Ghazal and Khamrya: The poet as ritual clown. In On the art of medieval Arabic
literature. Princepton, New Jersey: Princepton University Press, 1974, p 31-77.
157
HAMORI, Andras. Wasf: two views of time. In On the art of medieval Arabic literature. Princepton, New
Jersey: Princepton University Press, 1974, p 78-98.
158
Sria (dinastia dos Omadas) e Iraque (dinastia dos Abssidas) tm um poder cultural grande, mas uma
poesia nova surgir em Hedjaz. Trata-se da poesia corts, sensual, sem a renncia do amor platnico. Filha das
cidades (at-Tif, Meca e sobretudo Medina), surgiu em torno da poca da Peregrinao, como um mundo
politicamente isolado, confinado, desiludido, vigiado de longe pela Sria que, inicialmente, se tornou o corao
do Estado muulmano. H uma atmosfera problemtica entre religiosidade e sensualidade misturadas. O
importante primeiro viver e gozar. Atrelada ao prazer, a poesia torna-se um fazer musical e de canes, o
divertimento principal ao tdio de viver, aliando espontaneidade e mundano, o refinado urbano exaltao
amorosa, de um deserto onde no se vive mais. MIQUEL, Andr. La posie courtoise lpoque umayyade: le
Hedjaz et son influence. La littrature conqurante. In La littrature arabe. Paris: Presses Universitaires de
France, 4e. dition, 1993, p.37-44.
159
Com base em: (...) loriginalit des poetes du plaisir tient la rsolution avec laquelle ils plient aux
ncessits du lyrisme et elles seules des rythmes et une langue dsormais prouvs : cest lutilisation, et non
la nature en soi de loutil potique, qui rend un son particulier. Labandon des schmas archaques au profit
dune posie vcue, le recours aux images concrtes, perues dans linstant, la prfrence pour des rythmes
propices lexpression spontane, la recherche du mot propre, dans un esprit non plus de raffinement
lexicologique mais daccs limage smantiquement la plus exacte et potiquement las plus riche, autant de
faits qui tmoignent que cette posie sengage rsolument, en les prolongeant, dans les voies frayes avant elle
par les Hedjaziens. MIQUEL, Andr. La littrature des rencontres. In La littrature arabe. Paris: Presses
Universitaires de France, 4e. dition, 1993, p.51-52.
82
160
A penumbra pela qual os viajantes fazem seu caminho para a garrafa , naturalmente suficiente, o outro
lado da oposio luz/escurido que ocorre no Coro sempre e sempre a todo instante. Suspeito que o
empurro simblico das imagens da luz na khamryat de Abu Nuws que fez Ibn Qutayba sentir que havia algo
novo nestes poemas ... Abu Nuws est muito mais interessado no jogo de luz. Traduo nossa. HAMORI,
Andras. The poet as ritual clown. In On the art of medieval Arabic literature. Princeton, New Jersey: Princeton
University Press. 1974, p.64.
83
objetos
aparentemente
dspares,
em
combinaes
estranhas
161
Mas a combinao de objetos belos em si mesmos carece daquela aura [termo emprestado de Walter
Benjamin] de ato criativo que retm os objetos de arte dentro de sua temporalidade. Gemas parecem irradiar
sua cor de dentro inesgotavelmente. Agimos sobre elas em alguma medida, cortamo-las e combinamo-las
conforme nos agrade, mas uma diferena permanece entre um pintor ou escultor e um lapidador de pedras
preciosas. Os primeiros trabalham pintura ou pedra para um significado, o outro meramente intensifica algo
que j est no material. (...) Com a diminuio do papel esttico do ato criativo vai uma perda de
temporalidade; esta perda os poetas que engastaram gemas e outras finalizaes estticas no trabalho deles
consideravam um ganho. Traduo nossa. HAMORI, Andras. Wasf: two views of time. In On the art of medieval
Arabic literature. Princeton, New Jersey: Princeton University Press.1974, p.79.
162
Now-you-see-it-now-you-dont. HAMORI, Andras. Wasf: two views of time. In On the art of medieval
Arabic literature. Princeton, New Jersey: Princeton University Press, 1974, p. 89.
84
grupo enfraqueceu,
163
85
das lutas e das idias de seu tutor, condio essa em que as opinies prprias do
poeta representavam um poder muito limitado.
Em tal ambiente cosmopolita, tanto o poeta quanto o narrador das Noites
ficam sujeitos a uma lei com rigor de teorema: a pertena casta privilegiada
[que] condiciona o acesso ao saber. Para o seu objeto, a sua expresso, as suas
perspectivas, tudo isto constitui um domnio reservado. Sua rea de expanso
limitada.
164
tanto para incorpor-la como para interagir com ela, e mesmo agir nela, sempre
fora restrito classe dominante, numa hierarquizao bem definida, ainda mais
com o poder poltico instalado na cidade.
Somente a classe dirigente, quer poltica quer administrativa, tinha acesso
cultura erudita. A grande massa popular ficava excluda desse conhecimento,
ficava posta parte desse saber elaborado e erudito que significava a via de
acesso, pelo modo vertical, a outros nveis sociais e pelos quais havia muita
disputa.
La culture est lun des lments de la conscience collective qui fonde la
classe dominante. Lacquerir ajoute aux chances de sy faire admettre. Le
pote doit sassimiler les modes de pense et les attitudes idologiques de
cette classe. Mais, dison-le bien, jamais il ne russira, quelle que soit sa
gloire, sy intgrer : il participe ses activities, il peut devenir le
protg, peut-tre lami intime, aucun moment lgal. Il est, parmi cette
lite, en fonction. La culture nest pas descendue lui, il est parvenu
elle et, du coup, elle linstrumentalise : il devient le manieur professionnel,
des formes littraires qui lui sont imposes, il va se conformer des
modles reus ds sa priode formation. 165
86
Diferentemente dos poetas, que muitas vezes tinha origem humilde e sua
posio social era um empecilho ao acesso da cultura, o possvel narradorautor das Noites era uma pessoa erudita, fazia parte do governo pela
ascendncia administrativa, pertencia a outro nvel social, o que j significava o
acesso cultura por vias tanto empricas quanto dedicadas pesquisa do saber.
Aquele provvel redator letrado da administrao, um escriba ou prosador,
pertencente a outro nvel cultural, pode ter sido quem tenha inventado e recriado
os contos, para uma boa formao da alma, para preservar os bons exemplos,
para servir de biblioteca ou de arquivos s geraes futuras.
Nos contos, percebe-se um texto construdo com preocupao estilstica. A
retrica se funda na redundncia, na enumerao de comparaes, nas mximas
ao infinito, nas sries lgicas de efeitos e de causas, de princpios gerais e de
casos particulares; misturam-se gneros entre o srio e o divertimento, para no
cansar o leitor. Cuida-se da clareza e da elegncia do texto para o momento de
166
Conforme anotao em Nota de Rodap, a de nmero 32: Arrisco essa hiptese a partir das observaes de
Muhsin Mahdi (que no entanto no chega a formul-la) a introduo e sua edio crtica do Livro das mil e uma
noites: Almuqaddima ... Leiden, Brill, 1984, v.I (Almatn), p. 11-51. JAROUCHE, Mamede M. Uma potica em
runas. In Livro das mil e uma noites, volume I: ramo srio/ Annimo; [introduo, notas e apndice e traduo
do rabe Mamede Mustaf Jarouche]. So Paulo: Globo, 2005, p. 28.
167
Id, p.28.
87
168
MIQUEL, Andr. Histoire et societ. In BENCHEIKH, J.E.; BREMOND, C.; Miquel, A. Mille et un contes de la
nuit. Paris: Gallimard, 1991, p.46-48.
169
Com base na afirmao : la voix narrative et les voies des personnages utilisent des registres diffrents de
langue, font rsonner dialecte et langue littraire (...) donnent sens la polyphonie des voix tant loue par
Bakhtine. (...) Mais le conte va bien plus loin : il fait du mtissage de la langue unie ressource littraire.
AYOUB, Georgine. La langue des Nuits : wajh malh wa-lisn fash. In CHRAB, Abouubakr. (direction) Les mille
et une nuits en partage. Paris: Sindbad, 2004, p.492.
170
ANNIMO. Livro das mil e uma noites, volume I: ramo srio/ Annimo; [introduo, notas e apndice e
traduo do rabe Mamede Mustaf Jarouche So Paulo: Globo, 2005, p. 76.
88
La poesie prend alors une vertu qui nest point seulement celle du biendire, du rim/rythm, vertu qui pourrait somme toute tre aussi celle de
la prose. Cest lcriture qui entreprend de dire un plaisir ce point tendu
que les mots se mettent en quelque sorte mimer leur signification, o le
pome enlumine le texte dune iconographie interprtante.171
j haviam iniciado a
171
A poesia tem ento uma virtude que no apenas a do bem-dizer, do rimado/ ritmado, virtude que poderia
em suma ser tambm aquela da prosa. a escrita que empreende o dizer um prazer ao ponto distendido em
que as palavras se pem de algum modo a mimar sua significao, em que o poema ilumina o texto de uma
iconografia interpretante. Traduo nossa. BENCHEIKH, Jamel Eddine. Ces Failles au fond desquelles ... In
BENCHEIKH, Jamel Eddine, BREMOND, Claude; MIQUEL, Andr. Mille et un contes de la nuit. Paris: Gallimard,
1991, p.271.
172
... leur lecture attentive rvle un lien organique entre prose et posie dans lorganisation du rcit .
BENCHEIKH, Jamel Eddine. La volupt den mourir. In BENCHEIKH, J.E.; BREMOND, C.; Miquel, A. Mille et un
contes de la nuit. Paris: Gallimard, 1991, p.270.
89
O termo rabe uslb173 utilizado por Ibn Haldn, contm uma significao
complexa que almeja compreender, de um lado, o que poesia, o que h num
texto que o torna de qualidade
potica e quem
lhe
assegura a qualidade
potica enquanto texto. Por outro, questiona como adquirir o domnio dos
procedimentos de poetizao. um termo que deve ser entendido como a forma
(sura) mental (dihn) das combinaes das frases, sua fixao na imaginao
semelhana de um molde capaz de receber toda combinao necessria da
lngua, ao enunciar um discurso.
Nessas
combinaes,
associam-se
conceitos
ligados
aos
elementos
elaborao
BENCHEIKH, Jamel Eddine . LUslb Haldnien: La poetisation du rel. In Potique arabe: Essai sur les voies
dune cration. Paris: ditions Anthropos, 1975, p. 56-58.
174
Muhsin Mahdi foi professor de rabe em Chicago e depois em Havard, e colega de Nabia Abott. Tornou-se
herdeiro de um projeto de estudos primeiramente concebido por Macdonald para editar o manuscrito de
Galland e reconstruir o manuscrito arquetpico das Noites, do qual o manuscrito de Galland e todos os outros
sobreviventes do ramo srio e egpcio derivaram. Aps longo perodo de estudos, de 1959 a 1984, deduziu um
ancestral, um arqutipo, uma fonte-me, que seria a produzida na Sria (em que a verso Galland segue bem
prxima) cuja verso estaria baseada em uma iraquiana, a que ele no especula sobre a forma que teria tido.
Com base em IRWIN,Robert. The Arabian nights. A companion. Londres: Tauris, 1994. Reimpresso de 2005,
p. 54-55.
90
da
espcie
humana,
sem
dar
respostas
questes
humanas
91
Nas Noites, no h uma viso simplista nem eufrica das atitudes, das
aes e dos sentimentos humanos, mas sombras, hesitaes, exageros, mistura
de horror beleza que perscrutam a alma, uma certa ironia que pe mostra o
paradoxal, a burla e a preservao do que pode ser considerado marginalizado.
O que h de mais importante nas Noites o poder da palavra, a fora da
linguagem. Alm do prazer do entretenimento, h as intenes do narrador,
nada
ingnuas.
Ali
esto
os
tabus,
como
incesto,
suicdio,
mil e uma
92
um livro
177
JAROUCHE, Mamede M. Uma potica em runas. In Livro das mil e uma noites, volume I: ramo srio/
Annimo; [introduo, notas e apndice e traduo do rabe Mamede Mustaf Jarouche]. So Paulo: Globo,
2005, p. 11.
178
Nenhuma dvida sobre um ponto: um livro estrangeiro. De um estrangeiro mltiplo. Mesmo se os rabes
tenham desempenhado seu papel neste gnero de compilaes... nenhuma dvida que estas so de outros
povos que, massivamente, esto na origem da coleo. Para os gregos... depois a nova Roma, Constantinopla
... o paralelo possvel entre Sahrzd e Esther, ambas destinadas aos servios do amor, ao salvamento de seus
semelhantes... A ndia tambm teve sua parte, muito decisiva, neste gnero de narrativa... o Ir que parece
ter desempenhado o papel decisivo> pelas tradues de obras indianas... Qualquer que seja, persas so os
nomes da protagonista e de sua companheira, Sahrzd et Dinazade; persa o ttulo original da coleo, Hazr
afsna... Traduo nossa. MIQUEL,Andr. Histoire et societ. In Mille et un contes de la nuit. Paris: Gallimard,
1991, p.17-18.
93
ao livro
Hazr afsna, cuja traduo do persa mil fbulas, pois fbula em persa se diz
afsna, embora as pessoas chamassem tal livro de as mil e uma noites.181
Por esta ocasio, um livreiro de Bagd, Annadm Alwarrq182, escreve um
Catlogo (Alfihrist) cujos
escritos em rabe,
que o conto -
JAROUCHE, Mamede M. Uma potica em runas. In Livro das mil e uma noites, volume I: ramo srio/
Annimo; [introduo, notas e apndice e traduo do rabe Mamede Mustaf Jarouche]. So Paulo: Globo,
2005, p. 28.
180
Ibid, p. 14-15.
181
Ibid, p. 15.
182
Ibid, p. 19-21.
94
sem saber quais histrias Cherazade contava. A sntese do enredo do contomoldura (ou prlogo-moldura) revela-se ainda distante da histria que
conhecemos hoje.
Pelo Catlogo, quando trata dos contadores noturnos de histrias e de
suas reunies noite, possvel identificar algumas caractersticas de um
gnero disseminado na cultura da poca e tipificado por meio de
narrativas
183
categorias
Ibid, p. 19.
Ibid, p. 26.
95
marginalizado
os
sentimentos
nada
nobres
do
homem.
As
Noites
desconstroem uma Bagd que se v e outra prestes a ruir, por dentro e por fora.
Nesse sentido, de um lado tais histrias atraem e encantam e, por outro,
tm uma aurola de depreciao, desdm e at mesmo desprezo, mas no por
razes banais. No se trata apenas da suposta oralidade, que se marca pelo
estilo repetitivo e a ausncia de aprimoramento lingstico. Tem a ver com a
questo do prazer, causado pelas histrias que afrontam um desejo e uma lei,
bem como com a idia de perda de um vasto conhecimento intelectual advinda
delas. O que fica evidenciado o no-reconhecimento de que o Livro das mil e
uma noites resultado de outro adab.
acrescentaram-se
camadas
camadas
de
narrativas,
no
GHAZOUL, Ferial H. Free text. In Nocturnal poetics. The Arabian Nights in comparative context. Cairo: The
American University in Cairo Press, 1996, p. 1-4.
96
sem que prejudiquem a coerncia do texto. Por isso possvel dizer que as
Noites so um texto em estado de fluxo.186
A estratgia narrativa fundamental das Noites a do conto-moldura, ou
ainda
literrias rabes (Kalila e Dimna, o Sbio Sindbd, As 101 Noites, por exemplo).
No trabalho aqui proposto, passaremos a identific-la por conto-moldura.
Esta a narrativa que pe um limite ou uma borda razo do livro. Ao
desenhar a cena inicial e dar-lhe um fecho ao final, justifica a coleo narrativa
ali contida, caso contrrio, o conjunto de tais histrias seria uma mera recolha de
textos, sem sentido de estarem ali aglutinados, dando um senso de total
arbitrariedade.
Na estrutura global do Livro das noites, o conto-moldura se torna
essencial. o espao onde so expostos os motivos que fazem a narradora
entrar em cena e desfiar uma palavra quase infinita; trata-se de um livro no
apenas de histrias mas de estratgias do discurso, de como contar histrias.
Conforme Ferial Ghazoul187, o conto-moldura das Noites formado por 4
blocos narrativos que se combinam, mas que poderiam ser independentes entre
si.
97
filha do vizir, muito culta, se dispe a ser a noiva daquela noite, na esperana de
salvar todas as mulheres do reino, por uma artimanha que ser combinada com
a irm, Dinazade. O pai, porm, em grande aflio, faz uma advertncia filha
ao contar a fbula do burro, do boi e do fazendeiro. Nova interrupo da
narrativa.
98
desiste de seu plano e instrui a irm, Dinazade, na seguinte trama: que pea que
ela conte histrias para passar a noite, antes de ser mandada para a morte.
Recontar histrias ao soberano ensandecido, articulando narrativas de tal modo
que nunca terminem antes da aurora, quando ele ter, ento, adormecido. Tal
estratgia, mantida por um engenho narrativo perptuo, permitir que a
curiosidade do rei fique cada vez mais aguada pela palavra da narradora, de
noite em noite.
Esta a cena que se desdobrar diante de um senhor perigoso e
misgino, para que inmeras personagens atuem dentro das Noites. Algo,
porm, sempre preceder a todas estas narrativas. o drama, por trs de todos
os contos, do perigo iminente da morte que protelada porque Cherazade, s
vive para dizer e por dizer188.
Assim, possvel afirmar que o centro de atrao do livro a histria de
Cherazade. A narrativa tem a fora de desencadear tanto um entretenimento,
algo que carrega para o sonho com uma beleza que no se v, que desemboca
no desejo de falar sobre coisas essenciais da vida; quanto um afrontamento,
para subverter o que j est posto: a lei, a morte. Esta a parte narrativa
indispensvel do conto-moldura, que no pode jamais ser omitida.
Em linhas mais abstratas, o conjunto narrativo do conto-moldura trata de
uma ruptura que provoca uma maldio, acarretando o mximo da destruio,
para s no final haver o resgate, a salvao. como se fosse paraso perdido e
recuperado; tabu e conhecimento; perda da inocncia, a recuperao/ aceitao/
compreenso e a redeno.
99
Chariar
quanto
para
Cherazade.
Trata-se
do
prprio
campo
da
189
GHAZOUL, Ferial H. Narrative dialectics./ Discursive significance. In Nocturnal poetics. The Arabian Nights in
comparative context. Cairo: The American University in Cairo Press, 1996, p.17-54.
190
Com base em: when questioned by his brother about his indisposition [Sahzaman replies]: Oh brother I
have an internal sore. Sahrzd sums up the solution: And I will relate to thee a story that shall, if it be the
will of God, be the means of procuring deliverance. GHAZOUL, Ferial H. Discursive significance. In Nocturnal
poetics. The Arabian Nights in comparative context. Cairo: The American University in Cairo Press, 1996, p. 30.
100
101
com
essa
estrutura
organizacional,
torna-se
possvel
191
sempre rondando a vida. a morte que pode ser desfeita pela vida, nos filhos e
nas histrias contadas.
Quanto ao cdigo retrico, trata-se daquele que fundamenta o livro, por se
tratar de um livro sobre como contar histrias, tornando-se o centro de atrao
dos demais cdigos. Por meio dele, evidencia-se a
capacidade da linguagem
191
JAROUCHE, Mamede M. Uma potica em runas. In Livro das mil e uma noites, volume I: ramo srio/
Annimo; [introduo, notas e apndice e traduo do rabe Mamede Mustaf Jarouche] So Paulo : Globo,
2005, p. 27.
192
GHAZOUL, Ferial H. Discursive significance. In Nocturnal poetics. The Arabian Nights in ccmparative context.
Cairo: The American University in Cairo Press, 1996, p. 29-41.
102
como
necessidade de
comunicao
infinito (a
193
O cogito noturno : Eu narro, portanto, eu sou. ... o mito dentro de As Mil e Uma Noites usa lngua e
narrativa de diferentes tradies lingsticas como um instrumento de harmonia e vida. importante notar que
a palavra em questo profana, e no a palavra de Deus que d vida eterna. O profano (como linguagem
indecorosa) da palavra em As Mil e Uma Noites, ento, tenta situar a lngua em relao a homens e mulheres,
indicando como o cdigo retrico lida com a brecha inaugural e sua cura, como [est] incorporado na matriz. O
contar histrias em As mil e uma noites um cruzar contnuo de abismo. O discurso de Sahrzd paira na
borda da morte. Ela est perpetuamente num estado limiar. Traduo nossa. GHAZOUL, Ferial H. Discursive
significance. In Nocturnal poetics. The Arabian Nights in comparative context. Cairo: The American University in
Cairo Press, 1996, p. 36.
103
so muito longas,
194
DELEUZE, Gilles. A dobra. Leibniz e o barroco./Gilles Deleuze.Traduo Luiz B.L.Orlandi. Campinas, SP :
1991, p.26
104
e os que deles
decorrem.
Nessa idia de dobra-desdobra, sem implicar necessariamente um
parmetro constante, reduzem-se as variveis cuja variabilidade, a partir de um
trip tpico da retrica rabe medieval,
experincias
195
105
Muitas leituras tm sido feitas de As Mil e Uma Noites pelo vis da psicanlise. H o poder curativo
indiscutvel pelas palavras, daquele que fala e que elabora. Mas, como entender este processo psicanaltico em
Sahrzd, se ela quem fala e Chariar quem se cura? Neste sentido, podemos dizer que a personagem
rabe milenar utilizou-se de processos psicodramticos, talvez antes de Jakob Moreno, o criador do Psicodrama.
Sahrzd, pelas suas palavras, quem monta o cenrio imaginrio, traz baila infindveis outras personagens
e utiliza-se da irm, Dinazade como ego-auxiliar. Dinazade no a protagonista deste enredo, mas
personagem fundamental para o seu desenrolar porque ela que sempre incentiva a irm por mais estrias.
Sua funo primordial a de estar sempre atenta a tudo, a de no perder um gesto sequer do monarca, a de
estar pronta a intervir nas narrativas da irm caso perceba o menor indcio de tdio ou aborrecimento do califa.
Esta ateno silenciosa cena diz mais que as palavras porque diz com os olhos, com os gestos, com o riso e
... com o pranto, trata-se de uma confabulao com a irm para endossar ou modificar certas estratgias.
SILVA, Sandra A. Moreno e Sahrzd: Narrar e Morrer, 1001 Maneiras de Sobreviver. Trabalho apresentado no
XIV Congresso Brasileiro de Psicodrama, em Belo Horizonte, MG, de 09 a 12 de junho/ 2004. CD-ROM.
106
semanticamente
pode
ser
traduzida
como
heternimo.
Como
terceira
da
mais
genuna
fragilidade
vulnerabilidade
feminina.
Em
da
198
Com base em: She [Sahrzd] tries to appease his appetite, to tame him, as it were, and replaces his
steady diet of women with tales of women, Shahrazads genius lies in turning women from objects of sex to
objects of sexual fantasy. This entry into the symbolic is the most critical step undertaken by Shahrazad. Once
the signifier replaces the signified, language becomes possible and once language is installed, unlimited
discourses become possible. GHAZOUL, Ferial H. Narrative dialectics. In Nocturnal poetics. The Arabian Nights
in comparative context. Cairo: The American University in Cairo Press, 1996, p. 23-24.
107
variao
e/ou
repetio
apiam-se
nos
mesmos
princpios
retricos,
de
108
primeiro o de procurar verificar o seu alinhamento ou correlao com o contomoldura das Noites. O segundo, o de buscar indcios que possam identificar
vnculos, se que os h, entre A Cidade de Bronze e o conto de Borges, El
Inmortal, a ser tratado no captulo seguinte.
De modo geral, o conjunto de noites de A Cidade de Bronze se organiza
em torno de dois temas que acabam sendo um ao final. De um lado, um tema
aparente que se mostra: envolve tradies antigas de vrias naes e trata de
lendas sobre Salomo, especialmente a das garrafas de bronze onde ele
aprisionou gnios rebelados.
profunda e que se
199
The Story of The City of Brass. Nights 566578 (Verso Lane) Verificar Anexo 2. Disponvel em:
http://www.bartleby.com/16/701.html Acesso em 16 maio 2006.
109
histrias
emolduradas,
em
espelho
uma
da
outra,
formando
Baseados no texto de Lane, elaboramos um resumo mais detalhado das referidas partes do texto.
Em Damasco, na Sria, numa das sesses noturnas entre pessoas de grande importncia e erudio, o califa
Abd el-Malik ibn Marwan conversava sobre as tradies de antigas naes e tambm lendas que envolviam
Salomo. Falava-se desse poder sobre a natureza, o aprisionamento de gnios e demnios em garrafas de
bronze que Salomo havia selado para a eternidade. Dentre as pessoas ali presentes, Talib ibn Sahj contou ao
110
um castelo negro, a
descoberta de uma
califa sobre a viagem de um homem que, ao naufragar perto da ilha da Siclia, chegou acidentalmente a um
lugar onde havia as tais garrafas de bronze, o que despertou enormemente a curiosidade do soberano.
Segundo o prprio narrador, o povo daquele lugar estava totalmente apartado do mundo dos outros homens
porque ali se tratava de um local que no havia sido atingido pelo dilvio da poca de No. Eram homens
negros, de compleio de bestas selvagens, moravam em cavernas, andavam nus e no entendiam a palavra
humana. O nico que se comunicava pela linguagem humana era o rei. Pertenciam a uma religio antes do Isl
e da misso de Maom. Um dia, um deles pescou naquele mar uma garrafa que, ao ser quebrada, liberou uma
fumaa azul que foi se tornando a figura horrvel de um gnio que gritava: Arrependimento! Arrependimento!,
ignorando o tempo aprisionado que havia se passado e que Salomo no existia mais. Ento, a pedido do califa
e sob o seu patrocnio, comeou-se a organizar uma expedio para ir em busca das garrafas. Talib ibn Sahj
ficou incumbido de levar uma carta do califa ao seu irmo, comandante no Egito, que por sua vez, deveria
convocar emir Musa ibn Nuseyr, vice-rei de um pas do Maghreb, que j estava muito prximo do local das
garrafas encontradas. claro que emir Musa ibn Nuseyr ouviu e obedeceu s ordens recebidas, mas convidou
o sheik Abd-Es-Samad para a viagem, como voz de sabedoria e orientao pelos caminhos difceis e
desconhecidos que seriam percorridos, numa jornada prevista por aproximadamente 2 anos para ir e outro
tanto para voltar.
201
Durante o percurso, aps um ano de jornada, esquecidos e perdidos no deserto, ocorreu o primeiro fato
inesperado e importante: depararam com um palcio negro. primeira vista, o castelo era pura seduo e um
espelho ou eco das coisas que haveria e seriam vividas na Cidade de Bronze. Tratava-se de uma construo
grandiosa e destituda de qualquer sinal de vida, um verdadeiro mausolu cheio de tumbas. Inicialmente, houve
um encantamento de sonho pela descrio das riquezas, das gemas de pedras preciosas, seu colorido e
tamanho, verdadeiras belezas ali expostas. Devido s vrias tabuletas escritas em versos e encontradas pelo
interior do palcio, as quais o sheik lia e emir Musa copiava e guardava o texto, o local, de aparncia
encantadora, acabou se revelando um espao encantatrio e ameaador. A futilidade, que havia ali enquanto
as pessoas eram vivas, foi se desfazendo apesar da avareza para manter a riqueza e do enorme esforo para
resistir morte. Deste modo, o que parecia um sonho acabou se tornando pesadelo, porque os textos das
tabuletas falavam das falsas aparncias do mundo, das vises confusas que a vida oferece como as de quem
dorme ou dos sonhos de quem sonha, ou da miragem de quem tem sede e imagina ser gua: o mundo
enganoso. S Deus eterno e poderoso. A vida humana est condenada morte. preciso estar atento s
calamidades. Saindo do castelo, aps trs dias de viagem, ocorreu o segundo fato importante. O grupo
encontrou uma espcie de mquina mgica na figura de um homem-cavalo que ao ser tocada, girou e apontou
a direo correta para a Cidade de Bronze. Este rob no era em si demonaco, mas continha algo sinistro,
prefigurando tambm inmeras esttuas ilusionistas na Cidade de Bronze. Uma vez na direo correta, ocorreu
o terceiro fato decisivo pr-encontro da Cidade de Bronze, como prefigurao de punio em casos de
desobedincia a uma ordem ou lei. Havia uma pilastra de mrmore onde estava aprisionado, por obra de
Salomo, um efrit, um gnio do mal, numa aparncia monstruosa, misto de animal e figura humana. Indagado
sobre quem era e as razes de sua priso naquela pilastra, no s as personagens, mas ns, como platialeitor, somos informados das aes e razes que levaram Salomo a aprisionar aquele gnio na pilastra e
outros milhares em garrafas de bronze, lacradas, seladas e atiradas ao mar. Assim, h um reenvio ao primeiro
bloco narrativo bem como uma prefigurao de acontecimentos na Cidade de Bronze, para os casos de
desobedincia. Ento, pela voz do gnio, h uma rememorao dos poderes de Salomo recebidos de Deus e
sua capacidade em comandar os seres da natureza. Este gnio, guardio de um dolo, ao qual muitas vezes ele
encarnava, era adorado por um rei e sua filha de grande beleza. Como comandante de uma tropa enorme de
outros gnios, tinha uma influncia poltica tanto para manter a paz entre os gnios e Salomo quanto sobre
as decises do rei. Ocorre que, por ser subalterno a Salomo, o efrit lhe conta sobre a beleza daquela princesa
e por quem imediatamente Salomo se apaixona. Entretanto, como a moa idlatra, torna-se impossvel um
relacionamento, decorrendo da uma intimao de Salomo para que o pai quebre o dolo e se submeta ao seu
Deus, bem como lhe entregue a filha em casamento. No se subordinando s imposies de Salomo e
instigado pelo gnio encarnado no dolo que lhe garante fora neste enfrentamento, ocorre uma luta sangrenta
entre as duas partes. Salomo, como qualquer humano, ferido em sua vaidade e orgulho, devasta o reino com
dio mortal graas a seus poderes, travando uma luta vencedora de nmeros hiperblicos. Como vencedor da
batalha, pune o gnio rebelde aprisionando-o na pilastra, e os demais so encarcerados em garrafas de bronze
e atiradas ao mar.
111
202
203
202
Confirmada a direo da Cidade de Bronze pelo efrit, o grupo seguiu viagem. A aparncia da cidade, na
distncia, era de um objeto negro com duas chamas vivas. Esta iluso de tica ocorria porque as paredes eram
de pedras negras e havia duas torres de bronze de Al-Andalus. Tratava-se de uma construo grandiosa e
solidamente fortificada com muros que se elevavam alto no ar, impenetrvel com seus inumerveis portes
porque nenhum deles se abriria a no ser por meio de algum artifcio. Para contornar a fortaleza, na tentativa
de descobrir algum porto que permitisse a entrada, foram necessrios dois dias! A nica maneira de abrir
algum porto seria por dentro da cidade. Devido a esta falta de acesso, o jeito foi vislumbrar a cidade do alto
de uma montanha. Era algo imenso, impenetrvel, vazio, sem uma voz ou uma alma viva, apenas corujas,
pssaros, urubus. Havia pavilhes nobres, domos brilhantes, manses em boas condies, rios correndo,
rvores frutferas, jardins cheios de frutas maduras. Na distncia, emir Musa divisou 7 tabuletas de mrmore
branco esculpidas e onde havia palavras de bons conselhos. A primeira estava em grego antigo. Falava sobre a
morte e sobre as coisas passageiras da vida: o mais apropriado a indiferena ao mundo! Os versos de todas
as tabuinhas foram copiados por emir Musa ibn Nuseyr. Para adentrar a cidade, foi feita uma escada e, uma
vez no topo do muro, cada um dos doze homens que voluntariamente se dispuseram a descer dentro da
cidade, gritavam, batiam palmas, acabavam pulando e morrendo. Somente com o sheik o mistrio se desfez:
devido sua f e oraes, ele venceu uma espcie de encantamento, uma miragem dissimulada em forma
humana na figura de simulacros de danarinas sobre um espelho formado de gua, que no serviam mais para
proteger os mortos mas, como uma iluso de tica da prpria morte, levar morte. Tudo naquela cidade
tornara-se algo fraudulento e destrutivo. Caminhando at as duas torres de bronze, o sheik viu dois portes de
ouro, sem fechaduras nelas ou qualquer sinal que pudesse abri-las. Entretanto, como Deus quisesse, olhando
atentamente, viu no meio de uma delas a figura de um homem-cavalo de bronze, com uma mo estendida,
como se estivesse apontando para uma das torres, e onde havia uma inscrio que instrua a maneira de abrir
a porta. Uma vez aberta, revelou-se uma larga passagem, um lugar elegante mas, ningum vivo. O sheik abriu
a porta para seus companheiros e, por prudncia, emir Musa ordenou que apenas a metade do grupo
adentrasse a cidade. No havia indcios de vida na cidade ou em qualquer aposento do palcio e, como j
ocorrido anteriormente, havia inscries em versos que iam esclarecendo os acontecimentos. A cidade era um
ambiente de aparies e de aparncias: muita beleza e riqueza incalculveis, muitas pedras preciosas. Era um
lugar de tesouro escondido e santurio da morte. No salo de festas, finalmente encontraram uma rainha
morta, cujos olhos eram gemas preciosas e davam a falsa impresso de olhar para as pessoas, observando-as
da direita para a esquerda ou vice-versa. Diante deles havia uma tabuinha de ouro, onde havia a explicao do
sucedido, sempre enfatizando a fugacidade dos bens terrestres. Emir Musa, emocionado, chorou e anotou tudo.
Para que algum homem pudesse ter chegado at aquele local deveria ter havido a permisso de Deus. Deste
modo, eles poderiam pegar as riquezas que quisessem, como prmio, exceto no mexer nas riquezas que
adornavam a rainha. Mas como Talib foi vencido pela cobia, ao tentar pegar o que era proibido, foi morto e
teve a cabea cortada.
203
Seguindo caminho pela costa martima, os viajantes atingiram o pas daquele povo bestial, em que o rei era
o nico a se comunicar na linguagem dos visitantes. Mas, nesta ocasio, eles j haviam se tornado
muulmanos, porque havia aparecido para eles no mar Khidr, um intermedirio divino e prottipo do
conhecedor esotrico, entre luzes difusas e iluminao pelos arredores, ensinando-lhes palavras de louvor a
Deus, especialmente s sextas-feiras. Os visitantes foram alimentados com peixe na forma humana,
presenteados com 12 garrafas de bronze e muitos outros objetos para o califa. Finalmente o grupo retornou a
Damasco e, dos presentes recebidos, os gnios foram libertados para deleite do califa, o peixe de aparncia
humana morreu de calor e os tesouros foram distribudos entre os muulmanos. Emir Musa ibn Nuseyr solicitou
ao califa para que o filho o substitusse no cargo de governador para que pudesse se aposentar, indo morar
em Jerusalm.
112
113
de
comparativo:
labirinto,
como
podemos
constatar
pelo
seguinte
quadro
114
Castelo Negro
Cidade de Bronze
Viso distncia:
Viso distncia:
No h descrio.
Viso prxima:
Eram duas torres de bronze de Al-Andalus, uma
construo
arquitetnica
magnfica,
fortemente
fortificada, elevando-se alta no ar, impenetrvel: a
altura das paredes era de 80 metros cbicos, 525
portes, mas nenhum aberto.
A extenso da cidade medida por uma volta em torno
do muro, levando 2 dias e duas noites sem descanso.
Nenhuma porta foi encontrada aberta.
do
alto
de
uma
Entrada do castelo:
Entrada da cidade:
Aberta.
Havia
ngulos
magnnimos,
degraus de mrmore colorido nunca antes
visto, teto e paredes decorados com ouro
e prata e minerais, e um pouco mais alm,
um bloco com inscries em grego.
115
116
falante. Se, no incio do conto este povo no sabia falar, no final, ele tem a
palavra: ao fazer parte do Isl, isto implicou em aprender uma lngua, em falar e
ler esta lngua, em se tornar humano pela lngua. Estabelece-se, pelo cdigo
retrico, uma correlao semelhante ao conto-moldura, em que o silncio tem a
ver com a morte e a palavra com a vida, seja terrena ou espiritual.
Tambm o aprisionamento dos efrits nas garrafas de bronze, como castigo
aplicado no confinamento de um tempo quase eterno, pode ser considerado
outro exemplo de transformao s avessas. A procura pelas garrafas propicia o
limite final do castigo deles que, ao gritarem arrependimento, evidencia uma
transformao destes seres a custa de duras penas e longo sofrimento, lio
aprendida e chance de vida nova.
Entretanto Talib, que estava em liberdade e em condies de livre arbtrio,
ao infringir a lei, tomado pela cobia, punido com a morte. Numa correlao,
no muito evidente, poderamos dizer que a pena de morte para Talib est para
a pena de morte das esposas e escravos adlteros, dos irmos Chariar e
117
Neste sentido, a
118
119
H algo j pronto e acabado em emir Musa, talvez por ser mais velho e
vivido, ponderado e de sentimentos nobres, sensvel ao ponto de emocionar-se
at s lgrimas com os textos encontrados, talvez por ser pai, assim como
Cherazade me. Emir Musa no se modifica ao longo da jornada, permanece o
mesmo. Se ele for considerado o heri da histria, no se trata de um heri
prottipo daquele que aprende, como uma prova inicitica vida adulta. Pelo
contrrio, ao fazer dupla com o sheik, uma voz de sabedoria, reafirma uma aura
de sobrenatural em torno dele e que lhe garante a perfeio, que s a fico
consegue dar. Talib quem realiza a transformao por todos. ele quem
retoma a narrativa do incio, e garante a eterna falta humana.
Se, A Cidade de Bronze a cidade dos enganos, das fraudes, das iluses
de tica, seria bem interessante considerar Talib o verdadeiro heri da narrativa,
aquela personagem que, ao ser marginalizada, descentra a narrativa para ver
sem ser vista, disfarada, aguardando um outro texto (quem sabe o de Borges!)
para poder empreender a jornada de todos ns.
120
CAPTULO III.
UM ALEPH: BORGES, SEGUNDO O LIVRO DAS MIL E UMA NOITES.
Introduo.
Para Borges, a arte de narrar gira sobre este duplo vnculo. Ouvir um
relato que se possa escrever, escrever um relato que se possa contar em voz
alta.204. Suas narrativas, como vestgios de tradio oral, imaginam um
interlocutor ali, diante do autor. Ouve-se, quase perdido ou deslocado, um texto
emaranhado, a respeito de algum desconhecido ou amigo de Borges, que lhe
contou ou que ele ficou sabendo, por vias indiretas, sobre tal histria. Nunca
uma narrao em linha reta, mas justamente, retorcida e entrecruzada com
outras narrativas. O argumento central, escondido sob muitos detalhes, mostrase aos poucos, como segredo de um mistrio.
Ler Borges significa atentar aos envoltrios; maneira como ele distribui
os contos em um livro, aparentemente em disposio aleatria; s engrenagens
narrativas que podem levar a outras histrias, para gerar histrias dentro de
histrias, ou para abraar outras histrias, sem que o leitor perceba, com
clareza, o intrincado labirinto narrativo borgeano que parece ter alguns padres
de direo.
A prosa de Borges complexa e a fora de seu relato est no poder
criador e paradoxal que o autor atribui linguagem, devido limitao da
palavra. Ao mesmo tempo
ela nomeia o
204
PIGLIA, Ricardo. Borges: a arte de narrar. In Borges no Brasil /organizador Jorge Schwartz. So Paulo:
Editora UNESP: Imprensa Oficial do Estado, 2001, p.21.
121
122
207
BORGES, Jorge Lus. Eplogo, em O livro de areia. Trad. de Lgia Morrone Averbuck. Reviso de traduo
Maria Carolina de Arajo e Jorge Schwartz. In Obras completas de Jorge Luis Borges, volume 3. So Paulo:
Globo, 1999, p. 84-85.
123
no Livro
1. O outro
2. Ulrica
3. O Congresso
4.
There
are
things
Lovecraft,
escritor
que
sempre
julguei
um
7.
espelho
a 7. Undr
mscara
8. Undr
8. O espelho e a mscara:
Comentrio nico para Undr e este conto: so
literaturas seculares que constam de uma nica
palavra.
10 O suborno
12 O disco
124
do
enredo
deles
tecer,
adiante,
alguns
comentrios
1. El espejo y la mscara:
208
209
BORGES, Jorge Luis. El espejo y la mscara. In El libro de arena. In Jorge Luis Borges. Obras Completas.
volume 3.1 ed. Buenos Aires: Emec Editores, 2005, p.51 a 54. Verso em portugus: BORGES, Jorge Lus. O
espelho e a mscara, em O livro de areia. Trad. de Lgia Morrone Averbuck. Reviso de traduo Maria Carolina
de Arajo e Jorge Schwartz. In Obras Completas de Jorge Luis Borges, volume 3. So Paulo: Globo, 1999. p.
50-53.
209
Como fato real, o conto El espejo y la mscara nos desloca tanto no tempo, ano de 1014 d.C, quanto no
espao, Irlanda. Situa-nos na ps-batalha de Clontarf, registro da expulso dos vickings do territrio irlands e
o incio da sua migrao para a Esccia e Inglaterra. Como fato histrico, Clontarf foi uma luta sangrenta. Os
vickings marcharam contra o rei Brian Boru que se tornou um tipo mstico de lder, como o Rei Arthur o foi para
os bretes. A Batalha de Clontarf ocorreu perto de Dublin, em que houve grandes perdas para ambos os lados.
O rei os derrotou, mas teve seu filho Murrough, de 15 anos, morto na batalha. Historicamente, o prprio Brian
Boru, j idoso, foi assassinado em sua tenda. Dados disponveis a partir do site: http://www.doyle.com.au/
battle clontarf.htm. Acesso em 19 jan 2005.
125
Parte 3: Desfecho:
3.1 Suicdio do poeta.
3.2 Perambulao do rei pelo seu reino, como mendigo, sem nunca mais
ter declamado o poema. 210
210
126
2. Undr
211
Parte 1- Prlogo-Envoltrio:
1.1
e,
Ulf Sigurdarson.
PALAVRA.
Parte 3 - Desfecho:
211
BORGES, Jorge Luis. Undr. In El libro de arena. In Jorge Luis Borges. Obras completas. volume 3 .1 ed.
Buenos Aires: Emec Editores, 2005, p.55 a 59. Verso em portugus: BORGES, Jorge Lus. Undr, em O livro
de areia. Trad. de Lgia Morrone Averbuck. Reviso de traduo Maria Carolina de Arajo e Jorge Schwartz. In
Obras completas de Jorge Luis Borges, volume 3. So Paulo: Globo, 1999. p. 54-58.
127
3. El Disco213
Parte 1 -
delas.
212
128
O andarilho:
Parte 3 - Desfecho:
Odin era o maior dos deuses vikings na mitologia nrdica, senhor de todas as magias, deus da sabedoria,
pai dos deuses, deus da guerra. Faltava-lhe um olho, conta-se t-lo dado em troco de um pouco de sabedoria .
Dizem ainda ter-se enforcado na rvore csmica Yggdrasil para obter o conhecimento dos mortos mas foi
ressuscitado em seguida. Tinha dois corvos que o informavam de tudo o que se passava no Mundo, o
"pensamento" e a "memria". Possua tambm a lana Gungnir, que nunca errava o alvo, e em cujo cabo havia
runas que ditavam a preservao da lei. Na mitologia Nrdica, acreditava-se que a terra era formada por um
enorme disco liso. Disponvel em http://velharias-traquitanas.blogspot.com/2006/03/odin-era-o-maior-dosdeuses-vikings-na.html. Acesso em 23 fev 2008.
215
Proposta de organizao do conto EL DISCO em 3 partes:
1- Apresentao das duas personagens do conto, o lenhador e o andarilho.
1.1 Em 1 pessoa, o lenhador se auto-apresenta. Mora no bosque desde pequeno, o irmo mais velho j
morreu, no sabe a prpria idade, solitrio e sozinho, um homem rude, avarento, valente graas ao
machado, tira o sustento do bosque mas gostaria de derrubar todas as suas rvores. Parece um homem das
cavernas, um eremita j quase cego no bosque. Nunca teve a ambio de conhecer o mar, que fica aps o
bosque.
1.2 Aparecimento de um andarilho que diz ter percorrido toda a Saxnia: homem alto e velho, envolto em
manta puda, com cicatriz no rosto, custava a andar sem o apoio do basto, um ar de autoridade dado pelo
tempo. A contragosto, o lenhador d abrigo ao desconhecido: um lugar para dormir no cho, po e peixe.
2- Acontecimentos no dia seguinte.
2.1 Ordem dada pelo andarilho para que o lenhador pegasse o basto que havia cado de sua mo,
identificando-se como sendo um rei desterrado, da estirpe de Odin - talvez pura loucura do velho.
2.2 O seu poder rgio ainda se devia posse do disco... Abriu a palma da mo, que era ossuda. No havia
nada na mo. Estava vazia. Mas ao ser tocada a mo, o lenhador sentiu uma coisa fria e viu um brilho. Era o
disco de Odn que tem s um lado.
2.3 A cobia toma conta do lenhador, que j via o disco transformado em barra de ouro e ele sendo rei. H
uma barganha de troca: o disco pelo cofre de moedas de ouro, ao que o velho diz no.
3- Desfecho.
3.1. - O lenhador manda o rei-andarilho embora, mas to logo ele lhe d as costas,uma machadada na nuca
o suficiente para mat-lo. Uma vez aberta a mo, deixou cair o disco com um brilho no ar.
3.2. O machado serviu de referncia para o local onde o disco caiu, enquanto o lenhador arrastava aquele
corpo at o arroio, que estava muito cheio. Ao voltar para casa, procurou o disco que no foi encontrado e
faz anos que continua procurando.
129
216
216
BENCHEIKH, Jamel Eddine Luslb haldnien: La poetisation du rel. In Potique arabe: Essai sur les voies
dune cration. Paris: ditions Anthropos, 1989, p. 56-58.
130
poetas
formam
duplas,
como
repetio,
pelo
conceito
de
131
no
disfarce
que
encobre
esconde
as
intenes,
os
Se o lenhador
132
como
motivo
crucial
que
faz
Cherazade
contar
as
histrias
perpetuamente.
Cada conto traz um elemento para simbolizar a morte e as diversas
maneiras de morrer: a adaga/ suicdio, a velhice/ morte natural, o machado/
assassinato. Todos eles, porm, reenviam ao mesmo princpio para se
imortalizar, para se eternizar e vencer a morte, como numa batalha - a palavra.
Talvez a de um poeta...
Ao expandir a questo do vencido no conto El disco, evidencia-se a
questo da barbrie, da morte estpida e sem nexo, do saber contido e
propiciado pela palavra e que a ignorncia jamais ouvir. Da porque, no vai e
vem do tempo e do espao, possamos realmente refletir sobre quem seja o
133
poeta e qual a sua melhor palavra, sobre quem seja o rei e de onde advm o
seu poder, e qual este poder.
217
BORGES, Jorge Luis. El Aleph. In Obras completas. Volume 1. 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002,
p.533-630. Verso em portugus: BORGES, Jorge Lus. O Aleph. In Obras completas de Jorge Lus Borges,
volume 1. Traduo de Flvio Jos Cardozo. Reviso de traduo: Maria Carolina de Arajo. So Paulo: Globo,
2000, p. 593-700.
218
SOSNOWSKI, Sal. Borges e a cabala. So Paulo: Perspectiva, 1991, p.66, em Nota de Rodap.
134
Assim, sabemos que a palavra enigmtica aleph, que nomeia tanto o livro
como o conto, diz respeito a uma letra bem como a um nmero, e envolve o
conceito de que o todo no maior que qualquer das partes: entre letra e
nmero, instala-se o Homem que fica entre o cu e a terra. Porm, aleph no
uma letra qualquer. Borges a associa lngua sagrada. Mas, de que lngua fala
Borges se ambas, rabe e hebraico, do ramo semita, a tm como a primeira letra
de seu alfabeto? E em ambas, Deus revela Sua criao do universo pelo verbo?
A histria da letra Aleph na concepo judaica a seguinte:
H vinte e duas letras que formam o alfabeto hebraico, sendo trs letras
fundamentais: ALEPH - MEM SHIN, que representam os primeiros
elementos: MEM mudo como a gua e SHIN sibilante como o fogo,
havendo ALEPH entre elas, um sopro de ar que as reconcilia.
Aps todas as letras terem sido postas em ordem e estabelecidas por
Deus, Ele combinou-as, pesou-as, mudou-as e formou com elas todos os
seres que existem, e todas as coisas que devero ser formadas no futuro.
Segue que, com todas as combinaes, pesos e mudanas, houve 231
formaes, e deste modo toda criatura e toda palavra emanaram de um
nome. Estas combinaes foram fixadas na esfera por Deus, como uma
muralha com duzentas e trinta e duas portas, e sendo as esferas viradas
para frente e para trs.
De fato, combinando as 22 letras duas a duas, sem permutao teremos
= n x ((n-i / 2) = 22 -1 x (22/2) = 231. Quanto s 232 portas, podem
ser o Aleph mais as 231 combinaes das 22 letras, duas a duas.
Deus criou uma realidade do nada, fez a no existncia tornar-se
existncia e trabalhou, por assim dizer, colunas colossais do ar
impalpvel. Isto foi demonstrado pelo exemplo da combinao da letra
Aleph, substncia primitiva, com todas as outras letras, e todas as outras
letras com Aleph. Deus predeterminou, e falando criou de um nome todas
as criaturas e todas as palavras. Deus, sua idia e seu verbo, so uma
nica unidade. Portanto a letra Aleph o ar de onde emanou a palavra
criadora.220
135
222
atravs da
reconstruo do imaginrio.
O interesse no teolgico, talvez nem sequer filosfico; [] o elemento
ldico que parece esconder-se atrs de toda afirmao e sentena como
esses espelhos que o espreitam na escurido noturna para reproduzir e
distorcer aquilo que possui ecos de solenidade.223
221
HANANIA, Aida Ramez. A caligrafia rabe e a arte de Hassan Massoudy/ Aida Ramez Hanania. So Paulo :
Martins Fontes, 1999, p.47 (grifos nossos).
222
YOUNES, Ebtehal. Jorge Luis Borges y el patrimonio filosfico oriental. In Variaciones Borges 2/1996.
Denmark : Borges Center/ Aarhus Universitet., p. 96-99.
223
SOSNOWSKI, Sal. Borges e a cabala. So Paulo: Perspectiva, 1991, p.42.
136
Tal repetio, como um eco, ressoa por todos os demais contos do livro,
aparentemente ordenados de forma disparatada, e justapostos como unidades
heterogneas. A proliferao do som dessa letra-palavra, aleph, ou desse objeto
de significante ausente, garante ao livro uma circularidade, como ato de unir as
pontas de uma meada, como processo metonmico de decifrao: um reenvia ao
outro e, de certo modo, a narrativa no se fecha ou no se conclui. O livro tornase algo interminvel, como a rbita aberta pelo objeto aleph, seus contos se
multiplicam no leitor, como a noite 1002, e assim infindavelmente.
Ao pensar outra configurao para a ordem dos contos de El Aleph,
poderemos ficar mais seguros na insegurana instaurada: iniciar o livro numa
ordem invertida, como aqui ensaiamos, do fim para o comeo, maneira oriental,
225
224
PIGLIA, Ricardo. Borges: a arte de narrar. In Borges no Brasil/ organizador Jorge Schwartz. So Paulo:
Editora UNESP: Imprensa Oficial do Estado, 2001, p.24
225
BORGES, Jorge Lus. El Aleph. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 627.
137
1. O imortal
226
Verso em portugus: BORGES, Jorge Lus. O Aleph. In Obras Completas de Jorge Lus Borges. Volume 1,
So Paulo: Globo, 2000, p.699.
138
139
saber total e absoluto, patrimnio exclusivo de Deus nico, mas a busca racional
da verdade pelos homens que a ela consagram sua vida...227
O livro El Aleph pode ser, nesse sentido, considerado um livro sacroprofano, uma procura pela f e pela razo, disfaradas, ou sob mscaras de
narrativas fantsticas.
En efecto, la creacin, segn Ibn Arabi, es una representacin imaginativa
que emana de la esencia divina y se revela al mundo aparente. O sea, el
mundo de lo imaginario sirve como intermediario y vnculo entre Dios y el
mundo, tanto en el plano de la existencia como en el de la interpretacin
la Creacin no es una operacin a partir de la nada, sino el fruto de la
imaginacin creadora de la esencia divina que fue revelado al mundo
aparente bajo la forma de manifestaciones diferentes cuyo origen es uno a
pesar de la multiplicidad. lo imaginativo para Ibn Arabi equivale a lo
fantstico para Borges, como voluntad de trascender el mundo la
imaginacin humana es un medio para alcanzar lo metafsico, lo cual
corresponde al concepto borgesiano de la metafsica como rama de la
literatura fantstica.228
227
HERNNDEZ, Miguel Cruz. El sentido de las tres lecturas de Aristteles por Averroes. In Ensayos sobre la
filosofia en Al-Andalus/ Andrs Martnez Lorca (coord.). Barcelona: Anthropos, 1990, p. 411. Traduo nossa.
228
YOUNES, Ebtehal. Jorge Luis Borges y el patrimonio filosfico oriental. In Variaciones Borges 2/1996.
Denmark : Borges Center/ Aarhus Universitet., p. 96.
229
ALAZRAKI, Jaime. La prosa narrativa de Jorge Luis Borges. Temas Estilo. Madrid: Gredos. 1968, p.13-14.
140
Com a sensao de ter sido obrigado a ser aquele homem e que, para ser
aquele homem, teve de escrever essa narrativa, e assim at o infinito,
reafirmamos a hiptese de Averris ser a mscara de Borges no transcorrer do
livro todo, um Outro, que lhe d certa sustentao neste fio, entre razo e
metafsica. Essa mscara lhe garante uma eficcia de representao da
realidade, que se desdobra ao expandir, pelas inmeras dobras dos contos de El
Aleph, diferentes e quase infinitos pontos de vista sobre o assunto.
Averris pode ser para Borges o que Cherazade foi para os escribas: a
personagem que cede lugar para a palavra, oferece a mscara para que a voz do
escriba soe, incorpore no instante do presente, a memria do passado e do
futuro, sonhando nfinitos lugares, reais ou imaginrios, para a cena que se vive.
Cherazade est sempre no palco encenando um entretenimento para
evitar uma tragdia iminente, teatralizando suas narrativas cujos discursos se
confrontam de muitas maneiras. Tece smbolos, ensaia disposies narrativas,
impe enunciados aparentemente inocentes, ora breves ora longos, evidencia a
coexistncia da lei e do desejo, em conflito e em contradio, luta pela vida
atravs da palavra e com a morte sempre a lhe espreitar bem de perto. Talvez,
Borges/Averris encenem a mesma tragdia, ou comdia. Trata-se da vida
sempre por um fio e o homem sempre sem respostas, a considerao da
palavra como instrumento todo-poderoso231 ao mesmo tempo que ldico,
tornando a literatura de Borges em jogo metafsico como divertimento da razo.
230
BORGES, Jorge Lus. La busca de Averroes. In El Aleph. In Obras completas. Volume 1. 14 reimpresin.
Buenos Aires: Emec, 2002, p.588.
231
SOSNOWSKI, Sal. Borges e a cabala. So Paulo: Perspectiva, 1991, p.19.
141
232
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Sete aulas sobre linguagem, memria e histria. Rio de Janeiro: Imago, 1997,
p.10.
142
Considerando tanto esse conceito de estratgia textual, que gera, que cria
e que organiza um texto ou um livro, quanto uma possvel segmentao
narrativa, que contribui para a sua melhor compreenso, tentaremos agrupar as
narrativas do livro El Aleph, a partir dos princpios de infinito contidos no
pensamento barroco, abordados por Deleuze no livro A dobra. Isto no significa
a nica combinao possvel, mas apenas a sugesto de uma possibilidade de
organizao do livro.
Para Deleuze234, a idia de infinito se constri, ora pela similitude do
tema, quando h certas combinatrias que evidenciam certos objetos serem
semelhantes, decorrendo de que no h um Todo maior ou uma Parte menor;
ora pela relao estabelecida entre certas passagens dos contos, numa
incluso recproca, como um infinito derivado: o Todo e so as Partes, e,
233
Um de nossos objetivos provar a existncia de um tipo de conto dito esquema gerador: o sistema geral
que rene, dispe e coordena todos os elementos do texto narrativo... [que] so postos numa estratgia
textual que gera o conto. Esta estratgia textual... cria o texto, organizando-o e fazendo-o caminhar segundo
suas leis interna. Nenhum elemento do texto pode pretender no ter conhecido esta estratgia. Nenhum pode
pretender escapar sua lei. dizer que, inscrito no texto, no est ali por nascena. Ela , ento, concebida
por uma vontade anterior ao texto. Traduo nossa. BENCHEIKH, Jamel Eddine. Les mille et une nuits ou la
parole prisonire. Paris : Gallimard. 1988, p.94-95.
234
DELEUZE, Gilles. A dobra: Leibniz e o barroco./Gilles Deleuze. Trad.Luiz B.L.Orlandi. Campinas: Papirus,
1991, p.83-85.
143
Criador.
A partir de una figura simple y por yuxtaposicin en las distintas
dimensiones del espacio eucldeo, se genera un tipo de laberinto de gran
complejidad espacial, donde el recorrido tiene distintas alternativas a la
derecha e izquierda, hacia arriba e hacia abajo. aadindole la tercera
dimensin, la altura, obtenemos un prisma hexagonal, una especie de
cristal de cuarzo.235
235
144
1
O INFINITO
El Aleph
Borges/Averris
Borges/Lugar
RAZO X METAFSICA.
A PTRIA:FORMAO EM MOSAICO
- La busca de Averroes.
- El Zahir
- El muerto
- Emma Zunz
-Los telogos
Borges/Labirinto
Borges/Tempo
O FANTSTICO
A MORTE
- La casa de Asterin.
- La otra muerte
- La espera
laberinto
- Deutsches Requiem
- El hombre en el umbral
6
A ETERNIDADE
El inmortal
236
LUFT, Lya. El Aleph. In Borges no Brasil/ organizador Jorge Schwartz. So Paulo: Editora UNESP: Imprensa
Oficial do Estado, 2001, p. 327-332.
145
Termina o conto.
8. Um Aposto de 1943 ao conto verdadeiro ps-escrito, em que o autor
faz algumas referncias histricas ao Aleph, e conclui
numa degradao
escuro, que se abre e se fecha rapidamente, para manter e revestir o aleph, que
ocupa literalmente um espao de quase centro do conto. O cerne do conto,
talvez como em elipse, esteja escondido entre todos aqueles desperdcios
narrativos, disfarando ou escondendo o seu verdadeiro objetivo, que alis pode
ser o do livro como um todo: imaginar ver o infinito num ponto, imaginar a
sincronia do tempo, estar em todos os lugares ao mesmo tempo, experimentar
ser Deus. Talvez por isto que a definio de Borges para aleph seja a de que o
todo no maior que qualquer das partes.
As partes de abertura (1,2,3,4) mostram uma ordem de realidade do
tempo de Cronos. A primeira informao dada trata da morte de Beatriz e el
146
personagem
primo-irmo
de
Beatriz,
Carlos
Argentino
Daneri,
que
aparelho
de
radiotelefonia,
cinematgrafo,
lanterna
mgica,
237
BORGES, Jorge Lus. El Aleph. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin Buenos Aires:
Emec, 2002, p.617-627.
238
Ibid., p.623.
147
Quanto aos encontros entre Daneri e Borges, eles se sucedem nas datas
de aniversrio de Beatriz. Para nossa surpresa, num deles, j doze anos, desde a
sua morte, haviam se passado. Pelos encontros, sabemos da produo literria
de Daneri em forma de poesia, e sua pretenso em versificar o planeta Terra!
Mximo desdenho de Borges para com essa produo literria, o que o leva a
compreender que el trabajo del poeta no estaba en la poesa; estaba en la
invencin de razones para que la poesa fuera admirable.239
So farpas veladas entre eles, at que Daneri revela seu desejo de ter
essa obra prefaciada, no por Borges, mas por lvaro Melin Lafinur240. E em
tons bem irnicos, e com sentimentos de rancor, Borges consente em ser o
intermediador daquela ao: a) hablar con lvaro.... b) no hablar con lvaro.
Previ, lcidamente, que mi desidia optara por b.241
Assim, em sobressaltos acaso o telefone tocasse e Daneri cobrasse o
resultado da conversa Borges - Lafinur, o tempo se passa e a narrativa nos
conduz para o seu cerne, para ao que realmente se props: colocar o aleph
diante de ns, pelos olhos de Borges... Daneri quem informa acerca da
demolio da sua casa, da rua Garay, e do tesouro que est guardado no poro:
239
BORGES, Jorge Lus. El Aleph. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin. Buenos Aires:
Emec, 2002, p.619.
240
Por otra parte, evidentemente la "Postdata del primero de marzo de 1943" remite al premio de 1942. Previa
a la Comisin Nacional de Cultura, una comisin asesora, integrada por Enrique Banchs, lvaro Melin Lafinur,
Horacio Rega Molina, Jos A. Ora y Roberto Giusti, haba recomendado otorgar el primer premio al libro de
Eduardo Acevedo Daz, el segundo a Pablo Rojas Paz y el tercero a Csar Carrizo. Mientras tanto, el libro
presentado por Borges, El jardn de senderos que se bifurcan, slo obtuvo el voto de Eduardo Mallea, quien
formara parte de la Comisin de Cultura. Este acontecimiento tuvo una gran resonancia en el crculo literario
allegado a Borges, tanto que el nmero 94 de la revista Sur, de julio del mismo ao, estuvo dedicado al
desagravio al autor ante la decisin del jurado. El "escndalo" suscitado provoca, poco tiempo despus, la
publicacin en la revista Nosotros de un artculo, "Los premios nacionales de literatura", en el que se justifica el
dictamen. Aunque este descargo no aparece firmado, segn Frieda Koeninger, es posible suponer que su autor
fuera Roberto Giusti, quien, adems de formar parte de la comisin asesora, se desempeaba como director de
Nosotros. A la vez, tres aos despus, Borges publicar "El Aleph", segn cuya Postdata, quienes le arrebatan
los lugares de honor en el concurso son Mario Bonfanti y Carlos Argentino Daneri. En un movimiento de ida y
vuelta de seres ficticios y reales, el mismo Acevedo Daz aparece mencionado en el relato en relacin a Carlos
Argentino: "Hace ya mucho tiempo que no consigo ver a Daneri; los diarios dicen que pronto nos dar otro
volumen. Su afortunada pluma (no entorpecida ya por el Aleph) se ha consagrado a versificar los eptomes del
doctor Acevedo Daz." (Borges, Jorge Luis 1990: 627). Esta referencia permite pensar una homologacin entre
ambos, en la que Carlos Argentino Daneri no necesariamente "sea" Eduardo Acevedo Daz, pero s, al menos,
alguien muy similar. Dentro de este plano de las referencias, es posible pensar que el "doctor Aita", ganador del
primer premio en el relato, est aludiendo a Antonio Aita, crtico literario asociado a la revista Nosotros, autor
de libros como Algunos aspectos de la literatura argentina (1930), La literatura argentina contempornea
(1931) y La literatura y la realidad americana (1931). lvaro Melin Lafinur, por otra parte, aparece tambin
con una referencia negativa. Sin embargo, al momento de la entrega de los Premios Nacionales tal parece que
la apuesta fuerte la hace Sur y es la que gana a largo plazo mientras que Nosotros parece responder a criterios
y parmetros de dcadas anteriores, puesto que los autores y textos premiados, junto a toda la lnea del
regionalismo nativista, y pese al lugar que convalidan y otorgan los premios dentro de la institucin literaria y
el campo intelectual, pasaron a ocupar un espacio muy marginal, cercano al olvido, en la historia literaria.
Comienza, as, por esta poca, a elaborarse e imponerse, ganando terreno, otro concepto de lo nacional y de la
representacin de lo nacional, aquel que Borges expondr paradigmticamente en "El escritor argentino y la
tradicin". MARENGO, Mara del Carmen. El premio nacional de 1942: batallas por el canon. Universidad
Nacional de Crdoba/Argentina. Disponvel em http://163.10.30.3/congresos/orbis/Maria%20del%20Carmen
%20Marengo.htm. Acesso em 10 maio 2006.
241
BORGES, Jorge Lus. El Aleph. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin. Buenos Aires:
Emec, 2002, p.622.
148
en un ngulo del stano haba un Aleph. Aclaro que un Aleph es uno de los
puntos del espacio que contiene todos los puntos.242
Empreende-se ento, a viagem em busca do aleph. Narrativamente,
Borges constri um cenrio de tpica casa barroca, numa arquitetura de dois
andares, de complexidade espacial para garantir e provocar, no leitor, a idia de
movimento causado pelas escadas. No se trata apenas do andar de baixo, ou do
espao de um poro, mas da idia de um lugar subterrneo e sombrio, vazio
mas com bugigangas, no limite frgil do claro que se faz no escuro.
El espacio que interesar representar no es pues el que siga fielmente las
descripciones del texto, sino aqul que se formaliza en la mente del lector
a lo largo de la lectura; no el espacio infinito, sino aqul que d la
sensacin del espacio ilimitado, no ser el de la representacin sino el de
la sugerencia. 243
242
Ibid., p.623.
GRAU, Cristina. Borges y la arquitectura. Madri: Ctedra, 1995, p. 75
244
DELEUZE, Gilles. A dobra: Leibniz e o barroco./Gilles Deleuze. Trad. Luiz B.L.Orlandi. Campinas: Papirus,
1991, p 54.
245
BORGES, Jorge Lus. El Aleph. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin. Buenos Aires:
Emec, 2002, p.624.
243
149
toda uma
teria
246
Id., p.624.
Id., p.624 Obs: enumeramos para melhor compreenso.
248
SARDUY, Severo. O barroco e o neobarroco. In Amrica Latina em sua literatura. So Paulo: Perspectiva,
1979, p.174.
249
BORGES, Jorge Lus. El Aleph. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin. Buenos Aires:
Emec, 2002, p.625.
247
150
giratrio
de
tenso-distenso,
contrao-dilatao,
compresso-exploso,
250
DELEUZE, Gilles. A dobra: Leibniz e o Barroco/ Gilles Deleuze. Trad. Luiz B.L.Orlandi. Campinas: Papirus,
1991, p.178/179.
251
BORGES, Jorge Lus. El Aleph. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin. Buenos Aires:
Emec, 2002, p.627.
151
de
certas
combinatrias
de
objetos,
fundamentais
para
desenvolvimento das narrativas, como moeda, tigre, roda, fogo, etc; o reenvio
complexidade e fugacidade do objeto aleph para trabalhar realidade e fico e
amplificar o imaginrio pelo fantstico.
Como forma, trata-se da possibilidade de La busca de Averroes ter suas
idias expandidas nos demais contos do bloco narrativo, especialmente por se
apresentar como uma representao teatral, talvez outros atos da mesma pea.
No fundo dessas narrativas, ou dessas encenaes, est o conflito entre o
EU e o Outro, entre o Mesmo e o Diferente, que parece convergir para um
mesmo ponto: o cosmo, como uma unidade total, e que para Averroes diz
respeito a un mundo no definitivo, presente, actual. El Cosmos es un conjunto
actual; la cosmovisin tiene sentido desde aqu: la actualidad presente; desde
ahora: la condicin del hombre viviente y no del intelecto descarnado.252
252
CRUZ HERNNDEZ, Miguel. El sentido de las tres lecturas de Aristteles por Averroes. In Ensayos sobre la
fiolosofia en al-ANdalus/ coord, Andrs Martinez Lorca. Barcelona: Anthropos, 1990, p. 416.
152
3.5.1
La busca de Averroes.253
253
BORGES, Jorge Lus. La busca de Averroes. In El Aleph. In Obras completas. . volume 1. 14 reimpresin.
Buenos Aires: Emec, 2002, p.582- 588.
254
Ibid., p. 582.
255
ATTIE FILHO, Miguel. Ibn Rusd, o reformador. In Falsafa : a filosofia entre os rabes: uma herana
esquecida. So Paulo: Palas Athena, 2002, p. 300-334.
153
258
257
e Al
A falsafa amadureceu com Al-Farabi, numa viso de mundo em que o real e o divino se conjugam, o
peripatetismo e o neoplatonismo se encontram, e o sistema edificado pela razo encontra seu coroamento
numa viso mstica. Ressaltou a distino entre a noo de essncia e de existncia. Al-Farabi buscou
harmonizar a filosofia com a religio proftica do Isl. Em sua doutrina, a presena do neoplatonismo na
metafsica aristotlica assumiu um carter de verdadeira teoria cosmolgica da emanao, resultando num
sistema metafsico de grande complexidade, que se ops doutrina criacionista de Al-Kindi. In ATTIE FILHO,
Miguel. Al-Farabi, o inventor. In Falsafa: a filosofia entre os rabes: uma herana esquecida. So Paulo: Palas
Athena, 2002, p. 195-225.
257
Ibn Sina (Avicena) tem o perfil do homem universal medieval versado em todos os saberes. um apogeu
da falsafa. Na rea de filosofia, suas principais fontes foram as obras de Aristteles e as teses de AL-Farabi
quanto doutrina cosmolgica na vasta descrio metafsica e sistemtica do mundo; a hierarquia das
inteligncias; a emanao das esferas do Ser Necessrio, ligando o pensamento plotiniano da emanao
doutrina aristotlica do intelecto.In ATTIE FILHO, Miguel. Ibn Sina, o sistematizador. In Falsafa: a filosofia entre
os rabes: uma herana esquecida. So Paulo: Palas Athena, 2002, p. 226-265.
258
Al-Gazali foi considerado o inimigo mais fervoroso da falsafa e um dos telogos mais importantes do
islamismo. Pelas suas prticas ascticas, aproximou-se dos sufis e, ao final da vida, foi visto por muitos como
um mstico. Razo, dogma e meditao forjaram o seu pensamento. Ele condenou as principais teses
metafsicas de Al-Farabi e Ibn-Sina. Tornou-se a maior personagem na histria da reao islmica ao
neoplatonismo: foi jurista, telogo, filsofo e mstico. At Al-Gazali, a falsafa realizara uma interpretao
peculiar da sabedoria alcornica, o que representava uma substituio da teologia do kalam por uma
cosmoviso aristotlica neoplatonizada isto suscitou uma reao antifilosfica do kalam atravs de Al-Gazali.
Para ele, os homens de reta moral poderiam restaurar a f, por isso dedicou sua vida e sua obra a revivificar o
Isl por meio da experincia religiosa de todos os crentes no se tratava apenas dos debates sobre a verdade
mas de realizar uma verdadeira transformao de vida para viver, de fato, os princpios teolgicos na alma
dos crentes. Ele o autor do livro Tahfut al-falsifa/ A destruio dos filsofos. So 20 teses que
mostrariam as contradies em que estariam imersos os que professavam as teses dos filsofos. Dos 20 pontos
considerados falsos na doutrina dos filsofos, 3 se destacam por irem diretamente contra as afirmaes do
Alcoro, o que leva Al-Gazali a condenar os filsofos por impiedade. In ATTIE FILHO, Miguel. Al-Gazli, o
batedor. In Falsafa: a filosofia entre os rabes: uma herana esquecida. So Paulo: Palas Athena, 2002, p.266299.
259
ATTIE FILHO, Miguel. Ibn Rusd, o reformador. In Falsafa: a filosofia entre os rabes: uma herana
esquecida. So Paulo: Palas Athena, 2002, p. 322-323.
260
Ibid., p. 319.
154
Ibid., p. 315.
BORGES, Jorge Lus. La busca de Averroes. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin.
Buenos Aires: Emec, 2002, p.583.
262
155
isso,
consideraramos
Averris
um
dos
alephs
do
livro,
156
3.5.2. El zahir.264
263
A resposta para tudo isto que o conhecimento de Deus no pode ser dividido em opostos de verdadeiro e
falso em que o conhecimento humano est dividido; por exemplo, podemos dizer de um homem que tanto
conhece como no conhece outras coisas, porque estas duas proposies so contraditrias, e quando uma
verdadeira a outra falsa; mas no caso de Deus ambas as proposies, que Ele sabe e que Ele no sabe
aquilo que Ele conhece ou no, so verdadeiras, pois Ele no o conhece atravs de um conhecimento que
determina uma imperfeio nomeadamente conhecimento humano, mas o conhece atravs de um
conhecimento que no carrega qualquer imperfeio, e este um conhecimento cuja qualidade ningum a no
ser Deus Ele-mesmo pode entender. E quanto a ambos universais e individuais verdade dEle que ele os
conhece e no os conhece. Esta a concluso para a qual os princpios dos filsofos antigos conduziram; mas
aqueles que fazem a distino e dizem que Deus conhece os universais mas no os particulares, no
alcanaram compreender sua teoria, e isto no conseqncia de seus princpios. Porque todas as cincias
humanas so passividades e impresses dos existentes, e os existentes operam neles. Mas o conhecimento do
Criador opera nos existentes, e os existentes recebem as atividades de Seu conhecimento. Traduo nossa.
AVERROES. Tahafut al-Tahafut. (The incoherence of the incoherence).Translated from the Arabic with
introduction and notes by Simon Van Den Bergh. Volumes I and II. Cambridge: EJW Gibb Memorial Trust.
1987, p.269.
264
BORGES, Jorge Lus. EL zahir. In El Aleph (949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949. 2 ed.,
14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 589-595.
157
mais
mordaz
consciente,
pela
capacidade
dela
em
265
BORGES, Jorge Lus. EL zahir. In El Aleph (949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949. 2 ed.,
14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 590.
266
Ibid, p. 594.
158
Zahir pode ser traduzido por uma expresso: ter visto um tigre,
significando santidade ou loucura. Assim, Borges insere uma explicao que tem
tudo a ver com o conto La escritura del dios, antecipando o cenrio da narrativa:
o tigre como animal mgico, a pintura dele por um faquir muulmano no piso,
nos muros, na abbada de uma cela - uma espcie de tigre infinito, feito de
muitos tigres e de vertiginosa maneira; atravessado de tigres, raiado de tigres,
incluindo mares e Himalaias e exrcitos que pareciam outros tigres.
Tambm pode ser traduzido por astrolbio de cobre, pois quem quer que
o tenha visto, continua a pensar nele at o fim de seus dias. Tambm rosa
(remetendo ao conto A procura de Averris): el zahir es la sombra de la Rosa y
la rasgadura del Velo268.
Desse modo, o conto El zahir faz um trabalho de aproximao com o
objeto zahir, indo s mincias de sua significao bem como a infinidade de
objetos assim nomeados, transformados no tempo e no espao, mas sempre
ligados ao mundo rabe e projetados no mundo ocidental.
267
268
Ibid, p. 593.
Ibid, p. 595.
159
BORGES, Jorge Lus. La escritura del dios. In El Aleph (949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.596-599.
160
parece ser a linha narrativa traada por Borges, para o livro como um todo: tudo
leva a um aleph, reduo, ao interior, compreenso batin dos textos.
Zahir, entre tantas significaes, tambm quer dizer ter visto o tigre e,
esta a acepo dele em La escritura del dios. Significa loucura ou santidade,
como
personagem do
La escritura del
dios pode
ser
161
punto la escribi ni con que caracteres, pero nos consta que perdura,
secreta, y que la leer un elegido. 270
mi dios confiando el
mensaje a la piel viva de los jaguares... esa red de tigres, ese caliente laberinto
de tigres, dando horror a los prados y a los rebaos para conservar un dibujo272.
Se, uma palavra j contm em si um universo implcito decir el tigre es
decir los tigres que lo engendraron, los ciervos y tortugas que devor, el pasto
de que se alimentaron los ciervos, la tierra que fue madre del pasto , el cielo que
dio luz a la tierra.273 - que pensar, ento, da linguagem de um deus? Tal palavra
deve ser nica e conter toda a plenitude, talvez traduzidas pelas ambiciosas e
pobres palavras humanas: todo, mundo, universo274.
Viver e sonhar, sendo verbos sinnimos, envolvem Tzinacan num labirinto.
A realidade questionada pelo sonho, que a recobre como vus. Interpretar o
sonho como se apresenta e/ou enxergar o tigre to prximo (como zahir) so
caminhos para compreender a realidade mais ntima, para entender aquela
mensagem do deus, j como batin.
Un da o una noche entre mis das y mis noches, qu diferencia cabe?
so que en el piso de la crcel haba un grano de arena, Volv a dormir,
indiferente; so que despertaba y que haba dos granos de arena, Volv a
dormir; son que los granos de arena eran tres. Fueron, as,
multiplicndose hasta colmar la crcel y yo mora bajo ese hemisferio de
arena. Comprend que estaba soando; con un vasto esfuerzo me
despert. El despertar fue intil; la innumerable arena me sufocaba.
Alguien me dijo: No has despertado a la vigilia, sino a un sueo anterior.
Ese sueo est dentro de otro, y as hasta lo infinito, que es el nmero de
270
Ibid, p.596.
BORGES, Jorge Lus. La busca de Averroes. In El Aleph. In Obras completas. volume 1. 14 reimpresin.
Buenos Aires: Emec, 2002, p.583.
272
BORGES, Jorge Lus. La escritura del dios. In El Aleph (949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.597.
273
Ibid, p.597.
274
Ibid, p.598.
271
162
3.5.4
Los telogos.277
275
Id., p.598.
Id., p.598.
277
BORGES, Jorge Lus. Los Telogos. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949.
2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.550-556.
276
163
d.C). Nele se narra que Platn ense en Atenas que, al cabo de los siglos,
todas las cosas recuperarn su estado anterior...278, uma idia venerada, lida e
relida pelos leitores que no se deram conta da inteno do autor: queria mesmo
era refut-la, recusar a concepo de histria cclica.
Um sculo depois, dois telogos, Aureliano de Aquilia e Joo de Panonia,
refutaro tais idias sobre o tempo circular, por ocasio do surgimento de uma
novssima seita, a dos montonos (llamados tambin anulares), que defendia
que la histria es un crculo y que nada es que no haya sido y que no ser. 279
Em El tiempo circular (em Histria de la eternidad, 1936), Borges j
definira um esquema gerador, ou um eixo narrativo, para o conto Los telogos.
Yo imagin hace tiempo un cuento fantstico, a la manera de Lon Bloy:
un telogo consagra toda su vida a confutar a un heresiarca; lo vence en
intrincadas polmicas, lo denuncia, lo hace quemar; en el Cielo descubre
que para Dios el heresiarca y l forman una sola persona.280
278
Ibid., p.550.
Id., p.550.
280
BORGES, Jorge Lus. El tiempo circular. In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis Borges. Obras
Completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.395.
279
164
homens.
Si los perodos planetarios son cclicos, tambin la historia universal lo
ser; al cabo de cada ao platnico (um curso de sculos) renacern los
mismos individuos y cumplirn el mismo destino la historia humana se
repite; nada hay ahora que no fue; lo que ha sido, ser; pero todo ello en
general, no (como determina Platn) en particular.282
281
282
Id., p.395.
Id., p.395.
165
dano a ningum; segunda, ajudar aos outros sempre que possvel" (Agostinho,
XIX.)
283
283
ANDRADE, Regis de Castro. The individual and the citizen in the history of ideas (with an essay on
Machiavelli). Lua Nova. [online]. 2002, no.57 [cited 31 May 2006], p.33-71. Available from World Wide Web:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-64452002000200003&lng=en&nrm=iso>.
ISSN 0102-6445. Acesso em 31 maio 2006.
284
BORGES, Jorge Lus. El tiempo circular. In Historia de la Eternida (1936). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.394.
166
285
Herclides Pntico refiere que Pitgoras deca de s mismo que en otro tiempo haba sido Etlides y tenido
por hijo de Mercurio; que el mismo Mercurio le tena dicho pidiese lo que quisiese, excepto la inmortalidad, y
que l le haba pedido el que vivo y muerto retuviese en la memoria cuanto sucediese. As que mientras vivi
se acord de todo, y despus de muerto conserv la misma memoria. Que tiempo despus de muerto, pas al
cuerpo de Euforbo y fue herido por Menelao. Que siendo Euforbo, dijo haba sido en otro tiempo Etlides, y que
haba recibido de Mercurio en don la transmigracin del alma, como efectivamente transmigraba y circua por
todo gnero de plantas y animales; el saber lo que padecera su alma en el infierno y lo que las dems all
detenidas. Que despus que muri Euforbo, se pas de alma a Hermtimo, el cual, queriendo tambin dar fe de
ello, pas a Branquida, y entrando en el templo de Apolo, ense el escudo que Menelao haba consagrado all;
y deca que cuando volva de Troya consagr a Apolo su escudo, y que ya estaba podrido, quedndole slo la
cara de marfil. Que despus que muri Hermtimo se pas a Pirro, pescador delio, y se acord de nuevo de
todas las cosas, a saber: cmo primero haba sido Etlides, despus Euforbo, luego Hermtimo y enseguida
Pirro. Y finalmente, que despus de muerto Pirro vino a ser Pitgoras, y se acordaba de todo cuanto hemos
mencionado. Disponible em http://www.webdianoia.com/presocrat/pitagoras_diog.htm. Acesso em 31 maio
2006.
286
ROSSET, Clment. O real e seu duplo- ensaio sobre a iluso.Trad. Jos Thomaz Brum. Gallimard, 1976/
SP:L/PM , 1988.
287
BORGES, Jorge Lus. Los telogos. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949.
2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.552.
167
288
Ibid., p.555.
Disponvel em http://www.mundodosfilosofos.com.br/heraclito.htm. Acesso em 31 maio 2006.
290
BORGES, Jorge Lus. El tiempo circular. In Historia de la eternidad (1936). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.394.
291
BORGES, Jorge Lus. Los telogos. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949.
2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.555.
289
168
e El muerto;
cativa, filia-se Emma Zunz. Decorre, ento, a hiptese de que eles se organizam
em duplas, atuam em espelho multiplicando imagens falsas, em que nada o
que parece. Os contos contm um duelo entre lei e desejo, no limiar da morte
ou se entregando morte, quase como a relao em duplas de Chariar x
Cherazade.
A histria de Chariar refere-se a um caminho que trata de uma lei e a sua
contraveno. Talvez este seja o caminho do bloco aqui proposto: o desrespeito
e a subverso lei. Chariar tem a chance de retornar lei e retomar a prpria
292
293
Ibid., p.555-556.
Ibid., p.551.
169
ouvimos as histrias, e estamos olhando para este espelho que fala da morte
deste Outro para falar da nossa prpria.
Os contos lembram, ento, as estratgias temticas dos poemas rabes
qasdas, ao falar da tribo, dos atos dignos de rememorao, do jogo da vida
como um jogo de azar, da vida e da morte sempre espreita, da imprudncia,
do derramamento de sangue, da personagem traioeira ou corrupta. Somos
remetidos, portanto, a um tempo e um lugar distantes de um grupo que parece
no existir mais.
Nesse sentido, o conto Historia del guerrero y de la cautiva cruza tempo e
espao, como o tema atll nas qasdas: evidencia o contraste irreversvel da
experincia humana entre o presente, que tem muito pouco a dizer, exceto pela
rememorao das lembranas de um passado guardado na memria e, as
relaes espaciais do que est ali recorrente na natureza.
Embora o espao circunscrito em Historia del guerrero y de la cautiva trate
da regio geogrfica limtrofe entre Argentina-Uruguai, bem possvel que a
inteno de Borges tenha sido perscrutar um espao que foi ou estava sendo
reconstrudo pelo homem branco, incluindo a tambm, os marginalizados, os
fora-da-lei, homem ou mulher, bem ou mal sucedidos. O bloco narrativo funciona
como diferentes olhares sobre uma nao prenhe, a Amrica, a Argentina ou,
mais de perto ainda, a gestao de um ser americano-argentino, podendo ser
heri, mas tambm bandido, podendo ser traidor e ao mesmo tempo trado,
porque el anverso y el reverso de esta moneda son, para Dios, iguales.294
Essa coleo de contos diz respeito a um homem-narrativa295 que d algo
a mais: el yo vale decir, la memoria de lo pasado y la previsin de lo porvenir,
vale decir, el tiempo296, mesmo que isto implique na devorao dos cadveres,
na destruio das flores ou na transformao dos sonhos em pesadelos.
294
BORGES, Jorge Lus. Histria del guerrero y de la cautiva . In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras
Completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.560.
295
TODOROV, Tzvetan. Os homens-narrativas. In Potica da Prosa. So Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 95-112
296
BORGES, Jorge Lus. La penltima versin de la realidad. In Discusin (1932). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.199.
170
3.6.1
BORGES, Jorge Lus. El arte narrativo y la magia. In Discusin (1932). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.226-232.
298
BORGES, Jorge Lus. Histria del guerrero y de la cautiva. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras
completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.557-560.
171
continente
desertor.
Como
smbolo,
Droctulft
representa
todos
os
homens
em
172
3.6.2
300
173
303
Sura 97 Al-Cadr, el Destino. El Sagrado Corn. Traduccin literal, ntegra del original arbigo al espaol,
con comentarios y compendios de las Suras. Autorizado por la Liga Islmica Mundial/ La Meca. Arbia Saudita.
1 ed. s/d. Valencia: Centro Islmico de Venezuela, s/d, p.758.
302
FERREIRA DE ALMEIDA, Joo (traduo) A Bblia Sagrada: o Velho e o Novo Testamento. 7 impresso. Rio
de Janeiro: Imprensa Bblica Brasileira. Parte do Novo Testamento, 1953, p. 198.
303
BORGES, Jorge Lus. Biografia de Tadeo Isidoro Cruz (1829-1874). In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges.
Obras Completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.561.
304
BORGES, Jorge Lus. Biografia de Tadeo Isidoro Cruz (1829-1874). In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges.
Obras Completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.562.
174
3.6.3
El muerto.307
Id., p.562.
BORGES, Jorge Lus. Los telogos. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949.
2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.556.
307
BORGES, Jorge Lus.El muerto. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.545-549.
306
175
porque
quer
176
BORGES, Jorge Lus.El muerto. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.547.
177
Cego e surdo pela ambio, e sendo alimentado para isto, Otlora se nega
a perceber a realidade que o circunda. Confia num cavaleiro sombrio, de barba
cerrada e que veste poncho Ulpiano Surez, capanga ou guarda-costas de
Bandeira, de fala abrasileirada, reservado, hostil, cheio de desdm. Vivendo num
mundo de iluso, Otlora llega tambin a desear, con deseo rancoroso, a la
mujer de pelo resplandeciente. La mujer, el apero y el colorado son atributos o
adjetivos de un hombre que l aspira a destruir.309
Por fim, a guinada no conto se opera exatamente quando o desejo
extrapola a lei, num momento de vertigem. A maquinao satnica de Azevedo
Bandeira se revela aos poucos, para o protagonista (e para o leitor), entre
intimidao e afrontas, entre seriedade e brincadeira, em risos maquiavlicos.
Otlora, como duplo de Bandeira, incorpora esse modo de fazer e de ser e vai
sendo esse prprio Outro, assumindo o lugar dele que acredita ser o seu. Ferido
em combate, acreditando j ser o novo rei, regressa a El Suspiro, um
estabelecimento pobre e perdido em qualquer lugar da interminvel plancie,
onde nesta noite dorme com a mulher ruiva.
Mas, um jogo de blefes: nem Otlora o chefe e nem Bandeira deixou
de ser o chefe, de manipular todas as cenas, de dar as cartas, de ser o todopoderoso invisvel em todos os momentos.
Num jogo de espelhos, as imagens se modificam, os atores confirmam
seus papis, o de traidor e o de trado mas, quem quem? No jbilo crescente
de Otlora pela bebida e na presena taciturna de Bandeira, h uma cena brutal
e intimidatria provocada por Bandeira ao obrigar a mulher ruiva a beijar
Otlora, como o beijo de Judas.
Apenas neste instante possvel admitir a realidade, enxergar pela
primeira vez com alguma clareza. Na iminncia da morte que Otlora percebe
a traio, comprende, antes de morir, que desde el principio lo han traicionado,
que ha sido condenado a muerte, que le han permitido el amor, el mando y el
triunfo, porque ya lo daban por muerto, porque para Bandeira ya estaba
muerto.310
309
Ibid., p.548.
BORGES, Jorge Luis.El muerto . In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.549.
310
178
311
BORGES, Jorge Luis. Emma Zunz. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949.
2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.564-568.
179
312
AEDO FUENTES, Maria Teresa. Borges y Emma Zunz postulando realidades. Acta literaria. [online]. 2000,
no.25 [citado 05 Junio 2006], p.27-36. Disponible en la World Wide Web: http://www.scielo.cl/scielo.php?script
=sci_arttext&pid=S0717-68482000002500004&lng=es&nrm=iso>. ISSN 0717-6848. Grifos nossos. Acesso em
5 junho 2006.
313
BORGES, Jorge Lus. Emma Zunz. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949.
2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.565.
180
Foi ao porto, indiferente aos olhos famintos dos homens, procurando pelo
tal navio sueco, e escolhendo algum perfeito para o plano, para que a pureza
do horror no fosse diminuda: de uno, muy joven, temi que le inspirara alguna
ternura y opt por otro, quiz ms bajo que ella y grosero ... El hombre la
condujo a uma puerta y despus a un turbio zagun y despus a una escalera
tortuosa y despus a un vestbulo (en el que haba una vidriera con losanges
idnticos a los de la casa en Lans) y despus a un pasillo y despus a una
puerta que se cerr.314
O relato enumerativo, tanto nos introduz como obriga a uma experincia
espacial e temporal, de labirinto e de simultaneidade, como o aleph. Num tempo
cronolgico suspenso, Emma vive a eternidade de minutos. Como saber o que
ela pensava no instante de fatos to graves, fora do tempo cronolgico, de
sensaes caticas, desconexas e atrozes? Se pensou uma s vez no morto, que
motivava o sacrifcio, seu propsito correu perigo: penso (no pudo no pensar)
que su padre le haba hecho a su madre la cosa horrible que a ella ahora le
hacan315.
A partir dessa realidade circunstancial, o argumento mais evidente para a
vingana, ou seja, aquele de executar um ato de justia por amor ao pai,
ganhou outra dimenso, necessitando
ser averiguado. Os
motivos
mais
A vingana
era pelo pai ou contra o pai? Emma estava vingando a me? Ou todas as
mulheres ultrajadas?
Um jogo de espelhos se acentua. As imagens podem estar refletindo
identidades invertidas que, sendo imagens, tambm podem ser falsas, sem
nunca esclarecer com firmeza, porque nem mesmo o narrador tem certeza dos
fatos: pens Emma Zunz una sola vez en el o muerto que motivaba el
sacrificio? Yo tengo para mi que pens una vez ...316
Forma-se
um
tringulo
de
personagens
emaranhados.
Emma
trai
Loewenthal que traiu Emmanuel que pode ter trado Emma e Lowenthal.
Nenhuma das personagens parece ser o que aparenta, todas se refletem e so
refletidas, muitas vezes como imagem distorcida e fora de foco.
O pai de Emma, Emmanuel Zunz, adota um outro nome: Manuel Maier.
Neste detalhe, incorpora-se a idia de algo que no , que se esconde, que est
314
315
316
Ibid., p.565-566.
Ibid., p.566.
Ibid., p.566.
181
distorcido, que disfara para no ser reconhecido. um pai que gera uma srie
de dvidas. difcil confiar na questo da sua honestidade, da sua inocncia, de
seu amor de pai para a filha, do suicdio aparentemente acidental. Como controle
da filha, talvez uma marionete, obriga-a a fazer justia pelas prprias mos,
vinga-se do inimigo por via indireta.
Aaron Loewenthal parece funcionar como um duplo de Emmanuel Zunz.
Quem o traidor e quem o trado? Do ponto de vista de Emma, ele o
culpado, o ladro, o avarento enriquecido s custas de um casamento, um
patro capitalista, uma pessoa medrosa que se protege com um co e um
revlver. Para a sociedade ele visto como um homem honrado, srio, religioso,
recluso, vivo que era apaixonado pela mulher, bom administrador dos negcios.
Para ele mesmo, h uma incapacidade vergonhosa em ganhar dinheiro, saindose melhor na sua conservao. Mscaras superpostas.
Emma um lobo em pele de cordeiro, ou lobo e cordeiro ao mesmo
tempo, encarna o pai e Loewenthal simultaneamente, age como uma mulher
flica. Pela juventude e pouca experincia de vida, aparenta debilidade e
carncia, e oposio violncia. Mas tem uma ao enrgica, forte, premeditada,
calculista, vingativa. O nico instante em que ela se revela humana e feminina
no momento do estupro consentido como prostituta, em que mais parece um
cordeiro imolado e pondo em dvida as razes aparentes de seu procedimento.
Mesmo assim, segue risca o estabelecido por si mesma, e s com o passar do
tempo, que poder ser ela mesma, quando a memria, no tempo, conseguir
repudiar e confundir o gesto.
Como tudo no conto, o encontro no escritrio da fbrica entre Emma e
Loewnthal foi pura encenao, atuaram personagens de personagem de si
mesmos. Seduzido pela fragilidade de Emma em seu texto ensaiado, mesmo que
as coisas no tivessem sado exatamente como Emma planejara, dois tiros pem
o enorme corpo do senhor Loewanthal no cho que, sem saber a razo de tal
ataque, mereceu mais um outro tiro para que se calasse definitivamente.
A histria, de que o patro queria saber da greve e do abuso sexual, era
inacreditvel, de fato, pero se impuso a todos, porque sustancialmente era
cierta. Verdadero era el tono de Emma Zunz, verdadero el pudor, verdadero el
182
dio ... el ultraje que haba padecido; slo eran falsas las circunstancias, la hora
y uno o dos nombres propios.317.
Ibid., p.568.
183
3.7.1
La casa de Astrion.319
dificuldade da comunicao humana pela escrita, por isto nunca teve pacincia
318
HUICI, Adrin. El mito clsico en la obra de Jorge Luis Borges. El laberinto. Sevilla: Alfar. 1998, p. 20-21
BORGES, Jorge Lus. La casa de Asterin. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.569-570.
319
184
para aprender a ler, embora sinta falta disto para preencher las noches y los das
largos.320
Sua casa no tem pompas nem mveis, constitui-se de puertas (cuyo
nmero es infinito)321
nelas, estando sempre prontas para deixar entrar quem quiser. um lugar de
quietude e solido e, todas las suas partes estn muchas veces, cualquier lugar
es otro lugar. La casa es del tamao del mundo; mejor dicho, es el mundo.322
Numa referncia sua condio de natureza divina, alega que no se lembra se
criou, ou no, as estrelas, ou o sol, ou a enorme casa.
As referncias mitolgicas iluminam o conto cada vez mais: descreve o
sacrifcio a cada nove anos de nove homens, que no resistem viso de
Astrion, e morrem. Tambm a profecia pela qual haver de chegar o seu
libertador daquele lugar e daquela solido. E, a revelao final, a divagao
sobre a imagem desse libertador, que mostra a
tem de si: ser un toro o un hombre?
323
BORGES, Jorge Lus. La casa de Asterin. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.569.
321
Id., p.569.
322
Ibid., p.570.
323
Id., p.570.
324
BORGES, Jorge Lus. Abenjacn el Bojar, muerto en su laberinto. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges.
Obras Completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.600-606.
185
Como histria 1, o conto trata dos fatos como parecem ter acontecido,
uma trama cheia de mistrios. A partir da rememorao de acontecimentos da
infncia por Dunraven, o jovem escritor e poeta local, para Unwin, um jovem
matemtico, sabemos de Abenjacn el Bojar, caudillo o rey de no s qu tribu
niltica (Qunia/ Sudo),[que] muri em la cmara central de esa casa a manos
de su primo Zaid. Al cabo de los aos, las circunstancias de su muerte siguen
oscuras. En primer lugar, esa casa es un laberinto. En segundo lugar, la
vigilaban un esclavo y un len. En tercer lugar, se desvaneci un tesoro secreto.
En cuarto lugar, el asesino estaba muerto cuando el asesinato ocurri. En quinto
lugar327
A partir desse enigma, somos introduzidos fortaleza de Abenjacn, um
tipo de labirinto, fundado no de Astrion. Construdo pelo homem, Borges o
descreve na forma de un crculo, pero
infinito. Sendo seus muros mais altos que um homem, ficava impedida a viso
para fora daquele ambiente, tornando-se um tnel cheio de ecos, encruzilhadas
e bifurcaes, sufocando pela baixa altura e, sempre dobrando esquerda, at
atingir o seu centro, um aposento nico com lguas e lguas de corredores
325
BORGES, Jorge Lus. Los dos reyes y los dos laberintos. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras
Completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.607-608.
326
NGELO, Andra Lcia Paiva Padro. Borges e o conto policial: Abenjacn el Bojar, muerto em su
laberinto In Interletras- Revista Transdisciplinar de Letras, Educao e Cultura da UNIGRAN-MS. Dourados/MS.
V.1, n.5, jul/dez. 2006. ISSN 1807- 1597. Disponvel em http://www.unigran.br/interletras/arquivos/v5/dossie
Abencajanpara Interletras5andrea.pdf. Acesso em 06 mar 2008.
327
BORGES, op cit., p.600.
328
BORGES, Jorge Lus. Abenjacn el Bojar, muerto en su laberinto. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges.
Obras Completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.600-601.
186
Id., p.600-601.
Ibid., p.604-605.
Ibid., p.600.
187
Los dos reyes y los dos laberintos, como uma narrativa de encaixe,
insere-se no conto Abenjacn, el Bojar como o discurso feito no plpito, pelo
ministro da igreja, sobre a situao inusitada da construo da casa-labirinto. No
conto de Abenjacn, a parbola que o repreende pela sua audcia e
arrogncia.
No Eplogo de El Aleph, Borges diz que este conto pode ser considerado
uma narrativa de As mil e uma noites, intercalada
rabe e que Abenjacn seria uma variante dos contos rabes. Tambm parece
que a histria de Los dos reys y los dos laberintos seja uma duplicao, como
espelho, da narrativa de La casa de Asterin, como uma grande metfora do
mundo desde sempre, do universo inabarcvel, quer como um
labirinto
construdo pelo homem quer aquele feito por Deus na natureza, nas tentativas
humanas de expressar sua compreenso de Deus e do universo.
La incapacidad del hombre para explicarse el universo hace de ste un
laberinto cuya clave no conocemos y en el que, invariablemente, nos
extraviamos. En este laberinto, fruto de la divinidad o del azar, no hay hilo
de Ariadna posible. el laberinto divino, no slo es incomprensible sino
que adems, y sobre todo, resulta inhabitable, el hombre crea sus propios
laberintos que, si no resuelven sus problemas, al menos son transitables
en tanto que responden a la medida de lo humano. 333
Ibid., p.606.
HUICI, Adrin. El mito clsico en la obra de Jorge Luis Borges. El Laberinto. Sevilla: Alfar, 1998, p.244-245.
188
arrogncia pelo feito; e o que dado pela natureza divina, o deserto, a punir
qualquer arrogncia humana. Borges pe em evidncia o deserto, como um
labirinto sem a estrutura arquitetnica humana que lhe d forma, apenas tecido
de tempo e de espao, e repetindo, infinita e interminavelmente a si mesmo, de
modo igual, um verdadeiro infinito.
Tiene el desierto uno de los requisitos fundamentales del laberinto: no
dejar salir a quien entra en l y una peculiaridad, la infinitud, que se
percibe desde el comienzo y que genera la desesperanza, contrastando
con la esperanza de salida que siempre hay en los laberintos construidos:
al final de una encrucijada, al doblar un muro curvo, al subir una escalera,
al cruzar una plazoleta, al pasar el umbral de una puerta, est la
esperanza de que ste sea el ltimo obstculo que separe de la salida.334
humano, como o nico dado concreto e real da vida. Nenhuma das personagens
334
189
3.8.1
La otra muerte.335
BORGES, Jorge Lus. La otra muerte. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.571-575.
336
MIRANDA, lvaro. Conversa com Jorge Luis Borges. Disponvel em http://www.revista.agulha.nom.br/bh16
borges11.htm Acesso em 06 jul 2006.
337
DELEUZE, Gilles. Lgica do sentido. Trad. Luiz Roberto Salinas Fortes. 4 edio. 2 reimpresso. So Paulo:
Perspectiva, 2003, p. 64.
190
191
que muchas veces haba referido esas mesmas cosas, y tem que detrs de sus
palabras, casi no quedaran recuerdos338.
Porm, a entonao de sua voz se modifica quando o nome de Damin
pronunciado, e algumas reflexes so colocadas, saindo do discurso comum: que
uma batalha serve para revelar quem covarde e quem valente, que se trata
do instante nico na vida de um homem e, que este instante provou que Damin
nunca deixou de ser o que era - um tosquiador que fraquejou em Masoller.
Como primeira verso dos fatos, isto envergonhou Borges, por destruir
uma imagem de dolo que ele criara em torno de Pedro Damin. Talvez isso
justificasse a recluso de si mesmo por Damin, mais pela vergonha que pela
modstia, porque un hombre acosado por um acto de cobarda es ms complejo
y ms interesante que un hombre meramente animoso.339
No inverno, Borges retornou casa do coronel Tabares para outros
pormenores, e acabou entrevistando um outro senhor de idade, que havia
militado na mesma revoluo: doutor Juan Francisco Amaro, de Paysand. E,
para sua surpresa, a rememorao revelava um outro Pedro Damin, no um
covarde, mas um valente que havia morrido como qualquer homem desejaria
morrer, na ponta, gritando, alvo para
peito, mesmo firmado nos estribos, gritando e acabando por ficar entre as patas
do cavalo. O que gritava Damin? Palavres, mas tambm Viva Urquiza!. Para
o Coronel Tabares, Pedro Damin era um nome que ele nunca tinha ouvido, e
era impossvel lembrar-se dele.
Passado o tempo, mais apagamentos em torno de Pedro Damin, e
remetendo ao incio do conto. O amigo de Borges, Patrcio Ganon, no iria mais
traduzir o poema The past, e nem se lembrava de Pedro Damin; o coronel
Tabares dizia ter se lembrado dos homens terem enterrado algum de nome
Damin; o carteiro de Gualeguaychu havia morrido, e ningum nas imediaes
do rancho de Damin se lembrava dele.
Com esses dados, Borges, como se ainda no estivesse escrevendo o
conto, passa s suas hipteses, como diversos atalhos para a escolha de uma
direo:
338
BORGES, Jorge Lus. La otra muerte. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.572.
339
Id., p.572.
192
e um valente,
morto em 1904;
vivendo como del outro lado de um cristal; e quando muri, su tenue imagem
se perdi, como el agua en el agua340. Por isso, a referncia nada ingnua ao
poema The Past, como fundo e como eco para o conto:
O Passado 342
Traduo literal por Mrcia Reis Brando
A dvida est paga,
O veredicto anunciado,
As Frias jazem,
A praga extinta,
Todas as sortes lanadas;
Vire a chave e cerre a porta,
Doce para sempre a morte.
Nenhuma soberba esperana, nenhum obscuro
desgosto,
Nenhum rancor assassino, pode penetrar.
Tudo agora definitivo e lpido;
Nem os deuses podem abalar o passado;
Moscas se debatem contra a porta adamantina
Para sempre cerrada.
Ningum pode entrar novamente,Nenhum ladro por mais perspicaz,
Nem Sat com um nobre truque
Pode penetrar por uma janela, fresta ou furo,
Atar ou desatar, suprir a falta
Inserir uma pgina, ou forjar um nome,
Remodelar ou concluir o que est cerrado,
Alterar ou reparar o Eterno Destino.
340
BORGES, Jorge Lus. La otra muerte. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.574.
341
Disponvel em http://www.firstscience.com/SITE/poems/emerson3.asp. Acesso em 03 jul 2006.
342
BRANDO, Mrcia Reis. Disponvel em
http://www.revistazunai.com.br/ensaios/marcia_reis brandao_
Borges.htm Acesso em 03 jul 2006.
193
tratado
3.8.2. La espera.
346
343
BORGES, Jorge Lus. La otra muerte. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.575.
344
Ibid., p.574-575.
345
BRANDO, Mrcia Reis. O real e o virtual em um conto de Borges. Em: http://www.revistazunai.com.br/
ensaios/marcia_reis_brandao_Borges.htm Acesso em 04 jul 2006.
346
BORGES, Jorge Lus. La espera. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.608-611.
194
Entre sonho e vida desperta, entre viglia e sono profundo, o conto La espera
tem uma certeza de realidade de pesadelo, nunca muito ntido quanto aos
acontecimentos, ao ambiente ou s situaes apresentadas.
Quando somos introduzidos ao conto, uma carruagem deixa o protagonista
numa penso ou hotel, localizada numa certa rua do Noroeste, nmero 4004.
So imprecises de um sonho, com um ar inslito: a personagem mais parece
um vulto, o lugar vago uma dessas ruas, e o nmero, provavelmente, uma
variao de 1001, quadruplicando a potncia de fantasia, como dados de algo
surreal.
O cenrio, composto por coisas (ahora arbitrarias y casuales y en
cualquier orden, como las que se ven en los sueos347), depende, talvez, do
tempo que passa para se tornarem invariables, necesarias y familiares.348
Tambm, ao ser efetuado o pagamento de seu transporte, por engano, com uma
moeda oriental, sejamos remetidos aos sortilgios do zahir, aumentando a
potncia da confuso entre sonho e realidade.
Quase uma tentativa de ser, ou de se tornar o Homem Invisvel de
H.G.Wells, essa narrativa tambm poderia ser outra verso de Abenjacn, mas
cujo estratagema de esconde-esconde ou de perseguidor-perseguido mal
sucedido. O protagonista, para ser ainda mais invisvel, no tem nome, embora o
apresentado seja a usurpao do nome de seu inimigo. Isto, porm, no
considerado uma astcia, visto que tinha sido impossvel pensar em outro:
senhor Villari.
Ao transitar pelo labirinto da cidade, talvez mais eficiente que o labirinto
de Asterin, essa personagem, enreda-se cada vez mais no limite frgil entre
sonho e realidade, fico e vida real. O falso Villari no consegue perceber,
ironicamente, semelhanas ou coincidncias entre a arte, trazida pelos filmes de
mocinhos e bandidos como coro de uma tragdia, e a realidade de sua prpria
vida naquela perseguio sem fim, numa constante ansiedade de ser encontrado.
A ele no importava a fico dos romances, que poderia espelhar a sua vida,
mas a realidade trazida pelo jornal ou, mais especificamente, as informaes de
uma dada seo do jornal. Algum dia, quem sabe,
a notcia da morte de
Alejandro Villari estaria impressa ali. Podia ser at que j tivesse morrido, o que
seria um sonho - um alvio ou um infortnio? Como Asterin, o falso Villari
347
348
Ibid, p.608.
Id., p.608.
195
tambm aguardava o seu Teseu. Aos de soledad le haban enseado que los
dias, en la memria, tienden a ser iguales, pero que no hay un da, ni siquiera de
crcel o de hospital, que no traiga sorpresas. .. esta reclusin era distinta,
porque no tena trmino.349
O seu nico relacionamento era com um cachorro-lobo, j velho da casa,
com quem falava em espanhol ou italiano. Vivia como o animal, s o instante do
presente, ignorando o passado que consistia num tempo feito, que lhe causava
um cansao parecido com a felicidade. O tempo de Villari o tempo sem
tempo dos sonhos.350
Mas, o que traz Villari realidade um horrvel milagre - uma dor de
dente, sentida duas vezes noite e ao amanhecer, sinal de que est vivo.
Portando-se como qualquer pessoa em casos de extrao de dentes, sente-se
nem mais covarde nem mais tranqilo. Entretanto, ao mesmo tempo isto mau
pressgio, pois perder um dente em sonho significa a morte. Esse instante fugaz
(de realidade ou de sonho?), logo se torna passado.
De volta ao mundo confuso entre iluso e realidade, Villari continua sua
vida, sempre acometida por insana sensao de perseguio. Seja em meio
multido do cinema, quando empurrado por estranhos, seja pela leitura da
Divina Comdia, quando se identifica com a histria de traio entre Ugolino e
Ruggieri, ou o confinamento de Ugolino na torre, tal qual sua recluso no quarto
de hotel ou de penso, espera de seu algoz.
E, assim, o nico instante de realidade do conto, quando Villari morto,
uma cena preparada atravs de sonhos, numa inverso, segundo Alazraki,
cuidadosamente elaborada graas linguagem literria, e provavelmente
baseada na afirmao de Maom: la gente est durmiendo. Cuando mueren se
despiertan351.
Nos amanheceres, Villari sonhava um sonho de fundo sempre igual e de
circunstncias variveis, em que havia homens que entravam no quarto com
revlver, ou estavam em meio multido, e ele utilizava a arma, que de fato
estava guardada na gaveta do criado-mudo, para se defender. Sempre o
estampido o fazia despertar.
349
BORGES, Jorge Lus. La espera. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.609.
350
El tiempo de Villari es el tiempo sin tiempo de los sueos. Em: ALAZRAKI, Jaime. Versiones.
Inversiones. Reversiones. El espejo como modelo estructural del relato en los cuentos de Borges. Madrid:
Gredos, 1977, p.117. Traduo nossa.
351
YOUNES, Ebtehal. Jorge Luis Borges y el patrimonio filosfico oriental. In Variaciones Borges 2/1996.
Denmark: Borges Center/ Aarhus Universitet., p.93.
196
ainda
no
ocorreu. O
acontecimento
imaginado,
como
352
ROSSET, Clment. A iluso oracular: o acontecimento e seu duplo. In O real e seu duplo- ensaio sobre a
iluso ; traduo Jos Thomaz Brum. Gallimard, 1976/ SP:L/PM , 1988, p.20-42.
353
BORGES, Jorge Lus. Deutches Requiem. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.576-581.
197
SARLO, Beatriz. Borges, un escritor en las orillas. Buenos Aires: Compaia Editora Espasa Calpe Argentina
S.A/Ariel, 1995, p.194.
355
CHAGAS, Marcelo. O martrio do cnone. Em nota de rodap. Disponvel em: http://www.revista.criterio.
nom.br/ artigo-martirio-canone-literario-marcelo-chagas.htm Acesso em 10 jul 2006.
356
BORGES, Jorge Lus. Deutches Requiem. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas 1:19231949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.577.
198
358
Mas a piedade, parece, nunca existe sem uma parte de desprezo ou, pelo
menos, sem um sentimento de superioridade por aquele que a sente, ficando
embutida
uma
suficincia
que
ressalta
insuficincia
do
Outro,
uma
Ibid., p.578.
Ibid., p.579.
Id., p.579.
199
daquilo que ele representa, muitas das histrias contadas naquela noite por
Christopher Dewey, do Conselho Britnico e que havia trabalhado entre as duas
guerras no Industo, sero ouvidas por Bioy Casares e Borges. Uma delas ser
escolhida por Borges para ser reconstruda e resultar no presente conto.
Invocando a Al para que o livre da tentao de t-la escolhido pelo exotismo do
relato, Borges afirma, literalmente, tratar-se de uma narrativa de un antiguo y
simple sabor que sera una lstima perder, acaso el de Las 1001 Noches.364
Ao mencionar Ultra auroram et gangem, o contador das histrias
confunde a metfora com um dos versos de Juvenal, instaurando, no recontar de
Borges, um territrio maior que o contido pela geografia, um sabor de stira ao
360
Ibid., p.580.
Ibid., p.580-581.
362
SARLO, Beatriz. Borges, un escritor en las orillas. Buenos Aires: Compaia Editora Espasa Calpe Argentina
S.A/Ariel, 1995, p.192.
363
BORGES, Jorge Lus. El hombre en el umbral. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras Completas
1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p.612-616.
364
Ibid., p.612.
361
200
201
reinante no conto, entre Sikhs e muulmanos, como uma vitria do novo juiz,
que sendo escocs tambm um marginalizado do mundo britnico. Estranha-se
quando Glencairn desaparece, repentina e completamente, mantendo-se o fato
em sigilo.
A partir desse acontecimento, Borges elabora uma representao do
mundo oriental pela ndia, j a partir do provrbio: la India es ms grande que el
mundo369. Com a metfora ultra auroram et gangem, Borges inclui e extrapola os
limites indianos para narrar algo til para o mundo, unindo as duas metades,
oriente e ocidente, nessa parbola acerca da justia.
De um lado, comea a haver, pelos colonizadores, uma investigao
policial para descobrir o paradeiro de Glencairn. Por outro, defronta-se com a
rede intrincada e solidria das pessoas nativas, que negam qualquer informao
sobre o desaparecido. A cidade, como um imenso labirinto, guardava esse
segredo. Por meio de um envelope que continha algumas senhas, o narrador
chega a um bairro popular, humilde e apinhado de gente, onde encontra um
homem muito velho, encolhido no umbral. Ele se torna o fio que desembaraa a
trama, porque o avivamento da memria coletiva acerca de uma histria de
dominao e injustia.
El tiempo que se fue queda en la memoria; sin duda soy capaz de
recuperar lo que entonces pas.370. Retomando os tempos em que o general
John Nicholson (1822-1857) Nikal Seyn371, ainda era vivo, o velho fala sobre os
tempos de corrupo, de maldio, de enganos e de fraudes e a esperana de
todos com a chegada do novo juiz, que acabou se revelando da mesma ndole,
aniquilando a esperana que alguma vez havia despertado.
369
Id., p.612.
Ibid., p.614.
371
John Nicholson (general): (December 11, 1822 September 23, 1857) was a Victorian era military hero.
Born in Dublin, Ireland, Nicholson was an officer of the army of the British East India Company. He was
instrumental in the settlement of the North-West Frontier and played a legendary part in the Indian Mutiny. A
charismatic and authoritarian figure, Nicholson create a legend for himself as a Political Officer under Henry
Lawrence in the frontier provinces of the British Empire in India. Involved in the First Anglo Sikh War as a junior
officer, he was taken under the wing of Henry Lawrence along with several other similarly aged officers was
given much power as a political officer, and later a District Commissioner. He was feared for his foul temper
and authoritarian manner, but also gained respect of the Afghan tribes in the area for his fairhandedness and
sense of honour. He inspired the short lived cult of Nikal Seyn, despite the fact that he did not conceal his
distaste for Indians and even went as far as to have some of his worshippers imprisoned and whipped (none of
which shook the steadfastness of their devotion!) and inspired several contemporary sayings in Pakistan. He
was best known for his role in the Sepoy Mutiny where he gained immortality (in British Military circles at least)
planning and leading the Storming of Delhi where he was fatally wounded shortly afterwards in mopping up
operations. He became the Victorian Hero of Delhi inspiring books, ballads and generations of young boys to
join the army. Nicholson is referenced numerous literary works, including Rudyard Kiplings Kim, in which the
protagonist, Kim, meets an aged Subadar-Major. The man turns out to be a veteran of the Indian Mutiny, and
in his interaction with Kim, he is said to sing old song of Nikal Seyn before Delhi. He died in battle on
September 23, 1857. Disponvel em http://en.wikipedia.org/wiki/ John_Nicholson_(general). Acesso em 15 jul
2006.
370
202
Qual ser o fio possvel que possa unir tais contos, de modo a relacionlos entre si como um bloco narrativo? Ficam to entremeados e costurados entre
si, que se torna difcil considerar um deles como o possvel conto-moldura.
Todos eles refletem-se e reenviam-se, como uma intrincada rede de labirinto,
como diversos caminhos que cheguem a um mesmo lugar.
No conto La otra muerte, a histria de Pedro Damin revela que um
soldado acima de tudo, um homem, com suas fraquezas, temores e angstias.
Que dele, como soldado, se espera valentia. O que se percebe, porm, a
natureza ambivalente do ser humano, pondo em evidncia a fragilidade de uma
tica objetiva e universal. Talvez a agonia de Damin, durante os seus 40 anos
de vida ps-guerra, tenha sido a de uma espera, por um instante que pudesse
dar-lhe a dignidade como soldado ideal.
No conto La espera, no sabemos os motivos que levam a personagem
falso Villari a se esconder, a se sentir perseguido o tempo todo. Se, entendido
o conto como um sonho ou um pesadelo, por que no considerar este conto
como o delrio causado pela febre de Damin, ou um delrio de ex-combatente?
Tambm que, caso este falso Villari assumisse os seus erros, ou crimes, diante
da justia, que no sabemos o que seja- o que poderia lhe acontecer? Uma vez
capturado e levado a julgamento, o que pode ser uma hiptese,
372
373
ser que
203
haveria outro desfecho que a no condenao morte? Este falso Villari tambm
poderia ser Otto zur Linde, de Deutsches Rquiem, visto que ele manca, e que
se mostra como uma outra sada para pr fim perseguio, j julgado e
condenado, espera do minuto derradeiro.
Nessa ambigidade moral, relativa e complexa da natureza humana de
quem no nem heri e nem covarde, nem mocinho e nem bandido, nem anjo
nem demnio, nem vencedor nem vencido, vlido para Oriente e para Ocidente,
Borges apimenta o caldo da justia ou da injustia incluindo uma narrativa sobre
o que a tica consideraria inquestionvel: um juiz louco para julgar um juiz
corrupto. Assim, em El hombre en el umbral, o que julgou julgado, o que
condenou condenado, porque prevalece a loucura, como dbil limite entre o Eu
e o Outro, ou o Mesmo.
Apostando no tempo futuro, para julgar os acontecimentos do presente,
como diz Otto acerca das figuras histricas, que nunca imaginaram o grau de
importncia dos fatos para a posteridade, preciso tambm no esquecer de que
somos feitos de passado. Embora a histria habitual [seja], de fato, a
comemorao das faanhas dos vencedores, a apologia que tende a recobrir
os momentos revolucionrios do curso da histria374, um discurso de dominao
e de legitimao do poder, resta arte expressar a voz dos marginalizados, dos
excludos, dos derrotados, dos fora da histria, de modo a registrar a memria
de todo o sofrimento acumulado.
Mesmo que todas as personagens desse conjunto narrativo estejam ou
tenham vivido momentos cruis de guerra, e todas enfrentem uma batalha
ntima, cada qual com a sua razo de existncia, cada uma se debatendo entre
ser heri e ser covarde, entre se manter na Memria ou se perder no anonimato,
todas elas desenham o traado do Mesmo Homem de sempre, j um co-lobo,
repetindo a mesma histria de um outro jeito, refazendo a Vida de um certo
modo, ampliando o horizonte interno de si mesmo, como a esfera minscula de
um aleph.
374
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Histria e Cesura. In Histria e narrao em Walter Benjamin. So Paulo:
Perspectiva, 1999, p.99.
204
BORGES, Jorge Lus. El Inmortal. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges. Obras completas 1:1923-1949. 2
ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 533-544.
205
376
CERVERA SALINAS, Vicente. Las horas y los siglos Borges. In Borges studies on line. On line. J. L. Borges
Center for Studies & Documentation. Disponvel em http://www.uiowa.edu/borges/bsol/cerver.shtml Acesso em
31 jul 2006.
377
Salomo diz: No h nada de novo sobre a terra. Tanto quanto Plato tinha a imaginao de que todo
conhecimento seno recordao, do mesmo modo Salomo sentenciou que toda novidade no seno
esquecimento Traduo nossa. In BORGES, Jorge Lus. El Inmortal. In El Aleph (1949). In Jorge Luis Borges.
Obras completas 1:1923-1949. 2 ed., 14 reimpresin. Buenos Aires: Emec, 2002, p. 533.
206
rios
diferentes.
Resulta que, ao final, a nica esperana humana admitir a morte como o
limite necessrio condio da espcie humana, de reconhecer-se, como sendo
mortal, que a imortalizao humana se d pela palavra.
3.9.1. El Inmortal.
reescritura
de
uma
traduo,
passvel
de
muitas
outras
verses,
207
do Oriente,
Marco Flamnio
208
Cidade dos Imortais. En Roma, convers con filsofos que sintieron que dilatar
la vida de los hombres era dilatar su agona y multiplicar el nmero de sus
muertes. Ignoro se cre alguna vez en la Ciudad de los Inmortales: pienso que
entonces me bast la tarea de buscarla.380 Vencido pela curiosidade e pela falta
de guerra, organiza uma expedio, e parte.
H grandes complicaes no percurso, como deseres, motins e tentativa
de assassinato dele. Uma vez ferido, o protagonista deixa-se levar ao acaso pelo
cavalo, atingindo o objetivo de sua aventura. Bebe de um riacho de guas
escuras, e torna-se imortal, sem o saber.
arquitetura catica, e quanto sada dali, nem se recorda como ocorreu (talvez
para poder parecer novo ao recontar). Nessa aventura, acompanhado por dois
ou trs trogloditas.
209
esquecendo-se de morar nela, como sendo algo concreto e vo: marca una etapa
en que, juzgando que toda empresa es vana, determinaron vivir en el
pensamiento, en la pura especulacin.381 H uma maldio em ser
imortal.
Ser inmortal es balad; menos el hombre, todas las criaturas lo son, pues
ignoran la muerte; lo divino, lo terrible, lo incomprensible, es saberse
inmortal. ...
La muerte (o su alusin) hace preciosos y patticos a los hombres. stos
conmueven por su condicin de fantasmas; cada acto que ejecutan puede
ser ltimo; no hay rostro que no est por desdibujarse como el rostro de
un sueo. Todo, entre los mortales, tiene el valor de lo irrecuperable y de
lo azaroso. Entre los Inmortales, en cambio, cada acto (y cada
pensamiento) es el eco de otros que en el pasado lo antecedieron, sin
principio visible, o el presagio de otros que en el futuro lo repetirn hasta
el vrtigo. No hay cosa que no est como perdida entre infatigables
espejos. Nada puede ocurrir una sola vez, nada es preciosamente
precario. Lo elegaco, loo grave, lo ceremonial, no rigen para los
Inmortales.382
381
382
Ibid., p. 540.
Ibid., p. 540-542.
210
3.9.2
da
condio
humana
quanto
sua
finitude,
transitoriedade
383
HUICI, Adrin. Hacia el centro del ddalo. In El mito clsico en la obra de Jorge Luis Borges. El laberinto.
Sevilla: Alfar, 1998, p. 231.
384
Ibid., p. 167-168.
211
das
deslocamentos
Noites,
so
como
Cidade
de
fictcios
transpostos
Bronze,
cujos
literariamente
episdios
para
ou
real,
212
CERVERA SALINAS, Vicente. Las horas y los siglos Borges. IN Borges studies on line. On line. J. L. Borges
Center for Studies & Documentation. Disponvel em http://www.uiowa.edu/borges/bsol/cerver.shtml Acesso em
31 jul 2006 .
213
386
214
387
HUICI, Adrin. Hacia el centro del ddalo. In El Mito Clsico en la Obra de Jorge Luis Borges. El laberinto.
Sevilla: Alfar, 1998, p. 239.
215
O Livro das mil e uma noites, um dos textos mais apropriados pelo
Ocidente, atuou em escritores de escolas e orientaes diferentes, muitas vezes
at mesmo contrrios entre si. Encontram-se indcios dos textos das Noites em
Shakespeare, Voltaire, Proust, Wordsworth, Joyce, Poe, Whitman, Coleridge,
Thackeray, Stevenson, Conrad, Wells, Yeats, e... Borges, para chegarmos onde
queremos.
Nesse trabalho de tese, propusemo-nos afirmar que a potica narrativa de
Borges tem indcios de apropriaes de elementos poticos arabizantes, j
amalgamados e combinados de longa data, desde a Pennsula Ibrica. No se
trata de afirmar, ento, que a potica rabe se revela nele tal e qual ela se
apresenta, embora em Borges tudo seja dissimulao, mas que no processo de
incorporao e de reconstruo do Livro das mil e uma noites, graas ao prprio
conceito de leitura de Borges, como reescritura, ficam includos elementos de
uma cultura arabizante como parte de construo da intrincada potica
borgeana.
O Livro das mil e uma noites corresponde a um texto cultural de extrema
movncia, como um texto nmade, por transitar com facilidade entre culturas,
entre lugares e tempos dos mais variados. Mesmo que haja a aura das Noites
no serem reconhecidas como o paradigma cannico da potica rabe, ainda
assim consubstancial o reflexo de um fazer potico beduno, talvez com indcios
dos poemas qasdas. Borges, fundado na cultura anglo-saxnica e herdeiro dela,
tambm transita por culturas diversas, indo e vindo no tempo, identificando-se
como uma biblioteca viva da cultura universal, feita pelo labirinto intertextual de
textos que levam a outros textos, revelando e incluindo a arabizao presente
na Amrica Latina, para onde convergiram a combinao cultural de longa data e
distncia.
sabido que a erudio de Borges sobre o oriente provm de leituras de
livros europeus, e especialmente pela traduo do Livro das mil e uma noites. Ao
combinar as diversas tradies culturais, quer do ocidente quer do oriente,
216
na
organizao
em
histrias-molduras
emolduradas
que
so
217
refletidas,
espelhamento,
multiplicaes
ilimitadas,
tradues,
218
Ibid. p.97
219
392
Escritura andrgina, podemos escrever: o discurso da lei e do desejo coexistem ali, podendo exprimir ali
seus conflitos e suas contradies. Irredutivelmente atados um ao outro para se combater, eles encontraram no
conto o lugar por excelncia para ser o campo de batalha. Cherazade recupera assim sua verdadeira funo:
ela a guardi do lugar. Ela afronta a morte no para salvar sua cabea, mas para guardar a palavra. Por
certo, ela no representa as mulheres, mas todo ser de desejo. Traduo nossa. BENCHEIKH, Jamel Eddine.
Les Mille et Une Nuits ou la parole prisonnire. Paris: Gallimard, 1988, p.36.
220
volta para si mesma para recriar, com suas prprias cinzas, uma nova
maneira de escrever; uma fnix, oh, no muito freqente.393
393
394
221
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
Sobre BORGES.
ABAD, Jose M. Cuesta. Ficciones de una crisis. Potica e interpretacin en
Borges. Madrid: Gredos, 1995.
AEDO FUENTES, Maria Teresa. Borges y Emma Zunz postulando realidades. In
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=S0717-68482000002500004&lng=es&nrm=iso>. ISSN 0717-6848. 05 junho
2006.
ALAZRAKI, Jaime. La prosa narrativa de Jorge Luis Borges. Temas Estilo.
Madrid: Gredos, 1968.
______. Jorge Luis Borges. Edicion de Jaime Alazraki. Madrid: Taurus, 1976.
reimpresso de 1987.
______. Versiones. Inversiones. Reversiones. El espejo como modelo estructural
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NGELO, Andra Lcia Paiva Padro (UFSC). Borges e o conto policial:
Abenjacn, el Bojar, muerto em su laberinto. In Interletras - Revista
Transdisciplinar de Letras, educao e Cultura da UNIGRAN-MS. Dourados/MS.
V.1, n.5, jul/dez. 2006. ISSN 1807- 1597. Disponvel em http://www.unigran
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232
233
ANEXOS.
Anexo 1:
Supplemental Nights Volume 2
395
I overtravelled whileome lands and climes and towns and visited the cities of high
renown and traversed the ways of dangers and hardships. Towards the last of my life, I
entered a city of the cities of China wherein was a king of the Chosros and the Tobbas
and the C sars. Now that city had been peopled with its inhabitants by means of justice
and equity; but its then king was a tyrant dire who despoiled lives and souls at his
desire; in fine, there was no warming oneself at his fire for that indeed he oppressed the
believing band and wasted the eland. Now he had a younger brother, who was king in
Sarmarkand of the Persians, and the two kings sojourned a while of time, each in his own
city and stead, till they yearned unto each other and the elder king despatched his Wazir
to fetch his younger brother. When the Minister came to the King of Samarkand and
acquainted him with his errand, he submitted himself to the bidding of his brother and
answered, To hear is to obey. Then he equipped himself and made ready for wayfare
and brought forth his tents and pavilions. A while after midnight, he went in to his wife,
that he might farewell her, and found her with a strange man, lying by her in one bed.
So he slew them both and dragging them out by the feet, cast them away and set forth
on his march. When he came to his brothers court, the elder king rejoiced in him with
joy exceeding and lodged him in the pavilion of hospitality beside his own palace. Now
this pavilion overlooked a flower-garden belonging to the elder brother and there the
younger abode with him some days. Then he called to mind that which his wife had done
with him and remembered her slaughter and bethought him how he was a king, yet was
not exempt from the shifts of Time; and affected him with exceeding affect, so that it
drave him to abstain from meat and drink, or, if he ate anything, it profited him naught.
When his brother saw him on such wise, he deemed that this had betided him by
reason of severance from his folk and family, and said to him, Come, let us fare forth acoursing and a-hunting. But he refused to go with him; so the elder brother went to the
chase, while the younger abode in the pavilion aforesaid. Now, as he was diverting
himself by looking out upon the flower-garden from the latticed window of the palace,
behold, he saw his brothers wife and with her ten black slaves and ten slave-girls. Each
slave laid hold of a damsel and another slave came forth and did the like with the queen;
and when they had their wills one of other they all returned whence they came. Hereat
there betided the King of Samarkand exceeding surprise and solace and he was made
whole of his malady, little by little. After a few days, his brother returned, and finding
him cured of his complaint, said to him, Tell me, O my brother, what was the cause of
thy sickness and thy pallor, and what is the reason of the return of health to thee and of
rosiness to thy face after this? So he acquainted him with the whole case and this was
grievous to him; but they hid their affair and agreed to leave the kingship and fare forth
a-pilgrimaging and adventuring at hap-hazard, for they deemed that there had befallen
none the like of what had befallen them. Accordingly, they went forth and as they
journeyed, they saw by the way a woman imprisoned in seven chests, whereon were five
395
Disponvel em:
234
padlocks, and sunken deep in the midst of the salt sea, under the guardianship of an
Ifrit; yet for all this that woman issued out of the ocean and opened those padlocks and
coming forth of those chests, did what she would with the two brothers, after she had
practised upon the Ifrit. When the two kings saw that womans fashion and how she
circumvented the Ifrit, who had lodged her in the abyss of the main, they turned back to
their kingdoms and the younger betook himself to Samarkand, whilst the elder returned
to China and contrived for himself a custom in the slaughter of damsels, which was, his
Wazir used to bring him every night a girl, with whom he lay that night, and when he
arose in the morning, he gave her to the Minister and bade him do her die. After this
fashion he abode a long time, and the commons cried out by reason of that grievous
affair into which they were fallen and feared the wrath of Allah Almighty, dreading lest
He destroy them by means of this. still the king persisted in that practice and in his
blameworthy intent of the killing of damsels and the despoilment of maidens concealed
by veils, wherefore the girls sought succor of the Lord of All-might, and complained to
Him of the tyranny of the eking and of his oppression. Now the kings Wazir had two
daughters, sisters german, the elder of whom had read the books and made herself
mistress of the sciences and studied the writings of the sages and the stories of the cupcompanions, and she was a maiden of abundant lore and knowledge galore and wit than
which naught can be more. She heard that which the folk suffered from that king in his
misuage of their children; whereupon ruth for them gat hold of her and jealousy and she
besought Allah Almighty that He would bring the king to renounce that his new accursed
custom, and the Lord answered her prayer. Then she consulted her younger sister and
said to her, I mean to devise a device for freeing the children of folk; to wit, I will go up
to the king and offer myself to marry him, and when I come to his presence, I will send
to fetch thee. When thou comest in to me and the king had his carnal will of me, do thou
say to me, O my sister, let me hear a story of thy goodly stories, wherewith we may
beguile the waking hours of our night, till the dawn, when we take leave of each other;
and let the king hear it likewise! The other replied, Tis well; forsure this contrivance
will deter the king from this innovation he practiseth and thou shalt be requited with
favour exceeding and recompense abounding in the world to come, for that indeed thou
perilest thy life and wilt either perish or win to thy wish. So she did this and Fortune
favoured her and the Divine direction was vouchsafed to her and she discovered her
design to her sire, the Wazir, who thereupon forbade her, fearing her slaughter.
However, she repeated her words to him a second time and a third, but he
consented not. Then he cited to her a parable, which should deter her, and she cited to
him a parable of import contrary to his, and the debate was prolonged between them and
the adducing of instances, till her father saw that he was powerless to turn her from her
purpose and she said to him, There is no help but that I marry the King, so haply I may
be a sacrifice for the children of the Moslems: either I shall turn him from this his heresy
or I shall die. When the Minister despaired of dissuading her, he went up to the king
and acquainted him with the case, saying, I have a maiden daughter and she desireth to
give herself in free gift to the King. Quoth the King, How can thy soul consent to this,
seeing that thou knowest I abide but a single night with a girl and when I arise on the
morrow, I do her dead, and tis thou who slayest her, and again and again thou hast
done this? Quoth the Wazir, Know, O king, that I have set forth all this to her, yet
consented she not to aught, but needs must she have thy company and she chooseth to
come to thee and present herself before thee, albeit I have cited to her the sayings of the
sages; but she hath answered me with more than that which I said to her and
contrariwise. Then quoth the king, Suffer her visit me this night and to-morrow
morning come thou and take her and kill her; and by Allah, an thou slay her not, I will
slay thee and her also! the Minister obeyed the kings bidding and going out from the
presence returned home. When it was night, he took his elder daughter and carried her
up to the king; and when she came before him she wept; whereupon he asked her,
What causeth thee to weep? Indeed, twas thou who willedst this. She answered, I
weep not but of longing after my little sister; for that, since we grew up, I and she, I
have never been parted from her till this day; so, an it please the King to send for her,
that I may look on her, and listen to her speech and take my fill of her till the morning,
235
this were a boon and an act of kindness of the King. So he bade fetch the damsel and
she came. Then there befel that which befel of his union with the elder sister, and when
he went up to his couch, that he might sleep, the younger sister said to her elder, Allah
upon thee, O my sister, an thou be not asleep, tell us a tale of thy goodly tales,
wherewith me may beguile the watches of our night, ere day dawn and parting. Said
she, With love and gladness; and fell to relating to her, whilst the king listened. Her
story was goodly and delectable, and whilst she was in the middle of telling it, the dawn
brake. Now the kings heart clave to the hearing of the rest of the story; so he respited
her till the morrow; and, when it was the next night, she told him a tale concerning the
marvels of the land and the wonders of Allahs creatures which was yet stranger and
rarer than the first. In the midst of the recital, appeared the day and she was silent from
the permitted say. So he let her live till the following night, that he might hear the end
of the history and after that slay her. On this wise it fortuned with her; but as regards
the people of the city, they rejoiced and were glad and blessed the Wazirs daughters,
marvelling for that three days had passed and that the king had not put his bride to
death and exulting in that he had returned to the ways of righteousness and would never
again burthen himself with blood-guilt against any of the maidens of the city. Then, on
the fourth night, she related to him a still more extraordinary adventure, and on the fifth
night she told him anecdotes of Kings and Wazirs and Notables. Brief, she ceased not to
entertain him many days and nights, while the king said to himself, Whenas I shall have
heard the end of the tale, I will do her die, and the people redoubled their marvel and
admiration. Also, the folk of the circuits and cities heard of this thing, to wit, that the
king had turned from his custom and from that which he had imposed upon himself and
had renounced his heresy, wherefor they rejoiced and the lieges returned to the capital
and took up there abode therein, after they had departed thence; and they were
constant in prayer to Allah Almighty that He would stablish the king in his present stead.
And this, said Shahrazad, is the end of that which my friend related to me. Quoth
Shahryar, O Shahrazad, finish for us the tale thy friend told thee, inasmuch as it
resembleth the story of a King whom I knew; but fain would I hear that which betided
the people of this city and what they said of the affair of the King, so I may return from
the case wherein I was. She replied, With love and gladness! Know, O auspicious
king and lord of right rede and praiseworthy meed and prowest of deed, that, when the
folk heard how the king had put away from him his malpractice and returned from his
unrighteous wont, they rejoiced in this with joy exceeding and offered up prayers for
him. Then they talked one with other of the cause of the slaughter of the maidens, and
the wise said, Women are not all alike, nor are the fingers of the hand alike. Now when
King Shahryar heard this story he came to himself and awakening from his drunkenness,
said, By Allah, this story is my story and this case is my case, for that indeed I was in
reprobation and danger of judgment till thou turnedst me back from this into the right
way, extolled be the Causer of causes and the Liberator of necks! presently adding,
Indeed, O Shahrazad, thou hast awakened me to many things and hast aroused me
from mine ignorance of the right. Then said she to him, O chief of the kings, the wise
say, The kingship is a building, whereof the troops are the base, and when the
foundation is strong, the building endureth; wherefore it behoveth the king to
strengthen the foundation, for that they say, Whenas the base is weak, the building
falleth. In like fashion it befitteth the king to care for his troops and do justice among
his lieges, even as the owner of the garden careth for his trees and cutteth away the
weeds that have no profit in them; and so it befitteth the king to look into the affairs of
his Ryots and fend off oppression from them. As for thee, O king, it behoveth thee that
thy Wazir be virtuous and experienced in the requirements of the people and the
peasantry; and indeed Allah the Most High hath named his name in the history of Musa
(on whom be the Peace!) when he saith, And make me a Wazir of my people, Aaron.
Now could a Wazir have been dispensed withal, Moses son of Imran had been
worthier than any to do without a Minister. As for the Wazir, the Sultan discovereth unto
him his affairs, private and public; and know, O king, that the likeness of thee with the
people is that of the leach with the sick man; and the essential condition of the Minister
is that he be soothfast in his sayings, reliable in all his relations, rich in ruth for the folk
236
and in tenderness of transacting with them. Verily, it is said, O king, that good troops
be like the druggist; if his perfumes reach thee not, thou still smellest the fragrance of
them; and bad entourage be like the blacksmith; if his sparks burn thee not, thou
smellest his evil smell. So it befitteth thee to take to thyself a virtuous Wazir, a
veracious counsellor, even as thou takest unto thee a wife displayed before thy face,
because thou needest the mans righteousness for thine own right directing, seeing that,
if thou do righteously, the commons will do right, and if thou do wrongously, they will
also do wrong. When the King heard this, drowsiness overcame him and he slept and
presently awaking, called for the candles; so they were lighted and he sat down on his
couch and seating Shahrazad by him, smiled in her face. She kissed the ground before
him and said, O king of the age and lord of the time and the years, extolled be the
Forgiving, the Bountiful, who hath sent me to thee, of His grace and good favour, so I
have incited thee to longing after Paradise; for verily this which thou wast wont do was
never done of any of the kings before thee. then laud be to the Lord who hath directed
thee into the right way, and who from the paths of frowardness hath diverted thee! as
for women, Allah Almighty maketh mention of them also when He saith in His Holy Book,
Truly, the men who resign themselves to Allah and the women who resign themselves,
and the true-believing men and the true-believing women and the devout men and the
devout women and truthful men and truthful women, and long-suffering men and longsuffering women, and the humble men and the humble women, and charitable men and
charitable women, and the men who fast and the women who fast, and men who guard
their privities and women who guard their privities, and men who are constantly mindful
of Allah and women who are constantly mindful, for them Allah hath prepared
forgiveness and a rich reward. as for that which hath befallen thee, verily, it hath
befallen many kings before thee and their women have falsed them, for all they were
more majestical of puissance than thou, and mightier of kingship and had troops more
manifold. If I would, I could relate to thee, O king, concerning the wiles of women, that
whereof I should not make an end all my life long; and indeed, in all these my nights
that I have passed before thee, I have told thee many tales of the wheedling of women
and of their craft; but soothly the things abound on me; so, an thou please, O king, I will
relate to thee somewhat of that which befel olden kings of perfidy from their women and
of the calamities which overtook them by reason of these deceivers." Asked the king,
How so? Tell on; and she answered, Hearkening and obedience. It hath been told me,
O king, that a man once related to a company the followingtale:
237
Anexo 2:
Nights 566578
396
THERE was, in olden time, and in an ancient age and period, in Damascus of
Syria, a King, one of the Khalifehs, named Abd-el-Melik the son of Marwan; and he was
sitting, one day, having with him the great men of his empire, consisting of Kings and
Sultans, when a discussion took place among them, respecting the traditions of former
nations. They called to mind the stories of our lord Suleyman the son of Daud (on both
of whom be peace!), and the dominion and authority which God (whose name be
exalted!) had bestowed upon him over mankind and the Jinn and the birds and the wild
beasts and other things; and they said, We have heard from those who were before us
that God (whose perfection be extolled, and whose name be exalted!) bestowed not
upon any one the like of that which He bestowed upon our lord Suleyman, and that he
attained to that to which none other attained, so that he used to imprison the Jinn and
the Marids and the Devils in bottles of brass, and pour molten lead over them, and seal
this cover over them with a signet.
Then Talib [the son of Sahl] related, that a man embarked in a ship with a
company of others, and they voyaged to the island of Sicily, and ceased not in their
course until there arose against them a wind which bore them away to one of the lands
of God, whose name be exalted! This happened during the black darkness of night, and
when the day shone forth, there came out to them, from caves in that land, people of
black complexion and with naked bodies, like wild beasts, not understanding speech.
They had a King of their own race, and none of them knew Arabic save their King. So
when they saw the ship and those who were in her, he came forth to them attended by
a party of his companions, and saluted them and welcomed them, and inquired of them
respecting their religion. They therefore acquainted him with their state; and he said to
them, No harm shall befall you. And when he asked them respecting their religion, each
of them was of some one of the religions prevailing before the manifestation of ElIslam, and before the mission of Mohammad, may God bless and save him!wherefore
the people of the ship said, We know not what thou sayest. Then the King said to them,
There hath not come to us any one of the sons of Adam before you. And he entertained
them with a banquet of the flesh of birds and of wild beasts and of fish, beside which
they had no food. And after this, the people of the ship went down to divert themselves
in the city, and they found one of the fishermen who had cast his net in the sea to catch
fish, and he drew it up, and lo, in it was a bottle of brass, stopped with lead, which was
sealed with the signet of Suleyman the son of Daud, on both of whom be peace! And
the fisherman came forth and broke it; whereupon there proceeded from it a blue
smoke, which united with the clouds of heaven; and they heard a horrible voice, saying,
Repentance! repentance! O Prophet of God!Then, of that smoke there was formed a
person of terrible aspect, of terrific make, whose head would reach [as high as] a
mountain; and he disappeared from before their eyes. As to the people of the ship, their
hearts were almost eradicated; but the blacks thought nothing of the event. And a man
returned to the King, and asked him respecting this; and the King answered him, Know
that this is one of the Jinn whom Suleyman the son of Daud, when he was incensed
against them, imprisoned in these bottles, and he poured lead over them, and threw
them into the sea. When the fishermen casteth his net, it generally bringeth up these
bottles; and when they are broken, there cometh forth from them a Jinni, who
imagineth that Suleyman is still living; wherefore he repenteth, and saith, Repentance!
O Prophet of God!
396
238
And the Prince of the Faithful, Abd-el-Melik the son of Marwan, wondered at
these words, and said, Extolled be the perfection of God! Suleyman was endowed with a
mighty dominion!And among those who were present in that assembly was EnNabighah Edh-Dhubyani; 1 and he said, Talib hath spoken truth in that which he hath
related, and the proof of his veracity is the saying of the Wise, the First, [thus
versified]
And [consider] Suleyman, when the Deity said to him, Perform the office of
Khalifeh, and govern with diligence;
And whoso obeyeth thee, honour him for doing so; and whoso disobeyeth thee,
imprison him forever.
He used to put them into bottles of brass, and to cast them into the sea.And the
Prince of the Faithful approved of these words, and said, By Allah, I desire to see some
of these bottles! So Talib the son of Sahl replied, O Prince of the Faithful, thou art able
to do so, and yet remain in thy country. Send to thy brother Abd-el-Aziz, the son of
Marwan, desiring him to bring them to thee from the Western country, 2 that he may
write orders to Musa 3 to journey from the Western Country to this mountain which we
have mentioned, and to bring thee what thou desirest of these bottles; for the furthest
tract of his province is adjacent to this mountain.And the Prince of the Faithful
approved of his advice, and said, O Talib, thou hast spoken truth in that which thou hast
said, and I desire that thou be my messenger to Musa the son of Nuseyr for this
purpose, and thou shalt have a white ensign, together with what thou shalt desire of
wealth or dignity or other things, and I will be thy substitute to take care of thy family.
To this, Talib replied, Most willingly, O Prince of the Faithful. And the Khalifeh said to
him, Go in dependence on the blessing of God, and his aid. Then he gave orders that
they should write for him a letter to his brother Abd-el-Aziz, his viceroy in Egypt, and
another letter to Musa, his viceroy in the Western Country, commanding him to journey,
himself, in search of the bottles of Suleyman, to leave his son to govern the country in
his stead, and to take with him guides, to expand wealth, and to collect a large number
of men, and not to be remiss in accomplishing that object, nor to use any pretext to
excuse himself. He sealed the two letters, and delivered them to Talib the son of Sahl,
commanding him to hasten, and to elevate the ensigns over his head; and he gave him
riches and riders and footmen to aid him in his way: he gave orders also to supply his
house with every thing requisite.
So Talib went forth on his way to Egypt. He proceeded with his companions,
traversing the districts from Syria, until they entered Misr; 4 when the Governor of
Egypt met him, and lodged him with him; and he treated him with the utmost honour
during the period of his stay with him. Then he sent with him a guide who accompanied
him to Upper Egypt until they came to the Emir Musa the son of Nuseyr; and when he
knew of his approach, he went forth to him and met him, and rejoiced at his arrival;
and Talib handed to him the letter. So he took it and read it and understood its
meaning; and he put it upon his head saying, I hear and obey the command of the
Prince of the Faithful. He determined to summon the great men; and they presented
themselves; and he inquired of them respecting that which had been made known to
him by the letter; whereupon they said, O Emir, if thou desire him who will guide thee
to that place, have recourse to the sheykh Abd-Es-Samad the son of Abd-el-Kuddus ElMasmudi; for he is a knowing man, and hath travelled much, and he is acquainted with
the deserts and wastes and the seas, and their inhabitants and their wonders, and the
countries and their districts. Have recourse therefore to him, and he will direct thee to
the object of thy desire. Accordingly he gave orders to bring him, and he came before
him; and, lo, he was a very old man, whom the vicissitudes of years and times had
rendered decrepit. The Emir Musa saluted him, and said to him, O sheykh Abd-EsSamad, our lord the Prince of the Faithful, Abd-El-Melik the son of Marwan, hath
commanded us thus and thus, and I possess little knowledge of that land, and it hath
been told me that thou art acquainted with that country and the routes. Hast thou then
a wish to accomplish the affair of the Prince of the Faithful?The sheykh replied, Know,
O Emir, that this route is difficult, far extending, with few tracks. The Emir said to him,
239
How long a period doth it require? He answered, It is a journey of two years and some
months going, and the like returning; and on the way are difficulties and horrors, and
extraordinary and wonderful things. Moreover, thou art a warrior for the defence of the
faith, and our country is near unto the enemy; so perhaps the Christians may come
forth during our absence: it is expedient therefore that thou leave in thy province one to
govern it.He replied, Well. And he left his son Harun as his substitute in his province,
exacted an oath of fidelity to him, and commanded the troops that they should not
oppose him, but obey him in all that he should order them to do. And they heard his
words, and obeyed him. His son Harun was of great courage, an illustrious hero, and a
bold champion; and the sheykh Abd-Es-Samad pretended to him that the place in
which were the things that the Prince of the Faithful desired was four months journey
distant, on the shore of the sea, and that throughout the whole route were haltingplaces adjacent one to another, and grass and springs. And he said, God will assuredly
make this affair easy to us through the blessing attendant upon thee, O Viceroy of the
Prince of the Faithful. Then the Emir Musa said, Knowest thou if any one of the Kings
have trodden this land before us? He answered him, Yes, O Emir; this land belonged to
the King of Alexandria, Darius the Greek.
After this they departed, and they continued their journey until they arrived at a
palace; whereupon the sheykh said, Advance with us to this palace, which presenteth a
lesson to him who will be admonished. So the Emir Musa advanced thither, together
with the sheykh Abd-Es-Samad and his chief companions, till they came to its entrance.
And they found it open, and having lofty angles, and steps, among which were two wide
steps of coloured marbles, the like of which hath not been seen; the ceilings and walls
were decorated with gold and silver and minerals, and over the entrance was a slab,
whereon was an inscription in ancient Greek; and the sheykh Abd-Es-Samad said, Shall
I read it, O Emir? The Emir answered, Advance and read. May God bless thee! for
nought hath happened to us during this journey but what hath been the result of the
blessing attendant upon thee.So he read it; and, lo, it was poetry; and it was this:
Here was a people whom, after their works, thou shalt see wept over for their
lost dominion;
And in this palace is the last information respecting lords collected in the dust.
Death hath destroyed them and disunited them, and in the dust they have lost
what they amassed;
As though they had only put down their loads to rest a while; quickly have they
departed!
And the Emir Musa wept until he became insensible, and he said, There is no
deity but God, the Living, the Enduring without failure! He then entered the palace, and
was confounded by its beauty and its construction; and he looked at the figures and
images that it contained. And, lo, over the second door were inscribed some verses. So
the Emir Musa said, Advance, O sheykh, and read. Accordingly he advanced and read;
and the verses were these:
How many companies have alighted in the tabernacles since times of old, and
taken their departure!
Consider thou then what the accidents of fortune have done with others when
they have befallen them.
They have shared together what they collected, and they have left the pleasure
thereof, and departed.
What enjoyments they had! and what food did they eat! and then in the dust
they themselves were eaten!
And again the Emir Musa wept violently: the world became yellow before his face;
and he said, We have been created for a great object!
Then they attentively viewed the palace; and, lo, it was devoid of inhabitants,
destitute of household and occupants: its courts were desolate, and its apartments were
deserted; and in the midst of it was a chamber covered with a lofty dome, rising high
240
into the air, around which were four hundred tombs. To these tombs the Emir Musa
drew near, and, behold, among them was a tomb constructed of marble, whereupon
were engraved these verses:
How often have I stood [in fight]! and how often slain! and to how many things
have I been a witness!
And how often have I eaten! and how often drunk! and how often have I heard
the songs of beauteous damsels!
And how often have I ordered! and how often forbidden! and how many strong
fortresses are seen,
Which I have besieged and searched, and from which I have taken the lovely
females ornaments!
But in my ignorance I transgressed to obtain things wished for, which proved at
last to be frail.
Then consider attentively thy case, O man, before thou shalt drink the cup of
death;
For after a little while shall the dust be poured upon thee, and thou wilt be
lifeless.
And the Emir Musa, and those who were with him, wept. Then he drew near to
the dome-crowned chamber, and, lo, it had eight doors of sandal-wood, with nails of
gold, ornamented with stars of silver set with various jewels. And over the first door
were inscribed these verses:
What I have left, I left not from generosity; but through the sentence and decree
operating upon man.
Long time I lived, happy and enraged, defending my asylum like a fierce lion.
I was never quiet, nor would I bestow a mustard-seed, by reason of my avarice,
though I were cast into the fire.
Thus did I until I was smitten by the decree of the glorious Deity, the Creator, the
Maker.
When my death was appointed soon to take place, I could not prevent it by my
numerous stratagems;
My troops that I had collected availed not, and none of my friends aided me, nor
my neighbour.
Throughout my whole life was I wearied in my journey to the grave, now in ease,
and now in difficulty.
So, when the purses have become laden, shouldst thou accumulate dinar upon
dinar,
It will all pass before the morning to another, and they will have brought thee a
camel-driver and a grave-digger;
And on the day of thy judgment, lone shalt thou meet God, laden with sin and
crimes and heavy burdens.
Then let not the world deceive thee with its beauty; but see what it hath done to
thy family and neighbour.
And when the Emir Musa heard these verses, he wept again so violently that he
became insensible; and after he had recovered, he entered the chamber covered with
the dome, and beheld in it a long tomb, of terrible appearance, whereon was a tablet of
iron of China; and the sheykh Abd-Es-Samad drew near to it, and read its inscription;
and, lo, on it was written,
In the name of God, the Eternal, the Everlasting throughout all ages; in the
name of God, who begetteth not, and who is not begotten, and unto whom there
is none like: in the name of God, the Mighty and Powerful: in the name of the
Living who dieth not.To proceed:O thou who arrivest at this place, be
admonished by the misfortunes and calamities that thou beholdest, and be not
deceived by the world and its beauty, and its falsity and calumny, and its fallacy
241
and finery; for it is a flatterer, a cheat, a traitor. Its things are borrowed, and it
will take the loan from the borrower: and it is like the confused visions of the
sleeper, and the dream of the dreamer, as though it were the sarab of the plain,
which the thirsty imagineth to be water: the Devil adorneth it for man until
death. These are the characteristics of the world: confide not therefore in it, nor
incline to it; for it will betray him who dependeth upon it, and who in his affairs
relieth upon it. Fall not in its snares, nor cling to its skirts. For I possessed four
thousand bay horses in a stable; and I married a thousand damsels, of the
daughters of Kings, high-bosomed virgins, like moons; and I was blessed with a
thousand children, like stern lions; and I lived a thousand years, happy in mind
and heart; and I amassed riches such as the Kings of the regions of the earth
were unable to procure, and I imagined that my enjoyments would continue
without failure. But I was not aware when there alighted among us the
terminator of delights and the separator of companions, the desolator of abodes
and the ravager of inhabited mansions, the destroyer of the great and the small
and the infants and the children and the mothers. We had resided in this palace
in security until the event decreed by the Lord of all creatures, the Lord of the
heavens and the Lord of the earths, befell us, and the thunder of the Manifest
Truth assailed us, and there died of us every day two, till a great company of us
had perished. So when I saw that destruction had entered our dwellings, and had
alighted among us, and drowned us in the sea of deaths, I summoned a writer,
and ordered him to write these verses and admonitions and lessons, and caused
them to be engraved upon these doors and tablets and tombs. I had an army
comprising a thousand thousand bridles, composed of hardy men, with spears,
and coats of mail, and sharp swords, and strong arms; and I ordered them to
clothe themselves with the long coats of mail, and to hang on the keen swords,
and to place in rest the terrible lances, and mount the highblooded horses.
Then, when the event appointed by the Lord of all creatures, the Lord of the
earth and the heavens, befell us, I said, O companies of troops and soldiers, can
ye prevent that which hath befallen me from the Mighty King? But the soldiers
and troops were unable to do so, and they said, How shall we contend against
Him from whom none hath secluded, the Lord of the door that hath no doorkeeper? So I said, Bring to me the wealth. (And it was contained in a thousand
pits, in each of which were a thousand hundredweights of red gold, and in them
were varieties of pearls and jewels, and there was the like quantity of white
silver, with treasures such as the Kings of the earth were unable to procure.) And
they did so; and when they had brought the wealth before me, I said to them,
Can ye deliver me by means of all these riches, and purchase for me therewith
one day during which I may remain alive? But they could not do so. They
resigned themselves to fate and destiny, and I submitted to God with patient
endurance of fate and affliction until He took my soul, and made me to dwell in
my grave. And if thou ask concerning my name, I am Kush the son of Sheddad
the son of Ad the Greater.
And upon the same tablet were also inscribed these verses:
Shouldst thou think upon me after the length of my age, and the vicissitudes of
days and circumstances,
I am the son of Sheddad, who held dominion over mankind and each tract of the
whole earth.
All the stubborn troops became abject unto me, and Esh-Sham from Misr unto
Adnan.
In glory I reigned, abasing their Kings, the people of the earth fearing my
dominion;
And I beheld the tribes and armies in my power, and saw the countries and their
inhabitants dread me.
When I mounted, I beheld my army comprising a million bridles upon neighing
242
steeds;
And I possessed wealth that could not be calculated, which I treasured up against
misfortunes,
Determining to devote the whole of my property for the purpose of extending the
term of my life.
But the Deity would nought save the execution of his purpose; and thus I became
separated from my brethren.
Death, the disuniter of mankind, came to me, and I was removed from grandeur
to the mansion of contempt;
And I found [the recompense of] all my past actions, for which I am pledged: for
I was sinful!
Then raise thyself, lest thou be upon a brink; and beware of calamities! Mayest
thou be led aright!
And again the Emir Musa wept until he became insensible, in considering the fates
of the people; after which, as they were going about through the different apartments
of the palace, and viewing attentively its chambers and its places of diversion, they
came to a table upon four legs of alabaster, whereon was inscribed,
Upon this table have eaten a thousand one-eyed Kings, and a thousand Kings
each sound in both eyes. All of them have quitted the world, and taken up their
abode in the burial-grounds and the graves.
And the Emir Musa wrote all this. Then he went forth, and took not with him from
the palace aught save the table.
The soldiers proceeded, with the sheykh Abd-Es-Samad before them shewing
them the way, until all the first day had passed, and the second, and the third. They
then came to a high hill, at which they looked, and, lo, upon it was a horseman of
brass, on the top of whose spear was a wide and glistening head that almost deprived
the beholder of sight, and on it was inscribed, O thou who comest up to me, if thou
know not the way that leadeth to the City of Brass, rub the hand of the horseman, and
he will turn, and then will stop, and in whatsoever direction he stoppeth, thither
proceed, without fear and without difficulty; for it will lead thee to the City of Brass.
And when the Emir Musa had rubbed the hand of the horseman, it turned like the
blinding lightning, and faced a different direction from that in which they were
travelling.
The party therefore turned thither and journeyed on, and it was the right way.
They took that route, and continued their course the same day and the next night until
they had traversed a wide tract of country. And as they were proceeding, one day, they
came to a pillar of black stone, wherein was a person sunk to his arm-pits, and he had
two huge wings, and four arms; two of them like those of the sons of Adam, and two
like the fore-legs of lions, with claws. He had hair upon his head like the tails of horses,
and two eyes like two burning coals, and he had a third eye, in his forehead, like the
eye of the lynx, from which there appeared sparks of fire. He was black and tall; and he
was crying out, Extolled be the perfection of my Lord, who hath appointed me this
severe affliction and painful torture until the day of resurrection! When the party beheld
him, their reason fled from them, and they were stupefied at the sight of his form, and
retreated in flight; and the Emir Musa said to the sheykh Abd-Es-Samad, What is this?
He answered, I know not what he is. And the Emir said, Draw near to him and
investigate his case: perhaps he will discover it, and perhaps thou wilt learn his history.
The sheykh Abd-Es-Samad replied, May God amend the state of the Emir! Verily we
fear him.Fear ye not, rejoined the Emir; for he is withheld from injuring you and
others by the state in which he is. So the sheykh Abd-Es-Samad drew near to him, and
said to him, O thou person, what is thy name, and what is thy nature, and what hath
placed thee here in this manner? And he answered him, As to me, I am an Efrit of the
Jinn, and my name is Dahish the son of El-Amash, and I am restrained here by the
majesty, confined by the power, [of God,] tormented as long as God (to whom be
243
ascribed might and glory!) willeth. Then the Emir Musa said, O sheykh Abd-Es-Samad,
ask him what is the cause of his confinement in this pillar. He therefore asked
respecting that, and the Efrit answered him, Verily my story is wonderful; and it is
this:
There belonged to one of the sons of Iblis an idol of red carnelian, of which I was
made guardian; and there used to worship it one of the Kings of the sea, of illustrious
dignity, of great glory, leading, among his troops of the Jann, a million warriors who
smote with swords before him, and who answered his prayer in cases of difficulty. These
Jann who obeyed him were under my command and authority, following my words
when I ordered them: all of them were in rebellion against Suleyman the son of Daud
(on both of whom be peace!); and I used to enter the body of the idol, and command
them and forbid them. Now the daughter of that King was a frequent adorer of the idol,
assiduous in the worship of it, and she was the handsomest of the people of her age,
endowed with beauty and loveliness, and elegance and perfection; and I described her
to Suleyman, on whom be peace!
So he sent to her father, saying to him, Marry to me thy daughter and break thy
carnelian-idol, and bear witness that there is no deity but God, and that Suleyman is
the Prophet of God. If thou do so, thy due shall be the same as our due, and thy debt
as our debt. But if thou refuse, I bring against thee forces with which thou hast not
power to contend: therefore prepare an answer to the question, 6 and put on the
garment of death; for I will come to thee with forces that shall fill the vacant region,
and leave thee like yesterday that hath passed.And when the messenger of Suleyman
(on whom be peace!) came to him, he was insolent and contumacious, and magnified
himself and was proud. Then he said to his wezirs, What say ye respecting the affair of
Suleyman the son of Daud? For he hath sent demanding my daughter, and
commanding me to break my carnelian-idol, and to adopt his faith.And they replied, O
great King, can Suleyman do unto thee that, when thou art in the midst of this vast
sea? If he come unto thee, he cannot prevail against thee; since the Marids of the Jinn
will fight on thy side; and thou shalt seek aid against him of thine idol that thou
worshippest; for he will aid thee against him and will defend thee. The right opinion is,
that thou consult thy lord (and they meant by him the red carnelian-idol), and hear
what will be his reply: if he counsel thee to fight him, fight him; but otherwise, do
not.And upon this the King went immediately, and, going in to his idol, after he had
offered a sacrifice and slain victims, fell down before it prostrate, and began to weep,
and to recite these verses:
O my lord, verily I know thy dignity; and, behold, Suleyman desireth to break
thee.
O my lord, verily I seek thy defence: command then; for I am obedient to thy
command.
(Then that Efrit, the half of whom was in the pillar, said to the sheykh Abd-EsSamad, while those around him listened,) And thereupon I entered the body of the idol,
by reason of my ignorance, and the paucity of my sense, and my solicitude respecting
the affair of Suleyman, and recited this couplet:
As for me, I am not in fear of him; for I am acquainted with everything.
If he wish to wage war with me, I will go forth, and I will snatch his soul from
him.
So when the King heard my reply to him, his heart was strengthened, and he
determined to wage war with Suleyman the Prophet of God (on whom be peace!) and to
fight against him. Accordingly, when the messenger of Suleyman came, he inflicted
upon him a painful beating, and returned him a shameful reply; and he sent to threaten
Suleyman, saying to him, by the messenger, Thy mind hath suggested to thee desires.
Dost thou threaten me with false words? Either come thou to me, or I will go to thee.
Then the messenger returned to Suleyman, and acquainted him with all that had
occurred and happened to him. And when the Prophet of God, Suleyman, heard that, [it
was as though] his resurrection took place; 7 his resolution was roused, and he
244
prepared his forces, consisting of Jinn and men, and wild beasts, and birds and reptiles.
He commanded his Wezir Ed-Dimiryat, the King of the Jinn, to collect the Marids of the
Jinn from every place: so he collected for him, of the Devils, six hundred millions. He
also commanded Asaf the son of Barkhiya [his Wezir of men] to collect his soldiers of
mankind; and their number was one million or more. He made ready the accoutrements
and weapons, and mounted, with his forces of the Jinn and of mankind, upon the
carpet, with the birds flying over his head, and the wild beasts beneath the carpet
marching, until he alighted upon his enemys coast, and surrounded his island, having
filled the land with the forces. He then sent to our King, saying to him, Behold, I have
arrived: therefore repel from thee that which hath come down, or else submit thyself to
my authority, and acknowledge my mission, and break thine idol, and worship the One,
the Adored God, and marry to me thy daughter according to law, and say thou, and
those who are with thee, I testify that there is no deity but God, and I testify that
Suleyman is the Prophet of God. If thou say that, peace and safety shall be thy lot. But
if thou refuse, thy defending thyself from me in this island shall not prevent thee: for
God (whose name be blessed and exalted!) hath commanded the wind to obey me, and
I will order it to convey me unto thee on the carpet, and will make thee an example to
restrain others.So the messenger came to him, and communicated to him the
message of the Prophet of God, Suleyman, on whom be peace! But the King said to
him, There is no way for the accomplishment of this thing that he requireth of me:
therefore inform him that I am coming forth unto him. Accordingly the messenger
returned to Suleyman, and gave him the reply. The King then sent to the people of his
country, and collected for himself, of the Jinn that were under his authority, a million;
and to these he added others, of the Marids and Devils that were in the islands of the
seas and on the tops of the mountains; after which he made ready his forces, and
opened the armouries, and distributed to them the weapons. And as the Prophet of God,
Suleyman (on whom be peace!), he disposed his troops, commanding the wild beasts to
form themselves into two divisions, on the right of the people and on their left, and
commanding the birds to be upon the islands. He ordered them also, when the assault
should be made, to tear out the eyes of their antagonists with their beaks, and to beat
their faces with their wings; and he ordered the wild beasts to tear in pieces their
horses; and they replied, We hear and obey God and thee, O Prophet of God! Then
Suleyman, the Prophet of God, set for himself a couch of alabaster adorned with jewels,
and plated with plates of red gold, and he placed his Wezir Asaf the son of Barkhiya on
the right side, and his Wezir Ed-Dimiryat on the left side, and the Kings of mankind on
his right, and the Kings of the Jinn on his left, and the wild beasts and the vipers and
serpents before him.
After this, they came upon us all together, and we contended with him in a wide
tract for a period of two days; and calamity befell us on the third day, and the decree of
God (whose name be exalted!) was executed among us. The first who charged upon
Suleyman were I and my troops; and I said to my companions, Keep in your places in
the battlefield while I go forth to them and challenge Ed-Dimiryat. And, lo, he came
forth, like a great mountain, his fires flaming, and his smoke ascending; and he
approached, and smote me with a flaming fire; and his arrow prevailed over my fire. He
cried out at me with a prodigious cry, so that I imagined the heaven had fallen and
closed over me, and the mountains shook at his voice. Then he commanded his
companions, and they charged upon us all together: we also charged upon them, and
we cried out, one to another: the fires rose and the smoke ascended, the hearts of the
combatants were almost cleft asunder, and the battle raged. The birds fought in the air;
and the wild beasts in the dust; and I contented with Ed-Dimiryat until he wearied me
and I wearied him; after which I became weak, and my companions and troops were
enervated, and my tribes were routed. The Prophet of God, Suleyman, cried out, Take
ye this great tyrant, the ill-omened, the infamous! And the men charged upon the men,
and the Jinn upon the Jinn; defeat befell our King, and we became unto Suleyman a
spoil. His troops charged upon our forces, with the wild beasts on their right and left,
and the birds were over our heads, tearing out the eyes of the people, sometimes with
245
their talons and sometimes with their beaks, and sometimes they beat with their wings
upon the faces of the combatants, while the wild beasts bit the horses and tore in pieces
the men, until the greater portion of the party lay upon the face of the earth like the
trunks of palm-trees. As to me, I flew from before Ed-Dimiryat; but he followed me a
journey of three months, until he overtook me. I had fallen down through fatigue, and
he rushed upon me, and made me a prisoner. So I said to him, By Him who hath
exalted thee and abased me, pity me, and take me before Suleyman, on whom be
peace! But when I came before Suleyman, he met me in a most evil manner: he caused
this pillar to be brought, and hollowed it, and put me in it, and sealed me with his
signet; after which, he chained me, and Ed-Dimiryat conveyed me to this place, where
he set me down as thou seest me; and this pillar is my prison until the day of
resurrection. He charged a great king to guard me in this prison, and I am in this
condition tortured as thou seest me.
The party therefore wondered at him, and at the horrible nature of his form; and
the Emir Musa said, There is no deity but God! Suleyman was endowed with a mighty
dominion!And the sheykh Abd-Es-Samad said to the Efrit, O thou, I ask thee
concerning a thing of which do thou inform us. The Efrit replied, Ask concerning what
thou wilt. And the sheykh said, Are there in this place any of the Efrits confined in
bottles of brass from the time of Suleyman, on whom be peace? He answered, Yes, in
the Sea of El-Karkar, where are a people of the descendants of Nuh (on whom be
peace!), whose country the deluge reached not, and they are separated there from [the
rest of] the sons of Adam.And where, said the sheykh, is the way to the City of Brass,
and the place wherein are the bottles? What distance is there between us and it?The
Efrit answered, It is near. So the party left him, and proceeded; and there appeared to
them a great black object, with two [seeming] fires corresponding with each other in
position, in the distance, in that black object; whereupon the Emir Musa said to the
sheykh, What is this great black object, and what are these two corresponding fires?
The guide answered him, Be rejoiced, O Emir; for this is the City of Brass, and this is
the appearance of it that I find described in the Book of Hidden Treasures; that its wall
is of black stones, and it hath two towers of brass of El-Andalus, 8 which the beholder
seeth resembling two corresponding fires; and thence it is named the City of Brass.
They ceased not to proceed until they arrived at it; and, lo, it was lofty, strongly
fortified, rising high into the air, impenetrable: the height of its walls was eighty cubits,
and it had five and twenty gates, none of which would open but by means of some
artifice; and there was not one gate to it that had not, within the city, one like it: such
was the beauty of the construction and architecture of the city. They stopped before it,
and endeavoured to discover one of its gates; but they could not; and the Emir Musa
said to the sheykh Abd-Es-Samad, O sheykh, I see not to this city any gate. The
sheykh replied, O Emir, thus do I find it described in the Book of Hidden Treasures; that
it hath five and twenty gates, and that none of its gates may be opened but from within
the city.And how, said the Emir, can we contrive to enter it, and divert ourselves with
a view of its wonders?
Then the Emir Musa ordered one of his young men to mount a camel, and ride
round the city, in the hope that he might discover a trace of a gate, or a place lower
than that to which they were opposite. So one of his young men mounted, and
proceeded around it for two days with their nights, prosecuting his journey with
diligence, and not resting; and when the third day arrived, he came in sight of his
companions, and he was astounded at that which he beheld of the extent of the city,
and its height. Then he said, O Emir, the easiest place in it is this place at which ye
have alighted. And thereupon the Emir Musa took Talib the son of Sahl, and the sheykh
Abd-Es-Samad, and they ascended a mountain opposite the city, and overlooking it;
and when they had ascended that mountain, they saw a city than which eyes had not
beheld any greater. Its pavilions were lofty, and its domes were shining; its mansions
were in good condition, and its rivers were running; its trees were fruitful, and its
gardens bore ripe produce. It was a city with impenetrable gates, empty, still, without a
voice or a cheering inhabitant, but the owl hooting in its quarters, and birds skimming in
246
circles in its areas, and the raven croaking in its districts and its great thoroughfarestreets, and bewailing those who had been in it. The Emir Musa paused, sorrowing for
its being devoid of inhabitants, and its being despoiled of people and dwellers; and he
said, Extolled be the perfection of Him whom ages and times change not, the Creator of
the creation by his power! And while he was extolling the perfection of God (to whom be
ascribed might and glory!), he happened to look aside, and, lo, there were seven tablets
of white marble, appearing from a distance. So he approached them, and, behold, they
were sculptured and inscribed; and he ordered that their writing should be read;
therefore the sheykh Abd-Es-Samad advanced and examined them and read them; and
they contained admonition, and matter for example and restraint, unto those endowed
with faculties of discernment. Upon the first tablet was inscribed, in the ancient Greek
character,
O son of Adam, how heedless art thou of the case of him who hath been before
thee! Thy years and age have diverted thee from considering him. Knowest thou
not that the cup of death will be filled for thee, and that in a short time thou wilt
drink it? Look then to thyself before entering thy grave. Where are those who
possessed the countries and abased the servants of God and led armies? Death
hath come upon them; and God is the terminator of delights and the separator of
companions and the devastator of flourishing dwellings; so He hath transported
them from the amplitude of palaces to the straitness of the graves.
And in the lower part of the tablet were inscribed these verses:
Where are the Kings and the peoplers of the earth? They have quitted that which
they have built and peopled;
And in the grave they are pledged for their past actions: there, after destruction,
they have become putrid corpses.
Where are the troops? They repelled not, nor profited. And where is that which
they collected and hoarded?
The decree of the Lord of the Throne surprised them. Neither riches nor refuge
saved them from it.
And the Emir Musa fainted; his tears ran down upon his cheeks, and he said, By
Allah, indifference to the world is the most appropriate and the most sure course! Then
he caused an inkhorn and a paper to be brought, and he wrote the inscription of the
first tablet; after which he drew near to the second tablet, and the third, and the fourth;
and, having copied what was inscribed on them, he descended from the mountain; and
the world had been pictured before his eyes.
And when he came back to the troops, they passed the day devising means of
entering the city; and the Emir Musa said to his Wezir, Talib the son of Sahl, and to
those of his chief officers, who were around him, How shall we contrive to enter the city,
that we may see its wonders? Perhaps we shall find in it something by which we may
ingratiate ourselves with the Prince of the Faithful.Talib the son of Sahl replied, May
God continue the prosperity of the Emir! Let us make a ladder, and mount upon it, and
perhaps we shall gain access to the gate from within.And the Emir said, This is what
occurred to my mind, and excellent is the advice. Then he called to the carpenters and
blacksmiths, and ordered them to make straight some pieces of wood, and to construct
a ladder covered with plates of iron. And they did so, and made it strong. They
employed themselves in constructing it a whole month, and many men were occupied in
making it. And they set it up and fixed it against the wall, and it proved to be equal to
the wall in height, as though it had been made for it before that day. So the Emir Musa
wondered at it, and said, God bless you! It seemeth, from the excellence of your work,
as though ye had adapted it by measurement to the wall.He then said to the people,
Which of you will ascend this ladder, and mount upon the wall, and walk along it, and
contrive means of descending into the city, that he may see how the case is, and then
inform us of the mode of opening the gate? And one of them answered, I will ascend it,
O Emir, and descend and open the gate. The Emir therefore replied, Mount. God bless
thee!Accordingly, the man ascended the ladder until he reached the top of it; when he
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stood, and fixed his eyes towards the city, clapped his hands, and cried out with his
loudest voice, saying, Thou art beautiful! Then he cast himself down into the city, and
his flesh became mashed with his bones. So the Emir Musa said, This is the action of
the rational. How then will the insane act? If we do thus with all our companions, there
will not remain of them one; and we shall be unable to accomplish our affair, and the
affair of the Prince of the Faithful. Depart ye; for we have no concern with this city.
But one of them said, Perhaps another than this may be more steady than he. And a
second ascended, and a third, and a fourth, and a fifth; and they ceased not to ascend
by that ladder to the top of the wall, one after another, until twelve men of them had
gone, acting as acted the first. Therefore the sheykh Abd-Es-Samad said, There is none
for this affair but myself, and the experienced is not like the inexperienced. But the Emir
Musa said to him, Thou shalt not do that, nor will I allow thee to ascend to the top of
this wall; for shouldst thou die, thou wouldst be the cause of the death of us all, and
there would not remain of us one; since thou art the guide of the party. The sheykh
however replied, Perhaps the object will be accomplished by my means, through the will
of God (whose name be exalted!) And thereupon all the people agreed to his ascending.
Then the sheykh Abd-Es-Samad arose, and encouraged himself, and, having said,
In the name of God, the Compassionate, the Merciful!he ascended the ladder,
repeating the praises of God (whose name be exalted!), and reciting the Verses of
Safety, until he reached the top of the wall; when he clapped his hands, and fixed his
eyes. The people therefore all called out to him, and, said, O sheykh Abd-Es-Samad, do
it not, and cast not thyself down! And they said, Verily to God we belong, and verily
unto Him we return! If the sheykh Abd-Es-Samad fall, we all perish!Then the sheykh
Abd-Es-Samad laughed immoderately, and sat a long time repeating the praises of God
(whose name be exalted!), and reciting the Verses of Safety; after which he rose with
energy, and called out with his loudest voice, O Emir, no harm shall befall you; for God
(to whom be ascribed might and glory!) hath averted from me the effect of the artifice
and fraudulence of the Devil, through the blessing resulting from the utterance of the
words, In the name of God, the Compassionate, the Merciful.So the Emir said to him,
What hast thou seen, O sheykh? He answered, When I reached the top of the wall, I
beheld ten damsels, like moons, who made a sign with their hands, as though they
would say, Come to us. And it seemed to me that beneath me was a sea (or great river)
of water; whereupon I desired to cast myself down, as our companions did: but I beheld
them dead; so I withheld myself from them, and recited some words of the book of God
(whose name be exalted!), whereupon God averted from me the influence of those
damsels artifice, and they departed from me; therefore I cast not myself down, and
God repelled from me the effect of their artifice and enchantment. There is no doubt
that this is an enchantment and an artifice which the people of this city contrived in
order to repel from it every one who should desire to looks down upon it, and wish to
obtain access to it; and these our companions are laid dead.
He then walked along the wall till he came to the two towers of brass, when he
saw that they had two gates of gold, without locks upon them, or any sign of the means
of opening them. Therefore the sheykh paused as long as God willed, and, looking
attentively, he saw in the middle of one of the gates a figure of a horseman of brass,
having one hand extended, as though he were pointing with it, and on it was an
inscription, which the sheykh read, and, lo, it contained these words:Turn the pin that
is in the middle of the front of the horsemans body twelve times, and then the gate will
open. So he examined the horseman, and in the middle of the front of his body was a
pin, strong, firm, well fixed; and he turned it twelve times; whereupon the gate opened
immediately, with a noise like thunder; and the sheykh Abd-Es-Samad entered. He was
a learned man, acquainted with all languages and characters. And he walked on until he
entered a long passage, whence he descended some steps, and he found a place with
handsome wooden benches, on which were people dead, and over their heads were
elegant shields, and keen swords, and strung bows, and notched arrows. And behind
the [next] gate were a bar of iron, and barricades of wood, and locks of delicate fabric,
and strong apparatus. Upon this, the sheykh said within himself, Perhaps the keys are
248
with these people. Then he looked, and, lo, there was a sheykh who appeared to be the
oldest of them, and he was upon a high wooden bench among the dead men. So the
sheykh Abd-Es-Samad said, May not the keys of the city be with this sheykh! Perhaps
he was the gatekeeper of the city, and these were under his authority.He therefore
drew near to him, and lifted up his garments, and, lo, the keys were hung to his waist.
At the sight of them, the sheykh Abd-Es-Samad rejoiced exceedingly; his reason almost
fled from him in consequence of his joy; and he took the keys, approached the gate,
opened the locks, and pulled the gate and the barricades and other apparatus, which
opened, and the gate also opened, with a noise like thunder, by reason of its greatness
and terribleness, and the enormousness of its apparatus. Upon this, the sheykh
exclaimed, God is most great!and the people made the same exclamation with him,
rejoicing at the event. The Emir Musa also rejoiced at the safety of the sheykh Abd-EsSamad, and at the opening of the gate of the city; the people thanked the sheykh for
that which he had done, and all the troops hastened to enter the gate. But the Emir
Musa cried out to them, O people, if all of us enter, we shall not be secure from some
accident that may happen. Half shall enter, and half shall remain behind.
The Emir Musa then entered the gate, and with him half of the people, who bore
their weapons of war. And the party saw their companions lying dead: so they buried
them. They saw also the gate-keepers and servants and chamberlains and lieutenants
lying upon beds of silk, all of them dead. And they entered the market of the city, and
beheld a great market, with lofty buildings, none of which projected beyond another:
the shops were open, and the scales hung up, and the utensils of brass ranged in order,
and the khans were full of all kinds of goods. And they saw the merchants dead in their
shops: their skins were dried, and their bones were carious and they had become
examples of him who would be admonished. They saw likewise four markets of
particular shops filled with wealth. And they left this place, and passed on to the silkmarket, in which were silks and brocades interwoven with red gold and white silver
upon various colours, and the owners were dead, lying upon skins, and appearing
almost as though they would speak. Leaving these, they went on to the market of
jewels and pearls and jacinths; and they left it, and passed on to the market of the
money-changers, whom they found dead, with varieties of silks beneath them, and their
shops were filled with gold and silver. These they left, and they proceeded to the
market of the perfumers; and, lo, their shops were filled with varieties of perfumes, and
bags of musk, and ambergris, and aloes-wood, and nedd, and camphor, and other
things; and the owners were all dead, not having with them any food. And when they
went forth from the market of the perfumers, they found near unto it a palace,
decorated, and strongly constructed; and they entered it, and found banners unfurled,
and drawn swords, and strung bows, and shields hung up by chains of gold and silver,
and helmets gilded with red gold. And in the passages of that palace were benches of
ivory, ornamented with plates of brilliant gold, and with silk, on which were men whose
skins had dried upon the bones: the ignorant would imagine them to be sleeping; but,
from the want of food, they had died, and tasted mortality. Upon this, the Emir Musa
paused, extolling the perfection of God (whose name be exalted!), and his holiness, and
contemplating the beauty of that palace, and its strong construction, and its wonderful
fabrication in the most beautiful form and with the firmest architecture; and most of its
decoration was an ultramarine. Around it were inscribed these verses:
Consider what thou beholdest, O man; and be on thy guard before thou
departest;
And prepare good provision, that thou mayest enjoy it; for every dweller in a
house shall depart.
Consider a people who decorated their abodes, and in the dust have become
pledged for their actions.
They built; but their buildings availed not: and treasured; but their wealth did not
save them when the term had expired.
249
How often they hoped for what was not decreed them! But they passed to the
graves, and hope did not profit them;
And from their high and glorious state they were removed to the narrowness of
the sepulchre. Evil is their abode!
Then there came to them a crier, after they were buried, saying, Where are the
thrones and the crowns and the apparel?
Where are the faces which were veiled and curtained, and on which, for their
beauty, proverbs were composed?
And the grave plainly answered the inquirer for them, As to the cheeks, the rose
is gone from them.
Long time they ate and drank; but now, after pleasant eating, they themselves
have been eaten.
And the Emir Musa wept until he became senseless; and afterwards, having given
orders to write these verses, he went on into the interior of the palace. There he beheld
a great hall, and four large and lofty chambers, each one fronting another, wide,
decorated with gold and silver and with various colours. In the midst of the hall was a
great fountain of alabaster, over which was a canopy of brocade; and in those chambers
were places [one in each chamber] containing decorated fountains, and tanks lined with
marble; and channels of water flowed along the floors of those chambers, the four
streams meeting together in a great tank lined with marbles of various colours.The
Emir Musa then said to the sheykh Abd-Es-Samad, Enter these chambers with us. So
they entered the first chamber; and they found it filled with gold and with white silver,
and pearls and jewels, and jacinths and precious minerals. They found in it also chests
full of red and yellow and white brocades. And they went thence to the second chamber,
and opened a closet in it, and, lo, it was filled with arms and weapons of war, consisting
of gilded helmets, and Davidean coats of mail, and Indian swords, and lances of Khatt
Hejer, and maces of Khuwarezm, and other instruments of war and battle. Then they
passed thence to the third chamber, in which they found closets having upon their doors
closed locks, and over them were curtains worked with various kinds of embroidery.
They opened one of these closets, and found it filled with weapons decorated with
varieties of gold and silver and jewels. And they went thence to the fourth chamber,
where also they found closets, one of which they opened, and they found it full of
utensils for food and drink, consisting of various vessels of gold and silver, and saucers
of crystal, and cups set with brilliant pearls, and cups of carnelian, and other things. So
they began to take what suited them of those things, and each of the soldiers carried off
what he could. And when they determined to go forth from those chambers, they saw
there a door of saj inlaid with ivory and ebony, and adorned with plates of brilliant gold,
in the midst of that palace. Over it was hung a curtain of silk worked with various kinds
of embroidery, and upon it were locks of white silver, to be opened by artifice, without a
key. The sheykh Abd-Es-Samad therefore advanced to those locks, and he opened
them by his knowledge and boldness and excellent skill. And the party entered a
passage paved with marble, upon the sides of which were curtains whereon were
figured various wild beasts and birds, all these being worked with red gold and white
silver, and their eyes were of pearls and jacinths: whosoever beheld them was
confounded. Next they came to a saloon, on beholding which the Emir Musa and the
sheykh Abd-Es-Samad were amazed at its construction.
They then passed on, and found a saloon constructed of polished marble adorned
with jewels. The beholder imagined that upon its floor was running water, and if any
one walked upon it he would slip. The Emir Musa therefore ordered the sheykh Abd-EsSamad to throw upon it something that they might be enabled to walk on it; and he did
this, and contrived so that they passed on. And they found in it a great dome
constructed of stones gilded with red gold. The party had not beheld, in all that they
had seen, any thing more beautiful than it. And in the midst of that dome was a great
dome-crowned structure of alabaster, around which were lattice-windows, decorated,
and adorned with oblong emeralds, such as none of the Kings could procure. In it was a
250
pavilion of brocade, raised upon columns of red gold, and within this were birds, the
feet of which were of emeralds; beneath each bird was a net of brilliant pearls, spread
over a fountain; and by the brink of the fountain was placed a couch adorned with
pearls and jewels and jacinths, whereon was a damsel resembling the shining sun. Eyes
had not beheld one more beautiful. Upon her was a garment of brilliant pearls, on her
head was a crown of red gold, with a fillet of jewels, on her neck was a necklace of
jewels in the middle of which were refulgent gems, and upon her forehead were two
jewels the light of which was like that of the sun; and she seemed as though she were
looking at the people, and observing them to the right and left. When the Emir Musa
beheld this damsel, he wondered extremely at her loveliness, and was confounded by
her beauty and the redness of her cheeks and the blackness of her hair. Any beholder
would imagine that she was alive, and not dead. And they said to her, Peace be on thee,
O damsel! But Talib the son of Sahl said to the Emir, May God amend thy state. Know
that this damsel is dead. There is no life in her. How then can she return the
salutation?And he added, O Emir, she is skillfully embalmed; and her eyes have been
taken out after her death, and quicksilver hath been put beneath them, after which they
have been restored to their places; so they gleam; and whenever the air putteth them
in motion, the beholder imagineth that she twinkleth her eyes, though she is dead.
Upon this the Emir Musa said, Extolled be the perfection of God, who hath subdued his
servants by death!And as to the couch upon which was the damsel, it had steps, and
upon the steps were two slaves, one of them white and the other black; and in the hand
of one of them was a weapon of steel, and in the hand of the other a jewelled sword
that blinded the eyes; and before the two slaves was a tablet of gold, whereon was read
an inscription, which was this:
In the name of God, the Compassionate, the Merciful. Praise be to God, the
Creator of man; and He is the Lord of lords, and the Cause of causes. In the
name of God, the Everlasting, the Eternal: in the name of God, the Ordainer of
fate and destiny. O son of Adam, how ignorant art thou in the long indulgence of
hope! and how unmindful art thou of the arrival of the predestined period!
Knowest thou not that death hath called for thee, and hath advanced to seize thy
soul? Be ready then for departure, and make provision in the world; for thou wilt
quit it soon. Where is Adam, the father of mankind? Where are Nuh and his
offspring? Where are the sovereign Kisras and Csars? Where are the kings of
India and El-Irak? Where are the Kings of the regions of the earth? Where are
the Amalekites? Where are the mighty monarchs? The mansions are void of their
presence, and they have quitted their families and homes. Where are the Kings of
the foreigners and the Arabs? They have all died, and become rotten bones.
Where are the lords of high degree? They have all died. Where are Karun and
Haman? 9 Where is Sheddad the son of Ad? Where are Kenan and the Lord of
the Stakes? 10 God hath cut them off, and it is He who cutteth short the lives of
mankind, and He hath made the mansions to be void of their presence. Did they
prepare provision for the day of resurrection, and make themselves ready to
reply to the Lord of men?O thou, if thou know me not, I will acquaint thee with
my name and my descent. I am Tedmur, the daughter of the King of the
Amalekites, of those who ruled the countries with equity. I possessed what none
of the Kings possessed, and ruled with justice, and acted impartially towards my
subjects; I gave and bestowed, and I lived a long time in the enjoyment of
happiness and an easy life, and possessing emancipated female and male slaves.
Thus I did until the summoner of death came to my abode, and disasters
occurred before me. And the case was this:Seven years in succession came
upon us, during which no water descended on us from heaven, nor did any grass
grow for us on the face of the earth. So we ate what food we had in our
dwellings, and after that we fell upon the beasts and ate them, and there
remained nothing. Upon this, therefore, I caused the wealth to be brought, and
meted it with a measure, and sent it by trusty men, who went about with it
through all the districts, not leaving unvisited a single large city, to seek for some
food. But they found it not; and they returned to us with the wealth, after a long
251
absence. So thereupon we exposed to view our riches and our treasures, locked
the gates of the fortresses in our city, and submitted ourselves to the decree of
our Lord, committing our case to our Master; and thus we all died, as thou
beholdest, and left what we had built and what we had treasured. This is the
story: and after the substance there remaineth not aught save the vestige.
And they looked at the lower part of the tablet, and saw inscribed upon it these
verses:
Child of Adam, let not hope make game of thee. From all that thy hands have
reassured thou shalt be removed.
I see thee desirous of the world and its embellishments; and the past generations
have pursued the same course.
They acquired wealth, both lawful and forbidden; but it repelled not fate when
the term expired:
The led troops in multitudes, and collected riches; and they left their wealth and
buildings, and departed
To the narrow graves, and lay down in the dust; and there they have remained,
pledged for their actions;
As if the company of travellers had put down their baggage during night in a
house where was no food for guests.
And its owner had said to them, O people, there is not any lodging for you in it.
So they packed after alighting:
And they all thereupon became fearful and timid: neither halting nor journeying
was pleasant unto them.
Then prepare good provision that will rejoice thee to-morrow; and act not save
agreeably with the fear of thy Lord.
And upon the tablet were also inscribed these words:
Whoso arriveth at our city, and entereth it, God facilitating his entrance into it,
let him take of the wealth what he can, but not touch any thing that is on my
body; for it is the covering of my person, and the attire with which I am fitted
forth from the world. Therefore let him fear God, and not seize aught of it; for he
would destroy himself. I have caused this to be an admonition from me unto him,
and a charge which I give him in confidence. And peace be on you! I beg God,
moreover, to save you from the evil of trials and sickness.
The Emir Musa, when he heard these words, again wept so violently that he
became insensible; and after he had recovered, he wrote all that he saw, and was
admonished by what he witnessed. He then said to his companions, Bring the sacks,
and fill them with part of these riches and these vessels and rarities and jewels. And
thereupon, Talib the son of Sahl said to the Emir Musa, O Emir, shall we leave this
damsel with the things that are upon her. They are things that have no equal, nor is the
like of them at any time found, and they are more than the riches thou hast taken, and
will be the best present by which thou mayest ingratiate thyself with the Prince of the
Faithful.But the Emir replied, O thou, heardest thou not that which the damsel hath
given as a charge, in the inscription upon this tablet? Moreover, and especially, she hath
given it as a charge offered in confidence, and we are not of the people of treachery.
The Wezir Talib, however, said, And on account of these words wilt thou leave these
riches and these jewels, when she is dead? What then should she do with these things,
which are the ornaments of the world, and the decoration of the living? With a garment
of cotton might this damsel be covered, and we are more worthy of the things than
she.Then he drew near to the steps, and ascended them until he reached the spot
between the two men [the slaves before mentioned], when, lo, one of these two smote
him upon his back, and the other smote him with the sword that was in his hand, and
struck off his head, and he fell down dead. So the Emir Musa said, May God not regard
with mercy thy resting-place! There was, in these riches, a sufficiency; and
covetousness doth doubtlessly dishonour the person in whom it existeth!He thereupon
252
gave orders for the entry of the troops, who accordingly entered, and they loaded the
camels with part of those riches and minerals; after which the Emir Musa commanded
them to close the gate as it was before.
They then proceeded along the sea-coast until they came in sight of a high
mountain overlooking the sea. In it were many caves, and, lo, in these was a people of
the blacks, clad in hides, and with burnuses of hides upon their heads, whose language
was not known. And when they saw the troops, they ran from them, and fled to those
caves, while their women and their children stood at the entrances of the caves. So the
Emir Musa said, O sheykh Abd-Es-Samad, what are these people? And he answered,
These are the objects of the inquiry of the Prince of the Faithful. They therefore
alighted, and the tents were pitched, and the riches were put down; and they had not
rested when the King of the blacks came down from the mountain, and drew near to the
troops. He was acquainted with the Arabic language; therefore, when he came to the
Emir Musa, he saluted him; and the Emir returned his salutation, and treated him with
honour. Then the King of the blacks said to the Emir, Are ye of mankind, or the Jinn?
The Emir answered, As to us, we are of mankind; and as to you, there is no doubt but
that ye are of the Jinn, because of your seclusion in this mountain that is separated
from the world, and because of the greatness of your make. But the King of the blacks
replied, Nay, we are a people of the race of Adam, of the sons of Ham the son of Nuh,
on whom be peace! And as to this sea, it is known by the name of El-Karkar.So the
Emir Musa said to him, And whence obtained ye knowledge, when there hath not come
unto you any prophet divinely inspired in such a country as this? He answered, Know, O
Emir, that there appeareth unto us, from this sea, a person diffusing a light whereby the
surrounding tracts are illuminated; and he proclaimeth, with a voice which the distant
and the near hear, O sons of Ham, be abashed at Him who seeth and is not seen; and
say, There is no deity but God: Mohammad is the Apostle of God. And I am Abu-lAbbas El-Khidr.Before that, we used to worship one another; but he called us to the
worship of the Lord of mankind.Then he said to the Emir Musa, He hath also taught us
some words to say.And what, asked the Emir, are those words? He answered, They
are these:There is no deity but God alone: He hath no partner: to Him belongeth
dominion, and to Him belongeth praise: He giveth life and killeth: and He is able to
accomplish every thing. And we seek not access to God (to whom be ascribed might
and glory!) save by these words, nor know we any others. Also, every night of Friday
we see a light upon the face of the earth, and we hear a voice saying, Perfect! Holy!
Lord of the Angels and the Spirit! Whatsoever God willeth cometh to pass, and what He
willeth not cometh not to pass! Every benefit from God is a gratuitous favour! And there
is no strength nor power but in God, the High, the Great!
The Emir Musa then said to him, We are the associates of the King of El-Islam,
Abd-el-Melik the son of Marwan; and we have come on account of the bottles of brass
that are here in your sea, and wherein are the devils imprisoned from the time of
Suleyman the son of Daud (on both of whom be peace!). He hath commanded us to
bring him some of them, that he may see them, and divert himself by the view of
them.And the King of the blacks replied, Most willingly. Then he feasted him with fish,
and ordered the divers to bring up from the sea some of the bottles of Suleyman; and
they brought up for them twelve bottles; wherewith the Emir Musa was delighted, and
the sheykh Abd-Es-Samad also, and the soldiers, on account of the accomplishment of
the affair of the Prince of the Faithful. The Emir Musa thereupon presented to the King
of the blacks many presents, and gave him large gifts. In like manner too the King of
the blacks gave to the Emir Musa a present consisting of wonders of the sea, in the
form of human beings, and said to him, Your entertainment for these three days shall
be of these fish. And the Emir replied, We must carry with us some of them, that the
Prince of the Faithful may see them; for thereby will his heart be pleased more than by
the bottles of Suleyman.
Then they bade him farewell, and they journeyed back until they came to the land
of Syria, and went in to the Prince of the Faithful; whereupon the Emir Musa acquainted
him with all that he had seen, and all that had occurred to him with respect to the
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verses and histories and admonitions, and told him of the case of Talib the son of Sahl.
And the Prince of the Faithful said to him, Would that I had been with you, that I might
have beheld what ye beheld! He then took the bottles, and proceeded to open one after
another, and the devils came forth from them, saying, Repentance, O Prophet of God!
We will not return to the like conduct ever!And Abd-el-Melik the son of Marwan
wondered at this. But as to the damsels of the sea, with the like of which the King of the
blacks feasted them, they made for them troughs of wood, which they filled with water,
and into these they put them. They died, however, in consequence of the intensity of
the heat. After this, the Prince of the Faithful caused the riches to be brought before
him, and divided them among the Muslims. And he said, God hath not bestowed upon
any one the like of what He bestowed upon Suleyman the son of Daud. Then the Emir
Musa begged the Prince of the Faithful that he might appoint his son in his place as
Governor of the province, and that he might himself go to the noble Jerusalem, there to
worship God. So the Prince of the Faithful appointed his son to the government, and he
himself went to the noble Jerusalem, and he died there.
This is the end of that which hath come down to us, of the history of the City of
Brass, entire. And God is all-knowing.
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Anexo 3.
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256
Ya me come, ya me come,
por do ms pecado haba,
en derecho al corazn,
fuente de mi gran desdicha.
Del conde don Julin se sabe que, atribulado por el papel que haba desempeado
en la destruccin del reino de Espaa, huy de los rabes para reunir sus riquezas, acaso
con la intencin de organizar algn modo de resistencia. Don Julin intent refugiarse
primero en lo que hoy se conoce como la Muela del Conde, en el Seoro de Molina, ro
Tajo arriba. Sin embargo, los rabes le acosaban muy de cerca, y para que sus tesoros
no cayesen en manos de quienes le iban a la zaga hizo arrojarlos a la laguna de Taravilla,
en cuyo fondo deben de encontrarse todava. Consigui luego escapar al norte, pero los
rabes lo apresaron en las tierras aragonesas de Loarre, donde lo maltrataron hasta
matarlo, enterrndolo luego fuera de tierra sagrada.
Florinda, a quien los rabes denominaron la Cava, la barragana, muri ahogada
por su propia voluntad en el ro Tajo, en el mismo sitio en que sus baos haban
provocado los deseos del rey Rodrigo. El lugar, cercano al actual puente de San Martn y
a las ruinas de un antiguo torren, es conocido como Bao de la Cava. Durante mucho
tiempo vagaba por las orillas del ro o apareca entre sus aguas su desesperado y
gimiente espectro, pero ya hace siglos que unos adecuados exorcismos consiguieron calmarlo para siempre. El espectro lloroso fue sustituido por dos tenues figuras luminosas,
las de un hombre y una mujer, que a veces, en ciertas noches, pueden vislumbrarse en
aquellos mismos parajes, en apacible compaa.
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