Magias Encantamentos e Metamorfoses LIVRO
Magias Encantamentos e Metamorfoses LIVRO
Magias Encantamentos e Metamorfoses LIVRO
Delia Cambeiro
Organizadoras
Magias, encantamentos
e metamorfoses
Fabulaes modernas e suas expresses
no imaginrio contemporneo
Sobre as organizadoras
MAGALI MOURA
Doutora em Literatura Alem pela USP
(2006) e Ps-doutora em Letras pela
Unesp/Araraquara (2009). Atualmente
Procientista UERJ/FAPERJ e docente no
curso de Graduao em Letras PortugusAlemo e de Ps-Graduao em Letras da
UERJ. Publicou o livro Aspectos da poca
de Goethe (2011) e organizou o volume
Fausto de Goethe no sculo XXI. Questes
fusticas na contemporaneidade (2012),
ambos em co-autoria com Izabela Kestler.
DELIA CAMBEIRO
Doutora em Literatura Comparada pela
UFRJ (1999) e Ps-Doutora em Literatura
Comparada, na Universitade da Corua,
Espanha (2010). professora Associada
aposentada do Instituto de Letras da UERJ,
onde atuou na Graduao PortugusItaliano e na Ps-Graduao em Letras. Foi
Procientista UERJ/FAPERJ e professora da
Alliance Franaise (1983-1996). Publicou
Vises e revises em Literatura Comparada
1(2010) e a seleta de contos Melancolias
(2010).
Magali Moura
Delia Cambeiro
Organizadoras
Magias, encantamentos
e metamorfoses
Fabulaes modernas e suas expresses
no imaginrio contemporneo
1 edio
Rio de Janeiro
2013
ANDREA VICHI
Design
RACHEL MATTA
Reviso
LETRAS E VERSOS
Impresso
FICHA CATALOGRFICA
M194
Sumrio
Apresentao
33
57
REGINA MICHELLI
77
91
123
145
169
187
203
217
FERNANDA LEMOS
233
251
MARCUS MAZZARI
265
a histria, tantas vezes atualizada na Literatura, de um gato/gata, representados como personagens geis no engano e na tramoia, capazes de
promover a ascenso de um dono conivente com as maquinaes do
matreiro animal. Cambeiro retoma as linhas desses fictcios feldeos,
a servio de seus donos, no novelrio dos italianos Giovan Francesco
Straparola (sc. XVI) e Giovan Battista Basile (sc. XVII); insiste na atualizao temtica, passando sua busca por Perrault, quadrinhos, filmes seriados de televiso e longas-metragens para o cinema, e por interessante
mosaico de igreja medieval.
Encerramos a apresentao deste volume com palavras de agra-
Magali Moura
Delia Cambeiro
16 ]
Os Irmos Grimm entendiam que o manancial de contos e de manifestaes folclricas preservado por sculos na tradio oral popular no
sculo XIX j corria o risco de perder-se, de ser esquecido. Da seu empenho a favor de um registro extensivo e fiel. Sabemos, no entanto, que
eles no deixaram de retocar as narrativas que coletaram: no apenas as
verses publicadas divergem das anotaes inicialmente feitas mo1,
como os contos continuaram sendo retocados de edio em edio. Mesmo
assim, sua proposta foi de manter viva essa herana cultural, anotando
diversas verses de um mesmo conto, guardando informaes precisas
sobre a coleta (como local, data e informante que relatou o conto) e acrescentando comentrios e estudos. Para os Irmos Grimm, a coleta exigia
cuidado e preciso no manuseio dos dados seja na recolha junto a narradores orais, seja na pesquisa em livros e manuscritos antigos, de onde os
irmos tambm extraram vrios contos, a exemplo de O rato, o pssaro e o
chourio (Von dem Muschen, Vgelchen und der Bratwurst), narrativa
proveniente de livro de Johann Michael Moscherosch (1601-1669).
Ainda que os registros anteriores aos Grimm sejam esparsos, muitos
contos de fadas foram preservados em livros e manuscritos. Pesquisas
1
20 ]
21 ]
22 ]
24 ]
(Grimm, 1978, p. 196), o que talvez seja uma pista para o monstro que ele
era em verses mais antigas.
Essa substituio, por sua vez, alterou o modo de combate ao opositor. A exemplo do que vemos em outros contos de fadas nos quais aparece
o diabo como Pele de urso (Der Brenhuter), O diabo e sua av
(Der Teufel und seine Gromutter), O fuliginoso irmo do diabo (Des
Teufels ruiger Bruder) o diabo no combatido com a espada, mas
enganado pelos humanos, que so superiores em sagacidade e esperteza.
Para Renate Zelger (1998, p. 261-2), esse aspecto teria entrado nos contos
somente a partir do Renascimento, quando o ser humano aumentou seus
conhecimentos cientficos, passando a imbuir-se de confiana e ousadia
para enfrentar foras que antes lhe pareciam insuperveis.
Seja como for, o enredo de O diabo e os trs fios de cabelo segue
em linhas gerais os moldes do ritual de iniciao, em que um jovem sortudo
e amvel, mas tambm corajoso e determinado, enfrenta perigos e testes
at ser admitido no mundo dos adultos. Ao final, depois de sobreviver s
tentativas de assassinato pelo rei, de buscar os fios de cabelo do diabo e
retornar para casa carregado de ouro, nosso protagonista conseguiu afastar
o prprio rei e sentar-se, ele prprio no trono. uma trajetria cujas etapas
so em boa medida correlatas s do mito de Zeus (Jpiter), que destronou
Cronos (Saturno), tomando para si a glria e o poder que antes estavam nas
mos dos deuses antigos (tits).
A derrota da bruxa ou da madrasta m, que vemos em diversos
contos de fadas, pode ser lida como variao desse mesmo tema. Em
Branca de Neve, por exemplo, as palavras do espelho sobre a beleza da
menina enfurecem a malvada esposa do rei porque elas do a notcia de que
em breve ela ser suplantada no poder pela mocinha jovem. No mito e no
conto de fadas, a superao do antigo pelo novo ineludvel, pois cadeia
essencial do ciclo da natureza.
[ 25 ]
Sob essa tica, os Irmos Grimm viram nos contos de fadas ecos dos
antigos relatos mticos, e concluram que uma forma descende da outra. Os
contos seriam, assim, verses modificadas pela imaginao (ou seja,
transformadas em fico) de antigas narrativas que outrora tinham valor
sagrado (BRICOUT, 2005, p. 194). Ao invs do tempo primordial da criao
do mundo e de todas as coisas, tal como no mito, o conto trata de um
passado indefinido (H muito, muito tempo atrs...). Ao invs de
histrias dos deuses, eles so narrativas sobre pobres moleiros, mocinhas
rfs, crianas perdidas na floresta os quais se deparam com a magia, mas
que so apenas simples humanos e no seres divinos ou fabulosos.
Para estudiosos como Max Lthi (1964, p. 101), porm, a antologia
de contos de fadas dos Irmos Grimm traz aspectos que so prprios do
mito. Dentre eles, a tendncia universalidade, o tempo sem poder de
corroso e o carter abstrato. E nisso os Grimm se distinguiriam de outras
antologias.
Por exemplo, na Bela adormecida no bosque, de Perrault, a protagonista criticada pelo prncipe (cem anos mais novo do que ela) por usar
roupas do tempo de sua av, e a ogra (me do prncipe) ordena ao cozinheiro que prepare e lhe sirva as crianas (seus prprios netos) com molho
Roberto (2004, p. 59-60). O que vemos em Perrault uma contextualizao social e cultural, que remete a valores ou costumes da aristocracia francesa: a valorizao da moda, o refinamento da culinria e o distanciamento
nas relaes familiares.
Em contraposio a Perrault, na Bela Adormecida dos Grimm domina a atmosfera mgica e inocente: o amor incondicional, e o desabrochar desse afeto representado, simbolicamente, pelo despertar com
um beijo (em Perrault a adormecida no precisa do prncipe para despertar:
ela acorda no momento em que se esgotam os cem anos da maldio).
Nesse e em outros contos dos Grimm, reina um estilo singelo e atemporal,
[
26 ]
que os torna carregados de simbologia: a muralha de espinhos transformase em camada de flores, os vestidos das princesas so simplesmente de
ouro ou prata, o lenhador mata a fome com po e vinho.
Na viso de Lthi, esses elementos proporcionam um efeito de
abstrao, reduzindo personagens, objetos e eventos essncia: ao invs
de preocupar-se com a moda de uma certa poca, o conto de fadas dos
Grimm fala da preciosidade de uma roupa. E essa preciosidade no decorre
de seu valor material, mas serve como um sinal de distino da personagem
que a usa, destacando-a como figura central da narrativa.
Vejamos, a ttulo de exemplo, as cores que caracterizam Branca de
Neve: alva como neve, corada como sangue, com cabelos negros como
bano. No temos aqui meramente a descrio de uma beleza fsica, mas
traos que inserem a protagonista em uma relao de simbiose com os
ciclos da Natureza: frio e quente, slido e lquido, claro e escuro. Branca de
Neve rene em si os designativos dos reinos animal (sangue), vegetal
(madeira) e mineral (gua), e aponta para as estaes e para a oposio
bsica entre vida (sangue) e morte (neve). Sua beleza externa deixa,
portanto, de ser mero adorno de superfcie, para funcionar como indcio
da beleza interna atestando seu carter verdadeiro (autntico), profundo,
universal. Branca de Neve simboliza o ser humano em harmonia com o
universo ao redor e, como tal, ela ganha o direito ao final feliz.
J a madrasta, que s v o espelho, representa o indivduo preso
imagem externa, ao modo como o outro a v, quilo que superficial e
artificial. O espelho muda de mensagem porque o tempo destri a beleza
fsica. Branca de Neve, ao contrrio, fica sempre mais bela, pois sua
beleza a verdadeira essncia humana. Esteja no palcio ou na cabana,
com conhecidos ou estranhos, ela humilde e dedicada, e sabe adequar-se
a todas as situaes: tanto consegue implorar por piedade (ao caador),
como oferecer ajuda (aos anes). Branca de Neve a representao viva de
[
27 ]
28 ]
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
BEOWULF. Translated from the Anglo-Saxon by Robert Kay Gordon. New York:
Dover Publications, 1992.
BRANDO, Adelino. A presena dos irmos Grimm na literatura infantil e no
folclore brasileiro. So Paulo: IBRASA, 1995. (Biblioteca Literatura e Arte,
75).
BRICOUT, Bernadette. Conto e mito. In: BRUNEL, Pierre (Org.). Dicionrio de
mitos literrios. Traduo de Carlos Sussekind e outros. 4. ed. Rio de
Janeiro: Jos Olympio, 2005. p. 191-199.
FRENZEL, Elisabeth. Nibelungen. In: Stoffe der Weltliteratur. 2. berarb. Aufl.
Stuttgart: Alfred Krner Verlag, 1963. p. 464-471.
GRIMM, Irmos. Contos e lendas dos irmos Grimm. Traduo de side M. Bonini.
So Paulo: Edigraf, 1961. 8 v.
GRIMM, Brder. Kinder- und Hausmrchen. Mnchen: Winkler, 1978.
GRIMM, Jacob; GRIMM, Wilhelm. Contos de Grimm. Traduo de David Jardim
Jr. Belo Horizonte: Villa Rica, 1994. (Grandes Obras da Literatura Universal,
16).
GRIMM, Brder. Kinder- und Hausmrchen: die handschriftliche Urfassung von
1810. Herausgegeben und kommentiert von Heinz Rlleke. Stuttgart:
Philipp Reclam, 2007.
[ 29 ]
ROMERO, Slvio. Contos populares do Brasil. Edio anotada por Lus da Cmara
Cascudo. Rio de Janeiro: Livraria Jos Olympio Editora, 1954.
SCHERF, Walter. Lexikon der Zaubermrchen. Stuttgart: Alfred Krner Verlag,
1982.
TODOROV, Tzvetan. Introduo literatura fantstica. So Paulo: Perspectiva,
1975.
ZELGER, Renate. Teufelsvertrge im Mrchen: Der Mller ist des Teufels Lust.
In: HEINDRICHS, Ursula; HEINDRICHS, Heinz-Albert (Ed.). ZauberMrchen. Mnchen: Diederichs, 1998. p. 249-264.
ZIPES, Jack. Fairy tale as myth, myth as fairy tale. Lexington: The University Press
of Kentucky, 1994.
34 ]
E assim comea tambm esta apresentao, para que, assim esperamos, ela possa ter um final feliz.
H 200 anos apareceu o primeiro volume dos Contos da Infncia e do
Lar. Este aniversrio uma tima oportunidade para se refletir sobre os
contos dos Irmos Grimm e se pensar em sua aplicao na aula de alemo.
Nas ltimas duas dcadas, trabalhos de Hans Weber (1998, 2000) e de
Swantje Ehlers (2004, 2005), assim como edies especiais da revista
Frhes Deutsch (Alemo na Infncia; 2005, 2012) ajudaram a dar novos
impulsos tericos e metdicos para o trabalho com contos de fadas nas
aulas de alemo como lngua estrangeira (neste ano, foi lanada tambm
uma edio portuguesa completa dos Kinder- und Hausmrchen de 1857,
traduzidos por Teresa Aica Bairos, com o ttulo Contos da Infncia e do Lar.
Apesar de no se poder esperar dos contos de fadas milagres no que diz
respeito ao aprendizado, seu potencial para a aula impressionantemente
variado (cf. Lange, 2005). Um dos argumentos mais comumente ouvidos
contra o uso dos contos dos Irmos Grimm a suposta lngua antiquada e
difcil dos textos originais. A tentativa comum de adaptao desses textos
aos diferentes nveis de conhecimento da lngua dos alunos por meio de
mudanas encurtadoras causa frequentemente perdas na magia dos contos
que determinada substancialmente por seu tom no estilo dos Grimm.
Pge-Alder (2007, p. 130), orientando-se por Rlleke (2004), caracteriza o
estilo de conto de fadas dos Irmos Grimm da seguinte forma:
o
o
o
o
o
o
o
o
36 ]
Hoje, apenas uma pequena parte dos antigos contos de fadas ainda
so conhecidos. Isso ocorre, por um lado, porque eles foram tardiamente
compilados e, por outro lado, por causa da mudana na comunicao interpessoal que ocorre desde a industrializao e da impressionante acelerao
causada pela revoluo digital. No h mais tempo para a lentido dos contos de fadas, mesmo que o mensageiro do conto Seis andam pelo mundo
(Sechse kommen durch die Welt) seja rpido como um pssaro. Mas
quem precisa mais de contos de fadas quando j se tem um smartphone?
Mas o conto de fadas est acostumado a no se desesperar: ele se esconde
na fala coloquial, na propaganda, nas mdias, na fico, em histrias fantsticas, em filmes e ilustraes e entra furtivamente nas mdias digitais.
De vez em quando, surgem surpreendentemente em sua forma
original. quando pais ou irmos lem contos para as crianas, quando um
livro de contos de fadas se encontra como presente de aniversrio ao lado
de videogames ou ainda quando contos so contados e encenados em
jardins de infncia ou na escola.
Em uma pesquisa feita sobre os contos de fadas mais populares
com entrevistados a partir de 16 anos, os campees foram, com poucas
excees (O Gato de Botas), os clssicos dos Contos da Infncia e do Lar
de 1857 (apndice 1). Branca de Neve, Joo e Maria e Chapeuzinho
Vermelho ocuparam as trs primeiras posies.
Por sua vez, mesmo uma pesquisa menos representativa com o
objetivo de descobrir os 20 contos de fadas mais populares (Allensbacher
Berichte, 2003, n. 12) contm dez contos dos Irmos Grimm (apndice 2).
Certo indcio para o quo conhecido cada conto , so as adaptaes
cinematogrficas de lngua alem de contos de fadas, sendo que, neste
caso, os contextos sociais, as intenes e interesses comerciais ligados aos
filmes tm de ser levados em conta (apndice 3). Os contos de fadas
conhecidos so, por assim dizer, os contos de fadas tpicos, i. , os contos
[
38 ]
nos quais se encontram mais facilmente as caractersticas tpicas do gnero. Segundo Rlleke (2004), somente cerca de 40, dos muitos textos
presentes na compilao de 1857, podem ser corretamente classificados
como contos de fadas por apresentarem as caractersticas tpicas do conto
de fadas, no que diz respeito estrutura, ao contedo e narrativa (caractersticas presentes em Branca de Neve e nos outros clssicos). Contos
menos conhecidos tm tambm frequentemente caractersticas de outros
tipos de narrativa. Um exemplo o Conto-charada (Rtselmrchen)
que, apesar de certas diferenas, tambm faz parte dos contos mgicos
(Zaubermrchen), por causa de seu entrelaamento com o maravilhoso
(LTHI, 1997, p. 6).
Conto-charada
Trs mulheres tinham sido transformadas em flores que ficavam
em um campo. Porm, uma delas tinha a permisso para passar as
noites em sua casa. Ento, uma vez, quando a manh estava chegando e ela sabia que teria que, transformada novamente em flor,
voltar ao campo para ficar com suas companheiras, ela falou para o
seu marido: Se voc vier ao campo hoje de manh e colher-me, serei salva e ficarei daqui para a frente com voc. E assim aconteceu.
Agora fica a pergunta de como ela reconheceu seu marido, apesar
de as flores serem completamente iguais e sem nenhuma diferena
entre si. Resposta: j que ela passou a noite em casa e, assim, fora
do campo, o sereno no caiu em cima dela como caiu nas outras
8
duas e, por isso, o homem pode reconhec-la. (KHM, 160, 1857) .
8
40 ]
at que algum aparea e compre uma roupa para ele. (KHM 36,
Texto da edio em manuscrito de 1810)10.
Outros contos dessa verso original ficaram, mais tarde, irreconhecveis ou parecem atualmente referncias a um conto narrado. O conto
As estrelas-moedas (Die Sterntaler), que j curto nos Contos da Infncia e do Lar de 1857, tem uma extenso de apenas quatro linhas em sua
verso de 1810, onde leva o nome de Pobre Menina (Armes Mdchen).
Alm disso, o estilo caracterstico da narrativa completamente ausente.
Porm, exatamente por causa dos problemas citados, o conto desperta o
interesse no leitor de ouvir ou ler uma verso contada com mais detalhes.
Pobre menina
Conto maravilhoso infantil sobre a pobre menina, sem jantar,
sem pais, sem cama, sem touca e sem defeitos mas que toda vez
que uma estrela se limpava, ela encontrava l embaixo uma
bonita moeda etc. (GRIMM; KHM 8; verso manuscrita de 1810)11.
10
Armes Mdchen.
Kindermrchen von dem armen Mdchen, ohne Abendbrot, ohne Eltern, ohne Bett,
ohne Haube u. ohne Fehler, die aber allemal so oft ein Stern sich putzte unten einen
hbschen Thaler fand usw.
[ 41 ]
12
42 ]
Prof. Dr. Heiz Rlleke (Wuppertal), Contos esquecidos dos Irmos Grimm
(Vergessene Mrchen der Brder Grimm.), palestra no dia 25/11/2011 em
Meiningen durante o simpsio sobre contos de fadas Contos de fadas
esquecidos, desaparecidos, redescobertos (Mrchensymposium: MrchenVergessen, verschwunden, wieder entdeckt).
[ 43 ]
Bastante desconhecidos so tambm contos que podem ser considerados como possveis verses originais de outros contos. Esses contos
foram, em alguns casos, divididos em diferentes contos pelos Irmos
Grimm. Depois de que a filha mais nova do rei, no conto nmero 1 da
compilao de 1857, jogou o sapo na parede e ele se transformou de volta
em um belo prncipe: Der war nun nach ihres Vaters Willen ihr lieber
Geselle und Gemahl (Ele se tornou ento, de acordo com a vontade do pai
da moa, seu amado companheiro e marido). Mas tambm h outras
verses que indicam que os bonitos olhos do filho do rei no prometiam
lealdade. Porm, a jovem filha do rei era o que se chamaria hoje de
emancipada e conseguia recuperar o seu noivo com coragem e esperteza
(Os doze caadores; Die zwlf Jger; KHM 67, 1857).
Em A Bela Adormecida (1857, p. 50), l-se que E, ento, o casamento do filho do rei com a bela adormecida ocorreu com muita pompa e
eles viveram felizes para sempre (Und da wurde die Hochzeit des
Knigssohns mit dem Dornrschen in aller Pracht gefeiert, und sie lebten
vergngt bis an ihr Ende). Diferentemente das verses em italiano (Basile)
e em francs (Perrault), que serviram como inspirao para a verso alem,
nessa verso, a histria acaba nesse momento. Porm, em suas notas
(BRDER GRIMM, 2001, v. 3, p. 269), os Irmos Grimm fazem referncia
a um texto nos fragmentos, o qual mostra que a vida de aventuras continua
depois do casamento.
A sogra malvada
Era uma velha e malvada rainha que, quando seu filho foi
guerra, mandou prender sua nora junto com seus dois filhos no
poro. Um dia, ela disse para o cozinheiro: V e mate uma das
crianas e prepare-a para mim. Eu quero com-la, Com que tipo
de caldo?, Com um marrom, disse a mulher malvada.
O cozinheiro no conseguiu ter a crueldade de matar a bonita
[
44 ]
O caminho para a compreenso de contos aparentemente conhecidos passa por interpretaes significativas, verses inteligentes e cuidadosas como as de Irving Fetscher ou as de Janosch e tambm por uma
integrao viva e ldica de contos de fadas e de seus motivos no mundo
atual. Diante desta situao, dou-me a licena de proferir a seguinte
mxima:
15
Es war eine alte bse Knigin, die lie , whrend ihr Sohn in den Krieg
gegangen war, ihre Schwieger samt ihren beiden Kindern in einen Keller
sperren. Danach sprach sie eines Tages zum Koch; geh und schlachte eins
von den Kindern und bereite es mir zu, ich will es essen, Mit was fr eine
Brhe?, Mit einer braunen, sprach das bse Weib.
Der Koch konnte es nicht bers Herz brungen, das schne Kind zu tten,
und die Mutter bat so flehentlich; da nahm er ein Schweinchen und
bereitete es zu, und die Alte a die Speise mit Begier.
Nicht lang darauf rief sie den Koch abermals und sprach das Kinderfleisch
schmeckt so zart, richte mir auch den andern Knaben zu. Mit was fr eine
Brhe?, Mit einer wei en sagte das Weib.
Der Koch that aber wie das erstemal und setzte ihr ein Spanferkel vor, das
sie mit noch grerer Lust verzehrte. Endlich will die Alte auch die junge
Knigin essen, der Koch schlachtet dafr aber eine Hirschkuh. Nun hat die
junge Knigin ihre Noth die Kinder vom Schreien abzuhalten, damit die Alte
nicht hrt, da sie noch am Leben sind.
[ 45 ]
Und sie hrten tglich ein Mrchen der Brder Grimm, und
eines schnen Tages konnten sie das ihnen zuvor so fremde
Deutsch verstehen und sogar sprechen.
E eles ouviram diariamente um conto de fadas dos Irmos Grimm
e, um belo dia, eles j conseguiam compreender e falar o alemo,
que era anteriormente to estranho para seus ouvidos.
46 ]
o... E morreu uma morte ruim. ( und starb eines bsen Todep. KHM, 9)
oE eles viveram por muito tempo felizes e satisfeitos (Und sie
lebten noch lange glcklich und vergngt. - KHM, 12)
oMeu conto acabou, ali est correndo um rato, quem peg-lo pode
us-lo para fazer um grande bon de pele. (Mein Mrchen ist aus,
dort luft eine Maus, wer sie fngt, darf sicht eine groe Pelzklappe
daraus machen. - KHM, 15)
oAbra a janela para que as mentiras voem para fora.(Mache das
Fenster auf, damit die Lgen hinausfliegen.; KHM, 159)
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
KINDER brauchen Mrchen. Institut fr Demoskopie Allensbach, 2003.
(Allensbacher Berichte, 12)
BETTELHEIM, Bruno. Kinder brauchen Mrchen, 30. Auflage, Mnchen:
Deutscher Taschenbuch Verlag, 2011.
BRDER GRIMM. Kinder und Hausmrchen. Die handschriftliche Urfassung von
1810, herausgegeben und kommentiert von Heinz Rlleke. Stuttgart:
Philipp Reclam, jun. 2007.
BRDER GRIMM. Kinder-und Hausmrchen. Heinz Rlleke (Ed.). Stuttgart:
Philipp Reclam, 2001. v. 1-3.
EHLERS, Swantje. Mrchen und Fremdsprachenlernen. DaF- Mitteilungen, v. 1,
p. 64-76, 2004.
FETSCHER, Iring. Wer hat Dornrschen wachgeksst? Das Mrchen-Verwirrbuch
und die Reportagen des Edlen von Goldeck von den drei MrchendeuterKongressen. Frechen: Komet, 2000.
GOETHE INSTITUT. Fachzeitschrift fr Deutsch als Fremd-und Zweitsprache.
Frhes Deutsch, Mnchen, v. 4: Mrchen mal Anders, Apr. 2005.
____________. Fachzeitschrift fr Deutsch als Fremd-und Zweitsprache. Frhes
[ 47 ]
48 ]
ANEXO
1. Pesquisa sobre os contos mais populares feita com entrevistados a
16
partir de 16 anos
Contos
Porcentagem
Schneewittchen
43
Branca de Neve
Hnsel und Gretel
43
Joo e Maria
Rotkppchen
27
Chapeuzinho Vermelho
Aschenputtel/Aschenbrdel
21
Cinderela
Dornrschen
17
Bela Adormecida
Frau Holle
14
Senhora Holle
Der Wolf und die sieben Geilein
12
O Lobo e as sete Cabritinhas
Rumpelstilzchen
10
Hans im Glck
9
Joo sortudo
Der gestiefelte Kater
8
O Gato de Botas
Schneeweichen und Rosenrot
7
Branca de Neve e Rosa Vermelha
Froschknig
6
O sapo rei
Bremer Stadtmusikanten
5
Os Msicos de Bremen
Das tapfere Schneiderlein
4
O Alfaiatezinho Valente
Die Sterntaler
2
As moedas-estrelas
16
Pas/Ano
RDA/1987
CIL / KHM
RFA/2008
RFA/2008
50 ]
11
Rapunzel
Das Tapfere Schneiderlein
O alfaiatezinho valente
Frau Holle
Senhora Holle
Rotkppchen
Chapeuzinho Vermelho
Die Bremer Stadtmusikanten
Os msicos cantores de Bremem
Tischlein deck dich
Mesinha, cubra-te!
Gevatter Tod
Morte madrinha
Dornrschen
Bela Adormecida
Knig Drosselbart
Rei Barba-de-Tordo
Knig Drosselbart
Rei Barba-de-Tordo
Schneewittchen
Branca de Neve
Schneewittchen
Branca de Neve
Die Goldene Gans
O ganso dourado
Die Prinzessin mit dem goldenen Stern
A princesa com a estrela dourada
Jorinde und Joringel
Jorinda e Jorindo
Die Gnseprinzessin
A princesa guradadora de gansos
Die zertanzten Schuhe
Os sapatos estragados de tanto danar
Die zertanzten Schuhe
Os sapatos estragados de tanto danar
Schneeweichen und Rosenrot
Rosa branca e rosa vermelha
[ 51 ]
RDA/1988
RFA/2009
RFA/2008
12
RFA/2008
24
RFA/2012
26
RFA/2009
27
RFA/2008
36
RDA/1980
38
RDA/1971
50
RDA/1965
52
RFA/2008
52
RDA/1961
53
RFA/1991
53
RDA/1964
64
URSS/1959
65
RDA/1986
69
RDA/1989
89
RDA/1977
133
RFA/2011
133
RFA/2012/FF
161
20
52 ]
KHM Titel
Der Froschknig oder der eiserne Heinrich
O prncipe sapo ou O Henrique de ferro
Der Wolf und die sieben Geilein
O lobo e os sete cabritinhos
Brderchen und Schwesterchen
Irmozinho, irmzinha
Rapunzel
Hnsel und Gretel
Joo e Maria
Von dem Fischer un syner Fru
Sobre o pescador e sua mulher
Das tapfere Schneiderlein
O alfaiatezinho valente
Aschenputtel
Gata borralheira
Frau Holle
Senhora Holle
Die sieben Raben
Os sete corvos
Rotkppchen
Chapeuzinho vermelho
Die Bremer Stadtmusikanten
Os msicos cantores de Bremem
Der Teufel mit den drei goldenen Haaren
O diabo com trs cabelos de ouro
Tischchendeckdich, Goldesel und Knppel aus dem Sack
Mesinha cubra-te, Asno de ouro e Porrete do saco
Daumesdick
Da grossura de um polegar
Der Gevatter Tod
A morte madrinha
Dornrschen
A bela adormecida
Knig Drosselbart
Rei barba de tordo
[ 53 ]
53
55
64
65
69
71
78
83
89
Sneewittchen
Branca de neve
Rumpelstilzchen
Die goldene Gans
O ganso dourado
Allerleirauh
Bicho peludo
Jorinde und Joringel
Jorinda e Jorindo
Sechse kommen durch die ganze Welt
Como seis homens se arranjaram no mundo
Der alte Grovater und der Enkel
O velho av e o neto
Hans im Glck
Joo sortudo
Die Gnsemagd
A guardadora de gansos
108
116
119
133
153
161
187
literatura infantojuvenil ocupa, ainda hoje, um espao de pouco reconhecimento no meio acadmico, fato que se justifica, em parte,
pelo vnculo com a transmisso de valores ideolgicos defendidos pela
sociedade em que foi produzida, colocando-se em questo o valor esttico
das obras frente ao vis didtico-pedaggico. Os contos dos irmos Jacob e
Wilhelm Grimm pertencem tradio e, embora apresentem cenrio por
vezes ligado ao ensino de valores morais, por outro:
Seu sucesso deve-se, de um lado, a esta extrema capacidade de
condensar, de forma mgica, na trajetria das aes das personagens, as mais inconscientes aspiraes e necessidades humanas e, de outro, a sua linguagem despojada de artificialismo e
expresses de cunho didtico-pedaggico. As narrativas visam ao
prazer e, se elas educam, porque trazem consigo a globalidade
da experincia humana. (AGUIAR, 1993, p. 30).
58 ]
60 ]
Quando dizemos 'feminino' nesse sentido, obviamente no estamos querendo dizer 'prprio de mulheres'. Estamos falando de qualidades interiores, psicolgicas, que so comuns aos homens e s mulheres (JOHNSON,
1997, p. 38).
O princpio feminino associa-se a aspectos ligados mais ao plano
emocional, assinalando qualidades que remetem ao sentimento, ao afeto,
sensibilidade, experincia intuitiva e lrica, ao inconsciente e
introspeco, ao sonho, primado de Eros. Em contrapartida, os atributos
masculinos aproximam-se da objetividade e da racionalidade, definindo-se
por habilidades ligadas ao, competio e conquista, ao poder de
comandar e controlar situaes, ao esprito de iniciativa, coragem, ao
intelecto, primado do Logos. Os estudos junguianos asseveram a
necessidade de harmonizar a riqueza de ambas as partes que, como opostos
complementares, equilibram a psique humana: Poder sem amor torna-se
brutalidade. Sentimento sem fora masculina torna-se sentimentalismo
adocicado (JOHNSON, 1997, p. 45).
62 ]
64 ]
66 ]
nome, como sabe do que deseja. Observa-se que, nos contos dos irmos
Grimm, a mediao mgica no repousa na atuao das fadas, ainda que a
personagem animal evidencie possuir os poderes desse ser sobrenatural,
como fazer previses e auxiliar o protegido no que ele necessita; o poder
outrora atribudo a essa personagem feminina humanizada desloca-se para
outras mos, de certa forma ofuscando o poder outrora atribudo s
mulheres, quando pensamos na sociedade cltico-bret, bero das fadas.
Para obter a ajuda da gata, Joo desloca-se para o castelo encantado
que ela possui. L, precisa servi-la por sete anos, realizando tarefas como
cortar lenha, roar o prado, construir uma casinha de madeira; em troca,
mora no castelo, recebe boa comida e bebida. Ao fim do prazo, Joo precisa
ainda confiar nas promessas da gata, que lhe pede para retornar ao moinho
sem o cavalo e com as pobres roupas que possua, aguardando por ela.
O desfecho na narrativa a vitria da personagem aparentemente
desqualificada. Pelo fato de Joo cumprir as tarefas pedidas, vencendo os
desafios que lhe foram apresentados, o encanto da gata se desfaz: ela uma
princesa e se casa com o fiel Joo. A ascenso do protagonista se d atravs
de casamento com princesa no por promessa paterna em troca de o heri
realizar alguma tarefa difcil, mas por desejo prprio da personagem
feminina, redimida graas ao do heri.
A histria termina com a seguinte frase: Depois disso, que ningum
diga que um tolo no pode se tornar uma pessoa importante. (GRIMM,
2005, p. 209). Neste conto, apesar de o heri ser considerado tolo, sai
vitorioso porque sua simplicidade permite-lhe dobrar-se s exigncias,
aprendendo a conviver com a alma feminina representada de forma
instintiva na figura animal da gata. Seus competidores, que dependem da
'esperteza' e ficam fixados na superfcie das coisas, revelam-se os verdadeiros tolos (BETTELHEIM, 1980, p. 131).
O feminino, representado pela gata, configura-se dotado de poder,
[ 67 ]
68 ]
70 ]
Concluso
Muitos so os prismas atravs dos quais se pode fixar o olhar quando
se focaliza os contos da tradio, que longe esto de oferecer um modelo
nico a seu leitor. Ainda que poca de produo das narrativas se exigisse
das mulheres comportamento de recato, silncio, submisso e bondade,
concernente dependncia que as cercava, algumas histrias desconstroem as ideias tanto de submisso feminina, quanto de centralizao de
poder e deciso da figura masculina. Por seu turno, nem todos os heris
atualizam os arqutipos que cercam a noo do masculino e a relao com a
anima, evidenciando tanto fragilidades, quanto deformaes perversas
da psique.
O percurso de leitura pelos trs contos revelam diferentes estratgias no encontro entre o feminino e o masculino, ora promovendo a integrao e a harmonia dos opostos, ora evidenciando a impossibilidade de
conciliao. Tal perspectiva refora a importncia dos contos dos irmos
[
72 ]
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
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SILVEIRA, Nise. Jung: vida e obra. Rio de Janeiro: Jos lvaro/Paz e Terra, 1976.
Experincia e imaginao
em Goethe
WILMA PATRCIA MAAS
polemizam com Newton no que diz respeito natureza das cores, que, para
Goethe, so antes produzidas pela percepo do observador do que por
alguma qualidade inerente ao objeto observado. Em um breve ensaio de
1793, intitulado A hiptese de Newton sobre a refrao diversa, Goethe
acusar Newton de ser autor de sofismas que beiram a desonestidade. (Por
trs vezes no mesmo texto, Goethe referir-se- teoria da refrao diversa como quimera (Schein), engano (Irrtum) e iluso teatral (knstliche
Darstellung) (GOETHE, WA, II, p. 173-176). Goethe, entretanto, no cita
Newton no ensaio sobre a mediao da experincia, que comentaremos
aqui. A aluso ao fsico ingls se faz de maneira indireta, quando Goethe
alude aos incontveis obstculos que podem colocar-se entre o cientista e
seu objeto de observao, provocando assim concluses equivocadas que
podem mesmo vir a se tornar leis cientficas. O termo Vermittler, mediador,
tem, portanto, no ttulo do ensaio de Goethe, a funo de fazer lembrar ao
cientista ou mesmo ao observador leigo que o acesso aos objetos do mundo
sensvel s se pode dar de maneira mediata, nunca imediata.
Goethe trata de estabelecer as condies necessrias para uma investigao objetiva dos fenmenos naturais. Estas, alm do equipamento
adequado, incluem uma capacidade do investigador que o torne apto a no
se deixar enganar por meio de um julgamento apressado dos resultados
obtidos. Goethe atribui essa tendncia do observador ao autoengano ou
autoiluso elaborao imediata de um juzo a partir da percepo emprica. Esta leva a uma representao (Vorstellung) subjetiva e errnea, prejudicial, porque guiada pela organizao mental de cada observador:
O homem se satisfaz mais com a representao do que com a
prpria coisa, ou dito de outro modo: o homem se satisfaz com
algo na mesma medida em que o representa para si mesmo. Um
tal objeto deve adequar-se a sua maneira de perceber o mundo, e
por mais que o observador seja capaz de elevar e apurar sua
capacidade de representao em relao ao senso comum, o
[
78 ]
Der Mensch erfreut sich nmlich mehr an der Vorstellung als an der Sache, oder wir
mssen sagen: Der Mensch erfreut sich nur einer Sache, in so fern er sich dieselbe
vorstellt; sie mu in seine Sinnesart passen, und er mag seine Vorstellungsart noch so
hoch ber die gemeine erheben, noch so sehr reinigen, so bleibt sie doch gewhnlich
nur ein Versuch, viele Gegenstnde in ein gewisses fliches Verhltni zu bringen,
das sie, streng genommen, unter einander nicht haben; daher die Neigung zu
Hypothesen, zu Theorien, Terminologien und Systemen, die wir nich mibilligen
knnen, weil sie aus der Organisation unseres Wesens nothwendig entspringen.
[ 79 ]
80 ]
81 ]
82 ]
Como afirma o prprio Goethe ao final do ensaio, seus Beitrge zur Optik so o
mais claro exemplo desse mtodo. Ali, as experincias com o prisma so repetidas, mas
ao mesmo tempo enriquecidas com variaes minuciosas, como a inverso da posio
das superfcies branca e preta dos cartes que refletem os raios de luz filtrados pelo
prisma de vidro. Diz Goethe: Nas duas primeiras partes das minhas Contribuies
tica, procurei alinhar uma sequncia de experimentos que determinam os limites
uns aos outros e mesmo aludem imediatamente uns aos outros; quando se conhece a
todos eles muito bem e deles se tem uma perspectiva ampla, pode-se dizer que eles
constituem em certa medida um experimento, representam apenas uma experincia,
sob os mais variados pontos de vista. (WA, 11, p. 33)(Ich habe in den zwei ersten
Stcken meiner optischen Beitrge eine solche Reihe von Versuchen aufzustellen
gesucht, die zunchst an einander grnzen und sich unmittelbar berhren, ja, wenn
man sie alle genau kennt und bersieht, gleichsam nur Einen Versuch ausmachen,
nur Eine Erfahrung unter den mannichfaltigsten Ansichten darstellen.)
23
Ich wage nmlich zu behaupten: da Ein Versuch, ja mehrere Versuche in
Verbindung nichts beweisen, ja da nichts gefhrlicher sei als irgend einen
Satz unmittelbar durch Versuche besttigen zu wollen, und da die grten
Irrthmer eben dadurch entstanden sind, da man die Gefahr und die
Unzulnglichkeit dieser Methode nicht eingesehen.
[ 83 ]
juzo. Esse o momento em que o observador pode ser assaltado por uma
srie de inimigos interiores, que contribuiro para a iluso e o engano:
Todo cuidado pouco frente ao riscos de tirarmos concluses
muito rapidamente a partir dos experimentos; pois na passagem da experincia ao julgamento, do conhecimento aplicao
que todos os inimigos interiores do homem esto espreita: a
imaginao, a impacincia, a pressa, a satisfao consigo mesmo,
a teimosia, o modo de pensar, os pr-julgamentos, o comodismo,
a leviandade, a instabilidade de nimo, como quer que se nomeie
o bando todo com suas consequncias, todos esto por trs e
observam imperceptivelmente tanto o homem do mundo quanto
o observador tranquilo e aparentemente a salvo das paixes
mundanas24. (WA, 11, p. 27-28).
Man kann sich daher nicht genug in Acht nehmen, aus Versuchen nicht zu
geschwind zu folgern: denn bei'm bergang von der Erfahrung zum Urtheil, von
der Erkenntni zur Anwendung ist es, wo dem Menschen gleichsam wie an
einem Passe alle seine inneren Feinde auflauern, Einbildungskraft, Ungeduld,
Vorschnelligkeit, Selbstzufriedenheit, Streifheit, Gedankenform, vorgefate
Meinung, Bequemlichkeit, Leichtsinn, Vernderlichkeit, und wie die ganze
Schaar mit ihrem Gefolge heien mag, alle liegen hier im Hinterhalte und
berwltigen unversehens sowohl den handelnden Weltmann als auch den
stillen, vor allen Leidenschaften gesichert scheinenden Beobachter.
[
84 ]
86 ]
88 ]
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
CLEMENT, C. "Offenbares Geheimnis" oder "geheime Offenbarung"? Goethes
Mrchen und die Apokalypse. Goethe Yearbook, v. 17, p. 103-127, 2010.
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SULLIVAN, H. I. Seeing the Light: Goethe's Mrchen as Science Newton's
Science as Fairy Tale. Goethe Yearbook, v. 14, p. 103-127, 2006.
2.
1.
O mundo encantado
de Goethe
MAGALI MOURA
92 ]
terica, o que tenta ser resolvido de forma inaugural no sculo XX por estudos como os de H.P. Lovecraft (Supernatural Horror in Literature, 1927) e
Vladimir Propp (Morfologia do conto fantstico, 1928). Essas investigaes
desdobraram-se em outros estudos tericos ao longo do sculo XX como
os de Sartre (Situaes I, 1947), de Peter Penzoldt (The supernatural in
ficcion, 1952) e de Tzvetan Todorov (Introduo literatura fantstica,
1970), levando a redefinies e interpretaes acerca do gnero fantstico.
A lista se adensa no final do sculo e chega at o atual. Esse fato nos leva
constatao de que a magia ficou restrita ao mbito das artes e de alguns
crculos religiosos e alternativos, ficando absolutamente de fora do pretenso discurso cientfico, cuja base se encontra justamente no momento para
onde pretendo levar a discusso.
Como mencionado inicialmente, o tema do fantstico e do sobrenatural aflora de modo pujante em produes cinematogrficas e televisivas,
em jogos de computadores e videogames e em livros que se dedicam a
contar histrias de magos e seres maravilhosos com enorme sucesso de
vendas. Um tal vigor e apreo pode ser encontrado h cerca de 200 anos,
quando o maravilhoso e o irracional adquiriu contornos programticos e
significou uma revoluo no modo de se fazer literatura. Distante de mera
diverso, a aluso ao no puramente racional tinha uma funo social e
libertria, poder-se-ia dizer, poltica. Deste modo, chegamos chamada
poca de Goethe, tempo no qual o discurso cientfico ainda no havia sido
entronado como nica possibilidade de enfrentamento e investigao do
real e, portanto, adjudicava-se ao discurso literrio um papel de suma
importncia nas revolues polticas.
Para se ter uma breve ideia da intensidade da mudana implementada naqueles tempos, basta que se faa a seguinte observao: Goethe
nasce em um mundo, no qual ainda perambulavam alquimistas a servio de
quem acreditava alcanar riquezas fceis por esse meio, e o deixa em um
[
94 ]
96 ]
Este o ponto sobre o qual chamo ateno por ele ser utilizado
sculos mais tarde como o contraponto fundamental lgica racionalista da
tradio literria do sculo XVII, direo unvoca contestada por alguns
crticos nos oitocentos e que ruma para a entronizao de seu contrrio, o
predomnio do irracional nos romnticos, posio esta que se torna quase
26
A tematizao deste conceito em sua ligao com o maravilhoso foge ao escopo deste
trabalho apesar de ser de suma importncia. Ser alvo de estudo posterior.
[ 97 ]
98 ]
100 ]
102 ]
capacidade imaginativa (Einbildungskraft). Desta forma, surge a possibilidade de recriao do mundo e de suas leis, tanto poticas como polticas:
Como o mundo presente no precisa ser necessariamente da
forma como ele est organizado, de tal maneira que no pudesse
ser de outra forma, justamente assim so possveis muitos outros
mundos, tal como a natureza e a ordem das relaes presentes
podem ser mudadas. Dessa forma, todos esses incontveis sistemas de mundo esto submetidos ao poder da imaginao. Ela o
produz por meio de uma fora mais do que mgica, embora no o
seja, a partir do rol das possibilidades (e) transmitindo-lhe a
aparncia de realidade. (BODMER, 1471, p.13; grifo meu).
104 ]
esclarecedor, havia um outro em paralelo que teimava em persistir e perpetuar o obscuro, o velado, o secreto um movimento escurecedor, a iluminar atravs das sombras, longe da pretenso de obscurecer e tornar o mundo ilegvel. A meu ver, essa poderia ser tambm a descrio de nossa poca.
Como exemplo disso, mencionemos aqui brevemente alguns exemplos. O primeiro a tragdia que se abate sobre a herona Emlia Galotti do
drama homnimo de Lessing (1772). Emlia que teria todas as condies de
ter um futuro tranquilo e feliz, acaba por se decidir pela morte por se ver
incapaz de dominar seus desejos e, assim, no realizar plenamente um
ideal de cultura baseado no primado da virtude e da razo. Nesse mundo
no havia lugar para as razes do desejo, oriundas do mago da alma.
Outro exemplo do poder da alma pode ser dado atravs dos quadros
de Johann Heinrich Fssli (1741-1825), em especial pelas imagens relacionadas a cenas descritas na literatura, em aluso sobretudo aos livros de
John Milton e Shakespeare. Nascido na cidade de Zurique, no ano seguinte
no qual Bodmer lanara seu fundamento acerca do maravilhoso na literatura, Fssli expressa em seus quadros esses recnditos da alma que a
literatura alem da Empfindsamkeit (Sensibilidade) e do Sturm und Drang
comeava a expressar. Este quadro, O fantasma da noite (Der Nachtmahr,
1782) considerado como referncia central em sua obra. Causou um
grande escndalo quando apresentado na exposio da Royal Academy,
referendando o epteto, The wild Swiss, com o qual Fssli era conhecido
em Londres. Para l se mudara aps uma longa estada em Roma onde se
deteve a aprender as tcnicas dos grandes mestres renascentistas da
pintura, principal-mente Michelangelo. Migrou para a ilha britnica a fim
de usufruir da atmosfera pretensamente mais moderna e livre que se
experimentava por l em comparao com outras cercanias na Europa.
Esta pintura caracteriza-se por uma forte atmosfera ertica criada
pela conjuno entre as figuras representadas. As vestes brancas da mulher
[ 105 ]
106 ]
William Blake. The Lovers' Whirlwind, Francesca da Rimini and Paolo Malatesta.
[ 107 ]
108 ]
110 ]
do que ao exerccio da razo. Assim caracteriza o filsofo os tempos primordiais em seu Ensaio sobre a origem das lnguas:
As paixes reaproximam os homens que a necessidade de encontrar meios para a sua subsistncia tinha dividido. No foram nem
a fome, nem a sede mas sim o amor, o dio, a piedade ou a clera
que pela primeira vez soltaram a fala dos homens. (Rousseau,
apud DOBRANSZKY, 1994, p. 122).
112 ]
114 ]
116 ]
118 ]
Goethe inaugura uma nova forma de se fazer literatura, uma literatura de sucesso popular e reconhecida por seus pares. As letras germnicas dialogam a partir de ento de igual para igual no cenrio europeu.
No h mais modelos a serem imitados, chegara o momento das trocas. O
caminho para a modernidade literria em solo germnico estava aberto,
rumando para a realizao dos chamados Kunstmrchen (contos artificiais,
inventados) uma nova forma de encantamento. No se poderia mais a
partir de ento pensar literatura como simples fruto da inteligncia humana, ela deveria se abrir para abrigar o humano e, assim, encantar.
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
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clssica. Introduo de Roberto de Oliveira Brando. Traduo do grego e do
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ROSENFELD, Anatol. Introduo. Da Ilustrao ao Romantismo. In: Autores prromnticos alemes. So Paulo: EPU, 1991.
[ 119 ]
longo do tempo, para o descrdito desse discurso. Por esta razo, embora
Goethe tenha escrito os Mrchen (1795), fantasia de pura imaginao que
desempenha um papel fundamental para o nascimento do Romantismo,
este faz questo de delimitar a diferena entre a literatura tradicional e os
Mrchen, simples contos de fadas. ento nesse quadro de referncias que
autores como Ludwig Tieck e Achim von Arnim (1781-1831) comeam a
misturar as duas literaturas o srio e o conto de fada, ensejando aquilo que ser nomeado posteriormente de gnero fantstico.
Passemos agora a um breve histrico, apenas para situar Ludwig
Tieck no contexto do Romantismo alemo. Quando F. Schlegel veio a
instalar-se em Berlim, no vero de 1797, o centro de gravidade dessa primeira fase do Romantismo deslocou-se provisoriamente de Iena para a
capital. E foi a que surgiu a revista Athenum e tambm a que
publicada a obra Lucinda, em 1799, causando escndalo na poca. No
entanto, o grande momento da cidade de Iena ainda estava por chegar, pois,
com a volta de Schlegel e a vinda de Ludwig Tieck, formava-se um ncleo
geogrfico importante, ao qual vieram a juntar-se Novalis e Schelling,
professor de filosofia da Universidade de Jena (BEHLER, 1996).
A unidade de pensamento e o equilbrio de ideais do grupo de intelectuais alemes revela-se precrio e sofre ao longo do tempo transformaes importantes, com reflexos imediatos naquilo que se entende por
literatura, suas configuraes genricas e sua funo social. O primeiro F.
Schlegel muito diferente do autor da maturidade, convertido ao catolicismo e bem-situado na vida. Se Clemens Brentano e F. Schlegel tornam-se
catlicos posteriormente, Ludwig Tieck, por seu turno, permanece
refratrio reconverso. Os mais ilustres nomes vinculados ao movimento
Sturm und Drang sero mais tarde canonizados como fundadores do que se
pode designar como Classicismo na Alemanha, como mais um dos inmeros aspectos contraditrios dos quais se reveste o movimento romntico.
[
124 ]
[ 125 ]
31
126 ]
predestinado de maneira eterna aos desdobramentos que lhe foram prprios32. (GUSDORF, 1993, v. 1, p. 14).
Assim, os intelectuais alemes tiram benefcio da abertura da
cultura universitria no pas e aproveitam para associar o campo
das letras reflexo filosfica e teolgica. diferena do que
ocorre na Frana, a sntese cultural surge como a encruzilhada de
influncias que se enriquecem mutuamente. No entanto, o
excesso de filosofia na poesia alem tambm pe em risco a
criao. Por isso, conforme assinala Antoine Berman, para a maioria dos romnticos de Iena, os escritos literrios no chegam a
ultrapassar o patamar da pura experimentao. Trata-se, como diz
Berman, de um espao de obra, porm dotado de uma intensa
reflexo sobre a obra ausente, desejada ou ainda por vir33, e,
acrescenta ele, no so obras, mas sim formas de escritura que
mantm uma relao muito profunda, mas tambm muito nostlgica, com a obra em si34 (BERMAN, 1984, p. 114-5). E Ludwig
Tieck sintetiza a distncia entre a teoria e a prtica, bem como o
abismo que se abre entre o desejo e sua realizao para captar
em uma soma aquilo que se apresenta dividido, fragmentado e
inconcluso:
O romantismo um caos a partir do qual haver a necessidade de
que saia da uma certeza, se podemos nos expressar desse modo.
32
Le romantisme est un chaos, partir duquel il faudra bien que sorte une
certitude, si lon peut sexprimer ainsi. Tous mes projets se perdent
toujours davantage dans une immensit informe.
36
la philosophie est la lettre de lintelligence, une criture morte lorsque
lhomme ne finit pas par se placer lui-mme au-dessus de toute philosophie
et de tout systme, mme au-dessus du systme de labsence de systme.
[
128 ]
Destacando seu gosto acentuado pelo sonho, Albert Bguin reconhece em Ludwig Tieck (1773-1853) o primeiro pintor da natureza romntica, assim como o primeiro escritor a evocar as fantasmagorias secretas de
um sujeito nico, matriz onde gestado o modelo do heri romntico e,
particularmente, aquele que vai inspirar a literatura fantstica:
Tudo est submetido a meu bel prazer; eu posso dar os nomes
que quiser a todos os fenmenos, a todos os atos. Minha vida
inteira um sonho cujas figuras nascem conforme meu desejo.
37
Eu mesmo, sou a nica lei da natureza e tudo obedece a essa lei .
(TIECK, William Lovell, apud BEGUIN, 1991, p. 304).
Tout est soumis mon bon plaisir; je puis donner les noms que je veux tous les
phnomnes, tous les actes. Ma vie entire est un rve dont les figures naissent selon
que je le veux. Moi-mme, je suis lunique loi de la nature, et tout obit cette loi.
[ 129 ]
Esto a colocados os ingredientes para uma das temticas recorrentes da literatura fantstica, ou seja, o curto-circuito do heri consigo
mesmo e da sua subjetividade em confrontao com o mundo. Conforme se
pergunta o protagonista de um de seus contos: Por que preciso que o
homem transporte incessantemente, carregando-o no seu interior, um
39
inimigo irreconcilivel que jamais para de atorment-lo? (TIECK,
Abdallah apud BRION, 1962, v. I, p. 248).
Tieck, a exemplo de outros alemes, vai buscar inspirao em contos
antigos e, profuso de imagens povoadas de fantasia rica e desenvolta, ele
mistura um profundo senso de ironia, sutilmente presente nas sucessivas
metamorfoses e prodgios de seus personagens, que do mostra da total
liberdade de imaginao que o movia a escrever. A obra A vida do ilustre
Imperador Abraham Tonnelli, por exemplo, tem como subttulo Autobiografia em trs partes, o que, por si s, j anuncia o tom parodstico que
38
Tout se transforme, rien ne dure; nous ne sommes que parce que nous
changeons constamment, et nous ne pouvons comprendre comment une
existence immuable pourrait encore sappeler une existence (...). Tout ce qui
nous entoure nest vrai que jusqu un certain point.
39
Pourquoi faut-il que lhomme transporte sans cesse, portant, lintrieur de
lui-mme, un ennemi irrconciliable qui ne sarrte jamais de le tourmenter? .
[
130 ]
Toutes les choses taient fondues dans lor et la pourpre les plus suaves, les cimes
des arbres taient baignes des rayons du couchant, une lumire trs douce tait
pandue sur le champ, les feuillages taient immobiles, le ciel en sa srnit semblait
tre un paradis ouvert, le murmure des sources, auquel se mlait parfois le frmissement
des arbres, passait dans le pur silence comme laccent dune joie mlancolique.
[
132 ]
Ne tenez pas mon rcit pour un conte, aussi trange quil puisse vous paratre!
[ 133 ]
Me rapportes-tu mon oiseau? mes perles? mon chien? lui cria-t-elle. Tu vois bien, le
mal a en lui-mme son chtiment; ton ami Walther, ton cher Hugo ntaient autres
que moi-mme. Dieu du ciel! murmura Eckbert part lui; dans quelle effroyable
solitude ai-je pass ma vie! Et Bertha tait ta soeur! Eckbert tomba terre.
Pourquoi ma-t-elle trahie et quitte? sans cela, tout et bien fini, son temps
dpreuve tait pass. Elle tait la fille dun chevalier qui la faisait lever chez un
ptre, la fille de ton pre. Pourquoi ai-je toujours t effleur de cette odieuse
pense? scria Eckbert. Parce quun jour, dans la toute petite enfance, tu entendis
ton pre en parler; cause de son pouse, il ne pouvait faire lever cette fille sous ses
yeux, car elle tait lenfant dune autre feMme. Eckbert gisait terre, hagard et
agonisant; sourdement, confusment, il percevait les paroles de la vieille, les
aboiements du chien, et la chanson que rptait loiseau.
[
134 ]
Hay, pues, que pensar que el objeto mediador desempea su funcin especfica en el
relato fantstico por el hecho de que se trata de un relato en el que se da un desnivel
de planos de realidad, tal, que el paso entre los mismos no est previsto por el cdigo,
quedando, as, intensamente marcado por un efecto umbral; y en el que el objeto
mediador atestigua una verdad equvoca porque inexplicable, e increble quia inepta.
[ 135 ]
136 ]
consciente e inconsciente e procurou penetrar pelo vis de seus personagens no mistrio da segunda existncia que acompanha em surdina
nossa vida cotidiana, provocando o surgimento de imagens e emoes
inexplicveis (BGUIN, 1991, p. 295).
O conto Eckbert, o Loiro evoca o tema do retorno de lembranas infantis e do pas natal, sem contudo chegar aos monstros e aos perigos apontados mais tarde por Hoffmann. Estas lembranas, que povoam o inconsciente, se revestem de um carter ambguo: ao mesmo tempo em que representam o lugar da acolhida e da proteo, so tambm o lugar de angstias indizveis que alimentam o medo metafsico de pulses incontrolveis.
H instantes em que um ser que conhecemos h muito tempo
pode nos assustar, s vezes at ao terror: uma gargalhada, por
exemplo, chega diretamente ao corao, e ns nunca o tnhamos
visto rir assim (...) Nosso instinto sente ento que existe nesse
ser alguma coisa contra a qual devemos nos resguardar45. (TIECK
apud BGUIN, 1991, p. 297).
Nous ne savons mme pas combien de sens nous avons. Sur les sens grossiers du
corps, tout le monde saccorde. Mais... la force du sentiment, - la facult dvoquer
immdiatement ce qui est invisible, lointain, obscurci par un long oubli, - le
pressentiment, - les tranges pouvantes qui font se hrisser les cheveux et se
contracter la peau, - le subtil frmissement de certaines sensations o se marient le
plaisir et lhorreur: toutes ces ractions sensibles, et bien dautres encore, quest-ce,
sinon justement des sens, mais situs dans une couche plus profonde de nous-mmes;
sils ne sont pas toujours en activit, leur pouvoir nen est que plus efficace.
45
Il est des instants o un tre que lon connat depuis trs longtemps peut vous
effrayer, parfois jusqu lpouvante: un clat de rire, par exemple, lui vient tout droit
du coeur, et nous ne lavions jamais entendu rire ainsi [...] Notre instinct sent alors
quil y a dans cet tre quelque chose dont nous devons nous garder.
[ 137 ]
138 ]
aos noivos, trazem ento o clice dos grandes dias, passando-o entre
todos os convivas reunidos mesa. Contudo, a me da noiva surpreende a
todos por no conseguir beber o vinho. Por outro lado, esta tambm fica
confusa ao ouvir o estranho personagem pronunciar o nome Francisca, ao
levar o clice boca.
Ao final do banquete, Ferdinando permanece sozinho com a velha
senhora e, ao contarem suas histrias, descobrem que foram os antigos
amantes de juventude e que a vida havia separado por conta de um malentendido, somente agora desfeito. Tarde demais, e Ferdinando reconhece
ambiguamente que, a maneira pela qual ns nos perdemos e nos reencontramos faz lembrar uma histria terrvel de bruxaria46. De fato, ao fim
do relato, o leitor se pergunta pelos motivos reais que teriam contribudo
para a separao dos dois jovens: um feitio fabricado ardilosamente para
afastar os amantes e enganar um apaixonado? ou um feitio real elaborado por um alqumico? Os dois que sofreram a ao do acontecimento
sem que pudessem agir sobre ele so os inocentes que pagaram como se
fossem culpados, instalando aquilo que Paul Ricoeur denomina o trgico
da inocncia punida47, em oposio prtica justicialista do Sobrenatural.
Estamos ento face a uma posio intermediria entre a aceitao no problematizada do prodgio caracterstica do maravilhoso e a gradao heurstica do fantstico verdadeiro.
Foi por causa de sua falta que ele perdeu o direito felicidade
vislumbrada no sonho, e sua viso, outrora cheia de beleza, acaba transformando-se em imagem grotesca como retrato da realidade. O sonhador
desperta, como um melanclico desfecho da histria, onde o grotesco das
duas figuras se impe com toda sua carga desestruturadora e desmisti46
140 ]
Qualquer que seja o ponto de vista adotado, os textos de Tieck marcam a dificuldade de poetizao do real e a utopia do sonho romntico, que
se transforma em pesadelo por conta dessa incompatibilidade. Longe do
universo gtico ou frentico que j povoavam as histrias de fantasmas
do final do sculo XVIII, os contos fantsticos que aqui enfocamos se
revestem de uma dimenso crtica que vm problematizar as certezas e os
valores herdados da Aufklrung. A denncia de um mundo percebido como
perverso e desumano, que age sobre o destino dos heris e prolonga o
conflito do bem e do mal para dentro da alma das personagens, tal como em
Isabela do Egito, de Achim von Arnim, d lugar expresso angustiada de
um sujeito, s voltas com sua prpria identidade. Embora Ludwig Tieck seja
reconhecido como o legtimo fundador da novela fantstica alem, aquilo
que sugerido por ele em sua temtica encontra sua expresso mais acabada na obra fantstica de E.T.A. Hoffmann, que fixa definitivamente o gnero na tradio literria, garantindo-lhe um longo e instigador percurso.
49
Avec ce conte, le pote voulait avant tout se procurer une transition vers la seconde
partie, dans laquelle le rcit schappe constamment de la ralit la plus ordinaire
pour courir au merveilleux le plus tonnant, et o chacun de ces deux mondes
sexplique et se complte par lautre. [...] Par ce moyen, le monde invisible
restait en perptuel contact avec notre monde sensible.
[
142 ]
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
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Paris: Gallimard, 1983.
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Seuil, 1985.
SCHLEGEL, Friedrich. O dialeto dos Fragmentos. Trad. de Marcio Suzuki. So Paulo:
Iluminuras, 1997.
TIECK, Ludwig. In Les Romantiques allemands, vol. I e II. Trad. e Prefcio de Andr
BABELON. Paris: Grasset, 1933; Pandora Essais, 1978.
[ 143 ]
m uma perspectiva metodolgica, pretende-se demonstrar o desenvolvimento da leitura e da escrita, partindo do estudo de contos de
fadas como estratgia de desenvolvimento da proficincia discursiva dos
estudantes no ensino bsico. A anlise proposta est centrada no desvendamento dos recursos lingusticos que compem a macroestrutura textual,
bem como daqueles elementos da microestrutura, estabelecendo a estreita
ligao entre leitura, escrita e anlise lingustica.
146 ]
Pressupostos bsicos
Lingusticos
O desenvolvimento da capacidade de leitura visto como foco de
investigao do emprego de competncias e de habilidade de linguagem.
A leitura concebida como processo complexo e abrangente de compreenso, de produo e de atribuio de sentidos que faz rigorosas exigncias ao crebro, memria e emoo. Por isso, mais do que mera
decodificao. um processo contnuo e progressivo que se desenvolve ao
longo da vida. Para participar plenamente do mundo do letramento, o
indivduo deve desenvolver habilidades variadas, complexas, diversas.
Estas habilidades vo do domnio do cdigo e dos instrumentos competncia comunicativa e interacional de atuao nas mltiplas prticas
sociais que vo sendo constitudas, historicamente.
A leitura constitui uma das prticas de letramento dentro de um
conjunto de prticas sociais que usam a escrita, na perspectiva de um
sistema simblico e enquanto tecnologia, em contextos especficos, para
objetivos especficos. Entende-se, portanto, que o conceito de linguagem
pressupe Sujeitos que interagem no processo de comunicao. dessa
perspectiva que advm a importante funo da escola, qual seja o desenvolvimento da competncia discursiva dos estudantes.
[
148 ]
Literrios
Somente na segunda metade do sculo XVII manifesta-se, abertamente, a preocupao com uma literatura voltada para crianas e jovens.
[ 149 ]
150 ]
Os Contos de Grimm
No preciso acentuar a grande importncia que os Irmos Grimm
tiveram para a Alemanha e para o mundo no que concerne a sua obra literria de carter popular, oral, voltada para o pblico infantojuvenil. Dife[ 151 ]
152 ]
154 ]
CONTOS DE FADAS
FBULAS
NARRATIVA DE AVENTURA
Situao Inicial
Desfecho
(reequilbrio)
Complicao
(desequilbrio)
Tentativas
de soluo
(de equilbrio)
Clmax
Essas cinco partes estruturam o fluxo da sequncia narrativa. A situao inicial sempre alegre, positiva, brilhante, feliz, em que o protagonista apresentado, em uma situao a que podemos denominar de
equilbrio; a complicao, momento em que a situao problema apresentada, representa o surgimento do mistrio a ser vencido pelo heri,
[
156 ]
desses personagens. Impera um protagonista bom, virtuoso, afvel, suave, etreo, mrtir, pois sofre, sem reclamar, submisso s
provas que o levar felicidade eterna. Em geral, essas so as caractersticas dos personagens femininos; aos masculinos, cabem as
caractersticas da coragem, do destemor, da resistncia, da inteligncia, do sentimento varonil, do amor intenso. Em contrapartida,
o ncleo do antagonista est marcado por um campo semntico
negativo que revela suas maldades. Portanto, o antagonista feio,
capaz de atrocidades, invejoso, sente raiva, astucioso, capaz de planejar coisas vis para atingir a seus objetivos. Essas caractersticas se
manifestam tanto do ponto de vista fsico quanto do ponto de vista
psicolgico.
Assim, podem ser visualizados abaixo dois campos semnticos opositivos que caracterizam a viso maniquesta, estruturante do gnero, contos de encantamento.
PROTAGONISTA
ANTAGONISTA
Protagonista
Bom, modesto, puro,
obediente, recatado,
(principalmente, os
personagens femininos);
Vigor sco, corajoso,
determinado,
hones dade (personagens
masculinos).
mau, feio na
aparncia,
prepotente,
astcia voltada
para o mal,
vaidade,
soberba,
ambio
nega va.
158 ]
[ 159 ]
Exemplo 1:
Era uma vez uma menina to doce e meiga que todos gostavam
dela. A av, ento, a adorava, e no sabia mais que presente dar
criana para agrad-la. Um dia, ela presenteou-a com um
chapeuzinho de veludo vermelho. O chapeuzinho agradou tanto
a menina e ficou to bem nela, que ela queria ficar com ele o
tempo todo. Por causa disso, ficou conhecida como Chapeuzinho
Vermelho.
Um dia sua Me lhe chamou e lhe disse: [...]
(Chapeuzinho Vermelho Irmos Grimm)
O narrador-observador sabe o que ocorre na histria e apresenta ao leitor o personagem, a situao inicial equilibrada, ambiente agradvel, harmonioso, caracterstica aconselhvel ao viver
cotidiano. testemunha das aes ocorridas, por isso pode levar o
leitor primeira interlocuo entre me e filha, personagens da
narrativa. Essa conduo ao discurso direto so sempre introduzidas pelos verbos discendi.
Exemplo 2:
Sua av morava no meio da floresta, distante uma hora e meia da
vila.
Logo que Chapeuzinho entrou na floresta, um Lobo apareceu na
sua frente.
Como ela no o conhecia nem sabia que ele era um ser perverso,
no sentiu medo algum.
(Chapeuzinho Vermelho Irmos Grimm)
160 ]
Exemplo 3:
O Lobo pensou consigo: "Esta tenra menina um delicioso
petisco. Se eu agir rpido, posso saborear sua av e ela como
sobremesa.
(Chapeuzinho Vermelho Irmos Grimm)
162 ]
Ressalte-se que so elementos que estabelecem relaes lgicas da mesma natureza, nesse caso, semanticamente temporais.
A funo discursiva, entretanto, que muda, dependendo da localizao no pargrafo, podendo ser mais localizado, estabelecendo
relaes mais pontuais, ou mais abrangentes, estabelecendo relaes em nvel da macro estrutura.
Consideraes finais
No dizer de Trouche (2006, p. 144), a leitura como atividade pedaggica requer do professor uma experincia como leitor capaz de permitir
uma orientao segura a seus alunos, para que sejam leitores menos ing[
164 ]
[ 165 ]
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
COELHO, Nelly Novaes. Panorama Histrico da Literatura Infantil/ Juvenil Das
origens indo europeias ao Brasil contemporneo. 3. ed. refundida e ampliada. So Paulo: Quron, 1985.
ESTES, Clarisse Pinkola. Contos dos Irmos Grimm. Traduo de WylesLiv. So
Paulo: Rocco Editora, 2011.
IRMOS GRIMM. Contos Comerciais Infantis e domsticos (1812-1815).
Traduo de Christine Rhrig. So Paulo: Editora Cosac Naif, Apoio Instituto
Goethe, 2012.
KOCH, Ingedore. Desvendando os segredos do texto. 2. ed. So Paulo: Cortez,
2002.
Das Volksmrchen ist ein von Mund zu Mund weitergegebenes Werk der
epischen Dichtung, vornehmlich der Prosadichtung, verschiedenen
Charakters (Zauber-, Abenteuer-, Alltagsmrchen), dessen Ziel die
Darstellung eines erfundenen Inhalts ist.
54
Utilizo o conceito lnguas adicionais na acepo de lngua estrangeiras.
[
170 ]
172 ]
tegido e desenvolvido'. Os estudos literrios tm vrias finalidades educativas, intelectuais, morais e afectivas, lingusticas e
culturais e no apenas estticas. (CoE, 2001, p. 89).
174 ]
Verstehen ist kein passives Aufnehmen von Information, sondern ein aktiver Prozess, in
dem die Lernenden eigenes Wissen, eigene Lese- und Verstehensstrategien einsetzen.
[ 175 ]
O protocolo deste chat pode ser acessado na pgina do Instituto Goethe atravs do
link http://www.goethe.de/lhr/prj/mac/msp/de2148236.htm.
59
Es gibt keine zu schwierigen Texte, sondern nur zu schwierige Aufgaben.
[
176 ]
178 ]
Consideraes finais
Nos livros didticos, de forma geral, observa-se que so os contos
de fadas mais conhecidos do pblico em geral, como Chapeuzinho Vermelho, Branca de Neve e os Sete Anes, Joo e Maria, por exemplo, que so
apresentados nesses livros. Isso se deve ao fato de se levar em considerao
o conhecimento prvio do aprendiz, pois ao apresentar textos que com
temticas que j so de conhecimento do aprendiz-leitor, a leitura e a compreenso textual sero facilitados.
H que se comentar ainda, no entanto, que no trabalho com os
contos de fadas e textos literrios na aula de LA, percebe-se ainda uma
tendncia do uso desses tipos de texto como pretexto para se ensinar
estruturas gramaticais. No exemplo observado no livro Eurolingua Deutsch
2, na lio 9 que tem Mrchen (Contos de Fadas) como tema , o conto de
Chapeuzinho Vermelho aparece integrado com os seguintes objetivos de
aprendizagem: 1) trabalhar um texto literrio (einen literarischen Text
erarbeiten); 2) falar sobre contos de fadas (ber Mrchen sprechen); 3)
narrar um conto de fadas (ein Mrchen erzhlen) e 4) pretrito: verbos
irregulares (Prteritum: unregelmige Verben). V-se que o nico objetivo
no o ensino dos verbos irregulares no pretrito atravs dos contos de
fadas, mas tambm um objetivo, atravs do texto.
Apesar dos contos de fadas serem um gnero textual originalmente
de cunho oral, na aula de LA estes textos so, geralmente, apresentados na
forma de texto escrito. Sendo assim, os contos de fadas precisam ser
tratados como textos escritos. preciso que sejam propostos exerccios
antes da leitura, para que os conhecimentos prvios do aprendiz sejam
ativados; exerccios durante a leitura, para dar suporte ao trabalho de
leitura, possibilitando uma compreenso mais detalhada do texto e
exerccios depois da leitura, para que o que foi aprendido a partir do texto
[ 179 ]
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
BISCHOF, Monika; KESSLING, Viola; KRECHEL, Rdiger. Landeskunde und
Literaturdidaktik. Berlin: Langenscheidt, 1999.
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FULGNCIO, Lcia; LIBERATO, Yara. Como facilitar a leitura. 8. ed. So Paulo:
Contexto, 2004.
FUNK, H.; KOENIG, M. Eurolingua Deutsch 2. Berlin: Cornelsen Verlag, 2006.
180 ]
[ 181 ]
ANEXO
Figura 1
182 ]
Figura 1
[ 183 ]
Figura 3
184 ]
Magias e encantamentos
fabulaes germnicas
do passado
LVARO ALFREDO BRAGANA JNIOR
de Zaubersprche frmulas encantatrias - oriundas do espao germanfono continental e anglfono, mister que partamos de uma discusso
prvia, porm sucinta, sobre magia, encantamento e religiosidade.
188 ]
As Zaubersprche interfaces
entre paganismo e cristianismo
No mundo germnico, o termo Zaubersprche engloba os encantamentos,(charms, em ingls). Entretanto, uma outra categoria as Segen
(bnos) s vezes erroneamente incorporada como uma tipologia de
encantamentos, o que j fora apontado por Bacon (1952, p. 225). Evidentemente, a questo de um sincretismo de prticas pags germnicas com os
rituais cristos usados aflora, a partir do momento em que no sculo VIII
64
Carlos Magno lega Igreja a misso de unir e manter coeso seu imprio. As
zonas de interface entre a oralidade pag e a escritura crist comeam
indubitavelmente a se afigurar. As frmulas de encantamento, com seu
teor de crena mgica e rituais orais e gestuais, prestam-se a propagar a f
em Cristo.
Esse processo de incorporao e adaptao das tradies germnicas
66
ligadas ao mundo dos deuses estende-se no continente e nos reinos anglosaxes da Inglaterra do sculo VIII ao XI. Nesse recorte espao-temporal
coletamos dois corpora de frmulas, que, embora incompletos, passamos a
67
listar :
Encantamentos em
Antigo-Ingls
Encantamentos em
Antigo-Alto-Alemo
Encantamento de defesa
Para um cavalo manco
nove ervas
pontada
cavalo
66
190 ]
Contra paralisia
atrasado
Contra exostose
aqutico
de abelhas
Contra vermes
de gado # 2
viagem
Encantamento 12: Contra um quisto
192 ]
suister,
conda:
lidirenk:
dos membros
194 ]
ameldodest,
revelou,
onflyge,
peonha,
lond fr.
sobre a terra.
71
cwene reodan,
fnrdon.
lombescyrse,
73
196 ]
mngc wi a
slypan of wtere
Entoe
ge r ge fter. Sing
t galdor on lcre ara wyrta, III r
he hy wyrce and
ilce gealdor, r he
a sealfe on do .
pomada.
esta estaca,
198 ]
[ 199 ]
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/techniques_corps.pdf>. Acesso em: 20 dc. 2008.
edio veio a lume em 1812. Obra que obtm imediatamente sucesso estrondoso, at hoje muito vendida e conhecida, ganhando, em seu bicentenrio, uma traduo cuidadosa para o portugus de seus primeiro e
segundo volumes originais, pela editora brasileira Cosac Naify.
Dentre os contos dos irmos Grimm, existe um conto datando de
1819 que despertou especialmente nosso interesse : Os dois irmos75.
De tamanho acima do usual, ele chama a ateno pelo acmulo de simbolismos e forma narrativa, mais complexa e desviante76. O conto impressiona
pelo grande nmero de acontecimentos, concatenados habilmente. Includo somente na segunda edio dos Contos maravilhosos infantis e domsticos, apresenta elementos que remetem a vrios outros contos de fada e
canes de gesto medievais.
De antemo devemos assinalar algo curioso envolvendo a autoria dos
contos de fadas que s refora nosso interesse por este conto em especial,
uma coincidncia que traz certa carga de mistrio: se o trabalho dos dois
irmos Grimm notvel pelo grau de cumplicidade, o que agua nosso
interesse pelo tratamento do tema, no caso do francs Charles Perrault,
poucos sabem mas ele era o mais jovem de dois gmeos, tendo sido, segundo um de seus bigrafos, assombrado pela morte prematura de seu irmo77.
Alm desta curiosidade histrica que agua nosso interesse por nar75
GRIMM, Jacob & Wilhelm. Die zwei Brder. In: . Kinder- und Hausmrchen.
Dsseldorf e Zrich: Artemis & Winkler Verlag, 1997. p. 338-357.
76
O agente ou figura central muda ao longo da narrativa: os irmos antagonistas do
incio so substitudos pelos dois gmeos da gerao seguinte e depois
unicamente pelo gmeo mais jovem. Pouco antes do final, o gmeo mais
velho ocupa sozinho o espao central da narrativa para salvar o irmo.
77
justamente o que afirma o pesquisador Marc Soriano na introduo da coletnea
de contos de Perrault publicada pela editora Flammarion: Jumeau survivant confront
un frre virtuel qui le fait douter de sa propre existence, Charles Perrault languit et
accumule les retards scolaires. Puis soudain tout change. [...] Cette 'constellation
psychologique' ou plus exactement psychanalytique, marque profondment
l'inspiration et jusqu'au style de Charles Perrault. Des thmes dominants apparaissent
avec insistance: celui du reflet et du double, du miroir et de l'cho. (p. 14)
[
204 ]
Entretanto o rico tem planos de comer a ave, pois sabe que quem
come o corao e fgado de tal animal raro, ter sua fortuna garantida. Por
uma ironia do destino, os gmeos que costumavam comer as sobras da casa
do tio rico, acabam por comer justamente os rgos importantes do pssaro
de ouro.
Percebendo que os seus filhos eram diariamente recompensados
com duas moedas de ouro, graa concedida aos que tivessem ingerido o
corao e fgado do pssaro maravilhoso, o ingnuo vassoureiro resolve
consultar o irmo a respeito de tal mistrio. Este, ladino e prfido, cheio de
ira, resolve se vingar insinuando que os gmeos estariam ligados ao diabo e
que isso iria trazer desgraa. Convencido de que no tinha escolha, o pobre
abandona os dois filhos prpria sorte na floresta. Como o pequeno polegar
de Perrault79, as crianas no conseguem retornar ao lar. Mas tm a sorte de
encontrar um caador de boa ndole, que resolve adot-los e cri-los at a
idade adulta. Os gmeos ento adquirem uma formao melhor do que a
que tivessem obtido caso continuassem sob o jugo do ingnuo e subserviente pai.
Crescidos, passam por teste de iniciao e resolvem partir para o
mundo, com a anuncia do pai adotivo, que lhes d objeto mgico, uma faca
que, fincada em rvore, capaz de sinalizar o estado de cada gmeo. Em
uma floresta densa, os dois irmos recebem de animais falantes duas
lebres, duas raposas, dois lobos, dois ursos e dois lees. Cada irmo fica
com um exemplar de cada espcie no momento da separao necessria.
79
206 ]
Um parte para o leste o outro para oeste, aps juras de amor fraterno at a
morte.
O gmeo mais jovem passa ento a ocupar sozinho o centro da narrativa. Aps a separao, ele chega uma cidade ameaada por um drago
que tinha o hbito de sacrificar uma jovem pura a cada ano. Como a
princesa era a ltima que restava, seria a vez dela. O rei havia anunciado
que daria sua filha em casamento e todo o reino como herana quele que
derrotasse a besta. O jovem caador resolve ento lutar contra o drago.
Sobe montanha onde o terrvel animal se encontra e o mata, com espada
encontrada nas redondezas. Corta as lnguas das sete cabeas, como prova
de sua vitria. Depois disso, dorme, na companhia da filha do rei e dos
animais. O marechal se dirige ento ao local onde todos se encontravam e
resolve tomar para si a vitria, cortando a cabea do jovem caador e
raptando a princesa, que coagida a mentir para sobreviver. A moa confirma a mentira do marechal, mas impe o prazo de um ano para que o
casamento seja realizado. Os animais, ao acordarem, ficam desesperados. A
culpa reca sobre a lebre, que prope uma soluo milagrosa: ela mesma iria
buscar raiz capaz de curar todos os males. E assim feito. A cabea do caador recolocada no corpo e a raiz, ao contato com a boca, realiza o milagre
da ressurreio. Entretanto, o jovem no retorna imediatamente para a
cidade, mas perambula por um ano por toda parte, na companhia de seus
animais. Ao retornar finalmente, j estavam sendo realizados os preparativos para o matrimnio entre o marechal e a jovem princesa. Ele acaba por
se apresentar ao rei e provar ser o verdadeiro assassino do drago. O marechal executado e ele recebe a mo da princesa. Vive com ela tranquilamente at que decide caar em floresta, onde enfeitiado por bruxa, junto com seus preciosos animais. Seu irmo gmeo ressurge ento na narrativa, para salv-lo. Tudo termina bem ao final, a bruxa derrotada e os malentendidos esclarecidos.
[ 207 ]
Os cinco animais do conto parecem estar associados s repeties. Quando surgem pela
primeira vez o discurso proferido por cada espcie o mesmo: lieber Jger, la mich
leben, ich will dir auch zwei Junge geben. Quando interagem entre si ou quando so mensageiros do gmeo mais jovem na corte do rei, os animais tambm tm discurso idntico.
[
208 ]
210 ]
ASSIS, Machado de. (1904) p. 62-63: As barbas no queriam vir, por mais que eles
chamassem o buo com os dedos, mas as opinies polticas e outras vinham e
cresciam. No eram propriamente opinies, no tinham razes grandes nem pequenas.
Eram (mal comparando) gravatas de cor particular, que eles atavam ao pescoo,
espera que a cor cansasse e viesse outra. Naturalmente cada um tinha a sua.
[
212 ]
Cabe ressaltar que de forma reiterada a princesa se confunde diante dos gmeos,
s sabendo distingu-los atravs de objetos externos.
86
ASSIS, Machado de (1904). p. 194: [...] a situao moral de Flora era a mesma,
o mesmo conflito de afinidades, o mesmo equilbrio de preferncias.
[ 213 ]
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____________. Contes de ma mre l'oye. Paris: Gallimard, 2006. (Collection
Folioplus Classiques, 9).
88
218 ]
89
histrias envolvendo magia e metamorfoses . Embora cada uma das narrativas guarde peculiaridades, em linhas gerais, temos um jovem imprudente
que se v metamorfoseado em asno e passa por uma srie de situaes at
poder retomar sua forma humana.
Todavia, se ao relatar esse pequenssimo resumo das obras, parece
tratarem-se de obras extremamente semelhantes, a leitura de ambas
demonstrar que as mesmas convergem apenas no que diz respeito s
metamorfoses, a alguns contos, algumas vezes, libidinosos, e s provaes
de Lcio, o protagonista. Mas, em termos de simbologia, religiosidade e
crtica social, os textos de Apuleio e Luciano divergem tremendamente.
De acordo com Fcio, tanto o livro de Apuleio, quanto a obra de
Luciano, teriam sido inspiradas no original de Lcio de Patras, infelizmente
perdido para a posteridade. relevante frisar o processo de emulao
encontrado entre as trs obras. De acordo com Longino, no tratado Do
sublime, o processo de imitao criativa ou emulao seria o ideal, na
medida em que haveria a exaltao da grande obra ao ser realizada sua
imitao. Nesse sentido, vale lembrar que o conceito de originalidade no
se aplica a esse contexto literrio, no havendo nenhuma espcie de
plgio entre as obras a ser considerado.
Chirstopher Robinson aponta esse dado epocal em sua obra sobre
Luciano, afirmando:
Imitation in the principal that underlies the educational curriculum
in the Roman empire. To learn about life is to learn about life as
codified, analysed and exemplified in great Works of art. To write
about life is to reproduce the picture of life as presented in the same
works of art. [] Ancient thorists either recommend this double
89
interessante destacar alguns trabalhos que versam sobre as obras em pauta, tais
como o texto de FERRO (1999), que busca observar a simblica dos animais
nas duas narrativas, e o estudo de SILVA (2009), sobre os
aspectos religiosos e filosficos em Apuleio.
[ 219 ]
220 ]
tanto, cabe ressaltar que a diviso entre goetea e teurgia no bem evidente na Antiguidade romana.
Outra obra que traz uma coletnea de seus discursos enquanto sacerdote em Cartago Florida. Sua quarta criao de destaque foi o romance de
que tratamos aqui, no qual ele aproveita as inmeras narrativas de carter
fantstico para, segundo Almeida (2003, p. 129), fazer uma autntica
obra-prima em que revela a preocupao com a ornamentao da frase,
embora sem sobrecarga de recursos estilsticos, com realismo descritivo e a
fora da expresso.
Relevante ser guardarmos para nossas reflexes os contedos das
outras duas obras de Apuleio, uma vez que, tanto a magia e a crtica
maneira violenta e ilegal como a mesma aplicada e a religio sero
temticas mescladas s aventuras de O asno de ouro.
Luciano de Samsata, o provvel autor das aventuras de Lcio, um
polgrafo de origem Sria, que viveu entre 125-181 d.C, e escreveu tambm
durante os reinados de Adriano e de Marco Aurlio. Brinca com diversos
gneros literrios, sempre buscando adicionar o riso crtica das prticas
sociais. Sua obra bastante extensa, conta com os Dilogos dos mortos, um
stira vida no Hades; o romance Das narrativas verdadeiras, o Dilogo das
cortess, Como escrever a histria entre tantos outras peas literrias.
considerado um filsofo cnico por alguns e o representante da stira
menipeia, clebre por seus dilogos que mesclam o filosfico ao riso.
Almeida (2009, p. 2) define bem a vertente da obra lucinica:
A stira lucinica, continuadora da tradio menipia, caracterizavase pela suspenso do juzo moral do narrador quanto ao dos
personagens, ou seja, na stira do srio havia uma ambigidade em
que se negava a moralizao do mundo, ambiguidade esta que se
sustentava no equilbrio harmonioso entre o cmico e o austero. O
riso, neste caso, no estava a servio de qualquer virtude ou ordem
justa. Era um riso sem censura e sem moral da histria.
[ 221 ]
222 ]
224 ]
226 ]
O zurro do asno chama a ateno de pastores para o local e surpreendem os sacerdotes a pique de se entregar s suas ignomnias.
Logo a notcia se espalha e h a chacota geral a respeito da castidade edificante por eles praticada.
[
228 ]
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ROBINSON, Christopher. Lucian. Oxford: Duckworth, 1979.
234 ]
dores muulmanos mencionam documentos e registros do reino sudarbico de Himyar, os quais, embora hoje desconhecidos, teriam sido preservados e utilizados por historiadores posteriores, bem como a registros genealgicos conservados por algumas tribos e sub-tribos. Contudo, esses relatos sudarbicos citados nas fontes islmicas mais antigas apresentam um
carter mtico, e mesmo eventos relativamente prximos no tempo, como
os do sculo VI d.C., so relatados de modo confuso para os padres contemporneos. A maneira como chegaram at os nossos dias, aps sofrerem
manipulao de autores que vivenciaram o surgimento do islamismo e a ele
se converteram, parece mais prxima do que se chamaria hoje de narrativa
ficcional, em que uma espcie de pica popular aparece misturada a relatos
fantsticos. A tentativa, ao que tudo indica, era de valorizar a importncia
dos rabes do sul, atribuindo-lhes ancestrais destacados na guerra, nos ofcios, na lngua, nas artes do decoro (funun aladab) e at mesmo na religio,
a fim de que no parecessem menos gloriosos que os rabes do norte, dos
quais descendia o profeta Maom, fundador da religio muulmana. Historiadores contemporneos como o estudioso 'Abdul'azz Addri no hesitam
em atribuir boa parte desses relatos, aos quais eles costumam chamar de
akhbr mulaffaqa, algo como notcias forjadas, rivalidade entre rabes
do sul e do norte e a uma espcie de ciumeira entre os do sul pela prevalncia do norte nos tempos do Isl. Essa rivalidade continuaria a exercer,
mais tarde, importante papel na ecloso de revoltas e no estabelecimento
de alianas polticas. Mas a concluso final, quanto historiografia do sul,
que os seus relatos so poucos, pobres e com uma viso extremamente
pragmtica do fazer histrico. Pairam igualmente dvidas quanto linguagem em que teria sido exarada tal histria, uma vez que a lngua do sul da
pennsula, o himyarita, um dialeto semita distinto do rabe propriamente
dito os lingistas o denominam sudarbico , sendo o seu alfabeto tambm inteiramente diverso do alfabeto rabe.
[ 235 ]
236 ]
islmica, que os relatos dos dias dos rabes eram um ramo do conhecimento no qual se estudam as grandiosas ocorrncias e os terrveis sucessos entre as tribos dos rabes, devendo ser colocados como uma das partes
da histria. Para o prolfico historiador rabe contemporneo 'Abdul'azz
Addri, em seu estudo Nash'at 'ilm attarkh 'inda al'arab (O Surgimento da
Cincia Histrica Entre os rabes), os dias dos rabes consistiam num
conjunto de narrativas orais, tribais e coletivas, domnio comum da tribo, e
assim permaneceram at o sculo II H./VIII d.C., quando foram ento
reunidas e registradas por escrito. O que se deve observar, porm, que o
perodo inicial do Isl, por meio de suas correntes polticas e sociais, afetou
a literatura dos 'dias dos rabes', cuja narrativa, j de si confusa do ponto de
vista cronolgico, no est, de modo geral, imune 'asabiyya (neste caso,
'solidariedade tribal'), apresentando o ponto-de-vista de apenas um dos
lados dos envolvidos nas batalhas. Alm disso, faltam consistncia e coerncia a essas narrativas, e tampouco nelas se pode vislumbrar qualquer
idia de histria. A despeito disso, conforme o mesmo autor, tais narrativas contm alguns fatos histricos, e seu interesse bsico reside em sua
permanncia nos primrdios do Isl, e no processo de apropriao a que
foram submetidas, por seu turno, durante a formao da historiografia muulmana. De um lado, esses relatos, com sua narrativa direta e plena de
vivacidade, tornaram-se parte prvia da prpria histria islmica, e as poesias neles enxertadas foram objeto de interesse tambm dos estudiosos de
lngua e dos genealogistas. Mas foi somente no sculo XIII que o historiador
Ibn Alathr tentou, em seu importantssimo e volumoso O Livro Perfeito em
Histria (Alkmil fi attarkh), submet-los a uma cronologia organizada.
Com efeito, esses relatos esto intimamente ligados prpria estrutura de
pensamento tribal, caracterizada pelo conservadorismo, por certa
indiferena cronologia, pela preocupao com faanhas e feitos hericos.
Na verdade, trata-se de um decorrer temporal em que os saltos qualitativos
[ 237 ]
so pontuados por eventos considerados grandiosos, dos quais freqentemente se lana mo como marco, logo substitudo pela ecloso de algum
outro evento cuja grandiosidade constituda como igual ou maior.
O surgimento do Isl no incio do sculo VII, com sua mensagem
universalista e seu proselitismo, marca o incio de uma nova era em todos os
sentidos. A civilizao rabe tomaria outro rumo. De cultura de certo modo
ensimesmada que era, passa a ser, com intensidade, uma cultura de carter
nitidamente universalizante. No se pretende aqui descrever os percalos
do Isl, suas dificuldades iniciais, as batalhas que afinal resultaram em seu
triunfo; anote-se somente que ele surgiu quase no centro da pennsula,
num lugar, Meca, que j era considerado sagrado pelos rabes, e que, ao
mesmo tempo, era um dos menos dotados de histria naquela regio.
Embora por mais de um motivo o Isl continue associado aos rabes
pois foi em sua lngua que se deu a revelao de seu livro sagrado, o portador de sua mensagem era um profeta rabe, e rabes foram os primeiros a
expandir a religio muulmana e militar na converso de outros povos
justo dizer que a partir dele deixa-se de lado uma cultura de mbito local,
limitada, sem horizontes, e se d incio a uma expanso mundial que em
dado momento pareceu irresistvel a todos quantos a vivenciaram.
Como texto, o Alcoro se organiza de modo sensivelmente diverso do
da Tor judaica ou dos Evangelhos cristos. Suas narrativas no possuem a
completude das desses livros, nem sua organizao temporal se lhes assemelha. Nele no h nada parecido com as crnicas, ou reis. No existe
ali nenhum relato extenso que se pretenda estritamente linear. O Alcoro
lida com o passado de modo sinttico e no raro alusivo, procurando extrair
sua fora da potica que a conciso lhe confere. Mesmo a escatologia cornica no to detalhada como a bblica. O Alcoro agrupa os eventos por
exemplaridade, rara vez por linearidade. Aqui cabe uma pequena observao: normalmente, fala-se em surgimento do Isl, mas no assim que
[
238 ]
240 ]
242 ]
adotam, que a diviso dos eventos por ano. Desse modo, a narrativa
introduzida por frases como, por exemplo, e quando foi o ano quinze,
seguida de tudo quanto chegara ao conhecimento do historiador. Ao lado
desse princpio de agrupamento de eventos, verifica-se outro, que no raro
com ele se cruza: o do agrupamento dos eventos sob o nome do soberano
que ento governava.
Para elaborar suas obras histricas, os historiadores da poca operavam com a acumulao de relatos sobre um determinado evento. Tais relatos so referidos a personagens dspares, num mtodo muito semelhante
ao da cadeia de transmisso que fora inaugurada para o estabelecimento
das falas e atos do profeta Maom. Ocorria muitas vezes de os relatos,
embora atribudos a personagens diversas, serem praticamente os mesmos,
o que servia para corroborar a veracidade, diga-se assim, da narrativa.
Ocorria ainda que aparecessem relatos divergentes entre si, em graus
variados, sobre um mesmo evento, o que confere a essa historiografia um
carter muito interessante pelo espao concedido ao contraditrio.
Era comum que o historiador no interviesse com juzos quando os
relatos apresentassem grandes disparidades, deixando o julgamento ao leitor. Quando o fazia, porm, costumava usar o argumento da verossimilhana: Mas o mais aceitvel, porm, que..., apresentando em seguida o fato que lhe parecesse mais aceitvel.
Um dos trabalhos desses historiadores era a separao daquilo que
julgavam ser relatos legitimamente histricos dos mitos e fbulas. Tratavase de uma espcie de peneiragem que obedecia a critrios de verossimilhana e adequao que nem sempre so claros hoje, como se d, por
exemplo, no caso da construo da cidade de Alexandria. Segundo o
historiador Almas'di, do sculo XI, monstros marinhos destruam noite o
que os trabalhadores construam durante o dia, o que obrigou Alexandre a
descer ao mar numa espcie de caixo com tampa de vidro, acompanhado
[ 243 ]
de dois de seus homens; foi ento que ele constatou que se tratava de
demnios com corpo humano e cabea de feras, munidos de machados,
serrotes e bastes, imitando os artfices e trabalhadores que ento construam a cidade. Alexandre e seus auxiliares fizeram desenhos dos tais
demnios, retornaram superfcie e mandaram construir esttuas semelhantes queles animais, colocando-as na praia. Quando anoiteceu, os
demnios vieram destruir as fundaes da cidade, mas toparam com as
esttuas, assustaram-se e nunca mais voltaram. E Alexandria pde finalmente ser construda. Nos Prolegmenos sua obra histrica (cujo ttulo
inusual, traduzido, Livro das Lies e Registro do Sujeito e do Predicativo a
Respeito dos Dias dos rabes, dos Persas, dos Berberes e Daqueles Dotados
de Grande Poder Que lhes Foram Contemporneos), Ibn Khaldun, polgrafo
norte-africano do sculo XIV, critica esse relato de seu antecessor
Almas'di, afirmando tratar-se de uma longa narrativa composta de fbulas
e absurdos, pois os reis no se envolvem em semelhantes aventuras [...], e
tampouco se conhecem as formas especficas dos gnios [os demnios
martimos], que podem assumir diversas formas; quando se mencionam
suas mltiplas cabeas, o objetivo ressaltar sua feira e seu horror, e no
dizer a verdade (v. 1, p. 88-89).
J em seu j citado e fundamental Livro Completo em Histria, Ibn
Alathir procura estabelecer, para alm do critrio de verossimilhana, o de
pertinncia ao gnero, afirmando na Introduo: Quando contemplei [os
livros de histria escritos antes do meu], constatei que eram contras-tantes
na busca do objeto, quase transformando a essncia do conhecimento em
incidente, alguns prolongando-se demasiado nos caminhos e relatos, e
outros resumindo e falhando em muito do que ocorreu; apesar disso, todos
deixavam de lado as ocorrncias mais grandiosas e os sucessos mais
conhecidos, e muitos preencheram suas pginas com pequenas questes
que seria mais apropriado descartar e mais adequado no registrar, como
[
244 ]
quando dizem 'um fulano no muulmano, amigo de um vagabundo, perdeu a vergonha', 'o preo subiu em tantos centavos', 'fulano foi dignificado',
'fulano foi humilhado'[...] (v. 1, p. 2). Assim, para Ibn Alathir, a pertinncia
de qualquer relato pretensamente histrico ser determinada, primeiro,
por sua adequao ao gnero, e, segundo, por sua verossimilhana.
Como quer que seja, porm, o inegvel que os relatos histricos,
entre os muulmanos, serviram, em primeirssimo plano, para legitimar o
Isl. Isso absolutamente inquestionvel, ficando muito claro na prpria
separao que fazem entre os fatos religiosos e aquilo que chamavam de
khuraft (traduzvel como mitos, invencionices) ou isra'iliyyat (invencionices dos israelitas), as quais somente devem ser usadas, como nota Ibn
Kathir, naquilo que a lei [religiosa] permitiu e que no contraria o livro de
Deus [o Alcoro] e a tradio de seu enviado [Maom], e que constitui a
parte que no se autentica nem se desmente, e tambm que simplifica algo
que entre ns se est resumido, ou designa alguma obscuridade em nossa
lei [religiosa], naquilo cuja designao a ns no traz benefcio, e ento o
mencionamos a ttulo de ornamentao, no de necessidade nem de
dependncia (v. 1, p. 6). Desnecessrio dizer que, para o esprito laico e
materialista, no deveriam existir diferenas entre uma entidade oculta
qualquer que fala a um homem, ou entre algum que morre e ressuscita
para salvar o mundo, ou entre demnios marinhos que se disfaram de
artfices, visto que todas essas coisas pertencem ao domnio do
suprassensvel, do sobrenatural; j a mentalidade religiosa opera de outro
modo, enxergando como natural aquilo que pertence ao domnio de sua f
religiosa, ou que pode ser assimilado pela escatologia que lhe prpria, mas
aquilo que, sendo sobrenatural, est fora dela, passa a ser, amide, mito ou
invencionice. Seria o caso de dizer, no sem alguma reserva, que os nossos mitos so superiores aos mitos alheios. Ou que o nosso bode cheira
melhor que os bodes alheios.
[ 245 ]
246 ]
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O bicentenrio de um clssico:
Poesia do maravilhoso em
verso original
92
MARCUS MAZZARI
O conto maravilhoso, que ainda hoje o primeiro
conselheiro das crianas porque foi outrora
o primeiro da humanidade, continua a
viver secretamente na narrativa. O primeiro
e verdadeiro narrador e permanece
sendo o narrador de contos
maravilhosos.
(Walter Benjamin,
O Narrador).
Este texto foi publicado originalmente como prefcio ao volume Contos maravilhosos
infantis e domsticos (1812 1815), de Jacob e Wilhelm Grimm (traduo de
Christine Rhrig), publicado em outubro de 2012 pela Editora Cosac Naify (So Paulo).
Mas o trabalho nesse projeto continua pelos anos e decnios subsequentes, at que em 1857 publicada a ltima edio organizada pelos
irmos (mais propriamente por Wilhelm Grimm), com 211 das 240 peas
que foram recolhidas no total e que iam sendo acrescentadas por vezes
tambm excludas de edio a edio. Quando surge, entretanto, essa
edio definitiva, a obra j havia se consagrado plenamente na Alemanha e
enveredava, partindo de duas antologias traduzidas para o dinamarqus em
1816 e para o holands em 1820, por uma carreira internacional no menos extraordinria. Presentes em praticamente todos os pases do mundo,
as narrativas dos irmos Grimm ocupam hoje o primeiro lugar entre os
livros alemes mais traduzidos, na frente do difundidssimo Manifesto
Comunista de Marx e Engels, e sua importncia para a constituio da identidade cultural alem permite uma comparao at mesmo com a Bblia de
Lutero ou o Fausto de Goethe.
Todavia, com todo o xito internacional que se abriu coletnea de
Jacob e Wilhelm Grimm, digno de nota que a designao de gnero que
atriburam s suas narrativas no possua correspondncia exata em nenhum dos inmeros idiomas que as acolheram. Trata-se do substantivo
neutro Mrchen, forma diminutiva derivada da palavra maere, que no
mdio-alto-alemo (estgio da lngua que vigorou entre aproximadamente
1050 e 1350) significava notcia, mensagem ou relato relativo a um
acontecimento notvel, que merecia permanecer registrado. Mrchen se
traduz geralmente por formas compostas fairy tales (ingls), contes de
fes (francs), cuento de hadas (espanhol), fiaba popolare (italiano) ou
ento por termos que no guardam nenhuma relao com a etimologia do
original alemo, como sprookje (holands), eventyr (dinamarqus), skazka
(russo). Em portugus temos contos de fadas, contos das carochinhas
ou ainda contos maravilhosos, sendo que esta ltima possibilidade talvez
seja a mais apropriada, pois se as histrias designadas por Mrchen poucas
[
252 ]
impacto sobre as personagens envolvidas, chegando a atuar assim enquanto verdadeiro milagre. J nas narrativas dos Grimm, um sapo pode dirigir a
palavra a uma princesa aflita, como em O rei sapo ou o frreo Henrique,
ou uma outra princesa (A Bela Adormecida), pode despertar de um sono
centenrio, aps ser beijada pelo prncipe, sem que ningum veja nisso
nada de assombroso.
A naturalidade do maravilhoso mostra-se, portanto, como a verdadeira essncia das narrativas enfeixadas neste volume. Outra de suas caractersticas fundamentais a introduo, logo com a primeira frase, do heri
ou de uma circunstncia diretamente relacionada ao desafio a ser enfrentado e superado na histria. E isso porque em seu sentido mais autntico
esses contos nos do notcia da vitria de seres inocentes e frgeis
crianas, animais, jovens aflitos sobre terrveis adversidades ou poderes
malignos, encarnados por bruxas, ogros, adultos cruis e desnaturados.
Apresentam-nos um mundo em que os acontecimentos se desenvolvem no
sentido de corresponder por fim ao nosso mais profundo sentimento de
justia e tica. Mas justamente esse sentido utpico que passa a ensejar,
sobretudo a partir da publicao da coletnea dos irmos Grimm, o
emprego irnico do termo Mrchen em outros contextos. assim que, j
no incio do Manifesto Comunista (1848), Marx e Engels postulam a necessidade de se fazer frente ao conto maravilhoso (Mrchen) que, segundo
os autores, teria se constitudo em torno do espectro do comunismo
talvez j se aludindo a escabrosidades como o apetite da bruxa em Joo e
Maria por tenras criancinhas ao forno. Permanecendo no plano poltico,
vale assinalar que tambm os nazistas se apropriaram a seu modo do termo,
imputando a muitos de seus opositores e vtimas a acusao de difundirem
contos maravilhosos de atrocidades (Greulmrchen) com a finalidade de
conspurcar a imagem do regime.
Incontveis so os narradores e poetas alemes que incorporaram s
[
254 ]
do frreo Henrique, de Rumpelstilzchen, Rapunzel e a histria daquele que sai pelo mundo para conhecer o medo, a qual se intitula na edio
de 1812 Bom jogo de boliche e de cartas. A presena dos Grimm ainda
mais intensa na obra pica de Gnter Grass, cujo personagem mais clebre
o liliputiano Oskar Matzerath que narra sua biografia no romance O
tambor de lata (1959) tem no Pequeno Polegar uma inspirao decisiva,
segundo confessa o prprio autor no livro de 2010 Palavras de Grimm
Uma declarao de amor: Ainda te lembras, Oskar, quo permanente foi o
caminho que o Pequeno Polegar te apontou, quo resistente ele te fez,
como te despachou para o que desse e viesse? Dize obrigado, Oskar, dize
obrigado! E lembremos ainda dois outros romances de Grass profundamente tributrios da tradio dos contos maravilhosos: O linguado (1977),
que desdobra em mais de 600 pginas a histria O pescador e sua mulher
(recolhida originalmente, tal qual Da rvore de zimbro, em dialeto baixoalemo pelo pintor Runge) e A ratazana (1986), em que Grass no apenas
se vale de figuras como Joo e Maria, Branca de Neve, Rumpelstilzchen,
Rapunzel, Gata Borralheira, Chapeuzinho Vermelho etc., mas tambm
transforma os prprios irmos em personagens da trama romanesca,
figurando Jacob enquanto Ministro para o Meio Ambiente e Wilhelm na
condio de Secretrio de Estado.
Na mesma medida, porm, em que constituem uma referncia
proeminente para poetas e prosadores, os contos maravilhosos ocupam
lugar privilegiado tambm na teoria literria, em especial nas reflexes
sobre o pico. Em seu primoroso ensaio O Narrador, Walter Benjamin
vislumbra no gnero consolidado pelos irmos Grimm uma clula primordial das formas literrias ligadas tradio oral e popular. Com o
postulado de que todos os autnticos representantes da arte da narrativa
trazem dentro de si o narrador de contos maravilhosos, Benjamin levanta
uma fecunda hiptese, que poderia ser pensada at mesmo luz do uni[
256 ]
mito, mas que lhe prefervel saber-se reunida em torno do ser humano.
O empenho de Walter Benjamin em valorizar o papel afirmativo
desempenhado pelos contos maravilhosos e, mais ainda, em elucidar os
seus vnculos com a tradio oral, annima e popular vai plenamente ao
encontro dos esforos filolgicos que Wilhelm e, sobretudo, Jacob Grimm
desenvolveram em prol de sua coleo e do gnero Mrchen. Na fecunda
polmica que travou com o poeta romntico Achim von Arnim (1781
1831) que entre os anos de 1805 e 1808 publicou, em parceria com
Clemens Brentano (1778 1842), uma compilao de canes populares
da Idade Mdia at o sculo XVIII (A tromba mgica do menino) Jacob
Grimm procurou apresentar os Contos maravilhosos infantis e domsticos
como a mais genuna manifestao da poesia da Natureza, criao
espontnea de uma coletividade annima. Esforou-se igualmente em
distinguir os contos populares (Volksmrchen), que coletara ao lado do
irmo, dos artsticos (Kunstmrchen), os quais ostentariam vestgios
ntidos da elaborao literria individual (como se verifica claramente em
fairy tales de Oscar Wilde ou Hans Christian Andersen, para citar exemplos
posteriores). Contos populares, ao contrrio, possuem o seu habitat na
tradio oral e, com frequncia, iletrada, na qual ingressam diretamente da
alma do povo, conforme a expresso empregada por Jacob no esprito
romntico ento vigente. Por isso, esses contos exigiriam do compilador a
mais estrita fidelidade, que Jacob exemplifica a Arnim mediante a seguinte
imagem: se, ao quebrar um ovo, no possvel evitar que um pouco da clara
fique na casca, fidelidade no sentido proposto seria preservar a gema
intacta, da mesma maneira como o essencial da narrativa oral deve passar o
mais inclume possvel para a forma escrita.
No entanto, sabe-se hoje, sobretudo a partir de pesquisas desenvolvidas no sculo XX, que os irmos Grimm no apenas deixaram bastante
clara na casca do ovo, como tambm no mantiveram a gema das
[
258 ]
Frankfurt sobre o Meno), ocupada na poca, a exemplo de outros estados alemes, pelas tropas napolenicas. Essa primeira edio, portanto,
diferencia-se substancialmente, no que diz respeito ao teor cru e drstico
de no poucas narrativas, das edies subsequentes organizadas por
Wilhelm Grimm e, nesse aspecto, distingue-se igualmente de coletneas
anteriores, como as napolitanas de Giovanni Straparola (As noites
agradveis, 1550 53) e de Giambattista Basile (Pentamerone, 1634 36),
a alem de Johann Augustus Musus (Contos maravilhosos populares dos
alemes, 1782 86) ou a famosa coleo francesa de Charles Perrault
(Contos da mame gansa, 1697), com a qual a obra dos Grimm em grande
parte por influncia da imigrao huguenote no sculo XVII compartilha
algumas das peas mais conhecidas: Chapeuzinho Vermelho, A Bela
Adormecida, O Pequeno Polegar, O Gato de Botas ou ainda Barba
Azul, que Machado de Assis aproveita magistralmente, no conto O espelho, para caracterizar a terrvel crise psicolgica vivenciada pelo heri
Jacobina.
Entre as pequenas obras-primas que o leitor tem aqui em mos
assomam em primeiro lugar as histrias mais genuinamente maravilhosas, como O rei sapo ou o frreo Henrique, Gata Borralheira,
Branca de Neve, O querido Rolando, Serve-te mesinha, A senhora
Holle, tambm aquelas elaboradas por Goethe, Brecht e Gnter Grass (O
p de zimbro, A pastora dos gansos, O pescador e sua mulher) e tantas
mais. Vrias outras so protagonizadas por animais e revelam afinidades
com o domnio das fbulas: Gato e rato em sociedade, O gato de botas,
A raposa e os gansos, O rei da sebe e o urso. H tambm histrias que
lembram a estrutura de uma legenda hagiogrfica (A protegida de Maria)
e outras mais prximas do burlesco, como O alfaiate valente, Bom jogo
de boliche e de cartas, O ferreiro e o diabo ou ainda, para mencionar
outra pea que conduz a um inferno que no deve aterrorizar tanto as
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crianas, O diabo e seus trs fios de cabelo dourado, com sua mensagem
final de coragem: Por isso, quem no teme o diabo pode arrancar-lhe os
cabelos e conquistar o mundo.
Mas necessrio ressaltar, acima de tudo, que o leitor encontrar
todas essas narrativas em sua verso primordial, que muitas vezes diverge
consideravelmente da forma sob a qual se tornaram famosas. J o exemplo
acima da gravidez de Rapunzel ilustra a diferena, no tocante a motivos
relacionados sexualidade, entre a primeira edio e todas as demais,
retrabalhadas por Wilhelm Grimm. E vale observar tambm que, logo na
primeira histria, o sapo no recobra a sua forma anterior de prncipe por
meio de um beijo da bela filha do rei (conforme consta em todas as edies
posteriores), mas sim aps esta ser acometida por irrefrevel acesso de
fria e arremessar o asqueroso bicho contra a parede, a fim de espatif-lo.
To logo tenha percorrido as primeiras pginas deste volume, o leitor
se ver num reino que talvez possa causar-lhe certo estranhamento, pois
muito distante das imagens e verses mais amenas comumente associadas
aos contos dos irmos Grimm. Violncias e atrocidades iro ao seu encontro sob as configuraes mais variadas: crianas em extrema aflio
abandonadas, por exemplo, na floresta para morrerem de fome ou serem
devoradas pelas feras; meninas ou jovens mulheres submetidas a toda sorte
de injustias e perseguies (e mesmo ao desejo incestuoso do prprio pai,
o rei que v na filha a nica beleza comparvel da falecida rainha, em Mil
peles); judeus expostos ao aviltamento e suplcio pblicos (O judeu entre
os espinhos e, em forma atenuada, A luz do sol revelar), mostrandose assim razes remotas do antissemitismo que na Alemanha nacionalsocialista se converteria em genocdio. Mas se essa esfera da violncia
componente praticamente corriqueira do universo dos Grimm, em no
poucas narrativas o leitor a encontrar sob formas extremadas, o que pode
ser ilustrado com A moa sem mos, que tem os membros decepados
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pelo prprio pai e mais tarde obrigada a vagar pela terra acompanhada
apenas do filho recm-nascido. Ou ainda Os doze irmos, histria que se
abre com a determinao do rei de assassinar seus doze filhos aps o
nascimento de uma menina: tempos depois, buscando desencantar os
irmos transformados em corvos, a herona obrigada a suportar calada,
durante longos anos, todos os sofrimentos infligidos pela maligna
oponente, at a calnia, punvel com a morte na fogueira, de ter devorado
os dois filhos recm-nascidos. E eis que a crueldade continua mesmo no
momento final de se reparar a injustia: O que fazer com a madrasta
malvada? Ela foi colocada num barril cheio de leo e repleto de cobras
venenosas, tendo de morrer uma morte horrvel.
Que significado se poderia atribuir a semelhantes passagens? Desempenhariam elas o papel de valorizar tanto mais a mensagem positiva de
emancipao que os contos maravilhosos querem transmitir s crianas?
Ou a crueldade no fundo no sentida enquanto tal, uma vez que, no se
destacando da dimenso do maravilhoso, aparece igualmente impregnada da naturalidade que envolve todos os detalhes da histria? Ou talvez
no seja sentida porque o conto maravilhoso, como caracterstico de toda
esse breve estudo, objetivamos fazer a leitura de variantes da conhecida histria dO gato de botas, passando por duas dedicadas
gatas, que, em oposio verso masculina, no se apresentam caladas de
botas. Seja gata ou gato, com botas ou sem botas, o tema, incrustado no
imaginrio cultural, eternizou-se magnificamente e foi tratado sob a forma
de uma personagem que, por meio do engano e da tramoia, promove a
asceno de seus donos. inegvel muito j ter sido explorado sobre a
origem dos contos de fadas e dos contos maravilhosos, suas devidas diferenas, a importncia de tal acervo literrio, de lastro oral e popular pleno
de implicaes, em relao ao imaginrio coletivo e aos arqutipos. Por isso,
focalizaremos o contedo dos textos selecionados, comentando-os no que
toque a diferenas e identidades contidas no desenvolvimento da matria
narrada por Straparola e Basile, com o objetivo de chegarmos verso de
Perrault.
Nosso desejo contrastar, portanto, as excepcionais gatas delineadas
pelos autores italianos, para chegar ao gato do escritor francs, j munido
de botas.
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como, salienta Bruscagli (op.cit., p.138) a ambientao metahistrica ou fantstica, expressivo espao destinado a componentes mgicoritualsticos, morfologia repetitiva [...] (que a moderna classificao
proppiana nos divulgaria: distanciamento do protagonista, [...] uso de
meios mgicos, superamento da prova etc.).
No foi por acaso que Straparola publicaria sua obra em Veneza, sede
de uma indstria editorial aberta experimentao e vida de novidades.
Tal pormenor explicaria, alm da qualidade literria, o grande sucesso de
pblico, pois, a recepo encontrada desencadearia, na segunda metade do
quinhentos, vinte edies da obra.
Se o trabalho de elaborao artstica das noites rendeu resultados
positivos ao escritor, tambm acrescentou mais uma obra de importncia
cultural ao Ocidente; o mesmo afirmamos quanto a Basile, que nos deixou
um repertrio considervel, capaz de dar continuidade e de expandir o
legado oral e popular existente, recebido por ele e seu antecessor.
Nesse ponto de nosso ensaio, importa apresentarmos uma sntese
das duas histrias e comentar a interessante diferena imaginada por
Basile.
Comearemos cronologicamente por Straparola. Seu conto narra
sobre um rapaz que recebeu de herana uma gata, aps a morte da me.
Nada mais possuindo, ficou mingua, porm, o sofrimento de Fortunato
fez a gata prometer ajud-lo. Com tal propsito, entrou no bosque e caou
uma lebre, foi ao castelo ofereceu-a ao rei. Nas vrias vezes em que de l
saa, roubava um alimento para seu dono. Com o tempo, achou melhor
colocar em prtica o plano de um falso afogamento, que consistia em
Fortunato se jogar no rio, a gritar por socorro. Assim fizeram.
Naquele instante, passava pelas imediaes a comitiva real, portanto,
quando se ouviram os pedidos de socorro, o rapaz foi imediatamente salvo e
levado ao castelo. O rei soube ter sido Fortunado quem lhe mandara tantos
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presentes, por isso, recebeu a princesa em casamento. A necessidade, porm, de o rapaz oferecer noiva um castelo digno, levou a gata a se adiantar
velozmente ao cortejo. Em misso salvadora do dono, ela ameaava, pelo
caminho, cavaleiros, agricultores, mendigos, para que afirmassem serem
todas aquelas terras, inclusive todos eles, de propriedade do senhor
Fortunato, at mesmo um castelo abandonado, nunca reclamado por
ningum, aps a morte do antigo castelo. Com o casamento e a rpida
subida de Fortunato classe nobre, Straparola fecha o conto.
A histria da gata protetora, que tudo faz e consegue, na inteno de
promover a felicidade do dono, foi retomado por Basile, em Cagliuso,
conto inserido em obra duplamente intitulada e aqui j mencionada, Conto
dos contos, com o subttulo Pentamerone97(Pentameron).
Basile faria algumas modificaes, que, sempre do um acento novo
histria, valorizam [...] criaes dos contistas e nos esclarecem sobre a
imaginao (PROPP, 1973, p. 260) dos autores. Inscrevem-se na linha da
pardia e da crtica social. Interessante ressaltar que, para Snia Salomo
Khde (1990, p. 33), contemporaneamente, as possveis modificaes a
serem encontradas nos contos de fadas, [...] de modo geral, [...] esto a
favor da desconstruo de esteretipos que aprisionem as atitudes comportamentais das crianas. Inscrevem-se na linha da pardia e da crtica social.
As modificaes, para Vladimir Propp, so chamadas de inverses, pois, a forma fundamental se transforma por vezes em sua oposta
(op.cit., p. 256), gerenciaram a imaginao do escritor italiano, nos seguintes pontos: ao invs de um bosque, colocou a ao no porto de Npoles; ao
invs de lebres, a gata presenteava o rei com peixes; o rei o rei de Npoles
e o protagonista Cagliuso, que d nome novela. Em geral, o enredo
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constroem uma teia intertextual, formam entre eles uma semelhana, mas,
eles se distinguem a partir de determinados elementos constituintes da
narrativa. Na estrutura essencial do enredo de Straparola, que partira de
narrativa j cristalizada na cultura oral transferindo-a escrita, Basile dispos
novos dados, detalhes de sua inveno; recontou a mesma histria;
guardou a mesma carga conotativa; adicionou, no entanto, a interessante
passagem final, qual j nos referimos.
Os comentrios anteriores, no que toca [re]criao de um texto a
partir de outro j existente, remetem-nos, sem dvida, discusso a respeito da intertextualidade, leva-nos a categorias que no sero aqui examinadas, limitamo-nos a acrescentar outras, tais quais, pardia, estilizao,
dialogismo e outras, a serem desenvolvidas em futuro ensaio sobre o tema.
Quanto a tais categorias, como bem nos lembra Snia Salomo Khde
(1983, p. 55), atravs de processos ldicos e alegricos est a relao
intratextual e intertextual que os personagens estabelecem entre si e entre
personagens de outros livros, inaugurando um dilogo rico pela discusso
dos valores e das formas de viver.
Voltamos ao passo em que falvamos sobre o ditado da gata e sublinhvamos que, no que se refere s insinuaes de ordem moralizante, os
ttulos italianos em tela nos oferecem um antigo lastro de tradio popular,
repletos de ensinamentos edificantes. Fugindo a tais indicaes, os contos,
tanto de um como de outro autor italiano, no se destinavam especificamente s crianas. Os de Basile, publicados postumamente, denominados
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pelo autor de Contos dos contos ou o passatempo das crianas , afasta-se
de tal propstio. Em verdade, a obra era, segundo Erminia Ardissino (2005,
p. 142-143), [...] destinada aos frequentadores dos crculos literrios napolitanos. O objetivo [...] era dar um modelo normativo para consagrar o
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REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
ARDISSINO, Erminia. Il Seicento. In: BATTISTINI, Andrea (Org.) Storia della
letteratura italiana. Bologna: Mulino, 2005. v. 2.
BRUSCAGLI, Riccardo. Il Quattrocento e il Cinquecento. In: BATTISTINI, Andrea
(Org.). Storia della letteratura italiana. Bologna: Mulino, 2005. v. 3.
CHEVALIER, Jean e GHEERBANT, Alain. Dictionnaire des symboles. Mythes,
rves, costumes, gestes, formes, figures, couleurs, nombres. Paris: Rober
Laffont/Jupiter, 1982.
COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas. So Paulo: tica, 1987.
PROPP, Vladimir. As transformaes dos contos fantsticos. In: TOLEDO, Dionsio
de Oliveira (Org.). Histria da literatura. Formalistas russos. Traduo de
Ana Mariza Filipouski et al. Porto Alegre: Globo, 1973.
Os Autores
KARIN VOLOBUEF
docente da UNESP-Araraquara desde 1992 e pesquisa Romantismo, contos de
fadas e fantstico, tendo publicado Mito e magia (Edunesp, 2011) e Dimenses
do fantstico, mtico e maravilhoso (Cultura Acadmica, 2011), Vertentes
do fantstico na literatura (Annablume, 2012), alm de tradues de E.T.A.
Hoffmann, Tieck, Fouqu, Lessing, Brant, dentre outros.
RAINER BETTERMANN
Docente de Alemo como Lngua Estrangeira na Friedrich-Schiller-Universitt
Jena. Foi Leitor de Alemo em Lisboa (1976-1981) onde editou o livro Poesia da
R.D.A. Breve antologia (1980, com lvaro Pina). Traduziu para o alemo os romances Levantado do cho (1985, com Rosi Bettermann) e O Ano da Morte de Ricardo
Reis (1988) de Jos Saramago.
REGINA MICHELLI
Professora Associada de Literatura Portuguesa na UERJ, DE, doutora, desenvolvendo projetos de pesquisa em Literatura Infantil e Juvenil, acerca das identidades de gnero (configuraes arquetpicas do masculino e do feminino) e do
maravilhoso.
WILMA PATRCIA MAAS
Professora de lngua e literatura de expresso alem na Unesp-Araraquara e lder
do grupo de pesquisas Literatura, arte e filosofia na poca de Goethe. Desenvolve pesquisas sobre Goethe, Friedrich Schlegel, Bildungsroman, Primeiro
Romantismo Alemo (Frhromantik) e autora do livro O cnone mnimo: o
Bildungsroman na histria da literatura (EDUNESP, 2000) .
MAGALI MOURA
Docente da UERJ atua na Graduao e Ps-graduao em Letras com bolsa do
Programa Procincia UERJ/FAPERJ. Tem como foco de pesquisas a chamada poca
de Goethe, com vrias publicaes sobre o tema em revistas e livros, lder do
grupo de pesquisas Literatura, arte e filosofia na poca de Goethe. Atualmente
dedica-se traduo do Livro de Fausto (Faustbuch) de Spiess e a preparao de
uma edio crtica das peas de juventude de Goethe.
FERNANDA LIMA
Fernanda Lemos de Lima professora adjunta da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro e atua na graduao de Letras nas reas de Cultura Clssica, Lngua
e Literatura Gregas e no mestrado em Literatura Comparada e Teoria da
Literatura. Publicou o estudo Entre quartos ruas e cafs: imagens da poesia
homoertica de K. P. Kavfis, dentre outros textos e tradutora de poesia grega
antiga e moderna.
MAMEDE JAROUCHE
Professor de Lngua e Literatura rabe na USP, pesquisador e tradutor.
MARCUS MAZZARI
Marcus V. Mazzari professor de Teoria Literria na USP, tradutor e tambm
autor, entre outros, de Labirintos da aprendizagem (Editora 34, 2010). Elaborou
os prefcios, comentrios e notas aos volumes Fausto I (Editora 34, 2004 edio
revisada e ampliada: 2010) e Fausto II, de Goethe (Editora 34, 2007), em traduo
de Jenny Klabin Segall.
DELIA CAMBEIRO
Professora Associada UERJ. Doutora e Ps-Doutora em Literatura Comparada.
Docente da Graduao e da Ps-Graduao. Bolsista do Programa Procincia
UERJ/FAPERJ; publicou, em 2010, Vises e revises em Literatura Comparada,
alm de artigos em captulos de livros e em vrias revistas especializadas. Prepara,
sob a tica Literatura e Cidade, um livro sobre a lrica urbana do poeta carioca
Reynaldo Valinho lvarez e outro com artigos crticos. Ex-professora da Alliance
Franaise. Tradutora.
ISBN 978-85-60559-16-9