Capelozza
Capelozza
Capelozza
Resumo
Introduo: a anlise facial tem sido um recurso diagnstico valorizado desde os primrdios
da Ortodontia. Vrios autores tentaram estabelecer referncias de normalidade na direo das
quais os pacientes ortodnticos deveriam ser tratados. Essa preocupao da Ortodontia est
em concordncia com a expectativa do paciente, cuja principal motivao para o tratamento
ortodntico a melhora esttica. Para que os objetivos do profissional possam solucionar a
queixa do paciente fundamental que o ortodontista conhea os parmetros utilizados pela
sociedade na avaliao esttica. Sugerimos, por meio desse trabalho, uma nomenclatura que
permita a realizao da Anlise Facial Subjetiva, esttica e morfolgica. Objetivo: avaliar a
aplicao prtica da anlise. Metodologia: solicitou-se a um grupo heterogneo de avaliadores (14 ortodontistas, 12 leigos e 7 artistas) que dessem notas ao perfil facial de 100 indivduos (50 de cada gnero) classificando-os como esteticamente desagradveis (notas 1, 2 ou
3), esteticamente aceitveis (notas 4, 5 ou 6) e esteticamente agradveis (notas 7, 8 ou 9).
Resultados: 89% dos perfis foram esteticamente aceitveis, 8% desagradveis e 3% agradveis.
Em 38,35% das justificativas, o nariz foi a estrutura responsvel pela esttica desagradvel, seguida pelo mento (queixo) em 18,9% dos relatos. Concluso: foi possvel observar, portanto,
que a Anlise Facial Subjetiva mais um instrumento diagnstico, que tem sua importncia
aumentada por ser o parmetro pelo qual o paciente e as pessoas com as quais ele convive vo
avaliar os resultados do tratamento.
Palavras-chave: Anlise facial. Esttica. Ortodontia.
introduo
A Odontologia moderna tem seu sucesso associado unio sinrgica de todas as especialidades,
sejam elas Dentstica, Prtese, Cirurgia ou Ortodontia, para a construo de um sorriso saudvel,
mas principalmente esttico. Essa premissa est
de acordo com as expectativas dos pacientes, que
tem por principal motivao para o tratamento a
melhora esttica advinda do mesmo. Na Ortodon-
* Doutoranda em Ortodontia pela USP - So Paulo. Mestre em Ortodontia pela Universidade Metodista de So Paulo. Especialista em Ortodontia pela
PROFIS USP Bauru. Professora Assistente do Departamento de Ortodontia da Universidade Metodista de So Paulo.
** Professor Livre Docente da Faculdade de Odontologia da Universidade de So Paulo.
*** Professor Doutor da Faculdade de Odontologia da Universidade de So Paulo Bauru. Membro do setor de Ortodontia do HRAC USP Bauru.
**** Doutoranda em Ortodontia pela USP So Paulo. Mestre em Odontologia. Especialista em Ortodontia. Professora Colaboradora Assistente da
Disciplina de Ortodontia do Departamento de Odontologia da Universidade de Taubat.
159
normal e adequada harmonia facial. A maioria deles portava desarmonia facial, devida protruso
exagerada dos incisivos, exigindo retratamento.
O equilbrio foi ento obtido s custas de exodontias, contrariando todas as filosofias vigentes at
ento.
A posio do incisivo inferior, avaliada na telerradiografia do perfil, passou ento a definir a necessidade de exodontias a fim de obter um ngulo
entre o longo eixo do incisivo inferior e o plano
palatino de 90 5. Segundo Tweed41, esse parmetro estava relacionado esttica facial agradvel.
A utilizao destes e outros parmetros cefalomtricos na definio dos planos de tratamentos resultou em extraes desnecessrias e iatrogenias na esttica facial, identificadas por autores da literatura
norte-americana como dish face ou face cncava.
A perspectiva atual da prtica e da pesquisa
odontolgica exige que o profissional se aproxime
das expectativas do seu paciente ao definir a melhora da esttica facial e do sorriso como o principal objetivo do tratamento, e a avaliao direta
da face do paciente como seu principal recurso
diagnstico, a qual permite observar as caractersticas faciais harmoniosas e desarmoniosas como o
paciente avaliado por si mesmo e pelos seus pares.
Ao paciente, definitivamente, no interessa que os
ngulos e propores de sua face estejam dentro de
um padro de normalidade se este padro no se
adequar s suas caractersticas tnicas e individuais.
A principal aspirao do paciente ser reconhecido
como bonito, ou no mnimo normal, por si mesmo
e pela sociedade, eliminando caractersticas desagradveis do sorriso e de sua face.
Dentro dessa perspectiva, devemos entender
como a populao realiza a apreciao esttica
dos seus integrantes, para que possamos reproduzir essa avaliao na nossa rotina de diagnstico.
Para tanto, alguns conceitos de esttica utilizados
pela populao devem ser entendidos.
ESTTICA
Conceitualmente, esttica a apreciao da
160
beleza, ou a combinao de qualidades que proporcionam intenso prazer aos sentidos, s faculdades intelectuais e morais11. Portanto a identificao da beleza est relacionada a uma sensao
de prazer diante da visualizao de um objeto,
um som, uma pessoa. Por ser uma sensao prazerosa, o conceito de beleza prprio de cada
indivduo, sendo estabelecido a partir de valores
individuais relacionados ao gnero, raa, educao e experincias pessoais; e a valores da sociedade como o ambiente e a publicidade (mdia),
cada vez mais responsvel pela globalizao do
conceito de beleza.
Inmeros autores j tentaram definir caractersticas faciais responsveis pela esttica agradvel
(beleza). Wuerpel43, Herzberg13 e Brons4 observaram que a esttica agradvel estaria associada harmonia e ao equilbrio entre as partes constituintes
do perfil facial. Rickets39 e Jefferson15 observaram
que a beleza estaria associada coincidncia das
propores faciais com a proporo urea. Cunningham7, Peck30 e Perret et al.33 associaram a
beleza a caractersticas neonatais. Segundo esses
autores, as faces consideradas mais atrativas seriam
aquelas com olhos grandes e espaados, rea nasal
pequena e mento pequeno, consideradas caractersticas neonatais, associadas a caractersticas de
maturidade, como maxilares proeminentes, e de
expresso, como sobrancelhas altas.
No af de identificar a caracterstica da beleza,
Langlois e Roggman19, Langlois et al.20 e Perret et
FIGURA 1 - A apreciao esttica varia para cada populao em diferentes momentos histricos.
161
Os estudos j realizados nos habilitam a afirmar que 80% dos pacientes desejam uma melhora
esttica da face e do sorriso, para ser reconhecido
como normal na sociedade da qual fazem parte.
Portanto, o ortodontista deve, ao incio do tratamento, definir os objetivos e limitaes do caso,
estabelecendo um planejamento ortodntico que
d ao paciente a melhor face e o melhor sorriso
possveis, esclarecendo ao paciente as possibilidades e limitaes do seu caso, eliminando, dessa
forma, expectativas irreais.
O objetivo do profissional s pode condizer
com a expectativa do paciente se o ortodontista
conhecer os parmetros utilizados pela sociedade
na avaliao esttica dos seus membros. Para esta
avaliao consideramos necessrio criar uma nomenclatura que possibilite a realizao da Anlise
Facial Subjetiva.
ANLISE FACIAL SUBJETIVA ESTTICA
A Anlise Facial Subjetiva permite o estudo
da avaliao esttica realizada rotineiramente pela
sociedade. Por meio dessa anlise classificamos os
indivduos, de acordo com a agradabilidade esttica, em esteticamente agradvel, esteticamente
aceitvel e esteticamente desagradvel.
Um dos objetivos dessa anlise facilitar a comunicao entre o paciente e os profissionais envolvidos no tratamento.
Essa nomenclatura foi anteriormente utilizada
Esteticamente agradveis
Esteticamente
aceitveis
Esteticamente desagradveis
FIGURA 2 - Pirmide de agradabilidade esttica.
162
por Neger e Newark27 que afirmaram ser a maioria da populao composta por indivduos esteticamente aceitveis.
A partir dessa conceituao construmos a pirmide de agradabilidade esttica (Fig. 2). O objetivo
do ortodontista deve ser realizar uma melhora do
paciente na pirmide. Os pacientes esteticamente
desagradveis devem ter a possibilidade de, ao final do tratamento, serem classificados como esteticamente aceitveis e os pacientes esteticamente
aceitveis e agradveis s podem ser submetidos a
procedimentos que mantenham ou incrementem
a classificao do paciente na pirmide.
Com o intuito de avaliar a distribuio dos brasileiros, adultos, normais, ou seja, representativos
da maioria da populao, na Pirmide de Agradabilidade, realizamos um estudo com uma amostra
de 100 indivduos (50 de cada gnero) leucodermas, com idade mdia de 23 anos e 7 meses, com
desvio-padro de 3 anos e 6 meses, variando de
18 a 36 anos (Tab. 1). A maioria da amostra foi
constituda por alunos, professores e funcionrios
da Universidade Metodista de So Paulo.
Os critrios utilizados para a incluso do indivduo na amostra foram a presena de um adequado equilbrio muscular facial, representado pelo
selamento labial passivo, ausncia de tratamento
ortodntico ou cirurgia facial prvios e disponibilidade de participar deste estudo.
Para cada indivduo da amostra foram obtidas
medidas descritivas
varivel
gnero
feminino
mnimo
mximo
mdia
d.p.
18,8
33,2
23,4
2,9
idade
masculino
18
36
23,8
3,9
avaliador
medidas descritivas
mnimo
mximo
mdia
d.p.
ortodontista
masculino
36
56
44,7
7,8
0,57 n.s.
ortodontista
feminino
35
53
40,4
5,8
F=M
leigo masculino
27
53
35,7
9,2
leigo feminino
21
40
30,7
8,9
artista feminino
25
48
34
8,9
163
mnimo
mximo
mdia
d.p.
primeira
4,9
1,6
segunda
4,9
1,5
0,357 n.s.
perfil
P=S
164
desagradvel 8%
agradvel 3%
90 (45)
100
88 (4)
90
80
agradvel
aceitvel
aesagradvel
porcentagem
70
aceitvel 89%
50
40
30
20
10
0
6 (3)
4 (2)
feminino
12 (6)
0 (0)
gnero
masculino
60
esttica agradvel ou desagradvel. Morris25; Nanda, Gosh26 e Brons4 associaram a esttica agradvel
harmonia e equilbrio entre as partes do perfil
facial. Perrin34 identificou, no perfil feminino, a
forma do mento e, no masculino, a boca e os lbios
como partes importantes na avaliao esttica, porm observou que a classificao esttica dos indivduos no baseada em qualquer caracterstica
do avaliado, mas no sentimento despertado pelo
mesmo no avaliador.
Cox e Van der Linden9 associaram o aumento
da convexidade do perfil aparncia esttica desagradvel. Em 1976, Terry e Davis40 observaram
que os componentes faciais mais importantes na
avaliao esttica da face foram primeiro a boca,
seguida dos olhos, estrutura facial, cabelo e nariz,
nessa ordem. Cunningham7, Peck30 e Perret et al.33
sugeriram que os indivduos esteticamente agradveis seriam aqueles com caractersticas faciais neonatais. Por sua vez, Langlois e Roggman19 e Langlois
et al.20 identificaram, nos indivduos esteticamente
agradveis, as medidas faciais mdias da populao
qual pertenciam, sugerindo que a face percebida
como agradvel a face mdia da populao.
Brons4 observou que a face harmoniosa vista
como uma unidade, enquanto na face desarmoniosa a ateno atrada pelo elemento que est
fora de equilbrio, denominado pelo autor de elemento discordante.
165
Tabela 4 - Justificativas apresentadas pelos examinadores para classificao dos indivduos esteticamente
desagradveis.
gnero
feminino
masculino
justificativa
nariz
24
40,7
64
35,8
queixo
13,6
37
20,7
maxila
11,9
1,7
olhos
6,8
1,7
boca
5,1
pele
5,1
3,4
lbios
3,4
10
5,6
ngulo nasolabial
3,4
perfil
3,4
1,7
testa
1,7
2,2
excesso de tecido
mole
1,7
0,6
face longa
1,7
0,6
pescoo
1,7
ngulo queixopescoo
15
8,4
linha queixopescoo
2,2
tero inferior da
face
1,7
sulco mentolabial
1,1
bochecha
1,1
0,6
0,6
olhar
0,6
rosto
0,6
total
59
100
179
100
166
167
168
169
170
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Endereo de correspondncia
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