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WOOD, Denis. Cartography is dead (Thank god!). Cartographic Pespectives, NACIS, n. 45, 2003, p. 4-7.

Traduo preliminar: Gisele Girardi ago/2012 (Para uso em grupo de pesquisa. No circula)


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Cartografia est Morta (Graas a Deus!)
Denis Wood*

Cartografia Est Morta (Graas a Deus!)
Vamos admitir. A cartografia est morta. E ento vamos agradecer nossas estrelas da sorte
que a melhor parte do mapeamento do sculo est se libertando da mo morta da academia.
Esse o cerne da questo: assim como cartografia subjulgou
1
o mapeamento, os
departamentos universitrios de geografia subjulgaram a cartografia. Alguns mapeadores
foram felizes em "atualizar" sua denominao, espalhando as implicaes do ofcio de "fazer"
e assumindo o ttulo de "professor", mas, em geral, muito imperativos do mapeamento
universal foram condicionados dessa forma e assim, no importa o quanto os cartgrafos
acadmicos exigissem, poucos notaram, e ainda menos deram ateno s tentativas de fazer
da cartografia uma profisso. Durante todo esse perodo o que poderamos chamar de a Era
de Cartografia pessoas de todo o tipo de perfil continuaram a fazer todo tipo concebvel de
mapa. Hoje cada vez mais difcil, mesmo para cartgrafos, pretender ter alguma relevncia.
Quantas pessoas participaram da NACIS XXIII
2
? Umas 150? Eu tenho dito que 11.000 pessoas
participaram da mais recente conferncia de usurios da ESRI
3
. Cartografia? Faa-me o favor!
Cartografia? O que cartografia?
Mas, ento, fcil vem, fcil vai.
Quando eu digo s pessoas que a sua cartografia no muito melhor do que a de cem anos
atrs elas me olham como se eu fosse louco. Apontando para palavras como "pr-histrico",
"antigo" e "medieval", por exemplo, no ttulo do primeiro volume da Histria de Cartografia de
Harley e Woodward, elas me perguntam: "Do que voc est falando?" Os fatos so bastante
simples: at onde sabemos "cartografia" foi um termo cunhado como um neologismo
Portugus ("cartographia") pelo Visconde de Santarm em 1839. Helen Wallis e Arthur
Robinson dizem que a palavra "foi rapidamente tomada e aplicada elaborao de mapas", e
que "os mapeadores foram logo chamando-se cartgrafos". Na verdade, "cartografia" no
atestada pelo Dicionrio Oxford de Ingls at 1859, nem "cartgrafo" at 1863, "cartogrfica"
no at 1880 (na frase "a arte cartogrfica est apenas em sua infncia"), e "cartograma" no
at 1890 (e no em seu sentido moderno at 1934). A palavra parece ter pegado apenas
gradualmente, de fato, exatamente como o assunto a que se refere foi fazendo o seu caminho
para as salas da academia. Imagine tentar justificar uma posio do corpo docente em
"mapeamento". "Cartografia" soa muito mais respeitvel.
Em 1962, Erwin Raisz apontou que "Em 1920, havia apenas duas universidades com cursos em
cartografia. Atualmente, o nmero bem mais de uma centena". Como sabemos, o nmero
continuou a aumentar at o incio dos anos 1990, quando comeou a declinar. Os sinais de que

1
NT. No original, shangaiing, expresso que significa a ao pirata de sequestrar e escravizar.
2
NT. Refere-se ao 23 encontro da NACIS - North American Cartographic Information Society, realizado em
Jacksonvile (Flrida), em outubro de 2003.
3
NT. Environmental Systems Research Institute. Empresa americana que produz o software ArcGis.
WOOD, Denis. Cartography is dead (Thank god!). Cartographic Pespectives, NACIS, n. 45, 2003, p. 4-7.
Traduo preliminar: Gisele Girardi ago/2012 (Para uso em grupo de pesquisa. No circula)


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esta queda vai acelerar esto por toda parte. Eu estou apostando que nenhum dos cargos
atualmente ocupados por cartgrafos ser preenchido com eles uma vez que estiverem vagos.
Cartografia vai passar a ser um fenmeno ocorrido em meados do sculo XX.
O campo est morto. Estamos apenas esperando o estertor. A palavra vai ficar por um tempo
(palavras fazem isso), mas o seu dia est passando tambm.
E tem que ser assim. Tome o seu uso em frases como "a histria da cartografia" ou "inovaes
cartogrficas". Aplicada cartografia antes de 1839 para escolher a data mais concebvel a
palavra na melhor das hipteses anacrnica, e, na pior, imperdoavelmente presunosa.
Confundir a histria do mapeamento com a da cartografia como confundir a histria de
andar com a do automvel. Se escrevssemos a histria do automvel como se escreve a
histria da cartografia, volumes seriam dedicados inveno de sandlias, de sapatos. No
s bobagem, isto nega a novidade da inovao quando ela chega. Se "cartografia" sobreviver,
ser apenas para referir-se prtica da cartografia acadmica no sculo XX.
No no dezenove?
No, a palavra ento era muito nova. Ainda estava em busca de seu objeto prprio e da forma.
Ela ainda tinha de entrincheirar-se. Isso s aconteceu uma vez que aqueles que se
autodenominaram cartgrafos se entrincheiraram nas universidades e nas burocracias
governamentais relacionadas.
Mapeamento no suportaria esta profissionalizao sozinho. O que aconteceu com a
cartografia aconteceu com uma srie de prticas como parte de uma profissionalizao geral,
um "aburguesamento" do que podemos chamar de negcios do "colarinho branco".
Aprendizagem desapareceu para ser substituda pela escolaridade. Os nomes foram alterados.
Eles foram latinizados. Coveiros se tornaram agentes funerrios. Reprteres se tornaram
jornalistas. Os professores se tornaram educadores. Cirurgies se tornaram mdicos.
Mapeadores tornaram-se cartgrafos. Ivan Illich se refere metade do sculo XX como A Era
das Desativaes das Profisses, "desativar" porque a profissionalizao de muitos trabalhos
tende a desabilitar no-profissionais de imaginar que poderiam... enterrar um corpo, comear
um jornal, ensinar, cuidar de sua prpria sade, fazer um mapa.
Para dar um exemplo perfeitamente paralelo, foi em meados do sculo XIX que Frederick Law
Olmsted e Calvert Vaux cunharam a expresso "paisagista" para si mesmos. "Paisagista" pegou
como uma forma de designar aqueles que projetavam jardins, parques, campus, locais
residenciais, at mesmo cidades. Em 1900, Harvard criou o primeiro departamento de
paisagismo. O nmero de departamentos aumentou apenas lentamente, mas explodiu aps a
Segunda Guerra Mundial. Logo histrias do paisagismo estavam sendo escritas. Eu preciso
dizer que esses historiadores descobriram paisagismo na pr-histria e no perodo antigo e
medieval? Paisagistas hoje tambm esto a cair em tempos difceis como engenheiros civis,
arquitetos, urbanistas (que romperam com o paisagismo na dcada de 1920), designers de
parques e jardins (de novas escolas em florestas e recursos naturais), jardineiros, artistas da
terra, e outros assumir o design de jardins, parques, playgrounds, subdivises, cidades.
Profisses mais fortes se organizam para prevenir a prtica de seus mistrios por estranhos
Illich pensa em profisses como cultos induzindo legislaturas a aprovar leis de licenciamento.
Profisses mais fracas se contentam com programas de certificao. Os mais fracos se viram
como podem. contra a lei exercer a advocacia ou a medicina sem licena. Professores de
escolas pblicas e contabilistas precisam ser certificados. Qualquer pessoa pode auto-intitular-
WOOD, Denis. Cartography is dead (Thank god!). Cartographic Pespectives, NACIS, n. 45, 2003, p. 4-7.
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se um decorador de interiores ou um cartgrafo. Mas todas as profisses igualmente repelem
ameaas integridade do seu profissionalismo denegrindo o trabalho no profissional como,
na melhor das hiptese, incompetente, e na pior, como perigoso, ameaador, e mesmo mal.
Considerando o fato de que quase todos os mapas so, e sempre foram, feitos por no-
profissionais (pelo menos cartgrafos amadores), a cartografia como uma profisso tem sido
relativamente tranquila sobre a qualidade do trabalho no profissional. Ela geralmente tem se
contentado a encorajar o que foi considerado bom. Mas quando ameaada, ela respondeu
com total altivez profissional.
Clssica foi a sua reao ao mapa de Peters. O mapa de Arno Peters foi ignorado at a sua
proeminncia e quando as vendas dispararam. Em seguida, ele foi atacado em todas as
frentes: o mapa era feio, a projeo foi roubada, e Peters no era um cartgrafo mas
(surpresa!) um jornalista propagandista para (suspiro duplo!) causas de esquerda. Quando esta
estratgia falha em conter a crescente popularidade do mapa, o American Congress on
Surveying and Mapping emitiu um pronunciamento
4
contra no apenas o mapa de Peters, mas
todos os mapas do mundo retangulares. Isto teve o efeito til de condenar o mapa de Peters
juntamente com o de Mercator (que Peters estava usando como um bode expiatrio para
defender a superioridade de sua prpria projeo), enquanto pareceria no atacar nenhum. O
estratagema no enganou ningum: para castigar os mapas de Peters e de Mercator, o ACSM
se preparou para excomungar toda uma classe de projees. Quase toda a profisso aprovou
esta resoluo idiota. Assinaram a Associao Cartogrfica Americana, a Sociedade Geogrfica
Americana, a Associao de Gegrafos Americanos, a Associao Cartogrfica Canadense, o
National Geographic Society (o NACIS no). A completa falta de efeito da resoluo sua risvel
falta de efeito demonstrou quo pouca autoridade a profisso tinha.
Isto foi em 1989. Foi, de certa forma, a sentena de morte da profisso. SIG e ESRI s rolaram o
cadver para o precipcio.
O episdio inteiro em sua rgida afetao cujo tom esnobe
5
atrai apologistas profissionais at
hoje! tornou muito claro por que a profisso tinha que sumir: era o caminho. De qu? Da
evoluo contnua do mapeamento humano no da cartografia. A questo que quando se
trata de mapeamento no h estranhos, no mais do que h pessoas estranhas quando se
trata de falar ou escrever em ingls. Estes so direitos de nascimento dos membros da nossa
sociedade, que adquirem a capacidade de falar e fazer mapas medida que crescem. Falar e
criar mapas no so como cirurgia de corao ou basquete profissional, que exigem formao
especializada e anos de prtica. Voc no pode simplesmente entrar na pele de um jogador da
NBA e esperar marcar. Voc no pode simplesmente abrir o peito de seu amigo e reparar seu
corao, no importa o quanto a situao exiga. Mas quando uma situao de comunicao
exige falar ou fazer um mapa, voc pode apenas abrir a boca (ou atacar o teclado) ou pegar a
caneta (ou o mouse).
No tenho nenhum interesse em negar que a formao especializada e anos de prtica pode
transformar a fala trpega em eloqncia, ou um esboo bruto em uma anlise penetrante,
mas, surpreendentemente, treinamento e prtica no so garantia de nada. O que parece
promover ambos so situaes que os exigem e pessoas que esto dispostas a enfrentar o
desafio. Eu estou pensando no momento que Gwendolyn Warren teve a necessidade de
mapear onde os motoristas de Detroit atropelaram crianas negras na pista Pointes-

4
NT. No original, fatwa.
5
NT. No original: holier-than-thou
WOOD, Denis. Cartography is dead (Thank god!). Cartographic Pespectives, NACIS, n. 45, 2003, p. 4-7.
Traduo preliminar: Gisele Girardi ago/2012 (Para uso em grupo de pesquisa. No circula)


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Downtown, mas eu poderia facilmente estar pensando em John Snow lutando com a natureza
da clera ou Tom Van Sant com a fragilidade da terra. Eu poderia estar pensando na
compulso de Joseph Minard em mapear as perdas de Napoleo em sua campanha da Rssia
ou na de Woody Sullivan de mapear a radiao eletromagntica da Terra (e assim produzir o
primeiro mapa da Terra noite). Eu poderia estar pensando no Mapa Dymaxion de
Buckminster Fuller para o qual ele foi guiado por sua convico de que "nave espacial Terra"
requeria uma nova forma de ser vista para que sua realidade global pudesse ser apreendida,
mas eu poderia muito bem estar pensando em na Delimitao dos estratos da Inglaterra e do
Pas de Gales com a parte da Esccia" de William Smith, para a qual ele foi impulsionado por
sua convico de que a Terra precisava de uma nova forma de ser vista em sua realidade
geolgica para ser apreendida. Eu poderia estar pensando nos "mapas mentais" de Boston de
Kevin Lynch, ou no mapa do Metr de Londres de Harry Beck, com a mesma facilidade.
uma longa lista, esta de mapas feitos por pessoas que eram tudo, menos cartgrafos
profissionais, que eram, nos casos acima, "uma pessoa negra de Detroit", um homem da
medicina, um artista, um engenheiro, um astrnomo, um designer/engenheiro/arquiteto/
visionrio, um "escavador de canal", um planejador urbano, um desenhista de engenharia... As
situaes de comunicao em que se encontravam clamavam por mapas e, como seres
humanos de sociedades imersas em mapas, fizeram mapas em resposta. Milhares e milhares e
milhares de mapeadores, treinados em qualquer coisa menos cartografia, fazem isso todos os
dias, muitos deles fazendo a sua vida com isso, e muitos dos mapas que fazem so to bons
quanto qualquer outro que j tenha sido feito. Alguns deles, como os exemplos acima, com
certeza mudaram a forma como pensamos sobre o mundo e sobre mapas.
H muito que os cartgrafos aprenderam o que til e valioso no tenho interesse em
depreciar as contribuies positivas feitas pelas geraes de cartgrafos acadmicos , mas h
muito que era madeira morta, desde o princpio, e est to podre que hoje est ameaando o
resto. Toda a besteira prescritiva, todo mapa deve ter uma legenda e uma escala toda de
fato ignorou um zilho de mapas eficazes e teis, e isto tem que parar. E design! Cartgrafos
acadmicos nunca entendenderam nada nada sobre design. Deus sabe que, no conjunto,
os mapas menos interessantes, menos atraentes, menos significativos foram feitos por
cartgrafos universitrios: toda a conversa sobre design, vinda de analfabetos em design, tem
que parar. E a intimidao dos entendidos orientando as pessoa voc no pode alterar a
escala em uma mquina de Xerox tambm no ajuda. til seria oferecer assistncia
profissional, e de joelhos, se necessrio, a todas as pessoas que tentam melhorar sua situao,
mapeando-a: os Primeiros Povos que vieram a saber o que mapa ou ser mapeado, os locais
pobres tentando lidar com o impacto da minerao transnacional, da extrao de madeira e do
desenvolvimento industrial; as pessoas preocupadas com a rpida deteriorao de seu meio
ambiente, as pessoas que tentam se encontrar no conceito de lugar...
Cartgrafos desempenharam um papel significativo em tornar o mundo seguro para os
colonizadores, os conglomerados de minerao e os militares. Precisamos retribuir. Nada mais
salva a profisso. o fim. Mas enquanto ela desaparece ainda h uma oportunidade de deixar
um legado que poderamos contemplar, sem vergonha. Isso no pode estar alm do nosso
alcance.
*Por 25 anos Denis Wood ensinou design da arquitetura da paisagem e histria da arquitetura
da paisagem como um professor na School of Design da North Carolina State University. Seu
livro Five Billion Years of Global Change acaba de ser publicado pela Guilford Press.

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