Ansiedade

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Luciana Raupp Di Bernardi 1

www.psicologia.com.pt
O DEVIR DO ANSIOSO:
PARE, PEA AJUDA. VOC NO PODE DAR CONTA DE TUDO

(2006)

Luciana Raupp Di Bernardi
Psicloga. Tribunal de J ustia do Estado de Santa Catarina
Diretoria de Sade - Seo Psicossocial Ambulatorial (Brasil)

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RESUMO

No processo de cura das desordens de ansiedade, constatamos a necessidade quase que
impositiva, por parte do terapeuta, de trabalhar o parar, o descansar, o no fazer presso e o
aprender a tomar flego antes de qualquer coisa. Sugere-se que o indivduo tem que aprender a
no ter pressa, aprender a fazer uma tarefa de cada vez e a deixar de lado a prepotncia de sua
mente, ou seja, o querer controlar e dar conta de tudo. Afinal, as solues para os problemas dos
pacientes com estes distrbios parecem no estar em suas mentes, mas nos fatos em si, ou seja,
nas aes dos mesmos.

Palavras-chave: Ansiedade, desordens, sintomatologia, psicodinmica, terapia


Para que possamos compreender o conceito da ansiedade, conceito este de carter
predominantemente psicodinmico, precisamos analisar sua evoluo desde o nascimento do
indivduo, bem como indubitavelmente fazermos a distino do conceito do seu parente mais
prximo: o medo.
De acordo com GRSPUN (1979) existe o que chamamos de ansiedade primitiva, ou
ansiedade reflexa, a qual est diretamente ligada a brusca eliminao de txicos na primeira
distenso muscular da caixa torxica. Essas primeiras reaes variam de indivduo para
indivduo, segundo determinante constitucionais (traos hereditrios e anomalias do Sistema
Nervoso Central SNC) e determinantes ambientais (experincias intra-uterinas e nascimentos
prematuros). Apenas com o desenvolvimento do SNC que ir surgir a chamada funo
voluntria cortical e as respostas de alerta ante o perigo iminente tornam-se controladas e
intelectuais. A essa resposta damos o nome de medo. O medo, desta forma, um estado

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emocional de alerta ante o perigo, caracterizado por um conhecimento intelectual do mesmo e de
controle cortical, com apenas sensao psicolgica. A ansiedade, por sua vez, um estado
emocional de alerta ante o perigo, todavia desprovido de contedo intelectual e, pelo tom
emocional especfico (tlamo-hipotalmico), tem manifestaes perifricas, sendo mais comuns
os distrbios respiratrios.
A ansiedade, extensivamente explicao supramencionada, nos remete a uma antecipao
do sofrimento propriamente dito, por ser uma manifestao subjetiva interna referente sempre a
conflitos e necessidades no satisfeitas dentro da personalidade e, portanto, inconscientes.
Podemos inferir, desta forma, que a ansiedade uma sensao decorrente da excessiva
excitabilidade no SNC, onde o estmulo seria uma interpretao inconsciente, por parte do
indivduo, de uma situao de perigo iminente. Nossa mente, por necessitar de uma situao de
segurana e bem-estar, ir estimular nosso corpo para uma situao de luta ou de fuga e, em
decorrncia, ocorrerr uma acelerao do pensamento com o objetivo de fazer com que o
indivduo planeje uma forma de se livrar dessa situao de perigo o mais rapidamente possvel.
Lembra-nos muito bem o Dr. Isaac Efraim (2006): "Este movimento mental, na maioria das
vezes acaba causando uma certa confuso mental, uma ineficincia da ao, um aumento da
sensao de perigo e de incapacidade de se livrar do mesmo, o que configura um crculo
vicioso" (www.ansiedade.com.br). No medo em si, o quadro nos apresentado de forma
diferente, pois neste sentimento existe uma percepo relativamente clara dos elementos
perigosos da situao e da direo do impulso. Cabe aqui ressaltar a importncia do terapeuta em
investigar as reaes do indivduo frente ansiedade na 1
a
fase do desenvolvimento infantil,
tendo em vista as mesmas serem os determinantes bsicos da personalidade.
Ainda segundo GRNSPUN (1979), podemos encontrar a ansiedade presente em
praticamente todos os distrbios de conduta e muitas crises de ansiedade so consideradas
inevitveis e at mesmo fisiolgicas, como nos mal-estares orgnicos metablicos, vasculares,
txicos, etc. A ansiedade patolgica sempre evolui do medo, atravs de perturbaes de conduta,
transitando evolutivamente desde timidez e vergonha at as crises de ansiedade. Para que seja
possvel uma adequada abordagem do quadro que nos apresentado, temos que nos reportar a
possveis causas usualmente consideradas predisponentes da ansiedade: os fatores
constitucionais ou hereditrios (onde o indivduo herda dos seus ancestrais uma pr-disposio
para os sintomas de ansiedade); os fatores culturais e os fatores ambientais (neste ltimo, nas
atitudes dos pais destacam-se a rejeio, a superproteo, a hostilidade e a ansiedade, as quais
podem provocar no indivduo em desenvolvimento as maneiras de resposta de contgio ou os
conflitos intrapsquicos. Complementando nossa abordagem, existem os fatores chamados
desencadeantes, que so os estmulos, dentre eles: acidentes de carro onde o indivduo "viu a
morte de perto", doenas graves ou crnicas; mudanas de ambiente (de emprego, de escola, de
residncia, de cidade); incio de ano escolar; experincias sexuais; etc. estes estmulos podem ser
considerados experincias traumticas, onde uma nica vivncia deste tipo seria a responsvel

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pela instalao do quadro ansioso ou seu desencadeamento no caso da constatao conjunta de
algum fator predisponente. Uma outra possvel origem, de acordo com autores como Grspun
(1979) e Dr. Efraim (2006), a dificuldade que geralmente o indivduo possui em assimilar fatos
novos ou desconhecidos, pois isso certamente poder fugir do seu controle.
A ansiedade pode ser algo saudvel, desde que se limite em nos colocar em alerta para algo
novo, para uma nova luta ou at mesmo um perigo. Todavia, esta ansiedade, a partir do momento
em que se tornar demasiada, o indivduo ir encontrar dificuldades para lidar com situaes tidas
como simples no seu dia a dia. Esta averiguao poder ser realizada atravs da tentativa de
julgar se esta ansiedade apropriada situao vivida pelo paciente. Elucida-nos Willian V.
Good e J efferson E. Nelson (1992): "deixe o paciente contar-lhe quo perturbado ele se sente.
Sua experincia subjetiva importante. Observe alteraes comportamentais que existem para
evitar a ansiedade, tais como permanecer em casa o dia todo ao invs de trabalhar" (1992,
p.43). O comportamento evitativo, desta maneira, item fundamental na avaliao do quadro
apresentando. Outras queixas, tais como leveza na cabea, extremidades que adormecem,
hiperventilao e uma sensao de "irrealidade" so freqentes expresses do quadro ansioso.
Alm disso, podemos nos deparar tambm com componentes de cunho fisiolgico traduzidos em
expresses de tenso motora e hiperatividade autonmica. Segundo esses autores, podemos
classificar os transtornos de ansiedade em dois tipos: 1) os transtornos de ansiedade primria,
que abrangem as fobias, os ataques de pnico, a ansiedade generalizada, os transtornos de
estresse ps-traumtico, os transtornos obsessivos-compulsivos e os episdios dissociativos; e
2) os transtornos de ansiedade secundria, onde a ansiedade pode ser secundria a transtornos
psiquitricos como a esquizofrenia, a demncia, o delirium, a depresso e determinadas
condies mdicas como drogas, hipertireoidismo, hipoglicemia, arritmias cardacas, prolapso da
vlvula mitral e hipxia. Importante, tambm, reportarmo-nos classificao constante no DSN-
IV, que engloba como desordens de ansiedade: ansiedade; angstia; estresse; ataque de pnico;
transtorno de pnico; depresso reativa (adquirida); transtorno obsessivo compulsivo; fobia
simples; agorafobia; claustrofobia; fobia social; fobia processual. Todas estas desordens so
agrupadas por terem uma base ansiosa.
A Dra. Sofia Bauer (2002) nos lembra da importncia de termos clara a interligao com
quadros ansiosos e depressivos. Nas desordens de ansiedade comum encontrarmos pessoas
exigentes, que querem sempre mais e melhor. Isso ocasiona um aceleramento de aes e
preocupaes no indivduo. Como se o indivduo dissesse: "No sou to amado, se eu for o que o
outro desejar, posso ser mais amado". Existe uma espcie de procura do amor no outro, este
outro no v ou no percebe e, assim, fecha-se um ciclo vicioso. O indivduo pode a comear a
ter que dar conta do que no se d conta. Isso favorece uma sobrecarga, a chamada presso, onde
este indivduo possivelmente poder vir a sofrer de depresso (ou de presso!). A nvel
fisiolgico, ocorre uma disfuno dos neurotransmissores denominados serotonina, dopamina ou
noradrenalina. Na ansiedade propriamente falando, a excitao no Sistema Nervoso Central

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acontece decorrente de uma descarga da Noradrenalina (aumento) que produzida nas Supra-
renais, Lcus Cerleos e Ncleo Amigdalide, ocasionando um aumento da irrigao nos
gnglios basais, com diminuio de serotonina. J na depresso existe um aumento da irrigao
no sistema lmbico e a diminuio tanto da serotonina, quanto da dopamina e noradrenalina.
Fundamentalmente, tanto na ansiedade como na depresso, deveremos tratar das alteraes
bioqumicas demanda que causou o esgotamento de algum destes neurotransmissores. Segundo
esta autora, infere-se que as causas psicolgicas da ansiedade so comumente um desgaste pela
tentativa de ser o 1
o
lugar; perfeccionismo; busca de aprovao e frustrao (gerando sentimentos
de raiva e tristeza). Em termos de depresso (nos transtornos de humor depresso
maior/mania/hipomania/transtorno bipolar/distimia) pode ocorrer a falha qumica primeiramente.
A respeito dos sintomas da ansiedade, poderamos destacar a sensao de falta de descanso,
brancos na mente, irritabilidade, dores musculares, distrbios do sono e distrbios alimentares.
Outro aspecto a ser considerado que nestas patologias comum a combinao de outros
quadros clnicos. Exemplificando: quando um indivduo pensa demais, exagera, sente ficar
esgotado, isso significa que ele gastou muita serotonina (este neurotransmissor responsvel pela
conduo das idias, emoes e aes). Isso ocorrer em resposta a um estmulo de presso, que
podem ser os pensamentos de ansiedade, de medo e/ou de exigncias. Estes pensamentos
funcionam como estmulos de presso que iro desencadear uma liberao de adrenalina e
noradrenalina de forma inadequada, geralmente como padro de respostas de luta e/ou fuga. Este
alarme ir disparar por um motivo especfico (no caso das fobias, onde h um contedo
intelectual definido), ou sem motivo aparente (nos ataques de pnico) ou quando "se esgotar" de
disparar (na depresso). Fica claro, portanto, que a ansiedade a base onde surgiro as fobias, a
sndrome do pnico e a depresso.
Em termos de psicodinmica, tudo uma questo de volume, como afirma a Dra. Teresa
Robles (2001). Esta autora nos afirma que a patologia ser sempre maior de acordo com o
tamanho das feridas, dos traumas e da energia da emoo presa a fatos de infncia. Isso parece
ter uma correlao com uma imagem paterna ou materna de exigncia dos filhos e, em
conseqncia, o desenvolvimento de uma auto-exigncia constante no indivduo. Num duplo
vnculo, estes pais diziam o no dito: "Voc incompetente, voc no d conta".
Complementando, a Dra. Sofia Bauer (2002) explica que no caso do transtorno do pnico isso ir
gerar um forte sentimento de desproteo, onde o indivduo sente que no bom o bastante para
se proteger, precisando ficar sempre em alerta. Nas fobias o mecanismo bsico seria o
deslocamento de uma emoo (viso de Freud), vinculada geralmente a um dos genitores ou a
uma pessoa de muito afeto para a criana, para um animal, objeto ou situao. Como a criana
no pode sentir raiva da figura que ama, por exemplo, ela ir se sentir culpada; essa culpa gera
um castigo e deste vem a penalizao da fobia em si. Desta forma, a fobia simples uma
conseqncia imediata dessas experincias infantis, geralmente na 1
a
infncia.

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O tratamento da ansiedade deve visar primeiramente a remisso da sintomatologia
apresentada, sobretudo se esta se apresentar aguda, tendo em vista os sintomas agudos
comumente terem caractersticas de autodestruio. Cabe aqui destacar a importncia da terapia
medicamentosa, especificamente os remdios ansiolticos, os quais devero ser prescritos por
mdico competente (clnico geral ou psiquiatra). Posteriormente, quando o indivduo estiver mais
calmo, atravs dos meios que visem a modificao da estrutura da personalidade relativamente ao
quadro ansioso, onde o foco so as metas reeducativas da personalidade. Segundo Mira Y
Lpez, considerado um dos nomes mais brilhantes da psiquiatria contempornea, as sndromes de
ansiedade "devem ser tratadas mediante uma persuaso um tanto impositiva que leve o paciente
a integrar novamente os seus movimentos desordenados e estreis em um esquema prtico e
rtmico, adequado e fcil. A relaxao progressiva dos msculos coetaneamente com um
exerccio respiratrio amplo e progressivamente lento, a captao do elemento ou hiptese
causal ou desencadeante da sndrome, a reconstruo do processo que a mantm e sua
explicao ao prprio paciente, a abertura de novas perspectivas e o princpio de uma nova
conduta que ocorra pelas vias seguras, do plano preestabelecido, so fases que parecem
inevitveis na teraputica da ansiedade "(MIRA Y LPEZ, 1967, P.257). As tcnicas hipnticas
e de relaxamento, desta forma, apresentam-se como concursos teis na teraputica das desordens
de ansiedade.
Em qualquer processo psicoterpico destas desordens, sugere-se imperativo trabalhar no
indivduo aquilo que pesa alm da conta, ou seja, aquilo que faz o sinal de alerta disparar por
pouca coisa. O alvo a ansiedade considerada demasiada ao indivduo. As pessoas ansiosas esto
acostumadas a ficar em alerta sem perceberem e vo desenvolvendo esse estado como se fosse
um alarme extremamente sensvel. Basta um pequeno sinal e o mal-estar, o corao acelerado, os
tremores, a respirao desregulada ou at mesmo o pensamento de que "vou passar mal agora"
podem disparar no indivduo. Na terapia, portanto, teremos que, alm da identificao das
caractersticas fsicas e psicolgicas do estado ansioso, centrar-nos no parar para mudar de vida
e, a partir da, delinear um trabalho de preveno destas crises e de mudana de atitudes.
Resumidamente, nesse processo de cura das desordens de ansiedade, constatamos a
necessidade quase que impositiva, por parte do terapeuta, de trabalhar o parar, o descansar, o no
fazer presso e o aprender a tomar flego antes de qualquer coisa. Sugere-se que o indivduo tem
que aprender a no ter pressa, aprender a fazer uma tarefa de cada vez e a deixar de lado a
prepotncia de sua mente, ou seja, o querer controlar e dar conta de tudo. Afinal, as solues para
os problemas dos pacientes com estes distrbios parecem no estar em suas mentes, mas nos
fatos em si, ou seja, nas aes dos mesmos. Isso implica em despertar em nossos pacientes o
desejo de colocar sua vida em primeiro plano, ou seja, conduzi-los descoberta de um novo jeito
de viver, muito mais saudvel e feliz. Toda proposta teraputica que favorea este processo
torna-se vlida.

Luciana Raupp Di Bernardi 6
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REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS


BAUER, Sofia. Hipnoterapia Ericksoniana passo a passo. Livro Pleno, Campinas, 2002.
EFRAIM, Isaac. www.ansiedade.com.br, 2006.
GOOD, Willian V, NELSON, J efferson E. Descomplicando psiquiatria. 1992.
GRSNPUN, Haim. Distrbios neurticos da criana, 1979.
MIRA Y LPEZ. Manual de Psicoterapia, 1967.
ROBLES, Teresa. Revisando o passado. Editorial Diamante, Belo Horizonte, 2001.

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