Olga Von Simson

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O SAMBA PAULISTA E SUAS HISTRIAS.


( Textos, depoimentos orais, msicas e imagens na reconstruo da trajetria de uma
manifestao da cultura popular paulista.)
Olga R. de Moraes von Simson.
Centro de Memria/UNICAMP.

Samba de Abertura : MENINO GRANDE (Geraldo Filme) *
Lembrar, deixa-me lembrar (Refro)
La,la,ia, la,la,ia.....
So Paulo menino grande
Cresceu, no pode mais parar
No Ptio do Colgio
Que lhe viu nascer
Um velho ip parece chorar
No vejo sua me preta
Na rua com seu prego
Cafezinho quentinho, senhor
Pipoca, pamonha e quento
Lembrar , deixa-me lembrar

(Refro)

Agora que o menino cresceu
Perdeu sua simplicidade
No quer mais o seu amor perfeito
E o cravo vermelho
Seu amigo do peito
So Paulo de Anchieta
E de Joo Ramalho
Onde esto seus bomios?
A sua garoa?
Cad seu orvalho?

Extrado do CD Geraldo Filme Memria Eldorado, distribudo pela Gravadora
Eldorado 1980

O samba, como todos sabem, tem sua origem mais remota em frica.
Em Angola h at hoje, uma dana originria da rea de Luanda na qual, ao som dos
tambores, se d a umbigada.
A palavra Samba na lngua quimbundo quer dizer umbigada
Na lngua umbundo, samba significa estar animado, estar excitado.
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No luba ou outras lnguas bantas, samba significa pular e saltar com alegria
A alma do samba vem para o Brasil com os escravos nos navios negreiros e aqui ele
se torna crioulo, adquirindo um corpo com caractersticas diversas, conforme a
regio onde se desenvolve:
No Nordeste ele ser, em geral chamado de Coco. No litoral norte de Pernambuco o
denominam samba de matuto, e ser danado nos ranchos pastoris.
Na Bahia, alm de ser danado nos ranchos pastoris do Ciclo Natalino ele ser
chamado de samba de roda, apresentando forte influncia das religies africanas e
estar carregado de ax.
No Rio de Janeiro, trazido por migrantes baianos que se fixaram na cidade em
meados do sculo dezenove, ele ser a princpio o samba de partido alto, muito
prximo do batuque africano, uma dana de umbigada com ritmo marcado por
palmas, pelo prato de cozinha raspado com faca, por chocalhos e outros
instrumentos de percusso e, s vezes acompanhado pelo violo e pelo cavaquinho.
Segundo velhos sambistas, a expresso partido alto provem da alta dignidade desse
samba, cultivado por minorias negras.
Mais tarde, no incio da dcada de 1930, surge no Rio de Janeiro o samba de
breque no qual o cantor d uma, ou mais paradas sbitas (os breques) para encaixar
frases curtas de cunho humorstico, marcando bem o carter carioca desse samba.
Na dcada de 40, sob influncia de regulamentos impostos pela ditadura getulista,
surgiu o samba-enrdo, especialmente composto para descrever o tema do enredo
do desfile do ano, que necessariamente deveria ter fundo histrico-patritico.
No Rio Grande do Sul conhecido como batuque e, em So Paulo a histria do
samba, que vai se tornando crioulo, muito pouco conhecida. Vamos tentar
reconstruir aspectos dessa trajetria baseados num dilogo intertextual entre farta
documentao original fixada em diferentes suportes empricos
Por longo tempo, as razes do samba paulista se mantiveram fortemente rurais e ele
foi chamado ora de samba de roda, ora de samba de bumbo, ora de samba-leno
ou ainda de samba rural, segundo os intelectuais que o estudaram nos anos 30,
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como Mrio de Andrade e Mrio Wagner da Silva. O povo o chamava simplesmente
de batuque.
No incio, na ento Provncia de So Paulo, o samba se estruturou e se fortaleceu
nas grandes fazendas para onde os negros foram levados como escravos para plantar
primeiro a cana-de-acar e depois e com um nmero muito maior de cativos, para
promover o lucrativo cultivo do caf.
O samba era danado nas senzalas e nos terreiros, ao som de grandes bumbes,
cavados com fogo nos troncos de rvores enormes. Essas concavidades cilndricas
eram depois recobertas com couro de animais e produziam uma batida grave e
profunda que se tornou a marca do samba paulista. Eram os mesmos tambores que
serviam para embalar o jongo, uma dana religiosa de roda que s era danada a
noite, no meio da mata. Nela os danarinos se movimentavam em sentido anti-
horrio, acompanhados pela batida dos tambores jongueiros denominados Caxambu
ou Candongueiro.
A principal zona fornecedora de braos escravos para o Brasil foi o Centro-Oeste
africano, onde se localizava a colnia portuguesa de Angola, que teria contribudo
com 73% dos africanos enviados para o Brasil. L nessa regio havia o costume de
se homenagear a deusa da fertilidade, atravs de uma dana ritual na qual acontecia
a umbigada, que o encontro dos corpos do danarino e da danarina na regio do
ventre. No era um ato licencioso, nem carregado de sensualidade, mas uma forma
ritualizada de se louvar a fertilidade da natureza. Essa prtica foi conservada no
jongo que uma dana com fundamento, isto , com fundo religioso.
Nos sculos XVI e XVII, os africanos oriundos do Oeste da frica chegavam aos
portos de Salvador e Recife para, em seguida serem vendidos aos proprietrios dos
engenhos de cana-de-acar do Nordeste. Mais tarde, a decadncia da economia
aucareira levou ao deslocamento da mo de obra escrava para as plantaes de caf
que floresceram na Provncia de So Paulo no sculo XIX.
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A partir de 1850 essa migrao interna de mo de obra escrava foi intensificada,
pois no era mais possvel importar cativos diretamente da frica para manter o
avano da cafeicultura, ento a explorao agrcola mais rentvel.
Nossas pesquisas revelaram que os grandes fazendeiros campineiros, ante tal
impossibilidade, voltaram antiga estratgia de buscar escravos em outras regies
brasileiras, cujas culturas em crise, podiam liberar mo de obra. Passaram ento a
comprar escravos jovens e fortes, cujo trabalho intenso permitia a constante
ampliao de seus cafezais.
Assim, de muitas provncias nordestinas como Bahia, Sergipe, Alagoas,
Pernambuco, Paraba e at do Piau e Maranho desceram negros crioulos aps
1853, ao que parece fazendo a primeira parte da viagem por mar at o Rio de
Janeiro e vindo em seguida por terra at os cafezais que necessitavam da sua fora
braal para crescer. Para no serem confundidos com escravos fujes receberam
salvos condutos que descreviam muito bem as caractersticas do escravo, sua origem
e at os pertences que ele trazia consigo.
Um nico fazendeiro campineiro, o Baro de Itatiba, cujo esplio foi localizado no
Arquivo Histrico Municipal de Campinas, importou sessenta e um cativos em
diferentes datas, entre 1853 e 1874. Eles eram provenientes de vrias provncias
nordestinas, todos jovens e crioulos e vieram trabalhar nas fazendas do Baro,
situadas muita prximas ao que hoje o centro da cidade, pois uma ficava onde
atualmente funciona o Lar dos Velhinhos de Campinas e outra em terras dos
distritos de Sousas e Joaquim Egdio.
Ora, entre as bagagens trazidas pelos escravos crioulos, na longa viagem por mar e
terra veio tambm o que hoje denominamos de patrimnio imaterial, isto , os
saberes e os hbitos culturais que eles adquiriram na sua infncia e juventude
vividas no Nordeste. Entre esses saberes culturais certamente chegou tambm o de
cantar e danar o samba de roda, uma prtica j ento em ampla difuso por toda a
regio nordestina e na qual tambm se inclua a umbigada, originada do antigo ritual
religioso angolano em honra deusa da fertilidade.
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por isso que ainda hoje encontramos l em Sousas, morando na favela do Beco
o Seu Chico, que aos 94 anos se diz neto de escravo baiano e filho de sambadeira e
narra com alegria e saudade as noitadas de samba que vivenciou desde a infncia,
acompanhando a me, juntamente com seus irmos. Ela foi uma exmia sambadeira,
diz ele, que sabia fazer voar as sete saias, um detalhe importante na criao
coreogrfica do batuque ou samba de umbigada.
Conta ele que para ir ao samba ela cuidava de levar tantos sacos de estopa, quantas
eram as crianas que a acompanhavam. Conforme a dana prosseguia e os filhos
iam ficando sonolentos, a me encontrava cantinhos mais abrigados onde estendia
os sacos para que eles dormissem, enquanto ela continuava danando o batuque ou
caiumba.
Lembra Seu Chico que ao terminar a noitada, quando ela os acordava para
voltarem para casa, ele notava a expresso de felicidade no rosto de sua me,
enfeitado por uma cabeleira toda vermelha, porque coberta pela poeira que, na
dana do samba, era levantada pelo vento das sete saias.
Provavelmente foi a fuso do samba de roda nordestino, trazido pelos jovens
escravos vindos do Nordeste, com a dana do jongo, bastante comum no interior
paulista, que acabou dando origem ao samba rural paulista. Em Campinas esse
encontro originou a manifestao do samba de bumbo, que tornaria nossa cidade nos
anos 20 e 30 do sculo passado, uma fora legendria nas disputas sambsticas de
Pirapora do Bom Jesus.
Os testemunhos orais colhidos entre os descendentes dos sambadores do final do
XIX e incio do XX nos permitiram localizar a existncia de trs grupos de samba
de bumbo que, partindo de regies diversas do municpio de Campinas, se dirigiam
todos os anos Pirapora, para participar das festas do So Bom Jesus.
Um deles era dirigido por Dona Aurora e saa do Bairro da Capela, um bairro rural
situado ao longo do caminho velho que ligava Campinas a So Paulo. Hoje esse
bairro faz parte do municpio de Vinhedo e l os descendentes de Dona Aurora vem
tentando recriar seu famoso samba, liderados por uma neta da antiga lder, Dona
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Marisa Maral, que tem se esforado no intuito de recriar a dana, aps a reforma do
bumbo Trovo e assim manter a tradio.
Um outro grupo, que tambm ia todos os anos para Pirapora, era liderado por um
grande sambador chamado Z Mundo e saa do distrito de Aparecidinha, um bairro
rural situado tambm prximo estrada que de Campinas demandava o interior do
Estado, j nas proximidades dos atuais municpios de Hortolndia e Sumar.
Esse grupo, formado principalmente por mulheres, se desestruturou em meados dos
anos 30, porque seu lder morreu atropelado no centro da cidade e as sambadeiras
que o seguiam ficaram sem apoio para continuarem danando.
O terceiro grupo, que parece ter sido o mais numeroso e organizado, era liderado
por Ernesto Estevan e reunia os afro-descendentes que viviam mais prximos do
centro urbano da cidade. Estevan parece ter sido o lder sambista mais atuante na
cidade, pois como era chofer de profisso tinha mais facilidade de se locomover
costumando visitar aos domingos os demais agrupamentos, mantendo as relaes
entre eles e cultivando as tradies comuns.
Todos os trs grupos se apresentavam em Pirapora danando uma variedade do
samba rural que diferia do samba de umbigada ou batuque, pois nessa performance
no acontecia a tradicional umbigada.
Os depoimentos orais colhidos, assim como as crnicas jornalsticas do incio do
sculo passado, apontam que o forte controle social, exercido pela Igreja Catlica e
pelos senhores de escravos, sobre a numerosa escravaria, ainda no sculo XIX, e
depois sobre o povo negro da cidade, nas dcadas iniciais do sculo vinte, fizeram
com que os grupos de sambadores de Campinas, a princpio, proibissem as crianas
de participarem do samba.
Seu Alusio Geremias, artista plstico e dirigente de escola de samba relembrando
sua infncia vivenciada nos cortios do Cambu, nos anos 40 do sculo passado,
relata: ...a maior parte do tempo eu morei no Cambui...na Vila Sampainho, que na
baixada, l pr lado da (Av.) Norte-Sul. L, nos cortios, se danava o samba de
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roda. L eu participava vendo os meus parentes, mas o pessoal no deixava (criana)
participar, criana entr(r) no meio, de jeito nenhum!
Ele assim descreve o samba que assistia quando menino: Eles falavam que era
samba de roda... Fazia uma roda assim, eu (me) lembro, o pessoal com uma
zabumba, que no era nem bumbo, era zabumba e um repique que batia com duas
baquetas, tinha mais alguma coisa, um chocalho...
E a o pessoal ficava tocando naquela linha, naquela batida e a aquele desafio
comea: um cara cantando alguma coisa, ou uma mulher l e os homens, os
tocador(es) aqui, eles vinham, encontravam... era como se fosse um bumba-meu-
boi, toreava(m). Os cara(s) do bumbo toreavam aquelas nega-via... as mulheres
vestidas com aqueles vestid(es), tipo de baiana,...de saia rodada. Elas cantavam os
desafios e eles desafiavam... Aquilo rolava a noite inteira, ia at o sol quente...as
vezes o sol j estava queimando e sempre um, pr pode mexer com os
outros,...usava aquilo e seguia naquele esquema.
A represso s formas de divertimento negro foram to presentes na Campinas do
incio do sculo XX, que os grupos de sambadores, para continuar realizando suas
noitadas de samba, desenvolveram a estratgia de retirar a prtica da umbigada das
suas performances, transformando o samba de roda no samba de bumbo, uma forma
tipicamente campineira de danar o samba. Sendo a umbigada encarada pelos
senhores como uma prtica licenciosa e carregada de sensualidade, deixaram de
pratic-la, no havendo mais o encontro dos corpos dos danarinos, pois o que
acontece no samba de bumbo o encontro da sambadeira com o bumbo, que
posicionado frente do corpo do tocador.
Dessa forma, se realmente no se dava mais o arremdo de intercurso sexual, forma
como era vista a umbigada pelos representantes da oligarquia, simbolicamente a
representao do ato de fertilizao se tornou ainda mais forte, dado o tamanho do
bumbo que representaria o falo, em seu posicionamento frente do corpo do
tocador.
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Mrio de Andrade em seu livro Aspectos da Msica Brasileira falando de suas
observaes do samba em 1931,33 e 34 durante o carnaval paulistano e em 1937 em
Pirapora do Bom Jesus ressalta a sublime coreografia sexual do par que se formou
de repente no centro da dana coletiva. Em seguida ele descreve magistralmente os
avanos e recuos tpicos do samba de bumbo realizados pelo tocador, um negro
esplendido e uma pretinha nova, de boa doura que vem pela primeira vez
sambando em frente dele...e que entusiasmou o negro. Diz Mrio de Andrade
mais adiante: Nunca senti maior sensao artstica de sexualidade, que diante
daquele par cujo contacto fsico era no entanto realizado atravs dum grande bumbo.
Era sensualidade? Deve ser isso que fez tantos viajantes e cronistas chamarem de
indecentes os sambas de negros... Mas, se no tenho a menor inteno de negar
haja danas sexuais e que muitas danas primitivas guardam um forte e visvel
contingente de sexualidade, no consigo ver neste samba rural coisa que o
caracterize mais como sensual
Parece que essa estratgia foi bem sucedida, pois as pesquisas vm apontando que
na Campinas do ltimo quartel do sculo dezenove, o samba j era aceito por alguns
senhores de escravos mais benevolentes, sendo danado pelos negros em datas
especiais, como no aniversrio de uma sinhzinha ou em dia de festa religiosa.
o caso do Baro Geraldo de Rezende, grande cafeicultor que no s permitia,
como apreciava o samba dos seus escravos, convidando amigos e parentes, para
juntos assistirem ao sambas danados em dias de festa no terreiro de caf da famosa
Fazenda Santa Genebra. Sua filha, uma musicista, ao escrever a biografia do pai,
registrou a letra e a melodia dos sambas que eram cantados no terreiro da Santa
Genebra, terreiro esse, que ainda se mantm intacto em frente casa da fazenda,
bem ao lado da UNICAMP.

Seqncia de sambas recolhidos por Amlia de Rezende e recriados pelo
Cupinzeiro.
I
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Quando o meu bem vaise embora, ai eu fico
Panha laranja no cho tico-tico
Panha laranja no cho.
Panha laranja no cho tico-tico
Panha laranja no cho.
Minha toalha de renda
Minha toalha de bico
Panha laranja no cho tico-tico
Panha laranja no cho.
Panha laranja no cho tico-tico
Panha laranja no cho.

II
Minha cumadi, pelo amor de Deus ai,
Minha cumadi, pelo amor de Deus ai,
Me d meu leite, co a vaca me deu
Me d meu leite, co a vaca me deu



III
V cham Nhonh
V cham Nhonh
Mucama t brigando
L no corredor

Oi viva Nenm
Oi viva Nenm
Viva Nenm crioula
10
Oi viva Nenm

Os velhos cronistas campineiros nos contam tambm que mais tarde o samba foi
danado na cidade, com o nome de samba de terreiro ou caiumba, l para os lados
do Cemitrio da Saudade ou ainda junto a um crrego que cortava a atual Avenida
Moraes Salles. Essas danas aconteciam principalmente no dia 13 de maio, a grande
data negra da cidade.
Ruy Martins Ferreira, tendo suas memrias de infncia ativadas pela leitura das
crnicas de Barbosa Pupo, reunidas no livro Oito bananas por um tosto, produziu
um bico de pena mostrando o conjunto musical que animava uma festa de 13 de
maio, em que a cayumba rolava solta.
A semelhana de Campinas, o samba foi chegando ao territrio urbano e tomando seu
lugar nas cidades interioranas paulistas, atravs de festas profano-religiosas, sendo
cantado e danado na Festa de Coroao dos Reis do Congo, durante a fase da
escravido e mais tarde na Festa de Santa Cruz ou na Festa de So Benedito. Essa foi
uma estratgia desenvolvida pelas lideranas negras para que ele fosse aceito, at
entre os senhores mais renitentes, pois danando o samba, louvava-se o santo
homenageado naquele dia e assim, gradativamente ele ia se tornando uma dana
cristianizada.
Em Campinas, o samba de bumbo se tornou uma prtica to comum que inspirou o
seu compositor maior, Carlos Gomes, a criar uma pea musical intitulada Quilombo,
cujo subttulo : Quadrilha Brasileira sobre os Motivos dos Negros. Ela
subdividida em movimentos denominados Cayumba, Bananeira, Quingob,
Bamboula e Final.
Alceu Maynard de Arajo, um importante estudioso do folclore paulista, dizia que o
batuque no estado de So Paulo uma dana de terreiro, e que em Campinas ele era
chamado de Cayumba. Esse autor explica tambm que nele devem estar presentes o
tambu, o quinjengue ou molemba e o urucungo, definindo assim a percusso original
para a realizao do samba de bumbo campineiro.
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Foi esse samba de origem rural, praticado em muitas cidades interioranas, como It,
Campinas, Capivari, Tiet, Piracicaba, que foi levado, a partir do final do sculo XIX
e primeiros anos do XX, para a capital do estado de So Paulo pelos negros
migrantes. Esses trabalhadores, libertos da escravido e expulsos das fazendas pelas
sucessivas crises da cafeicultura, tiveram que buscar uma ocupao urbana na capital
do estado, cidade que nesse perodo crescia e se industrializava rapidamente, atraindo
por isso muitos migrantes provindos do interior.
Ali esses migrantes interioranos se fixaram nas regies urbanas pouco valorizadas.
Nelas, enchentes constantes ou encostas muito ngremes, dificultavam uma ocupao
urbana pelas classes mais abastadas. Foram nesses espaos urbanos que se formaram
os trs grandes territrios negros tradicionais da cidade de So Paulo: Barra Funda,
Bexiga e Baixada do Glicrio. Aps a Segunda Guerra Mundial, bairros como Casa
Verde, Peruche, Vila Matilde, ou Taboo se constituram tambm com grande
concentrao de populao afro-brasileira, sendo locais onde o samba, at hoje,
uma fora tradicional e agregadora.


TRADIO. (Vai no Bexiga pra ver) Geraldo Filme
Quem nunca viu o samba amanhecer
Vai no Bexiga pra ver
Vai no Bexiga pra ver
(Quem nunca viu)

O samba no levanta mais poeira
O asfalto hoje cobriu o nosso cho
Lembranas eu tenho da Saracura
Saudades tenho do nosso cordo

Bexiga hoje s arranha cu
E no se v mais a luz da lua
Mais o Vai-vai esta firme no pedao
tradio e o samba continua

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Extrado do CD Geraldo Filme Memria Eldorado, distribudo pela
Gravadora Eldorado, 1980

NO MORRO DA CASA VERDE. (Adoniran Barbosa - 1975)

Silncio, madrugada
No morro da Casa Verde a raa dorme em paz...
L embaixo os meus colegas de maloca
Quando comea a sambar no para mais.
(Silncio)

Valdir, vai buscar o tambor...
Larcio, traz o Agog...
Que o samba na Casa Verde enfezou.
(Silencio)

Extrado do CD Adoniran Barbosa Especial. EMI- ODEON BRASIL.

Campinas tambm teve, a partir do final do XIX e primeiras dcadas do XX, os seus
redutos com maioria de populao afro-brasileira como os bairros Cambu, Ponte
Preta, Vila Marieta e So Bernardo. Esses eram locais onde o samba de bumbo era
danado nos cortios e nos terreiros, com grande animao dos danarinos que
varavam as noites, seja cantando os estribilhos tradicionais ou fazendo versos de
improviso.
Nesses bairros paulistanos ou campineiros, onde viviam os negros e os brancos
pobres, o samba foi aprendido e danado pelos imigrantes, fossem eles de origem
portuguesa, italiana ou espanhola, pois sendo vizinhos e companheiros nas duras
lidas cotidianas, eram tambm parceiros nos momentos de festa e congraamento. O
samba ganha assim um carter integrador, pois atravs da msica e da dana,
esses novos brasileiros, tambm pobres e migrantes, vo conseguindo seu lugar no
espao econmico, mas tambm no espao cultural e de lazer das cidades que se
desenvolviam.
Adoniran Barbosa (que nasceu e cresceu em Valinhos e cujo nome de batismo era
Joo Rubinato), Chico Pinga (fundador da E.S. Lavaps) e Tkio (dirigente de
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Bateria da Nen de Vila Matilde), alm dos sambistas Germano Matias e
Oswaldinho da Cuca, so exemplos de brancos, filhos de imigrantes, que muito
contriburam para o samba paulista.

Aqui poderamos fazer uma pausa musical para ilustrar a condio do
brasileiro pobre e operrio com mais um samba de Adoniran Barbosa.

TORRESMO A MILANESA(Adoniran Barbosa & Carlinhos Vergueiro, 1976)
O enxado da obra
Bateu onze horas
Vamose embora Joo
Vamose embora Joo

O que que voc trouxe...
Na marmita Dito?
Truxe ovo frito!
Truxe ovo frito!
E voc beleza...
O que que voc trouxe?
Arroz com feijo...
E um torresmo a milanesa.
(Da minha Tereza)

Vamos almoar
Sentados na calada
Conversar sobre isso e aquilo...
Coisas que ns no entende nada,
Depois puxar uma paia,
Andar um pouco pra fazer o quilo
( dureza Joo)


O mestre falou,
Que hoje no tem vale no
Ele se esqueceu
Que l em casa no sou s eu.
(Se segura Maria)
dureza Joo...
dureza Joo...
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Extrado do CD Adoniran Barbosa Especial- EMI ODEON BRASIL.

O samba, nas primeiras dcadas do sculo XX, passou a ganhar novas foras nas
cidades paulistas, atravs do Carnaval. Nessa poca eram os cordes que faziam
sucesso no carnaval negro, uma manifestao popular ainda em fase de
consolidao. A princpio os cordes se apresentavam ao som de marchas
sambadas compostas pelos prprios sambistas, pois esse ritmo permitia um desfile
cheio de evolues, realizado para agradar um pblico ainda em fase de conquista e
sempre sob a aprovao, cuidadosamente negociada, ano aps ano, com a polcia.
Mas, esses sambistas negros e brancos no se esqueciam das suas razes
interioranas. Pelo menos uma vez por ano, retornavam a So Bom Jesus de Pirapora
para festejar com outros grupos vindos de Tiet, Capivari, Piracicaba, Campinas,
So Roque e de lugares ainda mais distantes. Iam para louvar o Bom Jesus, mas
tambm para participar das acirradas disputas de samba, realizadas noite nos
barraces que serviam de alojamento para os romeiros. Era ali, nesses enormes
barraces que os paulistanos se embebiam de suas razes e tradies afro-rurais para
continuar montando seus cordes carnavalescos, manifestaes urbanas, mas com
forte e decisiva influncia do jongo, do samba de roda, do samba de bumbo e do
samba de batuque.

Sambas com influncias rurais ou que fazem meno Pirapora.
DITADO ANTIGO (Tuniquinho Batuqueiro e Osvaldinho da Cuca )
Mandei preparar o terreiro que j vem chegando o dia
Eu vou encorar meu pandeiro para entrar na folia

Meu av preto de Angola me ensinava a cantoria
Foi herana de um passado quando fez a travessia
Na bagagem a esperana, conscincia e valentia
Capoeira quilombola derrubava e no caia

E quando comear o pagode,
Pego o pandeiro, caio na orgia
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E quando comear o pagode,
Pego o pandeiro, caio na orgia

Eh jongueiro
Bate no couro que tem festa no terreiro (refro)

No dizer da minha av sambador no tem valia,
Samba nunca deu camisa minha av sempre dizia...
Sambador no ganha nada, vive na calada
E no cuida da famlia...

E quando comear o pagode,
Pego o pandeiro, caio na orgia
E quando comear o pagode,
Pego o pandeiro, caio na orgia

Extrado do CD:
Osvaldinho da Cuca convida: Em referncia ao Samba Paulista.
Rio 8 Fonogrfico
SAMBA DE PIRAPORA (Geraldo Filme)
Eu era menino...
Mame disse vmo embora,
Voc vai ser batizado
No samba de Pirapora
(Eu era menino)

Mame fez uma promessa...
Para me vestir de anjo
Me vestiu de azul celeste,
Na cabea um arranjo.
Ouviu-se a voz do festeiro
No meio da multido,
Menino preto no sai
Aqui nessa procisso
Mame mulher decidida...
Ao santo pediu perdo
Jogou minha asa fora,
Me levou pro barraco

L no barraco tudo era alegria
Negro batia na zabumba e o boi gemia
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(l no barraco)

Iniciado o negrinho
Num batuque de terreiro,
Samba de Piracicaba,
Tiet e campineiro...
Os bambas da Paulicia
No consigo me esquecer...
Frederico na zabumba
Fazia a terra tremer...
Cresci na roda de bamba...
No meio da alegria,
Eunice puxava o ponto,
Dona Olmpia respondia.
Sinh entrava na roda
Gastando a sua sandlia...
E a poeira levantava
No vento das sete saias

L no barraco tudo era alegria
Negro batia na zabumba e o boi gemia
(l no barraco)

Extrado do CD Histria do Samba Paulista, narrada e cantada por
Oswaldinho da Cuca , participao de Aldo Bueno, Germano Matias e Tobias
da Vai-Vai, Gravadora CDC UMES, distribudo pela Eldorado Fonogrfica,
1999

Foi esse intenso contato interior/capital que trouxe para So Paulo uma primeira
leva de sambistas tradicionais, nascidos e formados no interior do Estado e que
criaram e mantiveram os cordes com seus constantes e quase obrigatrios retornos
anuais Pirapora, at os anos 50 do sculo passado. Tal fato nos permite dizer que o
interior do Estado de So Paulo foi o bero e a grande fora alimentadora da
tradio do samba paulista e nesse sentido dois exemplos precisam ser lembrados:

Dionsio Barbosa nascido em Itirapina, neto de um escravo baiano e de uma ndia
da aldeia jesutica de Conceio dos Guarulhos, era filho de outro cativo, carapina
de profisso e exmio danador de Caiap. Dionsio tambm foi um mestre
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carapina, ou seja, mestre carpinteiro, que ao migrar de Itirapina para So Paulo,
empregou-se em uma empresa moveleira do bairro do Bom Retiro. Devido
qualidade do seu trabalho, foi mandado pela empresa ao Rio de Janeiro para
trabalhar na filial carioca. L ficou de 1912 a 1914 hospedado em casa de famlia de
sambistas e conheceu o apogeu dos ranchos carnavalescos cariocas, tendo tambm
admirado as performances das Bandas Marciais da capital da Repblica. Retornando
So Paulo, fundou o primeiro cordo denominado Grupo Carnavalesco da Barra
Funda, que ele ensaiava no quintal da sua casa, situada no incio da Rua Conselheiro
Brotero.
Mais tarde, devido a grande popularidade alcanada, o Cordo foi cognominado
pelo povo de Camisa Verde, recebendo o Branco em seu nome por imposio
policial, para diferenci-los dos integralistas, um movimento poltico liderado por
Plnio Salgado, cujos membros tambm usavam camisas verdes.

Geraldo Filme ou Geraldo da Barra Funda, nascido em So Paulo, mas
batizado em So Joo da Boa Vista, era filho de uma empregada domstica que
servia s famlias da aristocracia paulista. Sua me viajou a Europa com seus
patres e de l trouxe a idia de fundar a primeira associao de domsticas de que
se tem notcia no Brasil. Esse grmen de sindicato, entretanto, no prosperou e Dona
Augusta se tornou dona de penso e fornecedora de marmitas que eram entregues
por seu filho Geraldo. Por isso ele, desde moleque, cruzava diariamente a Barra
Funda e os Campos Elseos, conhecendo assim os grupos de bambas do Largo da
Banana, da Praa do Correio e do Largo da S e se tornando tambm um bamba,
tanto no jogo da Tiririca (a famosa capoeira paulista), como na composio de
sambas que com grande sabedoria contam a histria dos redutos negros paulistanos.
Geraldo Filme foi fundador do Cordo Paulistano da Glria, participou dos
carnavais do Bexiga e cantou com graa, propriedade e realismo a saga do negro
paulista.

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Um outro cordo carnavalesco importante nessa histria o Vai-Vai, surgido nas
ladeiras ngremes da Saracura, uma regio do Bexiga, em So Paulo. A Saracura
era um local habitado por negros e imigrantes italianos muito pobres, mas que j
possua nos anos 30 muitos times de futebol de vrzea. A turma do Vai-Vai, um dos
times do bairro, resolveu criar um cordo-carnavalesco para poder danar um bom
samba, aps as partidas futebolsticas do final de semana. Para frisar sua rivalidade
com outro time do bairro chamado Cai-Cai, se auto denominou Vai-Vai.
SAMBAS TRADICIONAIS DOS CORDES CAMISA VERDE E VAI-VAI.
Camisa Verde e Branco

Vem,vem,vem, vem morena
Brincar no nosso cordo
Ns no podemos deixar
O nosso Rei Momo na mo
Camisa Verde a gloria
Para alegrar os coraes
La ia ra, la ia ra

Vai-Vai

Que barulho que barulho aquele
Que barulho aquele que vem l
o Vai-Vai
Que vem brincar o carnaval
Quem nunca sambou na vida
Nem uma vez por ventura
Vem pro Vai-Vai do Bexiga
Orgulho da Saracura

Os cordes eram ensaiados e dirigidos pelos apitadores, que ao som de fortes silvos
conseguiam as mais incrveis evolues, tanto dos membros da bateria como das
amadoras, termo paulista para designar o grupo das pastoras. Um dos mais famosos
apitadores do samba paulista foi Pato Ngua, cuja habilidade de dirigente
sambista nunca foi suplantada.
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Ele ensaiava por trs ou quatro anos o Vai-Vai do Bexiga e quando julgava que esse
cordo j havia vencido um nmero suficiente de concursos carnavalescos, se
bandeava para a Barra Funda, ensaiando ento o Camisa Verde, que assim se
tornava campeo por quatro ou cinco anos consecutivos. Retornava ento Pato
Ngua ao Bexiga, para atravs de sua liderana propiciar nova fase de sucesso ao
Vai-Vai.
Nesse perodo, os anos 40 e 50 do sculo passado, para fazer samba era preciso ser
um bamba, isto , circular e viver entre a legalidade e a marginalidade, como mostra
a composio de Geraldo Filme. Foi por isso, por esse carter marginal do samba
que Pato Ngua, uma lenda entre os afro-brasileiros de So Paulo, apareceu um dia
assassinado na periferia, fato que inspirou uma das mais belas composies desse
sambista maior.

SILNCIO NO BEXIGA (Geraldo Filme)
Silncio...
O sambista est dormindo
Ele foi, mas foi sorrindo
A notcia chegou quando anoiteceu
Escolas
Eu peo o silncio de um minuto
O Bexiga est de luto
O apito de Pato ngua emudeceu

Partiu, no tem placa de bronze
Nem fica na histria...
Sambista de rua morre sem glria,
Depois de tanta alegria que ele nos deu...
Assim, o fato se repete de novo,
Sambista de rua, artista do povo...
E mais um que foi sem dizer adeus...
(Silncio)

Extrado do CD Geraldo Filme Memria Eldorado, distribudo pela
Gravadora Eldorado, 1980

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Sambas como esse, tipicamente paulistas, resultam de uma tradio cultural que
provinda com o povo negro do interior do Estado, se urbanizou e se fortaleceu na
capital, tendo por base a manifestao carnavalesca dos Cordes e continuou ainda
por algumas dcadas sendo mantida nas reunies realizadas nos dias de festas
religiosas negras na Barra Funda ou no Jabaquara.
Esse samba que, de rural se tornou urbano e carnavalesco, deixou marcas indelveis
na histria do grupo afro-paulista. Ele comeou a perder fora, entretanto, quando
em 1968 o carnaval foi oficializado por um prefeito carioca, Faria Lima, um
engenheiro notvel, mas pouco enfronhado nos temas da cultura popular. Por isso
solicitou a um carnavalesco, tambm carioca, que redigisse o regulamento que
disciplinaria os desfiles de Momo, em So Paulo .
Esse carnavalesco, apelidado Jangada, desconhecendo a realidade do samba
paulista, redigiu um regulamento inteiramente baseado nas escolas de samba
cariocas, forando assim todos os cordes, no curto perodo de quatro anos, de 1968
a 1972, a se transformarem em manifestaes assemelhadas s da antiga Capital da
Repblica, apagando assim essa rica trajetria cultural que hoje estamos tentando
reconstruir.
Foi tentando recuperar essas histrias e mostrar sua importncia na formao
cultural do povo paulista, j em risco de perder a rica memria do samba de So
Paulo, que h mais de cinco anos um grupo de pessoas, das mais diferentes origens
sociais e culturais de Campinas, criou o Ncleo de Samba Cupinzeiro. Esse ncleo,
a semelhana de outros grupos da Capital como o Morro das Pedras, o Projeto
Nosso Samba ou o Samba da Vela, vem dando novo alento ao samba de raiz
produzido em So Paulo, atravs do esforo de comunidades, cada vez mais unidas
e conscientes da fora transformadora dessa manifestao cultural de origem afro-
brasileira.
Eles realizam um trabalho importante de formao de pblico, tornando jovens,
adultos e idosos que participam das rodas de samba, pessoas conscientes, atuantes e
crticas em relao produo sambstica atual. So pessoas, que embora passando
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a valorizar a ancestralidade e a tradio, apreciam tambm os novos sambas que,
com razes fincadas no passado, falam de temas da contemporaneidade.
O objetivo dessas associaes, a primeira vista to heterogneas, foi o de reconstruir
e difundir a memria e a tradio do samba paulista. Assim, o pblico presente s
rodas de samba conhece e canta os sambas tradicionais paulistas, mas tambm os
inesquecveis sambas cariocas produzidos entre os anos 20 e 70 do sculo passado.
Ouvem as histrias de vida e as composies, na prpria voz de sambistas
tradicionais, que so especialmente convidados para essas reunies quinzenais.
A educao noformal a metodologia utilizada para transmitir, na grande roda
que se forma, os contedos que abordam a nossa histria comum e que so
pesquisados pelos membros mais atuantes da comunidade. Atravs de estratgias
envolventes e sedutoras ( em que a msica, a visualidade e o ritual se fazem
presentes) eles enriquecem, com os dados da tradio, o capital cultural dos
participantes, potencializando assim a inspirao dos jovens compositores que
integram tais grupos, os quais passam ento a compor novos e inspirados sambas.
Assim, ligando o passado ao presente, eles nos mostram a fora das nossas origens,
a beleza da nossa memria comum e as possibilidades de sambar com alma, com
prazer, mas tambm com conscincia.
Seqncia de sambas compostos por integrantes do Ncleo de Samba
Cupinzeiro.
HOMENAGEM AO CUPINZEIRO (Anabela, Bruno, Edu e Enio)

No terreiro duas mangueiras
Um cupinzeiro, muita gente e muito samba
Assim, na batalha e na conquista
Com graa e com malcia,
Nessa vida de aprendiz
Desse canto brasileiro,
Tradio do meu pas.
Aprendendo com meu povo
Um modo de ser feliz.
(no terreiro)

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O samba uma festa brasileira,
cultura verdadeira
Que nunca vai ter fim...
por isso que eu canto a noite inteira,
Bem de baixo da mangueira
Um refro que diz assim...
Salve o samba brasileiro
Abenoe esse terreiro
De samba luar e cupim.

BAR DO PACHOLA (Edu de Maria e Bruno Ribeiro)

Dentro do Mercado
Existe um pequeno botequim...
Onde encontro cachaa da boa,
Pimenta vermelha e aipim.
Onde encontro a turma do samba,
Cerveja gelada e camaro.
Bacalhau e feijoada,
Angu com rabada e agrio.

De p no balco, o Nelson Barriga
Mastiga um torresmo com muito limo...
Enquanto a Marilda prepara a comida para um batalho.
Vem chegando o Vela Preta
Com o Tni e a El...
E o Wilson Perneta, desmente o que o presidente falou...
No existe a democracia para alm do meu butiquim,
S aqui come o rico e o pobre e at quem no gosta de mim.
O Bar do Pachola uma escola
Pra quem sabe aprender,
Que a vida no da bola pra remandiola que est no poder.


BATUQUE BANTO NAS FAZENDAS DO BARO. (Anabela, Alice, Darco,
Edu e Enio)
O bloco do Cupinzeiro
Vem rua, mente aberta ps no cho
Mostrando a cultura do povo
Em plenas terras de Baro

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Nas terras do Baro Geraldo de Resende
O rei caf, imponente floresceu...
Sob a chibata um povo de real valor
De pele negra, trabalhou e padeceu
O mesmo povo, demonstrou sua bravura,
Preservou sua cultura.
Maior riqueza o Brasil no conheceu.

Batuque Banto nas fazendas de Baro
O samba a minha herana
E eu mantenho a tradio.

E hoje.
Hoje, o imperador mudou de nome
Impe a guerra e a fome
Impede a liberdade cultural
Por isso, solto a voz no Cupinzeiro
Um canto forte e mensageiro
Saudando a luta do negro ancestral
Por isso, solto a voz no Cupinzeiro
Um canto forte e mensageiro
Sambando neste carnaval.

O boi falou pro batuque comear
E o samba campineiro
O meu bloco vem cantar.

HISTRIA E TRADIO. (Edu de Maria e Bruno Ribeiro)

Quem foi que disse, que o samba est morrendo
Que ele j no o mesmo
Que ningum lhe d valor
Que aposentou-se a malandragem
Que o samba vive margem
E que a poeira baixou

O samba no se entrega facilmente,
O samba um negro valente,
Que rompe os grilhes do passado
Lanando no presente esta lio:
O povo que no tem memria
um povo sem histria e tradio

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Samba, solido sonhando
Liras de recordao.
Paixo de atemporal sentido
O sambas um vestido pudo
Pendurado no varal da solido.

Samba, solido sonhando
Liras de recordao.
Grito do meu peito mais aflito
Quando cala, teu silncio como um grito.
Meu samba imortaliza este momento
Me desculpe Nelson Sargento,
Mas o samba no agoniza o seu refro.
Meu samba imortaliza este momento
Me desculpe Nelson Sargento,
Mas o samba no agoniza no.

FONTES UTILIZADAS NA PESQUISA Depoimentos orais depositados no
LAHO: Laboratrio de Histria Oral- CMU/UNICAMP
Para o samba paulistano:
Dionsio Barbosa.
Seu Zzinho do Morro da Casa Verde
Geraldo Filme.
Nen da Vila Matilde
Para o samba campineiro:
Seu Alusio Geremias
Alceu Estevan
Dona Marisa Maral
Dona Sinh
Ana Miranda
Bibliografia:
ANDRADE, Mrio. Samba rural paulista. In CARNEIRO, Edson (Org.).
Antologia do Negro Brasileiro. 1933
_________________ASPECTOS DA MSICA BRASILEIRA. S. Paulo. Ed.
MEC/Liv. Martins Ed. S/A, s/d.
25
ARAUJO, Alceu Maynard. Documentos Folclricos Paulistas. So Paulo: Prefeitura
do Municipio, Dep. de Cultura, Diviso do Arquivo Histrico, 1952

DUARTE, Raphael. Campinas de outrora. (Coisas do meu tempo, por Agrcio) So
Paulo. Typografia Andrade & Mello, 1905.

LEANDRO, Anabela. Samba na Fazenda do Baro Geraldo de Resende
Olhares. Revista SARAO, vol. I, n6, fevereiro 2003.
www.unicamp.br/sarao

LIMA, Rossini Tavares de. Um Folguedo popular paulista do sculo XVIII. In
HABITAT. So Paulo. ano 12, n 64, julho 1961, pag. 48 e 49.

MANZATTI, Marcelo. Samba Paulista: do centro cafeeiro periferia da cidade In
Revista SARAO, vol. I, n 12, set. 2003. www.unicamp.br/sarao

MARTINS, Maria Amlia de Resende. Um idealista realizador. Rio de Janeiro. Of.
do Almanak Laemmert, 1939.

PAIS, Jos Machado. O Enigma do Fado e a Identidade Luso-Afro-Brasileira. In
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PUPO, Benedito Barbosa. Oito bananas por um tosto.(Crnicas Campineiras)
Campinas, 1976

VON SIMSON, Olga R. de Moraes. Carnaval em Branco e Negro, Carnaval
Popular Paulistano (1914-1988). Campinas. Ed. da Unicamp, EDUSP e Imprensa
Oficial, 2007.

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ZORZETTO, Ricardo. A frica nos genes do povo brasileiro. In PESQUISA
FAPESP, abril 2007, no. 134, p. 37 a 43

Atualizado em 27/02/2008

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