POLÍTICA AMBIENTAL E PLANEJAMENTO ENERGÉTICO - Emílio La Rovère
POLÍTICA AMBIENTAL E PLANEJAMENTO ENERGÉTICO - Emílio La Rovère
POLÍTICA AMBIENTAL E PLANEJAMENTO ENERGÉTICO - Emílio La Rovère
exe
JUNHO 2002
Revisada em fevereiro de 2007
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ÍNDICE
Conceituação ....................................................................................................................... 1
Formas de Energia .............................................................................................................. 1
Fontes de Energia ............................................................................................................... 2
As Leis da Energia ............................................................................................................... 4
Breve História do Uso da Energia no Mundo ...................................................................... 8
Energia, Meio Ambiente e Desenvolvimento..................................................................... 11
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PARTE I - O QUE É ENERGIA
Conceituação
O conceito de energia foi introduzido pelo físico inglês Young, no início do século XIX
(Debeir et al, 1986). Muito antes disso, porém, o Homem já observava as manifestações de
diferentes formas de energia existentes na Natureza : o fogo, a radiação solar, o movimento dos
astros celestes, as quedas d’água, os ventos. A humanidade cedo começou a aprender como
aproveitá-las para tornar sua vida mais fácil, utilizando a Natureza como fonte de suprimento de
energia, nas diversas formas apropriadas a satisfazer suas necessidades básicas : calor,
movimento, iluminação, por exemplo.
Hoje, a ciência define energia como a capacidade de realizar trabalho. Com efeito,
etimologicamente o termo “energia”, de origem grega, é quase um sinônimo de trabalho. Por sua
vez, a Física conceitua trabalho como o produto de uma força pelo deslocamento que ela provoca
no sentido em que é aplicada. É interessante notar que a ciência física utilizou nessas definições o
termo “trabalho”, um conceito já existente, de origem sócio-econômica, atribuindo-lhe um
significado particular (Bôa Nova, 1985). Essa associação foi decorrente da noção de mobilizar as
forças da natureza para efetuar as tarefas de transformação da matéria que a simples força
muscular do homem encontrava dificuldades em executar. Com efeito, a antropologia já identificou
como a mais importante diferenciação da espécie humana, com relação aos outros animais, sua
capacidade de prolongamento : da mente, através da exteriorização do pensamento, por meio da
palavra ; e do corpo, graças a ferramentas e máquinas multiplicadoras do poder de seus
membros, utilizando fontes de energia disponíveis na Natureza (Leroi-Gourhan,1961).
Formas de Energia
Um corpo que se move possui energia, assim como outro, mesmo em repouso, sob a
atração de um campo gravitacional, como a força da gravidade que atrai os corpos em posição
elevada para a superfície da Terra. Por exemplo, a energia dos ventos e das quedas d’água são,
ambas, formas de energia mecânica, cinética a primeira, e potencial, a segunda (à medida que as
águas escoam, parte de sua energia potencial se transforma em cinética).
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Existem várias outras formas de energia, além da mecânica (Rosa, 1985) :
- gravitacional, ilustrada pela atração entre grandes massas como os corpos celestes : dá origem, por
exemplo, às marés, forma de energia devida à atração mútua entre a Terra e a Lua.
- eletromagnética, como a energia radiante da luz, presente quando cargas elétricas se encontram sob a
atração ou repulsão de um campo elétrico : uma corrente elétrica produz trabalho ao passar sob um
campo magnético (que ela própria pode induzir em um eletroímã), fazendo surgir uma força que move as
espirais de fio do enrolamento de um motor elétrico.
- elástica, presente em uma mola comprimida, que pode realizar trabalho ao se distender.
- térmica, sendo o calor na verdade a energia cinética das moléculas do corpo aquecido, podendo ser
proveniente diretamente do sol, nossa principal fonte de energia, ou obtido a partir da energia mecânica
(caso dos atritos, por exemplo), elétrica, química ou nuclear.
- química, que mantém a coesão dos átomos nas moléculas de materiais combustíveis, isto é, que
liberam calor na sua queima (reação química exotérmica com o oxigênio do ar), como o petróleo, o
carvão e o gás natural, por exemplo. Na verdade, essa coesão é de origem eletromagnética, devida à
interação das cargas elétricas dos elétrons entre si e com os núcleos atômicos.
- nuclear, devida à coesão dos prótons e nêutrons dentro dos núcleos atômicos. Reações nucleares,
como a fusão e a fissão, em que partículas nucleares se chocam com núcleos atômicos dando origem a
novos núcleos e partículas, podem liberar uma energia até milhões de vezes maior que as reações
químicas.
Fontes de Energia
Apesar de suas múltiplas formas, a energia se origina de apenas três tipos de interações
fundamentais da natureza : gravitacional, eletromagnética e nuclear (ver Figura 1).
A energia solar, por exemplo, a mais importante para o Homem, provém da fusão
termonuclear, na superfície do sol, de elementos leves, especialmente do hidrogênio, produzindo
deutério e hélio. Como a massa total resultante é ligeiramente menor que a inicial, há nesse
processo uma transformação dessa pequena diferença de massa em uma enorme energia,
liberada sob a forma de calor, segundo a fórmula da teoria da relatividade restrita de Einstein : E =
m.c2 (energia igual ao produto da massa relativística pelo quadrado da velocidade da luz). Parte
da energia produzida atinge a Terra, sob forma de radiação eletromagnética, especialmente a luz
visível. Cerca de 30 % dessa energia é refletida de volta ao espaço, pelas nuvens, por partículas
na atmosfera e pela superfície terrestre. O resto é absorvido pela atmosfera e, principalmente,
pela Terra, que esquenta. Aquecendo-se, a Terra reemite esse calor de volta ao espaço, mas
como sua temperatura é bem menor que a do sol, a frequência dessa radiação é também muito
menor, possibilitando a absorção de parte desse calor por alguns gases que estão na atmosfera (o
dióxido de carbono e o metano, por exemplo). Este fenômeno é chamado de “efeito estufa”, por
analogia com o plástico das estufas que também retêm o calor necessário para o crescimento de
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certas plantas, em clima frio. É graças ao efeito estufa que a temperatura do nosso planeta subiu
até atingir um nível equilibrado, que permitiu o aparecimento e o desenvolvimento de formas cada
vez mais complexas de vida.
Assim, a energia do sol é vital para a vida na Terra e dessa fonte energética derivam ainda
outras formas de energia utilizável no nosso planeta. Os vegetais crescem e se desenvolvem
graças à fotossíntese, que é a assimilação da energia solar pela clorofila de suas folhas,
transformando-a em matéria orgânica, a biomassa. A lenha e o carvão vegetal de florestas
plantadas, o álcool e o bagaço da cana de açúcar, por exemplo, são combustíveis produzidos de
forma renovável, graças ao fluxo de energia que recebemos do sol.
Além disso, os chamados combustíveis fósseis - petróleo, gás natural e carvão mineral, são
oriundos da decomposição da biomassa, durante milhões de anos, pela ação de bactérias. Essa
fermentação conduz à uma perda do oxigênio presente nos vegetais, dando origem, de acordo
com o tempo de decomposição, à formação de diversos tipos de carvões, como a hulha, o linhito e
a turfa, por ordem de idade decrescente. O petróleo e o gás natural resultam da fermentação
bacteriana de matéria orgânica sob condições especiais, transformando os hidratos de carbono
em hidrocarbonetos, que em estado líquido ou gasoso se deslocaram facilmente na crosta
terrestre até serem aprisionados por rochas porosas. É importante notar que os combustíveis
fósseis constituem um estoque não renovável, pois o tempo de sua formação na Terra, da ordem
de milhões de anos, é muito maior que a escala de tempo das atividades humanas.
A diferença entre as quantidades de energia solar recebida nas várias partes da superfície
terrestre causa diferenças de temperatura e pressão, provocando ventos na atmosfera. Também
contribuem para sua formação a energia cinética do movimento de rotação da Terra e a atração
gravitacional da Terra sobre a massa da atmosfera que a envolve. Portanto, a energia eólica
resulta da energia solar e da energia gravitacional.
Também a partir dessas duas fontes, os oceanos poderão (no futuro, pois hoje só temos
projetos-piloto para desenvolvimento das tecnologias necessárias, que de modo geral ainda são
muito caras) fornecer energia de três tipos :
- das marés, provocada pelo movimento de revolução da Lua em torno da Terra, arrastando pela atração
gravitacional a massa de água dos oceanos, fazendo variar a altura da superfície do mar, que pode ser
usada próximo às costas.
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- das ondas, provocadas por efeitos combinados de movimentos do mar e dos ventos que se atritam com
a superfície dos oceanos.
- da diferença de temperatura entre a água da superfície, aquecida pela energia solar, e as águas mais
profundas dos oceanos.
Pode-se, enfim, usar diretamente a energia solar como fonte energética, através de equipamentos
especialmente construídos para captá-la, destacando-se :
- coletores planos, capazes de aproveitar não só a radiação direta do sol mas também a radiação difusa
(única disponível em dias nublados) para aquecimento de água e do ar (na secagem de grãos, por
exemplo).
- células fotovoltaicas, para geração direta de energia elétrica, aproveitando o efeito fotovoltaico : a
radiação solar direta desprende elétrons de materiais semicondutores (como o silício metálico, por
exemplo), dando origem a uma corrente elétrica.
- coletores concentradores (cilíndrico-parabólicos, por exemplo) da radiação solar direta num único
ponto, de forma a produzir calor em alta temperatura para vaporizar a água e gerar eletricidade numa
turbina.
Outra fonte energética renovável, mas que não é originada pela energia solar, é a
geotérmica, formada pela alta temperatura do núcleo da Terra, e alimentada pela desintegração
radioativa de núcleos atômicos instáveis, presentes no seu interior.
As Leis da Energia
De um modo geral, a atividade humana necessita captar uma fonte de energia da natureza
e transformá-la numa forma em que possa ser utilizada, na quantidade suficiente para a produção
de bens e serviços demandados pela sociedade. As conversões da energia na natureza têm
portanto dois aspectos, relacionados à quantidade e à qualidade da energia, de interesse para o
Homem, que os estudou no ramo da Física conhecido como Termodinâmica, considerada a
ciência da energia.
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O Primeiro Princípio da Termodinâmica, conhecido como a Lei da Conservação de Energia,
estabelece que a energia não pode ser criada nem destruída. Dentro de um sistema fechado (por
exemplo, a Terra ou o sistema solar), a quantidade total de energia não se altera, embora as
formas em que ela se apresenta possam mudar. Trata-se da versão, no campo da energia, do
famoso princípio da Química, enunciado por Lavoisier : “Na natureza nada se perde, nada se cria :
tudo se transforma”.
Assim, por exemplo, 1 Tcal = 103 Gcal = 106 Mcal = 109 kcal = 1012 cal.
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outras. Quando duas partículas em movimento se chocam, a energia total do sistema antes e
depois do choque é a mesma. Porém, a energia cinética total das duas partículas após o choque é
menor, pois uma parte dessa energia se transformou em calor, devido ao atrito durante o choque.
Ora, essa energia em forma de calor não está mais disponível para mover as partículas, sob forma
de energia mecânica. Dizemos então que ela se degradou, dispersando-se no ambiente, fora do
sistema composto pelas duas partículas em movimento. Para fins práticos, a parcela de energia
que se transformou em calor representou uma perda para o sistema. De modo geral, todas as
formas de energia podem ser transformadas em calor. Porém, o Segundo Princípio da
Termodinâmica nos informa que a transformação inversa, do calor para outras formas de energia,
só é possível em parte: jamais podemos converter toda a energia térmica de que dispomos em
trabalho. Ou seja, para galgarmos um degrau na qualidade da energia que queremos usar, somos
forçados a abrir mão de uma parte da quantidade inicial, que se dissipará sem poder ser
recuperada. Dentre suas várias formulações, o segundo princípio da Termodinâmica pode ser
enunciado da seguinte forma : " Na transformação de calor em trabalho, o sentido é sempre do
estado térmico mais alto para o mais baixo, e sempre com rendimento menor do que 100 % "
(Sevá, 1989). Isto quer dizer que “é impossível operar uma máquina térmica que converta
completamente em trabalho o calor de um corpo quente, sem rejeitar parte do calor para um corpo
mais frio” (Carvalho e Goldemberg, 1980). Portanto, nessa conversão de forma, há sempre uma
perda de energia útil.
Dentre os combustíveis, os líquidos e gasosos são mais nobres que os sólidos, por sua
maior eficiência de uso final e menor custo de manuseio, estocagem e transporte, graças a seu
menor volume, propiciado por sua maior concentração. Com efeito, o poder calorífico dos
combustíveis fornece uma primeira aproximação de sua comodidade de uso. Assim, numa escala
crescente de qualidade temos a lenha, com 2500 a 4000 kcal/kg, o carvão, com 6000 a 7000
kcal/kg, e o petróleo, com cerca de 10000 kcal/kg. Podemos carbonizar a lenha, ou liquefazer o
carvão, obtendo um combustível de melhor qualidade, com maior eficiência de uso final e mais
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compacto. Porém, temos de pagar um preço por isso, em termos da quantidade de energia
disponível. Por exemplo, na transformação de lenha em carvão vegetal cerca de metade da
energia contida inicialmente na lenha é consumida na carbonização, restando apenas a outra
metade disponível sob forma de carvão. Mesmo assim, convém efetuar essa transformação
quando temos de transportar a lenha para ser consumida a grandes distâncias. Dependendo dos
parâmetros de custo de transporte específicos em cada contexto, raramente o raio econômico de
uso da lenha como combustível supera 200 km, tornando-se mais interessante sua transformação
em carvão vegetal, a partir desse limite.
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Breve História do Uso da Energia no Mundo
É interessante notar que o homem, ao longo de sua História, foi dominando sucessivamente
o uso de fontes cada vez mais nobres de energia. O próprio ser humano pode ser visto como uma
máquina que ingere alimentos e realiza uma certa quantidade de trabalho. O homem corresponde
a um motor de 100 W de potência, necessitando uma entrada de 2 mil kcal/dia de energia
bioquímica (combustão dos alimentos) para que o coração e os músculos realizem suas atividades
de trabalho mecânico. Quando aprende a controlar o fogo, inicialmente para se aquecer, cozinhar
e proteger-se, o homem realiza sua primeira grande conquista energética, pois a queima de
apenas 1 kg de lenha seca pode chegar a produzir 4 mil kcal. Estima-se que o homem nômade,
extrativista, consumia 5 mil kcal/dia, por volta de 100 mil anos A.C. (Goldemberg, 1987).
Durante a Idade Média, sociedade rural em que o escravismo foi substituído pelo regime de
servidão feudal, as principais fontes de energia continuaram as mesmas : lenha, tração animal e
força muscular humana, além da energia solar na agricultura. Mas surgiram gradativamente
importantes inovações para aumentar o rendimento da captação e uso da energia : a charrua e a
atrelagem dos animais pelo peitoral elevaram a eficiência do trabalho mecânico; e expandiu-se o
uso de moinhos de água e de vento. Já na transição para a Idade Moderna, duas inovações foram
marcantes : modificações nos tipos e arranjos das velas tornaram a energia eólica mais importante
que os remos, na navegação ; e a descoberta da pólvora (mistura de salitre, carvão e enxofre
pulverizados) pelo Ocidente, com seu uso nas armas de fogo. O uso de energia era da ordem de
26 mil kcal/dia (Bôa Nova, 1985).
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Às suas vésperas, a potência empregada pelo homem, isto é, a taxa de consumo de
energia por unidade de tempo, ainda era a mesma de milhares de anos atrás. Em consequência,
sua velocidade de deslocamento em terra continuava sendo a do cavalo, por exemplo. O mapa da
França nos lembra disso, quando observamos sua divisão administrativa em departamentos
(como os nossos estados), ainda a mesma estabelecida pelo Código Napoleônico : o tamanho de
cada departamento corresponde à distância percorrida em 1 dia de viagem a cavalo para
atravessá-lo, maneira encontrada por Napoleão, hábil estrategista, de calcular o deslocamento de
suas tropas. Ou seja, os exércitos napoleônicos se movimentavam com a mesma velocidade que
as legiões romanas ao invadirem a Gália, dois mil anos antes.
A partir da era industrial, não só o consumo energético per capita explodiu, atingindo 77 mil
kcal/dia por volta de 1875, como a quantidade de energia mobilizada por minuto cresceu
tremendamente, com os requisitos de potência bem mais elevados das máquinas a vapor. Elas
podiam ser alimentadas a lenha, mas logo se descobriu a vantagem de substituí-la pelo carvão
mineral, de poder calorífico sensivelmente superior. Começava assim a grande transição para os
combustíveis fósseis : nos Estados Unidos, por exemplo, a participação da lenha no consumo
energético total caía de 90 % para 20 % em apenas 50 anos, entre 1850 e 1900, enquanto no
mesmo período o carvão subia de 10 % para 70 %.
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inconsistência da crença na possibilidade de um crescimento ilimitado do consumo de energia,
diante da perspectiva de progressiva escassez e encarecimento do petróleo no futuro.
Esta crença foi também abalada pela crescente poluição do ambiente com os resíduos do
uso da energia, e pela inexistência de uma fonte energética alternativa ao petróleo, abundante e
barata. Desde o século passado o homem havia descoberto a energia elétrica, a partir da
descoberta do eletromagnetismo, em 1820, e da indução eletromagnética, pouco depois : a
possibilidade de gerar uma corrente elétrica num fio metálico enrolado em forma de bobina, a
partir da movimentação de um ímã, ou seja, a transformação da energia mecânica usada para
mover o ímã na eletricidade induzida na bobina. Mas a eletricidade não é uma fonte, e sim uma
forma de energia extremamente cômoda, graças à sua limpeza, facilidade de controle e eficiência,
e por permitir um fácil transporte via linhas de transmissão, viabilizando sua utilização a grandes
distâncias. Um gerador elétrico, composto basicamente de um conjunto de bobinas e ímãs,
precisa ter seu movimento impelido por uma turbina (ver Figura 2), movida pela energia hidráulica
(potencial/cinética de uma queda d’água) ou térmica (vapor produzido numa caldeira pela queima
de lenha, carvão ou óleo). Como os recursos hídricos só bastam para suprir uma pequena parcela
da demanda de eletricidade, em escala mundial, as principais fontes de energia para a geração
elétrica no mundo são o petróleo e o carvão mineral.
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tendências de aumento a longo prazo dos preços da energia, além de minimizar os impactos
ambientais do sistema energético. Afinal, como vimos, a humanidade foi capaz de progressos
enormes, mesmo usando quantidades moderadas de energia.
O uso de energia é essencial para a satisfação das necessidades humanas. Ao longo dos
séculos, o homem aprendeu a utilizar as fontes de energia disponíveis na natureza para atender
às suas necessidades.
Hoje, a energia, em suas várias formas, está presente em todas as atividades humanas,
seja como um serviço essencial à qualidade de vida, seja como um fator de produção que
dinamiza o desenvolvimento econômico. Deve-se portanto tratar a produção e o uso de energia
dentro de um enfoque sistêmico, superando uma abordagem limitada ao setor energético. Isto
acarreta a necessidade de consideração da componente energética das diversas políticas
setoriais, analogamente ao que ocorre com o requisito de uma adequada inserção da dimensão
ambiental no processo de desenvolvimento.
A relação entre energia e meio ambiente também é muito intensa, devido à utilização de
recursos naturais e aos impactos ambientais envolvidos ao longo da cadeia de produção,
transformação, transporte, distribuição, armazenagem e uso final da energia. A energia só se torna
útil ao homem graças ao uso de equipamentos de consumo (por exemplo : caldeiras, motores,
fogões, fornos, turbinas) que convertem nos bens e serviços desejados (calor para aquecimento
de ar e de água, para cozinhar e para atividades produtivas; força motriz para o trabalho mecânico
e para os meios de transporte; iluminação; etc.) o conteúdo energético das formas finais em que a
energia é entregue ao consumidor : gasolina, óleo diesel, óleo combustível, nafta, querosene, gás,
coque, carvão vegetal, álcool, eletricidade, dentre outras. Por sua vez, estas formas de energia,
ditas secundárias, são obtidas a partir de fontes de energia primária, providas pela natureza
(petróleo, gás natural, carvão mineral, lenha, cana de açúcar, energia hidráulica, urânio,
principalmente), em centros de transformação : refinarias de petróleo, plantas de gás natural,
usinas de gaseificação, coquerias, carvoarias, destilarias, usinas hidroelétricas, centrais
termoelétricas (a carvão, gás, derivados de petróleo e nucleares), por exemplo. Algumas fontes de
energia primária também podem ser utilizadas diretamente pelo consumidor final, como no caso
do uso de lenha para cocção de alimentos. A Figura 3 ilustra a cadeia de transformações da
energia.
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ano de 1983 indicou que, da oferta interna bruta (produção mais importações menos exportações
e variações de estoque) de energia primária, a energia útil representava 33 %, 11 % foram
usados como matéria-prima para fins não-energéticos, e as perdas atingiram 56 % do total (12 %
na passagem da energia primária à secundária e 44 % nos equipamentos de uso final).
Este elevado nível de perdas tem duas origens principais. Em primeiro lugar, em muitos
países de todo o mundo, inclusive o Brasil, desperdiça-se grande quantidade de energia em
decorrência de planejamento e funcionamento ineficiente dos processos e equipamentos usados
para converter a energia nos serviços necessários às atividades humanas. Isto se explica
principalmente pela influência do baixo preço da energia, em particular o petróleo (fonte energética
dominante a nível mundial), na orientação do progresso técnico ao longo de todo o período (os 25
anos após a 2a guerra mundial) em que se moldou grande parte do atual aparelho produtivo
mundial. E pela baixa incidência dos custos energéticos no orçamento das empresas e das
famílias (menos de 5 % na grande maioria dos casos). Por outro lado, um certo nível mínimo de
perdas ao longo da cadeia de transformações energéticas é inevitável, por força das próprias leis
da Física, em particular do segundo princípio da Termodinâmica.
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para o meio ambiente. O caso da energia nuclear é sem dúvida o mais importante neste campo,
mas, em outra escala e com características diversas, também as barragens hidroelétricas, as
biotecnologias, as minas de carvão, os poços, as refinarias e o transporte de petróleo, entre
outros, apresentam riscos tecnológicos que têm de ser considerados.
Por outro lado, com a rapidez e a amplitude desse desenvolvimento, perigosos limites foram
superados : pela primeira vez na história, as atividades humanas podem destruir frágeis equilíbrios
ecológicos essenciais para a reprodução da vida, seja pela escala de sua agressão ao meio
ambiente (rejeitos poluentes perturbadores dos ciclos biogeoquímicos), seja pela ocorrência de
acidentes com consequências maciças. Com exceção do "buraco" da camada de ozônio, os
principais riscos ambientais em escala planetária com que hoje nos defrontamos estão
intimamente associados à elevação do consumo de energia :
c) A chuva ácida e seus impactos sobre os solos, os recursos hídricos, a vegetação e as construções.
d) O risco de acidentes em reatores nucleares, os problemas criados pela disposição de seus resíduos e
pela desativação dos reatores, após seu tempo de vida útil, e os perigos de contaminação associados ao
uso da energia nuclear.
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superando amplamente as fronteiras dos países que se beneficiam de seu emprego. Três
consequências deste fenômeno são particularmente importantes :
1) O desafio de preservar o meio ambiente exige uma tomada de consciência mundial e torna-se
extremamente complexo por necessitar de uma ação coordenada a nível internacional.
2) O planejamento energético terá cada vez mais de incorporar uma dimensão ambiental, que
condicionará de forma crescente as decisões a serem tomadas sobre a produção e o uso de energia.
3) A curto e médio prazos, é fundamental conter o crescimento do consumo energético dos países
industrializados (que com 29 % da população mundial, são responsáveis por 84 % do consumo
energético global) através de uma ampla política de conservação que promova o uso mais eficiente da
energia. Aos países do Terceiro Mundo, caberá evitar o mimetismo com relação à sociedade de
consumo do Norte, de todo modo necessariamente restrito ao benefício de suas elites (com sua
"poluição do desperdício" e a inevitável contrapartida da "poluição da pobreza" da grande maioria da
população). Isto implica a busca de um estilo de desenvolvimento menos intensivo em energia e, a longo
prazo, não destruidor dos equilíbrios vitais do planeta e que, ao mesmo tempo, propicie erradicar os
males próprios do subdesenvolvimento econômico, social, tecnológico, político e cultural, certamente os
principais fatores de deterioração da qualidade de vida nesses países (La Rovere, 1990).
É neste contexto geral que se situa a relação entre energia, meio ambiente e
desenvolvimento na realidade brasileira, adicionalmente caracterizada por algumas
especificidades, entre as quais se destacam :
ii) a existência de importante segmento da indústria siderúrgica, em particular a produção de ferro gusa e
ferro-ligas, baseada no uso de carvão vegetal (como redutor e combustível), oriundo em sua maior parte
de desmatamentos.
iii) a importância do álcool de cana de açúcar como combustível de automóveis, graças ao maior
programa de biomassa renovável em todo o mundo.
iv) a má qualidade do carvão mineral brasileiro, com seus altos teores de cinzas e enxofre.
Estas especificidades reforçam e complexificam ainda mais, no caso brasileiro, a atual interpenetração
entre a política ambiental e o planejamento energético, acima mencionada. Grandes centrais
hidroelétricas tiveram sua construção cancelada ou adiada devido à reação da sociedade frente ao
potencial de seus impactos sociais e ecológicos. Novas unidades de produção de gusa vêem sua
viabilização ameaçada pela obrigatoriedade de obtenção de carvão vegetal a partir de reflorestamentos.
Foi necessário abrir uma exceção na redução do teor de álcool na gasolina, para preservar a qualidade
do ar na cidade de São Paulo. A queima de carvão mineral para geração termoelétrica no Rio Grande do
Sul é apontada como causadora de chuvas ácidas no Uruguai.
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Estes e outros exemplos demonstram a necessidade de nossa política ambiental estar
particularmente atenta às características da produção e uso da energia no país, assim como a
importância crescente de uma adequada inserção da dimensão ambiental no planejamento
energético brasileiro.
Além disso, emerge a relevância fundamental da promoção do uso mais eficiente da energia
em todas suas aplicações, na medida em que a energia mais barata e a única que não causa
impactos ambientais é aquela que se economiza, graças a medidas de racionalização do uso de
energia.
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Parte II - Energia no Brasil
Evolução Recente e Situação Atual
Uma visão de conjunto do uso de energia no país é fornecida pelo balanço energético
nacional, que agrega as quantidades consumidas das diferentes formas de energia através de
seus equivalentes em toneladas de petróleo calculados a partir dos poderes caloríficos superiores
de cada fonte. São apresentadas nos Quadros 1 e 2 a evolução nas últimas décadas da estrutura
da oferta interna bruta de energia no país (requisitos energéticos globais para atender ao consumo
interno de energia primária: produção mais importações menos exportações) e sua situação atual.
Quadro 1 :
Evolução da estrutura da oferta interna bruta de energia no Brasil de 1940 a 1980
Fontes de 1940 1940 1970 1970 1980 1980
Energ. Nuclear - - - - - -
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Quadro 2 : Evolução recente da estrutura da oferta interna bruta de energia no
Brasil e sua situação atual - 1990 a 2006
Fontes de 1990 1990 2000 2000 2005 2005 2006 2006
Energia Mtep % Mtep % Mtep % Mtep %
Petróleo e 57,7 40,7 86,7 45,5 84,5 38,6 84,6 37,5
derivados
Gás Natural 4,3 3,1 10,3 5,4 20,5 9,4 21,7 9,6
Carvão Mineral e 9,6 6,8 13,6 7,1 13,7 6,3 13,5 6,0
derivados
Energ. Nuclear 0,6 0,4 1,8 0,9 2,5 1,1 3,7 1,6
Subtotal não 69,7 50,9 112,4 59,0 121,3 55,5 123,5 54,8
renováveis
Hidroelétrica e 20,0 14,1 30,0 15,7 32,4 14,8 33,5 14,9
Hidráulica
Lenha e Carvão 28,5 20,1 23,0 12,1 28,5 13,0 28,6 12,7
vegetal
Derivados de Cana- 18,9 13,4 20,8 10,9 30,1 13,8 33,0 14,6
de-açúcar
Outras Renováveis 2,1 1,5 4,4 2,3 6,3 2,9 6,7 3,0
Subtotal renov. 69,7 49,1 78,2 41,0 97,3 44,5 101,8 45,2
TOTAL 142,0 100 190,6 100 218,7 100 225,3 100,0
Fonte : MME-SE-DNDE ; "Balanço Energético Nacional", 2001; EPE, “"Balanço Energético Nacional", 2007.
O consumo total de energia primária no Brasil registra forte crescimento ao longo da década
de 70, com seu aumento sofrendo uma desaceleração nos anos 80. O incremento do uso de
energia no país começa a apresentar taxas elevadas a partir do término da 2a guerra mundial,
impulsionado pela urbanização acelerada de uma população crescente, pelo processo de
industrialização e pela construção de uma infra-estrutura de transporte rodoviário, de consumo
energético intensivo. Em 1940, para uma população de cerca de 41 milhões de habitantes, dos
quais 69% estavam no meio rural, o consumo brasileiro de energia primária era de apenas 23,4
Mtep. No final do século, 60 anos depois, 81 % de uma população de 170 milhões de habitantes
viviam nas cidades de um país com 4171 dólares de PIB/capita (em US$ de 2005), e o consumo
energético médio por habitante tinha quase que duplicado, passando de 0,6 para 1,1 tep/hab/ano
(ver Quadros 2a e 2b).
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Quadro 2a
População, PIB e Consumo de Energia Primária no Brasil, 1990-2006
Quadro 2b
População, PIB e Consumo de Energia Primária no Brasil
1990-2000 2000-2006
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Os Quadros 3 a 6 mostram a evolução recente e a estrutura atual do consumo energético final por
setor e por forma de energia secundária utilizada.
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Quadro 5 : Estrutura do Consumo Energético Final - Brasil - 2006 - em Mtep/ano
(números arredondados)
Setores Eletrici- Deriv. Lenha Produtos da Gás, C. TOTAL
dade Petr. C. Veg. Cana Min,Out. GERAL
Energético 1,3 4,8 0,0 8,9 3,8 18,8
Residencial 7,4 5,7 8,8 0,0 0,2 22,1
Comercial 4,7 0,5 0,1 0,0 0,3 5,6
Público 2,8 0,6 0,0 0,0 0,05 3,5
Agropecuário 1,4 4,9 2,3 0,0 0,0 8,6
Transportes 0,1 44,7 0,0 6,4 2,0 53,3
Uso não energ. 0,0 12,6 0,0 0,6 1,2 14,3
Indústria 15,8 11,6 11,3 15,3 22,9 76,8
TOTAL GERAL 33,5 85,3 22,5 31,2 30,4 202,9
Fonte : EPE ; "Balanço Energético Nacional", 2006
O rendimento médio de utilização vem crescendo lentamente ao longo dos anos, porém,
devido à penetração de energéticos de eficiência de uso mais elevada (eletricidade e derivados de
petróleo, principalmente), enquanto o uso de lenha (combustível de baixo rendimento) estagnava
nos anos 70 e decrescia levemente na década de 80 (ver Quadros 1 e 2).
A forte expansão do uso de eletricidade no país pôde ser suprida pelo aproveitamento do
enorme potencial hidroelétrico nacional (ver Quadro 7). A geração hidroelétrica vem respondendo
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desde o início da década de 70 por mais de 90 % do consumo nacional de eletricidade. E o grau
de utilização do potencial hidroelétrico inventariado permanece inferior a 40 %. As importações de
eletricidade pelo país a partir de 1985 (ver Quadro 8) se referem à contabilização como importada
de metade da energia gerada pela central binacional de Itaipu.
Com efeito, o refino e a distribuição de derivados, segmentos mais rentáveis da indústria do
petróleo, foram priorizados pela Petrobrás, no início de suas atividades, em detrimento dos
esforços de prospecção. Isto causou graves dificuldades econômicas ao país quando os preços do
petróleo no mercado internacional se elevaram acentuadamente, em 1973 e em 1979/80. As
importações líquidas de petróleo e derivados (importações menos exportações), no nível de 44
Mtep em 1980, atingiram um valor de 9,4 bilhões de dólares, chegando a representar 47 % da
receita total de exportações do país.
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Quadro 7 : Recursos e Reservas Energéticas (medidas, indicadas e
inventariadas)(1), Brasil, 31/12/2006
Fontes de Energia Unidades Recursos e Reservas Equivalência Energética –
103tep
Petróleo 103 m3 1.936.665 1,725,569
6 3
Gás Natural 10 m 347.903 345,468
6
Carvão Mineral – in situ 10 t 10.090 2,754,570 (2)
Hidroeletricidade GW ano (3) 112.2 236.000 / ano
Energia Nuclear t U3O8 177.500 1.236.287 (4)
Notas :
(1) Não inclui recursos e reservas inferidas e estimadas, nem as demais fontes energéticas novas e renováveis.
(2) Coeficientes de conversão variáveis e admitindo recuperação média de 70 % e poder calorífico médio de 3900 kcal/kg
(3) Energia firme, convertida pela relação 1 MWh=0,08 tep
(4) Consideradas as perdas de mineração e beneficiamento, sem considerar reciclagem de plutônio e urânio residuais.
(6) Nota: 1 tep = 10.000 kcal
Fonte : EPE ; "Balanço Energético Nacional", 2007
No caso dos derivados de petróleo, porém, o grande aumento de seu consumo acarretou
um elevado grau de dependência do petróleo importado, que chegou a 83% em 1980
(ver Quadro 8).
Coque/c.met 3,7 62,7% 7,9 82,2% 9,4 82,6% 10,9 80,3% 11,0 80,9%
Eletricidade 0,0 -0,2% 2,3 11,9% 2,7 12,2% 3,8 12,7% 3,5 9,8%
Urânio 0,0 0,0% 0,0 0,0% 0,0 0,0% 0,6 34,2% 5,9 162,1%
Álcool -0,2 -11,7% 0,6 9,5% 0,8 11,3% -0,1 -1,3% -1,8 -26,0%
Total 49,6 42,9% 36,4 25,3% 45,6 28,4% 41,5 21,1% 23,7 10,3%
Notas :
- déficit negativo = exportações líquidas
- importação de álcool inclui metanol
- É importante esclarecer a particularidade do valor de 162,1% para o Urânio em 2006, explicada
pelo aumento do estoque de Urânio: Devido ao grande número de atividades envolvidas na
transformação do urânio natural (na forma de U3O8 em urânio enriquecido, contido em pastilhas de
UO2, componentes dos elementos combustíveis), o tempo de processamento dessa transformação
é, em média, de 21 meses. Devido a esse fato, convencionado que todo urânio em processamento
no ciclo do combustível é registrado como ‘estoque de U3O8’. A cada ano é estornado do estoque de
U3O8 a parcela correspondente à produção do urânio contido no UO2 dos elementos combustíveis,
acrescida de cerca de 1,5% de perdas de transformação.
Fonte : EPE ; "Balanço Energético Nacional", 2006
22
energia devido à diminuição das taxas de crescimento econômico do país nos anos 80. Houve
uma reversão da tendência de aumento da participação dos derivados de petróleo no balanço
energético nacional. Foram mobilizados os importantes recursos energéticos nacionais (ver
Quadro 4). Grandes investimentos asseguraram a penetração significativa do uso de álcool nos
transportes, do gás natural e do carvão mineral na indústria e a continuidade da expansão da
oferta de hidroeletricidade a taxas elevadas (ver Quadros 1 e 2). Mesmo a lenha, usada
diretamente ou após sua transformação em carvão vegetal, avançou consideravelmente em
alguns segmentos industriais, que hoje chegam a absorver, em seu conjunto, quase a metade de
toda a energia fornecida pela lenha (ver Quadros 3 a 6), atenuando a perda de sua importância
causada pela queda de seu consumo no meio rural.
Por outro lado, a produção nacional de petróleo saltou de 9,3 para 28,2 Mtep entre 1980 e
1985. Isto contribuiu decisivamente para reduzir os gastos de divisas com as importações líquidas
de petróleo, que caíram para 4 bilhões de dólares em 1985. Posteriormente, o anti-choque de
preços do petróleo, que em 1986 derrubou suas cotações no mercado internacional, permitiu
minimizar as pressões do dispêndio de divisas com importações líquidas de petróleo sobre o
balanço de pagamentos : a parcela do valor das exportações brasileiras absorvida para este fim,
que chegou a 47 % em 1980, era de apenas 10 % em 1986. Este nível se manteve praticamente
estável até 1993 (quando as importações líquidas de petróleo e derivados custaram 3,5 bilhões de
dólares, correspondentes a 9 % das exportações totais do país). Com a estabilização do nível de
preços e a retomada do crescimento econômico a partir de 1994, a demanda interna de petróleo
voltou a crescer, atingindo 1/3 do consumo total de energia primária em 1997. Apesar de um
aumento significativo da produção nacional de petróleo (atingindo 44 Mtep em 1997), as
importações voltaram a crescer, chegando a 39 Mtep em 1997. Entretanto, graças à estabilização
dos preços do petróleo no mercado internacional e ao crescimento das exportações brasileiras, os
dispêndios líquidos com a importação de petróleo e derivados ficaram em 5,7 bilhões de dólares,
representando 11 % das exportações totais do país em 1997.
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Quadro 9 : Preços Médios Constantes de Fontes de Energia no Brasil
(US$ de 2006 / barril equivalente de petróleo)
Seus efeitos foram agravados pelos atrasos cumulativos de diversas obras de grande porte,
devidos à não materialização da demanda prevista e à crônica insuficiência de recursos. Este
processo conduziu a desperdícios de energia e de recursos, acarretando um crescente
endividamento e um nível insuficiente de investimentos nos setores de eletricidade, carvão mineral
e álcool (MIF, abril 1991). A partir de 1994 o governo vem procurando reduzir os subsídios ao
preço do álcool: de 1994 para 1998 o preço real deste energético alternativo aumentou. Os preços
da energia para o consumidor residencial (eletricidade residencial e GLP) também aumentaram
nesse período (ver Quadro 9).
Também a partir de 1994, foi retomada a recuperação tarifária do setor elétrico, para atingir
o nível médio de tarifas preconizado pelo Banco Mundial (67 US$/MWh contra 33 US$/MWh no
início da década). Estas cifras dão a medida da extensão da crise financeira do setor elétrico,
talvez o mais atingido pelos fatores anteriormente mencionados (compressão tarifária, não
materialização da demanda, atrasos de obras de grande porte por falta de recursos,
endividamento externo), por se basear em grandes hidroelétricas, envolvendo altos investimentos
de longo prazo de maturação.
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privada no setor elétrico. A figura do produtor independente de energia foi regulamentada e o
processo de privatização já se encontra em estágio avançado. No início dos anos 90, o setor
elétrico era constituído pela Eletrobrás, empresa federal, por 4 empresas de âmbito regional sob
seu controle (Eletronorte, CHESF, Furnas, Eletrosul), e por cerca de 60 empresas estaduais ou
locais de distribuição, públicas ou privadas. Hoje, o segmento de distribuição já foi transferido para
a iniciativa privada. A rede de transmissão, com acesso garantido a todos os agentes, é operada
por uma instituição privada independente, o ONS – Operador Nacional do Sistema. O
planejamento do setor, por parte da SNE/MME e da Eletrobrás, é essencialmente indicativo.
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Parte III - A Utilização Racional da Energia no Brasil
Vimos ao longo deste trabalho que a promoção do uso mais eficiente da energia é de
importância fundamental no Brasil de hoje, por três razões principais :
a) Economia de investimentos
Para aumentar a oferta de energia elétrica no ritmo requerido pela sociedade brasileira, é
necessário dispor de vultosos recursos financeiros (cerca de 6 bilhões de dólares por ano, nos
próximos 5 anos) devido à escala das obras necessárias para a construção de centrais de geração
e linhas de transmissão de eletricidade. Estes recursos ficam imobilizados por longos períodos : o
prazo total de estudo, projeto e construção de uma grande central hidroelétrica é de cerca de 10
anos. Só depois de sua conclusão o investimento inicial começa a ser recuperado com a receita
proveniente da venda da energia. Enquanto isso, essa massa de recursos não está disponível
para investimento em outras prioridades do desenvolvimento nacional, como educação e saúde,
por exemplo. Hoje, o Estado se encontra em grandes dificuldades para financiar a expansão da
geração e transmissão de energia elétrica necessária ao país, diante da insuficiência e das outras
prioridades de alocação da poupança nacional. Isto pode colocar em risco a própria garantia de
fornecimento da energia elétrica, no futuro, em quantidade e qualidade condizentes com o esforço
de retomada do crescimento econômico do país.
26
Por outro lado, “sabendo usar, não vai faltar”. A conservação pode ser vista como uma fonte
alternativa de suprimento das necessidades de energia elétrica, pois cada kWh economizado
permite evitar a construção da capacidade de gerar 1,2 kWh (em média, devido às perdas na
transmissão e distribuição da rede elétrica), reduzindo a magnitude das obras requeridas em
novas usinas e linhas de transmissão. O mais interessante é que se pode economizar muita
eletricidade a um custo menor do que o necessário para gerar, transmitir e distribuir a mesma
quantidade de energia elétrica. Além disso, o prazo de maturação dos investimentos em
conservação é bem menor que o longo período de gestação de centrais hidroelétricas,
possibilitando uma resposta mais rápida às necessidades da sociedade.
Outra vantagem da conservação é ser a única “fonte” de energia que não gera, de modo
geral, impactos ambientais negativos, pois, ao contrário, evita a implantação de grandes
empreendimentos. Isto é particularmente relevante no Brasil de hoje, para amenizar os impactos
ambientais advindos da expansão futura do setor elétrico brasileiro, minimizando a necessidade
de construção de grandes hidroelétricas e linhas de transmissão na Amazônia, de termoelétricas a
carvão ou de centrais nucleares, por exemplo, com todos seus impactos e riscos ambientais
anteriormente mencionados.
Enfim, o uso mais eficiente da energia na indústria e nos serviços traz quase sempre
benefícios adicionais para as empresas, em termos de economia de tempo e matéria-prima,
criação de empregos qualificados e aperfeiçoamento do produto final, contribuindo para a
elevação da produtividade global da economia.
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elétrica : o valor da economia de óleo diesel, importado, que seria obtida, caso os ônibus de nossas
cidades andassem com seus motores bem regulados, seria suficiente para pagar o salário de uma
equipe de mecânicos responsáveis por sua manutenção; isto significa trocar um gasto de divisas por
criação de empregos e importante redução da poluição, graças à conservação de energia.
f) A mudança de valores que podem modificar a estrutura da demanda social : Educação para promover
a auto-limitação dos níveis de consumo material, em nome da preocupação de preservar a qualidade do
meio ambiente, a solidariedade com as gerações futuras e com aqueles que hoje não gozam do mesmo
acesso aos recursos.
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Instrumentos de Ação do Estado para Promover a Conservação
a) Política de preços
Vimos anteriormente os prejuízos causados ao setor elétrico e ao país pela manutenção de
tarifas de energia elétrica artificialmente baixas no passado. Na verdade, o preço baixo da energia
é uma vantagem ilusória, pois a sociedade como um todo acaba pagando o seu custo real, através
dos impostos que recolhe, subsidiando os grandes consumidores que pagam barato pela energia
que consomem. Assim, os preços da energia devem refletir o mais fielmente possível o conjunto
de seus custos para a sociedade : econômicos (produção, transporte, distribuição) e também, na
medida do possível, sociais e ambientais (nem todos passíveis de quantificação). Isto é
fundamental para que os agentes econômicos dêem o devido valor à energia, evitando seu
desperdício e preocupando-se com seu uso mais eficiente. Um nível mais elevado de preços da
energia favorece também a realização de investimentos para poupar energia, pois seu tempo de
retorno se reduz, graças à maior rentabilidade.
b) Política fiscal
A incidência regressiva de taxas e impostos, segundo o nível de eficiência energética de
equipamentos e serviços, pode ser utilizada para sinalizar aos agentes econômicos a
conveniência da adoção de medidas de conservação. Em outras palavras, impostos mais
elevados em automóveis de alta cilindrada ou eletrodomésticos de baixo rendimento energético,
por exemplo, podem inibir o uso intensivo de energia, enquanto uma redução ou isenção de
impostos pode ser aplicada para estimular a penetração de um produto/processo/equipamento
energeticamente eficiente, baixando seu preço para o consumidor final.
c) Política de crédito
De um modo geral, após o esgotamento dos potenciais de conservação de energia
disponíveis nos primeiros níveis de ação (eliminação de desperdícios e racionalização), a
obtenção de economias de energia adicionais depende da realização de investimentos iniciais
mais elevados do que no emprego das tecnologias convencionais de produção. É fundamental
para sua viabilização que existam ou sejam criadas linhas de crédito em condições adequadas
para financiar a implantação de processos e equipamentos produtivos mais eficientes no uso da
energia.
d) Política de investimentos
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A disponibilidade de novas tecnologias mais eficientes no uso da energia depende do nível
de investimento no desenvolvimento científico nesse campo, acompanhado de sua transformação
em inovações tecnológicas que sejam difundidas na economia, o que requer uma série de
esforços coordenados de diversas políticas públicas (industrial, de capacitação de recursos
humanos, etc.)
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elétrico já vem atuando para promover o uso mais racional da energia elétrica no país, através da
execução do PROCEL - Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Santos, 1994).
31
A Participação da Sociedade Civil no Uso Eficiente da Energia
Além do Estado e das empresas, o cidadão também tem sua parte a fazer na busca de uma
utilização mais racional da energia no Brasil. É importante salientar que isto reverterá em seu
próprio benefício, podendo representar economia no seu bolso e melhoria de sua qualidade de
vida. A conservação de energia é, portanto, antes de mais nada, uma atitude inteligente da sua
parte.
Buscar a eficiência energética contribui também, como vimos, para a proteção do meio
ambiente, que é um dever de todos, Estado e cidadãos, registrado na Constituição brasileira. Por
outro lado, a sociedade também tem assegurada, na nossa Constituição, o direito a um meio
ambiente sadio. Este dever/direito está expresso em seu artigo 225 : “Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações”.
Assim, esta dupla atribuição abre um campo imenso para o exercício da cidadania pelos
indivíduos e suas associações, na realização de esforços de conservação de energia como sua
contribuição para um desenvolvimento sustentável. É importante destacar duas dimensões desta
busca :
a) O esforço pessoal/coletivo para racionalizar o uso de energia na sua casa, escola, local de trabalho,
eliminando desperdícios e se comportando como um consumidor atento ao critério de eficiência
energética na aquisição de bens e serviços. Para tanto é fundamental estar informado sobre seu
consumo energético, direto (em casa, na escola, local de trabalho) e indireto (embutido nos bens e
serviços que utiliza), e adotar as medidas que estão a seu alcance para conservar energia.
b) A cobrança de atitudes e medidas consistentes do Poder Público, da classe política e das empresas
no sentido de aumentar a eficiência energética da economia brasileira.
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Parte IV - Impactos Ambientais da Produção e Uso de Energia no Brasil
Carvão Mineral
33
Estado de seu papel regulador da atividade : a eliminação do uso de carvão metalúrgico nacional
e a redução do raio de utilização do carvão vapor têm inclusive causado desemprego e conflitos
que agravam a situação social nessas áreas. Além disso, o custo de recuperação da área
minerada através do recondicionamento do solo chega a superar o valor da terra na região.
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Configura-se assim um impasse cuja solução depende da compatibilização das metas de
expansão do uso de carvão com as normas para emissão de enxofre. De um lado, há distorções
nas normas : os padrões estabelecidos se baseiam em emissões na fonte, e não nas condições
do meio ambiente, aumentando consideravelmente o custo de controle ; e os níveis permitidos
para usinas maiores que 70 MW são mais rigorosos que os praticados em países industrializados
onde a qualidade do ar já estava muito degradada (2,00 mg/kcal contra 2,16 nos EUA, 3,06 na
RFA e 3,96 na região norte da França). Por outro lado, a prioridade da meta fixada para o
aumento da produção de carvão pode ser questionada diante de outras alternativas de política
energética (ver seções anteriores).
Uma possível solução tecnológica seria a adoção da combustão em leito fluidizado nas
futuras termoelétricas a carvão. Esta tecnologia permite uma queima limpa do carvão, graças à
adição de calcário e à temperatura de operação no leito, retendo todo o enxofre sob a forma
inofensiva de CaSO4 (gesso). Já existem no país, com tecnologia nacional disponível
comercialmente, caldeiras queimando carvão em leito fluidizado, para fornecimento de calor
industrial, em escala correspondente a 1 MW de geração elétrica. Não há maiores dificuldades, do
ponto de vista científico, em ampliar essa capacidade até 50 MW, bastando-se equacionar os
problemas de engenharia inerentes a todo "scaling-up" tecnológico. Prevendo essa possibilidade,
o próprio Plano 2010 da Eletrobrás já havia previsto em 1987 a construção de termoelétricas a
carvão deste porte no final dos anos 90. Entretanto, encontra-se praticamente paralisado, devido à
falta de recursos, o programa visando a capacitação para o projeto e construção de termoelétricas
deste tipo, através da instalação de uma unidade de demonstração de 12 MW, reunindo
universidades, centros de pesquisa e firmas de engenharia nacionais sob a coordenação da
Eletrosul.
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via navegação de cabotagem. Os riscos de colisão, incêndio e sossobramento de navios são
crescentes, devido ao aumento do tráfego e do tamanho dos petroleiros. Além da experiência dos
grandes acidentes ocorridos a nível internacional (Bretanha, Alasca, etc.), os pequenos
vazamentos decorrentes das operações normais de transporte são responsáveis por 35 % do
total de descargas de óleo nos oceanos, com impactos negativos em vários pontos de zonas
costeiras. Também não podem ser esquecidos os riscos de vazamento, explosão e incêndio em
oleodutos, gasodutos, trens, caminhões e depósitos de gás e produtos petrolíferos, como vêm
demonstrando as ocorrências recentes de acidentes deste tipo.
O uso final do gás natural e dos derivados de petróleo causa impactos ambientais da
mesma natureza que os da queima dos demais combustíveis fósseis, como o carvão mineral (ver
item anterior), sendo o mais importante a emissão de uma série de poluentes atmosféricos :
material particulado, monóxido de carbono, óxidos de enxofre e de nitrogênio, compostos
orgânicos, traços de metais e de radionuclídeos, além do CO2 que vem ocasionando o aumento
do efeito estufa (ver adiante). A magnitude das emissões varia de acordo com o tipo de
combustível usado, sua composição e as medidas tomadas para reduzi-las. De um modo geral, o
gás natural é o combustível mais limpo, com grande vantagem sobre os derivados de petróleo,
que por sua vez poluem menos na sua combustão que o carvão mineral, por unidade de energia
36
fornecida. O óleo combustível pesado e os derivados ultraviscosos do petróleo (resíduos asfálticos
- RASF e de vácuo - RESVAC) apresentam problemas parecidos com os do carvão mineral, pois é
no "fundo do barril" que se concentram o enxofre e metais pesados. Com a evolução prevista
para a estrutura do refino no país, sua produção deverá aumentar, e sua utilização em
termoelétricas (1000 MW já estão planejados a curto e médio prazo) deverá ser cercada dos
mesmos cuidados necessários com o carvão (ver item anterior).
37
manutenção dos veículos, maiores investimentos no refino, aumento do preço do diesel e sua
substituição por gás natural em ônibus urbanos.
Hidroeletricidade
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econômico tanto na área do lago artificial como no rio, a jusante da represa. Trata-se na verdade
de uma transformação radical que se opera no ecossistema, substituindo-o por outro,
artificialmente construído. A retenção no reservatório dos sedimentos carreados pelo rio pode
acelerar a erosão e assorear o lago, além de prejudicar a agricultura e a pesca a jusante. O
equilíbrio dos recursos hídricos e todo o ciclo hidrológico podem ser afetados pela construção da
barragem. O enchimento do lago gera movimentos sísmicos que podem causar terremotos. O
microclima local também se torna sujeito a variações.
Os impactos sociais das barragens começam desde a fase de construção, com o grande
afluxo da mão de obra atraída pelo empreendimento sobrecarregando a normalmente já
insuficiente infra-estrutura preexistente em termos de assentamentos humanos. O principal
problema nesse campo, porém, é certamente a necessidade de realocação das famílias que
habitam a área a ser inundada pelo reservatório. Na verdade, a população afetada direta e
indiretamente em suas condições de vida pela construção da barragem é bem maior, abrangendo
também a população ribeirinha. A experiência de compensação das populações locais atingidas
tem se mostrado altamente insatisfatória em todo o Brasil : planejamento inadequado, orçamento
insuficiente, execução apenas parcial dos planos e adoção de tecnologias inapropriadas. Assim,
enquanto os benefícios da geração de eletricidade são distribuídos a nível nacional pela rede de
transmissão, a nível local ficam apenas os impactos negativos. De um modo geral, não é
aproveitado o potencial de contribuição das hidroelétricas para o desenvolvimento social e
econômico da região, através de seu aproveitamento para irrigação, agricultura, pesca, turismo,
lazer e a instalação de pequenas indústrias, além do fornecimento de energia elétrica. Ao
39
contrário, via de regra não se permite o uso múltiplo da água, impedindo-se até a navegação em
muitos pontos.
1. a forte reação das populações atingidas, que se organizaram para resistir e negociar em melhores
condições com as empresas do setor elétrico, inicialmente na região sul e difundindo-se a seguir pelo
país até a criação de uma comissão nacional de atingidos de barragens.
2. as exigências de organismos financeiros internacionais, como o BID e o Banco Mundial, que sob a
pressão de movimentos ecológicos, opinião pública e governos em nível internacional passaram a
condicionar seus empréstimos para a construção das usinas à garantia de mitigação de seus impactos
ambientais.
40
3. a regulamentação pelo CONAMA (resoluções 001/86 e 006/87) da exigência de aprovação de estudo
prévio de impacto ambiental para o licenciamento da construção e operação das centrais hidroelétricas.
Diante destes fatores e dos sérios problemas causados ao setor elétrico pela irrupção da
questão ambiental, como o atraso de cronogramas de obras e o consequente aumento de custos,
sua postura frente a essa questão vem sofrendo inegáveis transformações. Departamentos de
meio ambiente foram criados na Eletrobrás e suas subsidiárias, coordenando a execução de uma
série de estudos visando aperfeiçoar a compreensão e o tratamento dos aspectos ambientais dos
empreendimentos do setor. Consolidando seus resultados, elaborou-se um Plano Diretor de Meio
Ambiente do setor elétrico. Reconhecendo as deficiências de seus procedimentos tradicionais, o
novo discurso ambiental do setor recomenda a prevenção dos impactos de seus
empreendimentos e a abertura do processo decisório sobre sua implantação.
Impõe-se uma mudança de mentalidade, uma vontade política e uma capacitação adequada
para lidar com os desafios colocados pela questão ambiental que não podem se limitar aos
departamentos de meio ambiente das empresas do setor. Alguns requisitos básicos para uma
inserção adequada da dimensão ambiental no planejamento do setor elétrico brasileiro são (La
Rovere, 1990a ) :
2. A consideração "ex-ante" dos impactos ambientais, exigindo seu estudo prévio desde a etapa do
inventário das bacias hidrográficas, permitindo avaliar diversas alternativas de partição de queda da
bacia quanto a sua consequências sobre o meio ambiente.
41
3. A necessidade de se inserir os empreendimentos elétricos nas estratégias de desenvolvimento
regional integrado de suas áreas de influência, articulando-se a atuação do setor elétrico com as
instituições responsáveis pela política ambiental, econômica e social nessas regiões.
Energia Nuclear
A única central nuclear brasileira iniciou sua operação comercial em 1985, no município de
Angra dos Reis (RJ). Com 650 MW de potência, representa apenas 1,2 % da capacidade instalada
de geração elétrica no país em 1990. Seu reator é do tipo PWR (pressurized water reactor), o mais
difundido em todo o mundo, operando a partir do seguinte ciclo do combustível nuclear :
mineração do urânio; fabricação do "yellow cake" (concentrado de óxidos de urânio); purificação e
conversão para hexafluoreto; enriquecimento do urânio; fabricação dos elementos combustíveis;
irradiação do combustível no reator; reprocessamento do combustível para recuperação de urânio
e obtenção de plutônio (esta fase é opcional); disposição final dos resíduos de baixa, média e alta
radioatividade; desmantelamento das instalações nucleares desativadas.
42
de uma usina nuclear submete seus trabalhadores a uma pequena dose de radiação e a
população em torno a dose ainda menores. Estas emissões são baixas e controladas, porém
ainda se necessita de estudos conclusivos sobre os efeitos a longo prazo da exposição contínua a
pequenas dose de radiação.
Resíduos radioativos são gerados em todas as áreas da indústria nuclear, com diversos
níveis de radioatividade. A maior quantidade de resíduos ocorre no início do ciclo do combustível,
nas etapas de mineração e concentração, enquanto os rejeitos de mais alta radioatividade são
produzidos no final do ciclo pela operação dos reatores e pelo eventual reprocessamento (no caso
de sua adoção para reciclagem do combustível). Os resíduos classificados como de nível baixo e
intermediário de radioatividade são enterrados, acondicionados em tambores especialmente
concebidos para esta finalidade. Os rejeitos de alta radioatividade teriam de ser solidificados e
mantidos isolados por um longo período (várias gerações futuras) em depósitos convenientes,
porém na verdade nenhuma solução efetivamente satisfatória para esse problema é conhecida
hoje. Como o reprocessamento não está sendo feito em escala industrial, os elementos
combustíveis irradiados no reator são estocados provisoriamente em um dos prédios da usina,
solução empregada em Angra. No entanto, a vida útil desses depósitos é inferior à duração da
radioatividade do rejeito.
De um modo geral, pode-se dizer que a importância dos riscos potenciais prevalece
amplamente sobre os impactos ambientais da produção e uso da energia nuclear em condições
normais, ao contrário do que ocorre no caso das grandes hidroelétricas. Apesar da probabilidade
de acidentes ser considerada baixa, as consequências podem ser funestas, e a multiplicação das
instalações, das necessidades de transporte de materiais radioativos, o envelhecimento das
centrais e o inevitável relaxamento, com o tempo, na segurança do fator humano, entre outros
elementos, apontam para uma probabilidade real crescente de acidentes de grandes proporções
(como os casos de Three Mile Island e Tchernobyl já comprovam). Ao lado desses fatores
objetivos de risco, a percepção social do risco também é afetada negativamente pela desconfiança
de seu uso em aplicações militares, pelo temor do desvio de materiais radioativos para fins
terroristas e de atos de sabotagem, pelo fato da radiação não ser perceptível por nossos sentidos,
pela falta de conhecimento e informação a seu respeito e pela proximidade das centrais nucleares
a zonas densamente povoadas.
43
prevendo-se que cada estado deverá se encarregar da disposição dos resíduos radioativos
gerados em seu território.
Atualmente, a combustão direta da lenha ainda fornece energia para cocção à maioria da
população rural brasileira. Este uso vem caindo regularmente, devido principalmente ao aumento
da taxa de urbanização do país. Em 1990 menos de 1/3 da lenha utilizada para fins energéticos foi
absorvida pelo setor residencial. Já o seu consumo pela indústria e na agropecuária, da mesma
ordem de grandeza, cresceu até meados da década de 80 para estagnar em seguida. O mesmo
comportamento teve o uso de carvão vegetal na indústria, onde é consumido principalmente pela
siderurgia (na fabricação de ferro gusa e ferro ligas). A transformação da lenha em carvão vegetal
ainda é feita, em sua maior parte, por pequenos fornecedores da indústria que se utilizam de
fornos rudimentares de baixa eficiência : metade da energia contida na lenha é perdida nessa
etapa.
Mas os maiores impactos ambientais se devem ao uso de carvão vegetal na siderurgia, que
está historicamente associado ao desmatamento de Minas Gerais e do sul da Bahia e de Goiás.
Cerca de 45 % da lenha se destina à fabricação de carvão vegetal, que tem 80 % de seu consumo
absorvido pelo setor siderúrgico, concentrado em Minas Gerais. Apesar dos esforços de
reflorestamento das usinas integradas de ferro gusa e do segmento de ferro ligas, apenas 30 % do
carvão vegetal utilizado é produzido de forma renovável. Daí a polêmica sobre a instalação de um
novo pólo guseiro na região de Carajás, que poderia agravar o processo de desmatamento da
44
Amazônia. O IBAMA havia exigido a implantação de Planos Integrados de Florestamento (PIFs)
para assegurar a produção renovável do carvão vegetal na proporção de 70 % em 1992, a ser
aumentada regularmente até atingir 100 % em 1995. Esta exigência, no entanto, vem sendo
sistematicamente desrespeitada. Recentemente, uma lei estadual aprovada em Minas Gerais
reconheceu a inviabilidade desses prazos, estendendo-os até 1999. Receia-se, no entanto, que o
impasse volte a se repetir, apenas postergado por mais quatro anos.
Para que esta contribuição positiva à qualidade ambiental do país e à luta contra o aumento
do efeito estufa ( o crescimento das árvores retira CO2 da atmosfera - ver adiante) se concretize,
será necessário reorganizar linhas de crédito para os programas de reflorestamento, pois o
sistema anterior de incentivos fiscais (que deu margem a grandes distorções) foi extinto.
O Programa Nacional do Álcool (Proálcool) foi lançado em 1975, usando a cana de açúcar
como matéria-prima, com base na capacidade instalada da indústria açucareira. Graças à
concessão de financiamentos governamentais em condições privilegiadas para construção de
grandes destilarias e expansão da área plantada de cana, a produção de álcool pôde aumentar
rapidamente. Em 1979 passou-se à adaptação dos motores dos carros novos para uso de 100 %
de álcool (hidratado), após a adição à gasolina ter atingido o nível de 25 %. Já em 1985 a
produção de álcool atingia 12 bilhões de litros por ano. Hoje, 4,2 milhões de carros são movidos
apenas a álcool hidratado, consumindo 10,5 bilhões de litros, e os demais utilizam 1,3 bilhões de
litros de álcool anidro em mistura com a gasolina.
45
Apesar de seu sucesso tecnológico, o Proálcool também apresenta importantes custos
sociais e ecológicos. Os incentivos dados à expansão da cultura da cana de açúcar, não
desfrutados pelas culturas alimentares para abastecimento do mercado interno, chegaram a
causar, em algumas regiões, a substituição de cultivos alimentícios pela cana. Sua produção, à
base de monocultura com a prática da queimada para facilitar o corte, exige muito do solo, além
de um elevado uso de insumos : fertilizantes, água, pesticidas. A transformação da cana em álcool
nas destilarias gera os principais impactos ecológicos, na queima do canavial, na lavagem da
cana, na queima de bagaço e na obtenção de subprodutos poluentes, como a torta de filtro e
sobretudo o vinhoto.
A torta de filtro, resíduo sólido, também pode ser aplicada na lavoura, em quantidades
limitadas, porém, para não prejudicar o desenvolvimento das raízes. Sua biodigestão anaeróbica
também constitui uma possível alternativa. A queima do bagaço como combustível das caldeiras
da usina produz fuligem (arraste de bagaço não queimado) que polui a atmosfera na usina e seus
arredores. Existe tecnologia de controle disponível (ver item sobre termoelétricas a carvão),
exigindo no entanto um esforço econômico-financeiro. Mais grave é a liberação para a atmosfera
de particulados e cinzas na queima dos canaviais. Além do aspecto visual dos incêndios, os
efeitos sobre a saúde das populações dos centros urbanos vizinhos (incidência de doenças
respiratórias e irritação das mucosas) são acentuados em regiões de grande concentração de
usinas (como por exemplo as áreas próximas a Ribeirão Preto e a Piracicaba, no estado de São
Paulo). A solução a médio prazo reside na mecanização da colheita. O estado de São Paulo já
apresenta um índice de mecanização de 15 %, em média. Esta transição deverá ser lenta e
gradual, porém, sob pena de causar pesados custos sociais.
46
Com efeito, do ponto de vista social o impacto mais positivo do Proálcool foi a geração de
empregos no meio rural. A agroindústria sucroalcooleira é responsável por 720 mil empregos
diretos, estimando-se em mais de 200 mil os empregos indiretos por ela criados. O investimento
total para se gerar um emprego nesse setor (US$ 36 mil em São Paulo e seguramente menor nas
demais regiões) é sensivelmente inferior à média nacional (US$ 41 mil). Certamente as condições
de trabalho, a remuneração e a sazonalidade desses empregos limitam a qualidade de seu
benefício social. No entanto, em comparação com outras atividades agrícolas, os índices de
ocupação de mão de obra por unidade de área, de remuneração e de sazonalidade da cana de
açúcar estão entre os melhores. Por outro lado, é inegável que o Proálcool foi também
concentrador de renda ao privilegiar a produção em destilarias cada vez maiores, transferindo
recursos públicos altamente subsidiados a pequeno número de usineiros. Também do ponto de
vista de redução de desigualdades regionais o programa pouco contribuiu, pois 60 % da produção
de álcool está concentrada no estado de São Paulo. Enfim, do lado da utilização final, seu efeito é
perverso por se destinar à faixa restrita de proprietários de veículos particulares, beneficiada por
estímulos fiscais ao carro a álcool e pelo subsídio ao preço do álcool pago pelo consumidor.
Do ponto de vista ecológico, porém, o uso final do álcool traz importantes benefícios. Em
primeiro lugar, sua queima não contribui para o aumento do efeito estufa, pois a quantidade de
carbono emitida para a atmosfera corresponde à fixada no crescimento da cana de açúcar. Os
motores a álcool puro são bem menos poluentes que os alimentados por gasolina, devendo-se,
porém, estudar melhor os efeitos sobre a saúde humana de aldeídos, emitidos em maior
quantidade. A adição de álcool à gasolina permitiu a substituição do chumbo tetraetila
anteriormente usado como antidetonante. Além disso, quanto maior o teor de álcool na mistura,
menores os níveis de poluentes atmosféricos emitidos (com exceção dos aldeídos). Com a
oscilação desse teor (ver item sobre petróleo), o desempenho dos carros a gasolina foi afetado, e
o consumidor começa a voltar gradativamente a comprar carros novos a álcool : após cair a 4 %
no auge do descrédito do programa, em meio à crise de desabastecimento do produto em
1989/90, hoje a proporção de carros a álcool nas vendas de veículos novos já está entre 10 e 20
%. A meta do governo é recuperar o nível de 40 % (MIF, abril 1991), compatível com o atingimento
da plena utilização da capacidade instalada de destilação de álcool (16 bilhões de litros/ano) no
ano 2000. Para isto, no entanto, será fundamental expandir a área plantada (atualmente de 3,7
milhões de hectares), liberando créditos para a expansão do plantio de cana.
A regularização do Proálcool a médio prazo depende, porém, de um ajuste estrutural que
permita acelerar a redução de custos de produção (que já vem ocorrendo). Há um enorme
potencial de ganhos de produtividade no setor, em particular através da valorização de
oportunidades de aproveitamento de subprodutos. Nesse sentido, urge remover os obstáculos
institucionais e tarifários à utilização do bagaço de cana em sistemas avançados (via gaseificação,
ciclos combinados de cogeração e turbinas com injeção de vapor) de geração termoelétrica,
viabilizando um importante excedente a ser injetado no sistema elétrico.
47
O Efeito Estufa
48
últimos autores estimaram apenas a contribuição da Amazônia, mas ainda assim há discrepâncias
causadas por diferentes hipóteses sobre superfície desmatada e densidade de biomassa da
floresta.
De todo modo, a contribuição do uso de energia no Brasil para o aumento do efeito estufa é
significativamente inferior. Considerando apenas as emissões de CO2, as estimativas preliminares
do PPE/COPPE/UFRJ são de 69 Mt C /ano para 1990, valor bastante próximo às 66 Mt C /ano
calculadas por Moreira e Poole (1991). Isto corresponde a pouco mais de 1 % das emissões
globais, contra 4,7 a 6,6 % do desmatamento da Amazônia (segundo Reis e Margulis, 1990). O
relativamente baixo valor das emissões de CO2 devidas ao uso de energia se explica pela grande
participação da hidroeletricidade e de biomassas renováveis no balanço energético brasileiro (ver
seções anteriores). Diante da imprecisão dos dados disponíveis referentes à lenha, considerou-se
que apenas 20 % da lenha (incluindo seu uso na forma de carvão vegetal) consumida no setor
residencial era oriunda de desmatamentos, contribuindo assim para o aumento do efeito estufa.
Nos demais setores de uso de lenha, supôs-se que essa proporção se invertia (80 % da lenha
oriunda de desmatamentos).
Segundo essas hipóteses, em 1990 o petróleo contribuiu com 61 % das emissões de CO2, a
lenha com 14 %, o carvão vegetal com 11 %, o carvão mineral com 10 % e o gás natural com 4 %.
Dos setores de uso final, o maior responsável por emissões de CO2 foi o industrial com 40 %,
seguido do de transportes com 35 %, do residencial com 10,5 %, do agropecuário com 8 %, do
energético com 5,5 % e do comercial e público com 1 %.
A principal contribuição brasileira para deter o avanço do efeito estufa teria de vir,
naturalmente, da redução do desmatamento, em particular na Amazônia. Algumas medidas de
política energética, porém, também podem contribuir nesse sentido, e podem estar sujeitas a
menores dificuldades para sua implementação. A mais importante é, sem dúvida, a promoção da
conservação de energia, em diferentes níveis, através de um aumento do rendimento energético
global que permita o atendimento das necessidades econômicas e sociais com um menor
consumo de energia. Complementarmente, a substituição do uso dos combustíveis fósseis por
fontes energéticas renováveis (hidroeletricidade, bagaço de cana, lenha e carvão vegetal de
reflorestamentos, outras biomassas, energia solar, por exemplo), e o maior uso de gás natural em
substituição a derivados de petróleo e carvão mineral, também podem contribuir para a redução
do efeito estufa.
49
São eles : a Amazônia, o Meio Norte, o Cerrado, o Pantanal, a Mata Atlântica, a Caatinga, os
Campos do Sul, os Pinheirais, a Zona Costeira e o Ambiente Urbano.
a) Carvão Mineral
50
Atividades Impactos Biomas
Perfuração, Sísmica Desmatamento Amazônia
Produção (plataformas) Prejuízo à fauna
Risco de incêndios
Oleodutos e Gasodutos Vazamento hidrocarbonetos mar Zona costeira
Terminais Marítimos Prejuízo a lazer e turismo (RJ, SP, NE)
Ferrovia, Rodovia, Navios Prejuízo à saúde da população Mata Atlântica
Refinarias Poluição de baías-metais pesados
Queima de derivados Poluição atmosférica urbana Ambiente urbano
Aumento do efeito estufa
c) Hidroeletricidade
51
Naturalmente os indicadores de área inundada pelos reservatórios e de população a ser
remanejada não cobrem adequadamente o conjunto dos impactos ambientais causados por
grandes centrais hidroelétricas, servindo apenas para fornecer uma primeira visão da distribuição
pelo território nacional da magnitude desses empreendimentos. O Quadro 12 apresentado a seguir
resume os principais impactos ambientais, por bioma, das centrais hidroelétricas e das linhas de
transmissão necessárias ao transporte da energia gerada.
d) Energia Nuclear
52
Quadro 13 : Impactos Ambientais da Energia Nuclear por Bioma
Atividades Impactos Biomas
Mineração de urânio Radiação sobre trabalhadores Cerrado
Beneficiamento de urânio Poluição local do solo, água, ar Mata Atlântica
Operação de reatores Resíduos radioativos Zona Costeira
Risco de dispersão radioativa Ambiente Urbano
Além do estado de São Paulo, onde se situa a metade da capacidade instalada, sofrem os
impactos ambientais da produção de álcool, principalmente, Minas Gerais e Paraná, no Sul, e
Alagoas e Pernambuco, no Nordeste, havendo também a dispersão de 1/4 da produção em
destilarias espalhadas nos demais estados. O uso do álcool em motores de veículos se concentra
nas zonas urbanas, enquanto o bagaço é consumido nas usinas de açúcar e álcool ou em
caldeiras de indústrias vizinhas.
53
Risco de acidentes com metanol
No intuito de fornecer uma visão resumida do conjunto dos impactos ambientais do vetor
energético sobre os diferentes biomas, procedeu-se a uma classificação aproximada de sua
intensidade, para viabilizar a apresentação do quadro-síntese a seguir. Naturalmente, a escala de
magnitude utilizada (pequena/média/grande) é meramente indicativa da distribuição relativa dos
impactos de cada sub-vetor pelos biomas, devendo portanto ser lida por coluna, não se julgando a
relevância de suas consequências nos níveis local e regional, que podem ser importantes.
54
proativa, e não meramente de controle, com relação ao sistema energético nacional. A título de
exemplo, alguns pontos prioritários para sua atuação, abordados neste trabalho, são resumidos a
seguir :
4. Elaborar um Plano Diretor de Meio Ambiente para o setor de Petróleo e Gás Natural.
5. Definir as especificações dos combustíveis líquidos de forma a viabilizar o cumprimento das normas
estabelecidas no PROCONVE.
6. Antecipar para a fase do inventário de bacias hidrográficas a elaboração do estudo prévio de impacto
ambiental e contribuir para a implementação do sistema nacional de gerenciamento de bacias
hidrográficas.
8. Definir na forma de lei a destinação final dos rejeitos radioativos produzidos no país.
10. Desenvolver tecnologia apropriada a cada contexto regional para reflorestamento e carvoejamento
de madeira, com aproveitamento de seus subprodutos para a indústria química.
12. Estabelecer as metas futuras do Proálcool : proporção de carros novos a álcool, teor de álcool na
mistura com a gasolina, expansão do plantio de cana ; e os instrumentos de política para atingi-las.
Há uma série de relações do setor energético com outros vetores que têm agido com
destaque na dinâmica ambiental do país, tais como : exploração madeireira, exploração mineral,
55
urbanização, “agribusiness”, industrialização, fluxos de circulação, fluxos internacionais e
exploração pesqueira.
56
Referências Bibliográficas
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Brito, S.S. "Transformação do Perfil Energético ; Evolução e Implicações Ambientais". Relatório
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Eletrobrás. "Programa Decenal de Geração 1994/2003”, 1994.
Goldemberg, J. Energia Nuclear, Sim ou Não? Ed. J. Olympio, Rio de Janeiro, 1987
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La Rovere, E.L.; “Five hundred years of energy use”, “500 años de mucha energia”, Petrobras
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J.A.S.; Borges, J.L.; La Rovere, E.L.; Guimarães, A.P.C.; “Mapeamento Regional para
57
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Amapá”, Revista Brasileira de Energia, vol. 7, no. 2, 2o. semestre 1999, p.9-22
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Puiseux, L. La Babel Nucléaire. Paris, Galilée, 1977
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Rosa, L.P. "Dimensões básicas de um novo estilo de desenvolvimento. A infraestrutura física e as
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Santos, M.F.M. “O Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica”, in Seminário
Internacional Estratégias de Conservação de Energia Elétrica para o Brasil,
PROCEL/Eletrobrás, Rio de Janeiro, outubro 1994.
Sevá, A.O. "Risco tecnológico e natureza alterada". Campinas, 1989.
58
Anexo 1
Potencial de Fontes Alternativas de Energia no Brasil
1. Energia Solar
O Brasil se situa em segundo lugar, a nível mundial, quanto à energia solar incidente. Em
média, sobre uma superfície horizontal do território nacional incidem entre 1500 e 2000 kwh/m2
por ano, variando conforme o local do país. Isto significa que, tomando-se uma eficiência média de
conversão de 6 % da energia solar em eletricidade através de células fotovoltaicas, numa área
equivalente aos 142 mil km2 que seriam inundados por reservatórios formados pelas barragens
caso todo o potencial hidroelétrico do país fosse utilizado, seriam obtidos cerca de 15 trilhões de
kwh/ano, ou seja, mais de 20 vezes o valor do potencial hidroelétrico inventariado. Hoje esta
comparação tem seu significado prático limitado pela diferença de custos entre as duas fontes :
cerca de 2000 US$/kw para a hidroeletricidade contra 6000 a 8000 US$/kw para a eletricidade
solar fotovoltaica. No futuro, porém, as células fotovoltaicas poderão se tornar competitivas caso
prossiga a tendência de redução de seu custo (que era de 20000 US$/kw no final da década de
70), pois o custo de aproveitamento do potencial hidroelétrico é crescente. Do ponto de vista
tecnológico, o Brasil foi o primeiro país do Terceiro Mundo a fabricar comercialmente a célula
fotovoltaica, a partir do silício monocristalino, não se limitando à simples montagem dos painéis
solares.
Atualmente, porém, o uso mais difundido da energia solar no país é o aquecimento de água,
em residências, hotéis, hospitais e piscinas. Na segunda metade da década de 80, já existiam no
país 25 fabricantes de coletores solares planos para aquecimento de água, com uma capacidade
anual de produção de 30.000 m2. A secagem solar de produtos agrícolas, a climatização
ambiental, o bombeamento d'água, a refrigeração solar, a destilação e a dessalinização de água
são outras aplicações da energia solar já pesquisadas e demonstradas no país em escala piloto.
Em alguns casos, em particular no meio rural, se atinge as condições de viabilidade econômica. O
elevado investimento inicial, entretanto, é um obstáculo importante, assim como para outras fontes
não convencionais de energia, na ausência de mecanismos de financiamento ao consumidor.
59
2. Energia Eólica
3. Xisto
60
problema ambiental é considerado solúvel, quanto à recuperação da área degradada, com base
nos conhecimentos adquiridos com a experiência piloto. Deve-se alertar, porém, que toda
mineração em céu aberto de grandes áreas causa impactos consideráveis sobre o meio ambiente.
No caso do xisto, os danos ambientais são agravados pela maior quantidade de rejeitos
produzida. Além do material estéril, no processo de retortagem de xisto para a produção de óleo o
rejeito aumenta de volume, acarretando a necessidade de maiores superfícies para disposição.
Pode ocorrer a lixiviação dos poluentes contidos no xisto retortado e na água de retortagem,
contaminando os recursos hídricos da superfície e subterrâneos.
4. Turfa
As reservas estimadas e inferidas de turfa chegam a 3 vezes o valor das reservas medidas
e indicadas, que são da ordem de 40 Mtep, mas ainda assim os recursos brasileiros de turfa
atualmente conhecidos representam um potencial energético relativamente modesto em relação
aos demais combustíveis fósseis. Entretanto, sua valorização energética pode ser importante a
nível regional, em conjunto com seu uso na agricultura para recuperação de solos. A Companhia
Brasileira de Pesquisa de Recursos Minerais concluiu a identificação geológica de inúmeros
depósitos de turfa em áreas litorâneas da região Nordeste, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em
Santa Catarina. Lavras-piloto foram realizadas pela CECRISA em Santa Catarina, pela CESP
(Companhia Energética de São Paulo) em São Paulo e pela COPENER (Copene Energética) e
pelo CEPED (Centro de Pesquisas e Desenvolvimento) na Bahia, com apoio da FINEP
(Financiadora de Estudos e Projetos). Estes projetos permitiram o desenvolvimento da tecnologia
de lavra, secagem, combustão e gaseificação, que é relativamente simples.
Os custos de produção de energia da turfa variam conforme o local, o tipo de exploração e
a distância aos centros de consumo. A geração termoelétrica junto à turfeira e o uso como
combustível em cerâmicas ou cimenteiras próximas são as opções economicamente mais
promissoras. Dificuldades de drenagem, no entanto, inviabilizaram a exploração energética de
turfeiras em zonas litorâneas apesar de sua boa qualidade como combustível (alto poder calorífico
e baixo teor de cinzas). Seus impactos ambientais também são variáveis, podendo ser sensíveis
na medida em que grandes quantidades sejam retiradas sem a devida recomposição do solo.
5. Outras Fontes
Naturalmente o Brasil se destaca por seu imenso potencial energético de outros recursos da
biomassa, além do álcool de cana de açúcar, que já é uma realidade comercial no país desde
1975.
Merece um destaque especial a possibilidade de aproveitamento mais eficiente do bagaço
de cana, subproduto das usinas de açúcar e de álcool. Já existe tecnologia disponível para
concretizar sua utilização na cogeração de energia elétrica a ser injetada na rede, que depende
apenas da criação de condições para a viabilização econômica de sua comercialização junto às
61
concessionárias de energia elétrica. O estado de São Paulo vem desenvolvendo um programa
piloto nesse sentido.
Outra alternativa promissora é o aproveitamento de óleos vegetais disponíveis localmente
(dendê, buriti, etc.) para acionamento de motores diesel, seja para movimentar veículos como para
geração de energia elétrica em pequena escala. Experimentos-piloto com motores especialmente
concebidos para uso de óleos vegetais in natura vêm sendo realizados pela COPPE/UFRJ.
A biomassa sob forma de resíduos também pode representar uma importante fonte de
recursos energéticos a nível local. Por exemplo, a geração elétrica a partir de resíduos da
mandioca revelou-se economicamente viável em recente estudo sobre sistemas isolados no
estado do Amapá (Nascimento et al, 1999).
Além do aproveitamento da energia das biomassas, alguns estudos têm sido realizados no
Brasil sobre outras tecnologias energéticas alternativas, procurando acompanhar o estado da arte
a nível internacional.
Ainda em estágio de pesquisa e desenvolvimento, e em alguns casos já com projetos de
demonstração, podem ser mencionadas : as células a combustível, o uso do hidrogênio como
vetor energético, o aperfeiçoamento das tecnologias atuais de combustão, gaseificação e
liquefação de carvão, reatores nucleares intrinsecamente seguros, a fusão nuclear, e o
aproveitamento das diversas formas de energia dos oceanos : marés, ondas, correntes, gradiente
de salinidade e gradiente térmico entre a superfície e o fundo do mar.
A mais longo prazo, algumas aplicações dessas tecnologias poderão se revelar
promissoras. Entretanto, para valorizar essas oportunidades deve-se retomar em escala ampliada
os esforços de desenvolvimento científico-tecnológico no campo energético. Nos últimos anos, os
estudos de fontes alternativas de energia foram sendo descontinuados devido à queda do preço
do petróleo e à crise do sistema nacional de ciência e tecnologia. Um apoio institucional adequado
e a alocação de recursos financeiros em níveis compatíveis com as potencialidades são
indispensáveis para reverter este processo.
62
Anexo 2 : GLOSSÁRIO
Biomassa - matéria orgânica de organismos vivos ou oriunda destes (por exemplo, vegetais,
esterco, restos de alimentos).
Célula Fotovoltaica - dispositivo que produz eletricidade diretamente a partir de sua exposição à
luz, aproveitando o efeito fotovoltaico : os fótons da luz desprendem elétrons da superfície de
materiais semicondutores, como o silício, usados na fabricação da célula, originando uma corrente
elétrica.
Coqueria - fábrica de coque, derivado do carvão mineral (de tipo metalúrgico) para uso em alto-
fornos siderúrgicos, na redução do minério de ferro (produção de ferro-gusa, primeira etapa da
transformação em aço).
Destilaria - fábrica de álcool, a partir da fermentação do caldo extraído da cana de açúcar e sua
destilação : processo químico em que se evapora e condensa um líquido com o fim de obtê-lo
puro, separando-o de outro.
Energia elástica - presente em uma mola comprimida, que pode realizar trabalho ao se distender.
63
Energia gravitacional - atração entre grandes massas como os corpos celestes : dá origem, por
exemplo, às marés, forma de energia devida à atração mútua entre a Terra e a Lua.
Energia térmica - energia sob a forma de calor, sendo o calor na verdade a energia cinética das
moléculas do corpo aquecido.
Fabricação de cimento por “via úmida” - processo produtivo em que se necessita de grande
quantidade de energia, sob a forma de calor, para evaporar a umidade da massa.
Fabricação de cimento por “via seca” - processo energeticamente muito mais eficiente, por evitar o
consumo de energia para eliminar a umidade da massa.
Finos em suspensão - material particulado sólido (de carvão, por exemplo), imerso em meio
líquido ou gasoso (água ou ar, por exemplo).
Fusão nuclear - junção de duas ou mais partículas atômicas formando uma massa ligeiramente
menor que a soma de suas massas iniciais : a diferença muito pequena de massa se transforma
em enorme quantidade de energia, recuperada sob a forma de calor.
Fonte alternativa de energia - fonte energética que pode substituir a fonte predominantemente
usada atualmente (por exemplo, petróleo e derivados).
Fonte renovável de energia - fonte energética que continua sendo gerada naturalmente em um
ritmo semelhante ao de sua utilização pelo Homem.
64
Formas secundárias de energia - formas finais em que a energia é entregue ao consumidor
(gasolina, óleo diesel, óleo combustível, nafta, querosene, gás, coque, carvão vegetal, álcool,
eletricidade, dentre outras), obtidas a partir de fontes de energia primária em centros de
transformação : refinarias de petróleo, plantas de gás natural, usinas de gaseificação, coquerias,
destilarias, carvoarias, por exemplo.
Fotossíntese - assimilação da energia solar pela clorofila das folhas, transformando-a em matéria
orgânica, a biomassa.
Laminação contínua - processo de se reduzir a espessura de uma chapa (de metal como o aço,
por exemplo), produzindo lâminas, de forma contínua, imediatamente após a produção da chapa,
sem interrupção, evitando que o material se resfrie e depois deva ser aquecido novamente para
ser trabalhado, o que envolveria um gasto maior de energia.
Lingotamento - transformação de metal fundido (aço líquido, por exemplo) em barras (lingotes).
Lixiviação - efeito de liberação dos sais contidos em certas substâncias, produzido, por exemplo,
pela lavagem do solo pelas águas das chuvas.
Máquina térmica - qualquer máquina que processa uma transformação de energia em calor.
65
Radiação eletromagnética - energia radiante, que pode ser a luz visível ou ondas ultra-violetas e
infra-vermelhas.
Recurso natural renovável - recurso que continua sendo gerado na natureza em um ritmo
semelhante ao de sua utilização pelo Homem.
Recurso natural não-renovável - recurso finito, formado na natureza mas que não se renova em
um ritmo semelhante ao de sua utilização pelo Homem.
66