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Ajudar a cair
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E-book103 páginas1 hora

Ajudar a cair

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Sobre este e-book

Nesta composição breve sobre vizinhança é acompanhado de perto o Verão de 2016 junto dos residentes do Centro Nuno Belmar da Costa, instituição pertencente à Associação de Paralisia erebral de Lisboa, situada no Bairro Residencial de Nova Oeiras. O que implica ser vizinho de alguém? Conheceremos pelo nome as pessoas de quem tomamos conta? Como nos modificam aqueles que não nos lembramos de termos deixado entrar na nossa vida? Estas são algumas das perguntas de fundo que Ajudar a cair tenta fazer e deixar em aberto.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento24 de ago. de 2017
ISBN9789898838926
Ajudar a cair
Autor

Djaimilia Pereira de Almeida

Djaimilia Pereira de Almeida é escritora e autora de, entre outros, As Telefones, A Visão das Plantas e Luanda, Lisboa, Paraíso, premiado com o Prémio Oceanos 2019. Em 2017, publicou Ajudar a Cair, na Colecção «Retratos da Fundação».

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    Ajudar a cair - Djaimilia Pereira de Almeida

    I

    Último dia antes das férias de Agosto da maioria do pessoal e de muitos dos residentes do Centro Nuno Belmar da Costa, propriedade da Associação de Paralisia Cerebral de Lisboa, no Bairro Residencial de Nova Oeiras. Decorre uma actividade na piscina portátil adquirida com a verba angariada durante uma festa realizada em Maio de 2016, altura em que uma fanfarra tocou sob a buganvília frondosa que sombreia a ampla calçada à portuguesa na entrada do Centro. A música da fanfarra prolonga-se na memória, cortada por salvas de palmas e gargalhadas, numa tarde fresca. Do alvoroço à sombra, protegidas por um canavial que convive com uma acácia, perduram as fardas dos músicos, azuis-escuras e como que fora do sítio, num passeio habitualmente silencioso e sem outro percalço além de um bando de pombos perseguido por uma labradora velha.

    Da piscina, em Julho, servem-se, da parte da tarde, os residentes do Centro e, da parte da manhã, as crianças do Centro Paroquial de Nova Oeiras. Ouvida do interior dos apartamentos em redor, através das janelas antigas, a melodia de mergulhos e gargalhadas é de manhã ou de tarde estranhamente próxima e difícil de distinguir, não se sabendo dizer se alguém está feliz ou a ser atacado: notas em que o prazer se confunde com o terror e que o ouvido comum não consegue destrinçar. Um quadro de ardósia deixado no passeio convida os vizinhos do Bairro a dar um mergulho. Fale connosco se quiser usar a piscina, lê-se a giz de várias cores. O morador sonolento precisa de vir à janela confirmar que ninguém corre perigo, tão parecidos são os sons da aflição com os do contentamento, se escutados à distância, enquanto passa pelas brasas.

    Aos banhistas aplicou-se protector solar em abundância, e vestiram-se biquínis e calções de banho adequados a senhoras e senhores na casa dos sessenta. Os corpos são pequenos, os joelhos ossudos; os pés inchados, pálidos. Aguardam numa fila indiana de cadeiras de rodas por entrar na água, onde apenas entra um de cada vez. Há ansiedade no ar. Uma cama de rede de sarja listrada foi pendurada em duas colunas do alpendre por onde trepa a buganvília, podada, quando é preciso, por um jardineiro experiente. Um rapaz agita-se sentado num sofá feito de paletes de madeira pintadas de laranja e turquesa imitando puns com um sopro surdo no antebraço direito. É o único que não se senta numa cadeira de rodas. Também bate palmas sem outra razão aparente que a de estar claramente entusiasmado, bichana aos ouvidos das monitoras, ou berra palavrões. Outros banhistas estão estirados em grandes almofadas brancas feitas pela costureira do Centro, a dona Ofélia. Estou à parte, sentada num banco, do outro lado da coluna de canas. De trás do biombo verde, o rapaz de pé chama-me com insistência. Parece querer mostrar-me alguma coisa, mas não lhe passo

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