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Liberal com Orgulho
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E-book436 páginas12 horas

Liberal com Orgulho

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Sobre este e-book

Coletânea de artigos sobre economia e política. Com apresentação de economistas e empresários como Gustavo Franco, Jorde Gerdau, Indio da Costa, Paulo Guedes e Antenor Barros Leal, o livro traz artigos inéditos e textos publicados no jornal O GLOBO, Revista VOTO, Revista Banco de Ideias, entre outros. Os principais temas abordados pelo autor são: a morte da oposição, Israel, Che Guevara, a volta da inflação e o sistema de cotas.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento9 de set. de 2013
ISBN9788564833104
Liberal com Orgulho

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    Tudo que um certo grupo da classe dominante pensa sobre como deve ser o Brasil.

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Liberal com Orgulho - Rodrigo Constantino

IBMEC.

copyright © Rodrigo Constantino

ISBN 9788564833104

Coordenação Editorial

Flávia Portela

Capa e Projeto Gráfico

Flávia Portela

Arte-Finalização

Fernanda Barata Ribeiro

Revisão

Ana Bittencourt

Produção de ebook

S2 Books

Direitos desta edição reservados à

ESTUDIO F DESIGN / LACRE

www.editoralacre.com.br

RODRIGO CONSTANTINO

LIBERAL COM ORGULHO

Nota do autor: a palavra estado será sempre grifada com letra minúscula no livro. A explicação é a mesma utilizada pela revista Veja, quando adotou esta postura: Se povo, sociedade, indivíduo, pessoa, liberdade, instituições, democracia, justiça são escritas com minúscula, não há razão para escrever estado com maiúscula.

Para todos os liberais espalhados pelo país

"O liberal é humilde. Reconhece que o mundo e a vida são complicados.

A única coisa de que tem certeza é que a incerteza requer a liberdade,

para que a verdade seja descoberta por um processo de concorrência e debate que

não tem fim. O socialista, por sua vez, acha que a vida e o mundo são facilmente

compreensíveis; sabe de tudo e quer impor a estreiteza de sua experiência – ou

seja, sua ignorância e arrogância – aos seus concidadãos."

(Raymond Aron)

"Devemos buscar a perfeição na criação, na vocação, no amor, no prazer. Mas

tudo isso no campo individual. No coletivo, não devemos tentar trazer a felicidade

para toda a sociedade. O paraíso não é igual para todos."

(Mário Vargas Llosa)

Sumário

Capa

Créditos

RODRIGO CONSTANTINO

Nota do autor

Dedicatória

Introdução

A Era da Esperança

Lições da Grande Depressão

A Origem do FED

A Crise Vista por um Prisma Liberal

Leis contra o Fumo: onde há Fumaça, há Governo!

Juventude Destroçada

As Cotas Racistas

O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Inimputáveis

O Proselitismo da UNE

De Quem é a Culpa?

Por um Câmbio Livre

A Hipocrisia da Esquerda

A Atualidade de Mencken

A Revolução Cultural Socialista

Nacionalismo Oportunista

Segregação Racial

O Nobel da Paz

Vinte Anos Depois

Dia da Consciência Individual

O Câncer da Corrupção

Liberdade de Imprensa

A Raça Humana

Os Tutores das Almas Infantis

O Culto à Presidência

Trogloditas de Esquerda

Correlação e Causalidade

A História Resgatada

Heróis ou Vilões?

Em Nome do Povo

Ecos de Massachusetts

Arrogância Autoritária

Filhos do Iluminismo

A Cigarra Doente

O Caminho da Servidão

Pelo Fim do Banco Central

O Monopólio da Virtude

Google x China

Insistindo no Erro

As Barreiras do Sindicalismo

Brasília e Tiradentes

Tempos Perigosos

Dia da Liberdade

Dançando no Vulcão

Órfãos Políticos

Seitas Fechadas

A República Sindical

Filhos da Liberdade

A Servidão Voluntária

A Outra Face de Dilma

Filhotes de Skinner

Democracia Suja

Juventude Utópica

A Bajulação Corrompe

Os Incorruptíveis no Divã

A Morte do Federalismo

A Liberdade segundo Mises

O Sonho Americano

A Filantropia dos Ricos

Reflexões Patrióticas

Pan-Africanismo sem Racismo

A Sabedoria de Schopenhauer

Siderbrás: O Aço é Nosso!

Em Defesa da Privatização

Dia de Luto

O Demolidor de Utopias

Liberalismo e Democracia

Orwell contra o Totalitarismo

Resgatando a Linguagem

Individualismo Sim, Sociopatia Não!

O Papel da Oposição

Crianças Mimadas

A Ditadura do Politicamente Correto

Os Chacais no Poder

Para Derrotar as Máfias Sindicais

O Fanatismo de Rousseau

A Miopia dos Governantes

Uma Máquina Chamada Churchill

Procura-se Líder de Oposição

Liberdade de Expressão

O Extermínio dos Romanov

Onde Estão as Reformas?

Bônus Demográfico: até quando?

O Custo da Burocracia

Hora de Mudanças

A Farra do Governo

Modelo Equivocado

Como se Faz Oposição

O Lado Negro da Internet

A Falibilidade Humana

Capitalismo de Estado

Uma Sociedade Infantilizada

Democratas Fundamentalistas

A Economia em uma Sociedade Justa

Inflação Fora de Controle?

Salvando o Capitalismo dos Capitalistas

O Ódio a Israel

Enaltecendo a Mediocridade

O Mito Che Guevara

Os Tentáculos do Governo na Economia

É Hora de Repensar o BNDES

Senhores do Destino

Terremoto em Lisboa

Partido do Estado

Um Suíço no Brasil

A Falência do Estado Social

As Boas Intenções

Demanda Agregada

O Liberalismo no Brasil

Um Conflito de Visões

Heróis da Liberdade

Epílogo

Obras Mencionadas

Índice Temático

Sobre o autor

Texto de orelha

Introdução

Poucas pessoas assumem ser liberais no Brasil. Com uma hegemonia da esquerda no ambiente intelectual do país, as virtudes e os fins nobres foram se tornando monopólio dos pensadores socialistas ou social-democratas, e qualquer ponto de vista liberal passou a ser automaticamente descartado como coisa de elite insensível ou oportunismo de grupos de interesse. Nada poderia estar mais longe da verdade.

Os países liberais foram justamente aqueles que tiveram mais progresso material, associado sempre a uma ampla liberdade individual, incompatível com modelos que concentram demasiado poder no estado. Por que, então, ter vergonha de usar o termo liberal? Os fatos históricos e também o embasamento teórico estão do lado dos liberais. Por que fugir do rótulo?

Sim, os rótulos podem ser simplistas e gerar confusão. Mas não acredito que a saída para os liberais seja recusar tal denominação. Fazer isso é fazer o jogo da esquerda, aceitar que o monopólio da virtude está do lado de lá. Não está! E, por isso mesmo, faz-se necessário debater com foco nos argumentos, defendendo sem medo as posturas liberais. A timidez no debate, com os liberais sequer assumindo abertamente aquilo que pregam, representa um tiro no pé do liberalismo como opção de modelo ao país.

E que fique claro o ponto já levantado por Roberto Campos: o liberalismo nunca nos deu o ar de sua graça. Se o Brasil é um país com muita miséria e desigualdade social, isto não é culpa do liberalismo, pois este jamais existiu por aqui. O Brasil é um país patrimonialista e clientelista, que nos últimos 20 anos experimentou uma social-democracia com governo inchado, e que antes, nos tempos da ditadura, tampouco teve algo que se assemelhasse ao liberalismo, mesmo restrito à economia.

Dirigismo estatal não combina com livre mercado. Concentração de poder no estado também não é uma bandeira liberal. Portanto, os males que assolam nosso país não foram plantados por políticas liberais ou neoliberais, ao contrário do que reza a lenda esquerdista. O Brasil está na rabeira dos rankings que medem o grau de liberdade econômica dos países. O liberalismo simplesmente nunca foi testado na terra brasilis.

Infelizmente, nenhum partido organizado ostenta a cartilha liberal. A maior evidência disso foi o PFL, que ao menos carregava liberal no nome, alterar sua sigla para DEM, de democratas. Isso explica, em parte, a apatia da oposição durante o governo do PT. Os tucanos e democratas não sabem fazer oposição contra um governo que, em linhas gerais, utiliza o mesmo ideário social-democrata, com forte crença na capacidade do governo como locomotiva do progresso. Falta-lhes a convicção necessária para oferecer, de fato, um modelo alternativo, ou seja, o liberalismo.

Meu livro tenta justamente estimular este debate, mostrando porque os liberais merecem uma oportunidade política para posicionar o país em uma trajetória diferente, com mais liberdade econômica e individual. Os artigos aqui presentes falam de diversos temas distintos, mas invariavelmente retornam a este ponto central: a defesa da liberdade individual. E nada representa ameaça maior a esta liberdade do que um governo inchado, obeso, que concentra poder demais.

Cotas raciais, empréstimos subsidiados, privilégios, política inflacionária, corrupção fora de controle, leis arbitrárias, impunidade, burocracia asfixiante, tudo isso tem ligação, em última instância, com o modelo de sociedade que temos no Brasil, e que passa longe do liberalismo aqui defendido. Os principais pilares deste modelo liberal seriam o estado democrático de direito, o império das leis, igualmente válidas para todos, e uma economia de mercado, com preços livres, propriedade privada protegida e limitada intervenção estatal, mesmo que por meio de regulamentações.

O Brasil está muito longe deste modelo. É meu objetivo contribuir para que isto possa ser mudado. O quanto antes, pois custa muito caro, tanto em termos materiais quanto de liberdade individual e até vidas, insistir no erro do coletivismo estatizante atual. Vamos dar ao liberalismo uma chance!

A Era da Esperança

O GLOBO • Janeiro, 2009

"Não há erro pior na liderança pública do que

alimentar falsas esperanças que logo serão frustradas."

Winston Churchill

A euforia que tomou conta do mundo durante a posse de Obama foi um espetáculo preocupante. O bordão a esperança venceu o medo resume a retórica do momento, abraçada por milhões de pessoas apavoradas com a crise econômica. Elas depositam toda a sua esperança no presidente, visto como um messias salvador. O governo passou a ser o Deus moderno.

Talvez ciente do alerta feito por Churchill, o discurso de Obama foi mais sóbrio que o esperado, pregando uma nova era de responsabilidade. O curioso é que Obama defende as políticas expansionistas do governo como solução para a crise. O governo americano já possui uma enorme dívida e um déficit fiscal crescente. Soa no mínimo estranho o presidente que defende pacotes bilionários falar em responsabilidade. Sêneca disse: Longo é o caminho ensinado pela teoria; curto e eficaz é o do exemplo. Se Obama leva a sério seu recado, poderia começar com mais responsabilidade fiscal no próprio governo.

Os pilares ideológicos dos pais fundadores estão cada vez mais abandonados. O próprio culto à Presidência demonstra como o país se afastou dos valores de seus fundadores, que enxergavam com enorme desconfiança o governo. A República americana acabou se transformando em uma espécie de ditadura da maioria, onde as liberdades individuais ficam totalmente ameaçadas. O estado, como já havia previsto Bastiat, virou a ficção através da qual todo mundo se esforça para viver à custa de todo mundo.

No seu livro sobre as multidões, Gustave Le Bon afirma que as massas não estão preparadas para admitir que algo possa ficar entre seu desejo e a realização deste desejo. Para ele, o indivíduo sob a psicologia das massas é um bárbaro, isto é, uma criatura agindo por instinto. Nelson Rodrigues resumiu: a unanimidade é burra. O filósofo Ortega y Gasset descreveu o homem massa como uma típica criança mimada que quer impor seus desejos. São como boias à deriva, dispostos a depositar poder em quem promete atender a tais anseios imediatos.

A esperança não venceu o medo: ela foi criada por ele. Os americanos preferiram sonhar a enfrentar a dura realidade. Esperam do governo milagres. Repetem que Obama vai resolver a crise. Obama é o super-homem! Esquecem que a economia anda bem quando a mão invisível pode funcionar sem tantas amarras. O dirigismo estatal é o caminho da ineficiência e da servidão. A história está repleta de exemplos para ilustrar isso. Nenhum ser humano seria capaz de absorver o conhecimento pulverizado na população toda. Obama e seus aliados são apenas seres humanos. Não são oniscientes, tampouco santos dispostos a sacrificar seus interesses particulares em prol do bem-comum.

Mas as multidões não querem saber disso. Elas estão com medo, e precisam abraçar cegamente a esperança de que Obama irá solucionar todos os problemas. Vivemos na era da esperança, e como disse Baltazar Gracian, a esperança é a grande falsária da verdade.

Lições da Grande Depressão

RATIO PRO LIBERTAS • Fevereiro, 2009

"Aqueles que não conseguem se lembrar

do passado estão condenados a repeti-lo."

George Santayna

Smoot-Hawley Tariff Act. National Credit Corporation. Reconstruction Finance Corporation. Farm Credit Act. Banking Act. National Industry Recovery Act. Farm Mortgage Refinancing Act. Export-Import Bank. Home Owners Loan Act. Securities and Exchange Act. Communications Act. National Housing Act. Emergency Relief Appropriation Act. Works Progress Administration. Rural Electrification Administration. Wagner Act. Fair Labor Standards Act. Social Security Act. Revenue Act. Essas são apenas algumas medidas adotadas por Roosevelt (à exceção das duas primeiras, de Hoover) durante a Grande Depressão. O New Deal foi um programa de enorme hiperatividade e crescimento do papel do governo na economia. O resultado, ao contrário do que muitos acreditam, foi péssimo.

O livro The forgotten man, de Amity Shlaes, relata com detalhes a história dessa complicada fase americana. Durante uma nova crise de proporções assustadoras, resgatar na história os erros do passado pode servir para evitá-los no presente. A arrogância dos políticos em Washington, confiantes de que poderiam resolver a crise com canetadas e aumento de gastos públicos, ajudou muito a postergar a recuperação da economia. Havia uma sensação bastante disseminada de que somente enormes intervenções estatais poderiam reanimar a economia. No mundo, a Itália de Mussolini e a União Soviética de Stalin conquistavam muitos adeptos do dirigismo estatal, intelectuais e economistas que acreditavam no planejamento central do governo como locomotiva do desenvolvimento. Eles estavam errados, naturalmente.

A retórica de Roosevelt era bastante populista, e seus constantes ataques aos negócios privados geraram um clima de insegurança generalizada. As medidas do New Deal dificultaram a vida das empresas ainda mais do que a crise já fazia. Os impostos aumentaram, o império da lei foi trocado pela arbitrariedade do governo, e as greves e salários maiores, resultados do Wagner Act, aumentaram os custos em uma época quando era fundamental reduzi-los para a sobrevivência. O governo de Roosevelt sistematizou as políticas de grupos de interesse, e a menor minoria de todas – o indivíduo – era o homem esquecido que pagaria a conta. Roosevelt focava apenas naquilo que se vê, ignorando tudo aquilo que não se vê, para usar os termos de Bastiat. Os defensores do New Deal, muitos deles simpatizantes do modelo soviético, criaram um clima de hostilidade aos empresários, assim como um ambiente de polarização no país. Os duros ataques aos ricos – lembrando que FDR era um homem rico – serviam para alimentar a revolta dos pobres, mas não para reduzir a pobreza.

O protecionismo comercial, sempre tentador para políticos em épocas de crise, jogou a economia americana em uma depressão ainda maior. Hoover assinou o Smoot-Hawley Tariff Act, mesmo com mais de mil economistas escrevendo uma carta aberta na qual tal medida era duramente condenada. A medida se mostrou catastrófica, e retaliações ocorreram no mundo todo. As importações americanas caíram mais de 40%. Atualmente, o presidente Obama parece condenar verbalmente a cláusula protecionista do seu pacote multibilionário, mas se não vetar de fato esta medida, poderá estar dando o mesmo tiro no pé que Hoover deu no passado. Fechar-se em um momento de crise apenas agrava a crise.

Outra característica muito presente nos discursos de Roosevelt foi a busca por bodes expiatórios. A depressão, segundo Roosevelt, era o resultado da falta de honra da elite, e a ganância nacional era a causa moral dos problemas. Mirar em inimigos de classe como alvos tornou-se uma marca registrada de Roosevelt. Era chegada a hora de os ricos dividirem seus recursos com a sociedade. A atenção deixava de ser o crescimento econômico para todos, e passava a ser a distribuição do bolo existente, ou declinante. Não por acaso os líderes soviéticos foram um dos grupos mais entusiasmados com a vitória de Roosevelt sobre Hoover. O presidente, em sua cadeira de rodas, era visto como o grande salvador da pátria, o homem que iria assumir o controle da economia e fazê-la retomar sua trajetória de crescimento da década de 1920. O sonho não iria se realizar.

O começo do governo Roosevelt ficou conhecido como os cem dias, um período frenético de medidas estatais experimentais. Em um ano, algo como 10 mil páginas de leis foram criadas, quase quatro vezes a quantidade que constituía o estatuto federal até então. O governo jogou no lixo o padrão-ouro, e confiscou todo o metal em posse dos cidadãos, tornando ilegal comprar ou exportar ouro. Roosevelt declarou um feriado bancário para resgatar a confiança no setor, mas isso não adiantou. O que importava era passar a imagem de que o governo estava agindo, estava preparado para mudar as coisas. O primeiro grande projeto foi o National Industry Recovery Act, com a premissa de que os gastos do governo iriam criar empregos e consertar a economia. O que veio em seguida, a criação do National Recovery Administration, faria os projetos anteriores parecerem pequenos. O NRA, com seu emblema da águia azul, representou o passo mais ousado dos Estados Unidos rumo ao socialismo. O governo iria decidir preços, controlar a produção das empresas e fazendas, enfim, em termos econômicos, os americanos estavam se aproximando da realidade nazista da Alemanha e comunista da União Soviética. O senador Thomas Gore, do Partido Democrata, chegou a questionar, de forma sarcástica, as medidas do governo: Isso não é socialismo?

O maior empecilho para tais planos eram as instituições mais sólidas nos Estados Unidos, como a Corte Suprema, que declarou vários casos inconstitucionais. Os pequenos empresários eram os que mais sofriam com o excesso de regulação do governo. O NRA representava, como aponta Shlaes, a institucionalização dos cartéis. Foi em 1935 que o famoso jogo Monopólio foi criado. Ciente dos entraves por intermédio dos juízes guardiões da Constituição, Roosevelt defendeu com vontade a meta de aumentar o número de juízes, para poder indicar gente sua. Felizmente, para os americanos, essa ideia não foi adiante, sendo barrada no Congresso.

A máquina de gastos públicos estava ligada a todo vapor, mas a economia se negava a melhorar. Os gastos federais em 1935 eram o dobro do patamar de 1930. Mas quase 12 milhões de americanos estavam sem emprego ainda. A centralização era outro ponto grave: pela primeira vez nos Estados Unidos em tempo de paz, o gasto federal ultrapassava o de todos os estados e localidades. A República americana, que preservara até então as liberdades individuais, dava lugar à Democracia de massas, uma espécie de ditadura da maioria com o poder concentrado no Executivo. Roosevelt iria ignorar os alertas dos pais fundadores e concorrer a um terceiro mandato. O estrago de Roosevelt às liberdades iria alcançar até mesmo o seu próprio conceito: liberal passava a significar, para os americanos, o defensor de mais governo, e não de um governo bastante limitado, como o liberalismo sempre pregou.

No entanto, nada disso parecia melhorar a vida dos americanos, especialmente os mais pobres, os homens esquecidos. A renda per capita americana, segundo a The Economist, estava no mesmo patamar da inglesa no fim da década de 1930, sendo que havia sido um terço superior no começo da década. O índice de ações Dow Jones só iria retornar ao patamar de 1929 no fim de 1954, quase uma década após a morte de Roosevelt. Em 1937, ocorreu outra depressão dentro da Grande Depressão, e o índice chegou a cair mais de 40%. O desemprego em 1938 ainda estava acima de 17%. De qualquer ângulo observado, o New Deal fracassou. Em vez de recuperar a economia, ele criou mais barreiras aos negócios, gerou mais incertezas e afastou investimentos produtivos, postergando a recuperação.

Diante desses fatos, e lembrando que a história muitas vezes rima, parece impossível evitar calafrios com os acontecimentos atuais. Novamente, o governo tem sido visto como a grande salvação para os males do mundo, e Obama é o novo profeta que vai gastar de forma alucinada para reativar a economia. O governo vai usar sua mão benevolente para ajudar os que precisam. Mas ignora-se que para ele dar alguma coisa, antes precisa tirar, ou então hipotecar o futuro das próximas gerações. Se com uma mão ele oferece ajuda, com a outra ele tira mais recursos do bolso de cada um. A mesma retórica populista tem sido usada, o mesmo ataque à ganância, a busca por bodes expiatórios do setor privado. A iniciativa privada vai sendo tolhida pela crescente intervenção estatal. As lições da história são ignoradas. O preço poderá ser alto demais. Sabemos quem vai ter que pagar a conta: os homens esquecidos.

A Origem do FED

BANCO DE IDEIAS, IL • Março, 2009

A maioria das pessoas assume como certa a necessidade de existência de um banco central. Poucos questionam sobre as suas origens. O economista Murray Rothbard foi uma rara exceção. Em The case against the FED, ele conclui que o Banco Central americano deveria ser extinto. Em sua opinião, a própria criação do Federal Reserve foi o resultado de um poderoso cartel de bancos tentando se proteger de saques e objetivando manter a capacidade de expandir indefinidamente o crédito. Da simbiose entre governo e grandes banqueiros, nasceria o poderoso instrumento de gerar inflação e redistribuir renda.

O aumento nos preços dos bens é uma consequência da inflação, pois a maior oferta de moeda leva a uma queda relativa no seu valor. O público não tem o poder de criar mais moeda. Somente o governo, por meio do Banco Central, tem este poder. Qualquer um que imprimir papel-moeda em casa é acusado do crime grave de falsificação. Todos entendem que isto, se feito em grande escala, faria com que os demais sofressem perda no valor de suas rendas. Além disso, não é difícil perceber que o falsificador transfere riqueza dos outros para ele mesmo, pois quando os efeitos da maior oferta de dinheiro forem sentidos, ele já se apropriou dos bens comprados.

A mesma lógica se aplica quando é o governo que cria mais moeda do nada. O resultado final é a transferência de riqueza para os primeiros beneficiados com os gastos financiados com o novo papel. Logo, se a inflação crônica é causada pela contínua criação de mais moeda, e se apenas o Banco Central tem o poder para emitir moeda, quem é o responsável pela inflação? No entanto, todos aceitam sem muita reflexão que o Banco Central é o vigia que vai proteger a poupança de todos contra os males inflacionários. Para Rothbard, isso é análogo ao ladrão que começa a gritar Pega, ladrão! e corre apontando o dedo para os outros.

Na verdade, o governo não é o único agente capaz de criar inflação. Os bancos podem obter o mesmo resultado com o crédito. Os bancos desfrutam do poder de multiplicação monetária por meio do crédito sem lastro em reservas. Os bancos assumem o compromisso de pagar seus depósitos imediatamente, mas não são capazes de honrar este compromisso com todos os depositantes. Isso seria ilegal com todos os outros bens, menos com o dinheiro. E quanto mais os bancos emprestam em cima de seus depósitos, maior o risco de uma repentina perda de confiança e uma corrida bancária. Por isso, há o interesse em formar um cartel de bancos.

Juntando a fome do governo por recursos com a vontade de comer dos bancos, a criação de um banco central é o próximo passo natural. Para o governo, o banco central representa uma boa solução para financiar seus gastos e déficits por meio do imposto inflacionário, e para os bancos ele serve para remover os limites da expansão de crédito. A história mostra que a origem dos principais bancos centrais realmente esteve ligada a estes interesses. O Bank of England, por exemplo, foi criado para ajudar a financiar o grande déficit do governo com as guerras. Nos Estados Unidos, os defensores de um banco central sempre foram os herdeiros intelectuais de Hamilton, os mesmos que defendiam tarifas protecionistas e subsídios do governo para indústrias nacionais. Tinha que haver uma forma de financiar isso tudo.

O pânico de 1907 finalmente forneceu o pretexto conveniente para os defensores de um banco central. O que Rothbard mostra é que os grandes banqueiros, como Morgan e Rockfeller, estavam por trás desta demanda pela criação de um banco central. A crença de que os próprios banqueiros desejavam um regulador para limitar sua liberdade por puro altruísmo parece bastante ingênua. Em 1913, os banqueiros e intervencionistas venceram a disputa e o Federal Reserve System foi criado, com o monopólio da emissão de moeda e a função de emprestador de última instância. Desde então, os Estados Unidos experimentaram períodos mais intensos de inflação, e depressões mais profundas do que antes.

A crise atual nada mais é do que uma consequência desse modelo. Alan Greenspan acabou se tornando um dos principais responsáveis pela inundação de liquidez que permitiu o surgimento da bolha que agora estourou. E atualmente, Ben Bernanke assumiu o controle do poderoso templo, disposto a esticar ainda mais os limites do FED para salvar os bancos insolventes. Ele conta com o entusiasmado apoio de intervencionistas como Paul Krugman, e claro, dos próprios banqueiros. Que poupador pode se sentir protegido com um vigia desses?

A Crise Vista por um Prisma Liberal

VOTO • Abril, 2009

Virou lugar-comum culpar o livre mercado pela atual crise que assola o mundo. Em todo lugar, escuta-se que a ausência de regulação e a ganância dos capitalistas estão na raiz dos problemas. Pretendo mostrar, a seguir, uma análise diferente das causas desta crise financeira. Meu objetivo será demonstrar que as impressões digitais do governo norte-americano estão em todas as cenas do crime.

Em primeiro lugar, os Estados Unidos não experimentam mercados verdadeiramente livres há quase um século. O governo intervém ativamente usando tanto a política fiscal como a monetária, além de inúmeras regras regulatórias. Um dos principais preços de mercado é justamente a taxa de juros, e ela vem sendo sistematicamente manipulada pelo governo, por intermédio do Banco Central.

A emissão de papel-moeda e as operações no open market são instrumentos à disposição do Banco Central para a criação de mais oferta monetária. Historicamente, todo governo abusou deste mecanismo, usando a inflação para financiar seus gastos. O resultado é o estímulo de mais crédito na economia, com taxas de juros artificialmente mais baixas. Investimentos que não seriam realizados em uma economia realmente livre acabam se tornando atraentes, e muitos recursos são desviados para destinos indesejados.

Esses excessos estimulados pelo governo necessitam de um tempo para ajuste, sempre doloroso. Uma analogia com um bêbado pode ilustrar melhor a situação: após o consumo excessivo de álcool, uma ressaca se faz necessária para o organismo limpar as impurezas acumuladas. No entanto, o Banco Central norte-americano atua como alguém que oferece novas rodadas grátis de bebida, postergando a ressaca, mas também aumentando os riscos. Se muita liquidez for injetada para evitar frequentemente a ressaca, o resultado pode até ser uma cirrose.

O Banco Central atua como emprestador de última instância, o que é análogo a uma rede de segurança para trapezistas. Sabendo-se a priori que essa rede de segurança estará lá para proteger no caso de uma queda eventual, os trapezistas naturalmente irão ousar mais nas manobras. É o que os economistas chamam de moral hazard.

A bolha da Internet estourou em 2000, uma fase de ajustes dolorosos era necessária, mas o governo considera tais ajustes sempre impopulares. As intervenções, como a manutenção da taxa de juros em 1% ao ano por longo período, aliviaram as sequelas da crise, mas ajudaram a criar uma nova bolha ainda maior. Não deixa de ser curioso o fato de que era Alan Greenspan o mentor desta política, já que ele foi um ferrenho defensor do padrão-ouro no passado, objetivando justamente proteger a economia de políticas inflacionárias como esta. Durante sua gestão no comando do FED – Federal Reserve –, o mercado financeiro criou a expressão Greenspan Put, exatamente para se referir a esta rede de segurança garantida pelo Banco Central no caso de alguma catástrofe.

Mas a intervenção do governo não se restringiu à área monetária. O setor imobiliário sempre foi foco de muita atenção por parte dos políticos, pois a demanda pela casa própria costuma ser uma prioridade para muitos cidadãos. Em 1977, foi criado o Community Reinvestment Act (CRA), com o objetivo de obrigar bancos a emprestar uma parte dos seus ativos às comunidades carentes.

Em 1994, o governo estendeu as metas do CRA e, em 2005, após um escândalo contábil envolvendo a Freddie Mac, resolveu punir a empresa demandando mais crédito hipotecário para as classes de baixa renda. Em outras palavras, o governo exerceu enorme pressão para que o crédito imobiliário chegasse às classes mais baixas, com menor condição de pagamento. Foi justamente este setor subprime do crédito imobiliário que experimentou o maior crescimento nos últimos anos, caracterizando uma verdadeira bolha, que depois estourou.

Muito se fala sobre ausência de regulação como causa da crise também, mas alguns dados colocam essa análise em xeque. Os setores no epicentro da crise atual não eram os menos regulados, mas, sim, segmentos bastante controlados, como os de seguro, bancos e financiamento imobiliário. A Fannie Mae e a Freddie Mac contavam com um órgão regulador especial, a OFHEO, cuja missão era cuidar da saúde financeira dessas empresas. Isso não impediu que o grau de alavancagem delas chegasse a 50 vezes seu capital.

Já o setor de hedge funds, normalmente alvo preferido como bode expiatório, perdeu com a crise, mas não tanto quanto esses outros setores mais regulados. A acusação de que o mercado norte-americano não tem regulação é simplesmente falsa. Existem diversos órgãos reguladores, como a própria Securities and Exchange Commission (SEC) e o FED, os quais controlam os mercados minuciosamente. Os reguladores podem até ser acusados de negligência, mas não faz sentido falar em ausência de regulação.

Como espero ter deixado mais claro neste resumo, as intervenções do governo

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