Agora que enlouqueci
Posso negar meu amor por ti
Posso ridiculamente gargalhar
Dizer que ninguém deve amar
Agora que perdi a razão
Digo que é besteira falar em paixão
Que eu não sinto mais emoção
Que é tolo quem acredita no coração
Agora que perdi minha serenidade
Acredito que não existe felicidade
Que no amor só existe maldade
Idiota quem fala em fidelidade
Agora que não sei quem sou eu
Vejo que minha alma pereceu
Minha mente adoeceu
Que meu sonho junto com você morreu.
Agora que tornei-me insano
Devo me afastar da mulher que amo
Encarar um novo caminho e partir
Tentar com todas as forças sorrir
Agora que parte de mim é loucura
Vou para longe desta tortura
Em busca de uma cura
Alguém que por mim, tenha ternura.
Agora irei ao encontro de um novo amor
Alguém que me dê o devido valor
Que escute o que eu tenho a falar
Alguém que queira me amar.
20230605
POEMA 26-Louco eu?
20220925
Carlos Drummond De Andrade, A Bunda, que Engraçada
"A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.
Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora – murmura a bunda – esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.
A bunda são duas luas gêmeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.
A bunda se diverte
por conta própria. E ama.
Na cama agita-se. Montanhas
avolumam-se, descem. Ondas batendo
numa praia infinita.
Lá vai sorrindo a bunda. Vai feliz
na carícia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.
A bunda é a bunda,
rebunda.
A bunda, que engraçada."
20220321
Mulher, de Ary dos Santos
mulher-loiça, mulher-cama
ela é também mulher-asa,
mulher-força, mulher-chama
E é preciso dizer
dessa antiga condição
a mulher soube trazer
a cabeça e o coração
Trouxe a fábrica ao seu lar
e ordenado à cozinha
e impôs a trabalhar
a razão que sempre tinha
Trabalho não só de parto
mas também de construção
para um filho crescer farto
para um filho crescer são
A posse vai-se acabar
no tempo da liberdade
o que importa é saber estar
juntos em pé de igualdade
Desde que as coisas se tornem
naquilo que a gente quer
é igual dizer meu homem
ou dizer minha mulher»
20210321
20210308
Escrito por Martha Rivera-Garrido
“Não te apaixones por uma mulher que lê, por uma mulher que tem sentimentos, por uma mulher que escreve…
Não te apaixones por uma mulher culta, maga, delirante, louca.
Não te apaixones por uma mulher que pensa, que sabe o que sabe e também sabe voar, uma mulher confiante em si mesma.
Não te apaixones por uma mulher que ri ou chora quando faz amor, que sabe transformar a carne em espírito; e muito menos te apaixones por uma mulher que ama poesia (estas são as mais perigosas), ou que fica meia hora contemplando uma pintura e não é capaz de viver sem música.
Não te apaixones por uma mulher que está interessada em política, que é rebelde e sente um enorme horror pelas injustiças. Não te apaixones por uma mulher que não gosta de assistir televisão. Nem por uma mulher que é bonita, mas, que não se importa com as características de seu rosto e de seu corpo.
Não te apaixones por uma mulher intensa, brincalhona, lúcida e irreverente. Não queiras te apaixonar por uma mulher assim. Porque quando te apaixonares por uma mulher como esta, se ela vai ficar contigo ou não, se ela te ama ou não, de uma mulher assim, jamais conseguirás ficar livre…”
20200430
POEMA Vinho
Deixa minha língua navegar
no complexo vinho da tua saliva.
Deixa-me tornar embriaguez
o que seria apenas beijo.
Deixa que eu toque
com as franjas do meu corpo
a tua alma profunda
(segregada e manifesta em teus humores).
Deixa que eu a perceba
como a uma sereia de certezas
(içada de um imenso mar de dúvidas).
Luís Bogo
http://lopesca.blogspot.pt/2005/11/poema-vinho-de-lus-bogo.html
20190321
DEIXEM-ME SER ASSIM
Cigarra de asas loucas pelo monte
Ribeiro de Vastíssimo caudal
Ou musgo adormecido ao pé da fonte.
Cantiga que ecoa pelo Vale
Sol morno a mergulhar no horizonte
Pintura de Miró ou de Bual
Ou lenda do passado que a avó conte.
Deixem-me ser nenúfar por abrir
Olor de rosa e nardos a florir
Criança com sapatos de mulher
E flauta de pastor ao Sol poente
E grito de luar Sereno e quente
Deixem-me ser aquilo que eu quiser!
Zabul Moita
20170321
POEMA O Ponto
Mínimo sou,
Mas quando ao Nada empresto
A minha elementar realidade,
O Nada é só o resto.
- Reinaldo Ferreira
Dia da poesia
POST Antigo
http://lopesca.blogspot.pt/
20170127
POEMA Pablo Neruda Fome
Tenho Fome da Tua Boca
Tenho fome da tua boca, da tua voz, do teu cabelo,e ando pelas ruas sem comer, calado,
não me sustenta o pão, a aurora me desconcerta,
busco no dia o som líquido dos teus pés.
Estou faminto do teu riso saltitante,
das tuas mãos cor de furioso celeiro,
tenho fome da pálida pedra das tuas unhas,
quero comer a tua pele como uma intacta amêndoa.
Quero comer o raio queimado na tua formosura,
o nariz soberano do rosto altivo,
quero comer a sombra fugaz das tuas pestanas
e faminto venho e vou farejando o crepúsculo
à tua procura, procurando o teu coração ardente
como um puma na solidão de Quitratue.
Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor"
20161224
POEMA Natal de quem?
Tratam do bacalhau,
Do peru, das rabanadas.
- Não esqueças o colorau,
O azeite e o bolo-rei!
– Está bem, eu sei!
– E as garrafas de vinho?
– Já vão a caminho!
– Oh mãe, estou pr'a ver
Que prendas vou ter.
Que prendas terei?
– Não sei, não sei…
Num qualquer lado,
Esquecido, abandonado,
O Deus-Menino
Murmura baixinho:
– Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?
Senta-se a família
À volta da mesa.
Não há sinal da cruz,
Nem oração ou reza.
Tilintam copos e talheres.
Crianças, homens e mulheres
Em eufórico ambiente.
Lá fora tão frio,
Cá dentro tão quente!
Algures esquecido,
Ouve-se Jesus dorido:
– Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?
Rasgam-se embrulhos,
Admiram-se as prendas,
Aumentam os barulhos
Com mais oferendas.
Amontoam-se sacos e papeis
Sem regras nem leis.
E Cristo Menino
A fazer beicinho:
– Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?
O sono está a chegar.
Tantos restos por mesa e chão!
Cada um vai transportar
Bem-estar no coração.
A noite vai terminar
E o Menino, quase a chorar:
– Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?
Foi a festa do Meu Natal
E, do princípio ao fim,
Quem se lembrou de Mim?
Não tive tecto nem afecto!
Em tudo, tudo, eu medito
E pergunto no fechar da luz:
– Foi este o Natal de Jesus?!!!
(João Coelho dos Santos in Lágrima do Mar - 1996)
L: Assim é o meu Natal :)
20160701
Florbela Espanca: Ser poeta
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e cetim…
É condensar o mundo num só grito!
E é amar-te, assim, perdidamente…
É seres alma e sangue e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!
Florbela Espanca, «Charneca em Flor», in «Poesia Completa»
20160321
Dia Mundial da Poesia
Mínimo sou,
Mas quando ao Nada empresto
A minha elementar realidade,
O Nada é só o resto.
Reinaldo Ferreira
Dia Mundial da Poesia
https://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_Mundial_da_Poesia
Poemas
http://lopesca.blogspot.pt/search/label/Poema
20150918
Bocage Amor
Ofensa que se eleva a grau supremo;
Paixão requer paixão; fervor e extremo
Com extremo e fervor se recompensa.
Bocage
Sonetos
250 anos do nascimento de Bocage
20150917
Bocage Ambição
Com essas coisas vãs que o mundo adora
Este (oh, cega ambição!) mil vezes chora
Porque não acha bem que o satisfaça.
Bocage
20150916
Bocage 250 anos do seu nascimento
A índole errante?
Quem é muito amado
Não é muito amante.
20150321
2015-03-21 Dia Mundial da Poesia
Nós temos cinco sentidos:
são dois pares e meio de asas.
- Como quereis o equilíbrio?
David Mourão-Ferreira
20130321
POESIA Amar
Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
Poema de Florbela Espanca
20110620
POESIA Se, depois de eu morrer...
Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples.
Tem só duas datas --- a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra todos os dias são meus.
Sou fácil de definir.
Vi como um danado.
Amei as coisas sem sentimentalidade nenhuma.
Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.
Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.
Compreendi que as coisas são reais e todas diferentes umas das outras;
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.
Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.
Fechei os olhos e dormi.
Além disso fui o único poeta da Natureza.
Alberto Caeiro
(Fernando Pessoa)
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20110619
POESIA Mar Português
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, in Mensagem
IN / Imagem
20110618
POESIA O amor é uma companhia
O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.
Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.
Alberto Caeiro
(Fernando Pessoa)
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