quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Unidade na Diversidade


ENTREVISTA c/ ARMANDO

1º. ASKARJ: Armando, fale-nos sobre o que motivou sua candidatura e o que nós Produtores Agroflorestais/Seringueiros podemos esperar de sua parte caso seja eleito?

ARMANDO KAXINAWÁ: Na verdade eu fui convocado por lideranças indígenas para assumir essa missão de concorrer no pleito de 2010. A motivação veio em saber que fui escolhido entre o meu próprio povo – de forma democrática e concorrendo com outros jovens Huni Kui em igualdade de condições.

Todos os povos indígenas do nosso Acre, como também os caboclos, ribeirinhos, seringueiros, pescadores, caçadores e demais trabalhadores livres do nosso Estado – podem contar com a minha fidelidade plena e adesão incondicional à causa do homem da floresta.

2ª ASKARJ: Saberia dizer quantos candidatos indígenas estão concorrendo às eleições no Acre?

ARMANDO KAXINAWÁ: Sinceramente não pude pesquisar com rigor, mas confirmados somos dois: - eu e mais um. Se os povos indígenas realmente quiserem consolidar sua representação política, podem eleger os dois candidatos tranquilamente.

Soubemos de casos de alguns candidatos “nawás” que recentemente foram visitar as aldeias negando nossa candidatura e oferecendo apoio material aos nossos parentes, mas nós acreditamos na honra e lealdade do povo, que não vende a própria consciência.

3º. ASKARJ: Todos sabem que nasceu e foi criado às margens do Rio Purus, passou a maior parte da vida na floresta como um índio de Aldeia. Como pode estar preparado para assumir uma cadeira na Assembléia Legislativa do Estado?

ARMANDO KAXINAWÁ: Certo de que estou muito bem preparado, me atrevo a dizer que sou um dos candidatos com melhor perfil parlamentar – conheço a vida na cidade e na floresta, sou professor bilíngüe e a minha vivência com o povo é real e objetiva. Conheço muito bem o contexto político-social dos povos da floresta – não como mero expectador, mas como protagonista de uma história de resistência cultural.

O fato de ser criado na aldeia me preservou de muitos vícios, me fez compreender as relações humanas noutra perspectiva, sedimentando na estrutura do meu ser o conjunto de valores morais que nos é transmitido pela sabedoria ancestral.

4º. ASKARJ: O que a candidata à Presidência da República, MARINA SILVA, representa para Armando Kaxinawá?

ARMANDO KAXINAWÁ: Marina é a figura mais notável no cenário político brasileiro, uma mulher de expressões fortes – inteligente, intrépida, idealista. A candidatura de Marina tornou-se um movimento popular (ao contrario das outras que não passam de conchavos políticos e pirotecnia de marketing). No movimento Marina Silva, encontramos a seiva do patriotismo: daquele amor pela terra, trabalho e tradições ensinado pelos nossos maiores.

5º. ASKARJ: Nas aldeias e colônias do interior corre informações de que a CASA do ÍNDIO, em Rio Branco, está passando por sérias dificuldades e muitos reclamam da morosidade e baixa qualidade no atendimento aos indígenas. O que pensa em fazer para reverter essa situação?

ARMANDO KAXINAWÁ: Confesso que não conheço todos os problemas estruturais, mas sei que falta vontade política para resolver as dificuldades maiores. A CASA do ÍNDIO pode e deve ser completamente reestruturada, melhores acomodações, transporte e logística. Fazem-se necessárias novas contratações de técnicos e enfermeiros, ampliação do quadro de médicos e especialidades. Eleito, serei o mais aguerrido defensor dos direitos indígenas assegurados em lei, seremos os anunciadores de um novo tempo!

6º. ASKARJ: Em sua opinião, quais são as maiores dificuldades enfrentadas pelos nossos parentes nas aldeias do Acre?

ARMANDO KAXINAWÁ: No momento, penso que a maior dificuldade é de interlocução com o Governo, pois não há um representante legítimo dos povos da floresta na composição política de governo. Somos nós que sabemos quem somos e o que queremos, mas eles ainda acreditam que “os índios” devem estar sob a tutela do Estado, que os sociólogos, antropólogos e assistentes sociais são os sabem o que é melhor para todos nós. Por essas e por outras é que precisamos eleger nossos deputados.

7º. ASKARJ: Por que adotou como seu slogan de campanha a frase: “Unidade na Diversidade”?

ARMANDO KAXINAWÁ: Essa pergunta foi realmente muito oportuna, pois é de fundamental importância que todos saibam que a candidatura de um indígena não limita as ações parlamentares apenas ao âmbito das aldeias. Nossa candidatura, embora priorize os interesses e necessidades dos povos indígenas, não exclui os não-índios, muito pelo contrario!

A unidade na diversidade é realmente a proposta de uma democracia orgânica onde se permita a expansão harmônica da singularidade humana. Estamos irmanados com os ribeirinhos, caboclos e seringueiros na luta por melhores condições de vida para nossas famílias.

8º. ASKARJ: Pelas aldeias corre os rumores que Armando Kaxinawá (Isaká) é o principal representante da juventude indígena do Acre. Como pensa em trabalhar por essa juventude e quais seus projetos prioritários?

ARMANDO KAXINAWÁ: Sinto-me honrado em receber essa missão – missão árdua e desafiadora de representar politicamente a juventude da floresta. Nosso trabalho na Assembléia Legislativa será calcado na garantia dos direitos constitucionais e na ampla divulgação da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

Nos diversos projetos que temos no prelo, penso que o mais animador (a menina dos meus olhos) é a CASA do ESTUDANTE, onde implantaremos uma grande comunidade de acolhida e suporte de jovens dos ramais, colônias e aldeias, que precisam permanecer em Rio Branco enquanto concluem cursos técnico/profissionalizante e faculdade.

ASKARJ: Considerações finais:

ARMANDO KAXINAWÁ: Agradeço demais aos editores desse blog pela oportunidade de falar aos seus leitores e amigos. Aos que interessar em nos ajudar, procurem levar nosso nome como uma bandeira de luta a todas as comunidades, sindicatos, igrejas, associações e rede social.

Forte e fraterno abraço do Armando Kaxinawá!

quarta-feira, 2 de junho de 2010

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Mae Inini

Courtesy TerritorioScuola

Roteiro de Viagem

Foto de Satélite de Jordão - AC

Roteiro Kaxinawá Jordão.

02 a 16 Junho - 15 dias e 14 noites.

Dia 02/06

Chegada em Brasilia – Voo para Rio Branco
Reunião na casa dos povos da floresta
Noite em Rio Branco

Dia 03/06

Voo para Jordão – avião bandeirante
Transfer para aldeia São Joaquim
Dança da Jibóia
1º Ritual
Noite em São Joaquim

Dia 04/06

Caminhada no Parque de plantas medicinais com Pajé Muru – conversa com Pajé
Tecelagem com as mulheres
Apresentação de filmes Kaxinawá
Noite em São Joaquim

Dia 05/06

Transfer para Astro Luminoso

Ritual
Noite em Astro Luminoso

Dia 06/06

Pintura indígena no corpo.
Noite em Astro Luminoso

Dia 07/06

Transfer para Boa Vista
noite em Boa Vista

Dia 08/06

Caminhada na Floresta – visita ao parque de ervas
Ritual

Noite em Boa Vista

Dia 09/06

Transfer para Belo Monte
Almoço em Novo Natal

Chegada em Belo Monte – apresentação de danças
Noite em Belo Monte

Dia 10/06

Transfer para Novo Segredo
Almoço Pão de Luz

jogo futebol crianças

Chegada fim da tarde – Novo Segredo.
Ritual
Noite em Novo Segredo

Dia 11/06

Dia em Novo Segredo

Café da manhã c/ tecelagem e canto

Visita ao parque
Banho de Lama - Manhã

Banho de ervas medicinais - Noite

Noite em Novo Segredo

Dia 12/06

Inicio do retorno
Parada para dormir em Novo Natal

Tecelagem
Noite em Novo Natal

Dia 13/06

Transfer para Aldeia Nova Cachoeira.
Caminhada ao Parque.
Ritual
Noite em Nova Cachoeira.

Dia 14/06

Retorno para São Joaquim
Ritual de encerramento com Pajé Muru
Noite m São Joaquim

Dia 15/06

Transfer para Jordão
Voo para Rio Branco
Noite em Rio Branco

Dia 16/06
Voo para Brasília
retorno para Europa

***

Jordão na Rota Turística do Acre

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Fogo sagrado

“Ti buna wanãn wen! Nukun ti xunirã txakabukiran, nukawaxun, ti buna wanã wen. Muxu kiri ti buna wanãxã wen. Ti xunirã nuku tunãkikirã, ti xunirã txakanukirã. Muxu kiri, xaba kiranaya, dacibi kuyuash naxi kuyu ibu nãkã wen nun ti buna wanun nã!
Xukitê buna wanã wen nun ti buna wai kanõ nã!...Xukitê itxapabu buna wakã wen nun xuki kanõ nã... Iuinaka dutuxõ, nanu kawen, iuinaka daci dutuxõ, nanu kawen!... Iuinaka uwapa itxawakawen!...
Buronãbu itxakawen, tipash bu itxawakawen, baku mixtinbu itxawakawen nõ buyushi kanõ nã... Xunu buma bi kawen, itxapabõ kunã wakã wen, rabu baku mixtibu txawi kanõ nã! Munutanã ia iui bukawen! Nun ti buna wanõ nã... Nukun ti xunirã txakabukirã, nun ti buna wamarã, nuku dutukin, kuyukikirã - Nun ti buna warã, nuku dutua maimish kirã!
Nukun xunipabu ia iuia, in ninkabã ibã ininkirã... Nukun xunipaburã rawen txãish tin buna wabã ibã ininkirã! Nukun xunipaburã mawa õ nãnupabu, nukun xunipaburã pashka, nuku pashtin bã inibuki! Rateri hunu murã bunubõ , rateri mawanõbõ, rateri nai murã bunubõ... Nukurã nun baku mishti õ nã ishmapaki... Rabi nukun nabu ubishitaniburã õ nã nupabukirã!
Nun muxukiri ti buna wai kanõ... Xaba kiranaya dacibi naxikuyui bukawen. Ti xunirã nukawaki, kuyuibukawen! Bari kuya nun ti kutin wai kanõ... Muxu kiri baku mishtinbu ratu xuta dash kibukawen, rabu xuta huxupu bunubõ, nun kuya nishpu pimanun buna... Kuuwatã, dumõwatã, paburuwatã, nukun nabu hiwe butxa ratu iui tãkawen, rabu muxu kiri yuinaka pi bunõbunã, nukun ti buna watãnã, nu rãtxai kanõnã...
Nukun ti buna watãnã, umã txani nõ bukawen... Umã txani, kuyutãnã, titin nõ bukawen... Tirintãnã, tirin, kuyutã, katxa wa nõ bukawen nun nawanõnã!
Nukun nabu xunipabu ia iuicin nibuki, rabin nukurã bake mishtin nun un nãishmapaki... Rabãu nuku iumuwanirã, mawa pupabuki, dubunibuki. Rabin nukurã dubukiriã, mishtin, õnãyamash ikai... Rabõ nukun xanen iburã mawa õnãnupabu dubunibuki! Nukun uparã, ratõ nukun xunipabu ratu iumuwanirã, mawa õnãkaya mawaniki... Nun iumuirã, paxukiria iumuniki!... ”.

Tradução do texto:

Vamos fazer fogo novo! Nosso fogo velho está ruim, apaguem ele. Façamos fogo novo! Amanhã vamos fazer fogo novo... A gente já pode matar o fogo velho, é ruim o fogo velho. Amanhã a claridade está chegando, vamos todinhos sem falta nos banhar, vamos, para fazer nosso fogo novo.
Novos acendedores vamos fazer para irmos fazer o novo fogo. Façam novos acendedores para nós lidar com eles... Matem caça, botem para assar no moquém, matem muitas caças e botem para moquinhar! Ajuntem caça grande...
Ajuntem-se, rapazes, e ajuntem-se, moças, ajuntem-se, crianças, para nós irmos brincar... Vão tirar as sapopemas das samaúmas e façam muitos banquinhos para as crianças poderem se sentar. Depois que vocês acabarem, venham me dizer para nós fazermos o fogo novo. Nosso fogo velho ficou ruim, se não fizermos o fogo novo isso vai nos matar, acaba com a gente – mas se fazemos fogo novo, não nos mata não.
Nossos velhos me disseram sempre, eu ouvia. Antes todos os dias se fazia fogo novo. Nossos velhos mais inteligentes, nossos velhos se espalharam, largaram a gente, foram embora. Uns foram para o alto dos rios, uns morreram, uns foram para dentro do céu... Nós, meninos pequenos, não somos assim inteligentes como nossa gente que se espalhou. Vamos fazer fogo novo amanhã então... A claridade está chegando, quando amanhecer vão todos se banhar... Apaguem os fogos velhos! Acabem! Quando o sol estiver alto nós vamos acender o fogo. Amanhã os dentes daquelas crianças vamos arear, para eles virem com os dentes brancos bonitos para com o sol alto a gente fazer nixpu.
Furamos os beiços, furamos as ventas, furamos as orelhas, vão dizer para as pessoas das outras casas virem para comer caça com a gente, fizemos fogo novo para nós irmos conversar... Fizemos nosso fogo novo, vamos festejar batizado. Festejamos o batizado, acabamos, vamos bailar! Bailamos, bailamos, acabamos, precisamos fazer caiçuma para nós dançar.
O pessoal antigo, nossa gente velha, me ensinou, porém nós crianças não somos inteligentes o bastante. Aqueles que nos criaram eram muito bons, mas acabaram. Nós que viemos por derradeiro, crianças, não entendemos o bastante. Aqueles nossos tuxauas muito inteligentes acabaram-se. Nossos pais, aqueles que nossos velhos criaram, muito inteligentes e direitos, morreram. Nós, nos criamos, os restos do galho...

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Os pajés-cantores da floresta

Cerimônias de Pajelança do Povo Hunikuin do Estado do Acre vêm sendo apresentadas como celebrações da cultura ameríndia da floresta amazônica em diversas partes do mundo nos últimos anos: França, Holanda, Espanha e Suécia já receberam pajés dedicados à valorização e preservação dessa etnia. Foram eles os mesmos “kaxinawás” (nome que a sociedade brasileira dá ao povo hunikuin) que serviram de matéria para a primeira obra da etnografia nacional, no Rio de Janeiro da Belle Époque, por mãos do sábio cearense Capistrano de Abreu, cem anos atrás. A luta política pelos direitos da terra, tanto no Purus como no Tarayá-Jordão, expressou-se a partir de 1988 quando da Aliança dos Povos da Floresta, assinada em Rio Branco, Acre, como de relevância internacional, o que deu à nação hunikuin oportunidade de qualificações em educação indígena diferenciada, técnica agroflorestal e enfermagem a benefício do conjunto da vida comunitária. O mesmo quanto ao estudo dos saberes de suas tradições, através do engajamento contínuo de jovens pajés, como exemplo do orgulho e zelo dos “kaxinawás” por suas etnociências. Por meio da evocação dos seres de força da floresta, a comunhão do nixipae-ayahuasca está no âmago da sua atividade espiritual ampliando a consciência étnica e ambiental desse povo original do grande tronco linguístico chamado “Pano”, nas fronteiras da Amazônia peruana e brasileira.



Em visita a Belo Horizonte, a convite da universidade federal, uma comitiva hunikuin apresentou-se no Centro Yachak, dirigido por Ricardo Villanueva, onde conheceram um cacique pataxó de Coroa Vermelha, Bahia, que fez o convite da visita dos pajés hunikuins. A apresentação da Pajelança da Floresta no Parque Nacional de Monte Pascoal, durante celebrações da Entrada da Primavera de 2010, será marco também do lançamento da ABRASET – Associação Brasileira de Etnoturismo.

Viagem de Preparação



Guardiães da ciência hunikuin

O liderança Zé Banê, José Floriano Sales
Aldeia Novo Cachoeira
Terra Indígena Baixo Rio Jordão
Maio de 2010, Acre