5/30/2005
Há uns meses, saudei aqui um artigo de opinião do actual ministro das Finanças, Luís Campos e Cunha, que escreveu no ano passado no Público, em que defendia a aplicação de um imposto de meio cêntimo por metro quadrado no solo, no sentido de potenciar o seu uso.
Ora, hoje vi a repetição de uma entrevista que concedeu na RTP-2 - julgo que no Programa «Diga Lá, Sua Excelência» em que o agora ministro, quando questionado, disse que essa ideia não estava no programa do Governo. Mas acrescentou que «academicamente é uma boa ideia», acompnhando isto com um sorriso. Esse sorriso traiu-o, porque demonstrou que as ideias de quem está fora do Governo são meros delírios académicos, mesmo quando são boas ideias. E que, quando se chega à «real politik», são logo relegadas para um envergonhado canto da memória. Desceu, portanto, na minha consideração...
Em virtude de, desde há alguns meses, quase não sair de Lisboa, não tenho tido oportunidade de avaliar «in loco» se este ano existe qualquer melhoria relevante no estado de limpeza e gestão das nossas florestas. Por isso, deixo aqui um convite a todos os que queiram aqui deixar alguns comentários sobre se julgam existir melhorias significativas ao nível da gestão e prevenção contra os fogos florestais.
E já agora coloco, aqui ao lado, uma sondagem - com possibilidade de resposta regional.
5/28/2005
O presidente da autarquia do Porto, Rui Rio, pode até ter toda a razão do Mundo em relação à polémica do túnel da Avenida de Ceuta naquela cidade. Mas perdeu-a toda ao violar o embargo decretado pelo IPPAR (vd. aqui)., argumentando razões de segurança e atacando a ministra da Cultura. Com que cara irá agora a Câmara do Porto embargar obras ilegais de empresas privadas? E que fará se estas desrespeitarem a ordem de embargo, alegando «razões de segurança»?
5/27/2005
Eu sei que isto faz parte daqueles pequenos defeitos humanos, mas não resisto a compartilhar a minha alegria em ver o Estrago da Nação em 88º lugar no Sitemeter, com uma média de 151 visitas diárias - o melhor resultado absoluto e relativo desde a sua criação em Janeiro de 2004. Como estas «peneiras» são fruto de uma tão «modesta» posição, certamente este meu pequeno pacadilho de soberba será também «modesto»; e portanto perdoável...
5/26/2005
Eis o marketing do Governo ao seu melhor estilo. O uso dos números é sempre uma arte: a razão pela qual o défice anunciado é de 6,83% e não de 6,8% não é um preciosismo. De modo a justificar as medidas draconianas, ao ouvido, «seis ponto oitenta e três» parece muito maior do que «seis ponto oito». Muito maior do que apenas 0,03 pontos percentuais... Já foi uma sorte não termos ouvido que era de «seis ponto oitocentos e trinta e um». Isso sim, seria um trinta e um: com um valor tão alto seria a depressão, a recessão.
Já saudei aqui a iniciativa do Governo em retirar o parecer vinculativo das autarquias à nomeação dos directores das áreas protegidas como paradigma de uma correcção de bom senso a uma anterior má decisão.
Saúdo, por isso, também a intenção do secretário de Estado do Ambiente, Humberto Rosa, em reforçar a participação pública nas avaliações de impacte ambiental (vd. aqui artigo no Jornal de Notícias). Já agora, que tal, repor a realização das audiências públicas que, de repente (e por óbvias motivações políticas) cessaram no início de 2001 por iniciativa do então Minsitério tutelado pelo actual primeiro-ministro José Sócrates? E já agora dar alguma dignidade à sensibilização ambiental por iniciativa do Estado. Se a acção do Instituto de Promoção Ambiental já era, há uns anos, fraquíssima, então desde que foi fundido no Instituto do Ambiente simplesmente eclispou-se. .
5/25/2005
A pretexto de um comentário do autor do Geoplantas ao meu post anterior (À Margem Ambiental LXIX) sobre a questão da contabilização das áreas ardidas, julgo que são pertinentes, embora seja necessário recentrar a discussão.
«Trabalhar» com números permite sempre dar azo a manipulações ou enganos. Mesmo tendo havido nos últimos anos uma melhoria na cartografia das áreas queimadas - fruto do trabalho da equipa do professor Cardoso Pereira do Instituto Superior de Agronomia -, mesmo assim houve tentativas de «aldrabar» números, como aconteceu em 2003 durante o «Verão quente» ou ainda no ano passado com a «inflação» do números de incêndios a determinada altura (que foi depois justificada por uma duplicaçao de registos em Braga e Porto). Os valores dos anos 70 e 80 também deverão pecar por algum defeito, embora tal não significa que houve efectivamente um agravamento da área ardida nas últimas décadas.
Em relação ao somatório da área ardida, claro que também concordo que não o melhor indicador. Mas é um indicador! Grosso modo, a área ardida de povoamentos florestais constitui cerca de 50% da área ardida (em 2003 foi superior), mas quando se está a tentar «medir» a eficiência do combate aos incêndios julgo que será mais correcto apresentar os valores globais. Se quisermos avaliar os prejuízos económicos será mais adequado analisar apenas os povoamentos florestais (e discriminá-los por tipo de povoamento); se avaliarmos os prejuízos ambientais, então será porventura adequado incluir alguns das áreas de matos, ponderada a sua localização e desenvolvimento (o que se torna um trabalho mais complexo).
Por fim, concordo também que o número de incêndios tem uma importância relativa. Em Portugal não existe uma correlação «positiva» entre incêndios e área ardida. Aliás, esta é «negativa», porquanto os distritos com mais incêndios têm menor área ardida - Porto e Braga - e ao invés, os que têm menor número de incêndios - regra geral, distritos mais desertificados -, a área ardida é maior. Esta situação radica em aspectos demográficos e sociais que julgo ter já abordado aqui e que desenvolvo no livro «O Estrago da Nação» (e muitos outras pessoas, mais especialistas do que eu, o têm salientado). No entanto, em todo o caso, o número de ignições em Portugal, independentemente dos seus efeitos continua a ser absurdamente elevado.
Novo inquérito em curso, desta vez para que façam «palpites» sobre a área que irá arder este ano, tendo em conta as actuais circunstâncias e o passado. Em baixo coloco um gráfico com a evolução da área ardida desde 1974 até 2004 (os valores estão em hectares; 2003 por ter sido um ano «quente», a barra foi encurtada para não «minimizar» os outros valores).
Entretanto, podem continuar a votar ainda no caso Portucale (finalmente, já houve um voto que atribui à génese da «coisa» uma cabala...).
Dou por terminado o inquérito sobre a forma como deveria ser discutida a introdução ou não das culturas transgénicas em Portugal. Como se sabe esta questão está actualmente suspensa, mas longe de ser encerrada.
Embora o inquérito mostre que 70% das respostas se oponham a este tipo de cultivo, sei bem que não é representativa da generalidade dos portugueses. Certamente que, na população portuguesa, haverá mais do que os 18% (os valores obtidos neste inquérito) sem qualquer opinião ou sem interesse nesta questão. Mas também gostaria que, independentemente da posição, houvesse mais do que 37% a considerar que seria adequado fazer-se um referendo sobre esta matéria. Até porque este é um assunto que não deve ser decidido conjunturalmente por um Governo - ou por um tribunal -, pois os efeitos que terá a longo prazo poderão ser irreversíveis.
Resultados finais
Sou a favor, mas deveria haver um referendo | 5% | 2 | |
Sou contra, mas deveria haver um referendo | 25% | 11 | |
Não tenho opinião formada, mas deveria haver referendo | 7% | 3 | |
Sou a favor e julgo ser desnecessário referendo para decidir a aprovação | 7% | 3 | |
Sou contra e julgo ser desnecessário referendo para decidir uma proibição | 45% | 20 | |
Não tenho opinião, mas penso ser desncessário qualquer referendo | 2% | 1 | |
Simplesmente não tenho opinião formada | 0% | 0 | |
Transgénicos? Eu quero é que o Benfica (Porto, Sporting, etc...) seja campeão | 9% | 4 | |
44 votos totais |
5/24/2005
O Conselho de Ministro aprovou um diploma que retira o parecer vinculativo à nomeação dos directores das áreas protegidas. Peruntam-me se foi uma boa medida? Responderei com o seguinte: Será que a correcção de uma má medida (feita pelo Governo PSD/PP) é uma boa medida ou uma questão de bom senso?
Já agora, um aspecto que me estrá a preocupar bastante - e que também é referido numa notícia do Público - é a revisão do plano de ordenamento da albufeira de Alqueva. Tem me constado que existem muitos projectos turísticos para cortes de montado (mais de azinho do que sobro) que estão a aguardar esta revisão. Temo que se confirme a sina dos críticos do Alqueva: que esta barragem só serviu apenas para dinamizar a construção civil e regar campos de golfe.
Estava agora a pensar com os meus botões que, provavelmente, já seria tempo do Ministério do Ambiente anunciar algo de novo que possa vir a marcar as linhas de rumo da política de ambiente. Até agora, a menos que esteja muito distraído, somente vislumbrei «gestão da crise»...
E, além disso, de entre os desafios que em 11 de Março passado aqui coloquei, somente a alínea c) foi concretizada (via Ministério da Agricultura, diga-se...). E estes nem eram questões estruturantes, mas sim conjunturais, mas que seruviriam de exemplo.
Para recordar eram estes os meus desafios:
a) a revisão da decisão de construção da barragem do Sabor
b) a alteração do traçado da CRIL, de modo a preservar o Aqueduto das Francesas
c) a suspensão do despacho conjunto para o abate de 2600 sobreiros na herdade da Vargem Fresca, em Benavente
d) a aprovação do POOC do Sotavento algarvio, com a confirmação da demolição dos clandestinos
e) o avanço das acções de embargo e demolição das casas ilegais do Parque Natural da Arrábida e, neste âmbito, acatar a decisão judicial de demolir a casa do futuro secretário de Estado José Magalhães.
f) aprovação da Lei da Água
5/22/2005
5/21/2005
Existem «ideias peregrinas» que surgem, por vezes, apenas para mostrar que, perante a falência (ou simples ausência de aposta) de um modelo, se está aparentemente preocupado em mudar, mesmo nada mudando.
Hoje, no Expresso, surge uma proposta em transformar o Instituto de Conservação da Natureza (ICN) num «instituto empresarializado, como o das Estradas de Portugal, mas ajustado à realidade das áreas protegidas», como defende o seu presidente, João Menezes.
O problema do ICN é velho e estrutural. E nada tem a ver com modelos institucionais, mas somente com uma questão de aposta política na conservação da Natureza. As áreas protegidas não podem, nem devem ambicionar, uma gestão lucrativa directa, não podendo, por isso, ambicionar ser uma espécie de instituto de cariz lucrativo. O «lucro» - que implica despesa, ou seja, um maior investimento em conservação - da conservação das áreas protegidas advém de podermos legar nas gerações futuras esses pequenos pedaços de Portugal natural e, sobretudo, em garantirmos uma preservação de locais que, do ponto de vista turístico, podem trazer mais-valias indirectas. Enquanto tivermos um orçamento de 11 milhões de euros, que se esgota quase apenas em pagamentos de salários, não há modelo empresarial ou qualquer outro que salve esta situação. E criar assim um novo modelo é apenas gastar tempo e dinheiro, mostrando que se faz algo, sem nada fazer de concreto.
5/20/2005
Apelo aqui humildemente ao senhor Procurador-Geral da República: por favor coloque os telefones sob escuta dos eventuais envolvidos em supostas promessas de alterações da carta da Reserva Ecológica Nacional de Torres Novas para a construção do Boquilobo Golf Resort. (vd. notícia aqui, com os agradecimentos ao Ondas pela chamada de atenção).
5/19/2005
No Público Online está a decorrer um inquérito - por certo, à laia de rescaldo do caso Portucale - em que se coloca a questão: Qual deve ser a forma de financiamento partidário.
Como saberão, actualmente a lei proíbe financiamentos privados, permitindo apenas donativos pessoais (devidamente comprovados) e subvenções do Estado. Porém, sabemos também que os partidos políticos vivem bem acima das suas posses.
Ora, cada vez mais se verifica uma atitude de anti-partidarismo que resulta na defesa da tese «o dinheiro dos meus impostos é mal empregue para ser dado aos partidos políticos». Não surpreende, por isso, que o inquérito do Público Online apresente apenas 46% de respostas a defender que o financiamento dos partidos seja mantido como prevê a legislação.
Por mais vontade que se tenha em que o Estado não financie os partidos, penso que este será, nas actuais circunstâncias da nossa democracia, um mal menor. Enquanto não houver um sério sistema de controlo das contas dos partidos - e acabar, de vez, com a fantochada das análises que o Tribunal Constitucional faz, criticando os partidos e aplicando-lhes umas irrisórias multas - e continuar a opacidade dos financiamentos, mais vale manter-se a proibição de financiamentos directos das empresas. Portugal ainda não têm a maturidade democrática para para instituir os «lobbies» (que interferem activamente nas campanhas eleitorais e não só) e, provavelmente, no futuro nem isso será desejável, pois poderemos cair numa «americanização» do nosso sistema.
5/18/2005
Surgiu recentemente um curioso blog chamado Odivelas de Cimento, profusamente ilustrado e com umas curiosas adivinhas, cuja temática é óbvia pela sua denominação. Vale a pena dar uma espreitadela. É uma excelente iniciativa que deveria ser estendida a muitos outros concelhos.
Em jeito de balanço do caso Portucale que estoirou há uma semana, apraz-me fazer uns breves comentários:
a) O Governo deveria encontrar uma solução drástica para a Herdade da Vargem Fresca, agora que «todo o Mundo» ficou a saber a escandalosa forma como aqueles terrenos foram cair nas mãos do Grupo Espirito Santo. Por mim, o Estado deveria, tão só, expropriar aqueles terrenos (descontando a área do actual campo de golfe). O valor a pagar pelos terrenos deveria ser aquele que, actualizada a inflação, o Grupo Espirito Santo gastou por eles.
b) Ficou também patente que o Ministério Público desempenha um papel primordial na «moralização» e criminalização dos negócios obscuros do urbanismo. O caso da Vargem Fresca e muitos outros (por exemplo, só em Benavente existem outros dois processos escandalosos: Mata do Duque e Vila Nova de Santo Estevão) são denunciados pela imprensa há anos e anos. E isto não bastou para que se fizessem investigações aprofundadas. O urbanismo em Portugal é, hoje em dia, um dos negócios mais obscuros (e seguros) de enriquecer indevidamente.
c) É curioso ver (embora seja um bom sinal, ao fim e ao cabo) ver distintos «opinion-makers» a perorar sobre este escândalo da Portucale, quando, na verdade, infelizmente, pouco apoio foram dando para que os jornalistas que «dirigem» investiguem e tenham meios para investigar outros processos. E infelizmente, tirando honrosas excepções, as notícias sobre urbanismo e os negócios da construção civil ainda têm um reduzido peso e destaque nos órgãos de comunicação social portuguesa. Pode ser que, neste caso, este escândalo traga um efeito positivo.
d) Considero essencial que seja alterado o actual método para se fazerem declarações de utilidade pública em projectos ou considerá-los «estruturantes», de molde a fazê-los avançar em zonas interditas (REN, RAN, áreas protegidas, etc.). Esse «poder» discricionário não pode estar «entregue» a um ou dois ou três ministros, nem tão-pouco a um Governo. Por isso, defendo que essas declarações sejam sempre objecto de votação em sede de Assembleia da República. Se é certo que num Governo maioritário, como o actual, isso significava que em teoria a sua aprovação seria óbvia, na prática haveria uma enorme vantagem. Tornava o processo mais transparente e, se polémico, chegaria ao conhecimento imediato da opinião pública antes do facto consumado.
5/16/2005
A seca continua. Para mim, a culpa não é do Instituto da Água, nem das alterações climáticas, nem de nada que não seja de nós, como diria o Padre João Baptista da vila de Estremoz em 1757, cujo extracto do sermão de preces por chuva aqui reproduzo.
Tende entendido, meus irmãos carissimos, que está a vossa terra tão seca, porque também se acha como terra secca a vossa alma: Anima mea sicut terra sine aqua tibi. Está Deus seco para vós, porque vós estais secos para elle: Sicut terra sine qua tibi. E está a vossa alma seca, porque não tem oração, pois só na oração he que se recebe a agua do do Ceo; e absolutamente fallando, nenhuma agua vem do Ceo sem ser pedida, e por isso o Ceo vos regatea a agua, que desejais, porque vós regateais ao Ceo uma hora de oração. Pelo que se quereis agua do Ceo, vinde a orar: Petite & accipietis. Vinde a esta Igreja, frequentai este Oratorio, especialmente naquelas horas, que estãotão deputadas para o mesmo exercicio da Oração Mental, já que por falta della, como já disse, vos castiga o Senhor.
Entretanto, aqui estão os resultados do inquérito que coloquei sobre as responsabilidades da seca que Portugal está a atravessar, que obteve 91 respostas. Não deixa de ser curioso reparar numa «bondade» que resssalta das opiniões: 64% das respostas não responsabilizam nenhuma entidade em concreto (34% apontam as alterações climáticas; 18% o São Pedro e 12% o azar). Continuo com a minha opinião: a seca quando se verifica logo no primeiro ano de uma queda pluviométrica reduzida é sobretudo culpa da incorrecta gestão dos recursos hídricos. E, por outro lado, culpar as alterações climáticas não é motivo para desculpa: afinal se o aquecimento global vai implicar anos de menor precipitação, convém ir preparando a adaptações na forma como gerimos os nossos recursos hídricos.
Selection | ||
Governo do PSD/PP | 3% | 3 |
Governo do PS | 5% | 5 |
Instituto da Ãgua | 19% | 17 |
Instituto de Meteorologia | 9% | 8 |
Alterações climáticas | 34% | 31 |
Azar | 12% | 11 |
São Pedro | 18% | 16 |
91 votes total |
Penso que já referi aqui uma ou duas vezes que em 2001 fiz um levantamento exaustivo do universo das empresas com capitais municipais, onde detectei falcatruas diversas, empresas sem sentido, administradores a ganharem ordenados chorudos sem nada fazer, duplicação de (in)competências entre serviços autárquicos e as ditas empresas, objectos sociais obstusos, objectos sociais que fugiam à esfera municipal; enfim, trinta por um linha. Na génese destas empresas - um ovo de Colombo para os autarcas - estava a possibilidade de assim fugirem ao visto do Tribunal de Contas, encontrar «jobs para os boys» (sendo que, em alguns casos, os boys eram os próprios autarcas) e desviar o endividamento das autarquias. Na altura, o então Governo socialistas, prometeu alterar a lei - não o fez, nem os outros Governos.
Entretanto, o joio foi crescendo, aumentando. O Tribunal de Contas vem, de quando em vez, apresentar relatórios sobre algumas empresas, detectando situações de pôr os cabelos em pé. Na semana passada, uma associação destas empresas municipais, num encontro nacional, congratulou-se com o sucesso. Entretanto, anteontem no Público, surgia a Associação Nacional dos Municípios Portugueses a congratular-se com a «redução» do endividamento das autarquias, embora a empresa consultora tenha referido que não contabilizou (e desconhece) o endividamento das empresas muncipais (que era, em 2001, já bastante grande em muitas delas). E ficou-se também a saber, recentemente, que a Emarlis, em Lisboa - que ficou sem objecto social depois das suas competências terem «migrado» para a Simlis (uma empresa multimunicipal com capitais do Estado e das autarquias) - tem custos com remunerações ascendem a quase 300 mil euros por ano, cerca de 63 por cento dos quais se destinam aos três elementos do conselho de administração. E que a dita empresa, que nada faz, prevê ainda despender aproximadamente 18 mil euros com o aluguer de viaturas para os membros da administração.
Ainda tenho esperanças de um dia ter coragem para emigrar. Porque as esperanças disto endireitar já são poucas.
Já começo a estar habituado, sempre que critico os meios ambientalistas (ONG e partido políticos nesta área), de me cairem em cima e de me acusarem de ter segundas intenções. Sobre a minha crítica à actividade do MPT na Assembleia da Repúlica, colocado no Farpas Verdes CCXX, o deputado Pedro Quartin Graça colocou um comentário (que me parece incompleto...), o qual reproduzo mais abaixo, em letra pequena.
Gostaria de fazer uns esclarecimentos sobre o meu post original e uns comentários ao deputado do MPT. Primeiro, os esclarecimentos: esperaria, de facto, uma maior actividade dos deputados do MPT, sim. Por um lado, porque existe a «necessidade» de mostrarem que possuem independência face ao partido que os elegeu (PSD), e por outro, porque necessitam urgentemente de criarem um estatuto de «trabalhadores incansáveis». Mesmo que muitas das iniciativas do MPT forem inicialmente ignoradas pela imprensa, é importante que mostrem trabalho. Por exemplo, se actualmente estivesse no activo no jornalismo e estivesse a fazer um trabalho sobre a seca, os fogos florestais, o litortal, os montados, os projectos urbanísticos, por que carga de água haveria de questionar os deputados do MPT se, consultando o seu site, não visse sequer uma referência a estes temas?
Em relação à questão do «folclorismo» das propostas. Aquilo que disse foi que as duas únicas propostas dos dois deputados do MPT «estão a milhas, a anos-luz das prioridades da política ambiental - a segunda é, sim, uma questão de segurança rodoviária - e, pior do que isso, facilmente são rotuladas de 'ecologismo folclórico'». Não era minha intenção rotulá-las, mas pensando melhor, pelo menos as rotulo de pouco ambiciosas e desajustadas. Por um lado, porque não propor menus biológicos nas cantinas escolares, sabendo até que actualmente está em curso uma campanha contra a obesidade infantil e dos adolescentes? E, por outro, em relação à questão dos peregrinos de Fátima, pareceu-me uma «ideia peregrina» fazer uma proposta deste género na véspera da aparição de Nossa Senhora em Fátima; até porque, repito, o que está em causa é sobretudo uma questão de segurança rodoviária (e se o MPT quer alargar o seu âmbito, que o faça, mas de forma mais ambiciosa, pois, por exemplo, em relação ao novo código da estrada, os utilizadores de bicicleta foram bastante prejudicados, por perderem sempre a prioridade em relação aos veículos com motor).
Por fim, um comentário mais político, como cidadão, ao deputado Pedro Quartin Graça. Diz-me ele que «Gostaria de assinalar, em primeiro lugar que, não sendo evidentemente um "crime", (muito longe disso...), creio não o ter tido contudo a felicidade de contar consigo entre aqueles que "em mim" votaram nas últimas eleições legislativas». E eu confirmo que não votei, de facto.
Acrescenta, depois, no seu racicínio que «a ser verdade (...) ainda que não lhe diminua a capacidade de fazer comentários públicos acerca da actuação de qualquer deputado, lhe retira contudo a legitimidade política de, enquanto eleitor (...), poder exigir responsabilidades em sede de promessas eleitorais a esse mesmo deputado no que diz respeito à sua actuação no Parlamento.». Ora, o deputado Pedro Quartin Graça, porventura, se esquece ser um deputado da Nação e, portanto, na minha opinião, qualquer cidadão pode pedir-lhe contas. Mas mesmo que assim não fosse, o deputado esquece-se de um lapidar pormenor: haverá sempre novas eleições e, por certo, os eleitores que não votaram neles podem sempre querer saber o que andaram eles a fazer. E eles devem mostrar o que fazem, nem que seja para «seduzir» os eleitores que neles não votaram antes. Por isso, o deputado Pedro Quartin Graça, das duas uma: ou não perecebe isso ou então não está a pensar que o MPT venha a poder eleger deputados nas próximas eleições.
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Comentário textual do deputado Pedro Quartin Graça
Meu Caro Pedro Almeida Vieira,
Creio que não nos conhecemos pessoalmente. Este facto não me impede de assinalar os valiosos contributos que V. tem dado, através dos seus escritos e intervenções, entre outras actividades, à "causa ambiental" em Portugal.
O mesmo tenho tentado fazer, dentro das minhas actividades políticas e profissionais correntes, nos últimos 25 anos.
Isto a propósito do seu comentário acerca daquilo que os deputados do MPT-Partido da Terra andam ou não andam a fazer no Parlamento, que, com o título "Farpas Verdes CCXX", foi inserido no seu blog pessoal, o qual acompanho com interesse.
Gostaria de assinalar, em primeiro lugar que, não sendo evidentemente um "crime", (muito longe disso...), creio não o ter tido contudo a felicidade de contar consigo entre aqueles que "em mim" votaram nas últimas eleições legislativas. O que, a ser verdade (e corrija-me se me enganei...) ainda que não lhe diminua a capacidade de fazer comentários públicos acerca da actuação de qualquer deputado, lhe retira contudo a legitimidade política de, enquanto eleitor (que não o foi), poder exigir responsabilidades em sede de promessas eleitorais a esse mesmo deputado no que diz respeito à sua actuação no Parlamento.
Nomeadamente, como é o caso presente,quando a ideia que resulta para os leitores do seu comentário é a de que os deputados do MPT andam no Parlamento "a dormir", sem nada fazerem. O que, digo-lhe é manifestamente injusto, por não verdadeiro.
É verdade que, no seu escrito, aplaudiu as propostas que fizémos sobre a introdução, quer nos três refeitórios do Parlamento, quer na creche da A.R., de um “menu biológico”, bem assim como a relacionada com os peregrinos que caminham para Fátima e a rede nacional de percursos pedestres e cicláveis. Mas também é verdade que as rotulou como não sendo revestidas de credibilidade em sede ambiental.
Devo dizer que entendo que labora em dois equívocos: o primeiro relacionado com o facto de entender que o MPT "apenas" está condenado a intervir em matérias estritamente ambientais, se é que estas matérias existem, o que eu duvido - É com hoje, tudo é AMBIENTE - ; o segundo
porque "exige" hoje aos deputados do MPT coisas que, semanas atrás, dizia ser vedado aos deputados do MPT sobre elas se pronunciarem, por terem "vendido a alma ao diabo".
Recordo o que escreveu em 30 de Dezembro de 2004: (...)«Por outro lado, a alegada independência dos futuros deputados do MPT é uma falácia completa. Na verdade, na prática eles terão que votar sempre em linha com o PSD, excepto em matérias de consciência; de resto, mesmo que estejamos perante questões políticas de índole ambiental em que o PSD mostre uma atitude contrária ao pensamento do MPT, os seus deputados terão de estar em sintonia, a menos que aleguem «objecção de consciência». Ora, um partido que se norteia pela consciência, não tem estrutura. Em suma, não existe.»
Posso-lhe garantir que se enganou rotundamente: não vendemos ne» (sic; NB: provavelmente o restante comentário não terá surgido por razões técnicas, ou seja, por ter sido ultrapassado o espaço permitido pelo HaloScan)
Pedro Quartin Graça | 05.13.05 - 3:15 pm
5/15/2005
Continuam a ser reveladas as negociatas «cozinhadas» pela dupla Nobre Guedes-Telmo Correia. Depois de Benavente e da Autodril, surge hoje no Diário de Notícias outra aprovação de um emprendimento turístico em área de Reserva Ecológica Nacional do concelho de Belmonte por «utilidade pública» que beneficia políticos do PSD.
Em 16 de Julho de 2004, escrevia nas Farpas Verdes XCIX, o seguinte:
A nomeação de Luís Nobre Guedes para o cargo de Ministro do Ambiente nem no dia 1 de Abril seria motivo para ser anunciada. É o grau zero da política de ambiente. Estamos no meio de um lamaçal, de areias movediças negras que nos levam bem fundo e sem esperanças de nos reerguermos. É altura de ir à luta...
Afinal, o que nos aconteceu foi uma noite de 31 de Outubro: o Dia das Bruxas.
Por sua vez, Ribeiro e Castro diz, a este respeito, que «Quem não deve não teme e nós não temos medo. Não há nada que nos inquiete». Pois, até aí já nós vimos!
5/13/2005
Quase dois meses depois da entrada em funcionamento do novo Parlamento, lembrei-me que - pode ser distracção minha -, os deputados do Movimento Partido da Terra não deramainda sinais de vida. «Culpando», eventualmente, a comunicação social por não estar atenta à intensa actividade do MPT - até porque em comunicado este partido prometia em 28 de Fevereiro que com eles «a Ecologia Política não será a mesma» -, fui então ao seu site ver o que andam fazendo.
Pois bem, os dois deputados do MPT já fizeram muito trabalho. Anteontem anunciaram que vão «entregar ao Conselho Administrativo da Assembleia da República uma proposta tendente à introdução, quer nos três refeitórios do Parlamento, quer na creche da A.R., de um “menu biológico”». E ontem «preocupados com a segurança e a paz de espírito dos peregrinos que caminham para Fátima», propuseram «que esta localidade seja uma das primeiras de Portugal a ser abrangida por uma rede nacional de percursos pedestres e cicláveis».
Até concordo que estas duas propostas são de cariz ambiental, mas estão a milhas, a anos-luz das prioridades da política ambiental - a segunda é, sim, uma questão de segurança rodoviária - e, pior do que isso, facilmente são rotuladas de «ecologismo folclórico».
Se o MPT quer fazer este género de propostas deveria previamente trabalhar para ter um estatuto de credibilidade em assuntos prementes da política ambiental. Senão torna-se uma espécie de Partido Ecologista Os Verdes. Até agora nada se vê na sua sua intervenção em assuntos prementes, como seja a seca, a prevenção dos fogos florestais, o urbanismo, o ordenamento do litoral, etc., etc., etc..
5/12/2005
O caso da Herdade da Vargem Fresca está longe de ser um caso isolado no país e, sobretudo, em Benavente. Este concelho é, aliás, um excelente repositório de trafulhices e esquemas para a implementação de projectos à margem da lei que devia seguir de estudo para alunos de direito e de urbanismo. A poucos quilómetros de distância da herdade da Portucale, cresceu um empreendimento denominado Mata do Duque que usou o famoso esquema das quintinhas - com a bênção e o beneplácito da autarquia de Benavente. Próximo, nasceu o empreendimento de Vila Nova de Santo Estevão, aprovado através de um diploma que estava revogado e que envolveu também cortes de sobreiros. Todos estes projectos fizeram correr muita tinta e apenas um processo judicial: por sinal, contra mim - que, como já disse anteriormente - foi arquivado pelo Ministério Público por claramente confirmar que todas as denúncias que fazia eram verdadeiras. Se o eram, pena tenho que os responsáveis não tenham sido investigadas.
Curiosamente, o motivo que me levou há anos - comecei no já longínquo ano de 1998 - a investigar estes projectos foi o de ter constatado um «estranho» fenémeno: Benavente, um concelho marcadamente rural, tinha registado um crescimento «anormal» dos valores de sisa entrados nos cofres da autarquia. Ou seja, significava grandes transacções de terrenos, prenúncio de grandes projectos imobiliários. Estas «coisas» são como uma doença: dão os primeiros sinais antes de se manifestarem em toda a sua destrutiva força.
Miguel Ramalho, na sua crónica no Expresso Online, relembra mais uma vez uma das mais estapafúrdias decisões do Governo PSD/PP: o de extinguir o Instituto Geológico e Mineiro e integrar as suas funções numa descabida Direcção-Geral de Geologia e Energia. E recorda isso a pretexto da utilização racional das águas subterrâneas. Seria tempo, de facto, do actual Governo corrigir este desvario...
Ao contrário do que vários «opinion-makers» têm sugerido - ainda ontem, Lobo Xavier na Quadratura do Círculo - o tráfico de influências, a «cunha» e outros expedientes mais ou menos legais mas sempre eticamente reprováveis não se devem essencialmente à burocracia e/ou ao peso excessivo do Estado na economia. Deve-se sim ao facto de possuirmos leis bastante bem fundamentadas, em geral, mas saber-se que, sempre com algum jeitinho, com algum amiguismo, com muitos ismos, se consegue fazer passar um projecto. E, aliás, para quem consegue estas proezas de ultrapassar as leis restritivas até convém, paradoxalmente, que estas existam. É que se eu conseguir algo que poucos ou nenhum conseguem mais valorizado se torna o meu «projecto». Afinal, no que diz respeito ao empreendimentos imobiliários, não se enriquece construindo onde legalmente se pode, mas sim construindo onde por lei não era suposto poder construir-se.
5/11/2005
Embora seja importante «diabolizar» a atitude dos Governo de 1995 do PSD e do Governo PSD-PP em relação à questão da Portucale, convém recordar que também um Governo do PS esteve em vias de concretizar um despacho semelhante em 1999. Por acaso, saiu uma notícia antes no Expresso, caso contrário acredito que seria, por certo, assinado. Deixo-a aqui em baixo para recordar o processo.
Golfe Verga Sobreiros
PEDRO ALMEIDA VIEIRA
in Expresso, 9 de Fevereiro de 1999
OS MINISTROS da Agricultura, Capoulas Santos, e da Economia, Pina Moura, já assinaram um despacho conjunto que poderá autorizar a Portucale, uma empresa do Grupo Espírito Santo, a cortar 2600 sobreiros para instalar dois campos de golfe nos arredores de Benavente. É o passo mais recente num processo de avanços e recuos, iniciado em 1995, de entidades governamentais; caso a ministra do Ambiente, Elisa Ferreira, também dê luz verde ao pedido da Portucale, aquelas árvores protegidas serão mesmo cortadas, sob a justificação de se tratar de um empreendimento de «imprescindível utilidade pública ou agrícola de relevante interesse nacional».
A Portucale, uma empresa que inicialmente foi criada para fins agro-turísticos, tem actualmente em execução, na herdade da Vargem Fresca - antiga propriedade da Companhia das Lezírias, com cerca de 500 hectares - um projecto imobiliário, em condomínio fechado, para a construção de 1354 fogos, um campo de tiro, um clube house, um clube hípico e dois campos de golfe.
Um longo ziguezagueEmbora com alvará de loteamento para o projecto, os campos de golfe, que já obtiveram financiamento comunitário de quase um milhão de contos, estão «embargados» desde finais de 1995 quando o então recém-nomeado ministro Gomes da Silva - que tinha então Capoulas Santos como seu secretário de Estado - proibiu explicitamente o corte de sobreiros na herdade. Na altura o governante tinha ficado chocado com o processo de autorização para o abate de quase quatro mil sobreiros decretado pelo ex-ministro social-democrata, Duarte Silva que, mesmo perante as sucessivas recusas da Direcção-Geral das Florestas, concedeu luz verde para o abate já quando o PSD tinha perdido as eleições legislativas. Esta revogação da autorização feita por Gomes da Silva não chegou, contudo, a tempo de evitar que cerca de 1700 sobreiros fossem cortados. A empresa haveria de recorrer desta decisão, mas o tribunal, em Março de 1996, daria razão ao ministro da Agricultura. Tendo considerado que essa decisão do Governo do PSD tinha sido «um acto anormal em democracia», Gomes da Silva procurou reformular a lei da protecção dos montados de sobro e azinho para que essas «autorizações políticas» fossem mais dificultadas.
Assim, em Janeiro de 1997 sairia um diploma legal mais exigente na protecção das azinheiras e sobreiros - define, por exemplo, os períodos e critérios técnicos das podas e do descortiçamento - que apenas permitia o corte de árvores doentes ou para desbaste de exploração. O próprio preâmbulo da lei relevava a importância dos montados de sobro em termos ambientais e económicos, salientando que a cortiça, após transformação, representa 3% das exportações nacionais. A única excepção à autorização de cortes seria dada apenas para empreendimentos de «imprescindível utilidade pública ou agrícolas de relevante interesse para a economia nacional», que passava a necessitar de três assinaturas de membros do Governo.
Quase em simultâneo com a demissão de Gomes da Silva, a Portucale viria, em finais de Setembro do ano passado, a remeter novo pedido de autorização para o corte de sobreiros, tendo mesmo aumentado o número inicialmente definido anos antes. É aquela solicitação que acaba de receber parecer favorável dos ministros da Agricultura e da Economia.
Contactado pelo EXPRESSO, Capoulas Santos não reconhece a existência do despacho e declara que «o pedido de declaração de utilidade pública se encontra em apreciação», tendo destacado a importância «dos 500 postos de trabalho que a sua execução implicará». Estes postos de trabalho são, no entanto, os previstos para a globalidade do empreendimento que não está dependente da construção dos campos de golfe, visto que o empreendimento, além da componente imobiliária, possuirá outros equipamentos de desporto e lazer já autorizados.
Nas mãos de Elisa Ferreira
O titular da pasta da Economia, Pina Moura, não fez qualquer comentário. A «moto-serra» está agora nas mãos de Elisa Ferreira, a quem o processo foi remetido para análise há mais de três semanas. Contactada pelo EXPRESSO, a ministra do Ambiente defendeu que a sua decisão apenas será tomada «após serem realizados mais contactos ao nível do Governo para analisar todo o processo». Contudo, Elisa Ferreira diz estar «consciente das implicações da sua decisão política, mas que esta terá de ser suportada por avaliações técnicas».
Com efeito, esta área embora considerada de uso turístico pelo plano director municipal de Benavente encontra-se também sujeita aos regimes da Reserva Ecológica Nacional, cuja carta ainda não está concluída, mas que salvaguarda esta zona por ser de máxima infiltração. Daí que não só estarão em causa os impactes ambientais do corte dos sobreiros, como também os efeitos do uso de adubos e pesticidas para os campos de golfe. A concretizar-se esta autorização por utilidade pública a uma empresa privada, abre-se também um precedente para o corte de mais montados de sobro e azinho em outros empreendimentos turísticos do país.
Telmo Correia, antigo ministro do Turismo, disse há pouco na TSF que assinou o despacho da Herdade da Vargem Fresca por um «critério político», de «boa-fé» e cumprindo a «legalidade».
Ora, o critério político é um saco muito grande que permite confessar implicitamente que não existe critério económico, nem social, nem ambiental por detrás. A boa-fé é um argumento irrelevante como justificação, porque estou ainda para ver um político a admitir que actou de má-fé. Quanto à legalidade, havemos de saber se «imprescindível utilidade pública» é compatível com a construção de um empreendimento que estaria vedado ao público por ser privado.
Independentemente das questões de tráfico de influências - e saber os benefícios desse tráfico (alguém julgará que não existem? que foi apenas pelos lindos olhos do Espírito Santo?) - julgo que há aqui matéria de ilegalidade. Os três antigos ministros cometeram uma ilegalidade no exercício das suas funções e deveriam, assim, ser também responsabilizados civil ou criminalmente por isso...
José Adelino Maltez, autor do blog Sobre o Tempo que Passa, relembra, de forma bem incisiva, as palavras do ex-ministro do Ambiente sobre os interesses que ele se aprestava para combater. Parece que Nobre Guedes decidiu antes entregar o ouro ao ladrão (ler aqui).
Já agora, falou-se na altura do despacho do anterior Governo em relação à Portucale, da existência de um parecer de Freitas do Amaral, como jurisconsulto. Nunca vi esse parecer nem citações dos pressupostos e conclusões do dito. Mas que convinha saber o seu teor - e mesmo a confirmação da sua existência -, ai isso convinha. Por uma questão de transparência...
Em 9 de Março, escrevi no Farpas Verdes CLXXXIII, o seguinte:
Este projecto da Portucale, do Grupo Espírito Santo, é um daqueles casos em que me envergonho de ser português. Já em 1995, a Portucale conseguira, também no fim do Governo de Cavaco Silva, permissão para abater sobreiros. Conseguiram abater uns quantos, mas o novo Governo de António Guterres viria a suspender o abate total. A Portucale não desistiu e quase conseguiu em 1998 obter uma declaração de imprescindível interesse público (houve um despacho que chegou a ter duas assinaturas de ministro, mas não avançou porque a então ministra do Ambiente, Elisa Ferreira se opôs). O projecto ficou, assim, em banho-maria até esta negociata final. Ou seja, 10 anos depois renasce um projecto vergonhoso, da mesma forma torpe. Sinceramente, custa-me a acreditar que não haja aqui «luvas» pelo meio...
Pois bem, finalmente, o Ministério Público decidiu agir perante um escândalo evidente, abalando a forma torpe, desavergonhada e inumiputável com que as negociatas do imobiliário se fazem em Portugal. A questão, contudo, é para mim apenas a ponta do icebergue e seria interessante que este caso se estendesse também aos responsáveis que nos serviços florestais foram coniventes com estas situações.
Ando há já um bom par de anos a apelar para que o Ministério Público tenha uma maior intervenção nos casos do imobiliário e de aprovações ao arrepio da lei e da justiça social. Espero bem que este caso não seja isolado e que mais intervenções sejam implementadas.
De qualquer modo, este processo tem, para mim, um gosto pessoal. Desde 1998, era eu o único arguido por causa de processos imobiliários em Benavente: fui processado por alegada difamação pelo presidente da autarquia por denunciar em artigos na GR e Expresso algumas negociatas da construçao civil naquele concelho, sobretudo na Herdade da Mata do Duque, em Vila Nova de Santo Estevão e também na Herdade da Vargem Fresca. No meu caso, o processo foi (obviamente) arquivado - confirmando assim que aquilo que escrevera era verdade; espero que este caso de Nobre Guedes, Abel Pinheiro e outros que mais (convém investigar as movimentações do Grupo Espirito Santo na Herdade da Comporta, junto ao Safo), não o seja.
5/08/2005
Os jornais gratuitos distribuídos em Lisboa sobretudo no metropolitano têm uma função bastante nobre: o de colocar muita gente que não lê a passar os olhos por um jornal. No entanto, essa nobre acção não pode/deve prescindir do desejado rigor, até para formar as pessoas. A imagem que aqui coloco foi retirada da edição de 4 de Maio último e faz uma síntese da situação de seca. Titula: «Caudais com menos água». A menos que signifique que os caudais têm, com a seca, menos água e mais poluentes, este é um título disparatado e desinformativo.
No entanto, este tipo de disparates são gerais na maior parte dos orgãos de comunicação social. Desde «os caudais das albufeiras» até «os caudais reduziram-se para a x metros por segundo», passando por «os caudais galgaram», já viu muito disparate deste género. E é pena, num país que está sempre com notícias sobre água: por causa das secas ou das cheias.
Na imprensa nacional, usa-se e abusa-se de sondagens por tudo e por nada. Como quase sempre dão «belas» primeiras páginas, aplica-se muitas coisas que não podem nem devem ser aplicadas sem uma correcta ponderação, sem uma correcta interpretação.
Vem isto a propósito do DN e da TSF terem noticiado ontem que «Manuel Maria Carrilho e Rui Rio partem como favoritos na corrida às presidências de câmaras das duas mais importantes cidades portuguesas», de acordo com o Barómetro feito pela Marktest. Diz também a notícia da TSF que «os inquiridos do Barómetro também não têm dúvidas sobre quem será o vencedor em Sintra, dando uma vitória a Fernando Seara no confronto com João Soares com mais 19 por cento a verem como provável este cenário».
Ora, olhando para a ficha técnica vê-se que a amostra do estudo é foi constituída por 807 entrevistas a indivíduos residentes em Portugal Continental, 420 das quais mulheres, efectuadas entre os dias 19 e 22 de Abril. A margem de erro é de 3,45%. Mas, destas apenas 161 entrevistas foram feitas na Grande Lisboa e 89 no Grande Porto. Nos concelhos de Lisboa, Porto e Sintra - alvo da sondagem - terão sido muitíssimo menos.
Portanto, tendo em conta que a avaliação dos diversos candidatos a eleições autárquicas são feitas pelos munícipes não faz qualquer sentido fazer uma sondagem a nível nacional. Quanto muito seria, sim, porventura interessante comparar as diferenças entre a percepção nacional e a local em relação aos diversos candidatos em causa, mas também aqui o número de respostas dos inquiridos nestes três concelhos deveria ser muito maior para ter significado estatístico. Por isso, esta é uma pseudo-sondagem e a margem de erro não é de 3,45%... é de 100%.
5/06/2005
Em relação à atribuição das Bandeiras Azuis às praias portuguesas, saliento o seguinte:
a) o aumento do número de galardões representa, em algumas regiões, uma melhoria evidente da situaçao comparativamente a anos anteriores (o caso mais evidente é o de Gaia, que há anos era uma desgraça). Em todo o caso, convém dizer que o aumento é artificial, porque muitas praias foram entretanto «desmembradas» (com denominações «sul» e «norte», por exemplo, em praias que são conhecidas como sendo apenas uma). Por exemplo, Gaia em 2001 tinha apenas oito zonas balneares e agora tem 13.
b) A ABAE tem sido, cada vez mais, benevolente com o rigor dos critérios, concedendo derrogações em análises menos favoráveis (a Quercus veio, mais uma vez, criticar com razão este facto). Isto tem, além do mais, um efeito contraproducente, pois o que geralmente acontece é haver necessidade de arrear a bandeira azul durante a época balnear, devido a resultados maus em termos de qualidade da água.
c) Continua, por outro lado, a ser inadmissível que a ABAE continue a atribuir bandeiras azuis às praias do Sotavento Algarvio. Há um critério imperativo que obriga que as praias tenham plano de ordenamento da orla costeira. Mas a interpretação da ABAE (falta de coragem?) é de que apenas estão sujeitas aos critérios aquelas praias que tenham POOC aprovado. Ora, isto não faz sentido, porque beneficia o infractor. Penso que é tão grave uma praia não cumprir um POOC do que a região não ter POOC (até porque sabemos são as autarquias daquela região que têm estado a engulhar a aprovação deste plano de ordenamento).
José Sá Fernandes anunciou ontem à tarde a sua candidatura como independente à Câmara Municipal de Lisboa. E eu, pela primeira vez, acedi a subscrever uma lista pública de apoio a uma candidatura política. Fiz, por várias razões:
a) Sá Fernandes corporiza o modelo de intervenção cívica que está muito longe de se restringir ao caso túnel do Marquês e mesmo à esfera territorial do concelho de Lisboa. Para quem sempre quis, nas suas acções, atalhar que os responsáveis políticos fizessem mal, acho bem que queira agora, em concreto, fazer bem.
b) O manifesto eleitoral de Sá Fernandes toca nos aspectos essenciais dos «cancros» da cidade de Lisboa: uma capital «rendida» aos interesses imobiliários, sem projectos estruturantes, que reduziu a sua população devido sobretudo à especulação imobiliária, que perdeu os laços de solidariedade, que se tornou uma cidade feia.
c) O circulo de apoios que, para já, Sá Fernandes congrega mostram bem a abrangência desta candidatura: desde Ribeiro Teles até António Barreto, passando por individualidades da cultura e da arquitectura e da ciência, com diversos quadrantes e sensibilidades políticas. Isso demonstra, mais que tudo, que esta candidatura poderá ser uma pedra de toque para o necessário passo em frente da democracia: ou seja, terminar com partidocracia do regime democrático português.
d) O meu apoio - humilde, tendo em conta o leque de individualidades que assinou o manifesto - deve-se também ao facto de, actualmente e desde há uns meses, não estar no activo em termos jornalísticos. Se assim não fosse, mesmo subscrevendo as alíneas anteriores, não poderia dar o meu apoio público.
5/04/2005
A pretexto de uma discussão na Ambio, escrevi um texto com uma rápida análise da situação do movimento ambientalista e dos seus dirigentes. Deixo-o aqui, como o escrevi (amanhã se vir erros, corrijo...).
Uma ONG tem, no seu âmago, um funcionamento muito semelhante a um partido político em relação aos objectivos das pessoas que a integram. Tal como nos partidos políticos existem pessoas com verdadeira vontade de serviço público e exercem-no sem pedir nada em troca, nas ONG também. Não vale a pena aqui discutir se a percentagem de pessoas (dirigentes e «bases» nas ONG que têm um objectivo somente nobre é superior ao do que se verifica nos partidos políticos. Mesmo que exista uma maior percentagem (pessoalmente penso que sim), é exactamente a dimensão das ONG que as torna apetecíveis aos ambiciosos.
Ou seja, é mais fácil singrar no movimento ambientalista do que num partido político; ter mesmo visibilidade pública. Falo por mim: tinha acabado a licenciatura em 1993 e era já dirigente nacional da Quercus (se me perguntarem se fiz um bom trabalho, responderei que sim; se me perguntarem se isso é sinal de maturidade minha ou imaturidade da ONG, porque não teve capacidades de atrair pessoas com mais experiência, escolherei de caras a segunda alternativa).
Ser dirigente de uma associação importante como a Quercus ou a LPN ou o GEOTA permite, de facto, subir um patamar de forma rápida. Depende depois de cada pessoa como faz a gestão desa subida. Não sou absolutamente nada contra antigos dirigentes de associações ocuparem cargos políticos ou de confiança política. A questão preocupante é saber se essas nomeações foram feitas pelas suas capacidades técnicas ou se pelos «fretes» que fizeram enquanto dirigentes. Isto é, a eventual mácula não advém da aceitação do cargo, mas sim da justificação para a escolha do cargo.
Em todo o caso, sou liminarmente contra que um dirigente ambientalista salte para uma empresa privada, abordando questões que meses antes tratou como dirigente da ONG.
Por outro lado, é sempre prudente ter o chamado «período de nojo», ou seja,evitar saídas repentinas das ONG para ocupar cargos políticos. Por exemplo, eu evitaria a alternância que o José Alho tem tido - Quercus, IPAMB, PNSAC, LPN, candidato à autarquia de Ourém -, embora não a censure de todo (talvez por ser seu amigo), porque penso que em qualquer dos sítios onde esteve fez alcançou o cargo por mérito e fez um trabalho globalmente positivo. Esta questão é sensível e não apenas nas ONG. É, por exemplo, uma das questões éticas mais discutidas no seio dos jornalistas (devido à passagem para assessorias de gabinetes ministeriais, para empresas de comunicação e sucessivo regresso à actividade jornalística).
Por fim, uma última nota: o movimento ambientalista tem feito, sem dúvida,um trabalho extremamente positivo para o qual, infelizmente, a sociedade ainda não prestou o devido tributo - se assim fosse tinhamos, pelo menos, muitos mais associados. No entanto, a sua pequenez é uma das suas maiores fragilidades. Quando sabemos que basta uma camioneta para conseguir eleger uma direcção da Quercus, o risco é enorme. E, por isso, convinha ao movimento ambientalista português congregar-se, fundir-se, e criar uma federação (não a CPADA, que tem actividade muito limitada) que fosse assente na profissionalização e tivesse acima de tudo uma boa capacidade financeira e técnica (e já agora uns estatutos blindados e um código de ética).
5/03/2005
A propósito da polémica autorização do cultivo de transgénicos em Portugal - e que está a começar a dar os primeiros passos no terreno no Cadaval -, julgo que, como em muitas matérias, os portugueses continuam completamente alheios aos riscos (vive-se numa saudável ignorância) e não há qualquer interesse político em informar.
Por isso, se existem temas que se tornam essenciais para o futuro do país, este será um deles. E, provavelmente, é um dos temas que não seria nada descabido colocar em referendo. Se outra virtude não tivesse, permitiria pelo menos uma discussão aberta na opinião pública. Fica aqui a ideia e a proposta para votarem na sondagem que coloquei aqui ao lado.
5/02/2005
Com a publicação, hoje, de um relatório da Direcção-Geral de Geologia e Energia sobre a produção e consumo de energia em Portugal durante o ano passado, dei-me ao trabalho de compreender como são «cozinhados» os dados para o cumprimento das metas de consumo de electricidade por fontes renováveis. Isto porque no relatório da DGGE afirmava-se que a electrcidade por fontes renováveis atingiu 34%, corrigido o índice de produtibilidade hidroléctrica (IPH), quando fazendo os cálculos a «coisa» rondava apenas os 22,5%, sem correcção.
Por outro lado, refere-se nesse relatório que a produção por fontes renováveis subiu de 31% em 2003 para 34% em 2004, com as tais correcções. Isto quando, em termos absolutos, houve de facto uma redução real: em 2003, a produção por via renovável foi de 35,4% e em 2004 foi de apenas 22,5%.
A razão destas abruptas diferenças, prende-se com as correcções da hidraulicidade: ou seja, quer chova menos, quer chova mais, os valores da produção são corrigidos para o valor médio.
No entanto, pensava eu que a correcção de hidraulicidade era feita ao factor 1 - ou seja, a produção de 2004 de hidroelectricidade deveria ser multiplicada por um factor 1,235 (visto que o IPH foi de 0,81). Mas não: afinal como os valores de referências para efeitos da directiva comunitária são de 1997 - que foi um ano muito chuvoso, que teve um IPH de 1,22 -, a produção de 2004 foi multiplicada por 1,51!
Contas feitas, produzimos por via hídrica apenas 10.036 GWh em 2004, mas para efeitos de contabilidade relativamente à directiva comunitária que nos obrigará a produzir 39% de electricidade por energia renováveis é como se tivessemos produzido 16.295 GWh.
Ora, esta correcção para um IPH de 1,22 é uma autêntica falácia, por duas razões.
Primeiro, nos últimos 8 anos, o IPH tem atingido uma média de 1,0125 - ou seja, próximo do índice de hidraulicidade 1 (o que parece normal, pela sua própria definição), pelo que partir do referencial do ano de 1997 (IPH de 1,22) é uma maquilhagem estatística, porque raramente se verifica. Portanto, se num ano médio (IPH igual a 1) Portugal conseguir produzir 32% de energia por via renovável estará automaticamente a cumprir a directiva que estabelece os tais 39%. É esquisito, mas será assim.
Segundo, essa correcção parte do pressuposto de que o aumento da produçao hidroeléctrica é directamente proporcional ao IPH, o que não é verdade. Basta, aliás, comparar 2004 com 2003. Em 2003, o IPH foi de 1,33 (ou seja, superior ao 1,22 da referência) e obteve-se uma produção de 15.894 GWh - ou seja, menos do que o valor de 2004 corrigido (16.298 GWh). Vejam o absurdo desta correcção: em 2003 produziu-se mais 5.858 GWh por via hídrica do que em 2004, mas para efeitos de contabilidade da directiva é como se 2004 tivesse produzido mais energia renovável hídrica do que 2003.
P.S. Espero que tenham compreendido esta arrazoado técnico.
5/01/2005
O conceito de modernidade em Portugal é, por vezes, confundido com propostas arrojadas que, a mais das vezes, constituem um chorrilho de delírios disparatados. Vem isto a propósito de um «estudo» proposto por, segundo uma notícia do jornal Público de ontem, um grupo de arquitectos, engenheiros do ambiente e artistas para uma Lisboa do ano2030. O nome do estudo em si mesmo já é algo alucinante: «O Grande Estuário 2030: Uma Cidade sem Petróleo». Alucinante e contraditório: propõe, desde logo, uma expansão enorme da malha urbana da Grande Lisboa suportada não em mais uma, mas sim mais duas pontes.
Em seguida, dizem os autores que como Lisboa está envelhecida, atrofiada e incapaz de oferecer «alternativas credíveis às novas tensões urbanísticas» (não sei o que isto quer dizer...), a solução passa por crescer para sul. Depois, no meio disto, surge também a proposta para uma candidatura para os Jogos Olímpicos de 2020, um aeroporto no Montijo (embora se saiba que tecnicamente e por motivos de segurança, esta não é uma solução válida) e o mais que certamente estará no estudo, mas que a notícia não refere.
Se algum dos autores deste «estudo» olhasse para as dinâmicas demográficas da Grande Lisboa, olhasse para as finanças do país, olhasse para a necessidade de reabilitar Lisboa e conter a suburbanização, porventura teria gasto melhor o seu tempo, propondo verdadeiras e exequíveis medidas para a tal Lisboa sem petróleo do ano 2030.