11 fevereiro 2010
A Espiral Descendente aproxima-se do fundo
«Durante algum tempo, poder-se-ia pedir ao primeiro-ministro que tivesse vergonha na cara. Agora, resta saber se a temos nós.» – Nuno Pombo, aqui.
A sustentabilidade de um regime mede-se na maior parte pela seriedade dos seus titulares de cargos públicos. Mas, numa democracia, é sobre os cidadãos que recai a responsabilidade final relativa ao destino do regime: Se este apodrece e cai, ou se se regenera e sobrevive. A indiferença generalizada da população à corrupção, à mentira, ao abuso da causa pública, à imoralidade, ao desrespeito pelas formalidades democráticas e pela separação de poderes, fere de morte o regime. Quem defende o primeiro-ministro com base numa argumentação autista de que a violação do segredo de justiça (o que até agora não foi o caso) ou de privacidade é um atentado ao Estado de Direito, fecha os olhos ao facto de que são as próprias acções do primeiro-ministro e da sua entourage que, mais do que ferir o Estado de Direito, põe potencialmente em causa o próprio regime, ao criarem um clima de relativização ética e de free-for-all em que vale tudo.
Parece que estamos a chegar a um momento da verdade. Dentro do PS, quem se achar sério tem a obrigação de se demarcar desta liderança abismal; não esquecendo que a seriedade de cada um é apenas tão real quanto as suas acções efectivas (ou como diria o imaginário Forrest Gump, «Stupid is as stupid does»). Lutas passadas contam pouco no presente. Na oposição, à falta de acção pelo Presidente da República, pelo próprio governo ou pelo partido que o apoia, há que mostrar em termos claros que não se é conivente com a situação. Se isso implicar uma moção de censura ou mesmo eleições antecipadas, que eventualmente não desejem, so be it. Se depois de eleições tudo ficar na mesma, o que parece improvável, então o país terá o governo que (aparentemente) merece; e será apenas uma questão de tempo até o regime ruir e a espiral descendente bater no fundo.
Leitura complementar: A Espiral Descendente; Revisitando a Espiral Descendente; (ou, como diria Spooner, protagonista de I Robot, «Somehow I told you so just doesn’t quite say it.»)
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29 janeiro 2010
Princípios e participação política
«(…) as decisões públicas são tomadas pelos políticos na base do seu próprio bem estar, e não do interesse da sociedade… A ideia do político como criatura dedicada à prossecução dos interesses da sociedade como um todo é hoje considerada como um mito pela generalidade dos economistas (…)»
A propósito destas palavras, escritas por Cavaco Silva em 1978 numa revista da Universidade Católica, João Pinto e Castro afirma:
«(…) não se entende como é que alguém nessas condições se atreve a candidatar-se a um qualquer cargo de responsabilidade pública.»
Deixando de lado o aspecto de que qualquer dos leitores destinatários das palavras de Cavaco Silva reconheceria de imediato a referência à teoria da Escolha Pública, a atitude de Pinto e Castro é sintomática de um dos grandes problemas do debate político, particularmente em Portugal. Os “donos do regime” criam as suas regras, definem a sua ética e todos os outros são uns malandros. Quem não concordar tem bom remédio: Resigne-se à sua insignificância.
É o “catch-22″. Quem vê as falhas do regime e a forma como este permite, pelo próprio desenho do sistema e respectivos incentivos ao comportamento, que os eleitos se comportam de forma criticável, torna-se não elegível para participar politicamente na reforma do sistema. A maldade está no olho maldoso do crítico. Ético e com bons princípios é pagar lip service às boas intenções e à beatitude, e depois agir de outra forma.
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24 setembro 2009
Pensamento do dia
«Ponham a razão firmemente no seu lugar e chamem ao seu tribunal todos os factos, todas as opiniões. Questionem de forma audaz até a existência de Deus; pois, se existir, ele mais aprovará o respeito pela razão, do que o medo vendado.» - Thomas JeffersonEtiquetas: ética, objectivismo, pensamentos
16 setembro 2009
Pensamento do dia
«De todas as tiranias, é bem possível que a mais opressiva seja a tirania exercida para bem das suas vítimas. Talvez seja melhor viver sob cleptocratas do que sob moralistas omnipotentes. A crueldade do cleptocrata pode por vezes dormir, a sua ganância ocasionalmente saciada; mas aqueles que nos tormentam para o nosso bem fa-lo-ão sem trégua, pois fazem-no com a benção das suas consciências.» – C. S. Lewis
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04 setembro 2009
Pensamento do dia
«O dever não existe. Se sabes que algo está certo, vais querer fazê-lo. Se não o queres fazer - é porque não está certo. Se está certo e não o queres fazer - então não sabes o que é certo e não és um homem.» - Ayn Rand (em
We The Living)
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31 agosto 2009
Pensamento do dia
«Não há nenhuma entidade social com um bem que faça algum sacrifício para seu próprio benefício. Há apenas pessoas individuais, distintas, com as suas próprias vidas. Usar uma destas pessoas para o benefício de outras, usa-a a ela e beneficia as outras. Mais nada.» - Robert Nozick
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27 agosto 2009
Pensamento do dia
«Não há forma de subjugar os inocentes. O único poder de qualquer governo é o poder de submeter os criminosos. Pois quando não existem suficientes criminosos, há que fazê-los. Declaram-se tantas coisas como crime que torna-se impossível aos homens viverem sem violar a lei. Quem quer uma nação de cidadãos cumpridores da lei? O que se ganha com isso? Mas passando o tipo de leis que não podem ser nem obedecidas, nem executadas, nem interpretadas objectivamente, cria-se uma nação de incumpridores - e aí é só facturar à conta da culpa.» - Ayn Rand (frase de Floyd Ferris, personagem de
Atlas Shrugged)
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24 agosto 2009
Pensamento do dia
«A disseminação do mal é um sintoma de vácuo. Sempre que o mal vence, isto ocorre apenas por omissão: Pela falha moral daqueles que fogem ao facto de que não pode existir compromisso no que toca a princípios básicos.» - Ayn Rand
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20 agosto 2009
Pensamento do dia
«Para viver, o homem necessita de agir; para agir, ele deve fazer escolhas; para fazer escolhas, ele deve definir um código de valores; para definir um código de valores, ele deve saber o que é e onde está - isto é, deve conhecer a sua natureza (incluindo os seus meios de conhecimento) e a natureza do universo onde age - ou seja, o homem necessita de metafísica, epistemologia, ética, o que significa: Filosofia. Ele não consegue fugir a esta necessidade; a sua única alternativa é se a filosofia que o guia é escolhida pela sua mente ou ao acaso.» - Ayn Rand
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18 agosto 2009
Pensamento do dia
«A justificação moral do capitalismo não está na asserção altruista de que este representa o melhor caminho para atingir o 'bem comum.' É verdade que o capitalismo é esse caminho - se é que expressão faz algum sentido - embora tal seja meramente uma consequência secundária. A justificação moral do capitalismo está no facto deste ser o único sistema consonante com a natureza racional do homem, de proteger a sua sobrevivência enquanto homem, e de ter como seu princípio regedor a justiça.» - Ayn Rand
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04 agosto 2009
Separação de poderes
Francisco Proença de Carvalho, no
31 da Armada:
«Há quem diga que a mera suspeita é incompatível com o exercício da política. Do ponto de vista dos princípios teóricos, é uma posição bonita e inatacável. Mas, na vida real, parece-me uma tese ingénua e sujeita a resultados perversos. Hoje a suspeita pode surgir de qualquer lado: de denúncias anónimas, de investigações jornalísticas com o objectivo de fazer manchetes atractivas, de ódios pessoais e políticos, das mais variadas formas e feitios…. Exemplos não faltam da enorme facilidade com que, sumariamente, se arrasam carácteres em Portugal, sendo que, provavelmente na maior parte das vezes, esse julgamento público não tem a correspondente condenação penal ou sequer acusação.
É também por isso que discordo em absoluto da aprovação de qualquer lei que impeça os cidadãos de se candidatarem a cargos políticos pelo facto de serem arguidos ou acusados (algo bem diferente de condenados) criminalmente. É óbvio que fica bem aos políticos defenderem este tipo de legislação, principalmente nos tempos em que esta classe é generalizadamente mal vista. Os habituais patriarcas da moral e bons costumes gostam, os media aplaudem quem propõe estas medidas, portanto os seus defensores batem recordes nos rankings da popularidade.» - Ler o resto.
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28 julho 2009
Valores, objectivismo e subjectivismo
Objectivism versus "Austrian" Economics on Value, por Per-Olof Samuelsson.
«One could easily do either too much or too little of the differences between Ayn Rand’s philosophy of Objectivism and the "Austrian" school of economics. One could do too much of it by saying the "Austrians" are subjectivists, which is obviously anathema to Objectivism (and vice versa: an objective theory of value has to be anathema to the Austrians); or one could do too little of it by simply denying and/or ignoring the differences that do exist. But in fact, there is only one amendment that should be done by the "Austrians" to bridge this gulf: they should acknowledge that, while our valuation of things certainly takes place within our minds, the values that we identify as values exist "out there", in the world. This is the subject of this essay.»
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24 julho 2009
Propriedade intelectual
What is Copyright?, por Peter Saint-Andre.
«A friend of mine, with whom I agree on a great many intellectual matters, recently sent me the manuscript of a book he is writing. He is a strong advocate of individual rights and a principled opponent of government per se, since he argues that government force cannot help but violate individual rights. So I was surprised to find, right there on page one of his manuscript, the phrase "Copyright 2007. All rights reserved."
What is copyright? Usually it is considered a form of intellectual property. But that raises a further question. What is property? Are intellectual creations a form of property? If so, exactly how?»
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09 agosto 2008
Prevenção e Pena de Morte
As questões levantadas pelo
João Miranda e pelo
Carlos Guimarães Pinto relativamente ao caso dos reféns em Campolide e a comparação com a pena de morte são interessantes. Mas incompletas. E o assunto não é de pouca importância, pois o uso do poder de iniciação de força é algo que vai ao âmago das justificações teóricas quer do estado quer de “agências de segurança” num eventual “estado de natureza”. Existem aqui duas questões básicas: A primeira é se é comparável ou não a pena de morte ao uso preventivo de força mortal. A segunda tem a ver com os mecanismos de legitimidade para qualquer uma delas.
A diferença entre a pena de morte e a execução, como chama o João Miranda, dos raptores de Campolide, está no facto da primeira ser uma medida punitiva, teóricamente compensatória, e que se pretende seja dissuasora dos crimes a que se aplica; e da segunda ser uma acção preventiva, cujo objectivo é impedir que o crime venha a ser cometido. Esta diferença é clara, sendo um exemplo extremado da questão que sempre se coloca relativamente ao papel do estado ou de uma “agência de segurança”: Proibir (coerção
a priori) ou compensar (coerção
a posteriori) as violações de direitos naturais de um indivíduo? E também nela estão patentes todos os aspectos levantados por Robert Nozick na primeira parte de
Anarchy, State, and Utopia: Tentamos prevenir as violações de direitos, potencialmente criando injustiças que são elas próprias violações? Ou compensamos as vítimas após a violação, correndo o risco que tal não seja possível ou justo para a vítima, e contribuindo para um ambiente geral de insegurança em que uma ameaça imparável pode estar ao virar de cada esquina?
A pena de morte é um problema ético bicudo. Sendo a vida o direito natural primordial, a sua violação institucional levanta mais questões do que resolve. O argumento principal contra tem a ver com a possibilidade de erro, cuja consequência seria uma injustiça irreversível. Mas mesmo na sequência de crime muito grave, confessado ou apanhado em flagrante, coloca-se o argumento de que se trata de uma violação do direito natural primordial que não vai de modo algum inverter o crime que lhe deu origem. Sobra assim o argumento a favor da dissuasão, que não me convence por aí além, a partir do momento em que a sua execução está sempre tão distante do crime original, que não creio entraria no pensamento do potencial criminoso (excepto se fosse uma pena generalizada, o que levantaria ainda mais problemas).
O caso do uso preventivo de força mortal é diferente. Aqui a situação é de perigo iminente. Existe a possibilidade de um crime capital ser cometido em flagrante. Esta situação limite é o cerne da questão de se é legítimo ou não que o estado tente prevenir crimes. Se não fôr legalmente possível ao estado, ou a uma “agência de segurança”, impedir que uma pessoa mate outra, quando está em condições de o fazer, então nenhuma coerção
a priori será legítima, devendo o estado limitar-se a forçar a compensação das vítimas depois do crime. O que num caso destes seria impossível. E contrariamente à pena de morte, a possibilidade de ter lugar esta força preventiva é de facto dissuasora.
Em ambos os casos pode existir erro humano. Mas enquanto no caso da pena de morte o erro ocorre “a sangue frio” e sem sequer haver efectiva compensação da vítima já morta, no caso do uso preventivo de força mortal o erro ocorre na tensão da situação; sendo a vida da vítima efectivamente preservada e havendo indícios fortes (mesmo que eventualmente errados) de que o crime poderia ser cometido a qualquer momento. Uma hesitação que resultasse na morte da vítima seria objectivamente uma falha mais grave.
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05 maio 2008
Abutres
No contexto das notícias catastrofistas, quase “fim dos tempos”, sobre o aumento do custo de vários bens alimentares, a campanha do Banco Alimentar contra a fome deste fim de semana teve especial relevo nas notícias e tudo indica que foi muito bem sucedida. Quase duas dezenas de milhar de voluntários e, presumo, centenas de milhar de contribuintes (no sentido real do termo), deram forma a uma enorme iniciativa de apoio a quem passa necessidade. O que acho realmente extraordinário é o facto da maior parte destas pessoas não questionar o facto de apesar de quase metade de tudo o que produzem ser consumido pelo estado, alegadamente “social”, continuem a persistir situações de carência que apenas são resolvidas por iniciativas fora desse estado. Se o questionam, o facto é que não agem em consonância.
As décadas vão passando, o peso do estado vai aumentado e vão subindo de tom as queixas sobre aumentos das diferenças entre ricos e pobres, ou da dimensão das “bolsas” de pobreza. A conclusão, evidente, de que algo está errado no modelo do estado social nunca é atingida. As receitas passam sempre por mais intervenção, mais estado e menos escolha individual. Note-se que o problema é rigorosamente o mesmo nas outras funções, supostamente nucleares, do estado. Quanto mais cresce a carga fiscal, piores os serviços de saúde prestados, com enormes listas de espera e racionamento; menos formados são os alunos e mais desacreditada fica a escola pública; mais desacreditadas ficam a justiça e a segurança pública. As boas intenções, que proverbialmente vão pavimentando a estrada daqui ao inferno, essas nunca são questionadas.
A razão para esta passividade é filosófica. O humanitarismo, a ideia de que o padrão moral é o nobre sacrifício e de que a mais alta virtude que alguém pode almejar é viver para ajudar os outros são responsáveis por isto.
Como escreveu Isabel Paterson, quando esta ideia se junta ao internacionalismo e à vontade de “ajudar a humanidade”, estão reunidas as condições para a catástrofe. Condicionadas pelo padrão moral altruista, as pessoas são incapazes de perceber as implicações efectivas dessa filosofia de subordinação da produção à ajuda a terceiros (quando devia ser justamente ao contrário) ou nem sequer de julgar os “grandes humanitários” pelos resultados e não pelas intenções (algo que parece óbvio).
Desta forma, as pessoas acabam por não ver o verdadeiro papel dos estadistas responsáveis pela situação. Não vêm que estes, ao defender as suas boas intenções para o estado “social”, acabam por comportar-se como abutres que se alimentam (espiritualmente, quando não literalmente) da miséria alheia.
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30 março 2008
O Humanitário com a Guilhotina
(adaptado e traduzido a partir do original de Isabel Paterson, incluido no seu livro The God of The Machine, editado em 1943)A maior parte do mal no mundo é feito por boas pessoas, e sem ser por acidente, lapso ou omissão. É o resultado das suas acções deliberadas, persistentes ao longo do tempo, e por si vistas como motivadas por altos ideais e objectivos virtuosos. Isto é demonstravelmente verdadeiro; e nem podia ser de outra forma. A percentagem de pessoas realmente malignas, violentas ou depravadas tem de ser pequena, pois nenhuma espécie sobreviveria se os seus membros habitual e conscientemente se ferissem uns aos outros, por sistema. A destruição é tão fácil que mesmo uma minoria persistente mal-intencionada poderia exterminar em pouco tempo a maioria inocente de pessoas tendencialmente boas. Homicídio, roubo, pilhagem e destruição são facilmente cometíveis por todos os indivíduos em qualquer altura. Se assumirmos que estes são inibidos apenas por medo ou pela força, que temerão eles, ou quem usaria de força contra eles se todos os indivíduos tivessem as mesmas inclinações? Se calculássemos todo o mal cometido por criminosos deliberados, o número de homicídios, a extensão de estragos e perdas, este seria certamente negligenciável comparado com a totalidade de morte e devastação causada a seres humanos pela sua própria espécie. Por conseguinte, é óbvio que em periodos quando milhões são exterminados, a tortura é praticada, a fome forçada, a opressão tornada política, como presentemente em grande parte do mundo, e como ocorreu frequentemente no passado, tal só é possível com a vontade de muito boa gente, mesmo com a sua acção directa, no que consideram objectivos virtuosos. Quando não são os executantes imediatos, dão publicamente a sua aprovação, elaborando justificações ou então escondendo factos com silêncio, e desencorajando a discussão.
(...)
Como foi que a filosofia humanitária da Europa do século XVIII abriu as portas ao Reino do Terror? Não foi por mero acaso; foi antes a consequência lógica da premissa original, do objectivo e meios propostos. O objectivo era o de promover o bem dos outros enquanto a primeira justificação da existência; os meios, os poderes do colectivo; e a premissa, a de que o "bem" é colectivo.
O fundo da questão é ético, filosófico e religioso, abarcando a relação do homem com o universo, da sua faculdade criativa com o seu Criador. O erro fatal ocorre na incapacidade de reconhecer a norma da vida humana. Claramente, há uma grande quantidade de dor e angústia que ocorrem na existência. A pobreza, a doença e acidentes vários são possibilidades que podem ser reduzidas a um mínimo, mas que não podem ser totalmente eliminadas do caminho que a humanidade deve percorrer. Mas estas não são condições desejáveis, para ser alcançadas ou perpetuadas. Com naturalidade, as crianças têm pais, enquanto a maior parte dos adultos gozam de uma saúde razoável a maior parte da vida e desenvolvem actividades úteis que lhes permite subsistir. Essa é a norma e a ordem natural. Os males são marginais. Podem ser aliviados com recurso ao excesso marginal de produção; caso contrário nada se poderia fazer. Assim, não se pode assumir que o produtor existe apenas em função do não-produtor, o saudável em função do doente, o capaz em função do incapaz; nem qualquer pessoa em função de outra. (O processo lógico, se assumirmos que qualquer pessoa existe apenas em função de outra, foi implementado em sociedades semi-bárbaras, quando a viúva ou seguidores de um homem morto eram enterrados vivos na sua sepultura.)
As grandes religiões, que são também grandes sistemas intelectuais, sempre reconheceram as condições da ordem natural. Elas urgem a caridade e a benevolência como obrigações morais, a ser alcançadas por via do
superavit do produtor. Isto é, tornam-nas secundárias relativamente à produção, pela inultrapassável razão que sem produção não haveria nada para dar. Consequentemente, elas prescrevem regras severas, a ser assumidas apenas voluntariamente, para aqueles que desejarem devotar totalmente as suas vidas à caridade, a partir de contribuições. Esta é sempre considerada um vocação especial, pois nunca poderia ser a forma de vida comum. Como o beneficente tem de obter os fundos ou bens, que distribui, através do produtor, ele não tem autoridade para mandar; ele tem de pedir. Quando ele subtrai a sua própria subsistência a partir destes donativos, ele apenas pode retirar o mínimo essencial. Como prova da sua vocação, ele tem até de prescindir da felicidade da vida familiar, como forma de receber a benção formal. Nunca pode obter o seu conforto a partir da miséria alheia.
(...)
Se o objectivo principal do filântropo, a sua razão de existir, é ajudar os outros, o seu bem supremo requer que esses outros estejam em estado de necessidade. A sua felicidade é a outra face da moeda da miséria alheia. Se ele deseja ajudar a "humanidade", então toda a humanidade tem de passar necessidade. O humanitário pretende ser o agente principal nas vidas dos outros. Ele não pode admitir nem o divino nem a ordem natural, pela qual os homens têm o poder de se ajudar a si mesmos. O humanitário substitui-se a Deus.
Mas dois factos inconvenientes o confrontam; primeiro, os capazes não precisam da sua ajuda; e segundo, a maior parte das pessoas, se não forem pervertidas, decididamente não deseja ser "ajudada" pelo humanitário. Quando se diz que toda a gente devia viver em função dos outros, qual é o rumo de acção específico que deve ser seguido? Deve cada pessoa fazer exactamente o que qualquer outra quiser, sem limites ou reservas? E somente o que os outros querem que faça? O que acontece se pessoas diferentes fizerem exigências contraditórias? O esquema é impraticável. Possivelmente o que se pretende é que uma pessoa faça apenas o que é "bom" para os outros. Mas saberão esses outros o que é bom para eles? Não, a mesma dificuldade elimina esta hipótese. Deverá então A fazer o que lhe parece bom para B, e B o que lhe parece bom para A? Ou deverá A aceitar apenas o que lhe parece bom para B, e vice-versa? Tal seria absurdo. Claro que o que o humanitário na verdade propõe é que seja feito o que ele pensa ser melhor para todos. É nesta altura que o humanitário monta a sua guilhotina.
Que tipo de mundo vê o humanitário como aquele que lhe permite o máximo alcance de acção? Só pode ser um mundo de sopas-de-pobres e hospitais, no qual ninguém retenha o poder natural de um ser humano de ajudar-se a si mesmo ou de resistir que ajam sobre ele contra a sua vontade. E este é o mundo criado pelo humanitário quando consegue levar a sua vontade avante. Quando um humanitário deseja que cada pessoa tenha um litro de leite, é evidente que não é ele que tem o leite, nem é capaz de o produzir. Caso contrário, porque haveria ele de simplesmente "desejar"? Mais, mesmo que ele possuísse leite em quantidade suficiente para dar um litro a cada pessoa, desde que os seus supostos beneficiados tivessem a possibilidade de produzir leite para si próprios, eles diriam "não, obrigado". Assim sendo, como criará o humanitário a situação em que ele terá todo o leite e todos os outros carecerão dele?
Só há uma forma. Através do uso do poder político na sua máxima extensão. Por isso, o humanitário sente-se mais gratificado ao encontrar ou visitar um país onde todos vivem limitados por racionamento. Onde a subsistência é distribuída aos poucos, o seu desiderato é alcançado: carência generalizada e um poder superior para "aliviá-la". O humanitário na teoria é o terrorista em acção.
(...)
O filântropo, o político e o parasita estão inevitavelmente aliados, porque têm os mesmos motivos, procuram os mesmos fins; existir para, e através de, outros. As pessoas boas não podem ser exoneradas do facto de os apoiarem. Nem podemos acreditar que as pessoas boas estão totalmente alheadas das consequências. Mas quando estas pessoas boas sabem, e seguramente o sabem, que três milhões de pessoas (na menor das estimativas) morreram de fome em um ano, como consequência dos métodos que aprovam, porque continuam a fraternizar com os assassinos e a apoiar as suas acções? Porque lhes disseram que a morte de três milhões poderá, no fim, beneficiar um número maior. Este argumento aplica-se igualmente bem ao canibalismo.
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20 novembro 2007
Preconceitos, Colectivismo e Determinismo
(também postado n'O Insurgente)No meio da maré de críticas a Pedro Arroja pelos seus posts sobre "os judeus" no
Portugal Contemporâneo, ainda não vi argumentos que pareçam realmente entender a razão pela qual os preconceitos raciais são errados. Já na anterior celeuma relativamente às declarações de James Watson sobre eventuais diferenças na inteligência entre raças foi a mesma coisa. Exceptuando
este post no De Rerum Natura, que toca nos pontos essenciais, embora eu não esteja totalmente de acordo com tudo o que lá está. [Adenda: Também
aqui o Rui A havia escrito sobre o assunto, expondo essencialmente as mesmas ideias que aqui escrevo.]
A maior parte dos ataques a Arroja (tal como a Watson) fazem implicitamente recurso a proposições puramente infantis, do género "os nazis era racistas; os nazis eram maus; logo o racismo é mau" ou "o racismo teve efeitos terríveis no passado; logo qualquer preconceito racial devia ser crime". No caso de Watson a coisa vai até mais longe, chegando ao "o racismo é mau; logo qualquer afirmação que aparente ser racista é logicamente falsa".
O que é criticável nas análises de Pedro Arroja não é que ele seja uma qualquer espécie de nazi anti-semita. Acusá-lo disso é um disparate. O seu problema principal é uma tendência colectivista e determinista na análise que tolda quase todas as suas conclusões. Além disso, há também a questão do uso de meias-verdades, ou escolha selectiva dos factos apresentados, com o objectivo de suportar as suas teses, embora isso já seja outro assunto.
Quase tudo o que Pedro Arroja escreve é "grupal". As análises procuram sempre características colectivas em grupos, sejam "os católicos", "os protestantes", "os brasileiros", "os judeus", "os negros" ou "os ateus", entre outros. Nada de errado em verificar características comuns a grupos, caso contrário podíamos deitar fora a sociologia (
no great loss, dirão alguns, eh eh). O problema está no retirar de conclusões sobre membros individuais a partir dessas características de grupo. E aqui entra o seu típico determinismo: Quase todos os seus artigos tiram conclusões do género "as características do grupo X fazem necessariamente que os seus membros ajam de determinada forma" ou "o país Y tem uma cultura tal, logo só um governo do tipo Z funcionará por lá".
O problema dos preconceitos raciais está aí. Na falta de respeito pelo indivíduo que está implícita no seu julgamento em função da etnia a que pertence. Daí que as correntes politico-filosóficas colectivistas sejam as menos bem colocadas moralmente para criticar preconceitos raciais (ou mesmo outros, como sexuais, profissionais, nacionais, etc). Já quem defende o indivíduo acima do colectivo está inerentemente a censurar tais preconceitos.
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11 junho 2007
Danos Colaterais
(também postado n'O Insurgente)
"Na lógica do engenheiro social, não há relação causal entre eventos tão díspares como (1) a criação de uma burocracia de assistência social e (2) a redução (após a passagem de alguns anos) na probabilidade de alguém, perante a morte do vizinho, ir cozinhar uma caçarola para o jantar da família enlutada. Na lógica que eu uso, essa causalidade existe e tem grande importância.
O meu argumento parte de duas premissas. Uma vem directamente de Aristóteles; a prática da virtude tem as características de um hábito e de uma arte. As pessoas podem nascer com a capacidade de serem generosas, mas só se tornam generosas pela prática da generosidade. As pessoas têm a capacidade de ser honestas, mas tornam-se tal apenas pela prática da honestidade. A segunda, para a qual não tenho uma fonte específica, é a resposta humana a que me referi várias vezes: As pessoas tendem a não fazer uma tarefa quando outrém a faz por elas. No nível micro, o diálogo entre o governo e o cidadão é parecido com algo como:
- Queres sair para alimentar quem tem fome ou vais ficar aí em casa a ver televisão?
- Estou cansado. O que é que vai acontecer se eu não fôr?
- Bem, nesse caso acho que tenho de ir eu.
- Se é assim, então vai tu." - Charles Murray (tradução minha)
Uma suspeita que sempre tive é a de que a existência de programas públicos de assistência social, financiados via impostos, contribui para uma diminuição da generosidade privada. No fundo, que a beneficência coerciva acaba por asfixiar a genuína. As razões lógicas que levantam esta suspeita são fáceis de entender: diminuição do rendimento líquido disponível, ou repúdio pela ideia de que o apoio social é um "direito", com o consequente "dever" dos outros.
Em 1988, no seu livro
In Pursuit: Of happiness and Good Government, Charles Murray analisa a questão estatísticamente e mostra existir uma contracção significativa da beneficência privada quando existe uma política oficial de aumento dos apoios sociais estatais. Nos dez anos anteriores à eleição de John F. Kennedy, durante os quais esses apoios baixaram, a filantropia privada aumentou de 2% do rendimento disponível até cerca de 2,7%. Dessa altura até 1980 (quando Ronald Reagan foi eleito), baixou até 2,1% (apenas com uma ligeira estagnação durante os anos Nixon-Ford). Foram os anos de maior expansão dos programas sociais norte-americanos. Daí até a 1986, antes da edição do livro, voltou a subir, chegando a cerca de 2,5%.
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24 abril 2007
Dark Eminence
(também postado n'O Insurgente)Nos últimos dias, a escolha de Pina Moura para a administração da Media Capital, pelos seus proprietários (Prisa, grupo espanhol com ligações aos socialistas lá do burgo), fez correr alguma tinta. O PSD gritou "lobo" e vários comentadores criticaram, por variadas razões. Subitamente, a esquerda viu a luz.
"É o mercado a funcionar", disseram. A defesa do mercado é sempre bem-vinda, mesmo quando cheira a hipocrisia. Para que não restem dúvidas, começo por deixar bem clara a minha posição:
1.1) Os accionistas de uma empresa devem ser livres de escolher quem entendem para trabalhar nela; especialmente a equipa de gestão, pois é esta que responde directamente perante eles. A comunicação social não deve ser diferente. Um jornal ou uma televisão são empresas como as outras, mesmo que tenham algum "poder" de influência sobre a "opinião pública".
1.2) É dez vezes preferível que um determinado meio ou grupo de comunicação assuma publicamente as suas inclinações políticas do que finja uma inexistente imparcialidade. As declarações de Pina Moura ao Expresso são por isso de uma franqueza pouco habitual; devem ser bem recebidas, em vez de causarem falsas escandalizações.
Dito isto, não deixa de ser perfeitamente legítimo apontar alguns disparates oriundos da área do PS sobre este assunto. Em primeiro lugar porque tem piada; em segundo porque se não o fizermos eles começam a achar que podem safar-se mesmo quando fazem o que não devem. Eis algumas ideias sobre o tema:
2.1) As leis em vigor para a comunicação social são o resultado de anos de acção legislativa do PSD e do PS. Esta leis, incluindo a da ERC, criada pelo actual governo socialista, incluem várias provisões que pretendem garantir a independência e imparcialidade da informação. Existem sanções previstas na lei para incumprimento. Se qualquer empresa tem fins políticos, como afirma Pina Moura, não seria de eliminar ou clarificar estas provisões na legislação?
2.2) A comparação, feita por
Vital Moreira, Pina Moura e pela própria Prisa, com a situação do grupo de Francisco Balsemão é risível. O Expresso foi fundado em 1973, antes de sequer existir PSD. Balsemão não exerce qualquer cargo político executivo desde 1983. A independência editorial deste grupo, relativamente ao seu principal accionista e presidente, é razoável, desde o Expresso, que nunca foi de fazer fretes ao PSD, até à SIC, onde com igual facilidade se faz a cama a Santana Lopes ou a folha a Sócrates. Poderá uma TVI com um "cardeal republicano, laico e socialista" dizer o mesmo?
2.3) Cumprindo algumas formalidades básicas, qualquer um pode criar um jornal. O mesmo não se passa no que toca a uma rádio e, especialmente, um canal de televisão. Estas entidades dependem de atribuição por parte do estado de uma licença que, por inerência, é um bem escasso. Face às limitações à concorrência que este regime de propriedade industrial impõe ao negócio, não seria de reconsiderar a legislação em vigor para ela ficar mais de acordo com as novas inclinações
laissez-faire dos socialistas?
2.4) Quando o Helder referiu que
as empresas têm como missão dar lucro aos seus accionistas, em resposta à afirmação de Pina Moura de que todas as empresas têm objectivos políticos, houve quem argumentásse que esses objectivos políticos são tão legítimos como o lucro. Sim. Mas como não há almoços grátis, não será de perguntar onde irão os accionistas da Prisa buscar o seu retorno se não é aos
cash-flows da Media Capital?
Etiquetas: ética, falácias, media
04 fevereiro 2007
Racionalismos que a Razão desconhece
Neste post sobre relativismo moral, João Miranda escreve:
"Como já explicou aqui o Pedro Arroja, a partir do momento em que se aceita que a ética tenha base racional, abre-se a porta para que as premissas fundamentais do sistema ético sejam o resultado da vontade de quem as escolhe."
A "explicação" referida relaciona-se com estes (
1,
2,
3) posts no
Blasfémias. Coloco o termo entre aspas porque na verdade não penso que Pedro Arroja tenha explicado o que lhe é atribuído. Quanto mais não seja porque essa afirmação ou é uma tautologia ou uma contradição nos termos, dependendo de como se definem os conceitos. Além de que as suas ideias perdem clareza quando fala de Ayn Rand, de quem parece ter uma qualquer
pet peeve. Em vários posts nos últimos meses referiu Rand em termos críticos (talvez mesmo
cáusticos); sem, no entanto, apresentar argumentos críticos fundamentados às suas ideias - referir o
affair idiota que ela teve com um homem 25 anos mais novo não me parece a melhor forma de questionar a "Moral Racional" do Objectivismo. Ainda por cima porque existem pontos perfeitamente passíveis de crítica no pensamento de Rand, bastava ter escolhido um deles.
Mas voltando ao que interessa. Se aceitarmos que a realidade existe e que a podemos perceber, pelo menos em parte, através da nossa faculdade racional alimentada pelos nossos sentidos, e que esta, mesmo que falível, não altera a natureza da realidade, temos base para avançar. Quem não concorda escusa de ler o resto. Pode ir ali a baixo atirar-se para a frente do primeiro autocarro que passar. Com um bocado de sorte pode ser que tudo seja uma ilusão e o autocarro na verdade não esteja lá.
Definição Importante Nº 1: Razão é a capacidade que um ser humano tem de perceber e sistematizar a realidade.
Não é: (i) A "certeza/correcção", como por exemplo na frase "o Pedro tem razão e tu estás errado"; (ii) A "verdade/nirvana", como por exemplo na frase "o Zé Manel está a meditar no Tibete para alcançar a Razão".
Definição Importante Nº 2: Moral Racional (objectivista) é um código ético que pode ser explicado racionalmente e que está dependente do contexto e do sujeito na avaliação dos valores.
Não é: (i) o Racionalismo de Platão, Descartes, Kant ou outro qualquer; (ii) um código intransigente que uma vez identificado se impõe a todos; (iii) um código
à la carte onde cada um escolhe as suas premissas.
Nos dois extremos clássicos do debate sobre a natureza dos valores temos de um lado intrinsicistas, que acham que as premissas fundamentais a que se refere o João Miranda são reveladas ou descobertas, quer por intervenção divina, pela "tradição" ou "história"; do outro os subjectivistas/relativistas, que acham que essas premissas fundamentais dependem de cada indivíduo (hedonistas), ou que são indiferentes ou impossíveis de determinar (nihilistas). Adicionalmente, há os objectivistas, que rejeitam ambas as posições clássicas (mais detalhes
aqui,
aqui e
aqui).
Por definição, os intrinsicistas não aceitam a ideia de uma base racional para a ética. A citação acima do João Miranda não se aplica a eles. Sobram os relativistas e os objectivistas.
Para os relativistas, a base do seu sistema ético é por definição o resultado da sua própria escolha, caso contrário não eram relativistas. Logo, a citação acima é tautológica. Isto aceitando que os relativistas partem de uma base racional e não emocional, aleatória ou caprichosa na sua concepção da ética.
Já para os objectivistas, as premissas fundamentais terão de ter as raízes na realidade. Isto é, os valores estão alicerçados em factos observáveis e inteligíveis graças à nossa capacidade racional. Por isso, a citação é uma contradição nos termos. Para eles, as premissas não são matéria de escolha. A sua grande diferença para o intrinsicistas, contudo, passa pelo reconhecimento de um elemento subjectivo que tem um papel no
ranking relativo dos valores. Ou seja, a natureza de "bem" ou "mal", ou de "certo" ou "errado", é objectiva; mas a importância relativa na comparação directa entre dois valores diferentes depende do contexto do sujeito avaliador.
Etiquetas: ética, objectivismo