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sábado, 29 de janeiro de 2011

HERMENGARDA e os TEMPEROS

Gosto muito dela. Apesar de sua cabeça já alva, continua trabalhando duro na roça. Algumas vezes, quando vou a Palmeiras, cruzo com ela na estrada, indo ou voltando da lide, com a cabeça equilibrando a lenha do fogão, ou algum paiol de palha com os produtos que colheu para alimentar a si e aos seus. Acho interessante que, tendo vivido toda a vida no pequeno e isolado povoado da Conceição dos Gatos, perto do Capão, tenha se interessado por colecionar improváveis objetos. Vamos chamá-la de Hermengarda porque este nome me sugere coisas de antigamente.
Hermengarda me alegrou logo na primeira fala quando fez a consulta. Disse-me que não gosta de usar remédio de farmácia, preferindo usar plantas medicinais do seu quintal. Seguimos no tempo e novas consultas, bastante irregulares, assim como irregular foi o seguimento dos conselhos. Gosto de gente como Hermengarda, desobediente. Por outro lado, preocupa-me gente como Hermengarda, desobediente. Expliquei a ela que o caldo de galinha é riquíssimo em colesterol e que os temperos artificiais, que tanto gosta, contêm com freqüência glutamato monossódico que aumenta a pressão. Complementei que tempero tem que ser aquele que sua mãe usava, da horta. Foi aí que me olhou com aquele rosto miúdo e enrugado, levemente inclinado e sorridente e disse que a comida ficava desenxabida sem estes temperos. Enterneceu-me a declaração. Vi em minha mente o tempo em que aos poucos seu paladar foi se viciando no sabor forte que eles trazem. Ela não sabe, mas o glutamato monossódico realça os sabores que dessa forma atingem com mais força as papilas gustativas dando a impressão de mais sabor. Assim deixamos de nos concentrar no paladar, paramos de prestar atenção às sutilidades do gosto, ficamos dependentes do ataque ríspido das comidas fast food. É por isso que nos enlatados salgados colocam um pouco de açúcar e nos doces colocam um pouco de sal. Truques que não são ilegais, nem imorais (alguns deles fazem parte da cultura ancestral), mas que à larga geram dependência ao sabor industrial.
Resolvi usar um argumento guardado na manga: Disse que ela não gostava de usar medicamentos porque eram químicos, daí a irregularidade e a rebeldia com as medicações anti-hipertensivas, mas usava como tempero substâncias industrializadas do mesmo jeito que os remédios de farmácia. Ela parou. Sua cabeça tremeu levemente. Sorriu e disse: “Mas são gostosos”. Continuamos conversando e listei os problemas que os temperos artificiais trazem, mas acho que não a convenci. Seu desprezo pela química dos laboratórios esbarra no aprendizado do paladar. E ela não está sozinha nisso. Milhões de pessoas em todo o mundo caiu nesta rede, nesta armadilha. Chegam a pensar que sempre comemos assim. Tem gente que acha que desde os tempos imemoriais comemos pão branco, açúcar branco etc. Sem memória, sem consciência. A industrialização e os conhecimentos modernos trouxeram muitos benefícios para a humanidade, porém também algumas perdas, como é o caso do uso de temperos. Hermengarda ganharia muito se ainda usasse os temperos de sua mãe e avó, vejamos alguns poucos exemplos:
Alho: O alho, graças à alicina, reduz o colesterol. É anti-infeccioso. Afina o sangue (o mesmo efeito que o AAS, embora mais fraco e, mais importante, com menos efeitos colaterais). Compostos sulfúreos presentes no alho reduzem o efeito cancerígeno das nitrosaminas que encontramos em calabresas, carnes, no fumo etc. Como se não bastasse, contribuem para que as células cancerígenas se suicidem (apoptose). Reduz a taxa glicêmica, ou seja, a quantidade de açúcar no sangue diminuindo a necessidade de insulina. As substâncias positivas do alho são melhor absorvidas quando consumidas com óleo (azeite de oliva virgem é a eleição).
Cebola: Reduz o colesterol. Reduz a taxa glicêmica. Contém os mesmos compostos de enxofre que o alho, com os mesmos efeitos. Alho porró também.
Manjericão, hortelã, orégano e alecrim: Estes temperos foram comparados com uma medicação contra a angiogênese (nos casos de câncer convém reduzir a angiogênese que é a formação de novos vasos sanguíneos), o Glivec, e cada uma delas ganhou da medicação. A salsa e o aipo (por causa da apigenina) empataram, mesmo em doses baixas. Além disso, a salsa é grande fonte de vitamina A (betacaroteno). O alecrim, ademais, contém carnosol que diminui a capacidade do câncer invadir os tecidos vizinhos. Importante: O efeito das ervas misturadas (e também das verduras e legumes misturados) é muito mais forte. Veja o livro de Servan-Schereiber, Anticâncer (Ed. Fontanar).
Gengibre: Antiinflamatório, antioxidante, reduz a angiogênese em casos de câncer.

Hermengarda é uma mulher extraordinária. Sua teimosia deu-lhe a vida que tem e a felicidade de poder ainda ir para a roça. Não posso dizer o mesmo de sua filha, que já padece as conseqüências da alimentação inadequada. Hermengarda conheceu e se viciou nos temperos artificiais depois de velha, sua filha era mais jovem e por levar mais tempo da vida em contato com eles, e com outros vícios da alimentação moderna, já apresenta os sintomas decorrentes de tais vícios. E como será para a neta? Preciso conversar com a filha de Hermengarda, talvez ela não seja tão teimosa.

Recebam um abraço temperado, Aureo Augusto