Dar poder a um homem ou uma mulher revelará quanto realmente vale – quem ele ou ela é de verdade.
Assisti recentemente a um programa, realizado em país evoluído, com cachorros treinados para farejar doenças, como tumores, e facilitar o diagnóstico precoce e correto. Cem por cento de acerto confirmou que o potencial canino abre novas fronteiras para a saúde humana.
Isso me levou a pensar que um cão, treinado para reconhecer potenciais delinquentes que escondem no seu âmago o despreparo para exercer cargos de poder e confiança, seria muito interessante para a humanidade, uma verdadeira dádiva.
O poder é uma chama tão poderosa quanto perigosa, amplia as possibilidades de escolha, de decisão, e disso desprende aquilo que está retido nas profundezas insondáveis da personalidade humana. Virtudes e defeitos, nobreza e mesquinharia, desejos e repressões, bem e mal chegarão à superfície se declarando segundo a complexidade psicológica e comportamental do indivíduo. Infelizmente, costumam se destacar, com mais frequência, as piores perversões, que geram prejuízos incalculáveis. Alguns precisam estar num local restrito, recebendo cuidados especiais.
Tem aquele que, com o poder, se torna um bom e cuidadoso pastor, como outro que se transforma em um explorador, um déspota, um abusivo e até um algoz dos subordinados.
As boas práticas sugerem a necessidade de preparar a pessoa para exercer a liderança de grupos e missões. Isso é imprescindível, contudo o imprevisível acontece, mesmo com o treinamento prévio. O poder, com espantosa frequência, revela as fraturas de base, aquelas que, deixadas ao livre-arbítrio, passam a produzir desastres.
Já assisti a casos de pessoas que exploram, abusam, prejudicam, traem e subtraem recursos que deveriam tutelar com honestidade.
A capacidade real para exercer proficuamente o poder, do mais ínfimo ao mais alto grau, vem da experiência, mais provavelmente daquela familiar ou da convivência com outros que servem de exemplo. Entretanto, nem todas as famílias – e nem todas as experiências – exerceram um poder formador.
Assim, o indivíduo não tem na sua bússola uma referência, um farol para se orientar corretamente, muitas vezes nem uma cultura proficiente.
As famílias monárquicas, as de mais alto “poder”, procuram, quase sempre, dar aos filhos o embasamento, a cultura e mostrar quanto o freio nos momentos de decisão se faz mais importante que o acelerador. Para compreender os meandros e oportunidades de escolha que se abrem com o poder na mão, é preciso entender que não existe um ser humano igual a outro. A personalidade se forma por experiências únicas. Podem ser parecidas, embora irrepetíveis, inclusive para gêmeos. O resultado é de uma miríade de indivíduos irrepetíveis – a surpresa fica à espreita.
Tudo muda e se transforma, porém podemos reparar que os ensinamentos, em especial os exemplos práticos, marcam o indivíduo, dão a ele a oportunidade de aprender e se formar, independentemente da origem. O resto é com o livre-arbítrio dele, sob observação dessa imensurável inteligência que está atrás do fluir dos eventos.
O poder se parece com um entorpecente, cujas doses precisam ser graduais e homeopáticas, sob controle de alguém habilitado. Pode ser aumentado, diminuído ou retirado totalmente, para o bem do guindado às alturas e dos demais impactados.
Caso se conceda poder a um indivíduo que não tem bem definido seu contorno ético e moral, que vacila entre o egoísmo e a meta real da missão, teremos alguém que explora para si as oportunidades. Será desastroso como aquele que com muita corda acaba de se enforcar. Quase sempre, depois, não reconhece o erro, passa a culpa para os outros, e até aquele que lhe deu as pérolas sobre as quais escorregou. Ele se faz de vítima e, ainda, a lição não servirá para se corrigir.
Encontra-se aquele que, para encobrir seus pecados, fala muito, com medo de ouvir a verdade. Temos outros, mais raros, treinados para ficar calados e fixar o olhar embaçado no vazio. Temos de todas as espécies, mas o cinzento em volta deles não conseguem apagar.