Extinção é não só o último romance publicado por Thomas Bernhard — embora não tenha sido provavelmente o último a ser concebido e escrito —, mas também o mais longo e aquele em que se concentram, de uma forma mais depurada e mais límpida, as ideias fundamentais do famoso escritor austríaco e se desenha com maior perfeição a sua estética literária. É assim uma espécie de cúpula do edifício de prosa narrativa por ele construído ao longo dos anos — em grande parte atormentados pela doença — da sua relativamente breve existência (1931-1989) e que constitui a parte fundamental da sua obra.
A temática de Extinção gira em torno de um palácio, Wolfsegg, centro de uma grande propriedade agrícola, e de uma família, a do narrador, Franz-Josef Murau, que das suas «origens» se afastou, para ir viver em Roma. Com a morte dos pais e do irmão num acidente de automóvel, cabe-lhe em herança Wolfsegg, de que ele acaba por fazer doação à Comunidade Israelita de Viena, uma alusão à reparação devida aos judeus depois do holocausto do período nazi. O «complexo das origens», um aspecto fundamental da vida e da obra de Bernhard, situa-se também na base deste romance. Só através da «extinção» da família e da propriedade o narrador se pode verdadeiramente encontrar consigo próprio. Esta ideia aplica-se igualmente ao nosso mundo, que só será possível mudar através da sua destruição total ou quase total, «para depois o reconstruirmos […] como um mundo completamente novo».
O radicalismo do pensamento de Bernhard, que ele próprio reconhece, classificando-se de «artista do exagero», exprime-se aqui em toda a originalidade da sua prosa, cuja estrutura musical se revela em Extinção extremamente apurada e a essa prosa transmite, mesmo no que ela às vezes parece ter de monótona, um ritmo insinuante e uma estranha fascinação.
[José A. Palma Caetano]
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Thomas Bernhard
Thomas Bernhard, um dos mais importantes romancistas e dramaturgos austríacos, nasceu em Fevereiro de 1931, em Heerlen, nos Países Baixos.
A sua mãe regressou a Viena em 1932, tendo confiado o filho aos avós. Foi assim que o autor de O Náufrago passou os primeiros anos em Seekirchen, nos arredores de Salzburgo, tendo tido uma relação feliz com o seu avô, o escritor Johannes Freumbichler.
Quando tinha sete anos, atingido já pela doença pulmonar que marcaria toda a sua vida, foi viver com a mãe para a Baviera, onde os seus avós se instalaram no ano seguinte.
Em 1942, frequentou um centro de educação nacional-socialista para crianças na Turíngia, onde sofreu graves humilhações. Em 1943, foi colocado num internato nazi em Salzburgo, aonde regressou após uma estada na Baviera.
Já depois da guerra, aos dezasseis anos, abandona os estudos liceais e emprega-se como aprendiz numa mercearia. Aí contrai uma grave pleurisia, que faz com que os médicos o considerem condenado. Abandona o hospital em 1951, mas, a partir daí, a sua vida é perturbada por operações aos pulmões e internamentos hospitalares. Após a morte do seu avô em 1949, Thomas Bernhard aproveita os períodos de internamento para escrever poesia.
Em 1950, encontra no sanatório Hedwig Stavianicek uma mulher trinta e cinco anos mais velha do que ele, que será até ao fim da vida sua companheira, apoio moral e financeiro e a primeira leitora dos seus livros.
Entre 1952 e 1954, colabora em jornais e publica os primeiros poemas, ao mesmo tempo que estuda no Conservatório de Música e Artes Dramáticas de Viena e no Mozarteum em Salzburgo (Bernhard tem uma excelente voz de barítono).
Frequenta a sociedade intelectual vienense, de que se tornará crítico impiedoso.
O êxito, em 1963, do primeiro romance, Geada, permite-lhe adquirir uma quinta em Ohlsdorf, na Alta Áustria. É nessa região que acaba por se fixar e onde escreve, embora viaje frequentemente para Portugal, Espanha, Itália, a Jugoslávia e a Turquia.
É ao longo destes anos que a sua prosa, caracterizada por longas frases, repetidas até à obsessão, como ecos variados de si próprias, de estilo polifónico, se vai definindo. É, em geral, composta por um monólogo ininterrupto, de uma personagem misantropa, que vai ajustando contas com a mediocridade, o modo de vida e as instituições da Áustria.
Entre 1975 e 1982, publica cinco volumes de pendor autobiográfico. Os seus principais romances surgem nos anos 80, como é o caso de O Sobrinho de Wittgenstein (1982), que retoma a sua experiência de internamentos hospitalares e a sua amizade com Paul Wittgenstein, e O Náufrago (1983), que aborda a vida e a morte de Glenn Gould e de Wertheimer.
Thomas Bernhard é também conhecido como dramaturgo. Ein Fest für Boris (1970), O Presidente (1975) e O Reformador (1979) causam escândalo. Um artigo sobre o teatro de Salzburgo fez com que lhe fosse movido um processo por difamação. Em 1968, o seu discurso ao receber um prémio do Estado austríaco para a literatura leva os representantes oficiais a abandonarem a sala.
Thomas Bernhard morreu em Fevereiro de 1989.
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