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Anomalias congênitas em nascidos vivos

2017, Revista Brasileira em Promoção da Saúde

Este artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições, desde que o trabalho seja corretamente citado.

e-ISSN:1806-1230 Artigo Original Anomalias congênitas em Rio Branco, Acre DOI: 10.5020/18061230.2017.6309 ANOMALIAS CONGÊNITAS EM NASCIDOS VIVOS Congenital anomalies in newborns Anomalías congénitas de nacidos vivos Andréia Moreira de Andrade Universidade Federal do Acre - UFAC - Rio Branco (AC) - Brasil Alanderson Alves Ramalho Universidade Federal do Acre - UFAC - Rio Branco (AC) - Brasil Simone Perufo Opitz Universidade Federal do Acre - UFAC - Rio Branco (AC) - Brasil Fernanda Andrade Martins Universidade Federal do Acre - UFAC - Rio Branco (AC) - Brasil Rosalina Jorge Koifman Escola Nacional de Saúde Pública - ENSP/FIOCRUZ - Rio de Janeiro (RJ) - Brasil RESUMO Objetivo: Analisar a prevalência e possíveis fatores associados às anomalias congênitas em um município do estado do Acre.Métodos: Estudo transversal, descritivo, baseado nos dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) do município de Rio Branco, Acre, Brasil, no período de 2001 a 2013. A variável desfecho foi a presença de anomalias congênitas e as variáveis independentes estavam relacionadas à mãe e ao nascido vivo. Odds Ratio (OR) e intervalos de confiança de 95% foram estimados por regressão logística. Resultados: A prevalência de anomalias congênitas esteve presente em 0,2% dos nascidos vivos no período analisado, e as mais frequentes foram: as deformidades osteomusculares (41,3%), seguidas das malformações do sistema nervoso (17,9%); observando‑se associação com a idade da mãe, <15 e ≥35 anos (OR 1,72; IC95% 1,03; 2,87), o parto cesáreo (OR 1,85; IC95% 1,29; 2,65), o menor escore de Apgar no 1º (OR 3,54; IC95% 1,69; 7,42) e 5º minutos (OR 13,65; IC95% 4,00; 46,61) e o peso ao nascer ≤1.499g (OR 5,09; IC95% 2,32; 11,19). Conclusão: A chance de apresentar anomalia congênita foi maior entre: nascidos vivos de mães muito jovens ou em idade avançada; pré‑termos com menos de 32 semanas gestacionais; nascidos de parto cesáreo; nascidos vivos que apresentaram grau de dificuldade grave para Apgar 1º e 5º; e neonatos que apresentaram extremo baixo peso. Descritores: Anormalidades Congênitas; Declaração de Nascimento; Estudos Transversais. ABSTRACT Objective: To analyze the prevalence and factors potentially associated with congenital anomalies in a municipality of the State of Acre. Methods: Descriptive cross-sectional study of data from the Live Birth Information System (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos – SINASC) of the municipality of Rio Branco, Acre, Brazil, from 2001 to 2013. The outcome variable was the presence of congenital anomalies and the independent variables were related to the mother and the live birth. Odds Ratios (OR) and Confidence Intervals of 95% were estimated by logistic regression. Results: The prevalence of congenital anomalies was 0.2% in live births in the analyzed period, and the most frequent were musculoskeletal deformities (41.3%) followed by malformations of the nervous system (17.9%); they were associated with the age of the mother <15 and ≥35 years old (OR 1.72, 95%CI 1.03, 2.87), cesarean section (OR 1.85, 95%CI 1.29, 2.65), lower Apgar score at 1 (OR 3.54, 95%CI 1.69, 7.42) and 5 minutes (OR 13.65, 95%CI 4.00, 46.61) and birth weight ≤1.499g (OR 5.09; 95%CI 2.32, 11.19). Conclusion: The chance of having congenital anomaly was higher in the live births of mothers aged <15 and ≥35 years old; preterm births with less than 32 gestational weeks; cesarean births; live births who presented a degree of severe difficulty for Apgar 1 and for Apgar 5, and neonates who presented extreme low weight. Descriptors: Congenital Abnormalities; Birth Certificates; Cross-Sectional Studies. Este artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições, desde que o trabalho seja corretamente citado. Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 Recebido em: 22/03/2017 Revisado em: 17/07/2017 Aceito em: 08/09/2017 1 Andrade AM, Ramalho AA, Opitz SP, Martins FA, Koifman RJ RESUMEN Objetivo: Analizar la prevalencia y posibles factores asociados con las anomalías congénitas de un municipio del estado de Acre. Métodos: Estudio transversal y descriptivo basado en los datos del Sistema de Informaciones sobre Nacidos Vivos (SINASC) del municipio de Rio Branco, Acre, Brasil, en el periodo entre 2001 y 2013. La variables de desfecho fue la presencia de anomalías congénitas y las variables independientes se relacionaron a la madre y al nacido vivo. Odds Ratio (OR) e intervalos de confianza del 95% fueron estimados a través de regresión logística. Resultados: La prevalencia de anomalías congénitas estuvo presente en el 0,2% de los nacidos vivos del período analizado siendo las más frecuentes: las deformidades osteomusculares (41,3%) seguidas de las malformaciones del sistema nervoso (17,9%); observándose asociación con la edad de la madre, <15 y ≥35 años (OR 1,72; IC95% 1,03; 2,87), el parto por cesárea (OR 1,85; IC95% 1,29; 2,65), la menor puntuación del Apgar en el 1º (OR 3,54; IC95% 1,69; 7,42) y 5º minutos (OR 13,65; IC95% 4,00; 46,61) y el peso al nacer ≤1.499g (OR 5,09; IC95% 2,32; 11,19). Conclusión: La oportunidad de presentar anomalía congénita fue mayor entre los nacidos vivos de madres muy jóvenes o en edad avanzada; los pre términos con menos de 32 semanas de gestación; los nacidos de parto por cesárea; los nacidos vivos que presentaron grado de dificultad grave para el 1º y 5º; y los neonatos que presentaron bajo peso extremo. Descriptores: Anomalías Congénitas; Certificado de Nacimiento; Estudios Transversales. INTRODUÇÃO As anomalias congênitas são alterações morfológicas, estruturais ou funcionais que podem ser detectadas ainda na vida intrauterina, ou após o nascimento. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), no mundo, as anomalias congênitas foram causa de morte de 303.000 nascidos vivos, ou seja, de 7% do total, durante o primeiro mês de vida(1) em 2016. Elas podem estar ligadas a fatores genéticos (anomalias cromossômicas), ambientais (teratógenos), multifatoriais ou mistos (herança genética e ambiente)(2). A exposição das gestantes a agentes teratogênicos representa de 2% a 10% dos casos de malformações congênitas. Tais agentes podem ser classificados em: agentes químicos (drogas lícitas, ilícitas e medicamentos), agentes biológicos (infecções) e agentes físicos (radiação ionizante e temperatura). É comum a associação entre dois ou mais agentes, potencializando os efeitos nocivos dos teratógenos(2,3). As ações de promoção da saúde tornam-se possíveis mediante o reconhecimento dos principais fatores associados às anomalias congênitas. A análise dos fatores de risco bem como dos fatores de proteção permitem a realização de intervenções no período pré‑concepcional e gestacional, assim como condutas durante o período do parto(2-4). Algumas anomalias congênitas são mais frequentes em determinados grupos étnicos, como é o caso da polidactilia, mais comum entre chineses e índios americanos. Outras malformações, como prega simiesca, sindactilia e dedos supranumerários, são observadas com maior frequência na população negra. Enquanto as malformações maiores e múltiplas são mais prevalentes na população branca, outros fatores de risco destacados na literatura científica incluem: idade materna avançada (>35 anos), maior número de gestações anteriores, parto cesáreo, menor duração da gestação, uso indevido de fármacos, tabagismo, consumo de bebidas alcoólicas, deficiências nutricionais, presença de doenças preexistentes, exposição ocupacional a agentes teratogênicos, condições socioeconômicas desfavoráveis, baixo peso ao nascer e menor escore de Apgar(2‑5). O Brasil, assim como outros países, instituiu alguns programas e ações preventivas de malformações congênitas. Pode-se destacar que, desde 2002, ocorre a fortificação de farinhas de trigo e milho com ácido fólico, havendo também a implementação de programas que preconizam a utilização do ácido fólico de forma adequada durante a gestação, com o objetivo de reduzir a ocorrência de defeitos na formação do tubo neural do feto(6). Entre as formas de prevenção primária, podem ser destacadas as medidas de planejamento familiar, evitando gestações inesperadas, não identificadas de forma precoce e em mulheres com idade avançada(2); a vacina contra rubéola(7); o controle da comercialização de abortivos(8); bem como campanhas para evitar hábitos maternos considerados nocivos(3). Entre as medidas secundárias estão aquelas relacionadas à detecção precoce das principais anomalias congênitas. Destaque principal para a realização de um pré‑natal adequado, em que as possibilidades de detecção são duplicadas, e para os investimentos em novas tecnologias diagnósticas na gestação, como exames de ultrassonografia obstétrica, medida de translucência nucal, cariotipagem fetal, teste de marcadores bioquímicos e o rastreamento combinado(9‑11). Com o intuito de coletar, registrar, analisar e divulgar dados sobre nascimentos, o Ministério da Saúde do Brasil (MS) instituiu, em 1990, o Sistema de Informação sobre Nascidos vivos (SINASC), cujo documento padrão é a Declaração de Nascido Vivo (DNV). Em 1999, foi inserido o campo 34, relativo às anomalias congênitas detectadas no momento do nascimento. Esse campo compõe o “bloco V ‑ recém‑nascido” e o seu adequado preenchimento permite conhecer e medir a frequência e a natureza desses eventos, elaborar indicadores demográficos e de saúde, e ainda monitorar fatores associados e exposições de risco(12). 2 Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 Anomalias congênitas em Rio Branco, Acre Não obstante a relevância de estudos sobre malformações congênitas para subsidiar políticas públicas voltadas à saúde materno‑infantil, não foram identificados estudos publicados sobre anomalias congênitas no estado do Acre. Desta forma, o presente artigo tem o objetivo de analisar a prevalência e possíveis fatores associados às anomalias congênitas em um município do estado do Acre. MÉTODOS Trata‑se de um estudo transversal, retrospectivo e descritivo, baseado nos dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) do município de Rio Branco, Acre, Brasil, no período de 2001 a 2013. Os dados foram obtidos nas Declarações de Nascidos Vivos, por meio do SINASC, disponíveis no site do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS/MS). Realizou‑se a extração dos dados no sistema de informações entre os meses de maio e junho de 2015. A seleção do período de estudo deu-se em virtude da última atualização anual do sistema, que disponibilizou os dados referentes a 2013. Rio Branco é a capital do estado do Acre e constitui seu maior centro populacional, comercial, cultural e industrial. Em 2010, obteve o maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado (0,727), inferior ao índice nacional (0,755). Em 2016, possuía população estimada em 377.057 habitantes, que correspondia a 47,3% do total da população do Acre. No mesmo ano, 89,4% da população de Rio Branco residia em zona urbana, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(13). Para a coleta dos dados, utilizaram‑se os seguintes passos: Acesso ao domínio http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index. php?area=0901 → Arquivo de dados → SINASC → Modalidade de arquivo “Dados” → Tipo de arquivo “DN - Declarações de Nascidos Vivos” → Ano “2001-2013” → UF “AC” → Enviar). Os dados foram extraídos em arquivo com formato “.dbc” e especificados por ano de nascimento, os quais foram exportados para o Excel em formato “.xlsx”, onde ocorreu o agrupamento e compatibilização entre as variáveis. Obteve‑se a variável dependente, “presença ou ausência de anomalias congênitas”, a partir do campo 34 da DNV. Quando presente, a anomalia foi classificada utilizando‑se códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais. É atribuída uma categoria única a cada estado de saúde, correspondente a um código com até seis caracteres, sendo denominada Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, relacionada à décima revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID‑10) publicada pela OMS, a qual é utilizada globalmente para estatísticas de morbidade e mortalidade. As variáveis independentes foram aquelas relativas: às anomalias congênitas, à mãe (escolaridade, estado civil, idade, paridade); à gestação atual (tipo da gestação, número de consultas de pré‑natal e duração da gestação); ao parto (ano, local e tipo de parto) e ao nascido vivo (Apgar no 1º e 5º minutos, sexo, cor de pele e peso ao nascer). Utilizando a literatura científica como parâmetro, as variáveis foram assim descritas: local de realização do parto (hospital, domicílio, e outros); idade da mãe (até 19 anos, 20 a 34 anos, ≥35anos); situação conjugal da mãe (com ou sem companheiro); escolaridade da mãe (sem escolaridade, 1 a 9 anos de estudo, 10 a 13 anos de estudo, 14 a 16 anos de estudo, 17 ou mais anos de estudo); duração da gestação (até 27, de 28 a 31, de 32 a 36, de 37 a 41 e 42 ou mais); tipo de gestação (única e gemelar); número de consultas pré‑natais (nenhuma, 1 a 3, 4 a 6, 7 ou mais); tipo de parto (vaginal ou cesáreo); número de filhos vivos (nenhum, 1 a 3 filhos, 4 ou mais); número de filhos mortos (nenhum, 1 a 2 filhos, 3 ou mais); sexo do nascido vivo (masculino e feminino); raça/cor de pele do nascido vivo (branca, preta, amarela, parda e indígena). Na análise de regressão logística, incluiu‑se apenas as variáveis com completude acima de 75%(14). Para efeito de análise, as seguintes variáveis foram agrupadas e recategorizadas: idade da mãe dividida em duas categorias (de 15 a 34 anos e de < 15 e ≥ 35 anos) e presença de anomalia congênita de acordo com os sistemas orgânicos acometidos (malformações sistema nervoso (Q00‑Q07); do olho, ouvido, face e pescoço (Q10‑Q18); do aparelho circulatório (Q20‑Q28); do aparelho respiratório (Q30‑Q34); fenda labial e fenda palatina (Q35‑Q37); outras malformações aparelho digestivo (Q38‑Q45); malformações dos órgãos genitais (Q50‑Q56); malformações e deformidades osteomusculares (Q65‑Q79); outras malformações congênitas (Q80‑Q89); anomalias cromossômicas (Q90‑Q99)). A escolaridade materna encontra-se agrupada segundo anos de estudo. Para a Escala de Apgar e o peso ao nascer, utilizouse os critérios da OMS, os quais são adotados pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde – DATASUS e estão disponíveis em: www.datasus.gov.br/cid10/V2008/WebHelp/definicoes.htm, considerando que o Apgar se divide em: ótimas condições (8 a 10), dificuldade leve (7), moderada (4 a 6), grave (1 a 3), e o peso ao nascer é classificado como extremo baixo peso (até 999g), muito baixo peso (1000g a 1499g), baixo peso (1500g a 2499g) e peso normal (≥ 2500g). Para a classificação em anomalias maiores e menores, utilizou‑se como parâmetro a lista de malformações elaborada pelo European Surveillance of Congenital Anomalies (EUROCAT), seguindo o critério de nível de comprometimento médico, funcional e cosmético. As anomalias cromossômicas foram incluídas como defeitos maiores(15). Os dados foram analisados utilizando-se o programa Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS), versão 22.0. A análise dos dados se deu por regressão logística bivariável e múltipla. Para compor o modelo de regressão logística múltipla, foram selecionadas as variáveis que, na análise simples, apresentaram p< 0,20. Utilizou‑se o método stepwise forward para Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 3 Andrade AM, Ramalho AA, Opitz SP, Martins FA, Koifman RJ entrada das variáveis, em que se inicia o modelo apenas com a constante e depois se adicionam as variáveis independentes uma a uma, com base em critérios específicos, em que a variável com escore mais significativo é adicionada ao modelo. Sendo assim, o modelo foi ajustado segundo a estatística do teste da razão de verossimilhança, sendo mantidas apenas aquelas variáveis que mantinham o modelo mais parcimonioso, isto é, o modelo que envolvia o mínimo de parâmetros possíveis a serem estimados que explicassem bem o comportamento da variável resposta. As medidas de associação encontram-se estimadas por Odds Ratios brutas e ajustadas com intervalos de confiança de 95% (p<0,005). Considerando a Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que trata das pesquisas que utilizam as informações de acesso público e irrestrito, nos termos da Lei nº 12.527 de 18 de novembro de 2011, e considerando ainda que foram utilizadas informações de banco de dados secundários, sem possibilidade de identificação individual, este estudo dispensou registro e avaliação no sistema CEP/CONEP. RESULTADOS No período de 2001 a 2013, de um total de 110.946 nascidos vivos no município de Rio Branco, 0,2% tiveram alguma anomalia congênita, 57.197 (51,6%) eram do sexo masculino e 16 casos (0,01%) foram classificados como sexo indeterminado. A maior prevalência de anomalias congênitas (0,4%) ocorreu no ano de 2004, e a menor, de 0,1%, no ano de 2011 (Tabela I). Tabela I ‑ Prevalência de anomalias congênitas em nascidos vivos segundo o ano de nascimento. Rio Branco, Acre, 2001 ‑ 2013. Ano de nascimento Número de partos 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 Total 8202 8500 8509 8180 8502 8322 8268 8670 8146 8173 7889 5573 7309 104243 Prevalência de anomalia congênita n % 21 0,3 27 0,3 17 0,2 35 0,4 15 0,2 14 0,2 17 0,2 10 0,1 9 0,1 18 0,2 8 0,1 12 0,2 14 0,2 217 0,2 Na população de estudo, a idade das mães variou de 11 a 60 anos, sendo que 26,8% (29.781) tinham até 19 anos, 66,1% (73.337) tinham de 20 a 34 anos e 7,1% (7.821) apresentaram idade igual ou superior a 35 anos. Enquanto 6,1% das mulheres tiveram nascidos vivos pré‑termo, 41,3% declararam ter feito de 4 a 6 consultas de pré‑natal, 3,7% declararam não ter realizado nenhuma consulta e 99,7% dos partos foi realizado em ambiente hospitalar. O peso médio dos nascidos vivos foi de 3.199g (DP=557g), mas 8,5% deles estavam com peso abaixo de 2.500g (Tabela II). Tabela II - Distribuição dos nascidos vivos segundo variáveis socioeconômicas e demográficas, características maternas e do pré‑natal, e do parto das parturientes. Rio Branco, Acre, 2001 ‑ 2013. Variável Local de realização do parto Hospital Domicílio Outros Idade da mãe Até 19 anos 20-34 anos ≥ 35 anos Situação conjugal da mãe Com companheiro Sem companheiro 4 n % 110.658 260 28 99,7 0,2 0,1 29.781 73.337 7.821 26,8 66,1 7,1 77.246 30.219 71,8 28,2 Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 Anomalias congênitas em Rio Branco, Acre Escolaridade da mãe Sem escolaridade 1 a 9 anos de estudo 10 a 13 anos de estudo 14 a 16 anos de estudo 17 ou mais anos de estudo Duração da gestação (semanas) Até 27 28 a 31 32 a 36 37 a 41 42 e mais Tipo de gestação Única Gemelar Número de consultas pré-natal Nenhuma 1a3 4a6 7 e mais Tipo de parto Vaginal Cesáreo Número de filhos vivos Nenhum 1 a 3 filhos 4 ou mais filhos Número de filhos mortos Nenhum 1 a 2 filhos 3 ou mais filhos Sexo do nascido vivo Masculino Feminino Raça/Cor da pele do nascido vivo Branca Preta Amarela Parda Indígena Escala de Apgar 1 Ótimas condições (8 a 10) Dificuldade leve (7) Dificuldade moderada (4 a 6) Dificuldade grave (1 a 3) Escala de Apgar 5 Ótimas condições (8 a 10) Dificuldade leve (7) Dificuldade moderada (4 a 6) Dificuldade grave (1 a 3) Peso ao nascer Extremo baixo peso (até 999g) Muito baixo peso (1000g a 1499g) Baixo peso (1500g a 2499g) Peso normal (≥ 2500g) Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 3.165 14.001 28.942 36.966 26.595 2,9 12,8 26,4 33,7 24,3 476 1.201 4.940 99.951 1.286 0,4 1,1 4,6 92,6 1,2 108.904 1970 98,2 1,8 4.109 20.034 45.308 40.248 3,7 18,3 41,3 36,7 67.038 43.810 60,5 39,5 18.107 59.460 11.192 20,4 67,0 12,6 61.983 12.202 818 82,6 16,3 1,1 57.197 53.733 51,6 48,4 9.744 437 194 94.278 294 9,3 0,4 0,2 89,8 0,3 78.375 3.834 2.096 1.012 91,9 4,5 2,5 1,2 83.760 657 401 544 98,1 0,8 0,5 0,6 586 855 8.023 101.349 0,5 0,8 7,2 91,5 5 Andrade AM, Ramalho AA, Opitz SP, Martins FA, Koifman RJ Do total, 7,0% dos nascidos vivos apresentaram mais de um tipo de anomalia, sendo as mais frequentes as malformações e deformidades osteomusculares (41,3%), malformações do sistema nervoso (17,9%), malformações dos órgãos genitais (8,9%) e anomalias cromossômicas (8,1%) (Tabela III). O não preenchimento do campo correspondente às anomalias congênitas ocorreu em 6.703 (6,0%) das DNVs. O campo relativo à presença de filhos mortos e vivos em gestações anteriores não foi preenchido em 32,4% e 20,0% das declarações respectivamente. As demais variáveis apresentaram incompletude abaixo de 3,0%. Tabela III ‑ Caracterização das anomalias congênitas em nascidos vivos. Rio Branco, Acre. 2001‑2013. (n=104.026) Variável n % Malformações sistema nervoso (Q00‑Q07) Malformações olho, ouvido, face e pescoço (Q10‑Q18) Malformações aparelho circulatório (Q20‑Q28) Malformações aparelho respiratório (Q30‑Q34) Fenda labial e fenda palatina (Q35‑Q37) Outras malformações aparelho digestivo (Q38‑Q45) Malformações órgãos genitais (Q50‑Q56) Malformações e deformidades osteomusculares (Q65‑Q79) Outras malformações congênitas (Q80‑Q89) Anomalias cromossômicas (Q90‑Q99) Número de anomalias por nascido vivo 42 7 2 3 13 18 21 97 13 19 17,8 3,0 0,9 1,3 5,5 7,7 8,9 41,3 5,5 8,1 Uma Duas Três Quatro Categoria das anomalias por nascido vivo 202 13 1 1 93,0 6,0 0,5 0,5 177 58 75,3 24,7 Classificação das anomalias (CID 10)* Maiores Menores *CID 10: Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde CID‑10. A chance de apresentar anomalia congênita foi maior entre os nascidos vivos de mães com idade <15 e ≥35 anos (OR 1,54; IC95% 1,03; 2,32); pré‑termo (OR 3,63; IC95% 2,38; 5,53) nascidos com 32 a 36 semanas de gestação (OR 9,15; IC95% 5,89; 14,20); com menos de 32 semanas gestacionais (OR 3,63; IC 2,38; 5,53); para nascidos de parto cesáreo (OR 2,05; IC95%1,56; 2,68); entre os nascidos vivos que apresentaram grau de dificuldade grave para Apgar I (OR 13,30; IC95%8,15; 21,70) e para Apgar 5 (OR 18,66; IC95%11,19; 31,12); e entre os neonatos que apresentaram extremo baixo peso (OR 14,17; IC95% 9,43; 21,29). A chance da anomalia foi menor entre as mães com maior número de filhos vivos (OR 0,89; IC95% 0,80; 0,99) (Tabela IV). Após regressão logística, na análise ajustada, as variáveis “idade da mãe”, “tipo de parto”, “escala de Apgar do 1º e 5º minuto” e “peso ao nascer” permaneceram associadas e mantiveram‑se estatisticamente significantes, enquanto que o sexo do nascido vivo e número de filhos vivos perderam a significância estatística, porém foram mantidos no modelo por ajustarem‑ no melhor, uma vez que a inserção das referidas variáveis diminui substancialmente o valor da razão de verossimilhança do modelo, aumentando seu poder de explicação. 6 Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 Anomalias congênitas em Rio Branco, Acre Tabela IV ‑ Prevalência, análise bruta e ajustada dos fatores associados às anomalias congênitas. Rio Branco, Acre. 2001 ‑ 2013. (n=110.946). Variável Idade da mãe 15 a 34 anos < 15 e ≥ 35 anos Estado civil da mãe Com companheiro Sem companheiro Escolaridade da mãe Até 13 anos de estudo De 14 ou mais anos de estudo Duração da gestação ≥ 37 semanas 32 a 36 semanas < 32 semanas Tipo de gestação Única Gemelar Número de consultas pré-natal 7 e mais 4a6 ≤a3 Tipo de parto Vaginal Cesáreo Sexo do nascido vivo Feminino Masculino Escala de Apgar 1 Ótimas condições Dificuldade leve Dificuldade moderada Dificuldade grave Escala de Apgar 5 Ótimas condições Dificuldade leve Dificuldade moderada Dificuldade grave Peso ao nascer ≥ 2.500g 1.500 a 2.499g ≤ 1.499g Número de filhos vivos Variável contínua Prevalência n % OR(Bruta) IC95% Valor pa OR(Ajust) IC95% 0,038 0,032 190 27 0,2 0,3 1 1,54 (1,03;2,32) 143 65 0,2 0,2 1 1,13 (0,84;1,51) 122 92 0,2 0,2 1 0,95 (0,73;1,25) 162 25 23 0,1 0,6 1,5 1 3,63 (2,38;5,53) 9,15 (5,89;14,20) 213 4 0,2 0,2 1 1,06 (0,39;2,86) 0,405 Valor pb 1 1,72 (1,03;2,87) 0,760 0,001 77 81 55 0,2 0,1 0,2 0,901 0,426 1 0,92 (0,67;1,26) 1,16 (0,82;1,64) 0,001 93 124 0,1 0,3 1 2,05 (1,56;2,68) 87 118 0,1 0,2 1 1,27 (0,96;1,68) 115 11 27 19 0,1 0,3 1,4 2,0 1 1,93 (1,04;3,58) 9,12 (5,98;13,9) 13,3 (8,15;21,7) 138 7 11 0,2 1,2 2,9 1 6,86 (3,19;14,72) 17,45 (9,3632,54) 17 3,2 18,66(11,19;31,12) 152 37 28 0,1 0,5 2,2 1 3,12 (2,17;4,47) 14,17 (9,43;21,29) - - 0,89 (0,80;0,99) 0,084 0,001 1 1,85 (1,29;2,65) 0,060 1 1,41 (0,98;2,02) 0,001 0,003 1 1,67 (0,80;3,49) 3,54 (1,69;7,42) 1,12 (0,33;3,81) 0,001 0,001 1 1,47 (0,45;4,83) 4,99 (1,80;13,79) 13,65 (4,00;46,61) 0,001 0,001 1 2,64 (1,60;4,35) 5,09 (2,32;11,19) 0,064 0,95 (0,84;1,06) 0,373 a) Teste do Qui‑quadrado de Pearson. b) Teste do Qui‑quadrado de Wald. DISCUSSÃO Verificou‑se, por meio da presente investigação, que 0,2% dos nascidos vivos em Rio Branco, Acre, no período compreendido entre 2001 e 2013, apresentaram alguma anomalia congênita. Os principais fatores associados encontrados: idade da mãe <15 e ≥35 anos, prematuridade, baixo peso ao nascer, menores escores de Apgar para o 1º e 5º minuto, parto cesariana e se eram mães com maior número de filhos vivos. Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 7 Andrade AM, Ramalho AA, Opitz SP, Martins FA, Koifman RJ A prevalência de anomalias congênitas encontrada no presente estudo apresenta percentual menor em comparação com outras pesquisas nacionais e internacionais(4,5,16‑19), o que pode ser atribuído à possível subnotificação, pautada nas discussões sobre a detecção da anomalia no momento do nascimento, uma vez que existem dificuldades em se detectar anomalias como malformações cardíacas e do sistema digestivo quando comparadas àquelas visíveis, tais como as do sistema genital e osteomusculares. Outro aspecto relevante para a complexidade é a descrição específica da anomalia, que exige dos profissionais o conhecimento e dedicação em descrevê‑la utilizando como base o segundo e terceiro dígito do CID‑10. Esses aspectos foram analisados por estudos que apontam para resultados com variações a depender do tipo de instituição de nascimento, profissional responsável pelo preenchimento da DNV, treinamento e capacitação da equipe(12,16,20‑22). No Rio de Janeiro, os pesquisadores encontraram uma prevalência de anomalias congênitas de 0,8% entre 2000 e 2006, e a mesma prevalência aparece em outro estudo que abordou os anos de 2000 a 2004 no mesmo município(17,23). No Vale do Paraíba Paulista, a prevalência foi de 1,5% em 2003 e 2004(4). Um estudo desenvolvido em São Luís do Maranhão apresentou uma prevalência de 0,4% entre os anos de 2002 a 2011(5). Segundo dados do Estudio Colaborativo Latinoamericano de Malformaciones Congénitas (ECLAMC), a prevalência de anomalias congênitas no Chile foi de 3,9% no período de 2001 a 2010(24). Outro estudo desenvolvido utilizando a mesma base de dados do ECLAMC, no período de 1995 a 2008, comparou as prevalências em todos os países latino‑americanos participantes do grupo, obtendo‑se a prevalência global de 2,6%, tendo o Brasil como líder (4,0%), seguido por Chile (3,1%), Uruguai (2,4%), Venezuela (2,3%), Paraguai e Argentina (2,2%), Colômbia (1,8%), Bolívia (1,7%) e Equador (1,4%)(18). No México, utilizando o sistema de registro de nascidos vivos, nos anos de 2009 e 2010, obteve‑se a prevalência de anomalias congênitas de 0,7%(19). Existem controvérsias na classificação das anomalias sob o critério de maiores e menores, pois se entende que a mais simples das anomalias pode trazer consequências extremamente relevantes ao seu portador, e vários centros de pesquisa consideram essa classificação dismorfologicamente incorreta, limitada e excludente(15). Contudo o presente estudo classificou as anomalias de forma descritiva, com o intuito de discutir não o mérito da classificação em maior ou menor, mas apontar que, por meio da DNV, são descritas principalmente as anomalias mais graves e perceptíveis no momento do nascimento, uma vez que 75,3% das anomalias foram classificadas como maiores, retomando dúvidas e questionamentos quanto à subnotificação de defeitos congênitos considerados menores no nascimento(15,21,23). As maiores prevalências, encontradas nos anos de 2001, 2002 e 2004, refletem o impacto da inserção do Campo 34 da DVN, que ocorreu em 1999, pois, após esse período, treinamentos e capacitações foram realizadas oportunizando a identificação e descrição das anomalias congênitas no nascimento de forma mais apurada(12). Dessa forma, deve‑se atentar ao analisar um aumento ou associação de um desfecho quando se trata de uma série histórica que sofreu interferência de uma nova política pública, como foi o caso da inserção do campo 34 na DNV. Sendo assim, alguns estudos de séries temporais interrompidas têm ganhado força entre as publicações cientificas(25). Os achados do presente estudo apontam para associação entre a idade da mãe e a ocorrência da anomalia congênita. Estudos destacam a idade materna como fator de risco para o desenvolvimento e agravamento dos casos de anomalias congênitas. Para mães muito jovens, no caso de adolescentes (entre 10 e 19 anos segundo a OMS), há risco aumentado para malformações osteomusculares, do sistema nervoso e também para as provocadas por fatores externos, tais como o uso indevido de medicamentos destinados ao abortamento(5,8,24,26,27). Observa‑se uma forte associação ao aparecimento de anomalias cromossômicas em nascidos vivos de mulheres após os 35 anos, e outras relacionadas à morbidades crônicas maternas preexistentes, como hipertensão arterial e diabetes, que aparecem relacionadas às anomalias cardíacas congênitas, permanecendo indefinido se a anomalia está relacionada à presença ou ao tratamento contínuo da doença(28,29). No presente estudo, não foi encontrada associação entre anomalias congênitas e o uso de bebidas alcoólicas e tabaco pela mãe durante a gestação, porém esses são fatores maternos que estão sendo apresentados pela literatura como potencial de risco para presença de anomalias, em especial para fissuras labiopalatinas(3,9,26‑29). Uma variável do presente estudo que não apresentou associação com a ocorrência de anomalias congênitas em Rio Branco foi o nível de escolaridade materna, em discordância com os achados de outros estudos nacionais e no restante da América Latina(4,18,19,24). Essa variável é citada como fator de proteção tanto para a identificação quanto para minimizar as sequelas das anomalias congênitas. Discute‑se a escolaridade relacionada aos determinantes sociais, uma vez que mulheres com maior nível de escolaridade geralmente pertencem a uma seleta camada social, com melhores condições econômicas e de acesso aos serviços de saúde, hábitos alimentares mais saudáveis e maior capacidade interpretativa de riscos potenciais durante o período gestacional(14,26). Na mesma perspectiva dos determinantes sociais, enquadra-se o estado civil da mãe, em que mulheres com estabilidade conjugal atingem padrões benéficos que vão desde a redução do risco reprodutivo (número de parceiros e doenças transmissíveis como sífilis), até melhores condições de segurança alimentar por possuírem renda familiar somada a do parceiro(4,17,24,27). Os fatores relacionados à gestação e ao parto geralmente são descritos como fatores de risco para esse desfecho em específico, mas os dados devem ser cuidadosamente discutidos, uma vez que existem aspectos limitantes ao se determinar tais associações. Um desses fatores é a duração do período gestacional. A presente investigação, concordando com outras(2,4,17), apresentou maior ocorrência de anomalias congênitas entre as mulheres com menor período gestacional. Tal fato pode ocorrer em casos nos quais a identificação da anomalia congênita ocorre ainda na vida intrauterina e há a interrupção da gestação para intervenções no quadro da anomalia, ou em casos em que a própria anomalia seja o fator comprometedor do desenvolvimento do 8 Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 Anomalias congênitas em Rio Branco, Acre feto e desencadeie o parto prematuro(4). Nessa mesma linha de raciocínio, enquadra-se o tipo de parto, uma vez as interrupções são geralmente realizadas por partos cirúrgicos e outros fatores, também considerados de risco, como idade da mãe, morbidades preexistentes e detecção precoce de anomalias, determinam a realização de cesarianas(2,4,17,18). No presente estudo, o tipo de parto apresentou associação e manteve‑se no modelo final. Ao se direcionar a discussão para as características do nascido vivo, a literatura relata maior identificação de anomalias entre os neonatos do sexo masculino(2,4,10,17). Os achados do estudo em questão apontam na mesma direção, porém não se manteve estatisticamente significante após análise ajustada para sexo. Considerando que, em 16 casos de anomalias classificadas como sendo do aparelho genital, não foi possível identificar o sexo do nascido vivo, esse número pode estar influenciando o direcionamento desta análise, tendo em vista o número total de casos no presente estudo. Muito se discute(4,5,17) sobre a maior ocorrência de anomalias entre os nascidos vivos do sexo masculino, pois sabe-se que algumas anomalias, principalmente as cromossômicas, são por natureza mais frequentes entre esses indivíduos. Dessa forma, quando se insere as anomalias cromossômicas junto ao total de anomalias congênitas, deve‑se ter cautela em analisar as possíveis associações com o sexo do nascido vivo. Os fatores associados às malformações congênitas encontrados no atual estudo, índices de Apgar do 1º e 5º minuto e peso ao nascer, corroboram outros estudos(4,5), sendo maior a chance da anomalia congênita ocorrer entre os nascidos vivos com índice de Apgar classificado com grau de dificuldade grave ou moderado, tanto para o 1º quanto para o 5º minuto, e essa associação foi confirmada após ajuste, permanecendo estatisticamente significante. Sabe‑se que algumas anomalias, principalmente as associadas ao sistema circulatório e respiratório, comprometem funções vitais do nascido vivo, sendo utilizadas como parâmetros principais para avaliação do Apgar de 1º e 5º minuto. Portanto, um nascido vivo que apresente uma anomalia de origem circulatória ou respiratória também poderá apresentará menores índices de Apgar(2,5,27). A chance de anomalias congênitas no presente estudo foi maior à medida que ocorreu redução do peso ao nascer quando comparada aos nascidos vivos com peso normal, e essa variável manteve‑se com significância estatística mesmo após análise ajustada. Inúmeros estudos relatam que a associação e a fundamentação são pautadas geralmente na relação com a prematuridade e com o retardo no desenvolvimento fetal devido à anomalia em questão. O baixo peso ao nascer aparece associado às doenças cardíacas congênitas, aos defeitos osteomusculares e em algumas encefalopatias(2,5,26). Entre as anomalias predominantes, estão as relacionadas às malformações e às deformidades osteomusculares, seguidas daquelas do sistema nervoso central, do aparelho geniturinário e anomalias cromossômicas. Os dados do presente estudo coincidem com os encontrados em outros dois estudos realizados, um no Rio de Janeiro(17) e outro que compara diversos países da América Latina(18). As deformidades osteomusculares, as anomalias do sistema nervoso central e geniturinário se destacam, visto que são passiveis de serem identificadas no momento do nascimento e, em alguns casos, são identificadas mesmo durante o pré‑natal, na realização de exames como ultrassonografia morfológica e medida de translucência nucal, possibilitando um diagnóstico pós-parto mais preciso(2,16). Entendendo a promoção da saúde como um conjunto de estratégias e formas de produzir saúde, no âmbito individual e coletivo, visando atender às necessidades sociais de saúde e garantir a melhoria da qualidade de vida da população(30), torna-se importante inserir a prevenção às anomalias congênitas como uma ação viável e efetiva, uma vez que podem ser implementadas estratégias de atenção primária baseadas em evidências, tanto para reduzir os fatores de risco quanto para propagarem os fatores e comportamentos de proteção em nível individual e coletivo(31). Destaca‑se que, entre as principais ações de prevenção primária baseada em evidências, direcionadas principalmente para famílias com mulheres em idade fértil, encontra‑se o uso profilático de suplementos (ferro e ácido fólico) no período pré‑ concepcional, a manutenção da saúde reprodutiva do casal e as atividades de planejamento familiar(32). Em relação ao atendimento às ações previstas nos protocolos de atendimento às gestantes, o estreitamento entre a teoria e a prática nas unidades básicas de saúde incluem: avaliação risco‑benefício em casos de necessidade terapêutica; políticas de vacinação; evitar a exposição a fatores de risco ambientais; identificação de fatores de predisposição genética; bem como o empoderamento das mulheres em suas escolhas de estilo de vida, constituem estratégias para o enfrentamento e a redução nos casos de anomalias congênitas na população(32,33). Apesar das informações do SINASC serem de domínio público irrestrito, estando disponíveis para toda a população, observou‑se no presente trabalho a escassez de estudos no estado do Acre. Destaca‑se a importância de serem desenvolvidos outros estudos com os dados que coletados disponíveis e que carecem de serem utilizados na construção coletiva do conhecimento, bem como para as estratégias de gestão do sistema de saúde. Pesquisadores(12,16,21,22) concordam com a exigência de melhores padrões para a confiabilidade e consistência dos dados relativos ao campo 34 da DNV, uma vez que as suspeitas de subnotificações são cada vez mais evidentes e há a necessidade de treinamento e conscientização do profissional para o adequado preenchimento e detalhamento dos dados, de forma que sugere‑ se o desenvolvimento de outros estudos que possibilitem reduzir/sanar os fatores limitantes da presente pesquisa. As possíveis limitações da atual pesquisa são aquelas relativas aos estudos de delineamentos transversais com dados secundários, que dependem da qualidade dos mesmos, pautada pela confiabilidade e a completitude, dada a possibilidade da ocorrência de falhas no preenchimento da DNV, que geralmente são atribuídas à baixa valorização e utilização da informação Rev Bras Promoç Saúde, Fortaleza, 30(3): 1-11, jul./set., 2017 9 Andrade AM, Ramalho AA, Opitz SP, Martins FA, Koifman RJ produzida, treinamento insuficiente dos profissionais, assim como dos técnicos administrativos, na alimentação do banco de dados, além de registros incompletos nos prontuários, pois muitas malformações congênitas podem não ser detectadas no momento do nascimento e, por conseguinte, não serem incluídas no SINASC. Cabe ressaltar a causalidade reversa, em que não é possível determinar causa e consequência dos fatos. Considerando os achados do atual estudo, espera-se fornecer subsídios para melhoria da qualidade da informação do SINASC no município de Rio Branco, Acre, e na região Norte do Brasil como um todo, bem como incentivar a utilização do sistema para monitoramento das condições de saúde materna e infantil. O conhecimento da prevalência e dos fatores associados aos casos de anomalias congênitas no município poderá ser útil para o planejamento de ações e serviços de saúde, implementando novos métodos diagnósticos, direcionando o acompanhamento pré‑natal para gestantes de risco (< 15 e ≥ 35 anos) e instituindo medidas de prevenção e de rastreamento que possibilitem intervenções quando necessárias. CONCLUSÃO No município investigado, a chance de apresentar anomalia congênita foi maior entre: nascidos vivos de mães de idade <15 e ≥35 anos; pré‑termos com menos de 32 semanas gestacionais; nascidos de parto cesáreo; os que apresentaram grau de dificuldade grave para Apgar 1º e para Apgar 5º minuto; e neonatos que apresentaram extremo baixo peso. REFERÊNCIAS 1. World Health Organization. Congenital anomalies. Fact sheet 370. [acesso em 2015 Fev 18]. Disponível em: http://www. who.int/mediacentre/factsheets/fs370/en/ 2. Fontoura FC, Cardoso MVLML. Association between congenital malformation and neonatal and maternal variables in neonatal units of a Northeast Brazilian city. Texto & Contexto Enferm. 2014;23(4):907‑14. 3. Cisneros Domínguez G, Bosch Núñez AI. Alcohol, tabaco y malformaciones congénitas labioalveolopalatinas. MEDISAN. 2014;18(9):1293‑7. 4. Pinto CO, Nascimento LFC. Estudo de prevalência de defeitos congênitos no Vale do Paraíba Paulista. 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