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Psicologia Pedagógica - Vigotski - Ed. comentada completo

• DCBA E d iç ã o C o m e n ta d a zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXW Licv . Semionovich ~f,J)· ki ~ ' 1 9 ,Q ts ,. 1 Organização, prefácio, comentários e notas G u ille n n o B la n c k Apresentação R ené van der V eer Introdução M a r io C a r r e te r o P S IC O L O G IA . P E D A G Ó G IC A --------- zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA para Proteção d o s D ir e ito s A s s o c ia ç ã o B r a s ile ir a a E d ito r ia is e A u to r a is RESPEITE NAO O AUTOR FACA COPIA DCBA www.abpdea.org.br V691p Vigotski, Liev Semionovich Psicologia Pedagógica / Liev Semionovich Vigotski; trad. Claudia Schilling - Porto Alegre: Artmed, 2003. 1. Psicologia pedagógica - Vigotski. L Título. CDU 37.013.77(Vigotski) Catalogação na publicação: Mônica Ballejo Canto - CRB 10/1023 ISBN 85-363-0047-7 P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Edição Comentada L iev S em io n o v ich V ig o tsk i Organização, prefácio, comentários e notas: Guilhermo Blanck Apresentação: René van der Veer Introdução: Mario Carretero Tradução: Claudia Schilling Consultoria, supervisão e revisão técnica desta edição: Edival Sebastião TeixeiraZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P s ic ó lo g o ) P r o fe s s o r M e s tr e em de P s ic o lo g ia do E d u c a ç ã o p e la U N E S ~ C E F E T /P R - U n id a d e D o u to r a n d o e A R lM :D EOIIORA 2003 em de E ducação P a to B r a n c o . p e la U S P . WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA publicada sob o títuloZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA um c u r s o b r e v e Obra originalmente P s ic o lo g ía p e d a g ó g ic a : © Aique Grupo Editor S.A., 2001 1WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Capa I M á r io Preparação M a r ia R b h n e lt do original L ú c ia B a r b a r á Leitura final F a b ia n a C a r d o s o F id e lis Supervisão M ô n ic a editorial B a lle jo C a n to Projeto e editoração A rm azém Reservados D ig ita l E d ito r a ç ã o E le tr ô n ic a - rcm v todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, ARTMED® EDITORA S.A. Av. Jerônimo de Ornelas, 670 - Santana 90040-340 Porto Alegre RS Fone: (51) 3330-3444 Fax: (51) 3330-2378 É proibida à a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na Web e outros), sem permissão expressa da Editora. SÃO PAULO Av. 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Por isso, a obra trata de tantos temas significativos para os pronoção sugere que a atividade conjunta com colegas mais capazes é essencial para o desenfessores. Vigotski fala da educação moral e estética, da necessidade de instruir as crianças volvimento cognitivo e que as crianças difesobre questões sexuais, da vantagem dos colérem em sua habilidade de tirar partido dessa gios mistos e de muitos outros temas afins. Na cooperação. Na década de 20, a concepção de escolha de seus temas e no nível de seu trataVigotski sobre o papel da educação no desenmento, P s i c o l o g i a p e d a g ó g i c a não difere muito volvimento cognitivo era um pouco diferente. Em P s i c o l o g i a p e d a g ó g i c a , ele sugere que o prodos livros de texto utilizados hoje em dia nos fessor tem de criar as circunstâncias e as concursos de introdução à psicologia nas univerdições ideais mais propícias para que a aprensidades européias e norte-americanas. Entretanto, muito mais que nos textos atuais, P s i c o dizagem se realize; porém, em última instânl o g i a p e d a g ó g i c a exprime um p o n t o d e v i s t a p e s cia, a criança é que deve aprender com suas Essa visão pessoal s o a l sobre essas questões. próprias atividades. De alguma maneira funnos permite comparar o pensamento de damental, as crianças educam-se a si mesmas. Vigotski com o de seus contemporâneos, bem Os pontos de vista de Vigotski sobre a como percorrer o caminho do desenvolvimeneducação e o desenvolvimento cognitivo nas to de seu próprio pensamento. Por isso, podedécadas de 20 e de 30 podem ser básica e commos ler este livro levando em conta pelos mepletamente compatíveis. No entanto, é evidente nos dois aspectos. Em primeiro lugar, consideque eles apresentam uma diferença de ênfase. O Vigotski dos anos 30 parece dar mais imporrando-o um resumo de todo o conhecimento psicológico significativo para a educação da tância à cooperação que o dos anos 20. Tais questões devem ser discutidas mais detalhadécada de 1920; em segundo lugar, como um damente para se compreender o desenvolvidocumento que mostra as concepções de Vigotski sobre áreas específicas em um períomento do pensamento de Vigotski e também porque são muito importantes e vigentes. Fedo particular de seu desenvolvimento intelectual. Um exemplo disso poderia ser a conceplizmente, a publicação de P s i c o l o g i a p e d a g ó g i ca nos permite abordar tanto essas questões ção de Vigotski sobre a educação. quanto outras afins. Em seus anos mais tardios, na década de A versão em espanhol de P s i c o l o g i a p e d a 30, Vigotski formulou a noção de que a educag ó g i c a foi redigida e anotada pelo Dr. Guillermo ção conduzia ao desenvolvimento e introdu-baZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA v i baZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A P R E S E N T A Ç Ã O zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA vos. Isso pode ser apreciado facilmente no caso Blanck, um dos historiadores da psicologia que da presente edição de P s i c o l o g i a p e d a g ó g i c a . O mais entende da questão. Como tal, ele pertexto original de Vigotski tornou-se relativatence a uma espécie em perigo e quase em mente difícil para sua compreensão cabal, pois extinção. De um ponto de vistaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA q u a n tita tiv o , os historiadores da psicologia são muito estrao leitor atual não conhece muito da psicologia, filosofia e medicina dos anos 20. Apesar nhos. Lêem centenas de livros para produzir disso, Blanck foi capaz de acrescentar ao texto apenas um, ou suas notas de rodapé. Conseoriginal um grande número de notas sumamenqüentemente, sua relação i n p u t - o u t p u t é muito desproporcional. São como os beija-flores, te precisas e reveladoras. Suas notas e seu prefácio contêm inúmeros dados históricos que enque precisam de enormes quantidades de néctar para continuar zunindo. Do ponto de vista riquecem consideravelmente nossa compreenda produção de livros, os historiadores da psisão do livro e converteram esta edição da obra cologia são o caminho livresco que desemboca de Vigotski na melhor edição disponível em na produção de o u t r o livro. Sua desvantagem qualquer língua. A psicologia deve muito aos é que são muito pouco prolíficos. escritos de Liev S. Vigotski e nós, leitores moSó podemos defender o trabalho dos hisdernos, devemos agradecer a Guillermo Blanck toriadores da psicologia se adotarmos um ponpela organização desta obra, uma das mais imto de vista q u a l i t a t i v o , destacando que seu zumportantes de Vigotski. bido leva-nos a resultados qualitativamente no- S u m á rio zyxwvutsrqponm Apresentação René van der Veer v Introdução Mario Carretero :: 11 Prefácio Guillermo Blanck 15 Prólogo à edição russa de 1926 Liev S. Vigotski 33 1. DCBAA WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA p e d a g o g ia e a p s ic o lo g ia 37 37 37 41 A pedagogia A psicologia A psicologia pedagógica 2. O s c o n c e it o s d e c o m p o rta m e n to e d e re a ç ã o 47 O comportamento e a reação Os três componentes da reação A reação e o reflexo A divisão das reações em hereditárias e adquiridas Os reflexos hereditários ou incondicionados Os instintos A origem das reações [e outros comportamentos hereditários] A teoria dos reflexos condicionados Os super-reflexos As formas complexas dos reflexos condicionados 3. A s p r in c ip a is le is d a a t iv id a d e n e rv o s a s u p e r io r (c o m p o rta m e n to ) 47 47 48 49 50 50 51 53 55 55 do ser hum ano As leis de inibição e de desinibição A psique e a reação O comportamento animal e o comportamento humano A formação das reações no comportamento O princípio do dominante no comportamento A constituição do ser humano em relação ao seu comportamento 4. O s fa to re s b io ló g ic o e s o c ia l 59 61 61 63 65 66 da educação A atividade do processo educativo e seus participantes Os objetivos da educação do ponto de vista psicológico A educação como seleção social : 59 : , 75 78 80 81 8 S U M Á R IO 5. 6. O s in s tin to s c o m o o b je to , m e c a n is m o A origem dos instintos As relações entre instinto, reflexo e razão Os instintos e a lei biogenética Dois critérios extremos sobre o instinto O instinto como um mecanismo da educação O conceito de sublimação A educação do instinto sexual As premissas psicológicas da educação mista A aplicação pedagógica dos instintos Os interesses infantis O padrão dos interesses infantis O significado psicológico do jogo 86 89 89 91 91 92 93 96 99 100 103 104 A educação 113 113 115 117 119 O conceito A natureza A natureza A educação 7. e m e io s d a e d u c a ç ã o zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPO 85 A p s ic o lo g ia d o c o m p o rta m e n to e m o c io n a l de emoção biológica das emoções psicológica das emoções dos sentimentos e a p e d a g o g ia 125 125 126 127 129 129 130 131 132 134 136 137 139 140 d a a te n ç ã o A natureza psicológica da atenção As características da orientação A orientação externa e interna A atenção e a distração O significado biológico da orientação O valor educativo da orientação O desenvolvimento da atenção O valor psicológico da expectativa Conclusões pedagógicas A atenção e o hábito O correlato fisiológico da atenção O funcionamento da atenção em seu conjunto A atenção e a apercepção 8. O re fo rç o e a re p ro d u ç ã o d a s re a ç õ e s [A m e m ó ria O conceito de plasticidade da matéria A natureza psicológica da memória A estrutura do processo da memória Os tipos de memória As peculiaridades individuais da memória Os limites da educação da memória O interesse e o matiz emocional O esquecimento e a recordação errônea As funções psíquicas da memória A técnica da memória Os dois tipos de recordação das reações A realidade da fantasia As funções da imaginação A educação do comportamento imaginativo e a im a g in a ç ã o ] 143 143 143 145 146 147 147 148 149 151 151 152 153 153 155 S U M Á R IO 9. DCBAo 10. p e n s a m e n to c o m o fo rm a d e c o m p o rta m e n to p a rtic u la rm e n te c o m p le x o zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYX 161 A natureza motora dos processos de pensamento O comportamento consciente e a vontade A psicologia da linguagem Oegoeoid Conclusões pedagógicas A análise e a síntese A importância do pensamento para a educação interior 161 167 169 172 172 175 176 O e s c la re c im e n to 181 181 187 188 190 193 193 195 p s ic o ló g ic o da educação p e lo tra b a lh o Os tipos de educação pelo trabalho O conhecimento da natureza através do trabalho A coordenação dos esforços de trabalho O valor do esforço de trabalho O conhecimento sintético A prática O profissionalismo e a politécnica 11. O c o m p o rta m e n to s o c ia l e s u a re la ç ã o c o m o d e s e n v o lv im e n to d a c ria n ç a O conceito de adaptação A criança e o ambiente O ambiente contemporâneo e a educação As formas reais do comportamento social As flutuações no desenvolvimento da criança 12. A educação 225 225 225 227 228 229 230 232 236 239 243 e s té tic a A estética a serviço da pedagogia A moral e a arte A arte e o estudo da realidade A arte como um fim em si mesmo A passividade e a atividade na vivência estética A importância biológica da atividade estética A caracterização psicológica da reação estética A educação da criatividade, do juízo estético e das habilidades técnicas A fábula [e as histórias infantis] A educação estética e o talento 14. O e x e rc íc io e a fa d ig a Sobre o hábito O significado pedagógico dos exercícios A teoria sobre a fadiga 15. O c o m p o rta m e n to a n o rm a l O conceito de comportamento anormal As crianças com deficiências físicas As deficiências e as doenças mentais 197 197 198 199 200 203 209 209 212 216 O c o m p o rta m e n to WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA m o ra l A natureza da moral do ponto de vista psicológico Os princípios da educação moral As infrações morais das crianças 13. 9 ' , 249 249 252 254 257 257 257 261 10 16. S U M Á R IO zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A psicopatologia da vida cotidiana A hipnose 263 264 O te m p e ra m e n to 267 267 268 268 271 273 277 e o c a rá te r O significado dos termos O temperamento A estrutura dó corpo e o caráter Os quatro tipos de temperamento O problema da vocação e a psicotécnica Os traços endógenos e exógenos do caráter i I 17. O p ro b le m a d o ta le n to e o s o b je tiv o s in d iv id u a is da educação A personalidade, ~ a educação 18. A s fo rm a s fu n d a m e n ta is d o e s tu d o d a p e rs o n a lid a d e d a c ria n ç a As pesquisas psicológicas experimentais da personalidade O método de Binet-Simon O experimento natural 19. A p s ic o lo g ia e o p ro fe s s o r A natureza psicológica do trabalho docente A vida como criação ín d ic e o n o m á s tic o I I i I I I , baZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA da criança 283 283 287 290 292 293 295 295 301 307 In tro d u ç ã o M a r io C a r r e te r o remediou em grande parte esses problemas de outras edições anteriores em línguas V IG O T S K I P A R A A E D U C A Ç Ã O zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA diferentes do russo, a ausência de indicações Hoje em dia, a obra de Vigotski está senbiográficas e bibliográficas e mesmo a falta de do extraordinariamente difundida. Sem dúinformação sobre a procedência do texto. Envida, os aportes do genial psicólogo russo vêm tretanto, um tema que ainda permanece pensendo, nas últimas décadas, um ponto de redente e que sem dúvida será resolvido nos próferência obrigatório para numerosos autores ximos anos, é a publicação de obras inéditas do âmbito educativo e psicológico, assim como que desempenharam um papel importante com para o ambiente da semiologia e da crítica relação ao aporte de Vigotski aos problemas literária e, de forma mais geral, das humaniteóricos e práticos da psicologia e da educadades e ciências sociais. Pode-se afirmar que ção. Entre elas, encontra-se o livro que o leitor esse é um caso de recuperação vertiginosa de tem em mãos neste momento. um autor falecido há mais de meio século, que Como Guillermo Blanck, em seu prefáem seu momento não teve o reconhecimento cio, situa com bastante detalhe o lugar deste adequado e que se implantou fortemente enlivro no conjunto da obra de Vigotski, iremos tre os leitores. limitar-nos a apresentar algumas de suas conParece-nos importante destacar que a ortribuições aos atuais problemas das relações ganização desta edição realizada por Guillermo entre a psicologia e a educação. Blanck - reconhecido como um dos maiores esEsta obra pretende ser - e consideramos pecialistas mundiais na biografia de Vigotski que esse propósito foi brilhantemente alcancaracteriza-se, em nossa opinião, por sua exceçado -, um manual de psicologia pedagógica lência em todos os sentidos. Ele não se ocupou para professores, no qual Vigotski expõe de apenas da tradução e do estilo, mas também forma simples e completa grande parte deste suas abundantes e minuciosas notas podem ser saber. Ela foi escrita por uma pessoa que, além de grande utilidade ao leitor para situar os aude ter grande experiência docente (ver o pretores e questões aos quais se refere Vigotski e fácio de Blanck), pensa a psicologia a partir que não pertencem à nossa época. da educação e não o contrário, como destaEsta introdução nos permite situar em um cou Bruner. Além disso, em todo o livro podef contexto histórico e intelectualmente relevanse sentir uma preocupação constante com os ! baZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA te a vida e a obra de Vigotski, aportando dap r o b le m a s r e a is e c o tid ia n o s d a e s c o l a e uma dos e visões inéditos até o momento. Todas discussão dos mesmos, não só a partir das liessas características nos parecem meritórias e mitadas perspectivas da psicologia, desta ou oportunas, pois a obra do criador do enfoque daquela tendência, mas de um contexto culsociocultural tem tido um destino muito divertural mais amplo, que inclui a literatura, a so, através de edições nem sempre à altura da . política, a filosofia e a cultura em geral. Nesqualidade do autor. A publicação de suasZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA O bras se sentido, consideramos que este livro contiA R E L E V  N C IA , I DA OBSA DE e s c o lh id a s I' baZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 12 L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nua sendoZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA to ta lm e n te v i g e n t e para todos aqueles que trabalham com psicologia e com educação, porque nos ajuda a perceber que não é importante apenas levar em conta os avanços científicos em nosso campo, mas as perspectivas teóricas mais amplas em que se fundamentam. ' Por outro lado, Vigotski realiza esse trabalho com uma l i n g u a g e m s i m p l e s e a m e n a , que pode ser entendida por qualquer professor interessado por essas questões. Nessa característica da obra parece-nos que se reflete o interesse do autor pela transformação da sociedade mediante a educação é, em suma, seu profundo compromisso com as tarefas relacionadas a todos os âmbitos da aprendizagem humana em contextos formais. Não podemos esquecer que Vigotski pertencia a uma g e r a ç ã o r e v o lu c io n á r ia que estava convencida de que o homem novo seria gerado através de um conjunto de transformações, entre as quais a educação desempenhava um papel fundamental. Essa inspiração profundamente marxista da obra vigotskiana, que não se limita a interpretar o mundo, mas aspira a transformá-lo, está vinculada a essa qualidade tão característica do genial autor russo, que é a capacidade de vincular s i g n i f i c a t i v a m e n t e a te o r ia e a p r á tic a , com a possibilidade de transmiti-Ia aos demais membros da sociedade, sobretudo aos professores, que são o e i x o c e n t r a l d e t o d o s i s t e m a e d u c a tiv o . Nos últimos anos, numerosos autores se perguntaram pelos motivos do auge da obra de Vigotski. Nós mesmos, quando pudemos revisar a produção bibliográfica a esse respeito nas últimas décadas, comprovamos que o interesse por sua obra cresce exponencialmente. Como é possível que um autor marxista seja tão lido em um momento como o atual, em que posições desse tipo estão tão desprestigiadas? Por que isso ocorre inclusive nos Estados Unidos, onde a educação e toda a cultura transformaram o individualismo em uma de suas bases teóricas? Para responder plenamente a essas perguntas precisaríamos de um espaço muito maior. Talvez tivéssemos de considerar que convém separar - o que nem sempre se faz - a enorme contribuição do marxis- mo como instrumento teórico de análise crítica da realidade, do fracasso de suas propostas políticas concretas, como sucedeu nos estados socialistas. No entanto, uma análise desse tipo não caberia neste exíguo espaço. Por enquanto, destaquemos apenas que a forma criativa e antidogmática como Vigotski conseguiu aplicar as idéias marxistas básicas para facilitar a compreensão dos fenômenos educativos e da aprendizagem não só é de enorme pertinência em nível internacional, mas mostra ao mesmo tempo o esgotamento de fórmulas clássicas na psicologia educativa, que têm considerado tradicionalmente que a aprendizagem é um fenômeno solitário que ocorre s o m e n te n a c a b e ç a d o a p r e n d iz . Em nossa opinião, a capacidade visionária de Vigotski ao vislumbrar que a aprendizagem se produz em um contexto microssocial e interativo - em q u e o o l h a r d o o u t r o se c o n s t i t u i em j a z e d o r d e n ó s m e s m o s - , sem o qual não se pode entender cabalmente os fenômenos da aquisição de conhecimento, é uma das principais razões de sua atual aceitação. Nesse sentido, muito se tem escrito ultimamente sobre a relação entre as obras de Vigotski e as de Piaget. Parece-me que atualmente muitos especialistas admitem - deixando de lado algumas diferenças de matizes - que as obras desses dois gigantes s ã o b a s i c a m e n t e c o m p a t í v e i s , especialmente se pensarmos em suas aplicações educativas e não tanto em suas elaborações teóricas p e r s e . No contexto dessa compatibilidade, cabe destacar que a obra de Vigotski conseguiu instaurar, tanto entre os pesquisadores quanto entre os professores, duas idéias essenciais, entre muitas outras: que deve haver a criação e a manutenção de c o m u n i d a d e s d e a p r e n d i z a g e m para que esta seja uma realidade individual e institucional, e que as relações entre o desenvolvimento cognitivo e a educação devem ser consideradas a partir de um ponto de vista d i a l é t i co, como o que está presente na z o n a d e d e s e n v o lv im e n to p r o x im a l. Sem dúvida, essas duas posições emblemáticas supõem uma visão, como a que encontrarão neste livro, da educação como fator de crescimento pessoal e social. Por último, escrevemos estas páginas alguns meses depois que Guillermo Blanck nos P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 13 entregou a versão final desta obra, alguns dias trabalho tão dedicado a uma causa - dar a coantes de seu falecimento tão inesperado. Gosnhecer a obra e a vida de Vigotski - o que taríamos de expressar, como já o fez a comuniGuillermo realizou com perfeição, tanto na dade científica, nosso agradecimento por essebaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Argentina quanto em âmbito internacional. P re fá c io G u ille r m o B la n c k últimas senes do ensino fundamental (para PSICOLOBIA crianças de 10 a 15 anos). O livro continha as PEDAGÓGICA D E V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA aulas que Vigotski havia ministrado na Escola de Formação de Professores de Gornel durante A falsidade consiste em uma privação de conhecimento, implícita nas _!.9~ia_s aqueles anos, -ü-cursõ -fora cõncebido como ~adas, isto é, E1~~I_a_9.él~ econfusas. uma introdução à psicologia pedagógica para uma nova geração de professores soviéticos, Spinoza,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA É tic a . destinados a substituir o velho sistema educa- /1') tivo pré-revolucionário. Quando a revoluçã;)V Não me deixem cair na ignorância. de outubro de 1917 ocorreu na Rússia, pro- ( Shakespeare, H a m l e t . pondo-se a criar uma sociedade socialista, o i , - ., índice de analfabetismo era de mais de 90%. I '/J Liev Vigotski era um homem modesto. "Estabelecemos como meta a eliminação total (. ,~. Seu amigo de infância e juventude, Semion do analfabetismo no 102 aniversário do regi'. Dobkin, relatou que, sempre que Vigotski terme soviético," afirmou Trotsky em 1923. Essa t minava uma palestra, muitos se aproximavam meta foi praticamente alcançada. ~ para cumprimentá-lo e elogiá-lo. Ele costumaEste prefácio não pretende resumir o conva responder: "Não fui eu que tornei a palesteúdo do livro, mas situá-lo em sua época e na tra interessante, o t e m a é que é interessante".WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nossa, esclarecer algumas de suas característi: ~ 7 'J ;,- Quando Vigotski começou a trabalhar na Unicas e explicar como ocorreu a produção da prel versidade de Moscou, dependente do Comissasente edição, oferecer alguns critérios para sua l"C' riado (Ministério) do Povo para a Educação compreensão e e x p l i c i t a r q u e m s ã o s e u s p o t e n ;; :~~;;Pública,emjulho de 1924,1 preencheu um forPARA LER A e l na . mulário e, 'seÇãüPÚBLICAÇÕES, escreveu: "Um breve manual de psicologia pedagógica, no prelo pela Editora Estatal". Esse "breve manual" era P s i c o l o g i a p e d a g ó g i c a , o livro que o leitor tem em mãos neste momento. A IM P O R T  N C IA DE PSICOLOGIA PEDAGÓGICA é um livro que ~ Vigotski começou a escrever em 1921 e terminou em 1923 ou no início de 1924, quando tinha 27 anos de idade. Vigotski escreveu o texto para estudantes que pretendiam lecionar nas P s ic o lo g ia , ,'" ~ p e d a g ó g ic a './- .J . .~.~ .- _./ ' o " ' _ / •. /" _ ,...- .- ',.._ - .• . , /' c ia is le ito r e s . Comecemos Q u a lq u e r pessoa por esta última questão. c u lta , m esm o q u e n ã o e s p e c ia - e d u c a ç ã o e s e u s p r o b le Não é preciso conhecer Vigotski nem ter uma formação superior à do ensino médio. Esse tipo de leitor apenas deve levar em conta que e s t e l i v r o f o i e s c r i t o p o r u m liz a d a , in te r e s s a d a p e la m a s , p o d e le r e s te liv r o . p r o fe s s o r jo v e m , d e s tin o u a e s tu d a n te s porém e x p e r ie n te q u e q u e r ia m e s á b io , e se s e r p r o fe s s o - de c r i a n ç a s de a t é 15 a n o s , na Rússia, há 75 anos. O livro está escrito em estilo coloquial, como se fosse um professor dando uma aula. Os temas, muito variados, são explicados por meio de exemplos e relatos atraentes, extraídos res 16 I I (:(',"-\ I I ,I I ~ ': .L .\ 1 --' \ 7 f' L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I . zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA de, porém está longe de ser t o d a a verdade. da vida real ou da literatura, Entre muitos ouVigotski t a m b é m foi um brilhante crítico litetros temas, o leitor pode-se informar sobre a rário e artístico, psicólogo da arte, estudioso atenção e a memória, a imaginação e o pensados problemas da psicologia dos sentimentos mento, a linguagem, o talento e a inteligência, do ator de teatro e da psicologia da criação, a educação moral e a sexual, a educação artístieminente educador e professor, crítico sagaz, ca, os contos de fadas;u importância psicológirefinado terapeuta, psicopedagogo de crianca do jogo, a educação das crianças com transtornos de comportamento, a educação para o ças portadoras de deficiências, neuropsicólogo e pesquisador do funcionamento normal e trabalho, a educação dos hábitos e a fadiga, a anormal do cérebro e da psique, psicólogo exeducação de crianças portadoras de deficiênciperimental, episteinologista e historiador da as mentais, auditivas e visuais e, finalmente, as características psicológicas que um professor psicologia, um grande psicólogo geral, psicólogo cultural, transcultural e comparativo, um deve ter, Como em todo 'curso, há temas mais fáceis e outros mais difí~eis, Entre os últimos, destacado teórico da psicologia do pensamento e da linguagem, um estudioso do judaísmo há algumas lições sobre biologia, a evolução das espécies, a psicanálise, o funcionamento e dos evangelhos e também um sociólogo que estudou a relação entre a psicologia e os grando sistema nervoso, etc. Mas talvez o mais importante seja queZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA s e p o d e a p r e n d e r u m a s é r ie des movimentos históricos do século X X : o socialismo) o comunismo, o fascismo e o capid e o r i e n t a ç õ e s e s p e c í f i c a s s o b r e a e d u c a ç ã o , No livro há palavras técnicas, porém todas elas estalismo. ------! tão explica das no texto ou nas notas ao final A s e g u n d a le n d a é a fa ls a h is tó r ia d a v id a e dos capítulos. Todos os personagens da histód a o b r a de Vigotski, que vamos tratar a seguira terceira lenda será elucidada mais tarde. Não ria, da mitologia ou das obras de arte) assim como os psicólogos, pedagogos, cientistas e relataremos aqui toda a sua vida nem sua vasta escritores mencionados no texto estão identiobra. Faremos apenas um resumo e nos deteremos nos dados que desmentem a lenda, forneficados nas notas. Temos de avisar a esse tipo cendo dados significativos para desmenti-Ia. 1 de leitor que nunca é possível entender absolutamente tudo. Como dizia um professor nosNarraremos agora) de forma sucinta) a so no Colégio Nacional: "Não se pode tudo". s e g u n d a l e n d a , que é uma espécie de "história Entretanto, o livro tem uma vantagem. Com oficial" e diz o seguinte: Em janeiro de 1924 apareceu no II Congresso Panrusso (Nacional) exceção dos Capítulos 2 a 4, que devem ser de Psiconeurologia, realizado em Petrogrado, lidos em ordem consecutiva, todos os outros um desconhecido jovem de 27 anos, prõvenipodem ser lidos em qualquer ordem. E se esse ente de uma remota cidade provinciana. É imtipo de leitor não quiser ler esses três capítuportante destacar que a lenda sempre começa los inteiros, pode folheá-Ios e ler apenas as aqui, em 1924, e nada nos diz da vida de aplicações educativas que lhe interessem. Há u m s e g u n d o t i p o d e l e i t o r : WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA o e s tu d a n te d e Vigotski antes dessa data, exceto que era um simples professor e que se dedicara à literatup e d a g o g i a o u o u n i v e r s i t á r i o i n t e r e s s a d o em p s i c o lo g ia , p s ic o lo g ia e v o lu tiv a , p s ic o lo g ia e d u c a tiv a e ra e ao teatro - nunca se menciona o judaísmo de Vigotski, com todas as implicações que este c i ê n c i a s d a e d u c a ç ã o . Esse tipo de leitor deve ler teve para explicar decisivos aspectos de sua completamente o livro em ordem consecutiva. vida e carreira. De acordo com a lenda, no menEste texto destina-se a ser um clássico e foi escricionado congresso, perante um público formato por um dos psicólogos mais lidos atualmente do por velhos sábios de barbas grisalhas, esse no mundo: Liev SemionovitchVigotski, Deve-se jovem fez um discurso muito eloqüente, sem conhecer Vigotski. Mas, para isso se tornar posler nenhum texto. Seu argumento central era sível, é preciso acabar com três lendas que impeque as correntes psicológicas dominantes nadem o acesso a um conhecimento nítido e quele momento tinham deixado de lado o esconfiável de sua vida e de sua obra. tudo científico da consciência - um dos proA p r i m e i r a l e n d a diz que Vigotski foi um blemas mais discutidos e difíceis da época - e p s ic ó lo g o e v o lu tiv o e e d u c a t i v o . Isso é verda- PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 17zyxwvutsrqpon que esse estudo devia ser realizado. Foi tão Cognición, 1984). A lenda é uma espécie de persuasivo que o público ficou perplexo. Imfilme cor-de-rosa que nunca se entendeu bem pressionado, o diretor do Instituto de Psicolocom a vida real. A verdadeira história de gia Experimental, anexo à Universidade de Vigotski não precisa de lendas, pois é suficienMoscou, K. Kornilov, convidou-o a colaborar temente interessante para abrir mão delas. com ele. E assim, do dia para a noite, esse jo-hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA O u tr o s é que as necessitaram. Contaremos agovem que provinha do mundo da literatura e ra a verdade, nada mais que a verdade. do teatro iniciou uma fulminante carreira no Apresentaremos então um resumo da v e r âmbito da psicologia, a partir do momento em d a d e ir a h is tó r ia de Vigotski, para os propósitos já anunciados neste prefácio. Liev Semionovitch que se instalou em Moscou, em 1924. No dia seguinte ele se reuniu com dois psicólogos, Vigodski nasceu no final de 1896 na BieloLuria e seu amigo Leontiev, e formaram uma Rússia. Quando adulto, mudou o "d" de seu tr o ik a (trio) muito unida, regida pela lealdade sobrenome pelo "t".' Ele cresceu na cidade de e pela amizade, que só aéabaria com a morte, Gornel, situada perto de Chemobyl. Desde crian- ~. e cuja missão histórica foi a criação de um novo ça demonstrou ser muito talentoso. Estudou com sistema de psicologia, que deixaria para trás a um preceptor e concluiu o ensino médio com crise que afetava a disciplina naquele mornenmedalha de ouro. Conhecia nove idiomas e pos- .Qf\'tc to. O trio foi crescendo. Formou-se uma nova suía um saber enciclopédico - algo não muito /)c;t --< escola de psicologia "sócio-histórica", monolí~~a ép~a. Provinha de uma família judia tica, que deu origem aos fundamentos da psinão-religiosa, ainda q~~J~sl2eitosa das tradicologia soviética. Em 10 anos, Vigotski passou ções. Vigotski seu baC_T!lj!~g.?J como um raio pela teoria, pela prática e por Quando terminou o ensino médio, Vigotski queria ingressar na Universidade de Moscou, instituições oficiais; produziu cerca de 200 trabalhos e morreu de tuberculose, em 1934, aos porém existiam cotas: admitia-se apenàs 3% 37 anos e 6 meses de idade. Dois anos depois, de alunos judeus, escolhidos por sorteio. Ele . as obras de Vigotski foram proibidas - durante teve sorte e foi sorteado. Na Universidade Im20 anos - Relsu!~ Em 1956, perial de Moscou, iniciou a carreira de medieiquando cOrheÇou o "desgelo" da URSS, Luria e na, mas depois mudou para direito. Ora, p o r Leontiev começaram a republicá-las, Nos anos q u e m e d ic in a o u d ir e ito ? Essas carreiras abri70, Aleksandr Romanovitch Luria e Aleksei am portas para o exercício lib e r a l da profissão Nikolaievitch Leontiev, que eram as mais consde médico ou advogado. No regime czarista, pícuas figuras da psicologia soviética da époos judeus não podiam ocupar nenhum posto ca, morreram. Em 1980 nasceu o "fenômeno estatal; por isso, não podiam seguir uma carVigotski", que cresceu muito até os dias de hoje. reira judicial, nem trabalhar em hospitais ou No imaginário psicológico, a tr o ik a continua escolas. Simultaneamente.Yigots-ki freqüentou [::/ viva, embora os três já estejam rnortos; sua r aFaculaadede História e Filoh2gi<Lda Univer-> morte foi como a de El Cid, pois ainda hoje "'--Siâa'àtPd'p~1a~ia~ki, fundad-a em continuam combaten~s e vencendo ba19.06 e não-recpnhecida oficialmente; ela era ~e r~rolucionários anticzaristas que talhas. Shakespeare disse certa vez que a menti- I \V ra era a verdade com máscara. Há algo de verdade nessa lenda, porém a máscara é grande ·N. de R.T. Foi o próprio Liev que mudou o "d" origidemais. Tal lenda - inclusive em sua versão nal de seu sobrenome pelo "t", porque acreditava não-abreviada - é um conto de fadas que ofenque sua família procedia de uma aldeia chamada de a inteligência de um adulto. Mas é difícil Vygotovo. A esse respeito veja-se: Riviére, A. La destruir lendas. Ainda hoje se escrevem esbop s ic o lo g ía de V y g o ts k i. 3. ed. Madri: Visor, 1988 e ços biográficos de Vigotski que reproduzem a Van Der Veer, R.; Valsiner, J. V y g o ts k y : u m a s ín te s e . lenda - nós mesmos o fizemos, de certa forSão Paulo: Loyola, 1996. Ao que parece, seus pais e irmãos, e posteriormente suas filhas, mantiveram a ma, no passado (cf. G. Blanck, ed., Vigotski: grafia original do sobrenome. M e m o r ia y V ig e n c ia , Buenos Aires: Cultura y ~"-----,,,-'\,./"-- feVe ;f ~m I 18 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA de psicologia experimental e realizou muitos tinham renunciado ou sido expulsos da Uniexperimentos junto com seus alunos. Nesse âmversidade Imperial, depois da derrota da revobito teve seu primeiro contato com as deficilução de 1905. Nela concentravam-se os meências infantis. Nessa etapa, que durou anos, lhores cérebros da Rússia, como K. Timiriazev, um dos descobridores da fotossíntese, e V. Vigotski tinha uma concepção psicológica basicamente sociogenética, como se pode ver no Vernadski, o criador da teoria da biosfera. Nes~ ~ª--(~~illkJvrgõtsKnei~ãIg;ns-C':lrS9S" dê"psir presente livro." 'cologia com Pável Blonski.: Seriam os únicos Assim, em 1919, Vigotskijá sabia bastante de-sua vida; na área da psicologia, foi autodide psicologia. Quando começou a redigir o data. Nas férias de verão, Vigotski viajava para presente livro, faltavam três anos para o famoso congresso no qual se apresentou publiGomeI. Segundo Dobkin, ~~~~~~e camente perante as celebridades científicas ~~. Em 1917, ano da revolução socialista de outubro, formou-se em russas. Portanto, sua passagem da literatura à , ambas as universidades. Uma das primeiras psicologia não ocorreu d o d ia p a r a a n o ite . I medidas tomadas pelos comunistas foi a Durante anos trabalhou arduamente com os ~ \ derrogação da legislação anti-semita, o que foí textos clássicos da psicologia. Vigotski já sabia ~ I apoiado pelos judeus, porque assim desaparetudo o que o leitor encontrará neste livro dois I I~R . d I I <:~lLQ~~!l) e, a partir esse momento, e es anos antes do congresso de Petrogrado. Se isso -'=:---podiamocupar qualquer cargo. Após a revolul for levado em consideração, é evidente que s u a lC'.9 ção, porém, houve a guerra civil, fome e frioj c a r r e ir a d e p s ic ó lo g o n ã o d u r o u 10 a n o s , mas Vigotski estabeleceu-se em Gornel com cerca de 15 . .',q \t sua família e, como já não era proibido, comeAté seu aparecimento no congresso, que ÇQ.ua dar aulas em várias escolas e instituiçõeshgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA mais pode ser dito? Em primeiro lugar, que - - .- ·~ ··- - - - - - - ·T ·. . . estatais e a escrever cnncas teatrais para jorVigotski n ã o e r a n e n h u m d e s c o n h e c id o . Muitos conspícuos intelectuais e cientistas moscovitas nais, etc. Não lhe foi difícil transformar-se n0 líder intelectual de Gomel, cidade de 40 mil o conheciam desde seus anos de universidade. habitantes. Organizou as "Segundas-feiras Li- É m u ito p r o v á v e l q u e v á r io s d e le s o te n h a m c o n terárias", nas quais discutia literatura russa ou v id a d o p a r a a p r e s e n ta r u m a p a le s tr a no c o tiproferia conferências sobre temas co o a teog r e s s o d e P e tr o g r a d o , pois surge aqui uma perriá '~Vl ade e Eínstein. Vígotski lera gunta que ninguém respondeu: como é que um ~~~odo intelectual professor de ensino fundamental de uma rejudeu, conhecia bem Spinoza. Também estumota cidade chega ao II Congresso Nacional ç-~ He~l. Este o levou a Marx e Engels e es- de Psiconeurologia, o evento acadêmico mais importante da disciplina? Essa é uma resposta -r.Jp~if tes a Lênin, cujas obras compreendia cabalmente. Tornou-se comunista, embora nunca tenha que não temos, porque a lenda nunca explise fiIiâãõ"'ãO-pafiído.Dava aulas de lógica, fi- cou nada a respeito. De forma simultânea com P s ic o lo g ia p e ~ losofia, estética, psicologia, etc. Antes dos 20 '-:z).anos,entre 1915 e 1916, terminou seu primeiro d a g ó g ic a , Vigotski começou a redigir parte de livro, l:íiííê'-x~ ensaio sobre H a m le t, P s ic o lo g ia d a a r te - um livro tão extenso quanto este -, continuou lendo, pesquisando e leciono qual havia certo grau de misticismo; no ennando, sem abandonar a atividade literária e tanto, essa faceta não duraria - desapareceu artística, que nunca abandonaria. Com Dobkin em uma segunda e breve versão posterior, parte e seu primo David Vigodski, destinado a ser integrante de seu livro P s ic o lo g ia d a a r te . um renomado lingüista, fundaram a Editora Vigotski também leu toda a história da psico"Bieka i dni" ("Eras e dias") e publicaram um logia e chegou a conhecer os clássicos de topar de livros de poesia, até abandonarem o emdas as correntes psicológicas da Rússia, da Eupreendimento por um recorrente problema ropa e dos Estados Unidos (ele sempre escrerusso: escassez de papel. David o pôs em convia "Rússia e Europa", como se a Rússia não pertencesse à Europa). Na Escola de Formatato com destacados formalistas - alguns deles influenciariam Vigotski até em seu último ção de Professores, organizou um laboratório ~r I PSICOLOGIA PEDAGÓGICA livro,hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P e n s a m e n to e lin g u a g e m . Fragmentos de sua P s ic o lo g ia da a r te fariam parte de o u tr a s comunicações que também apresentaria no congresso de Petrogrado - foram tr ê s , e não apenas uma. É claro que, nessa época, além de outras correntes, Vigotski também era muito influenciado pela reflexologia e pela reatologia, ainda que nunca tenha aderido totalmente a nenhuma delas; até 1928, muitas vezes lhes tomou emprestados conceitos e termos; em outras oportunidades, só termos: significantes, dando-lhes outros significados. Muito se discutiu sobre o provável caminho de acesso de Vigotski à psicologia. Em nossa opinião, todas as hipóteses construídas para explicar esse trânsito desmoronam com a leitura de P s ic o lo g ia p e d a g ó g ic a . A im p o r tâ n c ia fu n d a m e n ta l d e s s e te x to m o s tr a m u ito b e m c o m o se r e a liz o u o tr â n s ito - Psicologia pedagógica é o e lo p e r d id o q u e e s c la r e c e o p r o b le m a . O livro P s ic o lo g ia da a r te também ajuda a compreendê10, mas não tanto. Isso coincide com nossas opiniões anteriores à leitura de P s ic o lo g ia p e d a g ó g ic a : sempre dissemos que os caminhos tinham sido tanto os problemas da psicologia da arte quanto os suscitados pela atividade pedagógica e psicopedagógica, mas que estes tinham sido mais importantes. Finalmente, quando Vigotski falou no congresso, em 6 de janeiro de 1924, p a r e c e q u e o ú n ic o q u e fic o u p e r p le x o com s u a p a le s tr a fo i É possível que K o r n ilo v o te n h a c o n v id a do sem que Luria soubesse, porque Vigotski manifestou coincidências com sua teoria ou porque estava reestruturando o Instituto Experimental de Psicologia e precisava de colaboradores; o mais provável, porém, conforme a história oral, é que o tenha convidado p o r q u e L u r ia in s is tiu . A versão escrita de sua palestra no congresso foi "Os métodos de pesquisa reflexológicos e psicológicos" e não, como tem se repetido erroneamente, "Aconsciência como problema da psicologia do comportamento" (cf. ambos os trabalhos, compilados em L. S. Vygotski, O b r a s ... , t. I, op. cit., p. 3-22 e 39-60, respectivamente). É interessante notar que Vigotski, em sua conferência, criticou duramente a reflexologia de Bejterev e Pavlov com relação ao problema do estudo da consciência, mas manifestou algumas coincidências com a L u r ia . 19 reatologia de Kornilov e com as posições de William Jarnes e John Watson (um ano mais tarde, criticaria todas elas). Vigotski retornou a Gomel e casou-se com sua namorada, Roza Noievna Smiejova. O casal mudou-se para Moscou ainda em 1924. Todas as irmãs de Vigotski já tinham saído de Gornel e, pouco tempo depois, seus pais também se mudaram para Moscou. L u r ia d is s e q u e n o d ia s e g u in te à c h e g a d a de V ig o ts k i a M o s c o u e le s se r e u n ir a m c o m L e o n tie v , também membro do Instituto) e q u e os tr ê s p r o p u s e r a m r e e la borar to d a a p s ic o lo g ia e x is te n te e c r ia r u m a como objetivo de seu futuro trabalho. No entanto, pairam dúvidas sobre essa mencionada reunião e, sobretudo, que ela tenha ocorrido imediatamente após a chegada de Vigotski. É provável que Luria e Leontiev tenham ajudado Vigotski a se estabelecer, porém afirmamos sem vacilar que a realização dessa reunião demorou p e lo m e n o s um ano. Como disse Borges, a memória é mais inventiva que evocativa. Em suas memórias, Luria diz que costumavam encontrar-se com Leontiev no apartamento de Vigotski u m a ou d u a s v e z e s p o r s e m a n a (cf. A. R. Luria, T h e m a k in g o f m in d . A p e r s o n a l a c c o u n t o f S o v ie t P s y c h o lo g y , ed. de Michael e Sheila Cole, Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1979, p. 45), embora não mencione datas, para planejar seus estudos e seu trabalho experimental, que era realizado no laboratório de psicologia dirigido por Luria na Academia de Educação Comunista "Krupskaia" - experimentos que Vigotski planejava e supervisionava pessoalmente. No grupo de trabalho dirigido por Vigotski, Leontiev realizou uma pesquisa sobre a memória, de caráter plenamente vigotskiano, à qual retomaremos mais tarde. Com exceção dessa pesquisa, não existem evidências de nenhum trabalho conjunto de Vigotski e Leontiev, nem mesmo um simples artigo em co-autoria. Muito mais intensa foi a colaboração de Luria com Vigotski, que incluiu artigos, livros e até mesmo um trabalho de campo que durou dois anos, realizado em duas remotas repúblicas soviéticas da Ásia. O leitor perceberá que, no período em que se questionou o trabalho de Vigotski, ele sempre é mencionado ao lado de Luria, sem. n o v a p s ic o lo g ia g e r a l) 20 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nunca haver referência a Leontiev. O mito de um triohgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA e q u iv a le n te aos três mosqueteiros de Dumas só tem o valor que lhe é atribuído pelos que acreditam nele. Visto de outro ângulo, podemos dizer que Vigotski, Luria e Leontiev constituíram um "trio" - não o negamos -, porém esse trio nunca teve as mesmas características pintadas pela lenda, com a seguinte acepção do vocábulo tr o ik a : "um por todos e todos por um". Durante um ano, Vigotski e sua esposa moraram em um pequeno quarto, no porão do Instituto Experimental de Psicologia. Quando sua filha Guita nasceu, em' 1925, eles se mudaram para um apartamento de um quarto no número 17 da rua Bolshaia Serpujovskais, onde Vigotski moraria a vida inteira, com a mulher e duas filhas. Muitas vezes, Vigotski escrevia nesse quarto, enquanto, ao redor dele, outras crianças brincavam com sua filha. Outras vezes recebia visitas nele, como as célebres reuniões que teria, por exemplo, com Kurt Lewin. Em seus últimos 10 anos, Vigotski dirigiu várias cátedras e instituições, organizou grupos de trabalho, dirigiu laboratórios de pesquisa e centros de saúde, fundou e presidiu o Instituto de Defetologia mais importante da URSS, etc. Em 15 de julho de 1924, Vigotski foi nomeado diretor do Subdepartamento de Proteção Social e Legal de Crianças Portadoras de Deficiências, subordinado ao Comissariado do Povo para a Educação Pública. No formulário que teve de preencher para se inscrever no Comissariado, na seção em que se perguntava em que área considerava que poderia ser mais útil, Vigotski escreveu: "Na educação de crianças surdas-mudas e cegas". Desde seus anos em Gornel e até sua morte em Moscou, Vigotski viu milhares de crianças deficientes. Ele viajou apenas uma vez ao exterior, para representar seu país na Conferência Internacional para a Educação de Surdos, realizada em Londres, em1925. Visitou muitas escolas para surdos, tanto lá quanto em Berlim, na Holanda e na França. Quando regressou a Moscou, sofreu sua segunda internação - um ano de cama -, em condições de extrema precariedade: as camas não eram separadas por nenhum espaço. Vigotski sofreu um colapso em um pulmão devido a um pneumotórax e não podia permane- cer em pé sem ajuda. Nessas condições, no hospital, escreveu sua monografia O s ig n ific a d o h is tó r ic o d a c r is e d a p s ic o lo g ia , que terminou em 1926 e n ã o e m 1927, c o m o a fir m a a le n d a . Vigotski tinha de defender publicamente sua tese de doutorado em psicologia - que foi seu livro P s ic o lo g ia d a a r te , concluído em 1925 -, porém a comissão médica o liberou desse ritual, e o título de doutor lhe foi concedido. Mais tarde, Vigotski trabalhou em estreita colaboração com Nadiezhda Krupskaia, viúva de Lênin, que era membro da direção do Comissariado da Educação. Quando Vigotski morreu, sua filha mais velha, Guita Lvovna Vigodskaia, tinha 10 anos. Por esse motivo, é testemunha confiável de muitos acontecimentos de seus últimos cinco anos de vida, o que não acontece com sua irmã, Ásia, que tinha apenas 4 anos quando o pai faleceu. Guita recorda que Krupskaia costumava ligar para sua casa (comunicação pessoal, Moscou, 1988). Em 1928, Vigotski escreveu os manifestos fundamentais de sua E s c o la H is tó r ic o -C u ltu r a l d e P s ic o lo g ia , que começou a desenvolver por volta de 1927, em colaboração com Luria; essa colaboração não excluiu críticas epistemológicas profundas de Vigotski a Luria, a partir de 1926, relativas à relação marxismo/psicanálise (tais manifestos são "O problema do desenvolvimento cultural da criança" e "Primeiras teses sobre o método instrumental em psicologia"; cf. L. S. Vigotski, O d e s e n v o lv im e n to c u ltu r a l d a c r ia n ç a ... , op. cit., p. 31-64). Vigotski produziria quase 200 trabalhos de psicologia, além de cerca de 100 sobre arte e literatura - dos quais se conhecem apenas uns 60. Como já dissemos, Vigotski, Luria e Leontiev trabalharam juntos, mas desde o princípio Vigotski ta m b é m esteve rodeado de outros colegas. Possuía uma personalidade carismática, e uma de suas notórias características era a tendência a organizar facilmente grupos de trabalho, o que já era evidente desde sua adolescência. Quando um "quinteto" (p ia to r k a ) de estudantes R. I. Lievina, L. Slavina, L. Boyovich, N. Morozova e A. Zaporoyets - uniu-se à tr o ik a , a lenda passou a mencionar um "octeto". No entanto, ele teve vários outros colaboradores importantes - L. Saj ar ov, L. Zankov, r. PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 21 Soloviov, etc. Esse grupo realizava as pesquirado por Leontíev, instalou-se e permaneceu sas no laboratório de Luria e, entre eles, estaem Jarkov, enquanto outros continuaram em va A. N. Leontiev. Durante esses anos, Vigotski Moscou. Vigotski começou a viajar e a dividir fez algumas viagens pela URSS. Por exemplo, seu tempo entre essas duas cidades. esteve diversos meses em Tashkent, em 1929, Em Jarkov e Moscou, Vigotski se matriculou, 18 anos depois de sua primeira tentatilecionando na Universidade Estatal da Ásia Central. No entanto, estas não são as viagens va abortada, no curso de medicina, pois agora que mais nos interessam; há outras muito precisava de uma formação mais ampla devimais reveladoras ... do aos seus novos interesses - começara a esPor volta de 1930, Vigotski encontravatudar patologias como a esquizofrenia, a dese no apogeu de sua carreira. Era editormência, a doença de Pick e outras afecções neucurador de livros em várias editoras, diretor rológicas e psiquiátricas. Luria fez o mesmo. da principal instituição de defectologia da Em suas breves estadas em Jarkov, Vigotski URSS, integrava a comissão editorial das prinprestava seus exames de medicina, nunca em cipais revistas, projetava as pesquisas transculMoscou: ''Aqui nunca conseguirei terminar o turais realizadas por Luria através de duas excurso: os trâmites burocráticos, por ter perdipedições ao Uzbesquistão e ao Kirquizistão, do o diploma, terminaram com minha paciênalém das atividades anteriormente mencionacia" (cf. carta a Luria, Moscou, 21/02/33). Condas e das vinculadas à arte que, como já disseseguiu realizar a metade do curso e só não o completou totalmente porque foi impedido mos, ele nunca abandonou - embora tivesse tido a prudência de se abster de publicar a respela morte. Luria conseguiu se formar. peito, pois a queda de Lunacharski como miN o fin a l d o s a n o s 7 0 , Leontiev escreveu nistro da cultura representou uma sentença de sobre o "complexo problema da área da psicomorte para a revoluçãohgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA c u ltu r a l russa da décalogia" da ação mediada: da de 20 (cf. G. Blanck, "Vygotsky: El Hombre y su Causa", op. cit., p. 50-51). O rumo Deve-se dizer que alguns psicólogos dos anos stalinista adotado pela URSS começou a ma30 - como A . A . T a la n k in , P I. R a z m is lo v e ounifestar-se nas áreas da psicologia em que tros - captavam e destacavam o p o n to fr a c o . Vigotski trabalhava. Começaram a desapareque existia na interpretação da relação entre cer as revistas que ele co-dirigia. Começaram a consciência e a vida real, e que se evidenciaria na teoria histórico-cultural. (Cf. A. N. os ataques dos ideólogos contra o Instituto Leontiev, "Sobre o desenvolvimento criativo Experimental de Psicologia no qual ainda traO b r a s ... , op. de Vigotski", em L. S. Vygotski, balhava, especialmente contra ele e Kornilov. cit., t. L, p. 448; o grifo é nosso.) Apesar de tudo isso, Vigotski continuou realizando suas atividades e chegou a ocupar novos cargos; entre eles, o de deputado do soviete É alheio ao propósito desta narração a do distrito Frunze de Moscou, onde elaborava questão dos problemas teóricos de categorias políticas educacionais. No final de 1931, foi psicológicas como a "ação mediada" e a "ativinomeado diretor do Departamento de Psicolodade", na qual em alguns aspectos coincidimos gia Evolutiva da Universidade da Ucrânia. com as concepções desenvolvidas por A. N. U c r â n ia , longe de Moscou ... P o r q u ê ? Leontiev. O que nos surpreende nessa afirmaEmbora tivesse continuado trabalhando ção de Leontiev é que, da p e r s p e c tiv a p r iv ile g ia nessa situação adversa, tanto ele quanto seus da de q u a s e m e io s é c u lo , ele fale desse modo de colegas sentiram-se afetados pelo clima de sujeitos como Talankin ou Razmislov, que c a r e perseguição reinante. Em 1930 fora fundada c e m detodo atributo científico e moral para ser a Academia Ucraniana de Psiconeurologia, em tratados dessa maneira. Vigotskitinha uma opi- . Jarkov, e esta oferecia mais liberdade ideolónião diferentes desses dois personagens: ' gica e salários mais elevados, ao contrário do Quanto mais longe de nossas idéias estejam que acontecia em Moscou. Devido a essa siesses covardes barbeiros, escrevinhadores, . tuação, uma parte do grupo de Vigotski, lide- 22 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Bühler, Freud e da escola da Gestalt de forma ou seja lá o que forem, porém nãohgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA h o m e n s de c iê n c ia , tanto meacrítica, o que não é verdade (cf L. S. Vygotski, lhoro. (Cf. carta a Luria, 29/03/1933; o grifo O b r a s .... , op. cit., t. I; por exemplo, "O signifié nosso.) cado da crise histórica da psicologia"). Depois contadores p s ic ó lo g o s nem de assistir a uma das conferências de Talankin, Vigotski escreveu uma carta a Luria, informando-lhe que tinha decidido oficialmente "golpeálos, porém não matá-los" (" b it, n o n ie u b iv a t" ; cf carta a Luria, 01/06/1931). Depois das pesquisas transculturais realizadas no Uzbesquistão e em Kirquizistão, os ataques que excomungavam Vigotski e Luria tornaram-se ainda mais duros, repletos de insultos, tanto verbais quanto escritos. Duas áreas de trabalho fundamentais para Vigotski, como a defectologia e a pedologia começaram a cair em desgraça. Ele passou a ser acusado de "não ser marxista" e de outras tolices, como "não . citar o camarada Stalin" em suas obras; apeA teoria psicológica histórico-cultural de Vigotski e Luria é pseudocientífica, reacionásar de tudo, essas acusações não eram inofenria, antimarxista e antiproletária, e na prática sivas, pelo contrário. A ameaça de interrogaleva à conclusão anti-soviética de que a polítitórios inquisitoriais começou a pender sobre ca da URSS é conduzida por pessoas e classes Vigotski. Não é preciso ser psicólogo para saque pensam de forma primitiva, incapazes de ber que uma indefinida ameaça de estilo alcançar o pensamento abstrato. (Cf. P. I. kafkiano é muito mais perturbadora que sua Razmislov, "O kulturno-istoríchiestoi tieori concretização. Na verdade, Vigotski teve de psijologui Vigóstogo i Luria", K n ig a i P r o le tá r s perder muito tempo preparando-se para esse k a ia R e v o lu ts ia , n. 4, p. 78-86.) eventual acontecimento durante seus últimos anos, e isso está documentado em notas de Esse artigo de Razmislov, "Sobre 'a teoria reuniões internas de seu grupo de trabalho e psicológica histórico-cultural' de Vigotski e em suas cartas. Em sua correspondência há Luria", publicado na revista O liv r o e a r e v o lu fortes indícios de que em 1933 teve de compaç ã o p r o le tá r ia em 1934, nos dá uma idéia da recer diversas vezes perante uma comissão de concepção que essas pessoas tinham da ciêninquérito. Felizmente, o caso não teve maiores cia psicológica e, sobretudo, do to m d a s c r íticonseqüências. Luria só se atreveu a publicar c a s sofridas por Vigotski a partir de 1931, que, sua monografia sobre as experiências transculalém de tudo, eram to ta lm e n te fa la z e s . (A conturais 40 anos mais tarde (cf A. R. Luria, E I clusão sobre a incapacidade de alcançar um d e s a r r o llo h is tó r ic o ... op. cit.). pensamento abstrato por parte dos dirigentes Em 1932, a situação de Vigotski em Mossoviéticos inferida por Razmislov alude ao fato . cou tornou-se praticamente insuportável, e ele de que um dos muitos sujeitos experimentais decidiu então aumentar suas atividades fora da era o presidente de uma cooperativa agrária). cidade. Começou a trabalhar no Instituto de EduQuanto a Talankin, ele foi o primeiro, em 1931, cação Herzen, em Leningrado, onde rapidamena acusar a teoria do "grupo de Vigotski e Luria" te organizou um grupo de trabalho - D. Elkonin, de "não-marxista" e a declarar que estejdevía Y.Shif, M. A. Lievina, entre outros - e passou a ser seriamente combatido" (cf A. A. Talankin, viajar, minado pela tuberculose, entre Moscou, " O p o v o r o tie n a p s ijo lo g u íc h ie s k o m fr o n ti~ :':J " s o Jarkov e Leningrado, cidades muito, distantes e b r e o p o n to de in fle x ã o n a fr e n te p s ic o l6 g ic a " ] , com os precários meios de transporte da época. Q Sovietskaia Psijonievrologuia, n 2-3, p. 140M a s p o r q u e V ig o ts k i o p to u p o r a m p lia r s u a s a ti184); ele também acusou Vigotski e Luria de infiltrar na psicologia russa as teorias de Karl v id a d e s em o u tr a c id a d e em v e z qe c o n c e n tr á -Ia s Por que Vigotski se referia dessa maneira a esse tipo de psicólogos? Vejamos, por exemplo, o que escreveu Razmislov sobre as pesquisas transculturais vygotskianas, que concluíram que as pessoas escolarizadas alcançavam um nível de abstração formal e as que não o eram permaneciam prisioneiras de um pensamento concreto; no entanto" se estas eram escolarizadas, diante dos olhos dos pesquisadores passavam do plano concreto ao lógico formal (cf. A. R. Luria, E I d e s a r r o llo h is tó r ic o de lo s p r o c e s o s c o g n itiv o s , Madri: Akal, 1986): ,t .~ ~ PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 23 e m la r k o v ? zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Não conhecemos o motivo exato e, em 2 de junho, dessa decisão, porém sabemos o que aconteceu em Jarkov. S e u g r u p o s e d e s in te g r o u n e s s a c id a d e e, com isso, acabou também a "missão histórica" que, messianicamente, ele tinha traçado para si mesmo. Quando um p r o g r a m a d e p e s q u is a fe n e c e , isso ocorre devido a c a u s a s h is tó r ic a s in te r n a s e /o u e x te r n a s , utilizando de forma bastante livre a terminologia de Imre Lakatos. O líder da ruptura com Vigotski foi Leontiev, como o leitor já deve ter imaginado. Pode-se dizer que todos têm o direito de mudar suas concepções e que Leontiev mudara as suas paulatinamente, afastando-se das de Vigotski, Isso pode ter sido resultado de uma "história interna" - uma mudança na teoria por causas imanentes a seu desenvolvimento, sem influências "externas" determinantes, fossem elas políticas, econômicas ou outras. No entanto, tudo indica que is s o n ã o fo i o q u e a c o n te c e u .' Leontiev começou a tomar público seu distanciamento de Vigotski. Como resposta a essa situação, Vigotski lhe enviou uma carta, datada em 02/08/1933, na qual, em tom cordial, não ocultava sua mágoa e lhe informava que estava ciente de tudo o que estava acontecendo, que entendia a atitude de Leontiev e que lamentava que " to d o s e le s " tivessem fracassado em alcançar o objetivo ao qual tinham dedicado seu trabalho: "estou tentando compreender o modo de Spinoza, com tristeza, porém aceitando que (seu distanciamento) é irremediável"." Nessas circunstâncias, no início de 1934, Vigotski foi convidado a assumir a direção do Departamento de Psicologia do Instituto de Medicina Experimental de toda a Rússia, em Moscou. Essa proposta poderia resolver de forma considerável muitos de seus problemas. Aceitou e começou a planejar as atividades que desenvolveria no departamento. Também se dispôs a concluir seu livro P e n s a m e n to e lin g u a g e m ; alguns de seus capítulos foram ditados a Sofia Eremina, uma taquígrafa que, depois de datilografá-los, os devolvia para serem corrigidos. Em 8 de maio, ele teve uma hemorragia em seu local de trabalho e foi levado para casa. De seu leito ditou o último capítulo do livro. Seu estado de saúde piorou foi internado pela última vez. Sua esposa Roza Noievna e sua colaboradora Bluma Vulfovna Zeigarnik revezavam-o se para cuidá-lo (G. Vigodskaia, comunicação, Moscou, 1988). Morreu durante a noite de 10 para 11 de junho." Nesse mesmo ano de 1934, Leontiev publicou um obituário de Vigotski, no qual, apesar dos elogios, se distanciava da teoria "histórico-cultural", que ele rebatizou de "históricosocial". Em 1936, a obra de Vigotski foi proibida. Durante duas décadas, todos seus ex-colaboradores se dedicariam a tarefas estritamente científicas, afastadas de questões ideológicas, com exceção de Leontiev. Ao contrário de outros grupos intelectuais, como o de Mikhail Bakhtin, por exemplo, o de Vigotski não sofreu o Gulag nem perdas físicas." Em 1955, quando as obras de Vigotski estavam prestes a ser liberadas, Leontiev e Luria visitaram a família Vigodski - d e p o is d e 2 0 a n o s , p o r u m a ú n ic a v e z - para examinar seus arquivos. A obra de Vigotski começou a ser novamente publicada a partir de 1956, d e fo r m a m u ito g r a d u a l. Luria foi quem mais contribuiu para sua divulgação." N a d é c a d a d e 50 c o m e ç o u a s e r d ifu n d id a a le n d a h a g io g r á fic a d a " tr o ik a " , criada principalmente por Leontiev, que nunca falou sobre seu passado - um autêntico apoio à política científica stalinista - e, à medida que aumentava o reconhecimento de Vigotski, mais ele se autodenominava seu autêntico seguidor. D e fa to , L u r ia a p a r e c e n a le n d a c o m o fig u r a s e c u n d á r ia , ao lado de Leontiev. A historiografia atual tem se dedicado a estudar a criação e a presença desse tipo de "lendas" nas narrações históricas, procedimento denominado "invenção de uma tradição" (cf. E. Hobsbawm e T. Ranger, eds., T h e in v e n tio n o f tr a d itio n , Cambridge University Press, 1992, p. 1-14). A psicologia histórico-cultural de Vigotski, tão castigada em sua época, foi rebatizada como "sócio-histórica", denominação que só apareceu nos anos 50 e que posteriormente abrangeria toda a psicologia soviética - incluindo a "teoria histórico-cultural" de Vigotski e a "teoria da atividade" de Leontiev. O nascimento formal da "teoria da atividade" pode ser considerado o ano de 1940, quando Leontiev preparou a primeira parte de seu projeto de tese, 24 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKI o Vigotski que fala da "zona ohgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA d e s e n v o lv im e n to zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA do p s iq u is m o , perdida durante a Segunda Guerra Mundial. Leontiev a reconstruiu e a publicou em 1947 (120 páginas). Em 1959 foi publicada sua versão ampliada, P r o b le m a s do d e s e n v o lv im e n to do p s iq u is m o (496 páginas). Sua concepção da atividade teve três variações, como pode-se perceber em seu último livro, publicado em 1975 (cf. A. N. Leontiev, A c tiv id a d , C o n c ie n c ia y P e r s o n a lid a d , tradução de Lya Skliar, revisão técnica de G. Blanck et al., Buenos Aires: Ciencias dei Hornbre, 1978, 230 p.; as reedições são mexicanas: Cartago). Nos anos 80, Luria afirmou, no prefácio para T h e O x fo r d c o m p a n io n to th e M in d , que "Vigotski foi o m a is d e s ta c a d o p s ic ó lo g o soviético e fundador da e s c o la m a is in flu e n te da psicologia soviética" (cf. a edição de R. Gregory, Oxford University Press, 1987, p. 805; o grifo é nosso). Até 1980, essa opinião de Luria não teria sido aceita na Rússia pelos seguidores de S. L. Rubinstein (cf a nota 13 do Capo 7) e por alguns dos seguidores de A. N. Leontiev. No entanto, ela foi aceita no seio da comunidade científica internacional. Os partidários de Rubinstein perderam atualmente toda a sua influência. O mesmo não ocorre com os de Leontiev, que sustentam um amplo leque de posições, que vão da recusa da teoria de Vigotski à sua plena integração com a de Leontiev" O te r c e ir o tip o de le ito r d e s te liv r o é o e s p e c ia lis ta em p s ic o lo g ia e d u c a tiv a ou em c iê n c ia s da e d u c a ç ã o . Esse leitor já conhece as teorias educativas de Vigotski mais divulgadas e certamente já leu excelentes textos, como o de L. MoU (org.), V y g o ts k y e a e d u c a ç ã o : im p lic a ç õ e s p e d a g ó g ic a s da p s ic o lo g ia s ó c io -h is tó r ic a (1996), que reúne ensaios de alguns dos mais importantes pesquisadores de Vigotski e de suas teorias educativas, bem como suas aplicações práticas nos dias de hoje. Esse leitor também pode considerar familiar o texto introdutório de R. Baquero, V y g o ts k y e a a p r e n d iz a g e m e s c o la r (1998). No entanto, esse tipo de leitor também é vítima de uma lenda: a te r c e ir a le n d a s o b r e V ig o ts k i. Esta afirma que e x is te a p e n a s u m a te o r ia e d u c a tiv a v a lio s a de V ig o ts k i: a do Vigotski tardio, do Vigotski posterior à construção de sua concepção histórico-cultural, por exemplo, to proximal" - na verdade, "zona de desenvolvimento (z o n a b liy a is h e g o r a z v itia ). de desenvolvimendeveria se dizer mais próximo" 10 Vamos nos permitir fazer uma advertência a esse tipo de leitor: a leitura de P s ic o lo g ia p e d a g ó g ic a requer ativa participação e muita atenção. Se o leitor suspender seu juízo crítico, lerá um livro diferente do que leria se não o fizesse. Para citar apenas um exemplo, considerará ingênua a concepção de Vigotski sobre o instinto; se ler com atenção, porém, comparando todas as definições clássicas de instinto com as de Vigotski, perceberá que a sua nada tem a ver com aquelas, pois ele atribui aos instintos uma plasticidade e uma falta de rigidez que contradizem todas as concepções clássicas. A TRADUÇÃO DE PSICOLOGIA PEDAGÓGICA De acordo com nossas informações, o manuscrito do presente livro se perdeu e, dos 10 mil exemplares publicados na primeira e única edição russa de 1926, restam poucas cópias. Sempre foi difícil, em qualquer lugar, o acesso a um exemplar da primeira edição da década de 20, porém na URSS isso era ainda mais complicado. Não existe um "arquivo central" que reúna todos os materiais de Vigotski, no qual o público ou o especialista possa, por exemplo, solicitar uma fotocópia de uma primeira edição ou de um manuscrito. Esses materiais estão dispersos entre o arquivo privado de sua família - o mais importante -, os de interessados em Vigotski e os de algumas instituições. Felizmente tivemos acessos aos principais, sobretudo aos da família Vigotski. Mesmo assim não conseguimos ver muitos materiais importantes, especialmente manuscritos. Em Moscou, quando pedimos a Guita Vigodskaia um exemplar de P s ic o lo g ia p e d a g ó g ic a , para fotocopiá-lo na universidade, ela nos disse que tinha apenas um e que o emprestara a Vasili Davidov, que não estava em Moscou naquele momento. Como a data de nosso regresso já estava muito próxima, renunciamos à PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A 25 idéia de conseguir uma cópia do livro e nos desconfirmar que não era uma versão taquigrafada pedimos de nossos colegas russos, além de dede aulas orais. As frases de Vigotski são sumamente longas e contêm muitas orações suborvolver o gravador e a fotocopiadora portáteis. Quando nos despedimos de Anna Stetsenko, ela dinadas também compridas que, por sua vez, têm suas próprias orações subordinadas lonnos disse que queria nos dar um presente, emgas; essas ramificações secundárias e terciábora não soubesse se ele seria útil para nós, e rias dificultam o retorno à primária. Além disnos entregou uma pasta de papelão verde. Quando a abrimos, descobrimos que era uma so, Vigotski é muito reiterativo, e as repetições de alguns vocábulos são abundantes. Talvez cópia completa dehgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P s ic o lo g ia p e d a g ó g ic a . Neste essas características expliquem por que poumomento, a pasta está diante de nós. A primeira e única edição russa de P s ic o cos tradutores respeitam seu estilo original e o lo g ia p e d a g ó g ic a , como já dissemos, é de 1926. reescrevem, passando de seu acentuado estilo Em escala mundial, a segunda edição é a da coloquial às características mais habituais do Editora St. Lucie (Boca'Ratón, Flórida, Estaensaio contemporâneo; e também por que o dos Unidos), de 1997, com o título de abreviam e embelezam, fazendo com que aqueE d u c a tio n a l P s y c h o lo g y , editada e traduzida por les que realmente conhecem Vigotski não reRobert Silverman e que inclui uma introdução conheçam mais seu estilo. Em nossa versão ao de Vasili Davidov. A p r e s e n te e d iç ã o é a p r im e iespanhol tentamos recriar as características r a em e s p a n h o l e a te r c e ir a em e s c a la m u n d ia l. essenciais do estilo de Vigotski; isso significaO primeiro rascunho da presente edição va, naturalmente, deixar de lado uma traduem espanhol foi traduzido do russo por Lya ção literal. Suprimimos muitas palavras repeSkliar no verão de 1988-89. E s s a v e r s ã o n ã o tidas. Separamos as orações demasiado lonfo i r e a liz a d a p a r a u m a e v e n tu a l p u b lic a ç ã o , mas gas e em algumas poucas oportunidades elipara nosso uso pessoal, em um momento em minamos expressões redundantes, quando elas que estávamos ocupados escrevendo alguns prejudicavam a compreensão (essas elipses textos cujos prazos de entrega estavam acaforam indicadas). Algumas características do bando. Por esse motivo, não tivemos nenhurascunho de Skliar eram a falta de precisão no ma participação nela - habitualmente, com vocabulário técnico, erros na transliteração de outros textos destinados à publicação, revisásobrenomes e uma escolha errônea da acepção vamos juntos, frase a frase, os termos técnide alguns vocábulos, quando o dicionário ofecos, a redação em espanhol, etc. Portanto, essa recia várias delas; também nos deparamos com versão não foi preparada com o esmero habio costume que têm alguns tradutores do russo tual em Skliar. Esse rascunho era uma tradude substituir automaticamente alguns termos; ção totalmente literal do russo. Precisamente por exemplo, "czarista" é substituído por "anpor isso, era quase ilegível para um leitor de terior", "soviético" por "atual", etc. Demos uma língua espanhola não-familiarizado com os texmaior precisão ao vocabulário técnico, tentantos originais de Vigotski, pois havia configurado respeitar o léxico original da década de 20, ções sintáticas russas e se respeitara totalmenrestauramos as palavras substituídas, corrigite o peculiar estilo coloquial desse poeta socimos as acepções que consideramos equivocaalista da psicologia européia. das e redigimos integralmente o texto três veQuando pensamos em publicar este livro, zes - ainda que, como se sabe, nunca exista uma redação final; Alfonso Reyes, grande acadepois de uma década, Lya Skliar havia falecidêmico, escritor e trad-utor, disse uma vez que do, e assumimos a tarefa de traduzi-lo. Nosso principal material de referência foi o velho ras"os manuscritos são entregues à editora para cunho da tradução de Skliar. não continuar corrigindo-os". Vigotski era mais um "falador" que um Por outro lado, René van de Veer comparou a versão inglesa de RobertSilverman com escritor; quando lemos este livro pela primeio original russo, escreveu numerosas correções ra vez duvidamos que tivesse sido originalmente redigido e demoramos duas semanas paraGFEDCBA e observações à margem e as enviou para nós. 26GFEDCBA llEV SEM IO N O VIC H VIG O TSK I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Em nossa opinião, a versão de Silverman respeita muito mais que outras traduções para o inglês o estilo de Vigotski e é bastante literal; para obter maior precisão, usa um inglês com mais vocábulos de origem latina que saxônica. Com relação a algumas expressões idiomáticas, optamos por aquelas que são mais familiares a um leitor argentino, pois ele é que lerá este livro, porém tentamos distanciar-nos de regionalismos e encontrar a versão mais neutra e internacional possível; consideramos que um leitor madrilenho ou venezuelano poderá compreendê-Ia. Finalmente, certos termos cuja tradução pode provocar dúvidas ou despertar curiosidade pelo vocábulo original foram reproduzidos em russo entre colchetes ao lado do termo espanhol que escolhemos, ou nas notas de rodapé. Portanto, para a presente versão, contamos com a primeira edição original russa de Vigotski, o rascunho da tradução para o espanhol de Lya Skliar, a versão inglesa de Robert Silverman, as correções e a comparação da tradução de Silverman com o original russo, trabalho efetuado por René van der Veer. Nossa comparação detalhada de todo esse material deu como resultado a presente versão para o espanhol deste livro. O veredicto final está nas mãos do leitor. Como Borges disse certa vez, com o humor que o caracterizava, esperamos que o original seja fiel à tradução. ESC LA R EC IM EN TO S II E A D VER TÊN C IA S OshgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA e s c la r e c im e n to s feitos até aqui s o b r e a p r e s e n te tr a d u ç ã o não cobrem tudo o que gostaríamos de dizer. O leitor perceberá que há o u tr o s em nossas notas. Não pretendemos que esta edição seja de um nível acadêmico supremo. Se esse fosse o caso, só estaria ao alcance de muito poucas pessoas, e assim nos afastaríamos totalmente da intenção que teve Vigotski ao escrever o texto. Entretanto, consideramos que esta é uma versão rigorosa e uma edição precisa e, sobretudo, respeitosa do espírito deste manual; não nos esqueçamos de que ele foi um c u r s o " p r o v is ó r io " d e s tin a d o a p r o fe s s o r e s como frisou o próprio autor. Com exceção de quatro notas originais de Vigotski - explicitamente indicadas -, to d a s a s n o ta s d e s ta e d iç ã o s ã o n o s s a s . Foram lidas por acadêmicos e editores, professores e estudantes universitários de graduação e pósgraduação. Alguns acadêmicos destacaram que as notas deviam se ater exclusivamente a esclarecimentos técnicos, porém até agora não encontramos nenhuma edição de um texto de Vigotski que respeitasse esse critério. Nossa decisão de descartar esse critério é alheia a esse motivo, pois é viável se ater apenas a esclarecimentos técnicos. Entre vários motivos, o descartamos porque esse critério tacitamente acusaria de falta de rigor acadêmico os textos de Vigotski publicados por universidades, como a de Moscou ou Harvard, bem como as de países como a Itália e a Alemanha. Em geral, o critério das edições russas é explicar cada nome próprio que aparece no texto: personagens históricos, míticos, literários ou outros, incluindo juízos de valor. Aceitamos tal critério e, além disso, permitimo-nos redigir comentários que nos pareciam úteis. Quanto ao to m de alguns dos nossos comentários, esforçamo-nos para que ele fosse equivalente ao das notas originais de Vigotski, embora mais atenuado - Vigotski escreve sem eufemismos. Em nossas notas identificamos as pessoas e personagens mencionadas no texto na primeira vez em que aparecem, embora em alguns casos tenhamos repetido a informação na segunda vez em que são nomeados. Muitas edições norte-americanas respeitaram o critério russo e, além disso, acrescentaram um número maior de notas e chegaram a tomar a liberdade de resumir os textos - como acontece com a s d u a s diferentes edições do MIT -, ou de reescrevê-los no estilo de expressão de um g e n tle m a n contemporâneo - como ocorre nas edições da Universidade de Harvard. Naturalmente, tais "adaptações" e resumos foram muito criticados; por exemplo, Van der Veer as chamou de c o c k ta il-ty p e m ix in g . Também não concordamos com tais ingerências no texto de um autor, porém preferimos as d e e n s in o m é d io , PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A 27 terar" como "representar s o n s de uma língua edições ricas em notas e comentários; nesse com s ig n o s a lfa b é tic o s de outra (o grifo é nossentido, permitimo-nos apelar a um recurso so). Além disso, transliterar segundo uma lista freqüente de Vigotski, amparando-nos no disupõe um conhecimento de equivalências. Mas tado popular: "é melhor sobrar do que faltar". isso, por acaso, não exige o conhecimento do Quanto àhgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tr a n s lite r a ç ã o dos vocábulos rusalfabeto cirílico? Para que serviria a transsos - incluídos os nomes, próprios - adotamos o critério fonético, isto é, optamos por escrevêliteração, quando os termos poderiam ser escritos diretamente no alfabeto russo, como se Ias de acordo com o som que têm quando se faz ultimamente nas traduções francesas? Fipronunciam em russo e acentuá-los graficamennalmente, queremos concluir este parágrafo te de acordo com as regras do espanhol. com uma última afirmação: este critério de Quando em uma palavra russa transcretransliteração não serve para outros idiomas. vemos "y" seguida de vogal, este "y" deverá Quem escreve "Vygotsky" à moda inglesa, por pronunciar-se como em rioplatense. As letras exemplo, jamais poderá interferir de modo "zh" e "z" representam dois fonemas difíceis algum como se escreve esse sobrenome no de transcrever com o alfabeto romano e tamalfabeto russo; o mesmo ocorre com outros bém devem ser pronunciadas como o "y" em rioplatense, só que de modo muito mais débil. signos das listas; e ta m b é m há mais de uma lista de equivalências inglesas do alfabeto Por último, o uso tornou a pronúncia espanhola do sobrenome de "Vigotski" tal como cirílico. Ainda que sempre escrevemos "Vigotski", o escrevemos. Cabe acrescentar que o vocábutemos respeitado a s d ife r e n te s g r a fia s de s e u lo "Vigotskii" em russo tem os três is dessa línn o m e quando fazemos referências a edições de gua: o primeiro "i" é tônico e soa aproximadamente como "ui", com acentuação prosódica suas obras, para facilitar eventual busca por parte de algum leitor. Esse critério, o seguimos no "i"; o segundo soa como o "i" espanhol; e o com relação aos nomes de todos os autores. terceiro "i" leva um til que indica tratar-se de As palavras de certos idiomas - grego, uma vogal átona; quando o "i" átono enconalemão, russo - foram traduzidas para o espatra-se no final de uma palavra, não soa. nhol. No entanto, não traduzimos as palavras Segundo alguns critérios - como o deem inglês, francês e latim, pois essas línguas fendido, por Umberto Eco, por exemplo -, o supostamente foram estudadas por todos os objetivo da transliteração não é saber como leitores deste livro. se pronuncia uma palavra, mas como ela é T o d a a in fo r m a ç ã o e n tr e c o lc h e te s [ ] foi escrita em seu alfabeto original, neste caso o proporcionada por nós. cirílico, mediante uma lista de equivalências. As e lip s e s merecem uma explicação mais Esse critério, contudo, é impossível de ser sedetalhada. Quando elas são originais do livro guido por várias razões: não existe uma, mas de Vigotski, as escrevemos - como ele fazia, duas ou mais dessas listas em espanhol; há quando se lembrava - com três pontos entre vocabulários inteiros, e não apenas fonemas, parênteses: (...). Quando são nossas, as indique não correspondem aos signos de nenhucamos com três pontos entre colchetes: [...]. ma lista. Nos sobrenomes, esse problema é Entre elas, porém, cabe distinguir (1) as que mais evidente naqueles que não são russos. se encontram no corpo do texto escrito por Por exemplo, quando em russo se escreve "kk" Vigotski e (2) as que se encontram nas c ita ç õ e s ou "k", isso pode corresponder ao "ck" no alfe ita s p o r V ig o ts k i de o u tr o s a u to r e s . (1) As que fabeto romano, como em 'John Locke", que estão no texto escrito por Vigotski - assim como em cirílico se escreve, transcrito, "Dyon Lokk". as de nossas notas - são elipses realizadas por Por outro lado, o D ic c io n a r io de I a L e n g u a nós. (2) Em compensação, os "[ ...]" que apaE s p a iio la da Real Academia não translitera recem nas citações de outros autores, feitas por palavra de etimologia grega, grafando-a no Vigotski, n ã o s ã o e lip s e s n o s s a s , mas indicações alfabeto grego; esse dicionário define "transli-GFEDCBA r'IHGFEDCBA 1 I 28GFEDCBA LlEV SEM IO N O VIC H VIG O TSK I em que o fez, esses dados estão incompletos; de que Vigotski fez uma elipse que não indicou. Como dissemos no parágrafo anterior, geralmente ele citava o sobrenome, porém deinesse caso se trata de informação proporcioxava de lado o nome e as iniciais do autor, não nada por nós. mencionava os títulos dos textos nem a editora, No presente livro, oshgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA te r m o s "meio" e o lugar e a data da publicação, nem as páginas "ambiente" devem ser considerados sinônidas citações. Além disso, salvo algumas vezes, mos. O mesmo ocorre com "conduta" e "comcostumava citar de cor, e colocava as citações entre aspas (!). Essas características, como o leiportamento": Respeitamos o termo "professor" [ u c h itie l] tor do presente livro pode imaginar ou comproque Vigotski usa em todo o livro para referirvar, representam um pesadelo para qualquer editor. nos ao professor de ensino médio - ainda que em muitos casos ele se refira a contextos do A c r e s c e n ta m o s q u a s e to d a s as r e fe r ê n c ia s ensino fundamental. A designação dos profesq u e fa lta v a m , colocando-as ao final da citação sores de ensino médio muda bastante conforentre colchetes ou nas notas ao final dos capíme os diferentes léxicos. tulos. Não nos foi possível esclarecer as refeVigotski trata os vocábulos "subconsrências que não forneciam nenhuma pista, ciente" ( p o d s o z n a tie ln o ie ) e "inconsciente" como, por exemplo, quando Vigotski diz "um ( b e z o z n a tie ln o ie ) como sinônimos; por isso, o pesquisador disse uma vez ... ", ou "como frileitor que tentar discriminá-los estará fazendo sou um pedagogo ... ", etc. Também não pudeum esforço inútil. mos identificar alguns textos de algum autor As palavras "alma", "espírito", "psique", mencionado, quando ele citava apenas o so"psiquismo", "mente" e outras afins devem ser brenome desse autor e alguma expressão ou consideradas sinônimos de "atividade psíquica", citação do mesmo entre aspas. a menos que o contexto indique o contrário. O termo "psicológico" deve ser considerado sinôA G R A D EC IM EN TO S nimo de função ou acesso "psíquico" ou deve ser usado em uma acepção que denota "próPelas numerosas vezes que nos recebeu prio da matriz disciplinar chamada psicologia", em sua casa; por ter colocado seus arquivos conforme o contexto em que for usado. privados à nossa total disposição sem qualquer Para Vigotski, as palavras ''América'' e tipo de reserva; pelos livros que nos deu e pe"americano" sempre se referem a Estados Unilas fotocópias e fotografias que nos permitiu dos e a norte-americano, com apenas uma extirar; por ter-nos permitido entrar em contato ceção - uma referência histórica à descoberta telefônico com M a r ia S e m io n o v n a V ig o d s k a ia , da América. irmã mais moça de Vigotski, que se encontraFinalmente, queremos fazer um comentáva em repouso absoluto, mas mesmo assim nos rio sobre o tr a ta m e n to das r e fe r ê n c ia s e c ita ç õ e s esclareceu certas datas e outros dados; por ter fe ita s p o r V ig o ts k i. Em primeiro lugar, ele não nos dado permissão para a publicação das respeitava as convenções de sua época. Tamobras de Vigotski; pelas longas conversas que bém não tinha o costume de apresentar uma tivemos, tanto sobre a vida particular e públibreve bibliografia ao final do texto. Como perca de seu pai, bem como sua própria vida pesceberão, com exceção de sobrenomes e do títusoal, em um tom íntimo e espontâneo desprolo de alguns textos, ele não fornecia os dados vido de qualquer protocolo; enfim, por sua dos materiais de referência; nas poucas vezes cálida e generosa amizade, nosso maior agradecimento é e sempre será para G u ita L v o v n a v ig o d s k a ia , filha mais velha de Vigotski. Esten· N. de R.T. Ao contrário do que ocorre na edição demos nosso agradecimento a toda a sua faargentina, que prefere o termo "conduta", nesta mília, sobretudo à sua filha E le n a K r a ts o v a . edição preferimos o termo "comportamento" porEstamos em dívida com A n n a S te ts e n k o , que este é o mais utilizado na psicologia e pedagoque nos ofereceu uma fotocópia completa da gia brasileiras. --- ---- ----------- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 29 que trabalharam com Vigotski e que, antes de e única edição russa dehgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P s ic o lo g ia p e morrer, nos forneceram dados importantes. d a g ó g ic a . Também temos de agradecer a D m itr i Como já dissemos, Galpierin escreveu, a nosso L e o n tie v , agente literário de Guita, que nos ajupedido, um perfil psicológico de Vigotski. Seu dou desinteressada e generosamente em comvalor reside em que Galpierin foi um psicólogo plexos trâmites que permitiram que este livro que manteve relações pessoais com Vigotski dupudesse ser publicado. rante bastante tempo e tinha um olho clínico Muito devemos àqueles que consideramos excepcional. A generosidade de Galpierin exceperitos na biografia de Vigotski: além de Guita deu nossas expectativas. Vigodskaia, T â m a r a L ija n o v a , A n d r e i P u z ir ie i e K a r l L e v itin , com os quais tivemos reveladoras Também estamos em dívida com várias pessoas que incomodamos muito enquanto conversas em Moscou e que nos permitiram o preparávamos esta edição: Gabriel Álvarez, acesso a materiais de seus arquivos pessoais. Puziriei deu-nos uma cópia das cartas escritas Ernesto Arenzon, Cristina Bellini, Brenda Berstein, Jorge Mario Berstein, Viola Féjer, por Vigotski que pude recopilar e ainda estão inéditas. Tâmara Lifanova nos proporcionou Camilo Fernández Hlede, Graciela Merzari, dados de seu minucioso e inteligente trabalho Alberto Onna, Adriana Silvestri, Claudia de detetive e arqueóloga em todos os arquivos Singerman e Nilda Venticinque. Todas elas ofeque explorou. Levitin discutiu conosco os asreceram sua ajuda, em diversas formas e graus pectos metodológicos da história oral que o de participação, paciente e generosamente. levou, depois de muitas conversas com Semion Algumas delas nos fizeram várias sugestões Dobkin, a reconstruir a infância e a juventude sobre diversos aspectos do tratamento do texde Vigotski. to. Quando, m o tu p r o p r io , não aceitamos inR e n é v a n d e r V e e r merece um parágrafo à corporar algumas dessas sugestões, sabemos parte e, por mais extenso que ele seja, mal pode quais podem ser as prováveis conseqüências dar conta de nossa dívida e agradecimento. Van de nossa escolha, pois, segundo Aristóteles, a responsabilidade é totalmente nossa. der Veer é a máxima autoridade mundial em Finalmente, gostaríamos de dedicar nosVigotski. Colaboramos em diversas áreas e intercambiamos, discutimos e corrigimos nosso trabalho de edição do presente livro à mesos materiais inéditos antes de os tornar públimória de nossa querida amiga e colaboradora Lya Skliar. Nossa dívida com ela é imensa e cos. Compartilhamos muitas opiniões e valores fundamentais, que hoje estão cada vez mais eterna.GFEDCBA em desuso nos ambientes acadêmicos. Também discrepamos sobre certos aspectos de nossos trabalhos sem termos conseguido chegar neN O TA S cessariamente a um acordo, como d e v e a c o n te 1. O leitor que fala apenas o espanhol, interessac e r em todo trabalho científico sério. Quando do em maiores detalhes, pode ler nossos capíeste livro já estava no prelo, ele nos enviou tulos: Guilhermo Blanck, "Vygotsky: EI hombre sem que o tivéssemos pedido - seu resumo da y su Causa", no livro: Luis MoI! (org.), V y g o ts k y presente edição de P s ic o lo g ia p e d a g ó g ic a , que y la E d u c a c ió n , Buenos fures: Aique, 1993 - a pudemos incluir no início do livro e que nos edição original em inglês e suas 5 reimpressões surpreendeu pelos elogiosos juízos. Nossa cosão de Cambridge University Press; e G. Blanck, municação foi ininterrupta, e ele foi nosso prin"Vigotski en el Afio 2000: La Leyenda y Ia Hiscipal interlocutor. A espera da próxima carta tória", no livro: S. Dubrovsky (org.), V ig o ts k i: de Van der Veer sempre nos provocava maior S u p r o y e c c ió n en e l p e n s a m ie n to a c tu a l, Buenos suspense que o da leitura de um excitante roAires: Novedades Educativas, 2000. Textos do mance por capítulos. Mas uma curiosa diferenpróprio Vigotski: L. S. Vygotski, E l desarrollo de los procesos psicológicos superiores (antologia ça com essa situação é que nenhum folhetim de M. Cole et a!.), Barcelona: Crítica, várias do século XIX durou 13 anos. edições; L. S. Vigotski, E l D e s a r r o llo C u ltu r a l d e i Estaremos sempre em dívida com P io tr N in o y o tr o s te x to s in é d ito s , edição de G. Blanck, G a ip ie r in , B lu m a Z e ig a r n ik e N a ta lia M o r o z o v a , HGFEDCBA primeira 30GFEDCBA LlEV SEM IO N O VIC H VIG O TSK I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 1988; L. S. Vigotski,hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA infância de Vigotski, houve dois p o g r o m s em edição de Gornel, em 1903 e 1906. Seu pai participou G. Blanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998; L. S. da autodefesa judia do primeiro, um dos pouVygotsky, P e n s a m ie n to y le n g u a je , Buenos Aires: cos em que os cossacos não triunfaram. Fausto, várias edições - não é necessário ler esta 3. Não podemos esquecer que a Rússia estava versão resumida se o leitor for ler a versão comimersa em uma feroz Guerra Civil, pois os nopleta, incluída no Tomo II de suas O b r a s E s c o bres queriam recuperar o poder. Eles eram os g id a s - L. S. Vygotski, O b r a s E s c o g id a s , 6 tomos, Brancos, apoiados por exércitos estrangeiros Madri: Visor, 1991 - 2000; e L. S. Vygotski, de 14 países instalados em solo russo, entre P s ic o lo g ía d e i A r te , Madri: Visor, 1999: eles o da Alemanha, o dos Estados Unidos e o 2. No Império Russo, os judeus tinham de resido Japão. Os Brancos lutavam para restaurar dir obrigatoriamente no R a y o n , um gueto gia ordem favorável aos ricos. Os Vermelhos eram gantesco que abrangia vários países e do qual os comunistas, os pobres. Além disso, nas pealguns comerciantes, profissionais indepenquenas repúblicas do sudoeste do Império, dentes e os poucos estudantes que tinham concomo a Bielo-Rússia, estavam os a ta m a n e s , isto seguido ingressar nas universidades russas poé, os caudilhos nacionalistas conservadores, diam sair. ( R a y o n é uma palavra francesa que que eram chamados de Negros. A luta era tadesignava a "zona de estabelecimento dos jumanha que uma cidade ia dormir com um godeus" na Rússia de Vigotski; esse termo franverno de uma cor e amanhecia com o de oucês também é utilizado quando se fala em tra. Devido ao frio e à fome da guerra, na faiídiche e alemão; em inglês usa-se o termo mília Vigodski havia tuberculose. Em 1919, seu P a le o f S e ttle m e n t) . Era perigoso viver no irmão Dodik morreu de tuberculose aos 14 R a y o n , porque às vezes havia p o g r o m s . Este anos. Pouco depois morreu outro irmão, Isaak, termo provém do vocábulo russo p o g r o m , que de tifo. Restaram seis irmãs e os pais de significa "ataque em massa" (contra os juVigotski. Sua mãe também sofria de tubercudeus). Os p o g r o m s eram organizados pelo lose. Quando estava cuidando do irmão Dodik governo czarista. Durante eles, os cossacos e da mãe, Vigotski contraiu essa doença, que o martelavam pregos nas cabeças dos velhos, mataria 15 anos mais tarde. Sua doença semarrancavam olhos, torturavam crianças, estupre foi grave e, ano após ano, ele ouvia senpravam mulheres e roubavam tudo o que potenças de morte dos médicos. Foi internado três diam durante três dias - no quarto dia, as trovezes em estado grave. Na primeira, convencipas regulares czaristas saíam às ruas para "resdo de que iria morrer, pediu a Dobkin que se tabelecer a ordem". Era muito perigoso sair encarregasse de que sua monografia sobre do R a y o n sem permissão, como deve recorH a m le t, seus ensaios literários e suas críticas dar todo aquele que assistiu ao filme O h o teatrais fossem publicados. Vigotski não morm em d e K ie v ou que leu o romance de reu naquela ocasião, mas esses escritos comeMalamud, em que ele se baseia. Durante a çaram a ser publicados só a partir de 1965, isto é, 45 anos mais tarde. Em 1919, Gornel foi liberada definitivamente dos alemães pelos Vermelhos elá não houve mais guerra durante a vida de Vigotski. "N. de R.T. Das obras citadas por G. Blanck, encon4. Luria fora o principal colaborador de Vigotski, tram-se traduzidas no Brasil: Moll, L. C. v y g o ts k y e a de cujas concepções histórico-culturais compare d u c a ç ã o : im p lic a ç õ e s p e d a g ó g ic a s da p s ic o lo g ia s ó c io tilhou a vida inteira. Leontiev tinha aderido h is tó r ic a . Porto Alegre: Artes Médicas (Artmed), 1996; c o m p le ta m e n te às idéias de Vigotski, pelo mea versão resumida de P e n s a m e n to e L in g u a g e m foi nos até 1931, quando publicou seu livro publicada por Martins Fontes, várias edições. Em da m em óR a z v itie p a m ia ti [O d e s e n v o lv im e n to 2001, essa mesma editora publicou uma tradução r ia ] , que começara a escrever dois anos antes, completa desse livro com o seguinte título: A c o n s com um prólogo de Vigotski. (Os prólogos a tr u ç ã o do p e n s a m e n to e da lin g u a g e m ; Martins Fonum livro alheio são escritos depois de ele ser tes também publicou uma tradução de P s ic o lo g ia d a concluído; além disso, as provas dos livros são A r te em 1999. Cole, M. et al. organizaram, nos EUA, corrigidas até o último momento; em algumas uma antologia que Martins Fontes publicou no Branotas de rodapé de seus textos, Vigotski escresil sob o título: A jo r m a ç ã o s o c ia l da m e n te . Há váve, por exemplo, "estando este livro no prelo, rias edições dessa obra. Buenos Aires: Almagesto, L a G e n ia lid a d y o tr o s te x to s in é d ito s , PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A 31 de sua vida - política, econômica e animicaficamos sabendo que ... ", e acrescenta a informente -, não tenha se sentido tr a íd o p e s s o a lmação posterior à redação do mesmo). Além m e n te por aqueles que tinham sido seus pridisso, no final de 1932, ohgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA J o u r n a l o f G e n e tic 2 meiros discípulos e colaboradores, por mais P s y c h o lo g y (n 40, p. 52-81), publicou o artigo que compreendesse que poderiam ter existide Leontiev, "The development of voluntary do certos motivos de "história interna" (mas, attention in the child", que correspondia ao ainda que estes tivessem existido, nos pergunquarto capítulo de seu livro, e d ita d o p o r V ig o ts k i tamos: m o r a lm e n te falando, era e s te o momene L u r ia , que acrescentaram um resumo e seu to mais apropriado para torná-los públicos? primeiro parágrafo. Certamente a família de Vigotski também o Tudo indica que Leontiev mudou suas concepinterpretou da mesma maneira. Se isso não ções d e m a s ia d o r a p id a m e n te , durante a creshouvesse acontecido, não teria ocorrido o epicente atmosfera de q uestionarnento ideológico a Vigotski, quando foi acusado de "não ser sódio que narraremos posteriormente. marxista". Não negamos que tenha podido 6. O velório de Vigotski foi realizado em uma haver alguma "histórieintema'', mas no consala de aula do Instituto de Defectologia. Havia tanta gente que o féretro teve de ser transtexto em que ocorreu sua mudança não há ladado para o pátio. Existe um segredo (que nenhuma dúvida, em nossa opinião, de que todos conhecem) relativo a um episódio soela correspondeu, sobretudo, a questões de "história externa" - uma mudança na teoria bre o qual, de acordo com nossas informações, ninguém escreveu nada. Esse episódio, devido a causas a lh e ia s à sua lógica de desenvolvimento interno. Nossa asserção pode ser presenciado por muitos, foi transmitido oralrespaldada pelo fato de que a mudança de mente às gerações seguintes. Todas as vezes que quisemos relatá-lo e comentamos nossa Leontiev ocorreu em um sentido que estava plenamente de acordo com o fundamentaintenção, muitos nos sugeriram que não o filismo oficial stalinista - o deslocamento da zéssernos, porque isso poderia provocar malimportância do "signo" para a "ferramenta" e estar entre aqueles que são partidários, ao da "comunicação" para o "trabalho". Por oumesmo tempo, de Vigotski e Leontiev. Desde tro lado, exceto por algumas asserções de conque ficamos sabendo desse episódio - que nos tornos indefinidos, Leontiev não possuía nafoi confirmado por várias fontes - passaramquele momento uma teoria alternativa; demose 12 anos. E, desde que ele aconteceu, 65 rou seis anos para configurar sua "Teoria da anos. Não o pretendemos calar mais. Se a ciênAtividade" . cia busca a verdade, não deve temê-Ia e, se 5. Em princípio, Luria aderira ao grupo de Jarkov, não a suporta, não merece o nome que tem. para onde se mudou em 1932, mas depois de No momento de transladar o féretro - um rimuitas deliberações voltou a trabalhar em tual muito importante para os russos -, Luria Moscou. Segundo Guita L. Vigodskaia (comue Leontiev pediram permissão à família de nicação pessoal, Moscou, 1988), V ig o ts k i r o m Vigotskí para ajudar, porém esta se negou a p e u d e fin itiv a m e n te s u a r e la ç ã o c o m L e o n tie v n o lhes conceder esse privilégio. Luria e Leontiev fin a l d e 1933 e n u n c a m a is Q to r n o u a v e r ; mais começaram a chorar e a gritar desesperadamente no pátio do instituto, diante de todos tarde, teriam se correspondido com relação a questões estritamente científicas. A ruptura os presentes. Vígotski foi enterrado no cemitério Novodieteria se devido ao fato de que Leontiev disse a víchí de Moscou, junto aos túmulos dos mais Luria, por carta, que as idéias de Vigotski pertenciam ao passado e lhe propôs que se disimportantes artistas e cientistas russos. tanciasse de Vigotski e começasse a trabalhar 7. A viuvez de Roza Noievna Vigodskaia foi dura: com ele. Não sabemos por que Luria aceitou manteve sua família tendo que trabalhar até 16 horas diárias, cuidando de crianças portaessa proposta em um primeiro impulso, mas doras de deficiências. Durante a invasão alerapidamente se arrependeu de sua decisão, à URSS, em 1941, a família Vigodski foi mãHGFEDCBA relatou o episódio a Vigotski e mostrou-lhe a transladada para a cidade de Ufá. Sua filha recarta de Leontiev, Vigotski reagiu, enviando a corda que, quando puderam retomar a MosLeontiev uma carta duríssima - à qual ainda não se tem acesso. V ig o ts k i ta m b é m m u d o u p e r cou, ao se aproximarem do prédio onde viviam, c e p tiv e lm e n te s u a r e la ç ã o c o m L u r ia . É improviu algumas folhas manuscritas de seu pai que vável que Vigotski, no momento mais difícilGFEDCBAsaíam voando pela janela e que ela recolheu 32GFEDCBA LlEV SEM IO N O VIC H VIG O TSK I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA pectos educativos da teoria de Vigotski; seu com a ajuda dos vizinhos (comunicação pesneto mais velho, Liev Kravtosv, faz pós-graduasoal, Moscou, 1988). ção em psicologia. A única filha de Luria 8. Não duvidamos que Luria sentia uma autên[Elena], renomada microbióloga, suicidou-se tica devoção por Vigotski, nem que um sentina Inglaterra em 1992; a Editora Gnozis, de mento de culpa o acompanhou durante toda Moscou, publicou postumamente seu livro M o i a vida, sem nenhuma possibilidade de o tie ts . A . R . L u r ia [ M e u p a i: A . R . L u r ia ] , em redenção. Todos os q~e deixaram testemunho 1994. O filho de A. N. Leontiev, Aléxis, um consde suas conversas com Luria frisaram que, pícuo psicolingüista, e seu neto Dmitri, destasempre que surgia o nome de Vigotski, seu cado psicólogo, estudioso da teoria da persotom de voz mudava e sua linguagem gestual nalidade, da logoterapia e da psicologia da arte, denotava dor. Luria foi um dos maiores neumoram em Moscou. Em 1996, a editora S m is l ropsicólogos da história, mas sempre repetia [Significado], de Moscou, propriedade de que nada tinha feito além de desenvolverhgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA um a Dmitri A. Leontiev, publicou o monumental lidas tantas idéias de Vigotski. Isso é verdade, pois a obra de Luria no ~mbito da neuropsivro que Guita Vigodskaia e Tâmara Lifonova escreveram sobre Vigotski (G. L. Vigodskaia e cologia, área em que se tornou mundialmente T. M. Lifanova, L ie v S e m io n o v itc h V ig o ts k y . Y iz n . famoso, baseou-se na concepção de Vigotski D ie ia tie ln o s t. S h tr iji k p o r tr ie tu [ L ie v S e m io n o sobre a organização cerebral dos processos psíquicos (cf. L. S. Vygotski, "A psicologia e a v itc h V ig o ts k i. V id a . A tiv id a d e . D e ta lh e s p a r a u m teoria da localização das funções psíquicas", r e tr a to ] . Moscou: Smisl, 1996, 420 páginas e de 1934, em: O b r a s ... , op. cit., t. I, p. 13357 fotografias). 139). Mas também é verdade que o desen10. Consideramos que o presente livro servirá para volvimento de Luria transformou essa concepenriquecer a visão global da obra de Vigotski. O ção em uma das mais importantes da história mesmo aconteceria, se fosse possível ter acesso da ciência. a eles, com os dois grandes livros de Vigotski 9. Em 1935, um ano depois de Vigotski, sua mãe publicados postumamente por seus colaboradomorreu (não foi por causa da tuberculose); seu res, antes de serem proibidos (cf. L. S. Vigotski, pai morrera em 1931. Sua viúva, Roza N. O s n o v i P ie d o lo g u i [ F u n d a m e n to s de p e d o lo g ia ] , Vigodskaia, morreu em 1979. Sua filha Ásia L. edição de M. A. Lievina, Leningrado: Izdanie Vigodskaia (1930), que se dedicaraHGFEDCBA à biofísica, Instituta [Editora do Instituto Herzen], 1935; morreu em 1985 de descompensação clínica U m s tv ie n o ie r a z v itie d ie tii v p r o ts ie s ie o b u c h e n ia aguda, cujo diagnóstico é impreciso, segundo [ O d e s e n v o lv im e n to in te le c tu a l da c r ia n ç a no p r o nossas indagações em Moscou. Em 1991, morc e s s o de e n s in o /a p r e n d iz a g e m ] , Moscou-Leninreu a União Soviética, e a Rússia caiu no abisgrado: GIZ, 1935; e com mais uma dúzia de mo na anomia e no caos ...Guita L. Vigodskaia outros textos, que apareceram em diversas for(1925) formou-se em psicologia infantil (cf. por mas até 1936. Muito poucos pesquisadores posexemplo, sua R a z v itie jv a ta tie ln ij d v iy e n ie u suem cópias dessas publicações russas da décar ie b o n k a na p ie r v o m g o d u y iz n i [O d e s e n v o lv ida de 30. Devemos acrescentar a elas os textos m e n to do m o v im e n to de a p r e e n s ã o na c r ia n ç a de defectologia de Vigotski, que também exd u r a n te o p r im e ir o a n o de v id a ] , manuscrito põem desenvolvimentos de suas noções inédito, arquivos da Universidade de Moscou, educativas, das quais até hoje ninguém parece 1952). Guita Vigodskaia aposentou-se e dediter se dado conta. Não nos referimos apenas ao disponível volume V de suas O b r a s ... , op. cit., cou-se ao estudo da biografia do pai; vive atualmas também a outros escritos defectológicos que mente em Moscou. Sua filha, Elena Kravtsova, também é psicóloga e especializou-se nos aspermanecem inéditos. Prólogo à Edição R ussa de 1926 L ie v S e m io n o v itc h V ig o ts k i o desenvolvimento de nossas reações é a história de nossa vida (. ..). Se tivéssemos tido de encontrar a verdade mais importante que a psicologia contemporânea pode dar a um professor, , esta teria sido simplesmente: o aluno é um aparato que reage. r' o objetivo do presente livro é eminentemente prático. Desejo auxiliar nossa Escola de Formação de Professores" e o professor comum e contribuir com a elaboração de uma concepção científica do processo pedagógico de acordo com os novos dados aportados pela ciência psicológica. · N. de R.T. Nos textos que apresentam aspectos biográficos da vida deVigotski, temos encontrado muitas formas diferentes para caracterizar a escola em que Vigotski lecionara em Gornel, entre 1917 e 1924, que se dedicava a formar professores para as séries com crianças entre 10 e 15 anos. Por exemplo: Riviéri, A. L a p s ic o lo g ía de V y g o ts k y . 3.ed. Madri: Visor, 1988, fala em " E s c u e la de M a g is té r io de G o m e i" ; na tradução do livro-texto de VAN DER VEER, R.; Valsiner, J. V jg o ts k y : u m a s ín te s e . São Paulo: Loyola, 1996, encontramos "Colégio Pedagógico"; Oliveira, M. K. V y g o ts k y : a p r e n d iz a d o e d e s e n v o lv im e n to : u m p r o c e s s o s ó c io - h is tó r ic o . 4.ed. São Paulo: Scipione, 1998, fala em " escola de formação de professores". Como o livro de Vigotski foi elaborado como curso para a formação de professores, que hoje no Brasil corresponderiam aos docentes do ensino fundamental e médio, e, levando-se em consideração o original russo, a denominação utilizada por Oliveira (1998), por ser mais genérica, ajusta-se melhor à realidade brasileira atual, além de não desvirtuar a intenção original de Vigotski.GFEDCBA Hugo Münsterberg,hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCB P s y c h o lo g y a n d th e T e a c h e r ' HGFEDCBA Atualmente [cerca de 1923], a psicologia está passando por uma crise. Suas teses mais básicas e fundamentais são revistas e, por isso, tanto na ciência quanto na escola reina a mais completa divergência de idéias. A confiança nos velhos sistemas foi minada, enquanto os novos ainda não se formaram o suficiente para poder se atrever a configurar uma ciência aplicada. A crise da psicologia também denota, inevitavelmente, uma crise para o sistema da psicologia pedagógica e sua completa reestruturação. Apesar disso, nesse aspecto a nova psicologia é mais afortunada que suas antecessoras: não tem de "extrair conclusões" de suas teses, nem se furtar de aplicar seus dados à educação. O problema pedagógico está situado ~o centro da nova psicologia. A teoria dos reflexos condicionados constitui a base sobre a qual a nova psicologia deve ser construída. "Reflexo condicionado" é o nome do mecanismo que nos translada da biologia à sociologia e permite esclarecer a essência e a natureza do processo educativo. Devemos dizer diretamente que, devido a essa descoberta [o reflexo condicionado], foi possível que a psicologia pedagógica se transformasse em uma ciência, pois até esse momento ela carecia do princípio fundamental necessário para a unificação, em um todo único, dos fragmentados conhecimentos fáticos q~e utilizava. 34GFEDCBA LlEV SEM IO N O VIC H I VIG O TSK I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA curso" A principal tarefa do [presente] deve ser aspirar a manter a unidade científica de princípio ao analisar elementos separados da educação e ao descrever diferentes aspectos do processo pedagógico. É extraordinariamente importante demonstrar com precisão científica exaustiva que a educação - seja qual for o aspecto ao qual ela se referir e sejam quais forem as formas que adotar -, sempre tem em sua base o mecanismo de educação de um reflexo condicionado. No entanto, seria incorreto ver nesse princípio um recurso que esclarece tudo e uma panacéia, uma espécie deAbre-te Sésamo!" mágico da nova psicologia. Isso ocorre porque a psicologia pedagógica, pela própria essência de sua tarefa, opera com fatos e categorias de caráter e ordem mais complexos que uma reação ou um reflexo isolado e, em geral, que tudo aquilo pesquisado pela ciência atual sobre a atividade nervosa superior do ser humano." O pedagogo deve abordar as formas mais sintéticas do comportamento, as reações integrais do organismo. Por isso, a teoria dos reflexos condicionados não pode constituir a única base e o exclusivo fundamento para o presente curso. Ao analisar e descrever as formas mais complexas da conduta, é preciso utilizar plenamente todo o material científico fidedigno da psicologia anterior, traduzindo os velhos conceitos para a nova linguagem. Ao mesmo tempo, o autor tentou descobrir e demonstrar a natureza motora, reflexa, de qualquer forma de conduta para, desse modo, vinculá-Ia aos pontos de vista fundamentais e básicos sobre o tema. De acordo com Münsterberg, supomos que já passou a época em queHGFEDCBA ga, considerando-a o meio mais compreensível, cômodo e econômico para descrever muitos fenômenos; ela deve ser mantida transitoriamente até se elaborar uma nova linguagem científica. Criar novas palavras e denominações nos pareceu uma pretensão falsa, porque para descrever os fenômenos seria preciso utilizar o nome antigo e também o material anterior. Por isso, consideramos mais adequado decifrar em cada caso o verdadeiro conteúdo, tanto de um termo antigo quanto do próprio material. Por essa razão, o livro tem marcas evidentes da época científica de crise e mudança em que foi elaborado." Ao mesmo tempo, como ocorre com qualquer exposição sistemática, o autor com freqüência tem de expor opiniões alheias e ser o tradutor de idéias alheias à sua própria linguagem; também tem de enunciar suas próprias considerações e reuni-Ias com as de outros. Apesar disso, o autor pensa que este livro deve ser considerado uma nova experiência no que se refere à estruturação de um curso de psicologia pedagógica, como uma tentativa de criar um manual de novo tipo. A escolha do sistema e da disposição do material constitui uma experiência nova e ainda não realizada de fazer uma grande síntese dos mais diversos dados e fatos científicos. Em sua presente forma, o livro não reitera nenhum dos manuais conhecidos pelo autor sobre o mesmo tema. Por isso, o autor assume conscientemente como própria cada uma das idéias deste livro. Fica a critério da crítica competente dizer até que ponto se chegou a essa síntese; o autor a incita a tomar o livro como um manual transitório que, no mais curto prazo, deve ser substituído por outro mais completo.' [...] todo aspecto motor parecia um apêndice A imperfeição de uma primeira experiênsem importância, sem o qual a vida mental podia seguir seu caminho. Agora tudo parece ser o cia - além de todos os erros pessoais do autor contrário. A atitude ativa e a ação são consideparece totalmente inevitável quando se trata de radas condições para que seja possível desenconstruir em um terreno ainda não desbravavolver os processos centrais. Pensamos porque do. O autor considerou que a única meta do agimos. [H. Münsterberg,hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P s y c h o lo g y a n d th e curso é a aplicação rigorosa e conseqüente do T e a c h e r , New York:Appleton, 1909, p. 116.] ponto de vista fundamental sobre o processo educativo: um processo de reorganização soNo tocante à terminologia, o autor não cial das formas biológicas da conduta. Por isso, temeu, em momento algum, conservar a antia criação de um curso de psicologia pedagógica PSIC O LO G IA com uma base biossocial constituiu a principal intenção do autor. Consideraria [o autor] que seu trabalho alcançou o objetivo proposto se, apesar de todas as imperfeições deste primeiro passo, ele seguiu a direção correta: se o livro foi o primeiro passo rumo à criação de um sistema objetivo e exato de psicologia pedagógica.GFEDCBA PED A G Ó G IC A 35 pela ciência, mais cedo ou mais tarde, a nosso mundo subjetivo e, ao mesmo tempo, esclarecerá de modo surpreendente nossa misteriosa natureza, elucidará o mecanismo e o significado vital da maior preocupação do ser humano: sua consciência, os tormentos de sua consciência. Por isso, permiti em minha exposição certa contradição nas palavras. No título de meu discurso e durante sua exposição utilizei o termo 'psíquico', ainda que tenha apresentado apenas pesquisas objetivas, deixando comN O TA S pletamente de lado o subjetivo. Os fenômenos da vida chamados 'psíquicos', objetivamente 1. Na edição original, essa ~ a epígrafe do livro, obs.erváveis nos animais, distinguem-se, mesimpressa antes deste "Prólogo". Permitimo-nos mo que seja apenas pelo seu nível de complecolocá-lo aqui, como foi feito em várias edições xidade, dos fenômenos puramente fisiológicos. acadêmicas de textos de Vigotski com suas Que importância tem chamá-los de 'fenômeepígrafes. Por outro lado, o título original da nos psíquicos' ou 'complexos nervosos' para [ P r e d is presente introdução é apenas "Prólogo"hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA diferenciá-los dos simples fatos fisiológicos, lo v ie ] e não, obviamente, "Prólogo à edição russa caso se tenha compreendido e admitido que de 1926". Essa epígrafe, ao contrário da de ouum naturalista [um biólogo] só pode abordátros textos de Vigotski, não reflete de forma adelos objetivamente sem se preocupar de forma quada o conteúdo fundamental do livro. Em alguma com o problema de sua natureza?" nossa opinião, a explicação mais provável de [ N o ta o r ig in a l de V ig o ts k i] . sua escolha foi enfatizar a categoria de "reação", Vigotski não nos fornece nenhum dado sobre que é mais ampla que a de "reflexo", como exessa citação.HGFEDCBA O texto citado é o penúltimo paplica Vigotski no Capítulo 2. Quando escreveu rágrafo do chamado "Discurso de Madri", no este livro, uma de suas preocupações era destaqual Pavlov definiu p e la p r im e ir a v e z os reflecar certas limitações que tinha percebido na xos in/condicionados. Trata-se do relato de reflexologia, estando mais influenciado por conIvan Petrovitch Pavlov em uma das sessões plecepções reatológicas. nárias do Congresso Internacional de Medici2. O original russo diz, literalmente, "Escola Pena realizado em Madri, em abril de 1903. Foi dagógica". publicado pela primeira vez na Rússia em N o 3. A partir de 1928, o próprio Vigotski irá além tíc ia s d a A c a d e m ia M ilita r , 1903, p. 103. O tídessas categorias às quais chegara a ciência da tulo da moção é "A Psicologia e a Psicopatoépoca. Perguntamo-nos se ele foi consciente de logia experimentais dos animais". Cf. I. P. quanto já tinha começado a pressionar os limiPavlov, O b r a s E s c o g id a s , ed. de J. S. Koshtoiants, tes de algumas delas no presente livro, para além trad. de A. García Usón, Buenos Aires: Quetzal, das asserções e exceções que apresenta no final 1960, p. 147-163. (N o ta de G. B .) deste prólogo. Em nossa opinião, se há um pró5. Esse pedido de Vigotski não se transformou em logo injusto com o livro que introduz e que não realidade: os manuais de psicologia pedagógidá conta cabalmente do mesmo, é este. ca existentes na URSS durante os 65 anos pos4. Nesse sentido, o autor pode se remeter ao acateriores não passaram de variações pouco sigdêmico Pavlov, que escreve o seguinte: "Os nificativas dos temas do presente texto. dados objetivos obtidós (. ..) serão aplicados A Pedagogia e a Psicologia HGFEDCBA tos, não podem nos garantir A P E D A G O G IA zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA que o ideal possa ser realmente concretizado. Diz Blonski: A Pedagogia é a ciência que se ocupa da educação da criança. Mas o que é educação? Ela pode ser definida de diversas maneiras. Utilizaremos a definição de Blonski,' que diz que "a educação é a influência premeditada, organizada e prolongada no desenvolvimento de um organismo". Como ciência da educação, a pedagogia precisa estabelecer com precisão e clareza como deve ser organizada essa influência, que formas ela pode assumir, que procedimentos utiliza e qual deve ser sua orientação. A outra tarefa consiste em elucidar quais são as leis às quais se subordina o próprio desenvolvimento do organismo a ser influenciado. Ao depender de todos esses fatores, a pedagogia abrange vários âmbitos totalmente diferentes do conhecimento. Por um lado, visto que coloca o problema da criança, inclui-se na área das ciências biológicas, isto é, [as ciências] naturais. Por outro, como toda educação se propõe determinados ideais, fins ou normas, a pedagogia deve estar relacionada às ciências filosóficas ou normativas. Daí surge, no âmbito da pedagogia, a permanente discussão sobre o caráter biológico ou filosófico dessa ciência. A metodologia das ciências determina a diferença fundamental entre as ciências que estudam fatos e as que estabelecem normas. Sem dúvida, a pedagogia encontra-se no limite entre ambas. No entanto, unicamente os fatos não podem nos levar a conclusões científicas corretas com relação à educação; o mesmo acontece com as normas que, sem se basear nos fa- A pedagogia filosófica gera a utopia pedagógica. Em compensação, a pedagogia científica não inicia seu trabalho pela determinação de ideais superiores, normas e leis, mas pelo estudo do desenvolvimento real do organismo que é educado e da interação real entre este e o ambiente em que se educa. A pedagogia científica não se baseia em especulações abstratas, mas nos dados da observação e da experiência; ela é uma ciência empírica completamente peculiar e, de forma alguma, uma filosofia aplicada. Entretanto, como a pedagogia é uma ciência empírica totalmente peculiar, ela se baseia em ciências auxiliares, isto é, na ética social que destaca os objetivos gerais da educação e na psicologia que, junto com a fisiologia, proporciona os meios para resolver essas tarefas. A PSIC O LO G IA Em seu sentido estrito, o termo "psicologia" denota a teoria ou a ciência da alma," e assim foi tratada inicialmente. Os primeiros critérios diferenciam o cors u b s tâ n c ia s espepo e a alma humanos comohgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJ ciais , considerando dual a natureza do ser humano. O surgimento desses critérios remonta às épocas primitivas, quando o homem, ao observar os fenômenos do sonho, da morte, da doença e outros, convenceu-se de que um certo espírito vivia nele. Na idéia mais desenvolvida, essa crença adquiriu o caráter da noção 38GFEDCBA LlEV SEM IO N O VIC H VIG O TSK I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA de alma, considerada afim a uma substância ciência sobre os fatos espirituais, que Lange" material sutil, como a fumaça ou o pó. A pródenominou "psicologia sem alma". [Lange] diz pria palavra russahgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA d u s h á ["alma"] é um pouco o seguinte: parente da palavra [russa] d is h a t, que signifiPor acaso não se denomina "psicologia" a "cica "respirar". ência da alma"? Como se pode conceber uma A psicologia realmente era a ciência da ciência que coloque em dúvida se tem ou não alma. Os filósofos, quando estudavam a natuum objeto de estudo? Possuímos uma denomireza e as propriedades da alma, perguntavamnação tradicional para um grande número de se se ela era mortal ou imortal, que vínculos fenômenos não-demarcados com exatidão. Essa havia entre o corpo e a alma, quais eram a esdenominação provém de uma época em que se sência e os atributos dessa substância espiridesconheciam as rígidas exigências científicas tual, etc. atuais. Devemos descartar a denominação porEssa orientação predominou na área da que o objeto da ciência se modificou? Isso sepsicologia durante muito tempo e pode ser deria pedante e pouco prático. Adotemos então, sem vacilar, a de 'psicologia sem alma'! A denominada legitimamente psicologia metafísica, nominação é adequada, desde que tenhamos pois se referia a um material supra-sensível, um campo que não seja abordado por nenhuinacessível à nossa experiência. Com o nascima outra ciência. [F. A. Lange, G e s c h ic h te d e s mento da verdadeira ciência ocorreu uma biM a te r ia lis m u s u n d K r itik s e in e r B e d e u tu n g in d e r furcação, uma divisão de todo o saber, sua deG e g e n w a r t, Band 2: G e s c h ic h te d e s M a te r ia sintegração em c o n h e c im e n to m e ta fís ic o que se lis m u s s e it K a n t ( H is tó r ia d o m a te r ia lis m o e c r íreferia aos objetos da fé e se ocupava do muntica d e s u a im p o r tâ n c ia a tu a l. VoI. 2: H is tó r ia do supra-sensível e em c o n h e c im e n to p o s itiv o d o m a te r ia lis m o a p a r tir d e K a n t) , Frankfurt am o u c ie n tífic o , que restringiu deliberadamente o Main: Suhrkamp, 1974, p. 823.] alcance de seu estudo, os limites da experiência, mas em troca ganhou em certeza sobre o Assim, a psicologia empírica transformousaber obtido. se em "psicologia sem alma"? ou "psicologia No século XVIII, a psicologia dividiu-se sem metafísica", 8 ou "psicologia baseada na em racional e empírica. A p s ic o lo g ia r a c io n a l experiência"." Reiteremos que essa solução do continuou se chamando psicologia metafísica, problema foi indefinida e contemporizadora. porque seu método fundamental de estudo Embora dessa forma tenha sido descartada consistia na especulação. Em contrapartida, a uma parcela considerável de metafísica, a psip s ic o lo g ia e m p ír ic a fo i concebida como ciência cologia não foi totalmente equiparada às ciênque se ocupava dos fatos, baseada na expecias naturais. Ela começou a ser concebida riência; ela tentava estabelecer a mesma relacomo a ciência dos fenômenos espirituais ção com o tema em estudo que as ciências na[ d u s h e v n i] ou dos fenômenos da consciência. turais. Ambas as definições não resistem a uma crítiNo entanto, essa psicologia empírica, inica científica. ciada com uma dura crítica à psicologia racioEssa psicologia ensinava que os fenômenal, durante muito tempo continuou se dedinos espirituais são, por natureza, totalmente cando a problemas metafísicos. diferentes de todos os que existem no mundo, A psicologia metafísica foi objeto da seimateriais, sem extensão, inacessíveis à expevera crítica de Locke," Hume" e Kant," que mosriência objetiva, e transcorrem paralelamente traram que a alma não passa de um produto aos processos físicos em nosso corpo, sem esde nossa fantasia e que a experiência, a rigor, tar vinculados a estes por um nexo causal. Adem cada ocasião nos fornece apenas uma ou mitindo-se, portanto, a existência de fenômeoutra percepção, mas de forma alguma nos dá nos imateriais, sem causa nem extensão, essa nenhuma sensação de uma alma na forma de psicologia conservava plenamente o critério uma substância especial. dual sobre a natureza humana ( d u a lis m o ) , próDessa maneira, em vez da psicologia como prio do pensamento primitivo e religioso. Não ciência da alma, começou a surgir uma nova era de estranhar que essa psicologia estivesse PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A 39 mais complexos e que o movimento não é um intimamente ligada à filosofia idealista, que en"apêndice sem importância" da vida espiritual. sinava que o espírito é um princípio peculiar, Todos os processos psíquicos começaram a ser diferente da matéria, e que a consciência posentendidos como partes integrantes da ação, sui uma realidade particular, independente e seus elementos preliminares. "Pensamos porautônoma do ser. Por isso, tal psicologia, que que agimos", diz Münsterberg.!' No entanto, o se limitou ao isolamento da consciência com mesmo autor frisa que a maior caricatura desrelação ao ser, estava condenada a carecer de sa teoria seria a concepção, grosseiramente vitalidade, a estar divorciada da realidade e a errônea, de que a riqueza da vida interior deresultar impotente ante as questões mais prementes da conduta humana. pende da quantidade de movimentos e que, Em primeiro lugar, a consciência repreportanto, a vida mais plena deveria ser a do atleta ou a do acrobata de circo. Nos atos comsenta apenas uma pequena parte de toda nossa experiência psíquicahgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [ p ~ ijic h e s k i] , pois exisplexos, "a reação motora não consiste em uma te todo o enorme mundo do inconsciente. Em ação muscular qualquer, mas em uma nova ampliação ou fechamento [conexão] das vias segundo lugar, ela denota somente uma propriedade qualquer dessa experiência, ou consmotoras no próprio cérebro". No entanto, apetitui de forma mascarada o mesmo conceito sar de toda a atenção dispensada ao aspecto de "alma", só que com outro nome. Afirma motor, essa teoria continuava diferenciando os peculiares fenômenos espirituais, de natureza Blonski: imaterial, isto é, conservava ainda o dualismo e o espiritualismo da psicologia empírica. Também é incorreto afirmar que a psicologia Por esse motivo, em vez de assumir a forestuda os fenômenos espirituais. Essa psicologia não se afastou suficientemente da psima de uma ciência sobre os fenômenos espiricologia da alma e padece de todas as insufituais, atualmente a psicologia surge como uma ciências de um compromisso: tendo se declanova ciência, que os psicólogos norte-americarado psicologia sem alma, de repente começa nos designam como a ciência do comportamena estudar os fenômenos ... da alma. Justificato dos seres viVOS.1Esses HGFEDCBA psicólogos entendem se dizendo que, com a expressão "fenômenos por comportamento todo o conjunto de moviespirituais" [dushevni], denomina apenas um mentos, internos e externos, de um ser vivo. A grupo de fenômenos singulares, que se distinpsicologia apóia-se no fato, estabelecido há basguem dos materiais ou das coisas pelo fato de tante tempo, de que todo estado de consciência que tais fenômenos espirituais não existem no vincula-se inevitavelmente a alguns movimenespaço, não ocupam nele nenhum lugar, não tos. Em outros termos, todos os fenômenos psíse percebem com os olhos, ouvidos e outros órgãos dos sentidos, e só os conhece diretaquicos que ocorrem no organismo podem ser esmente quem os vivencia. Mas por acaso mitudados a partir da perspectiva do movimento. nhas idéias podem existir sem esse lugar do A psicologia analisa até as formas mais espaço que se chama cérebro? Por acaso vocês complexas de nossa consciência como formas não podem ver, ainda que seja parcialmente, particularmente sutis e imperceptíveis de mominha alegria e ouvir meus desejos? Como é vimentos. Portanto, a psicologia está se transpossível afirmar então que os fenômenos esformando em uma ciência biológica, pois espirituais não estão vinculados ao espaço, não tuda o comportamento como uma das formas são percebidos diretamente por ninguém mais importantes de adaptação do organismo exceto por mim e que não podem ser vistos?" vivo aoambiente. Por isso, considera que o comportamento é o processo de interação enA psicologia empírica, por outro lado, tre o organismo e o ambiente, e o princípio de personificada em seus representantes mais sóutilidade biológica do psiquismo passa a ser lidos, promoveu a importância do aspecto seu princípio explicativo. motor para estudar os processos da psique. Entretanto, o comportamento do ser huDemonstrou que, a partir do movimento, comano meça o desenvolvimento dos processos centraisGFEDCBA se desenvolve no complexo contexto do 2 40GFEDCBA LlEV SEM IO N O VIC H VIG O TSK I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ambiente social. O ser humano só entra em Apesar disso, os dados obtidos com a ajucontato com a natureza através desse ambienda desse método devem ser submetidos ao mais rigoroso controle e à sua comprovação objetite e, por isso, esse meio é o fator mais imporva, pois sempre corremos o risco de obter retante que determina e organiza o comportasultados falsos ou subjetivamente tergiversamento humano. A psicologia estuda o compordos. Por esse motivo, as observações objetivas tamento do homem hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA s o c ia l e as leis conforme e experimentais continuam sendo os métodos as quais esse comportamento se modifica. fundamentais da ciência. Comparado com a Muda-se simultaneamente o objeto da ciência e também seu método. Enquanto o prinsimples observação, o experimento possui o mérito de que nos permite provocar uma cipal método da psicologia empírica era a autoincontável quantidade de vezes os fatos de que observação [introspecção], isto é, a percepção necessitamos segundo nosso arbítrio, isolá-los, dos processos espirituais de si mesmo, a nova cornbiná-Ios, questioná-Ios em diversas condipsicologia rejeita esse método como o único ou fundamental. Esse método distingue-se por ções, modificá-Ias de acordo com as exigênum subjetivismo extremo, pois cada um é, ao cias da pesquisa. O p r im e ir o traço distintivo da nova psimesmo tempo, observador e observado. Ele exige um desdobramento da atenção, que nuncologia é seu m a te r ia lis m o , porque examina toda a conduta do ser humano como uma séca pode se realizar por completo: por influênrie de movimentos e reações que possui todas cia da observação desaparece um sentimento as propriedades de um ser material. Sua s e ou outro fenômeno em estudo, ou corremos o risco de deixar passar o mais importante, abg u n d a característica é a o b je tiv id a d e , pois coloca como condição indispensável para suas sorvido pela vivência direta. "Observar o própesquisas a exigência de que estas se baseiem prio medo significa não ter muito medo", diz na verificação objetiva do material. A te r c e ir a Blonski; observar a própria ira é o mesmo que característica é seu método d ia lé tic o , que recontribuir para que ela comece a diminuir. Por conhece que os processos psíquicos se desenoutro lado, se um intenso temor ou ira se apovolvem em uma vinculação indestrutível com dera de nós, não teremos tempo para obsertodos os demais processos no organismo e que var-nos. estão subordinados exatamente às mesmas leis Por esse motivo, a auto-observação não de desenvolvimento que regem tudo o que exisdeve ser considerada uma autopercepção ou te na natureza. E, finalmente, a última [ q u a r um estado passivo da consciência em que os ta ] característica é a b a s e b io s s o c ia l, cujo signifenômenos espirituais, digamos, se auto-reficado já foi definido." gistram em nossa consciência, mas como uma A psicologia científica passa atualmente atividade peculiar orientada à percepção das por uma crise, e a nova ciência [psicológica] vivências próprias. Essa atividade pode ainda está em seu período de estruturação iniinfluenciar e desorganizar outras ações e tamcial. Isso não significa, porém, que se sinta bém pode ser perturbada pelas vivências próobrigada a se basear apenas em seu próprio prias. Por isso, ao rejeitar a auto-observação material. Pelo contrário, com freqüência ela como única fonte do conhecimento psicológiprecisa se apoiar em todo o material cientifico, a ciência não renuncia a aplicar esse mécamente confiável e exato da velha psicologia. todo de relatório verbal do sujeito do experiComo o ponto de vista radical e básico do obmento ou de sua enunciação, sujeita a análise e interpretação, do mesmo modo que os jeto da ciência se modificou, em todos os casos é preciso encarar o velho material de um demais fatos de seu comportamento. Esses inmodo novo, traduzir os antigos conceitos para formes verbais ajudam-nos a incluir em nosa nova linguagem e explicar e compreender os sa pesquisa da conduta o registro dos movifatos e leis anteriores à luz dos novos critérios.HGFEDCBA mentos e reações internos inibidos ou nãoÉ inevitável, portanto, que, ainda durante exteriorizados que, sem esse método, ficarimuito tempo, sinta-se a dualidade da origem am fora do campo de nossa observação. ----------------------- --- ---- PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A Na segunda metade do século XIX ocorreu uma grande virada na psicologia: ela teve acesso ao experimento. Todas as ciências naturais devem seus extraordinários triunfos ao experimento. Ele criou a física, a química, a fisiologia. Médicos, fisiologistas, químicos e astrônomos também destacaram pela primeira vez a possibilidade do experimento na psicologia. Junto com o experimento, surgiu na psicologia a tendência ao estudo mais preciso possível dos fenômenos, e ela começou a tentar se transformar em uma ciência exata. Daí, naturalmente, surgiu o desejo de utilizar na prática as leis teóricas da ciência, como costuma acontecer com qualquer disciplina aplicada. Diz Blonski:HGFEDCBA ''A psicologia pedagógica é o ramo da psicologia aplicada que estuda o emprego das conclusões da psicologia teórica ao processo de educação e ensino". Inicialmente, no momento de seu nascimento, a psicologia pedagógica despertou grandes esperanças, e todos consideraram que, sob sua orientação, o processo educativo poderia ser tão preciso quanto a técnica. No entanto, essas expectativas eram enganosas e logo ocorreu um desencanto geral na área. Suas causas foram várias: algumas de caráter teórico, derivadas da essência da nova ciência, e outras de índole prática, fruto de seu desenvolvimento histórico. A primeira causa reside em que a ciência nunca dirige diretamente a prática. Jarnes'" destacou, acertadamente, que é um grave erro pensar que é possível inferir diretamente da Psicologia, para uso educativo, determinados programas, planos ou métodos de ensino. A psicologia é uma ciência, e o ensino é uma arte; mas as ciências nunca produzem as ar- 41 tes de forma direta [...]. A ciência da lógica ainda não ensinou nenhum ser humano a pensar corretamente, e a ciência da ética [...] ainda nunca obrigou ninguém a se comportar adequadamente [...]. A pedagogia e a psicologia andam com o mesmo passo, mas a primeira não nasceu da segunda. Ambas são equivalentes e nenhuma está subordinada à outra. Por isso, o ensino e a psicologia sempre devem estarhgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA c o o r d e n a d o s , porém isso não significa que qualquer forma coordenada de ensino seja a única, pois muitos modos de ensino podem concordar com as leis da psicologia. Saber psicologia não garante de forma alguma que seremos bons professores. [W. James, T a lk s to te a c h e r s o n p s y c h o lo g y a n d to s tu d e n ts o n s o m e o f life 's id e a is , Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1899/1983, da psicologia, começando pelas mais amplas generalizações e terminando com a terminologia. Isso é particularmente inevitável em nosso período crítico e de transição, no qual a ciência vive uma grave crise de seus próprios fundamentos.GFEDCBA A PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A p. 15-16.]15 A segunda causa da desilusão na área da psicologia pedagógica é esse caráter estreito que ela adquiriu até mesmo entre seus representantes mais eminentes. Lay16 recriminou Meumann'? por tê-Ia degradado ao nível de um "simples ofício". E, realmente, em sua forma clássica [a Psicologia Pedagógica] esteve muito mais perto "da higiene que da pedagogia". (Guessen);" Assim, a psicologia não pode fornecer diretamente nenhum tipo de conclusões pedagógicas. Mas como o processo de educação é um processo psicológico, o conhecimento dos fundamentos gerais da psicologia ajuda, naturalmente, a realizar essa tarefa de forma científica. A educação significa sempre, em última instância, a mudança da conduta herdada e a inoculação de novas formas de reação. Portanto, se quisermos observar esse processo de um ponto de vista científico, teremos de compreender necessariamente as leis gerais das reações e das condições de sua formação. Assim, a relação da pedagogia com a psicologia assemelha-se à relação de outras ciências aplicadas com suas disciplinas teóricas. A psicologia começou a ser aplicada a questões práticas, ao estudo da delinqüência, ao tratamento de doenças, à atividade laboral 'e econômica. Diz Münsterberg: ---------- -- - 42 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [ ... ] tu d o in d ic a u m a a u tê n tic a c a d a . E e n tã o d a já que lo g o to s d a p s ic o lo g ia a p lic a d a ] e n tre u m m o n te te ó ric a fin s p rá tic o s . te rá e n tã o , a e n g e n h a ria d e fra g m e n s e r u ti- E s ta [a p s ic o lo g ia e m re la ç ã o c o m u m , u m a re la ç ã o a p li- a p lic a - q u e p o d e rã o à p s ic o lo g ia ig u a l à q u e e x is te e n tre e a fís ic a . C o m o é q u e a p s ic o - lo g ia p o d e n o s a ju d a r a e n c o n tra r [ ... ] A p s ic o lo g ia p e d a g ó g ic a , A nós p s ic o lo g ia e s s e tip o d e p s ic o lo g ia n ã o se rá a p e n a s liz a d o s p a ra h a v e rá e s u b s ta n c ia l c e rto s fin s ? p ro d u to dos c o rre la ç ã o m e ta s c o m p e tê n c ia tre as c ie n tífic a g ic a s ; (3 ) (1 ) a p re ssa d a , que u tiliz a de a lg u n s g ó g ic o s , de nenhum c a , e s té tic a e in d u s tria l. p e d a g ó g ic a ções de n o in íc io um m odos, fo rç a s. p le s m e n te S e ria n o rm a s em que [ ... ] E , su a s p ró s im p ro v e - g e ra l. N o e n ta n to , d o s m o d e s to s e, sem g e rm e s p e d a g ó g ic a . [H . Psychology and the teacher, ou a d o ta s s e o p ri- d ú v id a , d a p e d a g o g ia m as e , fin a lm e n te , c o n d i- já p re p a ra d o , m e iro p a s s o já fo i d a d o p s ic o lo g ia de c o n fia r u m m a te ria l te m c o m p le to . in ú til n ie n te d a p s ic o lo g ia s u rg irá e não s is te m a deve e c o n ô m i- [ ... ] A p s ic o lo g ia m a is o u m e n o s d e to d o s p ria s e s tá p ro p o r c o n s e lh o s m é d ic a , ju ríd ic a , ju n to deve e x is tir guns a u to re s ensão u m a a u tê n tic a basear M ü n s te rb e rg , a p e c u á ria o p . c it., p . 2 5 .] is s o , com não c o n c o rd a m o s B lo n s k i [q u a n d o de d iz fo rm a d iz na o s e g u in te ]: s e ria p e d a g ó g ic a , d a p s ic o lo g ia te ó ric a por um é um a o s c a p ítu lo s in te re s s a n - a id é ia m ó ria , a im a g in a ç ã o , e tc ., e , p o r o u tr o , m in a a s e x ig ê n c ia s p e d a g ó g ic a s a m eexa- p ro m o v id a s ta l. O c o is a . Em ta re fa s bem deve a s s im que com pensação, com caso que que d ife re n - a c ria ç ã o b io lo g ia d ife re n te , sua é a p s ic o té c n ic a d iz e r na se com o e x p e rim e n ta l. c o m p le ta m e n te baseada p rim e iro a lg u é m a b io lo g ia é c o rre to , de e x p e rim e n tiv e s s e e x p e rim e n p o ré m não o segundo. A p e d a g o g ia e ta re fa s d ê n c ia c o m a s le is d a v id a e s p iritu a l; p o r e x e m - p e d a g ó g ic a o e n s in o d a das a p e d a g o g ia n a b io lo g ia d e fu n d i-Ia p e la v id a d o p o n to d e v is ta d e s u a c o rre s p o n - p lo , d e c id e c o m o s e d e v e re a liz a r N a re a - à in c o rn p re - im p re c is a é a lg o e s tá ta l e o u tra , c o m o a a te n ç ã o , a l- " tra n s fo rm a r d e v id o d e q u e " a p e d a g o g ia la d o , to m a te s p a ra o p e d a g o g o , em p e d a g ó g ic a , s e b a s e ia o m esm o a n im a is A p s ic o lo g ia que p a rtic u la r; p e d a g ó g ic a " . B lo n s k i, e x p e rim e n ta l" te ; vão, s ó s u rg iu p s ic o lo g ia Isso a l- p e d a g ó g ic a , c iê n c ia . C om o lo g o em peda- p s ic o ló g ic o s ; c iê n c ia e m p s ic o lo g ia a firm a ç ã o Por fa la m , pe- é a p e s q u is a m odo um a e o ob- p ro c e d im e n to s e à d ife re n c ia ç ã o de cada e rrô n e a a p s ic o lo g ia (5 ) a p s ic o lo g ia essa noção pedagó- a pedago- fo rm a e x p e rim e n ta l com o a p e d a g o g ia lid a d e , (4 ) da s is te m a s id é ia s com e x p e rim e n ta l a p lic a d a , en- a e x p e rim e n ta ç ã o ; je tiv o d a p s ic o lo g ia das de tu i u m a p a rte dos te ó ric a ; é id e n tific a d a d a g ó g ic a d is trib u íd a a p e d a g ó g ic a s , (2 ) a h is tó ria que, e as quando a h is tó ria a p e d a g o g ia e x p e rim e n ta l a s fo rç a s e s tiv e r d is c ip lin a s m a n e ira : p e d a g ó g ic o s ; e n tre e s ta b e le c id a ú ltim o s a n o s , é u m a n o v a c iê n c ia q u e c o n s tic o m a p s ic o lo g ia gum a se rá d ife re n te s s e g u in te g ia c o rre ta c ie n tífic a s da deve educação, apenas re a liz á -lo s . se e x a m in a r o s o b je tiv o s e n q u a n to a p s ic o lo g ia ocupa dos m e io s p a ra [D iz M ü n s te rb e rg :] le itu ra e d a e s c rita , d a fo rm a q u e e s tiv e r m a is d e a c o rd o c o m a p s ic o lo g ia in fa n til. o flo ris ta d a n in h a s . Tudo a p lic a ç ã o e s tá g ia g e ra l s e m p re d e tra n s fe rir p ro n to s , quer c iê n c ia g ic a s ; ca. Ui;ri essa o que a v id a - sem d e e s p e c ia lis ta é fo i m e n c io n a d o lu g a r, não da s o m e n te já por podem os de q u a l- pedagó- p e d a g o g ia p o s s ív e l a in ú til a lh e io s a s e x ig ê n c ia s q u e s tã o não lu g a r, d a p s ic o lo - a e s s e tra b a lh o a m e d ia ç ã o - p ro m o v a é um a p rim e iro e fra g m e n to s E m segundo F in a lm e n te , papel e q u iv a le rá c o n fo rm e que Em já c o n c lu íd o s m a te ria is M ü n s te rb e rg . d e ix a r in c o rre to . d e c a p ítu lo s te ó ri- conceder à p s ic o lo g ia . um a m a s u a s tu lip a s O b o tâ n ic o ca não am a nem d e v is ta , não o d e ia pode nada am ar P a ra e le , a e rv a d a n in h a m e n te a u tê n tic o te q u a n d o p a ra c iê n c ia é tã o m ana; do e e x p li- e , d o s e u p o n to nem o d ia r nada. é u m v e g e ta l ig u a l- e , p o rta n to , tã o im p o rta n - a m a is b e la f lo r . [ ... ] A s s im c o m o , o b o tâ n ic o , re s s a n te e o d e ia a s e rv a s q u e d e sc re v e q u a n to so b re a e rv a um a o hom em in te re s s a n te to d o d a n in h a flo r, ta m b é m p a ra a e s tu p id e z hum ana q u a n to e s s e m a te ria l e e x p lic a d o sem p a ix ã o . D e s s e p o n to é tã o in te - a s a b e d o ria a hu- d e v e s e r a n a lis a - to m a r p a rtid o e sem d e v is ta , o p ro c e d irn e n - PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A 43 to mais nobre não é melhor que o delito mais justamente, a ciência sobre as leis de modificavil , o mais belo sentimento não é mais vali-HGFEDCBA ção do comportamento humano e sobre os meioso que uma abominável vulgaridade, a os de dominar essas leis. idéia mais profunda de um gênio não pode Portanto, ela deve ser considerada uma gozar de preferência diante do balbucio abciência independente, um ramo particular da surdo de um louco; tudo isso é um material psicologia aplicada. Deve-se considerar errôneutro que só existe' como um elo na cadeia nea a identificação da psicologia pedagógica dos fenômenos causais, ( H . Münsterberg,hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA com a pedagogia experimental, admitida pela P s y c h o lo g y a n d th e T e a c h e r , [p. 30] .)19 maioria dos autores (Meumann, Blonski e outros). Münsterberg demonstrou de forma sufiDa mesma maneira, a psicologia pedagócientemente convincente que [essa identificagica também pode estar orientada para qualção] é errônea e considera a pedagogia expequer sistema de educação: Pode indicar como rimental como uma parte da psicotécnica. se deve educar para formar um escravo ou um Guessen diz o seguinte: homem livre, um arrivista ou um revolucionário. Vemos isso de forma brilhante no exemplo Se isso fosse assim, esse ramo da psicotécnica da ciência européia, que é igualmente engenhotem o direito de se autodenominar pedagógisa no que se refere a meios de criação e a meios ca só porque se dedica à busca de meios técde destruição. A química e a física servem em nicos que possam ser aplicados na prática no idêntica medida para a guerra e para a cultura. âmbito da psicologia? Com efeito, a psicoPor isso, cada sistema pedagógico deve possuir técnica [aplicada] no campo da justiça não se transforma, devido a esse fato, em jurispruseu próprio sistema de psicologia pedagógica. dência. Da mesma fora, a psicotécnica aplicaA falta dessa ciência explica-se por cauda à vida econômica não se torna parte da sas e circunstâncias puramente históricas do economia política. Evidentemente, a psicotécdesenvolvimento da psicologia. Blonski está nica aplicada ao âmbito da educação também certo quando diz que as atuais insuficiências não tem fundamentos para aspirar a ser conda psicologia pedagógica se explicam por suas temporânea de toda a pedagogia, nem para seqüelas espiritualistas e por seu ponto de visser considerada um de seus ramos. A pedagota individualista, e que só a psicologia como gia experimental poderia ser, no melhor dos ciência biossocial é útil para a pedagogia. casos, denominada psicotécnica pedagógica. A psicologia anterior, que considerava a psique de forma isolada do comportamento, não o mais correto seria diferenciar: (1) a podia encontrar o terreno verdadeiro para uma pedagogia experimental, que resolve tarefas ciência aplicada. Ao contrário, ao se dedicar a puramente p e d a g ó g ic a s e didáticas através da ficções e abstrações, ela sempre se divorciava experiência (escola experimental) e (2) a da vida real e, por isso, era impotente para se psicotécnica pedagógica, análoga a outros ratornar a fonte que daria origem a uma psicolomos da psicotécnica e que se dedica à pesquigia pedagógica. Toda ciência surge das demansa p s ic o ló g ic a aplicada à educação. das práticas e, em última instância, também se Mas também esta constitui apenas uma orienta para a prática. Marx dizia que os filósop a r te da psicologia pedagógica, pois "a fos só tinham interpretado o mundo, e que já psicotécnica não pode ser identificada à psicoestava na hora de transformá-lo." Essa hora chelogia aplicada, porque é apenas metade desta" ga para todas as ciências. Mas enquanto os filó(Münsterberg). A outra metade é a "psicologia sofos interpretavam a alma e os fenômenos esda cultura". Juntas, formam essa "verdadeira pirituais, não podiam refletir sobre a forma de psicologia pedagógica", que deve ser criada em os transformar, porque estavam à margem da um futuro próximo. Guessen pergunta: esfera da experiência. Em compensação, agora que a psicologia começou a estudar o comporNão será justamente porque a pedagogia extamento, pergunta-se naturalmente como é posperimental ainda pode se jactar tão pouco da sível modificá-lo. A psicologia pedagógica é,GFEDCBAexatidão de suas conclusões, que se dedicam 44 LlEV SEM IO N O VIC H VIG O TSK I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA a ela mais os pedagogos médicos e os psicólogos e os filósofos que os especializados? tentativa de refutar o materialismo filosófico e por estabelecer a duradoura tradição neokantiana na Universidade de Marburgo. Na edição norte-americana, Silverman colocou as N O TA S iniciais "N. N." antecedendo o sobrenome Lange, sem colchetes, como se Vigotski tives1. Pável Petrovitch Blonski (1884-1941) foi um se se referido ao psicólogo russo Nikolai psicólogo, pedagogo e pedólogo soviético que Nikolaievitch Langue. Em n e n h u m a p a r te desdesempenhou um importante papel nas décate livro Vigotski refere-se a N. N. Langue e, das de 20 e 30, tanto no desenvolvimento da apesar disso, aquela edição oferece uma biopsicologia quanto na construção de escolas na grafia de oito linhas dele (Langue é o sobrenoURSS. Foi autor de diversos livros. Os únicos me alemão Lange russificado). cursos estritamente de psicologia que Vigotski 7. Referência a F. A. Lange, G e s c h ic h te ... , op. cit. fez na vida, conforme .as informações disponíA edição original é de 1866. veis, foram os que realizou com Blonski na Uni8. Vigotski refere-se aqui ao filósofo kantiano A. versidade Shaniavsk( (não levamos em consiI. Vvedienski, P s ijo lo g u ia b ie z v s ia k o i m e ta fiz ik i deração os que fez com Gustav Shpet, pois es[ P s ic o lo g ia s e m m e ta fís ic a a lg u m a ] , 2.ed., tes não foram psicológicoshgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA s tr ic tu s e n s u ) . Para Petrogrado, 1917, p. 71. Vigotski cita a mesma Vigotski, Blonski foi um importante referencial expressão na página 346 de seu ensaio epistedurante toda a sua vida. mológico "O significado histórico da crise da 2. O termo "psique" provém do vocábulo grego Psicologia" (cf. L. S. Vygotski, O b r a s E s c o g id a s , \ j f u x l Í [ p s ijé ] , cujo significado é "alma". antigoHGFEDCBA T o m o I. P r o b le m a s te ó r ic o s y m e to d o ló g ic o s d e 3. John Locke (1632-1704) foi um dos maiores I a P s ic o lo g ia , tradução de José M. Bravo, edifilósofos ingleses. Sua importância é capital ção de Amelia Álvarez e Pablo deI Río, Madrid: para a psicologia, pois ele fundamentou a deVisor/ Aprendizaje/Ministerio de Educación y terminação ambiental da mente (cf. seu E s s a y Ciencia, 1991, p. 257-407). C o n c e r n in g H u m a n U n d e r s ta n d in g ) e minou as 9. Vigotski refere-se aqui a H. Hôffding, P s y c h o bases filosóficas da crença em idéias inatas. lo g ie in U m r is s e n a u f G r u n d la g e d e r E r fa h r u n g 4. David Hume (1711-1776) foi um filósofo es( E s b o ç o s d e u m a p s ic o lo g ia b a s e a d a n a e x p e r iê n cocês. Sua importância para a psicologia resic ia ) , Leipzig: Reisland, 1908. Essa é a quarta de em que contribuiu para minar fundamenedição alemã, traduzida da quinta edição ditos filosóficos idealistas da mesma (cf. D. H u m e , namarquesa; a russa foi publicada em 1908. ~ r e a tis e o f H u m a n N a tu r e ; b e in g a n a tte m p t to Herald Hôffding (1843-1931) foi um filósofo ~ n tr o d u c e th e e x p e r im e n ta l m e th o d o f r e a s o n in g e psicólogo dinamarquês que defendeu um in to m o r a l s u b je c ts ) . paralelismo psicofísico, um positivismo crítico 5. Emannuel Kant (Kônigsberg, 1724-1804) foi e um relativismo filosófico. um dos principais nomes da filosofia clássica 10. É provável que a referência aqui seja a P. P. alemã, superado apenas por Hegel. Ele afirBlonski, O c h ie r k N c u c h n o i p s ijo lo g u i [ E n s a io d e mou que a psicologia era uma ciência empírica, p s ic o lo g ia c ie n tífic a ] , Moscou: GIZ [siglas de que devia ser separada da metafísica. Suas "Editora Estatal"], 1921. idéias sobre a psicologia estão expostas em E. 11. Hugo Münsterberg (Danzig, 1863-1916, Kant, C r ític a d e I a R a z ó n P u r a , 2 vols., Buenos Cambridge, Mass.) foi um importante psicóAires: Losada: 1960-62 (cf. "Dialéctica Translogo alemão que, em seus últimos anos de cendental", livro 2, seção 1). Kant também foi vida, trabalhou na Universidade de Harvard um cientista com amplos conhecimentos de convidado por William James, a quem sucematemática e física; sua teoria sobre a formadeu na direção do laboratório de psicologia. ção dos corpos celestes a partir de uma nebuA abreviatura "Mass.", que muitas vezes selosa primitiva é considerada correta pelos asgue o vocábulo "Cambridge" neste livro, sigtrônomos atuais (cf. M. Kant, H is to r ia n a tu r a l nifica "Massachussetts, EUA" e foi escrita para y te o r ía g e n e r a l d e l c ie lo , prólogo de Manuel que o leitor não se confunda eventualmente Sadosky, Buenos Aires: Lautaro, 1946). com "Cambridge, Inglaterra". 6. No original, Vigotski escreve apenas o sobre12. Vigotski refere-se ao comportamentalismo. Cf. nome Lange, sem nome nem iniciais. Trata-se seu artigo "O Comportamentalismo" em: L. S. de Friedrich Albert Lange (1828-1875), filóVigotski, L a G e n ia lid a d y o tr o s e s c r ito s in é d ito s , sofo socialista alemão que se destacou por sua 45 PSIC O LO G IA PED A G Ó G IC A edição de Guillermo Blanck, Buenos 13. Os partidários da "teoria da atividade" N . Leontiev, costumam da por A.HGFEDCBA neamente que Vigotski mesma em sua obra. que, só no presente psicologia, Vigotski da de destacar livro, seu primeiro texto de outros E não levamos termos que envolvem como "comunicação", em "ati- "modificação do filósofo do pragrnatismo e um O amigo psicofisiologista. Vigotski, Semion de tude Filipovitch Dobkin, lidos por Vigotski, em Gomei, foram 1988). 15. O grifo é de Vigotski. diretamente versity citação cador (Harvard A partir que nos refiramos a esse considerado É experimental. considerava eram à qual educando, Meumann go e pedagogo lo de Wundt. (1862-1915) experimental de da com das poucas Como da mes- na Rússia a referência e de a translitera- russo", parênteses, como já comen- é original de Vigotski e é uma norte-americana em todo o livro. diz o seguinte: Psychology and the H. Teacher, 1909, op. cito no PróloA russa é de 1911. A citação foi Nova York: Appleton, do original 20. Karl Heinrich inglês Marx Marx Feuerbach". como 1818-1883, Lon- redigiu Vigotski diferentes; é tr a n s fo r m á -Ia " . epitáfio no túmulo de Highgate, "Teses a ela, que limitaram-se de maneiras no cemitério onze refere-se "Os filósofos te r p r e ta r o mundo tuado a versão alemão cuja concepção do o pensamento de Vigotski. Em sua juventude, gravada não apre- com (Treveris, dres) foi o filósofo mundo organizou sobre porque significativas ra o que importa referên- se trata que ele nos oferece diz o seguinte: que estudos sobre a memó- de vários livros, Meumann, V o r le s u n g e n à p e d a g o g ia Engelmann, a várias obras E. in d ie B d . I [ C u r s o de in V a I. I], e x p e r im e n ta l, 1911. Vigotski de Meumann dedicou-se como z u r E in fü h r u n g P iid a g o g ik . Leipzig: foi um psicólodiscípu- Foi autor Meumann entre diferenças alemão, Realizou e x p e r im e n te lle 19. A referência de Vigotski. realizadas fará de um tal a in ago- Essa tese foi de Marx, sium subúrbio de Londres. ria infantil. tr o d u ç ã o as ações do ale- é Guessen. russa no processo Vigotski russa Akademischer, primeiro data do "período ção correta senta 4. cia no Capo Vigotski da da ação", o fundamental aprendizagem Obviamente na Alemanha. traduzida E x p e r im e n te lle a "pedagogia que depois go de Vigotski. o fundador e o o livro D ie M e th o d e d e r M a - que publicou de ago- Em colaboração a revista Criou Hessen. ma pessoa, tem livro é a versão publicou Uni- russa do pe- Guessen, r ia M o n te s s o r i u n d ih r S c iiic k s o l: e in B e itr a g z u r A edição essa citação com a versão E. Meumanrr.fundou 17. Ernst Freud Moscou, por Vigotski. alemão. P iid a g o g ik . pelo inglês significativas psicologia de Halle, Münsterberg, Traduzimos Trata-se Iosifovitch Em 1936, a Editora mão Hessen. tamos no prefácio, e A p s ic o p a - escreveremos apenas T a lk s to T e a c h e r s ... Wilhelm Lay (1862-1926) foi um edu- James, 16. August de James ed. de 1983), pois ela não utilizada ra, sempre da e x p e - pessoal, do original Press, diferenças de psi- de Sigmund comunicação a sua juven- A s v a r ie d a d e s da v id a c o tid ia n a , (K. Levitin, cita Guessen. Serguei texto citado neste capítulo é O s n o v i p e d a g o g u ik i [ F u n d a m e n to s de p e d a g o g ia ] , Moscou, 1923. O Sergius de relatou textos durante r iê n c ia r e lig io s a , de William to lo g ia russo d e s tin o : u m e n s a io s o b r e p e d a g o g ia ] , eminente infância Karl Levitin que os dois primeiros cologia dagogo P iid a g o g ik : [O m é to d o de M a r ia M o n te s s o r i e s e u ambiente", etc. 14. William James (EUA, 1842-1910) foi o principal sobre as idéias de Montessori, também sobrenome Guessen "atividade"hgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [ d ie ia tie ln o s t] a palavra consideração vidade", erro- o papel Gostaríamos 18. Em outro escrito, concebi- afirmar subestimou mais de 170 vezes. aparece à sua E s te tik a (edição russa: Moscou, 1920). Morreu de gripe aos 52 anos. rência Aires: 1998, p. 87-95. Almagesto, também referiu-se Ludwig (1804-1872) foi um filóso- Feuerbach fo materialista mação da alemão filosofia que L u d w ig F e u e r b a c h y e l fin a le m a n a , original balhos Buenos Aires: a for- (cf. F. Engels, de Ia filo s o fia c lá s ic a 1973; a edição Anteo, é de 1888). Vigotski de Feuerbach influenciou marxista conhecia e referiu-se os tra- e ela várias em seus textos. vezes, sobretudo em "O significado histórico da crise da Psicologia" (cf. L. S. Vygotski, à teoria da arte O b r a s ... , t. I, op. cit). e, em sua P s ic o lo g ia da a r te , Vigotski faz refe-GFEDCBA - Os Conceitos de Comportamento e de Reação o COMPORTAMENTO E A REAÇÃO ponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ex ceção . D arw in estab eleceu q u e as g lân d u las d a d ró sera ex citam -se q u an d o se co lo ca so b re A s reaçõ es são o s elem en to s fu n d am en elas u m g rão d e p ó d e ferro d e 1 /2 5 0 m il m ilitais q u e fo rm am to d o o co m p o rtam en to g ram as d e p eso ." [provedenie] d o an im al e d o ser h u m an o , tan A reação co n stitu i a fo rm a b ásica e p rito em su as fo rm as m ais sim p les q u an to n as m itiv a d e q u alq u er co n d u ta. S u as fo rm as m ais m ais co m p lex as. N o âm b ito d a p sico lo g ia, ch asim p les são o s m o v im en to s a partir d e algo e m a-se d e reação [reaktia] a resp o sta d o erg apara algo, q u e ex p ressam a ten d ên cia d o an in ism o ' p ro v o cad a p o r q u alq u er estím u lo . S e m al a ev itar as ex citaçõ es d esfav o ráv eis, en co o b serv arm o s a co n d u ta h u m an a, p erceb erem o s lh er seu co rp o e ev itar u m p erig o , o u a ap ro x ico m facilid ad e q u e, g eralm en te, to d o s o s m ar-se d as fav o ráv eis, esp ich ar o co rp o e sem o v im en to s e as açõ es su rg em co m o resp o sta g u rar. A p artir d essas fo rm as ex trem am en te a certo s estím u lo s, ex citaçõ es o u im p u lso s q u e sim p les d e co n d u ta, d u ran te u m lo n g o p ro cesd en o m in am o s "cau sas". so d e ev o lu ção , d esen v o lv eu -se a en o rm e m u lT o d o s o s n o sso s ato s são p reced id o s in etip licid ad e d e fo rm as tão d iv ersas d o co m p o rx o rav elm en te d e alg u m a cau sa q u e o s p ro v o tam en to h u m an o . ca, so b a fo rm a d e fato , aco n tecim en to ex tern o , d esejo , im p u lso o u id éia in tern a. T o d o s o s OS TRÊS COMPONENTES DA REAÇÃO m o tiv o s d e n o sso s ato s estim u lam [ex citam ] n o ssas reaçõ es. P o rtan to , a reação d ev e ser en Q u alq u er reação , to m ad a em su a fo rm a ten d id a co m o u m a in ter-relação en tre o o rg am ais p rim itiv a n o s o rg an ism o s elem en tares o u n ism o e seu m eio circu n d an te. A reação sem n a m ais co m p lex a d o ato h u m an o co n scien te, p re é u m a resp o sta d o o rg an ism o ad eterrn isem p re in clu i três co m p o n en tes fu n d am en tais. n ad as m o d ificaçõ es d o m eio e rep resen ta u m O p rim eiro d eles é a p ercep ção , p o r p arte d o m ecan ism o d e ad ap tação su m am en te v alio so o rg an ism o , d as ex citaçõ es o rig in ad as n o m eio e b io lo g icam en te ú til. ex tern o . E sse m o m en to é d en o m in ad o co n v en A reação su rg e n as etap as m ais in ferio res cio n alm en te sensorial. D ep o is v em o seg u n d o d o d esen v o lv im en to d a v id a o rg ân ica. A s b acco m p o n en te, o d a elab o ração d essa ex citação térias, p o r ex em p lo , reag em a ex citaçõ es tão n o s p ro cesso s in tern o s d o o rg an ism o , estim u in sig n ifican tes q u an to u m a m ilio n ésim a p arte lad o s p elo im p u lso à ativ id ad e. P o r ú ltim o , o d e m ilig ram a d e sal d e p o tássio . O u tro s o rg aterceiro co m p o n en te é a ação d e resp o sta d o n ism o s elem en tares, co m o as am eb as, o s o rg an ism o resu ltan te d e seu s p ro cesso s in terciliad o s, etc., tam b ém p o ssu em u m a cap acid an o s, g eralm en te so b a fo rm a d e m o v im en to . d e d e reação q u e se m an ifesta d e fo rm a to talE sse terceiro co m p o n en te é ch am ad o d e motor, m en te ev id en te. O s v eg etais n ão co n stitu em --~ - -- --- -- 48PONMLKJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA en q u an to o seg u n d o , relacio n ad o ao s an im ais su p erio res e ao ser h u m an o - n o s q u ais está v in cu lad o ao fu n cio n am en to d o sistem a n erv o so cen tral-, será ch am ad o d e central. E sses três co m p o n en tes, o sen so rial, o cen tral e o m o to ra p ercep ção d a ex citação , su a elab o ração [p ro cessam en to ] e a ação ' d e resp o sta - estão p resen tes n ecessariam en te em to d o ato d e reação . V ejam o s, p o r ex em p lo , alg u n s d o s tip o s m ais sim p les d e reação . S e a p lan ta esten d e seu cau le p ara o so l (h elio tro p ism o ), o u se a traça v o a ru m o à ch am a d a v ela, o u se o cach o rro secreta saliv a d ev id o à carn e q u e está em su a b o ca, ou se o sér h u m an o , ao o u v ir a cam p ain h a d a p o rta d e en trad a, d irig e-se a ela e a ab re, em to d o s esses caso s p erceb e-se facilm en te a ex istên cia d o s três co m p o n en tes an tes en u m erad o s. A ação d o s raio s d o so l so b re a p lan ta, d a ch am a d a v ela n o caso d a traça, d a carn e p ara o cach o rro e d a cam p ain h a p ara o ser h u m an o ex citam as reaçõ es co rresp o n d en tes. O s p ro cesso s q u ím ico s in tern o s q u e n ascem n a p lan ta e n o o rg an ism o d a traça so b a ação d o s raio s, a ex citação n erv o sa q u e se tran sm ite d a lín g u a d o cach o rro e d o o u v id o d o ser h u m an o ao sistem a n erv o so cen tral, to d o s eles co n stitu em o seg u n d o co m p o n en te d as reaçõ es co rresp o n d en tes. P o r ú ltim o , o cau le cu rv o , o v ô o d a traça, a secreção d e saliv a d o cão , o s p asso s d o h o m em e a ab ertu ra d a fech ad u ra co n stitu em o terceiro co m p o n en te [ ...] d a reação . N em sem p re esses três co m p o n en tes são tão ev id en tes q u an to n o s ex em p lo s an terio res. À s v ezes alg u n s p ro cesso s in tern o s d o o rg an ism o , n ão -v isív eis, ag em co m o estim u lad o res, co m o a m o d ificação d a circu lação d o san g u e o u d a resp iração d o s ó rg ão s in tern o s, d a secreção g lan d u lar, etc. N esses caso s, o p rim eiro co m p o n en te d a reação p erm an ece o cu lto ao n o sso o lh ar. A lg u m as v ezes, o s p ro cesso s in tern o s d ifíceis d e o b serv ar - e m en o s estu d ad o s - são tão co m p lex o s q u e n em é p o ssív el reg istrá-lo s, n o estad o atu al d a ciên cia p sico ló g ica. O u tras v ezes eles ad o tam fo rm as tão v elo zes q u e p arecem n ão ex istir e, q u an d o isso o co rre, n o s p arece q u e o terceiro co m p o n en te d a reação v em im ed iatam en te ap ó s o p rim eiro [sem p assar p elo seg u n d o ], isto é, q u e o m o v im en to d o o rg an ism o o co rre lo g o d ep o is d e receb er o estím u lo , co m o su ced e co m a to sse, o g rito reflex o , etc. C o m freq ü ên cia, o terceiro co m p o n en te d a reação - a ação d a resp o sta d o o rg an ism o p arece estar o cu lto . P o d e ex p ressar-se em m o v im en to s tão in sig n ifican tes e im p ercep tív eis p ara o o lh ar co m o , p o r ex em p lo , n o s m o v im en to s articu lad o s ru d im en tares e em b rio n ário s q u e fazem o s q u an d o p ro n u n ciam o s m en talm en te alg u m a p alav ra. T am b ém p o d e p arecer im p ercep tív el p o rq u e [p o d e ex p ressar-se co m o ] u m a série d e m o v im en to s d o s ó rg ão s in tern o s. P o r ú ltim o , as reaçõ es p o d em fazer p arte d e relaçõ es tão co m p lex as en tre si q u e é im p o ssív el d iferen ciá-Ias atrav és d e u m a o b serv ação sim p les e d esco b rir seu s três co m p o n en tes. O m esm o o co rre q u an d o a ação d e resp o sta se d istan cia n o tem p o o u se atrasa co m relação à ação d a ex citação . N esses caso s, n em sem p re é p o ssív el estab elecer co m facilid ad e e p o r co m p leto o p ro cesso trifásico d a reação . E m g eral, esses três co m p o n en tes ap arecem co m m aio r clareza n as reaçõ es m ais sim p les. N as fo rm as m ais co m p lex as d o co m p o rtam en to h u m an o , ad o tam fo rm as cad a v ez m ais en co b ertas e co n fu sas, e m u itas v ezes é p reciso fazer u m a an álise b astan te co m p licad a p ara rev elar e d esco b rir a n atu reza d a reação . N o en tan to , tam b ém n as fo rm as m ais co m p lex as o co m p o rtam en to h u m an o se estru tu ra co n fo rm e o m esm o tip o e m o d elo d e reação q u e n as fo rm as m ais sim p les d as p lan tas e d o s o rg an ism o s u n icelu lares [v eg etais e an im ais]. A REAÇÃO E O REFLEXO N o s an im ais q u e p o ssu em sistem a n erv o so , a reação assu m e a fo rm a d e reflexo [refleks]. N a área d a fisio lo g ia, en ten d e-se p o r reflex o to d o ato d o o rg an ism o p ro v o cad o p o r q u alq u er ex citação ex tern a ao sistem a n erv o so , q u e se tran sm ite p o r m eio d e u m n erv o cen tríp eto ao céreb ro ; a p artir d aí, seg u in d o u m n erv o cen trífu g o , p ro v o ca-se au to m aticam en te u m m o v im en to o u secreção d o ó rg ão co rresp o n d en te. O cam in h o seg u id o p elo reflex o co m u m é o seg u in te: (1 ) n erv o cen tríp eto , (2 ) n eu rô n io s 49 PSICOLOGIA PEDAGÓGICA aferen tes e eferen tes n erv o cen trífu g o . p o n en tes] [O co n ju n to d en o m in a-se tu i o esq u em a N o s ú ltim o s ch am ar e (3 ) d esses três co m - arco reflex o v árias teo rias categ o ricam en te e co n sti- E n tretan to , v o so . P o rtan to , d e reação e, m ais é' u m co n ceito estrita- o reflex o esse fato ra p arte férica d e reflex o , P ara sê-lo, estaria d o arco reflex o , cen tríp eto u m a im p o rtan te m en te b ito m ais ex ato sig n a co m .essa ceito am p lam en te b io ló g ico . O reflex o n ão ex iste co m p o rtam en to m as co m p len o d ireito m o s falar, n esses caso s, d e reaçõ es. d e reação co m p o rtam en to v im en to s n o s aju d a h u m an o b io ló g ico s o rg an ism o s, à lo n g a d o s in ferio res d a p sico lo g ia, n o q u al se d e- p alav ra d e to d o s o d a v id a p ers- B asta a o b serv ação p o rtam en to m an o d a fisio lo g ia tem p o , d o sistem a lim ita n erv o so o co n ju n to e, d o s fen ô - T em o s d elas a d iscu tív el que q u estão h u m an o d as ex citaçõ es m a n erv o so cen tral. co L azarev ," em so b re se n ão -v in - ras h o ras v id a. E ssas fo rm as x o s e in stin to s. da d iv erso s ad m issív eis m as d e p ecu liarid ad es teó rico , o s estím u lo s sistem a n erv o so , sag reg ação tássio ] cereb ral. d essa m an eira co m p letam en te tão p resen tes em fu n ção [clo reto ao co n stitu em term in ad o , cia p esso al. A p rin cip al as p rim eid e to d a a d e co m p o rtam en - em d o is tip o s: refle- ap arecem p esso al d u ran te no o s m ais d a h eran ça, in d iv id u ais d a ex p eriên - d iferen ça en tre as rea- inatas e as adquiridas co n siste em q u e as çõ es de po- rep resen tam v im en to s d e ad ap tação u m tip o to d a p o is es- m am en te trem a e e q u e, em g eral, p er- e n ão são fru to p rim eiras n ecessário s: d esd e ao co n trário , d a d e- O s m o v im en to s o s três co m p o n en tes - a d esag reg ação d e v ista e arb itrário s d o s sais d e p o tássio q u e su rg em a ex citação au tó cto n es q u e o co rrem n a su b stân cia d e reação d e u m p o n to p erío d o s seu p ro ap ren d i- E sses são , p o r n o d eco rrer h erd ad as iônica d o s n erv o s, estab elece q u e são to talm en te e p o ssív eis, ex tern a. p ro cesso d a ex p eriên cia estim u lação d u ran te de d o g rito , d a d eg lu tição ser d iv id id as O u tras reaçõ es, inatas. ou n o m o m en to sem n en h u m a in v ariáv eis q u ím icas teo ria o u su rg em d o n ascim en to m an ecem o acad êm i- herdadas crian ça q u e se o b serv am isto é, q u e su rjam d o siste- são na o s reflex o s to p o d em P o r ex em p lo , su a n ão a ex istên - d e reaçõ es a u m arco reflex o , d iretam en te ain d a o rig en s. n em in flu ên cia d a su cção , d e acrescen tar cia n o o rg an ism o zag em ex em p lo , o u d e u m ser h u - q u e em su a co m p o sição d e d iv ersas p resen tes m ais sim p les d o co m - an im al p erceb er A lg u m as E stão d o co m p o rtam en to de um p ara h á reaçõ es e a co n - o b serv áv eis. cu lad as do A DIVISÃO DAS REAÇÕES EM HEREDITÁRIAS E ADQUIRIDAS os [aju - as ilim itad as d e su a ev o lu ção b io ló g ico o to d e reflex o n o s lim ita ao círcu lo relativ am en - reso lv eu o s ato s elem en tares d o ser h u m an o . cesso d e crescim en to , m en o s p rin cip al- isto é, n o âm - seu n ascim en to ao m esm o cien tífica, ex p erim en tal, d e fo rm a m ais am p la. P o r o u tro lad o , o co n ceite estreito tem p o r trás d e si série d e m o - ao s fu n d am en to s p ectiv as p ara o estu d o o asp ecto P o rtan to , ao s su p erio res; o rg ân ica n a T erra, a d esco b rir sid erar a p o d e- a in co rp o rar d e ad ap tação a vinculá-lo d a-n o s] p eri- n em n o s an im ais q u e n ão p o ssu em n erv o so , co n ceito a p rim ei- q u e lev a à ex citação trad ição n o cam p o é u m co n - sistem a faltan d o isto é, a p articip ação A lém d isso , esse term o en q u an to n o s v eg etais ch am ar q u e seja co m o partir de agora utilizaremos a palavra "reação" para designar as formas básicas do comportamento humano? m en te fisio ló g ico , a reação n ão p o d em o s a m en o s ao céreb ro . n ão d e u m a reação d o sistem a n er- cen tral e o ato d e res- p o sta. E m co m p en sação , P o r esse m o tiv o , d o term o n ão p o r su a d escrição , p assa d e u m caso p articu lar esp ecificam en te, que O reflex o , co m o se p o d e facilm en te [p ro cessam en to ] d o n erv o e d o an im al. essa su b stitu ição b o ração su p o sição . a as reaçõ es a ciên cia d o ser h u m an o ad eq u ad a. co m p reen d er p assaram d e reflex o s e d e refiexoícgia" as reaçõ es n o s p arece esp in h al m ais g eral d e to d o ato n erv o so . tem p o s, d o ser h u m an o , estu d a d a m ed u la a esp écie. o cap ital h erd ad o d e m o ú teis, A s seg u n d as, d iv ersas u n ifo rm e em tro ca, são su - e se d istin g u ém m u tab ilid ad e lian o e u m esq u im ó , d o s sais -, a ela- PONMLKJIHGFEDCBA e in co n stân cia. um p ara fran cês p o r u m a ex U m au strae u m n eg ro 50PONMLKJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKI [african o ], u m o p erário e u m m ilio n ário , u m a crian ça e u m id o so , u m h o m em d a A n tig ü id ad e e u m co n tem p o rân eo to ssem e m an ifestam tem o r q u ase d a m esm a m an eira. N as fo rm as h ered itárias d e co m p o rtam en to ex istem m u itas co isas em co m u m en tre o s an im ais e o ser h u m an o . A s reaçõ es ad q u irid as, p elo co n trário , são ex trao rd in ariam en te d iferen tes, d e aco rd o co m as p articu larid ad es h istó ricas, g eo g ráficas, d e sex o , classe so cial e in d iv id u ais. OS REFLEXOS HEREDITÁRIOS INCONDICIONADOS " OU D ev e ser co n sid erad o co m o u m g ru p o fu n d am en tal d e reaçõ es d a crian ça recém -n ascid a o g ru p o d e reflex o s h ered itário s o u in co n d icio n ad o s. A crian ça g rita, m o v im en ta b raço s e p ern as, to sse e se alim en ta g raças a u m m ecan ism o n eu ro rreflex o b em -aju stad o , q u e fu n cio n a d esd e o s p rim eiro s in stan tes d e v id a. E n tre as características d istin tiv as d o s reflex o s d ev em o s d estacar, em p rim eiro lu g ar, o fato d e q u e são u m a ação d e resp o sta a q u alq u er ex citação ; em seg u n d o , q u e são au to m ático s, in v o lu n tário s e in co n scien tes, p o is co m freq ü ên cia o ser h u m an o n ão p o d e rep rim ir u m d eterm in ad o reflex o ; em terceiro lu g ar, n a m aio ria d as v ezes eles são b io lo g icam en te ú teis. P o r ex em p lo , se a crian ça n ão so u b esse to ssir d e fo rm a reflex a, facilm en te se asfix iaria ao in g erir o alim en to , p o rém o reflex o ex isten te a o b rig a a realizar m o v im en to s d e ex p u lsão p ara se liv rar d as p artícu las d e alim en to q u e [acid en talm en te] se in tro d u zem n a traq u éia. O reflex o d e fech ar as p álp eb ras d ev id o a q u alq u er irritação m ecân ica in cô m o d a d irig id a ao s o lh o s tam b ém é ú til. E sse reflex o d efen d e u m ó rg ão tão ex trao rd in ariam en te im p o rtan te e d elicad o , co m o o o lh o , d e d an o s m ecân ico s. P o d em o s p erceb er, p o rtan to , q u e a crian ça recém -n ascid a v iv e g raças às fo rm as h erd ad as d e co m p o rtam en to . S e ela p o d e se alim en tar, resp irar e m o v im en tar seu s ó rg ão s, d ev e tu d o isso ao s reflex o s. O reflex o n ão p assa d o n ex o m ais sim p les en tre o s elem en to s am b ien tais e o co rresp o n d en te m o v im en to d e ad ap tação d o o rg an ism o . l.J l. OS INSTINTOS C h am am o s d e instintos as fo rm as m ais co m p lex as d o co m p o rtam en to h ered itário . N o s ú ltim o s tem p o s está sen d o d efen d id o o p o n to d e v ista d e q u e o s in stin to s tam b ém d ev em ser co n sid erad o s u m reflex o co m p lex o o u em red e. E n ten d e-se p o r isso u m a u n ião d e alg u n s reflex o s d e tal tip o q u e a resp o sta d e u m reflex o ag e co m o ex citan te p ara o seg u in te. N esse caso , d ev id o a u m im p u lso in sig n ifican te o u a q u alq u er estím u lo ex tern o , p o d e su rg ir u m a série co m p lex a d e açõ es e ato s, v in cu lad o s en tre si d e tal fo rm a q u e cad a ação p ro v o caria au to m aticam en te a seg u in te. V ejam o s, p o r ex em p lo , o in stin to d e alim en tação q u e se m an ifesta n a crian ça. Im ag in em o s o q u e aco n tece. O s ex citan tes in iciais são o s p ro cesso s in tern o s q u e estim u lam a crian ça a realizar d e fo rm a reflex a u m a série d e m o v im en to s d e b u sca p relim in ar co m a b o ca, o s o lh o s e a cab eça. Q u an d o , em resp o sta a esses m o v im en to s, a m ãe ap ro x im a o seio d o s láb io s d o b eb ê, su rg e u m a n o v a ex citação e u m n o v o reflex o d e ro d ear co m o s láb io s o m am ilo . E sse m o v im en to , p o r su a v ez, p ro v o ca o n o v o reflex o d o s m o v im en to s d e su cção , q u e lev am o leite à b o ca d a crian ça. E sse n o v o estím u lo p ro v o ca o reflex o d e d eg lu tição , etc. D e aco rd o co m essa in terp retação , o in stin to n ão p assa d e u m a red e d e reflex o s su cessiv o s, u n id o s en tre si co m o se fo ssem elo s d e u m a co rren te. C o n v en cio n al e esq u em aticam en te, o in stin to p o d e ser ap resen tad o co m a seg u in te fó rm u la. E n q u an to u m reflex o co m u m é d esig n ad o co m o ab, em q u e a d esig n a o estím u lo e b o reflex o , o in stin to seria ex p ressad o m ed ian te a fó rm u la ab-bc-cd-de, e assim p o r d ian te. N o en tan to , essa in terp retação d o in stin to p ro v o ca u m a série d e o b jeçõ es. E m p rim eiro lu g ar, d estaca-se q u e o v ín cu lo d o in stin to co m o s elem en to s d o m eio circu n d an te é m u ito m en o s lim itad o e p reciso q u e o d o reflex o . O reflex o é u m v ín cu lo u n ív o co , rig o ro sam en te d efin id o e d eterm in ad o . O in stin to , p o rém , seria m u ito m en o s d eterm in ad o e m ais liv re. A lg u n s o b serv ad o res relatam q u e o s esq u ilo s jo v en s, sep arad o s d o s p ais n o m o m en to d o n ascim en to e criad o s em u m cô m o d o d o PSICOLOGIA PEDAGÓGICA q u al n u n ca v iam a terra n em o b o sq u e, e q u e sem p re receb eram alim en to d as m ão s d o h o m em , n o o u to n o co m eçam a m an ifestar o in stin to d e ju n tar p ro v isõ es p ara o in v ern o ; en tão eles co m eçam a esco n d er n o zes em b aix o d o tap ete, n o so fá o u em alg u m can to d a sala. N essas co n d içõ es, ex clu i-se to talm en te a p o ssib ilid ad e d e ap ren d izag em . T am b ém se ex clu em to d o s o s elem en to s d o am b ien te q u e g eralm en te aco m p an h am a m an ifestação d esse in stin to . P o r isso , cab e su p o r aq u i q u e ex iste u m v ín cu lo m u ito m ais flex ív el e elástico en tre a reação in stin tiv a e o am b ien te q u e n o caso d o reflex o . r 51 realizam an tes d a u n ião , e q u e n ão p o d em ser p rev isto s n em calcu lad o s p rev iam en te co m ex atid ão , p o is d iv erso s ó rg ão s p articip am d o s m esm o s. V erifico u -se q u e a m o sca sem cab eça tam b ém está cap acitad a p ara o ato d e aco p lam en to . N esse caso , o co m p o rtam en to fo i d iv id id o ex p erim en talm en te n as fo rm as in stin tiv as e reflex as. T o d as as reaçõ es d e co n d u ta d o o rg an ism o q u e an teced em o ato sex u al estão relacio n ad as ao co m p o rtam en to in stin tiv o , v in cu lad o ao fu n cio n am en to d o s cen tro s cefálico s. E m co m p en sação , o ato sex u al n ão p assa d e u m sim p les reflex o q u e n ão ex ig e a p articip ação d o s cen tro s cefálico s e está lo calizad o em cen tro s in ferio res. A lém d isso , o sistem a d o s m o v im en to s q u e co n stitu em u m reflex o está rig o ro sam en te d eterm in ad o e ex iste an tecip ad am en te de A ORIGEM DAS REAÇÕES [E OUTROS fo rm a p recisa. N o en tan to , o s m o v im en to s in sCOMPORTAMENTOS HEREDITÁRIOS] tin tiv o s n u n ca p o d em ser p rev isto s n em to talm en te calcu lad o s d e an tem ão , n u n ca se ap reA q u estão d a o rig em [h istó rica d o s p ro sen tam co m o u m estereó tip o ex ato e v ariam g ram as h erd ad o s d e co m p o rtam en to ] fig u ra to d as as v ezes. en tre o s m ais d ifíceis p ro b lem as cien tífico s. P o r ú ltim o , a terceira p articu larid ad e d o E stam o s d ian te d e fato s su ced id o s n o d eco rrer in stin to resid e n a m aio r co m p lex id ad e d o s m o d e m u ito s m ilên io s. D ev em o s lid ar co m aco n v im en to s p ro d u zid o s. N o caso d o reflex o , g etecim en to s q u e d esap areceram h á m u ito tem ralm en te ag e ap en as u m ó rg ão , p o rém , q u an p o e ju lg ar o p assad o d e aco rd o co m o p resen d o se trata d e in stin to s, d ep aram o -n o s co m te. E sse é o p ro b lem a d a o rig em d as fo rm as u m a série d e m o v im en to s co m b in ad o s d e d ih ered itárias d o co m p o rtam en to . É to talm en te feren tes ó rg ão s. im p o ssív el, n o atu al estad o d o sab er cien tífiD ev em o s acrescen tar tam b ém q u e ex isco , resp o n d er, ain d a q u e seja d e fo rm a ap ro x item d iferen ças an atô m icas e fisio ló g icas en tre m ad a, à q u estão d a o rig em d e u m d eterm in ain stin to s e reflex o s. N a fo rm ação d o s in stin to s d o in stin to o u reflex o . o sistem a n erv o so cen tral, b em co m o o sisteE n tretan to , o p rin cíp io g eral d e su a o rig em m a h o rm o n al o u d e secreção in tern a, d esem fo i estab elecid o e esclarecid o p o r D arw in ,? em p en h am u m p ap el su m am en te im p o rtan te. su a teo ria so b re a seleção n atu ral. N esse sen tiP o r esses m o tiv o s, tem o s d e d istin g u ir o s d o , n ão ex iste n en h u m a d iferen ça essen cial en in stin to s co m o u m a fo rm a p ecu liar d o co m p o rtre a o rig em d as fo rm as h ered itárias ú teis d e o rtam en to h ered itário ; essa d istin ção se b aseia g an ização d o s an im ais e seu co m p o rtam en to . tam b ém n a característica d e q u e o reflex o reN a ép o ca d e [fo rte] p en sam en to relig io p resen ta u m a reação q u e p arte d e q u alq u er ó rso p red o m in av a a n o ção d e u m a m ilag ro sa rag ão , en q u an to o in stin to é u m a reação d o co m cio n alid ad e p resen te n o s o rg an ism o s an im ais p o rtam en to d e to d o o o rg an ism o . E ssa caractee v eg etais, e d a co rresp o n d ên cia en tre o o rg arística fo i d estacad a p elo p ro fesso r v ag n er." n ism o e as co n d içõ es d e su a ex istên cia. O p en F ica m ais sim p les co m p reen d er essa d isam en to p ré-cien tffico v ia aí u m a d em o n straferen ciação atrav és d o ex em p lo d o aco p lação ev id en te d e q u e u m a p ro v id ên cia b o n d o sa m en to d e m o scas d ecap itad as, citad o p elo p ró e sen sata d o tara a av e d e asas, o p eix e d e n ap rio V ag n er. A s m o scas d ecap itad as são cap ad ad eiras e o h o m em d e razão . E m o u tro s terzes d e cru zar, d esd e q u e isso o co rra en tre u m m o s, co m o o ser h u m an o n ão p o d ia ex p licar ex em p lar d ecap itad o e o u tro n o rm al. A m o sca d e q u e m an eira tin h a su rg id o tão ex trao rd in án o rm al realiza to d o s o s m o v im en to s q u e se PONMLKJIHGFEDCBA 52PONMLKJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ria cap acid ad e d e ad ap tação n ism o s v iv o s e, ju lg an d o m esm o , p erso n ificav a d e to d o s o s o rg a- p o r an alo g ia a n atu reza u m p rin cíp io racio n al a ex p licação do m undo rid ad es b asean d o n o co n ceito co n q u ista tífico fo i a rejeição d o , q u e assu m iu ria d arw in ista d o p en sam en to d essa fo rm a so b re d efin itiv a a o rig em co n cep ção d e u m criad o r tu íd a sem p re p ara m eira n ism o s n atu ral v iv o s, p licação do m unco m a teo - racio n al A fo i su b stie, p ela p ri- o p rin cíp io d o d esen - o u d a ev o lu ção d o s o rg a- assim n atu ral cien - d as esp écies. p o r essa teo ria v ez, co lo co u -se v o lv im en to co n cep ção co m o da o p rin cíp io o rig em e do ser h u m an o . se sab e, h arm ô n ica d o p o n to in g ên u a, cau salid ad e m esm o p ela N essa lu ta, p ro p õ e so b rev iv em q u e o u tro s ap en as cau sas, que p ro d u z cad a caso d a esp écie E assim ca se d etém , lad o , o m esm o v am o d ireito san te ten são à v id a d esen v o lv em sário s d e lu ta, seleção dos e m ais d e lu ta n u n e d e so b re- co m u m d e- m odo e p o u co atro fiam , d ev id o q u e n ão são u tilizad o s. P o r ú ltim o , à in ativ id ad e, d ev e-se o rien tad a ten h am racio n alid ad e p azes n eces- d a co n s- É n o s an im ais. q u e, n a lu ta p ela aq u eles q u e, co m m aio r reflex o d o alcan ce é ev id en te d e to d o s d efen siv o e d e u m a m o rd id a que fo i lev ad o o s [ó rg ão s] su - p lacas d e g ratid ão fo rm as trazid as a ação d a trato s d aq u eles sen tid o frág io e salv aram -se que ex p lica-se o s an im ais in ca- tão co m p lex as C o n ta-se a u m tem p lo d eu s [co rresp o n d en te], a asso m b ro sa o s in stin to s d e ad ap tação . g reg o e é m o rtífero . se n o m esm o de d e q u e, e b ási- a o rig em realizaram um d e d esen v o lv er ap erfeiço ad as d e- fo rm as d ú v id a so b rev iv id o p erig o , n eles acrescen tar que e h ab ilid ad e T am b ém d as e d o s ó rg ão s a p ata isto é, as e d o s reflex o s co m p reen sív el de um d e m u ito s. fu n d am en tais in stin to s p elo fato d e q u e su cu m b iram ex ercitam , o s ó rg ão s a p o u co d o co rp o ex istên cia, in ces- um a n ão resta a m esm a p erfeitam en te rap id ez d a m o rte d e lu ta d e co m p o rtam en to , dos o u d e u m ferrão só co n ser- de um a tru ção retiraram d e v iv er. P o r o u tro p o r m eio ex atam en te ex p eriên cia e o reflex o , co n sid erad o s cas, a o rig em d ian te co m o p ro ces- so b rev iv en tes p érflu o s, sex u al, re- um a d e certa n o p ro cesso o in stin to características d a esp écie e ap erfeiço am e ú teis, seleção h ered itárias ser sáb ia e racio n al às cu stas fo rm as e d a teo - ser co m p reen d id a, m as co m o m o rrem p o r esses d a ev o lu ção elab o rad a co m o sú - e d o s reflex o s sim - ex p licad a e d ev e em su as um a D esse ser fu n d am en tais E assim ativ o d e to d as as su as p o ssib ili- d e ad ap tação . pode d e ex istên cia. d e to d as su as fo rças, sen v o lv im en to d o s in stin to s tam b ém p ela ex istên cia, tran siçõ es atrib u to s." A o rig em à v id a o u su rg e p ela v ia rev o lu cio n á- a novos sen sata, n ão o d e p eq u en as rep en tin o s, n ão co m o a realização co n siste isto é, p o r m eio e g rad u al b io ló g ica, aco n tece d o s m ais cap azes salto s b itas e ev id en tes v em esp écies m as tam b ém e ú til, m elh o ra a ev o lu ção , len ta ad ap tação co m o o p ro cesso o s o rg an ism o s d ad es m u d an ças, p les n o v as m ed ian te d a acu m u lação terrív el m ais ad ap tad o s so d e ap erfeiço am en to v iv ên cia ap en as de ria d a m u tação ,'? o s o rg an is- co m a O sig n ifi- d essa v o n tad e p ro cesso fo i co m p letad a d as m u taçõ es". n o p ro cesso p rin cíp io s ser v iv o R ecen tem en te, d e d esen v o lv im en to , q u e, da e ciliad o s em v eg etal so b rev iv en tes o m esm o v iáv eis. "teo ria estão m ais ad ap - às co n d içõ es aliza-se n o v am en te h u m an o . d e D arw in d o s o r- dos cad o m ais su b stan cial d a ev o lu - a cad a ad ap tar-se E n tre esses o rg an ism o s em teo ria d en o m in ad a a ev o lu ção esten d er ao ser Ao su a aten ção o s d esad ap tad o s m o s q u e, p o r d iv ersas ex em p lares d o ân g u lo en ten d id a. fu n d am en tal d e d ilem a: e d esap arecem ; tad o s essa en tre o o rg an ism o v id a" n o m u n d o E sse p rin cíp io u m a esp écie a d e v ista d e u m a "racio - m as a p artir m o to r ção , n a lu ta o b serv o u tev e d e co n cen trar n o m ecan ism o p erecer. n ão cien tificam en te tem p o , an im al. D arw in co rresp o n d ên cia e o am b ien te n alid ad e" d a v id a, se pôde u n icelu lares as p ecu lia- lei d a lu ta, q u e co n stitu i g an ism o s ria, m ed ian te C om o e refo rçam d e- d e seu s an tecesso res. a lei fu n d am en tal ap arecim en to d a ex - do m undo receb em b io ló g icas m ais ap to s esses d escen d en tes, G raças à trág ica [teleo ló - g ico ] d e fin alid ad e. A m aio r d escen d ên cia; v id o à h eran ça, e lh e atrib u ía e co n scien te, q u e faz co m q u e só o s ex em p lares d eix em co n sig o e que um e o b serv av a as co m o o feren d a ao aco m p an h ad as d o s re- tin h am so frid o u m n au - g raças à o ração . O cético PSICOLOGIA PEDAGÓGICA d isse: "M o strem -m e o s retrato s d o s q u e, ap esar d a o ração , p ereceram ; d o co n trário , n ão acred itarei q u e o d eu s seja to d o -p o d ero so ". O m esm o su ced e co m a v id a. O s q u e se ad ap tam se salv am , p o rém a ad ap tação n ão co n stitu i a lei m ais ex ten sa d a v id a o rg ân ica. H á u m n ú m ero m u ito m aio r d o s q u e n ão se ad ap tam , m as n ão o p erceb em o s p o rq u e eles se ex tin g u irarn .!' É co m p reen sív el q u e, d ev id o à lei g eral d a seleção n atu ral, ten h a o co rrid o o m esm o p ro cesso d e ad ap tação b io lo g icam en te ú til tan to n a co n d u ta d o s an im ais-q u an to n a estru tu ra d e seu co rp o . O fato d e o ser h u m an o elab o rar o reflex o d a to sse, o u a leb re o in stin to d o m ed o , o u a av e o in stin to d a m ig ração , p o d e ser ex p licad o , em su m a, p o rq u e m o rreram aq u eles q u e n ão p o d iam to ssir, o u ad o tar u m a p o sição d efen siv a p eran te u m su sto , o u m ig rar co m a ch eg ad a d o frio . PONMLKJIHGFEDCBA A TEORIA DOS REFLEXOS CONDICIONADOS A té p o u co tem p o atrás, a q u estão d a o rig em d as reaçõ es n ão -h ered itárias co n tin u av a sen d o co n fu sa e p o u co clara p ara a ciên cia. D u ran te m u ito tem p o , o s p ro fesso res ten d eram a co n sid erar q u e o s recém -n ascid o s eram u m a táb u la rasa, u m a p ág in a em b ran co em q u e o ed u cad o r p o d ia escrev er o q u e q u isesse. A b rev e d escrição d as fo rm as d iv ersas e co m p lex as d a co n d u ta h ered itária é su ficien te p ara in ferir facilm en te até q u e p o n to esse critério é in co rreto . A crian ça n ão é u m a fo lh a d e p ap el em b ran co , m as u m a fo lh a rep leta d as m arcas d a ex p eriên cia b io lo g icam en te ú til d e seu s an tep assad o s. N o en tan to , seria m u ito d ifícil d izer q u al é, p recisam en te, o m ecan ism o d o n ascim en to d as reaçõ es recém -ad q u irid as. Só duran te as ú ltim as d écad as, g raças, p rin cip alm en te, ao êx ito d o p en sam en to ru sso n a área d a fisio lo g ia, fo i p o ssív el ap ro x im ar-se d a elu cid ação d esse m ecan ism o . A teo ria d o s reflex o s co n d icio n ad o s, elab o rad a fu n d am en talm en te p elo acad êm ico P av lo v ," elu cid a as leis d esse m ecan ism o co m a in eg áv el ex atid ão d a ciên cia n atu ral ex p erim en tal. 53 A essên cia d essa teo ria p o d e ser facilm en te ex p licad a p o r m eio d o ex em p lo d o ex p erim en to clássico d e fo rm ação d e u m reflex o co n d icio n ad o . N o ex p erim en to , co lo ca-se n a b o ca d e u m cão carn e, açú car, ácid o clo ríd rico , etc. C o m o resp o sta a esses estím u lo s, o cão co m eça a secretar saliv a em u m a q u an tid ad e rig o ro sam en te d eterm in ad a e de um a q u alid ad e to talm en te d eterm in ad a, d e aco rd o co m o caráter d o estím u lo . A ssim , ele reag e ao ácid o clo ríd rico co m ab u n d an te saliv ação , p o rém a co m p o sição d a saliv a é su m am en te aq u o sa e líq u id a, p o rq u e n esse caso a m issão d o reflex o co n siste em elim in ar o estím u lo d esag rad áv el. Q u an d o se trata d e u m alim en to seco e p ican te, o an im al secreta u m líq u id o esp esso e v isco so em m en o r q u an tid ad e, en v o lv en d o o alim en to , p ara n ão d eterio rar o s seu s d elicad o s teg u m en to s in tern o s. P o rtan to , estam o s d ian te d e u m reflex o co m p leto , co m seu s três co m p o n en tes fu n d am en tais e co m to d as as su as p ecu liarid ad es típ icas, co m o u tilid ad e, au to m atism o , etc. S e em cad a o p o rtu n id ad e, alg u n s seg u n d o s an tes o u sim u ltan eam en te à ação d a carn e o u d o ácid o n o cão , acen d em o s u m a lu z azu l n o cô m o d o , to cam o s u m a cam p ain h a, o u acariciam o s, co çam o s o u esp etam o s o an im al, d ep o is d a rep etição d e certo n ú m ero d e [alg u m a d essas] ex p eriên cias, será criad o u m n o v o v ín cu lo en tre o estím u lo estran h o o u in d iferen te [a lu z azu l, a cam p ain h a, etc.] e seu reflex o saliv ar. N esse caso , será su ficien te acen d er a lu z azu l sem d ar carn e ao cach o rro p ara q u e ele saliv e n a m esm a q u an tid ad e e q u alid ad e q u e n o caso d e receb er a carn e. E sse n o v o reflex o saliv ar d ev e ser d en o m in ad o reflexo condicionado, p o rq u e só su rg e em certas co n d içõ es: q u an d o se d á a co n d ição d e co in cid ên cia o u co m b in ação d o n o v o estím u lo estran h o co m o s estím u lo s fu n d am en tais an terio res (lu z azu l + c a rn e )." P o r isso , tal reflex o tam b ém é ch am ad o d e "co m b in ad o ". É p reciso d istin g u ir esse n o v o reflex o co n d icio n ad o d o reflex o h ered itário o u in co n d icio n ad o , assim co m o o n o v o estím u lo , co n d icio n ad o [p o r ex em p lo , a lu z azu l], d o estím u lo in co n d icio n ad o [p o r ex em p lo , a carn e]. E m q u e se d iferen cia o reflex o co n d icio n ad o d o in co n d icio n ad o ? E m p rim eiro lu g ar, su a o rig em n ão 54PONMLKJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tem n ad a a v er co m ria, p o is ele n asce ex p eriên cia in d iv id u al. in d iv id u al v erso s a ex p eriên cia atrav és E m seg u n d o e co m p letam en te rep resen tan tes cie. E m terceiro lu g ar; m ais e in stáv eis tran sitó rias p arecer e se ex tin g u ir co m o estím u lo reflex o co n d icio n ad o rid ad es d as reaçõ es asp ecto s co n d u ta g raças d o an im al se to rn a e ráp id o fo rm ação seg u in te m ais m an eira. q u e ex istem n o d eco rrer a d iv ersid ad e p o d e acab ar m in ad as co n d içõ es, d o am b ien te q u alq u er m en o do m undo estím u lo d e co in cid ir ad ap tativ as sin ais que d o an im al. n ão saliv ação b io ló g ico q u e p o d em e o rien te q u e su rg em , reaja d o s estím u lo s p resen tes lei n o s in d ica a e p re- rep resen tam q u e as reaçõ es n ad a essen cial- a resp o n d er às b atid as estru tu ra, am b ien te co m d o m etrô - ao m esm o o co rre a certas p ecu liarid ad es in flu ên cia S e lev arm o s b ase e as fo r- v ão sen d o n as in atas, são elab o rad as d o am b ien te, q u e as reae fo rm ap o d erem o s É p ro v áv el d esse tip o q u e o co rrem a p artir o s elem en to s d e co m p o rtam en to d esco b erta d a an álise esp ectral, o u à d esco b erta que n o ser d o b erço . E las p o s- d e to d as co m p lex as d e N ap o leão elab o raso b u m a co m o "o am b ien - p elo am b ien te". já ex istiam a estab elece em co n sid eração d as so b a in flu ên cia su em P o rtan to , d o am b ien te. tam b ém to d as as reaçõ es d e su a o caráter co n d icio n ad o s ad q u irid as real g ru p o s q u e se ad q u irem . co m à o u aq u eles d eterm in an d o q u e as reaçõ es em o reflex o co m o am b ien te estes d o s reflex o s h u m an o tem p o a lu z azu l, fo rm a-se co in cid em d e estím u lo s, n o lab o rató rio . d efin ir o reflex o co n d icio n ad o seu co m p o rtam en to ou ao ser esco v ad o ? é o ferecid o q u e se acen d e te m u ltip licad o as reaçõ es d esta em u m cão ? P o r ap ren d e d o m eio çõ es in atas E sses reflex o s p ro d u za E m ú ltim a in stân - N esses caso s, é ó b v io q u e a cau sa é a o r- ter d o an i- a m esm a d e P av lo v co m rela- à lu z azu l, o u tro d ecisiv a eles p o d em de a elab o ração e u m terceiro teo ria tem o s fu tu ro s. ad q u irid as cach o rro um d as e su rg em o co m p o rtam en to ao s estím u lo s E ssa m esm a que a elab o ração co n d icio n ad a m as d as reaçõ es se tran sfo rm ar m ed id a d o am b ien te. so b a in flu ên cia v en d o fato o u fen ô - o sig n ificad o o an im al d istan tes reação S e o ácid o P o r- a ação d o fen ô m en o que p erm item d o an im al. reação im p o rtan te m al à ex ig ên cia ..IWJ pode ex trao rd in ariam en te e ad ap tar d eterm in a d aq u ela d as d esem p en h a q u e o lab o rató rio cia, o q u e a estru tu ra as co n d içõ es a cad a u m d e n ó s, p o d em o s q u e o am b ien te em q u e, d ev id o esses ap ro x im ar in d iv id u al. elem en to ex terio r e em to d a g an ização co m a ação d o estím u lo . reflex o s em d efin itiv o , en tre q u alq u er Ju stam en te, q u ais d ep en d e, C o m relação frisar q u e d a ex p eriên cia cria e d eterm in a a co n d u ta in d iv id u ais. é im p o rtan te n a fo rm ação lu z, etc. O m esm o reação às co n d içõ es tem p o , em d eter- d e q u alq u er É fácil p erceb er d a esp écie d o am b ien te o s d ife- que um novo aco n tecim en to , P ara q u e isso su ced a, h erd ad a [o u se fo rm ar] e q u alq u er tan to , d a ex p eriên cia nom o, e su as reaçõ es; E ssa lei estab elece v ín cu lo em este, d esses n o v o s v ín cu lo s é to talm en - te in esg o táv el. n ad a m ais é d o d e ad ap tação ção ao s cães d a ex p eriên cia. h erd ad o s co n - d e elab o ra- co n d icio n ad o s o p ro cesso A lei d e da q u e fo i que d izer em su a rea- ção d o s reflex o s fu n ção en tre d o am b ien te as d iferen tes flex ív el, o m eio e o o rg an ism o , n o v o s v ín cu lo s elem en to s co m O p ro cesso é o am b ien te. da p esso al h erd ad a, d e aco rd o E la e q u e q u alq u er [reação ] d a ex istên cia. p esso al d e to d a a su a v id a, v ai elab o ran d o e estab elecen d o é um a de por se ex p ressar A lém d o s v ín cu lo s en tre d içõ es as in atas, em p rin cíp io . q u e a ex p eriên cia n a h eran ça, ção ad q u irid a rev ela o co n d icio n ad o s, pode estab elece está b asead a co m d estas, d ecisiv o im p o rtan tes p articu larm en te g eral, tam b ém A o m esm o sim p les em su a ad ap tação . co m p aração o fato r ao q u al o co m p o rtam en to d o s reflex o s fo rm u lação g en ialm en te em um o círcu lo n ão -tran sm issív el novo são d iferen tes as p ecu lia- [essa d esco b erta] m ecan ism o que o co n stitu i su m am en te d o an im al; d iv erso to d as e-fo rm a p esso al E ssa d esco b erta esclarece ren tes p o ssu i ad q u irid as, d o in d iv íd u o su a ex p eriên cia h eran ça. fo r refo rçad o é ev id en te n em m o d ificad a m u ito a d esa- in co n d icio n ad o . P o r essa caracterização , p atrim ô n io esp é- fo rm as e ten d e se n ão é n o s d i- m esm a p o ssu i de lu g ar, d iferen te de um a m en te h ered itá- d e u m p ro cesso as, fo rm as m ais q u e lev aram à às cam p an h as d a A m érica. No P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 55 processo da experiência pessoal não surge neNa experiência com cães foi possível elanhuma reação genuinamente nova; seus eleborar reflexos condicionados não-superiores à mentos estão presentes na criança, porém em terceira ordem, porque a pesquisa foi iniciada uma aglomeração caótica, não-coordenada e há pouco tempo e tem de lidar com o aparelho não-organizada. Todo o processo de crescimen[sistema] nervoso primitivo do cão e experito que vai separando a conduta do adulto do mentar com reflexos que, por sua missão biocomportamento da criança se reduz ao estalógica, não são o terreno mais propício para o belecimento de novos vínculos entre o mundo desenvolvimento de super-reflexos, isto é, de e as reações do organismo e ao aumento de reflexos de níveis superiores. sua mútua coordenação. Apesar disso, podemos imaginar facilUm psicólogo contemporâneo poderia mente no sistema nervoso mais aperfeiçoado dizer: dêem-me todas as reações de uma criando ser humano - e, em parte, do animal -, a ça recém-nascida e toda a-trama de influênpossibilidade de surgirem reflexos condicionacias na estrutura do meio ~ poderei prever com dos de uma ordem extraordinariamente eleexatidão matemática seu comportamento vada, muito distantes do vínculo incondiciocomo adulto em cada momento dado.!" nado inicial que os gerou. Dessa forma, podemos ter uma noção da Existem plenos fundamentos para supor extraordinária plasticidade e mutabilidade do que a conduta do ser humano, na enorme comportamento no sentido de sua adaptação maioria de suas formas, é construída com esilimitadamente complexa e precisa ao meio.SRQPONMLKJIHGFEDCBA ses super-reflexos de ordem extraordinariamente elevada. Ao mesmo tempo, é sumamente imporO S S U P E R -R E F L E X O S tante que cada vínculo condicionado que surja na experiência pessoal possa ser o início de Pela mesma via experimental foi possível um novo vínculo; temos de recordar também estabelecer que os novos vínculos condicionaque a formação das reações condicionadas, dos não se formam apenas em função dos refalando teoricamente, não possui fim nem liflexos inatos ou incondicionados, mas também mite. Isso confirma uma vez mais o gigantesco com base nos reflexos condicionados. Assim, significado biológico que o comportamento por exemplo, se elaboramos um reflexo condihumano adquire, graças aos super-reflexos e cionado salivar à luz azul em um cão, ele saliaos reflexos condicionados. vará sempre que acendermos a luz azul. Se esse fato for acompanhado de um novo estímulo estranho, como as batidas de um metrônomo, AS FORM AS COM PLEXAS DOS um novo reflexo condicionado se formará no R E F L E X O S C O N D IC IO N A D O S animal depois de um certo número de repetições, e ele salivará ao ouvir o metrônorno mesComo a pesquisa já demonstrou, existem mo que a luz azul não seja acesa. formas sumamente complexas de reflexos conSeria justo denominar esse novo reflexo dicionados. Se a ação de um estímulo incondicionado, como a alimentação com carne, por decbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r e fle x o c o n d ic io n a d o de s e g u n d o n ív e l o u de s e g u n d a o r d e m , pois ele surgiu e se fortaleceu exemplo, não é iniciada imediatamente depois mediante um reflexo condicionado. Ao mesdo início da ação do estímulo condicionado mo tempo, o mecanismo de formação dos re[acender uma luz azul], mas em cada oportuflexos condicionados de nível superior ou s u p e r nidade depois de um certo intervalo - três ser e fle x o s não se diferencia essencialmente da gundos, por exemplo -, como resultado de uma formação dos reflexos de primeiro nível. Tamsérie de experimentos, elabora-se no cão um reflexo condicionado r e ta r d a d o : 'ele não vai sabém precisam de um vínculo estabelecido previamente para surgir e da coincidência tempolivar imediatamente depois de que se acenda ral entre o estímulo anterior e o novo. a luz, mas depois desses três segundos. Esse 56SRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tipo de reflexo nos permite compreender reações como a resposta que ocorre algum tempo depois do estímulo. Outro tipo de reflexo condicionado é o decbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tr a ç o [ou vestígio]. Aparece quando ação do estímulo incondicionado é iniciada depois do final da ação do estímulo condicionado. Por exemplo, quando uma luz azul é acesa, mas o cão só recebe carne quando ela é apagada, ele só vai começar a salivar quando a luz azul for apagada. É como se esse reflexo seguisse a marca deixada pelo estímulo quando o próprio estímulo deixou de atuar: Esse tipo de reflexo nos permite explicar como surgem formas complexas de reações condicionadas nas formas complexas de estrutura do ambiente. Em todas as formas do comportamento do animal e do ser humano, dos mais elementares aos mais superiores, o acadêmico Pavlov vê elos de uma única corrente , ou se]'a , da a [... ] ilimitada adaptação em toda sua extensão que constitui a vida na Terra. Por acaso o movimento das plantas para a luz e a busca da verdade por meio da análise matemática não são essencialmente fenômenos de uma mesma ordem? Este não constitui o último elo da corrente quase infinita de adaptações efetuadas em todo o mundo vivo? NOTAS 1. Vigotski utiliza muitas vezes o termo "excitante", muito usado na psicologia e fisiologia russas, que também falavam de "estímulos", como no comportamentalismo norte-americano. No . presente livro e s s e s te r m o s d e v e m s e r c o n s id e r a d o s s in ô n im o s . Vigotski utilizava vocábulos do léxico de diversas escolas psicológicas e, na época, estava influenciado pela reflexologia de Pavlov, pela reatologia de Kornilov e pelo comportamentalismo de Watson, porém nunca chegou a ser um reflexólogo, um reatólogo ou um comportamentalista. 2. A rigor, não se trata de uma glândula. Depois de preparar a segunda edição de A o r ig e m d a s e s p é c ie s , Charles Darwin passou férias em Sussex ficou surpreendido com o número de pequenos insetos que ficavam presos nas folhas de uma planta muito comum nos pântanos, a r o tu n d ifo lia . Durante 16 anos, ele pesquisou essa e outras plantas semelhantes. Demonstrou que qualquer objeto que tocasse a protuberância situada no extremo de um dos tentáculos da folha da drósera agia como estímulo, fazendo todos os tentáculos dobrarem para o centro da folha, enquanto esta segregava uma substância capaz de digerir a carne animal. Darwin surpreendeu-se com essa sensibilidade - a máxima que a química de sua época comprovara -, pois um fragmento de cabelo de mulher, pesando um milionésimo de grama, podia ativar essa reação. Ele publicou essas pesquisas em seu livro I n s e c tiv o r o u s P la n ts , Londres: John Murray; 1876. Esse.é o texto que consideramos como referência original. O texto utilizado por Vigotski foi um artigo em russo intitulado "O virayeni oshchushcheni u chielovieka i yivotnij" [Sobre a manifestação das sensações no homem e nos animais"], São Petersburgo, 1896, que pode ter sido um apêndice de I n s e c tiv o r o u s P la n ts . Cf. também a nota 7. 3. A r e fle x o lo g ia é uma escola russa de neurofisiologia, vinculada aos nomes de V M. Bejterev e r. P. Pavlov. Pesquisou a atividade nervosa superior do ser humano e dos animais e, em nossa opinião, continua representando um dos melhores c o r p u s teóricos que dão conta da fis io lo g ia do sistema nervoso. Anos depois da morte de Vigotski, essa escola se desprestigiou devido a um problema de in c u m b ê n c ia que se manifestou com maior virulência durante o reinado de T. D. Lisenko, exemplo paradigmático da política cultural stalinista na ciência. A reflexologia caiu no mecanicismo e no reducionismo quando extrapolou as fronteiras de seu objeto de estudo e pretendeu explicar, com sua metodologia e categorias, os processos psíquicos especificamente humanos, que requeriam uma abordagem totalmente diferente, como Vigotski destacou a partir de 1926. Sem a rejeitar, Vigotski foi tomando distância das questões vinculadas à reflexologia, próprias de princípios explicativos de nível fisiológico, pois seus interesses posteriores - a partir de 1928 - passaram a abordar o caráter de mediador dos processos químicos superiores (culturais) e, finalmente, a organização semiótica da consciência. 4. Piotr Petrovitch Lazarev (1878-1942) foi um físico, biofísico e geofísico russo. Elaborou a teoria iônica da excitação nervosa e uma teoD rosera P S IC O L O G IA 5. 6. 7. 8. 9. P E D A G Ó G IC A 57 ria sobre a adaptação do sistema nervoso censó, e não importa se as mudanças ocorreram tral aos estímulos externos. Em 1920, organipor meio de modificações pequenas ou granzou o Instituto Estatal de Biofísica, que passou des, ou ambas - questões que continuam senS o c h in ie n i a dirigir em 1931. Cf. P. P. Lazarev,cbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA do discutidas hoje em dia. [ O b r a s ] , vols. 1-3, Moscou, 1950-57. 10. É muito interessante que Vigotski considere que a teoria da mutação "completa" a teoria O grifo é nosso. Vladimir Aleksandrovitch Vagner (1849-1934) darwiniana da seleção natural do século XIX, de concepção graduala primeira grande teofoi um biólogo e psicólogo russo que fez importantes descobertas. Destacado teórico da ria da evolução. Quando fala de "teoria da evolução e grande psicólogo comparativo, mutação", Vigotski se refere a Hugo de Vries Vagner foi amigo de Vigotski e sempre se sua o p u s m a g n u m intitula-se justamente corresponderam. Como disse Van der Veer, M u ta tio n s th e o r ie [ T e o r ia da m u ta ç ã o ] e a T. H. constituíam uma "estranha dupla", pois Vagner Morgan. No início do século XX, esses autores era 46 anos mais velhó 'que Vigotski. Ambos relegaram a seleção natural a um segundo plamorreram no mesmo áno. (Vagner é o sobreno e privilegiaram as macromutações como motor da evolução. Na década de 30, a partir nome alemão Wagner escrito na forma russa.) dos trabalhos de Th. Dobzhansky, Th. H. Huxley Charles Robert Darwin (1809-1882) foi o naturalista inglês que se tornou o mais impore G. G. Simpson, surgiu a "teoria sintética" - a tante biólogo da ciência moderna. De forma segunda grande teoria da evolução -, uma sínsimultânea e independente, Darwin e Alfred tese da genética mendeliana e da teoria darwiniana da seleção natural- micromutações Wallace descobriram a origem das espécies e evolução gradual. Na década de 70, N. através da seleção natural durante o processo Eldredge e S. J. Gould criaram a terceira grande evolução dos seres vivos. Em 1867, Darwin de teoria da evolução, a do "equilíbrio pontuafoi eleito membro correspondente da Academia de Ciências da Rússia. Sua concepção do", na qual se articula a teoria darwinista privilegiando as categorias de "mudança e evolucionista da vida, o darwinismo, foi uma das matrizes básicas do pensamento de adaptação" - e a das macromutações, concebiVigotski. das estas de uma maneira muito diferente da pensada por de Vries e Morgan. Cf. Alberto Nesse caso, quando Vigotski fala de Darwin, Onna, "A origem das espécies", em: E. H. está se referindo a seu livro A o r ig e m d a s e s p é c ie s p o r m e io da s e le ç ã o n a tu r a l. No original Flichman et al., eds., L a s r a íc e s y lo s fr u to s . T e m a s de filo s o fia de I a c ie n c ia , Buenos Aires: russo, Vigotski diz literalmente "luta pela vida", como foi traduzido aqui. Darwin utilizou pouEUDEBA, 1998, p. 141-155. 1l. A evolução está constituída por dois processos cas vezes a expressão s tr u g g le fo r life em toda a sua obra; uma delas foi no título da li! edição inseparáveis: a sobrevivência e a extinção. Na opinião pública atual muitos fundamentalistas de 1859 de A o r ig e m ... Mas nesse mesmo livro Darwin começou a falar de "luta pela existênfalam da extinção como se esta fosse um procia" (cf. o título do Capo 3: s tr u g g le fo r e x is te n cesso à margem da evolução. 12. Ivan Petrovitch Pavlov (1848-1936) foi um c e ) . Atualmente, todos os biólogos usam esta última expressão. fisiologista russo e soviético, um dos mais importantes da história da ciência. Em 1904, reAqui Vigotski designa um mesmo processo com dois termos diferentes. Provavelmente sob a cebeu o Prêmio Nobel de Medicina por seus influência das discussões realizadas no movitrabalhos sobre as glândulas digestivas. Em 1903, já tinha exposto publicamente as bases mento operário da época sobre a possibilidade de sua teoria sobre a atividade nervosa supede passar de uma formação social para outra, rior, pela qual é mais conhecido, e que contimediante uma evolução gradual e sem violênnuaria desenvolvendo o resto da vida. cia ou por meio de uma revolução violenta, 13. A tradução correta do russo é diferente da traVigotski chama de e v o lu ç ã o as mudanças pedicional. U s lo v n i r e fie k s deveria ser traduzido quenas e graduais e de r e v o lu ç ã o as grandes e como "reflexo c o n d ic io n a l" e b e z u s lo v n i r e fle k s , drásticas. Naquela época, e a partir de Darwin, como "reflexo in c o n d ic io n a l" . A tradição conconsiderava-se que a evolução biológica transsolidada de falar de reflexos in /c o n d ic io n a d o s correra pela primeira via. Atualmente há um nos levou a respeitar esse uso incorreto dos consenso na comunidade científica de que, a rigor, o processo da evolução biológica é um SRQPONMLKJIHGFEDCBA termos. Ninguém diz que Fulano é um amigo 58SRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA incondicionado,cbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ~ c o n d ic io n a l, pois n ã o nenhum a c o n d iç ã o para seu comportamento amistoso. Ninguém diria tampouco que um condenado foi solto em sistema de liberdade condicionada, mas c o n d ic io n a l, isto é, que poderá conservar sua liberdade desde que c u m e x ig e pra com c e r ta s c o n d iç õ e s . 14. Este breve parágrafo tem o propósito didático de ilustrar a exposição precedente, porém Vigotski não esclarece se essa asserção é ou não correta. No Capo 4, no subtítulo 'A atividade do processo educativo e seus participantes", ele explica por que essa concepção é errônea - e também irrealizável, pois o fim explicitado não pode ser 'obtido. Obviamente, essa frase é uma variante da famosa expressão de Watson (1924): "Dêem-me uma dúzia de crianças saudáveis, bem-formadas, e meu próprio mundo específico para criá-Ias, e garanto que poderei pegar cada uma delas por acaso e treiná-Ias para que se transformem em qualquer tipo de profissional - médico, advogado, artista, comerciante e também mendigo e ladrão -, à margem de seus talentos, tendências, vocações e raças" (cf. J. Watson, E l c o n d u c tis m o , Buenos Aires: Paidós, várias edições). Essa exagerada concepção do criador do comportamentalismo sobre a possibilidade de controle total e efetivo das variáveis que intervêm no desenvolvimento de uma pessoa demonstrou estar errada. E não foi preciso contar com 12 crianças, pois bastou com os dois filhos de Watson: um deles se suicidou e o outro tornou-se psicanalista. \ SRQPONMLKJIHGFEDCBA A s P rin c ip a is L e is d a A tiv id a d e N e rv o s a S u p e rio r (C o m p o rta m e n to ) d o S e r H u m a n o .' Outra forma de inibição são as denominadas in ib iç õ e s c o n d ic io n a d a s . Se a inibição A diversidade do comportamento animal externa age muitas vezes, consecutivamente, e as formas complexas dos reflexos condicioo reflexo perde sua ação inibidora. Por exemnados só podem ser entendidas se prestarmos plo, se em cada caso há reflexo salivar à luz atenção às leis de inibição dos reflexos. Comazul com uma batida, paulatinamente esta preende-se facilmente que algumas vezes a absdeixa de inibir o reflexo, e a salivação flui de tenção de uma reação ou sua repressão podem forma totalmente normal. Quando recorremos ser condições essenciais da conduta. Geralmena um estímulo que perdeu sua força inibitória, te, abster-se de reagir pode ser tão necessário ou a um estímulo de força insuficiente, e realipara o comportamento quanto a própria ação. zamos o experimento fazendo com que a luz Suponhamos que um animal tenha se azul, agindo sozinha, seja acompanhada pela preparado para atacar, lançar-se sobre o inialimentação com carne, isto é, quando reformigo. Nesse caso, é muito importante que as çamos o reflexo condicionado com o incondireações de temor e fuga sejam reprimidas ou cionado, enquanto a luz azul acompanhada por inibidas, para não perturbar o curso normal um novo estímulo, como uma batida, não é da reação de ataque. Em certos casos, a reacompanhada por esta, depois de certo tempo pressão de um arco reflexo pode ser tão neceso golpe se transforma em inibição condicionasária biologicamente quanto sua realização. da do reflexo salivar. Depois de ter combinado Portanto, a inibição ou a repressão de certas o reflexo com a ação da luz azul, ele será inreações costuma ser condição necessária para terrompido. Isso [a inibição condicionada] dio curso correto de outras. ferencia-se da inibição externa simples porque A forma mais elementar de inibição é o surge também no processo de ação da estrutucaso da denominadacbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA in ib iç ã o e x te r n a s im p le s . ra complexa do ambiente, da mesma forma que Se, no momento da ação de um reflexo condio reflexo condicionado, e porque se forma sob cionado, o cão recebe um estímulo estranho a influência das mesmas condições. suficientemente intenso, a ação do reflexo se Além da inibição externa, também existe interrompe ou inibe. O novo estímulo desema in ib iç ã o in te r n a , que não está vinculada à penha o papel de uma espécie de freio do reação de nenhum estímulo externo, mas aos flexo. Assim, por exemplo, se o cão saliva deprocessos internos do sistema nervoso. O tipo vido a uma luz azul, mas nesse momento ouvemais simples de inibição interna é representase um golpe forte, o reflexo salivar é inibido. do pela extinção do reflexo condicionado. Da mesma maneira são inibidas ou interromQuando se estimula de forma prolongada em pidas no ser humano todas as reações diante um cão reflexo condicionado bem-elabode um disparo súbito, de um grito, etc. rado, que .não é reforçado, por um estímulo A S L E IS D E IN IB iÇ Ã O E D E D E S IN IB IÇ Ã O um 60 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA incondicionado, ele começa pouco a pouco a enfraquecer, a decrescer, como se se apagasse e extinguisse; finalmente, ele será interrompido. Podemos nos convencer de que, nesse caso, existe uma inibição do reflexo e não seu total desaparecimento. Se permitimos que o cão descanse ou repetimos .o experimento no dia seguinte, o reflexo surge novamente. A extraordinária utilidade biológica da inibição interna se evidencia quando vemos que ela protege o animal de um gasto infrutífero e inútil de energia, ajudando-o a gastáIa de forma econômica e prudente. Preserva o animal de estabelecer vínculos condicionados equívocos e causais. ,P~de-se pensar que o sonho não passa de uma forma muito evoluída dessa universal inibição interna das reações. Não é menor o significado da inibição nas reações no que se refere à diferenciação. Se um reflexo condicionado a qualquer estímulo foi criado no animal, ele reage a todos os estímulos similares. Por exemplo, se há um reflexo condicionado à batida do metrônomo com uma velocidade de 100 batidas por minuto, o animal também reage quando há 50 ou 200 batidas. No entanto, se as 100 batidas são reforçadas por meio de um estímulo incondicionado, enquanto as outros não o são, o animal aprende a diferenciar. Ele aprende a discriminar com exatidão os estímulos e reage apenas ao que foi estabelecido: todos os outros são inibidos internamente. Graças a esse mecanismo de diferenciação, é possível obter uma extraordinária especificação e precisão nos vínculos, a mais sutil discriminação dos estímulos do ambiente e a correlação de suas reações com as influências adequadas. Esse mesmo mecanismo de inibição interna é encontrado nos reflexos de traço e nos retardados. Podemos nos convencer disso da seguinte maneira. Sabe-se que as inibições possuem uma força de retorno, isto é, se são aplicadas à inibição, inibem as inibições ou desinibem os reflexos. Quando elaboramos em nossa experiência um reflexo retardado ou de traço à luz azul, o cão não saliva imediatamente depois que a luz tenha sido acesa. O reflexo fica inibido durante algum tempo. No entan- to, 'se durante esse intervalo agimos sobre o cão com um estímulo estranho com força suficiente, como uma batida, o reflexo manifesta-se de forma imediata. A batida, que em outro momento teria sido uma inibição para todo reflexo condicionado, ao ser aplicada a um reflexo inibido, inibe a inibição e desinibe o reflexo. Mediante um experimento de Pavlov podemos apreciar as formas complexas que o comportamento pode adotar, conforme a diferente combinação de inibições e reflexos. Foi elaborado em um cão o reflexo condicionado à luz [L]. Ele secreta 10 gotas de saliva. Se tocarmos uma nota musical [N] no piano enquanto esse reflexo atua, o reflexo é inibido definitivamente. Se fizermos soar o metrônomo [M], a ação do reflexo se restabelece, porém o cão secreta apenas 4 gotas. Para explicar esse fenômeno, vamos testar todas as combinações possíveis desses três estímulos: um a um, dois a dois, três a três. O mais cômodo é elaborar uma tabela com os resultados do experimento, para que os três estímulos fiquem indicados por suas iniciais, enquanto o sinal de mais denota sua ação combinada. L = 10 gotas N = O gota M = O gota L + N = O gota L + N + M = 4 gotas L + M = 6 gotas N + M = O gota A tabela mostra que a luz azul sozinha provoca 10 gotas. A nota e o metrônomo são inibidores e não provocam nenhum resultado, nem sozinhos nem combinados. A nota inibe totalmente o reflexo e o anula. O metrônomo como estímulo da mesma ordem sonora, secundária e mais fraca, só inibe parcialmente o reflexo e o reduz a 6 gotas. Os três estímulos juntos provocam 4 gotas, e esse resultado é obtido através da interação complexa dos três estímulos: a luz estimula 10 gotas, a nota inibe as 10, o metrônomo inibe a inibição e desinibe as mesmas 4 gotas que inibiu na ação conjunta com a luz. P S IC O L O G IA Por meio desse exemplo é fácil perceber que, mesmo quando temos os três elementos, ou seja, a luz, a nota e o metrônomo, o comportamento do animal pode adotar formas sumamente complexas e diversas de acordo com as combinações e a estrutura desses elementos. Podemos imaginar facilmente a colossal complexidade do comportamento do animal sob a influência de um grande número de elementos que constituem a estrutura complexa do ambiente real e que atuam durante muitos anos sobre o organismo.SRQPONMLKJIHGFEDCBA A P S IQ U E E A REAÇÃO A teoria dos reflexos condicionados permite considerar todas as formas do comportamento do ser humano como um sistema de reações adquiridas que se estruturam sobre as herdadas. Com uma análise cuidadosa, as formas mais complicadas e sutis do psiquismo evidenciam sua natureza reflexa e permitem estabelecer que a psique também deve ser considerada uma forma da conduta particularmente complexa. Antes, os psicólogos afirmavam que os fenômenos psíquicos eram algo isolado, único na natureza, que não havia nada parecido com eles e que eles se distinguiam radicalmente do mundo físico. Ao mesmo tempo, diziam que os fenômenos psíquicos não tinham existência física, que eram inacessíveis à observação, e mencionavam seu estreito vínculo com a personalidade, considerando que essa era a diferença essencial entre o psíquico e o físico. A análise científica descobriu facilmente que as formas mais sutis da psique sempre são acompanhadas de determinadas reações mataras. Se considerarmos a percepção dos objetos, logo perceberemos que nenhuma percepção ocorre sem o movimento dos órgãos apropriados. Ver implica realizar reações muito complicadas com os olhos. Inclusive o pensamento sempre é acompanhado de movimentos reprimidos, em sua maior parte, por reações internas articulatórias, isto é, pela pronúncia rudimentar e embrionária de palavras. Se pronunciarmos uma frase em voz alta ou se somente a pensarmos, no segundo caso todos P E D A G Ó G IC A 61 os movimentos são reprimidos e ficam enfraquecidos, e serão imperceptíveis para o olhar do outro. Mas, essencialmente, tanto o pensamento quanto a fala em voz alta são reações mataras iguais, só que de diferente nível e força. Isso fez o fisiologista Sechenov' - pioneiro da teoria dos reflexos psíquicos - afirmar que o pensamento é um reflexo interrompido nas primeiras duas terças partes do reflexo psíquico. É ainda mais fácil demonstrar a natureza reflexa sonora de qualquer sentimento. Como se sabe, quase todo sentimento pode ser lido no rosto ou nos movimento corporais de uma pessoa. Tanto o medo como a ira são acompanhados de modificações corporais tão notáveis que, pelo aspecto de uma pessoa, podemos inferir sem errar se ela está com medo ou com raiva. Todas essas mudanças corporais se reduzem a reações mataras dos músculos (mímica e pantomima), a reações secretoras (lágrimas, espuma na boca), a reações da respiração e da circulação (respiração ofegante, palidez). Por último, a terceira esfera da psique, a denominada "vontade", sempre está relacionada a determinados atos e, até mesmo na teoria da psicologia tradicional, sua natureza matara se evidencia. A teoria sobre os desejos e os motivos, como fonte motriz da vontade, deve ser entendida como a teoria sobre os sistemas de estímulos. Em todos esses casos temos os mesmos fenômenos, essas mesmas reações corporais, porém de formas infinitamente complexas. Por isso, a psique deve ser compreendida como uma forma particularmente complexa de estrutura do comportamento. O COM PORTAM ENTO E O COM PORTAM ENTO A N IM A L HUMANO Para a ciência natural e contemporânea, a comunidade da origem e da natureza do animal e do ser humano não constitui mais um problema. Para a ciência, o ser humano é apenas uma espécie de animal superior, que dista de ser definitiva. Do mesmo modo, também no comportamento dos animais e o dos seres 62SRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA humanos têm muitos pontos comuns e podemos dizer que o comportamento do ser humano desenvolve-se a partir das raízes do comportamento animal e, com muita freqüência, não passa do "comportamento de um animal que adotou a posição vertical". Em particular, os instintos e as emoções, isto é, as formas de conduta hereditária, são tão afins no animal e no ser humano que indicam, sem nenhuma dúvida, a fonte comum de sua origem. Alguns naturalistas não se sentem dispostos a estabelecer uma diferença essencial entre o comportamentohumano e o animal, e reduzem toda a diferença entre ambos a um diverso grau de complexidade e sutileza do sistema nervoso. Os partidários desse critério supõem que é possível explicar a conduta humana exclusivamente do ponto de vista biológico. Entretanto, é fácil observar que isso não é bem assim. Entre a conduta do animal e a humana existe uma diferença essencial. Toda a experiência do animal, todo o seu comportamento, do ponto de vista da teoria dos reflexos condicionados, pode ser reduzido a reações hereditárias e a reflexos condicionados. O comportamento do animal pode ser expresso da seguinte maneira: (1) reações hereditárias + (2) reações hereditárias x experiência individual (reflexos condicionados). O comportamento do animal está composto dessas reações hereditárias, além das reações hereditárias multiplicadas pela quantidade de novos vínculos que surgiram através da experiência individual. Mas é evidente que essa fórmula não abrange, nem sequer minimamente, o comportamento humano. Acima de tudo, no comportamento humano - em comparação com a dos animais observamos a utilização ampliada da experiência das gerações anteriores. O ser humano não aproveita apenas a experiência dessas gerações na escala estipulada e transmitida pela herança física. Todos nós utilizamos na ciência, na cultura e na vida a enorme quantidade de experiência acumulada pelas gerações anteriores, que não é transmissível mediante a herança biológica. Em outras palavras, ao contrário dos animais, no ser humano existe uma história, e essa experiência histórica, essa herança não-física, essa herança social, é o que o distingue do animal. O segundo novo fator de nossa fórmula será a experiência social coletiva, que também constitui um novo fenômeno no ser humano. Este não aproveita apenas as reações condicionadas estabelecidas em sua experiência pessoal, como geralmente ocorre com os animais, mas também os vínculos condicionados que se estabeleceram na experiência social de outras pessoas. Para estabelecer no cão o reflexo à luz, em sua experiência individual, foi preciso cruzar a ação da luz e da carne. Em compensação, o ser humano, em sua experiência cotidiana, utiliza as reações formadas na experiência alheia. Posso conhecer o Saara sem nunca ter saído de minha cidade natal ou saber muito sobre Marte sem ter visto esse planeta sequer pelo telescópio. As reações condicionadas do pensamento ou da fala em que se exprimem esses conhecimentos não sé formaram em minha experiência pessoal, mas na de pessoas que realmente estiveram na África e observaram Marte pelo telescópio. Por último, a distinção fundamental do comportamento humano com relação ao do animal são as novas formas de adaptação que só aparecem no ser humano. O animal vai se adaptando passivamente, reage às modificações do ambiente com mudanças em seus órgãos e na estrutura de seu corpo. Modifica-se para se adaptar às condições da existência. Em compensação, o ser humano adapta de forma ativa a natureza para si mesmo. Em vez de modificar os órgãos, muda os corpos da natureza, de tal modo que eles possam lhe servir de ferramentas. Não reage ao frio deixando crescer um longo pêlo defensivo, mas fazendo adaptações ativas do ambiente [a si mesmo], mediante a construção de uma casa ou a confecção de roupa, isto é, mediante a adaptação da natureza a si mesmo. Segundo a definição de um pesquisador," toda a diferença entre o ser humano e o animal se reduz ao fato de que o homem é um animal que produz ferramentas. Desde a época em que o trabalho - no sentido humano da palavra, isto é, a intervenção planejada e racional do ser humano nos processos da natureza com o objetivo de regular e controlar os processos vitais entre si mesmo e aquela - P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 63 tornou-se possível, a humanidade elevou-se a um novo nível biológico e incorporou à sua experiência algo novo, que era alheio a seus antepassados e parentes animais. É verdade que, também entre os animais, encontramos formas rudimentares de adaptação ativa: os pássaros constroem seu ninho, os castores constroem suas moradias, etc. Tudo isso se assemelha à atividade laboral do ser humano, mas ocupa um lugar tão pequeno na experiência do animal que, em conjunto, é incapaz de modificar as características da adaptação passiva. O mais importante consiste em que, apesar de toda a aparente semelhança, o trabalho do animal se distingue do trabalho humano da forma mais taxativa e categórica. Essa diferença foi destacada por Marx: duplicação da experiência constitui a terceira e última característica distintiva do comportamento humano. Portanto, toda a fórmula do comportamento do ser humano, em cuja base se encontra a fórmula do comportamento animal completado com novos elementos, adotará o seguinte aspecto: (1) reações hereditárias, mais (2) reações hereditárias multiplicadas pela experiência pessoal (reflexos condicionados), mais (3) experiência histórica, mais (4) experiência social, mais (5) experiência duplicada (consciência). Portanto, o fator decisivo do comportamento humano não é só o fator biológico, mas também o social, que confere componentes totalmente novos à conduta do ser humano. A experiência humana não é apenas o comportamento de um animal que adotou A forma como concebemos o trabalho pertena posição vertical," mas é uma função comce exclusivamente aocbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ser hum ano. Uma araplexa de toda a experiência social da humanha realiza operações que fazem lembrar as nidade e de seus diferentes grupos. de um tecedor, e uma abelha, com a construção das células de sua colméia, envergonharia mais de um pedreiro. Mas o que distingue positivamente o pior dos pedreiros da melhor abelha é que o primeiro modelou a célula em sua cabeça antes de construí-Ia na cera. [K. Marx, E l C a p ita l. C r ític a de la e c o n o m ía p o lítica ( D a s K a p ita l. K r itik d e r p o litis c h e n Õ k o n o m ie ) , t. I, vol. I, trad. e ed. de Pedro Scaron, Buenos Aires: Siglo XXI, 1975, p. 216.] AFORMAÇÃODASREAÇÓES NO COMPORTAMENTO Na verdade, o conceito de reflexo ou de reação é abstrato e convencional. Quase nunca encontramos o reflexo em sua forma pura. O que existe na realidade são grupos mais ou menos complexos de reflexos; na realidade objetiva só existem estes, e não reações isoladas. A rigor, quando a aranha tece sua teia ou A reação ou o reflexo isolado pode ser a abelha constrói suas células, estão exercitanobtido no laboratório em um experimento com do as mesmas formas passivas, instintivas e uma rã, por exemplo, mas nunca no homem. hereditárias de comportamento que as outras Neste, os reflexos estão vinculados entre si de reações passivas. O trabalho do pior tecedor modo constante e indissolúvel e, conforme o ou pedreiro representa a forma ativa de adapcaráter e a estrutura de cada grupo, também tação, porque é consciente. se modifica o caráter do reflexo que entra em Que é o caráter consciente da conduta sua composição. Portanto, o reflexo não é uma humana e qual é a natureza psíquica da consmagnitude constante, dada de uma vez por ciência [ s o z n a n ie ] ? Essa questão constitui um todas, mas uma magnitude variável; ele dedos mais difíceis problemas de toda a psicolopende do caráter geral da conduta em um degia e voltaremos a ela. Mas, de forma anteciterminado instante. pada, podemos considerar que a consciência Por esse motivo, o reflexo não é definido deve ser entendida como uma das formas mais como uma propriedade constante de um órcomplexas de organização de nosso comporgão determinado, mas como uma função do tamento, particularmente - como frisa Marx estado do organismo. como certa d u p lic a ç ã o da e x p e r iê n c ia , que perJá encontramos o caso mais simples de mite prever os resultados do trabalho e orienintervinculação dos reflexos na inibição e tar as próprias reações para esse resultado. EssaSRQPONMLKJIHGFEDCBA 64SRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA desinibição das reações, no qual vimos que os reflexos podem se enfraquecer ou se reforçar mutuamente, inibir ou estimular sua atividade recíproca. Em seus estudos, Pavlov considerou necessário trabalhar também com exemplos mais complexos, nos quais havia um conflito entre dois reflexos. Durante o processo de experimentação, desenvolvia-se em alguns cães a denominada reação de alarme com relação ao experimentador, isto é, uma impetuosa reação agressiva do cão, que se exprimia mediante latidos ameaçadores quando uma pessoa estranha entrava na sala. Es~a reação de alarme sempre interrompia a ação do reflexo salivar elaborada e interessou tanto os pesquisadores que eles a tornaram objeto de um estudo independente. Elaborou-se uma reação de alarme no cão com relação a um dos experimentadores, bem como uma reação alimentar (reflexo condicionado) à presença de outro, ante a palavra "sal[ k o lb a s k i] pronunciada por este e diante sichas"cbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA da visão do prato no qual o cão recebia as salsichas. Quando ambas as reações ocorriam de forma simultânea, isto é, quando o segundo experimentador entrava na sala durante o trabalho do primeiro, podia-se observar um quadro eloqüente de luta das duas reações. Percebeu-se que, à medida que se acrescentavam estímulos à reação alimentar, a de alarme diminuía e se extinguia paulatinamente. Quando a pessoa aparecia na sala, o cão jogava-se contra ela latindo furiosamente; no entanto, quando pronunciava a palavra convencional, os latidos diminuíam e ambas as reações pareciam se equilibrar. O cão não se lançava contra o recém-chegado, mas também não olhava para ele. Por último, quando se mostrava o prato, este provocava uma forte e evidente reação alimentar. "Os dois reflexos parecem ser os dois pratos de uma balança", observa o acadêmico Pavlov. Basta reforçar a influência em um prato para que ele se incline, ou reforçar o outro para que ele triunfe. Quando levamos em conta que todo reflexo, como diz Pavlov, é limitado e regulado não só por outro reflexo externo que age de forma simultânea, mas também por uma grande quantidade de estímulos internos, químicos, térmicos e outros, e que todos esses reflexos interagem constantemente, é fácil compreender toda a complexidade do comportamento humano. Para entender o mecanismo que torna possível a coordenação dos reflexos, temos de conhecer o princípio de luta pela via final, estabelecido pelo fisiologista inglês Sherrington." Sua idéia consiste em que a conduta racional só pode existir se houver certa regulação mútua dos diferentes reflexos; do contrário, o ser humano não seria um organismo integral com um único sistema de conduta, mas um conglomerado heterogêneo de órgãos separados, com distintos reflexos completamente desconexos. Há muito tempo os fisiologistas supunham que no sistema nervoso existiam centros especiais que inibiam e regulavam o curso dos reflexos. No entanto, pesquisas posteriores não confirmaram essa suposição e demonstraram que o mecanismo de coordenação dos reflexos e de integração dos mesmos ao comportamento integral do organismo é completamente diferente. O que acontece é que no sistema nervoso humano há uma quantidade incomensurável de fibras perceptoras (aferentes), denominadas receptores, e fibras motoras (eferentes). Os cálculos mostram que o número dos receptores é cinco vezes maior que o dos neurônios eferentes. Por isso, cada neurônio motor não está conectado apenas a outro, mas a muitos receptores, ou até mesmo a todos. A estabilidade e a força dessa conexão podem variar, mas determinou-se que [por exemplo], em caso de intoxicação com estricnina, no ser humano pode surgir um reflexo de q u a lq u e r n e r v o a q u a lq u e r m ú s c u lo . Isso indica que cada aparelho [sistema] motor está ligado a diversos grupos de receptores, talvez a todos, e assim não pode existir no organismo nenhum reflexo isolado e independente. A partir daí é possível compreender que, entre os diferentes grupos de receptores, pode-se iniciar uma luta sumamente complexa pelo campo motor geral, e o desenlace dessa luta depende de muitas condições extraordinariamente complexas. O mecanismo de luta pelo campo motor é precisamente o mecanismo de coordenação dos reflexos; ele está na base da unidade da personalidade e do importantíssimo ato da atenção; P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 65 atravessando a porta, e a luta pela porta é muito parecida a essa luta pela via final que se trava sem cessar no organismo humano, que dá ao comportamento humano o trágico e dialético caráter de luta incessante entre o mundo e o ser humano e entre os diferentes elementos do mundo dentro do ser humano. o sistema de receptores relaciona-se ao sisteA correlação de forças modifica-se a cada ma das vias eferentes como a larga boca superior de um funil com seu orifício de saída. instante nessa luta, provocando uma mudança Mas cada receptor está ligado a uma fibra em todo o quadro do comportamento. Tudo nela eferente e talvez a todas elas; a estabilidade é fluido e mutável, cada minuto nega o anteridessa conexão costuma variar. Por isso, contior, cada reação passa a ser contrária, e todo o nuando com nossa comparação com o funil, comportamento em seu conjunto faz lembrar diremos que todo ocbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA s is te m a n e r v o s o é como um embate de forças que nunca se detém. esse agulheiro orienta nossa reação pelos trilhos do comportamento e, conforme observa Sherrington, o comportamento do animal constitui uma série de sucessivas transições da via final de um grupo de receptores para outro: um funil, cujo orifício superior é cinco vezes mais largo que o outro. Nesse funil estão situados os receptores que também parecem um funil, com o orifício amplo dirigido para a extremidade de saída do funil geral, cobrindo-o completamente. Essa comparação nos permite imaginar a diversidade e multiplicidade das zonas gerais do sistema nervoso central. Verificou-se que, em caso de intoxicação com estricnina, pode-se obter um reflexo em qualquer músculo do corpo a partir de qualquer nervo aferente. Em outros termos, todo campo final está unido a todos os receptores do organismo integral. Graças a esse princípio, cria-se, a cada momento, uma unidade de ação, que serve de fundamento ao conceito de personalidade; portanto, a criação da unidade da personalidade constitui uma tarefa do sistema nervoso. A interferência dos reflexos heterogêneos e a cooperação dos homogêneos, pelo visto, serve de base para o processo psíquico fundamental da atenção. [Ch. Sherrington, A s o s ia ts ia s p in o m o z g o v i r e fle k s o v o P R IN C íP IO D O D O M IN A N T E NO COM PORTAM ENTO Nessa luta entre reações, o fator decisivo não é só o combate pela via final, mas também as mais complexas relações entre os diferentes centros no sistema nervoso. A pesquisa experimental demonstrou que, quando algum forte foco de excitação predomina no sistema nervoso, ele possui a propriedade de atrair para si outras excitações que surgem no sistema nervoso nesse momento, reforçando-se dessa maneira. Por exemplo, se uma rã, no momento do reflexo do abraço, ou seja, no período de excitação sexual elevada, recebe um estímulo externo qualquer (ácido, corrente elétrica, uma agulhada), o reflexo de abraço, em vez de enfraquecer, fica ainda mais forte. Diante de um i p r in ts ip o v o b s c h ie g o p o lia ( A a s s o c ia ç ã o d o s novo estímulo, desaparece a reação defensiva r e fle x o s e s p in o - c e r e b r a is e o p r in c íp io . da v ia habitual. Do mesmo modo, os atos de degluc o m u m ) , em: U s p ie ji s o v r e m e n o i b io lo g u i ( C o n tição e defecação dos cavalos se reforçam com q u is ta s da p s ic o lo g ia a tu a l) , Odessa, 1912.]5 estímulos externos. Uma gata isolada dos machos no período de cio reforça o reflexo básico o acadêmico Pavlov compara o funcio- com relação a estímulos alheios, como o ruído namento de nosso sistema nervoso central ao de um garfo no prato, que geralmente lhe fatrabalho de uma central telefônica, em que se zia lembrar comida. fecha [forma] um número cada vez maior de Durante os experimentos com rãs esclanovas conexões entre o ser humano e os elereceu-se que a excitação dominante no sistementos do mundo. Também seria adequado ma nervoso central pode inibir todas as outras comparar o sistema nervoso a uma porta esou desviar os reflexos, dando-lhes uma diretreita em um grande edifício ou teatro para a ção totalmente nova. Esse papel dominante de qual se precipita uma multidão de pessoas em uma excitação intensa, que submete todas as pânico. Muitas perecem e algumas se salvam SRQPONMLKJIHGFEDCBA outràs, justifica seu nome de [ e x c ita ç ã o ] d o m i- 66 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I cbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA constituição n a n te ; zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA todas as outras excitações são chamadas de s u b d o m in a n te s . Tal experimento demonstrou que, quando se provoca artificialmente o dominante sensorial em uma rã, ela reage aos mais diversos estímulos esfregando a pata intoxicada; todos os reflexos orientam-se para a zona da pele ligada ao centro do dominante sensorial. Quando se provoca com estricnina o estímulo dos centros sensoriais da pata traseira direita da rã, com a irritação de todas as patas restantes obteremos um reflexo defensivo, porém este se dirige sempre à pata traseira direita, ainda que a irritação com ácidoseja aplicada a qualquer outro setor da pele. Portanto, o dominante sensorial não interrompe os outros reflexos, mas lhes dá uma direção completamente nova. Se for provocado o dominante nos centros motores da mesma pata da rã, obtém-se um efeito totalmente diferente. Quando se irrita com ácido diferentes zonas da pele, o reflexo que faz com que ela se esfregue sempre se orienta para o lugar certo e exato da irritação, mas sempre reage primeiro a pata cujos centros motores foram previamente estimulados. Portanto, o dominante motor predetermina a escolha do órgão reagente e condena todos os outros ao atraso. O princípio do dominante, introduzido pelo professor Ujtomski," é o princípio fundamental do funcionamento do sistema nervoso, que coloca sob a influência do reflexo predominante todos os outros reflexos dos diferentes órgãos e coordena sua atividade em uma só direção. Vimos anteriormente que o comportamento do ser humano representa apenas uma das muitas possibilidades realizadas. Agora podemos definir o comportamento como o dominante que triunfou, servido pelos reflexos subdominantes. Este princípio explica de onde provêm a integridade e a unidade da conduta humana. A C O N S T IT U iÇ Ã O RELAÇÃO DO SER HUMANO EM AO SEU COM PORTAM ENTO A constituição do organismo humano com as leis hereditárias de seu comportamento é o primeiro fator biológico de nossa conduta. Na do ser humano, do ponto de vista de seu comportamento, devemos diferenciar, com relação aos três componentes da reação: (1) um aparelho [sistema] receptor, (2) um aparelho central [elaborador ou processador] e (3) um aparelho de resposta. Funciona como aparelho receptor no organismo humano (campo exteroceptor) todo o sistema de órgãos especiais dos sentidos: olhos, ouvidos, boca, nariz, pele, isto é, aparelhos especialmente destinados a perceber os estímulos externos, a analisá-los e a transmitilos para os centros. Esses aparelhos possuem nervos centrípetos, cuja missão é transmitir as excitações ao centro. Esses nervos finalizam em aparelhos terminais peculiares no cérebro, que possuem uma função de análise. A totalidade desse aparelho, que começa no órgão periférico e finaliza -se no aparelho terminal do nervo sensitivo, foi denominada acertadamente pelo acadêmico Pavlov de a n a lis a d o r , pois na verdade não tem outra tarefa senão analisar, decompor o mundo nos elementos mais sutis e menores, e ajustar as reações do ser humano às mudanças do ambiente. Essa função analisadora, que permite que o organismo estabeleça as mais complexas e sutis relações com o mundo, constitui uma das principais funções do córtex cerebral. As leis fundamentais de sua atividade são a irradiação e a concentração da excitação nervosa. Inicialmente, durante a elaboração do reflexo condicionado, o organismo também reage a qualquer estímulo similar. A excitação se difunde, estende-se para as zonas contíguas, ir r a d ia - s e . Paulatinamente, ocorre a c o n c e n tr a ç ã o da excitação, isto é, sua convergência em um setor cada vez mais limitado e estreito, sua restrição a uma só zona. Enquanto a irradiação nos permite compreender de que maneira reagimos com um mesmo movimento a estímulos similares e nos permite generalizar nossa experiência, a concentração esclarece de que modo a especializamos e detalhamos, como se a conduzíssemos com total exatidão rumo a determinados estímulos. Essa mesma estrutura está presente no aparelho receptor interno, ou campo interoceptor, adaptado para perceber as excitações internas; ele está localizado nos tegumentos in- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 67 A segunda tese é que o campo propriocepternos, que forram por dentro as partes intertivo só pode ser estimulado de forma secundánas de nossos órgãos. Também está adaptado ria pelas influências que chegam de fora, ou para perceber excitações internas de tipo quíseja, através de sua própria reação. Em outros mico, térmico, etc., procedentes das superfícies termos, é possível haver uma reação circular internas do corpo. [krugovoi],7 que devolve ao organismo [inforEnquanto o primeiro aparelho nos permação sobre] sua própria reação e consiste de mite perceber o mundo externo, o aparelho seis momentos, ao contrário da habitual reainterno está adaptado para perceber os proção tríplice: (a) excitação [estimulação] extercessos orgânicos mais importantes que transna, (b) elaboração [processamento] central, (c) correm dentro do organismo - no estômago, reação, (d) excitação proprioceptiva, (e) elano intestino, no coração, nos vasos sangüíneos boração [central] da excitação proprioceptiva e em outros órgãos relacionados às funções e (f) reforço ou detenção [enfraquecimento] internas fundamentais. Por último, o terceiroaparelho está comda primeira reação. Portanto, como cada reaposto pelo campo proprioceptivo, que percebe ção informa sobre si mesma, o organismo tem as reações próprias do organismo, graças às a possibilidade de regular e orientar o curso das reações. excitações periféricas que surgem nos músculos, nas articulações, nos tendões, etc. A terceira tese é de que os reflexos do O organismo pode conhecer suas próprias campo proprioceptivo podem estabelecer as reações mediante os dois primeiros aparelhos, mesmas relações com os outros reflexos, como sempre que o resultado de sua reação o influocorre com os demais. Eles podem exercer soencie, através do campo extero ou interoceptor. bre estes a mesma ação enfraquecedora e reforçadora, desviá-los e orientá-los. Por exemplo, o reflexo salivar atua através do aparelho perceptivo como qualquer estímulo Na constituição do ser humano, o apareexterno, mas também pode atuar através do lho de elaboração [processamento] está forcampo receptivo interno se ocorrerem determado pelas partes centrais do sistema nervominadas mudanças nos órgãos internos. Nesso, isto é, a medula espinhal e o cérebro. A se caso, a reação é percebida de forma análomedula espinhal representa, no aspecto genético [histórico, filo genético ], um produto de ga a partir do mundo externo e dos processos orgânicos próprios [internos]. origem mais precoce e, por isso, as funções mais primitivas e inferiores estão vinculadas a Mas também existe um aparelho especial, ela. Em particular, na medula espinhal e nos similar aos dois primeiros em sua estrutura, que alimenta todos os órgãos efetores do corcentros subcorticais estão localizados todos os po e cuja única função é a percepção das moreflexos hereditários e situados todos os centros motores. O córtex cerebral é uma espécie dificações periféricas que acompanham a reade supra-estrutura" do sistema nervoso central ção. Se as mãos e os dedos de um homem com e, na verdade, não possui uma conexão indeos olhos fechados forem colocadas de certa pendente com a periferia do corpo, à margem maneira, ele sempre pode se dar conta da podos centros subcorticais. Podemos cornpará-lo sição de ambos graças às sensações motoras a um assento e recipiente de todos os reflexos internas ou cinestésicas do campo propriocondicionados. ceptivo. Na medula espinhal localizam-se a expePara compreender tudo o que está relacionado à psique, é sumamente importante perriência hereditária e as reações hereditárias, ceber e lembrar três teses. A primeira é que o isto é, os nexos que se formam na experiência [biológica] da espécie; por outro lado, o córtex campo proprioceptivo está estruturado da cerebral é o órgão da experiência pessoal do mesma forma que os demais campos. Em ouindivíduo, o campo das reações condicionadas." tras palavras, o ser humano conhece seus próComo não possui funções motoras, ele realiza prios movimentos devido ao mesmo mecanisapenas funções de detenção e de aumento de mo graças ao qual percebe o mundo externo.SRQPONMLKJIHGFEDCBA 68SRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA complexidade, abrindo novos caminhos e estabelecendo novos nexos condicionados. Com relação a isso, [o córtex cerebral] está estreitamente vinculado a todo o aparelho receptor, representando a mais sutil projeção de todo esse aparelho, que chega a se excitar quando são excitados os pontos correspondentes na periferia do corpo. Essa primeira função é chamada de analisadora, pois tem a tarefa de dividir o mundo, da maneira mais sutil possível, em seus elementos componentes para que seja possível estabelecer os nexos mais finos entre o organismo e o ambiente. A outra função - não" menos importante - desse aparelho [sistema] consiste na atividade sintética ou de fechamento do córtex cerebral, que reside em estabelecer e "fechar" [formar] novos nexos sob a forma de reflexos condicionados. Com essas duas atividades se esgota de forma considerável o funcionamento do aparelho elaborador. De acordo com Pavlov, pode-se comparar [tal aparelho] com uma central telefônica em que, de forma ágil e flexível, ocorre o "fechamento" e a "abertura" temporal instantânea de todos os novos nexos possíveis; por isso, ele representa a riqueza inesgotável e a diversidade de formas de comportamento; a infinita e inesgotável variedade de todas as combinações possíveis de um imenso número de elementos diferentes. Graças a isso, a conduta humana não acaba sempre em determinadas formas estereotipadas, mas apresenta uma quantidade totalmente imprevisível de possibilidades, que não podem ser calculadas de antemão. Nesse aparelho elaborador também ocorre a mesma luta pela via final que, como já vimos, é o regulador fundamental de todo o comportamento. Aqui se produz a fusão das excitações em um só sistema geral de comportamento. Portanto, a função de coordenação dos reflexos no sistema do comportamento também reside aqui. O próprio fechamento [formação] do reflexo condicionado depende diretamente de todos esses processos. É curioso observar que esse fechamento constitui um caso particular do processo do dominante. A rigor, se examinarmos com atenção o mecanismo do reflexo condicionado, perceberemos facilmente que este representa o conflito entre duas excitações, como a carne e a luz no exemplo mencionado. Ao mesmo tempo, não podemos esquecer que as excitações condicionadas, tanto a luz como o som, também provocam sua reação; por exemplo, a reação de orientação-pesquisa dos olhos e da cabeça, o reflexo das pupilas, etc. Cabe perguntar por que o reflexo condicionado à carne forma-se com a luz e não o contrário, isto é, por que, como resultado da ação conjunta da carne e da luz, o cão começa a salivar ante a luz e não produz o reflexo de olhos e pupilas ante a carne. É evidente que aqui existe um conflito entre dois reflexos. Nesse caso, o mais forte é o alimentar e salivar, que possui a capacidade da [excitação] dominante: atrair para si e adiar a excitação mais fraca. Ainda nos resta examinar o aparelho de resposta na constituição do ser humano. Esse aparelho representa os sistemas de todos os órgãos, dos músculos e dos tendões para as reações motoras, do coração e dos vasos sangüíneos para as reações somáticas e das glândulas de secreção interna e externa para as reações secretoras. Tudo isso, considerado de forma global, é o aparelho [sistema] efetor, o executor de trabalho do organismo. Com relação a cada parte desse aparelho refletor cabe dizer o mesmo que foi dito com relação a cada músculo. Assim como cada um dos músculos está ligado a todo um grupo de receptores, qualquer grupo de células perceptoras pode tomar cada um dos efectores dos órgãos motores, circulatórios ou secretores. Em outros termos, cada órgão pode reagir a qualquer excitação e representa, assim como os músculos, conforme uma expressão de Sherrington, "um cheque ao portador" [Ch. Sherrington, ibid., p. 23.) Durante o estudo desse aparelho, iremos nos deter particularmente na atividade das glândulas de secreção interna do organismo do ser humano e dos animais. Há muito se descobriu que existem corpos glandulares peculiares que, por sua construção, são muito parecidos com as glândulas comuns, como a salivar e outras; eles se distinguem destas pelo fato de não possuir um conduto excretor externo, fato que, até recentemente, impedia o estudo de sua secreção. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 69 Durante muito tempo, a missão dessas mação dos ossos. Assim, o aumento [da secreção] da hipófise provoca gigantismo, isto é, um glândulas continuou sendo enigmática e increscimento anormalmente grande e o desencompreensível, e só nas últimas décadas o savolvimento excessivo de algum órgão. Por ouber científico começou a se aproximar da elutro lado, a extirpação da hipófise geralmente cidação dessa questão tão complexa na constiestá ligada ao nanismo. tuição do ser humano. Graças à pesquisa de Além disso, descobriu-se que a castração, casos patológicos, em que a falta ou a hiperou seja, a extirpação das glândulas sexuais, matrofia de alguma glândula tinha provocado determinadas modificações ou declinação de nifesta-se imediatamente em toda a estrutura funções; graças ao estudo da ação medicinal do corpo. Nos homens, a voz se torna mais de alguns preparados dessas glândulas, que aguda e se assemelha à voz feminina, a barba desaparece e todo o corpo começa a adotar restabeleceram essas funções; e, por último, uma aparência feminina. No último período, graças à extirpação experimental ou ao enxerto dessas glândulas no ser' humano e nos anicomo resultado dos experimentos de Steinach,'? Voronoff," Zavadovski" e outros, foi mais, foi possível determinar que elas vertem possível estabelecer experimentalmente dois sua secreção diretamente no sangue e, por isso, decidiu-se chamá-Ias de sangüíneas, endófatos notáveis relacionados à secreção interna. O primeiro é a dependência de todo o cacrinas ou incretoras, ou glândulas de secreção interna. ráter sexual do corpo humano da secreção interna das glândulas sexuais. Nos experimenExistem também glândulas que têm dutos, um galo castrado recebeu um enxerto de pla função, possuindo simultaneamente secreção interna e externa. Entre elas figuram, por glândula sexual de galinha - ou o contrário -, exemplo, as glândulas sexuais e o pâncreas. obtendo-se por via experimental uma mudanAinda não se pôde estabelecer em que consisça de sexo. Esse galo foi perdendo todas as suas te a secreção dessas glândulas, e os produtos características sexuais (secundárias): a voz, a de sua secreção são chamados convencionalcrista, a cauda, os esporões e o próprio carámente de hormônios (da palavra grega ópudco ter, e ficou muito parecido com uma galinha. [ormao], que significa "eu estimulo"). O processo inverso também foi realizado, e Sua denominação demonstra que a secreuma galinha foi transformada em galo. Dessa ção interna é sumamente importante para a maneira foi possível estabelecer a dependênatividade de todo o organismo. Determinoucia direta absoluta entre toda a estrutura do se que as pessoas que nascem com glândulas corpo do animal e seu caráter, por um lado, e tireóides deficientes e são completamente nora secreção interna das glândulas sexuais, pelo mais em todos os outros aspectos, padecem de outro; verificou-se então que tudo o que denocretinismo congênito; mas, quando se enxerta minamos masculino e feminino, tanto na esa glândula tireóide nessas pessoas, sua saúde trutura corporal quanto no caráter e no psiquismo, está condicionado pela secreção se restabelece. O mesmo sucede com os animais cuja tireóide é extirpada imediatamente interna das glândulas sexuais." após seu nascimento; no entanto, se forem aliO segundo fato, não menos notável e rementados com glândula tireóide alheia, a dolacionado ao primeiro, foi a demonstração da ença cede paulatinamente. No entanto, um dedependência direta que existe entre a secresenvolvimento desmedido da tiróide, enconção das glândulas sexuais e todas as variadas trado em certos tipos de doenças, provoca um modificações do organismo e do espírito, que metabolismo sumamente acelerado e leva a chamamos de velhice. Há muito tempo se observava que a idade e o sexo do ser humano uma combustão rápida e ao esgotamento do passam por uma espécie de ondas paralelas em organismo. A extirpação das paratireóides provoca o surgimento de convulsões mortais. A seu desenvolvimento, mas só ultimamente foi possível demonstrar que a velhice é resultado anormalidade de outra glândula, [que é uma espécie de] apêndice do cérebro, a hipófise, da interrupção do ingresso dos hormônios seinfluencia o crescimento, a magnitude e a for-SRQPONMLKJIHGFEDCBA xuais no sangue. Nas célebres experiências de 70 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Steinach, enxertou-se glândula sexual de um animal jovem em um animal velho e decrépito e, quando a glândula começava a verter sua secreção no sangue, verificava-se um rápido e evidente efeito de rejuvenescimento. O animal recuperava forças, a decrepitude desaparecia, seu pêlo começava a crescer, seus olhos apagados começavam a brilhar e ele começava a viver uma "segunda juventude". Foram obtidos efeitos exatamente iguais de rejuvenescimento no ser humano, mas nesse caso a operação consistia em regular o funcionamento da glândula sexual no sentido de aumentar sua secreção interna. Essa revisão nos permite constatar que fenômenos como o crescimento e a estrutura do corpo, o tamanho e a forma dos órgãos, as peculiaridades sexuais do corpo e da psique, a idiotice e o grau de consciência, todas as particularidades evolutivas do ser humano, que se manifestam tanto nos aspectos corporais quanto nos espirituais, dependem da secreção interna. A natureza e essência dessa dependência não foram definitivamente elucidadas até agora, mas com o estado atual dos conhecimentos científicos podemos considerar indiscutível que a química do sangue desempenha um papel decisivo. Graças à secreção de hormônios ocorre a mudança do estado químico do sangue, e isso modifica de forma substancial todos os processos do organismo, inclusive os nervosos. Portanto, todos os processos vitais do organismo dependem diretamente da composição química do sangue, e as glândulas de secreção interna são, fundamentalmente, as reguladoras dessa química. Isso pode ser esclarecido de forma muito simples e convincente. Todos conhecem a maravilhosa influência que as drogas exercem sobre o organismo: uma pequena dose de álcool é suficiente para modificar completamente a consciência, o pulso, a respiração, a percepção do mundo, o estado de ânimo, os sentimentos e a vontade. Por esse motivo as drogas têm sido bastante utilizadas, em todas as épocas, para provocar artificialmente algumas mudanças no corpo [e na psique]. A morfina e o ópio, a cocaína e o éter, em diferentes formas, mudam nossa consciência e, ainda que exerçam uma ação destrutiva sobre o orga- nismo, \~vam o ser humano a um mundo tão mágico fantástico, possuem uma capacidade tão fa losa de modificar nossos sentimentos, estado anímico e percepções, toda a nossa experiência terrena, que, por isso, elas têm sido a fonte inspiradora de fabulações em todo o mundo." Mas o que ocorre em todos esses casos de intoxicação do organismo com uma droga? Como é fácil perceber, ocorre apenas uma coisa: algumas novas substâncias tóxicas se introduzem no sangue, modificando primeiro sua composição química e, depois, também, o caráter de todos os processos - em primeiro lugar os nervosos - dos quais nosso comportamento depende. Algo semelhante sucede com as glândulas de secreção interna; ao agir sobre a composição química do sangue, elas também regulam o curso dos processos nervosos e contribuem para produzir modificações essenciais em nossa psique. O ser humano possui no sistema de secreção uma espécie de drogaria permanente, que estimula e intoxica o organismo com hormônios de diversos tipos. Ao mesmo tempo, as glândulas de secreção interna não constituem algo disperso, nem são independentes umas das outras. Pelo contrário, estão unidas em um sistema harmônico cuja presença se estabeleceu sem sombra de dúvida, embora até agora não tenha sido elucidado exaustivamente. Não há dúvida de que as glândulas influenciam umas às outras através do sangue, que dispersa os hormônios por todo o corpo e, por isso, é o melhor mensageiro no organismo. Os hormônios de uma glândula excitam ou inibem outra glândula e, depois de uma luta prolongada e complexa, vai se estabelecendo no organismo um sistema peculiar de equilíbrio e interação da secreção interna, de acordo com a presença dos diferentes hormônios. Ao mesmo tempo, o sistema hormonal ou de secreção depende intimamente e está ligado aos outros sistemas unificados do organismo, isto é, o circulatório e o nervoso. O nexo com o circulatório é perfeitamente evidente, pois constitui o meio que distribui os hormônios por todo o corpo, influenciando até os pontos mais afastados do mesmo. Em outras palavras, o sistema hormonal exerce sua influência através do sistema circulatório, ~ assim retornamos P S IC O L O G IA ao antigo critério sobre o sangue como sendo o autêntico assentamento da alma e da vida. Na Antigüidade, o ser humano acreditava que o sangue era a alma, e a ciência atual começa a pensar que os processos químicos do sangue determinam nossa conduta. É oportuno destacar aqui outro vínculo existente entre o sistema hormonal e o nervoso. Diz Weil: o sistema nervoso domina tanto os outros órgãos do corpo quanto as glândulas endócrinas; por outro lado, os hormônios podem provocar influência tanto nas terminações periféricas dos nervos quanto rios centros nervosos." P E D A G Ó G IC A 71 totalmente correta a observação de um cientista norte-americano: o ser humano não pensa apenas com cJ cérebro, mas mediante a atividade coordenada e rigorosamente determinada pelo conteúdo de seu crânio, combinada com todas as glândulas de secreção interna. Finalmente, a última conseqüência derivada da teoria da secreção interna consiste em uma conclusão sumamente instrutiva para os psicólogos: o físico e o psíquico, a matéria e o espírito, a estrutura do corpo e o caráter são processos intimamente entrelaçados, e não se justifica sua separação. Pelo contrário, transforma-se em premissa básica da psicologia a hipótese sobre a unidade de todos os processos que transcorrem no organismo, sobre a unidade entre o psíquico e o corporal e sobre a falsidade e a impossibilidade de delimitá-los. A teoria sobre a secreção interna destaca justamente um dos mecanismos psicofísicos que realiza essa unidade. Enquanto o sistema secretor constitui uma parte do aparelho de resposta de nossa conduta, que depende do mesmo, é evidente que outras funções do organismo, como o crescimento, a atividade sexual, a forma e a dimensão das partes do corpo, dependem do sistema nervoso, isto é, da psique; por outro lado, a psique depende da atividade de secreção interna. A unidade entre psíquico e físico não aparece tão claramente em nenhum outro lugar quanto na teoria sobre a secreção interna. Essas glândulas também são capazes de transmitir uma excitação ao centro e receber deste impulsos efectores, como qualquer músculo. Nesse sentido, elas fazem parte do aparelho de resposta do sistema nervoso, pois estão sujeitas a todas as leis da formação e reforço dos reflexos condicionados. Os experimentos têm mostrado que, se uma ação transcorre em resposta a uma irritação química interna, o reflexo condicionado pode se fechar [formar] a partir desta. Por exemplo, quando colocamos um rato em uma caixa de vidro dividida em três partes, estando o rato e o alimento em partes extremas, a corrida do rato em busca da comida é condicionada pelo chamado "sangue faminto", isto é, pela mudança de sua composição química. Se o experimento for combinado com o som de uma campainha, como resultado de uma série de repetições, o rato aprende a correr só quando ouve a campainha, ainda que não exista o estímulo do "sangue faminto?', porNOTAS que ele comeu minutos antes. Verifica-se assim que o excitante químico interno também 1. Sylvia Scribner e Michael Cole acertaram quannão está isolado do mundo externo, mas foi do afirmaram que o aparecimento de três liincorporado como parte do funcionamento vros, por volta de 1860, assentaram as bases geral do sistema nervoso. A o r ig e m para um estudo científico da psique:cbaZYXWVUTSRQPONM Embora o sistema nervoso influencie o d a s e s p é c ie s , de Darwin, E le m e n to s de psicofisica, horrnonal, não é menos evidente a influência de Fechner, e Os r e fle x o s do c é r e b r o , de inversa dos hormônios sobre o cérebro. Já desSechenov. Ivan Michailovitch Sechenov (1829tacamos como são importantes as modificações 1905) foi um fisiologista russo que afirmou que, que ocorrem no sistema nervoso e na conduta na base dos processos psíquicos, existem proquando ocorre o desaparecimento de uma glâncessos fisiológicos que podem ser estudados com métodos científicos objetivos. Segundo ele, dula. O cérebro influencia o sistema hormonal todos os atos da vida são reflexos. Devido à e, através deste, é influenciado. Por isso, estáSRQPONMLKJIHGFEDCBA 72SRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 2. 3. 4. 5. sões desse texto, que também faz parte da censura czarista, sua teoria foi publicada na m a g n u m o p u s de Sherrington: T h e I n te g r a tiv e M e d itforma de artigos, na revista quinzenalcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA s in s k i V e s n ik [ N o tic iá r io de M e d ic in a ] , nl! 47 e A c tio n o f th e N e r v o u s S y s te m , Nova York: Scribner, 1906, Lição [Cap.] IV. Silverman su40. Em 1866, finalmente pôde ser publicado o primiu totalmente tal citação na edição nortelivro R e fle k s i g o lo v n o g o m o z g a [ O s r e fle x o s do americana (cf. L. S. Vygotsky, E d u c a tio n a l c é r e b r o ] , com uma advertência da censura, que P s y c h o lo g y , Boca Ratón: St. Lucie Press, 1997, praticamente o excomungava. Posteriormenp.35). te, Sechenov descobriu outros importantes fe6. O príncipe Aleksei Alekseievtich Ujtomski nômenos da atividade nervosa superior: os pro(1884-1942) foi um fisiologista russo e soviécessos bioelétricos cerebrais, a importância da tico que, contemporaneamente a Nikolai inibição, etc. Aleksandrovitch Bersnshtein - colega de Vigotski refere-se a Benjamin Franklin (1706Vigotski no Instituto de Psicologia, trabalhou 1790), político fundador dos Estados Unidos, fu n c io n a is . r. M. na teoria dos s is te m a s físico e inventor - devemos a ele o pára-raios e as lentes bifocais. Certamente, Vigotski refereSechenov e N. E. Vvedienski - os sucessivos diretores do Departamento de Fisiologia da se a Franklin v ia Marx, que cita a expressão de Universidade de Petrogrado - treinaram e proFranklin que define o ser humano como um to o l- m a k in g a n im a l no volume I de O c a p ita l. moveram Ujtomski. Quando Vvedienski morEntretanto, ainda que a fabricação de ferrareu, em 1922, Ujtomski herdou seu posto. Admentas desempenhe um papel essencial no ser mirador de Sherrington, Ujtomski sempre foi humano, os animais também fabricam e usam abertamente religioso e, em suas aulas de ferramentas. A rigor, a verdadeira diferença enneurofisiologia, falava de Deus e da alma. Foi tre animais e seres humanos é que estes são os o criador da categoria de [ e x c ita ç ã o ] d o m in a n te , palavra e noção que reconhecia publicamende s e g u n d o únicos que fabricam fe r r a m e n ta s g r a u , como Jrustov estabeleceu (cf. H. F. te que tinha tomado do filósofo alemão Jrustov, "Formation and Highest Frontier of the Avenarius, cujo idealismo filosófico Lênin criImplemental Activity of Anthropoids", em: V I I ticara duramente. Apesar de tudo isso, I n te r n a tio n a l C o n g r e s s o f A n th r o p o lo g ic a l and Ujtomski gozou de admiração e reconhecimenE th n o lo g ic a l S c ie n c e , Atas, Moscou, 1964). Uma to durante a etapa mais repressiva do stalinisferamenta de segundo grau é a utilizada para mo e até sua morte. Vigotski se referiu à categoria de dominante em diversos textos, como fabricar o u tr a ferramenta - a de p r im e ir o g r a u . Por exemplo, um chimpanzé toma um galho, A p s ic o lo g ia da a r te , escrito na mesma época arranca suas folhas e o introduz em um forque o presente livro. Cf. A. A. Ujtomski, "O domigueiro para caçar formigas; ele fabricou minante como princípio da função do sistema uma ferramenta de primeiro grau. No entannervoso central", R u s k i F is io lo g u ic h ie s k i Y u r n a l [ R e v is ta de F is io lo g ia R u s s a ] , n- 6, p. 1-13, 1923; to, os macacos nunca poderão afiar uma pedra para descascar o galho com ela. Esse limie A. A. Ujtomski, "Dorninanta i Integralni te na capacidade de abstração existe em toObraz", V r a c h e b n a ia G a z ie ta [ G a z e ta M é d ic a ] , nl! 2, 1924; esses dois artigos são citados por dos os animais. Vigotski no vol. I de suas O b r a s ... op. cito Em "O significado histórico da crise ... '', op. cit., 7. Vigotski e seus contemporâneos referiam-se para referir-se a essa noção biológica do ser ao sistema d e fe e d b a c k . Ele diz que uma "reahumano, Vigotski utiliza a expressão usada por ção circular" está composta por a, b e c, e tamPlatão em suas D e fin iç õ e s : b íp e d e s e m p e n a s . [Sir] Charles Scott Scherrington (1857-1952) bém por d, e e f, incluindo assim a r e tr o a lifoi um dos mais importantes fisiologistas inEsse conceito será mantido no m e n ta ç ã o . Vigotski maduro (cf. o verbete "reação circugleses. Ele criou as bases para uma compreenlar"em: B. E. Varshava e L. S. Vigotski, P s ijo lo são integradora do sistema nervoso. Em 1932, recebeu o Prêmio Nobel de Medicina. g u ic h ie s k i S lo v a r [ D ic io n á r io de P s ic o lo g ia ] , Em sua citação, Vigotski não oferece nenhum Moscou: GIZ, 1931, p. 94). A noção de "readado sobre a referência. Usa a versão russa do ção circular" provém do psicólogo norte-ametrabalho de Ch. Sherrington, "The correlation ricano J. M. Baldwin (1861-1934), que estuof spinal-brain reflexes and the principle of the dou com Wundt. Baldwin foi um importante common path", de 1904. Existem várias verreferencial na obra de Vigotski. P S IC O L O G IA 8. No léxico de Vigotski é evidente a presença de numerosas palavras como essa, próprias do léxico de Marx; muitas delas foram criadas pelo próprio Marx. 9. Essa frase é imprecisa e está incompleta. A medula herda funções biológicas mais primitivas que o córtex cerebral, que não passam de meros reflexos elementares. Nos organismos que possuem cérebro, os instintos e qualquer programa incondicionado de conduta terão sua fase biológica no córtex cerebral e/ou nos núcleos cinzentos subcorticais. Naturalmente, o córtexcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ta m b é m é o suporte biológico dos programas aprendidos de comportamento. Nos organismos sem cérebr6 sua base se encontra nas zonas mais novas do sistema nervoso, as governantes, que surgiram no processo filogenético de telencefalização. 10. Eugen Steinach (1861-1944) foi um fisiologista austríaco que estudou a possibilidade de mudança de sexo em mamíferos mediante a extirpação e o transplante das glândulas sexuais. Ele também pesquisou os processos de rejuvenescimento no ser humano.SRQPONMLKJIHGFEDCBA 1 1 . Serge Voronoff (1966-1951) foi um médico russo é m ig r é . Diretor do Laboratório de Cirurgia Experimental do College de France, tornouse conhecido por seus estudos sobre o rejuvenescimento do ser humano mediante enxertos de glândulas de macaco. 12. Boris Michailovitch Zavadovski (1985-1951) foi um biólogo soviético que trabalhou com a metodologia da biologia e com a fisiologia do sistema endócrino. 13. Atualmente, essas afirmações só podem ser consideradas válidas para os animais, não para os seres humanos. Segundo as atuais pesqui- P E D A G Ó G IC A 73 sas, a ação hormonal determina aspectos da constituição corporal, porém n ã o in flu e n c ia o caráter ou a psique humana no tocante à id e n tid a d e s e x u a l (cf. a nota n 8 do Capo 16). 14. Quando Vigotski diz que os estados alterados de consciência originaram "fabulações", em geral ele se refere aos acontecimentos de caráter sobrenatural das mitologias religiosas. O uso de substâncias alucinógenas era muito difundido nos primeiros rituais religiosos - o Oriente próximo e o México são um exemplo disso. As alucinações eram interpretadas como fenômenos sobrenaturais, alheios à "nossa experiência terrena", como diz Vigotski. Nas mitologias religiosas, esses fenômenos são descritos com as mesmas características das alucinações visuais ou cinestésicas - causadas por essas substâncias psicodislépticas - e não tanto das auditivas. De acordo com John Allegro, o especialista em assuntos bíblicos que integrou a comissão internacional de tradução dos escritos do Mar Morto, muitas descrições de episódios bíblicos coincidem com os efeitos alucinógenos do "cogumelo sagrado" A m a n ita m u s c a r ia , cujo uso nos rituais religiosos das primeiras seitas judaicas e cristãs é evidente mediante uma análise filológica (cf. J. M. Allegro, D r o g a , m ito y c r is tia n is m o [ T h e e n d o f a r o a d ] , trad. de A. Llanos, Buenos Aires: Rescate, 1985.) 15. Vigotski refere-se ao livro do pesquisador alemão Arthur Weil, D ie in n e r e S e k r e tio n : e in e E in fü h r u n g fü r S tu d ie r e n d e u n d A r z te [A secreção interna: uma introdução para estudantes e médicos], Berlim: Springer, 1921. Na edição norte-americana do presente livro, o sobrenome do pesquisador foi grafado erroneamente "Weyl". Q Os Fatores Biológico e Social da Educação VUTSRQPONMLKJIHGFE D e tu d o o que fo i d ito a n te s , e x tra ir c o n c lu s õ e s p s ic o ló g ic a s s u m a m e n te p o rta n te s c o m re la ç ã o d o p ro c e sso ta m e n to rid a d e s a o c a rá te r e d u c a tiv o . hum ano d e s e n v o lv im e n to . V im o s q u e o c o m p o r- e s o c ia is d e s e u d a s re a ç õ e s o o rg a n is m o não que q u a n to n o a n tig o e n a in s titu iç ã o g in á s io , p a ra s a ir e P o r is s o , a m in a d o te m p o , p e la e s tru tu ra o rg a n is m o é e v id e n te c re sc e que é to ta lm e n te d o a m b ie n te esse d e te r- no qual o e s e d e s e n v o lv e . P or esse m o tiv o , to d a e d u c a ç ã o te m in e v ita v e lm e n te c a rá te r novas re a ç õ e s p ria e x p e riê n c ia . v ín c u lo q u e o c o rre u em sua s o a l. P o r is s o , a e x p e riê n c ia cando tra n s fo rm a -s e b a lh o p e d a g ó g ic o . capaz de n o o rg a n is m o P a ra o o rg a n is m o , é a p ró só é re a l o d o a lu n o d e v is ta a o u tre m [d ire - N ã o é p o s s ív e l e x e rc e r u m a in flu ê n - c ia d ire ta e p ro d u z ir m udanças em n is m o a lh e io , s ó é p o s s ív e l e d u c a r is to é , m o d ific a r a s re a ç õ e s in a ta s um o rg a - a si m esm o, a tra v é s da " N o s s o s m o v im e n to s s o r e s ." E m ú ltim a são in s tâ n c ia , a c ria n ç a E m s e u o rg a n is m o , lu g a r, tra n s c o rre a lu ta nossos p ro fe seduca a e n ã o e m o u tro d e c is iv a e n tre a s d ife - q u e se m p re o p ro c e sso à p e rc e p ç ã o d e liç õ e s e p re s c riç õ e s d a to rp e z a b a s e d o p ro c e s s o e d u c a tiv o pas- d o p ro - p s ic o ló g ic a . N a d e v e e s ta r a a tiv i- d a d e p e s s o a l d o a lu n o , e to d a a a rte d o e d u c a d o r d e v e s e re s trin g ir a tiv id a d e . a o rie n ta r N o p ro c e sso e re g u la r e s s a de educação, s o r d e v e s e r c o m o o s trilh o s ç a m liv re e in d e p e n d e n te m e n te d e le s m o v im e n to . so m b ra gundo apenas o s v a g õ e s, re - d ire ç ã o A e s c o la c ie n tífic a d e d ú v id a , a e x p re ssã o N a base deve a um a do p ró p rio é , s e m q u a lq u e r " e s c o la de ação", se- de L ay. da ação e s ta r o p ro fe s- p e lo s q u a is a v a n - e d u c a tiv a s u a c o n d u ta por a lu n o s em ç ã o c o m s e u s trê s c o m p o n e n te s : fo i s o c ia l, p o r e x c ita ç ã o [e s tím u lo ], e la b o ra ç ã o to d o s o s p a ís e s e é p o c a s s e m p re s is te m a e s - re d u z iu e a p re n d iz a g e m ao a si m esm o. a educação s e n tid o , deve ser que não se eduque m u ito s N esse a e x p e riê n c ia A educação re n te s in flu ê n c ia s q u e d e fin e m anos. o m a is e x ig e q u e s e re c o n h e - e d u c a tiv o , é tu d o . fe s s o r, é o c ú m u lo cebendo e x p e riê n c ia . pes- n a d a . P e lo c o n trá - P o r e s s e m o tiv o , o tra d ic io n a l c o la r e u ro p e u , bem c o m o a fa ls a re g ra d e q u e o d e ta l m o d o s iv a p e lo a lu n o A rig o r, d o p o n to a lu n o , c ie n tífic o , a lu n o , m a s q u e e s te s e e d u q u e edu- do do e x p e riê n c ia d e v is ta ç a q u e , n o p ro c e sso pessoal b a s e d o tra - o s p ro fe sso re s s o c ia l e s c o la r q u e por sua rio , o c rité rio p s ic o ló g ic o pessoal nas es- cada caso. é tu d o , e o a lu n o , de educação ta m e n te ]. si m esm a. p ro fe sso r pes- c ie n tífic o , n ã o s e p o d e e d u c a r p ró p ria c ra s s o e rro , a s s im e x p e riê n c ia n a p rin c ip a l o m e io o m e n o sp re z o o rg a n iz a d a J á v im o s q u e o ú n ic o e d u c a d o r fo rm a r um s o c ia l. d o n z e la s , e ra m em c o n c ilia r M é d ia e d o O rie n - p a s s iv id a d e s o a l, s ã o , d o p o n to d e re a ç õ e s não m as a p re n d id a s . s is te m a [o c o n te ú d o n o c o rp o d e c a d e te s n o b re s te , o s q u e e d u c a v a m com o A o m esm o s id o c o la s g re g a s e n a s d a Id a d e s o b re a s q u a is s e c o n s tró i o s is te m a d e re a ç õ e s novo te n h a d e ] s u a id e o lo g ia . T a n to n o s e m in á rio fo i e s ta b e le c e n d o -s e h e rd a d a s, pode a n ti-s o c ia l e p re c e p to re s , O fa to r b io ló g ic o d e te rm in a o fu n d a m e n to , d e c u jo s lim ite s im - e à e s s ê n c ia s e fo rm a a p a rtir d a s p e c u lia - e c o n d iç õ e s b io ló g ic a s a base, m a is podem os o p ro c e sso d o s p ró p rio s in te g ra l d e re a - p e rc e p ç ã o da [p ro c e ssa m e n - 76 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA to] da mesma e ação de resposta. A pedagogia anterior reforçava e exagerava de forma desmedida o primeiro momento da percepção, transformando o aluno em uma esponja que cumpria mais fielmente sua missão quanto mais ávida e plenamente se impregnava de conhecimentos alheios. Mas o saber que não passa pela experiência pessoal não é saber. A psicologia exige que os alunos não aprendam apenas a perceber, mas também a reagir. Acima de tudo, educar significa estabelecer novas reações, elaborar novas formas de conduta. Quando concedemos uma importância tão excepcional à experiência pessoal do aluno estamos anulando o papel do professor? Podemos substituir a fórmula anterior "o professor é tudo, o aluno, nada" pela inversa: "O aluno é tudo, o professor, nada"? De forma alguma. Se, do ponto de vista científico, negamos que o professor tenha a capacidade de exercer uma influência educativa direta, que tenha a capacidade mística de "modelar a alma alheia", é precisamente porque reconhecemos que sua importância é incomensuravelmente maior. Concluímos então que a experiência do aluno, a formação de reflexos condicionados, está determinada pelo meio social. Basta modificar esse meio para que o comportamento do ser humano também mude. Já dissemos que o ambiente desempenha, com relação a cada um de nós, o mesmo papel que o laboratório de Pavlov com relação aos cães dos experimentos. Assim como as condições do laboratório determinam o reflexo condicionado do cão, o ambiente social determina a elaboração do comportamento. Do ponto de vista psicológico, o professor é o organizador do meio social educativo, o regulador e o controlador de suas interações com o educando. Ainda que o professor seja impotente quanto à sua influência direta sobre o aluno, é onipotente em sua influência indireta, através do meio social. O ambiente social é a autêntica alavanca do processo educativo, e todo o papel do professor consiste em lidar com essa alavanca. Assim como seria insensato que o agricultor tentasse influenciar o crescimento de uma planta puxando-a diretamente da terra com as mãos, o professor estaria contradizendo a natureza da educação se se esforçasse para influenciar a criança de forma direta. No entanto, o agricultor influencia a germinação das plantas elevando a temperatura, regulando a umidade, mudando a distribuição das plantas contíguas, escolhendo e misturando o adubo, de forma indireta, através das mudanças correspondentes no meio ambiente. Dessa forma, o professor, através da modificação do meio, vai educando a criança. Também temos de levar em conta o duplo papel do professor no processo educativo; nesse aspecto, seu trabalho não constitui uma exceção se o compararmos a outros tipos de trabalho humano. Qualquer trabalho humano tem dupla natureza. Nas formas mais primitivas e nas mais complexas do trabalho humano, o trabalhador assume um duplo papel: organizador e diretor da produção e parte de sua própria máquina. Comparemos, por exemplo, o trabalho de um puxador de riquixá japonês que transporta passageiros pela cidade com o de um motorneiro. Veremos que o puxador de riquixá é uma simples fonte de força física, de tração, que com sua energia muscular e nervosa substitui a força de um cavalo, do vapor ou da eletricidade. Mas, simultaneamente, ele assume um papel no qual não poderia ser substituído pelo cavalo, pelo vapor ou pela eletricidade: além de ser parte de sua máquina, também é o comandante da mesma, o diretor, regulador e organizador de sua simples produção. Ergue as varas, puxa e detém o carrinho, evita os obstáculos, vira esquinas, escolhe a direção adequada. Esses mesmos dois momentos também são encontrados no trabalho do motorneiro. Com sua força muscular, ele também desloca de uma posição para a outra a manivela de freio do motor e utiliza a força mecânica de seus pés. Desse modo, ele é uma simples parte de sua máquina, uma parte que modifica a disposição das outras. Muito mais notória, porém, é a segunda função do motorneiro, em que ele atua como organizador e diretor de todo esse complicado sistema de motores, freios e sinais. Essa comparação evidencia que, ainda que ambos os momentos do trabalho estejam presentes nos dois casos, eles mudam de lugar. No caso do puxador de riquixá, o trabalho de organizador e diretor da máquina desem- P S IC O L O G IA penha um papel insignificante e imperceptível em comparação com o trabalho físico. Se ele se sentir cansado ao final do dia, isso não acontece por dirigir uma máquina, mas por correr entre as varas. No caso do motorneito, porém, o trabalho físico é praticamente inexistente, enquanto o trabalho mental é significativo. O desenvolvimento do trabalho, graças ao aperfeiçoamento da técnica, toma uma direção que pode ser estabelecida da seguinte forma: do puxador de riquixá ao motorneiro. Na indústria contemporânea, cada vez mais o trabalhador se transforma no orgàriizador da produção, em diretor da máquina. Da mesma forma, o professor é o organizador e o diretor do meio educativo social, assim como parte desse meio. Sempre que substitui os livros, os mapas, o dicionário, um colega, [o professor] atua como um puxador de riquixá que substitui o cavalo. Nesse caso, assim como o puxador de riquixá, o professor assume o papel de uma parte da máquina educativa e não atua como educador, do ponto de vista científico. Só age como tal quando, distanciando-se, incita a atuação das poderosas forças do meio, as dirige e as obriga a servir à educação. Chegamos, assim, à seguinte fórmula do processo educativo. A educação é realizada através da própria experiência do aluno, que é totalmente determinada pelo ambiente; a função do professor se reduz à organização e à regulação de tal ambiente. Para que esse papel fique completamente claro, observaremos com mais detalhe o conceito de meio educativo. Superficialmente, P E D A G Ó G IC A 77 ter certeza de que esse método de ensino vai produzir um ser humano resistente e vital. No entanto, esse critério é incorreto. Temos de considerar dois aspectos. Em primeiro lugar, o fato de que a meta da educação não é a adaptação ao ambiente já existente, que pode ser efetuada pela própria vida, mas a criação de um ser humano que olhe para além de seu meio. Durante o primeiro ano da revolução,' muitos conceberam o objetivo da educação como a tarefa de destruir a escola. A rua revolucionária, a avenida revolucionária é o me- lhor educador, temos de transformar nossos filhos em crianças da rua, deve-se destruir a escola em nome da vida; essas eram as palavras de ordem. Nessa opinião havia muito entusiasmo salutar, era uma reação justa contra uma escola isolada da vida por uma muralha chinesa e, provavelmente, nas tempestuosas épocas de revolução, suprimir a educação seja o método educativo mais seguro. Entretanto, as coisas são diferentes em períodos mais calmos e à luz de um pensamento científico sensato. É verdade que educamos para a vida, que esta é o árbitro supremo, e que nossa meta não é inocular virtudes escolares especiais, mas comunicar hábitos e capacidade de viver. [É verdade que] a incorporação à vida é nosso objetivo final, mas na vida existem hábitos muito diferentes e essa incorporação pode ter características muito diversas. Não podemos assumir uma atitude indiferente nem igual com relação a todos seus elementos, nem podemos dizer que sim a tudo, só porque isso existe na vida. Portanto, não concordamos com o fato de deixar o processo educativo nas mãos das forças espontâneas da vida. Nunca poderemos pode parecer que não é preciso que exista necalcular antecipadamente que elementos da nhum meio educativo especial, que a educavida predominarão em nosso educando, para ção pode ser efetuada em qualquer meio e que que este não termine como uma caricatura da o melhor educador é o meio destinado a ser o vida, isto é, como uma coleção completa de futuro local de atividade do educando. M as seus aspectos ruins e negativos. Em nossas ruas qualquer meio social artificialmente criado há muita escória e lama ao lado do belo e susempre inclui vínculos que se distinguem da blime, e deixar o desenlace da luta pela via realidade objetiva e, portanto, sempre conserfinal da criança nas mãos do livre jogo dos esvam certo ângulo de divergência com a vida. tímulos é tão insensato quanto se lançar ao Seria fácil concluir então que não se deve criar oceano e entregar-se ao livre jogo das ondas nenhum meio educativo artificial: a vida edupara chegar à América. ca melhor que a escola; portanto, mergulhem Em segundo lugar, devemos levar em cona criança na ruidosa torrente da vida e podem QPONMLKJIHGFEDCBA ta que os elementos do meio também podem 78QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA influenciar de forma nociva e funesta um organismo jovem. Não nos esqueçamos que não se trata de um sujeito já formado, mas de um organismo em crescimento, mutante e frágil, e que muito do que é aceitável para um adulto é funesto para uma criança. Ambas as considerações, portanto - a inadequação do meio adulto à criança e a extraordinária complexidade e heterogeneidade das influências do ambiente - obrigam a renunciar ao princípio espontâneo no processo educativo e a contrapor uma resistência razoável e uma direção a esse: processo, através da organização racional dó meio. Essa é a natureza de qualquer conhecimento científico. Toda tese teórica é comprovada ou verificada mediante a prática, e sua veracidade só se estabelece quando a prática construída sobre aquela se justifica. O ser humano não descobre as leis da natureza para se resignar, impotente, a seu poder onímodo e renunciar à sua própria vontade. Também não pode atuar contra elas de forma irracional e cega. M as, quando se submete racionalmente a elas, quando as combina, as subordina a si mesmo. O ser humano obriga a natureza a servi-lo conforme as próprias leis da natureza.' O mesmo ocorre com a educação social. Conhecer as verdadeiras leis da educação social, independentes da vontade do professor, não significa admitir que somos impotentes ante o processo educativo, nem que renunciamos a intervir nele e deixamos toda a educação nas mãos da força espontânea do ambiente. Pelo contrário, assim como qualquer ampliação de nosso saber, isso significa que nosso poder sobre o processo aumenta e que temos maiores possibilidades de intervir ativamente em seu curso. O conhecimento da autêntica natureza da educação nos indica com que recursos podemos dominá-Ia completamente. Portanto, a teoria psicológica da educação social, longe de denotar uma capitulação ante a educação, marca o ponto mais alto no domínio do andamento dos processos educativos. Dessa forma, a psicologia pedagógica se transforma em uma ciência prática sumamente efetiva. Não se limita a tarefas puramente teóricas, como compreender e descrever a na- tureza da educação, descobrir e formular suas leis. Deve nos ensinar a dominar essa educação, apoiando-nos em nossas próprias leis. Agora também compreendemos melhor a idéia antes mencionada de que, no processo de educação e com essa nova concepção, a importância do professor é incomensuravelmente maior. Ainda que seu papel aparentemente diminua quanto à sua atividade externa, pois passa a ensinar menos, sua atividade interna aumenta. O poder desse professor sobre o processo educativo é muito maior que o do professor de outrora, assim como o poder do motorneiro é muito maior que a força do puxador de riquixá. A A T IV ID A D E E D U C A T IV O o DO PROCESSO E S E U S P A R T IC IP A N T E S processo educativo não deve ser concebido como algo unilateralmente ativo, nem devemos atribuir tudo à atividade do ambiente, anulando a do próprio aluno, a do professor e tudo o que entra em contato com a educação. Pelo contrário, na educação não há nada passivo ou inativo. Até as coisas inanimadas, quando incorporadas ao âmbito da educação, quando adquirem um papel educativo, se tornam dinâmicas e se transformam em participantes eficazes desse processo. Com uma visão superficial fica fácil extrair da teoria dos reflexos condicionados a conclusão de que o comportamento humano e a educação são entendidos de forma totalmente mecânica e que o organismo é parecido com um robô [autômato] que responde com regularidade maquinal às excitações do meio. Já destacamos que esse critério é incorreto. O próprio processo de formação do reflexo condicionado - como demonstramos - surge da luta e do encontro de dois elementos totalmente independentes um do outro em sua natureza, que [...] se cruzam e interceptam no organismo conforme as leis desse mesmo organismo. "O ser humano enfrenta a natureza como uma força da natureza." O organismo enfrenta o mundo como uma magnitude que luta ativamente e enfrenta as influências do ambien- P S IC O L O G IA te com a experiência herdada. O ambiente esmaga e forja essa experiência com uma espécie de marteladas e a deforma. O organismo luta pela auto-afirmação. O comportamento é um processo dialético e complexo de luta entre o mundo e o ser humano no seio do próprio ser humano. E, no desenlace dessa luta, as forças do próprio organismo, as condições de sua construção herdada, desempenham um papel igual ao das influências incisivas do ambiente. Portanto, quando reconhecemos a "impregnação social" absoluta de nossa experiência, isso não significa de forma alguma que concebemos o ser humano como um robô, nem que lhe negamos toda significação. Por isso, a citada," que se propõe fórmula anteriormente a prever com exatidão matemática a conduta do ser humano e calculá-Ia a partir das reações herdadas e de todas as influências do meio, está equivocada em um aspecto essencial: ela não leva em consideração a infinita complexidade da luta intra-orgânica, que nunca permite calcular e prever a conduta do ser humano, que não passa do resultado dessa luta. O meio não é algo de fora imposto ao ser humano. Também não é possível discernir onde terminam as influências do meio e onde começam as influências do próprio corpo. Portanto, o corpo - como sucede nos campos íntero e proprioceptivos - faz parte do meio social. O processo de formação das reações adquiridas e dos reflexos condicionados é ativo e bilateral; nele o organismo não está submetido apenas à influência do ambiente, mas também influi de certo modo sobre o ambien- P E D A G Ó G IC A 79 mais ou menos independentes e isolados uns dos outros, e esses fragmentos podem ser objeto da influência inteligente do ser humano. Em suma, o meio é para o ser humano o meio social, porque quando aparece, com relação ao homem, como meio natural, sempre estão presentes aspectos sociais determinantes. Em suas relações com o ambiente, o ser humano sempre utiliza sua experiência social. Quando observamos um bosque, um rio, as árvores, compreendemos o que são essas coisas, nós as nomeamos e compreendemos a designação; abordamo-as com operações tão complexas da experiência social, que passam despercebidas, devido à mesma lei pela qual não percebemos que respiramos, crescemos, giramos junto com a Terra, que participamos de mudanças realizadas de forma ininterrupta e permanente. Só em um sentido muito estrito, limitado e convencional é possível contrapor meio social e meio natural. No entanto, se entendemos convencionalmente o meio social como o conjunto das relações humanas, é totalmente compreensível sua excepcional plasticidade, que o transforma em um dos recursos mais flexíveis da educação. Os elementos do meio não estão em um estado congelado e estático; seu estado é mutante, e ele muda facilmente suas formas e sua configuração. Quando combina de certo modo esses elementos, o ser humano cria novas formas do ambiente social. Por isso, o professor desempenha um papel ativo no processo de educação: modelar, cortar, dividir e entalhar os elementos do meio para que estes realizem o objetivo buscado. O processo educativo, portanto, é trilateralmente ativo: o aluno, o professor e o meio existente te e, através deste, sobre si mesmo, com cada entre eles são ativos. Por isso, é incorreto conuma de suas reações. Nesse processo bilateral, ceber o processo educativo como um processo o reflexo pertence ao organismo; nesse caso, o placidamente pacífico e sem altos e baixos. Pelo reflexo é entendido como uma reação prepacontrário, sua natureza psicológica descobre rada, e ao meio pertencem as condições para que se trata de uma luta muito complexa, na o surgimento de uma nova [reação]. M as, em qual estão envolvidas milhares das mais comcada caso, o processo de formação das reações plicadas e heterogêneas forças, que ele constidepende do desenlace do combate entre o ortui um processo dinâmico, ativo e dialético, seganismo e o meio. melhante ao processo evolutivo do crescimenO ambiente também não é algo totalmente estático, rígido e invariável. Pelo contrário, to. Nada lento, é um processo que ocorre a saltos e revolucionário, de incessantes combana realidade concreta não existe um meio únites entre o ser humano e o mundo. co. Ele se divide em uma série de fragmentos QPONMLKJIHGFEDCBA 80QPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I to de uma personalidade integral e harmônica e de um ser humano culto e civilizado, pois P O N T O D E V IS T A P S IC O L Ó G IC O xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA isso não significa absolutamente nada para a escolha dos nexos a serem utilizados no proA questão dos objetivos da educação em cesso educativo. Conseqüentemente, quando todo o seu alcance não tem a ver com a psicoformulamos de forma científica os objetivos da logia pedagógica. Esta deve descobrir o aspeceducação, estamos estabelecendo de forma to formal de todo o processo educativo, indeconcreta e exata o sistema de conduta que pendentemente de seus objetivos, esclarecer queremos plasmar em nosso educando. quais são as leis que o regem, à margem da Basta observar os sistemas educativos em direção para a qual sua ação está orientada. A seu desenvolvimento histórico para perceber indicação e o traçado dos objetivos da educação são questões relacionadas à pedagogia que os objetivos da educação sempre foram, nos geral e à ética social. fatos, totalmente concretos e vitais, e sempre A natureza psicológica do processo educorresponderam aos ideais da época, à estrutucativo é a mesma se desejarmos educar um fasra econômica e social da sociedade, que detercista ou um proletário [revolucionário], se premina toda a história de uma época. M as, atrapararmos um acrobata ou um bom funcionávés das palavras, esses ideais sempre foram forrio. A única coisa que deve nos interessar é o mulados de outro modo, devido, em cada oporpróprio mecanismo de formação das novas reatunidade, à incapacidade científica do pensações, seja qual for o objetivo final desejado. dor ou à hipocrisia de classe da época. No entanto, nesse problema existe certo O feudalismo, cujo único interesse eduaspecto formal que só pode ser considerado cativo era criar servos submissos e resignados, do ponto de vista psicológico. Na área da psinão podia dizer isso abertamente e então teve de disfarçá-lo por meio da doutrina religiosa cologia não se pesquisam quais são os objetivos particulares da educação, mas que tipo de da salvação da alma. O mesmo ocorreu em objetivos, em geral, devem ser propostos ao todas as épocas, em que a classe [social] doprocesso educativo, do ponto de vista científiminante dos exploradores, que também dirico. O problema de saber quais são as condigia a educação, dissimulava, mediante palações a observar para que nossos objetivos esvras abstratas, o verdadeiro objetivo da edutejam de acordo com o processo educativo só cação. Atualmente, quando as contradições de pode ser resolvido pela teoria psicológica da classe ficaram evidentes, a necessidade dessa dissimulação desapareceu, e o ser humano de educação. Vemos então que o processo educativo é nossa época tende a formular de modo totaltotalmente concreto. Ele consiste em estabelemente concreto e preciso o objetivo vital da cer novos nexos, que são materiais e concretos educação. em todos os casos. Por isso, é totalmente comDevemos levar em consideração que a preensível que só objetivos concretos possam educação sempre e em todas partes teve um ser atribuídos ao processo educativo. Do poncaráter classista, ainda que seus defensores to de vista científico, podemos nos referir da e apóstolos não se dessem conta disso. O que acontece é que, na sociedade humana, a edumesma forma à educação de um fascista ou de um revolucionário, de um acrobata ou de um cação é uma função social totalmente deterfuncionário, pois em todos esses casos sempre minada, que sempre se orienta em prol dos temos presente o caráter bem-determinado das interesses da classe dominante, e a liberdareações; conhecemos perfeitamente bem o sisde e independência do pequeno meio edutema da conduta e o ideal exato da atividade cativo artificial com relação ao grande meio que desejamos realizar. social são, na verdade, uma liberdade e uma M as, do ponto de vista científico, é abindependência muito relativas e condiciosurdo falar de ideais abstratos da educação, nais, convencionais, dentro de estreitas fronassim como é absurdo falar do desenvolvimenteiras e limites. O S O B J E T IV O S DA EDUCAÇÃO DO P S IC O L O G IA Sempre existe uma interação entre as influências e um vínculo entre o grande e o pequeno meios sociais; e toda a complexidade do problema psicológico da educação consiste em determinar as autênticas fronteiras dessa independência. Não é difícil mostrar e evidenciar a natureza e o conteúdo classista de qualquer sistema educativo. Basta recordar o sistema de instrução que imperava na escola czarista russa, o qual criava ginásios e universidades para a nobreza, colégios secundários para a burguesia urbana e asilos e escolas de experiência hereditária biente social. P E D A G Ó G IC A a um determinado 81 am- Não é difícil observar, porém, que essa definição é sumamente ampla; nesse caso, caberia no conceito de educação toda nova reação condicionada, e perderíamos todo critério para diferenciar a educação de qualquer formação de uma nova reação condicionada que fechamos [formamos] diariamente, quando decidimos cumprimentar uma pessoa que estamos conhecendo naquele momento, compreender uma nova palavra estrangeira, reagir ante um novo acontecimento. Devido a isso, devemos distinguir entre educação e vida cotidiana. Não há nenhuma dúvida de que todas as novas reações nos influenciam psicologicamente, em um processo de auto-educação. Isso salta à vista com particular nitidez quando não en- ofícios para os pobres. " Por isso, do ponto 'de vista psicológico, não tem sentido falar dos objetivos abstratos e gerais da educação. Cada educação possui seus próprios objetivos - até mesmo em cada período da educação pode haver objetivos próprios - e, independentemente da forma como se expressam, sempre formularão os aspectos contramos formações singulares e casuais de e o caráter da conduta que essa educação dereações, mas um processo planejado, racional seja tornar realidade. Só esses objetivos da edue prolongado de elaboração de novos sistemas cação podem ter um significado real na escode conduta íntegros em pessoas adultas. Por lha e na orientação do processo educativo, pois exemplo, quando observamos o treinamento só eles podem oferecer as regras necessárias de um solado, o ensino de um novo jogo, um para escolher as influências educativas adequacurso de taquigrafia ou datilografia, sem dúvida nos deparamos com processos psicológicos das e combiná-Ias de forma adequada em um de natureza educativa, já que em todos esses sistema pedagógico harmônico. QPONMLKJIHGFEDCBA casos se trata da elaboração e do reforço de novos sistemas de reações, de novas formas A E D U C A Ç Ã O C O M O S E L E Ç Ã O S O C IA L de comportamento. Entretanto, em prol da clareza e da exaVamos abordar agora a formulação defitidão do problema, aqui seria mais correto fanitiva da natureza psicológica do processo edular de JIHGFEDCBA r e e d u c a ç ã o - no sentido amplo da palacativo, com base em todo o material exposto. vra - mais que de educação. A diferença entre Seria extremamente difícil fazê-lo por meio de ambas as palavras tem a ver com o significado uma única frase, pois toda definição - segunque lhes dá o uso popular. Na linguagem cotido um ditado francês - é uma limitação, isto é, diana, entende-se por reeducação a reelaboraum enfoque parcial e unilateral do tema. Por ção profunda, a reorganização dos sistemas de isso, tentaremos encarar a questão da educareações já existentes. Por isso, convencionalção a partir de alguns dos seus aspectos mais mente, fala-se da reeducação de um delinqüenimportantes. te, de um portador de doença mental, etc. Na A primeira definição aproximada da edulinguagem comum, ninguém usaria a palavra cação indica que o processo educativo, em sua reeducação para se referir a cursos de datiloessência, se reduz a estabelecer e acumular grafia ou taquigrafia. Do ponto de vista popureações condicionadas, baseadas nas formas de lar, nesse caso não estamos reeducando nada, conduta inatas, e elaborar as que são úteis para mas comunicamos e elaboramos novos hábia adaptação ao meio social. Em outros termos: tos. Por outro lado, do ponto de vista científia educação é definida como a adaptação da co, em todos os casos seria mais acertado falar 82QPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA precisamente de reeducação, porque, psicologicamente, estarnos diante da formação de vários vínculos novos dentro de um sistema de comportamento previamente formado. Deve-se considerar como característica e d u c a ç ã o o momento de não-conessencial da JIHGFEDCBA solidação, de fluidez do crescimento e de mudanças originais no indivíduo. Portanto, em sua forma pura, o conceito de educação só pode ser aplicado a uma criança, isto é, a um organismo em crescimento e automodificação. Esse processo é análogo a todos os outros processos do organismo. As modificações no organismo ocorrem incessânternente durante a vida. No entanto, as modificações que são chamadas de crescimento possuem um significado biológico totalmente diferente. Seu destino e objetivo consistem em preparar o ser jovem para a complexa e múltipla atividade da vida. A palavra "educação" só é aplicável ao crescimento. Portanto, a educação pode ser definida como a influência e a intervenção planejadas, adequadas ao objetivo, premeditadas, conscientes, nos processos de crescimento natural do organismo. Por isso, só terá caráter educativo o estabelecimento de novas reações que, em alguma medida, intervenham nos processos de cresci'mento e os orientem. Nem todos os novos vínculos que se fecham [formam] na criança, portanto, serão atos educativos. Se, ao sair de casa, combino com a criança que vou deixar a chave com ela, estou fechando [criando] um novo vínculo com ela. M as, se essa reação não tem outra missão senão a de ajudar a criança a encontrar a chave, não pode ser denominada educativa do ponto de vista psicológico. Portanto, nem tudo o que fazemos com a criança é educação no sentido científico da palavra. Resulta evidente então que a educação pode ser um tema e um problema da psicologia infantil. M as em que reside o significado desse processo? O mais correto seria defini-lo como um processo de seleção social. Recordemos que a reação é um complexo processo de inter-relação entre o mundo e o ser humano, .que está determinado pela adaptação. O com- portamento ao meio. A número de se criar as Frank:" é a forma superior de adaptação criança, porém, possui um grande possibilidades sociais. Nela podem mais diversas personalidades. Diz A criança que "imagina" ser um bandido, um soldado ou um cavalo e "representa" esses seres, na verdade está mais certa que seus pais ou os psicólogos, que vêem nela apenas um ser pequeno e desvalido que vive no 'mundo infantil, pois sob essa aparência esconde uma reserva potencial lidades que não se encaixam r e a lm e n te se de forças e reana realidade ob- jetiva de sua vida. Nesse pequeno ser r e a l r r t e n t e v i v e m as forças e tendências do bandido, assim como as do soldado e até as do cavalo; n a r e a lid a d e , isso é algo incomensuravelmente maior do que parece para o olhar alheio. Potencialmente, a criança contém muitas personalidades futuras; ela pode vir a ser isto ou aquilo. A educação produz a seleção social da personalidade externa. A partir do ser humano como biótipo, a educação, por meio da seleção, forma o ser humano como tipo social. NOTAS 1. Nesse caso, o referencial de Vigotski é a revo- lução socialista russa do final de outubro de 1917, segundo o antigo calendário juliano, atrasado 13 dias com relação ao gregoriano, o nosso. De acordo com o gregoriano, a Revolução de Outubro ocorreu em 7 de novembro. A partir da Revolução tou nosso de Outubro, calendário. a Rússia ado- De qualquer modo, Vigotski está se referindo ao ano de 1918. 2. Vigotski apresenta aqui uma idéia que será capital em toda a sua obra. No manifesto fundacional de sua escola histórico-cultural, "O problema cultural do desenvolvimento da criança", de 1928, ele cita - e fará o mesmo diversas outras vezes - um d i c t u m do livro N ovum organan (1620) de Francis Bacon: " N a tu r a nan v in c itu r minar a natureza artigo de Vigotski n is i p a r e n d a " devemos está ["Para do- obedecê-Ia"]. incluído Esse em: L. S. Vigotski, E I D e s a r r o l l a C u l t u r a l d e i N i n o y o tr o s P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 83 4. Semion Liudvigovitch Frank (1877-1950) foi e s c r i t o s i n é d i t o s , xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA edição de G. Blanck, Buenos um filósofo russo é m i g r é . As referências de Aires: Almagesto, 1998, p. 31-55. Vigotski a Frank no presente livro pertencem à 3. Vigotski refere-se à concepção exagerada da obra D u s h a c h i e l o v i e k a [A alma do homem], plasticidade do psiquismo humano, mencionaM oscou, 1917. Há uma reedição em russo desda no Capo 2 (cf. também a nota nl! 14 desse se texto (cf. Paris: YM CA Press, 1977). Capítulo). QPONMLKJIHGFEDCBA O s In s tin to s c o m o O b je to , M e c a n is m o e M e io s da Educação Para o observador, a atividade instintiva do animal e do ser humano sempre pareceu algo misterioso e enigmático. Até os dias de hoje, ela continua sendo o aspecto mais obscuro e não-esclarecido da psicologia animal e humana. As causas dessa falta de clareza e compreensão da questão devem-se, acima de tudo, à obscuridade da própria atividade instintiva. Deparamo-nos com instintos tanto nos níveis mais simples da vida quanto nos mais complexos. Está comprovado que o comportamento puramente instintivo é muito mais perfeito nos animais inferiores que nos superiores. No ser humano, o instinto quase não existe em sua forma pura; ele sempre aparece como um elemento que faz parte de um todo mais complexo e, por isso, atua de forma mais encoberta, como uma mola secreta dos mecanismos evidentes do comportamento. destacar a causa verdadeira e mais próxima de nosso comportamento. É mais simples explicar a natureza do instinto comparando-o ao reflexo comum. Acredita-se que o instinto representa apenas u~ reflexo complexo ou em rede. No entanto, como já vimos [no Capo 2], há uma série de diferenças entre o instinto e o reflexo. O acadêmico Bejterev' propõe que chamemos de "instintos" os reflexos orgânicos complexos, que ele separa em uma classe especial, distinguindo-os dos reflexos simples e incondicionados. Na verdade, isso também significa o reconhecimento do instinto como uma classe particular das reações, [uma classe] que possui uma natureza independente. Antes de considerar os instintos como uma classe particular das reações, devemos considerar a forma como se relacionam à anatomia e à fisiologia. A ciência atual divide todo o sistema nervoso em dois sistemas fundamentais: o sistema nervoso animal e o vegetativo. O primeiro rege todas as funções animais do cação. Há muito, alguns pesquisadores respalorganismo - em primeiro lugar, as reações dam insistentemente o critério de que o insmotoras -, estabelecendo uma correlação entinto, como forma peculiar do comportamentre o organismo e o mundo externo. O segunto, não existe. Outros, pelo contrário, considedo rege as funções vegetativas do organismo, ram o instinto como algo peculiar, totalmente atuando nos órgãos internos, nas cavidades, irredutível a qualquer outra coisa, um tipo esnos tecidos, etc. Segundo todos os dados, ao pecial de reações do ser humano e do animal. contrário das demais reações, os instintos esUm pesquisador observou corretamente tão intimamente vinculados a essa parte íntique chamamos de instintos tudo o que não ma, vegetativa, do sistema nervoso. Precisacompreendemos. Na verdade, na linguagem mente seus nervos, que chegam às glândulas e comum, a palavra "instinto" aplica-se a todos às zonas internas do corpo, que alimentam toos casos em que não estamos em condições de QPONMLKJIHGFEDCBA Até hoje, a ciência não resolveu a questão da natureza dos instintos nem sua classifi- 86QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA pam de uma reação instintiva não é rigorosa. dos os tecidos e forram os vasos sangüíneos, Nunca é possível calcular e determinar antecisão as vias primárias pelas quais os estímulos padamente os movimentos nem a ordem dos intra-orgânicos, vinculados ao instinto, chegam reflexos que compõem a reação instintiva. Ao até o sistema nervoso central. A· atividade instintiva consolida-se nos . contrário, o reflexo funciona com uma regularidade maquinal. E, ainda que ele represente confusos chamados do corpo à satisfação orum todo complexo e composto, esse todo está gânica, nos complexos processos químicoformado de tal maneira que, em um reflexo vegetativos do organismo e parece ser resultacomplexo do qual participam muitos múscudo das mais' íntimas demandas que o organislos diferentes, não se pode prever com exatimo faz ao mundo. dão em que sucessão eles funcionam, um após Do ponto de vista fisiológico, admite-se o outro. facilmente que também os processos íntimos Já mencionamos [no Capo 2] a diferença da secreção interna são es-tímulos dos instinentre instinto e reflexo, estabelecida com base tos. Está comprovado que o instinto sexual é nas observações experimentais do professor estimulado fundamentalmente por essas duas Vagner com o acasalamento de moscas decavias: através dos gânglios nervosos do sistema pitadas. Esse experimento demonstra que o vegetativo e diretamente pela estimulação instinto pode se combinar de forma particuhormonal dos centros nervosos do cérebro. larmente complexa com os reflexos, porém Nesse segundo caso, a reação instintiva é subssempre difere deles, pois o caráter do vínculo tancialmente diferente do reflexo; ela não tem e a associação com a reação são essencialmencomo correlato um arco reflexo, mas surge graças à estimulação direta dos centros cerebrais. te diferentes. Dessa forma, o psicólogo pode consideIsso confere a tal reação uma espécie de carárar que o comportamento instintivo é uma claster independente, autônomo, ao contrário do se particular e, de acordo com o professor reflexo, que possui um caráter de resposta. Vagner, é possível admitir que o instinto repreDevemos levar em conta a diferença biológica entre o reflexo e o instinto, que geralsenta uma reação do comportamento de todo o organismo, enquanto o reflexo é uma reação mente se reduz ao fato de que os instintos reseparada da função dos órgãos. presentam as mesmas reações hereditárias que Quando o comparamos com o reflexo, os reflexos, vinculadas, porém, a peculiaridapercebemos no instinto a integração hereditádes tão manifestas quanto a idade, a periodiciria preestabelecida de reflexos, a predetermidade, etc. Em outras palavras, o reflexo é uma nação do domínio do processo, o resultado préreação permanente, que não varia no decorrer fixado da luta pela via final e o caráter intede toda a vida; em compensação, as reações instintivas podem se modificar, manifestar-se gral do comportamento. e desaparecer de acordo com a idade, o período fisiológico e natural, etc. A O R IG E M D O S IN S T IN T O S Por último, do ponto de vista psicológico, o instinto apresenta certos desvios que não Há divergências quanto à origem e à napermitem que ele seja reduzido a uma simples tureza dos instintos. soma ou sucessão de reflexos. Acima de tudo, Alguns supõem que originariamente, no existe uma dependência não muito rigorosa passado, as reações instintivas foram conscientre excitante e reação [estímulo e resposta], entes, inteligentes, racionais; a partir delas, o que caracteriza o instinto. Há muito tempo, os animal, por causas fortuitas ou pelo "método naturalistas afirmam que os instintos são cede tentativa e erro", escolheu, consolidou e gos, isto é, não percebem a falta de excitante e transmitiu por herança as reações úteis. Os parpodem atuar se [o organismo] passa para uma tidários desse critério consideram-no confirmasituação totalmente diferente." A formação da do por meio da automatização alcançada peprópria composição dos reflexos que partici- P S IC O L O G IA Ias ações racionais e conscientes do ser humano, quando repetidas com freqüência, de forma uniforme e na mesma sucessão. A rigor, as nove décimas partes de nossa conduta transcorrem de forma totalmente automática, isto é, maquinalmente, de forma independente de nossa consciência. Os centros nervosos que regem esses movimentos parecem autônomos. Respiramos, caminhamos, escrevemos e falamos, tocamos piano, lemos e nos vestimos de maneira totalmente automática, isto é, sem pensar cada vez nas ações que temos de realizar. As pernas 'parecem nos conduzir sozinhas e não nos exigem, em cada oportunidade, um impulso volitivo, a decisão de levantar e apoiar o pé; o mesmo ocorre com os dedos de um pianista virtuoso ou com o aparelho fonador de todas as pessoas. Basta comparar o esforço, o grau de tensão, o gasto de atenção do ser humano na primeira vez que ele aprende uma língua estrangeira ou aprende a tocar piano, com a facilidade com que produz os mesmos movimentos posteriormente, para compreender como a força do automatismo psíquico é enorme. Observem com atenção uma criança que está aprendendo a andar. Todo seu rosto exprime um estado de extrema tensão; ela está realizando um trabalho mental extremamente difícil. Cada vez que levanta seu pezinho e procura um ponto de apoio seguro enquanto estende o outro, parece estar resolvendo um problema sumamente complicado. Quando a comparamos com a criança de dois anos que corre livremente, percebemos a diferença essencial que a automatização provoca. Poderíamos demonstrar facilmente que a automatização rebaixa o caráter da reação humana, que a reduz ao tipo mais baixo, a mecaniza e, em geral, significa um passo atrás e um declínio, em comparação com a reação consciente de tipo racional. No entanto, isso não é P E D A G Ó G IC A 87 execução do pianista, o discurso do orador, a dança da bailarina, tudo isso exige uma extrema sutileza e exatidão de movimentos e chega à perfeição quando os centros que regem os movimentos necessários parecem se automatizar, se isolam de todas as outras influências do sistema nervoso e realizam seu trabalho com a máxima delicadeza e ritmo; tudo isso só é acessível ao sistema nervoso humano. Em segundo lugar, a automatização dos movimentos é uma condição necessária para descarregar o sistema nervoso central de toda uma série de trabalhos estranhos. Trata-se de uma espécie de distribuição peculiar do trabalho entre os centros nervosos, a liberação dos centros superiores de um conjunto de formas de trabalho inferior e habitual. Se o ato de andar não fosse realizado de forma automática, mas exigisse, em cada oportunidade, a tomada de consciência dos movimentos, absorveria uma quantidade tão grande de energia nervosa que não haveria espaço para outros atos. Por isso, o orador pode se entregar à composição do sentido de seu discurso: o processo de pronúncia dos sons se efetua como se fosse algo automático, sem exigir atenção nem pensamentos de quem está falando. Por esse motivo, é tão difícil falar em uma língua pouco habitual, em que nossa pronúncia ainda não se automatizou de forma suficiente. Portanto, a automatização de nossos movimentos é uma lei universal de nossa atividade e possui uma importância psicológica substancial. A base dessa lei reside na peculiar plasticidade de nossa substância nervosa, em que se formam os caminhos trilhados pelas vias nervosas, nas quais parece se conservar o traço das excitações antes experimentadas e existe predisposição para as repetir. Quando dobramos uma folha de papel, forma-se uma marca no local da dobradura. É a marca do movimento realizado, certa defor- totalmente correto. Também é muito fácil mostrar que a automatização de nossos movimenmação e mudança na distribuição das molécutos constitui a condição psicológica necessária las. O papel fica predisposto a se dobrar exatapara o surgimento dos tipos superiores de atimente nesse lugar. Com o mais leve dos sopros isso é o que acontece. Algo semelhante ocorre vidade. Em primeiro lugar, só os atos automatino sistema nervoso, embora essa comparação não deva ser entendida em sentido literal nem zados são o tipo mais perfeito de reação. A QPONMLKJIHGFEDCBA 1I iQPONMLKJIHGFEDCBA 88 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA se deva imaginar as marcas das excitações nervosas como as marcas do papel. O processo de auto matiz ação permite explicar o processo de origem das reações .ínstintivas a partir das conscientes. Os que aderem a esse critério supõem que, do mesmo modo que o movimento consciente, quando se aprende a tocar piano, [por exemplo], se automatiza posteriormente, as reações instintivas surgem mediante a seleção das ações conscientes e voluntárias. Portanto, esses psicólogos entendem o instinto como um ato inteligente mecanizado, e isso lhes permite afirmar que tudo o que atualmente é instintivo e maquinal já foi racional. "O instinto é a razão perdida": tal é a formulação exata desse critério. O esquema de desenvolvimento das reações, do ponto de vista dessa concepção, pode ser representado do seguinte modo: razão instinto - reflexo. Tal critério, embora pareça confirmado pela brilhante analogia com a automatização dos movimentos humanos, não pode ser considerado muito verossímil. O automatismo só explica de que modo os atos casuais, depois de uma série de repetições, se tornam precisos e mecânicos, mas isso não significa de forma alguma que esses atos tenham sido racionais em sua origem. O critério diz apenas que também os atos raciocinados podem se auto matizar, mas isso não implica que essa capacidade seja inerente tão somente a eles. Pelo contrário, todas as considerações mostram, pelo que foi exposto anteriormente, que a atividade de tipo racional- que surge com a participação direta do córtex cerebral- estrutura-se com base nas reações hereditárias e que, no processo de evolução, lhe corresponde um lugar mais tardio que o dos instintos. Infere-se daí que é muito mais verossímil outro ponto de vista, segundo o qual se deve considerar que os instintos se originaram antes dos atos de raciocínio. Desse ângulo, a razão [razum] é o instinto apreendido do qual se toma consciência, isto é, que é transmitido através da experiência pessoal. O esquema de desenvolvimento das reações, de acordo com esse ponto de vista, pode ser representado da seguinte maneira: reflexo - instinto - razão. Portanto, o reflexo, como for- ma mais primitiva da conduta, é tomado como fundamento e base de todas as formas da atividade humana. Entretanto, isso não significa que o instinto se reduza ao reflexo. No processo da evolução, com base no reflexo, o instinto pôde surgir como forma totalmente diferente do reflexo, embora geneticamente vinculada a ele. Diz o professor Vagner: Pelos alicerces apreciar de uma casa não é possível o que será construído: um armazém de comestíveis, um laboratório químico ou o escritório de um notário. A classe dos répteis constitui a base tanto da classe das aves como da dos mamíferos; entretanto, seria insensato buscar no bico de uma pomba os dentes de um lagarto, e uma unha curva de pássaro nas garras das patas de um crocodilo. [V A. Vagner, JIHGFEDCBA B io p s ijo lo g u ia i sm ezhne nauki e a s c iê n c ia s r e la c io n a d a s Obrazoevanie, (A B io p s ic o lo g ia a e la ) Petrogrado: 1923, Capo 4.] Esse segundo esquema, porém) também não é completamente satisfatório, porque sabemos que as formas "racionais" de conduta surgem diretamente do reflexo e não precisam de um elo intermediário sob a forma de instinto. Da mesma forma, em toda uma série de organismos, até o instinto mais perfeito não conduz, em seu desenvolvimento, à formação e à elaboração de reações raciocinadas. Por tudo isso, o mais acertado e correto quanto à origem é adotar o esquema proposto pelo professor Vagner, segundo o qual o instinto e a razão, tendo como fundamento comum o reflexo, desenvolveram-se paralela e independentemente em formas de conduta peculiares e autônomas entre si. O esquema" é o seguinte: Reflexo Instinto Razão P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 89 mente, distorcem intensamente o curso e a reprodução normal das reações. IN S T IN T O , R E F L E X O E R A Z à O xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Como regra psicológica geral e inegável, pode-se dizer que os exames e todos os proceA um professor interessa sumamente o vínculo existente entre instinto, reflexo e radimentos similares sempre oferecem uma imazão, que foi encontrado na zoopsicologia [psigem totalmente falsa e deformada do comportamento e, em grande parte, reduzem e desorcologia animal] e, pelo visto, confirmado no ganizam os sistemas de reprodução das reações. ser humano. Esse vínculo estabelece que os instintos É verdade que os casos inversos - que todos conhecem - também são possíveis; neles, a agifreiam o reflexo. Isso se torna evidente no setação provocada por um exame estimula de forguinte experimento. Se um inseto decapitado que se arrasta em certa direção seguindo uma ma excepcional recordações vívidas, respostas linha reta for golpeado C0m uma pinça, ele inteligentes; no entanto, do ponto de vista psicológico, isso é considerado anormal. iniciará um movimento reflexo giratório para a esquerda e para a direita. As oscilações ocorDa mesma maneira, temos todos os funrerão até chegar o cansaço e o esgotamento damentos para supor que, assim como os insdo sistema nervoso. Essa é uma forma puratintos exercem uma ação de freio, extinguinmente reflexa de conduta. Um inseto normal, do os reflexos, os primeiros estão sujeitos a essa que tiver perdido a reação instintiva, reagirá mesma reação devido às reações conscientes. de outra forma à mesma irritação. [Em princípio], ele efetuará um movimento reflexo para O S IN S T IN T O S E A L E I B IO G E N É T IC A um lado, mas depois acabarão os movimentos reflexos posteriores, que começarão a ser reOs estudiosos das ciências naturais obprimidos pelo instinto de autoconservação, que servaram há muito a estranha dependência obrigará o inseto a recorrer a movimentos mais entre a JIHGFEDCBA o n to g ê n e s e e a f i l o g ê n e s e dos organiscomplexos para evitar o perigo. mos, isto é, entre o desenvolvimento do indiA consciência exerce uma ação de freio víduo e o da espécie [respectivamente]. No feto exatamente igual à dos reflexos. Conhece-se a humano, por exemplo, em certas etapas obhistória de uma aposta feita por Darwin com servam-se características como aberturas bran12 jovens. [Darwin afirmou] que, depois de quiais, cauda e pêlos, que apresentam analocheirar o mais forte dos tabacos, eles não pogia com fases superadas há muito tempo pela deriam espirrar. Realmente, nenhum deles esevolução, em que os [muito remotos] antepaspirrou durante o teste, ainda que antes e desados do ser humano viviam na água e pospois do mesmo esse mesmo tabaco tivesse lhes suíam cauda. causado um intenso efeito. O forte desejo de Uma série de fatos indica a correlação ganhar a aposta e uma importante quantia de entre a história do desenvolvimento do orgadinheiro, a concentração da atenção no ato, o nismo, a partir da célula embrionária, e o dereceio de perder e outros processos consciensenvolvimento de toda a espécie. De acordo tes paralisaram e inibiram o reflexo." com essas circunstâncias, Hackel? formulou sua Aqui, cabe mencionar também a imporlei biogenética, aproximadamente da seguinte tante conclusão pedagógica a ser extraída desforma: a história do indivíduo representa a hisse fato. Se uma intensa emoção ligada a um tória, abreviada e resumida, da espécie." A evodesejo e ao medo atua de forma tão perturbalução do organismo repete a evolução da esdora no comportamento, chegando até a depécie, e o embrião e o filhote, em seu desensorganizar o curso das relações inferiores, fica volvimento, passam por todas as etapas pelas fácil compreender até que ponto são antipsiquais passou o desenvolvimento da espécie. cológicos todos os métodos pedagógicos sob a Portanto, o embrião efetua uma forma de performa de exames, etc., que certamente colocurso abreviado e acelerado de todo o camicam os alunos na mesma situação em que nho evolutivo. Darwin pôs seus colaboradores e que, geralAS RELAÇÕES ENTRE 90QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA M uitos psicólogos transferiram essa lei para o âmbito da psicologia e, até o momento, promovem-na como o princípio básico do desenvolvimento da psique infantil e o fundamento do princípio normativo da psicologia pedagógica. Supõe-se que, em seu desenvolvimento, a criança repita de forma abreviada e modificada todas as etapas fundamentais pelas quais a humanidade passou a partir do momento em que o ser humano surgiu na Terra até nossa época. No primeiro período de sua vida, a criança é uma simples seguradora de objetos. Atrai tudo para si, coloca tudo na boca, e isso corresponde à época em que o homem primitivo, da mesma forma que o animal, não conhecia o trabalho e se alimentava com alimentos prontos. Um pouco mais tarde, manifesta-se na criança o instinto da curiosidade: escapar, subir, investigar tudo o que a rodeia, o que corresponde ao segundo nível do desenvolvimento histórico, quando a humanidade adotou o modo de vida nômade. O interesse das crianças pelos animais domésticos, em certa etapa, está vinculado à criação primitiva de gado. A tendência infantil a brigar e o instinto de luta são considerados ecos das cruentas lutas da humanidade na época antiga. Por último, a personificação generalizada dos objetos pela criança, seu amor a tudo o que é fantástico, seu apego às histórias, as formas primitivas de seus desenhos e de sua linguagem, encontram analogia no animismo dos [homens] selvagens, das crenças religiosas primitivas e dos mitos. De forma global, tudo isso permitiria afirmar que a criança realmente atravessa, durante seus poucos anos de vida, os muitos milênios vividos pela humanidade, e daí se extrai a conclusão pedagógica relativa à legitimidade desses fenômenos primitivos na infância, considerando que a criança é um pequeno selvagem e, portanto, exigindo que esses instintos não sejam combatidos e permitindo que a criança vivencie livremente os instintos primitivos e as tendências do selvagem. Por isso, a atenção desmedida com relação ao relato fantástico, à explicação animista que geralmente as crianças dão aos fenômenos do mundo, à crença em seres fabulosos, à personificação dos objetos, etc., transformaram-se em método pedagógico, em um modelo do qual dificilmente elas se livram até poderem contar com um professor mais avançado e com mentalidade científica. Esse princípio, porém, não pode ser considerado definitivo, pois não possuímos dados suficientes sobre a história do desenvolvimento da humanidade para poder julgar com base em analogias. Conhecemos apenas analogias isoladas, fragmentárias e, com freqüência, sumamente remotas que, de forma alguma, autorizamnos a dizer que todo o desenvolvimento da criança, em seu curso geral, repete a história do desenvolvimento da humanidade. Só se pode afirmar com certeza científica que alguns momentos do desenvolvimento da criança podem ser relacionados, ora mais próximos, ora mais distantes, de alguma forma a diferentes momentos da história da humanidade. De acordo com M arshall,? devemos admitir que, se a história individual repete a história da humanidade, nessa repetição há enormes capítulos totalmente omitidos, enquanto outros estão deformados até ficaram irreconhecíveis e outros ainda se apresentam em uma tal ordem que, em seu conjunto, essa repetição de nenhum modo pode ser reconhecida como uma verdadeira reprodução, mas apenas como uma desfiguração, distando de ser um princípio explicativo para o desenvolvimento da criança; pelo contrário, ele mesmo precisa ser explicado. Com tal limitação, essa lei perde sua atração e deixa de ser uma explicação universal para se transformar em um problema. "Explicar o desenvolvimento da criança apelando para o desenvolvimento da humanidade - diz o professor Kornilov" - equivale a explicar uma incógnita através de outra". Aplicado à psicologia do instinto, isso significa que também aqui devemos nos limitar a comparar alguns instintos da criança com formas análogas da atividade do [homem] selvagem, mas não podemos admitir que, no desenvolvimento dos instintos, haja um mecanismo direto e inerte de simples repetição da história que já passou. Se o fizéssemos, entraríamos em profunda contradição com o condicionamento social dinâmico da psique, que estabelecemos anteriormente [no Capo 4J, como princípio fundamental. É muito fácil dernons- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 91 trar que, no sistema do comportamento humaca de que era preciso reconhecer que os insno, os instintos constituem algo rígido, estátitintos eram guias sábios na causa da educaco, que só se movimenta por inércia. No sisteção. E, enquanto os primeiros sistemas ma real da conduta, os instintos também estão conclamavam a um combate aos instintos, os socialmente condicionados, também se adapsegundos consideravam que todo o sentido tam e modificam, também são capazes de pasda educação estava na observância, possivelsar para novas formas, como todas as demais mente inofensiva, do processo natural de seu reações. O professor não deve atribuir um sigdesenvolvimento. nificado essencial ao paralelismo no desenvolNão é difícil compreender que nenhum vimento dos instintos, mas ao mecanismo de desses pontos de vista pode ser admitido como sua adaptação social e posterior inclusão na correto, pois cada um deles contém uma parte rede geral do comportamento. QPONMLKJIHGFEDCBAverdadeira e outra errônea. O critério científico reconhece tanto aspectos negativos quanto positivos nos instintos e tende a afirmar, em D O IS C R IT É R IO S E X T R E M O S concordância com o ponto de vista geral sobre S O B R E O IN S T IN T O o processo educativo - assim como sobre o processo de domínio do crescimento espontâCom relação ao ponto de vista estático neo da criança -, que os instintos representam sobre o instinto, havia dois extremos em sua uma enorme força educativa que pode ser tanvaloração psicológica e pedagógica. Alguns to nociva quanto útil. A eletricidade do relâmviam nos instintos a herança do animal no ser pago mata, mas quando o homem a domina humano, a expressão das paixões mais desenela movimenta o trem, ilumina a cidade e transfreadas e selvagens, que tinham sobrevivido à mite de um lado ao outro da Terra a palavra época primitiva e selvagem, já vivida e supehumana. Da mesma forma, o psicólogo aborrada pela humanidade. Consideravam que os da os instintos como uma enorme força natuinstintos eram uma espécie de órgãos rudimenral, espontânea, que constitui um fato que pode tares, isto é, que em sua época tinham tido um ser útil ou nocivo. Os instintos devem nos sersignificado e uma missão biológica corresponvir: "São terríveis como amos e excelentes dentes à etapa mais baixa da evolução do orcomo servidores", diz um psicólogo norte-ameganismo. Com a passagem para a etapa supericano. Por isso, o problema não deve se resurior, esses órgãos passaram a ser desnecessários mir à observância ou à luta contra o instinto, e foram condenados a uma paulatina atrofia e mas a conhecer qual é sua verdadeira natureextinção. Daí a avaliação psicológica sumamenza psicológica, o que nos dará a possibilidade te baixa das capacidades instintivas e o lema de dominar essa força educativa. pedagógico de negar aos instintos todo valor educativo, a total falta de preocupação com o desenvolvimento do instinto e, por vezes, a O IN S T IN T O C O M O U M M E C A N IS M O exigência de combater, reprimir e frear os insDA EDUCAÇÃO tintos infantis. Todo o sistema pedagógico educava com o lema de lutar contra os instintos. Do ponto de vista psicológico, o instinto O outro critério, exatamente oposto, parece ser um poderoso impulso ligado às mais exortava a se render perante os instintos e complexas necessidades orgânicas, que por pretendia colocar o instinto como pedra funvezes atinge uma força totalmente insuperável. O instinto é o impulso e o estímulo mais damental do sistema educativo. Esses psicólogos consideravam que os instintos represenpoderoso para a atividade. Por isso, é compretavam a sábia voz da natureza, o mais perfeiensível que essa enorme força de impulso nato mecanismo de uma conduta infalível e justural deva ser plenamente utilizada na área da educação. Como a conduta instintiva não apreta, e lhes parecia que eles eram o modelo e o ideal de uma atividade perfeita. Dessas consenta - como já esclarecemos - formas rígidas siderações, extraía-se a conclusão pedagógie estabelecidas, ela pode se fundir nas formas I 92QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA de atividade mais diversas e, como um motor, pode colocar em andamento as mais distintas reações. É totalmente impossível reprimir ou sujeitar os instintos, pois isso significaria combater infrutiferamente a natureza da criança; caso essa luta fosse bem-sucedida, isso equivaleria a menosprezar e acabar com a natureza infantil, despojá-Ia de suas propriedades mais valiosas e importantes. Basta lembrar o tipo de pessoas insignificantes e indolentes, covardes diante da vida, totalmente inúteis, que eram produzidas pela educação czarista, para a qual a repressão do instinto era fundamental. Todo o potencial da criação humana, o mais alto florescimento do gênio, não são possíveis no solo raquítico e anêmico da destruição dos instintos; pelo contrário, devem provir de seu flores cimento total e da tensão repleta de vida de suas forças. O psicólogo norte-americano Thorndike diz mais ou menos o seguinte sobre o instinto:" Não se pode fazer o rio Niágara recuar para o lago Erie e retê-lo lá, porém é possível, mediante a construção de canais de derivação, dar uma nova direção para suas águas e obrigá-I o a nos servir, colocando em movimento das de fábricas e oficinas. as ro- O mesmo ocorre com o instinto, que constitui uma imensa força natural, é a expressão e a voz das reivindicações naturais do organismo; isso não quer dizer, porém, que deva ser uma força terrível e destruidora. O instinto, bem como todas as outras formas de conduta, surgiu da adaptação ao meio, mas, como os instintos representam formas de adaptação muito antigas, é lógico que, com a mudança do meio, essas formas de adaptação tenham se tornado inadequadas ante circunstâncias mutantes. Portanto, aparentemente há certa falta de correspondência entre o instinto e o meio. Como exemplo dessa falta de harmonia, podemos nos referir ao instinto de autoconservação em sua forma defensiva e agressiva, conservada até os dias de hoje. O instinto de temor e de fuga do perigo é, sem dúvida, uma das conquistas biológicas mais benéficas no reino animal. Está correta a expressão: "O medo é o guardião da humanidade". Sem o medo, é provável que a vida não tivesse podido se desenvolver até suas formas superiores. É sumamente útil que, diante do perigo, o animal fuja de forma instintiva. No entanto, nos últimos séculos, as condições de vida modificaram-se tanto que, diante do perigo, a fuga instintiva deixou de ser [necessariamente] a reação mais adequada para o ser humano. Para uma lebre é útil que, diante do mais leve ruído, suas orelhas se ergam e todo o seu corpo trema, pois isso a protege do caçador e do predador. Entretanto, nem sempre é útil que o ser humano, ao se deparar com um perigo, empalideça, comece a tremer e fique sem voz. As condições do ambiente variaram tanto que o ser humano deve reagir ao perigo de modo completamente diferente. O mesmo ocorre com a cólera. Para um animal carnívoro que se depara com um inimigo, é sumamente útil que lhe mostre seus dentes de forma reflexa, que o sangue flua até sua cabeça, as patas fiquem tensas para atacá-lo, mas para o ser humano dificilmente será útil que, em um acesso de cólera, seus pômulos fiquem tensos e ele aperte as mandíbulas e os punhos. Em outros termos, os instintos como forma de adaptação elaborada em determinadas condições, só podem ser úteis nessas condições; em condições modificadas, porém, podem estar em desacordo com o ambiente e, então, a educação é que terá de eliminar essa falta de harmonia e fazer com que os instintos novamente entrem em concordância com as condições do meio. Toda a cultura humana relativa ao próprio homem e ao seu comportamento não passa dessa adaptação dos instintos ao ambiente. o C O N C E IT O D E S U B L IM A Ç Ã O Para a velha psicologia, a psique humana limitava-se ao estreito âmbito de suas vivências conscientes. Por isso, eram incompreensíveis e enigmáticos para ela todos os fenômenos psíquicos dos quais o homem não é consciente, mas que, imperiosa e insistentemente, manifes- P S IC O L O G IA tam-se na esfera do comportamento. Os psicólogos propuseram que esse campo de reações que determina nosso comportamento fosse chamado de esfera subconsciente ou subliminar ([do latim] JIHGFEDCBA l i m e n = umbral), isto é, que se encontra sob o umbral da consciência. Por meio de pesquisas, ficou evidente que na esfera subconsciente jazem certas tendências, certos impulsos instintivos, que, por algum motivo, não puderam ser satisfeitos. Entraram em conflito com outras forças psíquicas e foram exilados para o terreno inconsciente, parecendo que não exercem influência sobre nossa condutarNo entanto, apesar desse deslocamento, continuam existindo e exercendo sua ação no processo do curso das reações. Ao mesmo tempo, essa ação pode ser de duplo caráter, de acordo com o resultado do conflito. Se o conflito adota formas duradouras, as tendências e os desejos deslocados exercerão uma ação perturbadora e desorganizadora sobre o curso das reações e utilizarão cada oportunidade para penetrar novamente na consciência, irromper em seus processos e dominar o mecanismo motor. Nesse caso, sempre temos no subconsciente um inimigo raivoso, menosprezado, encurralado na clandestinidade. O desenlace desse conflito por vezes adota as formas mórbidas da doença neurótica. A neurose propriamente dita é uma forma de doença em que o conflito entre os instintos e o meio leva à insatisfação daqueles, ao deslocamento das pulsões para a esfera subconsciente, a uma grave dissociação da vida psíquica. Embora esses conflitos não assumam formas claramente mórbidas, eles continuam sendo, na realidade, uma anormalidade e podemos dizer francamente que o sistema de educação que não resolve a questão do instinto é uma fábrica de neuróticos. O refúgio na neurose é a única saída para as paixões que não foram satisfeitas e para os P E D A G Ó G IC A 93 mação da energia mecânica, luminosa, elétrica, etc., na psique o funcionamento dos diferentes centros não é algo fechado e isolado, mas algo que admite a possibilidade de transição de certas tendências para outras, de algumas reações para outras. Denomina-se sublimação a transformação dos tipos inferiores de energia em tipos superiores, mediante a repressão ao subconsciente. Portanto, do ponto de vista psicológico, existe um dilema com relação à educação dos instintos: neurose ou sublimação, isto é, um eterno conflito entre as paixões insatisfeitas com nosso comportamento, ou a transformação das paixões inadmissíveis em formas mais elevadas e complexas de atividade. A EDUCAÇÃO D O IN S T IN T O SEXUAL Para esclarecer todos os problemas do instinto, vejamos, por exemplo, o instinto sexual e sua educação. O fato de que o instinto sexual seja o mecanismo biológico mais poderoso de preservação da espécie e que, se ele se esgotar, a vida se extingue, não requer esclarecimentos especiais. Também é evidente que, psicologicamente, o instinto sexual representa a mais poderosa fonte de impulsos psíquicos, sofrimentos, gozos, desejos, dor e alegria. O problema da educação sexual sempre foi resolvido de diferentes maneiras, mas adotou formas penosas nas últimas décadas, em que a moral burguesa, por um lado, e as condições culturais, por outro, junto com o regime do sistema educacional, levaram o problema a um beco sem saída, sem oferecer nenhum modo de resolvê-lo, É difícil imaginar algo mais terrível que a atitude relacionada à vida sexual de uma escola do passado próximo. O problema sexual foi oficialmente desterrado da vida escolar e considerado inexistente. Essa ignorância do problema fez com que se lutasse contra todas as manifestações instintos não-realizados. do sentimento sexual e se declarasse que todo O conflito adotará uma forma diferente esse campo era sujo e ruim; a isso os educanquando as paixões deslocadas da esfera da consdos responderam com neuroses, com graves ciência adotarem formas mais elevadas, quandramas ou colocaram na clandestinidade essa do se transformarem em formas superiores de magnífica força do corpo humano; [isso fez energia psíquica. Esse caso é chamado de s u b l i com que] a educação e a instrução sexual pasm a ç ã o . Assim como na física ocorre a transfor- QPONMLKJIHGFEDCBA 94QPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA sassem às mãos de criados e colegas corruptos. Daí provêm todas as formas de anormalidades sexuais que tão tragicamente cortaram as próprias raízes da vida e encontraram guarida na escola. Devemos contrapor à velha escola duas teses fundamentais relacionadas à questão. Em primeiro lugar, a rejeição do critério de que a infância é uma idade angelical assexuada e que, portanto, o problema sexual não existe nessa faixa etária. Em segundo, a eliminação da educação sexual do sistema comum de influências educativas, a total anulação desse âmbito vital na juventude e a mera proibição burocrática imposta a essas questões é a pior de todas as saídas. O novo ponto de vista nos obriga a admitir que o estado infantil não deve ser concebido como totalmente assexuado até o período de amadurecimento sexual. Ao contrário, a pesquisa psicológica mostra que até na infância existe uma sexualidade infantil e diferentes manifestações patológicas e normais referentes a ela. A masturbação nos primeiros anos da puberdade e até na primeira infância é um fenômeno estabelecido há muito tempo pela prática médica. A prática da psicanálise, assim como a pesquisa que envolve adultos portadores de doenças mentais, desvelou o conflito no qual se incluem vivências sexuais infantis. Essas vivências sexuais adotam formas totalmente diferentes das adultas. Em primeiro lugar, na infância existe uma forma de erotismo amplamente distribuído, não-vinculado ao funcionamento dos órgãos sexuais, não-localizado em lugares rigorosamente delimitados, mas estimulado pelas aferências dos mais diversos órgãos e ligado, sobretudo, às membranas mucos as do corpo e às zonas erógenas. O caráter desse erotismo diferencia-se do erotismo adulto: adota a forma do auto-erotismo, isto é, um erotismo dirigido para si mesmo, e de um narcisismo psicologicamente normal, ou seja, um estado tal que as excitações eróticas partem do próprio corpo e se resolvem nele. Seria totalmente inadmissível supor que um sistema tão importante como o sexual pudesse existir de forma absolutamente independente de todo o resto e manifestar-se de repente a certa idade. No período imediato posterior, o erotismo infantil adota novas formas. Costuma estar orientado para as pessoas mais próximas da criança e introduz um componente complexo em sua atitude com relação à mãe e a outras pessoas. O sentimento da diferença sexual está ausente nas crianças, mas com muita freqüência nos deparamos com paixões infantis, que com freqüência são impulsivas e intensas. Em geral, podemos dizer que em todo esse período da vida da criança o instinto sexual assume formas ocultas e não-manifestas, e que, em condições normais, ele segue o caminho da sublimação. No início da puberdade, observamos no comportamento de meninos e meninas uma série de peculiaridades que os transformam em pequenos homens e pequenas mulheres. Em todos esses casos, estamos, sem dúvida, diante do instinto sexual sublimado. M uito mais complexo é o problema da educação do instinto sexual no período de amadurecimento sexual [puberdade], quando as paixões despertadas não encontram saída nem satisfação e se manifestam por meio desse estado tempestuoso, confuso e inquieto da psique que todos vivenciam durante o período da adolescência e juventude. Aqui o sentimento sexual adota inevitavelmente o caráter de um conflito, cujo feliz resultado só é possível caso ocorra a necessária sublimação, isto é, se as forças tempestuosas e daninhas do instinto forem orientadas por canais adequados. Como objeto da educação, o instinto sexual exige adaptações à estrutura social da vida não contrárias às formas estabelecidas da mesma, e a tarefa em geral não consiste em reprimir ou enfraquecer o instinto sexual. Ao contrário, o educador deve se preocupar com sua preservação plena e seu desenvolvimento normal. A divergência fundamental desse instinto com as condições ambientais reside no fato de que o instinto, em suas formas hereditárias, naturais, é completamente indiferente, cego e não tem conexão com o fim primordial ao qual serve. O instinto sexual do animal e do ser humano está orientado para todos os seres do sexo oposto. A diferença essencial que a cultura introduz na conduta sexual radica no caráter pessoal eletivo que o sentimento sexual adota no ser humano. A partir do momento em que esse P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 95 instinto se orienta para uma pessoa determizem as crianças, de bebês encontrados em renada e parece se extinguir com relação a todas polhos, evidenciam-se logo como falsas, colocam sobre o tema um manto de silêncio, desas restantes, deixa de ser um instinto animal e pertam a curiosidade das crianças, que relaciose transforma em sentimento humano. Romeu nam tudo isso, em sua compreensão, a algo e Julieta não puderam sobreviver um sem o ruim e vergonhoso, impelindo-as a tentar saoutro, apesar de, em Veneza, haver muitas moças e rapazes belos' que podiam ser seus ber tudo através de fontes inadequadas e corruptas, que turvam e sujam a psique e a imagiesposos. M as Romeu precisava apenas de nação infantis. Nesse sentido, o fato de a crianJulieta, e ela só queria seu Rorneu.'? No munça conhecer a verdade sobre a vida sexual do dos animais esse fato seria inconcebível e a transforma-se em uma imperiosa necessidade partir daí é que começa o humano no instinto sexual. Por esse motivo, os psicólogos contempsicológica, e o lema dos professores com reporâneos devem re al izar uma profunda lação a essa questão passou a ser a expressão: reavaliação dos valores ná pedagogia sexual. "M elhor um dia antes que uma hora depois". O amor juvenil, que nos últimos tempos Entretanto, temos de rejeitar a valorização exagerada da instrução sexual, pois seu era considerado algo inadmissível e nocivo significado é limitado e, com freqüência, conentre nós e, por isso, adotava as formas anôvencional. Acima de tudo é impossível consimalas da sedução ou da conquista frívola, para derar a instrução sexual como um recurso funo novo psicólogo é o único meio de humanizar o instinto sexual. Esse amor ensina a limitar o damental da educação sexual. O ser humano instinto e a orientá-lo em uma só direção, cria pode ser muito instruído e muito mal-educado no aspecto sexual. Os instintos são demasiado a capacidade fundamental de estabelecer relações totalmente excepcionais com uma só complexos e sutis para que possam ser combapessoa, diferenciando-a de todas as outras retidos e submetidos apenas com conhecimenlações humanas e concedendo-lhe um signifitos. A instrução sexual, assim como toda norcado exclusivo e profundo. O amor na juvenma moral, é totalmente impotente com relatude é a forma mais natural e inevitável de ção às tendências reais, não pode lhes dar a sublimação do instinto sexual. E o objetivo fidireção necessária. O fato de compreender nal, o fim último dessa educação consiste apecomo se deve agir não significa, de forma alguma, que alguém vai agir de forma correta. nas em ensinar o amor às pessoas. A outra diAo contrário, com muita freqüência isso devergência entre o instinto e o ambiente é a falta de harmonia entre sua não-utilização prátitermina colisões muito dolorosas na conduta infantil. Por exemplo, as explicações e indicaca e a enorme tensão que transmite e, nesse ções sobre os problemas causados pela sentido, a tarefa da educação não reside em masturbação infantil, a intimidação, etc., são orientar o instinto pela linha da menor resistência, nem pelo caminho mais curto e simtotalmente ineficazes na luta contra a mas tu rples da satisfação imediata, mas através de um bação infantil." A parte fundamental do dano surgiu de uma instrução inepta, porque a intilongo, difícil e belo caminho. Por último, é preciso vencer o instinto midade da criança criou um penoso conflito cego, introduzido na esfera comum da consentre uma tendência invencível que não enciência, vinculá-lo ao resto do comportamencontra outra saída e a consciência atormentadora da culpa, do temor e da vergonha. Incato, ligá-lo à meta e à função que está destinado a cumprir. Há muito se promove a instrupaz de superar esse conflito, a criança sofre muito mais por causa de perigos imaginários ção sexual como medida educativa fundamental. Entendemos por instrução sexual fazer com que reais. Além disso, nem sempre a instrução sexual leva em consideração a psicologia dos que as crianças conheçam, desde a idade mais interesses da criança. É comum' que, nos matenra, o critério científico sobre a vida sexual. A rigor, não se pode deixar de reconhecer as nuais estrangeiros, se ofereça material às crianças sem levar em conta seus genuínos interessaudáveis forças educativas da instrução sexual. Todas as histórias de cegonhas que tra- QPONMLKJIHGFEDCBA ses. Por exemplo, o processo. de reprodução dos 96QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA vegetais e animais, com o qual geralmente se inicia a instrução sexual, interessa menos à criança que a questão de saber corno nasceu seu irmãozinho. Por outro lado, ainda não está ao alcance da criança captar [dois] processos tão distantes corno a geminação dos vegetais e o nascimento de urna criança mediante urna idéia comum; ela não pode compreender a unidade de ambos. Por último, o extraordinário tato que é necessário na questão da instrução sexual também se deve ao fato de que a criança, na verdade, não compreende nenhum tipo de conhecimento abstrato e não vai saber separar essas novas informações em um grupo especial, mas as combinará com seu próprio instinto de curiosidade e investigação, isto é, os objetivos da instrução sexual podem estar acima das possibilidades da criança. Tudo isso, naturalmente, nos leva a encarar a instrução sexual com a maior cautela, ainda que não deva ser totalmente rejeitada. Deve-se reconhecer a ela um valor relativo e adiá-Ia, por considerações psicológicas, para urna idade posterior, quando os três perigos ligados a ela, corno o interesse pelo concreto, a incapacidade de fazer generalizações científicas e a utilização prática de qualquer conhecimento diminuam consideravelmente. Ligada a outras medidas educativas, a instrução sexual ministrada com certo tato pedagógico pode ser sumamente útil e importante. O mecanismo da educação do instinto sexual consiste nessa sublimação quejá mencionamos. Observou-se há tempo que a secreção interna das glândulas sexuais está intimamente relacionada às formas superiores da atividade humana, da criação e do gênio. Em particular, as raízes sexuais da criação artística são completamente evidentes. Os antigos gregos compreendiam tão bem esse nexo que chamaram de Eros não só a força da atração sexual, mas também a tensão entre a criação poética e o pensamento filosófico. Platão'" expressou muito fielmente, ainda que de forma mítica, essa profunda verdade. Conforme sua teoria, o mais baixo e o mais elevado combinam-se em Eros, que é representado corno filho do deus da abundância e da deusa da miséria: "é pobre, grosseiro, sujo, dorme sobre a terra sem se cobrir, porém sempre busca o bem e a beleza, é um grande mago e feiticeiro"." Schopenhauer expressou essa mesma idéia quando destacou que a máxima tensão da criação aparece precisamente quando o desejo sexual am adurece." E é fácil perceber, através da experiência, que toda perturbação e todo esgotamento do sentimento sexual são acompanhados do enfraquecimento e da agonia da criação. Não é assombroso que a idade mais criativa do ser humano seja a da plenitude sexual. Daí que a sublimação do instinto sexual, isto é, seu deslocamento ao inconsciente para interesses mais elevados, para alimentar a partir de lá a criatividade, seja a linha fundamental da educação sexual. Todos sabem até que ponto [a criatividade] é facilitada por esse estado peculiar de tempestade e estímulo, por essa sede de façanhas, por essa enorme quantidade de aspirações que há na juventude. Nesses casos, o professor não deve criar artificialmente nenhuma fonte para a sublimação. Ajuventude é a idade da criatividade natural, e o professor só tem de escolher a direção para a qual a sublimação deve ser encaminhada. A segunda fonte de sublimação, não menos rica que a criação pessoal, pode ser as relações sociais, que também são urna espécie de canais naturais pelos quais é orientado o instinto sexual sublimado. A amizade e o companheirismo, os profundos afetos e vínculos espirituais que unem os jovens nesse período não têm paralelo em nenhum outro período da vida humana. Urna amizade corno a juvenil não ocorre em nenhuma outra idade do ser humano. E, sem dúvida, essas relações sociais se alimentam, em última instância, na mesma fonte que a criatividade juvenil. Ao mesmo tempo, deve-se levar em conta que a sublimação é um processo interno, profundamente íntimo, de agonia da semente para voltar a germinar. A S P R E M IS S A S P S IC O L Ó G IC A S DA EDUCAÇÃO M IS T A Resta-nos considerar o problema relacionado aos meios que permitem chegar a essa sublimação. Todos podem compreender que os recursos da prédica moral e também os da instrução sexual são completamente inoperantes P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 97 para se contrapor aos intensos focos de excitanhoso e indecente, e com quem estão excluíção que surgem graças à atividade sexual. A das antecipadamente todas as relações de companheirismo, e vice-versa. No sistema de eduesta é preciso contrapor focos igualmente incação czarista, no antigo secundário, por exemtensos e que ajam de forma permanente. Isso plo, a relação entre os sexos ocorria apenas não se consegue isolando a educação sexual como uma questão especial, mas criando um em algumas formas de comunicação! como - clima sistemático de trabalho que corresponda bailes durante as festas, namoricos secretos e aos interesses vitais dos jovens e que repreflertes frívolos. Subentende-se que isso contrisente um sistema bem-organizado de canais buía para criar um ambiente peculiar fechado de derivação que possam abranger e orientar e doentio na relação sexual, no qual o instinto a energia sexual sublimada. Precisamente na sexual era deslocado e limitado, porém, como criação desses canais reside a tarefa da educanão tinha saída nem utilização racional, manição sexual, que deve ser resolvida, portanto, festava-se impetuosa e vivamente nas formas em um lugar à margem das questões do sexo. mais animais, bruscas e grosseiras. A única medida de caráter social necesDevido a essa educação, naturalmente, sária é a prática da educação conjunta de amelaborava-se o critério de que, com a mulher, o bos os sexos, que se tornou habitual para nosúnico relacionamento possível é o sexual, que a sa escola, mas que ainda não obteve aceitação mulher é, acima de tudo, uma fêmea, e que toda geral e continua se deparando com objeções. pessoa do outro sexo, só por isso, é o mais inAs premissas psicológicas desse sistema são tenso excitante do instinto. Em nenhuma partotalmente simples e claras. A primeira delas te, nem nos locais mais depravados, a opinião consiste na regra psicológica básica conforme sobre a mulher estava tão ligada às peculiaria qual, se quisermos extinguir a força de um dades sexuais quanto nos mosteiros. Por ser suexcitante, devemos preocupar-nos em tornámamente raro, o excitante conservava uma ex10 constante, habitual, totalmente imperceptítraordinária força em sua ação, e o sistema desvel e incapaz de provocar uma reação especial. sa educação é chamado acertadamente de sisQuanto maior for a quantidade de combinatema de excitação do instinto sexual. Também ções em que esse excitante estiver presente, é muito convincente o fato de que, quanto mais tanto mais fácil será fazer com que ele se torrigoroso fosse o sistema de educação separada, ne imperceptível e relativamente neutro. Deiquanto mais isolados estavam os dois sexos, o xaremos de notá-lo, da mesma maneira que instinto adotava formas mais agudas e desagranão percebemos a luz, o ar ou uma situação dáveis, como ocorria, por exemplo, nos centros habitual, e elaboraremos as reações automátide ensino fechados, exclusivos para homens ou cas, mais sutis e finas, sólidas e breves em seu mulheres. tratamento. Em segundo lugar, ao estarem em comuAssim, a primeira tarefa da educação senicação constante entre si, ao estabelecerem xual é enfraquecer essa reação ante qualquer milhares das mais diversas e complexas relapessoa do sexo contrário. A educação não-mista ções entre si, tanto meninos como meninas realça exatamente o objetivo oposto. Como aprendem a não reagir, a não perceber as pardeseja isolar os excitantes sexuais, preservanticularidades sexuais; estas se tornam habitudo assim o instinto de uma manifestação preais e não-obsessivas, não-irritantes, compreenmatura, a educação separa e destaca a difesíveis. A partir daí não se percebe mais o sexo, rença entre os sexos, exclui a existência de um da mesma forma como acontece com a luz, o centro de comunicação entre ambos, concenar ou o corpo. Criam-se canais vastos e podetrando toda a atenção dos educandos nas diferosos pelos quais a excitação sexual pode fluir, renças sexuais. A partir dos primeiros anos de de modo que a tarefa da sublimação já se reescolaridade, o menino aprende a olhar para a solve, em grande parte, por esse fato. menina como um ser completamente diferenEm terceiro lugar, o mais importante: a te, com outros interesses, cujo tratamento não possi_bilidade de realizar a principal tarefa da é permitido e constitui algo impróprio, vergo- QPONMLKJIHGFEDCBA educação do instinto sexual, isto é, a elabora- 98QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ção da função seletiva, a capacidade de fazer convergir e concentrar o amor em uma só pessoa, vai se formando de forma ótima sobre o pano de fundo do amortecimento dos excitantes sexuais. Além disso, a comunidade de interesses pode diluir o componente puramente sexual do amor juvenil em uma pluralidade de outras manifestações da simpatia e, dessa forma, serão obtidas as formas mais sutis e complexas da sublimação. Os jovens devem passar, inevitavelmente, por sua "etapa de cavalheiros" com relação à mulher. Agir como "cavalheiro", como categoria psicológica, é uma forma de educação sexual: Contra a educação mista, costuma-se argumentar que existem diferenças fisiológicas e psicológicas entre meninos e meninas, e que essas diferenças clamam por sistemas e programas educativos diferentes, como ocorria entre nós quando o ensino médio feminino distinguia-se do masculino tanto pelos seus programas quanto pelo sistema de educação. Não é difícil perceber que essas exigências eram, na maioria das vezes, de caráter social, e provinham de fontes totalmente diferentes. Acima de tudo, levavam-se em conta os diversos destinos para os quais se preparavam meninos e meninas na escola burguesa. O ideal da educação dependia do tipo de vida que o futuro reservava para homens e mulheres. Em outras palavras, isso se devia à correspondência entre a escola e o meio social que, como já vimos, é a principal regra da pedagogia. Atualmente, devido à reorganização revolucionária do sistema social, como é lógico, também mudam as relações na escola. E visto que uma ética igualitária da vida sexual se transforma em norma fundamental tanto para o homem quanto para a mulher, acaba a necessidade de se ter uma educação especial para esta. Por último, as diferenças puramente psicológicas entre um menino e uma menina, assim como as diferentes capacidades para algumas matérias, por exemplo, a tão propalada inépcia das meninas para a matemática ou para as atividades dinâmicas, também não são dons primariamente condicionados, mas derivados do papel histórico da mulher, em que a diferenciação das funções sociais a condenava ao ( K in d e r ; K ü c h e , estreito círculo dos quatro K JIHGFEDCBA [em alemão], ou seja: filhos, cozinha, vestidos e igreja. No entanto, não resta dúvida de que existem diferenças essenciais no comportamento de meninos e meninas, resultantes de suas diferenças sexuais e que se manifestam bastante prematuramente. Todas essas diferenças, em grande parte, estão relacionadas aos instintos, porém também aqui é sumamente difícil dizer até que ponto desempenha um poderoso papel o exemplo contagioso do meio social e da imitação das crianças. Por exemplo, quando brincam de bonecas e evidenciam outras manifestações do instinto paterno ou materno, sem dúvida encontramos uma cópia mais ou menos exata das relações que a criança enxerga em casa. Sem dúvida, há uma diferença psicológica essencial entre meninos e meninas, mas essa diferença é de tal índole que não pode ser levada em conta nos manuais e programas educativos. A tarefa da escola não reside em medir todos os alunos com a mesma régua; pelo contrário, um dos objetivos da estruturação do meio social escolar consiste em obter a organização mais complexa, diversa e flexível possível de seus elementos. Esses elementos não devem ser incompatíveis e devem concordar com o sistema. Em um sistema rico e flexível, as diferenças sexuais podem facilmente ser levadas em consideração durante a influência educativa. E, como a premissa psicológica básica de nossos sistemas educativos é estabelecer na escola os vínculos que posteriormente serão necessários na vida, devemos impregnar de antemão a escola com uma rede dessas relações não-sexuais, que depois serão imprescindíveis na vida. E isso pressupõe a mais ampla comunicação de ambos os sexos na escola como base do sistema educativo. Ainda resta uma última questão sobre a defesa da educação separada para meninos e meninas durante o período da idade de transição," vivenciada com particular dramaticidade e em períodos diferentes por ambos os sexos. Percebe-se facilmente que essa proposta apresenta todas as falhas de um meio compromisso e evidencia ainda mais sua falácia. Nos fatos, se admitimos o papel sexual saudável da educação mista, também temos de reconhecer K le id e r ; K ir c h e P S IC O L O G IA que sua necessidade nunca é sentida de forma tão aguda e poderosa quanto nos anos críticos do amadurecimento sexual. E, se estamos de acordo que a educação separada destaca as diferenças sexuais, irrita e instiga o instinto sexual, também concordamos que o dano dessa irritação nunca é tão forte e perceptível como nesse período. Portanto, a particularidade desses anos, no sentido de ser o período mais crítico da vida sexual, não só não enfraquece, mas acentua a necessidade psicológica da educação mista. .'QPONMLKJIHGFEDCBA A A P L IC A Ç Ã O P E D A G Ó G IC A D O S IN S T IN T O S A primeira questão com a qual o professor se depara é o problema geral da direção em que os instintos devem ser orientados. A regra mais geral será aqui a utilidade social do instinto e a possibilidade de utilizá-I o nas formas mais inofensivas, cultas e aceitáveis. Deixando de lado a pedagogia da repressão do instinto, há dois pontos de vista possíveis sobre a questão. O primeiro ponto de vista, conservador, ressalta a necessidade de superar os instintos, isto é, de educar no sentido de que o instinto, assumindo formas inofensivas e pacíficas, permita reagir às excitações ligadas a ele por meio de atividades artificiais. Assim, por exemplo, menciona-se a paixão de colecionar como uma forma inofensiva de superar o instinto de cobiça e acumulação. Também se sugere o esporte como uma forma de superar os instintos de luta, a vontade de lutar e a rivalidade. Ao mesmo tempo, se propõe a criação de tipos de atividade - como se fossem válvulas de segurança do instinto - em que a energia instintiva excessiva possa ser liberada. Destaca-se que essa superação dá resultados psicológicos excelentes, que o ser humano que colecionou muito em sua infância nunca manifesta cobiça nem avareza mais tarde e que, portanto, é preciso criar tipos substitutivos de atividade em que o instinto, ainda que conserve todas as suas peculiaridades, esteja orientado para um objeto inocente. Tudo consiste na direção que se dá ao instinto, no lado para P E D A G Ó G IC A 99 o qual ele é orientado. Aqui reside a essência do problema, dizem os partidários desse critério. No prazer de colecionar conserva-se toda a força, a agudeza e a paixão da tendência instintiva à acumulação, porém orientada para selos postais ou cachimbos, o que a torna, portanto, inócua. Através do esporte elimina-se toda a força do instinto de rivalidade, o desejo de vencer o inimigo, de superar o concorrente, de causar uma contrariedade ao outro, de abrir caminho ou obter sucesso deslocando os outros; essas qualidades sociais duvidosas adquirem então uma orientação inofensiva, pois o dano é causado no tabuleiro de xadrez ou na pista de críquete, a concorrência se exprime no melhor lançamento de martelo ou na forma de chutar a bola de futebol. No entanto, é fácil perceber que esse ponto de vista apresenta algumas falhas. Em primeiro lugar, ao se criar e cultivar atividades artificiais desse tipo, corre-se o risco de se formar uma série de paixões e parcialidades e de se criarem pessoas excêntricas. Algo frívolo e ofensivo para a vida, algo pouco inteligente está presente na paixão desmedida pelas satisfações mais inocentes, e o caçador fanático que se ocupa de trivialidades ou aquele que borda tule com fios de seda, ainda que seja inofensivo, como o célebre personagem de Gogol," representa uma espécie de caricatura da personalidade. Compreende-se facilmente que, com um forte desenvolvimento do instinto, obteremos inevitavelmente essas formas de excentricidade e, por isso, temos de admitir que o princípio de superação dos instintos não representa uma solução radical do problema. Em segundo lugar, esse princípio educativo é antieconôrnico. Ele se propõe a tornar o instinto inofensivo, porém a questão reside em sua utilização; ele gasta em vão, em objetivos insignificantes e vazios, as mais preciosas forças da ambição, do ímpeto e da perseverança humanas. Em terceiro e último lugar, nem sempre esse princípio alcança seus objetivos. Não reeduca o instinto, mas apenas a esfera de sua aplicação. O instinto não' é superado, mas, pelo contrário, assim como ocorre com um jogador ou colecionador fanático, com freqüência ele se torna mais estável, tenaz e 100 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA é reforçado sem cessar. Portanto, obtém-se continuamente o enraizamento e o reforço do instinto, em vez de sua superação. Por isso, na pedagogia dos instintos devese promover outro princípio, em vez da superação dos mesmos: sua máxima utilização no processo educativo. Desse ponto de vista, devese construir cada vez com maior decisão os sistemas de educação, tomando como base as tendências instintivas da criança. Ao mesmo tempo, é preciso reelaborar formas da atividade instintiva que ajudem a orientá-Ia pelo caminho de um desenvolvim.ento educativo útil. Nesse sentido, o mesmo 'princípio psicológico de formação de novos vínculos, que ocorre no caso dos reflexos condicionados, transformase na base da educação. No processo da atividade e da reação, os instintos passam facilmente de um para o outro. Assim como no caso do cavalheiro cobiçoso de Pushkin.!? o desejo de poder gerou a cobiça, porque a conquista do poder estava vinculada a uma incessante acumulação de dinheiro. Da mesma maneira, a lei psicológica fundamental reside na passagem de um instinto ao outro, na transformação de qualquer atividade de meio em um fim em Si mesmo. É sumamente fácil explicar a diferença psicológica de ambos os princípios com base nos exemplos mencionados. Colecionar selos, que é uma atividade infrutífera e desnecessária, pode se transformar em um valioso meio educativo se for combinado com alguma atividade mais complexa, como o estudo inicial da geografia, a prática da correspondência internacional, a avaliação estética dos selos; nesse caso, o fato de colecionar, combinado com uma atividade mais complexa, tornará realmente possível transferir o instinto de acumulação dos selos para o conhecimento geográfico relacionado a eles ou para o sentimento de comunicação internacional. Aqui ocorre uma efetiva conquista do instinto, quando a tendência inata à acumulação e à apropriação começa a nutrir e a impulsionar a paixão por acumular conhecimentos ou por conhecer o mundo inteiro. Ou, no caso do xadrez, a complexidade das combinações mentais, a necessidade do mais complicado traba- lho mental em cada momento em que pensa- mos nos movimentos mais adequados, transforma-se primeiro em um simples meio e em uma necessidade para alcançar o objetivo do jogo, mas pouco a pouco deixa de ser um meio para se transformar em um fim em si mesmo; para um bom enxadrista, o momento puramente emocional da luta, o triunfo e a defesa deslocam-se para um segundo plano em comparação com o prazer do pensamento abstrato e da solução das tarefas mais complexas. A satisfação sentida por um enxadrista com suas jogadas não é mais a mera satisfação de derrotar o adversário, mas a satisfação infinitamente superior de ter resolvido acertadamente um problema, de ter encontrado a saída correta para uma situação confusa. Se isso fosse psicologicamente falso, o interesse do jogo contra um adversário fraco - se as demais condições são iguais - seria exatamente o mesmo que jogar contra um forte. O princípio geral pode ser formulado da seguinte maneira: a regra pedagógica básica da educação dos instintos não exige sua mera anulação, mas seu uso e sua transferência para tipos mais elevados de atividade. O S IN T E R E S S E S IN F A N T IS A principal forma de manifestação do instinto na infância é o interesse, ou seja, a inclinação particular do aparelho psíquico da criança para este ou aquele objeto. Os interesses têm um significado universal na vida infantil. Tudo o que fazemos, inclusive o menos interessante, como diz Thorndike, tem a ver com o interesse, mesmo que este seja negativo: o medo do desagradável. Portanto, o interesse é uma espécie de motor natural do comportamento infantil, é a fiel expressão de uma inclinação instintiva, o indicador de que a atividade da criança coincide com suas necessidades orgânicas. Por isso, é fundamental que todo o sistema educativo e o ensino sejam construídos em função dos interesses infantis. Uma lei psicológica diz o seguinte: antes de tentar incorporar a criança a qualquer atividade, temos de despertar seu interesse pela 101 PSICOLOGIA PEDAGÓGICARQPONMLKJIHGF mesma, temos de nos preocupar em saber se ela está preparada para essa atividade, se possui todas as forças necessárias para ela e se está preparada para agir sozinha; ao professor corresponde apenas dirigir e orientar sua atividade. Até a mímica externa do interesse mostra claramente que o interesse denota a disposição e a preparação do organismo para certa atividade, acompanhadas de uma elevação da vitalidade geral e de um sentimento generalizado de satisfação. Quem escuta com interesse retém a respiração, orienta o ouvido para o lado do falante, não deixa de observá10, abandona qualquer outro trabalho e movimento e, como se costuma dizer, "fica todo ouvidos". Essa é a mais evidente expressão da concentração total do organismo em um único ponto, de sua completa redução a apenas um tipo de atividade. Ao mesmo tempo, deve-se levar em consideração um perigo essencial com o qual o professor se depara e que consiste em que, com o desejo de se interessar por algo e a todo custo, surja facilmente uma substituição de interesses. Provoca-se o interesse, mas não o que é necessário e para aquilo que é necessário. Em um manual de psicologia americano apresenta-se um relato eloqüente. Em uma escola rural, uma professora que pretendia ensinar geografia decidiu começar por ensinar às crianças o que era acessível, próximo e compreensível para elas - os campos, as colinas, os rios e as planícies que as rodeavam. No entanto, isso não despertou nenhum interesse nas crianças. O que aconteceu era que a professora anterior, desejando interessar as crianças para lhes explicar o que é um gêiser, tinha trazido uma bola de borracha com um orifício; ela a encheu de água, escondeu-a deliberadamente em um monte de areia e, pressionando com o pé no local adequado, fez com que o jato de água surgisse de debaixo da areia, para entusiasmo geral da criançada. Essa mesma professora, quanto tentou explicar um vulcão, tinha utilizado um pedaço de algodão encharcado com enxofre e o tinha colocado em uma pequena montanha de areia, para fazer de conta que era uma cratera. Tudo isso despertou o maior interesse nas crianças, e elas declararam à nova professora: '~á sabemos tudo isso, seria melhor que nos mostrasse fogos de artifício, como Miss N."; "ou uma seringa de borracha", propôs outra criança. Podemos perceber facilmente, por meio desse exemplo, que um interesse foi substituído pelo outro de forma errônea. Sem dúvida, a primeira professora conseguiu despertar o mais vivo interesse das crianças, mas era um interesse pelo truque, pelos fogos de artifício e pela seringa de borracha, e não pelo gêiser e pelo vulcão. Esse tipo de interesse não é pedagogicamente útil, e pode ser até profundamente nocivo porque, em vez de facilitar a atividade que exigimos das crianças, concorre com ela sob a forma de um poderoso interesse, enfraquecendo assim a preparação do organismo que o professor espera provocar. É muito fácil despertar o interesse contando casos concretos nas aulas de história, mas é difícil evitar que esse interesse tenha a ver apenas com o caso e não com a história. Esses meios colaterais de provocar interesse nem sempre facilitam, mas freiam a atividade. Por isso, o interesse ou a atenção de uma criança com relação a um trabalho não serve se seu estímulo é o medo do castigo ou a expectativa de uma recompensa. Podemos ter certeza de que não estamos desenvolvendo nos educandos o interesse pelo bordado ou pela aritmética - ainda que bordem ou façam contas com aplicação -, mas o interesse pela bala que receberão como prêmio ou pelo castigo de ficar sem a guloseima se cometerem algum erro. A capacidade de encontrar um interesse certo e velar por ele, para evitar que se desvie ou seja substituído por outro, é uma tarefa psicológica complexa. Por esse motivo, o prêmio e o castigo são um recurso totalmente inadmissível na escola, do ponto de vista psicológico. Além de todas as outras influências nocivas, que mencionaremos mais tarde, eles são prejudiciais pelo fato de serem inúteis, isto é, impotentes para provocar o tipo de atividade que necessitamos, pois introduzem um interesse incomensuravelmente mais poderoso, que faz com que o comportamento da criança coincida com o que desejamos; interiormente, porém, a criança não 102 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA muda. "O castigo educa os escravos"; esse antigo princípio está profundamente correto do ângulo psicológico, porque na verdade o castigo só ensina o medo e a capacidade de governar o próprio comportamento por meio dele. Por isso, o castigo é o recurso pedagógico mais fácil e medíocre, que provoca um efeito rápido e superficial sem levar em conta a educação interna do instinto. Baseando-se na aversão natural da criança à dor, é muito fácil atemorizá-Ia com um chicote e obrigá-Ia a deixar um mau hábito de lado, porém isso não o destrói; pelo contrário, em vez de apenas um hábito incorreto ela acrescenta outro, que é a sujeição ao medo. O mesmo ocorre com o prêmio: é fácil provocar uma reação se sua realização está ligada à obtenção de algo agradável, mas, se quisermos realmente educar essa reação na criança, temos de nos preocupar para que a satisfação e o prazer estejam vinculados diretamente a ela e não à expectativa de um determinado prêmio. Portanto, não se deve apenas despertar o interesse, mas esse interesse deve ter uma orientação correta. Ao mesmo tempo, é preciso se ater sempre à regra psicológica de passar dos interesses naturais da criança - que sempre estão presentes nela - aos interesses inculcados. Do ponto de vista psicológico é correto diferenciar, nesse caso, os novos interesses cuja educação constitui um fim em si, dos interesses que se educam apenas como meio. Só podem representar um fim em si mesmo os interesses cujo reforço prolongado faça com que eles se arraiguem e permaneçam a vida inteira. Aqui o desenvolvimento e o reforço do interesse representam a lei básica da educação e exigem do professor uma implantação gradual dos mesmos no processo da atividade. Esses interesses são, por exemplo, os interesses pelas questões vitais, pela ciência, pelo trabalho, etc. Outros interesses de caráter mais parcial ou temporário só podem servir, durante o processo de educação, como meios para educar algumas reações necessárias. Entre eles podemos mencionar, por exemplo, o interesse pela gramática de uma língua estrangeira, pelo banho e outras normas de higiene, etc. É sumamente importante interessar a criança pelo processo do banho ou pelas formas gramaticais de declinação enquanto ela não tiver elaborado o hábito de tomar banho ou não falar corretamente o idioma estrangeiro. Mas depois disso, não será mais necessário preocupar-nos por esse interesse, mantê-Ia, desenvolvê-Ia e reforçá-Ia, e ele poderá ser deixado de lado. Os interesses indiretos, que não estão diretamente ligados à reação necessária, porém podem servir de forma indireta para elaboráIa, têm uma missão ainda mais transitória. Por exemplo, o caráter da tarefa pedagógica de Thorndike, em que ele propõe utilizar, durante o estudo da química, o interesse natural das crianças pela culinária; no entanto, esse interesse emergente com relação à química deve absorver e preponderar sobre o interesse inicial pela culinária. A regra psicológica geral de desenvolvimento do interesse é a seguinte. Por um lado, para que um assunto nos interesse, ele deve estar ligado a algo que nos interessa, a algo já conhecido e, ao mesmo tempo, sempre deve conter algumas novas formas de atividade; do contrário, ele será infrutífero. Tudo o que é completamente novo ou velho é incapaz de despertar nosso interesse, de promover o interesse por algum objeto ou fenômeno. Isso quer dizer que, para colocar esse objeto ou fenômeno em relação pessoal com o aluno, é preciso transformar o estudo desse objeto em uma questão pessoal do aluno; dessa forma, poderemos estar seguros que obteremos sucesso. Do interesse infantil para um novo interesse - essa é a regra. Uma ajuda essencial é o método da educação pelo trabalho. Ele parte precisamente das tendências naturais das crianças a fazer coisas, a agir; permite que cada objeto se transforme em uma série de ações interessantes, e nada é tão próprio da criança quanto sentir satisfação com sua própria atividade. Ao mesmo tempo, a atividade da criança permite que cada objeto entre em relação pessoal com ela, se transforme em algo que tem a ver com seu sucesso pessoal. Aqui corresponde combinar as tarefas escolares com a vida; cada novo conhecimento ministrado deve estar relacionado a algo já conhecido e deve esclarecer algo novo para o aluno. É difícil imaginar algo menos psicológico que o sistema czarista de edu- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 103 cação, no qual se ensinava aritmética, álgebra, lhes interessa partindo do que conhecem e que alemão, sem que a criança compreendesse abdesperta naturalmente seu interesse. Froebel solutamente a que se referia tudo isso e para destacava que a criança obtém seus primeiros que o necessitava. Quando se procedia dessa conhecimentos em função de seu interesse maneira e surgia algum interesse, isso ocorria natural pela vida e pelas ocupações dos adulde forma casual e independentemente da vontoS.19 A partir de seus primeiros anos de vida, o filho de um camponês, de um comerciante tade do professor. Há ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA m a i s t r ê s importantes conclusões [reou de um artesão adquire espontaneamente gras] pedagógicas a extrair da teoria sobre o um grande número dos mais diversos conheciinteresse." A primeira [regra] consiste na vinmentos, durante o processo de observação do comportamento do pai. Em uma idade poste- ' culação entre todos os temas de um determirior, sempre é preciso respeitar o ponto de parnado curso, que é a melhor garantia de que se desperte um interesse único, concentrado em tida para elaborar um novo interesse, tomantorno de só um eixo. Só podemos falar de um do o já existente e partindo do já conhecido e interesse mais ou menos prolongado, estável e próximo. Por esse motivo, era tão tedioso o ensino clássico, iniciado com a mitologia e as profundo quando este não se fragmentar em dezenas de partes separadas, o que impede línguas antigas, e com temas que não tinham captar a idéia única e geral dos fragmentários nada em comum com a vida da criança. Portemas de ensino. tanto, a regra fundamental passa ser a tese de A segunda regra refere-se à repetição, utique, antes de comunicar um novo conhecimenlizada como método de recordação e assimilato à criança ou reforçar uma nova reação nela, ção de conhecimentos. Todos sabem como é devemos nos preocupar em preparar o terreno pouco interessante para as crianças essa repetipara isso, isto é, despertar o correspondente ção, como elas detestam essa tarefa, ainda que interesse. Isso é similar a preparar a terra annão represente nenhum tipo de dificuldade para tes de semear. elas. O que acontece é que nesse caso se viola a regra fundamental do interesse e, por isso, a o P A D R à O D O S IN T E R E S S E S IN F A N T IS repetição é uma mera marcação de passo sem sair do lugar e representa o recurso mais irraO desenvolvimento dos interesses infancional e nada psicológico. A regra [correta] tis está intimamente ligado ao crescimento bioconsiste em evitar totalmente a repetição, falógico geral da criança. Os interesses são a exzendo com que ensino seja concêntrico, isto pressão das suas necessidades orgânicas. No é, dispor o tema de maneira tal que ele possa primeiro período da vida, quando a criança ser totalmente percorrido da forma mais brecomeça a governar seus próprios órgãos de perve e simples de uma vez só. Depois, o profescepção - mãos, cabeça, olhos -, surge o intesor retorna ao mesmo tema, mas não para uma resse por todos os estímulos, sejam eles sonosimples repetição do que já foi visto, mas para ros, luminosos ou outros. Uma voz forte, uma percorrê-lo novamente de forma mais profuncor brilhante, um objeto para apalpar, tudo isso da e ampliada, com muitos fatos novos, genedesperta seu interesse. Nesse período, a crianralizações e conclusões, para que o que foi ça é um caçador natural de tudo o que cai peraprendido pelos alunos seja repetido, porém a to de suas mãos e, como para ela tudo está partir de um novo aspecto, que se vincula ao vinculado à alimentação, tenta experimentar já conhecido; dessa forma, o interesse surge o gosto de cada coisa e colocar na boca todos facilmente. Nesse sentido, tanto na ciência os objetos. quanto na vida, só o novo pode despertar nosPaulatinamente, a criança começa a so interesse. aprender a andar. O objeto de seu interesse Por último, a terceira regra de utilização passa a ser o deslocamento pelo espaço, esdo interesse estabelece que todo o sistema esquadrinhar, arrastar-se, engatinhar, deslocar colar seja estruturado em contato direto com objetos [caminhar, etc.]. A criança começa a a vida; deve-se ensinar às crianças aquilo que RQPONMLKJIHGFEDCBA o 104 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA se interessar pelo meio. Os anos posteriores são dedicados a uma orientação mais segura no meio, a um conhecimento mais sutil de alguns elementos do ambiente, a uma atividade mais dinâmica e à combinação de alguns elementos. A independência passa a ser o interesse fundamental da criança, o desejo de fazer tudo sozinha guia todo seu comportamento. Ela é capaz de se empenhar em qualquer trabalho até se cansar, sente-se infinitamente satisfeita nesse processo de repetir suas próprias ações simples diversas vezes. O período ulterior 'caracteriza-se pela ampliação de seus interesses para além dos limites de seu ambiente circundante imediato, pois agora ela já conhece bem tudo o que a rodeia e todas as combinações de que é capaz. Aparece o interesse por viagens, passeios, pela corrida. A esses anos corresponde um interesse particular pelas aventuras, grandes viagens e façanhas. Por último, o período da adolescência caracteriza-se por um elevado interesse por si mesma, a criança se transforma em um filósofo e lírico como era antes, quando fazia uma quantidade infinita de perguntas. As vivências pessoais, os problemas de seu "eu" captam toda a atenção do adolescente, que na juventude são substituídos por um vasto e elevado interesse pelo mundo e pelos problemas mais profundos da existência, que agora passam a atormentar sua consciência. No jovem, os olhos sempre estão muito abertos para o mundo, e isso denota uma elevada maturidade de seu ser para a vida. o S IG N IF IC A D O P S IC O L Ó G IC O DO JOGO O instrumento mais precioso para a educação do instinto talvez seja o jogo. O critério popular considera o jogo como uma distração, uma diversão à qual deve-se dedicar apenas uma hora. Por isso, em geral não se dá nenhum valor ao jogo e, no melhor dos casos, estima-se que se trata de uma fraqueza natural da infância, que ajuda a criança a passar o tempo. No entanto, a observação atenta descobriu há muito tempo que [o jogo] aparece invariavelmente em todas as etapas da vida cultural dos povos mais diversos e, portanto, representa uma peculiaridade insuperável e natural da condição humana. Além disso, ele não é inerente apenas ao ser humano, pois os animais também brincam; por isso, esse fato deve ter algum sentido biológico. O jogo deve ser necessário para algo, deve ter alguma missão biológica, pois do contrário não existiria nem teria tão ampla difusão. Propuseram-se várias teorias científicas sobre o jogo, tentando decifrar seu sentido. Uma delas reduzia o jogo à descarga de energia acumulada no jovem, que não pode ser eliminada pelas necessidades naturais. De fato, o animal jovem, assim como a criança, não têm de lutar pela sua sobrevivência, não têm em que gastar a energia acumulada em seu organismo e então realizam uma série de movimentos desnecessários e inúteis, correm, se jogam no chão e pulam, dando assim vazão à energia acumulada. Portanto, essa teoria não considera o jogo como um capricho casual, um passatempo, mas como uma importante necessidade vital. Ela constitui um passo à frente com relação ao critério popular, mas ainda dista muito de esgotar todo o sentido do jogo. Para essa teoria, o jogo não passa de uma válvula, de um canal através do qual flui a energia não utilizada. No entanto, ela ainda não responde à pergunta: em que se investe essa energia? Ela é usada em um investimento sensato? Essa interrogação é respondida por outra teoria que percebe a utilidade biológica do jogo como uma espécie de escola de educação para o filhote. Mediante uma observação atenta, percebemos sem esforço que, além de movimentos inúteis e desnecessários, o jogo também inclui movimentos ligados à futura atividade do animal, que assim vai elaborando o hábito e a habilidade para essa atividade, preparando-se para a vida, estabelecendo e exercitando as disposições adequadas. O jogo é a escola natural do animal. O gato" quando brinca com uma meada de lã ou com um camundongo morto trazido por sua mãe, aprende a caçar ratos vivos. Esse significado biológico do P S IC O L O G IA jogo, como escola e preparação para a atividade posterior, foi confirmado integralmente através do estudo do jogo humano. A criança sempre brinca, é um ser que brinca, porém seu jogo sempre possui um sentido importante. Ele sempre corresponde exatamente à sua idade e a seus interesses e inclui elementos que levam à elaboração dos hábitos e habilidades necessários. O primeiro grupo de jogos é constituído pelas brincadeiras da criança com ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA d ife r e n te s o b je to s i? [p. ex.], com chocalhos, e consiste em lançar e recuperar objetos; enquanto a criança se ocupa desses objetos, está aprendendo a vere ouvir, a segurar e a rejeitar o objeto, a dominá-lo, O período posterior dos jogos, que inclui esconder, escapar, etc., vincula-se à elaboração da habilidade de se d e s l o c a r e se o r i e n t a r no ambiente. Podemos dizer sem exagerar que quase todas as nossas reações mais fundamentais e profundas são elaboradas e criadas no processo do jogo infantil. O mesmo significado tem o componente de i m i t a ç ã o nas brincadeiras infantis. A criança reproduz e assimila ativamente o que observa nos adultos, aprende as mesmas atitudes e desenvolve as habilidades mais primordiais para sua atividade futura. Um psicólogo disse o seguinte: "Se, entre duas meninas, quisermos saber qual delas vai ser a melhor mãe, temos de observar quem brinca mais e melhor com sua boneca". Com isso, ele desejava destacar a importância educativa do jogo de bonecas para o desenvolvimento do instinto materno. Seria incorreto pensar que, ao brincar com sua boneca, a menina aprende a ser mãe no sentido em que o gato, ao brincar com um rato morto, preparase para perseguir um vivo. Aqui, a relação entre o jogo e a experiência é muito mais distante e complexa, e talvez a futura mãe não conserve nem recorde nenhum dos movimentos que fez para ninar sua boneca, mas sem dúvida dessa forma traçou as linhas básicas e se formaram as características internas fundamentais de sua futura experiência, que a ajudarão a realizar na vida o que treina através do jogo. Quando brinca com bonecas, a menina não aprende a cuidar de uma criança viva, mas a se sentir mãe.RQPONMLKJIHGFEDCBA P E D A G Ó G IC A 105 Os elementos de imitação presentes no jogo devem ser considerados dessa maneira. Eles contribuem para a assimilação ativa de diferentes aspectos da vida pela criança e organizam sua experiência interna nessa mesma direção. Outros jogos, denominados c o n s t r u t i v o s , estão relacionados ao trabalho com um determinado material, ensinam exatidão e acerto aos nossos movimentos, elaboram milhares de hábitos valiosos, diversificam e multiplicam nossas reações. Esses jogos nos ensinam a propor alguns objetivos e a organizar nossos movimentos de modo tal que possam ser orientados para a realização desse objetivo. Assim, as primeiras lições de atividade planejada e racional, de coordenação dos movimentos, de habilidade para governar os próprios órgãos e controlá-los, têm a ver com esses jogos [construtivos]. Em outras palavras, eles são os organizadores e professores da experiência externa, assim como os [jogos] anteriores organizavam a interna. Por último, o terceiro grupo de jogos, denominados j o g o s com r e g r a s , que surgem de regras puramente convencionais e das ações ligadas a elas, são uma espécie de escola superior de brincadeira. Eles organizam as formas superiores do comportamento, geralmente estão ligados à resolução de problemas de conduta bastante complexos, exigem do jogador tensões, conjeturas, sagacidade e engenho, uma ação conjunta e combinada das mais diversas aptidões e forças. Nenhum jogo copia exatamente outro. Cada um deles apresenta instantaneamente novas situações que exigem, em cada caso, novas decisões. Ao mesmo tempo, deve-se levar em consideração que esse tipo de jogo é a maior escola de experiência social. No jogo, o esforço da criança sempre é limitado e regulado pela grande quantidade de esforços dos outros jogadores. Em cada tarefa-jogo, como condição sempre presente, temos a habilidade de coordenar o próprio comportamento com o dos outros, estabelecer uma relação ativa com os outros, atacar e defender-se, prejudicar e ajudar, calcular antecipadamente o resultado de sua intervenção dentro do conjunto geral de todos os joga- · ,1 RQPONMLKJIHGFEDCBA j 106 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA dores. Esse jogo é uma experiência social viva e coletiva da criança e, nesse sentido, constitui um instrumento insubstituível para educar os hábitos e aptidões sociais. Em geral, quando se trata da questão do instinto social, nem tudo funciona bem na pedagogia atual. A família constitui um todo social não muito complexo com uma pequena quantidade de elementos bem-conhecidos e com formas completamente estabelecidas de relações entre seus membros. Por isso, é capaz de criar na alma infantil vínculos sociais profundos e sólidos, porém de uma extensão sumamente limitada: a aptidão de chegar a ser cidadão de um pequeno mundo social com vínculos diretos muito estreitos, profundamente gravados na personalidade. A família ensina apenas aquilo que se relaciona ao mais íntimo e próximo nexo social, educa o doméstico, enquanto nossa época exige a grandiosa tarefa de educar um cidadão do mundo, ligado aos vínculos mundiais que aumentam dia após dia. Nesse sentido, a escola também não é [ampla], pois também consta de elementos pouco numerosos e, nela, as relações sociais adotam formas que se estabelecem e consolidam muito rapidamente, nas quais as relações também se acomodam com grande facilidade umas às outras sem provocar novas reações e em que estas são elaboradas de acordo com um certo molde, de forma uniforme e árida. A coletividade escolar constitui um cenário insuficiente, pouco amplo para o desenvolvimento das grandes paixões sociais; ela chega até a ser uma escola muito estreita e pouco significativa para o instinto social. No entanto, a educação tem dois objetivos grandiosos. O primeiro deles é educar esse instinto em dimensões grandiosas, mundiais. Essa tarefa só pode ser resolvida psicologicamente mediante uma enorme ampliação do meio social. Devemos derrubar os muros do lar em nome da sala de aula, os muros da sala de aula em nome da escola, os muros da escola em nome da união de todas as escolas de uma cidade, etc., até chegar a movimentos infantis que abranjam todo o país ou a um movimento infantil mundial, como o dos Pioneiros ou o da Juventude Comunista [Komsomol] .21 Só nesses movimentos a criança aprende a reagir aos estímulos mais distantes, a estabelecer um vínculo entre sua reação e o acontecimento que ocorre a milhares de quilômetros, a coordenar; a vincular seu comportamento ao comportamento de enormes massas humanas, como o movimento operário internacional. O segundo objetivo da educação social consiste na elaboração e no polimento de formas de comunicação social particularmente sutis. Em nossa época, as relações sociais se tomaram grandiosas, não só por seu porte, mas também pelo seu grau de diferenciação e complexidade. As relações sociais da época prérevolucionária esgotavam-se em um pequeno grupo de relações estereotipadas, e as regras de cortesia abrangiam toda a conduta social do ser humano. Junto com a crescente complexidade da vida, o ser humano incorporou relações sociais cada vez mais complicadas e diversas, passou a participar das mais diferentes formações sociais e, por esse motivo, toda a diversidade das relações sociais do ser humano contemporâneo não pode ser totalmente abrangida por certos hábitos ou por aptidões preparadas antecipadamente. Nesse caso, o objetivo da educação não é o de elaborar determinada quantidade de aptidões, mas capacidades criativas para uma rápida e criativa orientação social. Das mais ocas e superficiais relações sociais que surgem entre os passageiros de um bonde às mais profundas e complexas que emergem através do amor e da amizade, o ser humano precisa evidenciar uma genuína habilidade criativa em suas relações com os outros. O amor e a amizade constituem a mesma criação de relações sociais que a educação política e profissional. E o jogo pode ensinar essa precisão, o polimento e a diversidade das relações sociais. Ao colocar as crianças em situações sempre novas, ao submetêIas a condições que se renovam constantemente, [o jogo] as obriga a diversificar de forma ilimitada a coordenação social de seus movimentos e lhes ensina flexibilidade, plasticidade e aptidão criativa como nenhum outro âmbito da educação . .Por último, aqui surge de forma particularmente notável e clara a última peculiarida- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 107 de do jogo: o fato de que, ao subordinar todo Em outras palavras, o jogo [com regras] o comportamento a certas regras convencioé um sistema racional e adequado, planejado, coordenado socialmente, subordinado a cernais, ele é o primeiro a ensinar uma conduta tas regras. Com isso, ele evidencia sua total racional e consciente. Para a criança, o jogo é analogia com o gasto laboral de energia no a primeira escola de pensamento. Todo pensaadulto, cujas características coincidem com os mento surge como resposta a um problema, atributos do jogo, com a única exceção dos recomo resultado de um novo ou difícil contato sultados, que no trabalho se exprimem em decom os elementos do meio. Quando essa difiterminado resultado objetivo antecipadamenculdade não existe, quando conhecemos perte programado, enquanto que no jogo se exfeitamente o meio, e nossa conduta, como processo de correlação com este, transcorre de pressam por uma satisfação afetiva convencioforma fácil e sem obstáculos, não há pensanal que se resolve de forma subjetiva dentro mento, pois os automatismós começam a funde quem joga, como prazer pelo jogo ganho. cionar. No entanto, quando o meio nos aprePortanto, apesar de toda a diferença objetiva senta novas e inesperadas combinações que que existe entre o jogo e o trabalho, que até exigem novas combinações e reações de nosso permitiria considerá-los opostos entre si, sua comportamento e uma rápida reorganização natureza psicológica coincide totalmente e inde nossa atividade, o pensamento surge como dica que o jogo é a forma natural de trabalho uma etapa preliminar do comportamento, da criança, a forma de atividade que lhe é inecomo organização interna das formas mais rente, a preparação para a vida futura." complexas da experiência, cuja essência psiUm psicólogo relatou que, em uma das cológica se reduz, em última instancia, à escocolônias inglesas, os nativos observavam com lha, entre as inúmeras reações que parecem assombro os ingleses, que chutavam uma bola possíveis, das únicas necessárias e em concorde futebol até ficarem exaustos. Eles estavam dância com o objetivo fundamental que o comhabituados ao fato de que os senhores não faportamento deve resolver. ziam nada, enquanto eles, nativos, costumaPortanto, em cada caso o pensamento é vam realizar tarefas ordenadas por eles por aluma espécie de solução de um novo problema gumas moedas. Nessa oportunidade, um deles de comportamento, mediante a escolha das rease aproximou dos ingleses que estavamjoganções adequadas. Um momento essencial é o da ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA do e lhes propôs, em troca de alguns s h i l l i n g s , o r ie n ta ç ã o , isto é, da reação preparatória do jogar futebol no lugar deles, para que eles não organismo com cuja ajuda este adota certa forse cansassem. O nativo não compreendia a dima de comportamento." E todo o mecanismo ferença psicológica entre o jogo e o trabalho, de seleção é interno, não-manifesto, até chegar que consiste no efeito subjetivo do jogo, e se ao resultado final, que obriga a deixar de lado deixou enganar pela total semelhança externa algumas formas e a adotar outras. Portanto, o entre a atividade lúdica e a do trabalho. pensamento surge da colisão entre múltiplas reações e da seleção de algumas destas, sob a NOTAS influência de reações preliminares. Se introduzirmos no jogo determinadas regras e limitar1. V1adimir Mikailovitch Bejterev (1867-1927) foi mos assim as possibilidades da conduta, apreum fisiologista, neurologista e psicólogo russo sentando à criança a tarefa de alcançar um dee soviético que, junto com Pavlov, foi o criador terminado fim, aguçando todas as suas aptidões da reflexologia. Embora tenha sido um pesquiinstintivas e aumentando seu interesse, isso nos sador de alto nível, de uma perspectiva dará a possibilidade de obrigá-Ia a organizar de in te r n a lis ta , foi o maior responsável pelos extal modo seu comportamento que ela tenha de cessos, pelo mecanicismo e o reducionismo desse p r o g r a m a de p e s q u i s a , segundo as categorias submeter-se a certas regras, orientando-se para epistemológicas de Lakatos. Em nossa opinião, um fim único e resolvendo conscientemente a rigor, a escola de Bejterev deveria ser chamadeterminadas tarefas." RQPONMLKJIHGFEDCBA Ir RQPONMLKJIHGFEDCBA 108 L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA da de ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r e f l e x o l o g i a , enquanto a denominação t e o da a t i v i d a d e n e r v o s a s u p e r i o r deveria ser reservada para a teoria de Pavlov - que também incorreu naqueles desvios, como já dissemos. Para ter acesso às teorias de Bejterev, veja: W Bejterev, P s i c o l o g i a O b j e t i v a , Buenos Aires: Paidós, 1953,425 p. A edição russa, que Vigotski costumava citar e à qual provavelmente se refira aqui, é: V. M. Bejterev, O b s h c h i e o s n o v i r e f l e k s o l o g u i c h i e l o v i e k a [ F u n d a m e n t o s g e r a i s da r e fle x o lo g ia h u m a n a ] , Moscou: GIZ, 1923. 2. Atualmente, muitos naturalistas continuam afirmando isso. Essa concepção do instinto é claramente explicada pelo discípulo de Konrad dt (cf. sua Lorenz, Iren âus Eibl-Eibelsfel E t o l o g í a , Barcelona: Omega, 1974): "Primeiro o esquilo escava a terra e depois coloca a noz [ ... ]; seguem os movimentos de cobrir o buraco com terra e pisá-lo, ainda que não tenha feito nenhum buraco no solo. Cada um dos movimentos tem um lugar fixo na seqüência total. E cada movimento, por sua vez, é uma seqüência internamente programada de diferentes contrações musculares" [p. 210]. "Os padrões fixos de conduta desenvolvem-se sem considerar o sentido de preservação da espécie que essa atividade tem. [ ... ] Assim, por exemplo, o cão que esconde um osso em uma sala realiza movimentos com o focinho como se quisesse enterrá-lo, pois esse é seu comportamento i n a t o . E também dará diversas voltas pela sala antes de se deitar, ainda que não exista nenhuma grama para escavar" [p. 35]. 3. O esquema ao qual se refere Vigotski está em: V.A. Vagner, B i o l o g u i c h e s k i e o s n o v a n i a s r a v n i t e i r ia n o i p s ijo lo g u i (b io p s ijo lo g u ia ). V o l. lI. In s tin k t y de p s i c o l o g i a b i o l ó g i c a c o m p a r a tiv a (b io p s ic o lo g ia ). VoI. 11. Instinto e razão], São Petersburgo: Wolf, 1913, p. 282. 4. Essa história está relatada na p. 39 da 2ª edição, ampliada e editada por Francis Darwin: Ch. Darwin, T h e E x p r e s s i o n o f t h e E m o t i o n s i n M a n a n d A n im a ls , Londres: John Murray, 1892. Dessa edição citamos o seguinte trecho: "[M]any years ago I laid a s m a l l wager with a dozen young men that they would not sneeze if they took snuff, although they all declared that they invaliably did s o ; accordingly they all took a pinch, but from wishing much to succeed, no one sneezed, though their eyes watered, and all, without exception, had to pay me the wager". O grifo é nosso. Darwin era muito cuidadoso com o dinheiro e, como se rázum . [ F u n d a m e n to s vê, não se tratava de uma "grande" quantia, como diz Vigotski, que se refere de cor a essa história. Há uma tradução para o espanhol dessa obra (Madrid: Alianza). No original russ o , Vigotski diz "doze" [ d v i e n a d t s a t ] jovens, conforme o que disse Darwin; no entanto, na edição norte-americana traduziu-se "20 young people" (sic, p. 65), como se Vigotski tivesse escrito " d v a d t s a t " . 5. Ernst Hâckel (1834-1919) foi um importante zoólogo evolucionista alemão, que introduziu algumas inovações, nem sempre lógicas, nas teorias de Darwin. Prolífico inventor de palavras, a ele pertencem os termos "ecologia", "ontogenia", "filogenia", "lei biogenética", etc. Esta última lei, de sua criação, afirma erroneamente que "a ontogenia é a curta e rápida recapitulação da filogenia" (cf. E. Hâckel.Anrnrop o g e n ie [ A n tr o p o g ê n e s e ] ; há uma tradução inglesa da Si! edição, intitulada T h e e v o l u t i o n o f m a n , 2 volumes, Londres: Watts, 1905, p. 7). Para uma exposição crítica dessa lei e sua aplicação à psicologia e à pedagogia, cf. L. S. Vigotski, "La Ley Biogenética en Psicología y en Pedagogia" (1927), no livro: L. S. Vigotski, E I D e s a r r o llo C u ltu r a l d e i N iiio y o tr o s te x to s edição de G. Blanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998, p. 69-78. 6. Mais que "da espécie" diríamos "das espécies". É difícil estabelecer com precisão o começo da seqüência filogenética para essa lei. Por exemplo, para o H o m o S a p i e n s , esta deveria se iniciar ou mais atrás, no R a m a p i no A u s t r a l o p i t e c u s t e c u s , ou muito antes: a partir do aparecimento dos vertebrados. Ou seja: nesse caso, as espécies atravessam filo geneticamente quase toda a taxonomia: do subtipo passam pela classe, pela ordem, pela família e pelo gênero, até chegar à espécie. Cf. G. Blanck, L a e v o l u c i ó n d e l h o m b r e , Departamento de Publicaciones de Ia Facultad de Filosofía y Letras de Ia Universidad de Buenos Aires, 1989-2000, 12 edições. 7. Aqui, Vigotski refere-se ao biólogo evolucionista inglês A. Marshall, que em 1890 dedicou seu discurso presidencial no 60° encontro da B r i t i s l i A s s o c i a t i o n f o r t h e A d v a n c e o f S c i e n c e ao tema da lei biogenética, sustentando que essa lei constituía "a base da ciência da Embriologia" (cf. A. Marshall, "Development of animaIs", no j o u r n a l dessa sociedade científica, 1891, p. 826-852). Fomos incapazes de situar as asserções de Marshall às quais Vigotski se refere aqui. in é d ito s , P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 109 8. Konstantin Nikolaievitch Kornilov (1879-1957) das naqueles tempos e que suscitam alguns esclarecimentos. Hoje em dia há idéias muito difoi o psicólogo russo que, em 1924, convidou Vigotski a trabalhar no Instituto de Psicologia ferentes sobre essas questões que pressupõem Experimental que dirigia, anexo à Universidauma discussão da concepção física - catexias, de de Moscou. Naquela época, todos os psicóenergia, etc. - da sublimação do século XIX, ou que as premissas biológicas para a sexualilogos soviéticos queriam construir uma psicodade nos humanos tenham tanto poder, como logia marxista. Kornilov criou a ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r e a t o l o g i a , que afirma Vigotski - influenciado por Freud nesse definiu como "ciência das reações" e que período de sua formação. Não há consenso soinfluenciou fortemente Vigotski em sua primeira etapa, como é evidente no presente texto. A bre o fato de que esse "instinto", como diz Vigotski, tenda a orientar sexualmente a pespartir de 1928, porém, Vigotski começou a criar sua própria concepção marxista da psicolosoa para pessoas do sexo oposto: a orientação dos processos gia: a t e o r i a h i s t ó r i c o - c u l t u r a l sexual nos humanos é atribuída principalmenpsíquicos. Por volta de 1.930, a reatologia deite a uma aprendizagem de modelos de interação social; deve-se destacar que, há anos, a hoxou de ser consensual e finalmente se extinguiu. Em 1943, Kornilov foi incorporado à Acamossexualidade deixou de ser considerada uma demia de Ciências Pedagógicas/Psicológicas da doença pela comunidade científica mundial de Rússia. É provável que a citação apresentada a psiquiatras e psicólogos clínicos. Tampouco seguir - assim como outras posteriores no liexiste consenso sobre a alternativa da castidavro - provenham do texto de Kornilov O c h i e r k de proposta por Vigotski aos jovens. N ã o d e v e p s ijo lo g u i r ie b io n k a d o s h k o ln o g o v o z r a s ta [ E n m o s e s q u e c e r que Vigotski chamava de "ados a io s o b r e a p s ic o lo g ia d a s c r ia n ç a s p r é -e s c o la lescência" à puberdade; inclusive por vezes ele r e s ] , Moscou, 1922. diz "a criança adolescente", isto é, não se refe9. Edward Lee Thorndike (1874-1949) foi um ria aos garotões atuais que, por suas características histórico-psicológicas, são denominapsicólogo americano que se destacou como dos "adolescentes" e que, na época de Vigotski, grande teórico da psicologia da aprendizagem. Discípulo de James, foi quem mais pesquisou já eram considerados adultos (cf. também a a aprendizagem dos organismos por "tentatinota nº 15). va e erro" [ t r y a n d e r r o r ] . Aqui, Vigotski está 12. Platão (428-347 a.C.) foi um dos grandes filócitando de cor. Por isso escreve: "Thorndike [... ] sofos idealistas gregos. Ele foi um ideólogo dediz a p r o x i m a d a m e n t e o seguinte" (o grifo é nosfensor da classe social escravista, assessor proso). A citação é do livro de E. L. Thorndike, fissional de tiranos, e seu ideal foi um modelo de sociedade dividida em três classes sociais: T h e p r i n c i p i e s o f t e a c h i n g b a s e d on P s y c h o l o g y , cuja primeira .edíção é de 1906. Essa é a vera dos trabalhadores, a dos militares que serviam para manter a ralé a distância e a dos goversão que Vigotski deve ter lido; mais tarde, ele nantes-filósofos, que podiam gozar do ócio e foi editor e escreveu o prólogo da edição russa (Moscou, 1926). Uma característica de quase dos privilégios originados na exploração dos trabalhadores. E x p l i c i t a m e n t e , Platão legitimou todos os prólogos que Vigotski escreveu nessa época é a reprodução de parágrafos inteiros o uso da mentira por parte dos governantes e de P s i c o l o g i a p e d a g ó g i c a . O prólogo ao livro de propôs a e d u c a ç ã o como meio de introduzir nas Thorndike está incluído no volume I de suas classes dominadas a ideologia das classes dominantes: "Será, pois, lícito o exercício da O b r a s . . . , op. cit., p. 143-162. mentira aos governantes da cidade, e eles po10. Nessa referência à obra R o m e u e J u l i e t a , de derão utilizá-Ia para enganar [ ... ] aos cidadãos Shakespeare, Vigotski se refere a Veneza, quan[ ... ]. Como nos prepararíamos para fazer com do na verdade a tragédia ocorre em Verona, cidade vizinha de Veneza. Em Veneza transque uma nobre mentira fosse acreditada? Não será preciso dar-lhes uma boa educação?" Sim, corre i n t e r a l i a a obra a t e i o . 11. Ainda que muitas vezes Vigotski tenha-se mas não na idade adulta - acrescenta - mas a partir da infância, para que as crianças se transadiantado à sua época, também foi um filho formem em "homens honrados submissos às daquela época. Por isso, pode nos assombrar a leis" (Platão, L a R e p ú b lic a , Buenos Aires: atualidade do e s s e n c i a l de suas concepções sobre a sexualidade e a educação sexual, emboEUDEBA, 1968, p. 193 e segs.). ra haja várias idéias errôneas muito difundi- --- --------- RQPONMLKJIHGFEDCBA 110 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 13. Essa é uma típica citação à Vigotski: de cor. Ou 17. melhor, não se trata de uma citação, apesar das aspas; nessasZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA d u a s linhas resume-se o que Platão coloca na boca de Sócrates em d o z e linhas (cf. Platão, E I b a n q u e t e , Madrid: Planeta, 1995, p. 165). Segundo Sócrates, essa descrição de Eros foi feita por Diotima em uma conversa que teve com ela. Vigotski sabia ler grego, latim e iídiche. Além disso, sabia escrever e falar russo, hebraico, alemão, inglês, francês e esperanto. 14. Arthur Schopenhauer (1788-1860) foi um filósofo alemão irracionalista e anti-hegeliano. Sua principal obra é . D l e W e l t a i s W i l l e u n d V o r s t e l l u n g [O m u n d o c o m o v o n t a d e e r e p r e s e n t a ç ã o ] , de 1818. Aqui, Vigotski se refere a esse livro. O seguinte trecho expressa essa idéia: "l ...] o ponto culminante da vida dos animais 18. é a procriação; conseguido esse fim, a vida do 19. indivíduo declina mais ou menos rapidamente" (cf. Madrid: Orbis, 1985, último parágrafo do Livro Il). Para Schopenhauer, a vontade é um impulso presente nos organismos, das plantas ao ser humano. Essa idéia, assim como seu exacerbado pessimismo e suas concepções sobre os sonhos, o egoísmo, etc., influenciaram 20. as teorias de Freud, o qual "em suas premissas 21. fundamentais, bem como nas linhas determinantes de seu sistema, está ligado à filosofia [ ... ] do grande pessimista", "à metafísica idealista da vontade e às representações de Schopenhauer" (cf. Vygotski, O b r a s . . . , t. I, op. cit., p. 299). Em vários de seus textos, Freud reconheceu essa influência. 15. Vigotski chamava a adolescência de "idade de transição". Outras vezes a chamava diretamente de "adolescência": p o d r o s t o k , em russo. 16. Vigotski se refere ao governador da cidade provinciana de N., um personagem do romance As a lm a s m o r ta s , de Gogol. Nikolai Vasilievitch 22. Gogol (1809-1852) foi o mais importante escritor russo de comédias do século XIX. É considerado um dos narradores com melhor domínio da prosa russa. Algumas análises dessa sua mestria podem ser encontrados em: M. Bajtín, "La Construcción de Ia Enunciación", em M. M. Bajtín/V N. Voloshinov, Q u é e s e l L e n g u a j e y o t r o s te x to s in é d ito s , edição de G. Blanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998. Segundo S. Dobkin, Vigotski dirigiu em Gomel a encenação da obra de Gogol, O c a s a m e n t o . Essa é uma referência à obra O c a v a l h e i r o c o b i ç o s o , de Pushkin. Aleksander Sergueievitch Pushkin (1799-1837) é o Poeta Nacional russo. Seus "romances em verso", como costumava subintitular seus dramas, tiveram - e continuam tendo - projeção nacional e internacional. Entre eles e s t ã o M o z a r t e S a l i e r i , B o r i s G o d u n o v , E v g u e n i O n e g u i n . Grandes compositores, de Tchaikovski a Stravinsky, compuseram óperas baseadas nos dramas de Pushkin. Ele também escreveu importantes obras em prosa. Era nobre e mulato. Sua esposa era uma histérica, e ele, um marido ciumento. Tal armadilha neurótica o levou a desafiar todo mundo a duelo. Morreu em um duelo. C f . A. S. Pushkin, O b r a s E s c o g i d a s , trad. de A. Marcoff, México, 1946, 468 p. O grifo é nosso. Para Froebel, a escola não é uma preparação para a vida, mas "um aspecto da vida" (cf. W. A. Froebel, D i e M e n s c h e n e r z i e h u n g [ A e d u c a ç ã o do hom em ], 1826). Segundo Froebel, a atividade espontânea, movida pelo i n t e r e s s e , é o princípio reitor da educação. Para mais detalhes sobre Froebel, cf. a nota ns 3 do Capítulo 19. O grifo das palavras que caracterizam as diferentes classes de jogos é nosso. Antes do colapso do sistema socialista internacional (1990), tanto dentro como fora dos países socialistas, existiram esses dois movimentos, organizados pelos partidos comunistas. O movimento dos Pioneiros era próprio das crianças do ensino fundamental. O da Juventude Comunista era mais amplo e abrangia jovens de idades correspondentes aos do ensino médio e universitário (em Cuba, por exemplo, esses movimentos continuam existindo). Eles celebravam festivais anuais, com a presença de delegados de todo o mundo. O grifo é nosso. O vocábulo russo é u s t a n o v k a , traduzido para o inglês como s e t e para o espanhol como o r i e n t a c i ó n . É i m p o r t a n t e c o n s i d e rar q u e ) c a d a v e z q u e V i g o t s k i f a l a de o r i e n t a ç ã o ou de r e a ç ã o de o r i e n t a ç ã o ) e l e s e r e f e r e a e s s a c a t e g o r i a p s i c o l ó g i c a , salvo indicação contrária do contexto. A o r i e n t a ç ã o - o s e t - é um processamento inconsciente da informação, dirigido e regulado por sua meta final. As pesquisas sobre a orientação foram objeto de estudo da escola de psicologia da Geórgia, dirigida por D. N. Uznadze (1886-1950). P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 111 Uznadze tomou a categoria de "predisposição 24. É altamente provável que essa seção tenha se baseado em grande parte em K. Groos, D i e à ação" de Külpe, durante seus estudos na AleS p i e l e d e r M e n s c h e n [O j o g o do h o m e m ] , Jena: manha. Para maiores detalhes sobre essa escola georgiana, cf. F. V. Bassin,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA E l p r o b le m a d e l Fischer, 1899. Karl Groos (1861-1946) foi um i n c o n s c i e n t e , prólogo de Marie Langer, Buenos psicólogo alemão ao qual Vigotski se referia com freqüência. Ele desenvolveu uma teoria Aires: Granica, 1972, 384 p. 23. Vigotski sempre diz "tarefa" e "cumprimento, do jogo, conforme a qual este é uma escola que prepara as crianças para situações críticas resolução, etc., da tarefa". Na linguagem técda vida. nica atual da psicologia, dir-se-ia "problema e re/solução de problemas".RQPONMLKJIHGFEDCBA A Educação do C o m p o rta m e n to E m o c io n a l o C O N C E IT O pessoa, podemos compreender sem qualquer D E E M O Ç Ã O zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A teoria dos sentimentos ou das emoções' é o capítulo menos elaborado da velha psicologia. É mais difícil descrever, classificar e vincular esse campo do comportamento humano a certas leis que fazer isso com todos os restantes." Entretanto, também na velha psicologia foram enunciados critérios totalmente justos sobre a natureza das reações emocionais. James e Lange" foram os primeiros a destacar essa questão. Enquanto James prestou atenção às amplas modificações corporais que acompanham as emoções, Lange concentrouse nas mudanças vaso-motoras que [as emoções] provocam. De forma independente, ambos os pesquisadores chegaram à conclusão de que a noção habitual sobre as emoções é fruto de um profundo erro e que, na verdade, as emoções não transcorrem de acordo com sua ordem aparente. A psicologia e o pensamento comuns diferenciam três momentos no sentimento. O primeiro é ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA a p e r c e p ç ã o de qualquer objeto ou acon(o encontro tecimento ou sua r e p r e s e n t a ç ã o com um assaltante, a lembrança da morte de um ser amado, etc.) [e é designado] A . O sentimento que isso provoca (temor, pena) [é designado] E. E as e x p r e s s õ e s c o r p o r a i s desse sentimento (tremor, lágrimas) [são designadas] C. 4 O processo completo do curso da emoção era representado da seguinte maneira: ABC. Se observarmos atentamente qualquer sentimento, é fácil perceber que ele sempre possui sua própria expressão corporal. Os sentimentos intensos parecem estar escritos em nosso rosto e, quando olhamos para alguma tipo de explicações se ela está raivosa, atemorizada ou serenamente contente. Todos os parâmetros corporais que acompanham um sentimento dividem-se facilmente em três grupos. Em primeiro lugar, está o grupo dos movimentos mímicos e pantomímicos, das contrações peculiares dos músculos, sobretudo de olhos, boca, pômulos, mãos e tronco. Eles pertencem à classe das reações motoras emocionais. O grupo seguinte é o das reações somáticas, isto é, as modificações da atividade de vários órgãos ligados às funções vitais mais importantes do organismo, como as modificações da respiração, as batidas do coração e a circulação sangüínea. O terceiro grupo é o das reações secretórias: determinadas secreções de ordem externa ou interna, como as lágrimas, a transpiração, a salivação, a secreção interna das glândulas sexuais, etc. Em geral, a expressão corporal de qualquer sentimento depende desses três grupos. James distingue os três momentos mencionados em todo sentimento, mas promove a teoria segundo a qual a ordem e a sucessão desses três momentos são diferentes. Enquanto o esquema corrente estabelece a sucessão ABC dos três momentos, isto é, percepção sentimento - mímica, o verdadeiro estado de acordo, segundo James, corresponde a outra fórmula: ACE, ou seja, percepção - mímica sentimento. Em outros termos, James supõe que os objetos possuem a capacidade de provocar em nós, diretamente ou por reflexo, várias modificações corporais, e que o sentimento é o momento secundário da percepção destas modi- 114 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ficações. o encontro com um assaltante, diz James, de modo reflexo e sem a mediação de nenhum sentimento, nos provoca tremor, secura na boca, palidez, respiração entrecortada e outros sintomas do medo. O próprio sentimento de medo tem a ver com sentir o conjunto dessas modificações do organismo. Quando temos medo, sentimos o próprio tremor, as nossas palpitações, a nossa palidez, etc. Quase da mesma maneira, a lembrança da morte de um ser querido e próximo provoca lágrimas de forma reflexa, nos faz abaixar a cabeça, etc. A tristeza se reduz à sensação dessas manifestações, e entristecer-se sígnifica perceber as próprias lágrimas, a postura curva, a cabeça caída, etc. Em geral se diz o seguinte: choramos porque estamos tristes, batemos porque estamos irritados, trememos porque sentimos medo. De acordo com James, seria mais correto dizer: estamos tristes porque choramos, estamos irritados porque batemos, estamos assustados porque trememos. O que antes era considerado causa é, na verdade, uma conseqüência, e vice-versa: a conseqüência na verdade é a causa. Podemos ver que isso realmente acontece quando consideramos os seguintes argumentos. O primeiro consiste em que, se provocamos artificialmente várias expressões exteriores de um sentimento, o próprio sentimento não demora para aparecer. Como diz James, façam um experimento: quando se levantarem pela manhã, adotem uma expressão melancólica, falem com voz abafada, não levantem os olhos, suspirem freqüentemente, curvem a coluna e o pescoço, em uma palavra, assumam todas as características da tristeza e, à tarde, serão invadidos por tal melancolia que não saberão onde se esconder. Os educadores sabem muito bem como é fácil que uma brincadeira se transforme em realidade para as crianças, [por exemplo], como dois meninos que começam a lutar de brincadeira, sem animosidade alguma, de repente, no calor da luta, começam a sentir dentro de si ira contra o adversário e são incapazes de dizer se a brincadeira terminou ou se continua. Com a mesma facilidade, uma criança atemorizada de brincadei- ra, de repente começa a sentir medo de verdade. E, em geral, qualquer expressão externa facilita o aparecimento do sentimento correspondente: quem foge se assusta facilmente, etc. Os atores sabem disso muito bem, quando determinada postura, entoação ou gesto provoca uma intensa emoção neles. A regularidade oposta apóia ainda mais essa tese. Basta deixar de lado as expressões corporais de uma emoção para que esta desapareça imediatamente. Se o tremor é reprimido, se obrigamos o coração a bater regularmente, se a expressão de nosso rosto volta ao normal, o sentimento de medo desaparece. Reprimam a expressão de qualquer paixão, e ela se extinguirá. Um psicólogo relata que, cada vez que sentia um ataque de ira, abria as palmas das mãos e os dedos, até sentir dor. Isso sempre paralisava a ira, porque é impossível ficar zangado com a mão totalmente aberta, pois a ira equivale a punhos fechados e boca apertada. Quando dominamos mentalmente a emoção, suprimindo todas as mudanças corporais, nada resta do sentimento. Suprimam os sintomas do medo e deixarão de temer. As visíveis objeções contra esse ponto de vista se resumem a dois fatos; no entanto, com uma compreensão correta, longe de refutar, eles até mesmo confirmam essa teoria. O primeiro é o conhecido fato de que com freqüência algumas reações não estão associadas obrigatoriamente a uma emoção. Por exemplo, quando descascamos uma cebola, podemos provocar lágrimas com facilidade, porém isso não significa de forma alguma que depois ficaremos tristes. É fácil compreender que, nesse caso, estamos provocando apenas um sintoma isolado, que por si mesmo não é capaz de despertar uma emoção, mas sem dúvida a provocaria se ele se combinasse com todos os sintomas restantes. Não basta provocar lágrimas nos olhos para a tristeza aparecer, porque esta não consiste apenas de lágrimas, mas também de toda uma série de sintomas internos e externos que estão ausentes naquele instante. Por último, a segunda objeção é que alguns sentimentos são provocados facilmente mediante a assimilação interna de drogas introduzidas no sangue. Sem adotar nenhuma P S IC O L O G IA das expressões artificiais do sentimento, basta tomar certa dose de álcool, morfina ou ópio para provocar uma série de sentimentos complexos. Nesse caso, porém, é evidente que, ao inocular essas substâncias, estamos atuando [diretamente] sobre a própria base das reações emocionais [o cérebro]. Modificamos a composição química do sangue, modificamos todo o sistema da circulação e todos os processos internos vinculados ao sangue - sobretudo a secreção interna - e, devido a isso, obtemos facilmente um forte efeito emocional no organismo. .' ' Portanto, tudo nos permite afirmar que é verdade que a emoção é um sistema de reações vinculado de modo reflexo aos estímulos. O esquema das emoções de James coincide totalmente com o esquema do comportamento e da experiência consciente, do qual partimos todo o tempo. O sentimento não surge sozinho em um estado normal. Sempre é precedido de um determinado estímulo ou causa, externa ou interna (A). O que nos impele a temer ou a alegrar-nos é o estímulo a partir do qual se inicia sempre a reação. Depois, vem uma série de reações reflexas motoras, somáticas e secretórias (C). E, por último, temos a reação circularZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [ f e e d b a c k ou retroalimentação J, o retorno das próprias reações ao organismo em qualidade de novos estímulos - a percepção de ordem secundária do campo proprioceptivo - que representam o que antes era denominado emoção (B). É fácil compreender o caráter subjetivo do sentimento, isto é, o fato de que a pessoa que o experimenta e aquela que observa suas expressões externas terão noções totalmente diferentes do mesmo sentimento. Isso acontece porque ambos os observadores registram, nesse caso, dois momentos diferentes de um mesmo processo. Quem olha de fora registra o momento C, isto é, as reações emocionais em si. Quem olha de dentro registra a excitação proprioceptiva que parte das próprias reações - o momento B - e aqui, como explicamos, estamos diante de vias nervosas completamente diferentes e, portanto, diante de processos distintos.RQPONMLKJIHGFEDCBA A NATUREZA P E D A G Ó G IC A 115 B IO L Ó G IC A DAS EMOÇÕES É fácil perceber que as emoções surgem mediante os instintos e constituem ramificações próximas deles. Por isso, alguns pesquisadores consideram o comportamento instintivo-emocional como um todo único. É particularmente clara a raiz instintiva das emoções nos sentimentos primitivos, elementares, nos chamados sentimentos inferiores.' Nesse caso, alguns pesquisadores relacionam as mesmas reações aos instintos e às emoções. Vejamos, por exemplo, duas emoções elementares em seu possível significado biológico: a ira e o temor. É fácil observar que todas as mudanças corporais acompanhadas pelo medo possuem uma origem biologicamente explicável. Existem muitos motivos para supor que, em certo momento, todas as reações motoras, somáticas e secretoras que entram na composição de uma emoção como forma integral de comportamento foram uma espécie de reações adaptativas úteis de caráter biológico. Sem dúvida, o medo foi a forma superior da fuga instantânea e impetuosa do perigo e, nos animais e por vezes também no ser humano, ainda conserva as marcas evidentes de sua origem. As reações mímicas do medo geralmente se reduzem à ampliação e à preparação dos órgãos da percepção, cujo fim reside no alerta e na captação sumamente inquieta das menores mudanças do meio. Os olhos muito abert s, as fossas nasais dilatadas, as orelhas tesas, implicam uma atitude alerta com relação ao mundo; uma atenta escuta do perigo. Depois, aparece um grupo de músculos tensos, como se estivesse preparado para a ação e se mobilizasse para saltar, fugir, etc. O tremor, tão c o mum no medo humano, não passa de uma rápida contração dos músculos, como se eles se adaptassem para uma corrida extraordinariamente rápida. Nos animais, o tremor durante o medo se transforma diretamente em corrida. O mesmo sentido e significado da fuga do perigo também está presente nas reações somáticas de nosso corpo. A palidez, a inter- 116 L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA sem querer, surge a idéia de que, no decorrer rupção da digestão e a diarréia denotam o reda transformação do animal em ser humano, fluxo do sangue dos órgãos cuja atividade deias emoções vão diminuindo de intensidade e xa de ser uma necessidade primordial para o se atrofiando. organismo e sua afluência para os órgãos aos O medo e a ira de um cão são mais fortes quais corresponde a palavra decisiva nessa sie expressivos que a ira de um [ser humano] tuação. Na verdade, isso se parece com uma selvagem; esses mesmos sentimentos são mais mobilização em que o sangue, esse adminisimpulsivos em um selvagem que em uma criantrador de nosso organismo, fecha e interromça; e, na criança, são mais fortes que no adulpe a atividade dos órgãos que estão na retato. É fácil extrair então a conclusão geral de guarda, relacionados à atividade pacífica do que, no sistema do comportamento, as emoorganismo, e lança toda a força de sua alimenções desempenham o papel de órgãos rudimentação para os setores combativos, que salvam tares que, em sua época, tiveram grande imdiretamente do perigo. O mesmo ocorre com portância, mas que agora, devido à modificaa respiração: profunda, ofegante, adaptada ção das condições de vida, estão condenadas a para uma corrida veloz. As reações secretoras, ligadas à secura da boca e outras, parecem prose extinguir e representam um elemento desvar o mesmo refluxo do sangue. necessário, e por vezes nocivo, dentro do sisFinalmente, as últimas pesquisas com anitema do comportamento. Com efeito, no aspecto pedagógico, os senmais mostraram que as emoções também provocam mudanças na secreção interna. Sabetimentos constituem uma rara exceção. Para o professor, é desejável que eles aumentem e que mos que a química do sangue muda em um gato assustado. Em outros termos, sabemos que todas as outras formas de comportamento e das reações sejam reforçadas. Se pudéssemos autambém os processos internos mais íntimos se adaptam à tarefa fundamental do organismo: mentar 10 vezes a recordação ou a compreenfugir do perigo. Tudo isso, tomado em seu consão dos alunos, isso facilitaria 10 vezes o trabajunto, nos permite definir o medo como uma lho educativo. Mas se imaginarmos por um insmobilização de todas as forças do organismo tante que a capacidade emocional da criança para a fuga do perigo, como ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA u m a fu g a in ib id a , pode aumentar 10 vezes, isto é, que ela ficaria e compreender que o medo representa uma 10 vezes mais sensível e que, devido a um mínimo gozo, poderia chegar ao êxtase, e devido à forma consolidada de comportamento que surge do instinto de autoconservação em sua formais insignificante aflição começaria a chorar, naturalmente obteríamos um tipo de comporma defensiva. tamento extremamente indesejável. De modo totalmente análogo, é fácil demonstrar que a ira é o instinto de autoconserPortanto, o ideal da educação emocional não reside, supostamente, no desenvolvimenvação em sua forma ofensiva e constitui outro to e no reforço, mas, pelo contrário, na represgrupo de reações, outra forma de comportamento, agressivo; a ira é uma b r i g a i n i b i d a . são e enfraquecimento das emoções. Como as emoções representam formas biologicamente Esta é a origem da mímica da ira, que se exprime através dos punhos apertados e prontos inúteis de adaptação devido à modificação das circunstâncias e condições do ambiente e da para bater, dos pômulos salientes e dos dentes apertados - vestígios da época em que nossos vida, elas estariam condenadas a se extinguir no processo da evolução, e o ser humano do antepassados mordiam -, do avermelhamento do rosto e das posturas ameaçadoras. futuro não teria emoções nem noção de outros órgãos rudimentares. No entanto, essa É fácil perceber, porém, que tanto o meforma de ver, relativa à completa inutilidade do quanto a ira, da maneira como atualmendas emoções, é profundamente errônea. te são encontrados no ser humano, são formas sumamente atenuadas desses instintos e, P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 117 nhum deles prepondera sobre o outro e ambos estão equilibrados na disputa. D A S E M O Ç Õ E S zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Esses três casos são básicos para o desenvolvimento do comportamento emocional. ConMediante a simples observação, sabemos de que modo os sentimentos tornam o comporsiderando-se a origem das emoções a partir das formas instintivas de comportamento, podemos tamento mais complexo e diverso, e até que ver que estas são uma espécie de resultado da ponto uma pessoa emocionalmente dotada, sutil e educada está, nesse sentido, acima de uma avaliação, feita pelo próprio organismo, de sua pessoa carente de educação. Em outras palarelação com o ambiente. E todas aquelas emovras, até mesmo a observação cotidiana evidenções ligadas à sensação de forma, à satisfação, cia um certo novo sentido que a presença dos etc., as chamadas sensações positivas, estão sisentimentos proporciona ao comportamento. A tuadas no primeiro grupo. As relacionadas à senmesma conduta, dotada dé um aspecto emosação de angústia, fraqueza e sofrimento - as cional, adquire um caráter totalmente diferensensações negativas - pertencem ao segundo te da incolor. As mesmas palavras, pronunciagrupo. Só no terceiro caso teremos uma relatidas com sentimento, agem sobre nós de maneiva neutralidade emocional no comportamento. ra diferente que as pronunciadas sem vida. Por esse motivo, a emoção deve ser entenDe que forma a emoção modifica o comdida como uma reação do comportamento nos portamento? Para responder a essa pergunta, momentos críticos e catastróficos, como pontos deve-se recordar o caráter geral do comportade desequilíbrio, resumo e resultado da condumento, tal como foi descrito anteriormente. Do ta que, a qualquer instante, impõe diretamente nosso ponto de vista, o comportamento é um as formas do comportamento posterior. processo de interação entre o organismo e o O comportamento emocional tem uma ambiente. Portanto, nesse processo sempre difusão sumamente ampla e, a rigor, até em poàem ocorrer três formas dessa correlação nossas reações mais primárias é fácil descoque, nos fatos, se alternam entre si. O primeibrir o aspecto emocional. ro caso ocorre quando o organismo sente que A velha psicologia ensinava que em toda predomina sobre o ambiente, quando as taresensação existe um tom emocional, isto é, que fas e exigências que este exige da conduta são até mesmo as vivências mais simples de cada resolvidas pelo organismo sem dificuldade nem cor, som ou odor possuem inevitavelmente altensão, quando o comportamento transcorre gum aspecto sensível. No tocante a odores e sem travas internas de nenhum tipo e se realigostos, todos sabemos que há pouquíssimas za uma adaptação ótima com um gasto mínisensações neutras, emocionalmente indiferenmo de energia e força. Nesse caso, o organistes. Cada odor e quase todos os gostos são inmo predomina sobre o ambiente. falivelmente agradáveis ou desagradáveis, cauOutro caso [o segundo] ocorre quando a sam prazer ou desgosto, estão ligados à satispreponderância e a superioridade estão do lado fação ou à rejeição. Parece um pouco mais difícil revelar isso do ambiente, quando o organismo se adapta com dificuldade ao meio. A falta de corresponnos estímulos visuais e auditivos, mas também dência entre a extraordinária complexidade do aqui é fácil mostrar que qualquer cor ou formeio e a relativamente fraca capacidade dema, assim como qualquer som, possuem um fensiva do organismo é sentida como uma tenaspecto emocional único, que pertence apenas são desmedida. Nesse caso, o comportamento a ele. Todos sabemos que certas cores e fortranscorre com sua força máxima, com o mámas nos tranqüilizam; outras, pelo contrário, ximo investimento de energia, e o efeito de nos excitam. Algumas provocam ternura e outras, repugnância; algumas despertam alegria adaptação será mínimo. Por último, o terceiro caso, possível e real, e outras causam sofrimento. Para convencersucede quando surge certo equilíbrio entre o se disso basta recordar o evidente significado emocional da cor vermelha - essa constante organismo e o ambiente, isto é, quando ne- A NATUREZA P S IC O L Ó G IC A 118 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Agora, em situações diferentes, as formas companheira de qualquer insurreição, paixão externas dos movimentos que acompanhavam e rebelião -, ou azul - essa cor fresca e serena a emoção se enfraqueceram e, pouco a pouco, da distância e dos sonhos. foram se atrofiando devido à sua inutilidade. Na verdade, é suficiente refletir um pouMas a função interna de organizadora de todo co sobre como aparecem em cada idioma formas de expressão como uma "cor fria" ou uma o comportamento, que foi seu papel primário, "cor cálida", um "som alto" ou um "som baicontinua existindo até hoje. Esse aspecto de atividade na emoção é o que constitui a caracxo", uma "voz suave" ou uma "voz dura". Uma terística mais importante no estudo de sua nacor não é cálida nem fria, assim como o som tureza psicológica. Quem pensa que a emoção também não é alto nem baixo e em geral não possui formas espaciais. No entanto, todos representa uma vivência puramente passiva do organismo e que ela não provoca nenhuma compreendem quando se diz que a cor de laranja é cálida ou que urna voz grave é baixa atividade está concebendo a questão de forma ou "grossa", como a chamavam os gregos. É equivocada. Pelo contrário, podemos pensar que a teoevidente que não há nada em comum entre a ria da origem da psique, que vincula sua aparicor e a temperatura, entre o som e o tamanho, ção à denominada c o n s c i ê n c i a h e d o n i s t a , isto é, mas pelo visto existe algo que os une no tom emocional que colore ambas as impressões. Um com o sentimento primitivo [original] de satisfatom cálido ou um som alto indica que há algução ou insatisfação que, como momento secunma semelhança entre o tom emocional da cor dário de retroalimentação da reação, a freava e da temperatura. A cor laranja em si mesma ou estimulava, é mais verdadeira. Portanto, a não se parece com nada cálido, mas em sua direção inicial das reações surge das emoções. ação sobre nós há algo dessa índole que recorLigada à reação, a emoção regula e orienta a reada a ação do cálido. Já definimos a reação ção, segundo o estado geral do organismo. E a emocional como uma reação que avalia e é passagem para o tipo psíquico do comportamento [ fe e d secundária; como uma reação circularZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA surgiu, sem nenhuma dúvida, mediante as emob a c k ] do campo proprioceptivo. E o tom emoções. Também pode-se supor que as formas pricional da sensação tem a ver com o grau de márias do comportamento puramente psíquico interesse e participação de todo o organismo da criança sejam as reações de prazer e desgosem cada uma das reações de um órgão. Para o to, que surgem antes que as outras. organismo, é indiferente o que o olho vê: ou Esse caráter ativo das reações emocionais se solidariza com essa reação ou se opõe a ela. se explica de melhor maneira graças à teoria "Portanto - diz Münsterberg - o 'agrado' ou tridimensional do sentimento, proposta por 'desagrado' na verdade não antecede a ação, Wundt." [Essa teoria] pressupõe que todo senmas a ação é que leva à continuação ou intertimento tem três dimensões e que cada dimenrupção do estímulo." são possui duas direções. O sentimento pode fluir na direção: (1) do gozo e do desagrado; Por esse motivo, a reação emocional, entendida como reação secundária, é um podero(2) da excitação e da inibição; (3) da tensão e do relaxamento. so organizador do comportamento. Na reação emocional realiza-se a atividade de nosso orgaPode-se supor rapidamente que a tensão nismo. Vimos que as emoções surgiram, por via coincide com a excitação, enquanto a inibição instintiva, dos movimentos mais complexos e coincide com o relaxamento. Mas isso não é corvivos. Em sua época, elas organizaram o comreto. Se uma pessoa receia algo, seu comportaportamento nos momentos mais difíceis, fatídimento caracteriza-se por uma extraordinária tencos e importantes da vida. Emergiram nos ponsão, pela tensão de cada músculo e, ao mesmo tos culminantes da vida, quando o organismo tempo, por uma extraordinária inibição de suas triunfava sobre o ambiente ou estava prestes a reações. Da mesma maneira, a expectativa de ser destruído por este. Em todas essas oportuum prêmio ou a antecipação de um veredicto nidades, as emoções exerceram uma espécie de [favorável] provoca uma excitação gozosa, asditadura sobre o comportamento. sociada ao desaparecimento da tensão. P S IC O L O G IA Essas três dimensões de qualquer emoção implicam, a rigor, o caráter ativo do sentimento. Toda emoção é um chamado à ação ou à rejeição da ação. Nenhum sentimento pode permanecer indiferente e infrutífero no comportamento. As emoções são, precisamente, o organizador interno de nossas reações; [o organizador] que coloca em tensão, excita, estimula ou freia todas as reações. Portanto, a emoção conserva o papel de organizador interno de nosso comportamento. Quando fazemos algo com alegria, as reações emocionais de alegria significam que, a partir daquele momento: tentaremos fazer o mesmo. Quando fazemos algo com repulsão, isso significa que tenderemos, por todos os meios possíveis, a interromper essa tarefa. Portanto, esse novo componente introduzido pelas emoções em nosso comportamento se reduz totalmente à regulação, pelo organismo, de cada uma de suas reações. Torna-se então totalmente compreensível essa diversidade coordenada das reações emocionais que incorpora ao processo de cada reação singular todos os órgãos fundamentais de nosso corpo. Pesquisas experimentais demonstram, mediante o registro dos movimentos respiratórios, das batidas do coração e do pulso, que essas curvas dos registros que expressam o curso dos processos orgânicos mais importantes respondem docilmente à mínima irritação, como se elas se adaptassem imediatamente às mais mínimas modificações do ambiente. Não é em vão que, há tanto tempo, o coração é considerado o órgão do sentimento. Nesse sentido, as conclusões da ciência coincidem com o antigo critério sobre o papel do coração. As reações emocionais são, acima de tudo, reações do coração e da circulação; e, se recordarmos que a respiração e o sangue determinam o curso de todos os processos em todos os órgãos e tecidos, compreenderemos por que as reações do coração podem assumir o papel de organizadores internos do comportamento. Lange afirma o seguinte: P E D A G Ó G IC A 119 cem influência sobre nossos órgãos externos não colocassem em ação também esse sistema, passaríamos de largo pela vida, indiferentes-e impassíveis; as impressões do mundo exterior aumentariam nosso saber, mas tudo se limitaria a isso; não despertariam em nós nem alegria, nem ira, nem preocupação, nem temor. [C. C. Lange,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFED T h e e m o t i o n s , Nova York: Hafner, 1967, p. 80] A EDUCAÇÃO D O S S E N T IM E N T O S ''A educação sempre implica mudanças." Se não houvesse nada a modificar, não haveria nada a ser educado. Que mudanças educativas devem ocorrer nos sentimentos? Anteriormente, vimos que todo sentimento não passa do mecanismo da reação, isto é, de certa resposta do organismo a qualquer estímulo do meio. Portanto, o mecanismo da educação dos sentimentos é, em linhas gerais, o mesmo que para todas as outras reações. Mediante a vinculação de vários estímulos sempre podemos fechar [formar] novas conexões entre a reação emocional e qualquer elemento do ambiente. Da maneira que a primeira influência educativa será a mudança dos estímulos aos quais a reação está ligada. Todos sabem que na ação não tememos aquilo que temeremos mais tarde [quando a ação ficou para atrás e estamos distantes dela]. O que provocava temor e assustava torna-se inofensivo. Por outro lado, também aprendemos a temer muitos objetos e coisas em que antes confiávamos. De que modo se realiza essa transferência do medo de um objeto para outro? Aqui, o mecanismo mais simples é a educação de um reflexo condicionado, isto é, desse mecanismo de transferência da reação para um novo estímulo, que se efetua cada vez que este coincide com o estímulo incondicionado de uma reação inata. Por exemplo, se o fato que assusta uma criança sempre é acompanhado de outras circunstâncias, estas posteriormente por si mesmas serão capazes de lhe provocar medo. Uma Devemos todos os conteúdos emocionais de criança receia entrar em um quarto em que nossa vida espiritual, nossas alegrias e penas, as horas de alegria e tristeza, a nosso passou por uma experiência terrível, ainda que sistema vasomotor. Se os objetos que exer-RQPONMLKJIHGFEDCBA seja apenas uma vez. Evita os objetos que es- 120 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tavam presentes no momento em que se assustou. Deriva daí que a primeira regra da educação do sentimento deve consistir no seguinte: é preciso se esforçar por organizar a vida e o comportamento da criança de tal maneira que ela enfrente os estímulos entre os quais deve ser criada essa transferência do sentimento, com a maior freqüência possível.' Inicialmente, a criança reage com temor ante a proximidade de suas contrariedades pessoais, porém suponhamos que alguma ameace assiduamente seus seres queridos, sua mãe ou irmã. Isso também se vinculará à dor pessoal para a criança. No décorrer de um curto período fecha-se uma nova conexão para a criança, que reagirá com temor ante a aproximação de uma contrariedade ou de um sofrimento que não a afeta pessoalmente de forma alguma, mas que ameaça seus seres queridos. Portanto, o sentimento estreito e egoísta de temor pode passar a ser uma potente base de amplos e profundos sentimentos sociais. Da mesma forma, podemos retirar facilmente do estreito círculo pessoal todos os sentimentos egoístas, isto é, podemos ensinar à criança a não reagir com ira a uma ofensa pessoal, mas à ofensa ao seu país, à sua classe [social], à sua causa. Essa possibilidade de ampla transferência dos sentimentos constitui a garantia de sua educação, que se exprime na possibilidade de construir relações completamente novas entre o indivíduo e o ambiente. Por isso, para o professor não deve haver emoções inaceitáveis ou indesejáveis. Pelo contrário, ele sempre deve partir dos sentimentos chamados de inferiores e egoístas, os mais primários, básicos e intensos e, com base nesses sentimentos, assentar as bases da construção emocional da personalidade. Por esse motivo, a divisão dos sentimentos em inferiores e superiores, egoístas e altruístas deve desaparecer, pois todos os sentimentos podem ser orientados pelo educador para qualquer lado e podem ser conectados a qualquer tipo de estímulo. Pode-se ensinar uma criança a ficar com medo de uma espinha que aparece em seu rosto ou de uma aranha na parede, e é possível ensinar-lhe a temer as calamidades gerais, as derrotas da causa preferida, a desgraça que pode acontecer com seus seres queridos. E tudo o que dissemos sobre o medo pode se referir igualmente aos outros sentimentos. Todas as outras reações emocionais podem ser vinculadas aos mais diversos' estímulos, e só é possível realizar esse vínculo fazendo com que os diferentes estímulos sejam confrontados com a experiência pessoal do aluno. Em outros termos, também nesse caso o mecanismo educativo se reduz a uma determinada organização do meio. Portanto, a educação das emoções sempre é, em essência, uma reeducação das emoções, isto é, uma modificação na direção da reação emocional inata. Além disso, existe um mecanismo psíquico da educação dos sentimentos inerente apenas às reações emocionais e que se fixa nas peculiaridades de seu caráter. Através desse mecanismo, uma conexão entre uma reação e qualquer fato não pode ser fechada apenas da forma anteriormente mencionada. O sentimento de medo, por exemplo, também pode ser vinculado a um estímulo que não esteve unido na experiência a um estímulo condicionado de medo, mas que na experiência da criança esteve ligado a um sentimento de dor, de desagrado, etc. Nesse caso, basta criar a denominada ZYXWVUTSRQPO rea ç ã o p r e v e n tiv a . Assim, a criança pequena estende pela primeira vez suas mãos, com confiança, para a luz [uma vela, por exemplo] mas, se se queimar alguma vez, começa a sentir medo do fogo e reage com grande temor quando se aproxima dele. Temos aqui o fechamento de uma nova reação, não através do estabelecimento de um reflexo condicionado, mas de algo diferente, ou seja, a conexão independente entre duas emoções, em que uma emoção de dor fortemente vivenciada provoca a emoção do medo. Em outras palavras, o efeito emocional de algum fato ou reação serve como causa para a formação de uma série de outras conexões emocionais. Quando se deseja que a criança sinta medo de algo, é preciso vincular o aparecimento disso à dor ou ao sofrimento para o organismo; assim, o temor surge sozinho. Dessa maneira, os sentimentos devem ser considerados um sistema de reações preventivas que comunicam ao organismo o futuro imediato do seu compqrtamento e orga- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 121 nizam as formas desse comportamento. Remétodo morto, sem alma, de ensinar as matérias, desempenhou um papel não pouco imsulta então que o professor encontra nos senportante na extinção da alma do mundo e no timentos uma ferramenta sumamente valioaniquilamento dos sentimentos. Quem de nós sa para a educação das reações. Nenhuma fornão refletiu sobre o manancial inesgotável de ma de conduta é tão sólida como a ligada à estímulos emocionais que existe em um curso emoção. Por isso, se desejarem provocar no comum de geografia, astronomia ou história; aluno as formas necessárias de comportamentudo o que devemos fazer é pensar que o ensito, sempre devem se preocupar com que esno dessas disciplinas deve extrapolar os limisas reações provoquem uma marca emociotes dos áridos esquemas lógicos e se transfornal nele. Nenhuma prédica moral educa tanto como uma dor vivida, um sentimento vivimar não só em objeto e tarefa do pensamento, mas também em tarefa do sentimento. do e, nesse sentido, o aparelho dos sentimentos é uma espécie de instrumento especialA emoção não é uma ferramenta menos mente adaptado e fino através do qual é mais importante que o pensamento. A preocupafácil influenciar o comportamento. ção do professor não deve se limitar ao fato As reações emocionais exercem uma inde que seus alunos pensem profundamente e fluência essencial e absoluta em todas as forassimilem a geografia, mas também que a sinmas de nosso comportamento e em todos os tam. Por algum motivo, essa idéia geralmenmomentos do processo educativo. Se quiserte não passa pela nossa mente, e o ensino mos que os alunos recordem melhor ou exermatizado por emoções é um raro hóspede citem mais seu pensamento, devemos fazer entre nós. [O ensino], na maioria das vezes, com que essas atividades sejam emocionalestá ligado ao carinho impotente que o promente estimuladas. A experiência e a pesquifessor sente por sua matéria, porém ele não sa têm demonstrado que um fato impregnaconhece a forma de transmitir esse amor a do de emoção é recordado de forma mais sóseus alunos e, portanto, costuma ser considelida, firme e prolongada que um feito indiferado um extravagante. rente. Cada vez que comunicarem algo ao aluNo entanto, as reações emocionais devem no tentem afetar seu sentimento. Isso não é constituir o fundamento do processo educatiapenas necessário como meio para uma mevo. Antes de comunicar algum conhecimento, lhor recordação e assimilação, mas também o professor tem de provocar a correspondente emoção do aluno e se preocupar para que essa como fim em si .mesmo. Na época pré-revolucionária, nossa eduemoção esteja ligada ao novo conhecimento. Este só pode se solidificar se tiver passado pelo cação intelectualizava nossa conduta de forma ilimitada, e o resultado foi essa terrível "sesentimento do aluno. O restante é conhecimencura do coração", essa completa falta de sentito morto, que mata qualquer atitude viva com relação ao mundo. De todas as matérias ensimento que se transformou na característica inevitável de todas as pessoas que tiveram esse nadas na escola, só no âmbito da literatura - e também aqui em um ínfimo grau - reconhetipo de educação. No homem contemporâneo ceu-se a necessidade de que o momento emotudo foi automatizado a tal ponto que suas cional estivesse presente na estruturação do impressões singulares uniram-se a conceitos, processo educativo. e sua vida transcorre de forma aprazível sem Os antigos gregos diziam que a filosofia afetar nem atingir sua psique; no aspecto emocomeça pelo assombro. E isso é psicologicacional, essa vida sem júbilo e sem tristeza, sem mente correto quando se aplica a qualquer sacomoções vívidas, e também sem grandes aleber, no sentido de que todo conhecimento deve grias, cria a base para esses sentimentos de ser precedido de um sentimento de avidez. Um pequeno calibre que, na linguagem literária certo grau de sensibilidade emocional, de comrussa, recebeu há muito tempo a denominapromisso, deve servir necessariamente como ção de mentalidade pequeno-burguesa. Devido a essa educação, perdemos a esponto de partida para qualquer trabalho educativo. pontânea sensação de vida e, além disso, o XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA l 122 L lE V S E M IO N O V IC H o V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA melhor exemplo dessa insensibilidade estéril a que nos referimos é um pequeno relato cômico de Tchekov," que possui um profundo sentido. Ele conta que um velho funcionário que nunca tinha estudado, recordava por experiência o significado de todos os sinais de pontuação. Sabia que, antes da enumeração de documentos ou certificados, deve-se colocar dois pontos, que a vírgula separava o sobrenome e as enumerações; em outras palavras, em toda sua vida e experiência sempre foram assim os momentos cujo significado emocional era denotado com esses sinais. No entanto, ele não encontrou nenhuma vez, em todos seus anos de trabalho, o sinal de exclamação. Ficou sabendo, por meio da esposa, dessa regra, aprendida por ela no colégio, pela qual se coloca um sinal de exclamação para expressar entusiasmo, admiração, ira, indignação e outros sentimentos. Esses sentimentos, porém, não tinham existido na vida do funcionário, e um sentimento de infinita amargura pela vida totalmente vivida, de rebelião e indignação, provoca-lhe pela primeira vez uma forte explosão e, no livro de felicitações de seu chefe, escreve três grandes sinais de exclamação depois de sua assinatura. 'I ,XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Se quiserem que seus alunos não tenham uma vida tão lamentável quanto a do funcionário de Tchekov, façam com que o entusiasmo, a indignação e outros sentimentos não passem ao largo de suas vidas, para que nelas haja mais pontos de exclamação. Não sei por que em nossa sociedade formou-se um critério unilateral sobre a personalidade humana, nem por que todos relacionam dons e talento apenas ao intelecto. Além de ser possível pensar com talento, também se pode ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA s e n t i r t a l e n t o s a m e n t e . O aspecto emocional da personalidade não tem menos importância que outros e constitui o objeto e a preocupação da educação, na mesma medida que o intelecto e a vontade. O amor pode conter tanto t a l e n t o e inclusive g e n i a l i d a d e quanto a descoberta do cálculo diferencial." Em ambos os casos o comportamento humano adota formas excepcionais e grandiosas. O outro extremo - que não é o melhor da educação emocional é o desmedido e falsamente inflado sentimentalismo, que deve ser diferenciado rigorosamente do sentimento. Deve-se entender por sentimentalismo as formas de reações emocionais em que a emoção não está ligada a nenhuma ação e se resolve totalmente nas reações internas que a acompanham. A título de exemplo de um falso sentimento, James menciona os sentimentos dos aristocratas russos que choram no teatro diante da representação de qualquer drama sentimental, sem passar pelas suas mentes que seus cocheiros estão congelando na rua a uma temperatura de 40 graus negativos. Na mesma medida em que a emoção é poderosa e importante para a ação, o sentimentalismo é estéril e insignificante. No que se refere à educação dos sentimentos no sentido próprio da palavra, a tarefa pedagógica essencial consiste no domínio das emoções, isto é, na inclusão delas na rede geral do comportamento, de forma tal que se vinculem intimamente a todas as outras reações e não se expressem de maneira perturbadora e desorganizadora. Saber dominar os próprios sentimentos não implica psicologicamente outra coisa que saber dominar suas expressões externas, isto é, as reações ligadas a estas. Por isso, o sentimento só é vencido através do domínio de sua expressão motora, e aquele que aprende a não fazer caretas nem franzir a testa ante um gosto desagradável, vence também a própria repulsão. Daí deriva o extraordinário poder sobre a educação dos sentimentos, que é inerente ao desenvolvimento dos movimentos conscientes e a seu controle. "O covarde que adotar uma postura altiva e que, com aspecto belicoso, caminhar ao encontro do inimigo de forma audaz e aberta, já venceu sua covardia." Sabemos que célebres valentes, como Pedro o Grande'? e Napoleão!' tinham um medo mortal de ratos e insetos. Portanto, conheciam o sentimento de medo e as reações emocionais. Entretanto, podiam se manter firmes durante o combate, sem tremer sob as balas, porque sabiam controlar seu temor. Esse domínio dos sentimentos, que constitui o objetivo de toda educação, pode parecer, à primeira vista, uma repressão de todo sentimento. A rigor, porém, implica apenas a P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 123 subordinação do sentimento, sua vinculação às restantes formas de comportamento, a orientação racional desse sentimento. Como exemplo dessa utilização racional do sentimento, podemos mencionar os denominados sentimentos intelectuais, isto é, sentimentos como a curiosidade, o interesse, o assombro, etc., diretamente ligados à atividade intelectual e que a dirigem de forma evidente, embora ao mesmo tempo tenham uma expressão corporal totalmente insignificante que, na maioria das vezes, se esgota em alguns movimentos sutis dos olhos e do rosto .. " O jogo, que já classificamos como o melhor mecanismo educativo do instinto, é ao mesmo tempo a forma ótima de organização do comportamento emocional. O jogo da criança sempre é emocional, sempre desperta nela sentimentos intensos e vívidos, mas também a ensina a não seguir cegamente os sentimentos, mas a coordená-los com as regras do jogo e com seu objetivo final. Portanto, o jogo constitui a primeira forma de comportamento consciente que emerge com base no instintivo e no emocional. É o melhor meio para a educação integral de todas essas diferentes formas e para estabelecer uma coordenação correta e uma ligação entre elas.XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 2. A morte não permitiu que Vigotski concluísse uma monografia sobre as emoções, que começou a escrever em 1931 e que continuou redigindo até 1933. Esse ensaio inacabado está incluído no voI. VI de suas O b r a s E s c o g i d a s (Madrid: Visor). O manuscrito original, segundo Roza Noievna Vigodskaia (cf. V o p r o s i F i l o s o f i [ P r o b l e m a s de F i l o s o f i a ] , 1970, n? 6), tem três títulos: (1) A t e o r i a d a s e m o ç õ e s à l u z da p s i c o - "Emoção, afeto, sentimento" - sobretudo o original tratamento dos sentimentos estéticos superiores -, da P s i c o l o g i a D i a l é c t i c a de Jorge Thénon (Buenos Aires: Paidós, 2.ed., 1974, p. 163-186). em seus fundamentos às técnicas utilizadas nas terapias comportamentalistas para o tratamento das fobias. Embora a reflexologia e o comportamentalismo sejam essencialmente diferentes, aqui há um ponto de coincidên- n e u r o lo g ia c o n te m p o r â n e a : P e s q u is a s h is tó r ic o - e (3) E n s a i o s d e p s i c o l o g i a : O p r o b l e m a d a s e m o ç õ e s . O título provisório da versão do vol. VI das O b r a s ... de Vigotski p s i c o l ó g i c a s ; (2) S p i n o z a ; em espanhol, traduzidas da versão da Editora Pedagoguika de Moscou, não coincide com nenhum desses três: é D o u t r i n a das e m o ç õ e s . P e s q u is a h is tó r ic o -s o c io ló g ic a . 3. Cf. W James, "What is an Emotion", M i n d , n 29 (1884), p. 188-205. Em 1890, James ampliou esse artigo no capítulo sobre as emoções de seu P r i n c i p i a s de P s i c o l o g í a , trad. de A. Bárcena, México: FCE, 1989, p. 909-943; esse é o livro que consultamos para este capítulo. A versão russa de P r i n c i p i a s ... , trad. de I. I. Lapshin, foi publicada em 1911 em São Petersburgo. Carl George Lange (1834-1900) foi um médico e fisiologista dinamarquês que pesquisou as emoções e chegou, de forma independente, a conclusões semelhantes às de William James sobre elas - por isso, se fala da "teoria das emoções de James-Lange". Utilizamos uma versão inglesa do livro de Lange (cf. C. G. Lange, T h e E m o tio n s , op. cit.; o texto original dinamarquês é de 1885: Om S i n d s b e v a e g e l s e r ) . NOTAS 4. O grifo é nosso. 5. O fato de que aqui Vigotski fale de "sentimene m o ç õ e s e dos 1. Neste capítulo, Vigotski fala das ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tos inferiores" e, posteriormente, de "sentimens e n tim e n to s , como se esses termos fossem sitos superiores" não permite inferir - dado que nônimos. O vasto e rico campo da afetividade o faz em sentido axiológico - que ele alude à humana - emoções, paixões, afetos, sentimensua futura divisão dos processos psíquicos em tos - teve sua acepção reduzida, na psicoloinferiores e superiores. Em compensação, no gia do século XX, a apenas um termo: "emoCapo 7, pode-se perceber uma noção e m b r i o ção". Em nossa opinião, os diferentes concein á r i a dessa divisão. tos da afetividade mencionados abrangem 6. Aqui, Vigotski refere-se a W Wundt, G r u n d r i s s vários campos ontologicamente diferentes da d e r P s y c h o l o g i e [ C o m p ê n d i o de P s i c o l o g i a ] , cuja realidade da psique. A emoção estaria mais 1-ªedição é de 1896 e que chegou, em 1911, a próxima do biológico, enquanto o sentimendez edições revistas, seguidas de cinco reimto seria uma emoção socializada, um produto pressões. cultural. Cf., por exemplo, o Capo 4, intitulado 7. Essa prescrição feita por Vigotski é idêntica 124 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I cia com o comportamentalismo de primeira geração à Watson. O comportamentalismo radical de Skinner - de segunda geração - está mais circunscrito aos laboratórios de pesqui- poucos passos do de Vigotski, no cemitério Novodievichi de Moscou. 9. O grifo é nosso. As asserções de Vigotski nesse parágrafo, escritas 70 anos antes de que se começasse a falar de' "inteligência emocional" sa de comportamento animal, à fisiologia, à farmacologia, etc. As atuais psicoterapias comno âmbito da psicologia, chamam a atenção. portamentais-cognitivas utilizadas no âmbito 10. Pedro o Grande (1672-1725) foi o czar que clínico pertencem a um comportamentalismo a R ú s s ia n a e s fe r a c u ltu r a l e u r o p é ia , in tr o d u z iu de terceira geração, conforme os períodos deincorporou sua tecnologia e construiu a cidamarcados por Arthur Staats (cf.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA C o n d u c tis m o de de São Petersburgo segundo o estilo das S o c i a l , México: EI Manual Moderno, 1979). É grandes cidades ocidentais, transferindo para interessante observar que a convergência das lá a capital da Rússia. Entretanto, esse movicorrentes comportamentais e cognitivas, que mento inaugurado por Pedro contou com a ocorreu a partir da década de 80 nos Estados forte resistência da e s l a v o f i l i a [ s l a v i a n o f i l s t v o ] , Unidos, foi antecipada' por Vigotski 60 anos corrente que considera que a Rússia pertence antes (cf. seus comentários sobre o que ele à esfera cultural asiática e que seus males oridenominou "psicocomportamentalismo" em ginaram-se com as importações ocidentais. seu artigo de 1928, "EI conductismo", p. 91, Atualmente, de Solyenitsin ao novo Partido Coem L. S. Vigotski, L a G e n i a l i d a d y o t r o s t e x t o s munista russo, todos são eslavófilos. i n é d i t o s , edição de G. Blanck, Buenos Aires: 11. Napoleão Bonaparte (1769-1821) foi a figura Almagesto, 1998, p. 87-96). É muito intereshistórica mais importante do século XIX. A sante ver como Vigotsky analisou os alcances Revolução Francesa institucionalizou o poder e os limites dessa corrente, suas conquistas e da burguesia com Napoleão. Ele e n c a r n o u a carências, antes que o comportamentalismo m o b i l i d a d e s o c i a l introduzida pelo capitalismo: se transformasse no principal sistema psicosaiu da academia militar como segundo tenente lógico do mundo, de 1930 aos anos 70. Para e chegou, por seus próprios méritos, ao mais uma visão das mudanças na psicologia atual, alto escalão militar francês; mais tarde, em sua "zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA assim como das tendências dominantes, ver carreira política, se transformou na maior auM. Carretero, l n t r o d u c c i ó n a I a P s i c o l o g í a C o g toridade da França (e inclusive em seu impen i t i v a , Buenos Aires: Aique, 1997, p. 76-78. rador, em um gesto grotesco). Suas campanhas 8. Aqui, Vigotski se refere ao conto de Tchekov O militares m i n a r a m as b a s e s f e u d a i s dos países s i n a l de e x c l a m a ç ã o ( C o n t o de N a t a l ) . Anton que invadiu. Para além de derrotas momentâPavlovitch Tchekov (1860-1904) foi um médineas, em termos históricos pode-se dizer que, co, dramaturgo e contista russo - um dos mais em geral, onde Napoleão pisou, a burguesia importantes contistas da história da literatura. acabou por triunfar. Ele morreu de tuberculose. Seu túmulo fica a 1 l' " " I XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A P s ic o lo g ia e a P e d a g o g ia d a A te n ç ã o zyxwvutsrqponmlkjihgfedc ,. essas adaptações motoras à percepção das impressões externas. Até os atos mais fáceis da DA ATENÇÃO atenção - como a pesquisa experimental dea te n ç ã o A psicologia tradicional define a ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA monstrou - são acompanhados de modifica[ v n i m a n i e J como a atividade mediante a qual ções do traçado da respiração e do pulso. conseguimos desmembrar a complicada compoInclusive esses processos mais íntimos do sição das impressões que nos chegam do exteorganismo se adaptam à atividade iminente. rior, concentrando na parte mais importante toda Entretanto, essas reações motoras ativas só a força de nossa atividade e facilitando assim sua constituem a metade do processo. A outra penetração na consciência. Dessa forma, é possímetade, não menos importante, consiste na vel alcançar a precisão e a clareza peculiares para detenção de todos os outros movimentos e reavivenciar separadamente o que é importante. ções não-vinculados à atividade iminente. Por No entanto, a velha psicologia também sua experiência pessoal, todos sabem até que sabia que, nos atos da atenção, nos deparaponto a escuridão contribui com uma escuta mos com fenômenos que não são de ordem atenta ou o quanto o silêncio propicia um olhar "psíquica", e que a atenção também se inicia, mais atento; em outras palavras, o quanto a com maior freqüência, em toda uma série de inação e a tranqüilidade dos órgãos não-envolmanifestações de caráter puramente motor. É vidos facilitam a concentração da atenção na atividade do órgão fundamental. Do ponto de suficiente observar os atos mais simples da atenção para perceber que, em cada caso, esvista psicológico, a interrupção de uma reação ses atos começam com reações de ajuste que ou sua inibição representa o mesmo que a reação motora de qualquer movimento ativo. Porse reduzem a movimentos dos diferentes órtanto, do aspecto motor, a atenção se caractegãos da percepção. Assim, quando nos dispomos a observar algo cuidadosamente, adotariza por movimentos adaptativos dos órgãos mos a postura adequada, colocamos a cabeça internos e externos e pela inibição de qualquer em certa posição, adaptamos e fixamos os olhos outra atividade do organismo. da forma necessária. No ato de escutar atentaEm nossa vida, porém, o principal papel mente, o papel dos movimentos adaptativos e pertence àqueles atos de atenção que não foorientadores do ouvido, do pescoço e da caberam mencionados na primeira parte desse quadro. Isso ocorre na denominada atenção "inça não é menor. O sentido e a função de todos esses moterna", isto é, quando o objeto para o qual a vimentos têm a ver com uma posição mais côforça de nossa atenção está orientada não é moda e favorável dos órgãos da percepção, que externo ao organismo, mas constitui uma parrealizam o trabalho mais importante. Mas este da reação do próprio organismo que, nesse sas reações motoras da atenção vão além das caso, assume o papel de estímulo interno. mencionadas reações dos órgãos externos da Do ponto de vista das reações, os fenôpercepção. Todo o organismo é penetrado por menos da atenção devem , ser considerados A NATUREZA P S IC O L ó G IC A 126 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA O primeiro, que permite diferenciar entre si as sistema de ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r e a ç õ e s de o r i e n t a ç ã o ou seja, das reações preparatórias reações de orientação, é sua c a p a c i d a d e , ou do organismo que colocam o corpo na postura seja, a quantidade de excitações simultâneas que, em uma orientação dada, podem ser ine no estado necessários e os prepara para a cluídas no mecanismo de ação de nossa conatividade que o espera.' Desse ângulo, as reações de orientação não se diferenciam de forduta. Segundo os cálculos de Wundt.! nossa ma alguma de todas as outras. É muito fácil consciência pode abranger de forma simultâdescobrir e mostrar nelas os mesmos três comnea de 16 a 40 impressões simples, enquanto ponentes necessários que surgem durante o a atenção é capaz de preparar nosso organismo para reagir simultaneamente a uma quantranscurso completo de cada reação. O primeiro desses componentes é a pretidade menor de impressões do mesmo caráter, de 6 a 12. Portanto, fica claro o caráter sença do correspondente estímulo ou impulseletivo da reação de orientação, que escolhe so, independente da forma como é expresso, por meio de uma impressão externa ou uma uma pequena parte de todo nosso comportaexcitação externa - através de uma palavra mento e, pelo visto, faz com que ele transcorra não-pronunciada, um desejo, uma emoção, etc. em outras condições que todas as demais. Sem esse ponto de apoio nunca aparece neDevemos dizer que a extensão da oriennhuma reação de orientação. tação não pertence às magnitudes constantes, A seguir, temos o componente de elabobiologicamente invariáveis. Ela apresenta varação [processamento] central desse impulso, riações muito bruscas conforme o sexo, a idacuja existência sempre pode ser julgada pelas de e a individualidade, porém o fundamental diversas formas adotadas pelas reações, ainda é que depende dos exercícios, dos hábitos e da que sejam provocadas pelo mesmo impulso, experiência de cada pessoa. Até para uma messegundo a diversidade e a complexidade dos ma pessoa a capacidade das orientações possíestados do sistema nervoso central. Quando veis não é algo constante, podendo variar de um estímulo chega a um grupo de focos de acordo com o estado geral de seu organismo. excitação, ele provoca um determinado efeito, O conceito dos contextos e limites das possibimas, se o agrupamento desses focos se modifilidades de ajuste do organismo constitui uma ca, o efeito desse mesmo estímulo será comdas conquistas mais valiosas da psicologia da pletamente diferente. atenção e introduz essa teoria em contextos econômicos que sempre permitem calcular e Por último, o terceiro componente da reação é o efeito de resposta, que sempre se realilevar em conta previamente as possibilidades za mediante um ato de atenção, através de uma de nossa atenção. série de movimentos de órgãos externos ou inO segundo aspecto que caracteriza a orientação é sua d u r a ç ã o ? A orientação eviternos, de uma série de reações somáticas dos órgãos internos ou de secreção interna. A read=ncia um estado sumamente instável, inconsção de orientação, nesse sentido, é a reação tante e oscilante. Isso pode ser verificado nos mais corrente do organismo, só que no comexperimentos mais simples. Se fixarmos nosportamento humano lhe cabe um papel pecusos olhos atentamente em um ponto ou uma liar: o de preparadora de nosso comportamento letra durante um longo período, é fácil perceposterior. Por isso, essa reação prévia pode ser ber que a atenção, intensa no início, começa chamada de "pré-reação". pouco a pouco a enfraquecer; o ponto, inicialmente percebido com máxima precisão e clareza, começa a diluir-se ante nossos olhos, torA S C A R A C T E R íS T IC A S na-se confuso e escuro, escapa de nosso camD A O R IE N T A Ç Ã O po de visão, volta a aparecer, treme, parece titilar ante a vista, ainda que todas as conAs r e a ç õ e s de o r i e n t a ç ã o [ u s t a n o v k a ] dedições externas que determinam o curso das vem ser descritas a partir de vários aspectos. excitações tenham permanecido invariáveis. como certo [ u s ta n o v k a ] , P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 127 dispersa de excitações completamente ÉzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA evidente que a mudança nos resultados deve similares, mas como um todo único com forma de onda, com seus pontos de auge e queda. A última característica e função da orientação também estão de acordo com isso, ou seja, seu papel de u n i f i c a d o r a e o r g a n i z a d o r a das impressões externas. Graças ao caráter rítmico de nossa atenção, estamos propensos a introduzir o ritmo e atribuí-lo a todos os estímulos externos, independentemente do fato de que os possuem ou não. Em outros termos, não percebemos o mundo em sua forma fragmentária e caótica, mas como um todo vinculado e rítmico, unindo os elementos menores em grupos e esses grupos em novas e maiores formações. Isso torna compreensível a expressão de um psicólogo de que, graças à atenção, percebemos o mundo como se fosse poesias, em que as sílabas separadas se unem em pés, estes em hemistíquios, os hemistíquios em versos, os versos em estrofes, etc. ser atribuída às modificações dos processos internos, particularmente ao processo de orientação ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [ u s ta n o v k a ] . Por estranho que possa parecer, a duração da orientação mede-se em um intervalo sumamente insignificante de tempo e, nos casos mais extensos, mal passa de alguns minutos; depois disso, começa a haver uma espécie de flutuação rítmica da orientação. Ela decai e volta a surgir se as condições da conduta exigem que se mantenha durante um longo período. Portanto, a orientação é uma espécie de diversos impulsos com intervalos, uma linha ponteada e não-cheia, que regula nossas reações por impulsos, perrnitindo-lhes fluir por inércia nos intervalos entre um impulso e outro. Dessa forma, o caráter r í t m i c o se transforma em lei fundamental de nossas orientações, exigindo que levemos em consideração todas as exigências pedagógicas que derivam daí. Os experimentos tão simples de Urbantschitsch A O R IE N T A Ç Ã O E X T E R N A E IN T E R N A confirmaram totalmente esse fato." Nesses experimentos, o sujeito do teste devia escutar No aspecto qualitativo, a psicologia atentamente, com os olhos fechados, o tiqueempírica caracterizava a atenção como voluntaque de um relógio, marcando com as palatária e involuntária. Em geral, consideravam-se vras "mais longe" e "mais perto" quando o tiin v o lu n tá r io s [ e x t e r n o s ] os atos que respondiam que-taque lhe parecesse mais forte ou mais fraa estímulos externos e que nos atraem por sua co. Em todos os casos obtinha-se invariavelenorme força, interesse ou capacidade de exmente o mesmo resultado: o sujeito, de forma pressão. Se, em uma sala silenciosa, o ruído de ordenada e com uma alternância correta, dium tiro atrai minha atenção, esse é um exemzia "mais longe" e "mais perto", pois continuaplo de atenção involuntária. A causa de minhas mente tinha a impressão de que o tique-taque reações de orientação [ u s t a n o v k a ] não se endiminuía ou se intensificava, o que lhe causacontra no organismo, mas em fenômenos que va a ilusão de que o experimentador estava estão fora dele, na surpreendente força do novo aproximando ou afastando regulamente o apaestímulo que se apodera de todo o campo livre relho; na verdade, o relógio estava imóvel, da atenção, desloca e inibe todas as nossas reapendurado na parede e, durante todo o temções restantes. po, não mudara de posição. Nós, psicólogos, chamamos de atenção De novo fica evidente que a causa do env o lu n tá r ia ou i n t e r n a aqueles casos em que a fraquecimento e da intensificação do som não concentração não está dirigida para fora, mas deve ser buscada nos processos externos, mas para dentro do organismo, e a própria vivência, nos processos internos da orientação. No caso ato ou pensamento do ser humano se transmencionado, estamos diante de uma forma forma em objeto da atenção. Como exemplo completamente pura do ritmo ou caráter ondudessa atenção voluntária podemos mencionar latório em nossa orientação, que, quando está qualquer concentração do próprio pensamendirigida para uma série regular e ininterrupta to, quanto tentamos lembrar .algo, compreende excitações, não as percebe como uma série XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ""f 128 ;, ., L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA der algo, ou quando empreendemos algum trabalho, a leitura de um livro, a escrita de uma carta e, de forma totalmente consciente e voluntária, realizamos a preparação de todos os órgãos necessários para essa tarefa. Durante muito tempo pareceu haver uma diferença radical entre ambos os tipos de atenção, devido à diferença entre a natureza fisiológica da involuntária e a natureza psicológica da voluntária. Os psicólogos caracterizavam a voluntária como vontade interna, como um puro ato de esforço volitivo, que não estava diretamente relacionado, a manifestações corporais. No entanto, a pesquisa experimental demonstrou que, mesmo no caso da atenção voluntária, estamos diante das mesmas reações somáticas da respiração e da circulação que existem no tipo involuntário de atenção. Além disso, esses atos são acompanhados por uma idêntica interrupção dos movimentos alheios, pela mesma detenção da atividade que está presente no caso da atenção externa [involuntária], e que a única diferença entre ambos os tipos de atenção é a ausência de reações adaptativas evidentes dos órgãos externos na voluntária." Essa diferença, porém, explica-se de forma clara e plena pela diferença existente entre o objeto ao qual a atenção está orientada nos dois casos. Compreende-se que, na atenção despertada por qualquer impressão proveniente de fora, o organismo reage com a preparação dos correspondentes órgãos de percepção, através dos quais essa impressão será levada até a consciência. Também se compreende que não existe nenhuma necessidade dessas reações quando a orientação se concentra em estímulos internos, que percebemos a partir dos campos proprioceptivo e interoceptivo, enquanto percebemos os estímulos externos a partir do campo exteroceptivo. A linguagem corrente registrou essa semelhança através das expressões com as quais se designam os atos da atenção interna [voluntária]. Quando estamos recordando algo de maneira intensa e concentrada, é como se estivéssemos ouvindo palavras que ressoam dentro de nós mesmos, e os sons e as vozes alheios ao assunto nos incomodam, como acontece quando escutamos atentamente uma música ou as palavras de alguma pessoa. Aqui, a linguagem reforça a plena semelhança que existe entre os movimentos adaptativos do ouvido e os das vias nervosas proprioceptivas no primeiro e segundo tipos de atenção. A diferença psicológica essencial só será a presença, no segundo caso [a atenção voluntária], de certa excitação externa capaz de provocar o mesmo efeito de reação de orientação que um estímulo externo. Não nos equivocamos de forma alguma se admitimos que a diferença entre ambos os tipos de orientação se reduz à diferença entre o reflexo inato ou incondicionado e o adquirido ou condicionado. Em suas formas elementares e mais simples, a concentração é como a observação o demonstrou - um reflexo incondicionado que se manifesta nos primeiros dias de vida do lactante, possuindo todas as características mais típicas da atenção do adulto. Mas, como todo reflexo incondicionado, também o reflexo de concentração está sujeito à educação e à reeducação. Se o estímulo que provoca esse reflexo sempre é acompanhado de outro estímulo estranho, graças a essa coincidência reiterada no tempo de ambos os estímulos, fecha-se [cria-se] uma nova conexão no córtex cerebral entre o segundo estímulo neutro e a reação coincidente com este. Forma-se assim um reflexo condicionado que age com regularidade mecânica e que é provocado pelo novo estímulo com a mesma precisão com que foi antes causado pelo incondicionado. Suponhamos que, em uma criança, o reflexo de concentração sempre é provocado pelas impressões provenientes da mãe que a alimenta. Se o sistema desses estímulos sempre coincide com excitações dos olhos provenientes das reações correspondentes ou de seu próprio pranto involuntário, graças a um breve treinamento, a sensação da vista ou o pranto serão suficientes para que todas as reações da criança se concentrem na comida, na ingestão de alimento, embora a mãe esteja ausente naquele momento. Assim, a orientação externa, provocada por um estímulo externo, passará para uma P S IC O L O G IA segunda fase, transformando-se em orientação interna, pois se subordinou a um estímulo interno.XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A ATENÇÃO E A D IS T R A Ç Ã O Em geral, a distração é considerada o ato diretamente oposto à atenção. Na realidade, se concebermos como atos de atenção a preparação do organismo para a chegada de certos estímulos, a distração denota, naturalmente, que se recebe um estímulo totalmente inesperado enquanto o organismo está despreparado para reagir a ele. Quando estamos atentos às palavras de outra pessoa, reagimos a elas com uma resposta oportuna e consciente. Quando estamos escutando de forma distraída, não respondemos ou nossa resposta demora ou é inadequada. Essa noção, porém, precisa de uma correção importante. Do ponto de vista psicológico, devem ser diferenciados dois aspectos diferentes e inconciliáveis na distração. Na verdade, a distração pode provir de uma atenção fraca, da incapacidade de reunir e concentrar a orientação [ustanovka] em algo. Por isso, ela pode estar indicando certa detenção e frustração de todo o mecanismo de nossa conduta e, nesse sentido, caso surgirem algumas características notórias, ela assume um caráter patológico evidente e passa a pertencer ao âmbito do anormal. Entretanto, a distração com a qual o professor tem de lidar na maioria das vezes e que se manifesta a cada momento na vida de uma pessoa normal constitui uma companheira necessária e útil da atenção. Já esclarecemos a importância da orientação, que limita nosso comportamento. O sentido da orientação sempre se reduz a restringir nosso comportamento a um caminho estreito. A redução do curso das reações, às custas de sua quantidade, ganha em força, qualidade e clareza. Naturalmente, isso pressupõe também uma redução de nosso comportamento, e uma série de estímulos que chegam a nós pode não provocar nenhuma reação . .Quando estamos atentos a uma só coisa, inevitavelmente estaremos distraídos com relação a todas as outras. A relação adquire aqui P E D A G Ó G IC A 129 o caráter matemático de uma proporcionalidade direta e, sem dúvida, podemos dizer que, quanto maior for a intensidade da atenção, maior será a intensidade da distração. Em outros termos, quanto mais exata e completa for a orientação a uma reação qualquer, menos adaptado para outra estará o organismo. Nas conhecidas histórias sobre a distração dos sábios e, em geral, das pessoas ocupadas com alguma idéia, essa lei psicológica dos vínculos entre atenção e distração é confirmada de forma mais eloqüente. A distração do sábio ou do pesquisador sempre envolve uma extraordinária concentração de seu pensamento em apenas um ponto. Do ponto de vista científico, é correto não falar da educação da atenção e da luta contra a distração, mas da correta educação de ambas, de forma conjunta. O S IG N IF IC A D O B IO L Ó G IC O D A O R IE N T A Ç Ã O O significado biológico da orientação [ustanovka] pode ser descoberto mais facilmente se levarmos em conta as necessidades que a originaram. Quanto mais complexo é um organismo, mais diversa e sutil é a forma de suas inter-relações com o ambiente e mais elevadas são as formas adotadas por seu comportamento. A complexidade fundamental, que distingue a conduta dos animais superiores, é uma supra-estrutura de experiência individual ou reflexos condicionados, construída graças à experiência herdada. Na aranha ou na borboleta, 99% do comportamento está determinado por formas instintivas herdadas; só 1 % - para simplificar - é determinado pelos nexos individuais estabelecidos por condicionamento [aprendizagem]. Essa relação [proporção] varia em ordem inversa quando passamos dos animais inferiores aos superiores." Na complicada composição do comportamento humano, só uma centena de reações é inata, não é afetada por influências individuais da experiência pessoal. O sentido biológico dessa supra-estrutura reside na chamada adaptação "antecipada" ou "de sinal" do organismo ao surgimento de fatos que ainda não estão presentes, mas que fatalmente aconte- 130 V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA cerão, devido a certos indícios conhecidos. Em suas formas superiores, esse sinal ou forma antecipada de adaptação a modificações futuras do meio se transforma em reação de atenção ou de orientação, isto é, está ligada de forma reflexa a impulsos daquelas reações que levam o organismo ao estado mais completo de preparação. Portanto, segundo a exata definição de Karl Groos,? a orientação pode ser definida, do ponto de vista biológico, com a espera do futuro, como uma ferramenta na luta pela existência, que permite que () organismo reaja com os movimentos necessários, não no momento do aparecimento do perigo, mas antes. Podemos dizer que o comportamento humano, em suas formas complexas, se divide em suas partes. Devido à enorme quantidade de reações elaboradas pelo organismo e à excepcional complexidade de suas combinações e uniões, surge a necessidade de uma direção especial do curso dessas reações, do controle do organismo sobre seu próprio comportamento. Em primeiro lugar, assumem o papel de reações de controle e regulação as excitações internas que aparecem no campo proprioceptivo e que levam o organismo a uma disposição combativa ante cada reação. Por isso, com todo direito, podemos comparar a atenção com uma estratégia interna do organismo. Na verdade, seu papel é o de estrategista, isto é, de guia organizador, de dirigente e fiscal do combate, sem nunca participar diretamente da luta. Desse ponto de vista fundamental também podem ser facilmente explicadas todas as características já mencionadas da orientação. É totalmente compreensível que, para conservar a unidade de funcionamento de nossos órgãos, torna-se biologicamente indispensável que o organismo corte a reação de orientação e restrinja sua extensão, a fim de garantir a unidade de ação dos mais diversos órgãos de nosso corpo. Também é compreensível a excepcional brevidade da orientação, pois ela constitui algo sumamente arriscado para o organismo, devido à sua estreita extensão. Quando ela prepara o organismo para o combate em um determinado setor, o enfraquece e desmobiliza para o combate em outros e, se a orienta- : " I L lE V S E M IO N O V IC H ~ ,.' ~IXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ção não fosse tão temerosa e instantânea, muitas vezes exporia o organismo aos riscos de um enorme perigo, contra os quais seria incapaz de oferecer resistência. Biologicamente, a orientação deve passar com rapidez de uma reação para outra, abrangendo com sua ação organizadora todos os aspectos de nosso comportamento. Essa natureza e o caráter rítmico da atenção, que não passa de um descanso dela, são imprescindíveis para que funcione durante bastante tempo. O caráter rítmico, portanto, não deve ser concebido como um princípio de diminuição da atenção, mas, pelo contrário, como um princípio de prolongamento desta, porque, quando o trabalho da atenção se satura e corta o ritmo, por meio de minutos de detenção e descanso, conserva e reforça sua energia e não se esgota nem se gasta por completo durante um prazo prolongado. Por fim, a última descoberta na natureza da atenção, quando se desvenda sua importância biológica, é que a reação de orientação deve ser entendida como um esforço do organismo que se prolonga sem cessar, e nunca como uma manifestação espontânea de sua atividade. Nesse sentido, estão certos os que dizem que, como um motor, a atenção funciona por meio de explosões, mantendo a força do impulso de uma explosão para a outra. De maneira que o ato de atenção deve ser compreendido como algo que se extingue e renasce de forma incessante, como algo que se acalma e acende a cada instante. o VALOR E D U C A T IV O D A O R IE N T A Ç Ã O Podemos dizer, sem medo de exagerar, que a orientação [ustanovka] é a condição primordial para exercer influência pedagógica sobre a criança. Alguns pedagogos preferem reduzir todo o processo da educação à elaboração de certas formas de orientação e, desse modo, dizem eles, toda educação é, acima de tudo, a educação da atenção, e os diferentes tipos de educação se distinguem uns dos outros só pelo caráter das orientações que devem ser elaboradas. P S IC O L O G IA Em certo sentido isso é totalmente correto, pois na educação não temos de lidar com movimentos e comportamentos que possuem uma meta e um valor por si mesmos, mas com a elaboração de aptidões e hábitos para as futuras atuação e atividade. Nesse caso, nossa tarefa não é provocar certas reações por si mesmas, mas apenas educar as orientações necessárias. A educação deve incorporar certa coordenação, apreensão e direção no conjunto caótico e desordenado de movimentos do recém-nascido. Toda a conduta do adulto se diferencia da do recém-nascido pela presença dessa característica. Por isso, se transforma em princípio fundamental da educação a escolha das reações mais necessárias e importantes, que devem ser conservadas, colocadas como pedra fundamental, em torno das quais devem se cristalizar e organizar-se em grupo as outras reações de menor significado, considerando que, em última instância, os movimentos totalmente inúteis para o organismo foram inibidos e reprimidos. Mas precisamente essas três funções - separação, agrupamento e demora - são realizadas pelo mecanismo da orientação. Para esclarecer a importância pedagógica da atenção, recorre-se à observação da forma como uma mãe, indiferente a todos os possíveis ruídos provenientes da rua, acorda devido a um fraco choro do filho; ou como um moleiro, que não acorda nem com o mais potente trovão ou com o barulho da tormenta, desperta com o mais leve murmúrio da água. Em outras palavras, geralmente - e para isso citamos esses casos - a orientação permite destacar as influências do meio que são biologicamente mais importantes para o organismo, ainda que elas sejam menos intensas que outras. oXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA D E S E N V O L V IM E N T O DA ATENÇÃO Como objeto da educação, a orientação não é menos valiosa, por sua ilimitada capacidade de desenvolvimento. Se compararmos as diferentes capacidades da criança e do adulto, em nenhum terreno nos deparamos com uma diferença tão colossal quanto no âmbito da orientação [ustanovka]. Na idade inicial, a P E D A G Ó G IC A 131 atenção tem, quase de forma exclusiva, um caráter instintivo-reflexo, e só gradualmente, mediante um prolongado e complexo treinamento, ela se vai transformando em orientação voluntária, dirigida pelas necessidades fundamentais do organismo que, por sua vez, dirige todo o nosso comportamento. Ao mesmo tempo, adquire excepcional significado pedagógico o interesse infantil, como a mais freqüente forma de manifestação da atenção involuntária. A atenção infantil depende quase por completo do interesse e, por isso, a causa natural da distração infantil sempre é a falta de coincidência de duas linhas da tarefa pedagógica: a linha do próprio interesse da criança e a de suas tarefas obrigatórias. Por isso, o velho sistema escolar, em que a divergência entre essas duas linhas era considerada a base da sabedoria psicológica, era obrigado a recorrer a medidas externas de organização da atenção; tinha de valorizar a atenção dos alunos por meio de uma nota especial e, em essência, era totalmente incapaz de elaborar as formas adequadas de orientação. Quando se permite que a criança siga seus interesses e se desenvolva de acordo com eles, isso envolverá inevitavelmente a observância de seus caprichos e suas necessidades e levará ao mesmo ponto ao qual levaria essa atitude com relação ao cavaleiro e seu cavalo. Muitos professores consideram que, dessa maneira, estariam renunciando à orientação e à direção do processo educativo e raciocinam mais ou menos assim: se a criança deve ser guiada por seu interesse, para que serve então o professor? Este se torna inútil se segue cegamente os interesses da criança. [Mas também] é nocivo se, na frente da criança, ele se esforça para rejeitar esse interesse e paralisar sua força de ação. Esse evidente equívoco pode ser resolvido do modo menos doloroso na psicologia pedagógica se nos situarmos no único ponto de vista correto: a educação não significa apenas seguir as tendências naturais do organismo, nem a luta estéril contra essas iriclinações. A linha da educação científica passou entre esses dois extremos, porém hoje eles devem ser combinados em um todo unificado. A educa- 132 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ção só será viável através das tendências naturais da criança; em todas as suas tendências, o ponto de partida da educação sempre devem ser essas inclinações. Mas ela confirmará sua própria impotência se considerar que esse é o único objetivo e sentido de sua missão. A rigor, a educação intervém ativamente nessas inclinações naturais da criança, as faz colidir entre si, as agrupa à vontade, apóia algumas delas, estimula umas às custas das outras e, dessa maneira, canaliza o processo espontâneo das inclinações infantis pelo canal organizador e formador do meio educativo social. O problema referente ao papel do professor no desenvolvimento dos interesses infantis está nessa mesma situação. Por um lado, o psicólogo é obrigado a reconhecer a onipotência dessa lei e tem de afirmar, de acordo com Thorndike, que esse princípio tem um significado universal e que até a tarefa menos interessante é realizada, em definitivo, por interesse, ainda que este seja negativo, ou seja, para evitar uma situação desagradável. Desse ponto de vista, toda aprendizagem só é possível à medida que se basear no próprio interesse da criança. Não existe outro modo de ensinar. Toda a questão está em saber até que ponto esse interesse é orientado conforme a linha do tema em estudo, e não vinculado a influências alheias a ele, como prêmios, castigos, medo, desejo de agradar, etc. Mas essa admissão da onipotência do desejo infantil de nenhuma maneira condena o professor a seguir de forma impotente o interesse infantil. Ao organizar o meio e a vida da criança nesse meio, o professor se imiscui ativamente nos processos do curso dos interesses infantis e os influencia da mesma forma que influencia todo o comportamento da criança. No entanto, sua norma sempre será: antes de explicar, interessar; antes de obrigar a agir, preparar para essa ação; antes de apelar às reações, preparar a orientação; antes de comunicar algo novo, provocar a expectativa do novo. Portanto, no aspecto subjetivo, para o aluno a orientação representa, acima de tudo, uma expectativa da atividade iminente. :iXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA o VALOR P S IC O L Ó G IC O D A E X P E C T A T IV A Na vida cotidiana, pode-se observar facilmente que a ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA e x p e c ta tiv a [ o y i d a n i e ] facilita a conduta ante qualquer fato inesperado. Com freqüência, a surpresa denota que a ação não está preparada e que a reação é inadequada. Entretanto, graças a experimentos psicológicos rigorosos, foi possível descobrir a verdadeira natureza da expectativa e traçar de forma acertada os limites de seu valor educativo. A experiência demonstrou que a expectativa, a rigor, sempre se reduz a certa preparação prévia dos correspondentes órgãos funcionais; ela seria uma espécie de mobilização do organismo para a ação posterior e constituiria uma ação já iniciada, porém não levada a termo. Essa ação iniciada é denominada por Binet" de "estado psíquico". Do mesmo modo que a atitude surge graças a certos movimentos e serve de ponto de partida para os posteriores, esses estados psíquicos da expectativa aparecem em função de determinadas reações, permitindo o surgimento dos seguintes. Ao medir a duração de uma reação simples, foi possível estabelecer um fato sumamente interessante: todas as pessoas, na reação simples, ante qualquer excitação simples, podem apresentar três reações de tipo completamente diferentes entre si, de acordo com a orientação [ u s t a n o v k a ] preliminar. O tipo mais comum de reação é chamado de reação n a t u r a l . É a reação que ocorre quando o movimento é realizado graças à orientação mais habitual, comum e própria de uma determinada pessoa. Isso acontece nos casos em que não intervimos diretamente na orientação do sujeito do experimento nem a organizamos de acordo com nossa maneira e com os objetivos do teste. O experimento demonstrou que, nesses casos, temos um tempo médio de reação típico de cada pessoa, isto é, a magnitude média habitual de sua orientação, que se manifesta no ritmo habitual e natural dos movimentos - o andar, a conversa, a escri- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 133 a qualquer momento, que imediatamente se ta - dessa pessoa. Em outros termos, nesses transforma em movimento ativo quando se casos é como se provocássemos a orientação ouve a parte executiva da ordem: "marche"! natural que foi elaborada e se formou na pesCom essa divisão consciente da orientação e soa após muitos anos - e que constitui parte do movimento vai sendo elaborada uma reainseparável de seu temperamento e caráter. Todos sabem que cada um de nós tem sua ção vigorosa e perfeita. maneira habitual de falar, sua velocidade haPerguntamo-nos: de onde provém essa aceleração da reação muscular ou, em outras bitual de caminhar e seu ritmo habitual de gesticular e falar. Essa orientação natural pode palavras, a orientação para a parte muscular do movimento? É evidente que ela ocorre às se distanciar de seu tempo médio em ambas custas da parte dos processos que foram reaas direções se, com a instrução prévia dada ao sujeito, provocamos nele uma nova orientação. lizados previamente com a mesma orientação Se antes do teste pedirmos ao sujeito que e, se a orientação motora reduz o tempo em não reaja do modo habitual' logo que perceber que a reação muscular transcorre, isso signia impressão externa, mas mais rapidamente, e fica que uma parte desse trabalho foi efetuase ao mesmo tempo lhe pedirmos que dirija da por esta, e que a reação muscular será reatoda a sua atenção ao órgão que mais reage, lizada agora sob o controle e a direção dessa digamos, ao dedo com que deve ser realizado orientação. o movimento de resposta, em cada oportuniIsso é confirmado também no caso inverdade obteremos um efeito notável. [Esse efeiso, quando se provoca uma orientação de cato] se exprime por meio de uma considerável ráter diretamente contrário, o que sucede nos redução do tempo de reação, pois a orientacasos em que a instrução exije do sujeito que ção prévia ao movimento correspondente inele dirija toda a sua atenção não ao órgão que duzido por nós já produziu todas as excitações reage, mas aos órgãos da percepção, quando nervosas necessárias e imprescindíveis para pedimos ao sujeito do teste que escute ou obefetuar esse movimento, que é adiado até o serve atentamente e que não reaja antes de perceber com clareza e se conscientizar da exaparecimento do sinal, diante do qual a demora desaparece, e a reação é efetuada de forma citação. Com essa orientação sensorial, que vigorosa e intensa. dirige todas as operações preparatórias ao priA pedagogia militar leva essa lei em conmeiro componente perceptivo da reação, obsideração quando tenta elaborar movimentos temos um efeito evidente de retardo geral da reação em comparação com o tempo médio de rápidos e precisos durante a instrução e divisua forma natural. de uma determinada ordem, isto é, divide as Esse retardo do movimento, sem dúvida, excitações [os estímulos] essenciais em duas partes: a ordem preliminar e a ordem execué provocado pela ação dilatória que qualquer tiva. Ao mesmo tempo, no processo de aprenorientação secundária exerce na reação. Nesse caso, a atenção foi totalmente dirigida aos dizagem, ambas as partes são separadas freqüentemente por um intervalo de vários miórgãos da percepção e, naturalmente, isso atrasou e diminuiu a velocidade da reação da mão. nutos, para educar no soldado um movimenConseqüentemente, as pesquisas experito preciso de orientação e da própria reação. mentais demonstraram a influência real da Quando se dá a ordem "em frente", os soldaorientação sobre o curso das reações posteriodos permanecem em seu lugar, mas sabem que res. A psicologia experimental destaca que o deverão marchar; eles realizam apenas a tempo, a força e a forma de qualquer moviorientação, preparam os grupos musculares mento são completamente determinados pela necessários para o movimento, mobilizamorientação preliminar. nos, e exteriormente isso se exprime por meio dessa peculiar tensão e disposição a marchar XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 134 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I dições necessárias para o curso correto das reaozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA experimento com dois pesos de tamações, o professor deve assegurar uma correta nhos diferentes, mas com o mesmo peso, mosorientação, o que é muito mais importante. Em tra de forma simples e eloqüente a ação da total acordo com a teoria psicológica, podeorientação. Se os dois pesos são erguidos sumos dizer que, 'na educação, devem ser ressalcessivamente com a mesma mão - primeiro o tadas as orientações. O professor sempre deve maior e depois o menor - temos a impressão considerar se o material que apresenta corresde que o maior nos parece mais leve, embora nossa visão nos diga que os dois pesos se equiponde às leis fundamentais da atividade da libraram em uma balança. Em outros termos, atenção. aqui até mesmo o conhecimento preciso é imAcima de tudo, esse material deve estar organizado e ser apresentado de maneira que potente para refutar a ilusão e, portanto, a base dessa ilusão não deve ser buscada no processo corresponda à estreita extensão das reações de de medir o peso, mas na orientação prévia que orientação e, pelo caráter de seu efeito, não se realiza de forma inconsciente em virtude de deve contradizer a duração de seu curso. As um hábito adquirido, isto é, antes do processo mais simples e triviais regras de cortesia pedade medir o peso.? gógica, que exigem que a lição não se estenda Essa orientação se reduz ao fato de que, demais nem seja ministrada com pressa, na ao ver um objeto grande, efetuamos a orientaverdade exprimem a mesma exigência de que ção para erguer um grande peso, lhe atribuío material corresponda às reações adaptativas mos maior impulso e realizamos um envio mais do aluno da forma mais primitiva. considerável de energia que no caso de um Ao mesmo tempo, é muito importante que objeto pequeno. De acordo com isso, um meso material esteja organizado para que também mo peso é distribuído, em um caso, em um possa corresponder ao ritmo de funcionamenesforço muscular menor e, no outro caso, em to de nossa orientação. A simples observação um maior. E, sem modificação de tamanho, o dos erros cometidos pelas crianças nos ditamesmo peso pode nos parecer maior ou medos, sob o influxo da distração e não por ignonor, conforme nossa orientação. rância da ortografia, evidenciam o ritmo em Todos esses experimentos nos dizem apeforma de onda, pois se o ditado for dividido nas uma coisa, ou seja, que todo comportaem intervalos iguais, cada uma dessas fases mento é determinado e regulado pelas reações caracteriza-se sucessivamente pelo aumento ou de orientação reais que o precedem, mas que diminuição do número de erros. a influência dessas reações nem sempre se exÉ preciso organizar didaticamente a lição, pressa diretamente nas reações posteriores. dividir o material para que aos momentos de aumento da força da atenção correspondam as partes mais difíceis e importantes e que os CONCLUSÕES P E D A G Ó G IC A S momentos de redução da onda de atenção coincidam com as partes menos importantes da exAs principais conclusões pedagógicas a posição. serem extraídas da teoria da orientação Além disso, o material deve ser flexível e [ustanovka] consistem, sobretudo, na fórmucapaz de assumir uma forma rítmica, isto é, la geral que exige que o professor não preste deve ser apresentado de forma tão coerente atenção apenas às reações evidentes do aluque permita perceber todas suas partes como no, mas também às orientações invisíveis e um todo único. subterrâneas, que precedem essas reações. Por fim, a última e mais importante norAssim, o professor não deve se limitar apema exige que o professor preste a mesma atennas a observar o aluno, mas também a conção à atenção e à distração. Engana-se profunjeturar, de acordo com o visível, sobre as damente o professor que considera a distramudanças não-visíveis que nele se operam. ção sua encarniçada inimiga e não compreenPara assegurar o sucesso do ensino e da de a simples verdade de que o mais distraído aprendizagem, além de garantir todas as conda classe pode ser o mais atento. P S IC O L O G IA ozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA segredo da transformação da distração dessa outra e, P E D A G Ó G IC A 135 por isso, tinham de permanecer inermes ante a força natural e espontâem atenção tem a ver, a rigor, com o segredo nea dessa orientação. de mudar os ponteiros da atenção de um sentido para o outro, e isso se alcança por meio Ao mesmo tempo, é muito importante do método educativo geral de transferir o indestacar que, mesmo em processos que chateresse de um objeto para outro, mediante sua maríamos de mecânicos e "passivos", como a vinculação. Essa é a tarefa fundamental para memória e a aprendizagem, a orientação desempenha um papel decisivo. A experiência desenvolver a atenção e transformar a atenção involuntária em voluntária. tem demonstrado que a aprendizagem transO educador deve se preocupar em criar corre de modo completamente diferente e dá resultados totalmente diferentes, de acordo e elaborar no aluno uma quantidade suficiente de excitações internas ligadas a certas reações com a prova à qual o sujeito do experimento de orientação e, quando tiver realizado isso, é submetido. Se os sujeitos sabem que devem, poderá ter certeza de que a atenção estará para prestar contas do que aprenderam, reinserida nos mecanismos internos do nosso produzir completamente tudo, aprendem de comportamento, funcionando em concordâncerto modo; se sabem que apenas devem recia com estes. conhecer o que foi reproduzido diante deles, Com relação a esse fato, sempre é precio estudo é realizado de outro modo totalmenso levar em conta a orientação fundamental te [diferente]. Portanto, um momento decisida educação, esta que, na literatura pedagógivo no processo educativo é o conhecimento ca dos últimos anos, tem sido chamada de ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA do objetivo de cada ação, saber para que se o r i e n t a ç ã o p a r a um o b j e t i v o de cada ato eduestuda determinado material, e esse fim últicativo. A nova psicologia transfere o processo mo, através da orientação prévia, exerce a educativo das mãos do professor para as do ação orientadora mais importante no procesaluno, e também exige que a consciência do so educativo. objetivo desse ato seja transferida do profesO valor pedagógico da expectativa não sor para o aluno. Ela não exige apenas que o se resume apenas a preparar o terreno para a aluno se auto-eduque com seus próprios atos, percepção de novos conhecimentos, mas abranenquanto o professor orienta e regula os fatoge muito mais que isso, ou seja, elaborar a dires que determinam esses atos; também exige reção correta que será comunicada à reação que não só o professor, mas também os alurecém-surgida. Fica bem claro que o processo nos, criem o objetivo desses atos. de educação, em suma, é a elaboração dos aluO exemplo mais simples da importância nos de certa quantidade de reações e de oudessa orientação fundamental para um objetras formas mais complexas do comportamentivo no processo educativo pode ser a oriento. E o fator decisivo para que esse processo tação para os exames, comum na escola czaseja bem-sucedido ou fracasse é a coincidênrista, psicologicamente absurda e pedagogicia ou a falta de coincidência da direção descamente nociva. Os exames relacionados hasas reações com aquelas na qual estão destibitualmente ao final do período letivo, por sua nadas a atuar. Se conservo em minha memóposição temporal no sistema de ensino e peria milhares de conhecimentos úteis, porém las conseqüências que implicavam para os alunão os posso utilizar no momento necessário e nos, transformavam-se, contra o desejo e a adequado, esses conhecimentos jazem em mim idéia dos professores, nessa orientação natucomo um peso morto e, além de serem inúteis ral para um objetivo. E, quando os melhores no sistema do comportamento, causam dano, professores viam com profundo pesar que no porque ocupam lugar e não permitem o estabelecimento e a elaboração de outras reações, ensino médio estudava-se para passar nos exames e esses exames eram aprovados para menos ricas porém com mais sentido. Aquilo que na literatura pedagógica de obter um diploma, sentiam-se impotentes para divulgação era chamado de falta de vitalidalutar contra esse fato, porque não podiam de da escola, na verdade designa a mesma promover nenhuma orientação natural em vez XWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 136 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA incorreção na orientação fundamental para um objetivo da educação. O maior pecado da escola czarista consistia em que nenhum de seus participantes podia responder à pergunta de para que se estudava geografia e história, matemática e literatura. Estão enganados aqueles que acreditam que a antiga escola oferecia poucos conhecimentos. Pelo contrário, com freqüência ela comunicava uma quantidade extraordinária de conhecimentos, sobretudo a escola européia. Só que, na maioria das vezes, isso era um tesouro no deserto, uma riqueza à qual ninguém podia dar um uso adequado, porque ~ orientação básica desses conhecimentos tinha a ver apenas com um lado da vida e sempre estava em extremo desacordo com ela. Como um diamante no deserto, esses conhecimentos não eram capazes de saciar as mais simples necessidades vitais do aluno mais comum. Por sua experiência pessoal, o leitor pode lembrar com facilidade que praticamente a única forma em que pôde usar os conhecimentos adquiridos na escola foi para dar uma resposta mais ou menos correta em um exame, mas o conhecimento da geografia ainda não ajudou ninguém a se orientar no mundo nem ampliou o conjunto de impressões recebidas em uma viagem, assim como o conhecimento de astronomia nunca permitiu que alguém vivenciasse de forma mais intensa e brilhante a grandeza do céu. Por isso, a exigência pedagógica fundamental é que absolutamente todo o material didático e educativo esteja penetrado e impregnado por essa orientação para um objetivo, e que o educador sempre conheça exatamente a direção em que a reação que se estabelece deve atuar. A ATENÇÃO E O H Á B IT O O hábito e a atenção ocupam posições antagônicas; sempre que o hábito cria raízes, a atenção desaparece. Todos sabem como nos assombra o que é novo e pouco habitual, e como freqüentemente não podemos dizer de que cor é o papel de parede de nosso quarto ou os olhos de uma pessoa que vemos todos os dias. No mesmo sentido, a tarefa da atenção deve ser particularmente tensa e séria quando. a conduta excede os limites do hábito e temos de realizar coisas que exigem uma reação particularmente complexa e difícil. Com relação a isso, o hábito passou a ser chamado de "inimigo e trégua da atenção", e na psicologia pedagógica predominava, até pouco tempo, uma atitude contraditória com respeito a ambos. Nos fatos, o valor pedagógico de ambos os processos é tão claro e evidente que, com certeza, não se deve renunciar a um deles em prol do outro, mas tentar conciliar ambos. Essa conciliação consiste na elucidação psicológica correta da verdadeira inter-relação entre a atenção e o hábito. A atenção realmente cessa seu trabalho quando o comportamento se torna habitual, mas isso não envolve apenas seu enfraquecimento; em geral, está ligado à intensificação de sua atividade. Isso se torna compreensível quando recordamos a estreiteza básica da atenção e o fato de que, em cada caso, ela ganha em intensidade enquanto perde em amplitude. O hábito, ao automatizar ações inteiras, ao subordiná-Ias ao funcionamento autônomo dos centros nervosos inferiores, libera e descarrega a atenção de nossa atividade, provocando uma espécie de exceção relativa da lei de inibição diferencial'? das reações secundárias quando se dá uma orientação fundamental. Dissemos anteriormente que toda orientação [ustanovka] inibe o curso das reações alheias. Seria correto acrescentar: exceto as automáticas e habituais. Podemos conversar com suma atenção enquanto caminhamos pela rua, podemos conversar enquanto realizamos um complexo trabalho manual. O significado psicológico sumamente importante dessa exceção da lei de inibição torna-se evidente quando consideramos o quanto aumenta a diversidade e a amplitude de nosso comportamento quando, paralelamente à orientação principal, surge em nós uma série de orientações parciais, paralelas a ações habituais. Ao mesmo tempo, a rigor, esse fenômeno não deve ser entendido como uma exceção da PSICOLOGIA PEDAGÓGICA lei psicológica geral, mas como a ampliação de um mesmo princípio. Tanto as ações habituais quanto os atos completamente automáticos exigem, para se iniciar e cessar, a participação das orientações correspondentes; podemos costurar sem prestar atenção a esse fato, mas de qualquer forma temos de estar atentos para ir [buscar o trabalho], pegar o trabalho, parar, retorná-lo durante algum tempo e deixá10, isto é, o começo e o final das ações automáticas de nenhum modo podem prescindir da orientação correspondente. Além disso, essa orientação - a direção tomada previamente e o ritmo das reações vai se expressar durante todo o curso das ações habituais. Portanto, temos o direito de não nos referirmos apenas a uma orientação em nosso organismo, mas a uma série de orientações simultâneas, entre as quais predomina uma delas, enquanto as demais se subordinam a ela. E essa observação psicológica coincide totalmente com a teoria fisiológica da existência dos focos de excitação nervosa dominantes e subdominantes no sistema nervoso central.'! oXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA C O R R E L A T O F IS IO L Ó G IC O DA ATENÇÃO Só recentemente os fisiologistas conseguiram descobrir fenômenos no sistema nervoso que, sem dúvida, podem ser ligados à atenção. A esse âmbito pertence a teoria das chamadas excitações dominantes do sistema nervoso, elaborada nos últimos tempos. A essência dessa teoria reside no estabelecimento do fato de que, no sistema nervoso, algumas das excitações surgidas são tão intensas que agem como excitações dominantes, que reprimem todas as outras ou as desviam de sua direção e, por último, as atraem para si e aumentam às suas custas. Essa excitação básica foi chamada de dominante, enquanto todos os demais focos do sistema nervoso são denominados subdominantes. Ao mesmo tempo, evidenciou-se um fato de extraordinária importância, ou seja, que quando existe uma dominante ligada a um ato instintivo, o principal foco de excitação se reforça cada vez que qualquer excitação colateral 137 penetra no sistema nervoso. O ato do reflexo de abraço na rã, o ato de defecação e deglutição no cavalo, a excitação sexual da gata isolada dos machos no período de cio representam essas dominantes naturais estudadas com precisão de laboratório. Todos esses atos são reforçados na presença de uma excitação estranha. Assim, se durante o reflexo do abraço alguém belisca a rã ou lhe aplica um irritante, como ácido ou corrente elétrica, a excitação estranha, em vez de enfraquecer o reflexo de abraço, o reforça. Portanto, nas mais simples organizações nervosas, o ato da atenção está estruturado de tal maneira que, além de provocar a inibição das reações ligadas a este, também é capaz de se reforçar às custas delas. Para os psicólogos, talvez a questão principal seja o caso sumamente interessante da criação experimental de uma dominante sensorial e de uma dominante motora separadamente, em uma rã. Nesse caso, a análise fisiológica penetrou tão profundamente no sistema nervoso que parece tentar diferenciar as raízes - nele incluídas - dos dois tipos de atenção: a sensorial e a motora. Observou-se que, quando se provoca uma excitação dominante dos centros motores da pata traseira direita na rã, com um meio artificial, como o fenol,'? ela reagirá precisamente com esse órgão a toda excitação proveniente de qualquer lugar do corpo. Em compensação, quando se provoca uma excitação dominante dos centros motores da mesma pata, quando são aplicados estímulos nos mais diversos pontos do corpo, o reflexo de esfregar se manifestará com exatidão mecânica, mas sempre estará dirigido ao local ligado à excitação dominante dos centros; por exemplo, a pata posterior direita, ainda que o abdome, as costas, o pescoço, etc. da rã também sejam excitados. Portanto, evidencia-se que a dominante sensorial conserva todos os outros reflexos, porém modifica seu curso e os desvia para o lugar mais excitado; por outro lado, a dominante motora adianta o órgão motor ligado a esta em todos os casos em que, conforme o funcionamento normal de um reflexo, outros órgãos devem entrar em ação. 138 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A transferência para o ser humano do estudo desses fenômenos certamente não poderá gozar dessa precisão ideal, que só é possível e realizável em sujeitos de laboratório experimental. Superficialmente, pode parecer que os resultados obtidos pelos fisiologistas se contrapõem aos fatos estabelecidos pela psicologia. Pareceria paradoxal admitir a possibilidade de um ato de atenção que não é enfraquecido pelas excitações estranhas mas que, pelo contrário, é reforçado às custas delas. Entretanto, uma série de observações, ainda não reunidas em nenhuma lei psicológica, confirmam que esse critério {correto. É curioso o relato feito pelo professor M. M. Rubisntein!" sobre a construção do edifício de um centro de ensino superior em uma grande cidade européia. Segundo os construtores, ele devia ser um edifício adaptado idealmente para os objetivos docentes; por isso eles se esforçaram para eliminar tudo o que poderia representar um estímulo estranho durante as aulas. Partindo do critério tradicional sobre a atenção, consideraram que, ao retirar o supérfluo, contribuiriam para estimular a atenção. De acordo com esse objetivo, o edifício foi construído sem formas salientes nem angulares, os cantinhos de cada sala foram deliberadamente dissimulados; as paredes viravam de forma imperceptível e continuavam na seguinte parede, para excluir todo elemento de influência da forma espacial sobre os estudantes. O mesmo ocorreu com os outros detalhes: todas as partes do edifício foram pintadas e forma homogênea, do primeiro degrau até a cúpula, incluindo todos os acessórios - tanto os objetos quanto a roupa dos alunos eram de uma cor cinzenta, neutra e uniforme. Mas esse edifício, que devia responder à última palavra da teoria psicológica sobre a atenção, deu resultados totalmente contrários aos esperados. Conforme o reconhecimento geral e unânime dos estudantes e professores, em vez de contribuir para estimular a atenção, ele agia de maneira depressiva e, mesmo nas conferências e aulas mais interessantes, os estudantes ficavam com sono minutos depois de adotar uma posição imóvel e atenta. Evidentemente, a ausência de estímulos alheios é mortal para o ato da atenção, e a correlação estabelecida pelos fisiologistas também é certa para a psicologia, pois o ato de atenção, pelo visto, exige certas excitações subdominantes, das quais se alimenta. Em outros termos, só é possível prestar atenção quando os estímulos que nos distraem ocupam uma situação subordinada com relação à tarefa fundamental que nos ocupa, porém eles não são totalmente eliminados do campo de nossa consciência e continuam agindo sobre nós. Há muito tempo, os psicólogos sabem que o ambiente exerce uma influência essencial sobre o sistema geral de trabalho e que, em função do andamento e do sentido das tarefas, ele pode e deve permanecer imperceptível para os alunos no processo de trabalho. É suficiente que, de maneira completamente inadvertida para uma pessoa que estiver ocupada e absorvida por qualquer tarefa - conversa, leitura ou escrita - a cor das paredes seja mudada de azul para amarelo e, embora a pessoa nem suspeite da mudança, podem ser encontrados sinais objetivos das modificações operadas no caráter de seu trabalho. Uma pessoa fala de certa maneira quando está rodeada de paredes azuis e de forma diferente quando as paredes são amarelas. Meumann pôde demonstrar que o processo da audição não melhora quando há silêncio absoluto e sepulcral, mas em auditórios aos quais chega um ruído amortizado e que mal pode ser ouvido. A influência excitante dos estímulos rítmicos débeis sobre nossa atenção foi estabelecida há tempo pela prática. Com relação a isso, Kant relata o curioso caso psicológico de um advogado que tinha o hábito de enrolar um longo fio nas mãos enquanto pronunciava um complicado discurso jurídico. Quando percebeu essa pequena debilidade, o advogado da parte contrária retirou furtivamente o fio antes de um julgamento e, conforme o testemunho de Kant, com essa hábil manobra privou totalmente o adversário da capacidade de enunciar uma argumentação lógica ou, expressando-nos mais corretamente, da capacidade de atenção psicológica, pois ao P S IC O L O G IA pronunciar seu discurso pulava de um tema para o outro." Titchener " estabeleceu que a atenção voluntária ou secundária surge do conflito entre as atenções involuntárias ou primárias e as conseqüentes situações motoras incompatíveis. Assim, o mecanismo da luta pela via fundamental está na base da atenção e, em geral, de todas as formas superiores, conscientes, do comportamento, derivadas da necessidade biológica de resolver os conflitos entre as reações e dar unidade ao comportamento. A conclusão pedagógica que se extrai daí aumenta ainda mais a preocupação do professor, pois lhe exige que, além de organizar a tarefa principal direcionada ao aluno, também organize todas as circunstâncias estranhas - o ambiente, a posição e a vestimenta dos alunos, a vista observada pela janela - que, como excitações subdominantes, distam muito de ser indiferentes para o funcionamento geral da atenção. Um escritor dizia que tudo depende do ambiente para o homem russo, que não pode deixar de ser um canalha na taverna, embora seja totalmente incapaz de realizar um ato indevido no meio de uma arquitetura séria e severa. Essa é, sem dúvida, uma observação da mesma ordem, só que expressa de forma aproximada e exagerada. P E D A G Ó G IC A 139 verificaremos que, conforme as flutuações de nossa atenção, o desenho pode apresentar três formas diferentes [ver Figura 7.1].16 De repente, nos parece que a superfície anterior está representada pelo quadrado pequeno e que temos à nossa frente uma pirâmide secionada, com o plano pequeno virado em nossa direção. No entanto, por mais que nos esforcemos para manter a vista nessa posição, a atenção muda depois de alguns minutos, e nos mostrará o mesmo quadro de uma perspectiva inversa. Teremos a ilusão de ver um quarto ou uma caixa que parte de nós, enquanto o quadrado grande está em um plano anterior; o menor será reinterpretado por nós como a parede que está mais longe, reduzida pela perspectiva. Por último, o terceiro caso seria toda a figura virada para nós em seu verdadeiro aspecto: toda ela aparecerá em um mesmo plano, como um quadrado fechado dentro de outro quadrado. oXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA F U N C IO N A M í::N T O D A A T E N Ç Ã O EM SEU CO NJUNTO F ig u ra 7 .1 Para caracterizar o valor pedagógico da atenção em seu conjunto, é preciso indicar o caráter integral que a distingue. Podemos dizer, sem exagerar, que, do trabalho da atenção, depende absolutamente tudo o que percebemos do mundo. Uma atenção apenas modificada nesse sentido muda de imediato e de maneira radical essa percepção, ainda que não tenham ocorrido modificações físicas de nenhuma espécie no meio circundante. Essa tese costuma ser ilustrada com figuras que evidenciam a existência de flutuações da atenção. Se imaginarmos um quadrado dentro de outro quadrado, disposto de tal modo que os vértices de ambos estão unidos entre si, e observarmos esse desenho durante bastante tempo, Nesse caso, temos diante de nós a flutuação natural da atenção e as modificações naturais do quadro que percebemos; e isso continua sendo certo quando estimulamos deliberadamente a mudança da atenção. De acordo com isso, modificamos o quadro do meio que estamos percebendo. Observar a mesma coisa com uma atenção orientada de diferente maneira equivale a vê-Ia em um aspecto completamente novo. Foi efetuada uma observação de extraordinário valor para a psicologia quando se prestou atenção ao raro e extraordinário quadro que apresenta um quarto ou lugar habitual e 140 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA conhecido por nós, se o observarmos colocando a cabeça para trás, adotando um ponto de vista totalmente novo e inesperado. Por isso, existe uma verdade psicológica no popular relato sobre o sábio que afirmava que as almas humanas reencarnadas em outros corpos, depois da morte, viverão em um mundo diferente. Ele dizia a seu vizinho: Uma vez verás o mundo com o olhar de um comerciante; outra vez, com o de um navegador, e o mesmo mundo com os mesmos barcos parecerá completamente diferente. A ATENÇÃO E A APERCEPÇÃO Devido a um prolongado trabalho da atenção, orientada constantemente na mesma direção, toda a nossa experiência se organiza e se forma nessa mesma direção. Esse fenômeno denomina-se ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA apercepçãoY Mediante esse termo devem ser entendidos todos os elementos prévios da experiência que introduzimos na percepção externa e que determinam o modo como um novo objeto será percebido por nós. Em outras palavras, a apercepção não passa da participação de nossa experiência anterior na formação da presente. Quando observo os objetos à minha frente, não só vejo e tomo consciência de suas qualidades sensíveis, cor, forma, etc. - embora atuem sobre mim com a força direta das coisas que estão à minha frente -, mas acima de tudo capto claramente que se trata de um chapéu, uma maleta e um tinteiro. Isso ocorre em virtude da apercepção, isto é, da experiência e da atenção já acumuladas. De forma muito acertada, a apercepção é comparada com o mecanismo que transfere o trem de uma via para a outra. O curso de nossos pensamentos e percepções é determinado totalmente pela ordem dos objetos que se encontram diante de nós, por um lado, e pelas leis de nossas associações, por outro. O papel decisivo de ambos é comparado corretamente com os trilhos que definem o movimento de nossa psique. Mas a livre atividade de nossa apercepção e atenção é, justamente, esse me- canismo que permite que os pensamentos escolham um caminho entre os diversos existentes. Portanto, a atenção define-se acertadamente como a relativa liberdade de nossa conduta, como a liberdade de escolha e limitação. Assim, a apercepção parece ser o capital acumulado de atenção. Mas esta, por sua vez, acumula e forma o tipo peculiar de nossa conduta que há muito tempo é chamado de c a r á t e r . Conseqüentemente, nessa formação de três níveis da experiência temos níveis sucessivos: atenção, apercepção e caráter. Para um professor, isso equivale a um papel ainda maior da atenção na educação, pois aqui a atenção não é considerada como um meio para facilitar certa tarefa educativa ou docente, mas é extraordinariamente importante como fim em si. Nunca transcorre sem deixar marca, sempre deixa um resultado atrás de si. Inúmeros resultados se acumulam na apercepção que tende a dirigir nossa conduta. Inúmeras apercepções formam o caráter e até as mais sutis influências educativas costumam ser impotentes para combatê-Ias. Assim, ao guiar a atenção, tomamos em nossas mãos a chave para a formação da personalidade e do caráter. NOTAS 1. Na leitura deste capítulo é importante levar em conta o que foi explicado na nota n 22 do Cap.5. 2. A fonte de tais dados é a 5ª edição de 1902-3 de W Wundt, P h y s i o l o g i s c h e P s y c h o l o g i e [ P s i c o lo g ia fis io ló g ic a ] . Se Vigotski não os obteve diretamente desse livro, pode tê-I os encontraQ S tu d ie n (1 8 8 1 do na revista P h i l o s o p h i s c h e 1903), que deu conta de cem pesquisas experimentais realizadas em 20 anos de trabalho laboratorial, ou citados por algum autor. Wilhelm Wundt (Alemanha, 1832-1920) foi o fundador da psicologia experimental e foi quem conseguiu constituir a psicologia como matriz disciplinar independente. Ele fundou em Leipzig o primeiro laboratório experimental de psicologia do mundo (1880). Foi autor de 491 textos com 110 páginas em média, o que faz com que ele ultrapasse o número de 50 mil páginas escritas. 3. Tudo o que foi grifado, desta palavra ao próximo subtítulo, é nosso. P S IC O L O G IA 4. Aqui, Vigotski refere-se P E D A G Ó G IC A a V. Urbantschitsch,jihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA p síq u ic o s a p re n d id o s, in te rn a liza d o s " Ú b e r e in e E ig e n th ü m lic h k e it d e r S c h a lle n p fin - 141 c u ltu ra l- m e n te . 7. É provável que esta seja uma referência a K. Groos, D a s S e e le n le b e ii d e s K in d e s [A v id a in te c u lia rid a d e da a p re e n sã o do so m de b a ix a in rio r das c ria n ç a s], Berlim: Reuther und Reichard, te n sid a d e 'l C e n tra lb t. m e d o W isse n c h . (1875), 1922. Cf. também a nota n 2 24 do Capítulo 5. 13:37, p. 625-9. Na edição norte-americana do 8. Alfred Binet (1857-1911) foi um psicólogo presente livro, Silverman traduziu erroneamenpositivista francês que estudou o pensamento te o nome desse importante pesquisador, transdas crianças, a inteligência e as diferenças increvendo-o diretamente do russo como "Urbanchich", Viktor Urbantschitsch foi um dividuais. Mais detalhes de sua vida e obra conspícuo psicólogo experimental alemão. podem ser encontrados no Capo 18 e nas notas Descobriu a "imagem intuitiva subjetiva" 1 e 2 desse capítulo. [su b je k tiv e A n sc h a u u n g sb ild e r], chamada de 9. O primeiro a escrever sobre a ilusão do peso foi "eidética" por alguns '(do Ü b e r su b je k tiv e Fechner, em 1860. No final do século XIX, [S o b re as im a g e n s o p tisc h e A n s c n a u u n g s b ild e r Charpentier publicou sobre a denominada "iluin tu itiv a s su b je tiv a s v isu a is], Viena, 1907). O são de Charpentier": quando dois cilindros de nome de Urbantschitsch aparece com enorme madeira do mesmo peso são levantados mediante uma corda, o maior é percebido como mais freqüência na bibliografia psicológica e leve. Para explicar essa ilusão, Müller e psicopatológica. Pode ser encontrado, por exemplo, em livros de autores tão variados Schumann publicaram um estudo experimencomo Charlotte Bühler (c f In fa n c ia y ju v e n tu d tal no qual tentaram fazer uma interpretação [K in d h e it u n d J u g e n d ], Buenos Aires: Espasateórica desse fenômeno, a partir de então uniCalpe Argentina, 1946, p. 332), S. L. Rubinstein versalmente aceito como a teoria de "ilusão de peso" em geral. (cf. P rin c ip ia s de P sic o lo g ia G e n e ra l [O sn o v i o b sh c h e i p sijo lo g u i], México: Grijalbo, 1967, p. 10. Cf. a primeira parte do Capo 3. 324), Karl Jaspers (cf. P sic o p a to lo g ía G e n e ra l 11. Vigotski já explicou a teoria da excitação do[A llg e m e in e P sy c h o p a to lo g u ie ], Buenos Aires: minante, de Ujtomski, no Capo 3. Beta, 1973, p. 89) e E. Mira e López (cf. 12. O fenol é um corpo que se extrai por destilaP siq u ia tría , t. I, Buenos Aires: EI Ateneo, p. 99). ção dos óleos de alcatrão. 5. A partir de 1928, Vigotski estabelece uma di13. Moisei Matveievitch Rubinstein (1878-1953) foi ferença fundamental entre a atenção involunum psicólogo educativo e um pedagogo russo e tária e a voluntária. A primeira é inata, biolósoviético. É muito provável que Vigotski se refigica e pertence aos p ro c e sso s p síq u ic o s e le m e n ra a seu livro: M. M. Rubinstein, O c h ie rk p e d a ta re s ou inferiores, comuns aos animais e ao g o g u ic h e sk o i p sijo lo g u i v sv ia si o b sh c h ie m ser humano. A segunda tem origem cultural e, p e d a g o g u ik [E n sa io de p sic o lo g ia p e d a g ó g ic a em paradigmaticamente, é um p ro c e sso p síq u ic o su re la ç ã o com a p sic o lo g ia g e ra lJ , Moscou, 1916. D e v e -se e v ita r a h a b itu a l c o n fu sã o desse autor p e rio r. As funções psíquicas superiores, a cujo com Serguei Leonidovitch Rubinstein (1889estudo Vigotski dedicou-se especialmente, são exclusiva e especificamente humanas, sociais, 1960), um dos mais conspícuos psicólogos so"artificiais", de origem cultural, internalizadas, viéticos, como ocorreu na edição norte-americonstruídas sobre a reestruturação das inferiocana do presente livro. Sua obra está publicada res, que dialeticamente se subsumem nas suintegralmente em espanhol com a grafia periores - A u fg e b u n g , segundo Hegel. "Rubinstein" (Montevideo, Pueblos Unidos, e México: Grijalbo). S. L. Rubinstein combateu 6. Em nossa opinião, este parágrafo tem uma importância fundamental para estabelecer uma a obra de Vigotski, embora isso não o tenha particularidade essencial e específica da psiimpedido de roubar-lhe idéias, sem mencionar a fonte, naturalmente - isso foi denunciado que humana, embora Vigotski refira-se aqui aos animais superiores em geral. E m n o ssa o p in iã o , publicamente por Kolbanovski nos anos 40. A hostilidade dos seguidores de S. L. Rubinstein a a firm a ç ã o q u e e le fa z n o fin a l d e ste p a rá g ra a Vigotski exprime-se, por exemplo, no livro fo , no período inicial de sua obra e no livro que mais parece enfatizar o papel dos procesde K. A. Abuljanova, O su b ie k te p sijic h ie sk o i d ie ia tie lsn o sti (Moscou: Nauka, 1973) [El sos biológicos inatamente determinados, e sta b e le c e a correta p ro p o rç ã o de su a p a rtic ip a ç ã o sujeto de Ia actividad psíquica (México, Roca, 1980)], em que Vigotski é mencionado de forn a p siq u e h u m a n a , com re la ç ã o a o s p ro c e sso s ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA dungen g e rin g ste r In te n s itiit" [" S o b re u m a p e - 142 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I cologia estruturalista ou estrutural", como ma insignificante só um par de vezes em suas Vigotski costumava fazer. Titchener estudou 360 páginas. dois anos com Wundt na Alemanha e foi seu 14. Essa é uma história que Kant conheceu enquanmais fiel representante nos Estados Unidos, to lia o jornal inglêsjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA T h e S p e c ta to r, nº 77, dirionde dirigiu o laboratório de psicologia da Unigido por Joseph Addison, que narra e refere versidade de CornelI. Menciona-se que em sua Anthropologie in pragmatischer Titchener foi um cidadão in g lê s que trabalhou Hinsicht [Antropologia em sentido pragmáticom psicologia a le m ã nos Estados Unidos. co]. Utilizamos a tradução para o espanhol de José Gaos (cf. r. Kant, Antropologia en sentido Boring escreveu que o livro P sic o lo g ia E x p e riprogmático, Madrid: Alianza, 1991, p. 80). É m e n ta l de Titchener era "a obra mais erudita provável que Vigotski, formado em direito, teem inglês" (cf. E. G. Boring, H isto ria de Ia P sinha conhecido a história ou a tenha lido na c o lo g ia E x p e rim e n ta l, trad. de R. Ardilla e E. tradução russa do livro de Kant (cf. sua A n tro Ribes Ifiesta, México: Trillas, 1983). O monup o lo g u ia p r a g m a tic h ie s k o i to c h k i zre n ia , São mental e clássico livro de Boring é dedicado, Petersburgo, 1900) .: justamente, a Titchener. 15. Essa é uma referência a E. B. Titchener, U c h ie b 16. A Figura 7.1 foi agregada por nós; ela n ã o consn ik : p sijo lo g u ia [M a n u a l de p sic o lo g ia ], Parte I, ta da edição original do livro. 17. A teoria da apercepção de W. Wundt consideMoscou: Mir, 1914. Vigotski também se refere rava que havia dois graus de consciência. Os a esse manual em sua P sic o lo g ia da A rte . Edward Bradford Titchener (Inglaterra, 1867processos deviam estar dentro do campo consciente [B lic k fe ld ], mas só alguns deles chega1927, Estados Unidos) foi um psicólogo que considerou que o objeto da psicologia era a vam a estar dentro de seu ponto de mira mente; e seu método, a introspeção, concebi[B lic k p u n k t]. Estes últimos são os processos da de uma forma diferente de sua acepção hapercebidos. O alcance do Blickpunkt é o da bitual. Titchener fundou a psicologia estrutuatenção e sempre é menor que o da consciênralista, que não deve ser confundida com a "psicia. Cf. sua P h y sio lo g isc h e P sy c h o lo g ie , 5.ed. de ;, cologia da Gestalt", denominada também "psizyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 1902-3. l' t 1 " ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA o R e fo rç o e a R e p ro d u ç ã o d a s R e a ç õ e s [A M e m ó ria e a Im a g in a ç ã o ] o C O N C E IT O ma outra, a capacidade para as mudanças, para a acumulação de suas marcas e para a predisDA MATÉRIAzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA posição, que constituem a base da memória. A plasticidade constitui uma das propriedades fundamentais e primárias de toda a maA N A T U R E Z A P S IC O L Ó G IC A téria. Toda substância é mais ou menos plástiDA MEMÓRIA ca, isto é, possui a propriedade de se modificar sob a ação de influências, muda a estrutuQuando nos referimos à memória jihgfedcbaZYXWVUTSRQ [ p a m ia t] ra e a disposição das moléculas e conserva vesno sentido usual da palavra, temos em mente tígios dessas mudanças. O ferro, a cera e o ar dois processos completamente diferentes. A são plásticos, porém eles cedem à influência velha psicologia já diferenciava dois tipos de de forma diferente, e também em medida dismemória, a m e m ó r ia m e c â n ic a e a m e m ó r ia tinta conservam os vestígios dessa influência. ló g ic a o u a s s o c ia tiv a . Entendia-se por memóEsses fenômenos estão presentes nas proprieria mecânica a capacidade do organismo de dades primárias de qualquer matéria e se oriconservar a marca de reações reiteradamente ginam em processos inerentes à natureza repetidas, de produzir as mudanças corresponinorgânica. Assim, poderíamos dizer que um dentes nas vias nervosas. Os psicólogos comcaminho lembra como as rodas passaram por paravam acertadamente esse processo a um caele, porque conserva as marcas das mudanças minho trilhado, que consideravam fundamenoperadas na disposição de suas partículas, que tal para a acumulação da experiência indiviocorreram devido à pressão das rodas. Nesse dual. Toda essa soma de hábitos, habilidades, sentido, poderíamos dizer que as pedras e as movimentos e reações individuais que dispoplantas também recordam. Assim, a plastimos, não passa do resultado desse trilhar. Um cidade denota três propriedades básicas da mamovimento repetido várias vezes deixa uma téria: (1) a capacidade de modificar a disposiespécie de marca no sistema nervoso e facilita ção das partículas; (2) a conservação das mara passagem de novas excitações por essas mescas dessas modificações; (3) a predisposição a mas vias. repetir essas modificações. Dessa forma, a O significado desse trilhar das vias nermarca facilita uma nova passagem das rodas; vosas pode ser estabelecido facilmente medianuma folha de papel, dobrada em determinado te um experimento simples em um cronoslugar, tende, ante o mais insignificante impulcópio, isto é, um relógio especial usado na área so, a repetir a dobradura no mesmo lugar. Nosde psicologia para medir a velocidade da reasa substância nervosa é, certamente, a mais ção, que tem uma precisão de 0,001 parte de plástica de todas as que conhecemos na natusegundo. Experimentemos medir o tempo nereza. Portanto, pode desenvolver, como nenhuD E P L A S T IC ID A D E 144 I· '{ I > I .' L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA cessário para reagir a qualquer cifra. Por exemplo, mostra-se ao sujeito do experimento o número 17 e lhe pedimos que mencione [o número seguinte] o 18. Depois, o experimento é modificado, e o sujeito, diante do número 17, não deve reagir nomeando o seguinte, mas o anterior, isto é, 16. No primeiro caso, o tempo necessário para a reação foi 1 1fz menor que no segundo caso. Isso se explica porque a reação nessa ordem é mais habitual para o organismo e se realiza por um caminho já trilhado, enquanto a reação na ordem inversa é menos comum para o sistema nervoso e é realizada com maior dificuldade, ele modo que o indicador objetivo dessa dificuldade é o aumento do tempo que o curso da reação consome. A outra forma da memória é a denominada memória associativa. A teoria das associações foi, durante muito tempo, o fundamento da psicologia, e muitos psicólogos chamavam de associação a qualquer conexão ou combinação de reações. Sempre se tinha em mente, porém, a associação de representações. Com o mesmo direito poderíamos falar também de associação de todos os movimentos. Portanto, vamos entender por associação um vínculo entre as reações, de forma tal que o aparecimento de uma delas provoca infalivelmente a aparição de outra. Na forma mais simples, a teoria das associações antecipou a teoria dos reflexos condicionados, que na verdade representam um caso particular e uma variedade de associação. Ao mesmo tempo, seria correto considerar o reflexo condicionado como um caso de associação incompleta, em que não se fecha totalmente o vínculo entre duas reações, mas entre o estímulo de uma e a parte de resposta da outra reação. Os psicólogos diferenciavam três tipos de associação: por semelhança, por contigüidade e por contraste. Não há necessidade dessas diferenciações, pois elas expressam mais diferença lógica no curso de nosso pensamento que a peculiaridade psicológica de cada processo. De qualquer forma, a velha psicologia sabia que a formação de uma associação depende da experiência e que a associação envolve uma conexão nervosa de reações que se fechou [estabeleceu] com base em um vínculo dado na experiência. Conseqüentemente, a velha psicologia também sabia que toda a riqueza do comportamento pessoal surge da experiência. Os experimentos psicológicos sobre a comparação entre ambos os tipos de memória, para esclarecer qual delas é mais necessária e útil, são sumamente interessantes. Nos testes, propôs-se o estudo de um mesmo material de duas maneiras diferentes: primeiro, por repetição mecânica e, depois, mediante o estabelecimento do nexo lógico entre os elementos estudados. Mais tarde, foi efetuada a avaliação comparativa do sucesso de ambos os métodos e ficou evidente que a memória lógica representa, com relação à memória mecânica, uma relação de 22 a 1. Em outras palavras, a pesquisa experimental mostrou que, se as demais condições forem iguais, o material é assimilado e recordado 22 vezes melhor e com mais êxito caso seu estudo for lógico, mediante a vinculação do novo ao assimilado anteriormente. O experimento pode ser realizado facilmente. Tomam-se 100 palavras, com aproximadamente o mesmo grau de dificuldade; elas são apresentadas por escrito ou oralmente e depois se conta a quantidade de palavras que o sujeito retém após a leitura. Geralmente, no caso de palavras com um grau de dificuldade médio, são retidas cerca de 10 palavras, e mesmo assim sem uma reprodução correta em sua ordem e seqüência. Apresenta-se depois uma segunda série, também composta por 100 palavras, de igual dificuldade, com os mesmos intervalos, mas se propõe ao sujeito que ele escolha antecipadamente alguma série que conheça bem, integrada por 100 palavras em uma sucessão conhecida. Por exemplo, é bem-conhecida a sucessão das denominações geográficas, os nomes dos colegas do curso, as personalidades históricas, os escritores, etc. Sugere-se então que ele estabeleça mentalmente uma associação entre qualquer palavra dada e a palavra correspondente no ordenamento do sistema que escolheu. Por exemplo, vamos supor que o sistema dos escritores russo, de Lornonosov' a Maiakovski- tenha sido tomado como base. A primeira palavra mencionada, "peixe", por exemplo, corresponde a Lomonosov. O sujeito procura um nexo entre ambas as palavras e o P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 145 encontra no fato de que Lomonosov era filho consciente]. Essa mulher, até sua doença, tinha sido criada na casa de um pastor protesde um pescador. Depois se estabelece, do mestante e, enquanto varria o quarto, sem prestar mo modo, um vínculo entre o segundo nome e qualquer atenção, ouvia o pastor ler a Bíblia a segunda palavra, etc., até o final. Em geral, nesses idiomas. Em estado normal, ela natuo sujeito é capaz de reproduzir em exata sucessão as 100 palavras apresentadas, do prinralmente nunca teria podido repetir nem uma cípio ao fim." Com o número do lugar ocupapalavra dita pelo pastor, pois as marcas dessas sensações eram muito fracas e insignificantes. do na lista, ele pode denominar a palavra e, por meio da palavra, pode designar o número No entanto, de alguma maneira elas se conservaram e resultaram suficientemente intenque ela ocupa na lista. As 100 palavras são resas para se exteriorizar e manifestar no delícordadas sem qualquer tensão e são retidas rio. Esse exemplo demonstra que nenhuma sentotalmente na memória, na sucessão exata sação que chega a nosso sistema nervoso deos erros cometidos não costumam ser superiores a 2 ou 3 em toda a série. Nesse experimensaparece, todas elas são conservadas e, em determinadas circunstâncias e condições, podem to pode parecer que lembrar, na verdade, deser reproduzidas." nota duas coisas diferentes: colocar diretamenO segundo componente do processo da te as reações na cabeça - o caminho trilhado memória consiste em que, diante de um sinal ou estabelecer em cada caso um novo vínculo conhecido, o sujeito produz o movimento entre o já estudado e o que deve ser novamente estudado. Este último caso é extraordinariaaprendido ou pronuncia a palavra necessária. Assim, se o sujeito recita várias vezes um poemente importante para um professor. Para cada tipo de memória devem ser extraídas separama tendo o livro ao alcance dos olhos, podedamente as conclusões pedagógicas.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA mos chamar de momento de reprodução dessas reações o momento em que elas podem surgir sem a presença dos correspondentes esA ESTRUTURA DO PROCESSO tímulos, isto é, quando o poema pode ser reciDA MEMÓRIA tado sem o livro. Mas sabemos muito bem que não é possível termos nenhuma reação sem a Aquilo que costumamos chamar de mepresença de estímulos; conseqüentemente, isso mória não constitui algo homogêneo, mas na acontece também com a reprodução que, na verdade inclui uma série de componentes comverdade, denota uma reação, pois sempre preplexos. A velha psicologia considerava que escisa de certos estímulos para surgir. Quais seses componentes eram quatro, e se ocupava rão esses estímulos no caso dado? Toda a quesprimeiro da própria fixação da reação, isto é, tão se reduz, evidentemente, ao fato de que o a presença da marca nervosa de um determiprocesso de reprodução da reação, como seu nado estímulo. É provável que esse componenimpulso fundamental, está subordinado à exte seja inerente a todas as sensações que pascitação interna. Depois, todas as partes das sam por nosso cérebro. reações produzidas se conectam entre si, de A pesquisa da esfera inconsciente de nostal modo que a resposta a uma reação represos sonhos, fantasias, etc. demonstrou que nesenta um estímulo para a seguinte. Isso se vê nhuma das representações e impressões que com extrema facilidade através de um simples percebemos desaparece sem deixar marca; apaexemplo; quando, tendo esquecido algum verrentemente, tudo é conservado nas esferas subso, começamos a recitar o poema a partir do conscientes e, com uma estrutura modificada, início, o verso precedente faz surgir o que esvolta a penetrar na consciência. Há um relato, tava faltando. Portanto, o segundo componente que é citado pelos psicólogos com freqüência, consiste no estabelecimento do, nexo entre a sobre uma mulher ignorante que, durante um excitação interna e o grupo de reações, por um delírio, começou a pronunciar longas citações lado, e alguns membros do grupo, por outro. em hebraico e grego antigos, línguas das quais O terceiro componente no processo da não possuía nenhuma noção [quando estava memória é o denominado momento de reco- 146 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nhecimento, que ocorre quando tomamos consciência da reação reproduzida como já ocorrida. Nesse caso, a reação reproduzida se une à nova reação, que identificaria a reação reproduzida com uma previamente existente. Por fim, devemos situar em quarto lugar o último componente - que na verdade representa outra vez uma reação totalmente nova -, o momento da localização, isto é, de achar o lugar e o tempo, assim como o nexo das circunstâncias em que essa reação se manifestou. Devemos compreender com clareza por que cada um desses componentes pode existir completamente separado dos restantes. A causa reside em que temos diante de nós tipos totalmente diferentes de atividade da memória. O S T IP O S D E M E M Ó R IA ; t Durante muito tempo, a memória foi considerada uma propriedade geral do sistema nervoso, que funcionava da mesma maneira em todos. A observação posterior demonstrou que, em geral, o funcionamento da memória em cada pessoa se aproxima de um ou outro tipo, conforme as formas mais freqüentes que ela utiliza. Os psicólogos começaram a diferenciar vários tipos de memória; começaram a se referir à memória visual, nos casos em que a pessoa utiliza com maior freqüência suas reações visuais durante a reprodução. No mesmo sentido, estabeleceram a memória auditiva e a mo tara, assim como tipos mistos de memória - visual-rnotora, audiovisual, etc. Para esclarecer a diferença entre esses tipos de memória era mais simples recorrer ao último exemplo, o da aprendizagem de algum poema. Pessoas com tipos diferentes de memória podem aprender o mesmo poema com os mais diversos métodos. Uma considerará mais fácil estudar lendo o livro em silêncio. Ela vai assimilando o que lê com a ajuda da visão e, mais tarde, no momento da reprodução, lembra até em que página isso estava escrito. Algumas pessoas, depois de dezenas de anos, podem indicar em que ângulo de uma página estava impressa uma determinada palavra de um manual essa é a chamada memória visual. Outras, ,i I ~ I ~;ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA para estudar o poema, devem ouvi-lo, Para elas, é mais fácil aprender de ouvido e, na reprodução, acham que ouvem uma espécie de ressonância interna da palavra, recordando assim a entonação com que foi emitida, o timbre de voz, etc. Uma característica curiosa consiste em que os primeiros, durante a reprodução, vão fechar os olhos e esquadrinhar com o olhar; os segundos, para recordar o que esqueceram, vão realizar movimentos semelhantes aos que são feitos para escutar. Diz-se que Mozart, como outros grandes músicos, possuía uma assombrosa memória de tipo auditivo. Quando tinha 14 anos, escutou apenas uma vez uma complexa sinfonia, e isso foi suficiente para que ele a escrevesse totalmente de cor.' Por último, o terceiro tipo de memória é o encontrado em pessoas que não estudam com a vista nem com o ouvido, mas através dos próprios movimentos, com a ajuda das sensações musculares e cinéticas que surgem quando os realizam. As pessoas desse tipo, quando estudam um poema, não podem deixar de escrevê-lo ou de repeti-lo, ainda que seja sem som. Quando se esforçam para recordar o que esqueceram, elas realizam reações fonornotoras, e o próprio ato da recordação transcorre na ponta da língua ou nos lábios. Dizemos que "estamos com a palavra na ponta da língua" ou, quando tentamos lembrar a ortografia de alguma palavra, encomendamos a tarefa à nossa mão e, conforme o movimento que realizamos com a mão e com os dedos, lembramos qual é sua ortografia. Devemos dizer que cada tipo de memória raramente é encontrado de forma pura e na maioria das vezes seus tipos são mistos. Nenhum tipo de memória interrompe o trabalho da memória dos outros tipos; pelo contrário, esses tipos também podem ser utilizados em caso de necessidade. Mas também é raro encontrar um tipo neutro puro, ou seja, um trabalho da memória que transcorra da mesma maneira pelos três tipos. Geralmente dois tipos de memória predominam de forma conjunta. A escolha de um tipo de memória é explicada, evidentemente, por uma série de causas, mas acima de tudo pela estrutura ge- P S IC O L O G IA ral de nossos órgãos da percepção e pelo modo de recordar que nos é mais habitual. As conclusões pedagógicas da teoria sobre os tipos de memória consistem na regra que recomenda que o professor utilize diferentes vias no tocante à memória. Quanto maior for o número de caminhos pelos quais penetra a reação no sistema nervoso, mais firmemente ela ficará retida na memória. O modo mais utilizado para aplicar todas as formas de recordação é um depois do outro; assim, durante o estudo de uma língua estrangeira, os alunos vêem uma palavra esçrita ante si, escutam sua pronúncia, repetem-na e a anotam - com isso se garante exatidão e facilidade de assimilação. De qualquer forma, é útil que o professor conheça o tipo individual de memória de cada educando para apelar com maior freqüência a esse tipo.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A S P E C U L IA R ID A D E S IN D IV ID U A IS DA MEMÓRIA O reforço e a reprodução das reações, assim como todas as demais formas do comportamento, não constituem uma magnitude constante, mas variam fortemente conforme a idade, o sexo e a individualidade. Em particular, optou-se por diferenciar a memória a partir da rapidez e da estabilidade da recordação. Nesse sentido, James compara a memória das diferentes pessoas com a cera e o gel, já que em ambos, graças à plasticidade da substância, obtém-se fácil e rapidamente a marca desejada, mas enquanto a cera a conserva, no gel ela desaparece com a mesma rapidez. Além disso, a memória varia no sentido da extensão, isto é, da quantidade de reações fixas, da duração, ou seja, do prazo durante o qual se conserva a reação registrada, da exatidão, etc. Todos esses aspectos - em função dos diferentes tipos de fixação - não têm a mesma importância. Em determinado momento, precisamos obter uma recordação prolongada, mas não particularmente precisa; em outro, pelo contrário, necessitamos de uma recordação exata, mas não especialmente prolongada. É sumamente importante para um professor perceber em cada caso com que recordação con- P E D A G Ó G IC A 147 ta, porque - como veremos a seguir - disso dependem o caráter e os resultados da recordação. Nas crianças, a memória não se desenvolve repentinamente e, na primeira etapa da vida, a criança é - segundo a expressão de Stern - um ser do presente." Pouco depois, a memória infantil começa a se desenvolver, mas apesar de tudo a memória imediata é mais débil nas crianças que nos adultos. Ebbinghaus,? que realizou uma pesquisa experimental da memória mediante a aprendizagem de sílabas sem sentido, descobriu que as crianças de 8 a 10 anos são capazes de reproduzir 1 1/2 menos sílabas que as pessoas de 18 a 20 anos. Binet obteve os mesmos resultados ao estudar a memória em três cursos escolares. Os alunos do ensino fundamental erraram 73% das respostas, os do ensino médio, 69% e os do superior, 50%. De acordo com os dados disponíveis, cabe pensar que a memória cresce e se desenvolve na infância, chegando a seu ponto máximo, segundo Meumann, aos 25 anos, começando, depois, a declinar lentamente." O S L IM IT E S DA EDUCAÇÃO DA MEMÓRIA Naturalmente, aqui surge a pergunta sobre a possibilidade de melhorar a natureza e a força da memória humana mediante a influência educativa. Como há determinada plasticidade em nossa substância nervosa que está na base de nossa memória, subentende-se que os poderes naturais da memória não podem ser aumentados ou reduzidos por outros meios, exceto os que levam diretamente a um relaxamento e restabelecimento do sistema nervoso. Uma profunda anemia, a presença de drogas no organismo e o enfraquecimento geral do sistema nervoso estão ligados ao enfraquecimento da memória. E a nutrição, o fortalecimento e o reforço do sistema nervoso restabelecem a memória. Por isso, James, por exemplo, considera inegável o fato de que as qualidades naturais de nossa memória não podem ser melhoradas por meio de nenhum tipo de exercício." 148 I , L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA No entanto, não resta dúvida de que a dade e eficiência quando é atraída e orientada por certo interesse. Aquilo que observamemória pode ser melhorada facilmente com a ajuda de alguns exercícios e da educação. mos com grande interesse é mais bem assimiMeumann descobriu que seu sujeito de prova, lado. Consideramos o interesse [interiés] como depois de várias semanas de exercícios no esuma inclinação interna que orienta nossas tudo de sílabas sem sentido, reduziu o tempo forças para a pesquisa de um objeto. Os psipara aprender 12 sílabas: de 56 repetições pascólogos comparam muito acertadamente o sou para 25, e outro [sujeito], de 18 a 6. A papel do interesse na recordação com o papel recordação é uma atividade e, como tal, pode do apetite na assimilação do alimento. Expeser melhorada mediante exercícios. Para recorrimentos com um cão mostraram que, nos dar, pode-se elaborar hábitos e habilidades escasos em que a ingestão de alimentos era acompanhada de uma intensa excitação do peciais. O primeiro efeito da educação da meapetite, da participação da visão e do olfato, mória consiste justamente na melhoria da recordação. Em seus aspectos essenciais, a mea ingestão unia-se a uma rápida secreção do suco gástrico, a uma rápida digestão do alimória sempre pode ser melhorada e fortalecida, ainda que isso não signifique elevar sua mento e à sua completa assimilação. Nos cacapacidade natural. Recordemos que, psicolosos em que se excluía essa excitação prévia gicamente, a memória denota um vínculo que do apetite, em que o alimento era introduzise estabelece entre as reações. Quanto maior do diretamente no estômago canino através for a quantidade de associações de que dispode um orifício, sua assimilação transcorria mos, mais fácil será estabelecer uma nova aslânguida e lentamente, embora conservasse sociação e, conseqüentemente, eleva-se a quaseu poder nutritivo. É evidente que o apetite lidade de nossa memória especial. desempenha um papel muito importante na Cabe destacar que o que antes se denopreparação da digestão e na excitação de sua minava memória é uma forma de comportaatividade. Os psicólogos dizem que o interesmento complexo e combinado, que abrange de se produz exatamente a mesma ação prepauma simples reação aos complicados reflexos ratória em nosso organismo quando se trata mentais. Deriva daí que, mediante exercícios de assimilar uma nova reação. Todos conheZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA especiais, é possível melhorar tanto alguns ascem a ação extraordinariamente estimulante pectos desse comportamento como as mais imque o interesse exerce sobre a psique. Uma portantes uniões mútuas de suas diferentes pessoa pouco capaz de resolver problemas partes. Dessa maneira, vai sendo elaborada na científicos na escola, incapaz de aprender pessoa uma memória especial, isto é, a habiliqualquer regra, pode ser sumamente talentosa dade de fixar e reproduzir aqueles tipos de reae capaz na esfera de atividade que desperta seu interesse. ção mais necessários para a vida, em primeiro É curioso que na vida, por exemplo, na lugar e, em segundo, os que são exercitados com maior freqüência. Sempre nos assombra atividade comercial ou ao colecionar selos, um a memória do bibliotecário, que conhece dealuno pode ser totalmente capaz de efetuar as zenas de milhares de livros por suas capas e combinações e cálculos que não consegue resabe seu lugar nas prateleiras, a memória do solver na escola. Quando está estimulado pelo farmacêutico em matéria de provetas e frasinteresse, ele recorda uma grande quantidade de nomes geográficos ou um conjunto de decos, a memória do médico no tocante aos sintomas de uma doença. Em todos os casos, posenhos. Em compensação, na escola, ele não rém, estamos diante de um novo fenômeno. consegue aprender o nome da capital de nenhum país. Nesse caso, o fundamental é a exigência que prescreve que, para obter uma boa o IN T E R E S S E E O M A T IZ E M O C IO N A L assimilação, o interesse sempre deve estar coordenado com a recordação. Se o professor As pesquisas sobre a memória demonsdesejar que algo seja bem-assimilado, deve se traram: que ela trabalha com maior intensipreocupar em torná-Io interessante. Desse pon- I P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 149 to de vista, a escola czarista era antipsicológica, É preciso extrair daqui uma conclusão de suma importância pedagógica, com reação à porque não era interessante. O outro papel do interesse consiste na necessidade de que os alunos sejam conscientes dos objetivos do estudo e das exigências função unificadora que ele desempenha com que lhes serão feitas posteriormente. O maior relação aos diferentes elementos do material ecado da escola czarista não consistia em que assimilado. O interesse cria uma orientação se recordava pouco, mas no fato de que a reconstante no sentido da acumulação da recorcordação ocorria em uma direção desnecessádação e, em suma, é o órgão da seleção no ria e estéril, isto é, que o objetivo da recordatocante a escolher as impressões e a uni-Ias ção sempre era a resposta a ser dada ao proem um único todo. Por isso, o papel desempenhado pelo interesse na orientação do objetifessor durante o exame; toda a recordação era vo do estudo é extraordinariamente importanadaptada apenas a isso e, por isso, era inadequada para outras finalidades. te. A pesquisa tem demonstrado que toda reO último elemento que guia a memória é cordação é efetuada sob o controle de certa o jihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA orientação desse processo. Os psicólogos chaa sp e c to e m o c io n a l do que é recordado. Os exmam isso de influência da orientação diferenperimentos demonstraram que as palavras vincial nos experimentos de recordação. A expeculadas a certas vivências pessoais eram recordadas com maior freqüência que as afetivariência demonstrou que os resultados da recordação dependem em grande parte da insmente indiferentes. Os experimentos de Peters e Nemecsek,!' que reuniram 15 mil respostas, trução que ocorre no início do teste. Essa instrução explica ao sujeito tudo o demonstraram que aquilo que nossa memória que se exige dele, quais são os objetivos que retém com maior freqüência são elementos imdeve propor à sua recordação e a que teste será pregnados de uma reação emocionalmente positiva. Nada se recorda tanto como aquilo que, submetido. Assim, a instrução estabelece uma série de reações de orientação que se expriem um determinado momento, esteve ligado mem na adaptação da recordação aos fins da ao prazer. Esta parece ser a expressão da tenaprendizagem. Isso nos convence ainda mais dência biológica do organismo, ou seja, reter e que a memória é apenas um dos tipos de ativireproduzir vivências relacionadas ao prazer. dade, uma das formas do comportamento. Por isso, transforma-se em regra pedagógica a exigência de uma certa vivência emocional, Os experimentos de Aall'" demonstraram que a orientação fundamental influencia a através da qual deve passar todo o material duração de nossa recordação, isto é, como se didático. houvesse a intenção de conservar o aprendido Além de preparar as correspondentes fordurante certo prazo. Esse autor dizia a seus suças da inteligência, o professor sempre deve se jeitos experimentais que deviam aprender um preocupar com as correspondentes forças do certo material de cor e lhes avisava que faria sentimento. Não se esqueçam de estimular o perguntas sobre uma parte no dia seguinte, ensentimento do aluno sempre que quiserem que quanto outra parte ficaria para quatro semanas algo fique enraizado em sua mente. Dizemos com freqüência: "Lembro-me disso porque me mais tarde. Depois, ele adiava o interrogatório surpreendeu na infância". para quatro semanas depois, e os resultados mostravam que as crianças tinham retido muito melhor o que devia ser reproduzido dentro E S Q U E C IM E N T O E de quatro semanas; o que fora proposto para A R E C O R D A Ç Ã O E R RÔNEA verificar no dia seguinte havia sido menos assimilado. Experimentos de outros cientistas mosO e sq u e c im e n to , isto é, o desaparecimento traram que, dependendo da orientação, o mesdos vínculos que se estabeleceram em nós como mo material pode ser assimilado em termos de nexos temporais, é um fato biológica e psicologisignificado sem recordar palavras isoladas, ou camente muito útil, porque graças a ele surgem que também é possível aprender palavras sem as formas extraordinariamente complexas e flecaptar o significado do todo.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA o 150 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA que, sempre que era imprescindível recordar xíveis de nosso comportamento. A capacidade esse sobrenome que tinha sido esquecido, viesde esquecer o desnecessário, de rejeitar o supérsem à mente as mais diversas palavras derivafluo, de desconectar os vínculos depois que eles das de todos os objetos relacionados aos cavacumpriram seu objetivo, constitui uma necessilos, porém o sobrenome não aparecia. Em comdade de nosso comportamento, assim como o pensação, ele surgiu casualmente quando sua estabelecimento de novas conexões. Costumabusca foi abandonada. Esse cômico equívoco se citar uma frase de Ternístocles," que diante ocorreu porque o aparecimento do sobrenode uma proposta de lhe ensinar a recordar, resme foi estabelecido em um plano completapondeu: "Prefiro que me ensine a esquecer". mente diferente que o da recordação. E se quiInfelizmente, nem sempre os pedagogos sermos nos livrar desses acontecimentos envalorizam essa importância útil e higiênica do graçados, nunca devemos confiar no acaso, esquecimento. Dessa forma, não se conscienpermitindo-lhe que estabeleça uma associação tizam que a memória não ,é'apenas um armacasual. zém ou depósito do sistema nervoso para conA escolha dessas associações sempre deve servar as reações adquiridas na forma como ser efetuada com o controle do professor e semforam assimiladas. É um processo criativo de pre deve estar orientada para essa futura atielaboração das reações percebidas e alimenta vidade de recordação na qual as associações todas as esferas de nossa psique. Isso exige um de reações deverão se manifestar. Podemos enfoque higiênico da memória infantil, que não dizer sem exagerar que, sempre que os conhedeve ser esmagada com o peso desmedido do cimentos da escola não estiverem dirigidos para material, com excesso de detalhes, com uma a vida, ocorrerão vínculos falsos e errôneos e, exagerada recordação de trivialidades que vão ainda que sejam adquiridos conhecimentos, além do necessário, para evitar que a memóestes não serão utilizados no processo da ação. ria fique repleta. Se encontrássemos uma forma de realizar em Assim perdemos o poder sobre a recornosso comportamento todos os conhecimendação, e esta adquire poder sobre nós. Uma tos que adquirimos na escola, poderíamos acanorma pedagógica fundamental exige que a bar facilmente com toda a imperfeição da edumemória seja colocada em uma posição suborcação. O trágico da situação, porém, reside em dinada, integralmente a serviço de nosso comque nossos conhecimentos sempre se formam portamento, e a condição necessária para isso simultaneamente com o mecanismo que deé expulsar da memória as reações desnecessápois os coloca em ação. Em outros termos, cada rias e que perderam seu vínculo. O professor vez que recordamos algo, temos de perceber precisa se livrar de tudo o que não é utilizado que uso daremos a isso para assim produzir o ativamente na memória, porque isso representa reforço da reação. A forma de recordar para uma carga nociva e morta, um lastro. um exame difere da forma de recordar para a Portanto, nem sempre o esquecimento é vida. A esses mesmos casos de recordação erum mal, mas às vezes é um bem, e o tato pedarônea se refere todo o âmbito da mnemônica gógico deve encontrar os limites em que a re[mnemotecnia ou mnemotécnica], isto é, dos cordação e o esquecimento, como duas funsistemas artificiais de recordar por meio da coções opostas, mas que cooperam entre si, tranexão da palavra necessária com cifras ou oubalhem em comum e de mútuo acordo. Um tros sinais convencionais. Na literatura psicoperigo muito maior, do ponto de vista pedagólógica estabeleceu-se uma atitude sumamente gico, é o caso da jihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r e c o r d a ç ã o e r r ô n e a , ou seja, o negativa com relação a esses recursos mnernôestabelecimento de vínculos e reações falsos e nicos devido à sua artificialidade, à sua cominúteis. Aquela história tão engraçada sobre o plexidade e ao seu caráter de generalização. sobrenome que fazia evocar um cavalo, relaNo entanto, essas regras mnemônicas tada por Tchekov," ilustra muito bem esses devem ser valorizadas por sua racionalidade e casos de recordação errônea. A associação ou grau de economia. Entende-se que, com frenexo estabelecido por casualidade entre o so14 qüência, os sistemas mnemônicos são totalbrenome OVSOV e o vocábulo "cavalo" fez com P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 151 mente casuais, frágeis e acessórios, e não poterior. Em outras palavras, está implícita na memória a utilização e a participação da expedemos confiar neles para reforçar uma reação. riência anterior no comportamento presente. Contudo, não podemos nos esquecer de que Desse ponto de vista, a memória, tanto no todos os sistemas de notação alfabética, numérica, musical, etc., na verdade representam momento da fixação quanto durante a reprodução, representa uma atividade no sentido as mesmas regras mnemônicas que permitem ligar uma série de signos às reações internas. estrito da palavra. Na fixação, a atividade se Os inventores dos alfabetos, dos números e das exprime por meio dessa inclinação deliberada notas musicais foram grandes criadores no âmdo organismo para esta ou aquela reação, que bito da mnemônica. Esta se baseia, sem nepermite realizar a reação em determinadas nhuma dúvida, na lei psicológica geral da ascondições de orientação e fixá-Ia. Se perdêssesociação, sobre a qual se estrutura, em geral, mos a memória de repente, nosso comportatodo o ensino da leitura, da' escrita, do cálcumento assumiria um caráter descontínuo e lo, do idioma, etc. . fragmentário; um dia ou um ato não estaria Münsberg afirma, corretamente, que, vinculado ao outro. Nosso comportamento para a vida intelectual do ser humano ser rica, apresentaria - no sentido cabal da palavra é muito mais necessária a capacidade de unir um caos de reações isoladas, não unidas em facilmente conceitos que possuir uma vasta banenhuma forma comum. gagem de conceitos. As 26 letras do alfabeto Entretanto, só a presença da memória não inglês" foram suficientes para compor todos cria toda a riqueza da vida espiritual, e muitas os dramas de Shakespeare. Conseqüentemenvezes as crianças portadoras de deficiências mente, o princípio econômico de nossa memória tais ou totalmente anormais distinguem-se por consiste na diversidade infinita de sistemas uma memória colossal que, por não ser utilizaconvencionais que permitem, de forma breve da, não tem nenhuma aplicação. Essescasosconse cômoda, conservar e transmitir valores espitituem uma espécie de experimento especialmenrituais tão complexos como os dramas de te montado pela natureza, para demonstrar como Shakespeare." Tudo depende da forma econôo fato de possuir apenas memória representa mica e racional adotada pela mnemônica ao muito pouco. Existem oligofrênicos que podem realizar esse trabalho. Todos conseguem enrecordar milhares de dados e textos diferentes, tender que o alfabeto cria uma grandiosa ecoporém se mostram totalmente incapazes de ler nomia de pensamento. Na mnemônica popuqualquer palavra." Por isso, um princípio pedalar, é freqüente que a complexidade das assogógico fundamental tem a ver com ligar o trabaciações requeridas não abrevia, chegando até lho da memória às restantes formas de nossa atia demorar, o caminho da recordação. Em vez vidade. Já vimos que o processo de associação, de criar apenas um obstáculo simples, muitas que em última instância determina também a vezes dá origem a uma enorme quantidade de memória, está na base de todos os principais procaminhos indiretos e ziguezagueantes que só cessos de nosso comportamento. dificultam a recordação. O dano provocado por Através da associação, a memória deve esse tipo de mnemônica fica totalmente claro estar vinculada aos demais aspectos de nosso para qualquer um.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA comportamento. AS FUNÇÕES P S íQ U IC A S D A M E M Ó R IA Na economia geral de nossa psique corresponde à memória o papel que, na economia mundial, corresponde ao capital. Assim como o capital, ela envolve uma certa quantidade de bens acumulados, não criados para seu consumo direto, mas para a produção pos- A T É C N IC A D A M E M Ó R IA A esfera da atividade em que é mais fácil avaliar a produtividade é a memória. Por isso, a pedagogia dispõe de todo um conjunto de regras com relação à profilaxia e à técnica da memória. A condição fundamental para reforçar as formas complexas de reações é a exiI 152 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA gência de que o aluno aprenda tudo como uma totalidade, que capte o significado como uma unidade integrada e que não estude tópicos isolados. Meumann destaca a importância de um método com intervalos, em que todo o material é dividido em partes, fazendo-se um recreio depois da cada uma delas. Ao mesmo tempo, o conteúdo das unidades menores é unificado em uma totalidade; aqui é extraordinariamente importante a distribuição das repetições. O que ocorre é que a repetição constitui o método básico para reforçar a reação. Acima de tudo, interessa observar que as repetições possuem um limite, depois do qual deixam de agir, tornam-se inúteis e até nocivas, pois esgotam toda a força de qualquer reação significativa e eliminam o significado do material. Além disso, é sumamente importante a distribuição dessas repetições. Não é indiferente se o aluno repete seguidamente ou com pausas entre as repetições. A conclusão pedagógica exige que haja uma distribuição das repetições; uma parte delas é transferida para um intervalo de tempo mais distante, afastado do primeiro por uma pausa. Cabe destacar, também, que cada pessoa tem seu ritmo habitual para reagir e que a modificação desse ritmo no sentido de aceleração ou adiamento enfraquece a potência da recordação. Por último, o ritmo também desempenha um papel decisivo na questão do estudo; ele consiste na união das partes do material, dando-lhes uma lógica conseqüente e organizando os elementos em uma totalidade integrada. Se lembrarmos que todo o papel da memória se reduz a uma atividade de vinculação, poderemos compreender facilmente as vantagens do ritmo, que proporciona antecipadamente as formas dessa vinculação. O S D O IS T IP O S DE RECORDAÇÃO DAS REAÇÕES Assim como a fixação [o reforço], a recordação das reações é uma atividade, só que ela representa um momento mais tardio nesse mesmo processo. Na psicologia tradicional, geralmente eram diferenciados dois tipos de recordação. Uma era denominada imaginação reprodutiva e abrangia todos os casos em que as reações reproduziam [recordavam] tudo que realmente aconteceu com o organismo. Por outro lado, era chamada de imaginação criativa ou construtiva a que reproduzia certa forma de experiência não vivida na realidade. Ao mesmo tempo, justamente o critério de realidade permitia distinguir a memória da fantasia, as reações de recordação das reações de imaginação. No entanto, esse critério deve ser qualificado como completamente incorreto pelas seguintes considerações. Não existe nenhuma recordação exata da experiência passada, não há lembranças totalmente exatas, a recordação sempre envolve certa elaboração do percebido e, portanto, certa deformação da realidade. E, vice-versa, as imagens da fantasia, por mais complexas que sejam,sempre incluem elementos extraídos da realidade. Por isso, não existe uma diferença essencial entre fantasia e recordação. Aqui, podemos falar mais de uma diferença qualitativa que de uma quantitativa. As imagens da fantasia também podem estar orientadas para a realidade; por exemplo, quando imagino o que acontecerá hoje à tarde, ou quando crio em minha imaginação uma vista do Saara, que nunca vi; em todos esses casos o comportamento imaginativo se dirige a objetos não menos reais que quando recordo um local de minha cidade natal ou rememoro o que ocorreu ontem. Por isso, não devemos considerar que a única distinção entre ambas as reações é saber se são ou não reais; temos de levar em conta, exclusivamente, sua relação com nossa experiência. Algumas delas constituem um âmbito que existiu em nossa experiência; as outras, um âmbito que não existiu. Qualquer erro da memória não constitui um fenômeno sem causa nem é fortuito, mas sempre é motivado por algum impulso interno sumamente importante. Portanto, agora diferenciamos as recordações abertamente deturpadas da fantasia que serve de fachada para certas recordações indesejáveis, deslocadas para o limiar de nossa consciência. Em geral, pode-se dizer que a memória está intimamente relacionada ao inconsciente e, na verdade, representa aspectos do comportamento não-determinados na esfera da consciência; assim são nossas recorda- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 153 neo e sem motivo algum. Mas isso é somente o resultado do desconhecimento dos motivos que condicionam esse funcionamento. Cabe mencionar aqui, em primeiro lugar, as inclinações que não foram satisfeitas em nossa vida. Elas A R E A L ID A D E D A F A N T A S IA são as verdadeiras fontes da fantasia e determinam seu segundo princípio de realidade. [fa n ta zia J , que costuma ser A fantasia jihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Essa lei pode ser formulada da seguinte madefinida como uma experiência oposta à realineira: independentemente de a causa ser real dade, na verdade tem suas raízes na experiênou irreal, a emoção ligada a ela sempre é real. cia real do ser humano. A pesquisa dos produSe choro pelo herói imaginário de um romantos mais complexos da criação mitológica, das ce ou fico com medo do terrível monstro que tradições religiosas, crenças e lendas, das imaapareceu em meus sonhos ou me emociono ao gens e invenções fantásticas mostra que, ainconversar em uma fantasia com meu irmão da que o ser humano explore ao máximo o morto há muito tempo," em todos esses casos potencial de sua fantasia, não pode inventar as causas de minhas emoções não existem na algo que não tenha sido vivido por ele em sua realidade, mas meu temor, minha pena, miexperiência. Quando imaginamos um ser fannha compaixão continuam sendo, à margem tástico, um centauro ou uma sereia, é claro que disso, vivências completamente reais. Conseestamos operando com as imagens de semicaqüentemente, a fantasia é real de duas maneivalo-serni-homern ou de sernipeixe-sernimuras: por um lado, pelo material que a forma; lher. Mas, nesse caso, a irrealidade deve-se à por outro, pelas emoções ligadas a ela. combinação dos elementos dessas imagens. Esses mesmos elementos, que formam o cavalo e o homem, o peixe a mulher, baseiam-se na A S F U N Ç Õ E S D A IM A G IN A Ç Ã O experiência real. Ainda ninguém conseguiu criar uma representação de tal índole que não Pelo que já foi dito, é fácil compreender que tenha qualquer relação com a realidade. Até a função básica da imaginação [v o o b ra y e n ie J é a imagens tão distantes e irreais, como as do organização de formas de comportamento que ainda não ocorreram na experiência do ser huanjo, do diabo, de Kashchei," etc., em sua essência, estão compostas de combinações mais mano, enquanto a função da memória consiste em organizar a experiência de uma forma que complexas de elementos extraídos da realidarepita aproximadamente o que já existiu. De acorde. Portanto, todo o material da fantasia, sem do com isso, várias funções parecem ser de natunenhuma exceção, tem sua origem na realidareza totalmente diferente, mas todas estão intide. A segunda fonte de realidade na fantasia é mamente relacionadas à função básica de encono sistema de nossas vivências internas, sobretrar o comportamento que corresponde às novas tudo as emoções e os desejos, cujo curso é decondições do ambiente. terminado pela combinação dos elementos A primeira função do comportamento reais nas representações fantásticas. su c e ssiv a e imaginativo pode ser denominada Embora a fantasia geralmente seja apreé sumamente importante para o professor. Sasentada como a forma de comportamento mais bemos tudo o que não ocorreu em nossa expecaprichosa, inexplicável e sem motivo, ela está riência com a ajuda da imaginação. Concretarigorosamente condicionada e determinada em mente: quando estudamos geografia, história, cada um de seus pontos, como todas as outras física ou química, astronomia ou qualquer cifunções de nossa psique. A questão consiste ência, sempre estamos encarando o conheciapenas em que as causas que condicionam seu mento de objetos que não ocorreram de forma trabalho jazem profundamente dentro do ser direta em nossa experiência, mas constituem humano e muitas vezes permanecem ocultas a principal aquisição da experiência social copara a consciência. Daí surge a ilusão de que o letiva da humanidade. E, se o estudo dos tefuncionamento da imaginação seria espontâções da infância que, como a teoria psicanalítica demonstra, são formas de semifantasia, semimemória.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 154 L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA mas não se limitar ao mero estudo do relato verbal sobre eles, mas tender a penetrar, através da fachada verbal de sua descrição, em sua própria essência, inevitavelmente ele vai utilizar a função cognoscitiva da imaginação. Ao mesmo tempo, deve usar todas as leis da atividade da imaginação. Isso significa, em primeiro lugar, que nenhuma construção da fantasia deve ser provocada antes que o professor tenha garantido a presença, na experiência pessoal do aluno, de todos os elementos com os quais deve ser construída a compreensão .adequada do novo tema. Se desejarmos suscitar no aluno uma representação vívida do Saara, devemos encontrar em sua experiência real todos os elementos a partir dos quais essa representação deve ser construída. Por exemplo, a esterilidade, as dunas, a imensidão, a falta de água, o calor; tudo isso tem de ser unido, mas ao mesmo tempo tudo deve se basear na experiência direta do aluno. Isso não quer dizer, naturalmente, que cada um desses elementos tenha de ser tomado diretamente de uma percepção imediata. Pelo contrário, muitas coisas podem ser adotadas por meio da experiência do aluno, elaborada e reelaborada no pensamento, mas, ao encarar a construção de um novo tipo de representação, devemos preparar antecipadamente todo o material necessário para essa construção, venha ela de onde vier. Por isso, o conhecimento da experiência do aluno é uma condição imprescindível da tarefa pedagógica. Sempre se deve conhecer o terreno e o material sobre o qual nos dispomos a construir, pois senão corremos o risco de erguer um edifício frágil sobre a areia. Por esse motivo, a maior preocupação do professor passa a ser a tarefa de traduzir o material novo e não-existente para a experiência do aluno, para a linguagem de sua própria experiência. James nos oferece um exemplo interessante que pode esclarecer bem essa questão. Suponhamos que estamos estudando a distância que há entre a Terra e o Sol. É claro que dispomos de vários métodos. Podemos, simplesmente, comunicar ao aluno a quantidadede quilômetros que separam a Terra do Sol, mas, ao fazer isso, temos de saber que di- ficilmente esse método vai alcançar o objetivo proposto. Em primeiro lugar, obtemos como resultado uma mera reação verbal, isto é, uma designação verbal; não obtemos um conhecimento vivo sobre o fato, mas apenas o conhecimento da fórmula com que esse fato é designado. Portanto, não penetramos na própria essência do fato. O seguinte caso serve de eloqüente confirmação do que acabamos de dizer. Durante o período de desvalorização da moeda soviética, quando as crianças se acostumaram a lidar diariamente com cifras "astronômicas", muitos professores perceberam que, quando tinham de comunicar a elas as verdadeiras cifras astronômicas, isso surtia um efeito completamente inesperado. Por exemplo, ao ouvir que a longitude do Equador terrestre é igual a 40 miljihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFE v e r s ta s ." um menino disse: "Tão pouco! Um copo de sementes de girassol custa a mesma quantidade de rublos". O significado das grandes cifras estava tão desprestigiado na experiência pessoal dos alunos que eles não podiam compreender de forma alguma por que, quando se queria representar distâncias enormes, eram utilizadas cifras que lhes pareciam magnitudes insignificantes. De qualquer forma, embora destaquemos esse efeito negativo, a cifra em si não diz nada à imaginação do aluno, apenas deixa esse número em sua memória. O professor que desejar suscitar uma verdadeira noção sobre a magnitude dessa distância procederá de forma mais adequada se tentar traduzi-Ia à linguagem própria da criança. James oferece essa explicação psicológica e pedagogicamente mais racional. Se perguntássemos ao aluno: "Imagine que disparam contra você a partir do Sol. O que você faria?" O aluno, naturalmente, responde que pularia para o lado contrário. O professor replica que isso não é preciso, que ele pode deitar-se tranqüilamente na cama e levantarse no dia seguinte, viver sem preocupações até a maioridade, terminar os estudos de comércio, chegar à minha idade; só então a bala começaria a se aproximar de você e você teria de mudar de lugar. Vocês percebem como é enorme a distância da Terra ao Sol? .'.~•. \' -Ó r -. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 155 ponsabilidade da imaginação. No jogo, na menEssa representação seria formada no alutira ou nas histórias, a criança encontra uma no com base em noções totalmente reais, exisfonte inesgotável de vivências, e, dessa forma, tentes em sua experiência pessoal, levando-o a fantasia abre novas portas para que nossas a medir a magnitude em unidades que lhe fossem acessíveis e compreensíveis. Tanto a velonecessidades e aspirações adquiram vida. Nesse sentido, na mentira infantil está implícito um cidade do vôo do projétil como a enorme duprofundo sentido psicológico, ao qual o profesração do tempo que abrange toda uma vida, sor tem de prestar muita atenção. em comparação com o segundo em que é preNo jogo, essa função emocional da fantaciso sair da trajetória da bala; o aluno conhece tudo isso com total precisão e a noção construísia se transforma inadvertidamente em uma da sobre esse material será para ele um conhenova função, ou seja, na organização das formas do ambiente que permitem que a criança cimento completamente exato, uma penetradesenvolva e exercite suas inclinações naturais. ção no fato. Esse exemplo. mostra as formas gerais como se deve lidar com a imaginação Podemos dizer que o mecanismo psicológico do para que ela leve ao conhecimento da realidajogo se reduz totalmente ao trabalho da imaginação e que, entre o jogo e o comportamento de. Sempre se deve partir do conhecido e do imaginativo, podemos colocar um sinal de igualsabido para compreender o desconhecido e o dade. O jogo não passa da fantasia em ação, e a ignorado. Além disso, a segunda lei da fantasia exige que não nos preocupemos apenas com própria fantasia não é nada mais que um jogo o material, mas também com a correta combiinibido e reprimido, não-exteriorizado. Por esse nação do mesmo. A lei da realidade da fantamotivo, na infância a imaginação adquire uma sia diz que sempre é real a emoção ligada à terceira função, que chamaremos de e d u c a tiv a , nossa construção. Por isso, é preciso provocar cujo sentido e missão é organizar o comportaa emoção e, ao transmitir ao aluno diversas mento cotidiano da criança, de tal forma que noções, não devemos nos preocupar apenas ela possa se exercitar e desenvolver para o fucom o material, mas fazer com que surja no turo. Portanto, no fundamental, as três funções aluno a correspondente emoção. da fantasia concordam totalmente com sua proA outra função da imaginação é denomipriedade psicológica, isto é, que se trata o comnada jihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA e m o c io n a l. A lé m de ter sua expressão exportamento dirigido a formas que ainda não terna, toda emoção também é interna e, porexistiram em nossa experiência. tanto, a fantasia é o aparelho que realiza diretamente o trabalho de nossas emoções. Da teoA EDUCAÇÃO DO COM PORTAM ENTO ria sobre a luta pelo campo motor final, sabeIM A G IN A T IV O mos que nem todos os impulsos e inclinações que estão em nós chegam a se concretizar. SurO critério mais corrente considera que, na ge, então, a seguinte pergunta: qual é o desticriança, a fantasia está presente de forma muino dos estímulos nervosos que surgem de mato mais vívida e rica que no adulto. Devemos neira absolutamente real no sistema nervoso, considerar errôneo esse critério por muitas caumas não chegam a se concretizar? Subentensas; uma delas tem a ver com o fato, que já vide-se que adquirem o caráter de um conflito mos, que a principal fonte do comportamento entre o comportamento da criança e o meio imaginativo é a experiência real. Como a resercircundante. Esse conflito provoca a doença va de representações reais é extremamente poneurose ou psicose - quando a tensão é intenbre na criança, na mesma medida sua imaginasa e não encontra outro desenlace, isto é, se ção, sem dúvida alguma, trabalha de forma mais não é sublimado nem se transforma em outras débil e pior que no adulto. Compreende-se, enformas de comportamento. tão, que o comportamento imaginativo também Por esse motivo, a sublimação, isto é, a precisa de desenvolvimento e de educação, realização socialmente superior das possibilidacomo todos os outros. des que não se realizaram, também é uma res-ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 156 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A primeira tarefa dessa educação consiste em que - como já explicamos - correspondem à imaginação as mesmas funções que à memória e, por isso, uma peculiaridade da imaginação infantil é que a fantasia da criança ainda não está diferenciada de sua memória. Tanto uma como a outra surgem da recordação das reações, e ambas, de alguma maneira, condicionam essa fusão na criança. Toda a experiência da criança ainda tem um caráter instável, não-acabado e não-elaborado e, portanto, toda nova recordação será, até certo ponto, deformada e inexata. Apesar de toda a sua boa intenção e desejo, .acriança não está em condições de reproduzir exatamente todos os detalhes de sua experiência real. Sempre ocorrerá uma involuntária tergiversação dos detalhes, porque a criança não os percebeu ou porque os inventou sob a influência do sentimento. Essa invenção, essa mentira sincera, sempre estará presente, inclusive na recordação do adulto. Nesse sentido, são muito eloqüentes e úteis os experimentos com depoimentos de adultos e crianças. Ficou claro, nesses casos, que é impossível obter uma descrição fiel e detalhada de qualquer testemunha ocular, por mais exatamente que tenha observado o fato e por mais honesta que ela se esforce por ser, ao expor o que viu. Em seu depoimento haverá muitos elementos que a própria pessoa aporta, e nos quais ela acredita piamente. A título de teste, apresenta-se às crianças uma figura qualquer ou se lê um relato omitindo detalhes; depois disso, elas são interrogadas sobre o relato e, em geral, inventam os pormenores. O mesmo sucede com os adultos quando presenciam um escândalo ou qualquer incidente, representado com esse propósito, e depois são questionados sobre os detalhes do que aconteceu. Além de surgirem lacunas na memória de todos, o que faz com que os fatos adquiram nos depoimentos um aspecto um tanto deformado, cada testemunha inventa alguns detalhes que não existiram, tergiversando assim os fatos. Essas tergiversações involuntárias de nossa memória manifestam-se com particular clareza nas crianças e, embora a natureza psicológica de ambas as formas do comportamento seja a mesma, no comportamento real sua função especial recai em cada uma delas e, por isso, o professor deve traçar o limite mais preciso possível entre fantasia e realidade. Isso tem a ver, em primeiro lugar, com a luta contra a mentira infantil que, em conjunto, de forma alguma deve ser compreendida como a mentira dos adultos, isto é, como um delito moral. A origem da mentira infantil é a verdade interna da vivência emocional. As crianças mentem e essa é uma lei geral do comportamento infantil, mesmo quando para elas isso não representa nenhuma vantagem nem constitui uma necessidade, graças ao fato de que a vida emocional das crianças tem um caráter de alta excitação; graças ao fato de que a paixão, como frisou Sechenov, é uma característica distintiva da infância, pois nessa idade a criança ainda não elaborou a força moderadora que regula seu comportamento. Sua fantasia não conhece a repressão nem o autocontrole e é extremamente impulsiva, realizando docilmente cada desejo emocional da criança. Por isso, é freqüente que uma criança não relate o que realmente aconteceu, mas o que gostaria de ter visto na realidade. Portanto, nada evidencia tanto os desejos, as aspirações e os anseios infantis quanto a mentira. James, com extrema correção, chama a mentira infantil de "engano sincero" e Hall'" observa que a mentira infantil é, acima de tudo, fantástica e heróica, raramente egoísta. A rigor, cada mentira infantil deriva de um estado emocionalmente elevado da criança, que se esforça naturalmente para exagerar o peso emocional de um acontecimento, fazendo com que tudo o que acontece lhe pareça "heróico", de acordo com seu alto nível de paixão. Outras mentiras infantis são o eco direto de desejos, como também acontece com os adultos. A criança mente com a mesma desenvoltura e naturalidade como vê um sonho. É preciso decifrar e encontrar o fundamento de cada mentira infantil, e só então poderemos avaliar esse ato e reagir a ele de modo correto. Na mesma situação está a fantasia infantil, a crença em diversos seres fantásticos com os quais as babás assustam as crianças, [a crença] em qualquer absurdo contado por um adulto. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 157 No capítulo sobre a educação estética [Capo plena realização e onde flui totalmente dentro de seus próprios limites. Além de não minar o 13], relataremos mais detalhadamente o dano sentido da realidade, ele desenvolve e exerci[que pode causar] esse fantasiar. Por isso, é preta todos os hábitos e.reações que servem para ciso lutar de forma implacável contra esse sentielaborar esse sentido. Todos conhecemos os mento pouco desenvolvido da realidade, e a edupapéis infinitamente diversos que os diferencação da fantasia deve ser realizada, acima de tes objetos podem desempenhar no jogo infantudo, pela linha da elaboração do respeito à reatil. O quarto pode ser uma floresta, ou o conlidade. A criança deve ser educada com grande vés de um barco ou um salão; a própria cadeirespeito pelo real, mas por real não se deve enra pode representar com idêntico êxito um catender o pequeno mundo que a rodeia. Aqui se valo, ou um trem, ou uma mesa comum. Mas trata dessa grande realidade que nos circunda, o jogo é completamente inofensivo porque, ao se não quisermos criar um pequeno-burguês e suscitar emoções reais, ao reproduzir elemenum medíocre. Temos de admitir que, quando se tos da experiência totalmente reais, continua fica encerrado nesse estreito círculo dos interessendo apenas um jogo e não afasta a criança ses imediatos, isso vai criando em crianças e adulda vida; pelo contrário, ele desenvolve e exertos uma forma de vôo curto, uma concepção cita as aptidões que lhe serão necessárias na miúda de vida, limitada e arrogante. vida. É interessante frisar que o jogo está tão O respeito pela grande realidade, porém, não pode evitar a saída dos estreitos limites da ligado à fantasia que as crianças preferem os experiência pessoal, e para essa saída é precibrinquedos simples e toscos aos caros e sofisticados, que não deixam nenhum espaço para o so contar com a ajuda do comportamento imaginativo. Conseqüentemente, a luta pela realitrabalho da fantasia infantil e exigem ser tratados com muito cuidado. Um brinquedo caro dade não deve implicar a destruição da fantaexige da criança uma atitude passiva e não é sia, mas apenas a exigência de que a fantasia seja colocada em seu devido lugar, dentro dos um objeto que possa servir de material adequado para desenvolver a fantasia. Gaupp afirlimites de suas próprias funções, e que o comportamento imaginativo esteja rigorosamente ma o seguinte: "Em nenhum outro período da condicionado e determinado. Em outras palavida a criança aprende tanto quanto nos anos de suas brincadeiras infantis". 22 vras, a fantasia deve ter seu lugar, mas não Não foi em vão que o professor K. N. devemos esquecer que estamos apenas fantaKornilov adotou como epígrafe, no caso da pessiando. Um comportamento imaginativo é pequisa da psicologia do jogo infantil através de rigoso quando nele coincidem todos os conflibonecas, as palavras de Rabindranath Tagore:" tos entre a realidade e os sonhos e, porisso, é arriscado renunciar à luta real e ceder à tentação de que qualquer situação Um menino perguntou à mãe: "De onde vim, difícil possa ser resolvida por meio de sonhos. onde você me encontrou?" Entre lágrimas e sorrisos, ela respondeu, apertando seu A entrega desmedida ao sonho distancia do pequerrucho contra o peito: "Você estava esmundo real, enfraquece e paralisa a possibilicondido em meu coração como desejo, meu dade de influenciar o mundo de forma ativa, querido. Você estava na boneca de meus joperturba a escolha correta das reações necesgos infantis". sárias no organismo, contribui para elaborar e sustentar reações socialmente nocivas e vitalmente instáveis. A imaginação é sumamente NOTAS útil como servidora, porém é prejudicial como amo porque, conforme a expressão de um psi1. Michail Vasilievitch Lomonosov (1711-1765) cólogo, é parecida com o fogo. foi o mais importante cientista e filólogo russo A outra tarefa de educação da imaginado século XVIII. A principal universidade rusção consiste em desenvolver as funções positisa, em Moscou, tem seu nome. vas que cabem à fantasia. O jogo infantil é a 2. Vladimir Vladimirovitch Maiakovski (18931930) foi o principal poeta soviético de vanesfera em que a fantasia encontra sua maisZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 158 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA excepcional velocidade todos os textos, por guarda e um dos mais importantes do século XX. mais complexos que fossem. Também existem Foi um revolucionário bolchevique desde os os "portadores de deficiência mental g e n ia is " . 13 anos. Suicidou-se por motivos que têm a Uma dessas pessoas que conhecemos fazia cálver exclusivamente com sua vida privada, coculos matemáticos de multiplicação e divisão mo todas as evidências comprovam, e não por de vários dígitos muito mais rapidamente que estar decepcionado com a situação política da uma calculadora. O leitor pode recordar o URSS, como geralmente se afirma. Seu túmulo autista do filme R a iti Man (1988), fielmente está situado a poucos passos do de Vigotski. A Editorial Platina de Buenos Aires publicou interpretado pelo ator Dustin Hoffman. Nossa quatro grandes volumes com suas obras funconcepção da genialidade não coincide exatamente com a de Vigotski (cf. seu artigo "La damentais. (1929), em L. S. Vigotski, La genialidad" 3. Vigotski podia fazer isso facilmente, e dessa G e n ia lid a d y o tr o s te x to s in é d ito s , ed. de G. forma ilustrava suas aulas sobre a memória. Blanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998). Nesse caso há uma revelação pessoal: em seu próprio procedimento.mnemotécnico, ele usa6. É provável que essa seja uma referência ao livro de W Stern, P s y c h o lo g ie d e r fr ü h e n K in d h e it va uma lista cronológica de escritores previa[ A p s ic o lo g ia d a p r im e ir a in fâ n c ia ] , Leipzig: mente memorizada. Alguém que estiver treiQuelle-Meyer, cuja versão russa é de 1922. nado nessa técnica pode lembrar 250 palavras sem erros significativos. Esse exercício mnernoWilliam Stern (Alemanha, 1871 - Estados Unidos, 1938) foi um filósofo e psicólogo que estécnico era um jogo de salão bastante difunditudou aspectos das psicologias infantil e difedo no século XIX. Como curiosidade, o poeta rencial. Fundou a escola psicológica p e rso tia nacional da Argentina, José Hernández, deslis ta , que distingue entre as pessoas e as coitacava-se no mesmo. 4. O caso citado e a conclusão que fecha o parágrasas: "O fato fundamental do mundo [ ... ] são fo foram extraídos de W James (cf.jihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P r in c íp io s ... , as pessoas reais". Sua teoria está ligada à de op., cit., p. 546-7). Este exemplo pode ser enPiaget e Vigotski, por levar em consideração a totalidade da pessoa em vez de processos isocontrado em uma citação que James faz de Coleridge: " B io g r a p h ia L ite r a r ia , 1847, I, 117"; lados. Stern e sua esposa emigraram para os por sua vez, ela é citada por "Carpenter, M e n ta l Estados Unidos quando o nazismo tomou o P h is io lo g y , capo X". Esses são os dados oferecidos poder na Alemanha. por James. James era consciente de sua falta de 7. Vigotski se refere aqui ao livro de H. Ebbinghaus, Ü b e r d a s G e d iid itis : U n te r s u c h u n g e n z u r e e x p e riprecisão no que se refere a referências. No prefácio de P r in c íp io s , diz o seguinte: "A bibliografiam e n te lle n P s y c h o lo g ie [ S o b r e a m e m ó r ia : U m a consinto muito - não é nada sistemática" (p. 4). Os tr ib u iç ã o à p s ic o lo g ia e x p e r im e n ta l] , Leipzig: autores aos quais James se refere são o poeta Duncker und Humboldt, 1885. Utilizamos a traromântico inglês Samuel Taylor Coleridge (1772dução inglesa: M e m o r y . A c o n tr ib u tio n to e x p e r im e n ta l p s y c h o lo g y , Nova York: Dover, 1964, 1934) e o anatomista W B. Carpenter, cuja obra F is io lo g ia m e n ta l foi publicada em 1881. 126 p. Hermann Ebbinghaus (1850-1909) foi um psicólogo alemão que, em uma famosa con5. Ainda que essa afirmação seja válida para trovérsia com Wilhelm Dilthey, em 1894, demuitos músicos, não a consideramos adequafendeu a psicologia experimental contra a "psida para o caso de Mozart. Aqui se fala de múcologia compreensiva" [ v e r s te h e n d e P s y c h o lo sicos com memória musical muito desenvolvig u e ] , uma das "ciências do espírito" criadas por da, e há vários músicos com boa memória que Dilthey. Suas pesquisas sobre a memória estão não se afastam da norma. Pois bem, justamenentre as melhores da história da psicologia. Sete Mozart n ã o é um bom exemplo, pois ele era um gênio, isto é, uma pessoa que p r o c e s s a v a a gundo Boring, op. cit., Ebbinghaus foi para a Alemanha o que James foi para os Estados in fo r m a ç ã o em s e u c é r e b r o d e u m a m a n e ir a s in Unidos. Quando Ebbinghaus morreu repentig u la r , à margem da norma e de uma forma ainda desconhecida pela ciência psicológica. Connamente de pneumonia, considerou-se que a psicologia alemã sofrera uma perda irreparável. forme esse critério, não teriam sido gênios, por exemplo, Kant, Beethoven ou Wundt, enquan8. Essa é uma referência a E. Meumann, O k o n o m ie to Ramanujan, Charlie Parker e Vigotski podeu n d T e c h n ik d e s G e â iid u n is s e s [ E c o n o m ia e té c n ic a d a m e m ó r ia ] , Leipzig: Klinkhardt, 1912. riam ser considerados tais. Segundo Luria, por Todas as vezes em que Vigotski menciona exemplo, "Vigotski lia em diagonal" e com uma P S IC O L O G IA 9. 10. 11. Q Q Q 13. 14. 15. 16. 159 tal. Exerceu grande influência sobre Vigotski, que Meumann neste capítulo, está se referindo a escreveu três versões - uma em 1915 e duas em essa obra. Essa é uma referência a W. James,jihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P rin c ip ie s ... , 1916 - de uma monografia intitulada T ra g u e d ia o G a m lie tie , p rin tsie D a tsk o m , U . S h ie k sp ira [A op. cit., subcapítulo "La retentiva de cada quien T ra g é d ia d e H a m le t, P rín c ip e d a D in a m a rc a , d e es incambiable", p. 531 e segs. W S h a k e sp e a re ], antes de fazer 20 anos. A verAnathon Aall (1867-1943) foi um filósofo e são de 1916 dessa obra foi publicada pela pripsicólogo norueguês que concebeu a psicolomeira vez em 1965, como "Apêndice" à lª edigia como uma ciência empírica. ção de P sic o lo g ia d a a rte : Moscou, Iskusstvo. O Aqui, Vigotski refere-se à comunicação de H a m le t de Shakespeare e a É tic a de Spinoza Peters e Nemecsek sobre a relação entre a evoforam os livros favoritos de Vigotski. Quando cação e o desagrado, publicada na revista Fortschritte der Psychologie und ihrer Anwense internou no hospital onde sabia que ia mordungen [Progressos na área da psicologia e rer, Hamlet foi o único livro que levou consigo (cf. G. Blanck, "Vigotski y Hamlet. Hacia una suas aplicações], n 2, p, 226 e segs., 1914. Peters já publicara em 1'911 seu artigo "Gefühl Psicología del Arte", In te rc a m b io s. R e v ista d e und Erinnerung" ["Sentimento e Recordação"], P sic o lo g ía y C u ltu ra , n 3, 1995, Buenos Aires: em PsychoI. Arb., n 6, p. 197 e segs. Wilhelm Almagesto, p. 76-78). 17. Cf. a nota n 5 deste capítulo. Peters (Viena, 1880-1963, Wurzburgo) foi um médico, psicólogo experimental e pedagogo 18. Kashchei é um personagem dos contos populares russos, avaro, ruim e imortal. alemão. Quando Hitler tomou o poder, Peters foi expulso de seu trabalho na Alemanha por 19. No texto, Vigotski escreve literalmente "alucinação", porém preferimos utilizar o termo "fanser judeu. Exilou-se em Londres e, mais tarde, em Istambul. Regressou à Alemanha em 1952, tasia" devido ao contexto e à evolução semânonde continuou trabalhando até sua morte. tica da palavra. É provável que esse exemplo Não pudemos encontrar dados do co-autor da tenha a ver com sua própria experiência biopresente referência. Nemecsek é um sobrenográfica: seus irmãos mais novos David (apelime de origem húngara e se pronuncia "Nérnedado Dodik) e Isaak, um ativo militante do chek". Na versão russa original lê-se literalmenK o m so m o l, morreram em 1919 e 1920, respecte "Nernechka", genitivo de "Nernechov". Isso tivamente (Cf. Vigosdkaia, comunicação pesexplicaria a sua transliteração errônea, como soal, 1988). 20. Medida russa que equivale a 1.067 metros. se fosse um sobrenome russo, na edição norte21. Aqui, Vigotski refere~se a G. S. Hall, "The americana de Silverman, que obviamente não pôde encontrar esta referência. contents of children's minds", P rin c e to n 's Temístocles (528-462 a.C.) foi um dos mais R e v ie w , 1883, vol. XI, p. 249-272. Granville Stanley Hall (1844-1924) foi um dos criadoexímios estadistas atenienses. Vigotski refere-se ao conto satírico de Tchekov, res da psicologia norte-americana e é consideU n a p e llid o d e c a b a llo (cf. A. P.Tchekov, C u e n to s rado o fundador das psicologias evolutiva e educativa. Listou toda a psicologia de sua époC o m p le to s, op. cit., p. 329-334). ca, publicou 489 trabalhos e fundou a A m e ric a n O sobrenome Ovsov é derivado de "aveia", em P sy c h o lo g ic a l A sso c ia tio n . russo. Aqui c o rrig im o s u m e rro . No original diz o se22. Referência a Robert Gaupp, P sy c h o lo g ie d e s K in d e s [P sic o lo g ia in fa n til], Leipzig, 1908 guinte: "as 22 letras do alfabeto inglês", quan(ed. russa: 1909), obra citada em outros texdo na verdade este tem 26 letras. No Capo 10, tos de Vigotski. R. Gaupp foi um psiquiatra o mesmo erro é repetido e também o corrigimos. Trata-se de um descuido. Vigotski conheque escreveu sobre a dipsomania, assassinacia suficientemente a língua inglesa. Por outra tos em massa e outros temas dessa especialiparte, sua irmã Zinaida, à qual era muito apedade médica. 23. [Sir] Rabindranath Tagore (1861-1941) foi um gado, era especialista em Shakespeare e lingüista, co-autora de vários dicionários de inpoeta hindu formado na Inglaterra. Recebeu o glês (por exemplo, cf. O. S. Achmanova e Z. S. Prêmio Nobel de Literatura em 1913. Aplicou suas idéias filantrópicas à educação em sua Vigodskaia, R u sk o -A n g lisk i S lo v a r [D ic io n á rio escola Santiniketan, perto de Calcutá. Essa ciR u sso -In g lê s], Moscou: GIZ, 1962). tação de Tagore pertence ao seu livro P e rso n a William Shakespeare (1564-1616) é o mais lid a d e , cuja edição russa é de 1922. importante escritor do cânone literário ociden-ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Q 12. P E D A G Ó G IC A o P e n s a m e n to SRQPONMLKJIHGFEDCBA c o m o F o rm a d e C o m p o rta m e n to P a rtic u la rm e n te C o m p le x o A " Em primeiro lugar, o psicólogo atual compreende perfeitamente bem o aspecto do processo do pensamento com que esta entra no sistema do comportamento como conjunto das reao zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA processo do pensamento figura entre os problemas psicológicos mais difíceis e meções motoras do organismo. Todo ato de pensanos estudados." A psicologia só passou a se mento, ligado a um movimento, provoca certa ocupar dessas questões ultimamente, empetensão prévia da musculatura correspondente, exprimindo a tendência a se realizar no movinhando-se em esclarecer, através da via experimental, todas as particularidades específicas mento; quando se restringe ao ato de pensar, que permitem distingui-lo das restantes formas esse movimento não chega ao seu fim, não é do comportamento. Até as últimas décadas manifestado por completo e subsiste de forma imperava a convicção de que o pensar, em eslatente, embora perceptível e ativa. sência, seria apenas uma combinação mais As observações mais simples indicam que complexa e de ordem elevada de processos um pensamento intenso sobre uma ação ou um ato posterior manifesta-se, de forma compleassociativos comuns, isto é, uma simples cotamente involuntária, na pose ou no gesto, nexão de reações verbais. como se fosse o esforço preparatório e preliNo entanto, uma auto-observação mais minar que nos dispomos a realizar. Um expericuidadosa, sob o controle do experimento e da mento muito simples consiste no seguinte: o medição exata, demonstrou que a composição sujeito a ser testado está sentado com os olhos do ato pensante é incomensuravelmente mais fechados entre dois objetos, um deles situado complicada, que ela inclui muitos componentes à direita, e o outro, à esquerda. Propõe-se que que só são inerentes a este e que não permitem o sujeito pense intensamente em algum desses reduzi-lo a um simples e livre fluir de imagens. objetos e então, se esta condição for escrupuParalelamente a essas sutis auto-observações, losamente cumprida, não é difícil adivinhar, iniciadas e elaboradas sobretudo pela escola psipelo movimento dos globos oculares sob as cológica de Wurzburgo," desenvolveu-se o estupálpebras, pela tensão da muscular do pescodo da natureza motora dos processos mentais, ço, em qual objeto ele pensou. O movimento ou seja, a captação dos sinais objetivos do pendos olhos e a tensão da musculatura sempre sar que podem ser sujeitos à comprovação extercoincidem com a direção de seu ato de pensana e ao cálculo. Ambas as pesquisas estabelecemento. É como se o pensamento secreto se torram os mesmos fatos, a partir de enfoques difenasse traído e fosse possível adivinhá-lo com a rentes, e permitiram estabelecer um novo critéinfalível exatidão que temos quando lemos. rio sobre o processo do pensamento, que a atual O mesmo experimento, que em geral se psicologia considera um ponto de partida. realiza no ambiente escolar, exige que o sujeito, A NATUREZA PROCESSOS M aTaRA DO S DE PENSAM ENT01 162 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA com os olhos fechados, segure na mão um peso suspenso por um barbante e se esforce para pensar e representar o balanço do peso, da direita para a esquerda. Após vários minutos, o peso realmente começa a se movimentar na direção pensada, ainda que o próprio sujeito, em geral, não consiga perceber os movimentos que está produzindo. Continua afirmando que sua mão está totalmente imóvel e, na verdade, os movimentos não são efetuados por meio do esforço "voluntário" da mão, mas, sobretudo, pelas pontas dos dedos que apertam o barbante; esse pequeno movimento realmente pode passar inadvertido para o sujeito. Sobre fatos dessa índole, porém mais complexos, construiu-se a leitura do pensamento alheio, que os psicólogos herdaram de prestidigitadores e artistas de variedades, mas que, como muitas coisas provenientes desse âmbito, obteve um reconhecimento e um significado absolutamente indiscutível para a ciência. A essência dessa leitura consiste em pedir que alguém pense em um movimento ou em uma serie de movimentos mais ou menos complicados, como escolher uma nota ao piano, pegar algum objeto de alguma pessoa presente na platéia, entregá-lo a outra pessoa, escrever uma palavra, mudar uma coisa de lugar, abrir uma janela, etc. Ao mesmo tempo, à guisa de controle, o pensado é escrito previamente em uma folha de papel. O leitor do pensamento costuma propor a quem está pensando que o faça com a maior intensidade e tensão possíveis, estimulando sua atividade de pensamento e, depois, mediante operações simples, em geral sem erros nem dificuldades, ele realiza o que o sujeito pensou. O que acontece aqui é como um processo de leitura dos músculos de quem está pensando, similar a uma verdadeira leitura, isto é, a percepção do sistema de determinados sinais externos conhecidos, que são interpretados conforme seu verdadeiro significado. O leitor se situa diante do sujeito e mantém suas mãos sobre os ombros de quem pensa, faz com que ele se movimente e, sem dificuldade, determina a direção em que deve ser efetuada a ação pensada. Se o leitor se movimenta para o lado inadequado, depara-se com a resistência da musculatura e, vice-versa, quando acerta a direção correta, a musculatu- ra revela uma evidente docilidade, como se concordasse com as ações realizadas. Isso também ocorre no momento de uma detenção ou de uma volta, porque essa docilidade termina e, junto com os novos movimentos orientadores, o leitor escolhe a detenção ou a volta. Mediante esses testes e apalpando os grupos musculares tensos, o leitor reconhece os movimentos que estão preparados nos músculos do sujeito e, geralmente, chega a formas sumamente completas e complexas, tornando mais detalhadas essas técnicas. A partir dos músculos, portanto, é possível tocar uma música inteira ao piano, escrever uma complicada operação aritmética, efetuar a entrega de objetos em uma sala de teatro repleta. Em todos esses casos temos uma leitura muscular real, que justifica por completo a afirmação de um psicólogo norte-americano, de que pensamos com os músculos. Através disso, ele só queria dizer que qualquer pensamento é realizado nas tensões musculares e que, sem esses movimentos musculares, o pensamento não existe. Ao mesmo tempo, é notável que, quanto mais concentrado e tenso é o pensamento, mais clara e complexa é sua natureza motora. A pessoa que pensa intensamente não se contenta com essas palavras silenciosas que pronuncia para si mesma. Começa a movimentar os lábios, às vezes murmura e começa a falar em voz alta consigo mesma. Os atores sabem bem que, psicologicamente, um monólogo equivale a interpretar previamente a cena em profunda e intensa reflexão. Então, sem perceber, a meditação se resolve por meio de um discurso em voz alta. Isso costuma acontecer com as crianças, quando estão absortas, pensando na solução de algum problema difícil; começam a ajudá-lo com os lábios e, nas operações de multiplicação e divisão a, testa, as faces e a língua também começam a participar ativamente. Na verdade, todos os fenômenos da escrita automática, que assombraram muitos observadores nas denominadas sessões de espiritismo, também pertencem a esse grupo. Depois da cuidadosa comprovação realizada por muitos cientistas, parece que nessas evocações dos espíritos dos mortos estamos diante da ine- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 163 que, no segundo caso, quem passa tem uma gável presença de uma escrita automática que idéia totalmente vívida e clara da profundidapermanece inconsciente para os próprios parde, da possibilidade de cair, idéia que na verticipantes da sessão. O fato de que aqui se dade ocorre em nove casos de cada-dez. 'exterioriza a mesma natureza do processo de Nisso se baseia o significado psicológico pensamento também pode ser revelado do corrimão nas pontes que atravessam um rio, mediante os mais simples experimentos. Duque foi evidenciado diversas vezes pelos psirante uma sessão de espiritismo, que transcorcólogos. A rigor, praticamente ninguém viu o re sem dificuldade alguma, basta fazer ao "escorrimão das pontes salvar a vida das pessoas pírito" - na verdade, aos próprios participantes no caso de uma queda, isto é, quando uma - uma pergunta que provoque opiniões diverpessoa que atravessa uma ponte perde o equigentes ou sobre a qual os presentes tenham uma líbrio, é difícil que o corrimão a faça retomar noção falsa. No primeiro caso, obtém-se uma à posição segura. Em geral, as pessoas camiresposta confusa e contraditória; enquanto, no nham perto dele, quase o tocam com o ombro segundo, uma resposta evidentemente errada. e não se inclinam para seu lado. Mas é sufiSe você comunicar previamente aos preciente retirar esse corrimão ou permitir a passentes que sua esposa morreu no Canadá dois anos atrás, ainda que, felizmente, ela esteja sagem por uma ponte inacabada para que, infalivelmente, haja acidentes. E o mais imporgozando de boa saúde na Europa, podemos ter certeza de que, ante a pergunta sobre a tante é que ninguém se atreve a caminhar esposa, o pires ou a mesinha espírita transmuito perto da borda da ponte. Nesse caso, a mitirão a mensagem "Canadá" e "morte". ação dos corrimãos é puramente psicológica. Elas eliminam da consciência a idéia ou a reNumerosos experimentos desse tipo mostraram que as respostas dependem diretamente presentação de uma queda e assim imprimem da expectativa de quem as prepara e realiza. uma direção correta a nosso movimento. Esse fenômeno é igual ao da vertigem e o do desejo O próprio processo do transe espiritista não de jogar-nos que sentimos quando olhamos passa de uma extraordinária tensão da muspara baixo a partir de uma grande altura, isto culatura dos dedos e de sua permanente entué, a tendência a realizar o pensamento, a idéia mescência, de modo que não se subordinam que nesse momento se apodera com particuà nossa consciência mas, pelo contrário, torlar clareza e força da consciência. nam-se sumamente dóceis para a estimulação Por isso, o pior procedimento pedagógiautomática do pensamento. Ao mesmo temco consiste em inculcar com força e insistência po, as mãos dos presentes costumam estar na consciência do educando todos os atos que entrelaçadas e, por isso, o tremor ou o movinão deve realizar. O preceito "não faça tal coimento que se inicia em um extremo difundesa" já representa um impulso para realizar esse se facilmente e parece se transformar em um ato, porque introduz na consciência a idéia movimento generalizado. desse ato e, portanto, a tendência a efetuá-Io. Na área da psicologia estabeleceu-se há Thorndike destaca corretamente que os muito tempo o fato muito significativo de que preceitos morais comuns nos manuais de motodo pensamento em um movimento provoca ral dos colégios secundários franceses são alesse mesmo movimento. Nos fatos, quando se tamente prejudiciais. A descrição detalhada de propõe a uma pessoa normal que passe por atos imorais, dos quais os professores desejam uma tábua que está no chão, certamente toproteger seus alunos, na verdade só ajudam a das concordarão com essa proposta e farão o gerar em sua consciência um certo desejo e a teste sem o menor risco de fracasso. Mas basta tendência a realizá-los. Por isso - conclui o imaginar que essa mesma tábua esteja estenautor - seria sumamente prejudicial esclaredida do sexto andar de um edifício até o sexto cer e descrever detalhadamente por que o suiandar de outro, ou sobre um precipício nas cídio é errado, como fazem os autores desses montanhas, para que a quantidade de travesmanuais. A literatura oferece uma enorme sias felizes pela tábua se reduza ao mínimo. A quantidade de exemplos de situações e casos diferença em ambos os casos se explica por-SRQPONMLKJIHGFEDCBA 164 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA em que o intenso temor ou a apreensão ante algo provoca a ação vinculada ao perigo. No livro O ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA i d i o t a , de Dostoievski," o medo que sentia o príncipe Mishkin de quebrar uma jarra muito valiosa em um baile faz com que, com a certeza de um sonâmbulo, isso realmente ocorra, isto é, a idéia que está continuamente na consciência se realiza na ação. Não existe melhor forma de obrigar uma criança a quebrar um copo que lhe dizer diversas vezes: "cuidado para não quebrar" ou "certamente você vai quebrá-lo", Se passarmos para formas de comportamento mais amplas e complexas, devemos dizer que a natureza motora do processo de pensamento não se esgota nesse grupo de fatos. Temos aquilo que, na área da psicologia, é denominado de atos ideomotores, ou seja, representações do movimento de tal tipo que imediatamente elas se realizam através do próprio movimento. As denominadas sensações cinestésicas fazem parte de outro grupo de fenômenos do mesmo tipo; elas foram descobertas e estudadas com particular dedicação durante as últimas décadas, sobretudo pela psicologia norte-americana. Os psicólogos chamam de cinestésicas as excitações e vivências ligadas aos movimentos de vários órgãos do ser humano e que parecem prestar conta ao ser humano de seus próprios atos. Toda a nossa musculatura, articulações e tendões, assim como quase todos os tecidos, são atravessados, nas mais profundas camadas internas, por finíssimas ramificações nervosas que nos comunicam o movimento e a posição dos órgãos com a mesma precisão com que os órgãos externos nos comunicam a posição e os movimentos dos objetos do mundo externo. Ao mesmo tempo, as sensações cinestésicas estão quase sempre ligadas ao campo proprioceptivo, que já mencionamos [no Capo 3J. Essas sensações cinestésicas, como mostra a análise psicológica, constituem o componente essencial de nosso processo de pensamento e até mesmo do ato volitivo. Para realizar qualquer movimento é preciso que, na nossa consciência, esteja presente previamente a imagem ou a lembrança dos estímulos que estiveram vinculados a esses movimentos. Portanto, a opinião geral dos psicólogos é de que todo movimento voluntário se produz inicialmente como se fosse involuntário, para provocar a correspondente reação cinestésica, ou seja, a correspondente excitação interna. E só depois, mediante a renovação dessa reação, é possível haver a repetição do movimento sob a forma de um ato voluntário. Na composição inexpressável e complexa que determina nosso pensamento ou representação de qualquer objeto, as vivências cinestésicas desempenham um papel decisivo. [As vivências cinestésicas] não estão localizadas com precisão, parecemnos algo interno que não é semelhante a outros estados porque, de fato, elas têm uma natureza nervosa totalmente diferente e um material de percepção também distinto. A presença desses componentes cinestésicos em qualquer movimento consciente foi confirmada pelos experimentos de Ber,' que ensinou sujeitos experimentais a movimentar as orelhas e a realizar outros movimentos que geralmente são involuntários; ao mover suas orelhas por meios mecânicos, criava a reação cinestésica que posteriormente permitiria que eles realizassem essa ação por sua própria iniciativa e desejo. Por último, o terceiro grupo desses fenômenos pertence ao âmbito do pensamento e da representação de objetos, coisas e relações que, à primeira vista, são difíceis de conceber cristalizados em um movimento. Em outras palavras, a dificuldade reside em estabelecer a natureza motora de pensamentos dirigidos não a um movimento, mas, por exemplo, a uma alta torre quadrangular, à cor azul, a um enorme peso. Entretanto, é fácil se convencer de que, também nesses casos, estamos diante de uma série de movimentos rudimentares que dificilmente podem se exteriorizar, ainda que existam. Na maioria das vezes se trata de movimentos dos órgãos da percepção que, em determinado momento, acompanharam a percepção de algum objeto. Por exemplo, quando pensamos em algo muito sonoro ou suave, realizamos, de forma rudimentar, os mesmos movimentos necessários para adaptar o ouvido e a cabeça à percepção desses sons em nossa experiência vital. Quando pensamos em um círculo, grande ou pequeno, com a musculatura dos olhos efetuamos os mesmos movimen- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 165 tos adaptativos [necessários] para focalizar poesia, guardamos silêncio e pronunciamos as palavras para nós mesmos. Essa retenção da esses objetos que, em algum momento, realmente percebemos. fala em um órgão interno, o fato de não conInclusive as relações do pensamento mais cluí-Ia, adquiriu um significado particularmente amplo e importante na comunidade humaabstratas e difíceis de traduzir para a linguana, devido à extraordinária complexidade das gem do movimento, como certas fórmulas inter-relações que surgem nela, até mesmo nas matemáticas, enunciados filosóficos ou leis lógicas abstratas, em última instância também primeiras etapas culturais. estão ligadas a alguns resquícios de movimenInicialmente, qualquer reflexo é realizatos que existiram e são reproduzidos novamendo em toda a sua plenitude, em todas as suas te. Se imaginarmos a paralisação total da muspartes. Temos o esquema completo do moviculatura, a conclusão natural disso seria a inmento; a criança antes aprende a falar e, deterrupção completa de toda-atividade de penpois, a pensar. É sumamente importante que samento. . um professor saiba que nos fatos não acontece Cabe separar especialmente um grupo de o que se pensava anteriormente, isto é, a crianmovimentos internos, nos quais são realizados ça primeiro começa a pensar e depois aprende os pensamentos e cuja importância é substanas palavras para exprimir seus pensamentos'? cial no comportamento humano. É o grupo das O primeiro pensamento da criança está ligado denominadas ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r e a ç õ e s f o n o m o t o r a s , isto é, de aos seus primeiros sons ainda não bem articumovimentos reprimidos, não-manifestos, do lados. Seu pensamento tem uma origem seaparelho de fonação, que consistem em elecundária. Surge apenas quando a criança, rementos complexos de reações respiratórias, primindo os sons, aprende a cortar o reflexo musculares e sonoras e que formam a base de antes da última terceira parte e o retém dentodo pensamento humano [ ... ]; seria muito tro de si. correto chamá-los de s i s t e m a da f a l a i n t e r n a Nesse caso, é sumamente importante leou f a l a s i l e n c i o s a . A var em consideração as conseqüências psicoÉ curioso que o ser humano primitivo, nos lógicas essenciais que derivam desse fato. Seprimeiros estágios da civilização, tenha idenria fácil representar as coisas como se o refletificado o pensamento e a fala, em total conxo cortado nas duas terceiras partes se distincordância com os dados científicos, definindo guisse do reflexo completo apenas quantitatio pensamento como "conversa com nosso abvamente, por não ter sido levado até o final. dome" ou, de acordo com a Biblia, "conversa No entanto, ao mesmo tempo também se mocom nosso coração"." O pensamento é uma condifica de forma radical a natureza psicológiversa escondida em algum órgão interno, nãoca e, junto com ela, seu propósito biológico e social. acabada e que não se dirige a ninguém exceto à própria pessoa pensante; essa é uma definiEmbora seja verdade que todo pensamenção que poderia ser aceita tanto por um hoto é fala, também é certo que a fala interna é mem [selvagem] quanto por um cientista modiferente da externa por sua própria natureza derno. A isso se referia Sechenov quando defipsicológica. Essa diferença pode ser reduzida niu o pensamento como as duas primeiras tera dois pontos fundamentais: o primeiro conças partes do reflexo psíquico ou como um resiste no fato de que, em todo reflexo, temos flexo cortado em dois terços; ele estava penuma espécie de três pontos de sustentação nos sando em um reflexo não-acabado, inibido em quais o arco reflexo se apóia e nos quais ocorsua parte externa. re a descarga intensiva e o gasto de energia A observação mais simples e cotidiana nervosa. Em geral, essa descarga é iniciada em mostra que isso realmente acontece. Quando qualquer órgão periférico, devido a um impulnos esforçamos para lembrar uma determinaso ou estímulo externo, um raio de luz, uma da melodia, perceberemos que a estamos canrajada de ar, etc. Depois ela é elaborada no sistema nervoso central e no efetor periférico tando para nós mesmos. Quando nos concende resposta. tramos para recordar as palavras de uma certa SRQPONMLKJIHGFEDCBA i , iSRQPONMLKJIHGFEDCBA 166 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I I!! I Ao mesmo tempo, os psicológicos puderam estabelecer que o gasto de energia no ponto central do sistema nervoso e no órgão executor está em uma relação inversa. Quanto mais intenso e grande for o gasto de energia central, mais fraca e menor será sua manifestação externa e vice-versa: quanto mais intenso for o efeito externo da reação, mais débil será o componente central. O organismo parece dispor de um fundo de energia nervosa. Aparentemente, cada reação se realiza nos limites r' de um orçamento energético determinado. E qualquer intensificação ernaior complexidade I' do componente central é pago com o correspondente enfraquecimento do movimento de resposta do órgão efetor. O professor K. N. Kornilov denominou tal princípio de "princípio de gasto uni polar de energia", e ele foi formulado com base em experimentos precisos com diferentes tipos de reação." A essência do experimento do professor Kornilov consiste em que se meça a quantidade de energia gasta durante a reação enquanto o ato mental vai se tornando gradualmente mais complexo. Propõe-se que o sujeito do teste reaja a uma campainha pressionando um determinado botão. Depois, pede-se que ele não reaja antes de reconhecer uma campainha que lhe foi mostrada antes do início do experimento. Posteriormente, se pede que ele reaja a uma campainha com a mão direita e à outra com a mão esquerda.' Em outras palavras, entre os componentes da percepção da excitação e o movimento de resposta do órgão efetor, é introduzido na reação um processo mental de reconhecimento, de diferenciação ou de escolha que, como já tinha sido demonstrado pelas pesquisas de Wundt, se exprime pela crescente duração da reação ou, como foi demonstrado pelas últimas pesquisas, pela queda de sua intensidade. Em outros termos, se só devemos realizar um movimento depois de termos compreendido bem o sinal ou escolher entre este ou aquele sinal, nosso movimento fica mais fraco e menos enérgico do que quando temos de reagir diretamente depois do sinal. Por outro lado, a pesquisa demonstrou II , ,zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA que essa diminuição do gasto de energia periférica está em uma relação matemática direta I I 11 '111' :tI com a quantidade total de energia que pode ser consumida durante uma reação e, portanto, pode servir para medir a energia gasta durante um determinado processo mental. Se admitirmos que, durante a reação a um sinal simples, o sujeito gasta A unidades de energia e, durante a reação de escolha entre dois sinais, gasta uma quantidade B, teremos então A-BZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A Essa será a medida da energia psíquica que o ato de escolha entre dois sinais consurruu nesse caso. As mais simples observações também demonstram que é difícil combinar algum trabalho físico intenso com operações mentais complexas; não é possível resolver problemas complicados enquanto corremos rapidamente pela sala. Não é possível se concentrar e pensar e, ao mesmo tempo, cortar lenha. Cada membro provoca uma espécie de espasmo, de entumescência e, por sua própria natureza, paralisa e detém o movimento. Por isso, uma pessoa meditativa sempre tem o aspecto de ter se detido; e, se algo nos surpreende intensamente, com certeza detemos nosso movimento. Portanto, fica estabelecido que, ainda que o pensar seja movimento, também - e por mais estranho que possa parecer -, é detenção do movimento, isto é, uma forma do movimento em que a maior complexidade dos componentes centrais da reação enfraquece e tende a anular todas as manifestações externas. Daí os psicólogos extraem, entre outras coisas, uma conclusão extraordinariamente importante para a pedagogia: a combinação entre o trabalho físico e o mental, que é considerada o fundamento da pedagogia do trabalho, não deve ser entendida de forma alguma como uma síntese simultânea de ambos. Cavar um buraco em uma horta e escutar simultaneamente uma aula de botânica, lixar uma tábua na oficina de carpintaria e, ao mesmo tempo, estudar a lei da composição e decomposição das forças equivale - como o professor K. N. Kornilov já demonstrou - a cavar maio buraco e a assimilar erroneamente a botânica, a P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 167 duzir uma mudança nos elementos do meio. A tergiversar a lei do paralelo gramo de forças e reação que não se manifesta até o final, resoltambém a estragar a tábua. Do ponto de vista vida dentro do próprio organismo, naturalmenpsicológico, a combinação entre teoria e prátite não pode desempenhar essa missão: ou se ca na educação deve implicar apenas a altertorna biologicamente desnecessária e, junto nância planejada e de acordo com o objetivo com os dejetos psíquicos, vai se atrofiando e dos diversos tipos de trabalho, que efetue de destruindo no processo de desenvolvimento, forma harmônica o gasto rítmico de energia ou deve obter um significado totalmente novo em ambos os pólos de nosso organismo. e um novo sentido. Por isso, graças ao ato de Justamente por denotar a forma superior que essa reação se resolve completamente dende atividade orgânica e de vida, o ritmo repretro do organismo, adquire o significado e o senta uma espécie de alternância de movimenpapel de excitante interno de nossas novas reto e repouso e, por isso, garante a perfeição e ações.A É como se o sistema de nossos pensaa continuidade do movimento. Do ponto de vista psicológico, o ritmo' não passa da mais mentos organizasse previamente nosso comperfeita forma de síntese entre movimento e portamento e, se primeiro se pensa e depois se repouso. Por esse motivo, o inigualável e asage, isso não implica outra coisa que essa dusombroso trabalho dos incansáveis músculos plicação e maior complexidade do comportade nosso coração só é possível graças ao carámento, quando a reação interna do pensamento primeiro prepara e adapta o organismo, e ter rítmico de suas batidas. Ele bate a vida indepois as reações externas efetuam o que foi teira sem cessar só porque bate por impulsos e descansa depois de cada batida. Assim, o prinestabelecido e disposto antecipadamente no cípio de certa atividade rítmica na educação pensamento. O pensamento age como o orgase transforma em algo psicologicamente nenizador prévio de nosso comportamento. cessário para a teoria e a prática da escola profissionalizante. COM PORTAM ENTO Se aplicado à explicação psicológica da atiC O N S C IE N T E E A V O N T A D E vidade de pensar, esse princípio do gasto unipolar de energia explica que a ruptura do reflexo em Superficialmente pode parecer que, com suas duas terças partes é compensada com o reo estabelecimento da natureza motora e refleforço e a maior complexidade de sua parte cenxa de nossos processos de pensamento, supri-ZYXWVUTSRQP tral, ou seja, com a elaboração à qual é submetim e - s e toda a diferença entre o tipo de comda, no sistema nervoso central, toda a excitação portamento racional ou consciente e o tipo reque vem de dentro. Isso significa que, graças à flexo ou instintivo. Surge, então, a idéia de que ruptura e à repressão do reflexo, isto é, graças à a psique e a conduta humanas estão submetiinterrupção da reação completa no pensamento, das, de acordo com essa concepção, a uma innossa reação ganha em flexibilidade, precisão e terpretação mecânica; que está sendo detercomplexidade de suas inter-relações com os eleminado um critério do organismo humano mentos do mundo e, ao mesmo tempo, nossa autômato que reage com determinadas ações ação pode ser realizada de formas infinitamente a certos estímulos do meio. Assim como Desmais elevadas e sutis. cartes? definiu os animais como mecanismos A outra diferença entre o pensamento e móveis e negou que eles tivessem alguma ania reação completa reside em que, no papel de mação ou psique, os psicólogos contemporâmovimento interno, essa reação perde o signineos tendem a compreender e interpretar o ser ficado de toda reação como um movimento dihumano do mesmo modo. Entretanto, a enorrigido para dentro e adquire o significado comme diferença entre a experiência humana e a pletamente novo de organizador interno de animal evidentemente refuta esse critério. nosso comportamento. Na verdade, uma palaQuando estabeleceu as peculiaridades do vra dita em voz alta, como qualquer movimentrabalho humano, Marx frisou a enorme difeto do organismo, sempre se dirige a algo que rença psicológica que distingue o trabalho do está fora de nós e sempre tende a criar ou pro-SRQPONMLKJIHGFEDCBA o rSRQPONMLKJIHGFEDCBA \ 168 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I ser humano do trabalho do animal. Na análise do comportamento racional ou consciente, o mais conveniente é partir de [do seguinte]: ! . forma total e exaustiva pelo papel interno que cabe aos nossos pensamentos. Muitas vezes nos deparamos com o fato de que a parte de resposta de qualquer uma das nossas reações pode se transformar em Uma aranha realiza operações que fazem lemestímulo de uma nova reação, como ocorre no brar as do tece dor, e uma abelha que constrói mecanismo em rede do instinto. Como resposas células de sua colméia deixaria mais de um ta à excitação por meio da carne, um cão semestre-de-obras envergonhado. Mas o que creta saliva e, sob a influência de um novo esdistingue vantajosamente o pior mestre-deobras da melhor abelha é que a primeira motímulo surgido ao mesmo tempo, ou secreta delou a célula em sua mente antes de consou engole saliva, de modo que a parte de restruí-Ia na cera. No final do processo de trabaposta de um reflexo - a secreção de saliva - se lho , obtém-se um resultado que, antes do iní-A transforma em estímulo do seguinte. , cio do processo, existia idealmente, ou seja, Essa transferência dos reflexos de um sisna consciência do trabalhador. [K. Marx, O ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tema para o outro é justamente o mecanismo C a p i t a l , op. cit., p. 216.] básico com o qual funciona o que é chamado de nossa v o n t a d e c o n s c i e n t e . Um ato volitivo A construção do tecido ou da célula ainpressupõe inexoravelmente a existência préda pertence totalmente às formas do comporvia em nossa consciência de alguns desejos, tamento instintivo, isto é, da adaptação passivontades e tendências, vinculados à represenva do organismo ao meio, que não se distintação do fim último ao qual aspiramos e à regue de forma alguma do mecanismo que, do presentação dos atos e ações que devemos remesmo modo, digere o alimento no estômago alizar para alcançar nosso objetivo. Assim, a ou nos intestinos humanos. O comportamento dualidade se encontra na própria base do ato do ser humano realmente inclui um componenvolitivo, e essa dualidade se torna particularte novo e essencial, que é a presença prelimimente notória e evidente quando vários motinar na mente dos resultados do trabalho, como vos, várias tendências opostas, colidem em estímulo orientador de todas as reações. É fánossa consciência, e esta tem de escolher encil perceber que aqui se trata de certa duplicatre essas diversas tendências e motivos. ção de nossa experiência. Para a nossa observação, a luta entre esA construção humana se distingue da da ses motivos parece ser a prova mais convincenabelha só porque o ser humano constrói duas te e direta da existência do livre-arbítrio. O ser vezes: a primeira em seus pensamentos e dehumano nunca se sente tão livre para proceder pois nos fatos. Daqui deriva a ilusão de uma segundo seu arbítrio como quando se depara vontade livre e consciente. No ser humano com várias possibilidades e comportamentos siatuante surge a impressão de que seus atos posmultâneos, e ele, como se fosse por um ato livre suem um duplo caráter: primeiro deseja, deda vontade, opta entre eles. Mas nenhum dos pois faz. A ilusão acentua-se ainda mais pelo atos de nossa psique é tão adequado, quando fato de que o primeiro componente pode se fazemos uma análise objetiva, para descobrir a desligar do segundo e ser realizado indepenverdadeira determinação e falta de liberdade dentemente dele. Tem-se a impressão de que a com o ato de luta entre motivos. É sumamente vontade ou o desejo, o esforço volitivo livre, fácil compreender que, do ponto de vista objesão totalmente independentes e não estão sutivo, a presença de um motivo volitivo não pasbordinados ao movimento real. Posso querer sa de uma excitação interna que nos impulsiolevantar a mão e, ao mesmo tempo, ter consna para uma determinada ação. A colisão siciência de que ela está amarrada e, portanto, multânea entre vários motivos implica o surgique o movimento não pode ser realizado. Em mento de várias excitações internas que lutam todos esses casos estamos diante de uma ilupela via fundamental com a força espontânea são cuja natureza psicológica se esclarece de dos processos nervosos. Ao mesmo tempo, o P S IC O L O G IA desenlace da luta sempre está predeterminado, por um lado, pela força relativa das partes em combate e, por outro, pelas condições da luta, criadas a partir do equilíbrio geral de todas as forças dentro do organismo. A antiga história filosófica sobre o asno de Buridan,"? que morreu de fome entre duas pilhas de feno só porque não pôde decidir entre as duas, tem um profundo significado psicológico. Na verdade, esse caso é totalmente impossível, pois é difícil ocorrer na realidade um equilíbrio total entre duas excitações. Além disso, a experiência prévia do asno exerceria uma influência decisiva, pois ele está habituado a encontrar seu alimento do lado direito ou do esquerdo. Mas, teoricamente, essa história exprime a idéia psicológica correta de que, diante de um pleno e ideal equilíbrio de todos os motivos, orientados em direções opostas, obtemos uma total inação da vontade, e, nesse caso, o mecanismo psíquico funcionará segundo todas as leis da mecânica exata que deixam em repouso o corpo que se encontra sob a ação de suas forças iguais com sentidos opostos. Conseqüentemente, o ato volitivo pleno deve ser entendido como o sistema de comportamento que surge graças às pulsões instintivas e emocionais do organismo, e está totalmente predeterminado por elas. Na verdade, o aparecimento dos desejos na consciência sempre é causado por certa mudança no organismo. O que costumamos chamar de desejos sem motivo só o são porque sua causa está oculta para nós ou escondida na esfera inconsciente. Além disso, essa tendência em geral se refrata em processos mentais complexos: tenta dominar nossos pensamentos porque o pensamento é o acesso ao comportamento, e quem domina os acessos também se apodera da fortaleza. Portanto, o pensamento é uma espécie de mecanismo transmissor entre os desejos e o comportamento, e ele guia o comportamento em função dos motivos e impulsos que provêm das bases profundas de nossa psique. Por esse motivo, para a psicologia, a plena determinação de nossa vontade é a premissa completamente fundamentada e principal para uma análise científica de seus processos. Os fenômenos sem mo-A 169 P E D A G Ó G IC A SRQPONMLKJIHGFED tivo e indeterminados não podem ser objeto de um estudo científico nem de afirmações científicas. A P S IC O L O G IA D A L IN G U A G E M A forma mais fácil e simples de esclarecer os mecanismos do processo do pensamento e da vontade, antes descritos, é o exemplo particular da linguagem, que constitui o elemento básico realizado por nosso pensamento como sistema de organização interna da experiência. Do ponto de vista da psicologia, a linguagem individual e racional passa por três etapas diferentes de desenvolvimento. Originariamente, a linguagem surge do grito reflexo que é completamente inseparável dos outros sinais emocionais e instintivos do comportamento. É simples demonstrar que, nos estados altamente emocionais - o medo, a ira, etc. -, a linguagem é uma espécie de parte do comportamento biológico geral de movimentos adaptativos, que de forma particular desempenha a função de expressão, por um lado, e de coordenação do comportamento, por outro. O grito expressivo está diretamente ligado à respiração expressiva, isto é, gritamos tal como respiramos. Entretanto, mesmo nas etapas mais precoces do desenvolvimento, o grito não se limitava a isso. No comportamento gregário do animal, era o meio de pedir ajuda, o sinal do chefe ao rebanho, etc. Nessa etapa do grito reflexo, aparece de forma primitiva a voz humana. A criança recém-nascida grita porque a rajada de ar agita suas cordas vocais. Nos primeiros dias de vida fica determinado e formado o caráter reflexo do grito infantil. É provável que a linguagem dos animais inferiores fique estagnada nessa etapa. Mas nos primeiros meses de vida surge outra etapa da linguagem, que se estrutura segundo todas as leis da educação do reflexo condicionado. A criança percebe seu próprio grito e, depois dele, percebe uma série de estímulos, como a proximidade da mãe, a amamentação, a troca de fraldas, etc. Graças à freqüente coincidência desses fatos, forma-se na 170 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA criança um novo vínculo condicionado, e ela começa a exigir a presença da mãe com um grito reproduzido especialmente para isso. Aqui aparece pela primeira vez a linguagem como tal, em seu significado psicológico, como vínculo entre uma determinada ação do organismo e o significado que depende dela. O grito da criança já possui um significado porque exprime algo compreensível para a própria criança e para sua mãe. No entanto, nessa etapa a linguagem ainda é sumamente limitada. Só é compreensível para quem fala, isto é,- está totalmente determinada e limitada por esse vínculo condicionado que existe na experiência individual do ser humano. Essa é a linguagem dos animais. Sabe-se que os animais aprendem a compreender o significado das palavras e relacionam determinados sons às próprias ações ou às alheias; por exemplo, deitar-se, levantar-se, fazer algo de acordo com a voz do dono. 11 Essa linguagem, porém, se distingue da humana pelo fato de que, para a elaboração da comI' preensão de seu significado, em cada oportu:I Ill . nidade ela deve passar pela experiência individual do animal, graças a esse vínculo condicionado que deve surgir entre o som e a ação. Em outros termos, a compreensão dessa linguagem limita-se apenas àquele cuja consciên" I',SRQPONMLKJIHGFEDCBA cia individual dela participa. A psicolingüística demonstrou que todas as linguagens-existentes também passaram por essa etapa e que todas as palavras que surgem na linguagem são criadas dessa maneira. É muito fácil observar que, na linguagem moderna, existem palavras de dois tipos. Algumas palavras ligam, de forma totalmente evidente para nós, certos sons a um determinado significado, enquanto outras, pelo contrário, realizam essa ligação de maneira totalmente incompreensível. Se tomarmos palavras como laranjeira e castanheira [árvores] e alaranjado e castanho [cores], é fácil ver que, no primeiro grupo, para nós é totalmente incompreensível que o som "laranjeira" denota justamente uma laranjeira; podemos imaginar facilmente que, em certas condições, poderíamos designar com a palavra "laranjeira" um castanheiro, e viceversa. Por outro lado, quando dizemos "alaranjado" e "castanho", não ouvimos apenas os sons : 1i e não compreendemos apenas seu significado, mas [também] entendemos a causa pela qual esses sons designam justamente essas cores. Para nós, seria absurdo chamar de "castanho" uma cor alaranjada e chamar de "alaranjado" uma castanheira, porque "alaranjado" significa parecido com a cor da laranja, e "castanho" designa a cor da fruta da castanheira. Conseqüentemente, os psicolingüistas diferenciam três elementos na palavra: o som, o significado e a imagem, entendendo por "imagem" o vínculo que existe entre o som e o significado, isto é, uma espécie de esclarecimento de por que uma determinada palavra está relacionada a um determinado som. Na linguagem, as palavras se diferenciam pela presença ou pela ausência desse terceiro elemento. Ao mesmo tempo, as pesquisas etimológicas têm demonstrado que, embora uma palavra tenha perdido sua imagem, em seu significado anterior ela existiu e que, portanto, nenhuma palavra surge casualmente; em nenhuma parte o vínculo entre o sentido e o som é arbitrário e sempre radica nessa proximidade de dois fenômenos semelhantes, que pode ser percebida facilmente na origem de palavras como "celeste'?" e "castanho". Uma palavra nova, nesse caso, designa o vínculo que há entre determinados objetos, e esse vínculo, determinado pela experiência, sempre está presente na origem de cada palavra. Em outros termos, qualquer palavra, no momento de seu aparecimento, possui uma imagem, ou seja, uma motivação de seu sentido, evidente e compreensível para todos. Além de significar, a palavra também indica por que significa. Pouco a pouco, no processo de crescimento e desenvolvimento da linguagem, a imagem vai se extinguindo, e a palavra conserva apenas o significado e o som. Isso quer dizer que a diferença entre as palavras de ambas as espécies se reduz à crescente diferença entre as palavras: as mais jovens possuem imagens; nas mais velhas, quase se apagaram, mas, se forem examinadas com atenção, suas imagens podem ser descobertas facilmente. As palavras profundamente antigas só revelam sua imagem depois de cuidadosas escavações históricas dos significados e das formas que as originaram. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 171 Mas o mais curioso para a psicologia da Para demonstrar como ocorre esse prolinguagem é o fato de que a linguagem realicesso de extinção, devemos mostrar de que za duas funções totalmente diferentes: por um maneira a palavra passa da etapa inicial da linlado, serve como meio de coordenação social guagem, apta apenas para seus criadores, para da experiência das pessoas; por outro, é o inslinguagem nacional de uma determinada potrumento mais importante de nosso pensapulação. A extinção da imagem ocorre porque a palavra é utilizada em vínculos muito mais mento. Sempre pensamos em alguma linguagem, amplos que os iniciais. Se tomarmos termos isto é, conversamos conosco mesmos e organicomo "tinta" [chiemila] e "bonde movido a zamos nosso comportamento interno da mesma cavalos", é fácil perceber a imagem que lhes maneira que organizamos nosso comportamenserve de base. No entanto, atualmente falamos to de acordo com o comportamento das outras sem constrangimento [ ... ] de tintas vermelhas, pessoas. Em outros termos, o processo de pensaazuis ou verdes, ou de bondes a vapor, ainda que, do ponto de vista etimológico, essas commento evidencia facilmente seu caráter social e binações não sejam possíveis. A pessoa que indica que nossa personalidade está organizada chamou o líquido que serve para escrever de conforme o mesmo modelo que as relações sotinta observou apenas uma característica desciais e que a noção primitiva sobre a psique como se objeto, em sua cor preta [chiomi] e, busum duplo que vive dentro do ser humano é a cando a afinidade do novo fenômeno com uma mais próxima dos nossos conceitos. característica antes conhecida, batizou o objeAs teorias psicológicas tradicionais conto com o nome desse todo. Esse atributo, posideram um enigma indecifrável a compreensão da psique alheia, pois toda vivência psírém, não era o essencial, o principal, o único no objeto, como quase sempre acontece. Era quica é inacessível à percepção de outra pesfortuito e desapareceu entre a enorme quantisoa e só é revelada através da introspecção. Só dade de outras características que, em seu consinto minha própria alegria; de que forma posjunto, serviram para elaborar o conceito geral so sentir a alegria de outra pessoa? Ao mesmo sobre as tintas. Quando "tinta" designava extempo, todas as teorias psicológicas, por mais clusivamente algo preto, esse era o vínculo que diferentes que sejam, sempre colocavam na tinha se estabelecido na experiência individual base da solução do problema que [só] podede apenas uma pessoa; em compensação, quanmos conhecer os outros à medida que nos codo essa designação começou a ser incluída em nheçamos. Por acaso não interpretamos os grande número de outras experiências, os semovimentos alheios por analogia com os nosres humanos se esqueceram que a tinta desigsos, por acaso não realizamos o processo de na exclusivamente algo negro, e a palavra, de apropriação de sentimentos, isto é, suscitamos em nós mesmos emoções próprias com relavínculo condicionado pessoal, se transformou em um termo geral e social. Em outras palavras, ção a uma mímica alheia? Como os psicólogos afirmavam, sempre traduzimos a psique alheia o pensamento deslocou a imagem, diluiu-a em à linguagem da nossa e conhecemos os outros si mesma, e só pelo parentesco [ ... ] sonoro é através de nós mesmos. possível tomar conhecimento da origem da A rigor, do ponto de vista genético" do palavra. desenvolvimento da consciência infantil e do A partir daqui, é fácil perceber que todos ângulo da teoria psicológica sobre o ato os processos de compreensão, inclusive a comvolitivo, a afirmação contrária seria a mais preensão da linguagem, implicam um vínculo correta. Vimos que a própria compreensão ou psicológico. Entender francês implica poder estomada de consciência de nossos atos surge tabelecer o vínculo entre os sons percebidos e como vínculo entre as excitações internas e, os significados das palavras. E esse vínculo como qualquer vínculo de caráter condicionapode ser tanto de caráter individual, como do, emerge da experiência, no processo de coinocorre na linguagem dos animais, quanto de cidência de diversas excitações. Portanto, a caráter amplamente social, como acontece com criança aprende primeiro a, compreender os a linguagem dos seres humanos.SRQPONMLKJIHGFEDCBA 172 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA sitório ou uma doença mais prolongada. Como outros e só depois, segundo esse mesmo moas pesquisas têm demonstrado, as psicoses e as delo, aprende a se compreender. Seria mais neuroses representam formas dessas doenças correto dizer que nos conhecemos à medida que aparecem no terreno de um conflito interque conhecemos os outros" ou, ainda mais exano entre diferentes camadas da personalidade. tamente, que só nos conhecemos à medida que Ao mesmo tempo, o ego é o núcleo consciente e somos outro, algo estranho a nós mesmos. Por organizador do comportamento que designaisso, a linguagem, esse instrumento de comumos como "pensamento". O ego é a parte nicação social, também é um instrumento de pensante de nossa personalidade. Mas isso decomunicação íntima do homem consigo mesmo. Ao mesmo tempo, o caráter consciente de monstra a dependência do processo de pensamento com relação às tendências mais arraiganossos pensamentos e atos deve ser entendido das e básicas do organismo. como esse mesmo mecanismo de transferência de nossos reflexos para outros sistemas ou, Começamos a compreender que o procespara utilizar os termos da 'psicologia tradicioso de pensamento surge de uma base instintinal, como uma reação circularZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [ u m fe e d b a c k ] . va e emocional e é dirigido justamente pelas forças desta última. Talvez a determinação do caráter emocional e ativo do pensamento consE G O E O ID titua a conquista mais importante da psicologia das últimas décadas. Promove-se e enfatizaJá ficou muito para trás a época em que se com particular insistência o fato de que penos psicólogos podiam considerar a personalisar sempre implica um interesse extraordinádade humana como algo único e simples. Atualrio do organismo em algum fenômeno, que é mente, a análise psicológica vem revelando, inerente ao pensamento um caráter ativo e na estrutura de nossa personalidade, camadas volitivo, que em seu curso os pensamentos não tão completamente heterogêneas, que não perestão subordinados às leis mecânicas da assomitem mais que ela seja concebida sob a forciação nem às leis lógicas da certeza, mas às ma de uma entidade única; podemos ter uma leis psicológicas da emoção. noção mais próxima do que ela realmente é Nesse sentido, o pensamento sempre deve quando tentamos representá-Ia sob a forma de ser entendido como um problema peculiar que colisão dialética entre as mais diversas tendêno comportamento resolveu de novo em novas cias e forças. circunstâncias. O pensamento sempre surge Até mesmo a linguagem popular estabelecom a dificuldade. Sempre que tudo flui facilce facilmente uma distinção entre o que "eu demente, sem qualquer obstáculo, o pensamensejo" [ I á jo c h u ] ou faço e o que é "desejado por to não surge. Ele surge onde a conduta se demim" [ m n ie jo c h ie ts ia ] , marcando assim uma para com um obstáculo. A dificuldade, como espécie de diferença entre os dois eixos fundafonte básica do processo de pensamento, é que mentais de nossa personalidade, que a nova psidá pretexto para todas as análises psicológicas cologia chama de "ego" e A"id "." Ao mesmo temque estabelecem a subordinação de nosso penpo, manifesta-se com absoluta precisão o carásamento à tendência determinante, isto é, à ter dual de nosso pensamento, como uma pertarefa predeterminante que deve ser resolvida manente colisão entre o ego e o ido Freud diz nesse caso. Daí também os elementos de esque o ego é parecido com o cavaleiro, enquanto forço, busca, orientação e todos os demais reso id parece o cavalo." E, se o cavaleiro não quiquícios informes e caóticos da atividade adapser ser derrubado pelo cavalo, com freqüência tativa que emergem enquanto pensamos. deve conduzi-lo para onde este quiser. Da mesma maneira, nosso ego tem de seguir freqüentemente as inclinações que existem nas camaCONCLUSÕES P E D A G Ó G IC A S das mais profundas da personalidade, pois do A primeira e mais importante conclusão contrário surge um conflito substancial e grave pedagógica que se impõe graças a essa conque termina provocando algum distúrbio tran- o P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 173 cepção do processo do pensamento reside no te o hábito de pensar de forma independente, novo critério de que o fundamental na educatira da criança essa preocupação e elimina deção caracteriza-se por uma franca recusa do liberadamente da educação todos os momentos de elaboração complexa da experiência, ao ensino com ajudas visuais. A pedagogia do passado estava impregnada até a medula desexigir que tudo seja oferecido de forma fraciosa tendência para facilitar toda a educação, nada, mastigada e digerida. O imprescindível, tentando dela eliminar qualquer dificuldade e porém, é preocupar-se com criar a maior quantorná-Ia totalmente leve, simples e fácil. Tratidade possível de dificuldades na educação da tava-se de uma reação muito salutar contra as criança, como ponto de partida para seu pensamento.'? dificuldades desumanas que as crianças daquela época tinham de superar. O ambiente social e todo o comportamenMas, junto com a tendência social saudáto infantil devem ser organizados de tal mavel, penetrou nessa teoria uma parcela bastante neira que cada dia provoquem novas combiconsiderável de erro psicológico. A exigência nações, casos imprevistos do comportamento, do gráfico [visual] em todo o ensino, como expara os quais não haja hábitos e respostas prepressão suprema dessa pedagogia facilitadora, paradas no depósito da experiência da crianrevela melhor que nada todos os seus pontos ça, mas que lhe exijam em cada oportunidade fracos. O reino visual envolve acima de tudo a novas combinações de pensamentos. Pensar, eliminação de qualquer dificuldade de pensacomo podem ver, não significa outra coisa que mento para a criança. Exige que tudo o que a participação de toda a nossa experiência anseja oferecido à criança seja oferecido primeiterior na solução da tarefa presente, e a pecuro na experiência pessoal e, depois, de uma liaridade dessa forma de comportamento resiforma tão acessível, direta e fácil que não resde em aportar o elemento criativo, formando te nada que possa provocar dúvidas, nada a todas as combinações possíveis dos elementos ser inferido: apenas olhar e tocar. existentes na experiência prévia. Em essência, Sem dúvida essa exigência limita a expeisso constitui [o que chamamos de] "pensar". riência apenas aos vínculos pessoais, que não Esse fato [pensar] multiplica a ilimitada possisão suficientes nem mesmo na escola mais bem bilidade daquelas combinações que podem ser equipada e com excelentes condições externas. realizadas a partir das reações humanas e faz A experiência do ser humano sempre é mais com que o comportamento humano seja divervasta que sua experiência pessoal: sabemos so, e mesmo inesgotável, e complexo até chegar ao excepcional. muito mais do que vemos e, se alguém quisesse que soubéssemos apenas o que vemos, essa O trabalho criativo se distingue do trabapessoa limitaria e estreitaria enormemente a lho escravo pelo fato de que, neste, o momenesfera de nossa experiência. to de organização prévia da experiência e o Mas é mais importante considerar que momento da execução estão separados. O traessa tendência à facilitação contradiz basicabalho físico e o trabalho mental foram segremente os princípios educativos da psicologia. gados do processo geral e único do trabalho Seria como se, na higiene infantil, se exigisse porque, devido à necessidade social, foram dique não fossem criadas dificuldades para as vididos entre grupos sociais diferentes. Alguns crianças no que se refere à mastigação dos aliforam encarregados de uma metade, ou seja, mentos, dando-lhes tudo sob a forma de minda organização interna prévia da experiência, gau ou líquido. Para nós, em troca, é muito enquanto outros ficaram com a execução físimais relevante ensinar a criança a comer. O ca. Psicologicamente, o processo completo do trabalho pressupõe necessariamente o contrámesmo sucede com o ensino: é muito mais importante ensinar a criança a pensar que corio, ou seja, a união em cada ato de ambos os municar a ela determinados conhecimentos. elementos: o prévio e o executivo. Em compensação, o método visual, ao criar o Portanto, do ponto de vista pedagógico, caminho mais cômodo e fácil para a assimilao correto não é a tendência às representações [visuais e fáceis], mas precisamente a tendênção dos conhecimentos, paralisa cornpletamen-SRQPONMLKJIHGFEDCBA 174 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA cia contrária: que a criança se oriente sozinha nas circunstâncias mais complicadas e confusas. Se os senhores desejarem ensinar algo sólido para as crianças, preocupem-se com os obstáculos. Subentende-se, ao mesmo tempo, que não se trata de criar intencionalmente situações sem saída para a criança, que provocariam nela um gasto infrutífero e não-sistemático de energias. Trata-se apenas de uma organização da vida, e do ensino, importante para que a criança encontre os dois elementos necessários para o desenvolvimento do processo-de pensamento como forma superior do comportamento. Esses dois elementos consistem, em primeiro lugar, em uma tarefa que deva ser resolvida e, em segundo, nos elementos e meios com os quais esse problema possa ser resolvido. A solução da tarefa [do problema] em si mesma, que antes representava 90% de obrigação do professor, hoje é totalmente transferida para o esforço do aluno. Nesse sentido, o Plano Dalton" de ensino, que transfere do professor para o aluno a obrigação de encontrar e formular as leis científicas, que substitui a sala de aula por laboratórios, que reduz o papel do professor a zero sempre que ele puder ser substituído pelos livros, pelas ilustrações e outros materiais didáticos afins, e que destina ao professor apenas a função de organizador e controlador da experiência do próprio aluno, é, do ponto de vista psicológico, o que mais corresponde à natureza da educação do processo de pensar. Aqui o aluno recebe uma espécie de contrato, isto é, uma tarefa dividida e dosada quanto ao tempo. No laboratório recebe todos os materiais e recursos necessários para resolver essa tarefa, e sua missão é organizar de tal forma sua experiência e dividir e calcular seu tempo para que o contrato seja cumprido com sucesso e no prazo estabelecido. Esse plano ensina cada aluno a pensar de forma independente, por si mesmo, enquanto o sistema czarista de ensino depositava essa obrigação em apenas um professor durante todo o curso. Esse sistema de ensino coloca cada vez mais o aluno na situação do pesquisador que insiste em estabelecer uma verdade e que é apenas diri- gido pelo professor. Com isso, o processo de trabalho fica psicologicamente completo, pois ele pressupõe inevitavelmente uma etapa prévia de planejamento, enquanto a reação que ocorre mais tarde expressa-se de forma cabal nesse plano. Por fim, o último aspecto que distingue favoravelmente esse sistema de ensino do anterior reside no caráter puramente concreto da atividade de pensar que se adquire com esse sistema educativo. O pensamento totalmente abstrato é incompreensível para o aluno e, no sistema de educação czarista, gerava um mero e estéril verbalismo, ou seja, uma propensão ilimitada à formulação verbal, às definições verbais sem nenhum aprofundamento sobre a essência do tema e no qual o conhecimento das palavras substituía o conhecimento do fato. Sobre uma de suas heroínas, relata Nekrasov'? que, apesar de todas as habilidades que adquiriu através de sua educação, de repente sentiu que não possuía uma muito importante: a aptidão para pensar. Sabia fazer muitas coisas e até mesmo andava perfeitamente bem a cavalo, mas nunca teve de pensar, justamente porque em toda a sua vida nunca se deparara com dificuldades. É preciso dizer que, se na rotina da escola czarista, os alunos também aprenderam a pensar, isso sempre sucedeu à margem das intenções da escola, porque as dificuldades que esta apresentava sempre despertavam o pensamento em uma direção que não era a necessária para o andamento do processo pedagógico. . É sumamente importante que, no processo de elaboração do pensamento, esse vínculo geral, esse objetivo final que constitui a tendência determinante de todo o processo de pensamento, seja formado na consciência do aluno. Para que penso? Desde o início, essa pergunta deve ter uma resposta precisa e satisfatória. No entanto, todo o sistema de nossos manuais escolares estava estruturado na falta desse vínculo orientador, e o aluno, ao passar do particular ao particular, compreendia o nexo entre as diferentes partes do curso, assim como o cavalo entende o nexo entre cada puxada das rédeas e cada virada, mas o senti- J P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 175 pada", ignoro todas essas variantes particulado de todo o caminho, do seu ponto de partires e determino certo sentido neutro e geral da até sua meta - sentido do qual dependem desse objeto. as diferentes viradas - continuava tão secreto para ele quanto para o cavalo.SRQPONMLKJIHGFEDCBAA conclusão pedagógica natural que emana daqui é que, através da experiência dos alunos, deve passar a maior quantidade possível A A N Á L IS E E A S íN T E S E de objetos e fenômenos, que têm de servir para a elaboração do fato correspondente; ao mesA atividade analítica e sintética da menmo tempo, sua seleção deve levar em conta te costuma ser considerada uma forma lógica que a própria escolha dos objetos deve facilifundamental, na qual se realiza nosso pensatar e sugerir ao aluno o trabalho analítico e mento, isto é, uma atividade que, primeiro, sintético. Como exemplo elementar, podemos divide o mundo que se percebe em elementos mencionar o procedimento pedagógico de elaseparados e, depois, constrói com esses eleboração do conceito de forma e cor na crianmentos novas formações que ajudam e entença. Selecionamos objetos de diversas formas der melhor o circundante. Com relação a isso, geométricas, mas da mesma cor, depois proceé muito importante esclarecer o mecanismo demos da forma contrária e, como resultado, psíquico da formação de conceitos, ou seja, o atributo da cor e da forma, sobre o pano de das reações gerais e genéricas que não se refundo de um ambiente diferente, aparece parferem a um objeto individual, mas a uma clasticularmente preciso e claro, como se ele se se completa ou a um grupo inteiro de objetos separasse dos objetos que o contêm e, graças à de forma simultânea. Nesse sentido, cada resua freqüente repetição, começa a dominar na ação representa um acumulador de xperiênconsciência e a levá-Ia a uma espécie de exiscia sumamente concatenado e, na verdade, tência independente. Portanto, o trabalho anajá é uma teoria integral. Quando digo "lâmlítico é facilitado por um agrupamento do mapada", levando em conta toda uma série de terial no qual o atributo a ser isolado enconobjetos homogêneos, estou utilizando os retra-se nas mais diversas combinações. sultados de um enorme trabalho analítico efeDa forma inversa, um agrupamento de tuado anteriormente, isto é, o trabalho de dimaterial em que os elementos sujeitos a vinvidir todos os objetos de minha experiência culação encontram-se na conexão mais clara e em suas partes componentes, de assimilar ou mais precisa facilita o trabalho de síntese da de comparar os elementos similares, de rejeisoma das características e, o que é mais imtar os fortuitos, de sintetizar os restantes em portante, depura todos os nexos estranhos. Ao um conceito integral. mesmo tempo, é preciso levar em conta a prinNos primeiros tempos, essa atividade anacipal lei para o professor: a dependência inlítica parecia extraordinariamente enigmática versamente proporcional entre a extensão e o e complexa, até que se estabeleceu que trabaconteúdo do conceito. Chamamos de ZYXWVUTSRQPONMLK e x te n s ã o lho análogo sempre ocorre na linguagem, até a quantidade de objetos ou fenômenos que mesmo quando operamos com objetos singuabrange um determinado conceito. O c o n t e ú lares. Mesmo quando não falo de lâmpadas em d o é a quantidade de atributos pensados com geral, mas de uma lâmpada determinada, não relação a esse conceito. Quanto mais ampla estou operando, em essência, com a mera exfor a extensão de qualquer conceito, mais esperiência sensorial, mas com uma experiência treito será seu conteúdo, e vice-versa. sujeita a uma elaboração essencial. A rigor, em Portanto, o educador sempre deve perceminha experiência real houve diversas lâmpaber antecipadamente que, ao ampliar a extendas diferentes, isto é, a experiência sempre são de um conceito, estará restringindo seu variou. A lâmpada estava acesa, apagada, conteúdo, e vice-versa: ao incluir inúmeros rodeada de certos objetos, era vista de um ândetalhes e pormenores concretos no conteúgulo diferente, mas agora, quando digo "lârndo, estará reduzindo e limitando sua extensão. 176 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I Para exemplificar, tomamos os conceitos pulsão. Compreender como se deve agir corde homem e [homem de raça] negro e, assim, retamente não significa atuar corretamente. poderemos explicar facilmente o significado Entretanto, é evidente e indubitável para a dessa lei. Pela extensão do conceito, homem é psicologia atual que o saneamento de nossa mais amplo que negro, porém negro também conduta deve começar a partir de suas formas preliminares, isto é, o saneamento do comporé mais amplo pelo conteúdo, isto é, pela quantidade de atributos que abrange, porque todos tamento deve ser iniciado pelo saneamento dos os atributos do conceito homem também são pensamentos. Por esse motivo, na psicologia pedagógica do último período, foi promovida inerentes ao negro, mas nesse conceito também estão representadas características espea um primeiro plano, não tanto a orientação cíficas que não estão presentes no conceito de externa de nossos pensamentos, como a clarehomem, mas contribuem para lirnitá-lo, pois za de seu objetivo interno, essa função íntima ele se restringe devido à diferença genérica. que lhe cabe. Ensinar a pensar corretamente Um psicólogo denomjnou acertadamensobre o mundo significa se preocupar com que, te essa lei de "lei trágica do ensino". Na verdana experiência do aluno, sejam criados nexos de, aqui o professor se depara com extremos corretos entre os elementos do mundo e suas inconciliáveis. Qualquer ampliação de denoreações. Ensiná-lo a pensar corretamente sotação envolve, na mesma medida, uma redubre si mesmo equivale a estabelecer em sua experiência vínculos corretos entre seus penção de seu conteúdo e sentido. E todo enriquecimento do conteúdo restringe sua extensamentos e atos, ou seja, entre suas reações são. O achado da correlação correta entre ampreparatórias e as efetoras. bos representa, em cada oportunidade, um diOs psicólogos contemporâneos tendem fícil problema para o tato pedagógico, problea ver nesse caráter interno dos processos penma que não pode ser resolvido de forma geral santes sua diferença específica, que permite i zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA enquanto a pedagogia não se transforme em distinguir tais processos em uma classe espe" fI uma ciência exata. cial de reações que constituem uma forma !'t , completamente nova de comportamento. Desrr se ponto de vista, cabe diferenciar três tipos A IM P O R T  N C IA D O P E N S A M E N T O .' de reações no comportamento humano: (1) o P A R A A E D U C A Ç Ã O IN T E R IO R instinto (os reflexos condicionados, estereotipados, hereditários, os modos preparados de O estudo de todas as formas possíveis comportamento que formam a base de todas adotadas pelas variadas psicopatologias e pela as reações das duas classes superiores; (2) o deficiência mental tem demonstrado que o treinamento (reflexos condicionados ou esta'! 11 baixo nível de desenvolvimento geral sempre belecidos por meio da associação e da apreni' SRQPONMLKJIHGFEDCBA está combinado com um baixo desenvolvimendizagem, novos mecanismos consistentes na to da esfera intelectual. Em outros termos, a aquisição de experiência pessoal e estrutupatologia evidencia o mesmo vínculo entre o rados com base no instinto; (3)0 intelecto (o processo de pensamento e o aspecto interior processo do pensamento). da personalidade que a psicologia manifesta. A distinção essencial dessa terceira forPor isso, o professor deve levar em consima de comportamento reside no caráter deração que o pensamento não é apenas o merepentino da manifestação dessas reações. canismo que torna mais complexa e precisa Kôhler estabeleceu a presença de similares connossa interação com o mundo externo, mas que jeturas e soluções repentinas, isto é, de gerele também organiza o aspecto interno de nosmes de intelecto, no chimpanzé." Thorndike so comportamento. também considera que o súbito aparecimento Todos sabem até que ponto o pensamendessas reações e de sua fixação "de uma vez to é impotente na luta contra as pulsões emopor todas", distinguem-nas tanto da educação cionais e instintivas. Nenhum preceito moral habitual do reflexo condicionado, que requer pode nos obrigar a proceder contra nossa um prolongado treinamento e um reforço graI , I . ', " I I ~ P S IC O L O G IA dual, que essas novas qualidades indicam "algo mais" do que o treinamento corrente. ''A ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA d e s c o b e r ta - diz Bühler," no verdadeiro sentido da palavra, é justamente o trabalho biológico do intelecto". Ao mesmo tempo, ele define opensamento como "um comportamento racional em novas situações, sem ensaios sobre o próprio objeto". Este último aspecto, ou seja, a ausência de ensaios externos e sua substituição pela comprovação interna, é a distinção essencial 3. do processo do pensamento. A galinha que cisca no quintal, tentando 'penetrar em cada orifício até finalmente encontrar o adequado, não representa um exemplo de pensamento. No processo do pensamento, os ensaios se 4. transferem para o interior. Ele se caracteriza pela demora, pela interrupção dos movimentos externos - reflexão -, pela acentuação da tensão das correntes nervosas e pelo súbito aparecimento da solução, que geralmente é acompanhada da exclamação: ''Ah!''; por isso, Bühler chamou esse fenômeno de "vivência Ah!" ou "reação Ah!". Do ponto de vista físico-químico, conforme Lazarev, "no sistema nervoso podem ocorrer processos cujo ponto de partida inicial é a reação que surge originariamente nos centros cerebrais, o que cria um sentido de voluntarismo". Lazarev admite a existência de "centros autovoluntários de excitação no cérebro, condi5. cionados pelos processos radioativos dos sais de potássio". Aqui não nos encontramos diante de um reflexo condicionado, mas de uma reação de novo tipo "que nasce no cérebro como processo voluntário"." SRQPONMLKJIHGFEDCBA NOTAS 1. Em russo existem duas palavras que se referem ao que denominamos "pensamento": m i s h l e n i e e m i s l . A primeira delas se refere ao p r o c e s s o , ao comportamento, à atividade, à função, etc., de "pensar"; a segunda tem a ver com o r e s u l t a d o desse processo: o "pensamento" ou a "idéia". Estabelecemos tal diferença neste capítulo. 2. A obra mais lida de Vigotski é P e n s a m e n t o e lin g u a g e m , da qual atualmente existem três versões em espanhol: duas resumidas e uma completa - das editoras Fausto, Paidós e Visor, P E D A G Ó G IC A 177 respectivamente. Ainda que esse não seja o título correto da obra, nós o conservamos porque é um clássico já consolidado pela tradição. Na nota n Q 35 do Capo 13 esclarecemos qual seria a tradução correta do título para o espanhol. Para uma melhor compreensão dessa obra, sugerimos que se leia p r i m e i r o o artigo de Vigotski, "EI pensamiento", en: L. S. Vigotski L a G e n i a l i d a d y o t r o s t e x t o s i n é d i t o s , edição de G. Blanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998, p. 37-60. A escola psicológica de Wurzburgo tirou seu nome da cidade alemã onde trabalhava. Fundada por Oswald Külpe, seus membros realizaram os p r i m e i r o s e x p e r i m e n t o s sobre os processos do pensamento, usando apenas o método introspectivo. Fiodor Mijailovitch Dostoievski (1821-1881) foi, depois de Tolstoi, o mais importante romancista russo do século XIX. L. A. Radzijovski afirmou que Vigotski teria escrito um ensaio sobre Dostoievski, hoje perdido (comunicação pessoal, Moscou, 1988). Dobkin supôs que o interesse precoce de Vigotski pela psicologia poderia ter nascido de suas leituras dos romances psicológicos de Dostoievski. Durante a vida inteira, este foi um eslavófilo fanático. Em sua juventude foi revolucionário e foi condenado a quatro anos de trabalhos forçados em uma prisão da Sibéria. Mais tarde se transformou em um monárquico reacionário e religioso. Seus melhores romances são O s i r m ã o s K aram azove C r im e e c a s tig o . Não nos foi possível estabelecer a identidade desse pesquisador.A É provável que essa grafia seja errônea e, se ele não for russo, a dupla transliteração dificulta ainda mais sua busca. É provável que se trate de Th. Beer, porém Vigotski também pode estar se referindo a qualquer outro cientista. 6. Nesses dois casos é pouco provável que as aspas do texto original denotem citações literais. As referências bíblicas de Vigotski dificilmente podem ser encontradas, pois ele não indica livro, nem capítulo, nem versículo. Também existe o problema da traição das traduções. Sabemos que Vigotski leu a T a r a em hebraico, porém esta compreende apenas o Pentateuco, isto é, os primeiros cinco livros do Antigo Testamento, que constituem apenas a primeira de suas três partes. Vigotski pode ter lido o resto do Antigo Testamento e o Novo Testamento em uma tradução. Nós utilizamos a Bíblia de Jerusalém, que não foi traduzida do original; ela 178 7. 8. 9. 10. 11. L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA provém de uma tradução para o francês do original escrito em hebraico, aramaico e grego. Vale o que já foi dito para todas as referências à Bíblia no presente livro. Com relação a "pensar" como "conversar com nosso coração", não pudemos situar esse trecho, ainda que vários possam sugerir essa noção. Por exemplo, em "Provérbios", 24:32, lê-se o seguinte: "meditei em meu coração"; no "Livro da Sabedoria", 8:17 e 21, Salomão diz o seguinte: "Pensando isso comigo mesmo e considerando-o em meu coração [ ... ]"; etc. O primeiro teórico relevante da concepção de que a criança primeiro tem idéias, que depois pode expressar graças A à 'aquisição da linguagem, foi Santo Agostinho, em quem Jerry Fodor se baseou para rejeitar totalmente as idéias de Vigotski expostas na primeira edição norteamericana de ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P e n s a m e n t o e l i n g u a g e m , em uma resenha crítica implacável (J. Fodor, "Some Reflections on L. S. Vygotsky's T h o u g h t a n d L a n g u a g e " , C o g n i t i o n , 1972, nº 1, p. 83-95). Aqui, Vigotski faz referência à obra de K. N. Kornilov, U c h i e n i e o r i e a k t s i a j c h ie lo v ie k a C 'r i e a k t o l o g u i a " ) [ L i ç õ e s s o b r e as r e a ç õ e s d o hom em (" r e a c to lo g ia " )] , Moscou: GIZ, 1922, p. 122 e segs. René Descartes (1596-1650) foi um filósofo e matemático francês cujas idéias dualistas foram consideradas por Vigotski prejudiciais ao desenvolvimento da psicologia v e r s u s o monismo de Baruch Spinoza. Jean Buridan (1300-1358) foi um filósofo francês, um lógico que estudou as leis de validade da dedução. Em seus escritos não aparece o famoso dilema do asno, porém Buridan costumava comentá-Io, baseando-se em uma história análoga de Aristóteles. Provavelmente Vigotski tenha lido pela primeira vez a história desse dilema na É t i c a de Spinoza. Essas propostas não são precisas. Os animais são incapazes de compreender significados porque não têm consciência, porém associam determinados sons com ações. O leitor pode comprovar isso por meio de um experimento muito simples se tiver algum animal doméstico, como um cão. Se ele for elogiado com um tom de recriminação, o cão reagirá com a mesma atitude que adota quando recebe uma recriminação. Em troca, se receber todo tipo de insultos em um tom de elogio, ele ficará contente. Isso demonstra que o cão não compreende o significado daquilo que lhe é dito, mas reage à prosódia - à entoação - daquilo que se diz. Por outro lado - independentemente da prosódia -, se o cão tiver sido treinado para sentar quando ouve o termo "sit", devido à formação de um reflexo condicionado, ele se sentará quando ouvir essa ordem. No entanto, isso não prova que ele compreende o significado em um plano semântico - da palavra "sit", pois também poderia se sentar ao ouvir um assobio, se este tivesse sido o estímulo usado no condicionamento. 12. "Celeste" é um argentinismo para "azul claro" (etimologicamente: da cor do céu). Nos exemplos que demos, mudamos algumas cores e objetos mencionados no original russo, por causa de inevitáveis dificuldades de tradução ao espanhol. 13. Quando Vigotski usa o termo "genético" não se refere à herança ou à genética como disciplina, mas segue a tradição hegeliano-marxista de considerar um fenômeno em seu devir histórico-evolutivo. E s s e e s c la r e c im e n to é v á lid o p a r a a to ta lid a d e d o p r e s e n te liv r o . 14. Estamos persuadidos de que estas linhas e as seguintes são uma referência a Paul Natorp. Em uma nota de rodapé em seu artigo "A consciência como problema da psicologia do comportamento", Vigotski escreveu: "Não existe compreensão do próprio eu [compreensão de si mesmo] que não tenha como base a compreensão dos outros. [ ... ] Até quando estamos sós, quando pensamos silenciosamente sobre nós mesmos, usamos palavras da linguagem e pelo menos mantemos a ficção de estar nos comunicando" (P. Natorp, Sozialpiiâagoguik: [A P e d a g o g i a S o c i a l ] , 1899 [Paderbom: Schõning, 1974, p. 95]). E acrescentou: "Em nossa opinião, a consciência é de fato a 'ficção da comunicação"'. Sobre Natorp, cf. também a nota nº 25 do Capo 12. No entanto, Vigotski também poderia estar se referindo a I. I. Lapshin, P r o b l i e m a chuzogo " Ia " n o v ie is h e i f i l o s o f i [O p r o b l e m a d o " E u " d e o u t r o n a filo s o f i a a t u a l ] , São Petersburgo, 1910; ou a um capítulo de Th. Lipps, "Das Wissen vom fremdem Ichen" [O conhecimento dos "Eu" alheios], de uma recopilação de 1907. Estes últimos textos ta m b é m e s t ã o c i t a d o s em o u t r a n o t a d o c i t a d o a r t i g o d e V i g o t s k i , escrito em 1925. Embora esse artigo de Vigotski esteja incluído no tomo I de suas Obras ... , op. cit., nessa edi~ão não figuram estas nem outras notas originais, confirmando-se assim o que afirmamos no prefácio sobre as alterações das diferentes edições dos textos de Vigotski. (A omissão das notas já está P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 179 na edição russa da Editora Pedagóguika de mirada vigotskiana a Ias relaciones entre Ia alfabetización, Ia escuela, Ia mente y Ia 1982, da qual foi traduzida a presente versão). conducta", P r o p u e s t a E d u c a t i v a (FLACSO), ns Utilizamos a primeira edição do artigo ["Soznanie kak probliema psijologuia poviedie11 (1994), p. 39-42. nia"], publicado em K. N. Kornilov [ed.], Psijo18. O Plano Dalton foi uma técnica de ensino méloguia i marksizm [Psicologia e Marxismo], dio baseada na aprendizagem individual, criada por Helen Parkhurst, em 1919. A partir de Leningrado: GIZ, 1925, p. 175-198. 1920, ele passou a ser aplicado na cidade de 15. Como podemos ve~ essas duas propostas lingüísDalton, Massachussetts, EUA. Foi adotado em ticas significam o mesmo em russo, porém sua vários países, inclusive na URSS. Criticado por distinção é que a primeira é pessoal e a segunda é impessoal. Segundo R. Silverman, Vigotski poseu caráter individualista, finalmente foi abandonado em todas partes. deria ter visto a diferença entre o ego e o id nessa diferença gramatical (cf. L. S. Vygotsky,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 19. Nikolai Alekseievitch Nekrasov (1821-1878) E d u c a t i o n a l P s y c h o l o g y , op. cit., p. 180). foi o máximo representante da "escola realis16. Referências à edição rússa - I a i o n ó - do livro ta", que incorporou problemas sociais e políde S. Freud, D a s I c h u n d d a s E s [O E g o e o I d ] . ticos à poesia russa. Foi considerado um poeSigmund Freud (Moravia, 1856-1939, Inglata do calibre de seus antecessores, Pushkin e terra) foi o psiquiatra criador da psicanálise. Lermontov. 20. Vigotski refere-se aos experimentos de resoluTeve se exilar pela perseguição que sofreu dução de problemas que Wolfgang Kôhler realirante o nazismo. Freud teve a sorte de nunca ter sabido que quatro irmãs suas, que permazou em um laboratório alemão de primatas, situado nas Ilhas Canárias, durante a Primeira neceram no continente, morreram em campos Guerra Mundial (cf. W. Kôhler, I n t e l l i g e n z p r ü de concentração nazistas: Adolfine morreu de inanição em Theresienstadt; e as outras, no fu n g e n a n M e n s c h n a ffe n , Berlim: Springer, campo de extermínio de Auschwitz, em 1942. 1921, 2.ed. Vigotski leu esse livro em alemão e foi o responsável por sua publicação em rusComo se vê, Vigotski adotou várias de suas teorias ao início de sua formação em psicologia. so vários anos mais tarde, em 1930, pela EdiNos arquivos de sua filha Guita, pudemos ver tora da Academia Comunista; foi o editor e fotos em que Vigotski aparece com sua amiga também escreveu o prólogo da obra, cujo título em russo é: I s l i e d o v a n i e i n t i e l i e k t a c h i e l o v i e Vera Schmidt e outros psicanalistas. De fato, Vigotski teve uma participação ativa na Sociek o p o d o v n i o b i e z i a n . Vigotski e Luria examinaram criticamente essas experiências de Kõhler dade Psicanalítica Russa, da qual foi membro até 1927 (cf. a lista de membros da I n t e r n a t i o em: E t i u d i pó i s t o r i p o v i e d i e n i a . O b ie z ia n a . P r i m i t i v o R e i b i o n o k [ E S t u d o s s o b r e a h i s t ó r i a do n a le Z e its c h r ift fo r P s y c h o a n a ly s e ), embora já c o m p o r ta m e n to : o m a c a c o ) o p r im itiv o e a c r itivesse tomado alguma distância das idéias a n ç a . Porto Alegre: Artes Médicas (Artmed), freudianas (cf. seu capítulo sobre a psicanálise 1996], Moscou: GIZ, 1930. Por outro lado, em P s i c o l o g i a d a a r t e , cito no Capo 13). Em uma Pavlov r e p l i c o u as já clássicas experiências de primeira etapa crítica, Vigotski não questionou Kõhler em seu laboratório de Koltushi, em Le- pelo contrário - os problemas levantados por ningrado, e discrepou em relação às concluFreud, mas a resposta que este tinha lhes dado. sões de Kôhler (cf. E. G. Vatsuro, L a d o c t r i n a Posteriormente, Freud deixou de ser uma refede P a v l o v s o b r e I a a c t i v i d a d n e r v i o s a s u p e r i o r ) rência importante em sua obra, pois a evolutrad. de J. Laín Entralgo, Barcelona: Vergara, ção de seu pensamento o levou a uma concep1959, Capo 12). O prólogo escrito porVigotski ção da psique muito diferente da de Freud. para o livro de Kõhler está incluído no tomo I 17. Essas afirmações de Vigotski são plenamente de suas O b r a s ... , op. cit., p. 177-205. válidas para fundamentar, nas discussões de Wolfgang Kôhler (Alemanha, 1887-1967, EUA) hoje em dia, as razões pelas quais a substituifoi um dos fundadores da Psicologia da G e s t a l t ção da cultura escrita pela audiovisual em gee emigrou para os Estados Unidos depois que ral é prejudicial. Particularmente na educação, os nazistas tomaram o poder na Alemanha (cf. em nossa opinião, a cultura escrita deve ser a L. S. Vigotski, "EI Fascismo y Ia Psicologia", em: base da mesma, e o material visual deve ser 1.S. Vigotski, E I D e s a r r r o l l o C u l t u r a l d e i N i i i o y um complemento auxiliar, contra a tendência o tr o s te x to s in é d ito s , edição de G. Blanck, pós-moderna dominante nos dias de hoje. Cf. Buenos Aires: Almagesto, 1998, p. 105-123. G. Blanck, "Cultura y procesos cognitivos: Una SRQPONMLKJIHGFEDCBA 180 21. ,I ' L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Esse ensaio de Vigotski é muito útil para compreender o destino dos numerosos psicólogos que tiveram que escapar da Alemanha durante o Terceiro Reich de Hitler). Karl Bühler (1879-1963) foi um psiquiatra e psicólogo alemão. Foi professor em Viena desde 1922. Depois que os nazistas tomaram o poder, em 1933, foi preso porque sua esposa Charlotte, uma renomada psicóloga evolutiva,A era de origem judaica. Emigraram para os Estados Unidos. Ele morreu em Los Angeles, e ela regressou para a Alemanha. Karl Bühler pesquisou a psicologia da linguagem, a psicologia evolutiva e a epistemologia da psicologia. Cf. seu livro ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA D ie g e is tig e E n tw ic k lu n g des K i n d e s [O desenvolvimento psíquico das crianças], Jena: Fischer, 1918. 22. Cf. a nota ns 4 do Capo 2. o E s c la re c im e n to YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P s ic o ló g ic o d a E d u c a ç ã o p e lo T ra b a lh o PONMLKJIHGFEDCBA . i O S T IP O S D E E D U C A Ç Ã O pação do professor está orientada para tudo, a fazer a tarefa da melhor e mais caprichada forma possível. Enquanto os hábitos de trabalho são um fim em si mesmo na escola de ofícios, na escola ilustrativa eles só constituem um meio para assimilar melhor outras matérias. Tanto histórica quando psicologicamente, o trabalho é apresentado aqui como o triunfo supremo do método visual, como a última palavra da "pedagogia da facilitação", porque tornar evidente não significa apenas demonstrar através da visão, mas incorporar ao processo de percepção a maior quantidade possível de órgãos; aproximar a criança do tema não só por meio da visão, mas também através do tato e do movimento. O próprio sistema e os objetivos do ensino podem manter-se invariáveis, pois esse ensino a p e n a s pressupõe que se ensine através das mãos, e que é possível ensinar q u a l q u e r c o i s a . Por isso, nesse sistema o trabalho só desempenha o papel de ilustração, por ser o melhor meio de assimilar, compreender e recordar algo. Em outras palavras, seu papel é auxiliar, complementar e subordinado. Se alguém estuda história nessa escola, por exemplo, a tarefa do professor, como é comum, consiste em elaborar nos alunos um saber preciso e exato sobre os fatos, as situações e as leis da história. No entanto, para realizar essa tarefa de transmitir um saber exato, é útil que os alunos desenhem mapas, montem modelos de construções antigas, reproduzam a vestimenta e as armas que eram utiliza- P E L O T R A B A L H O wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA exceto para lhe ensinar No desenvolvimento histórico e nas possibilidades psicológicas existem três tipos fundamentais de educação pelo trabalho. O primeiro consiste na denominada escola profissionalizante manual ou de ofícios, na qual o trabalho se transforma em objeto do ensino, porque o objetivo da escola é preparar os educandos para um determinado tipo de trabalho. Criar técnicos, artesãos, transmitir-lhes os hábitos e o conhecimento técnico de seu ofício é a tarefa dessa educação. Com essa concepção, a educação profissionalizante não se distingue em nada de qualquer outra educação, porque a pedagogia, seja ela qual for, sempre tende a estabelecer um certo novo sistema de comportamento, seja qual for a forma pela qual esse sistema se expresse. Seja ela a escola escolástica, que preparava o futuro polemista, o jurista, o pregador, ou a escola de ofícios, que prepara o chaveiro ou o sapateiro; em todos os casos, as reações da futura atividade são o objetivo do ensino. A posição que o trabalho ocupa no sistema de instrução de uma escola ilustratíva' é bem diferente, pois o trabalho não representa o objetivo do ensino, figurando apenas como um novo método, ou seja, um meio para estudar outras disciplinas. Quando o trabalho é introduzido nesse tipo de escola, não se leva em consideração o valor independente dos procedimentos de trabalho. Quando a criança aprende a serrar ou colocar pregos, a preocu- 182 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I das. Deriva daí uma atividade laboral muito complicada para os alunos, porém a orientação da educação e sua tendência básica sempre estão à margem do trabalho. Por último, a terceira possibilidade da escola e da educação pelo trabalho reside em um critério totalmente novo do trabalho como a própria base do processo educativo. Nessa escola puramente voltada ao trabalho, o trabalho não se incorpora como tema de ensino nem como método ou meio de ensino, mas como matéria-prima da educação. De acordo com a feliz expressão de um pedagogo, não só se introduz o trabalho na escola, mas também a escola no trabalho. Essa última concepção da escola pelo trabalho é a que se encontra na base do sistema soviético de instrução e precisa, mais que todas as outras, de uma fundamentação psicológica. A insignificante importância formadora da escola pelo trabalho que segue o modelo da escola de ofícios é totalmente evidente para todos. Devemos levar em conta que o caráter artesanal do trabalho tem origem na organização corporativa da sociedade medieval, quando os processos de produção eram sumamente primitivos e quando a maior quantidade de habilidades não estava concentrada na ferramenta, mas nas mãos do artesão. A produção foi se especializando de forma incessante, passou a exigir um treinamento enorme e complexo e domínio técnico, fechouse no estreito círculo corporativo, com freqüência passava do pai ao filho e do sogro ao genro, como um tesouro familiar e hereditário; desse modo, adquiriu um caráter limitado e fechado. Como qualquer forma de trabalho, o ofício também acumulava certa experiência criativa e a habilidade de gerações, porém era uma experiência e uma habilidade estreita, ainda que a fineza e a delicadeza do trabalho chegassem a um nível de perfeição ainda não superado hoje em dia. Precisamente porque o artesão realizava cada objeto à mão, este adquiria uma índole totalmente individual e, naquela época, não existia nenhuma fronteira entre o artesanato e a arte. O artista era um artesão. O artesão também era um artista em seu tra- balho. Não criava mercadorias [objetos destinados ao mercado], mas obras cujo nível de perfeição individual deixava para trás qualquer produção mecânica em massa. Por isso, é compreensível que a importância educativa do trabalho artesanal seja totalmente insignificante. A quantidade de conhecimentos teóricos com os quais um artesão opera é sumamente pequena; o conjunto de materiais de que necessita para sua elaboração é mínimo. Seu vocabulário técnico, digamos, ou seja, a soma dos procedimentos e movimentos utilizados, com freqüência se esgota em várias dezenas de estereótipos. Nesse sentido, o trabalho artesanal representa um material pedagógico ingrato, que exige um enorme gasto de energia para elaborar a fineza e a exatidão dos movimentos laborais, para obter o nível de automatização mais elevado da mão humana, que a aproxima da perfeição do instrumento; ao mesmo tempo, porém, não dá nada em troca, nem envolve nenhum tipo de elementos de desenvolvimento ou amplamente instrutivos. Subentende-se que essa natureza psicológica da educação profissional concorda totalmente com o caráter social da escola de ofícios, que surge no estado burguês sob o influxo da necessidade de uma classe média-baixa de bons artesãos produtores, e que a essa escola seja atribuído estreito lugar que lhe convém, como escola complementar, no sistema de instrução geral. Também se compreende que as restantes exigências pedagógicas dessa escola estão completamente de acordo com o caráter estreito que a distingue. O ideólogo mais representativo dessa escola é Kerschensteiner;" que afirma com absoluta franqueza que o ideal da educação profissionalizante é a formação de cidadãos e artesãos probos, educados no devido respeito ao regime social, político e cultural existente. Portanto, essa educação implica uma preocupação muito maior pela ordem social estabelecida que pela personalidade do aluno. Nesse sentido, é muito mais amplo o segundo tipo de escola para o trabalho, a denominada ilustrativa [de protótipos, piloto, visual], mas também ela é psicologicamente errônea em uma série de pontos. O primeiro é IrA 11; liYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ---------~-- --------------------------------------------- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 183 a consideração de que a própria tendência à vimentos, à possibilidade de auto-avaliar-se com a ajuda dos evidentes resultados obtidos. intuição e à facilitação da instrução deve ser No entanto, apesar de tudo isso, aqui o tomada como uma etapa já percorrida na petrabalho continua desempenhando o papel de dagogia. Os princípios da educação pelo trac a lig r a fia d a c o n d u ta , isto é, igualmente inbalho respondem muito mais às necessidades da pedagogia que ao ensino visual. E é comfrutífero, um gasto desnecessário de forças, cuja esterilidade aumenta e parece ainda preensível que o método de trabalho, como a maior porque aqui o trabalho se destina apemais plena expressão desse ensino visual, contenha na forma mais extrema todos os vícios e nas a repetir e copiar lições já sabidas. O aluno se empenha em realizar o que já sabe bem, insuficiências desse princípio. Aqui aparece outra vez a extrema falta e a utilidade desse trabalho é evidente para o de correspondência entre os hábitos que faprofessor, mas permanece oculta para o próprio aluno. zem falta para uma formaparticular de trabalho e os que são necessários para a questão A escola profissionalizante de ofícios não particular para a qual esse trabalho está destipossui essa insuficiência. Na verdade, sua denado a servir de protótipo [ilustração]. Consficiência não é a mesma que atinge a escola ilustrativa. Na escola de ofícios, atribui-se ao truir um bom modelo ou uma eficiente ferramenta é uma tarefa que exige tanta atenção, trabalho o importante lugar que ele realmenhabilidade, trabalho do pensamento e das te ocupa na vida. Ao adquirir esses hábitos de trabalho, as crianças que cursam essa escola mãos, que durante sua realização a importânentram diretamente na vida do trabalho. M as, cia puramente histórica dos objetos elaborainfelizmente, essa escola cultiva formas de trados passa para um segundo plano; segundo a balho que pertencem mais ao passado que ao expressão de um pedagogo norte-americano, futuro, está orientada para trás e não para a os momentos laborais nessa escola se transformam em instantes de detenção e amortecifrente. E o que ela transmite aos alunos não tem um grande valor para a vida contempomento do processo educativo. O estudo da história parece se deter quando os alunos se derânea. O significado educativo do trabalho dicam ao trabalho ilustrativo [de construção artesanal é praticamente nulo, porque contém de modelos], e o próprio trabalho não adquire uma experiência tão restrita que não permite o caráter de um avanço, mas de uma repetição sair dos limites da mestria artesanal. Em nosestagnada, de fixação e estudo de resultados sa época, o trabalho artesanal já perdeu o sigjá obtidos, de uma corrida sem sentido. nificado de mestria artística que lhe era ineO trabalho com o modelo histórico não rente na Idade M édia, quando o título de mesfaz com que o aluno avance na história, mas o tre era dado tanto ao mestre da pintura quancoloca totalmente sob o domínio do que já foi to ao mestre dos móveis, e quando tanto o calpercorrido. Entretanto, mesmo nessas condiçado como os móveis e outros artigos possuíções, o trabalho obtém um significado psicolóam o selo da perfeição individual e, por sua gico mais amplo em comparação com a escola natureza interna, realmente pertenciam ao de ofícios. Deixa de ser rebaixado para o nível âmbito da indústria artística. Qualquer coisa de uma produção profissional e, portanto, não nascia de um projeto original, e o processo de faz recair tamanho peso sobre o aluno. Já não sua execução era determinado e orientado tamse fecha no estreito círculo de uma atividade PONMLKJIHGFEDCBA bém pelas exigências individuais de cristalizas ó , mas transfere as possibilidades do aluno ção desse projeto. de uma atividade para a outra. É um grande Esses tempos passaram há muito e, na mestre mobilizador que treina os movimentos indústria moderna, cabe ao trabalho artesanal e a destreza do aluno, ensinando-lhe a domio papel lamentável e carente de interesse de nar mãos, pernas e tronco. Assume o papel de servir de produção auxiliar que remenda os poderoso educador do comportamento geral furos da grande indústria. O artesanato foi acostumando os alunos ao autocontrole, à conservado porque o modo de vida medieval auto-regulação e ao planejamento de seus mo- -- -- ---------- YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA I wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ;1'YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 184 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I I' ,1\ 'I !I'; I; I, I \j t' ,J " 11 ,11 ! ainda não desapareceu definitivamente da cultura contemporânea. M as com cada nova máquina na fábrica, com cada novo aperfeiçoamento da técnica [tecnologia], a importância do trabalho artesanal vai se anulando cada vez mais e em todos os sentidos o trabalho artesanal está passando para o quintal da vida. A própria divisão do trabalho em ofícios concentra a atenção do trabalhador no último momento do trabalho - o da execução - e não em suas premissas gerais. Em outros termos, o trabalho artesanal não destaca os elementos comuns a cada produção, próprios de todos os tipos de trabalho humano, mas os elementos que distinguem esse trabalho de qualquer outro. Em contraposição ao estreito trabalho de ofícios, o trabalho industrial moderno se distingue pela politécnica, cujo valor psicológico e pedagógico impõe que seja reconhecido nela o método fundamental da educação pelo trabalho. A indústria contemporânea é politécnica pelas peculiaridades econômicas, tecnológicas e - o que é fundamentalpsicológicas do trabalho. As causas econômicas têm a ver com esses enormes refluxos e deslocamentos das massas de trabalhadores que acompanham inevitavelmente a produção capitalista. M arx destacou que o mecanismo econômico, com a ajuda das crises e das conseqüentes reduções e ampliações da produção, tornam necessária a existência de um exército de reserva de proletários [a existência de desempregados], e os proprietários lançam uma enorme massa de trabalhadores de um ramo de produção para o outro. O operário que trabalhava em uma fábrica de garrafas, amanhã se dedica à produção de calçados, depois de amanhã entra em uma fábrica de carros e, com essa passagem de um ramo da produção para o outro, lhe é exigido apenas um desenvolvimento técnico geral mínimo, isto é, a capacidade de operar máquinas; ninguém exige dele conhecimentos especiais e profissionais de nenhum tipo." Por isso, as próprias condições econômicas colocam o operário diante da exigência de ser politécnico, ou seja, em nenhum tipo de produção ele vai além de seus fundamentos gerais, ou sucumbirá na próxima crise. E isso é o que acontece. Nove décimas partes dos operários europeus e norte-americanos não estão ligadas a nenhum profissionalismo que as ataria a algum tipo determinado de produção. Relata-se o caso de uma grande greve nos Estados Unidos, em que um ramo da produção foi abandonado por todos os que trabalhavam nele. No entanto, dois dias mais tarde esse importantíssimo ramo reiniciou seu funcionamento, mantendo a produtividade anterior, com um pessoal totalmente novo. As causas técnicas que também levam à politécnica residem no progresso das máquinas, que nivela todas as diferenças dos diversos mecanismos e os conduz a tipos mais ou menos homogêneos de máquinas mais econômicas, vantajosas e baratas. As condições de concorrência são tais que as máquinas mais vantajosas devem ser inevitavelmente introduzidas em todos os ramos de produção de um determinado tipo, no prazo mais breve possível. Do contrário, os empresários correm o risco de ser deslocados e esmagados na luta comercial pelos mercados. De fato, nunca antes ocorreu uma marcha triunfal em que qualquer novo aperfeiçoamento ocorresse com a mesma rapidez das últimas décadas. Isso é o que define a própria supra-estrutura de toda forma de produção mecanizada, no sentido de suas partes fundamentais, e essas partes componentes tornaram-se muito similares nas mais diversas empresas. A parte principal de toda a produção são os motores, que são do mesmo tipo nas mais diversas fábricas. Depois vêm os mecanismos de transmissão, também de um mesmo tipo, e a diferenciação só aparece na parte executiva ou efetora da máquina, de acordo com a função das últimas operações que ela tem de realizar para lançar o produto terminado no mercado. Portanto, em suas duas terças partes, a produção contemporânea torna-se uniforme e só na última terça parte se admite certa variação que, à medida que a técnica se desenvolve, vai se nivelando cada vez mais. Isso ocorre porque todas as formas possíveis de movimentos laborais, à medida que se dividem em formas mais simples e elementares, podem se reduzir a 12 tipos fundamentais de movimentos P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 185 dice dela; geralmente ele desempenhava apeelementares que, em diferentes combinações nas uma operação, sumamente insignificane com diferente sucessão, efetuam todas as formas do trabalho complexo da indústria te, que não podia ser realizada pela máquina. mundial. Dessa forma, o gasto de energia física se reIsso não deve nos assombrar, assim como, duziu enormemente, e também o aspecto segundo a expressão de M ünsterberg, não deve mental do trabalho não exigia uma grande tensão do trabalhador. nos causar assombro que as 26 letras do alfaA ação embrutecedora desse trabalho beto inglês tenham sido suficientes para expode ser avaliada se recordarmos que, nas propressar todos os dramas de Shakespeare. A duções mais comuns, o produto passa por vápartir daí, pode-se compreender facilmente que rias dezenas de operações, e o operário tem de também a terça parte, a parte executiva da repetir durante décadas um mesmo movimenmáquina, em última instância se reduz a um to com uma exatidão totalmente mecânica. Por alfabeto técnico que é o mesmo para qualquer isso, têm razão aqueles que afirmam que o traprodução. E assim como ocorre com o autêntibalho pré-automatizado era, apesar de tudo, co alfabeto, basta assimilar o alfabeto técnico do ponto de vista psicológico, mais humano para ler qualquer "livro" escrito com esse sisque o trabalho com a máquina. tema. A É muito provável que estejamos vivendo Entretanto, com o desenvolvimento da técnica, a situação modificou-se radicalmena maior época da história no que se refere à evolução do trabalho e que perante nossos te. Na composição dual do trabalho começou olhos esteja morrendo o conceito de profissão. a predominar o momento de direção e organiPor último, o essencial são as premissas zação da produção, enquanto o momento exepsicológicas da politécnica, que consistem do cutivo foi se anulando paulatinamente. Cada vez mais, a força humana é substituída pela seguinte. Todo processo de trabalho humano máquina, e o trabalhador moderno assume o é duplo, porque o ser humano representa, por um lado, a fonte direta de energia física e, por papel de organizador e diretor da produção, outro, é o organizador do processo de trabade comandante da máquina, controlador e relho. Nas formas mais primitivas do trabalho, o gulador de suas ações. Na produção altamente aperfeiçoada, trabalhador desempenha um papel dual: como esse processo adquire tal magnitude que em parte de sua própria máquina, como origem geral recai no trabalhador não só a direção direta de energia física, papel no qual pode ser das máquinas de modo direto, mas a dos substituído pelo gado, por um motor a vapor, controladores mecânicos que, por sua vez, repor um motor elétrico, etc.; e no papel de dirigulam as máquinas. Portanto, nessas empregente e organizador de seus instrumentos e mosas, o trabalhador é o regulador dos regulavimentos, no qual não pode ser substituído por dores, isto é, dos executores das funções ninguém. organizativas superiores e mais complexas. A divisão do trabalho em mental e físico Todos os que conheceram as condições de traocorreu na época em que ambas as funções balho do foguista na Rússia certamente se aspsicológicas, indissoluvelmente unidas em um sombrariam se conhecessem o trabalho dos ato de trabalho único, foram distribuídas enprincipais foguistas nas mais importantes fátre diferentes membros da comunidade, devibricas norte-americanas e se ficassem sabendo à diferenciação social. Alguns assumiram do que esse trabalho é realizado com as mãos apenas as funções de organização e de comantotalmente limpas." Isso se explica pelo fato do, enquanto outros se ocupavam só das exede que o trabalho sujo de jogar carvão na forcutivas. nalha, descarregar os restos, eliminar as parA situação variou um pouco quando se tes queimadas, avivar as chamas, abrir as saíintroduziu a máquina e quando o papel do das para a fumaça, limpar a fuligem e outras trabalhador assumiu um ponto médio entre tarefas, são realizadas por máquinas automáambas as funções. Com a máquina, o operáticas, por mãos metálicas que dão conta de rio assumiu o papel de um lamentável apên- YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 186 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA seu trabalho e de seu estado através de várias dezenas de adaptadores mecânicos que estão. em um tabuleiro e que, a partir dele, são reguladas por meio de alavancas. O mesmo foguista que esquenta uma imensa fábrica e que, nesse sentido, desempenha as mesmas funções que o foguista do trem, desempenha o papel de comandante-em-chefe de um exército de máquinas, e sua mesa de trabalho parece o estado-maior de campo no qual se reúnem as informações de todas as unidades, anotam-se as exigências, enviam-se ordens, coordenam-se as ações; tudo isso é realizado através de adaptadõres muito complexos e exatos, para cuja direção são necessários uma grande capacidade mental, uma vista penetrante e conhecimentos técnicos. O desenvolvimento do trabalho aproxima-se cada vez mais dessas formas, e os resquícios de trabalho físico que subsistem nessas produções se reduzem cada vez mais a insignificantes movimentos de alavancas que fazem lembrar os ponteiros do relógio, a pressão de chaves elétricas, os pequenos movimentos rotatórios da manivela de um cilindro. Nessas condições o trabalho, como certo gasto de energia física, como trabalho forçado de execução, é realizado pela máquina, competindo cada vez mais ao ser humano o trabalho responsável e mental de dirigir tal máquina. Por isso, torna-se totalmente compreensível a necessidade da formação politécnica para o trabalhador moderno. Ao mesmo tempo, deve-se compreender que, ao contrário do que estipula o sentido exato da palavra, essa politécnica não significa a pluralidade de ofícios, a combinação de muitas especialidades em uma só pessoa, mas o conhecimento dos fundamentos gerais do trabalho humano, desse alfabeto com o qual são criadas todas as suas formas, como se tirássemos dos parênteses o fator comum de todas essas formas. Não é nem preciso dizer que o significado formativo desse trabalho é ilimitado, enorme, porque testemunha o mais alto florescimento da técnica [tecnologia], e é realizado junto com o maior flores cimento da ciência. A técnica é a ciência em ação ou a ciência aplicada à produção, e a passagem de uma para a outra é efetuada minuto a minuto, em formas completamente inadvertidas e imperceptíveis. Por mais estranho que possa parecer, até o operário comum de uma grande empresa deve acompanhar os passos da ciência e, a esse respeito, é demonstrativa a expressão de um empresário norte-americano: "Um operário que se atrasou 10 anos com relação ao desenvolvimento contemporâneo da ciência não pode contar com um posto em minha fábrica." Dessa maneira, o trabalho se transforma em conhecimento científico cristalizado e, para adquirir os hábitos necessários para esse trabalho, realmente é preciso dominar todo o enorme capital de conhecimentos acumulados sobre a natureza, utilizados em cada aperfeiçoamento técnico. Pela primeira vez em toda a história da humanidade, o trabalho polítécnico forma um entrecruzamento de todas as linhas principais da cultura humana; ele teria sido inconcebível em todas as épocas precedentes. A importância formativa desse trabalho é ilimitada porque, para dorniná-Io por completo, é preciso dominar todo o material científico acumulado durante séculos. Por último, o mais importante é a ação puramente educativa realizada durante esse trabalho; transforma-se em trabalho consciente por excelência e exige de seus participantes a máxima tensão de todas as forças da inteligência e da atenção, elevando o trabalho de um operário comum aos escalões superiores do trabalho criativo humano. Por esse motivo, o industrialismo na escola implica a famíliarização com a indústria mundial; a elevação às cúspides da técnica moderna constitui a exigência fundamental da escola para o trabalho. A É fácil perceber quão longe de tudo isso estão as formas da escola para o trabalho cujo método era fazer com que recaísse nas crianças a tarefa degradante e suja de limpar a cozinha, os banheiros e o chão, considerando que nesse trabalho rotineiro e obscuro residia o princípio dos hábitos laborais. O trabalho era revelado às crianças a partir do ângulo de uma tensão física pouco habitual, justificando ao mesmo tempo seu significado etimológico, que na língua russa equivale a doença e sofrimento PONMLKJIHGFEDCBA [ b o l i e z n e p i e c h a l , respectivamente]. P S IC O L O G IA São sumamente interessantes as formas de trabalho que podem ser introduzidas na escola se ela estiver orientada, na estruturação de seu plano docente, não para as formas primitivas e há muito extintas do trabalho físico doméstico, mas às formas do trabalho industrial e tecnicamente superior. Dessa maneira, sem qualquer esforço de nossa parte, a criança incorpora-se diretamente aos dois âmbitos entre os quais deve estar dividida a influência educativa: o primeiro é a ciência natural moderna e o segundo é a vida social contemporânea, que abrange o mundo dnteiro. Na fábrica moderna lateja o pulso da vida e da ciência mundiais, e a criança situada nesse lugar aprende a sentir por si mesma esse pulso da contemporaneidade. Ao mesmo tempo, é sumamente importante organizar as formas da vida e da atividade laboral da criança para que ela entre em uma relação totalmente ativa e criativa com os processos a serem realizados. Isso não se obtém mediante o ensino profissional gradual das habilidades necessárias para operar as máquinas, mas fazendo com que a criança seja introduzida imediatamente no sentido de toda a produção e, ao mesmo tempo, aprenda a encontrar o lugar e o significado dos diversos procedimentos técnicos como partes necessárias de uma totalidade integral. oYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA C O N H E C IM E N T O DA NATUREZA ATRAVÉS DO TRABALHO No trabalho industrial, a criança tropeça desde o início com as formas superiores de elaboração dos materiais naturais e aprende a seguir o longo caminho pelo qual passa o material em seu estado bruto, do momento em que ele entra na fábrica até sair dela como produto elaborado e terminado. No decorrer desse longo caminho, o material tem de evidenciar quase todas as suas propriedades essenciais e, principalmente, tem de demonstrar nos fatos que está subordinado a todas as leis físicas e químicas; portanto, o processo de elaboração de qualquer matéria-prima é similar à demonstração dessas leis especialmente organizadas para o aluno. P E D A G Ó G IC A 187 Ao mesmo tempo, as próprias características do material, que o distinguem de outros, não desempenham um papel essencial. Acima de tudo, o material age como portador de certas propriedades comuns que, de acordo com o tipo de produção, se modificam de forma quantitativa, porém não-qualitativa. Ao operarmos com madeira ou metal, lã ou algodão, pedra ou osso, em todos esses casos nos deparamos com certa magnitude, densidade, elasticidade, deformação do material e outras propriedades deste. Assim, o caráter da produção moderna permite discriminar as partes comuns dos mais diversos materiais e generalizar diante dos olhos do aluno os atributos comuns da matéria. Na produção moderna - e esta é sua característica essencial - o material não aparece como tal com todos os seus traços individuais e específicos, mas como corpo físico ou conglomerado químico; nesse sentido, ante os alunos, não só nas páginas do manual, mas também nas páginas da vida, revelam-se os traços comuns inerentes - mas em diferente quantidade - tanto aos mais finos fios de algodão quanto ao mais duro aço. Conseqüentemente, as leis gerais da física e da química da substância universal passam diante dos alunos no processo do trabalho industrial com uma força totalmente direta e impactante. Não menos importante é o fato de que, no processo dessa produção, também passam diante dos alunos as principais leis de elaboração desse material, que se estruturam levando em conta a mecânica científica e que os fazem descobrir não uma ciência estática, mas uma ciência prática e dinâmica. O conhecimento das três partes da fábrica moderna pressupõe necessariamente que o aluno possua um conhecimento preciso de mecânica, e a capacidade para dirigir essas máquinas se baseia, em última instância, nesses conhecimentos. Na fábrica, cada dia de trabalho é um exame vívido e não são necessárias comprovações especialmente organizadas para avaliar e descobrir até que ponto esses conhecimentos se arraigaram de forma sólida e fundamentada. Isso está vinculado ao terceiro aspecto que apresentamos como uma nova vantagem do trabalho industrial, que consiste em que os 1I1 I A ,IYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 188 L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I 'I , i, .. i L. , " h I'. próprios movimentos do aluno voltem a ele sob a forma do produto terminado do trabalho, que permite que ele se autocontrole, avalie sua própria obra através dos resultados inegáveis e objetivos do trabalho e, o que é mais importante, crie a possibilidade de realizar esse momento final de satisfação, triunfo e certa vitória em função do qual, em essência, despertam-se todas as nossas aspirações e todos os tipos de atividade. Há muito, os psicólogos frisaram a utilidade psicológica das notas que James, por exemplo, considerava tãogrande, pois, para ele, elas superavam todo-o evidente dano provocado pelo sistema de qualificações. Ele exigia que fosse conservado o sistema de qualificações com notas na escola e, além disso, que os estudantes conhecessem suas qualificações, pois uma nota traz implicitamente esse momento útil que dá sentido a todo o trabalho do aluno e lhe permite julgar se seus esforços foram estéreis ou frutíferos. É verdade que James também considerava que as conclusões psicológicas devem dar lugar aos argumentos da experiência e admitia o caso em que, apesar dessa regra psicológica, o professor devesse se abster de comunicar as qualificações. No entanto, com isso não se resolvia o problema psicológico, e a concepção de James continha a grande verdade de que todo trabalho deve ser realizado até sua culminação, e que esse momento de sucesso ou fracasso deve ser comunicado ao aluno para ajudá-lo a conferir sentido a todo trabalho realizado. Por outro lado, o alto valor da educação pelo trabalho reside precisamente no fato de que este último momento não é alheio nem está separado de todo o processo de trabalho, como ocorria, por exemplo, com a qualificação escolar; portanto, ao realizá-lo, não existe nenhum perigo de que as aspirações do aluno tenham uma direção totalmente falsa, como sucedia sempre que o aluno começava a se esforçar só para obter uma boa nota. Quanto maior for o número de aspirações e interesses do aluno ligados a esse ponto final de seus esforços laborais, mais forte e eficaz será sua influência organizativa e coordenadora no sistema de suas reações. Conseqüentemente, a característica distintiva do trabalho humano, que exige o conhecimento prévio dos resultados finais, assim como a coincidência desses resultados com o que é proposto desde o início, encontra sua expressão mais plena e pura nas formas do trabalho industrial. Na verdade, os psicólogos propõem o mesmo quando se referem à saudável ação coletiva exercida pelo trabalho industrial sobre cada pessoa. Além disso, dizem eles, entre a massa de trabalhadores cada indivíduo sempre encontra uma espécie de grandes espelhos nos quais aprende a observar seus mais ínfimos movimentos e, dessa forma, o grau de domínio de seu próprio corpo e de seu comportamento adquire o nível mais elevado justamente aqui. Isso ocorre porque esse mesmo retorno da impressão se reflete no próprio aluno, enquanto o grupo dos que trabalham desempenha nessa situação o papel de uma imensa caixa de ressonância que intensifica e transmite em enormes dimensões as mesmas emoções que são possíveis em um pequeno grupo de pessoas. Nesse sentido, é verdade que a emoção aumenta de acordo com o público com o qual se vive. A vergonha sentida diante de uma multidão de milhares de pessoas é mil vezes mais intensa que a que sentimos diante de apenas uma pessoa. Do mesmo modo, também o significado da emoção de prazer que dirige todas as nossas reações para o objetivo final acentua-se e amplia-se junto com a ampliação do grupo no qual ela ocorre. A COORDENAÇÃO ESFORÇOS DOS DE TRABALHO Inclusive em suas formas mais primitivas, o trabalho não aparece apenas como um processo entre o homem e a natureza, mas também como um processo entre os seres humanos, pois até as formas mais primitivas de trabalho exigem a necessária coordenação dos esforços, certa habilidade para fazer o comportamento próprio concordar com o de outros seres humanos e a organização e regulação das próprias reações para que possam entrar como parte componente na trama ge- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 189 ral do comportamento coletivo. Por isso, o trae dos vínculos sociais que surgem entre as pesbalho, particularmente em suas formas soas no âmbito do trabalho, também existe superiores e técnicas, sempre implica a mais apenas para as formas inferiores de trabalho e grandiosa escola de experiência social. Um está excluída de suas formas técnicas superiopsicólogo diz que, em nenhuma parte, o ser res. M uitos diziam que o trabalho elabora apenas hábitos sociais estreitos e unilaterais; que humano aprende a autêntica cortesia e a civilidade como na fábrica moderna, porque esta ensina a ver em outra pessoa apenas um colaensina a todos a mais sutil coordenação de borador, um ajudante ou um chefe - e esses seus movimentos com os dos outros. aspectos das relações humanas são treinados Ao mesmo tempo, a propriedade mais e polidos até a perfeição artística. Na grande importante dessa aprendizagem consiste no indústria moderna são criados grupos inteiros fato de que ela ensina simultaneamente a sude pessoas intervinculadas pelo trabalho, que bordinação e a dominação'; excluindo todos os chegam a uma grande harmonia como conjunaspectos negativos de arribas. Nesse sentido, a to, como partes diferentes de um mesmo meação educativa do trabalho industrial faz lemcanismo, totalmente ajustadas uma à outra. No brar a ação educativa do jogo infantil, no qual entanto, esse ajuste das relações humanas no as crianças se sentem ligadas por uma rede de ambiente de trabalho em grande escala não regras complicadas e, junto com isso, aprendeve ser entendido como uma excepcional dem não só a se sujeitar a essas regras, mas harmonia de seu ritmo e hábito no trabalho. também a subordinar a elas o comportamento Nas formas sérias de trabalho se exige do colaalheio e a agir dentro dos rigorosos limites traborador a capacidade de replicar a tempo, além çados pelas condições do jogo. de uma compreensão séria e certa afinidade. Em suma, tanto o jogo infantil quanto o A condição psicológica do trabalho conjunto trabalho industrial representam só o modelo se transforma, nas formas elevadas da técnimais puro de qualquer forma de comportamenca, em uma confiança laboral mútua que exito na vida, porque sejam quais forem as forge uma certa unidade de ambas as partes. Ainmas às quais recorremos, sempre teremos de da nunca aconteceu que, na atividade profislidar com dois elementos, ou seja, com a nesional, dois seres se sintam tão intimamente cessidade de se sujeitar a certas regras para unidos quando na fábrica moderna, quando subordinar alguma outra coisa. Portanto, as falam entre si pelo telefone com palavras breformas básicas do comportamento consciente ves e entrecortadas. e da vontade, por estarem determinadas por Para compreender o significado psicolóesses dois componentes, também se formam e gico desse fato, é preciso lembrar que a educadesenvolvem no processo do trabalho técnico. A ção pelo trabalho promove métodos didáticos É sumamente importante o fato de que de ensino totalmente novos. O método anteritoda a complexidade das relações humanas, or, denominado PONMLKJIHGFEDCBA a c r o a m á t i c o , de simples transsejam elas geográficas, políticas ou culturais, missão de conhecimento do professor para o também encontra sua mais nítida expressão na aluno, assim como o método e r o t e m á t i c o , isto fábrica contemporânea. Ao trabalhar nela, é é, o método de descoberta conjunta do conhecimento pelo professor e pelo aluno por meio como se o aluno fosse colocado no tabuleiro de xadrez da luta social coeva de um modo de perguntas, bem como o método h e u r í s t i c o , totalmente real; querendo ou não, com cada ou seja, a busca dos conhecimentos pelos própasso começa a fazer parte dela. Em outros prios alunos, todos eles em conjunto não abrantermos, todos os problemas da educação social, gem a essência pedagógica da educação pelo que aparentemente exigiam enfoques e formas trabalho." Todos eles pressupõem a presença totalmente especiais da organização da coletido significado final dos conhecimentos, não no vidade escolar, são resolvidos sem dificuldade próprio aluno, mas no educador que o dirige na educação pelo trabalho. e, por isso, distinguem-se essencialmente da educação pelo trabalho, na qual o sentido do Por fim, o último perigo que ameaçava nesse caso, isto é, certa limitação das relações YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA saber, o ponto final ao qual se deve chegar, é 190 L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA dado ao próprio aluno sob a forma da produção, à qual este se incorpora. Nesse sentido, é correto comparar o caminho psicológico do ensino pelo trabalho com um círculo, porque essa educação realmente descreve um círculo e, como resultado do trabalho, retoma ao mesmo ponto de partida no qual se iniciou seu movimento. Só que esse de reação completo e totalmente terminado. O estímulo, iniciado com a excitação dos órgãos internos, passa através das vias nervosas centrais e sai para o exterior por meio do ato de resposta do órgão efetor ou operante. Ao mesmo tempo, nada fica estagnado dentro do organismo; nele não permanece nenhum resquício do trabalho psíquico; todas suas excita- retorno ocorre em um novo estado do aluno: ele vê as mesmas coisas com novos olhos, enriquecidos por uma nova experiência. Em outras palavras, aborda esse mesmo ponto de outro ângulo, e isso ajuda 'particularmente o aluno a observar, ao mesmo tempo e de uma só vez, todo o caminho percorrido e - o que é fundamentala se explicar por que esse cami- ções reagem plena e integralmente. Isso se assemelha ao que acontece em canais de circulação que levam algum líquido: desvia-se tudo, inclusive o que ingressou de massa sólida ou que penetrou através deste. A própria presença do esforço comprova ao mesmo tempo o trabalho totalmente correto e infalível do organismo, porque esse esforço é o agulheiro? que orienta toda excitação e reação pelos trilhos corretos. O resultado mais importante que se obtém com tal processo é que o trabalho é compreendido e, no aluno que está trabalhando, não surge nenhuma pergunta sobre o sentido de seu trabalho. O sentido surge antecipadamente e antes de provocar o esforço, e a presença do nho foi transitado. Todas as partes do processo psicológico, como a tarefa proposta aos alunos, a tomada de consciência dos meios e caminhos para sua solução, a preocupação por assimilar e consolidar esses conhecimentos, o controle e a comprovação destes e a avaliação final de todo o trabalho realizado, tudo isso unia de forma totalmente mecânica, no sistema pedagógico czarista, técnicas psicológicas diversas e desvinculadas entre si. Basta recordar os exames, as notas, as explicações das lições, o estudo que levava ao esgotamento e outros fatores, para ver que todas essas partes do processo pedagógico careciam de todo vínculo orgânico entre si e só eram reunidas de forma mecânica em um processo geral porque umas seguiam as outras. No entanto, na educação pelo trabalho obtém-se a fusão e a integridade de todo o processo pedagógico, a união orgânica de todas as suas partes em um único todo; e esse caráter circular da educação pelo trabalho indica mais claramente que todas as sucessivas etapas desse processo formam-se um círculo completo. o VALOR e fecham-se em DO ESFORÇO DE TRABALHO o valor psicológico lho consiste do esforço de traba- no fato de que ele é um processo esforço comprova a presença de um sentido. No entanto, qualquer pedagogia que tinha a ver com um conhecimento desvinculado da prática, quase sempre exigia esforços sem justificação alguma e adquiria, do ponto de vista psicológico, o caráter de um trabalho infrutífero como o de Sísifo," como derramar água em um recipiente sem fundo. A perplexidade habitual dos alunos do ginásio [ensino médio] destaca com suma eloqüência como era absurdo o trabalho que recaía sobre eles. Para qt;' resolver problemas aritméticos se eles já foram resolvidos há muito tempo e no final do livro estão publicadas suas respostas? Para que traduzir autores latinos, que há muito foram traduzidos literalmente? M eus alunos não podiam entender isso de forma alguma. Com efeito, qualquer exercício da escola estava construído de tal forma que se propunha que o aluno se esforçasse, mas ao mesmo tempo se comunicava que esse trabalho era completamente inútil, não fazia falta para ninguém e, em suma, era estéril. Por isso, todas as formas possíveis transformaram-se de se abster desse trabalho em um meio internacional P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 191 volvia-se o espírito, assim como o corpo era de luta dos alunos contra os professores, em desenvolvido por meio de exercícios físicos. prol da defesa da racionalidade e da compreenSobre essa ginástica das matérias instrutivas são de seu trabalho. O sistema educativo caretambém estava estrutura da a pedagogia, que cia de qualquer orientação e nunca pôde resacreditava, como a ginástica [educação física], ponder para que se estudava esta ou aquela que toda a atenção não devia focalizar movimatéria. mentos em si mesmos, mas sua força de deAo mesmo tempo, os psicólogos sempre senvolvimento para um determinado grupo de d is c ip lin a afirmavam o valor da denominada PONMLKJIHGFEDCBA músculos e órgãos. fo r m a l; afirmavam que, independentemente O ensino da língua eslava eclesiástica dos conhecimentos diretos que o aluno adquipode ser tão inútil na forma como era minisria enquanto estudava alguma matéria, o vatrado na escola czarista como o levantamento lor formativo da matéria residia no polimento de pesos na ginástica sueca, e na vida futura de nossas aptidões, na ação que tais matérias do aluno a gramática memorizada da [língua] exerciam no desenvolvimento de nossa intelieslava eclesiástica seria usada tão pouco quanto gência. Assim, por exemplo, supunha-se que o os procedimentos da ginástica sueca na vida estudo das palavras latinas não só criava no da maioria de nós. No entanto, considerava-se aluno a possibilidade de ler um livro em latim, que essa gramática melhorava e reforçava o mas também desenvolvia e aperfeiçoava sua cérebro como os pesos suecos faziam com os memória. Além de ensinar-lhe a multiplicar, músculos do braço. E, no aspecto psicológico, dividir e demonstrar teoremas, o estudo da essa teoria baseava-se totalmente na velha psiaritmética e da geometria contribuía para decologia denominada "psicologia das capacidasenvolver o pensamento lógico e a exatidão no des", que desmembrava todo o organismo psímanejo das quantidades. Em outras palavras, quico em uma série de diferentes capacidades supunha-se que a ação educativa de cada disespirituais, encontrava para cada uma delas ciplina ultrapassava os limites de sua ação dium lugar especial no cérebro e acreditava que reta e de algum modo obtinha uma interpretaa psicologia humana formava-se a partir da ção e um valor ampliados. A ação conjunta dessas capacidades, assim como É preciso dizer com franqueza que sobre seu corpo está formado pelos distintos órgãos." esse ponto de vista havia sido construído todo o sistema de instrução clássica na Rússia, que Devemos dizer francamente que nem a base psicológica, nem o fundamento pedagógitinha sua expressão nos ginásios. Todos comco dessa teoria resistem à menor crítica e que, preendiam perfeitamente que essas matérias tanto na teoria como na prática, os critérios que constituíam nove décimas partes do ensidesse tipo, à luz do saber atual, tendem a um no médio não possuíam nenhum significado certo obscurantismo medieval. Acima de tudo, pedagógico, e seu valor limitava-se a essa disa experiência pedagógica revelou que a disciciplina formal, a essa "ação de desenvolvimenplina formal das matérias costuma ser sumato" de nossa inteligência que supostamente mente insignificante. Seria mais correto dizer exerciam. Recordemos que as ciências natuque, efetivamente, ela também adota dimenrais só foram introduzidas no ginásio nos últisões consideráveis, porém só em um círculo mos anos [no início do século XX], e que essas muito restrito. A recordação dos verbos latinos disciplinas tiveram de enfrentar uma forte opoou das conjugações irregulares pode desenvolsição antes de serem incluídas nos planos de ver intensamente o hábito de recordar, mas reestudo. cordar apenas os verbos latinos. Nesse caso, os Essa teoria pedagógica nos parece, em um processos gerais de memorização não manifessentido histórico, herdeira da escola escolástica tam de forma alguma nenhuma melhora, ou ela medieval, em que os intermináveis exercícios é bastante insignificante. Portanto, a disciplina verbais, as construções e operações constituíformal de cada matéria está ligada apenas a am o único material e objeto do conhecimento melhoramentos imperceptíveis no terreno da e em que se supunha que, por essa via, desen- YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 192 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA acumulação de hábitos especiais e, assim, sua importância educativa se esgota por completo na aprendizagem profissionalizante. Dessa maneira, o estudo prolongado do latim aperfeiçoa a memória do farmacêutico para as receitas ou o bibliotecário aprende a reconhecer pela sua lombada milhares de livros e a lembrar o lugar de cada um nas prateleiras, porém nem a memória do farmacêutico nem seu conhecimento de línguas estrangeiras, nem a memória do bibliotecário para qualquer outra coisa se aperfeiçoam devido a seus exercícios profissionais. Ao contrário, podemos ter certeza de que essa especialização de nossas aptidões sempre se adquire às custas de uma limitação das mesmas em outros âmbitos e assim se paga um preço sumamente caro. Os psicólogos atuais tendem a destacar que existem mais desvantagens que vantagens nessa especialização precoce. Em particular, com relação à memória, dizem diretamente que um dos problemas essenciais da pedagogia é a questão de ensinar as crianças a esquecer o supérfluo e não de levá-Ias a recordar o necessário. É interessante lembrar, para resolver de forma acertada os problemas da psicologia da memória, as palavras de Temístocles, respondendo à proposta de ensinar a recordar tudo: A "É melhor que me ensinem a esquecer". A pesquisa de outras aptidões, assim como a da memória, levou aos mesmos resultados, isto é, demonstrou que a disciplina formal de cada matéria afeta de alguma maneira a elaboração de hábitos especiais. Em outras palavras, nossa capacidade parece se especializar, porém adquire certo caráter unilateral e sumamente estreito. É verdade que, com essa unilateralidade, a perda em amplitude é recompensada por um ganho considerável na produtividade geral e na flexibilidade dessa capacidade; no entanto, em conjunto, a disciplina formal de algumas matérias, por mais paradoxal que pareça, desempenha um papel prejudicial e limitativo no sentido do desenvolvimento e da ampliação. Segundo um provérbio francês, toda definição já é uma limitação, e em nenhum âmbitoisso é tão verdadeiro quanto no terreno do desenvolvimento de nossas aptidões. Por isso, na psicologia atual, a maioria dos pesqui- sadores tende a encarar com máxima desconfiança a matéria que é incorporada ao plano de estudos só em virtude de sua importância formal. A utilidade de cada matéria e sua conveniência no sistema pedagógico são determinadas, sobretudo, pela utilidade direta e pelo significado imediato que podem ser atribuídos aos conhecimentos que comunica. Por último, a noção psicológica sobre o trabalho humano composto por muitas aptidões diferentes não resiste a uma crítica rigorosa. Cada uma de nossas "aptidões" funciona de um todo tão complexo que, considerada separadamente, não nos proporciona uma idéia nem aproximada das verdadeiras possibilidades de sua ação. Uma pessoa com memória fraca, quando pesquisada de forma isolada, talvez possa lembrar mais que outra pessoa com boa memória, só porque a memória nunca age sozinha, mas sempre em estreita colaboração com a atenção, a orientação geral, o pensamento, etc., e a ação conjunta dessas diferentes capacidades sempre pode ser completamente independente da magnitude absoluta de cada um dos componentes. Por isso se subentende que, na pedagogia, deve-se promover ao primeiro plano o princípio do ensino real. Se os conhecimentos desenvolvem muito pouco nossas capacidades psíquicas, eles só devem ser valorizados à medida que forem necessários por si mesmos e em contextos bastante limitados, quando fizerem falta para elaborar alguns hábitos gerais. Ao mesmo tempo, o aspecto formal da elaboração dessas habilidades se esgota com movimentos tão elementares e primitivos que praticamente tornam indiferente a matéria com cujo estudo podem ser adquiridos. Conseqüentemente, o único critério do conhecimento é seu valor vital, sua necessidade para a vida ou o princípio de realidade. A lei fundamental da educação e a lei de formação dos reflexos condicionados referem-se a isso. Se mais tarde quisermos obter vínculos entre alguns conhecimentos ou fatos e uma determinada reação do ser humano, durante a educação devemos combinar ambos muitas vezes e, então, poderemos ter certeza de que o novo vínculo de que precisamos realmente se fechará [formará]. Portanto, toda a escola - P S IC O L O G IA esse grandioso aparelho de fechamento de novos vínculos - deve estar dirigida para a vida, porque só com essa aspiração os métodos escolares podem obter justificação e sentido. oYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA C O N H E C IM E N T O S IN T É T IC O Até agora nossa escola tem sofrido com o profundo dualismo que herdou da velha escola. Podemos encarar nosso sistema escolar do ângulo que for, mas não podemos deixar de perceber que, até o momento, seu plano de estudos se divide em dois 'grandes grupos inconciliáveis. Por um lado, as ciências naturais (as ciências da natureza) e, por outro, as ciências humanas (as ciênciasdo espírito);entre ambas não existe nenhuma ponte no edifício escolar. Os alunos são educados e instruídos com a convicção, talvez inconsciente, de que na realidade também existem dois mundos diferentes: o da natureza e o do ser humano, e que ambos estão separados por um abismo intransponível. Nem uma palavra relaciona um conjunto de temas ao outro e, se o aluno adquire critérios e uma compreensão diferente do mundo, isso ocorre à margem da escola. A escola parece servir para enraizar e aumentar essa bifurcação de nosso conhecimento e de nossa experiência. Quando o aluno passa do mundo da física para o mundo da economia política e da literatura, é como se fosse transferido para um mundo completamente novo, totalmente subordinado a leis peculiares, que não lembra de forma alguma o mundo que ele deixou recentemente, o das ciências naturais. Isso não representa um vício casual da escola russa, mas é a conclusão historicamente inevitável de todo o desenvolvimento da ciência e da escola européias. Nesse caso, a escola reflete apenas o que foi introduzido no próprio desenvolvimento da filosofia e da ciência. E só o trabalho, como matéria de estudo, permite unir ambas psicologicamente porque, por um lado, como processo que se realiza entre o ser humano e a natureza, se baseia por completo na ciência natural e, por outro, como processo de coordenação dos esforços sociais, constitui a base para as ciências humanas, sociais. P E D A G Ó G IC A 193 O trabalho construído com base no sistema das reações conscientes é justamente essa ponte que se estende entre o mundo das ciências naturais. e o das ciências humanas. A É a única "matéria" que constitui o objeto de estudo de ambas. De fato, quando se estudava o homem na ciência natural escolar, estudava-se apenas essa parte do ser humano que tem a ver com a anatomia e a fisiologia; ele era estudado apenas como animal mamífero. O mundo da natureza, do qual o ser humano era excluído, era subestimado e empobrecido em comparação com a riqueza da vida real. Por outro lado, o mundo das ações e dos atos humanos parecia suspenso no ar, como um arco-íris suspenso acima da natureza, sem raízes na terra. Só o trabalho, em seu significado histórico e em sua essência psicológica, é o ponto de encontro entre o fundamento biológico e o suprabiológico no ser humano. Nele se enlaçaram o animal e o homem, e o saber humano e o natural se entrecruzaram. Portanto, a síntese na educação, com a qual sonhavam os psicólogos em tempos remotos, torna-se possível na educação para o trabalho. A P R Á T IC A Blonski diz que "a educação para o trabalho é a educação do dono da natureza", porque a técnica [tecnologia] representa a dominação real e materializada do ser humano sobre a natureza, a subordinação do ser humano às suas leis para seu próprio benefício. Nesse sentido, o trabalho talvez seja ainda mais valioso, do ponto de vista psicológico, por estar dirigido à PONMLKJIHGFEDCBA p r á tic a [ p r a k t i k a ] .10 É sumamente ilustrativo que, na filosofia européia das últimas décadas, de alguma forma ele tenha sido promovido pelas mais diversas correntes como a única possibilidade de construir um conhecimento científico. Com efeito, a prática é a comprovação suprema à qual cada disciplina científica é submetida, e a expressão de M arx, dizendo que os filósofos só têm se limitado a interpretar o mundo, embora haja que rransformá-lo," abrange totalmente a autêntica história da ciência. 111' I wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 1 I, li 194 V IG O T S K I Em última instância, todo conhecimento surgiu e sempre surge de alguma exigência ou necessidade prática e, se no processo de desenvolvirnento ele se afasta das tarefas práticas que lhe deram origem, nos pontos finais de seu desenvolvimento ele volta a se dirigir para a prática e encontra nesta sua mais alta justificação, confirmação e verificação. Em particular, o máximo pecado psicológico de todo o 'sistema escolástico e clássico de educação foi o caráter absolutamente absI trato e inerte dos conhecimentos. O saber era assimilado como um prato pronto, e ninguém i: sabia o que fazer com" ele. Ao mesmo tempo, a própria índole do conhecimento era esquecida, isto é, o fato de ele não ser um capital de reserva pré-orientado PONMLKJIHGFEDCBA [ p r e -s e t] ou um prato pronto, mas um processo contínuo de criatividade, a luta da humanidade pelo domínio da natureza. A verdade científica é mortal, vive dezenas ou centenas de anos, mas depois morre, porque no processo de conquista da natureza a humanidade sempre continua avançando. A ciência de nossas escolas tinha chegado a uma total ruptura com essa tese quando, de forma I dogmática, buscava verdades que deviam ser !I estudadas a fundo pelos alunos. Nenhuma l ' noção psicológica sobre a verdade é mais falsa que aquela que nossos alunos extraíam dos manuais escolares. YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A verdade lhes era apresentada como algo terminado e definitivo, corno resultado de certo processo incondicionalmente correto. Ao mesmo tempo, é interessante perceber a enorme irreverência que a verdade científica criava nos alunos, devido ao fato de a conhecer através das páginas [dos manuais] de Kraevich e Sadovnik, nos quais a verdade parecia estar listada em parágrafos e o aluno não podia distinguir onde estava a verdade científica em si e onde estavam os procedimentos didáticos dos autores do manual. O processo em si da busca da verdade era ocultado, e esta não era apresentada na dinâmica de seu surgimento, mas na estática de uma regrajá encontrada. E como tudo isso era estudado exaustivamente, e os alunos repetiam tudo como se fossem papagaios, era totalmente natural que a atitude de nossos estudantes I ; L 1 E V S E M IO N O V IC H ~ I com relação à ciência e à verdade científica se diferenciasse pouco da atitude dos [homens primitivos] selvagens com relação às suas crenças; e esse supersticioso e obtuso culto à letra da verdade escolar, que na Rússia era a última palavra da pedagogia, só era capaz de educar selvagens civilizados. Em segundo lugar, a verdade sempre era apresentada sob a forma de uma regra teórica abstrata, que não era obtida através de um processo de busca e trabalho, mas através de um labor puramente mental. Ao mesmo tempo, nunca era relacionada às exigências vitais que a tinham gerado nem às conclusões vitais que dela derivavam. Entretanto, a própria índole da verdade científica, no tocante a qualquer regra higiênica insignificante ou à teoria da relatividade," também possui um caráter prático. Em outros termos, a verdade sempre é concreta. Em terceiro e último lugar, nessa infinita mescla de verdades científicas que eram oferecidas ao aluno, nem o mais experiente metodologista [epistemologista] da pedagogia poderia ter se orientado sem chegar às mais desoladoras conclusões. Durante o curso escolar as verdades científicas choviam a cântaros, no sentido literal da palavra, e nenhum pedagogo engenhoso teria podido explicar qual era o vínculo entre as declinações latinas, as guerras napoleônicas e as leis da eletrólise. Essa fragmentação e esse isolamento dos conhecimentos escolares recarregava a percepção do aluno com urna infinita quantidade de fatos separados, excluindo um ponto de vista unificador e vinculador do terna. Por isso, no âmbito da filosofia e da concepção do mundo, sempre imperava nos círculos instruídos a mais vergonhosa leviandade, urna fraseologia superficial e uma monstruosa falta de informação sobre os problemas mais elementares. Esses três vícios da escola czarista estão sendo superados por meio da educação para o trabalho que, em primeiro lugar, sintetiza e unifica todas as matérias; em segundo, dá a elas um determinado viés e um uso prático e, em último lugar, descobre o próprio processo de descoberta da verdade e de seu movimento depois de ela ter sido encontrada. P S IC O L O G IA oYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P R O F IS S IO N A L lS M O A Nenhum P E D A G Ó G IC A 195 princípio pedagógico enunciaconseqüências, caso não for compreendido de forma correta, quanto o princípio da escola para o trabalho; e devemos dizer honestamente que a prática russa da escola para o trabalho foi um claro exemplo dessas tergiversações. Blonski, E A P O L IT É C N IC A wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA do implica tão temíveis Embora as tendências da indústria moderna estejam orientadas para uma politécnica completa do trabalho, esse processo não deve ser considerado concluído, nem mesmo em um país capitalista tão desenvolvido quanto os Estados Unidos e muito menos aqui, na Rússia. Portanto, a politécnica é uma verdade do futuro, para a qual deve ser orientado o trabalho escolar, porém essa verdade ainda não está definitivamente cristalizada; além de implementar um programa de educação politécnica, a escola também tem a meta de satisfazer as demandas vitais imediatas que surgem. Ao mesmo tempo, o profissionalismo, que necessariamente deve ser proposto pela escola, deve ser entendido como uma concessão à vida, como uma ponte estendida da educação escolar para a prática da vida. Isso significa que a escola, com a orientação profissionalizante, não perde seu caráter politécnico. A politécnica continua sendo seu núcleo fundamental e básico, porém essa educação politécnica se acentua em um extremo para poder penetrar diretamente na vida. Com relação a esse ponto, o vínculo entre a educação geral e a especial na nova interpretação pode ser compreendido através da velha fórmula há muito promovida pela psicologia e que diz que PONMLKJIHGFEDCBA c a d a u m d e v e s a b e r a lg o s o b r e tu d o e t u d o s o b r e a l g o . "Cada um deve ser algo sobre tudo" significa que as noções mais elementares e gerais sobre os principais elementos do todo universal devem figurar na base da educação geral de cada pessoa. E "tudo sobre algo" quer dizer que se exige que nossa formação reúna absolutamente todo o saber de uma determinada área que esteja diretamente relacionado a nosso trabalho. É fácil compreender que essa antiga fórmula pode ser totalmente aplicada à educação profissionalizante se considerarmos que "tudo sobre algo" equivale à exigência do profissionalismo, enquanto "algo sobre tudo" tem a ver com a politécnica. em seu livro sobre a escola para o trabalho, diz que nela não há nenhuma página e nenhum princípio que não possam ser transformados na mais terrível caricatura do princípio do trabalho. Tenho visto escolas-com unas que ressuscita- ram por completo as práticas das instituições fechadas, que fazem lembrar asilos. Tenho visto instrutores que preparam o 'dia da criança' para todo um bairro com uma precisão que chega aos 15 minutos. Tenho visto educadores pré-escolares que ensinavam crianças de cinco anos a cozinhar a comida em cozinhas hediondas. Acudiram a mim crianças que escapavam do trabalho na horta porque ele as levava ao esgotamento total, devido ao calor massacrante e ao cansaço. Tenho visto professoras que consideram que o fato de arrastar pedaços de lenha pesados e sujos, limpar latrinas e varrer a poeira faz parte da escola para o trabalho; na minha opinião, esse é um trabalho nocivo e inútil até para os adultos. Tenho visto oficinas de marcenaria em que eu, um adulto, sufocava, trabalhavam e nas quais as crianças em posturas incríveis. Tenho visto trabalhos em metal em que as crianças corriam o risco de contrair uma pneumonia. Tenho visto mulheres conversadeiras que, depois de conversar sobre qualquer trivialidade da vida cotidiana, pensavam que estavam realizando a educação para o trabalho. Tenho visto professores tendo aulas de culinária escolar. Tenho certeza de que muitos professores leva- rão as crianças ao inferno da fábrica, lançarão adolescentes no meio do estrondo e do calor das oficinas, Que farão com que eles dirijam máquinas perigosas, encherão seus pulmões de poeira e carvão e, depois, começarão a convencer todo mundo de que estão educando segundo "o estilo Blonski". [P. P. Blonski, T r u d o v a ia s h k o la tr a b a lh o ), 1 9 1 9 .] = (A e s c o la de educação para o 196 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I 7. "Agulheiro" é um termo técnico que designa o N O T A S wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA dispositivo mediante o qual é selecionado o trilho por que o trem deve passar. Vigotski usa 1. Esse segundo tipo de escola, que traduzimos tal "metáfora ferroviária" algumas vezes nesta como "ilustrativa" ou "visual", também podeobra. ria ser traduzida como escola "de protótipos". 8. Na mitologia grega, Sísifo era um rei que, por 2. Georg Kerschenteiner (M unique, 1854-1932) ter ofendido Zeus, foi condenado ao trabalho foi um pedagogo alemão. Elaborou uma teoria eterno de carregar uma enorme pedra até o reacionária que chamou de "educação cívica", cume de uma montanha; ao chegar lá, a pedra para combater as influências de ideologias recaía, e Sísifo tinha de recomeçar o trabalho. volucionárias na juventude. Considerava que 9. A vigência dessa teoria psicológica, também o meio de obter essa educação era a escola chamada de "psicologia das faculdades", tem profissionalizante, e não a tradicional. No inísido defendida ultimamente por J. Fodor (cf. cio da Primeira Guerra M undial, foi publicada M o d u l a r i d a d de Ia M e n t e , M adri: M orata, na Rússia uma seleção das-suas obras. É muito 1986). provável que, aqui, Vigótski esteja se referin10. "Práxis" é uma palavra do vocabulário alemão, do ao seu livro de 1912, Der Begriff der de origem grega, que designa a "prática" no Arbeitsschule [O conceito da escola provocabulário de M arx. P r á t i c a é uma categoria fissionalizante], publicado em russo em 1918. central do marxismo, que se refere à "ativida3. Este parágrafo foi escrito há 75 anos, com relade social humana, cuja base é a produção mação aos estudos de M arx de 150 anos atrás. Para terial, a relação entre os seres humanos e o uma exposição mais detalhada, cf. L. S. Vigotski, mundo, de caráter fundamentalmente ativo" "La M odificación Socialista DeI Hombre", em: (Lucien Seve, U n e i n t r o d u c t i o n a Ia p h i l o s o p h i e L. S. Vigotski, PONMLKJIHGFEDCBA L a G e n ia lid a d y o tr o s te x to s in é d im a r x i s t e , Paris: Éditions Sociales, 1980, p. 701). to s , edição de G. Blanck, Buenos Aires: Seve é favorável ao uso do vocábulo "prática" Almagesto, 1998, p. 109-125. nas línguas em que esse termo existe, em vez 4. Nessa e em outras asserções de Vigotski evide "práxis", que teria uma conotação de "valodencia-se a diferença abismal no campo do derização historicista da prática social em d e t r i senvolvimento econômico que existia na épom e n t o da objetividade natural". Em compenca entre os Estados Unidos e a Rússia. A habisação, Sánchez Vázquez prefere "práxis", pois tual afirmação de Noam Chomsky em suas conem espanhol "prática" teria adquirido uma ferências, de que "só um louco [ c r a z y ] teria a conotação de desvalorização (cf. sua F i l o s o f i a idéia de comparar a situação econômica soviéde Ia p r a x i s , M éxico: Grijalbo, 2.ed. corrigida, tica com a norte-americana dos anos 20" coin1980, Introducción). Adotamos "prática" porcide com essas asserções de Vigotski; Chomsky que, em nossa opinião, esse termo se adapta afirma também que "a única equivalência válimelhor ao contexto em que Vigotski produziu da nesse sentido seria comparar a Rússia com este livro. o Brasil da época". Apesar de a URSS ter che11. Vigotski refere-se a K. M arx, "Teses sobre gado a um desenvolvimento econômico excepà tese XI, op. Feuerbach" e, mais precisamente, cional 30 anos mais tarde, o que a transforcito no Capo 1. mou na segunda potência mundial, nunca che12. No prefácio dissemos que Vigotski, em uma das gou ao grau de desenvolvimento das forças pro"Segundas-feiras Literárias" de Gómel, minisdutivas que houve nos Estados Unidos. trou uma palestra sobre Albert Einstein e sua 5. É muito provável que Vigotski esteja se refeteoria da relatividade. Também faz referência rindo a Henry Ford. Ele não teria mencionado a essa teoria e à de Newton, de um ponto de o industrial norte-americano devido A à sua púvista epistemológico, em O b r a s . . . , t. I, op. cito blica atividade anti-semita. 6. A denominação desses diferentes métodos foi totalmente suprimida na edição norte-americana deste livro. O grifo é nosso. -- --- --- --- o C o m p o rta m e n to S o c ia l . e s u a R e la ç ã o c o m o D e s e n v o lv im e n to d a C ria n ç a wvutsrqponmlkjihgfedcbaZY YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA o C O N C E IT O a criança está adaptada ao ambiente em diversos graus. Como se sabe, a biologia moderna consiPortanto, o problema da adaptação ao [ p r ip o s o b lidera que o conceito de adaptação PONMLKJIHGFEDCBA meio também deve ser analisado com relação do desenvolv a n i e ] é o princípio fundamental ao comportamento evolutivo da criança. Vejavimento da vida orgânica na Terra.' Por isso, mos ambas as questões. também dizemos na área da pedagogia que o Com relação à primeira, corresponde diobjetivo final de toda educação consiste na zer que a adaptação só deve ser considerada adaptação da criança ao ambiente em que lhe do ponto de vista social. Ao mesmo tempo, toca viver e agir. nunca se deve partir do meio dado e existente No entanto, é preciso levar em considee considerá-lo invariável e permanente. O meio ração duas circunstâncias. Em primeiro lugar, social contém uma imensa quantidade de aso fato de que a adaptação ao ambiente pode pectos e elementos muito diversos, que semser de diversa índole. Está adaptado ao meio o pre estão em flagrante contradição e luta enastuto arrivista, o negociante e o delinqüente tre si. Não devemos conceber o ambiente como que levam em conta, de forma admirável, os um todo estático, elementar e estável, mas mínimos estímulos do ambiente, sabem reagir como um processo dinâmico que se desenvolde forma adequada e conseguem satisfazer ve dialeticamente. Por isso, um revolucionário pode estar, do ponto de vista social, mais adaptodas as suas demandas vitais experimentando, ao fazer isso, um imenso sentimento de tado às tendências superiores do ambiente que auto-satisfação, que se exprime em um afeto um arrivista, porque está adaptado à dinâmica e não à estática social. emocional positivo e lhe dá a possibilidade de DE ADAPTAÇÃO dominar a situação em todos os casos. Cabe que nos perguntemos: por acaso essas pessoas representam o ideal de personalidade educada do ponto de vista da pedagogia? E vice-versa, ante qualquer revolucionário que não pode se conformar com nenhum círculo social, que se rebela contra a sociedade e que sempre entra em choque com o meio, manifestando assim sua falta de adaptação, podemos dizer que essa pessoa erroneamente educada? A segunda dificuldade reside que, devido ao seu desenvolvimento A atitude do ser humano com relação ao ambiente sempre deve ter o caráter de ativi- está mal ou dade, e não de mera dependência. Por esse motivo, a adaptação ao ambiente pode implicar a mais dura luta contra seus diferentes elementos, denotando sempre inter-relações ativas com este. Portanto, no mesmo ambiente social pode haver orientações sociais totalmente diversas do indivíduo, e toda a questão reside em saber em que direção essa atividade será no fato de evolutivo, educada. O segundo problema se resolve da seguinte maneira: a criança, na verdade, passa por 198 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA muitas etapas de adaptação ao ambiente social, e as funções de seu comportamento social se modificam intensamente de acordo com esta ou aquela etapa evolutiva. Assim, o comportamento social da criança deve ser considerado como um comportamento que é interpretado reiteradamente, de acordo com o desenvolvimento biológico A C R IA N Ç A do organismo. E O A M B IE N T E A. Zalkind revela o significado objetivo e materialista da teoria de Freud aproximadamente da seguinte maneira." Freud, segundo Zalkind, estabelece dois princípios aos quais a atividade humana está subordinada: o princípio do prazer e o princípio de realidade. As paixões e os desejos, profundamente ocultos no ser humano, e sua interação com o ambiente, dão origem à psique humana. "Toda a vida espiritual está orientada pelo desejo do gozo e pela rejeição ao sofrimento." Essas pulsões de gozo organizam toda a orientação da personalidade, preenchendo a atenção, a memória e o pensamento de um determinado conteúdo. "Todo o mundo psíquico do ser humano é a soma de seus desejos e a experiência da luta para realizá-los." M as o desejo do gozo colide com as exigências do meio real, ao qual é preciso se adaptar; assim, o princípio do prazer entra em choque com o princípio de realidade. O organismo tem de renunciar a muitos desejos. Esse desejo insatisfeito é deslocado para a área inconsciente e continua existindo lá de forma latente, [ ...] abrindo caminho para a vida psíquica, dirigindo-a por seus caminhos, submetendo-a às influências desses desejos inconscientes deslocados. O princípio do prazer, quando não chega a um acordo com o princípio de realidade, vinga-se deste criando um mundo particular no lugar do mundo real: o das paixões não-conscientes, deslocadas, inconscientes. Criam-se no ser humano duas realidades irreconciliáveis entre si: a realidade externa da qual se toma consciência, que contém em si os elementos de adaptação ao meio circundante, e a realidade psíquica, alheia e hostil ao meio externo, encurralada por este no subsolo do inconsciente, porém faminta, insatisfeita, prestes a irromper até a superfície. Toda a vida psíquica está impregnada pela feroz luta entre essas duas realidades. [A. B. Zalkind, "Freidizm i M arksizm" (Freudismo e M arxismo), Krasnaia Nov, n 4, 1924.] Q Essa luta se exprime através da denominada censura, que desfigura as paixões reprimidas que irrompem durante o enfraquecimento do estado consciente, no sonho e nos atos falhos. A forma superior desse conflito, dessa discórdia com o ambiente, se expressa através da denominada evasão na doença, que deve ser entendida como uma atitude doentia diante da realidade, como uma forma peculiar de comportamento, na qual triunfam os desejos deslocados e insatisfeitos, que formaram um certo "complexo", isto é, um grupo de representações ligado a alguma vivêncía afetiva. Até mesmo nosso processo de pensar é orientado de acordo com esses desejos deslocados ou complexos, e não precisamos mencionar que todas as restantes forças psíquicas estão subordinadas a essa lei. [O] ser humano só dirige ao meio circundante uma parte de sua riqueza criativa; a parte restante fica guardada para seu uso interno, alheio às obrigações impostas por esse meio. A quantidade de atenção, de memória, o material dos processos pensantes, a qualidade das aptidões gerais e especiais, a quantidade de resistência e flexibilidade que um indivíduo manifesta nos atos de sua real adaptação, com freqüência representam um fragmento insignificante de suas possibilidades criadoras. Em compensação, uma parte imensamente maior das mesmas permanece oculta para nós, encoberta, dirigida para os processos internos fechados, alimentando uma excitação excedente, irreal e não-criativa. Isso acontece não só com as denominadas personalidades patológicas, mas também com as pessoas totalmente normais, devido à extrema relatividade do conceito de normalidade nas condições do demente meio social dos dias de hoje. A estrutura congênita da personalidade e os hábitos que acumula no decorrer da primeira infância e durante o período de seu crescimento posterior, entrarão inevitavelmente em cho- P S IC O L O G IA que com as obrigações da realidade circun- dante. Aumenta assim a desorganização interna, há uma brusca cisão, uma marcante dissociação da personalidade, que entrega ao meio apenas o que este lhe tira de forma coercitiva, e a maior parte de seu potencial permanece tencial. no estado de uma faminta [A. B. Zalkind, ibidem.] tensão po- P E D A G Ó G IC A 199 rece-se pó de carne com cheiro a um cão. Ele responde com reflexos de preensão e secreção salivar, porém só tem acesso ao pó depois de um sinal luminoso ou sonoro. Em princípio, o cão tenta pegar o pó de todos os jeitos, secreta saliva, etc. No entanto, devido a insistentes repetições do experimento, ele começa a inibir seu reflexo básico: "sem obter permissão, sem o sinal condicionado, ele não está em condições bioquímicas de comer - não produz saliva nem os outros sucos -, perde o apetite e a vontade de comer". Freud supõe que uma grande parte desses desejos reprimidos são de origem sexual. Liga o desenvolvimento do instinto sexual à mais tenra infância. Naturalmente, não fala de um instinto sexual completamente desenvolvido e formado na criança, mas de elementos o A M B IE N T E C O N T E M P O R  N E O embrionários, parciais, de diferentes sensações EAEDUCAÇÃO que partem das membranas mucos as, do funcionamento de certos órgãos, e constituem os o ambiente social contemporâneo, isto é, germes do futuro sentimento sexual, a denoo meio da sociedade capitalista, cria, devido a minada "libido". seu caótico sistema de influências, uma conA experiência instintiva primária da criantradição radical entre a experiência precoce da ça, bem como os primeiros hábitos da infâncriança e suas formas de adaptação mais tarcia , a chamada conduta infantil, transcorrem A dias. Por isso, o organismo tem de assimilar principalmente sob a ação do princípio do pracertas formas de inibição, tem de encobrir seus zer. A preocupação pela adaptação ao meio desejos; esses desejos encontram uma saída no recai sobre os adultos. Eles fazem com que a sonho, porém não de forma clara, mas mascacriança estabeleça suas primeiras inter-relações rada, pois se deparam com o obstáculo da cencom o meio. Isso é o que marca o comportasura. Conseqüentemente, cria-se uma flagranmento infantil do período da primeira infânte contradição entre o ambiente e a personalicia. Ele se forma primeiramente a partir das dade. Surge daí um quadro que A. B. Zalkind reações congênitas incondicionadas e, depois, descreve do seguinte modo: todas as pulsões a partir dos reflexos condicionados de primeinão-realizadas recebem uma direção incorrero grau, afins a elas. ta e refluem para o instinto sexual, que se aliIsso é o que explica a trágica contradição menta, portanto, como um parasita se alimenentre "a reserva congênita, a experiência inta de seu hospedeiro. fantil precoce e suas aquisições posteriores". A caótica combinação das excitações [esComo há uma enorme falta de correspondêntímulos] sociais contemporâneas cria uma evicia entre essa experiência infantil precoce, badente falta de correspondência entre a reserva seada nos hábitos biológicos, e o ambiente, com herdada, a experiência da primeira infância e todas as suas exigências objetivas, surge uma as acumulações psíquicas posteriores, mais desorganização biológica do ser humano, e a maduras. Oculta-se então uma enorme parte das passagem do comportamento infantil ao comforças biopsíquicas do ser humano, seu uso portamento adulto sempre representa uma tradistorcido, pois o meio social aproveita apenas gédia, que Freud chama de "luta entre o prinuma parte insignificante dessa energia. Entrecípio do prazer e o princípio de realidade". tanto, no subsolo da psicofisiologia humana jaComo observa A. Zalkind, essas concluzem poderosas reservas que esperam os estísões coincidem totalmente com os experimulos sociais correspondentes. Possuem uma mentos de laboratório de Pavlov. Ali se reproextraordinária plasticidade. Liberar essas reserduz de forma experimental a definição da exvas e realizar a liberação social dessa energia periência infantil quando ingressa à vida. Ofe- YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA significa produzir o proces~o seguinte. No ser Ili 200YXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I wvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA I I .~ humano residem muitas energias sob a forma de inclinações, desejos e aspirações; uma parte dessa energia não obtém satisfação devido ao princípio da realidade e é deslocada para o inconsciente. Para essa parte restante de energia, há três saídas possíveis. A primeira é entrar em luta com as formas conscientes do comportamento, vencê-Ias e vingar-se do princípio da ele ruge por todo o apartamento - a catarse freudiana: uma explosão, uma incontrolável expansão da excitação reprimida. Esse é um dos caminhos. (2) Há outra possibilidade. A inibição continua agindo, os posteriores ata- ques do chefe a mantém, alimentam e condensam. M as também surgem novos estímulos: uma manifestação cidade, um manifesto revolucionária pela clandestino que realidade: isto é, evasão por meio da doença ou conc1ama à luta contra "os chefes" em geral, psiconeurose. A segunda é uma luta que termimétodos de luta prolongada, tenaz e organina em um empate ou, mais exatamente, não zada. O reflexo de agressão se libera, não de forma incontrolável, mas organizada, ele se termina de forma alguma, e o ser humano, desenvolve durante certo tempo e se transmantendo formas normais-de comportamento, forma em rnilitância revolucionária ilegal," prolongado conflito vive em um permanente perseverante. O reflexo de agressão se transentre o meio e si mesmo, e também dentro de si forma, através da soma - aumento - de estímesmo. Por último, a terceira saída: empurramulos circundantes, mediante sua prolongada para o inconsciente e deslocada pela realida inibição e sua liberação paulatina, em um dade, a energia é novamente liberada, de novo reflexo de ordem superior, isto é, em p r o c e s s o em nome da realidade, porém em uma direção c r i a t i v o . [A. B. Zalkind, ibidem.] socialmente útil e criativa. Nesse caso, o ambiente triunfa por completo, pois, além de deslocar Fica claro, portanto, que uma educação as forças que se opunham a ele, apodera-se noideal só é possível com base em um ambiente vamente delas de forma modificada. social orientado de modo adequado e que os Conseqüentemente, esse processo, ou PONMLKJIHGFEDCBA suproblemas essenciais da educação só podem b l i m a ç ã o , constitui a máxima realização de ser resolvidos depois de solucionada a questodos os nossos desejos, só que em uma diretão social em toda a sua plenitude. Daí deriva ção socialmente útil. Portanto, esse é o camitambém a conclusão de que o material hunho que deve ser percorrido pela educação. A mano possui uma infinita plasticidade se o sublimação é muito similar às formas correnmeio social estiver organizado de forma cortes de inibição dos reflexos, inclusive daqueles reta. Tudo pode ser educado e reeducado no que não foram deslocados para a esfera inconsser humano por meio da influência social corciente. Para esclarecer o mecanismo de ação respondente. A própria personalidade não da sublimação utilizaremos um exemplo exdeve ser entendida como uma forma acabatraído da vida diária por A. Zalkind: da, mas como uma forma dinâmica de interação que flui permanentemente entre o orgaUm funcionário subalterno é grosseiramente nismo e o meio. ofendido por seu chefe; as 'irritações' desse Devemos recordar a respeito que, embo- e tipo sempre lhe provocavam do reflexo de agressão, inibição, em vez pois o meio burocráti- co do regime czarista certamente não criava um terreno propício para a formação de reflexos agressivos manifestos. A soma dessas excitações inibidas pode se manifestar externamente em duas direções: (1 ) O funcionário está na sua casa, prestes a almoçar; qualquer detalhe, uma pequena desordem na mesa o "irritam"; a irritação cai no campo da excitação inibida e, de repente, brusco e violento, de agressão: a enorme [surge] os punhos força do reflexo batem de nosso século essa educação tropeça em uma série de obstáculos. Vejamos as formas reais do comportamento da criança. AS FORM AS R E A IS D O COM PORTAM ENTO S O C IA L um acesso os pratos voam em direção posa, aos filhos, ra absolutamente tudo no organismo humano esteja sujeito à educação, nas condições reais à es- na mesa, Na vida real as pessoas mantêm sua existência porque adaptam a natureza às suas demandas no processo de trabalho, A produção PSICOLOGIA PEDAGÓGICA humana distingue-se por seu caráter coletivo e sempre precisa de um certo grau de organização das forças sociais como momento preliminar para seu surgimento. Em geral, existe nos seres vivos uma íntima dependência entre os organismos de uma mesma espécie. No entanto, as formas da comunidade humana são diferentes das formas da comunidade animal. A comunidade animal se baseia nos instintos de alimentação, defesa, ataque e procriação, que exigiem a colaboração conjunta de diversos organismos. Na humanidade, esses instintos Jévaram à formação e ao aparecimento da atividade econômica, que é a base de todo o desenvolvimento histórico. Marx dizia o seguinte: 201 co'', em C. Marx e F. Engels, O bras Escogidas, Moscou: Progreso, 1969, p. 441, Capo3, parág. 12.)5 Assim, o processo de produção adquire o mais amplo caráter social na humanidade e, nos dias de hoje, esse fato abrange o mundo inteiro. Disso depende que surjam formas mais complexas de organização do comportamento social dos homens, com as quais a criança se depara antes de enfrentar diretamente a natureza. Por isso, o caráter da educação humana é totalmente determinado pelo meio social no qual o ser humano cresce e se desenvolve. Entretanto, nem sempre esse ambiente influencia o ser humano de forma direta e imediata; essa influência também é indireta, através de sua ideologia. Chamaremos de ideologia a todos os [Na] produção social de sua vida, os seres huestímulos sociais que foram estabelecidos no manos entram em determinadas relações neprocesso de desenvolvimento histórico e que se cessárias e independentes de sua vontade, relações de produção que correspondem a uma cristalizaram por meio de normas jurídicas, redeterminada fase do desenvolvimento de suas gras morais, gostos artísticos, etc. Essas normas forças produtivas materiais. O conjunto desestão totalmente impregnadas pela estrutura de sas relações de produção forma a estrutura classe da sociedade que as gerou e servem para econômica da sociedade, a base real sobre a a organização de classe da produção. Condicioqual se ergue a supra-estrutura jurídica e ponam todo o comportamento humano e, nesse lítica e à qual correspondem determinadas sentido, temos o direito de falar do comportaformas da consciência social. [...]. Quando a mento de classe do ser humano." base econômica muda, isso atinge de forma Sabemos que absolutamente todos os remais ou menos rápida toda a imensa supraflexos condicionados do ser humano são deestrutura erigida sobre ela. Quando esses reterminados pelas influências do ambiente que sultados são estudados, deve-se distinguir sempre entre as mudanças materiais ocorrio mesmo recebe de fora. Visto que esse meio das nas condições econômicas de produção e social é de classe em sua estrutura, é natural que podem ser apreciadas com a exatidão próque todos os novos vínculos tenham a colorapria das ciências naturais, e as formas jurídição de classe desse meio. Por isso, alguns pescas, políticas, religiosas, artísticas ou filosófiquisadores não falam apenas de uma psicolocas, em suma, as formas ideológicas como os gia de classe, mas também de uma fisiologia seres humanos adquirem consciência desse de classe. As mentes mais audazes se referem conflito e luta para resolvê-Ia. [K. Marx, prea "uma total imersão social" [vsepropitannost] fácio de 1859 àtsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA C ontribuição à crítica da ecodo organismo e afirmam que nossas funções nom ia política.] 4 mais íntimas são porta-vozes dessa natureza social. Respiramos e efetuamos as funções esDo ponto de vista do materialismo histósenciais de nosso organismo sempre em conrico, Engels afirma que: sonância com os estímulos que agem sobre nós. [...] as causas fundamentais de todas as muQuando analisamos a psicologia do homem danças sociais e transformações políticas não contemporâneo, encontramos nele tamanha devem ser buscadas na mente humana [...], quantidade de opiniões alheias, de palavras mas na mudança do modo de produção e disalheias e de idéias alheias que não podemos tribuição. Não devem ser buscadas na filosoafirmar taxativamente onde termina sua perfia, mas na economia de cada época. [F.Engels, sonalidade individual e onde começa a social. "DeI socialismo utópico al socialismo científi-KJIHGFEDCBA 202KJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKI Por isso, cada pessoa na sociedade atual, mesmo sem querer, é inevitavelmente porta-voz desta ou daquela classe [social]. Já que sabemos que a experiência individual é condicionada por seu papel com relação ao meio e que o pertencimento de classe determina esse papel, resulta claro que este defina a psicologia e o comportamento do ser humano. Afirma Blonski: Portanto, não existe na sociedade nenhum tipo de leis imutáveis e universalmente obrigatórias do comportamento humano. Na sociedade de classe o conceito de "homem" é, na verdade, um conceito abstrato e vazio. O comportamento social do ser humano é determinado pelo comportamento de sua classe [social], e cada ser humano é, inevitavelmente, um homem desta ou daquela classe. Com relação a esse ponto, devemos ser profundamente históricos e colocar sempre o comportamento do ser humano em relação com a situação de classe em um determinado momento. Este deve ser o procedimento psicológico fundamental para todo psicólogo científico. Recordemos que a estrutura de classe da sociedade determina a posição que o ser humano ocupa no trabalho social organizado. Conseqüentemente, o pertencimento de classe determina de forma simultânea a orientação IzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ;j cultural e natural da personalidade no ambienf •. i II'j te. Blonski afirma o seguinte: r I I , I~ til I ! .~I I [...] todo ser humano é uma variação média, a mais freqüente, mínima, máxima, etc., desta ou daquela classe social. Deriva daí o fato de que o comportamento individual vai depender do comportamento da classe correspondente. o que ocorre é que o trabalho humano, isto é, a luta pela existência, adota necessariamente as formas da luta social e, em função disso, coloca massas inteiras em iguais condições, exigindo-lhes que elaborem formas iguais de comportamento. Estas constituem os credos religiosos generalizados, os ritos e as normas com as quais vive uma determinada sociedade. De maneira que, queiramos ou não, consciente ou inconscientemente, a educação sempre se orienta de acordo com uma linha de classe. Para um psicólogo, isso significa que o sistema de estímulos que forma os sistemas de comportamento da criança é integrado por estímulos de classe. Devemos levar tal fato em consideração quando a pedagogia atual lida com o velho problema de saber qual é o ideal da educação: de tipo internacional, humano em geral ou nacional. Deve-se ter em mente a índole classista de todos os ideais; devemos lembrar que os ideais do nacionalismo, do patriotismo, etc. são formas encobertas dessa orientação classista da educação. Por isso, para a nossa pedagogia, a solução adequada do problema não pode ser nenhuma delas. Pelo contrário, à medida que a educação atual for se adaptando à classe operária que invade a arena histórica, os ideais do desenvolvimento internacional e da solidariedade de classe devem superar os ideais da educação nacional e "humana em geral". Entretanto, isso não significa que a pedagogia moderna encare com descuido as formas nacionais de desenvolvimento. O que sucede é que as formas nacionais representam um inegável e grandioso fato histórico. Por isso, subentende-se que elas integram nosso trabalho escolar como condição psicológica inevitável. Tudo o que a criança assimila vai-se adaptando às formas peculiares de comportamento, linguagem, costumes, hábitos e gostos que ela percebe. Ao mesmo tempo, é importante evitar os erros fundamentais que a pedagogia geralmente comete nesse sentido. Em primeiro lugar, o desmedido culto ao caráter nacionalWVUTSR [n a ro d n o s t], que acentua demasiadamente o elemento nacional no comportamento e, junto com o nacional, cultiva o nacionalismo nos alunos. Em geral, isso está ligado a uma série de fenômenos negativos, sob a forma de rejeição a outras nacionalidades, patriotice, etc., isto é, à parcialidade com relação aos atributos externos e ostensivos da própria nacionalidade. O colorido nacional do comportamento humano representa, assim como todas as aquisições culturais, um enorme valor humano, mas só quando não se transforma em uma carapaça na qual o ser humano se fecha, como o caracol em sua concha, e que o isola de todas as influências externas. PSICOLOGIA PEDAGÓGICA Com freqüência, o encontro de diferentes culturas tem levado a formas mistas e falsas da linguagem, da arte, etc., porém também tem dado excelentes resultados no que se refere ao desenvolvimento de novas formas de criação cultural. A lealdade ao próprio povo é a lealdade à própria individualidade e é o único carni. nho de comportamento normal e autêntico. O outro perigo do nacionalismo é a excessiva preocupação com essas questões; de fato, as formas nacionais de cultura são adquiridas de forma espontânea e entram inconscientemente na estrutura de' nosso comportamento. Nesse sentido, tanto psicológica quanto pedagogicamente, o nacional não contradiz a Classe, mas ambos têm uma função psicológica muito importante.KJIHGFEDCBA AS FLUTUAÇÕES NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA O desenvolvimento infantil constitui o princípio básico da psicologia. Uma criança não é um ser terminado, mas um organismo em desenvolvimento e, portanto, seu comportamento vai se formando sob a influência da ação sistemática do ambiente e também com relação a vários ciclos ou períodos de evolução do próprio organismo infantil, que por sua vez determinam a relação do ser humano com o meio. A criança se desenvolve de modo desigual, paulatino, pela acumulação de pequenas mudanças, mas também aos empurrões, aos saltos, de maneira ondulatória; dessa forma, os períodos de auge do crescimento são acompanhados de períodos de estagnação e abatimento. Essa intermitência das flutuações rítmicas constitui a lei básica do comportamento da criança e se manifesta até em oscilações diárias e anuais. Por exemplo, Meumann pressupõe que a psique infantil se distingue por sua máxima intensidade no outono e no inverno; de outubro a fevereiro inicia-se a maior tensão das forças psíquicas; em março ela começa a declinar e se anula no verão'? Paralelamente às oscilações anuais, também se observam as diárias, de acordo com as quais a pedagogia propõe que as aulas sejam distribuídas de tal forma que, nos momentos de intensifi- 203 cação de energia, sejam pedidas as tarefas mais difíceis.srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCB É particularmente notório o prejuízo provocado pelas tarefas realizadas ao entardecer e à noite, no momento de máxima redução da energia, assim como depois do almoço, quando, devido à digestão, ocorre um considerável refluxo do sangue da cabeça e seu afluxo para o abdome . Aplicado ao desenvolvimento da criança, o princípio de periodicidade pode ser denominado princípio dialético do desenvolvimento infantil, pois não se realiza mediante mudanças lentas e graduais, mas com saltos em certos pontos nodais, em que a quantidade se transforma em qualidade; e temos o direito de diferenciar períodos qualitativos do desenvolvimento infantil. Tudo acontece da mesma forma que ocorre com a água: com um esfriamento uniforme, no ponto de congelamento começa a se transformar em gelo e, com um aquecimento uniforme, passando pelo ponto de ebulição, de repente começa a se transformar em vapor. Em outros termos, o processo de desenvolvimento da criança, como tudo na natureza, também ocorre de formatsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGF dialética, mediante o desenvolvimento de contradições e a passagem da quantidade para a qualidade." Aristóteles estabeleceu, de modo geral, a passagem de uma etapa para a outra e, em geral, isso coincide com as graduações com as quais todos estão mais ou menos de acordo." Agora diferenciamos quatro etapas de evolução básicas no desenvolvimento das crianças. Cada uma delas possui seu significado biológico e, assim, sua relação peculiar com o ambiente. O primeiro período pode ser denominado período da primeira infância, no qual a atividade da criança é quase nula. Suas funções biológicas estão determinadas, sobretudo, pela alimentação: a criança come e dorme, cresce e respira, e sua conduta está totalmente definida por essas funções essenciais. Por isso, se desenvolvem as formas de comportamento que a ajudam a realizar essas funções. Quase todas as reações infantis desse período se destinam a familiarizar-se com o meio. Nessa etapa, a criança já evidencia uma série de reações ligadas ao jogo. Elajoga, orienta-se no ambiente e exercita seus principais.órgãos de percep- I II I 204KJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH ,!i I I , , i li'1'' VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ção e movimento. Principalmente nesse período ocorre um acontecimento sumamente significativo na vida da criança: ela aprende a controlar seus movimentos, pela primeira vez coordena a atividade de olhos e mãos, aprende a inclinar-se rumo a um objeto que está diante dela. Nesse período está isolada do meio pelos adultos, que realizam em seu nome as funções mais importantes de adaptação ao ambiente. No entanto, elajá está sob a influência do meio de seus seres mais próximos, do entorno e - o que é fundamental - do papel que tudo o que a rodeia desempenha com relação a ela. Por isso, para a criança, a mãe ocupa o primeiro lugar e, conforme a acertada expressão de um psicólogo,"? ela representa o primeiro meio social para a criança. Um salto abrupto nesse período é o aparecimento da primeira dentição, quando a criança modifica sua relação com o ambiente ao passar para uma alimentação diferente. Em geral, todo o período da primeira infância, rico em acontecimentos, no qual a criança aprende a caminhar, falar e movimentar-se, depende da orientação inicial do ambiente e se estende, portanto, mais ou menos até os 6 ou 7 anos de idade. Nessa etapa de crescimento ininterrupto, a criança aprende a dominar todos os seus movimentos e suas relações com o meio são determinadas pelo fato de que o meio chega a ela através dos adultos. Alguns psicólogos denominam toda essa etapa de "período do jogo". Surge então uma pequena crise, uma detenção do movimento que representa uma espécie de um ponto de ebulição ou de congelamento, após o qual se inicia um período novo, qualitativamente diferente: o da infância tardia, dos 7 aos 13 ou 14 anos. A criança adquire todos os hábitos necessários para se transformar em adulto. As formas de seu comportamento se tornam mais complexas, e ela estabelece novas relações com os que a rodeiam. Uma espécie de nova e segunda onda a impele de forma incisiva para o mundo, para uma relação mais estreita com este. Esse período acaba com a época do amadurecimento sexual, que todos os psicólogos reconhecem como uma etapa trágica na vida da criança. A mudança torna-se evidente em todos os âmbitos: na voz, no rosto e na estrutura corporal. Como diz [M. M.] Rubinstein: [...] quando todos os membros, em sua correlação, parecem estar em uma encruzilhada: abandonaram a etapa da integridade infantil e ainda não conseguiram estabelecer com firmeza a sólida harmonia do corpo maduro. Esse período caracteriza-se pelo maior conflito com o ambiente. É acompanhado de comoções internas e externas e, com freqüência, também nele surgem doenças que se desenvolverão posteriormente e perturbações do organismo que permanecerão a vida inteira. Isso acontece porque o instinto, tempestuoso e forte, que subitamente se manifesta no corpo, está condenado à inação e, por isso, surge um grave conflito entre a criança e o ambiente, assim como dentro da própria criança. Essa fase se destaca por uma excitabilidade extraordinariamente elevada e por atitudes desajeitadas, ou seja, por uma espécie de permanente consciência de falta de adaptação ao meio. Por isso é, no sentido cabal da palavra, uma idade crítica. Também é uma fase decisiva para a educação, no sentido de que são estabelecidas as formas básicas de sublimação, devido à exteriorização da energia sexual substituída pela sublimação alcançada por meio da educação. Depois dessa etapa vem o período da adolescência, dos 13 aos 18 anos, caracterizado pelo estabelecimento definitivo das relações com o ambiente. Isso se torna visível pelo fato de que, no período do amadurecimento sexual, desenvolve-se a última terça parte do peso total do cérebro. A primeira terça parte já é encontrada no recém-nascido; a segunda cresce durante toda a infância, até os 14 anos. Após esse período e até os 18 anos estende-se a etapa da juventude, na qual a incorporação ao meio é definitiva. Todas essas divisões devem ser consideradas como certas designações convencionais, que não possuem limites totalmente exatos e que são acompanhadas de uma série de peculiaridades psíquicas transitórias, inerentes, em grande parte, a cada uma , dessas idades. PSICOLOGIA PEDAGÓGICA Como exemplo, observemos o período de negativismo infantil na vida das crianças em idade pré-escolar. A manifestação mais eloqüente de negativismo é o prazer que se obtém com as disputas, a negação e o comportamento contra algo. Alguns psicólogos consideram que esse período abrange dos 3 aos 5 anos, mas, de acordo com certos fundamentos, cabe pensar que também está presente em uma idade posterior, podendo ser encontrado de forma mais sutil em crianças de 7 ou 8 anos. Podemos pensar que o significado psicológico dessa conduta reside ira virada que se acentua na criança com o aumento de sua atividade com relação ao meio. Diante de qualquer situação, essa criança diz: "me deixe sozinha" e sofre continuamente a "coceira da negação". Quando nos aproximamos dessa criança, basta dizermos "sim" para ouvir como resposta um taxativo e decidido "não". Um segundo depois, nosso "não" é respondido com um "sim" categórico. Se a criança estiver usando urna roupa branca, é suficiente que nos aproximemos e digamos "você hoje está com uma roupa branca" para que ela responda: "não, é preta". [M. M.] Rubinstein afirma o seguinte: 205 contagiou toda a classe e a professora, que em geral mantinha boas relações com a classe, não pôde fazer nada contra esse ataque de negativismo. Mas o mais curioso de tudo é que esse caso pôde ser resolvido sem dificuldade logo que a professora, seguindo a proposta do autor, também começou a escrever no quadro-negro da direita para a esquerda. Nesse mesmo dia as crianças retomaram à escrita normal.'? Esse negativismo é só um caso particular da manifestação de falta de adaptação geral que constitui uma característica básica da infância. No momento do nascimento e no decorrer de toda a infância, a criança é um organismo sumamente desadaptado, não-equilibrado com o ambiente. Por isso, ela sempre precisa de um equilíbrio artificial, com a ajuda dos adultos. Por isso, ela é o ser mais emocional e deve rir ou chorar, raramente permanece neutra, pois as emoções são pontos de desequilíbrio em nosso comportamento quando nos sentimos pressionados pelo meio ou quando triunfamos sobre ele. * Devido a isso, a marca da tragédia nunca pode ser apagada dos processos do crescimento e da educação infantis, e o ingresso da crian- Nesse período é freqüente que as crianças res.N. de R.T.Vigotski não chegou a elaborar um sistepondam tanto aos pedidos quanto às ordens, ma completo de periodização do desenvolvimento e inclusive aos simples chamados, com uma psicológico, mas lançou as bases sobre as quais suas negativa: "Volodia não", "mamãe não", etc. teses foram desenvolvidas por colegas como Leontiev Certa vez uma mãe recorreu a mim em busca e discípulos, como Elkonin e Davidov. Na sua de explicação, sumamente confusa devido ao periodização Vigotski destaca: a) a análise da esseguinte caso, que representa apenas uma forsência do processo de desenvolvimento e não seus ça aguçada desse período crítico. Seu filho desrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA traços externos; b) a análise das mudanças nas ati4 anos respondia sempre com uma negação, vidades da criança porque sua persônalidade muda correta ou não, mas ao mesmo tempo não se como um todo integral em sua estrutura interna no negava a fazer o que lhe era pedido. Certa percurso do desenvolvimento; c) o realce da ligavez, na hora de dormir e diante da proposta ção entre cada um dos períodos com um tipo de de rezar junto com a mãe a oração habitual, atividade que o caracteriza e; d) a idéia de que as realizou o que lhe pediam de forma totalmenatividades integrais da criança, ao determinar as te inesperada: "Não pai, não nosso, não estás, transformações psíquicas, determinam também sua não no céu", etc." consciência e suas relações com o meio, sua vida interna e externa. O leitor interessado na periodizaFatos semelhantes, embora talvez em forção do desenvolvimento psicológico sob o ponto de mas menos agudas, são encontrados com f vista da psicologia histórico-cultural poderá consulqüência. O autor observou como uma mer O bras escogidas, tom o N . Visar, tar: Vygotsky, L. S.tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHG 1996.; Davidov, V.La enseiianza escolar y el desarrollo que estava no período negativista copiava ( psiquico: investigaciâti teórica y experim ental. Mosestava escrito no quadro-negro em ordei cou: Editorial Progresso, 1988. , versa, da direita para a esquerda. Seu exeKJIHGFEDCBA .::· .r· · · .~. ~-:or-·· 206srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 4. Na edição norte-americana, Silverman acrescentou erroneamente, como fonte da citação: "(D as C apital)" (sicl) no corpo do texto, como se fosse uma referência feita pelo próprio Vigotski. No original russo, Vigotski não apresenta nenhuma referência e, se o tivesse feito, nunca teria confundido sua procedência, por mais descuidado que fosse, nem teria cometido o erro ortográfico de escrever "Kapital" com "C". 5. Friedrich Engels (Alemanha, 1820-1895, LonNOTAS dres) foi o mais íntimo amigo e colaborador de Marx. Ambos assentaram as bases teóricas 1. Apesar das múltiplas exegeses e revisoes da e práticas do comunismo moderno. Este texto foi escrito no início de 1880 e publicado nos teoria da evolução de-Darwin, realizadas durante um século, continua em vigor otsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA núcleo números 3, 4 e 5 da Revue socialiste; sua primeira edição como folheto foi feita em franduro da mesma: as categorias de m udança e cês: Socialism o utopique et socialism o scientiadaptação, como recentemente afirmou fique, Paris, 1880. Esta obra é uma separata do Stephen Jay Gould em sua polêmica com Daniel Dennett, em vários números da revista livro de F.Engels, H errti Eugen D ührings U m w i i l The N ew York Review of WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA B o o k s , durante 1998. zung der W issenschaf [La subversión de Ia ciênCf. também a nota nº 10 do Capo 2. cia por el seiior E. D ühring], mais conhecido 2. Neste capítulo, todas as vezes que Vigotski como Anti-D ühring (cf México: Grijalbo, tramenciona Zalkind, refere-se a seu artigo, dução de Manuel Sacristán, várias edições). A também publicado como folheto, A. B. citação de Vigotski apresenta algumas diferenZalkind, "Freidizrn i Marksizm" [Freudismo ças com o que Engels escreveu: "I ...] as causas e Marxismo"], Krasnaia Nov, n!!4, 1924. Para últimas de todas as mudanças sociais e de touma visão marxista da psicanálise na Rússia das as revoluções políticas não devem ser busdos anos 20, cf, L. S. Vigotski, EI significado cadas nas cabeças dos homens nem na idéia histórico de Ia crisis de Ia psicologia, op. cit.; que eles forjaram da verdade eterna e da etertambém M. Bajtin/V Voloshinov, Q ué es el na justiça, mas nas transformações realizadas lenguaje y otros textos inéditos, edição de G. no modo de produção e de mudança; não deBlanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998, p. vem ser buscadas na filosofia, mas na econo79-126. Como se vê nesses textos, a psicanám ia da respectiva época". lise deixou de ser considerada filosoficamen6. Neste parágrafo, o grifo é nosso . te "materialista", como diz Vigotski aqui, e 7. Meumann se refere ao hemisfério norte. foi caracterizada como "idealista". 8. O grifo é nosso. Essa noção da dialética é de Aron Borisovitch Zalkind (1888-1936), psiquiaEngels e não, como alguns poderiam supor, de tra e educador soviético, foi um dos primeiros Hegel. Cf. F.Engels, D ialéctica de Ia naturaleza, a aderir e a divulgar a teoria de Freud na URSS. México: Grijalbo, várias edições. 9. Aristóteles (384-322 a.C) foi o filósofo e o bióloZalkind foi médico do Instituto de Psicogo mais importante da Idade Antiga. Darwin esneurologia de São Petersburgo (1911-1914), creveu a A. W. Ogle em 22.02.1882: "Linneo e diretor do Instituto Clínico de Psicoterapia Cuvier foram meus deuses [...], porém eles eram (1917-1921) e professor da Universidade de simples escolares ao lado do velho Aristóteles". Moscou. Foi autor de vários livros. Em 1936(Cf. Ch. Darwin, M em oriasy Epistolario, Buenos ano em que as obras de Vigotski foram proibiAires: Elevación, 1946, p. 271). Essa referência das -, Zalkind foi vítima do terror stalinista, de Vigotski é vaga. Por um lado, Aristóteles connão suportou a pressão dos ataques ideológisidera o futuro da natureza e destaca as quatro cos e pessoais que sofreu e se suicidou e, por isso, foi póstuma e publicamente insultado. causas que agem nela, em sua Física. Por outro, em De anim a e outras obras, reconhece quatro 3. Zalkind refere-se a uma oposição políticajust~ funções principais em sua concepção biológica e em condições de ditadura totalitária, COIT' ocorreu na Rússia do czar Nicolau 11. psicológica - utilizamos termos atuais, pois para ça à vida foi e sempre será um processo de dolorosa ruptura e de criação, de dilacerações e geração de tecidos. Bühler está totalmente certo ao dizer que "a transformação de nossas crianças em homens é o maior de todos os dramas do desenvolvimento". Como um dente que vai cortando a gengiva, a criança entra com dor e força na vida.KJIHGFEDCBA . 1... .h '1 '\ • I ".>";f- PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 207 ele não existia essa separação - isto é, a nutrição, cheskoi psijologui v sviasi obshchiem pedagoguik a sensação, o movimento e o pensamento. Para [Ensaio de psicologia pedagógica em relação com uma compreensão da concepção aristotélica da a pedagogia geral], Moscou, 1916. filosofia da natureza, da biologia e da psicologia, 12. Vigotski foi um terapeuta e um psicopedagogo cf. W D. Ross,tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Aristóteles, Buenos Aires: Charcas, notavelmente criativo. Entre outros, Luria de1981, p. 94-22l. clarou isto em suas memórias (Cf. A. R. Luria, M irando hacia atrás, Madrid: Norma, 1979). Cf. 10. O psicólogo ao qual Vigotski refere-se aqui é Pavel Blonski. também L. S. Vigotski, La G enialidady otros tex1srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L É provável que o texto de M. M. Rubinstein tos inéditos, edição de G. Blanck, Buenos Aires: aqui citado por Vigotski seja O chierk pedagogi- KJIHGFEDCBA Almagesto, 1998, p. 13-36. '-J2 o Comportamento Moral KJIHGFEDCBA Na escola espartana, as crianças eram A NATUREZA DA MORAL DO PONTO DE obrigadas a servir a mesa durante as refeições VISTA PSICOLÓGICO tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r dos adultos. A criança tinha de roubar algo da mesa, e era castigada tanto se não podia fazêda educação moral perten10 quanto se fosse surpreendida em flagrante. ce às questões que atualmente estão sendo O objetivo moral dessa tarefa consistia em rourevistas pela psicologia e pela cultura, do bar e não ser surpreendido. Esse ideal corresmodo mais decidido e profundo. O nexo milenar entre a moralWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [m o r a l] e a religião depondia plenamente à ordem comunista da Esparta aristocrática e fechada, I onde a preosapareceu e, submetida à pressão da análise, a moral começa a adquirir cada vez mais um cupação com a propriedade não constituía uma caráter terreno. Sem dúvida, foi possível esnorma de moral e, por isso, o roubo não era tabelecer sua origem na experiência, na Terconsiderado um vício; no entanto, a força, a ra, sua dependência das condições sociais e habilidade, a esperteza e o autocontrole eram históricas e seu caráter de classe. ideais dos espartanos; consideravam que o peCada povo, cada época, assim como cada cado máximo era não saber enganar ao outro classe [social] tem sua própria moral, que seme não saber se dominar . .pre é produto da psicologia social. Conhece-se Em cada escola, a educação moral tama moral dos hotentotes que se exprimia em sua bém coincide plenamente com a moral de clasresposta à pergunta: que considera bom e se que a orienta. Na França, onde foram imruim?srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA "É bom - respondia um hotentote plantadas aulas especiais de moral, são utiliquando eu roubo uma mulher; é ruim que ela zados manuais em que o ideal da educação são seja roubada de mim." as virtudes burguesas que impregnam o espírito e a mente da classe média-alta francesa. Em cada meio social modificaram-se os conceitos e as noções morais, e aquilo que em Por exemplo, em um manual de moral francês uma determinada época e lugar era considequase não existem "critérios de moralidade", rado ruim, em outro lugar podia ser considecomo relata M. M. Rubinstein; em vez deles, exalta-se a economia, e seu índice é a cadernerado o maior dos méritos. E, se em todas essas diferentes manifestações da consciência mota de poupança. Tais ideais de classe também são inerenral se destaca alguma característica comum, isso só ocorre porque nos sistemas sociais tamtes a todos os demais sistemas de educação. bém existiram elementos comuns. Isso também ocorria no ensino médio [ginásio czarista], estruturado com base nos princípios Portanto, do ponto de vista da psicologia social, a moral deve ser considerada como certa autoritários, nos quais a obediência era consiforma do comportamento social que é elaboraderada o ideal do aluno, e os objetivos gerais da e estabelecida em prol da classe dominante, e da educação consistiam em formar um súdito fiel ou um funcionário pontual. é diferente para as diversas classes. Por isso, sempre existiu a moral do amo e a moral do escravo Agora, quando o mundo vive a tormenta e, por esse motivo, os períodos de crises foram depuradora da revolução social;" quando estretambém os de maior crise da moral. mecem os próprios pilares da moral burguesa, o problema . f I 210 srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA talvez em nenhum outro terreno tenhamos nobiu cortar. Tanto naquele momento como nos ções tão confusas e cambaleantes como no das dias de hoje o ser humano era atraído por qualnormas morais. Desaparece uma série de regras quer ato, mas era impedido pelo temor à expia~ de m~ral burguesa, impregnadas de hi~ocr,isia @.Q~ao~iKQ - no primeiro caso, inter-;O;no "'~ e falsidade. A moral burguesa era obngada a segundo, externo. O preceito moral "não mataJjngir, porqueensmava uma coisa e fazia outra, rás" sempre era entendido exatamente nesse porque estava construída-sobrea-nrnltaçãõaos sentido, não por sua validade intrínseca, mas interesses de classe e, enquanto apregoava o porque a pessoa que o infringisse se perderia reinado de Deus no além, implantava o reino devido aos tormentos de sua consciência. dos exploradores na Terra. A fonte natural desDostoievski, emtsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFE C rim e e castigo, evidencia essa ~,(:l__moral foi a mentira ea--hípocris-ia~O contradição interna da moral burguesa. Na refari~~-~;n(;'-;ra--se~-[ne'vlúiveracom'pã-~h-a~te. belião de Nietszche, todo o trabalho crítico neEnquanto as crian as viam uma coisa na vida e gativo do pensamento, dirigido contra a moral ouviam [Óutra coisa diferenl~ através das palaburguesa, continha tamanha força explosiva que vras, todos os esforços da escola destinavam-se P~~Q~~~~,tr1!jç~.~~-EU~~?-.~9,~~tã, a conciliar essa divergência entre a vida e a ~rA>,E~Dtr.Q, / -1> \)~ ""9\70 ÀL.-GUI"'\ moral da maneira mais fácil para a criança. A nova moral será criada quando tarnA criança não conseguia conciliar essas bém se criar uma nova sociedade humana," duas coisas ou, se aprendia a fazer isso, passamas então é provável que o comportamento va a considerar a moral uma forma de cortesia moral tenha se diluído totalmente nas formas social, cuja observância era exigida a todos, gerais do comportamento. Globalmente, toda mas de fato esse ponto de vista lhe exigia um a conduta será moral, porque não existirão fungrande esforço. A consciência moral das criandamentos de nenhuma índole para conflitos - - -----ças reduzia-se à convicção da camareira de ~,ntr~ o ~_~mportamento de um§l,pessoa e ,o_ele Griboiedov: "não há nada de mau no pecado, .toda a 'sociedade-o - ----- -WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA o que está errado são os mexericos't.t-> ,~cccC"'/;i):~), Agora vamos apontar alguns pontos que Além da opinião pública, o medo à expia ~ogia ~erá de enfrentar. ação moral tinha se transformado em sanção O primeiro deles reside na negação da oriobrigatória da moral e, em sua conduta psicogem absoluta, metaempírica, da moral ou de lógica, o ser humano era guiado pelas mesmas qualquer sentimento moral [que se pretende] re~s poli~~~: ~1!:.~Q_Q2.~e, aq,:!g.?_~i_~.E, ~ Do ponto de vista psicológico, o comporexatamente do mesmo modo, em geral, ele tamento moral, corno qualquer outro, depende orientava seu comportamento. Um filósofo das reações instintivas e congênitas, porém é russo denomina acertadarriente essas noções elaborado sob a influência das ações sisternátifu~morais de "polícia moral", porque a força das 9~do_ambi~!1_t~. Não há dúvidã-deqüe: leis morais era baseada na ~},!!0_~ __ e damento de um ~ J . ~ ~ ' encontrarehumilhante do medo do castigo moral e dos mos uma simpatia instintiva por outra pessoa, ~~~ - _ ..•... _--~~~~-' tormentos da consciência. Surgiu assim uma bem como o instinto social e muitas outras coimoral peculiar dos fortes e dos fracos e, como sas. Durante o processo de crescimento, quanocorre com relação à lei externa, os fracos se do se deparam com todos os fatos, conceitos e submetiam às leis da consciência, enquanto os fenômenos possíveis, essas reações inatas vão Ifortes se rebelavam e as infringiam. Afilosofia se transformando nas formas condicionadas de 'européia, em rebe1i~contra a moral bl.!Igll.e- comportamento que chamaremos de morais. ~ proclamava a imoralidade como sua lei fun- 4 Q-yodemos extrair a conclusão, portanto, de \damental, enquanto declarava, por meio de que o comportamento moral é um comportaINitzsche, estar além do bem e do mal." mento que pode ser educado, exatamente como Shestov" afirma que a atitude do ser huqualquer outro, através do ambiente social. mano com relação ao imperativo categórico" é (j)A segunda característica consiste na instotalmente similar à atitude do camponês russo tabilidade da moral nos dias de hoje. Por um com relação à floresta que Pedro o Grande proilado, precisa-se de audácia revolucionária, deirJ .-,,,,_ """.~ ~ no ...•••...... I .........•. -,~.", ... . ...•..•.....•.•. --_. PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 211 srqponmlkjihgfedcb /zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA xando de lado os conceitos pequeno-burgueses, para discemir o que ocorre, seu verdadeiro significado, para poder abandonar os preconceitos que todos consideravam dogmas morais imutáveis até pouco tempo atrás. ~ ~?~_J(lS)4p de i a anterior, da mor ~ deve ser de initivamente varrida da escola. Por outro lado, porém, nessa instabilidade da moral de nossa época também reside um certo perigo, isto é, a rejeição de toda ~ontenção moral e a plena arbitrariedade no comPortam-en'-to infantil. Deve-se levar em contaque uma cornpleta amoralidade, uma absoluta falta de princípios moderadores, nos leva de volta aos ideais ingênuos e há muito superados de seguir os 'f-instintos naturais, e com isso o ho~ -(l'---~,-,-",~ temporâneo não pode concordar de forma alguma. Não podemos aceitar a cega observância das demandas de nosso instinto, porque sabemos de antemão que essas exigências são geradas por épocas anteriores, constituem um resquício dajá passada experiência de adaptação a condições ambientais que desapareceram e, portanto, não representam um passo para a frente, mas para atrás. Por isso, a inevitável limitação e a adaptação das pulsões às ~S~ de vida são e~~~~~,E~- como nenhuma outra cria tantos perigos de _. O único critério a ser utilizado é incorporar-se ao espírito da época, às grandes correntes que impregnam o mundo. Ao mesmo tempo, a percepção meramente estética~ ~a ~ da revolução, co~~da apaiIxonadafiiéfifé por Blok" quando se dirigiu à intelectualidade russa: "com todo o corpo, com todo o coração, com toda a consciência, escutem a revolução", não pode ser a base da educação moral, pois só o fato de escutar aWVUTSRQPO revolução não leva ao contato vivo com ela, e ~~ o chamamento do poeta, aplicado às nossas crianças, deve ressoar de tal maneira que seu f'l' significado não exprima a exigência de escu- -,;:- --tar, mas <!-VCsz.IDP9!_~)soaln:ente a rpjI~Lca(' b,. ~-~---~J \ I I J ~~~®. --' 6JA terceira característica fundamental da educação moral em nossa época consiste em que \riJO,0i1distinguir o !~?-Ç9fUl)A~,en~~ está sendo criada diante áe nossos olhos. A ! fZS'i.J_ ~ e a ousada ~~ L (J ? J ~ !eahdaªe ~r~em toaasas mais difíceis e , ~ : J confusas situaçoes da vida é a primeira exi- . 'f' d '" gência da moral revolucionária. A educação) ,1)moral nunca pôde chegar a uma verdade tãotsrqponmlkjihgfe 'JI decidida e implacável como agora, quando esremntórias daeducacão. ~;ttão colocados na mesa e foram desmascara-z / ~~ ~~~ Conseqüentemente, nesse caos instável dos, em seu verdadeiro conteúdo, absolutarepresentado pelo estado atual da moral, de mente todos os '~alores" morais que estavam qualquer forma deverão se destacar algumas das disfarçados normas fundamentais do comportamento social/I Também nesse âmbito, como em todos humano. Não compete à psicologia pedagÓgiCã'{' os outros, a época revolucionária mal é capaz se ocupar da definição exata do conteúdo e da de promover os sistemas terminados de moral qualidade dessas normas morais, pois essa é dos quais as épocas anteriores puderam se jacuma preocupação da ~a soDa!\. A tarefa da tar. Em troca, porém, podemos propor à nossa psicologia é somente a de avaliar as possibilieducação moral algumas exigências que ~ 1.4dades de pô-Ias em prática no mundo real. muito mais longe que as de éQocas anteriores. ( I Devemos lembrar que, com freqüência, Podemos exigir que a educação soviética Bl$_/ as épocas revolucionárias de ruptura e derropar~~~eX.?-~2!~L ~,9~~~~l~JLqLe,-~~~ 0') cada da velha ordem social apresentam tama~ucionarios. Não se deve propor o ideal abs-I- -' nha combinação de diferentes culturas morais de uma personalidade perfei-j que ode ser muito difícil que a criança consi- ' ta porque ela não existe, e esse tipo de educaga se orientar essa confusão. As crises morais 'ção esquece as metasatuais e se ocupa de futia espreitam a cada passo e, por isso, o pedagolidades. Estamos diante dos fins concretos de go e o professor não podem de forma alguma preparar pessoas para a próxima época, pesse desentender das questões da educação mosoas da próxima geração, em plena corresponral. Nenhuma outra época cria possibilidades dênci,a com o papel histórico que terão de de~j tão brilhantes para o heroísmo moral, assim sempenhar. Por esse motivo, o caráter extre- l ))/1 y , V'--.~ trfunrâcr~a:o 212 L1EV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA dem literalmente do fato de ele encontrar umatsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA denom inação correta para toda a situação. Se afirmar que é uma pena perder uma boa bebida já servida, ou que não deve ser rude nem antipático quando está entre amigos [que bebem], ou que considera tentador OS PRINCíPIOS DA EDUCAÇÃO MORAL conhecer uma nova marca de uísque que nunca encontrara antes, ou que tem de parA primeira questão que levantamos aqui ticipar de uma reunião social, ou que é pretem a ver com a relação existente entre a educiso beber para reforçar definitivamente a cação moral e a cultura geral da personalidadecisão tomada, está perdido; com sua escode. Nesse problema,(10Is~assumiu o ponto ~ lha de uma denominação inC:Q;r~iª~~I~~iS.~ide vista da ~. Segundo ele, / 'i;:);-:; Q~~~a-prÓpriã·se-ntê·nça.E~ compensaçã~ J I t ~ , : ( - ; se, apêsar-:aetoda~'-denominações plauno mesmo lugar onde prosperam as formasWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA superiores da cultura também prosperam as \ ~ I . - i; t f r síveis, sugeridas abundantemente pela imal ginação excitada por sua dependência do formas mais elevadas de ~~ade. Daí sãosrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA extraídas conclusões similares às de Rous- J . álcool, ele escolhe uma denominação feia, porém mais acertada, sem vacilar, e começa a seau,"" que afirmam que o ideal moral não está adiante, mas atrás de nós, e consiste em negar (,::~~> se dizer: "sou um bêbado, sou um bêbado, . '1' t nat /' sou um bêbado", então ele está trilhando o a CIVIizaçao e re ornar a na ureza. (Ií' _ É id . , . , fi ,,\,\--\\0 caminho da salvaçao; quando pensa corretamente está salvando a si mesmo. tw James, eVI ent~ ue esse <:nteno .esta em .a-\~;;C;' g~a~te contradição com a ~logla rev2h!go- / c ' "K Talks to teachers ... , op. cit., p. 110.]12 ~, que pressupoe que ~~~ T vAyJro da humanidade está na forca e rià domina~-./',/'-~~~~r--I'./'~~~~"". Portanto, aqui tambem se estabelece de çao 49- ser human~ dgtjl-<Í-Q.-decllLtura sobre a" . . -~ ~~~.J' , ~. "-~~ / certo modo uma çompleta ldentldade entre a I [C . natureza. Entretanto, na crínca de Tolstoi a cul-: d t I ~ . .r-: , con u a mora e a consClenCla mora. onntura ha uma semente plenamente salutar e, com -~--J -] --, ----------' . d nua ames:: .' a Igumas ressa Ivas, essa cntica po e ser adotaL? P l) \ j \ 'DO(-;/~ \vtJlf\ \7 f - ~ '~ ~ da se levarmos em conta o fato de que deve se ,-.. - "referir não a uma cultura em geral, mas à culNosso esforço moral, no sentido próprio da , -. palavra, consiste apenas em se aferrar à idéia tura c!!p'gal!sta em partic1!@r. E verdade que, nos níveis superiores da cultura humana, as conapropriada. Por isso, se lhe perguntam em qu~ ç2!!s.~f..e __S U : l: f g ! L m org.l reduzida à suarorrriâ tradições morais alcançam seu ponto mais alto rfiaís-i'-iiiipleserrrals elementar, pode dar apequando uma aldeia de [homens primitivos] selnas uma resposta. Pode dizer que consiste no vagens apresenta um clim moral m is norm I esforço de atenção com cuja ajuda retem os cerque~~~. Mas só podemos conta idéia na mente, pois, sem esse esforço da ci-Girdaí que a cultura européia sobreviveu a si atenção, [essa idéia] seria deslocada por oumesma, e não que a ~~~E_a__ ~~~ ..K~itras tendências psíquicas presentes. ~ nica..J-mQ.~L Desde a época de Sócrates se .", I~R~~V?'.-~~~3~~~~g promove a opinião contrária, que identifica o j~~~m~Eia; [Ibidern, p. 109-110.] mamente concreto e a veracidade transformar na base da educação nossa época. devem se moral de ú:r.:~:~. à 9 i- > . ., A' -(» comJ1ortamento moral com a consciência mol ra_~ Sócrates disse "a moral é o conhecimento, enquanto a imoralidade é fruto da ignorância". 11 Aqui está implícito um sério problema psícológico que devemos compreender. James afirma 1 o seguinte: Para encontrar solução para esse difícil problema, devemos acrescentar que existem fatos que mostram, justamente, a relação inversa entre a consciência e o comportamento moral. ~:\ ~~o:~-=r~_~~~~~~ __ ~~~~_~~.ber ~~Jum ãC õisa ~ <i(.,lcompreenaer como se deve agir; e outra !?tal) Representa um exemplo de vacilação moral o que acontece com o bêbado [alcoolista] que decidiu se corrigir, mas é atraído de novo pela bebida. Sua vitória ou derrota moral depen- bE~~j.j!e~E.~~~ __ ~~_ir~º-.rKet<!...~~!!!ú!óae.mo.s compreender facilmente que o aleool e prejudicial e, apesar disso, não ~er forças suficientes para renunciar à bebida. E evidente que aqui a J; PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 213 consciência desempenha certo papel, porém não portamento, ainda que isso não signifique explicar [o caráter] dessa relação. o mais decisivo, sendo apenas um dos vários Podemos nos convencer disso se observarcomponentes e que, com freqüência, cede a outras pulsões instintivas mais poderosas. Pormos ~ente atrasadas. sabemos} tanto, não basta levar à consciência a represenque ~. e,.n. Y.~lv~m, __,e!l,' ~~~~.ualQOde se CQIll- A tação de um procedimento correto, mas é mui-tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA binar com a maiC?,~.d-ª~jm91-ªlid_,!Q.e.~~tantõ~eie'sozinho Ilªº ..garante um.compcrtamenC ~ to mais importante ~~~~to to_~~ral. I~~bé~ sabemos que o comportamen~ng~ciêucia. Garantir signito moral pode ser brilhante e concomitante com ~l'\O fica @!kamzarlde tal maneira a consciência da um marcante atraso da inteligência, que as criansrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ~ça que ela possa tri1Infauobr~ ças atrasadas podem evidenciar uma verdadeira \ s~us dese~os e te?dências [prejudiciais], conse sutil inteligência do coração e, assim, o desenvcientes e inconscientes. volvimento mental também não pode ser adrni- l \ i 1 A ~ De novo, a questão ~~~~ não se reduz apenas à consciência. James tem razão quando, ao .-!is!.9_~.C?mo SQDQiçªo neç~~s_<[email protected].~s_AÇ>!.e,HnQrªis~ 7 Cv' ~~stados psíquicos de um alcoolista, No entanto, temos o direito de afirmar que há~ !\n diz que sua vitória e sua derrota morais deuma profunda relação entre ambos, e que o de-:~ \ ! senvolvimento intelectual é um requisito propí l ~ _ pendem por completo da ~enÇ>minaçã~or~::, ta que ele det--ª.,~~ll~~. Mas ainda cabe ~ pa§-ª-~ª~~a.,c;.~.9 !:!:9E~ --.__ Essa relação implica uma vida mais sutil, que nos ~guntemos de que depende esse esformas mais complexas e diversas de comportado. Subentende-se que essa pergunta só pode tamento e, conseqüentemente, admite muitos ser respondida no sentido de que o surgimenmais casos e possibilidades para a ingerência to destas ou daquelas representações na conseducativa. Na criança pouco desenvolvida ciência depende, por sua vez, dos diversos estímulos que o precederam, um papel que cosmentalmente, o processo do comportamento cJ:ir." tuma ser assumido pelas pulsões emocionais é muito mais simples e, por isso, não dá espa- ~ ço para as SQ!Dbinações infinitamente mais~ .;t'~ intensas. çº!l~~.<lº~nt~.m~~ só podemos nos ~om..plexas qu~devem ser suscitadas nas crianreferir à ~nfl~ê~~~_S.o!!sçi~I)!~ quando a compreendermos como algo liR~dq-ª-o sigema ner~s para infll!enciar s.1:l-ªCOIlQ.utª-. r;~:I.J Entretanto, para a moralidade é decisiva a -P voso, como um sistema de reações exatam-én------------consciência que está diretamente vinculada ao te iguais às que formam todo o comportamen----'comportame'iitOesereãIíZc:latravés da atividato, mas estamos falando apenas daquelas reade. Se is!?o nao acontecer, uma consciência corções que freiam e regulam o resto do comporretapoêIêlevaracõmport;-~e;;:t~s inê'õrretõs.' tamento. Em outros termos, só a compreensão r-o Põrisso, devemos considerartotalmente da consciência como forma prévia de organização do comportamento pode nos explicar o infrutíferas as tentativas d~~~, de pre~~oral: A moral tem de constitulf'l iif -P.~~~L9,~cJ~s~i~r::~~'p3E~a~_~!j~,:~_~~~~a parte ms~'ãi-ável de toda a educação glo- I t y \. .9Y,~5~rr~t~" bal, e só age moralmente aquele que não se dá 1 Daí podemos extrair algumas conclusões. conta de que se comporta moralmente. Como Sem dúvida, a consciência exerce uma influêna saúde, que só percebemos quando está percia decisiva em nosso comportamento moral, turbada, como o ar que respiramos, também a embora não possa ser estabelecido nenhum conduta moral só desperta em nós uma série tipo de dependência direta entre ambos. Por de preocupações quando vemos que ela conisso, a pesquisa de Meumann demonstrou que tém alguma falha grave. "Não educar demasia?" desenvolvimento. moral e aE~ do", a regra de Herbart,!" não pode ser aplicaempre caminham Juntos, enquanto Witheft" \ da em tão grande medida a nada, exceto à '±' estabeleceu a regra de que os sucessos escola-WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA educação moral. r y ~ ? h ' res possuem importância fundamental para J i ~~'l toda a vida moral do aluno. Devemos colocar Por isso, nos parece um absurdo o ensino da moral. Por si mesmas, as regras de moa questão de tal 'ITi"odoque possamos descobrir ral representarão na mente do aluno uma "I,:~~a relação entre os sucessos escolares e o com- + B ? ! t ! -_J - / 'V I ~ .J --- ~r BQ ~~~ - I 1À.F' l'0KJIHGFEDCBA 7- 214 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKI dade, mas para isso não se preo~m tanto coleção de respostas puramente verbais, to~ lhes mostrar os as ectos nefastos da men. talmente desvinculadas do comportamento. ~, quanto em despertar neles en..!._u_sl_· a_s-"m"",o No melhor dos casos, será como u ~, E pela honestidade e pela veracidade. [...] não incluído na ação do me .smo e conde'quando estiverem legalmente obrigados ~ nado a~Q.Par ~o v' cu<fPor isso, pode prolhes falar sobre a nociva influência do álcovocar certo con ItO entre o comportamento ol, não enfatizem, como se faz nos livros, as da criança e a regra moral. Não resta nenhudoenças estomacais, renais e nervosas às ma dúvida, por exemplo, de que a luta da pequais o alcoólatra está exposto, e também não dagogia czarista contra alguns vícios infantis destaquem a baixa posição que ele ocupa na de caráter sexual não produziu resultados sociedade; é melhor frisar a alegria de posúteis; pelo contrário, sem dúvida exerceu uma suir um organismo saudável, que conservará durante a vida inteira, graças ao sangue puro influência nociva, por criar na alma da criane são, uma flexibilidade juvenil, que desco;te-· ça ~~Btil11_~.!l~~~!~2m.?-.RJ2.e-1lQS.QS. A crian-srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nhece os estimulantes tóxicos e no qual o sol 't\8 ça, que se sentia incapaz de dominar suas da manhã, o ar e o orvalho provocam a cada ~\êff,!J: pulsões e não tinha o que contrapor a elas, dia uma poderosa elevação do espírito. /~ sofria pela consciência de sua culpa, seus me-WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [Ibidem, p. 113-114.] '\ ~ V O " dos e s~a ver~on.ha e, assim, coisas que não I»' ; I J ~eram tao ternveis se transformavam, sob a '.J.'i influência dessa educação irracional, em uma Em outras palavras, no âmbito da educagrave S-Q!!l0çãoneuropsíquica. ção moral não devemos proceder como o fazeO ensino aa m-oral nos-~ece estéril e nomos com as l~s policiais, quandQ..~vitaIl1os civo, e mLalgyer fo~ucação moral nos , ualquer ato por se~~~~_~~a~tigg.que ele poAe parec_e.,)Jms~g~o d~Brta anonnalidide f.carretar. ão devemos transformar a moral nesse terreno. A educação moral ~ se dITüiía po icia interna do espírito. Q'la!195?evitadespercebidamente nos modos erais do co - mos algo por medo não estamos realizand'{;'llInj portamento que são esta elecidos e regulados ato moral. Nesse senti o, ousseãu procedeu ............... ~v"'---/.......,. pelo ambiente social. Nem o professor nem o alude forma profundamente errônea quando, para no devem notar_que se trata de um ensino espeproteger seu Emílio'" de um amor perigoso e cial da moral. A concepção do comportamento sujo, levou o menino a um hospital para pesmoral se amplia de forma extraordinária porque soas com doenças venéreas para assustá-lo com estamos adquirindo o direito de falar, não só do as feridas, a fetidez, o opróbrio e a humilhacomportamento moral no sentido estrito da pa~ão do corpo humano. A castidade, ç,Q!!!p~a lavra, mas da@@e mor~com relação às coi- ~ cust~s ~~% do ponto de vista psicológrco süjã mais a alma que a promiscuidade, sas, a si mesmo, ao próprio corpo, etc. , A única conduta moral é a que está ligaporque não destrói na psique da criança todas " da à livre escolha das formas sociais de conduas más tendências e impulsos, mas apenas suscita uma sórdida e mesquinha luta entre essas ta. Spinoza" escreve que, se um ser humano evita algo por considerá-lo ruim, procede como tendências e os ~,~,R!LI?,~n!.9J_ d~ºg, não , um escravo. O ser humano livre, conforme a ~U~.g.@i!,h~~~~ Só é valiosa a casj opinião de Spinoza, só é aquele que evita algo tidade adquirida por meio de uma atitude pol.J2orque outra coisa é melhor. James nos apresitiv~co~lação ao ato e com a compreensenta um método totalmente preciso da edusão~sua v~xda_de~a.~:~ê~~i~ ~~ cação moral, com a base de que~~ ~~:~,~~2!~9!!.~~enClaS)le~~_e tão ~l}2z e não do mal: ,~~~r~L~l!_~fa~~!. Q~{~de que não seJa-lIvre, qualquer temor e depend~ciajá enV\ J ~l Peço-lhes que se esforcem para tornar seus*S' vo~ven; ~alta de sentimento rr;o~al. ~sentido / alunos pessoas livres, habituando-os a agir e lPSlcologlCO, a moral sempre e livre. 'NAO \-I/ô.. a considerar as coisas, sempre que possível, Por tucl~~iSs<;'â'peCíagogra--atuã1 se endo ponto de vista do bem. Tentem fazer com contra em profunda contradição com a moral que eles se acqstumem a dizer sempre a ver- religiosa e, em particular, com a moral cristã, LKJIHGFEDCBA PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 215 cujo recurso fundamental tem sido a intimidahumana. Então, o ser humano honesto e puro, \ ção, a ameaça etc. [Diz James:] --srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA que se inflamou no ardor de uma tarefa filan-j ~.--:::--~ trópica, sente a humilhação e a insignificância /\1\ \:p de sua pureza moral diante de urna torpe pros- '\WVUTSRQP Aquele cuja vida está baseada na palavra "não", que diz a verdade porque a mentira é tituta e decide que, se somos impotentes para, uN'DO ruim, que ~em de lutar constantemente coniluminar as trevas com nossas lamentáveis lan-l_(",;'ro tra inclinações como a inveja, ~ovardia, a ternas, é melhor apagá-Ias e mergulhar tudo iniqüidade, está em todos os aspectos em uma nessas trevas: ---.! situação inferior, em todo sentido, daquela em Por últim~erceiro"perigo consiste em que estaria se o amor.à verdade e à generosique qualquer descrição das falhas, que gera dade fossem suas características cardeais e se na mente do aluno uma série de representa,/ ~a experimentasse t;5\9~~,}~Le§9.1!il1pf.j. O ções, ~~~.~<?J.n:Yl},~,~!_~}en-l.:c\Neste mundo, uma pessoa com nobres incli~})S~,:-SQ~,~ç~:J~~.. Recordemos ~u~~a f AT nações tem mais valor qv'e'qualquer monstro ccnsciencia e um movimento ue se InICiOU e que, em eterno combate, resiste a seus "vícios 'VA~~~~~~~~~~~~~·~~~~ inatos", ainda que aos olhos de Deus, como ~~~~~1Qj)~~~.!lÜ!lqs nossos discípulos contra o que não devem fazer, ao mesdizem os teólogos católicos, este último é o que pode reunir maior quantidade de "mérimo tempo chamamos sua atenção para essa tos". [Ibidem, p. 113.] falha e, desse modo, os incita~os a cometê-Ia. A expressão corrente de que o fruto proibido é doce contém uma grande verdade psicológica Uma pedagogia d~e tipo tem ~ Cor-=d-e--=:fic-c.,..,iê:-n-c--,-i@indiscutíveis. ~rimeira é qu~ e em parte tem a ver exatamente com o que estamos dizendo. Não há melhor maneira de ca pode ter certeza do suc s~Atemoriza o fraobrigar uma criança a quebrar o copo que está co, porém desafia a resistência do forte e consegurando que adverti-Ia constantemente "cuicede à violação da regra uma aureola peculiar dado, não vá quebrar o copo", ou "certamente de força e ousadia. Pa_ra_~~ps_ic_o_lo~&a moral, é sumamente notável a circunstân..cia de que QS você vai quebrá-Io", Do mesmo modo, forma mais se ura d~ crian- I' r~beldes e infratores de suas regras sempre fo~ ~~, ram apresentados à imaginas.ª-C?~umaIlU.QJ2 ~~~J!E..?!.~~.~_q~,~".9.~?q~~eJ9 I, uma luz atraente, jusramenteporque suaforça, ~~1~st.~ªlR~L, ~ seu-ofgulho in-d'eCliná jl}sJ,!pQI,diu.él-KJIHGFEDCBA Por isso, Thorndike destaca acertadamen, - ~~_.~_.-te o dano provocado quando analisamos com as ção à regra ~@m_suIPl.egnº~_ntes~ Dos heróis rebeldes de Byron'? aos mais correntes revoltocrianças de forma cuidadosa e detalhada, os motivos, formas e possibilidades do ~ sos do colégio, tudo o que é insolente e não se como se estabelece em alguns manuais francesubmete à intimidação atrai naturalmente as simpatias da criança. Nesses casos, a criança s~Esse procediment~~ 'n'a mente dos alunos as condições propícias e parece responder como o apóstolo: "Vejo o meum material que, no instante adequado, podem lhor e o aprovo, mas vou atrás do pior"." dominar a criança e orientar seu comportamen(3)~ deficiência dessa educação to, não contra o suicídio, mas para que o comemoral ~~~~W,s~;i~lli®I,Çl~é tam. Thorndike esclarece que nunca se deve dique ela cria uma noção totalmente incorreta zer a uma criança: "Vocês não P!:.~~~I!1_cortar~ 361\ sobre os valores morais ao ~:, j!IllZ-ª.to para,Q1.p-ªIo que teE1 ~ ~ E ~ ~ ~ ~ ! ~Toda'~, ~" ~-U!~9f-él~do consciência de qualquer fenômeno contém um' n~-'!_IJ!~_~~~g~~~d.Q, certo impulso motor que geralmente é muito in~~t,[email protected],. O torturante conflito moral tenso na criança. Todos conhecemos o poder que descrito por Andreiev'? em sua obratsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Trevas é os livros recém-lidos adquirem sobre o comporvivido por algum de nós em algum momento, tamento infantil, como aconteceu com aquelas e todos terão de reconhecer que, às vezes, pode crianças que leram Cooper" e Mayne Reid" e ser vergonhoso ser bom, assim como é vergofugiraID..Eara os Estados Unidos ~,~ansfur--'j )J nhoso ser rico, quando isso está combinado marem em índios." Portanto, não há nada mais.'. t7 com as terríveis trevas não-iluminadas da alma I 1,---- m ~1 ... .~éL~ª_?l!A - ~ r _*,. 216 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA l zyxwvu perigoso na idade infantil que esse ensino de lesão tinha acarretado um inevitável amor pelo '1 HE moral que, devido a uma conseqüência psicolócrime e pelas exteriorizações imorais. Nenhum> gica natural, se transforma em ensino de im~ psicólogo, ao analisar às formas do comportalidade. Devemos afirmar, sem medo de.cometer mento humano e explicar as leis de sua forma~m erro, que se a consciência de um atá! ção, pôde descobrir a existência dessas reações correto não garante a realização desse ato, a cons-tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r *inatas que regem o compo~tamen~o mora.l ~u ciência de um incorreto pode contribuir com sua i imoral. Portanto, ~ conc~lts>..._de_}mpe.cteI~ao realização. .J ~!~lEãO é um s9JJçeitoJüológiç-º_1_JTIas social., Não surge de fatores biológicos que formam o organismo e seu comportamento, I.!l_ª~deJa~oAS INFRAÇÕES MORAIS DAS CRIANÇAS Le.s~ociais....queregem e adaptam êS~'-e-compõr'fã"mento às conc1ições de existência no ambi-WVUTSRQP \ ! ' V ~ . / ~,/',./,.//'\:~V\/ Todo educador depara-se com ~~ente em que a criança vive. rais das cria~~ que se situam em uma escala Assim, a imperfeição moral sempre se ~n;amerite ampla, abrangendo de infrações origina na experiência e nunca denota leves imperceptíveis a autênticos e terríveis cri- deficiências das reações inatas e dos instinmes como assassinatos, incêndios, etc. Do mestos, isto é, um defeito do organismo e do commo modo, as ~adas pelos professoportamento, mas deficiências dos víncul~~ res contra essas crianças ~o~eçam com s!glyles condicionados ada2tatiy--º~_ às condlÇüê's do ~!~y"es~ias-O.r:ais e terminam nos r~- ambiente,~~~ ü;;--defeito da !d}-lça~ /í> .0rmatóri~ara delinqü~uvenis. nos quais ~or iss~Jé muito m-ií$Cüffe"ÊO"não falar ~de as c~ianças são m~ntidas a.trás ~~s.gra~es e sub- ídefeitos morais, mas de uma educ~ção social i metidas ~~~_~99IJ9-.~O fV \U D O U 'E:suficien~ __ <?~.~._ª_º-~nçl-ºI}5L<:l.ª __ ÇD-ªJl.ÇgJõaDo ponto de vista psicológico, como dequi podemos extrair uma conclusão totalmenvem ser consideradas essas falhas morais inte clara e geral que deve servir de ponto de R(j~'-;- fantis? ~ a descoberta da verdadeira natl,l- partida para considerar o problema da edustff'~~eza da m.2@l, a conduta moral parecia algo cação dessas crianças. El~s não exiK~ nenhu-tão objetivamente necessário para o comporma pedagQgj-ª,_eJ.p.~ci,al nern jnedidas proitamento como uma regra da lógica para o penbitiyas, corretivasepunitivas de nenhum tipo, social e samento. O homem ou a criança que violava ~5!.s. __ª.E~.flªS.,urp_ª_d~pli.f~_çlª_atenção__ as regras da moral parecia anormal ou doenuma quadruplicada influência educatiyado te. Nesses casos, a pedagogia falava go defeimeTo-~Emiocfos os casosde falliàs'mõTais das to moral da criança como se fosse uma doenêriãilç-âs, da mais insignificante à mais séria, ça, no mesmo sentido como geralmente se fala estamos diante de um c~~::, 7 ' d e um ~R?-~l? o~o. Também s: ça e o ~nWie~!g, e temos de reconhecer ~ue .supunha que o defeito moral era uma defi- rôêrácriança- [um ser desadaptado moral maciência inata, devido a causas biológicas, heto devido ao fato de vir ao mundo com rearança ou causas fisiológicas por alguma falha ções notoriamente inadaptadas ao ambiente na estrutura do organismo, como a surdez ou moral. Inclusive nas famílias perfeitamente lNAÍ!~11a cegueir~ congênitas. Afirmava-se, portaned..ucadas, ~nhu!§l.~t:.~ª!lS,ª_n_as~SQ.I!l uma ~ J \O to, que ha pessoas morais e ImOraIS de nasaptidão pronta para se comportar bem; pelo rv10M'-1 cença e que, conseqüentemente, existem contrário, em todas as suas funções e atos ! crianças destinadas pela própria natureza a naturais ~~O}~__subordinade forma, alguma \ viver atrás das grades porque nasceram deàs 1l9t~a~A,<!~~~,~i<t~?~xd9-/!ll~0_r9-1e, nesse \ li~qüentes, como um cego está co~d_enado a sentido, toda- a taref~ edu:_~~i~ase red~z apei nao ver ~ luz porque nasceu sem ~Isao:., nas a estabel,ecer a 1<:~~p!~~ d~ cnança e Esta claro que, do ponto de VIsta fisiolósuas reações as _Ç.Q.mÍIçoes _goambiente, gico e psicológico, essa noção éCabsurd~ NeO único~recurso pa~~ adã'i;iação desnhum fisiologista se deparou com certos ó~- sas reações é a ~~I}SÜk~9~~~~j.9~,ªmgãos especiais da moral no corpo humano cuja ~/~~~s~rs~~çl~~g,-:/E como nas condições do I J~/ t + a QJWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 7 J 4 1 d ;,t{ tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA f?J;r:A/rudrJ cLry f>l-};;iCiy <, KJIHGFEDCBA PSICOLOGIA PEDAGÓGICA 217 ~ zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA sistema [que herdamos] o ~~~~.<:.~al~_~E2.:: com a ordem estabelecida. Quando fala de A pre está organizado de for.IT!_ª_º-~_~armônica, casa dos m ortos." Dostoievski observa que as devillo às suas contradições implícitas, semforças mais bem-dotadas e mais 12oderosas clã ~,,~~-~_":> pre surgem pessoas que caem sob o influxo aldeia estavam reunidas [no QresídiQ) só que dessas condições desfavoráveis e que elaboestavammutilacÍas, desfiguradas e era;nutiliram dentro de si formas anti-sociais de comzadas para mãf Do mesmo modo, a delinqüência infantil P~E.~~~. Port~nto~recorrer à ~c;l,~como o único não denota nenhum defeito na psique da crianmeio pedagógico para combater esse mal. ça, que concorda e convive muito facilmente A criança [moralmente desadaptada] cJD1~.[I1~~~.~_~05!.le!!!9_K~!al:As falhas morais deve ser colocada em um ambiente que seja não indicam que ela seja incapaz de elaborar capaz de lhe inculcar novas formas de tratahábitos sociais ou seja inapta para a convivênmento das pessoas e adaptá-fá às condições de cia social. Pelo contrário, com muita freqüênsua existência, em vez das formas anti-sociais cia essa criança manifesta uma inusual astúde comportamento que nela se estabeleceram. cia, destreza, inteligência, ~têrÍtico hero~~ l ! ~ ~ ~ ~IE~!._~1 iIEE~~f~i~Qé,_acima de jYdo.,-ªJ.l!:i- e, o q~ é mais importante, ~ ~ i ~ ~ ! l : I soci-ª_L_~._~.~g.!:1S:élÇ~O mºmL~, __ ~obretud~_edl:!~c~9~Lp~_iar, a dos batedores >c~ção. s,.º-ç.iªl. Nesse sentido, a regra da pedade carteira, que I2-º~RrÓpria mQ.ral, i gogia científica é justamente o contrário da.~~pról?ri9:ilLÇEj2rQ.fj~~LQ.Ilsll,~}l_PI-ººrtº-ç-Ql}.- \ quilo que em geral se aplica aos infratores das ~_~jt-º.~2~t~_Q._bgm_g_Q.lllaJ. ../ leis na sociedade e no Estado,~~.RJllCom muita freqüência esse desequilíbrio são ~. Nesse caso há pouca preomoral da criança ocorre devido a du~ ~as 1,;:.' é'Úpação com a personalidade do delinqüente fundamentais. Em primeiro lugar, o ~nd9n~ e tudo se resum:;: neutralizá-Io e a colocar o [a ausência de um lar] ,24 que constitui um fato ambiente fora do perigo de sua influência; no de enorme significado social e equivale, por seu outro, pelo contrário, busca-se uma inclusão sentido, à falta de toda educação social, isto é, mais estreita, um contato social. Aqui, existe de toda preocupação para elaborar as reações preocupação para conservar e transformar a de adaptação ao ambiente. Em segundo lugar, Q. personalidade da criança; ~ @ existe o problema das crianças comfmuitos dons} a maior intensidad . Até mesmo em nossa éPO-J jque não encontram saída para sua energia nos Esta_Q} com sua política punitiva com repadrões correntes de comportamento. Pelo conlação aos delinqüentes, adota o ponto de vista trário, as crianças muito obedientes em geral de que os castigos devem servir mais para a representam um modelo evidente de falta de reeducação que para a intimidação e a expiaaptidão, porque costumam ser crianças raquítição. E tanto um delito grave como a mais leve cas e fracas, indolentes e de mente estreita,~ falha infantil, em última instância, denotam ~~~~!~~3~lg;~ uma pequena ou grande ruptura no comporsão as que não precisam de muito ou que, na tamento social da criança" mais tenra infâ ia compreenderam o segredo Tanto a delinqüência em geral como a da§stência próspera a valorizam acima de delinqüência infantil I)~~.igI!ili~-ª~0~ tudo. As pessoas de grandes paixões, de imen~ ~~,c:.i~9~~~~~~lYi.m~o sas proezas, de desejos intensos, inclusive sim~~~ª-l}2_~ Pelo contrário, o delito plesmente as pessoas de grande pensamento e denota com fre üência uma certa \forç~ uma caráter forte, raramente fazem parte desse gru,apacidade de protest , uma grande vontade po de bons meninos e bs>as men~. E ríênliiirri dos atrwutos da educação e aptidão para sentir:~e, ~~ muito~~utto. Nas condições da moral tradicional testemunha de forma tão elo~idade e do direito burgueses, o delinqüente,,~1!.~~J~~~uanto esses casos. qüente se ~siaLmava com tudo o.nue.saía Em outras palavras, não só nos casos em que a dos_limites d~ estereótipo comum; ele sentia educação moral não teve êxito, mas, com maior uma força interna e não podia se conformar freqüência, nos casos em que foi bem-sucedi- nesses-cãs-os-(rê~~-~os o ~ , - . r - - ~ , . I " '- / '. . . . . - , ~ , - ~ . ~ . ." '- - " , _ . _ " (!) ta J , l 218 srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKIzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nitude negativa, porque foi adquirida às custas do medo, da humilhação, e n㺠à~sust9-S je urna verdadeira r~ge!ler:ªQ.p. Por isso, ~aJg~ /'. CLAS~'\ ~dência ~omo no~ l~~_~~e~_~~~u~~e~tsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA l!l0ral da ob~.9~.A?s~p_'ReJ;..~~~sl$p.iJ.Ü:ante, c f-( moral teve tudo o ue era de e' do. Nesses j- { " J~/ /"-·\v~ e ~portamento, comprado a esse preç,WVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 0. casos revelou-se sua autêntica natureza. Vimos ço, não representa, de acordo com nossa opi( , . 'r \ ~ que, onde esta fracassou, confirmou sua total nião, o ideal pedagógico. _' I impotência, criando em teoria o conceito de ~ O princípio autoritário no âmbito da mo. defeito moral inato e, na prática, ~~ ral, venha e onde vier, deve ser destruido e, a Ipt(~,9$~J?J-~~? o regime escorar pelo presídio e encoriiendando qOS carceem seu lugar, deve ser erigido algo totalmente reiros a tarefa de completar as tarefas que os novo. Essa nova coisa, que deve servir de base para a educação moral, só pode ser definida professores deixaram inacabadas .. de forma aproximada, em concordância com Mas isso também acontece nos lugares em o critério geral da educação, como a coordeque a educação moral tradicional triunfou e nação socialdo próprio comportamento com obteve êxitos retumbantes. Inclusive nesses da coletividade e, aqui, a lugares ficou evidente que ~~~~ é cª-12..a]:_d~ õ-comportamento obediência deve ser totalmente ~b?tjtyí9.a,pela ~ria!llI?~.crianç? ~~cio~n}da e ~~0 losa~pusilânime e propensa àooediência, sub}!~r:e~ ~<?r~.~~~ç~~~9,~jª!~ r~zra. que provém ~ "-"'/'v"v-v",-r r-r-» de todos, da coletividade, e que também se des~~~ e ~~~r:SL7E isso ocorreu porque todo o sistema da educação moral estava estruturado tina a todãa coletividade, respaldada pelo mais sobre o ~incípio autoritário, isto é, sobre a eficaz mecanismo de organização e ordena@ibuiç~o, de certo significado compulsivo à mento da vida escolar, deve substituir esse -: ~ "dueto pedagógico" que antes predominava -: autoridade dõs paísoü"professores, respalda~- pela sanção dolprêmi;)je dofêastigª,-pela entre professor e aluno no sistema autoritário. \-: (intímídaçãõ'epélà felicidade. "Escute os mais Não se trata de obedecer a alguém ou a ~~~-----. ~ velhos e você qjlhará o bom caminho, do conalgo, mas de ~_ss~!!lJ.~livremente as formas de tr~ri?~.s~ã' ;;~'-ávfÓrn;ul; gros:;ira, comportamento que garantam correção no porém exata, de tal pedagogia. comportamento geral. Esse mecanismo não é ~ Atribuía-se o mais elevado valor moral à alheio ou imposto à criança; pelo contrário, ~ia mQ!ivad~elo medo, embora, do está em sua própria natureza, e ~io)é o ponto de vista p;Icológico,aobediência caremecanismo natural que ~J~j~IJ.~9!ye~Ç9inbiça de toda força educativa moral, porque suna esses hábitos. Em parte alguma o comport ramento éfa criança está tão regulamentado ;,1, ! (põe antecipadamente uma atitude por normas quanto no jogo e em nenhuma 1i9~~5-~~~~~I~~~/~~j§,~.~/t?~. Consequentemente, o mecanismo psicológico pârté'ele assume uma forma educativa tão liV './ ./ .--" ~ fundamental que jazia na base da educação vre ,e ,m,?~~~. .9,.u?-~~<? nesta. E não se trata de moral constituía, de fato, a mais profunda aluformas impostas pelo adulto à criança. 01< . cinação pedagógica imaginável. De nenhuma maneira se trata de germes] Ao mesmo tempo, é importante observar naturais do futuro comportamento moral. A que esse mecanismo enraizou-se tão profundacriança se submete às regras do jogo não por-' que seja ameaçada com um castigo ou porque', mente na carne e no sangue que até mesmo um receie provocar algum fracasso ou dano, mas pedagogo de vanguarda e um pai instruído não podem deixar de lado esse método clássico e, ~implesmen~~Q.<?.Ique a s>bservância das regras quando uma mãe diz ao filho: "não faça isso lhe promete - _e cumpre sua promessa a cada '< /--..../~~-~~./~ ?,<?S®-~_ma@ª~n~~_3~~(~ _esl~/~9Jn~~el!-_Q9..? instante -'a satisfação interna por meio do jogo, mesmo erro -"-- ainda que atenuado - que  políporque 'a criança age como parte de um rneca- '- .. (ci9.1- quando coloca o ladrão menor de idade atrás nismo comum composto por uma coletividade que joga. A inobservância das regras só a ameadas grades. Uma criança realmente pode se abster dessa falha, mas a influência moral e educaça com o fato de que o~~ ..n~?~~c~r~ e tiva dessa abstenção será igual a zero ou de magperderá seu interesse p~r ele. ISso constitui um da, ficou evidente sua completa impotência. Em nenhuma p,a,r~e.-?~çbeg~!:1 a tamanha d~- -4- /''0~~'\../'-' I ,"',-\.~ b I pT~(~ I .t ~~;!> Y~ (-"- ~.~ ""'." './.......... -, ,~., r\ PSICOLOGIA PEDAGÓGICA reg u lad o r su ficien tem en te p o d ero so p ara o co m p o rtam en to in fan til.ij D esse m o d o tam b ém se reso lv e a q u estão d as m ed id as d e in flu ên cia q u e u m p ro fesso r d ev e ad o tar co n tra as in fraçõ es m o rais d a crian 1 aJ~ o sistem a au to ritário d e m o ralid ad e, - to o a reg ra m o ral era aco m p an h ad a d e u m a san ção q u e im p licav a c{9.st1&9 d a crian ça em caso d e in su b o rd in ação . e seu tp rêm ~ em caso d e su b rrilssãQ ..O p rêm io e o castig o ad o tav am as I m ãis ~ sas fo rm as, ab ran g en d o castig o s físiI co s, a p riv ação d o alm o ço , a cela d e castig o , u m a reco m p en sa; até fo rm as 'su tis, co m o u m a rep reen são , u m a ad v ertên cia o u ~ lo g io s. A u tilid ad e p ed ag ó g ica o u , m elh o r, o d an o . d essas m ed id as, p o d e d iferir b astan te, p o i~ as elas . \ serv em co m o m eio s d e in flu ên cia p ro fu n d arn en , te f\./Vv--vy'v'\.:;J m ecân ica e en sin am , n o m elh o r d o s caso s, só I~ í- I as v irtu _ ~ s,_ ~ .~~ u D m lss_ ªª e ap en as u m a reg ra m o ral :[~ ~ taL º..d es-ª-g ra _ av en S u p õ e-se q u e, se essa san ção fo sse elim i- n ad a, a crian ça p ~ .ªJ> e~ ~ .a~ q u e_ ~ ~ a_ ~ I~ -ª-Q 1 n ão p ro v o car4 1 f~ T I:[u )lf'! r~ ~ n tr.e.J).s_ q u e..a ro ~ m e, en tão , ela n ão teria n en h u m m o ti"--v op ara ren u n ciar a eia. N o en tan to , o co m p o rtarn en to m o ral n ão d ev e se b asear em u m a p ro ib ição ex tern a, m as em u m a ~ I ~ o u , m ais co rretam en te, n o fato d e q u e -º~ \ ~ r ~ m an o d ev e ten d er· n atu ralm en te p ara o ià ') b em e _ ~ ~ ~ ~ ~ a, O co m p o rtam en to m o ral d ev e -' ~ .em su a n atu reza e ser ~ alizad o liv rem en te e sem esfo rço . (tW,Q;t1Jv'C- ç ,e ) S u b siste até h o je n a p ed ag o g ia a id éia d e q u e o m elh o r p ro fesso r d a crian ça é su a p ró .E !~ Ü L çloCr.o n h ece-se o critério p o p u lar d e p ro fj,f' \ fesso res q u e n ão en sin am as crian ças a ev itar ~~ 11 o p erig o , m as q u e lh es p erm item realizar so zia ex p eriên cia d e sen tir as d o lo ro sas co n - ~ :P 1 . I n h as I seq ü ên cias d e seu s ato s e ap ren d er a ev itá-Ias. A ssim , se u m a crian ça, m o v id a p elo in stin to , to ca a ch am a d e u m a v ela o u u m sam o v ar ferv en d o , o s p ro fesso res n ão a im p ed em . P elo co n trário , ach am q u e as crian ças d ev em ter a p o ssib ilid ad e d e se q u eim ar, p o is essa será a m elh o r esco la p ara elas, n a q u al ap ren d ~ ~ çg id ad o co m o f~ N o p ró p rio m ecan ism o p sico ló ic~ e d a t~ ~ o s e u cad o res en co n traram o m eio m ais p o d ero so , e o ex em p lo recém -citad o rep resen ta u m caso típ ico d essa ed u cação . 219 A o an alisar criticam en te esse critério d ev em o s lev ar em co n ta q u e,-ap licad o a caso s d esse tip o , n o s q u ais a ação d o lo ro sa está d iretam en te v in cu lad a ao ato , u m a ~ d id a ed u cativ a d essa ín d o le d ificilm en te p o d e ter u m a am p la d ifu são eser tran sfõ fíT lad a em p rin cíE lo g eraL S e o p ro fesso r q u iserag ir d e aco rd o co m essa reg ra e p erm itir q u e as p ró p rias crian ças ex p erim en tem as m ás co n seq ü ên cias d e seu s ato s, ~ ~ ~ ~ ~ ~ r se ai "J co n seq ü ên cia in d esejáv el d o ato n ão se m an i- ( ~ festar im ed iatam en te, m as_ cleJ2 9 isd e u m ~ Io - \ T lo n g ad o in terv____ alo d e tem ]2 Q .-º---lU ..D o s?D u ran.Jte \' O ..-.-.-. --.~ 4: esse p erío d o a crian ça ~ m p o d e se a~ o stu m ar a u m m au h áb it,o e to d o o d an o q u e ela d esco b rirá p o sterio rm en te n ão a aju d ará a se liv rar d esse co stu m e. A s co n seq ü ên cias n o ci ; J v as d etfu ~ a~ ._ ~ ~ i,g a~ r~ p o d em ser in ~ i.g n ifi- /)fA v__ can tes e im p ercep tív eis, m as, se p erm itirm o s q u e a crian ça ex p erim en te n a p rática o ato p ret:" ju d icial d e fu m ar, co rrem o s o risco d e fo rm ar 4"S ;P A u m fu m an te in v eterad o an tes q u e ela p o ssa I -~ '?? to m ar a d ecisão d e q u e é p reciso rejeitar a id éia ! d e se tran sfo rm ar em fu m an te. /'). 'V.j' ..". b' d V l1 .)_ ~ (.Ç L AS m as co n seq u en cias tam em p o em es--(f----tar lig ad as ao ato ; n a co m p reen são d a crian ça, p o rtan to , a d ep en d ên cia ex isten te en tre o ato e a m á co n seq ü ên cia p o d e ser in acessív el e in co m p reen sív el. P o r ú ltim o , u m a série d e ato s p ro v o ca co n seq ü ên cias tão fu n estas q u e seria I u m g ran d e risco ~ fiar em ~ ~ ~ L f!fh .1 ~ I1 çiéH ~ Jlll:;~ cativ ~ :, S e a crian ça ten ta se~ ~ JJn E ~ ~ !?-y ~ d ificilm en te u m p ro fesso r ach ará razo áv el p erm itir isso , p o rq u e ele co n h ece as co n seq ü ên cias n o civ as d o p u lo . E sses caso s p o d em ser > ' m u ito n u m ero so s, n ão só n o sen tid o d o d an o físico , m as tam b ém d o p reju ízo m o ral. A ssim , a ap licação d esse p rin cíp io p o d e se lim itar a caso s in sig n ifican tes, co m o o s já m en cio n ad o s, m as n ão p o d e ad q u irir am p lo sig n ificad o p ed ag ó g ico ; so b retu d o , ele é to talm en te in ad eq u ad o p ara a ed u cação d o co m p o rtam en to m o ral. C arece d a n ecessária lib erd ad e d e es- * ~ n ic~ ~ ~ ~ ~ ~ )I1 ~ 9 ~ l. N ato rp " afirm a q u e n u n ca p en ~ Q ..S I /~ e as p el'l'.9 ª"~ --R º-d ~ riªm .Jran ~ fQ rm ,!_ ~ -seJ~ ,m ~ rijo s se tiv es~ ~ ~ J!.~ ~ !.q ~ < !~p. ara isso ; ~ g b .em 'p s V âp eriàs q u e elas se tran sfo rm am _E!~ _ __< li.stb o \s 4J~ 'q u an d o se sen tem ..~ sç[é!y .iz_ ad as. N esse sen tid o .j a in u tilid ad e d esse p rin cíp io d a d o r p ara ju stifi- 220 LlEV SEMIONOVICH VIGOTSKI car o castigo é completamente evidente e clara. impregnar esse meio; começando pelas relaA criança aprende com muita rapidez a comções íntimas e a_mis~os~~."~~g~upos sociais preender que o castigo não está necessariamentesrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ~QQres, passando pelas u!:i2es mais-ampla? ligado a seu erro, mas [aprende] que aqui foi de caráter fraterno e terminando pelas mais wescentado urrlcômponente adicional e interimport~tes formastsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQ do~~EllP mediário expresso ~~ ,i~~~ a escola deve impregnar e envolver a ~ Então ela aprende a evitar essa ingevida da criança comLrrli.~harEillde vínculos sorência, a ocultar seu ato, a_~r, etc. ciais que ajudem a elaborar o caráter moral. Além disso, todo castigo coloca tanto o Em nenhum outro âmbito possui tanta força a educador quanto o educando em uma situação tese geral sobre a educação, ou seja, educar ~._Não é possível ~ervar o amo~ significa organizar a vida. EI1lJ!.1:!1~..c.o.ue-} o respeito nem a confiança entre um professor çª,"-ª~c:.r.jª-IJç-ªS.ªQ criadas c~rre~-ª!1l@te. que castiga e uma <:~i~~ç.9-_ castiK!lda. Qualquer Resulta compreensível, portanto, o nexo cas6go, seja ele qual for, sempre coloca o eduda educação com a vida e [o nexo] da ~ cando em uma posição humilhante, minando com ~stema social que deve servir de ponto seu amor e sua confiança. Herbart afirma: ~de parti~dagogia.~ª~ ------.--......-.. , educação só."~e:~~ ~fin!~.!Y~~E.~lvi<!?s vàstas-e ' ;+ t As ameaças constituem um meio educativo nef~sto, i~~ as ~t~§t~f9.!1.es e fazem os r,Palsfracos s~erem-Pill1CO-lkJ:Q.Illi!.teL..eJ...IQ.S..- porque não estão em condição de lutar contra seus desejos negativos. Neles, o perigo do castigo é suplantado pelos desejos. Em outras palavras, qualquer castigo resulta nocivo do ponto de vista psicológico e ~~~~tir na escola sovié~ O próprio conceito de e~~mpre deve denotar um defeito da educação. O delito de um escolar é, acima de tudo, um delito da escola, e só é apropriada a eliminação desse defeito na organização social da escola. Nesse sentido, a auto gestão na escola e a organização das próprias crianças são o melh0í,;:neio de educação moral nas salas de aula. / / Ao mesmo tempo, deve-se ter cuidado • para que as formas dessa auto gestão não se transformem em \mera cóPlaj das forma~ de comportamento dos adultos e [email protected]~ interesse pelaSf~E~a.1!~t~-º es ~~t~In_as não ill-ª.t~ o sentImento"de sociabilidade das crian~. De acordo com isso, a organização do meio social na escola não significa apenas criar ~tit~ireção es~~voc~~~ íii'ênte a~~~, realizar elê'içoê~e observar todas as formas de sociabilidade que as crianças gostam tanto de copiar dos adultos. Também é preciso se preocupar com os vínculos realmente sociais que devem ...gef~?itjv~~_~!!!~ __l!~!~~~os 9!> q~an.do J~.~~!ll ~rQblen:a: do_~ist~~~-:.sg~. Toda tentati~a de 'construrr ideaisde eaucaçao em uma sociedade socialmente contraditória é uma utopia porque, como vimos, o único fator educativo que determina as novas reações da criança é o meio social e, enquanto este contiver contradições insolúveis, estas ~ na educação mais bem pensada e inspirada. De acordo com isso, em nossa época de transição [rumo a uma sociedade socialista] sempre teremos de enfrentar na escola formas indesejáveis do comportamento infantil e devemos estar preparados de antemão para o complexo e difícil~~. Surge aqui a questão de como podemos reter; na pedago- u» gia soviética, os \aspectos POSltlVOª do sistema ~ "d.~.p.JêmiQs_~çª~~ig9s como medidas educativas. Embora os prêmios e castigos devam ser eliminados das escolas soviéticas por sua influência prejudicial, não resta dúvida de que uma parte de seus efeitos deve ser conservada [... ] Esse aspecto positivo deve ser conservado de tal for~ ma que cada ato da criança retome a ela como impr~~~§gw ~~~§l ;-~~ Nada impulsiona tanto a ação quanto o gozo relacionado a el~. Por essa razão, James encontrou um aspecto positivo no sistema de qualificações, chegando até mesmo a exigir que as 'crianças soubessem suas notas. Nesse fato, ele encontrou a cristalização da lei psicológica de acordo comKJIHGFEDCB I / ' I -J--mlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA rui:s-- UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 1 & U FEDCBA a rvvr;?->'- - / jiI 1 f ! \ / YYtYY?-9 / 'V 1 1 f J Y L N t 7 oM Y a qual, na circulação do traba ho, nosso próRrio ato retorna a nós sob a~ma impressão reflexa: Portanto, obtemos por meio de nossos órgãos a sensação da informação sobre esses atos e seus resultados. Ouvimos as palavras que pronunciamos, sentimos o golpe ql!:e demos, l~os olhos a~~n~~E1 o su~~acàsfõde nossas ações. Essa impressão, que se reflete inversamente, é necessária para que toda a experiência se complete. Mas todas as conclu~~,sões psicológicas às quais podemos chegar nos "'" r - dizem que o desejo do aluno de conhecer seu constitu~~ (&~ /J/ ~ j f )S A k rrE {Y 7 .ft P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A QPONMLKJIHGFEDC 221 está vinculado por nenhum laço, ou em uma cidade capitalista moderna, na qual o homem não sente nem compreende o homem. Esse sistema só pode esmagar a criança e agir de forma profundamente opressora sobre ela. É evidente que lna escola soviét@ temos de nos • preocupar com as formas d~ ~d~caç~o soc~al / que ~rovoquen: ~~ ~pOls a cnança aprecia a aceitaçao -'",,~. ~~Ji=lÇao de seus_coJ~_g~~e, com essa orga-r,R::!"~-i nização, o am biente iente será sera um mecarusrno poderoso que enviará constantemente à criança a impressão reflexa de seu ato. . Em um a~biente social corre~ar,nente or./d.e sua função. E esse desejo sempre deve ser realiganizado, a cnança sempre se sent~r~ como se t ~ ' : hiJ'V } >l zado, a menos que existam argumentos muito fosse totalmente :ranspar~nte, ~~ ;;.iR.' sérios contra ele. Por isso, informem ao.s-aluno~\* éf~~,s~oam e sa~e essas impres~os resultados de seu trabalho e as esperanças sões refle~us próprios atos - que cons'-:o Ee}.~em te~e~ lado essa norma tantemente irão a seu encontro - serão as me3 0 M .? em casos isolados e devido a algumas considedidas educativas mais poderosas que um prorações práticas especiais. [Ibidem, p. 32.] fessor pode ter à sua disposição. Ao mesmo tempo, compreende-se facilmente que a relação entre a criança e o meio nem \vV,y.~ lli~ci~a~~~ ~pe~~.~_mentode J<lm~spara defender o\sistema de notas na escolt Pelo sempre possuirá esse caráter1eliz e idíl@com o O J 1 \:; c~o, súãillcorreç~gica parece qual se apresenta a chamada(êªucação ~'liV!'~ '~/ totalmente evidente a partir das idéias apreOs ideais da educação livre, isto é, ~sentadas antes, quando falamos do castigo. A ~~~que A I nota representa uma forma de avaliação tão não são restringidos por nada, provocam nosalheia a todo o decorrer: do trabalho que logo sa objeção a partir de dois pontos de vista. começa a predominar sobre os interesses da Primeiro, porque nos fatos a educação livre prendizagem, e o aluno começa a estudar para quase nunca pode ser realizada plenamente vitar uma nota ruim ou obter uma boa. A nota e, por isso, sempre permanece apenas como ~._._-----------_._-_./ combina todos os aspectos negativos do eloprincípio pedagógico com uma vigência relagio e da recriminação. No entanto, esse pensativa, dentro de limites bastante estreitos. Jl) - e mento de James exprime uma grande verdade desejo da criança sempre contém muitos as-:.r I !psicológica, ou seja, que ~riança s~e pectos funestos e daninhos e, se ela puder J c~~t~Q.g~I}fl~~e realizar esses desejos, estará causando tanto esse conhecimento é um poderoso meio edudano a si mesma que nenhum professor razoácâtivôque'-"'óp;;fessor possui. vel permitirá, em nome dos princípios da eduPor isso, a escola de educação social não cação livre, que a criança cometa um ato desdeve ser concebida como uma multidão de sa índole. crianças sem vínculos entre si. Todos sabem E mais: a .E!ena liberdade na~ducª~ª_o 0 \ < muito bem que a união de uma quantidade tão significa que se rejeita toda remeditação, toda grande de crianças, não-ligadas por nenhum a~~socia.l, }s.to é, to a i u"fni. e~~- g o M tipo de vínculos, nem unidas por interesses co- -éatlva. Desde o imcio, educar tambérnsignifimuns, faz com que cada~~s caJimJmr: e restringir a libe[çi~ft~. Por isso, intensa~~ento.e sua solidão. Em como a educação é um processo inalienável ~~~~h '--"'~, nenhuma parte o ser umano se sente tao so na vida do ser humano, a educação livre não quanto no meio de uma multidão à qual não significa rejeitar a restrição, mas transferi-Ia ~ f' I 222QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A educação não conhece "inextirpáveis para a força espontânea da situação em que a inclinações para o mal". E ssas m esm as inclinacriança vive. Se o ser humano renuncia à edu-mlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA - entao - ~çara 'd~ ~ç3!0, a fd~ ser ~el uca o pe a rl!.a, ções podem ser direcionadas para o bem./, pelos móveis e pelas coisas. ~Por esse rm;tivo, a educação livre deve NOTAS ser entendida exclusivamente dentro dos lirní~il-ue pode ter ~a liberdad~!1_º_pl~~2 geral 1. O que Vigotski chama de "comunismo" deve de educação e no meío.socíaí, E sempre pode ser interpretado como um m odus vivendi sui ~contecer - e na verdade isso ocorre com fregeneris da classe social dominante espartana, qüência - ~~~~~~~J~5E.i_~_Il.-~) . pois Esparta era uma sociedade de classes, em ~~~~_~~il}!~!~_s.§~.~,si'l * __ ~~~.~!:yi~3~~~: :UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA que a aristocracia vivia do excedente econômico produzido pela exploração do trabalho gar a criança a fazer nada em particular, lhe dos escravos ilotas, desde o século XI a.c. mostrará o valor de mudar seu comportamen2. Vigotski se refere ao período histórico inaugupara que ele concorde com o interesse do rado pela Revolução Russa de 1917. grupo. Devemos ~---amzãra-Vida escoi_~r)de 3 , Essa é uma referência ao drama satírico em verso do escritor russo Aleksandr Sergueievitch tal forma ~~k.~~~~iª.Jl-SA~,!~ª-I}: Griboiedov (1795-1829), É um a loucura ser senS~1(g~n:W!.$!ll~ assim como é bom que ela sato, publicado definitivamente sem censura aceite as regras do jogo; a divergência com o 1861. em grupo, portanto, deixaria sua vida sem senti4, Friedrich Nietzsche (Alemanha, 1844-1900) foi do, pois ela se sentiria como se tivesse sido exo fundador do irracionalismo filosófico. Um de cluíc!.~do jogo. ~~.Sim cO.IE-?",C>..Jo.J~gl.~~mJIseus livros intitula-se, justamente, P ara além ~AS.9n~!:$1].Je. t~I1?_ª-9--dª~forças Pi .' do bem e do mal. Foi o filósofo-ídolo do Tercei~~~~~~~~2il!~da. \( ro Reich de Hitler, Seu estilo aforístico favoreEm suma, a teoria da educação livre é a ce avaliações opostas, Cf. Georg Lukács, El face contrária da teoria sobre o caráter inato dos asalto a la razón, México: Grijalbo; e Carlos sentimentos morais. Ambas admitem a impotênAstrada, N ietzsche, Buenos Aires: Almagesto. 5. Leon Shestov (1866-1938) foi um filósofo cia e a inutilidade da ingerência pedagógica nos existencialista e um crítico literário russo ém igré processos de desenvolvimento e crescimento da que viveu na França. criança, e ambas supõem que o fundamental do 6. O imperativo categórico é uma categoria do comportamento moral da criança já está presensistema filosófico kantiano. Segundo Kant, o te no momento de seu nascimento. A partir daí é imperativo é um juízo que ordena uma ação e natural que se admita que existem crianças boas cuja cópula não se exprime por meio de é, mas e más, morais e imorais, a partir de seu nascipor deve ser. Kant divide os imperativos em himento e pela sua própria natureza. potéticos e categóricos. Estes últimos são inconGàupp onsidera que "a degradação modicionais e absolutos. ral é uma' orma peculiar de degeneração psí7. Vigotski refere-se a uma etapa superior do soquica" e, para confirmar essa idéia, apresenta cialismo desenvolvido que nunca chegou a exisa opinião de muitos pais sobre seus filhos: tir, o comunismo, de acordo com o marxismocom traços utópicos, embora se afirmasse o "I esta criança] não pode ser norm al; ela é comcontrário. Cf. R Engels, Do socialism o utópico pletamente diferente das outras crianças; desao socialism o científico, op.cit.; e A. Sánchez de o começo não era corno __elas; tem uma Vázquez, D el socialism o científico al socialism o ~~ável inclinação paraFEDCBA Q mal').26 \-(AL.\I-[-ii~ I. utópico, México: Era, 1983. ~s:t-Q~Jpressupõe a existência de uma 8. Aleksàndr Aleksandrovitch Blok (1880-1921) inextirpãvel j!!!dffiação Qãrã Q 6eIriJ nas crianpoeta, ensaísta e dramaturgo. É consideraças. Aqui se comete o mesmo erro, isto é, a do o iniciante da literatura pós-revolucionária crença no comportamento moral inato e a russa. Foi uma das principais figuras da corincompreensão de que este é produto da edurente "Escita", profundamente eslavófila. Com cação. relação à citação de Vigotski, cf. A. Blok, U n Então pode surgir um\ConflitoJque, sem obri-' Jo r1 ~ . ,(\túX-7 : '~ '~ 1 I ~ ,I !~ ~ , ,I /1 fOI I I· " ,! ti1 '1 'i P S IC O L O G IA 10. 11. 2 12. 13. 223 sobre un P oeta FEDCBA y otros textos, zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Barcelorusso e, portanto, primeiro foi transliterado de na: Barral, 1972. nosso alfabeto para cirílico e, quando este liO conde Liev Nikolaievtch Tolstoi (1828-1911) vro foi traduzido para o espanhol, fez-se a foi, para a maioria dos críticos, o maior romantransliteração em sentido inverso. cista da história. Sua opus m agnum é G uerra e 14. Quando Vigotski se refere nesta obra a Herbart, paz, embora seu romance mais lido seja A na está se referindo à sua obra A llgem eine P iidogogik K arenina. Tolstoi viveu praticamente toda a [P edagogia U niversal], 1806. Johann F. Herbart vida em Iasnaia Poliana, sua propriedade pró(1776-1841) foi um filósofo idealista alemão, xima de Moscou, onde construiu uma escola bem como psicólogo e pedagogo. Foi o sucespara os filhos dos camponeses - que foi fechasor de Kant na cátedra de Kônigsberg. Sua conda pelo governo czarista -, colocou em prática cepção era associacionista, e quis reduzir a psimuitas de suas idéias sobre a educação e puque a unidades sensoriais elementares. Em sua blicou uma revista de pedagogia. Tolstoi renunconcepção pedagógica, o ensino sempre passa ciou a seu título de nobreza-e viveu como um por cinco níveis formais. Defendeu a idéia de que a educação devia ser uma disciplina cienasceta. Defendeu a supressão da propriedade privada e do dinheiro - era partidário do tífica e que, dessa forma, devia ingressar na universidade. escambo. Foi excomungado pela igreja ortodoxa russa, e a censura czarista proibiu quase 15. Baruch Spinoza (1632-1677) foi um filósofo toda a sua obra. Como mostra Vigotski neste da comunidade hebraica holandesa que exerlivro, Tolstoi tinha algumas idéias estranhas. ceu grande influência sobre os judeus progresUm dos seus comentários mais infelizes foi sua sistas. É válida a grafia "Baruch de Espinosa" consideração de que Shakespeare fora um péspor se tratar de um sobrenome ibérico e porsimo escritor, incapaz de criar personagens conque o próprio filósofo assinava algumas vezes vincentes; dedicou três anos de sua vida ao em"Despinosa", contraindo preposição e sobrenopreendimento ridículo de escrever essas me. Vigotski leu Spinoza na adolescência e o opiniões em seu ensaio O ShiekpC rte i o dram ie citou ao longo de toda a sua obra. A obra de .Spínoza é a protagonista de seu ensaio ina[Sobre Shakespeare e o dram a]. Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) foi um cabado sobre as emoções, escrito no final de filósofo francês. Expôs suas idéias pedagógisua vida (cf. L. S. Vygotski, O bras.,., Volume cas no livro É m ile ou de l'éducation, do qual VI, op. cit.). Seus livros favoritos foram o existem várias edições em espanhol. Emílio é H am let de Shakespeare e a É tica de Spinoza um personagem fictício. (cf. B. de Espínosa, É tica dem ostrada según el Sócrates (470-399 a.c.) foi um dos maiores fiorden geom étrico, ed. de Vidal Pena, Madrid: lósofos gregos. Vigotski não pode estar citanNacional, 1979). do um texto de Sócrates, pois não se conhece 16. Cf. a nata n 10. a existência de nenhum. Quando se cita 17. [Lord] George Gordon Byron (1788-1824) foi Sócrates, isso sempre é feito por meio da boca o poeta europeu mais popular do romantismo. de outra pessoa, geralmente seu discípulo De família escocesa, abandonou a Inglaterra e Platão, ou Xenofonte, etc. foi membro do Comitê para a Independência Todas as citações de W. James feitas por da Grécia. Participou ativamente da luta e, à sua obra depois de desembarcar em Missolonghi, morVigotski neste capítulo pertencem UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA T alks to T eachers ... , op. cito no Capo 1, que trareu devido a uma doença. 18. Essa é a tradução literal da frase entre aspas duzimos diretamente da língua inglesa, pois do original russo. É improvável que a fonte de não existem diferenças significativas com a versão russa citada por Vigotski. Em todo este Vigotski não tenha sido a Bíblia. Não pudemos encontrar essa proposta lingüística no Novo livro, raramente Vigotski destaca suas elipses, Testamento. Por outro lado, é duvidoso que um porém nós as restauramos. Não nos foi possível estabelecer a identidade apóstolo diga "vou atrás do pior" sem cair em contradição lógica com sua qualidade de apósdesse autor. Por isso, é possível que, no alfabeto romano, a grafia possa estar incorreta, pois tolo. As aspas dão caráter de citação a algo que é apenas uma entre várias possíveis; por exemnos parece que não é um a citação, mas uma plo, poderia ser "Vithoeft". Tal problema surge paráfrase sui generis de um trecho mais extenporque existem diversos critérios de transliteso. Provavelmente ele esteja se referindo ao ração e, sobretudo, porque o sobrenome não éQPONMLKJIHGFEDCBA trecho da "Epístola aos Romanos" do apóstolo pedante 9. P E D A G Ó G IC A 224 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA transformar em índios, mas encontrar ouro na Paulo, 2:17-22: "Mas se tu que te dizes judeu e Califórnia, porém são impedidos pelos pais. Cf. descansas na lei, [ ... ] e te jactas de ser [ ... ] luz A. P.Tchekov, C ontos ... ) op. cit., p. 593-601. possuis dos que andam nas trevas, [ ... ] porquemlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 23. A casa dos m ortos é um romance de Dostoievna lei a própria expressão da ciência e da versky, no qual ele narra o horror de seus quatro dade [... ] P regas: não roubar e roubas! Proíbes anos de trabalhos forçados, em que esteve o adultério e o cometes! [ ... ]" (cf. Bíblia, op. acorrentado em uma cadeia da Sibéria. É o cit., p. 1612; o grifo é nosso). autêntico antecedente, na narrativa russa, de 19. Leonid Nikolaievitch Andreiev (1871-1919) foi U m dia na vida de Ivan D enisovitch, de Alekum narrador e dramaturgo russo exilado. Sua sandr Solyenitsin e de C ontos de K olim a, de obra gozou de grande fama entre a intelectuaVariam Shalamov. lidade russa da primeira década do século XX. 24. O regime czarista, a participação russa na PriDa Finlândia, Andreiev enviou um SOS ao munmeira Guerra Mundial e na Guerra Civil postedo, pedindo que se salvasse a Rússia do rior à Revolução de Outubro, em que os conbolchevismo. .FEDCBA tra-revolucionários lutaram pela Restauração 20. James Fenimore Cooper (1789-1851) foi um com o apoio de 14 exércitos estrangeiros insprolífico escritor norte-americano. Seu romantalados em território russo, deixaram, por volce mais famoso é O últim o dos m oicanos (1826). ta de 1921, uma herança de 7 milhões de "me21. Reid, [Thomas] Mayne (Irlanda, 1818-1883, ninos e meninas de rua" [biezpriezorniki], que Inglaterra), viveu durante uma década como aventureiro nos Estados Unidos, e daí extraiu se dedicavam ao roubo e à prostituição (cf. J. A. Stevens, "Children of the Revolution: Soviet material para escrever 70 romances, cujas exRussia's Homeless Children in the 1920s", citantes aventuras entusiasmaram milhões de Russian History, 1982,9:2-3, p. 242-264). Esse crianças. Descreveu os costumes dos colonos e grave problema desapareceu poucos anos dedos índios do faroeste e se transformou em pois, mediante a criação de colônias como a herdeiro de Coopero Seus romances têm títudescrita por Anton S. Makarenko em seu P oelos estridentes, como Os caçadores de escalpos. Na edição norte-americana, esse autor não foi m a pedagógico. 25. Paul Gerbard Natorp (1854-1924) foi um filóidentificado, sendo designado como "Captain Mayne- Readee" (sic). sofo alemão neokantiano de escola de Mar22.UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA É duvidoso que tal fato realmente tenha ocorburgo. Ele concebeu a consciência como um sistema de normas que fundamenta as ciências, rido. Devido ao fontexto em que Vigotski meninclusive a ética, a educação e a política. Entre ciona essa história, 'é muito provável que a tesuas obras, além de uma monografia clássica nha conhecido lendo Tchekov, que a narra em sobre Pestalozzi, destaca-se: Sozialpiidogogik [A seu conto R apazes. No conto podem ser lidas pedagogia social], op. cito na nota n 14 do Capo frases como "Você leu Mayne Reid?", "Cheche9, editada em russo em 1911. É provável que vitzin se autodenominava 'Montigono Garra de aqui Vigotski esteja se referindo a esse livro. Abutre' e chamava de 'Irmão Cara Pálido' a Volodia, "os rapazes estavam se preparando 26. É muito provável que esta seja uma referência a Robert Gaupp, P sychologie des K indes [P sicopara escapar para algum ponto da América", logia das crianças], op.cit. etc. A rigor, o objetivo dos meninos não era se I 2 / A E d u cação E stética A E S T É T IC A A S E R V iÇ O D A P E D A G O G IA FEDCBA ções i alheias e, de acordo com a idéia de al- zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPON guns pedagogos, deve servir de meio para a o problema relativoUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA à " natureza, ao sigeducação do conhecimento, do sentimento ou nificado, aos objetivos e aos métodos da eduda vontade moral. cação estética ainda não foi resolvido de forConsideramos que, atualmente, se estama definitiva na ciência psicológica nem na beleceu a falsidade e a falta de valor científico pedagogia teórica. Desde tempos remotos até desse critério. Os três objetivos estranhos imos dias de hoje, há três pontos de vista extrepostos à estética - o conhecimento, o sentimenmos e contraditórios a respeito que, década to e a moral - desempenharam, na história após década, supostamente sempre encondessa questão, um papel que atrasou muito tram novas confirmações em toda uma série todos os esforços realizados para sua correta de pesquisas psicológicas. Portanto, a polêcompreensão. mica e o problema, em vez de se resolverem e aproximarem-se de seu final, parecem se comA M ORAL E A ARTE plicar cada vez mais com o avanço do conhecimento científico. Em geral, supõe-se que uma obra de arte Muitos autores tendem a negar quase possui um efeito moral, bom ou ruim, porém todo o significado educativo das vivências esdireto e, quando as impressões estéticas são téticas, e a corrente da pedagogia ligada a esavaliadas, sobretudo na infância e najuventuses autores e que se desenvolveu a partir de de, tende-se a valorizar esse impulso moral que uma raiz comum continua defendendo a mesemerge de todas as coisas. As bibliotecas inma idéia, atribuindo um significado estreito e fantis são formadas para que as crianças exlimitado à educação estética. No entanto, os traiam dos livros exemplos morais que lhes sirpsicólogos da corrente oposta tendem a exavam de lição; assim, a tediosa moral convenciogerar o significado das vivências estéticas e lhes nal e as falsas lições se transformam no estilo falta pouco para ver nelas o meio pedagógico essencial da insincera literatura infantil. radical que resolve todos os problemas comA única coisa séria que a criança pode plexos e difíceis da educação. extrair do contato com a arte - isso é o que se Entre esses dois pontos extremos situadiz - é uma ilustração mais ou menos vívida se uma série de critérios moderados sobre o desta ou daquela norma moral. O restante é papel da estética na vida infantil, a maioria considerado inacessível à compreensão infandos quais tende a reduzir o significado da estil. Para além dos limites da moral, em geral a tética ao entretenimento e ao goze.' Embora literatura infantil se reduz a poesias de absuralguns valorizem o sentido sério e profundo dos e disparates, pois só isso seria acessível à da vivência estética, quase nunca se fala damlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA compreensão das crianças.' Daí também surge educação estética com o um fim em si m esm o, o néscio sentimentalismo inerente à literatura mas apenas como um meio para obter resultainfantil e que é sua característica distintiva. O dos pedagógicos, alheios à estética. E ssa estétiadulto tenta imitar a psicologia infantil e, suca a serviço da pedagogia sempre realiza fun- 226QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA podemos ter certeza de que nosso cálculo lógipondo que o sentimento sério não seja acessíco terá o efeito esperado, quando se trata de vel para a criança, sem qualquer aptidão nem crianças. A respeito disso, os exemplos e anahabilidade adoça os acontecimentos e os helogias são menos instrutivos que os fatos da róis, substitui o sentimento pela pieguice e a vida e da psicologia infantis, publicados na liemoção pelo sentimentalismo. O sentimentateratura [bibliografia] sobre como as crianças lismo não passa da estupidez do sentimento. entendem as fábulas de Krilov" Como resultado, a literatura infantil geNos casos em que as crianças não tentam ralmente é um brilhante exemplo de falta de adivinhar a resposta que o professor espera degosto, de alteração profunda do estilo artístilas, mas falam sinceramente e por conta própria, co e da mais desoladora incompreensão do psiquismo infantil. suas opiniões são opostas à moral do professor, e isso fez alguns pedagogos pensarem que até esAcima de tudo, temos de rejeitar o critério de que, supostamente, as vivências estétisas obras tão indiscutivelmente "éticas" podem exercer uma influência moral prejudicial ao pascas possuem certa relação direta com as morais e que toda obra de arte contém uma essar pela psique das crianças. É preciso levar em pécie de estímulo para o comportamento conta as leis desse meio refratante [a psique inmoral. Um fato sumamente curioso foi publifantil]. Se não o fizermos, correremos o risco de cado na literatura [bibliografia] pedagógica obter esse tipo de resultados. norte-americana com relação à influência Por exemplo, na fábula [de Krilov] O cormoral de um livro tão indiscutivelmente vo e a raposa, toda a simpatia das crianças dirigiu-se para a raposa. Esta despertou sua adhumano comomlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A cabana do P ai T om , ás de Beecher Stowe." Quando se perguntou aos esmiração, e elas acharam que ela enganou com colares desse país quais eram seus desejos e inteligência e destreza o tolo corvo. Não se obteve o efeito que o professor pensava conseos pensamentos despertados pela leitura do livro, alguns deles responderam que lamenguir: a aversão à adulação e à aduladora. As tavam muito que a época da escravidão tivescrianças riram do corvo e a ação da raposa lhes pareceu admirável. As crianças não extraíram se passado e que não existissem mais escravos nos Estados Unidos. Esse fato adquire um da fábula a conclusão de que "a adulação é ruim e prejudicial", chegando assim a um sensignificado ainda maior porque nesse caso não timento moral oposto ao que se esperava. se trata de uma excepcional torpeza ou incomA cigarra e aform iNa fábula [de Krilov]FEDCBA preensão moral, mas porque a possibilidade ga, a simpatia das crianças foi provocada pela dessa conclusão está inserida na própria natureza das vivências estéticas infantis e nundespreocupada e poética cigarra que cantava durante todo o verão, e a responsável e tediosa ca podemos ter certeza antecipadamente de qual será a influência moral de um determiformiga lhes pareceu odiosa; na opinião delas, nado livro. toda a fábula tinha a ver com a obtusa e arroNesse sentido é muito instrutivo o conto de gante avareza da formiga. Os resultados espeTchekov sobre um monge medieval que, com um rados não foram alcançados de novo e, em vez de inspirar nas crianças respeito pela diligência assombroso talento de artista, relatou aos seus e pelo trabalho, a fábula lhes inculcou a alegria colegas do mosteiro o poder do diabo, a e a beleza de uma vida fácil e despreocupada. corrupção, o horror e as tentações que tinha visDa mesma forma, na [fábula de Krilov] to na cidade. O relator estava indignado e, como era um verdadeiro artista e falou com grande O lobo no canil, as crianças transformaram o lobo em herói, pois lhes pareceu que ele transentusiasmo, de forma eloqüente e sonora, essa mitia uma verdadeira grandeza, burla e um força do diabo e a sedução mortal do pecado foram pintadas tão claramente que, de manhã, magnânimo desprezo com relação aos cuidadores e aos cães, no instante em que [o lobo] não restava mais nenhum monge no mosteiro, pois todos tinham fugido para a cidade." não implorou por sua própria salvação, mas ofereceu, com altivez e arrogância, sua defesa A ação moral da arte faz recordar com e proteção. E as crianças não apreciaram a fámuita freqüência o estilo desse relato e nunca P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 227 ticos; não se comunica a flexibilidade, a sutilebula a partir do ângulo de seu sentido moral, za e a diversidade das formas às vivências esisto é, do castigo ao lobo, mas da perspectivatéticas; pelo contrário, transforma-se em rese é que podemos dizer isso - da trágica grangra pedagógica a transferência da atenção do deza de sua morte heróica. aluno da obra para seu significado moral. O Poderíamos citar uma infinita quantidaresultado dessa educação foi uma sistemática de de exemplos e casos com essas mesmas fádestruição do sentimento estético, sua substibulas ou com outras para confirmar o mesmo tuição pelo aspecto moral alheio à estética e, fato. No entanto, a escola russa, sem levar em daí, vem essa aversão natural à literatura clásconsideração o fato psicológico da diversidasica que 99% dos alunos que cursaram nossa de de possíveis interpretações e conclusões escola média sentem. Muitos dos que são parmorais, sempre se empenhava em adaptar tidários da exclusão da literatura como disciqualquer vivência artística a certo dogma moplina de ensino escolar assumem esse ponto ral, conformando-se com sua assimilação, sem de vista e afirmam que o melhor meio de inssuspeitar que com freqüência um texto literápirar aversão a qualquer escritor e impedir sua rio não só não contribuía com essa assimilaleitura é introduzí-lo no curso escolar. ção, mas também inculcava uma noção moral totalmente oposta. Blonski caracterizou acertadamente nossa educação estética quando A A R T E E O E S T U D O D A R E A L ID A D E afirmou que, nas aulas de literatura de nosso país, a poesia estava ausente, perdia-se toda a Outro erro psicológico na educação estédiferença entre o texto de uma fábula de Krilov tica, não menos prejudicial, foi impor à estétie a exposição prosaica de seu conteúdo. ca tarefas e fins alheios a ela, não de caráter A forma suprema e caricaturesca de tudo moral, mas social e cognoscitivo. A educação isso foi a busca do sentido fundamental de estética era adotada e admitida como um meio qualquer obra pela explicação "do que o aude ampliar o conhecimento dos alunos. Por tor quis dizer" e do significado moral de cada exemplo, todos nossos cursos de história da personagem separadamente. Solcgub" cita a literatura se baseavam nesse princípio e subsinterpretação [ridícula] que o professor tituíam deliberadamente o estudo das leis e Peredonov faz de um verso de um poema de fatos artísticos pelo estudo dos elementos soPushkin: "Com sua loba faminta o lobo cociais presentes nas obras [literárias]. É promeçou a andar".' Oferece-se aqui um panofundamente importante verificar que os marama exagerado, porém não tergiversado desnuais escolares mais populares sobre a históse prosaísmo sistemático da poesia, que interia da literatura russa, nos quais se inspirava grava a base de toda a educação estética e o ensino ministrado pelos nossos professores que se reduzia a isolar da obra literária seus de literatura avançada,mlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHG intitulam -se H istória elementos não-artísticos e a inventar várias da intelectualidade russa [de] Ovsiannikoregras morais relacionadas ao tema da obra. Kulikovski" e H istória do pensam ento social rusIsso está em profunda contradição com a so [de] Ivanov-Razumnik).? Em vez de estunatureza da vivência estética e, além disso, é dar os fenômenos e fatos literários, estuda-se preciso observar que age de forma mortífera a história da intelectualidade e do pensamensobre a própria possibilidade da percepção esto social, isto é, temas que, na verdade, são tética e da atitude estética com relação às coialheios e estranhos à educação estética. sas. Subentende-se que, com esse critério, a Tudo isso tinha um grande significado e . obra de arte fica desprovida de seu valor indeum sentido histórico na época anterior [czapendente, transforma-se em uma espécie de rista], quando nossa escola estava separada por ilustração de uma tese moral geral; toda a atenuma muralha chinesa das disciplinas sociais e ção concentra-se justamente nesse último asquando obtínhamos os germes da educação pecto, e a obra de arte fica fora da percepção ssocial e cívica nas aulas de literatura. Mas agodo aluno. Na verdade, com essa concepção não ra, quando se atribuiu às disciplinas sociais o se criam nem educam atitudes e hábitos esté-QPONMLKJIHGFEDCBA 228QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 'I, I! II lugar que lhes corresponde, essa substituição dos valores estéticos pelos sociais também seria prejudicial, tanto para uma ciência quanto para a outra. E essa mescla de diferentes campos do conhecimento se parece com os casais em que ambas as partes estão igualmente interessadas no divórcio. Em primeiro lugar, quando se estuda a sociedade conforme as imagens literárias, sempre se assimilam formas falsas e distorcidas, porque a obra de arte nunca reflete a realidade em toda a sua plenitude e em toda a sua verdade; ela representasempre um produto sumamente complexo elaborado pelos elementos da realidade, ao qual aporta um conjunto de elementos totalmente alheios. Em definitivo, quem só conhece a história da intelectualidade russa por meio de Oneguin e Chatski'? corre o risco de adquirir um critério totalmente errôneo sobre essa história. Procede de modo muito mais razoável quem a estuda com base em documentos históricos, cartas, diários íntimos e todos os materiais nos quais o estudo histórico se baseia, e entre os quais corresponde aos monumentos literários o mais modesto ou até mesmo o último lugar. O estudo da história da intelectualidade russa segundo a literatura russa é tão impossível como o estudo da geografia conforme os romances de Júlio embora ambos os temas tenham se Verne,UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA refletido na literatura. Esse critério baseia-se na falsa noção de que a literatura constitui uma espécie de cópia da realidade, uma fotografia típica que faz lembrar uma foto coletiva, que permite fotografar uma série de pessoas pertencentes a um mesmo grupo e sobrepõe os traços de uma pessoa sobre a outra e, por isso, os traços típicos do grupo se destacam com enorme clareza, enquanto os traços individuais e fortuitos se diluem. Com esse simplíssimo mecanismo obtémse o retrato típico de uma família, de um grupo de doentes ou de delinqüentes. Supõe-se que a imagem literária também seja parecida com essa fotografia grupal e que, por exemplo, o personagem Eugênio Oneguin reuniu e combinou em si os traços típicos da intelectualidade russa da década de 20 [do século XIX] e, por isso, é considerado material fidedigno para estudar a época. Entretanto, é fácil deII -, i monstrar que a verdade artística e a verdade da realidade nessa figura - como em todas as outras - são encontradas em relações sumamente complexas; [é fácil demonstrar] que, na arte, a realidade está sempre tão transformada e modificada que não é possível fazer uma transferência direta do significado dos fenômenos da arte para os da vida. Ao mesmo tempo, nessa forma de ensino corremos o risco de compreendermos mal a realidade, bem como de excluir os aspectos puramente estéticos. O interesse e a atenção orientados para o estudo do homem da década de 20 [do século XIX] não tem, do ângulo psicológico, nada em comum com o interesse e a atenção dirigidos à poesia de Pushkin: cristalizam-se em reações, emoções e atos psíquicos absolutamente diferentes, que só se valem de um material comum para necessidades totalmente diferentes. O teto de qualquer prédio arquitetônico pode ser utilizado como defesa contra a chuva, como ponto de observação, como local para um restaurante e diversos outros fins, mas sempre esquecemos completamente o significado estético do telhado como parte de um todo artístico, como parte de um projeto arquitetônico. A A R T E C O M O U M F IM E M S I M E S M O Por último, gostaríamos de destacar um terceiro erro cometido pela pedagogia tradicional ao reduzir a estética ao sentimento do agradável, ao prazer da obra de arte, vendo nisso um fim em si mesmo. Em outros termos, reduz todo o significado das vivências estéticas ao sentimento imediato de gozo e alegria que elas despertam na criança. De novo, a obra de arte é considerada um meio para estimular reações hedonistas e, na verdade, ela é colocada no mesmo nível que outras reações e estímulos similares de índole completamente real. Quem pensa cultivar a estética na educação como fonte de prazer sempre corre o risco de encontrar na primeira guloseima e no primeiro passeio os mais fortes concorrentes. A particularidade da idade infantil reside justamente no fato de que a força direta de uma vivência real concreta é P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 229 muito mais significativa para a criança que a a obra de arte não é acessível, de forma alguma, à percepção de todos, e que a percepção força de uma emoção imaginária. Portanto, vemos que a pedagogia tradide uma obra artística representa um trabalho psíquico difícil e árduo. Evidentemente, a obra cional se deparou com um beco sem saída com de arte não é percebida com uma total passivirelação aos problemas da educação estética, dade do organismo, nem apenas com os ouviao tentar lhe impor fins completamente alheidos ou os olhos, mas mediante uma muito comos e impróprios; assim, primeiro perdeu de visplexa atividade interna em que a visão e a auta sua própria importância e depois encontrou dição são apenas o primeiro passo, o impulso resultados opostos aos que esperava.QPONMLKJIHGFEDCBA básico. Se a missão de um quadro consistisse tãoA P A S S IV ID A D E E A A T IV ID A D E somente em mimar nossos olhos, e a da músiN A V IV Ê N C IA E S T É T IC A " ca em proporcionar vivências gratas a nossos ouvidos, a percepção dessas artes não apresenEsses erros psicológicos não eram protaria qualquer dificuldade e todos, exceto os vocados apenas pelo desconhecimento dos cegos e surdos, estariam destinados a percebêpedagogos, mas por um erro muito mais amIas. Entretanto, o momento da percepção senplo e profundo da própria ciência psicológica sorial dos estímulos não passa do impulso inicom relação às questões da estética. Durante cial necessário para despertar uma atividade muito tempo persistiu nela [a ciência psicomais complexa e que,mlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFE per se, carece de todo lógica] o critério de que a percepção estética sentido estético. Christiansen afirma o seguinconstitui uma vivência totalmente passiva, te: "O entretenimento de nossos sentidos não uma total entrega à impressão, uma detené o objetivo final do projeto artístico. Na músição de toda a atividade do organismo. Ao ca, o principal é inaudível; nas artes plásticas, mesmo tempo, os psicólogos frisavam que o o fundamental é o invisível e o intangível"." desinteresse, a admiração generosa, a comEsse aspecto invisível e intangível, duranpleta repressão da vontade e a falta de toda te o processo estético, deve ser entendido aperelação pessoal com o objeto estético eram nas como a transferência do acento principal condições para a realização da reação estétipara o momento de resposta da reação ante ca. Tudo isso é verdade, mas é apenas a meimpressões sensoriais que chegam de fora. tade da verdade e, portanto, oferece uma noNesse sentido, podemos dizer claramente que ção totalmente falsa sobre a natureza dessa a vivência estética é estruturada conforme o reação em sua totalidade. modelo exato de uma reação comum, que neNão resta dúvida de que certo grau de cessariamente pressupõe a presença de três passividade e desinteresse são a premissa psicomponentes: excitação, elaboração [procescológica infaltável do ato estético. Quando o samento] e resposta. O componente da perespectador ou o leitor assume o papel de parcepção sensorial da forma e a tarefa realizada ticipante ativo na obra que percebe, ele sai de pelos olhos e ouvidos constituem apenas o forma definitiva e irreversível da esfera da esmomento inicial da vivência estética. Temos tética. Ao observar uma maçã pintada em um de considerar agora os dois restantes. Sabequadro, quando a atividade ligada à intenção mos que, na verdade, uma obra de arte reprede saborear uma maçã de verdade está mais senta apenas um sistema organizado de uma intensamente desenvolvida em mim, é claro maneira especial das impressões externas ou que o quadro permanecerá fora de meu camdas influências sensíveis sobre o organismo. po de apreensão. No entanto, essa passividade No entanto, essas influências sensíveis estão constitui apenas - como pode ser facilmente organizadas e construídas de tal forma que desdemonstrado - o lado inverso de outra ativipertam no organismo um tipo de reação difedade, incomensuravelmente mais séria e nerente da habitual, e essa atividade peculiar, licessária ao ato estético. Isso pode ser comprogada aos estímulos estéticos, é que constitui a vado sem dificuldade pelo simples fato de que natureza da vivência estética.':' 230QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Ainda não podemos dizer com exatidão em que consiste [a vivência estética], pois a análise psicológica ainda não pronunciou a última palavra sobre sua composição, mas sabemos que ela envolve uma atividade construtiva muito complexa que é efetuada pelo ouvinte ou pelo espectador e que seria a seguinte: com as impressões externas apresentadas, a pessoa constrói e cria um objeto estético ao qual se referem todas suas reações posteriores. Nos fatos, por acaso um quadro não é apenas um pedaço de tela com certa quantidade de pintura aplicada em cima-dela? Mas, quando o espectador interpreta essa tela e essas cores como a representação de uma pessoa, de um objeto ou de uma ação, esse complicado trabalho de transformar a tela pintada em um quatro pertence totalmente ao psiquismo É preciso correlacionar as linhas, do receptor.UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA fechá-Ias sobre certos contornos, vinculá-Ias entre si de certa maneira, interpretá-Ias em perspectiva e transferi-Ias para o espaço, para que se pareçam com a figura de um ser humano ou de uma paisagem. Depois, precisamos aplicar a complexa tarefa de recordar, de associar idéias para compreender que pessoa ou que paisagem está representada no quadro, observar em que relação estão suas diferentes partes. Toda essa tarefa necessária pode ser denominada "segunda síntese criativa", porque exige que o receptor reúna e sintetize os elementos dispersos do todo artístico. Se uma melodia chega à nossa alma é porque nós mesmos podemos coordenar os sons que nos chegam de fora. Há muito tempo, os psicólogos dizem que todo o conteúdo e o sentimento ligados a um objeto de arte não estão nele, mas são aportados por nós. É como se introduzíssemos o sentimento das imagens da arte, e o próprio processo de percepção é chamado pelos psicólogos de "empatia". Essa complexa atividade de empatia se reduz, em essência, à renovação de uma série de reações internas, à união que as coordena e a uma certa reelaboração criativa do objeto próximo de nós. Essa função constitui a atividade estética básica que, por sua natureza, é uma atividade do organismo que reage ao estímulo externo. A IM P O R T  N C IA D A A T IV ID A D E B IO L Ó G IC A E S T É T IC A A importância biológica da atividade estética também figura entre essas questões polêmicas e confusas. Só nos degraus inferiores do surgimento da atividade estética é possível captar seu significado biológico. Inicialmente, a arte surge por necessidade de vida, o ritmo é a forma primitiva de organização do trabalho e da luta, os ornamentos fazem parte do cortejo sexual; a arte tem um evidente caráter utilitário e auxiliar." Mas o verdadeiro significado biológico da arte contemporânea - de arte nova - sem dúvida se encontra um pouco mais longe. Para o selvagem [homem primitivo] o cântico guerreiro substitui a voz de mando e a organização do combate, e o soluço fúnebre lhe parece um canal direto com o espírito do morto; no entanto, essas funções cotidianas comuns e imediatas não podem, de forma alguma, ser atribuídas à arte contemporânea e, assim, sua importância biológica deve ser buscada em alguma outra parte. Uma lei enunciada por Spencer" tornouse muito popular: a lei da economia das forças criativas, segundo a qual o significado das obras de arte e do prazer que elas proporcionam se explica totalmente por meio da economia de forças espirituais, pela economia de atenção que acompanha toda percepção da arte. A vivência artística é a mais econômica e vantajosa para o organismo, rende o maior efeito com um gasto mínimo de energia, e esse ganho de energia é o que constitui a base do prazer artístico. "O mérito do estilo reside precisamente no fato de que ele proporciona a maior quantidade possível de idéias com a menor quantidade possível de palavras", afirma Aleksandr Viesielovski." Como claros exemplos dessa lei mencionam-se geralmente a importância facilitadora da simetria e o descanso proporcionado pela interrnitência do ritmo. Entretanto, mesmo que essa lei fosse certa, ela na verdade teria muito pouco a ver com os problemas da arte, pois encontraríamos essa mesma economia de forças em todas as áreas em que a criação humana se manifesta. Em uma fórmula matemática e em uma lei física, P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 231 na classificação dos vegetais e na teoria sobre A solução para o problema do significaa circulação do sangue está implícita uma ecodo biológico do ato estético - e essa é uma das preocupações da psicologia atual - deve ser nomia de forças não menor que na produção buscada na elucidação da psicologia da criaartística e, caso se alegasse a existência de uma economia na influência estética, seria incomção do artista e na convergência da compreensão da apreensão e do processo de criação. preensível ver o que distingue a economia estética da economia comum a toda criação. Antes de nos perguntarmos para que lemos, Além disso, essa lei não exprime a verdade cabe perguntar para que as pessoas escrevem. psicológica e se opõe às pesquisas exatas no O problema do esforço de criação e de suas fontes psicológicas volta a apresentar dificulâmbito da arte. O estudo da forma artística tem dades não-comuns, pois passamos aqui de um demonstrado que, na vivência artística, não estamos diante de uma reprodução da realiobstáculo para outro. Mas não cabe duvidar mais da tese geral, conforme a qual o esforço dade facilitada, mas dificultada, e alguns dos pesquisadores mais radicais se atrevem a falar de criação é a mais profunda necessidade de [ostranenieJ dos objede uma "condensação"mlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nossa psique, no sentido da sublimação de altos como lei fundamental da arte. De qualquer guns tipos inferiores de energia. A concepção forma, fica claro que a linguagem poética é da criatividade como sublimação, isto é, como mais difícil que a prosa e que sua disposição transformação dos tipos inferiores de energia incomum das palavras, sua composição em psíquica não-consumidos e que não encontram saída na atividade normal do organismo em versos, seu ritmo, não só não aliviam nossa tipos superiores, é a mais verossímil da psicoatenção de qualquer trabalho, mas exigem dela uma constante tensão com relação aos elemenlogia moderna. Já esclarecemos [no CapoUTSRQPONMLKJ 5J o tos que aqui se manifestam pela primeira vez conceito de sublimação com relação à teoria e que não existem na fala corrente. sobre os instintos e, em particular, citamos a Mas a atual crítica de arte transformou opinião que estabelece que existe um estreito em uma completa tolice a tese de que, na obra nexo entre o processo criativo e a sublimação de arte, a percepção de todos os seus elemenda energia sexual. Segundo as palavras de um tos perde seu automatismo e se torna conscienpsicólogo, nas questões da criação temos algo te e sensível. Assim, por exemplo, na fala corcomo pessoas ricas e pobres, algumas das quais rente não prestamos atenção ao aspecto fonégastam toda a sua reserva de energia na vida tico da palavra. Os sons são percebidos de forcotidiana, enquanto outras a reservam e economizam, ampliando o círculo de necessidama automática e do mesmo modo se relacionam com um certo significado. James destades a serem satisfeitas. Em ambos os casos a cou o aspecto estranho e inusual que adquiricriação surge a partir do instante em que certa ria para nós nossa língua materna se a ouvísenergia não-aplicada e não-gasta em um fim semos sem compreender, como um estrangeiimediato não se realiza e ultrapassa o limiar ro. Ao mesmo tempo, devemos lembrar que a da consciência, do qual retoma transformada lei da linguagem poética é justamente a preem novos tipos de atividade. sença dos sons no campo iluminado da consTambém já explicamos detalhadamente ciência e a concentração da atenção neles proque nossas possibilidades superam nossa atiduz uma atitude emocional com relação aos vidade, que na vida do ser humano ocorre apemesmos. Conseqüentemente, a percepção da nas uma parte insignificante de todas as excilinguagem poética é mais difícil, pois exige um tações que surgem no sistema nervoso, e essa trabalho adicional em comparação com a lindiferença entre as possibilidades e a realizaguagem cotidiana. É evidente que a importânção, entre o potencial e o real em nossa vida é salva totalmente pela criação. Conseqüentecia biológica da atividade estética não reside nesse parasitismo que surgiria inevitavelmenmente, a identidade dos atos de criação e dos atos de apreensão da arte passa a ser uma prete se todo o gozo estético fosse adquirido às missa fundamental. Ser Shakespeare e ler custas de uma economia de forças espirituais Shakespeare são fenômenos que se diferenciam obtida graças ao trabalho alheio.QPONMLKJIHGFEDCBA 232QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA j I I ~ I I :1., :1 1"1 , ., ,. " l' infinitamente em seu nível, mas que são comcar esteticamente alguém, deve-se criar nessa pessoa um canal permanente de funcionamenpletamente iguais por sua natureza, como explica lu. Aíjenval." a leitor deve ser tão genial to correto que deriva e desvia a pressão do inquanto o poeta, e apreender a obra de arte é consciente para necessidades úteis. A sublimacomo se a recriássemos constantemente. Porção executa de formas socialmente úteis o que tanto, temos o direito de definir os processos o sonho e a doença realizam de forma individa apreensão como resumo e reprodução dos dual e patológica. processos de criação. E assim é inevitável extrair a conclusão de que constituem o mesmo A C A R A C T E R IZ A Ç Ã O P S IC O L Ó G IC A tipo biológico de sublimação de algumas forD A R E A Ç Ã O E S T É T IC A mas de energia espiritual que os processos de criação. Na arte, justamente, se realiza para Quando observamos, ainda que seja da nós essa parte de nossa vida que surge sob a forma mais superficial, uma reação estética, forma de estímulos de nosso sistema nervoso, percebemos que seu objetivo final não é a remas que não se cristaliza na atividade, porque petição de qualquer reação real, mas a supenosso sistema nervoso percebe mais excitações ração e o triunfo sobre ela. Se os poemas soque aquelas às quais pode reagir. a que acontece é que sempre existe no ser bre a tristeza tivessem apenas a finalidade de nos comunicar tristeza, isso seria muito triste humano a superioridade das possibilidades sopara a arte. Evidentemente, a tarefa da lírica bre a vida, de resquícios de comportamento nãonesse caso não consiste apenas em nos contarealizado, como explicamos na teoria sobre a giar, segundo a expressão de Tolstoi, com os luta pela via principal [no Capo 3J, e eles semsentimentos de outra pessoa - em nosso exempre têm de encontrar uma saída. Se esses resplo, a melancolia alheia -, mas colocar-nos quícios não encontram a saída adequada, cosacima dela, levar-nos a obter a vitória sobre tumam entrar em conflito com a psique humaela, a superar a tristeza. Nesse sentido, a defina e, no terreno desse comportamento não-realinição de Bukarin da arte como "socialização"mlkjihgfedcba zado, geralmente emergem formas anormais de [obobshchietvlienieJ dos sentimentos"19 e a teoconduta, neuroses e psicoses," que represenria de Tolstoi sobre o contágio do sentimento tam o choque de uma aspiração que não pôde de apenas uma pessoa em muitos" não são tose realizar, inconsciente, com a parte conscientalmente corretas psicologicam ente. te de nosso comportamento. a que permanece Nesse caso, o "milagre" da arte seria pairrealizado em nossa vida deve ser sublimado. recido com o triste milagre dos Evangelhos, em Para o que não se realizou na vida existem apeque com cinco pães e dois peixes foram alinas duas saídas: a sublimação ou a neurose. mentados "cinco mil homens, sem contar muPortanto, a arte representa, do ponto de vista lheres e crianças" e "comeram e se saciaram; e psicológico, um mecanismo permanente, biolorecolheram doze cestas com os pedaços resgicamente necessário, de eliminação das excitantes"." Aqui, o "milagre" consiste apenas na tações não-realizadas na vida e é uma acompaexcepcional multiplicação da experiência, pornhante inevitável de toda existência humanaUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA , que cada um dos comensais comeu apenas pão em algumas de suas formas. e peixe, peixe e pão. Com a socialização [geEssa sublimação na criação artística ocorneralização social] dos sentimentos na arte, obre de formas sumamente tempestuosas e vigotém-se a multiplicação dos sentimentos de um rosas, e a apreensão estética em formas atenuapor milhares, embora o sentimento de si mesdas, simplificadas e preparadas de antemão mo seja o tipo mais comum de emoção de orpelo sistema de excitações que chegam a nós. dem psicológica, e a obra de arte não pode Assim, resulta compreensível o significado exconter em si mesma nada além dos limites destraordinariamente importante da educação sa emoção quantitativamente enorme. É muiestética para a criação de hábitos permanento compreensível que, nesse caso, o destino da tes de sublimação do inconsciente. Para edu- !i ,I. / P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 233 arte seria lamentável, porque todo objeto real mos e, portanto, da liberação de algumas e toda emoção real ficariam diversas vezes mais forças trancadas e deslocadas, sobretudo as forças do comportamento moral. Um exceintensas, agudas e fortes e, assim, todo o pralente exemplo disso é encontrado no conto zer proporcionado pela arte emanaria da pode Tchekov Em mlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA casa, em que o pai, um fiscal breza e da fome do ser humano, quando na que durante toda a vida utilizou todos os tiverdade deriva da sua riqueza, do fato de que pos possíveis de repressão, censura e castitoda pessoa possui mais riqueza que a que pode gos, depara-se com uma situação sumamenjuntar em toda a sua vida. . Portanto, a arte não é um complemento te difícil quando descobre um pequeno delida vida, mas o resultado daquilo que excede a to de seu filho, uma criança de sete anos que, vida no ser humano. O "milagre" da arte faz de acordo com o relato da governanta, tirou fumo da escrivaninha do pai e fumou. Por lembrar mais a transformação da água em vimais que o pai se empenhe em explicar ao d e arte é portadora nh022 e, por isso, toda obraUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA filho por que não se deve fumar, por que não de algum tema material real ou de alguma emoção totalmente corrente no mundo. No se deve pegar o fumo alheio, seu sermão não entanto, a tarefa do estilo e da forma reside alcança seus objetivos porque entra em chojustamente em superar esse tema real mateque com obstáculos insuperáveis na psique da criança, que percebe e interpreta o munrial ou esse caráter emocional de uma coisa e do de forma muito peculiar e completamenantecipar algo totalmente novo. Por isso, deste fora do comum. Quando o pai lhe explica de as mais remotas épocas, o significado da atividade estética foi entendido como uma que não se deve pegar coisas alheias, a criança responde que na escrivaninha do pai está catarse, isto é, como uma resolução e uma liseu cãozinho amarelo e que ela não tem nada beração do espírito das paixões que o torturam. Na velha psicologia atribuía-se a esse concontra isso, e que se o pai precisar alguma ceito um significado meramente médico e hioutra coisa que lhe pertence pode pegá-Ia que giênico de curar o espírito e, sem dúvida, isso ela não se incomodará. Quando o pai tenta está muito mais perto da verdadeira natureza lhe explicar que fumar faz mal, que o tio Grigori fumava e por isso morreu, esse exemda arte que toda uma série de teorias atuais. plo também exerce uma ação oposta na crian"Os salmos curam um espírito que sofre"; essas palavras de um poeta exprimem com exaça, porque para ela a imagem do tio Grigori tidão a linha divisória que separa a arte da está ligada a certo sentimento poético; ela lembra que o tio Grigori tocava violino madoença. Não foi em vão que muitos psicólogos ravilhosamente bem, e o destino desse tio caíram na tentação de encontrar característinão só é incapaz de fazer com que ela rejeite cas comuns entre ambas, declarar que os gênios o que tio fazia, mas também atribui ao ato estavam próximos da loucura e colocar fora de fumar um novo e atraente sentido. Assim, sem ter conseguido nada, o pai interdos limites da normalidade tanto a criação rompe a conversa com o filho e só antes de quanto a loucura humana." Só quando emdormir, quando começa a lhe contar uma preendemos esse caminho podemos comprehistória, combinando sem habilidade as priender o valor cognoscitivo, moral e emocional meiras idéias que passam pela sua mente com da arte. Todos estes, sem dúvida, podem exisos modelos tradicionais, seu relato adota tir, mas sempre como componentes secundáinesperadamente a forma ingênua e ridícula rios, como uma espécie de seqüela da obra de de uma história sobre um velho czar que tiarte que só surge depois de realizar por comnha um filho; o filho fumava, ficou tuberpleto a ação estética. culoso e morreu ainda jovem; os inimigos Não resta dúvida de que o efeito moral chegaram, destruíram o castelo, mataram o da arte existe e se manifesta através de cervelho czar e "até no pomar não havia mais to esclarecimento interno do mundo espiricerejeiras, pássaros nem campânulas". O prótual, de uma eliminação dos conflitos ínti-QPONMLKJIHGFEDCBA 234QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA prio pai considerou ingênua e ridícula a história; no entanto, ela provocou um efeito inesperado no filho que, com ar pensativo e baixando a voz, disse o que o pai não esperava ouvir: que não ia fumar mais. A própria ação da história estimulou e originou novas forças na psique da criança, deu-lhe a possibilidade de também sentir o temor e o interesse do pai por sua saúde com uma intensidade tão nova que seu efeito moral, sugerido pela insistência prévia do pai, manifestou-se de forma inesperada mediante' o resultado que o pai tinha tentado obter anteriormente em vão. Ao mesmo tempo, porém, é preciso recordar as características psicológicas essenciais que distinguem esse efeito. A primeira delas é realizada sob a forma de um processo íntimo, interno, da atenção da própria criança, e de nenhuma maneira é obtida por meio de uma inferência lógica feita a partir de um sermão moral ou de uma lição extraída de uma fábula ou de um conto. Pelo contrário, quando mais intensa for a emoção e a paixão na atmosfera em que ocorre a ação da impressão estética, mais elevada será a animação emocional que a acompanha, maiores forças serão incorporadas ao efeito moral e mais fielmente se realizará a impressão estética. A segunda característica consiste em que, desse ponto de vista,UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA a : ação moral da estética pode ser casual e secundária; assim, consideráIa base da educação de um comportamento moral não seria razoável nem sólido. Na história, o pai reflete acertadamente sobre a questão de se é ou não correto que "o remédio deve ser doce e a verdade bela". Uma sociedade que extrai suas convicções dos romances e poesias, dos conhecimentos históricos das óperas e das antigas canções, bem como da moral das fábulas, nunca atinge um nível sólido e firme em cada um desses terrenos. Tchekov denomina claramente esse aspecto como capricho do ser humano desde a época de Adão e, nesse sentido, coincide plenamente com a pedagogia que exige da criança uma formação moral estrita e baseada na verdade." Também é possível e realizável o efeito cognoscitivo da arte. Uma obra de arte viven- ciada realmente pode ampliar nossa opinião sobre certo campo de fenômenos, obrigar-nos a observá-lo com novos olhos, generalizar e reunir fatos por vezes totalmente dispersos. Como toda vivência intensa, a vivência estética cria um estado muito sensível para as ações posteriores e, naturalmente, nunca passa sem deixar marcas em nosso comportamento posterior. Muitos comparam, com grande acerto, a obra poética com um acumulador de energia, que posteriormente a gasta. Do mesmo modo, toda vivência poética age como se acumulasse energia para ações futuras, lhes dá uma nova direção e faz com que o mundo seja visto com outros olhos. Os psicólogos mais radicais falam das atitudes meramente motoras provocadas por determinadas obras [de arte]. Recordemos, por exemplo, a existência de tipos de arte como a música dançante para notar que, em todo estímulo poético, está implícito um impulso motor. Ao mesmo tempo, este às vezes se realiza de forma imediata e tosca, em um evidente movimento de dança ou na marcação do ritmo, e isso pertence aos gêneros inferiores da arte. No entanto, às vezes, quando a complexidade desse estímulo chega ao seu mais alto grau, a complexidade motora desses impulsos não permite que eles sejam realizados plena e imediatamente, exprimindo-se então em um sutil trabalho preliminar para o comportamento posterior. A vivência estética organiza nosso comportamento. "Pela forma como uma pessoa sai de um concerto sempre podemos dizer a quem ela escutou, se Beethoverr" ou Chopin;" diz um pesquisador. Os psicólogos que estudaram os estímulos visuais que partem da pintura estão de acordo ao concluir que, no sistema da vivência do quadro, o papel fundamental pertence às reações cinestésicas, isto é, também motoras, e que olhamos o quadro mais com os músculos que com os olhos; sua ação estética está tanto nas pontas dos dedos quanto na visão, pois fala à nossa imaginação tátil e motora bem como à visual. Por último, o momento hedonista de prazer produzido pelas obras de arte pode estar presente como uma conseqüência e exercer in- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 235 fluência educativa em nossos sentidos, porém passiva com relação ao protagonista, que é ela sempre será secundária com relação à ação acentuada pela aproximação da morte e que fundamental da poesia e da arte. Isso se parece alimenta nosso sentimento de temor e admimuito com o que os psicólogos chamam de "forração. Assim, a fonte desse prazer deve ser ça expulsora das emoções superiores". Assim buscada em outro lugar e, naturalmente, só a como na Antigüidade, o poder exorcista da paencontramos namlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA catarse, isto é, na resolução lavra rítmica e do estilo poético expulsava os das paixões geradas pela tragédia, que constiespíritos e curavam, também a poesia contemtui o fim último da arte. "O terror - diz porânea expulsa e resolve as forças hostis ao Christiansen - não é representado em si mesorganismo, porque em ambos os casos se trata mo, mas como um impulso para superá-lo." de certa solução de conflitos internos. Da mesma forma, o cômico ou que é deÉ sumamente curioso recordar que o gozo testável ou rasteiro em si mesmo também prodas obras poéticas sempre 'surge de forma invoca um grande gozo, de um modo totalmente direta, contraditória, partindo infalivelmente incompreensível à primeira vista. Em O inspeda superação das impressões imediatas que o tor, de Gogol, nenhuma palavra é bela; pelo objeto e a arte produzem. Lembramos o trágicontrário, o autor se empenhou em buscar tudo co e o cômico na arte como os exemplos mais o que existe de chocante, oxidado e grosseiro eloqüentes dessa lei psicológica. A tragédia na língua russa. Na obra, todas as pessoas são sempre fala da morte e provoca em nós, serepulsivas, todas as situações são vis e não há gundo a definição de Aristóteles, medo, hornenhum pensamento luminoso. Mas, a pesar de ror e compaixão." Se não contemplarmos uma tudo isso, dessa vileza e repulsão brota certa tragédia com esses sentimentos, mas com um idéia peculiar que provoca riso, ou seja, essa leve sorriso, sua ação trágica, naturalmente, reação psicológica que o próprio espectador permanecerá desconhecida para nós. Os antiaporta e que não está implícita na comédia. Pelo gos já se interessavam pelo seguinte problecontrário, todos os personagens são totalmente ma: de que modo o doloroso pode se transforsérios, mas todo esse material está organizado mar em uma vivência do belo e por que a conde tal modo que provoca no espectador, inevitemplação da morte alheia pode oferecer um tavelmente, a reação de uma enorme gargalhagozo tão elevado ao espectador de uma tragéda, que pode ser comparada com a poesia líridia? Ingenuamente, eles o explicavam pelo ca, e que Gogol qualifica acertadamente de únicontraste biológico e tentavam reduzir o praco personagem honesto de sua comédia. zer que experimentamos na tragédia a esse senHá muito tempo, a estética alemã denotimento de segurança e satisfação que o ser minou "estética do grotesco" a essa peculiarihumano sente sempre que a desgraça atinge dade psicológica da arte e, com esses exemoutra pessoa. De acordo com essa teoria psicoplos, mostrou com enorme poder de convicção, o caráter dialético da vivência estética. A lógica, a tragédia de Édipo produzia um prazer supremo nos espectadores, porque lhes encontradição, a repulsa interna, a superação, a vitória; todos eles são componentes necessásinava a dar valor à sua felicidade e à sua visão." Entretanto, os exemplos mais simples rios do ato estético. É preciso ver o grotesco citados pelos mesmos autores invalidam comem toda a sua força para depois, mediante o pletamente essa teoria, quando eles destacam riso, elevar-se acima dele. É preciso viver com que os espectadores que estão na costa e vêem o personagem da tragédia todo o problema irreparável da morte, para se elevar, junto com um barco afundar deveriam sentir um enorme prazer, proveniente da consciência de sua próo coro, acima dela. A arte sempre é portadora desse comportamento dialético que reconstrói pna segurança. a emoção e, por isso, sempre envolve a mais Até a observação psicológica mais simples complexa atividade de uma luta interna que é nos permite ver que, durante a vivência da tragédia, o autor suscita em nós uma atitude com-QPONMLKJIHGFEDCBA resolvida pela catarse. 236QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I A E D U C A Ç Ã O D A C R IA T IV ID A D E , D O UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA a u í z o E S T É T IC O E D A S H A B IL ID A D E S I, T É C N IC A S Essa tese, transferida para a área da educação, divide-se logicamente em três problemas diferentes. A área educacional se ocupa das tarefas de educação da criatividade infantil, do ensino profissional de certas habilidades técnicas da arte e da educação de seu juízo estético, isto é, da aptidão para perceber e vivenciar a obra de arte. Sem dúvida, a questão da criatividade infantil se resolve no sentido de seu extraordinário valor pedagógico, embora seu valor estético independente seja quase nulo. O desenho infantil sempre é um fato educativamente prazeroso, ainda que às vezes também seja esteticamente feio. Ele sempre ensina a criança a dominar o sistema de suas vivências, a vencê-Ias e superá-Ias e, segundo uma excelente expressão, ensina a psique a se elevar. A criança que desenha um cão triunfa, supera-se e eleva-se acima de suas vivências diretas." Nesse sentido, também se transforma em exigência pedagógica fundamental o fato de poder discernir o conteúdo psicológico do desenho infantil, isto é, comprovar e examinar as vivências que levam ao surgimento do desenho, mais que avaliar traços e linhas de forma objetiva. Por isso, a retificação e a correção de um desenho infantil significa apenas uma grosseira intromissão na estrutura psicológica de sua vivência e ameaça impedi-Ia. Quando as linhas infantis são modificadas e corrigidas, talvez introduzamos uma ordem rigorosa no desenho, mas estaremos provocando confusão e perturbação na psique infantil. Por isso, é fundamental que a psicologia dê plena liberdade à criação infantil, renuncie à tendência de compará-Ia com a consciência do adulto e admita sua originalidade e suas particularidades. O menino do conto de Tchekov anteriormente mencionado," quando o pai lhe pergunta por que desenhou o soldado mais alto que a casa, sabe perfeitamente que uma pessoa não pode ser mais alta que uma casa e, por isso, responde com total segurança que, se o soldado for desenhado pequeno, seus olhos não po- derão ser vistos. Nesse desejo de destacar o lugar principal e central do desenho, que é o que preocupa a criança no momento, e de subordinar a ele todas as outras proporções, reside a peculiaridade do desenho infantil e a tendência da criança a se sentir livre e independente do traçado real dos objetos. Isso não significa que ela não consiga ver os objetos como realmente são, mas que nunca permanece indiferente ao objeto. Todo desenho infantil que não for feito por indicação dos adultos sempre parte de seu caráter apaixonado que deve ser levado em conta como propriedade básica do psiquismo infantil- e, por isso, a criança sempre distorce os aspectos que são centrais e mais importantes para ela sem respeitar o objeto [em um sentido naturalista]. Essa mesma regra é proposta por Tolstoi em sua pedagogia, ao exigir que as composições [literárias] infantis não sejam corrigidas pelos adultos, nem mesmo no aspecto ortográfico, porque a correção de um produto criativo acabado sempre tergiversa os motivos internos que a geraram. Em seu famoso artigo "Quem aprende de quem a escrever: as crianças camponesas aprendem de nós ou nós aprendemos delas?";" Tolstoi defende a idéia, à primeira vista paradoxal, de que [... ] um pequeno camponês semi-analfabeto manifesta tal força consciente de artista que, em toda a vasta elevação de seu desenvolvimento, Goethe" não pode alcançar. [...] Pareceu-me tão estranho e ofensivo que eu, autor demlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Infância." que obtive certo êxito e reconhecimento de talento artístico do público culto russo; que eu, em matéria de arte, não só não possa dar indicações ou ajudar Siomka e Fiedka de 11 anos, mas mal - e isso só em um feliz momento de excitação - os posso seguir e compreender. Nas composições dessas crianças, Tolstoi encontrava mais verdade poética que nos maiores modelos da literatura. E ainda que em suas composições fossem encontrados alguns lugares-comuns, isso sempre ocorria por culpa do próprio Tolstoi; em compensação, quando as crianças eram deixadas à sua própria iniciativa, não enunciavam nada que pudesse ser considerado afetado. Tolstoi concluiu então que o , P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 237 ideal da educação estética, assim como o ideal isso lhe é necessário e também porque, em cada moral, não está na frente de nós, mas atrás, um de nós, estão implícitas certas possibilidaisto é, [o ideal] não é aproximar a alma infandes criativas. Os processos de seleção da til da alma do adulto, mas conservar suas quagenialidade e do talento ainda são tão confulidades naturais iniciais. sos, desconhecidos e misteriosos que a peda[Tolstoi dizia] :UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ''A educação arruína e não gogia é completamente impotente para dizer corrige as pessoas". Nesse sentido, a preocuquais são precisamente as medidas que ajupação da educação se reduz quase exclusivadam a conservar e a educar os futuros gênios. mente a não destruir as riquezas espirituais da Surge aqui uma questão sumamente concriança, e o preceito "sejam como as crianças" fusa com relação à própria possibilidade da parece ser o ideal pedagógico superior tameducação estética. Já vimos que as opiniões de L. N. Tolstoi sobre esse problema não estabebém no âmbito da estética. Quase ninguém discute agora que essa lecem a devida diferença entre a criação artísopinião contém a famosa e' grande verdade de tica da criança e a do adulto. Por isso, Tolstoi que, na criação infantil, deparamo-nos com não leva em conta a grande importância da modelos totalmente espontâneos e puros de mestria na arte, e essa mestria é resultado da poesia, carentes de todo elemento da afetação educação, naturalmente. Ela inclui não só as profissional dos adultos. Ao mesmo tempo, habilidades técnicas da arte, mas algo muito porém, temos de reconhecer que se trata de maior: o sutilíssimo conhecimento das leis da uma criação de um tipo muito especial; é, diarte que se cultiva, o senso do estilo, o talento gamos, uma criação transitória, que não cria para criar, o gosto, etc. Em épocas anteriores, valores objetivos de nenhuma espécie e que é o conceito de mestre abrangia totalmente o conceito de artista. mais necessária para a própria criança, e não para as pessoas que a rodeiam. Assim como o Além disso, a noção da natureza mística jogo infantil, ela é salutar e nutritiva, só que da inspiração, de ser um possuído de Deus, etc., não vem de fora, mas do próprio organismo. foi substituída por critérios totalmente diferenO Siomka e o Fiedka de Tolstoi cresceram, mas tes sobre a natureza da criação. E a doutrina não se transformaram em grandes escritores, de Tolstoi sobre o fato de que "o homem, ao embora aosQPONMLKJIHGFEDCBA 1 1 anos encontrassem palavras nascer, representa um protótipo de harmonia, que, segundo a respeitável opinião de Tolstoi, verdade, beleza e bondade" deve ser admitida eram superiores às de seus romances e podiam mais como lenda que como verdade científica. ser comparadas com as de Goethe. É verdade que os impulsos diretos e a criativiO inegável erro desse critério reside no dade na infância são mais fortes e claros, podesmedido exagero e no culto às imagens da rém sua natureza - como já indicamos - é dicriação infantil, assim como na incompreensão ferente da dos adultos. E a criação de Siomka de que a força espontânea da criatividade, aine Fiedka, por mais elevada e bela que possa da que também seja capaz de criar imagens de ter sido, sempre será diferente da criação de enorme intensidade, está condenada para semGoethe e de Tolstoi, por essência. pre a permanecer no estreito círculo das forOutro problema é a opinião sustentada mas mais elementares, primitivas e, em suma, por Aijenvald, Guershenzon'" e outros de que pobres. a literatura não pode ser tema de ensino na Nesse sentido, a regra pedagógica refeescola. Essa opinião parte de um critério esrente à educação da criatividade infantil semtreito sobre a escola, que teve origem no fato pre deve partir do critério puramente psicolóde levar permanentemente em consideração os cursos ministrados antes da Revolução [de gico sobre sua utilidade, sem considerar que Ou tubro de 1917]. Perde-se de vista a diversiuma criança que compõe poesias pode vir a ser um futuro Pushkin ou que a criança que dade de possibilidades educativas da nova escola soviética. O sentimento estético deve ser pinta será um pintor no futuro. A criança não objeto de educação como todos os outros, só escreve versos nem desenha porque está incuque através de formas peculiares.FEDCBA bando um futuro criador, mas porquemlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA agora " " 'r 1 1r '1 zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA I ,I 238 'I ' , L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I 1 I', I lill , " :1 I, \ o ensino profissional da técnica desta ou daquela arte deve ser abordado do mesmo ponto de vista. O valor formativo dessas técnicas é imenso, assim como o de toda atividade laboral e complexa. Em particular, ele aumenta ainda mais por ser uma ferramenta para educação a apreensão das obras de arte nas crianças, porque é impossível penetrar até o fundo em uma produção artística quando se é totalmente alheio à técnica de sua linguagem. Por isso, uma mínima familiarização técnica com a estrutura de qualquer arte deve sem falta ser incorporada ao sistema de educação pública. Nesse sentido, estão pedagogicamente certas as escolas em que a assimilação da técnica de cada arte se transforma em requisito imprescindível da educação. No entanto, o ensino profissional, da arte encerra muito mais perigos que benefícios pedagógicos. As experiências infrutíferas e maciças de ensinar música a todas as crianças QPONMLKJIHGFEDCBA produzissem uma impressão esmagadora no psicólogo, e isso se transformou em regra obrigatória para a classe média abastada da Europa e da Rússia pré-revolucionária nas últimas décadas. Se prestarmos atenção à quantidade de energia inutilmente gasta para dominar a complexa técnica do piano, se compararmos isso com os insignificantes resultados obtidos após muitos anos de trabalho, é impossível deixar de reconhecer que esse experimento maciço, para toda uma classe social, redundou no mais vergonhoso fracasso. A arte musical não ganhou nem adquiriu nada valioso com esse projeto e, além disso, a simples educação da apreensão, compreensão e vivência da música nunca, em parte alguma, foi, de acordo com a opinião geral, tão baixa como no mencionado meio, no qual o ensino da execução se transformou em norma imprescindível de boa criação. No tocante às influências pedagógicas gerais, esse ensino foi pernicioso e prejudicial, porque quase em nenhuma parte e em nenhum caso esteve ligado ao interesse imediato da criança, e sempre foi realizado em função de certos interesses estranhos, na maioria das vezes para subordinar a criança aos interesses do meio que a rodeava e para refratar na men- te infantil as mais sórdidas e triviais idéias cotidianas do ambiente. Por isso, o ensino profissional da técnica de cada arte, como problema da instrução geral e da educação, tem de ser implantado dentro de certos contextos e deve se reduzir ao mínimo fundamental, concordando com outras duas linhas da educação estética: primeiro, com a criatividade própria da criança; segundo, com a cultura de suas percepções artísticas. Só é útil o ensino da técnica quemlkjihgfedcbaZYXWV vai além dessa técnica e ensina aptidões criativas: criar ou apreender. Por último, o aspecto relativo ao nível cultural da apreensão estética ainda continua sendo o menos elaborado, porque os pedagogos nem sequer suspeitavam toda a complexidade da questão, nem pensaram que aqui havia um problema implícito. Olhar e escutar, obter um prazer, parecia um trabalho psíquico tão simples que não requeria de forma alguma um ensino especial, mas de fato constitui justamente o objetivo e a tarefa fundamental da educação geral. A estrutura comum da educação social está orientada para ampliar ao máximo os limites da experiência pessoal restrita, para organizar o contato da psique da criança com as esferas mais amplas possíveis da experiência social já acumulada, para inserir a criança na rede da vida com a maior amplitude possível. Esses objetivos gerais também determinam os caminhos da educação estética. A humanidade mantém, através da arte, uma experiência tão enorme e excepcional que, comparada com ela, toda experiência de criação doméstica e de conquistas pessoais parece pobre e miserável. Por isso, quando se fala de educação estética dentro do sistema da formação geral, sempre se deve levar em conta, sobretudo, essa incorporação da criança à experiência estética da humanidade. A tarefa e o objetivo fundamentais são aproximar a criança da arte e, através dela, incorporar a psique da criança ao trabalho mundial que a humanidade realizou no decorrer de milênios, sublimando seu psiquismo na arte. E, como a compreensão de uma obra de arte não pode ser realizada com os métodos da interpretação lógica, isso exige uma apren- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 239 dizagem especial, peculiar, assim como a elaA primeira afirma que a criança ainda não boração de aptidões especiais para recriar as atingiu o nível da compreensão científica e que, obras artísticas. Nesse sentido, representam um por isso, precisa de certos substitutos para exmodelo de educação estética as aulas destinaplicar o mundo. Devido a isso, ela se conforma das a observar quadros, bem como as lições de facilmente com a interpretação fantástica da "leitura lenta", introduzidas em algumas escorealidade e encontra nas histórias o mesmo que las européias. o adulto encontra na religião, na ciência e na Aqui está a chave para a tarefa mais imarte, isto é, uma primeira explicação e comportante da educação estética: inserir as reapreensão do mundo, um agrupamento de todo ções estéticas na própria vida. A arte transforum caos desarmônico de impressões em um ma a realidade não só em construções da fansistema único e integral. Para a criança, as histasia, mas também na elaboração real das coitórias representam sua filosofia, sua ciência e sas, dos objetos e das situações, A moradia e a sua arte. vestimenta, a conversa e aleitura, a festa esOutro ponto de vista garante que, em seu colar e o modo de caminhar: tudo isso pode desenvolvimento, de acordo com a lei biogenéservir como material sumamente promissor tica;" a criança repete de forma abreviada e para a elaboração estética. condensada as principais fases e épocas que a A beleza deve deixar de ser uma coisa rara humanidade percorreu em seu desenvolvimene própria das festas para se transformar em to. Daí deriva a comparação sumamente pouma exigência da vida cotidiana, e o esforço pular da psique e da criação da criança com a criativo deve impregnar cada movimento, cada criatividade dos homens selvagens e primitipalavra e cada sorriso da criança. Potebnia" vos, e a afirmação de que a criança passa inedisse de uma bela maneira que, assim como a vitavelmente por um período de animismo eletricidade não está apenas onde há tormenpersonificação universal - e de antropomortas, a poesia também não está apenas onde fismo, processo pelo qual a humanidade em existem grandes criações artísticas, mas em seu conjunto passou originariamente. Por isso, todos os lugares onde a palavra humana esticonsidera-se necessário, em certa etapa do ver. E essa poesia de "cada instante" é o que desenvolvimento, introduzir esses critérios e crenças primitivos no mundo infantil, todas talvez constitua o objetivo mais importante da educação estética. essas representações sobre diabos, bruxas, faAo mesmo tempo, porém, é preciso condas, espíritos bons e ruins, que em algum momento já acompanharam a cultura humana." siderar o sério perigo da falsa arrogância introduzida na vida, que na criança se transforma Essa opinião aceita as histórias infantis como facilmente em afetação e pretensões. Não há um mal necessário, como uma concessão psicológica à idade e, conforme a expressão de nada de tão mau gosto como essa "beleza" um psicólogo, como uma mamadeira estética. introduzida no jogo, em sua maneira de anAmbos os critérios partem de um princídar, etc. A regra a ser seguida aqui não deve pio profundamente errôneo. No tocante ao ser o embelezamento da vida, mas a reelaprimeiro, a pedagogia rejeitou há muito todos boração criativa da realidade, isto é, uma elaos substitutos possíveis [de explicação], porboração das coisas e do próprio movimento das que o dano que eles causam sempre supera sua coisas que iluminará e elevará as vivências copotencial utilidade. O que acontece é que essa tidianas ao nível das criativas.QPONMLKJIHGFEDCBA utilidade sempre tem caráter temporal, existe até que a criança cresce e deixa de precisar A F Á B U L A [E A S H IS T Ó R IA S IN F A N T IS ] desse substituto da explicação do mundo. No entanto, o dano subsiste para sempre, porque Em geral, considera-se que a fábulaFEDCBA na psique, assim como no mundo, nada passa [s k a z k a ] destina-se exclusivamente ao público sem deixar marcas, nada desaparece, mas tudo infantil. Há duas considerações psicológicas que cria hábitos que persistem durante toda a vida. defendem essa opinião. "Exprimindo-nos com rigor científico - afirma 240QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA I II I" r. I James - podemos dizer que, de tudo o que fazemos, nada pode ser apagado"." Isso é particularmente certo com relação à idade infantil, quando a plasticidade e a flexibilidade de nossa substância nervosa alcança um grau superlativo e as reações, depois de duas ou três vezes, com freqüência permanecem gravadas para toda a vida. Se, nesse período, obrigamos a criança a regular e dirigir seu comportamento sob a influência de noções e critérios falsos e errôneos, podemos ter certeza de que esses critérios criarão o costume de agir nessas direções falsas. E quando, em nossa opinião, chegar o momento de liberar à criança dessas noções e critérios, talvez consigamos, por meio da lógica, convencê-Ia da inexatidão de todas essas noções anteriores; talvez até nos justifiquemos perante ela pelo engano ao qual a submetemos durante vários anos, porém jamais poderemos eliminar esses hábitos, instintos e estímulos já elaborados e profundamente arraigados nela e que, no melhor dos casos, são capazes de criar um conflito com os novos que lhe são inculcados. Como ponto de vista fundamental, deve ficar claro que não existe psique sem comportamento e que, se introduzirmos na psique uma noção falsa que não corresponde à verdade nem à realidade, também estaremos educando um comportamento falso. Daí surge necessariamente a conclusão de que a verdade deve se transformar no fundamento da educação a partir da mais tenra idade, porque uma noção incorreta também é um comportamento incorreto. Se, desde a infância, a criança se acostuma a acreditar na "cuca", no "bicho-papão", na feiticeira e na cegonha que traz os bebês, isso vai obstruir sua psique e determinar falsamente seu comportamento. Fica perfeitamente claro que a criança receia ou se sente atraída por esse mundo encantado, porém jamais permanece passiva diante dele. Nas ilusões ou nos desejos, sob o cobertor infantil ou no quarto escuro, no sonho ou no temor, sempre reage a essas representações de um modo sumamente excitado e, visto que o sistema formado por essas reações baseia-se em algo totalmente fantástico e falso, está sendo educada sistematicamente na criança um comportamento incorreto e falso.UTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Cabe acrescentar que todo esse mundo fantástico aterroriza a criança e, sem dúvida, sua força opressora supera sua capacidade de resistência. Quando rodeamos a criança com esse mundo fantástico, a estamos obrigando a viver em uma espécie de eterna psicose. E se imaginarmos, ainda que seja durante um instante, que uma pessoa adulta possa acreditar no que se ensina à criança, que extraordinária depressão e angústia se instalaria em sua psique! Tudo isso deve ser multiplicado diversas vezes quando transferimos essa idéia para a criança, porque sua mente fraca e nãofortalecida sente-se ainda mais impotente ante esse elemento obscuro. As análises psicológicas dos temores infantis produzem uma impressão totalmente trágica: as crianças sempre testemunham e relatam esses inexprimíveis germes de terror que os adultos semeiam na alma infantil com seus relatos. A utilidade educativa do "bicho-papão" no âmbito doméstico sempre se esgota na vantagem imediata da intimidação, mediante a qual pode-se conseguir que a criança renuncie a uma travessura momentânea ou obedeça a uma determinada ordem. O dano que isso provoca pode se expressar em formas de comportamento humilhantes para o ser humano que ela terá décadas mais tarde. O último argumento contra o critério tradicional sobre as histórias infantis tem a ver com sua mais profunda falta de respeito pela realidade, a preponderância do invisível que educa sistematicamente esse tipo de história. A criança permanece surda e tola ante o mundo real, encerra-se em uma atmosfera doentia e viciada, na maioria das vezes no reino das mentiras fantásticas. Não vê nenhum interesse na árvore nem no pássaro, e toda a diversidade da experiência aparentemente não existe para ela. O resultado dessa educação é criar alguém cego, surdo e mudo em sua relação com o mundo. Por tudo isso, devemos concordar com o critério que exige a eliminaçãomlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONM total e com pleta dessas noções fantásticas e néscias com as quais as crianças costumam ser educadas. Ao mesmo tempo, é sumamente importante observar que, além dos contos de fadas, também são prejudiciais as invençõ~s tolas e tradicio- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 241 nais com as quais muitas babás - e também sões naturais. Quando se fala a uma criança muitos professores cultos - atemorizam as sobre um cavalo, que lhe parece gigantesco e enorme, chamando-o de "cavalinho", está sencrianças. Nenhum educador pode se declarar do desfigurado o verdadeiro sentido da linguainocente do fato de que, em uma argumentação com a criança, não tenha recorrido a algem e a noção de cavalo, sem falar dessa atigum absurdo, simplesmente porque a criança tude falsa e adocicada com relação a tudo o considerará que esse absurdo é verdadeiro e que se estabelece com esse sistema de fala. A porque essa é a saída mais fácil da situação, a linguagem é o instrumento mais sutil do penlinha educativa do menor esforço. "Não vá lá, samento. Se a desfigurarmos, estaremos fazensenão a casa vai cair", "não chore, senão a podo o mesmo com o pensamento e, se uma prolícia vai levar você": esses são os exemplos desfessora refletisse sobre o absurdo emocional se absurdo "pseudo-científico-natural" que que profere quando diz a uma criança "vamos pegar o cachorrinho" ou "o cachorrinho vai substituiu o absurdo fantástico. De modo geral, deve-se dizer que toda morder você", certamente se aterrorizaria se sujeição da psique do professor à infantil repercebesse a confusão mental que está provopresenta, do ponto de vista psicológico, um cando nos sentimentos da criança. E, se há algo fenômeno educativamente nocivo, porque nunrealmente repulsivo e insuportável na literaca é possível acertar totalmente, e isso cria na tura e na arte infantis, é justamente a falsa adaptação do adulto à psique infantil. criança a necessidade de entrar em choque com o pensamento do educador, de derrubar e O outro critério - relativo à necessidade distorcer suas reações, aproximando-as daquilo de que as crianças vivenciem as crenças e noque o professor lhe impõe. A forma mais simções primitivas nas histórias infantis - também ples de compreender isso é através do exemnão resiste a uma crítica séria e desmorona plo da fala infantil, quando os adultos converjunto com a lei biogenética em que está baseasam com uma criança e se empenham em imido. Ninguém demonstrou ainda que a criança tar seu modo de falar, considerando que assim repete, em seu desenvolvimento, a história da são mais compreensíveis: ceceiam, pronunciam humanidade, e a ciência nunca teve fundameno "1"em vez do "r". Esse tipo de fala não é mais tos para falar de comparações, de uma analocompreensível para a.criança. E se ela pronungia e de uma afinidade mais ou menos distanciar as palavras de forma incorreta, isso não tes entre o comportamento infantil e o comsignifica que não as ouve bem, mas que não as portamento do [homem] selvagem. Pelo conpode pronunciar corretamente." E quando trário, as mudanças essenciais no panorama ouve o adulto falar dessa forma estranha, ela da educação com relação à situação e ao ambiente social ou, em outros termos, a esse elese confunde totalmente e se esforça para que sua fala seja parecida com a do adulto. A maimento comum da vida em que a criança penetra desde o momento de seu nascimento; tudo oria de nossas crianças usa uma fala não-nacontraria a lei biogenética, pelo menos no que tural, desfigurada pelos adultos, e não é possíse refere à sua transferência direta da biologia vel imaginar nada mais falso que essa fala de à psicologia. A criança é totalmente capaz de meia língua. Também queremos comentar aqui a forrealizar uma interpretação real e veraz dos fema falsa como os adultos sempre conversam nômenos, ainda que, naturalmente, não possa explicar tudo de repente. A criança, por sua com as crianças, usando diminutivos e expresprópria conta, nunca é animista nem antroposões carinhosas, transformando um cavalo em morfista e, caso essas tendências se desenvolcavalinho, um cão em cãozinho e uma casa em vam nela, a culpa sempre recai nos adultos que casinha. O adulto considera que tudo deve ser a rodeiam. representado de forma diminuta para as crianPor último, o mais importante é que, ças. No entanto, acontece o contrário. Procemesmo se certas condições psicológicas geram deria de forma muito mais psicológica quem atavismos na criança, isto é, o retorno de sua não diminuísse os objetos na representação psique a níveis já percorridos da história, se a infantil, mas os aumentasse para suas dimen-RQPONMLKJIHGFEDCBA 242RQPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA I t ! . criança realmente contivesse algo do [homem] primitivo, então a tarefa da educação não se reduziria de forma alguma a apoiar, alimentar e fortalecer esses elementos de selvagem na psique infantil, mas precisamente o contrário: sua tendência seria submeter de todas as maneiras esses elementos aos mais vitais e poderosos da realidade. Isso significa que as histórias infantis devem ser consideradas definitivamente desprestigiadas e condenadas à sua eliminação dos quartos infantis, com essa falsa e fantástica representação do mundo psiquicamente prejudicial? Em termos. É inegável que uma parte considerável de nossas histórias, justamente pelo fato de estarem baseadas nessa nociva fantasia e por não conter nenhum outro tipo de valores, deve ser abandonada e esquecida o mais rapidamente possível. No entanto, isso não implica que o valor estético de uma obra fantástica esteja vedado para a criança. Pelo contrário, a lei fundamental da arte exige essa livre combinação de elementos da realidade, essa independência essencial da verdade cotidiana que, na estética, acaba com a fronteira que separa o fantástico da verdade. Na arte,lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tudo é fantástico ou tudo é real, porque tudo é convencional, e a realidade da arte implica só a realidade das emoções vinculadas a ela. Na prática, não se trata de saber se realmente pode existir o que é relatado nas histórias. É mais importante a criança saber que isso nunca existiu na realidade, que é apenas uma história e que ela se acostume a reagir diante disso como ante uma história; dessa forma, ela não se preocupa em saber se acontecimentos semelhantes podem acontecer ou não na realidade. Para desfrutar de uma história não é preciso acreditar em seu relato. Pelo contrário, a crença na realidade de um mundo fabuloso estabelece relações puramente cotidianas com tudo, e isso exclui a possibilidade de uma atividade estética. Devemos esclarecer aqui uma lei importantíssima para esse âmbito: a lei da realidade emocional da fantasia. Essa lei consiste em que, independentemente de ser ou não real a realidade que nos influencia, nossa emoção ligada a essa influência sempre é real. Quando tenho uma Ilusão" e, ao entrar em um quarto [...] vejo a figura de um assaltante [em vez de um objeto] em um canto, essa figura é um equívoco, naturalmente, e o sistema de minhas representações ligadas a ela não é real; no entanto, são muito reais o medo que experimento por causa desse encontro e a emoção ligada à ilusão, mesmo que eles sejam reprimidos pela consciência tranqüilizante de meu erro. O que sentimos sempre é real. Portanto, nessa lei da realidade de nosso sentimento o fantástico se justifica. Não distanciamos de forma alguma as crianças da realidade quando lhes contamos uma história fantástica, desde que os sentimentos que surjam estiverem de acordo com a vida. Por isso, a única justificativa para uma obra fantástica é sua base emocional real e não nos surpreenderá reconhecer que, com a eliminação dos elementos fantásticos nocivos, a história continua sendo, de qualquer forma, uma das formas da arte infantil. Só que seu papel é totalmente diferente, isto é, deixa de ser a filosofia ou a ciência infantil e se transforma única e exclusivamente em uma mera história. O significado predominante da história baseia-se nas peculiaridades compreensíveis da idade infantil. Sucede que, no processo de interação entre o organismo e o mundo - ao qual se reduzem, em última instância, todo o comportamento e a psique - a criança está na etapa mais frágil e menos estruturada e, por isso, ela sente uma necessidade particularmente aguda de algumas formas organizadoras da emoção. De outro modo, a enorme quantidade de impressões que agem sobre a criança e que ela não consegue dominar a deixariam aterrorizada e provocariam a perturbação de sua psique. Nesse sentido, corresponde às histórias inteligentes dar um significado saudável e higiênico à estrutura da vida emocional da criança. A mais interessante das recentes teorias sobre a natureza das emoções coincide precisamente com a lei aqui esboçada. Há muito tempo percebeu-se que a emoção sempre possui certa expressão corporal externa, mas só muito depois se observou que ela também sempre tem alguma expressão "espiritual" ou psíquica. Em outras palavras, o sentimento não está ligado apenas à mímica e aos sintomas externos, mas também a imagens, representa- \ P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 243 ções e a um "pensamento emocional". Enquandas emoções que se cristaliza nos movimentos to alguns sentimentos gostam de se cobrir com e na organização do jogo. Uma história artística, assim como o jogo, é o educador estético cores brilhantes e tons cálidos, outros adotam natural da criança. tons frios e cores tênues; justamente aqui se manifesta a expressão psíquica da emoção. Um sentimento de tristeza me obriga a manter o A E D U C A Ç Ã O E S T É T IC A E O T A L E N T O corpo de certa maneira, e também a selecionar as impressões; [esse sentimento] se expriAlguns opinam que se deve falar de dois me por meio de recordações, fantasias e sosistemas de educação estética completamente nhos tristes. Em essência, os sonhos represendiferentes: um para as pessoas dotadas e tam essa expressão espiritual das emoções em talentos as, outro para as pessoas comuns. Essa sua forma pura.lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA A s pesquisas demonstraram que maneira de pensar não pode se conformar com um sentimento que surge espontaneamente, por a idéia de que a educação estética de pessoas exemplo, o sentimento de medo, é o fio que especialmente dotadas pode coincidir com a liga os mais diversos episódios e as partes abeducação estética de qualquer pessoa comum. surdas das imagens oníricas. Entretanto, os dados científicos vão nos afasAssim, resulta compreensível a importântando cada vez mais desse critério e comprocia emocional da imaginação. As emoções nãovam a opinião oposta, ou seja, que não existe realizadas na vida se exprimem por meio da uma diferença essencial entre uns e outros e arbitrária combinação dos elementos da realique se deve tentar elaborar um sistema pedadade e, sobretudo, da arte. Devemos recordar gógico único. ao mesmo tempo que a arte não só exprime as Com relação à educação da voz, cada vez emoções, mas sempre as resolve, livrando a mais se aceita o ponto de vista de que cada psique de sua obscura influência. pessoa, desde o seu nascimento, possui uma Isso aproxima a ação psicológica das hisvoz ideal, com tantas possibilidades que muitórias infantis da ação do jogo. O significado tas vezes superam as conquistas supremas da estético do jogo não se manifesta apenas no arte vocal. A garganta humana, normalmenaspecto rítmico dos movimentos infantis, na te formada, é o instrumento musical por assimilação de melodias primitivas em jogos excelência no mundo, e se, apesar disso, falacomo as cirandas, etc. É muito mais importanmos com vozes horríveis, isso ocorre exclusite o fato de que o jogo, sendo do ponto de vista vamente porque, devido aos gritos, à respirabiológico uma preparação para a vida, no asção incorreta, às condições do desenvolvimenpecto psicológico se revela uma das formas da to e à vestimenta, destruímos nossa voz inicial. criatividade infantil. Alguns psicólogos chamam Os mais bem dotados na qualidade da voz não a lei antes mencionada de "lei da dupla expressão aqueles que, desde o início, possuíram a são dos sentimentos", e o jogo justamente serve melhor voz, mas os que puderam conservápara essa "dupla expressão". No jogo, a criança Ia. A esse respeito, pronunciou-se o professor sempre transforma criativamente a realidade. Buldin.? Durante o jogo, as pessoas e as coisas adotam facilmente um novo significado. Uma cadeira A voz de Shaliapirr" não constitui um dom não representa apenas um trem, um cavalo ou raro, mas um caso raro de conservação de um uma casa, mas realmente participa do jogo dom comum. Alguma vez a voz humana alcomo tal. E essa transformação da realidade cançará tal perfeição musical que todas as no jogo sempre está orientada pelas exigênnossas noções sobre a linguagem dos anjos cias emocionais da criança. "Não brincamos serão superadas. porque somos crianças, mas a própria infância nos foi dada para brincar" - essa fórmula de K. Esse critério sobre os dons musicais do Groos exprime corretamente a natureza biolóorganismo humano começa a contar com um gica do jogo. Sua natureza psicológica é totalnúmero cada vez maior de partidários nos mais mente determinada por essa dupla expressão RQPONMLKJIHGFEDCBA 244RQPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I I I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA I I I I I: i t I' !" II I II 'I' Ao escrever a Sonata a K reutzer, Beethoven diversos campos da pedagogia. A noção corsabia por que estava no estado de ânimo que rente sobre o talento parece se inverter, e o o levou a compô-Ia. Portanto, ela tinha para problema já não é exposto como antes, pois ele um sentido que não tem para mim. A múatualmente ninguém se pergunta por que alsica me excita sem me levar a nenhuma resogumas pessoas são mais bem dotadas, mas por lução. Ao som de uma marcha militar, os solque outras são menos, pois o alto nível dos dons dados desfilam e ao som de uma musica daniniciais do ser humano é, de acordo com as çante as pessoas dançam e, assim, a música evidências, um fato básico em todos os camcumpre sua função. Em uma missa cantada, pos da psique e, portanto, merecem ser esclacomunga-se e, novamente, a música alcança recidos os casos de diminuição e perda desse sua finalidade. Em geral, porém, sentimos talento. Por enquanto só temos suposições cienapenas excitação e não sabemos o que devemos fazer. Por isso, a música às vezes produz tíficas - solidamente respaldadas por uma séesses efeitos tão terríveis, tão espantosos. [... ] rie de fatos. No entanto, se 'isso fosse estabelePor exemplo, o primeiro presto da Sonata a cido firmemente, para a pedagogia poderiam K reutzer, por acaso pode ser tocado em um se abrir as mais vastas possibilidades e surgisalão com damas decotadas? Como é possível ria o problema de como poderia ser conservatocar esse trecho, depois aplaudi-lo, tomar um do o talento criativo da criança. sorvete e comentar o último mexerico da ciAinda que essa questão não possa ser dade? Essas obras só deveriam ser executaconsiderada resolvida de forma definitiva e das em certas ocasiões, solenes e importangeral em sua aplicação particular aos probletes, ou quando são realizados atos que corresmas da educação comum, pode-se estimar que pondem a essa música. Depois de ouvi-Ia, é ela já foi resolvida no sentido de que a tarefa preciso fazer o que ela inspirou em cada um. (L. Tolstoi, Sonata a K reutzer, trad. de A . Pérez, da educação estética, como toda educação Madrid: SARPE, 1984, p. 119)43 criativa, deve partir, em todos os casos normais, da existência dos elevados dons da natureza humana e da suposição de que as maioNOTAS res possibilidades criativas estão presentes no ser humano, e [que se deve] dispor e orientar 1. Para as concepções estéticas de Vigotski, cf. sua as influências educativas para desenvolver e P sijologuia iskusstva. Existem duas edições em manter essas possibilidades. Portanto, os dons espanhol: L. S. Vigotski, P sicología de! arte, trad. também se transformam em lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tarefa da educaDe V. Imbert, Barcelona: Barral, 1982; e L. S. ção, embora na velha psicologia eles figurasVigotski, P sicología del arte, Madrid: Visor, sem apenas como uma condição e um dado 2000. A primeira edição russa foi publicada com da educação. Em nenhum outro âmbito da graves mutilações - "abreviações devido a citapsicologia essa idéia é confirmada de forma ções pouco importantes" (sic) -, em 1965, pela tão brilhante quanto no terreno da arte. A poseditora Iskusstvo de Moscou, com um anexo e um apêndice - o conto de Ivan Bunin, A lento sibilidade criativa que cada um de nós possui, A prazível, e o H am let de 1916, de Vigotski, resde se transformar em co-partícipes de Shakespectivamente. Essas mutilações ainda persispeare em suas tragédias e de Beethoven em tem na edição de M. G. Iaroshvski, de 1987 suas sinfonias, é o indicador mais claro de que (Moscou: Pedagoguika); além disso, dessa ediem cada um de nós existe potencialmente tanção desapareceu o anexo. As edições em espato um Shakespeare quanto um Beethoven. nhol, portanto, também estão mutiladas. A diferença psicológica entre o criador e 2. O C rocodilo e outras obras de Chukovski, que o ouvinte da música, entre Beethoven e cada estão tão na moda e são tão populares atualum de nós, foi definida muito bem por Tolstoi, mente na literatura infantil, são o melhor moque também emitiu uma opinião muito impordelo desse abuso, dos absurdos e disparates tante para a educação artística, ou seja, a nena poesia infantil. Aparentemente, o autor parte da opinião de que quanto mais tola [é a cessidade de reagir ante cada impressão e obra], mais próxima, amena e compreensível enfatizar a realidade da arte: \ P S IC O L O G IA 3 4. 5. 6. P E D A G Ó G IC A 245 ela é para as crianças. Estas se habituam facil7. Peredonov disse a seus alunos: "Observem, isso mente a essa literatura boba, porém sua ação deve ser compreendido da forma correta. Aqui educativa é indubitavelmente perigosa, sobrehá uma alegoria. Os lobos andam em pares: o tudo nas grandes doses oferecidas às crianças. lobo com a loba faminta. Ele está com a barriAo mesmo tempo, desaparece toda preocupaga cheia, mas ela está com fome. A esposa semção com o estilo e, em versos dissonantes, o pre deve comer depois do marido. A esposa autor reúne absurdos e disparates. Essa literadeve se subordinar por completo ao marido". tura só desenvolve estupidez nas crianças. [Nota original de Vigotski.] [Nota original de Vigotski.] Tanto nesta como na nota anterior de Vigotski Kornei Ivanovitch Chukovski (1882-1969) foi neste capítulo (nota 2), na edição norte-ameriuma importante figura da filologia, da teoria cana foram incluídos parágrafos inteiros que da tradução e da crítica literária russas. Merepertencem ao corpo do texto do livro e não às ceu um doutorado lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA honoris causa da Universinotas de rodapé. (Nota de G. B.) dade de Oxford e o Prêmio Lênin (ambos em 8. Dmitri Nikolaievitch Ovsianniko-Kulikovski 1962). No início do século XX, ele teve a infe(1853-1920) foi um filólogo russo e historializ idéia de considerar que tinha talento para a dor da literatura. Pioneiro no estudo da sintaliteratura infantil. Como se vê, Vigotski e ouxe do russo, seus trabalhos foram de indiscutítros críticos se encarregaram de destacar que vel excelência acadêmica e erudição. O livro essa face de sua obra não era muito feliz. (Nota mencionado por Vigotski é de alto nível acade G. B.) dêmico, embora seja inadequado como manual Stowe, Harriet E. Beecher (1811-1896) foi uma escolar de "educação estética". romancista norte-americana que escreveu con9. Ainda que inadequado como manual escolar, tra a escravidão. Aqui Vigotski refere-se a como ocorre com o livro de OvsiannikoU ncle's T om C abin, escrito cerca de 1850. Kulikovski (cf. nota 8), o texto aqui mencioNão pudemos localizar nem esse nem alguns nado por Vigotski é de alto nível acadêmico, outros contos de Tchekov referidos por Vigotski como já destacara~ em um ensaio de e, portanto, não podemos mencionar seus tí1912 publicado no jornal O P ensam ento de K iev. R. V. Ivanov-Razumnik (1878-1946) foi tulos. Atualmente não temos acesso à edição russa de suas obras completas e esses relatos um brilhante crítico literário soviético. Como A. A. Blok, foi um dos pilares do movimento não estão incluídos no volume intitulado C uentos C om pletos (!) de Tchekov, publicado eslavófi~ Ivanov per~ti'd~JfsE;rista, inimigo do Partido Bolchevique, pela editora Aguilar; op. cito Tal edição, com suas 1.311 páginas, reúne apenas 330 contos, sofreu perseguições e foi preso. Quando as e Tchekov escreveu mais de 600. tropas nazistas invadiram a Rússia durante a Ivan Andreievitch Krilov (1769-1844) foi o Segunda Guerra Mundial, ele e sua esposa maior criador de fábulas russo e o mais popuforam presos e deportados para a Alemanha, lar. Também fez traduções livres de La onde morreram. 10. Trata-se de personagens de ficção. Eugenio Fontaine - introduzindo algumas variações. Foi jornalista e dramaturgo. Foi censurado duOneguin é o personagem central do romance rante prolongados períodos pelo czarismo. em verso E vgueni O negui, de Pushkin, em que Vigotski realizou uma extensa análise da esTchaikovski se baseou para compor sua famotrutura de suas fábulas em sua P sicología del sa ópera. Chatski é personagem do drama saarte, op. cito Existem várias edições em espatírico É um a loucura ser sensato, de Griboiedov, nhol das fábulas de Krilov. op. cit. no Capo 12. Vigotski repete esse mesFiodor Kuzmich Sologub (1863-1927) foi um mo trecho em sua P sicología del A rte, embora narrado r, dramaturgo e poeta simbolista russubstitua Chatski por Pechorin, personagem so. Era professor de ensino fundamental, podo romance de Lermontov, U m herói de nosso rém se transformou em escritor profissional a tem po. partir do sucesso de seu romance O pequeno 11. Julio Verne (1828-1905) foi o romancista frandem ônio (1907). Seu protagonista é o malvacês que criou o gênero da ficção científica do professor Peredonov, um dos personagens moderna. Previu invenções posteriores, como mais impactantes e grotescos da ficção russa. o submarino, o fax, a televisão, as naves Vigotski faz nova referência a Peredonov no espaciais, etc. Entre suas obras estão: A V olta Capo 19 do presente livro.RQPONMLKJIHGFEDCBA ao m undo em 80 dias, Da T erra à L ua e V iagem 246RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 12. 13. 14. ~ I. 15. 16. 17. I, :1 I 18. 19. Essa é uma referência a N ikolari Ivanovitch ao lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA centro da T erra. Seu último livro) O eterno Bukarin, T eoría del M aterialism o H istórico. M aA dão, é pouco conhecido e se caracteriza por nual popular de sociología m arxista, Córdoba, seu ceticismo e pessimismo (cf. Buenos Aires: Argentina: Pasado y Presente, 1972, p. 195. Corregidor, 1975). As aspas do texto são nossas. A primeira ediAqui, Vigotski refere-se à obra P hilosofie der ção 'li T ieoria istorichieskogo m aterializm a: K unst [F ilosofia da arte], do filósofo alemão P opuliarni uchiebnik m arksistskoi sotsiologui, Broder Christiansen. A tradução russa é F iloMoscou, 1921. N. r. Bukarin (1888-1838) foi sofia iskusstva, São Petersburgo: Shipovnik, um antigo bo1chevique e um dos principais 1911. Vigotski também se refere a Christiansen em outros textos, como P sicología âelarte, dirigentes da Revolução de Outubro. Destacaop. cito e em "A Gráfica de Bijovski". Esta últido economista e sociólogo, em sua carta-testama obra, com ilustrações de A. Ia. Bijovski, se mento Lênin o chamou de "favorito do Partido". Depois de sua morte, Bukarin participou encontra em: L. S. Vigotski, L a G enialidad y ativamente das lutas internas. Aliou-se a Stalin edição de G. Blanck, otros textos inéditos, Buenos Aires: Almagesto, 1998, p. 97-104. 7f ~~ contra!~frotsk~ \ Zinoviev e Kamenev. Com a derrod.~s,· Stalin começou a persegui-Io. Essa asserção de Vigotski é a tese central de seu livro P sicologia dei arte, op. cito Cf. G. Acusado de desvios de direita, em 1934 ele foi Blanck, "Vigotski y Hamlet. Hacia una Psicoloafastado de todos os seus cargos. Depois de gía del Arte", Intercam bios, R evista de P sicología quatro anos de torturas psicológicas, foi julgado publicamente por alta traição e executado y C ultura, op. cito Cf. Guillermo Blanck, "Origen del Arte", em em 1938. E sta citação de B ukarin por V igotski e M.W., B reve D iccionario de E stética M arxista, as citações de T rotski no C apo 19 foram a causa fundam ental da proibição do presente livro na Buenos Aires: Dialéctica, 1989, p. 55-60 . Herbert Spencer (1820-1903) foi um filósofo U R SS durante m ais de 60 anos. Ainda que Bukarin tenha sido reabilitado completamene sociólogo inglês. Sua opus m agnum é T he te com a Perestroika de Gorbatchov, o mesmo Synthetic P hilosophy (1896), um tratado de filosofia, psicologia, ética, biologia e sociologia. não ocorreu com Trotski. Se lermos o conteúAleksandr Nikolaievtich Viesielovski (1838do de todas essas citações, ficará evidente que 1906) foi um historiador russo da literatura, o elas nunca contradisseram a ideologia oficial mais destacado representante do método hissoviética, de maneira que a explicação da cautórico comparado em teoria literária. Existe sa da proibição deve ser ad hom inem . uma edição complera de suas obras em russo, 20. Essa é uma paráfrase da definição que Tolstoi composta por seis volumes. dá em seu livro sobre a arte: "[ ... ] é um meio Iuli r. Aijenvald foi um crítico literário russo. de contagiar emocionalmente os seres humanos". (Cf. Leon Tolstoi, Q ué es el arte?, Buenos Foi um dos mentores de Vigotski na Universidade Popular Shaniavski. Vigotski escreveu um Aires: EI Ateneo, 1949, p. 175, Capo 14). 21. Neste parágrafo, com exceção do termo "miartigo sobre ele na revista N ovi P ut, em 1915. Em 1919, quando Vigotski teve seu primeiro lagre", as aspas são nossas, pois essas expressões são idênticas às do texto bíblico (Cf. A surto de tuberculose, aos 23 anos, convencido B íblia de Jerusalém , op. cit., p. 1409). Esse de que ia morrer pediu a Aijenvald, através de episódio, chamado de Primeira Multiplicação Dobkin, que publicasse postumamente seus dos Pães, é narrado em vários livros do Novo escritos, principalmente sua monografia sobre Testamento, mas aqui sem dúvida Vigotski se A tragédia de H am let, op. cit., mas Vigotski só refere ao "Evangelho segundo São Mateus" morreu aos 37 anos. Aijenvald foi expulso da (14:19-21). Em toda a sua obra são enconURSS junto com um grupo de intelectuais tradas citações da Bíblia. Segundo S. F.Dobkin opositores em 1922, e morreu no exílio. O (1899-1991), sua freqüente leitura da Bíblia H am let de Vigotski só foi publicado na Rússia influenciou seu estilo de expressão, como na em 1965. Em espanhol, a extensa monografia abundância de repetições e paráfrases (cf. r. sobre Hamlet foi publicada como apêndice em sua P sicología dei A rte, como já dissemos na M. Feigenberg (ed.), L . S. V igotski: N achalo nota ns 1. P u ti. V ospom inania S. F . D obkina o L. V igotskim (L . S. V igotski: Seus com eços. M em órias de S. Cf. o Capo 8, com o subtítulo "As funções da F . D obkin dobre L. V igotski) Israel: Jerusalém imaginação" . Publishing Centre, 1996, 108 p.) .~ .• -~. P S IC O L O G IA 22. 23. 24. 25. 26. P E D A G Ó G IC A 247 Referência à Bíblia. Cf. o episódio das Bodas 27. Aqui, Vigotski se refere à P oética de Aristóteles. 28. É dipo R ei é o mais conhecido dos 123 dramas de Canaã do Evangelho segundo São João 2:2do grego Sófocles (496-406 a. C.). Sem conhe9 (op. cito p. 1507-8). Cf. L. S. Vigotski,lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA La G enialidad y otros textos cer sua verdadeira identidade, Édipo mata o pai inéditos, ed. de G. Blanck, Buenos Aires: e se casa com a mãe, com quem tem quatro filhos. Anos depois, descobre a verdade e, em um Almagesto, 1998, p. 9-12. O personagem de um conto diz o seguinte: "Por momento de desespero, arranca seus olhos. 29. Cf. L. S. Vygotski, V oobrayenie i tvorchestvo v que a moral e a verdade não podem ser apredietskom vozr.astie. P isjologuichieski ochierk [A sentadas com toda a sua rudeza, em vez das infaltáveis formas adocicadas e douradas como im aginação e a criatividade na infância. E nsaio as pílulas? ... Isso não é normal! É uma falsifipsicológico], Moscou-Leningrado: GIZ, 1930. A tradução espanhola desse livro, intitulada La cação! Um engano! São falsidades! ... " [Nota im aginación y el arte en Ia infancia [E nsayo original de Vigotski]. Este personagem é Evgueni Petrovich Bijovski, psicológico] - o grifo é nosso -, publicada por Akal, Madri, 1982, apresenta numerosas defio pai da criança que fumáva no conto E m casa, ciências e erros. Além disso, não indica se a de Tchekov. A citação realizada por Vigotski tradução - anônima, naturalmente - foi feita pode ser encontrada em A. P. Tchekov, do russo ou de outro idioma. C uentos ... , op. cit., p. 877-8. (Nota de G. B.) 30. Trata-se do conto E m casa, cf. nota n 2 24. Ludwig van Beethoven (1770-1827) foi o com31. Esse famoso artigo de Tolstoi é o resultado de positor alemão que realizou a transição do suas experiências na Escola de lasnaia Poliana, classicismo ao romantismo. É considerado o que já mencionamos na nota n 2 9 do Capo 12. mais importante compositor do cânone musical ocidental. Supomos que o autor não-identiUsamos uma fotocópia do artigo em russo: "Kornu u kogo uchitsia pisat: krestianskim ficado dessa citação quer dizer que o efeito de riebiatam unas, ili nam u krestianskij riebiat?" sua música nos espectadores se manifesta de forma diferente que a de Chopin, pois em geExiste uma edição de alguns escritos educativos de Tolstoi em espanhol (cf. Leon Tolstoi, ral a música de Beethoven tem um caráter entusiástico - embora ele também tenha compoLa E scuela de Iasnaia P oliana, Barcelona: Calamus Scriptorius, 1978, 155 p.). sições profundamente melancólicas, como seus 32. Esta afirmação de Tolstoi sobre Goethe é tão riúltimos quartetos para cordas. Quando Vigotski dícula como ajá comentada, sobre Shakespeare, refere-se a Beethoven, alude às suas sinfonias no Capo 12. De acordo com cálculos recentes, o e as qualifica de "entusiásticas". Poucos sabem polifacético alemão Johann Wolfgang von Goethe que a alta sensibilidade artística de Vigotski (1749-1832) foi o escritor que utilizou o léxico excluía a música. Segundo nos afirmou sua fimais rico da história da literatura ocidental, além lha, ele era incapaz de diferenciar tons ou disde o ter usado de forma artística, como poucos criminar melodias, por mais simples que fosoutros. sem. Na nosografia do século XIX isto era cha33. Infância é o primeiro romance de uma trilogia mado de "surdez tonal", mas no início do séautobiográfica de L. N. Tolstoi. Depois dela veio culo XX tinha uma denominação ainda mais A dolescência e Juventude (Moscou: Progreso, engraçada: Vigotski era um "idiota musical", várias edições em espanhol). segundo José Ingenieros (cf. Ellenguaje musi34. Mikail Osipovitch Guershenzon (1869-1925) cal..., várias edições argentinas; a primeira foi foi um filólogo e crítico literário russo. É prode Alcan, Paris, 1907). Poucos argentinos savável que, aqui, Vigotski se refira à sua obra bem que Vigotski fez uma referência a V idenie poeta [A visão do poeta], Moscou, 1919, Ingenieros (cf. o volume I de suas O bras ... , op. livro que ele também cita em sua P sicologia da cit., p. 124). arte e em ''A Gráfica de [A .Ia.] Bijovski". Frédéric Chopin (1810-1849) foi um composi3 5. Aleksandr Afanasievitch Potebnia (1835-1891) tor e pianista polonês, paradigmaticamente foi um lingüista ucraniano e russo seguidor de romântico. Com relação ao que se disse na nota 2 Humboldt. O livro de Potebnia, M isl i iazik [P enn 25, a música de Chopin em geral é de carásam ento e linguagem , traduzido literalmente], ter intimista, como pode-se apreciar em seus publicado em Kiev em 1850 e reeditado em Noturnos, em muitos de seus Prelúdios, etc. Jarkovem 1913, foi uma referência permanente Chopin também tem composições de caráter na vida de Vigotski. Sua presença é evidente no entusiasta, como suas Polonesas.RQPONMLKJIHGFEDCBA 248RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA II i . i em mais de um texto. Cf., por exemplo, P rincíúltimo capítulo de seu último livro lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA M ishlienie i pios ... , op. cit. riedi [P ensam ento e linguagem ou, em uma tra39. Esse problema de aquisição fonológica costudução literal, O processo de pensar e aJala, ou O ma ser ilustrado com o seguinte exemplo. Se raciocínio e aJala], de 1934. apontarmos uma rosa para uma criança e lhe 36. Vigotski já explicou brevemente essa lei no Q perguntarmos: "Isto é um a losa?", ela responCapo 5. Cf. também nossas notas n 5 e 6 nesderá: w N ão) não é um a losa! É um a "losa"!. se Capítulo. Para uma discussão mais precisa, ampliada e definitiva, cf. L. S. Vigotski, 40. Na semiologia psiquiátrica, chama-se de ilu"La Ley Biogenética en Psicologia y en Pedasão uma percepção equivocada de um objeto, gogia", em L. S. Vigotski, E l D esarrollo C ultucomo ocorre quando, por exemplo, imaginamos ver um homem e, na verdade, se trata de ral dei N ino y otros textos inéditos, edição de uma árvore. A alucinação, em compensação, é G. Blanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998, uma percepção sem objeto e o sujeito alucinado p.69-77. não pode retificar com seu juízo crítico o trans37. Vigotski imaginou que uma sociedade perfeita torno perceptivo, embora possa reagir em ocioe um homem completamente novo, um "superhomem" poderiam se tornar realidade (cf. o nalm ente à sua percepção. 4l. Não pudemos identificar essa pessoa. Capo 19.) O trecho " .. .foram algum a vez acom42. Fiodor Shaliapin (Kazan, 1873-1938, Paris) foi panhantes da cultura ... (o grifo é nosso) indica que Vigotski, fiel filho da Ilustração, nunca um cantor lírico russo, o melhor baixo de sua pôde imaginar um futuro negativo para a huépoca. Cantou 21 anos no Teatro Bolshoi. Vimanidade. Com relação a essa expressão, 70 veu no exílio desde 1920. Apesar disso, o goanos depois de Vigotski a ter escrito, a cultura verno soviético sempre lhe deu um tratamenocidental voltaria a se encher de bruxas, espíto privilegiado. Cantou na Argentina em 1908 ritos, magia, etc., como nunca antes, influene em 1930-31. Considerava que o Teatro Colón ciada pela N ew A ge e outros irracionalismos de Buenos Aires era melhor que a Grande Ópera de Paris (cf. o livro F . J. Shaliapin, Moscou: esotéricos. Atualmente, os psicólogos e educadores se opõem a essas narrações, sejam elas Iskusstvo, 1958). 43. A sonata K reutzer para violino e piano de histórias de fadas, histórias em quadrinhos ou Beethoven é sua opus 47. A sonata K reutzer filmes - facilmente acessíveis às crianças nas também é o título de uma obra de Tolstoi: videolocadoras e através dos meios de difusão K reitserova sonata. Essa citação feita por de massa, a estupidez tecnologicamente orgaVigotski faz parte de uma argumentação que nizada, sobretudo na televisão. Por outro lado, hoje o "bicho-papão" é um bebê de peito comTolstoi coloca na boca de seu personagem parado com Freddy Krugger. Pozdnishev no Capo 23 de seu romance. Vigotski repete essa mesma citação em seu P si38. W. James faz essa afirmação - já reproduzida cologia da arte. neste livro - em mais de uma oportunidade e o Exercício e a F a d ig a RQPONMLKJIHGFEDCBA S O B R E O H Á B IT O sobre a capacidade de exercitação costuma-se propor, segundo o método de Kraepelin," a soma de números simples. Gaupp comenta o seguinte: zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPON i Do momento em que nos levantamos até o instante em que, à noite, nos deitamos na cama - diz James -,99 de cada 100, e provavelmente 999 de cada 1.000 de nossos atos Se prestarmos atenção à quantidade de somas se realizam de forma puramente automática efetuadas por unidade de tempo, notaremos ou por hábito. Vestir-nos e desnudar-nos, coque, na maioria das vezes, o rendimento do mer e beber, cumprimentar e despedir-nos, trabalho aumenta. Isso se manifesta ainda tirar o chapéu e dar passagem às damas; tomais claramente quando comparamos o rendas essas ações e até mesmo a maioria de nosdimento inicial dos diferentes dias, um após o sas palavras cotidianas consolidaram-se em outro. Essa elevação do rendimento é influennós graças à repetição, de uma forma tão típiciada pelo exercício que, como se sabe, facilica que quase podem ser consideradas movita e acelera todos os tipos de trabalho, tanto mentos reflexos. Para cada tipo de impressão físicos como mentais. O exercício é uma certa temos uma resposta preparada, automática. modalidade da memória. Durante a exerciteachers ... ]1 [W James, Talks to lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tação não se trata de reter impressões isoladas, mas de facilitar toda a direção da ativiCom isso já é possível perceber o impordade. Expressando-nos metaforicamente, tratante lugar que a formação de hábitos deve ta-se do caminho trilhado. ocupar na educação. O processo mediante o qual qualquer ação se transforma em hábito [privichkie] e adquire as propriedades características de um movimento automático é denominado exercício [uprazhnienie]. Definimos o próprio comportamento como uma organização especial das reações; resulta agora que só 0,001 dessas reações é determinado por algo que não seja o hábito. O ser humano, segundo uma expressão de James, é simplesmente um conjunto vivente de hábitos e, por isso, a meta do professor é acostumar o aluno aos hábitos que lhe possam ser úteis na vida futura. Daí deriva uma regra pedagógica muito importante, que exige que se dedique particular atenção aos processos de exercitação. Tal processo não deve ser considerado uma simples memorização. Cabe dizer que o exercício cria a predisposição para realizar da melhor maneira possível qualquer ação. Na pesquisa De acordo com o que ficou demonstrado por meio de pesquisas experimentais, o exercício desenvolve-se lentamente no início. Depois, sua rapidez aumenta, e ele é realizado por impulsos. Isso significa que o exercício provoca algumas mudanças na disposição das moléculas cerebrais. Nesse sentido, afirma James: A parte fundamental de toda educação consiste em transform ar nosso sistem a nervoso em nosso aliado e não em nosso inim igo [... ]. P ara conseguir isso) na idade m ais precoce possível em habituais e autom áa m aior quantidade de atos possíveis) evitando assim a consolidação de hábitos que provavelmente possam resultar desvantajosos [...]. Quanto maior for a quantidade de ações cotidianas que consigamos transformar em automáticas, que não exijam esforço, nossas tem os de transform ar ticos 250RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA capacidades mentais superiores terão berdade para a atividade que lhes é [W, James, Princípios de Psicologia, p. 100. Vigotski o citou sem o grifo que restabelecemos.] mais liprópria. op. cit., original Nesse sentido, é profundamente correto o ditado que chama o hábito de "segunda natureza" [Continuemos com James:] Essa lei deveria concitar a atenção do professor, dado o enorme e importante significado que os atos mais insignificantes podem adquirir caso se transformem em hábitos. Um gesto descuidado, um movimento casual, uma travessura inocente deixam marcas no sistema nervoso, e essa marca sempre se manifesta, talvez de forma imperceptível para nós, porém perceptível para o organismo. James estabelece cinco regras propostas pelo psicólogo Bain" para a educação do hábito. Acompanharemos a exposição de James: As crianças, com grande rapidez, transformam-se simplesmente em um conjunto vivente de hábitos. [Se isso se/soubesse], prestarse-ia mais atenção ao séu comportamento na 1. Utilizem tudo o que possa contribuir para idade em que ainda são plásticos. Nosso deso reforço de motivos corretos. Insistam tino está em nossas próprias mãos e, seja ele tenazmente nas condições que os apóiem bom ou ruim, nunca poderemos modificar no novo caminho. [ ... ] depois o que fizemos antes. Não há nenhum à observância de um 2. Nunca renunciem ato virtuoso ou vicioso que não deixe em nós novo hábito enquanto ele não tiver se arpelo menos uma marca insignificante. Na coraigado solidamente. Cada alteração de média de Jefferson,' o embriagado Rip van um novo hábito equivale à queda do noWinckle se desculpava cada vez que bebia, velo no qual estamos enrolando o fio de dizendo: "Não vou contar esta vez". Bem, e lã. Se ele cair apenas uma vez, será precidaí? Ele podia não a contar e o Senhor miseriso fazer de novo uma grande quantidade cordioso talvez não considerasse aquela vez, de voltas para que ele volte à sua forma mas de qualquer forma, ela era contada. Na anterior. O exercício incessante constitui profundeza das células e fibras nervosas as moo meio fundamental para tornar impecáléculas a contam, registram-na e a armazenam vel a atividade do sistema nervoso. [... ] para usá-Ia contra Winckle quando surgisse a 3. Aproveitem o primeiro caso favorável que próxima tentação. Para expressá-lo com rigor surgir para colocar em ação uma decisão científico, podemos dizer que nada daquilo tomada e empenhem-se em satisfazer que fazemos pode ser completamente apagaqualquer tendência emocional que surja, do. [W, James,lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P rincípios ... , op. cit., p. 104.] relativa aos hábitos que podem ser adquiridos. A decisão e a tendência não deiUm dos protagonistas de um conto de xam marcas no cérebro quando surgem, Tchekov, depois de um amor passado e engamas quando produzem alguns efeitos motores. [ ... ] A tendência à ação arraiganoso, anota em seu diário que o rei Davi tinha se em nós com maior força quando repeum anel com uma inscrição "tudo passa". Como timos de forma freqüente e ininterrupta resposta a isso, ele escreve as seguintes palaas ações e quando aumenta a capacidade vras em seu diário: "Se desejasse possuir um que o cérebro tem de provocá-Ias. Quananel, escolheria a inscrição nada passa." De do uma decisão nobre ou um impulso sinfato, cada um de nossos menores passos é cero do sentimento se perde sem deixar importante para o futuro. marca por nossa culpa, sem levar a resulDo ponto de vista psicológico, ambas as tados práticos, não só deixamos passar um afirmações contrárias são verdades iguais e secaso favorável para agir, mas também - o guras. Psicologicamente, tudo passa e qualquer que é ainda pior - criamos um atraso que, movimento repetido, justamente por ser preno futuro, começará a impedir que nossas decisões e emoções se-descarreguem cedido pelo primeiro, perde algo e adquire algo normalmente em forma de ação. O tipo novo. Mas também é verdade que psicologicamais desprezível de caráter humano é o mente nada passa, tudo deixa sua marca e indo sentimentalóide e sonhador impotenfluencia a vida presente e futura. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 251 te que, durante a vida inteira, se entrega senvolver apenas um órgão, o olho, o ouvido, a efusões sentimentais e nunca realiza um a boca, a mão ou a perna, porém nunca possuiato realmente valente. [ ... ] ria essa maravilhosa diversidade de órgãos re4. Não façam muitos sermões aos seus aluceptores que o caracterizam na realidade. [Ch. nos nem lhes digam um número excessiSherrington, T he integrative action af the vo de coisas boas de caráter abstrato. [ ... ] nervous system , op. cit., p. 223-4]5 5. Conservem viva a capacidade para o esforço, com um pequeno exercício voluntário Em segundo lugar, a ação da' fadiga é facotidiano, isto é, manifestem sistematicacilitar, depois de um prolongado trabalho de ' mente heroísmo em coisas insignificantes um mesmo reflexo, o aparecimento e o reforque não sejam imprescindíveis, façam cada ço de seu reflexo antagônico. Sherrington chadia alguma coisa, mesmo que seja apenas mou esse fenômeno de "indução espinal", por pela dificuldade de realizá-Ia, de modo que, analogia com fenômenos similares no órgão quando surgir uma verdadeira necessidada visão, denominados por Hering" de "indução de, não se sintam fracos e sem preparação. [W James,lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P rincípios ... , op. cit., Capo 4, visual". intitulado "O hábito".] Vemos, portanto, que, junto com a utili- dade biológica da ação habitual como reação oportuna e estereotipada aos estímulos uniforInclusive as pesquisas puramente fisiomes, estáveis e mais ou menos constantes do lógicas já demonstraram o imenso significaambiente, o sistema nervoso dispõe de outro do da repetição dos movimentos e da fadiga mecanismo, não menos importante biologicaconseqüente para o curso normal de nosso mente, porém oposto por seu significado e sencomportamento. O que acontece é que estão tido: o mecanismo da fadiga, cuja missão é a ligados à ação de um mecanismo nervoso que de frustrar o hábito, fechar suas vias nervosas é quase o mais importante: a luta pela via prine facilitar o surgimento de novas reações. cipal. Sherrington calcula que há quatro fatoÉ evidente que ambos os mecanismos são res que definem o desenlace dessa luta. Além necessários. Se o hábito não existisse, isso imda força relativa das excitações que competem plicaria um modo de comportamento muito e do caráter afetivo dos reflexos, ele menciona pouco econômico. Recordemos que qualquer a fadiga, que age duplamente. pensamento, um comportamento inusual, a Em primeiro lugar, a fadiga [utom lenieJ adaptação a novas condições, a aquisição de provoca o enfraquecimento do reflexo que prenovas reações, surge inevitavelmente de uma domina no campo final comum. "Com o correr dificuldade e se transforma em um retardo mais do tempo, o reflexo vai perdendo a capacidaou menos prolongado, isto é, em uma detende de conservar o vínculo com esse campo." O ção de todos os movimentos. Um animal que mais notável nesse caso é que o campo final não tivesse hábitos e se valesse desse modo de comum, sozinho, não evidencia cansaço. Evicomportamento tropeçaria em tudo com difidentemente, a fadiga não está localizada no culdade e reagiria ante tudo com retardo. órgão efetor, mas representa "uma adaptação Por outro lado, se não existisse fadiga, não oportuna" elaborada pelo sistema nervoso, que existiria a luta pela via principal, nem as tranexclui o predomínio demasiadamente prolonsições dessa via de um receptor para outro. gado de um mesmo reflexo. Toda a diversidade funcional das adaptações do animal ao ambiente desapareceria e seria Graças a isso obtém-se a diversidade de reasubstituída por uma reação uniforme e autoções reflexas do organismo, e a diversidade de mática. reações é necessária devido à milionária diversidade de fenômenos que existem no ambienA contradição dialética e o nexo de amte que nos rodeia. Se não existisse a chamada bos os mecanismos respondem totalmente às "fadiga", o organismo do animal poderia de-RQPONMLKJIHGFEDCBA leis gerais do desenvolvimento da matéria viva. 252RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I o S IG N IF IC A D O esse estado mental se transforma em movie lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA mento. Temos a sensação de que esse moD O S E X E R C íC IO S zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA vimento é provocado por nossa própria vontade, porque o resultado final obtido correscomportamento consciente se distingue ponde à representação anterior sobre o fim. pela característica peculiar de que, em cada [H. Münsterberg, P sychology and the T eacher, caso, antes de realizar qualquer ato, temos uma op. cit., p. 184-185.]7 P E D A G Ó G IC O o reação freada, não-exteriorizada, que antecipa o resultado de nosso ato e serve como estímulo com relação ao reflexo ulterior. Em outros termos, todo ato volitivo é precedido de certo pensamento. Com relação a isso, Münstenberg afirma o seguinte: Antes de estender a mão para pegar um livro, penso em realizar essa ação; vemos então que o fato fundamental é que a representação anterior à finalidade corresponde ao resultado final. No entanto, parece que, no fim das contas, omite-se o mais substancial. Por acaso, aqui não existe um processo intermediário, ou seja, um sentimento do impulso, um ato de decisão entre meu pensamento sobre o livro e o movimento realizado quando me levanto e o alcanço? Será que, precisamente aqui, não se oculta todo o mistério da vontade? Entretanto, uma psicologia exata não tem nada a ver com mistérios. Uma análise cuidadosa também pode desmembrar a vivência provocada por esse impulso. É fácil mostrar que, na verdade, a representação precedente só desempenha um papel com relação ao primeiro movimento que deve ser realizado para atingir o fim último. [ ... ] Quando penso em pegar o livro, a etapa final depende do primeiro passo, isto é, levantar-me da cadeira. [ ... ] A realização do primeiro movimento determina se toda a ação será efetuada. Portanto, em minha consciência deve haver a representação do primeiro movimento, como réplica real de todo o processo. Essa representação do primeiro movimento, que precede o próprio movimento, é justamente o conteúdo do que costumamos chamar de sentimento do impulso. [ ... ] O sentimento do impulso é esse tipo de representação antecipada dos resultados do primeiro movimento corporal que deve ser realizado [ ... ]. Em outras palavras, toda vivência e todo desejo conscientes, incluindo o sentimento da decisão e do impulso, está formado pelas duas representações, que competem entre si com relação aos fins. Uma delas predomina, associa-se à representação do primeiro movimento que deve ser efetuado, Portanto, todo o sucesso de nosso comportamento depende da representação inicial do fim, isto é, do predomínio sólido e decidido, em nossa consciência, da antecipação da reação não-exteriorizada. [Continua esse autor:] Não existe nenhuma capacidade volitiva especial a ser exercitada, não existe nenhum tipo de força espiritual peculiar que construa a passagem entre a representação do fim e sua realização [ ... ]. O que a criança tem de aprender em seu desenvolvimento é a capacidade de manter tenazmente a ação empreendida ante seu olhar mental. [ ... ] De fato, esse é o ponto nevrálgico da influência educativa: fazer o que realmente desejamos significa cumprir nosso dever. E não há objetivo mais elevado na educação que o desenvolvimento dessa capacidade de manter firmemente o que desejamos - nossa mais profunda vontade ante o olhar mental. [Ibidem, p. 187-189.] A partir dessa análise, torna-se perfeitamente compreensível o significado pedagógico do exercício. Münsterberg tem razão quando afirma que as outras funções da criança vão se desenvolvendo ao longo dos anos, porém sua atenção só se desenvolve graças a um exercício sistemático e minucioso. Explicaremos por que o exercício desempenha esse papel no ato da atenção. Recordemos que a atenção consiste em reações adaptativas de orientação [ustanovka] de nosso organismo [cf. Capo 7]. Ao mesmo tempo, a denominada atenção voluntária surge devido a uma reação mental interna. Conseqüentemente, ela se manifestará com maior freqüência se o número de estímulos internos aos quais estiver ligada for maior. Em outras palavras, para que ela surja, tem de haver uma grande reserva de estímulos internos. Exercitar a atenção implica provocá-Ia em cada caso mediante essa reação interna. Subentende-se que, quanto maior for , P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 253 a freqüência com que fizermos isso, quanto cebemos grupos inteiros de letras. Observanmaior for o número de casos que provocamos, do as primeiras letras, adivinhamos toda a pamais solidamente criaremos o vínculo entre os lavra. Mas quando lemos uma palavra em orestímulos internos e as reações de atenção. Por dem inversa, temos de visualizar conscientemente cada letra. Essa é justamente a ação do isso, Münsterberg diz que não há forma mais hábito, que vincula automaticamente entre si decisiva de influenciar esse comportamento que regular de forma rigorosa as ações exteruma série de reações e, com isso, nossa consciência não tem de se preocupar por elas. Quannas, reprimir os movimentos sem sentido e reto maior for a quantidade de reações que nosforçar os oportunos. so hábito abrange, mais distante ficará o objePortanto, o comportamento consciente pressupõe atenção, e a atenção se estabelece tivo que nossa consciência pode propor e estigraças ao exercício, isto é, graças à repetição pular. Por exemplo, se para mim todas as ações de certos movimentos, reforçados' pelo métomediante as quais me levanto da cama e me do dos reflexos condicionados com a represenvisto estão vinculadas a um hábito, minha detação desses movimentos. cisão consciente pode consistir apenas no penMas esse é apenas um dos aspectos da samento "tenho de me levantar". Se esse penquestão. O outro reside no problema do hábisamento está vinculado ao primeiro movimento. O que o hábito introduz de novo em nosso to, todo o processo se realiza facilmente e, encomportamento consciente? Digamos que o quanto me visto, posso pensar em qualquer hábito prolonga a previsão em nossa conduta, coisa. Em compensação, se o hábito abrange permite que nossos pensamentos disponham também o café da manhã, uma caminhada de grupos cada vez maiores de movimentos matinal e a viagem para o local de trabalho, vinculados entre si e que transcorrem sem esminha orientação consciente inicial talvez posforço algum de nossa parte. sa se expressar através da idéia "tenho de ir Basta comparar qualquer ação habitual trabalhar". Portanto, a orientação básica pode com uma não-habitual para perceber a enorabranger uma série mais prolongada de ações. Essa economia proveniente do hábito conme economia de forças obtida por meio do siste em que nunca percebemos como realizaautomatismo. É muito fácil contar de 1 a 100, porém esse processo se complica quando temos nossos movimentos. mos de contar na ordem inversa, de 100 a l. Também é fácil ler na ordem habitual, da esNão sei que músculos utilizo para retirar um querda para a direita, mas esse processo fica livro da estante; penso em pegar o livro e percebo o movimento para realizar essa ação. A difícil quando começamos a ler as palavras ao forma como uma coisa leva à outra não tem a contrário, embora soletremos a mesma quanver com minha vontade consciente. Minha tidade de letras. Essa economia que obtemos vontade confia na ação correta desse mecaquando lemos a mesma frase na ordem habinismo. No entanto, pode-se afirmar o mesmo do tual, em comparação com o ato de lê-Ia em movimento de nossas representações. Por ordem inversa, tem a ver precisamente com a exemplo, quero traduzir qualquer palavra para economia proporcionada pelo exercício. outra língua ou resolver um problema mateAs pesquisas experimentais têm demonsmático, ou pensar em algum plano; em todos trado que, quando realizamos exercícios esses casos [ ... ] isso é realizado de acordo com descontínuos com os olhos, percebemos por o objetivo traçado. Não somos conscientes da impulsos e não lemos movimentando a vista forma como a representação do fim leva a esse processo que se realiza sem obstáculos. de forma uniforme. Mediante o registro cine(Münsterberg) [Ibidem, p. 187.] matográfico do movimento das pálpebras ou com o registro de uma pequena alavanca colocada sobre as pálpebras, vemos claramente a A formação dos hábitos coloca à disposilinha do movimento de nossos olhos: lemos ção de nossa vontade mecanismos cada vez com o olho imóvel, e não com o que está em mais poderosos e permite que eles se propomovimento. Em outros termos, cada vez per-RQPONMLKJIHGFEDCBA nham fins cada vez mais distantes. Os hábitos 254RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I I.zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA te bem-sucedido quando acompanhado por aliviam a vontade e, dessa forma, lhe ofereuma satisfação interna. Do contrário, se transcem a possibilidade de encarar fins mais eleforma em uma cansativa repetição, contra a vados. "Se o processo de leitura e escrita nunqual o organismo se rebela. "O esforço foi co,ca se transformasse em um hábito, absorveria roado de êxito": essa é a condição essencial toda a nossa energia volitiva" [ibidem, p. 194] para avançar. Todos os casos de satisfação com e não deixaria espaço para a concentração no os resultados obtidos levam a certas mudansignificado, que é o fim a ser alcançado duranças no mecanismo nervoso de adaptação. Essà te esses processos. Quanto mais amplo for o fato possui um importante significado pedacírculo da atividade abrangido pelo hábito, gógico, mostra que a simples repetição não menor será a energia volitiva que teremos de garante o aumento do progresso, pois só a gastar para alcançar nossos fins. realização feliz de qualquer ação contribui com a formação da estrutura desejada no sistema O perigo reside apenas em que o hábito nervoso central. Se o mesmo movimento for sempre implica um modo. mecânico de comrepetido diversas vezes, a fadiga provoca reportamento e, por isso,lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA só pode ser útil quansultados insatisfatórios que impedem diretado existem condições uniformes. A conduta mente a formação de novas vias de menor rehabitual pode ser prejudicial nos casos em que sistência. (Münsterberg) [Ibidem, p. 193.] tem de haver uma nova adaptação. Os hábitos nos enriquecem e nos liberam para que possamos orientar nossos esforços para objetivos mais elevados. Mas os hábitos também nos escravizam e trabalham contra nossos esforços. A educação deve levar cuidadosamente em conta ambos os aspectos da formação dos hábitos. [Ibidem, p. 194.] Esse caráter dual do hábito revela-se claramente quando recordamos o inegável nexo que existe entre os processos do exercício e os processos da memória. A memória funciona de forma puramente reflexa, automática. J , II ,·1'f ~I James afirma que nada pode ser recordado sem uma "indicação" ["o ponto"], no jargão [teatral]. Essa indicação [ponto], que põe em ação o reflexo da memória, pode ser de duplo tipo. Se pertence aos estímulos mais ou menos constantes e que agem de forma estereotipada, exigindo uma resposta igualmente padronizada e estereotipada, a ação habitual será a reação correspondente às condições, a resposta correta e adequada à indicação [ponto]. Em compensação, se a indicação [ponto] pertence a circunstâncias novas, inesperadas e não-habituais e se, além disso, representa algum obstáculo para o curso normal das reações estereotipadas, a ação habitual será a pior resposta a esta e só servirá para impedir o pensamento. [ ... ] Existe uma regra psicológica sumamente importante para compreender corretamente o exercício. Este só é totalmen- A T E O R IA S O B R E A F A D IG A A fadiga - afirma Gaupp - é a antagonista do exercício. O processo de exercitação pode exigir simultaneamente a atividade de vários órgãos. Por exemplo, quando escrevemos ou caminhamos, o movimento de nossa mão ou de nossas pernas é regulado e determinado pelo funcionamento de nossos olhos, e todos sabem até que ponto é difícil escrever ou caminhar com os olhos fechados. Assim, qualquer atividade que realizamos provoca a ação de uma série de órgãos em conjunto e é acompanhada em qualquer ato de atenção pelo atraso ativo e pela inibição de todas as outras reações. Isso é o que condiciona o fato de flue, além da fadiga puramente muscular, que se desenvolve no órgão efetor - por exemplo, na mão que escreve -, existem fenômenos de fadiga nervosa geral muito extensa, que tornam todo nosso corpo incapaz de continuar a atividade. Devemos diferenciar três conceitos fundamentais: o cansaço, a fadiga e o esgotam ento. Podemos chamar de cansaço o estado nervoso que pode surgir em nós inclusive quando não existem fundamentos fisiológicos de nenhum tipo para o advento da fadiga. O cansaço pode surgir mesmo depois de um bom sono, ou por sugestão, ou devido à falta de interesse e pelo tédio, que derivam dos processos que ocorrem P S IC O L O G IA I i P E D A G Ó G IC A 255 diante de nós. Nos casos normais, porém, o canque o professor deve estabelecer a quantidade saço representa para nós um sinal de aparecimáxima de tempo que a criança pode trabamento da fadiga. A fadiga é um fator puramenlhar sem se fatigar. te fisiológico, e alguns pesquisadores supõem A fadigabilidade das crianças pequenas é que costuma estar vinculada ao aparecimento consideravelmente mais elevada que a das de tóxicos peculiares no sistema nervoso. maiores e, por isso, deve ser considerado um Durante certo tempo, supôs-se que havia grande erro pedagógico que a duração das um "tóxico da fadiga" que envenenaria nossos aulas no primeiro e no segundo grupo seja a tecidos durante um trabalho prolongado que mesma, apesar de que a fadiga em uma crianexige esforço. No entanto, a existência desse ça de 8 anos e em uma de 16 não aparece com tóxico não pôde ser demonstrada, e o caráter a mesma rapidez. fisiológico da fadiga continua sendo até agora Isso evidencia a necessidade do recreio, algo ainda não-elucidado. De qualquer forma, isto é, de interrupções parciais da tarefa; e da não podemos duvidar de que o simples fato, mudança de um tipo de trabalho por outro, por todos conhecido, de que qualquer trabapara que a monotonia não produza logo um estado de fadiga. lho nervoso é realizado às custas de certas substâncias materiais que se encontram em nosso A fadiga, em si mesma, é a pior condição sistema nervoso e de que, por esse motivo, o para o trabalho. É como se ela enunciasse o esgotamento dessas substâncias mais cedo ou protesto do organismo contra o trabalho; ela o mais tarde nos leva a abandonar o trabalho desorganiza, o torna mais lento e diminui sua que estamos fazendo. precisão, rebaixando a qualidade e os resultaO sistema nervoso, que precisa que o alidos do exercício. Por isso, uma exigência prioritária é uma higiene pedagógica especial, mento gasto seja reabastecido, cai em certa inação, em uma espécie de entumescimento na qual as tarefas da criança sejam distribuíque, nas formas extensas, adota o caráter de das de tal maneira que a levem a uma fadiga sono. O acadêmico Pavlov, ao pesquisar esses normal, e não a sobrecarreguem quando já está fenômenos, chegou à conclusão de que o sono fatigada. Nesse sentido, a fadiga é um fator representa processos amplamente difundidos desejável, porque cria fortes estímulos para a de inibição interna nos grandes hemisférios tranqüilidade, o descanso e o sono, contribuincerebrais." Portanto, a fadiga é algo totalmendo assim mais energicamente com o restabelete normal e necessário que regula nosso comcimento das forças esgotadas. A esse respeito, portamento no sentido de fazer-nos abandoé muito mais útil o trabalho que leva o aluno nar o trabalho quando este tornar-se nocivo até o umbral da fadiga e não o que o deixa a vários passos desse limiar. para o organismo. Nesse sentido, a aparição normal da fadiga constitui uma lei obrigatória Por outro lado, o esgotamento implica um de todos os tipos de trabalho. O professor não gasto tão anormal de forças que seu pleno restabelecimento é impossível. Então sempre deve temê-Ia, só deve se precaver nos casos surge um déficit, um gasto irreparável de enerem que surge uma extraordinária fadiga sem gia que produz conseqüências nocivas no orcansaço. Isso é o que sucede quando, com um ganismo. Ao mesmo tempo, cria-se a mais proesforço de vontade, reprimimos em nós o canfunda oposição de todo o organismo a esse trasaço e o vencemos, quando temos de realizar balho que provoca esgotamento. um trabalho complexo e difícil ou quando, devido à tensão, sentimos uma excitação tão grande que nos impede conciliar o sono. NOTAS Portanto, é evidente que o cansaço é uma reação subjetiva, e a fadiga é um estado obje1. Essa citação está na p. 48 da edição que contivo de nosso organismo. A fadiga não se masultamos. Cf. a nota ns 15 do Capo 1. nifesta de repente, mas pouco a pouco, e pode 2. Emil Kraepelin (1856-1926) foi um psiquiatra ser paralisada por pequenos intervalos no traalemão, um dos mais importantes da história balho e pela mudança de tarefas. Infere-se daíRQPONMLKJIHGFEDCBA ..,256 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA educação na Escócia. Amigo de John Stuart dessa especialidade médica. Aluno de Wundt, Mill, foi professor de lógica e de literatura inpesquisou praticamente todos os campos da glesa e, em 1876, fundou M ind, a primeira redisciplina. Ele distinguiu a psicose esquizofrêvista do mundo dedicada à psicologia. nica da maníaco-depressiva. Também é consi5. Em relação a Ch. Sherrington, cf o Capo 3 e a derado o fundador da psicofarmacologia. nota nº 5 desse capítulo. 3. Aqui, William James não cita o verdadeiro au6. Ewald Hering (1834-1918) foi um fisiologista tor de Rip van Winckle, o escritor norte-amerie psicólogo alemão que estudou a visão - tancano Washington Irving (1783-1859), mas to a percepção especial quanto a visão coloriJoseph Jefferson, que adaptou esse texto narda. Também realizou importantes pesquisas rativo para sua representação teatral:lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA R ip van sobre a memória. W inckle as P layed by Joseph Jefferson, Toron7. A partir daqui, todas as citações de Münsterberg to: Morang, 1899. no presente capítulo são de P sychology and the 4. Alexander Bain (Escócia, 1818-1903) foi um T eacher, op. cito Cf. a nota nº 19 do Capo l. filósofo que realizou a mais completa e siste8. Cf. I. P. Pavlov; E l sueiio y la hipnosis. T rabajos mática exposição da psicologia associativa empírica inglesa em numerosos livros. Contriexperim entales, ed. de J. Torres Norry, Buenos buiu de forma significativa com o avanço da Aires-Madrid: Martínez de Murguía, 1959. o o C O N C E IT O C o m p o rta m e n to A n o rm a l rio e em todas as partes nos esforçaremos para demonstrar o quanto são sutis os limites que seCOM PORTAM ENTO ANORMAL param o normal do anormal e com quanta freozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA conceito de normalidade pertence às qüência surgem, no comportamento corrente, canoções científicas mais difíceis e indeterminadas. racterísticas psicopatológicas. Na verdade não existe norma alguma, mas há uma quantidade inumerável de variações difeA S C R IA N Ç A S C O M rentes, desvios da norma, e muitas vezes é difícil D E F IC IÊ N C IA S F íS IC A S dizer onde o desvio ultrapassa os limites além dos quais começa o âmbito do anormal. Esses Os defeitos físicos podem ser tanto congênilimites não existem em nenhuma parte e, nesse tos quanto adquiridos e podem assumir as mais sentido, a norma representa o conceito meramen[defekt].l diversas formas, de acordo com o defeito lkjihgfedcbaZYXWVUT te abstrato de certa magnitude média dos casos Este pode se exprimir por meio da falta de alguns mais freqüentes de um fenômeno e, nos fatos, órgãos efetores - por exemplo, braços ou pernas não se encontra em forma pura, mas sempre e então se manifesta no defeito de comportamento mesclada com algumas formas anormais. Por isso, que distingue o inválido. Nesse caso, todo um grunão existem limites precisos de nenhuma índole po de reações ligadas a esse órgão ficam fora do entre o comportamento normal e o anormal. alcance da criança, e a anormalidade do comporNo entanto, esses desvios por vezes alcantamento se manifesta no fato de que, para comçam dimensões quantitativamente tão considepensar sua deficiência e completar as formas ráveis que temos o direito de falar de comportafaltantes de comportamento, o organismo confia mento anormal. Essas formas de comportamennovas funções a outros órgãos e organiza seu comto anormal também podem ser encontradas em portamento de forma diferente da utilizada pelas pessoas normais, manifestando-se como formas outras pessoas. Por exemplo, quando faltam as perde comportamento transitórias e temporárias, nas, os braços têm de ajudar no deslocamento do mas também podem ser encontradas como forcorpo pelo espaço. mas mais persistentes e mesmo constantes de seu A segunda conseqüência desse defeito comportamento. Desse ponto de vista, todas as consiste na consciência de seu déficit, que seformas anormais de comportamento podem ser gregará a criança de todo o corpo social e a divididas nos seguintes grupos: (1) formas pascolocará em uma-posição menos favorável que sageiras e fortuitas -lapsos, distrações, embriaas demais crianças. Por isso, o professor deve guez, etc.; (2) estados prolongados e persistense preocupar em resolver da forma mais indolor tes - neuroses e psicoses; e, por último, (3) altepossível todas as conseqüências desse defeito. rações permanentes de comportamento. Vamos Com uma organização acertada da vida infancomeçar pelas últimas, mas temos de avisar que til, com a atual diferenciação das funções soo velho critério que estabelece que as formas ciais, um defeito físico nunca deve representar anormais de comportamento são totalmente diuma causa de imperfeição total ou de invalidez ferentes das normais está incorreto. Em todas as social para seu portador. partes entramos em contradição com esse critéDE 258RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA !' Todo o problema reside em que as técnicas educativas devem ser, nesses casos, individualizadas, de acordo com cada caso particular. Com um método de compensação, por um lado, e de adaptação, por outro, a questão pode ser resolvida sem dificuldade. Um inválido, com uma educação razoável, pode conservar todo o seu valor social e a influência de sua deficiência pode ser praticamente anulada. Ficou muito longe a época em que o inválido, por causa de sua deformidade, era excluído da vida, e sua função social reduziase exclusivamente a uma, existência parasitária, que dependia da compaixão alheia. O milagre da educação social consiste justamente em que ela ensina os inválidos a trabalhar, ensina os mudos a falar e os cegos a ler. Esse milagre deve ser entendido como um processo totalmente natural de compensação educativa desses defeitos, como mostraremos a seguir O comportamento anormal adota formas muito mais difíceis quando está ligado a defeitos dos órgãos dos sentidos ou analisadores. A cegueira ou a surdez congênitas constituem problemas pedagógicos mais complexos que outros tipos de defeitos. Nesse caso não é qualquer órgão efetor que está afetado na criança, mas os órgãos da percepção, através dos quais se estabelecem vínculos de enorme importância com o ambiente. Ao mesmo tempo, tudo depende da importância do analisado r correspondente dentro do sistema geral do comportamento. A perda de funções como o olfato e o paladar não provocam conseqüências essenciais para toda a estrutura de nosso comportamento e, nas condições contemporâneas de nossa existência, representam um defeito pouco notável e até mesmo imperceptível. Nas atuais condições de vida o olfato é utilizado em poucos casos, e sua função biológica está se anulando cada vez mais. Entretanto, essas perdas das funções isoladas do olfato e do paladar ocorrem com pouca freqüência, assim como a perda do tato e da sensação motora. Formas congênitas de cegueira e surdez são encontradas com maior freqüência. Levando em conta estas últimas, resulta mais fácil demonstrar em que reside o princípio da educação das crianças portadoras de deficiências. Em primeiro lugar, vamos analisar os cegos. A cegueira, quando permanecem intactas todas as outras formas de comportamento, representa a perda de um analisador, o mais importante, que nos permite estabelecer as relações mais sutis e complexas com o mundo externo. Por isso, o cego não consegue perceber as formas de movimento que distinguem o vidente. A isso se deve o lamentável papel social que os cegos sempre e em todas as partes desempenham, por um lado, e a falta de autoestima interna e o estado de depressão que durante muito tempo se transformaram em seus companheiros permanentes. O princípio da educação, que estava concentrado nas mãos da beneficência, baseavase na idéia de que "devemos sentir compaixão pelos deficientes"," mantê-los com recursos doados, ajudá-los a viver uma existência humana lamentável. Quanto aos próprios cegos, inculcava-se neles, de todas as maneiras possíveis, a idéia de que deviam considerar sua desgraça como um castigo ou provação de Deus e assumi-Ia com total resignação. Ao mesmo tempo, não se realizavam tentativas para ultrapassar os limites da resignação ao defeito, e, assim, a regra pedagógica básica era a adaptação da educação a esse defeito e não sua superação. Por outro lado, foram criadas lendas psicológicas sobre a suposta existência de um extraordinário e misterioso sexto sentido dos cegos que lhes permitia, por uma sábia lei da natureza, penetrar através das trevas, mediante um desenvolvimento incomum de seu tato que, por sua intensidade e sutileza, superava o das pessoas normais. Tudo isso é profundamente incorreto. Na verdade, o comportamento dos cegos se organiza exatamente do mesmo modo que o das pessoas completamente normais, com a única exceção de que órgãos analisadores faltantes, vinculados à visão, no processo de acumulação de experiência são substituídos por outras vias analisadoras, na maioria das vezes táteis e motoras. Nesse sentido, é muito notável a leitura dos cegos. Os livros para cegos estão impres- -. _ ....•..•. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 259 sos com letras comuns, mas com tipos em rese encontram. Para quem vê pela primeira vez [na vida] um livro, as páginas parecem um levo, gravados no papel e, assim, os cegos aprendem, desde a mais tenra idade, a ligar a amontoamento desordenado de milhares de signos no qual a 'visão se perde de forma imreação da pronúncia deste ou daquele som ao potente. Assim, a ordem e o significado não estímulo tátil que parte dessa letra em relevo. são introduzidos pela agudeza da visão e do Toda a diferença com a leitura dos videntes se tato, mas pela experiência previamente acureduz ao fato de que a sensação visual é substituída pela tátil. Mas devemos lembrar sem- . mulada, pelos vínculos previamente estabelecidos das reações condicionadas, que agrupam pre que, para a formação de um reflexo condie relacionam uma enorme quantidade de estícionado, é totalmente indiferente saber com mulos externos. No ensino de um cego, deveque novo estímulo temos de operar. O reflexo salivar do cão passa a ser igualmente condicise substituir os vínculos de certos estímulos por outros, porém ao mesmo tempo todas as deonado e se fecha [forma] em um novo víncumais leis psicológicas e pedagógicas em que a lo, tanto no caso de ele estar excitado por uma educação se baseia continuam em vigor. luz azul, por uma carícia ou pelas batidas do Ao mesmo tempo, devemos levar em conmetrônomo. É mais comum os cegos utilizarem os ta que todo fechamento desses vínculos deve ter como objetivo final a incorporação do cego caracteres peculiares de Braille," que criou um à experiência social das outras pessoas, e isso alfabeto especial para cegos. Nesse alfabeto, se torna possível quando aproximamos ao mácada letra é formada por diversas combinações de seis pontos, impressos em relevo no papel. ximo os sistemas de estímulos condicionados dos cegos aos sistemas sociais universais da coSe uma pessoa vidente, não-acostumada com municação. Portanto, embora os caracteres esses caracteres, tentar tocar essa página com Braille pareçam ser o método mais econômico a mão, sentirá uma grande quantidade de pone cômodo, do ponto de vista psicológico eles tos desordenados, obterá uma série de sensanão podem ser admitidos como adequados, ções sem sentido e não saberá dizer qual é a pois essa escrita segrega o cego do conjunto quantidade e a disposição desses pontos. Em geral das pessoas. Uma carta escrita em alfacompensação, para o cego esses pontos estão beto Braille só pode ser compreensível para um ligados à representação de sons, que se orgacego e, dessa forma, não é apropriada para uma nizam em uma palavra, e essas palavras se comampla comunicação dos cegos com os videnbinam em frases que oferecem um determinates, mas para o estreito e fechado mundo dos do significado. É muito fácil perceber, assim, cegos. Por isso, devemos exigir que a experiênque qualquer leitura tem um caráter puramente cia do cego possa ultrapassar os estreitos limide reflexo condicionado e que lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA qualquer sistetes de seu defeito, para que ele possa se relama de estím ulos pode servir como alfabeto para cionar da forma mais vasta e direta com a exregistrar a fala humana." Para chegar a isso, o periência social da humanidade. novo estímulo tem de estar ligado ao velho Por esse motivo, do ponto de vista psicosom, pelo método do reflexo condicionado. lógico, é preciso propor uma possível redução Resulta compreensível, portanto, que o tato nos do ensino especial dos cegos para incorporácegos não é de modo algum melhor nem mais los, a partir da mais tenra idade, às escolas sutil que o dos videntes, mas está ligado a uma comuns, média e superior. O isolamento dos quantidade muito maior de nexos e acumulou cegos em escolas especiais não pode dar bons uma experiência muito maior. Isso pode ser resultados, pois com esse tipo de educação toda compreendido facilmente se prestarmos atena atenção dos alunos vai se centrar na cegueição à forma como olhariam uma página imra, em vez de imprimir-lhe outra direção. Espressa do presente texto uma pessoa alfabetisas escolas reforçam a psicologia do separatiszada e um analfabeto. Para a primeira não remo, própria dos cegos, e os encerram em um presenta nenhum esforço se orientar rápida e mundo estreito e sufocante. exatamente entre as milhares de letras que lá RQPONMLKJIHGFEDCBA 260 L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Há uma opinião muito difundida de que os cegos também se distinguem por uma formação espiritual peculiar. Assim, menciona-se sua especial sensibilidade, sua paixão pela filosofia, sua voracidade, etc. Tudo isso, à medida que parte de observações certas, pode facilmente ser tomado por verdade. No entanto, só um critério pobre pode considerar a cegueira, como deficiência congênita, como causa de tudo isso. É claro que esses não são defeitos do educando, mas da educação, isto é, ramificações secundárias do comportamento dos cegos. Foram criadas mais pelo clima social em que o cego se desenvolveu' e formou que pela estrutura interna de sua personalidade. A respeito disso, há um conto muito curioso, O lkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA m úsico cego, de Korolenko," cujo protagonista sofre permanentemente e se tortura por causa de sua tendência instintiva à luz e pela consciência de seu déficit. O professor Shcherbina," também cego, destacou acertadamente tanto a incorreção desse juízo de um vidente com relação a um cego, quanto a ausência nos cegos da sensação de estar vivendo nas trevas. Imaginar a cegueira como um estado em que alguém vive em permanente escuridão equivale a julgar o cego a partir do ângulo de um vidente. No entanto, a própria história de Korolenko também contém uma verdade com a qual a teoria psicológica coincide plenamente. O músico cego consumiu-se em um sofrimento irremediável enquanto esteve fechado no estreito círculo de seu padecimento pessoal e egoísta. Mas quando, depois de uma viagem com outros cegos, submergiu sua pena pessoal no mar da pena geral do povo, isso iluminou seu entendimento, isto é, ele se encontrou como pessoa, interna e espiritualmente. É sumamente curiosa a circunstância de que ele foi salvo pela própria música, que anteriormente apenas lhe ensinava novas formas de sofrimento. Quando [antes] sua mãe tentava traduzir para a linguagem dos sons o mundo das cores, isso acentuava e aguçava ainda mais o sentimento de seu defeito. Em compensação, quando a música se transformou em fonte de vasta experiência social para ele, realmente o ajudou a superar seu defeito. O princípio fundamental da educação dos cegos é o método de compensação social de seu defeito. E aqui, como em nenhuma outra parte, vemos a impotência radical da educação individual e a solução indolor do problema no plano social.' O problema das crianças surdas-mudas é ainda mais complexo. Na maioria dos casos estamos, em essência, diante da surdez como defeito congênito, pois a mudez é um fenômeno secundário devido ao fato de que a fala da criança, não alimentada por nenhum tipo de estímulos verbais externos e não controlada pela própria criança, fica estagnada na etapa do grito reflexo. O surdo de nascença, por não ouvir a própria fala nem a alheia, se transforma em mudo, ainda que os centros da fala e o aparelho de fonação não tenham sido afetados. Assim, na surdez temos um tipo totalmente diferente de defeito que no caso da cegueira. Embora todo o mundo externo seja apresentado para nós mais através da visão que da audição, e os sons desempenhem um papel comparativamente insignificante no contexto geral do mundo, a surdo-mudez é um defeito muito maior e terrível que a cegueira. Para o cego está vedado o mundo da natureza, mas em compensação o mundo social está aberto para ele. O surdo, ao contrário, conserva praticamente toda a percepção do mundo natural, mas exclui-se a possibilidade de comunicação social. Vemos aqui de forma evidente até que ponto, na época atual, os vínculos sociais são mais essenciais e importantes que os naturais. Na verdade, só a audição da fala humana está ligada aos sons, porém isso é totalmente necessário para o desenvolvimento interno da personalidade. Em nenhuma parte vemos com tanta clareza como no exemplo dos surdos-mudos que nossa consciência tem uma origem puramente social e se desenvolve conforme o modelo da comunicação com as outras pessoas. Nos surdos-mudos desenvolve-se precocemente a fala gestual, que logo substitui os estímulos sonoros pelos visuais. Os mudos falam com ajuda do alfabeto manual. Conversam mediante esse alfabeto" da mesma forma que nós conversamos com sons; em ambos os casos temos sistemas de estímulos condicionados para denotar nossas reações. Entretanto, sua linguagem gestual constitui o nível mais P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 261 tual. Sem a ajuda da fala, o surdo-mudo está baixo e a forma mais restrita de desenvolvicondenado a permanecer na etapa de grande mento da linguagem e da consciência. Admite atraso intelectual e falta de desenvolvimento. apenas a comunicação de surdos-mudos com No aspecto psicológico e educativo, temos o seus iguais e os encerra no limitado círculo de exemplo da evolução de [alguns] surdos-mudos sua deficiência. Essa linguagem tem as marcas como Helen Keller, que alcançou tal nível de do pensamento primitivo e, por isso, não pode consciência que pôde escrever uma série de lise transformar em instrumento de expressão e de conhecimento de fenômenos mais complevros interessantes sobre diversos ternas." xos e sutis. O fato mais importante, porém, é Um modelo para a natureza de todo proque a fala, além das funções de comunicação cesso educativo é o aparelho destinado à consocial, tem a função de construir a consciênversa de um cego com um surdo-mudo. Esse cia. Já vimos [no Capo 9] que todas as reações aparelho inclui os seis pontos de Braille que mentais, todos os atos de ori~i1'tação, constise levantam quando se pressionam os seis tuem a linguagem interna. Portanto, a mudez botões correspondentes. O cego, apertando os também é a ausência de um pensamento debotões, cria as combinações necessárias de senvolvido.? pontos e com estes forma as palavras que o O princípio da educação dos surdos-mudos mudo pode ler. Por outro lado, o mudo, ao consiste da mesma regra que se aplica aos cegos, realizar o mesmo trabalho, permite que o cego ou seja, da compensação do defeito através da apalpe os pontos salientes e penetre em seu ampliação da experiência social e da aproximapensamento. Vemos aqui esse recurso simples, ção do surdo-mudo das formas normais de comno qual, fechando [formando] novos vínculos condicionados, a educação vence as insuportamento. Isso pode ser conseguido mediante proficiências naturais e cria a possibilidade de comunicação social e, assim, o próprio desencedimentos pedagógicos mais complexos. Não basta substituir apenas o sistema dos estímuvolvimento. los auditivos pelos visuais. Também é preciso restabelecer o alterado mecanismo da reação A S D E F IC IÊ N C IA S E A S circular [okjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA fe e d b a c k ]. O que acontece é que, D O E N Ç A S M E N T A IS para elaborar a consciência da fala e dirigi-Ia, a própria reação deve retomar à mesma pesOs problemas relacionados à educação de soa sob a forma de um novo estímulo. Em gecrianças portadoras de deficiências mentais são ral, isso é realizado mediante o fato de que, mais complexos. Nesse terreno, temos três gruquando falamos, nos escutamos e, através dispos básicos de crianças. so, se desenvolve a consciência de nossa próO primeiro abrange as diferentes formas pria fala. Nos surdos-mudos, esse mecanismo de oligofrenias em diversos graus e formas, code reação circular é efetuado com ajuda das meçando pela idiotia e terminando pelo grau sensações cinestésicas que surgem durante a leve de retardo [mental]." Na maioria das vefala e substituem o ouvido. Só quando os mozes, esses fenômenos estão vinculados a alguvimentos articulatórios surgem na mente do ma lesão orgânica do sistema nervoso ou a doenaluno, este aprende a dirigir sua fala e a estruças congênitas da secreção interna [das glântura de forma consciente. Ao mesmo tempo, dulas]. Ao mesmo tempo, essas deficiências se aprende a ligá-Ia ao traçado visual da palavra expressam diminuindo a acumulação da expee à impressão visual da pronúncia alheia. Devido a isso, o surdo-mudo aprende a falar e a . riência individual. Essas crianças são lentas para formar novos reflexos condicionados e, portancompreender a fala do outro lendo-a em seus to, estão limitadas de antemão quanto à possilábios, da mesma maneira que a lemos em uma bilidade de elaborar um modo de comportamenpágina. to suficientemente rico, diverso e complexo. Só no desenvolvimento da fala está implíPor isso, a tarefa natural da educação cita a garantia de uma regeneração social do dessas crianças é estabelecer as reações vitais surdos-mudo e de seu desenvolvimento intelec-ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 262ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA te, que tem de estar adaptado ao distúrbio nerimprescindíveis que possam propiciar sua mínima adaptação ao ambiente, para torná-Ias voso dos educandos. Assim, se os estímulos abruptos e ruidosos são insuportáveis para esmembros úteis da sociedade e fazer com que tenham uma vida consciente e laboriosa. Os sas crianças, sua vida deve ser organizada de tal maneira que se garanta o silêncio e a tranmétodos de ensino dessas crianças em geral qüilidade. Ninguém se atreveria a ser tão oticoincidem com os aplicados às crianças normista e pensar que, com os recursos dessa edumais, só que seu ritmo é mais lento. Do pontoQPONMLKJIHGFEDCBA cação, qualquer comportamento anormal pode i de vista psicológico, é sumamente importante . não isolar essas crianças em grupos fechados ser definitivamente canalizado para um curso normal. Consideramos que não conhecemos especiais, mas exercitar o mais amplamente nem uma centésima parte das possibilidades da possível sua comunicação com os demais. Neseducação social e, embora não se possa falar da se caso, as considerações pedagógicas práticas completa superação de todos os defeitos, temos sobre a utilidade da educação 'às vezes entram bases concretas para afirmar que, sem essa eduem contradição com as exigências psicológicação, nenhuma outra está em condições de concas. Por exemplo, quando se promove o princeder formas socialmente úteis a esse comporcípio da escola complementar. Alguns pedagotamento anormal. gos supõem que a separação das crianças defiResta o último grupo de formas de comcientes em escolas especiais nem sempre é útil - ainda que, do ponto de vista do cumprimenportamento anormal: a conduta psiconeurótica nas crianças. Em geral, nela é incluída uma to do programa, seja desejável "aliviar" as esdoença passageira e temporária. Propôs-se difecolas comuns dessas crianças. renciar a psicose da neurose da seguinte maEntretanto, nos graus profundos de atraneira. A psicose surge de um conflito entre o so não resta a menor dúvida de que somos obrigados a confiar a educação dessas crianmeio e a personalidade, devido ao fato de que ças a escolas especialmente adaptadas a esse os impulsos internos da personalidade entram propósito. Todas as peculiaridades pedagógiem conflito com as condições do ambiente. Por cas dessa escola podem ser abrangidas por uma outro lado, a neurose deriva de um conflito dentro do próprio "eu", quando algumas tenregra psicológica comum. Deve ser uma escodências internas contradizem o nível moral la com um meio social facilitado, isto é, que básico da personalidade. De qualquer forma, não pressione a mente débil da criança com uma grande quantidade e complexidade de em ambos os casos estamos diante de doenças relações, mas que lhe dê a possibilidade de feque emergem de um conflito interno e que comprovam o fato de que, na interação entre char de forma lenta e segura os vínculos cono organismo e o ambiente, ocorreu uma situadicionados necessários. As crianças nervosas, epilépticas, histérição penosa. Subentende-se que a cura do conflito exige que sejam eliminadas as causas que cas, etc. apresentam desvios mórbidos em suas o geraram e, nesse caso, o tratamento do formas de comportamento e precisam mais de psiconeurótico se reduz à sua reeducação. tratamento que de educação. Mas nesse caso adquire particular força a idéia do professor Essa reeducação é possível por meio das novas inter-relações que se estabelecem entre Zalkind de que, em essência, não é possível trao meio e a criança, que permitem superar o çar um limite rígido entre educação e tratamento, entre pedagogia e psicoterapia. Ambas consconflito sem dificuldades. Isso é particularmente evidente quando nos detemos, por exemtituem a sociogogia," uma higiene social metodicamente planejada. Observando as crianças plo, no caráter e na natureza da psicopatologia doentes vemos que, em última instância, o ca- .infantil durante a guerra. A guerra, como enorminho para sua educação correta passa por uma me comoção social, provocou imensas mudanorganização do ambiente que as ajude a formar ças e deslocamentos entre nós e, logicamente, gerou uma série de conflitos nervosos que deos vínculos necessários com a ajuda da educaram origem à denominada "evasão na neuroção. As exigências pedagógicas de uma educase", isto é, a tentativa do indivíduo de elimição desse tipo devem levar em conta o arnbien- P S IC O L O G IA nar seu conflito, sua divergência com o ambiente, sob as formas do delírio, da fantasia e do comportamento anormal. A única saída correta diante desse tipo de psicopatologia é sua profilaxia e terapia, ou seja, a eliminação do conflito através de formas socialmente aceitáveis e úteis. A reeducação da psiconeurose em geral está subordinada a todas as outras leis de educação social do reflexo condicionado. Referimonos apenas a propiciar a saída da energia inibida e latente. Por isso, a psicologia atual tende a considerar a psicopatologia infantil como um fenômeno social e a reduz a manifestações anti-sociais da criança. Vejamos o que o professor Zalkind diz sobre a questão: P E D A G Ó G IC A 263 quecimentos casuais, que é o que acontece quando não conseguimos nos lembrar de alguns sobrenomes que conhecemos muito bem ou de nomes geográficos; os casos de perda repentina e de ruptura acidental de alguns objetos; o esquecimento de nossas próprias intenções; as ações sistemáticas como as que realizamos enquanto conversamos, quando brincamos com algum objeto ou rasgamos um papel em pedaços pequenos; oskjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLK la p s u s lin g u a e ; os la p s u s c a la m i; os erros de leitura, etc." Quando observados com atenção, todos esses casos revelam ser processos rigorosamente determinados. O próprio conceito de casualidade deve ser eliminado da pesquisa científica porque temos de supor de antemão que não existem ações sem causa e que, na verdade, as formas mais casuais e insignificantes de nosso Os [doentes] "circulares" perderam seus "cicomportamento estão determinadas e condiclos'":' de tal maneira sob a influência das condições externas, e os esquizofrênicos não só cionadas por profundos nexos causais. não seguiram sua dissociação, mas até restauPor exemplo, se pedirmos a uma pessoa raram suas perdas passadas que, salvo nos que diga o primeiro número que lhe vem à cacasos muito graves, talvez seja preciso renunbeça e ela menciona, digamos, o 3448, recorciarQPONMLKJIHGFEDCBA à condenação diagnóstica e psicopatolórendo à psicanálise quase sempre é possível gica. E inclusive as formas graves e especiais demonstrar por que ela mencionou justamente de psicopatologia, como nos convencemos a esse número e não outro, e quais são as causas cada passo, em outras condições sociais e peque existem por trás dele. Da mesma maneira, dagógicas estariam sujeitas a um ritmo totalpode-se demonstrar quais são as causas que mente diferente, a outra profundidade em seu correspondem aos nossos pequenos erros, esdesenvolvimento. quecimentos, lapsos, etc. Ao mesmo tempo, na base dessas formas de comportamento sempre Portanto, também a psicopatologia infanse encontram alguns desejos ou aspirações intil se dilui totalmente na educação social.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA conscientes que tentam abrir caminho para a superfície. Esse é, por exemplo, o significado A P S IC O P A T O L O G IA D A V ID A C O T ID IA N A dos lapsos que, com freqüência, de modo inesperado para o próprio falante, traem seu peno comportamento anormal, porém, não samento secreto ou sua intenção inconsciente. se manifesta apenas na anormalidade congêÉ claro que nesses casos estamos diante nita ou sob a forma de distúrbios transitórios. de formas embrionárias de psiconeuroses, porEle se infiltra e penetra em nossa vida cotidiaque cada lapso e cada nome esquecido reprena e é encontrado em todos os momentos, em sentam, da mesma forma como acontece com todas as pessoas. Durante muito tempo, esses uma grande neurose, o resultado de um confenômenos escaparam da atenção da ciência, flito, só que este é provocado por um choque porque esta e as pessoas comuns os considerainsignificante entre duas idéias sem importânvam casualidades e não lhes davam nenhuma . da. Entretanto, o estudo dessas formas de comimportância; parecia que não desempenhavam portamento tem um profundo significado. Prinenhum papel especial na vida humana. meiro, para esclarecer os fundamentos gerais Freud chamou esses fenômenos de "psicoda causalidade psíquica e, segundo, para estupatologia da vida cotidiana'?" e nela incluiu dar, da forma mais simples, o mecanismo pelo formas de nosso comportamento como os esqual se orientam as neuroses. No trabalho prá- 264ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ou certo número - realize uma determinada ação. Depois se sugere ao hipnotizado que esqueça o comportamento sugerido. E realmente, depois de acordar, no período intermediário, o hipnotizado não conserva a lembrança do que deve fazer, mas quando chega o prazo sugerido ou quando aparece o estímulo sugerido, ele imediatamente realiza com exatidão A H IP N O S E a ação induzida. O mais curioso de tudo isso é que o hipA hipnose pertence a formas de compornotizado tem a impressão de que ele mesmo tamento que não oferecem grande interesse quer realizar a ação em questão e inventa preprático para um pedagogo, porém são sumatextos para justificar seu comportamento esmente importantes para estudar as formas funtranho. Portanto, vemos que o vínculo reflexo damentais do comportamento. A hipnose é um condicionado que fechamos [formamos] no estado artificialmente provocado em qualquer hipnotizado pode ser completamente inconspessoa, semelhante ao sono, que se distingue ciente, não-subordinado a ele. A pessoa pode deste apenas pela manifestação muito clara da nem suspeitar de sua existência, porém o vínsugestão que geralmente o acompanha. Entre culo age com exatidão infalível. o hipnotizador e o hipnotizado se estabelece Com freqüência, a hipnose é comparada um certo nexo, chamadokjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA r a p p o r t, que coloca o com a educação, e alguns pedagogos, como hipnotizado em uma relação subordinada com Guyau," afirmam que a educação em geral relação ao hipnotizador. Este, a seu arbítrio, constitui somente uma série de sugestões coorpode provocar alucinações e alucinações nedenadas. Deriva daí que toda sugestão esteja gativas" no hipnotizado, sugerir-lhe diversos relacionada à hipnótica e que se aplique a vercomportamentos e ações. dadeira hipnose em alguns casos de crianças Até hoje, a natureza da hipnose ainda dificilmente educáveis. não foi totalmente estudada, apesar das nuNa verdade, temos de dizer que a sugesmerosas observações efetuadas nesse terretão desempenha um papel de extraordinário no." No entanto, em linhas gerais, podemos significado na educação, porém se distingue supor que a hipnose não implica outra coisa de um recurso educativo normal pelo fato de que uma inibição interna amplamente estenque, com freqüência, cria vínculos artificiais e dida nos hemisférios cerebrais, que o hipnotisecundários no sistema nervoso do aluno, em zador, com suas palavras, desinibe em certa vez de permitir que esses vínculos surjam nadireção e zona. Por isso, não é assombroso turalmente durante o processo de experiência. que a hipnose provoque uma excitação intenA importância essencial dos experimensa e viva, esmagadora, ou uma excitação caltos hipnóticos reside em que eles evidenciama e fraca, prolongada e monótona, de alram pela primeira vez com total clareza a r e a gum órgão da percepção. lid a d e d o in c o n s c ie n te ; mostraram que podeA forma mais curiosa do comportamento mos realizar certos atos sem conhecer sua verhipnótica é a denominada sugestão pós-hipnódadeira causa, oculta em uma sugestão inconstica. Durante o estado hipnótico se sugere ao ciente e, em vez dessa causa, podemos tomar hipnotizado a realização de alguma ação deconsciência de um motivo falso ou aparente. pois de acordar, em um determinado prazo conEm geral, o comportamento anormal ensiderável e distante. Por exemplo, pode-se sucerra enormes possibilidades para o pesquisagerir que, depois de três meses, ele escreva uma dor. Afirma K. Bühler: carta com determinado conteúdo, ou vá a um determinado lugar ou, ao sair de casa, faça algo A creche, o manicômio para loucos e as escoinofensivo porém tolo, ou, de acordo com cerlas especiais para oligofrênicos são os lugares to sinal - quando pronuncia a palavra "água" nos quais é possível conhecer, mais que em tico, o professor tem de dedicar a esses fenômenos pouca atenção, mas ele tem de saber o que significam e compreender, em cada oportunidade, que, por trás de qualquer lapso podese ver, como se fosse uma rachadura, o inconsciente que emerge.QPONMLKJIHGFEDCBA P S IC O L O G IA outra parte, a estrutura da psique humana e as amplas linhas de seu desenvolvimento. [K. Bühler,kjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA D ie E n tw ic k lu n d d e s K in d e s (O d e se n v o lv im e n to p síq u ic o d a s c ria n ç a s). Jena: Fischer, 1918.]19ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA NOTAS 1. A melhor coleção de escritos de Vigotski sobre esse tema é: L. S. Vygotski, O b ra s E sc o g id a s. F u n d a m e n to s de D e fe c to lo g ía , tradução de Lya Skliar e Guillermo Blanck, adaptação de Napoleón Vidarte e Irina Filanõva, Madri: Visor, 1997, 390 p. Sobre o uso do termo "defecti1 do Capo 17. vo", cf. a nota nQPONMLKJIHGFEDCBA 2. A palavra russa que Vigotski utiliza aqui para designar os portadores de deficiência é u b o g u i, cuja etimologia denota "aqueles que pertencem a Deus". 3. Louis Braille (1809-1852) foi um pedagogo francês que inventou um alfabeto de pontos para os cegos, baseado em diferentes combinações de seis pontos em relevo, que foi adotado no mundo inteiro. Braille foi cego desde os três anos e trabalhou como organista em igrejas. O livro mais atualizado em espanhol sobre a questão é: Esperanza Ochaíta, Alberto Rosa et a!., L e c tu ra B ra ille FEDCBA y p ro c e sa m ie n to de Ia in fo rm a c ió n tá c til, Madrid: Inserso, 1987, 182 p. . 4. O grifo é nosso. Essa é uma das asserções em que se vislumbra um e m b riã o da fu tu ra conc e p ç ã o se m ió tic a de Vigotski (cf. Adriana Silvestri e Guillermo Blanck, B a jtin y V ig o tsk i: L a o rg a n iza c ió n se m ió tic a de Ia c o n sc ie n c ia , prefácio de Michael Cole, Barcelona: Anthropos, 1993, 286 p.). James Wertsch articula essa concepção semiótica de Vigotski à de A. N. Leontieve M. M. Bajtín (cf. J. Wertsch, V o c e s de Ia m e n te , tradução de A . Silvestri, prólogo de Juan Daniel Ramírez, Madrid: Visor, 1993; ou J. Wertsch, L a mente en a c c ió n , Buenos Aires: Aique, 1999, 304 p.) 5. Vladimir Galaktionovitch Korolenko (18531921) foi um narrador e crítico literário russo. Por suas atividades revolucionárias, sofreu perseguições e deportações a vida inteira. Cf. V. Korolenko, E I m ú sic o c ie g o , Santiago: Quimantú, 1971. 6. Vigotski refere-se ao livro de A. M. Shcherbina, S lie p o i m u sik a n t K o ro le n k o [O m ú sic o c e g o de K o ro Ie n k o ], Moscou, 1916. Aleksandr Moisievitch Shcherbina (1874-1934) foi um filósofo, psicó2 P E D A G Ó G IC A 265 logo, defectólogo e pedagogo soviético. Fez importantes contribuições no campo da pedagogia dos cegos. Vigotski e Shcherbina foram colegas de trabalho (cf. L. S. Vygotski, O b ra s E sc o g id a s, t. V, op. cit., nota 1). 7. O livro mais completo e atualizado sobre os cegos foi escrito em espanhol e a partir de uma perspectiva vygotskiana, no mais autêntico espírito de Vigotski: o da assimilação crítica despojada de ecletismo - das correntes psicológicas do passado e do presente; o do rigor cognoscitivo não-dissociado do tratamento afetivo; e o da busca persistente dos melhores recursos educativos para responder às necessidades especiais dos cegos. Trata-se do texto P sic o lo g ía de Ia C e g u e ra , de Alberto Rosa, Esperanza Ochaíta y colegas da Universidade Autônoma de Madri, prólogo de Angel Riviere, Madrid: Alianza, 1993, 386 p. 8. A rigor, não se trata de um alfabeto, mas de uma linguagem. Os sinais representam fundamentalmente palavras e expressões, porém isso não exclui que, também com alguns sinais manuais, usando sobretudo os dedos, seja soletrada alguma palavra (datilologia) durante uma conversa. Poucos sabem que não existe apenas uma linguagem de sinais, mas muitas. Um surdo argentino, por exemplo, pode se entender com um italiano, porque a linguagem de sinais foi introduzida na Argentina por um italiano; em compensação, não pode se entender com um surdo espanhol, porque este tem uma linguagem de sinais diferente. Como acontece com a linguagem falada, o A S L (A m e ric a n S ig n L a n g u a g e ) dos Estados Unidos tende a se generalizar. Também existem dialetos. Talvez nada seja mais surpreendente para um falante que assistir a um congresso internacional de surdos, com intérpretes de várias linguagens em função dos expositores, todos gesticulando ao mesmo tempo de diferentes maneiras para dizer o mesmo. 9. Vigotski apela ao esquema de A. Potebniá, aqui interpretado um tanto estreitamente: "a linguagem é um meio de ter consciência do outro e, conseqüentemente, de si mesmo" (A. Potebniá, M isl i ia zik , op. cit.). Portanto, quando não há linguagem não há consciência e, quando não há consciência, não existe consciência do outro nem de si mesmo. Isso é verdade, porém não dá conta da realidade dos surdos. A conc e p ç ã o da lin g u a g e m de sin a is de V ig o tsk i é in c o rre ta , conforme comprovaram as pesquisas das últimas décadas. A linguagem de sinais L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I QPONMLKJIHGFEDCBA 266ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA possui todas as características da falada e permite um pleno desenvolvimento cognitivo. Essa ,t zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA é akjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA a u tê n tic a e p r im e ir a lin g u a g e m dos surdos. I Proibir a comunicação entre os surdos mediante a linguagem de sinais e s u b s titu i-Ia pela verbalização equivale a proibir que se fale o catalão na Catalunha e obrigar a população a '1 falar castelhano, como ocorreu sob a ditadura de Franco. Esse critério errôneo ainda predomina na Argentina. Limitado pelos conhecimentos de sua época, Vigotski era partidário da verbalização dos surdos para que eles tivessem uma p r im e ir a linguagem, recusando a linguagem de sinais. Os atuais professores de surdos afirmam que a oralização é uma s e g u n d a linguagem, para os surdos se comunicarem com a comunidade não-surda. A oralização também costuma incluir a aprendizagem da leitura labial. As pessoas muito treinadas na leitura labial de codificam praticamente 100% do discurso de um falante. 10. Helen Keller (1880-1963), norte-americana, ficou surda e cega aos 19 meses e, um pouco mais tarde, também muda. Quando tinha 6 anos seus pais pediram ajuda a A. Graham Bell para educá-Ia, e ele os encaminhou a Anne Sullivan, professora comportamentalista de cegos, que tinha sofrido de cegueira (cf. H. Keller, A n n e S u lliv a n M a c y , Buenos Aires: Mirasol, 1956). O resultado foi que Helen Keller chegou a falar, se formou na universidade cum la u d a e e dedicou sua vida a fazer conferências e a escrever livros em prol dos portadores de deficiência. Cf. H. Keller, L a h is to r ia de m i v id a , Buenos Aires: Leviatán, 1988; e H. Keller, E l m u n d o d o n d e v iv o , Buenos Aires: Sudamericana, 1956. lI. A nosologia tradicional dividiu as oligofrenias quadros de desenvolvimento cognitivo subnormal devido a patologias orgânicas - em três categorias, do déficit mais grave ao mais leve: idiotia, imbecilidade e debilidade mental. Como pode-se ver na p. 191 do t. V de s u a s O b r a s E s c o g id a s . F u n d a m e n to s de D e fe c to lo g ía , op. cito Na nota 1, Vigotski considerava correta essa elassificação. 12. "Sociogogia" [ s o ts ia g o g u ik a ] é um vocábulo rn criado por A. Zalkind. Para maiores detalhes ~ sobre a sociogogia e referências bibliográficas, cf. o Capo 19. Sobre A. Zalkind, cf. a nota 2 do Capo l l. 13. Nas velhas classificações nosológicas na área da psiquiatria, os pacientes que padeciam de I desordens anímicas bipolares, na terminologia atual, eram chamados de "circulares"; na terminologia clássica, eram os maníaco-depressivos. Os períodos de mania - excitação psicomotora - eram denominados "ciclos" e os de depressão eram chamados de "inibição psico- motora". 14. Já dissemos que, segundo Semión Dobkin, amigo de juventude de Vigotski, os dois primeiros livros de psicologia lidos por Vigotski foram Z u r p s y c h o p a th o lo g ie d e s A llta g s le b e n s [ A p s ic o p a to lo g ia da v id a c o tid ia n a ] de S. Freud . (1904) e T h e V a r ie tie s o f R e lig io u s E x p e r ie n c e . A s tu d y in h u m a n n a tu r e (1902), de w . James (cf. S. Dobkin, "Ages and Days'', em: K. Levitin [E.], O n e is n o t b o m a p e r s o n a lity , Moscou: Progress, 1982, p. 34). Em seu livro de 1931, H is to r ia d e l d e s a r r o llo de Ia s fu n c io n e s p s iq u icas s u p e r io r e s , Vigotski, já distanciado das teorias de Freud, considera correta a importância - não a interpretação - que o mestre de Viena deu à psicopatologia da vida cotidiana (cf. L. S. Vygotski, O b r a s ... , op. cit., t. 1II). 15. L a p s u s lin g u a e e la p s u s c a la m i significam, em latim, erros de fala e de escrita, respectivamente. 16. Se a a lu c in a ç ã o é uma percepção sem objeto por exemplo, ver ou ouvir algo que não existe, a a lu c in a ç ã o n e g a tiv a é o contrário: não perceber algo que existe e é evidente para nossos sentidos. Fora do contexto da hipnose e da atividade teórico-prática da psicanálise, a alucinação negativa é sumamente rara. 17. Cf. a nota n9.8 do Capo 14. 18. Jean-Marie Guyau (1854-1883) foi um filósofo e sociólogo francês positivista. Realizou estudos sobre estética, moral e religião. Concebeu a obra de arte como um fenômeno biológico, resultado de um excesso de força vital, embora exigisse um trabalho intenso. Ele acreditava que a medida de um fenômeno psíquico dependia de sua utilidade para o funcionamento biológico e que a moral regulava o balanço das forças vitais. 19. Vigotski leu o original alemão do livro de Karl Bühler, pois ele mesmo foi editor e escreveu o prólogo da publicação russa dessa obra de Bühler, em 1930: O c h ie r k d u jo v n o g o r a z v itia r ie b io n k a . Cf. o prólogo de Vigotski a esse livro de Bühler no t. I de suas O b r a s ... , op. cit., p. 163-176. A rigor, a tradução literal para o espanhol do livro de Bühler é E l d e s a r r o llo e s p ir itu a l de lo s n in a s . o T e m p e ra m e n to ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA o S IG N IF IC A D O e o C a rá te r dessa estrutura comum da personalidade D O S T E R M p S zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Desde os primeiros tempos do desenvolvimento da psicologia, junto com os problemas especiais do comportamento humano, eram tratados os do temperamentoFEDCBA [te m p e r a m e n t] e caráter U a r a k te r ] como temas que abrangem globalmente o comportamento humano. Ao mesmo tempo, esses termos modificaram seu conteúdo muitas vezes no decorrer de todo esse período e até mesmo agora, quando pronunciamos essas palavras, não temos muita certeza de que serão compreendidas corretamente, porque os pesquisadores atribuem significados diferentes a esses termos e os utilizam em diversos sentidos. Entretanto, justifica-se o uso das mesmas palavras para conceitos diversos; essa regra geral expressa a idéia de que todo organismo humano individual possui um modo e um caráter de seu comportamento global que é peculiar e inerente só a ele, e essas peculiaridades do comportamento, apesar de suas diferenças individuais, podem ser, de qualquer forma, reduzidas a certos tipos especiais. Em outras palavras, supõe-se que toda a diversidade dessas peculiaridades distintivas pode se reduzir a certas classes básicas de casos típicos. Se isso fosse realmente assim, significaria que todas as manifestações individuais estariam subordinadas a uma regularidade e poderiam ser compreendidas por algumas leis gerais. Essa questão é sumamente importante para os professores, porque, nos fatos, eles nunca se deparam com reações isoladas da criança, mas com seu comportamento global. Ao mesmo tempo, na pedagogia predominam as mais contraditórias idéias sobre a seguinte questão: a que deve ser atribuída a formação da criança: às suas particularidades hereditárias ou aos traços de sua personalidade adquiridos e elaborados por meio da educação? Em outros termos: o temperamento e o caráter são premissas ou resultados da educação? Na exposição a seguir, ambas as palavras serão usadas no sentido mais corrente para a psicologia contemporânea. Entenderemos por "temperamento" as peculiaridades de estruturação de todas as reações congênitas e hereditárias, a constituição herdada do organismo. Portanto, temperamento é o conceito mais fisiológico e biológico e abrange a esfera da personalidade que se manifesta nas reações instintivas, emocionais e reflexas. Em toda essa parte de nosso comportamento que costuma ser admitido como involuntário e herdado, o conceito dominante é "temperamento". 'Por outro lado, entenderemos por "caráter" essa estruturação particular da personalidade que vai se elaborando sob a influência das reações adquiridas. Em outras palavras, com relação à supra-estrutura individual dirigida sobre o comportamento congênito, o caráter significa o mesmo que o temperamento com relação às formas incondicionadas. Portanto, o problema fica delimitado, de modo que o temperamento é a premissa existente, e o caráter é o resultado do processo É claro que o uso das palavras é um educativo.QPONMLKJIHGFEDCBA tanto convencional, porém totalmente legítimo. Em primeiro lugar, porque não rompe de forma taxativa com a tradição psicológica que sempre relacionou o caráter à esfera' da vontade e o temperamento à esfera do sentimento. E, em segundo, porque diferencia com total exatidão as duas raízes essenciais do comportamento humano: a congênita 'e a adquirida. 268ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Em outros termos, essa denominação ma porque corresponde a fatos reais. o TEM PERAM ENTO é legíti- e, na psique de outra, do predomínio de outras diferentes. Conseqüentemente, quase todas as teorias psicológicas sobre o temperamento caíram em um círculo vicioso, e isso contribuiu para que o problema, de certo modo, fosse deslocado a um segundo plano na psicologia científica, transformando-se em tema de uma descrição semiliterária, serni-antrcpológica, ou sendo totalmente eliminado de todos os sistemas psicológicos sérios, ou tratado de passagem e com profundidade insuficiente. Inclusive as teorias mais antigas sobre o temperamento o relacionavam estreitamente à estrutura do corpo e determinavam os tecidos ou líquidos que supostamente são suas bases no organismo. Assim, o predomínio de um temperamento vinculava-se à preponderância da bile; o de outro, à preponderância do sangue, etc. A E S T R U T U R A D O C O R P O QPONMLKJIHGFEDCBA Posteriormente destacaram-se outros faE O CARÁTER tos da mesma ordem; por exemplo, Lésgafr! Na representação das massas populares, o diadestacou a importância decisiva que, para o bo é magro, com uma barbinha pontiaguda temperamento de diversas pessoas, tem a esem um queixo estreito. Ao mesmo tempo, os pessura dos vasos [sangüíneos] e a amplitude demônios obesos apresentam a característica do espaço entre eles. Outros autores estabelede uma estupidez bondosa. Um intrigante cosciam uma afinidade entre o temperamento e tuma ser imaginado com uma corcunda e, os diferentes tecidos internos do organismo; geralmente, cochicha ao falar. Uma velha bruno entanto, apesar da diferença desses critéxa, com um seco rosto de pássaro. Nos casos rios, todos eles tinham a convicção comum de de alegria e esperteza aparece o gordo cavaque a origem das particularidades do tempelheiro Falstaff," com seu nariz vermelho e calramento deve ser buscada nas características vo como um espelho. Uma típica mulher do individuais da estrutura corporal. povo com senso comum é baixa e rechonchuda, com as mãos nos quadris. Os santos são Essa teoria foi abandonada e totalmente esbeltos, transparentes, pálidos, com longas esquecida por alguns pesquisadores e foi subsextremidades. Em síntese, o virtuoso e o diatituída pela teoria relativa à essência puramenbo devem ter um nariz agudo, enquanto os te psíquica do temperamento, que tentou expersonagens humorísticos o têm grosso. Podeplicar a diferença entre temperamentos pelas se dizer algo a respeito? diversas correlações das forças psíquicas do organismo, como as paixões baixas e as elevaAssim começa o livro de Kretschmer,FEDCBA C onsdas, os desejos sensíveis e os ideais, as repretitu iç ã o e c a r á te r .' que, como se vê pelas palasentações abstratas e concretas. Cabe dizer que, vras citadas, na questão do temperamento e embora as primeiras tentativas de explicar o do caráter apela ao critério mais antigo refetemperamento tenham sido infrutíferas, porrente ao mais íntimo condicionamento do caque nunca puderam defender nem confirmar ráter pela estrutura corporal e, nesse sentido, de forma palpável o vínculo suposto, as seguntem tudo a ver com o critério popular sobre o das foram estéreis devido à sua própria natucorpo humano como porta-voz fiel do tempereza, porque transformavam o que era buscaramento. do em solução e o problema em resposta. Essa teoria encontra-se apenas em estaCom efeito, explicar o temperamento do embrionário, porém o material estudado através das diferentes combinações de caracmostra, com bastante poder de convicção, que terísticas psíquicas equivale a explicarkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA id e m p e r nela existe uma semente de verdade. id e m ? que todo o problema do temperamento A pesquisa foi iniciada com doentes menreside apenas no esclarecimento da presença tais, mostrando-se que a estrutura do rosto e e da preponderância, na psique de uma pesdo crânio, a superfície externa do corpo e sua soa, de determinadas paixões e representações P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 269 constituição têm uma ligação clara e direta isso, ele distingue duas principais esferas de com o tipo de distúrbio psíquico que afeta o ação entrelaçadas: doente. Kretschmer parte de duas formas básicas A kjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA p r im e ir a são os aparelhos psíquicos, aproxide doenças mentais: a ciclotimia' e a esquizomadamente o que também é chamado de arco reflexo psíquico. [... ] Seu correlato somático frenia," estabelecendo uma correlação entre a são os centros do cérebro e suas vias, em ligaconstituição do ser humano e seu caráter. Como ção inseparável com os órgãos dos sentidos e : ambas as doenças são acompanhadas de foros aparelhos motores, ou seja, o aparelho de mas sumamente marcantes e notórias da forunião dos sentidos externos, do cérebro e da mação do caráter, bem como de evidentes paresfera matara. A s e g u n d a são os temperamenticularidades da estrutura do corpo, também tos. Como se sabe empiricamente, estes são nesse caso, como na idéia popular sobre o diatotalmente condicionados pela química do sanbo e os santos, essa dependência se estabelece gue, isto é, de forma humoral. Seus represencom enorme evidência. No entanto, as conclutantes somáticos são o cérebro e o aparelho sões de Krestchmer vão muito além dos limiglandular. Os temperamentos constituem a tes da psiquiatria, e sua idéia ultrapassa fronparte da psique que, pelo visto, se encontra por via humoral em correlação com a estrutura do teiras para englobar em sua consideração tocorpo. Os temperamentos influem no mecanisdas as características do ser humano, afirmanmo dos aparelhos psíquicos, dando colorido aos do que em sua base estão os mesmos dois tisentimentos, inibindo-os ou excitando-os. Pelo pos de caráter ciclóide e esquizóide que, ainda que se pôde esclarecer empiricamente, os temque se diferenciem essencialmente entre si e, peramentos exercem a seguinte influência nas em sua expressão extrema, dão origem a uma qualidades anímicas: (a) a p s ic o e s te s ia , isto é, doença mental, também são encontrados na uma sensibilidade elevada ou insensibilidade vida corrente de forma mais ou menos diluída aos estímulos psíquicos; (b) a c o r do e s ta d o de e atenuada. â n im o , nos matizes de prazer ou desgosto nas Nesse sentido é sumamente importante vivências espirituais, sobretudo na escola do dominar a classificação básica de Kretschmer. alegre e do triste; (c) o r itm o p s íq u ic o , a aceleração a morosidade dos processos espirituais Sua pesquisa abrange três conceitos fundamenem geral [... ]; e (d) a e s fe r a p s ic o m o to r a , ou tais. Ele entende por "constituição" o conjunto seja, tanto no ritmo geral do movimento (tede todas as características individuais condicinaz ou lento), como no caráter especial do moonadas pela herança, isto é, genotipicamente vimento (lânguido, torpe, apressado, vigoroestabelecidas. Entende por "caráter" o conjuny so, suave, etc.). [E. Kretschmer, C o n s titu c ió n FEDCBA to de todas as possíveis reações afetivas e c a r á c te r , Barcelona: Labor, 1954, p. 385-6.] volitivas do ser humano, tal como surgiram no decorrer de sua vida, isto é, a partir dos anteKretschmer também admite que a influêncedentes hereditários e de todos os fatores cia humoral dos hormônios é difundida pela exógenos: as influências somáticas, a educaestrutura anatômica do cérebro, assim como ção psíquica, o ambiente e as vivências. Porpela estrutura do resto do corpo. Ele afirma o tanto, o conceito de caráter abrange a persoseguinte: nalidade psíquica em conjunto com seu aspecto afetivo, que não pode ser separado do inteGraças a isso toda a questão se torna tão comlecto. plexa que produz vertigens. Por enquanto será Por último, o vocábulo "temperamento" bom agrupar o conceito de temperamento em ainda não é para Kretschmer um conceito acatorno dos aparelhos psíquicos que reagem com bado, mas serve apenas como designação temparticular facilidade e freqüência às influênporária, cuja extensão ele ainda não conhece, cias químicas violentas, tanto exógenas (mormas que, em sua opinião, deve se transformar fina, álcool) quanto endócrinas, isto é, próxiem ponto de partida para a diferenciação funmas da afetividade e do ritmo psíquico geral. damental da psicologia biológica. EnquantoZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA [Ibidem, p. 386.] 270QPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M I O N O V I C H V I G O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Conseqüentemente, Krestschmer parte da importância prioritária das glândulas de secreção interna para a estrutura do corpo e a formação do temperamento. No organismo, ao lado das glândulas que eliminam sua secreção para o exterior (lágrimas, saliva, suco gástrico, suor, etc.), existe uma série de corpos glandulares da mesma estrutura, mas sem um fluxo excretor externo. Durante muito tempo pareceu totalmente enigmática a missão desses órgãos, até que se conseguiu estabelecer empiricamente e através da extirpação e da inoculação experimentais dessas glândulas que elas, evidentemente, vertem sua secreção de forma direta no sangue. Por isso, foram batizadas de glândulas sangüíneas, endócrinas, incretoras ou de secreção interna. Serviram como elemento de observação nesse sentido os casos patológicos de insuficiência ou hipertrofia congênita ou adquirida de alguma das glândulas; em segundo lugar, a extirpação experimental e o transplante cirúrgico de glândulas de um animal para o outro; e, por último, os experimentos de rejuvenescimento do ser humano efetuados recentemente. Todas essas observações mostraram que a atividade dessas glândulas endócrinas, que vertem no sangue certos estímulos ainda desconhecidos que são chamados de hormônios (da palavra grega ópudcoFEDCBA [o r m a o = "eu estimulo"]), modifica de modo direto a composição de nosso sangue e, através dele, exerce uma ação direta e muito intensa em todo o organismo e em todos os processos que nele se operam. Ao mesmo tempo, temos de registrar que, em pesquisas posteriores, também foram descobertas glândulas de terceira ordem, que "trabalham em duas frentes", segundo a expressão de um pesquisador russo, isto é, que por um lado têm secreção externa, expulsa através de um conduto excretor especial e, por outro, secreção interna, hormonal. Entre essas glândulas figuram, além de outras, as glândulas sexuais do homem e da mulher. A atividade de secreção interna regula o crescimento e a estrutura do corpo, o tamanho e a forma de ossos, cartilagens, músculos e tecidos, o funcionamento do cérebro e do sistema nervoso, as modificações evolutivas do corpo humano e suas peculiaridades sexuais. Quando a glândula tireóide falta de forma congênita, é inevitável o surgimento de cretinismo e idiotia, que são tratados mediante a inoculação de uma nova glândula no paciente. A castração das glândulas sexuais provoca a modificação da estrutura de todo o corpo: o homem adquire formas femininas e perde as masculinas; as mulheres se masculinizam. Mais tarde ocorre a modificação dakjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFE v o z ', e todas as características do temperamento mudam até se tornarem irreconhecíveis, segundo depoimentos de observadores. Ao inserir em animais castrados as glândulas sexuais do sexo oposto, a biologia experimental conseguiu obter uma mudança experimental de sexo, isto é, uma transformação radical do todos os caracteres sexuais secundários. Uma galinha submetida ao experimento por Zavadovski foi perdendo todos os caracteres de seu sexo, sua crista e esporas cresceram, começou a cantar como um galo, por vezes mostrava atração sexual pelas fêmeas e, em geral, pelo caráter do comportamento e pela estrutura do corpo mostrava uma inegável afinidade com o macho. Também é possível realizar transformações experimentais de sexo no sentido inverso." A hipertrofia da hipófise produz um crescimento gigante, um monstruoso aumento de tamanho de alguns órgãos. O desenvolvimento insuficiente dessa glândula provoca nanismo. Por último, os experimentos relacionados ao rejuvenescimento têm demonstrado que todas essas mudanças em nosso corpo e em nosso caráter, que dependem de certos períodos evolutivos na vida do ser humano, na verdade constituem uma conseqüência direta do funcionamento da secreção interna das glândulas sexuais. Regulando a atividade da glândula sexual, mediante procedimentos cirúrgicos, no sentido de intensificar sua secreção interna às custas da externa, obtivemos efeitos assombrosamente rápidos de rejuvenescimento do corpo e de todo o caráter. Em experimentos mais grosseiros com animais e com o ser humano, o transplante direto dessa glândula, colocada em qualquer local neutro, por exemplo, atrás do ouvido, provoca os mesmos efeitos de forma ainda mais surpreendente. Pode-se considerar totalmente P S IC O L O G IA determinado o nexo estreito e direto entre os órgãos da secreção e a química do sangue condicionada pelos mesmos, e entre toda a psique do ser humano e a estrutura de seu corpo." Até o momento a pesquisa conseguiu estabelecer só uma dependência. Agora o problema passa para uma fase diferente de sua solução; tenta-se determinar a correlação en.tre a estrutura corporal e o caráter, pois ambos têm causas comuns que os geraram, isto é, o funcionamento do aparelho secretor. Nesse sentido retornamos, como já se indicou, ao antigo critério sobre a alma e, de acordo com este, tendemos a localizá-Ia no sangue e a afirmar o significado realmente primordial do sangue humano para a psique; é o aparelho [tecido] que une o trabalho do cérebro, do sistema nervoso e das glândulas endócrinas.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA O S Q U A T R O T IP O S D E T E M P E R A M E N T O Na psicologia tradicional, a descrição do temperamento tem compreendido, desde a Antiguidade, quatro tipos baseados na teoria também antiga dos tipos fundamentais de comportamento humano. Esses tipos estão descritos do modo mais diverso, mas apesar de todas as variações, em suá definição permanecem invariáveis duas características básicas: em primeiro lugar, certa expressão corporal de cada um desses tipos, a circunstância de que, com um desenho, pode-se ilustrar o temperamento e, em segundo, certo caráter dos movimentos e de seu ritmo como fundamento da passagem da conduta externa do ser humano à interpretação de sua psique. Vejamos um breve resumo desses quatro tipos redigido pelo professor Kornilov com relação às crianças: P E D A G Ó G IC A 271 mentos afloram com rapidez, porém a envolvem de forma superficial; é alegre, gosta do prazer e tende a ele. Em geral, é uma criança agradável, encantadora, sem pensamentos alarmantes sobre o futuro e sem penas profundas [... ]. A criança de temperamentoFEDCBA fle u m á tic o é bastante diferente. Fisicamente bemnutrida, seus movimentos são lentos, é inerte e preguiçosa. Sua inteligência é lógica, reflexiva e observadora. Destaca-se por seu conhecimento em detrimento da originalidade e da criatividade. Seus sentimentos não são ardentes, porém são constantes; em geral, é uma criança bondosa, equilibrada, dando pouco trabalho a pais e educadores. Opostos por completo a esses dois tipos fracos de crianças estão os dois restantes, ou seja, os tipos fortes. Vejamos a criança de tipo c o lé ric o . É magra e esbelta, bastante decidida e rápida, e, por isso, com freqüência é precipitada em seus movimentos. É ousada, tenaz e dura na realização de seus objetivos. Sua inteligência aguda, penetrante e irônica mostra-se demasiado categórica em suas conclusões. Seus sentimentos são apaixonados, e ela é taxativa na manifesÉ ambitação de suas simpatias e antipatias.QPONMLKJIHGFEDCBA ciosa, vingativa e propensa a todo tipo de briga. É a criança mais intranqüila e menos equilibrada, causando, por isso, muitas preocupações aos seus educadores, mas em compensação, em condições favoráveis de educação, ela promete muito para o futuro. A criança de temperamento m e la n c ó lic o apresenta características diferentes. É uma criança sombria e com uma seriedade imprópria de sua idade, é lenta e sólida nas manifestações de sua vontade. Com uma inteligência forte, profunda e reflexiva, é tenaz e irredutível até o fanatismo em suas opiniões prediletas. Sumamente impressionável, sombria e fechada em si mesma, raramente manifesta seus sentimentos. Essa criatura, precocemente envelhecida, tão pouco parecida com a criança alegre, inspira aos adultos um respeito involuntário e um oculto temor pelo seu futuro. A caracterização detalhada desses temperamentos é a seguinte. Vejamos a criança com Para passar dessas descrições tão gerais e temperamentokjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA sa n g ü ín e o : é enxuta, esbelta, abstratas do temperamento à sua pesquisa mais delicada. Em seus movimentos é muito rápida e vivaz, inclusive agitada; empreende com precisa, temos de encontrar algum traço funímpeto qualquer tarefa nova, porém não posdamental no qual o temperamento surge com sui tenacidade para levá-Ia até o fim e, por inegável e exaustiva plenitude e certeza, e deisso, perde rapidamente o interesse por ela. dicar-nos ao estudo objetivo desses seus atriSua inteligência é viva e aguda, porém insufibutos externos. cientemente profunda e reflexiva. Seus senti- 272ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Por tudo o que foi dito até agora fica claro temperamento costuma ser atribuído aos perque, no fim das contas, definimos o temperasonagens históricos notáveis e enérgicos, a pessoas perseverantes e voluntariosas. Daí demento conforme o tipo de movimento produziriva a permanente lentidão, o fechamento ou do por nossos órgãos ou, em outros termos, pela possibilidade ou disposição dos movimentos que o adiamento e a tensão nos temperamentos meadivinhamos nas características do corpo. Por lancólicos, sua capacidade de se prender durante muitos anos a um mesmo pensamento isso, com base em nossas observações, devemos ou idéia, sua aparente imobilidade ligada a tomar o ato da reação como elemento básico e certa severa decisão e esforço valoroso. E, por integral, pois dele se compõem todas as formas último, os fleumáticos são pessoas com uma do comportamento. Vinculando o temperamentendência natural à reação lenta e fraca, isto to ao tipo de reação, logo adquirimos um enoré, pessoas do tipo sensorial-passivo. me material psicológico experimental sobre a A determinação desses quatro tipos, mescaracterização dinâmica temporária da reação para julgar essa questão. ' mo se eles forem considerados com certa reHá muito tempo se estabeleceu que cada serva e como se não passassem de um esquema científico preliminar e orientador, possui o um de nós possui seu próprio ritmo habitual de reação, e as pessoas podem ser diferenciaindiscutível mérito de transferir a questão para o terreno objetivo, permitindo estudar o temdas pelo caráter de sua reação, em rápidas e peramento do ângulo de sua docilidade dianlentas. A diferenciação posterior pode ser obtida se for introduzido um novo componente te das influências educativas. na caracterização da reação, isto é, o compoA definição dos limites da reeducação do temperamento é uma questão sumamente comnente do dinamismo ou da força e, então, da combinação cruzada de ambos os componenplexa, e só se a estudássemos do ângulo da reação poderíamos pesquisar experimentaltes, obtêm-se naturalmente quatro tipos fundamentais de comportamento humano que o mente se é possível que pessoas com tendênprofessor Kornilov caracteriza como: (1) pescia natural a um dos quatro tipos de reação soas com disposição natural a um modo de mencionados podem passar para outro tipo reação rápido e intenso, ou seja, de tipo musdevido à aprendizagem educativa, ao exercícular-ativo; (2) pessoas com tendência natucio, à mudança de orientação, etc. Ao mesmo ral a reagir de forma veloz e fraca, isto é, de tempo, as conclusões gerais das pesquisas extipo muscular-passivo; (3) pessoas com tenperimentais mostraram que todas as regras da dência a um modo lento e intenso de reagir, reeducação dos temperamentos podem ser isto é, de tipo sensorial-ativo; e (4) pessoas com abrangidas por uma lei geral, que possui uma inclinação natural a um modo de reação lento importância prioritária para a pedagogia. e fraco, isto é, de tipo sensorial-passivo.QPONMLKJIHGFEDCBA Qualquer pessoa passa facilmente do tipo É fácil perceber que esses quatro tipos, de reação fraca para a intensa, isto é, do modo estabelecidos totalmente à margem de qualpassivo de reagir ao ativo e do lento para o rápido. A passagem inversa, do tipo rápido ao lenquer dependência da teoria sobre os temperato e do forte ao fraco é sumamente difícil e, em mentos, com um método científico completa. mente diferente, levam ao mesmo e, em suas uma série de casos, praticamente impossível. Por conclusões finais, coincidem em tudo com a isso, é totalmente compreensível que a pessoa teoria clássica sobre o temperamento. que se submete com maior facilidade à reeduEm geral, as pessoas denominadas sancação seja a de tipo sensorial-passivo, isto é, os güíneas são as de tipo muscular passivo, que fleumáticos, que assimilam facilmente a forma reagem com rapidez, excitam-se facilmente, de comportamento das naturezas coléricas atiporém não reagem com plena intensidade e vas. Segundo a expressão de um psicólogo, esexpressão, pois se apagam com a mesma intas são todas as "pseudo" figuras históricas, das tensidade com que se apaixonam. A caracteriquais afirma, com muita correção, que são fleumáticas que fizeram de conta que eram colérização do colérico coincide com o tipo muscucas. Também pode ocorrer a transição do temlar ativo, de intensa e rápida reação, e esse '- - .....- P S IC O L O G IA peramento fleumático ao melancólico ou ao sangüíneo, pois cada um deles está ligado à mudança de um só componente característico na direção possível e acessível à reeducação. Os fleumáticos, com a aceleração dos movimentos, se transformam facilmente em sangüíneos e, com a acentuação de suas reações, se aproximam do tipo melancólico. O grupo mais difícil de reeducar é o dos temperamentos coléricos, porque eles nunca se habituam a permanecer serenos ante os diferentes acontecimentos de sua vida. As formas de transição ao temperamento fleumático são quase inalcançáveis para o colérico, e as crianças pertencentes a esse grupo dificilmente podem ser reeducadas. Na literatura pedagógica, as crianças desse tipo são chamadas de discordantes com o ambiente ou de caracteres indômitos. Um lugar intermediário no sentido da reeducação é ocupado pelos outros dois temperamentos que, em linhas gerais, só podem ser considerados medianamente reeducáveis. Em outros termos, o temperamento melancólico se aproxima facilmente do colérico, desde que se acelerem suas reações, e também o temperamento sangüíneo, em certas condições, pode passar facilmente por colérico, desde que se intensifiquem suas reações. Um sangüíneo que aprendeu a sentir intensamente e a falar com voz de mando, depois de conhecer o que significa querer algo fortemente e conseguir o que quer, não pode mais ser diferenciado do colérico. Enquanto as considerações pedagógicas se distinguem pela excessiva generalidade e ambigüidade das conclusões, o mesmo esquema pode apresentar um significado muito maior para as conclusões e os juízos psicotécnicos sobre a vocação profissional de determinada pessoa. P E D A G Ó G IC A 273 composição psicológica, mas pela qualidade e sucessão das reações típicas que as integram. Por isso, é muito fácil dividir qualquer trabalho profissional em alguns elementos primários que o compõem, isto é, reduzir toda a atividade laboral a uma série de reações de certos tipos e à sua união. É sumamente importante estabelecer a aptidão de uma pessoa para determinada profissão. Isso será benéfico para a tarefa e também para o desenvolvimento correto da personalidade, e a solução desse problema começou a ser encarada de ambos os pontos de vista. Inicialmente, a psicotécnica surgiu do interesse pela organização da empresa, e foram propostas tarefas práticas, a denominadakjihgfedcbaZYXWVUTSRQ s e le ç ã o n e g a tiv a . Sua tarefa residia em escolher entre todos os candidatos a um determinado trabalho, mediante um experimento psicológico, os totalmente inadequados, os que sem dúvida não poderiam realizar a tarefa proposta e prejudicariam a empresa. Com relação a isso, nos primeiros tempos toda a atenção da psicotécnica se reduziu a elaborar exigências mínimas, cuja inobservância equivaleria à inadequação do sujeito ao trabalho. Depois, a esfera de interesses desse âmbito científico ampliou-se: além da seleção negativa, ele começou a se ocupar também de uma s e le ç ã o p o s itiv a , isto é, passou a organizar testes psicológicos que permitissem julgar também o nível positivo de capacidade e vocação para uma determinada profissão, e não só a falta de aptidão dos candidatos. De acordo com isso, além de elaborar uma quantidade mínima de exigências necessárias e suficientes, a psicologia tinha de se ocupar de realizar um detalhado p s ic o g r a m a de cada tipo de trabalho profissional, ou seja, de efetuar uma análise psicológica detalhada de todas as partes integrantes desse tipo de trabalho. Com base nessa análise psicológica do trabalho profissional ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P R O B L E M A D A V O C A Ç Ã O QPONMLKJIHGFEDCBA dos mais diversos tipos, devia-se propor uma E A P S IC O T É C N IC A gama típica comum aos processos laborais, isto é, estabelecer alguns tipos fundamentais Qualquer tipo de trabalho está formado que pudessem agrupar toda a diversidade de por combinações especiais das reações que lhe diferentes profissões ou ofícios. são inerentes. As profissões se diferenciam Na gama de reações laborais, de acordo umas das outras não pelo caráter geral de sua com o esquema do professor Kornilov; diferen- o 274 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ciam-se vários tipos de processos laborais. Em primeiro lugar está o tipo natural de processos laborais, que corresponde aos ofícios que não exigem um intenso trabalho físico nem mental. São os ofícios do serviço doméstico, dos técnicos, dos porteiros, dos guardas, dos varredores, etc. Em todos esses ofícios as reações laborais são formadas por uma série de movimentos mais ou menos habituais para cada um de nós em nossa vida cotidiana. As condições de trabalho são tais que o serviço transcorre de forma mais ou menos estereotipada e automática, sem exigir uma atenção particularmente acentuada e, por último e mais importante, o trabalho profissional quase sempre transcorre em um estado mais ou menos natural e livre, sem exigir do trabalhador nenhuma tensão particular de forças nem uma celeridade particular. Como é lógico, nesses tipos naturais de processos laborais fica mais fácil efetuar a seleção psicotécnica, pois ainda que cada trabalhador manifeste determinada tendência natural a esse ou aquele tipo de reação, qualquer um pode realizar facilmente os objetivos do trabalho. O trabalho do segundo tipo é mais complexo; ele tem a ver com os chamados processos músculo-laborais e exige a concentração da atenção não no objeto do trabalho, mas, sobretudo, nos próprios movimentos. Esse tipo de trabalho exige de seus executores uma enorme tensão muscular e um considerável gasto periférico de energia. Entre esses ofícios estão, por exemplo, o de pedreiros, forjadores, mineiros, marteleiros, lenhadores, etc. Nesse caso, as exigências psicotécnicas impõem de forma absolutamente exata e clara que sejam escolhidos temperamentos que contribuam para a manifestação do tipo de reação muscular e enérgica. Em outros termos, os fleumáticos e os sangüíneos, pessoas habituadas a uma reação fraca, isto é, a uma liberação de energia insignificante durante seus atos, não possuem as características desse tipo de trabalhadores e, o que é mais importante, entrarão em grave conflito com as tendências fundamentais de seu próprio organismo se, por imposições da vida, tiverem de efetuar esse trabalho. Deve-se admitir que o mais adequado dos dois tipos restantes é a forma melancólica de comportamento e temperamento, pois a lentidão de suas percepções garante precisão, resistência, serenidade e empenho em seu trabalho. E a imensa força de cada movimento garante o efeito necessário. Por outro lado, os coléricos, que se apagam tão rapidamente quanto se acendem, nesse aspecto trabalham com menor tenacidade e resistência. O terceiro tipo de processos laborais pode ser chamado convencionalmente de sensorial e se caracteriza justamente por características opostas ao anterior. Aqui a atenção se concentra predominantemente no objeto do trabalho e, por isso, a condição imprescindível da reação é uma liberação mínima de energia externa, porém uma percepção extraordinariamente complexa e lenta dos estímulos externos. Esses ofícios abrangem o trabalho do relojoeiro, do mecânico, do torneiro, do alfaiate, etc. Parece evidente que o mais adequado para esse tipo de trabalho é o tipo de temperamento que se caracteriza justamente por estes traços, isto é, por reações lentas e fracas. Os fleumáticos podem ser bons relojoeiros e alfaiates, com maior possibilidade de êxito que os demais. Ao mesmo tempo, para esse tipo de ofício - como se estabeleceu mediante a simples observação, muito antes do aparecimento da psicotécnica - são particularmente desastrosas as pessoas com um tipo de reação inadequado. Por exemplo, pessoas acostumadas com um movimento enérgico e forte que, com um desenvolvimento intelectual completamente insuficiente, são incapazes de dominar, depois de vários anos, por exemplo, a arte de consertar um relógio, porque dobram demais a espiralou porque não a dobram de forma alguma, pois não conseguem moderar seus movimentos e dar-lhes essa sutileza fina com a qual se tornam úteis e eficazes no trabalho. Nesse sentido, a observação corrente coincide com os dados psicotécnicos. Existem pessoas que não podem lavar um copo, porque em geral não conseguem segurar nada frágil e quebrável nas mãos, pois apertam com tanta força como se o objeto fosse de cobre. Como quarto tipo de processos laborais, devemos mencionar os que exigem reações complexas, a denominada reação de discrimi- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 275 nação. Por exemplo, esse é o caso do caixista e pródiga liberação de energia psíquica para da tipografia que, antes de efetuar o movimenreações fracas, mas complexas e inteligentes. to, tem de distinguir exatamente uma série de Por isso, uma regra pedagógica geral diz o seestímulos na folha de sua composição e na caiguinte: se desejarmos ensinar a uma criança xa de seus tipos e não pode reagir antes que as reações adequadas para as formas superioessa distinção tenha ocorrido de forma precisa res de trabalho, temos de lhe ensinar movie correta.QPONMLKJIHGFEDCBA É evidente que a adequação a esse mentos fracos, pois eles são os mais "inteligentipo de processos laborais não pode ser deter- . tes"; e isso também é válido para o presente minada univocamente por apenas um atribucaso. to do temperamento, como fizemos antes para Em quinto lugar, estão os processos todos os ofícios mais simples. laborais que envolvem escolhas, isto é, os que Evidentemente, a reação se torna mais exigem discriminação não só no processo de complexa devido ao processo central e, para percepção dos estímulos, mas também no procomputar o efeito do trabalho, o curso de processo da reação de resposta. Em um trabalho cessos centrais tão complexos como o pensadesse tipo, antes de efetuar qualquer ação, deve-se realizar a consideração exata e a difemento, a atenção, etc. desempenha um papel muito mais importante que as propriedades renciação de dois componentes: primeiro, o componente de excitação [estímulo] e, segunelementares da reação - que se manifestam no do, o componente de resposta. Aos ofícios destemperamento. Devido à diversidade das pessoas e à sua diferente aptidão com relação a sa índole correspondem os ofícios de motorisesses ofícios, devem ser caracterizados com um ta, maquinista, motorneiro, datilógrafa, esquema muito mais complicado que o copista, piloto, etc. O motorneiro tem de pertetrâmero ternperamental, mediante o qual se ceber com exatidão os objetos que estão dianefetua a seleção psicotécnica menos precisa. te da rota do veículo, mas para ele é mais imEntramos aqui no campo de ação de mecanisportante efetuar uma escolha correta e infalível entre o giro da manivela do motor para a mos muito complicados, cujo funcionamento tem a ver mais com o caráter que com o temdireita ou para a esquerda, entre o movimento peramento, isto é, mais com as reações para frear ou acelerar. Nesse caso, se obtém uma diferenciação dupla ou uma reação de educadas e aprendidas que com as herdadas. Por isso, como regra geral, que também escolha em sua forma mais pura. se refere a todos os tipos ulteriores, pode-se Ao mesmo tempo, é especialmente imporadotar a tese de que, na verdade, as pessoas tante o momento de rapidez da reação, pois não é indiferente a velocidade da freada, a de todos os temperamentos podem ser igualaceleração diante de um perigo, a rapidez com mente aptas para esse tipo de ofícios, dependendo do funcionamento dos mecanismos mais que a datilógrafa vai escrever o texto que lhe é ditado, em quantos segundos o piloto vai reacomplexos que fazem parte do caráter. gir girando o volante ante uma inclinação do No entanto, aqui também se pode indiaparelho em pleno vôo. car a aptidão profissional mais provável, asAqui, ao analisarmos as características de sim como nas demais condições, para as pestemperamento elementares, obtemos uma ressoas cuja reação é lenta e fraca, pois o compoposta bastante clara à pergunta sobre a aptinente sensorial está submetido a um considedão de alguma pessoa, porém devemos posrável reforço nesses ofícios, enquanto o motor tergar a decisão até analisar de forma mais é relativamente indiferente para a eficácia final do trabalho. De qualquer forma, é comum precisa as reações complexas do comportamento. Entretanto, já estamos esboçando o camique uma reação fraca esteja ligada a um pennho para chegar a uma solução acertada do samento intenso e a uma atenção mais focaliproblema. Esse caminho consiste na pesquisa zada que no caso contrário. experimental do tipo de reações necessárias Por outro lado, essa regra em geral expripara um determinado ofício. Em outras palame a tendência de todo o trabalho humano, vras, se estamos preocupados com a reação de que passa cada vez mais de formas de enormeZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 276ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I um motorneiro ou de um piloto, a essência de minado, recorrendo a associações livres ou limitadas, ou nas quais deve ser realizado um seu trabalho reside na reação de escolha; por isso, devemos experimentar em todas as oporcerto trabalho de seleção mental dirigido a uma tarefa aceita em certo momento. Esses tipos tunidades como transcorre - com que rapidez e intensidade - essa reação de escolha no sude processos pertencem aos mais complexos jeito determinado, para verificar sua aptidão e, naturalmente, precisam da metodologia mais profissional. É claro que, se estivermos diante completa de pesquisa psicotécnica a fim de dede duas pessoas iguais em todos os demais asterminar a aptidão para realizá-los. pectos, mas se uma delas tiver uma reação de O resultado geral dessas pesquisas psiescolha mais rápida, isto é, se responder com . cotécnicas pode se reduzir a apenas uma regra os movimentos necessários e precisos a um que o professor Kornilov formula aproximadaestímulo corretamente entendido em 0,120 - mente da seguinte maneira: toda passagem de um gasto periférico de energia para um cen0,130 segundos, enquanto a outra faz o mesmo em 0,160 - 0,180 segundos, a primeira é tral se produz com maior esforço que o promais adequada para o trabalho em questão que cesso inverso. Ou, em outros termos: a passaa segunda. gem do trabalho mental ao trabalho físico semIsso tem a ver com todos os tipos de propre é realizada com muito mais facilidade que cessos laborais complexos, que sempre ado processo inverso, isto é, a passagem do trabalho físico ao mental. mitem uma pesquisa psicotécnica mediante o teste do funcionamento integral do orgaO significado pedagógico da psicotécnica nismo durante o decorrer de alguma reação não se esgota, naturalmente, na análise elecomplexa. mentar realizada anteriormente; no entanto, Em sexto lugar, estão os tipos de procesesta é suficiente para se ter uma noção geral II sos laborais de reconhecimento, que exigem sobre o problema psicotécnico no campo da I' o reconhecimento de um estímulo particular pedagogia e sobre seus métodos básicos de como condição antecipada de uma determiaplicação. nada reação ou de um estímulo previamente Ao mesmo tempo, deve-se recordar que desconhecido para o trabalhador. O que diso conteúdo desse problema não termina apetingue este tipo da diferenciação simples é que nas com a definição da aptidão profissional, esta pressupõe todo' um grupo de possíveis pois ele desempenha um papel muito mais estímulos conhecidos de antemão, enquanto substancial no processo de ensino e educação. o reconhecimento tem a ver com uma quantiEssa pesquisa sempre nos permite observar dade indeterminada e enorme de estímulos com quanto êxito foram desenvolvidas e vão que não podem ser levados em conta com se formando as reações de nossos alunos na antecipação. Esse é, por exemplo, o trabalho direção que escolhemos como meta de nossas influências. Portanto, a psicotécnica é um condo revisor, que tem de fazer um movimento selheiro prévio e um juiz com autoridade no depois de perceber e reconhecer este ou aqueinício e no final do processo educativo, que nos le erro no texto composto. Esse trabalho se I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA distingue da tarefa do tipógrafo, porque este permite responder à pergunta sobre se vale a 1 1 opera com uma quantidade previamente depena ensinar a um aluno determinado uma terminada de elementos (letras); em compenprofissão determinada e, além disso, se esse sação, o revisor nunca pode prever qual será aluno aprenderá essa profissão. 1: o erro que encontrará a seguir. A psicotécnica também representa uma Por fim, em último [e sétimo] lugar, coracompanhante permanente e um guia em nosresponde situar os processos laborais mais comso processo educativo, que qualquer dia pode plexos, que requerem associações, e que genos mostrar com exatidão objetiva em que esralmente ocorrem nas profissões intelectuais, tado estão nesse momento as reações que nas quais se requer que o trabalhador realize estamos educando, o que foi obtido até o modiversas operações sobre um material determento e o que deve ser alcançado ainda, que P S IC O L O G IA aspectos dessas reações e em que seqüência devem ser objeto de nossa preocupação e de nossa solicitude educativas.' Temos de ser conscientes que, no entendimento habitual, o problema psicotécnico adquire um sentido bastante estreito e limitado porque, segundo dizem, escolher uma profissão não é tudo na vida. A educação tem objetivos mais amplos que a formação de um profissional. Em suma, com freqüência é profundamente indiferente saber a profissão escolhida por um indivíduo, desde que este tenha uma personalidade desenvolvida ~ éompleta. Esse critério, que faz parte de uma valoração pouco elevada da escolha do trabalho, constitui um legado muito nocivo da escola czarista, que dirigia os fins fundamentais da educação para "algum lugar distante", para ideais de uma personalidade harmonicamente desenvolvida e perfeita, porém não-realizáveis em nenhuma parte do mundo. A escola czarista não tinha o trabalho como meta e, em concordância com isso, organizava sob estrita vigilância, do modo mais deforme e medíocre possível, a rotina diária de aulas que ocupavam todo o tempo do educando e absorviam todas as suas forças. Desse modo determinava-se e sancionaO profundo fracasso va-se antecipadamenteQPONMLKJIHGFEDCBA na vida de cada educando, que não era preparado para a vida que realmente vivia, e declarava-se que essa vida real era irrelevante para eles, pois não havia outra [classe de] vida possível ou acessível para ele. Esse profundo P E D A G Ó G IC A 277 fracasso na vida do discípulo de tal escola costumava adotar a forma de um drama existencial, de uma insatisfação com o próprio trabalho, de uma perda do sentido da vida e de todas as particularidades que caracterizavam o tipo psíquico do intelectual russo do passado recente. A vacuidade e falta de conteúdo das idéias longínquas e abstratas concordavam, ao mesmo tempo, com o opróbrio e a limitação de uma existência mesquinha, e o trabalho, que determinava os aspectos mais importantes da existência pessoal, era condenado às formas mais humilhantes, desumanas e servis. Por isso, do ponto de vista da educação para o trabalho, devemos valorizar de outro modo a questão da aptidão profissional. Devemos transformar uma questão acessória e secundária, de caráter puramente prático, em um problema teórico de importância prioritária sobre os fins individuais concretos que podem ser propostos à educação de cada aluno. Quando passamos das elocubrações e dos critérios pedagógicos gerais e começamos a pensar em um aluno em particular, a preocupar-nos com uma personalidade singular, estamos passando inevitavelmente de problemas meramente pedagógicos para problemas psicotécnicos. Portanto, para nós o problema psicotécnico envolve também o problema da pedagogia individual. Mas falaremos sobre isso no capítulo qua trata da pesquisa sobre a inteligência e a consideração das peculiaridades individuais de cada aluno. OSTRAÇOSENDÓGENOS E EXÓGENOS DO CARÁTER 'N. de R.T. As técnicas de psicodiagnóstico experiPara o professor é sumamente importanmentaram um grande avanço desde que Vigotski, te a diferenciação precisa entre os traços enhá 79 anos, expressou esse otimismo. No entanto, dógenos e exógenos do caráter, isto é, [a difeem que pesem esses avanços, a psicotécnica ainda renciação] dos traços determinados pela organão logrou o êxito imaginado pelo psicólogo russo; nização neuropsíquica da criança, que agem ali s, é tema de controvérsia nos campos da Educade forma completa a partir do momento do ç- o e da Psicologia Educacional. A respeito de técnascimento, por um lado; e, por outro, aquen cas psicodiagnósticas e suas aplicações, há exceles [outros traços] que são produto da influênle tes obras no Brasil. O interessado poderá consulcia externa e da aquisição posterior, que potar, por exemplo: Cunha, J. A. et al.kjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P s ic o d ia g n ó s tic o dem ser chamados de traços educados. Em - R. Porto Alegre: Artes Médicas (Artmed) 1993.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA - ---- --------- ------- ------ 278 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I outras palavras, a questão é a seguinte: o que pertence à constituição do organismo ou à educação no caráter? Até os dias de hoje, essa pergunta é objeto das discussões mais apaixonadas e taxativas, e os pesquisadores tendem, em função do âmbito em que sua observação se desenvolve, a considerar predominante este ou aquele traço do caráter. Em particular, os biólogos e fisiologistas tendem a atribuir um significado decisivo ao componente congênito-somático e colocam as formas mais complexas do caráter em ligação direta com estes ou aqueles processos fisiológicos. Por exemplo, Kretschmer, cuja teoriajá resumimos, se dispõe a reduzir grupos de carateres como "os bonachões calmos, as pessoas nobres e delicadas, os idealistas afastados do mundo, as naturezas imperiosas e frias, os egoístas, etc." exclusivamente aos aspectos biológicos da constituição. Por isso, tornou-se popular o critério de que o fator hereditário determina, do modo mais sutil e importante, todo os tipos de nossa personalidade. O papel da educação e, em particular, o papel do meio social em que ocorre a formação e o desenvolvimento da personalidade são considerados praticamente nulos. Uma posição oposta é adotada pelos psicólogos de tendência social [sociogenética], cujas pesquisas penetram no campo da realidade histórica e social concreta e que são empurrados por milhares de fatos diários para conclusões de significado diretamente oposto. Essas observações mostram, com irrefutável poder de convicção, que não só os últimos trari ços no desenho geral de nossa personalidade, mas inclusive os contornos mais fundamentais que definem sua fisionomia, se desenvolvem IQPONMLKJIHGFEDCBA sob a imperiosa influência do ambiente. I Entre ambos os pontos de vista extremos, pareceria impossível algum tipo de conciliação, e a ciência se sentia perante a alternativa de admitir a herança ou o meio, e a polêmica sempre transcorreu nesse plano. Só a teoria dos reflexos condicionados iluminou tal questão e permitiu apresentá-Ia de um ângulo totalmente novo. Essa teoria conciliou ambos os pontos de vista extremos e determinou, com a precisão da ciência natural experimental, o verdadeiro papel de cada um desses dois componentes. . I I ! . I ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Não há nada mais falso que a noção predominante sobre a criança na pedagogia czarista, conforme a qual a criança é representada como uma folha de papel em branco, isto é, como um conjunto de possibilidades totalmente puras que ainda não chegaram a se realizar. Se pensarmos assim, estaremos apagando não só todos os processos de formação e nascimento da criatura humana, mas também todo o enorme caminho da evolução orgânica que levou à elaboração e à criação da natureza humana. Fica claro que ambos não podem ser excluídos de nossa atenção, e parece incrível que, como resultado desses processos, tenha se obtido apenas uma mera potencialidade na qual nada estaria predeterminado pelo caráter desses processos. No entanto, agora estamos dispostos a contemplar do modo mais absoluto todas essas influências e nos aproximamos cada vez mais da verdade científica quando dizemos que nenhum fato da vida dos antepassados humanos e animais ou das influências experimentadas pela mãe e o feto passam sem deixar marca no organismo do recém-nascido, e que este contém em si os resultados perduráveis da experiência acumulada pela espécie, cujos últimos elos são seu pai e sua mãe. Nesse sentido, teríamos de fazer referência não tanto a uma herança estreita, que se limita ao círculo familiar, mas às formas mais amplas da herança da experiência humana global. Tendemos a atribuir ao componente da herança um significado absoluto no comportamento da criança e a afirmar que nenhum movimento em sua vida futura, por menor que seja, surge de outra origem que a das aptidões e reações hereditariamente adquiridas por ela. Podemos afirmar sem exagero que todos os recursos e movimentos de que esse futuro ser humano e cidadão do mundo disporá no decorrer de toda a sua vida já existem quando ele jaz no berço e movimenta-se impotente, sem poder fixar o olhar nem sustentar sua mão. Com efeito, de onde retirará, em sua vida posterior, novas possibilidades de movimento? Estas não têm de onde aparecer, assim como não aparecerão de nenhuma parte novos órgãos em seu corpo. No entanto, sem dúvida essa experiência herdada, qlj.e se reduz a cer- P S IC O L O G IA tas formas de comportamento estereotipadas e pautadas em todos os indivíduos de uma determinada espécie, não representa algo petrificado e permanente, mas propenso a constantes mudanças. Tão verdadeira quando a anterior é nossa segunda afirmação de que absolutamente nenhum dos movimentos da criança no berço permanece no decorrer de sua vida posterior nessa forma e como lhe foi dado através da herança. O mecanismo da formação do reflexo condicionado também evidencia as leis sob cuja influência a experiência 'herdada se adapta às condições individuais ao ambiente e, se em algo se distingue o comportamento do adulto do comportamento infantil é só no fato de que, dentro do caos de movimentos descoordenados e desorganizados do recém-nascido, mediante a influência sistemática do ambiente, se introduzem a organização, o sentido, a ordem e a coerência. Os movimentos desvalidos do lactante se transformam na luta do homem, plena de trágico e elevado sentido, com o mundo e consigo mesmo. Ao mesmo tempo, o sentido da educação social é determinado com exatidão científica como o sentido de uma seleção social que a educação realiza entre as inúmeras possibilidades da criança, permitindo que apenas uma se realize. Afirma Frank: P E D A G Ó G IC A 279 Toda essa luta, assim como seu desenlace - tal como mostramos nos primeiros capítulos - são basicamente determinados pelo sistema de vida em que a criança vive desde os primeiros instantes de seu nascimento. Portanto, o ponto de vista conciliador parte do reconhecimento de ambos os componentes, porém não no sentido de uma solução contemporizadora e que não resolve os problemas, de maneira que a cada tese em conflito seja atribuída a metade ou uma parte da influência, mas no sentido de sua coincidência dialética com pleno reconhecimento de sua oposição. Em outros termos, também não negamos a contradição entre o herdado e o ambiente, porém nos parece que ela não existe apenas no pensamento, mas na própria vida. E justamente a partir dessa base, a partir dessa contradição, é que a educação se inicia. Se uma criança nascesse como uma planta, com todas as formas de comportamento que correspondessem à sua vida futura, a educação não seria necessária. A necessidade da educação surge, conforme a expressão de Thomdike, do fato de que "o que existe não é o que deveria existir". Por isso, a educação sempre denota uma modificação e, portanto, a negação de certas formas de comportamento em prol da elaboração e do triunfo de outras. Só desse ângulo a educação se revela como um processo com um sentido totalmente idêntico a todos os outros processos da vida. A criança brinca de soldado, de bandido e de Nesse sentido, é profundamente correta a tese cavalo, pois nela realmente estão as tendências do bandido, do soldado e do cavalo. O sentique coloca o caráter trágico desse processo, codo da educação reside precisamente no fato mum a todos os demais processos da vida. de que, entre muitas dessas personalidades "Sem dor não ocorre nem o nascimento de uma realmente implícitas, só uma delas se realiza criança nem o nascimento de uma estrela." mediante a influência sistemática e a seleção.'? Exatamente do mesmo modo, o caráter não deve ser entendido como algo estático, sob Assim, o processo da educação perde seu a forma de uma soma acabada de peculiaridacaráter feliz e pacífico de preocupação com a des, de reações - congênitas ou adquiridas -, criança e de "ajudar a natureza" que lhe era mas como uma torrente que se desloca dinaatribuído anteriormente; ele é descoberto como micamente, em luta constante. Em outros terum processo dialético e trágico de desaparecimos, o caráter não surge das propriedades hermento permanente de certas possibilidades dadas do organismo tomadas tais como são, sociais às custas da realização de outras, de nem das influências sociais do ambiente tomauma constante luta das diferentes partes do das de forma independente, mas do choque mundo pelo organismo e dentro deste, dos incontraditório de umas contra as outras e da cessantes conflitos entre as forças mais divertransformação dialética do comportamento sas dentro do próprio organismo. .ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA herdado em comportamento pessoal." 280ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Resulta compreensível então o enunciado que exige que reconheçamos a presença de elementos de ambos os tipos no caráter. A partir daí também se esboça a solução da questão relativa à reeducação do caráter. Por acaso o caráter está totalmente condicionado pela educação, ou esta deve contar com ele como condição prévia e invariável? Na psicologia científica o problema não deve ser exposto dessa maneira. O que chamamos provisoriamente de "caráter" é uma incessante ruptura e conflito da vida pessoal com a experiência herdada e, nesse processo de ruptura e lutá, o educador pode intervir a cada instante e se convencer do fato de que tanto uma tese quanto a outra são igualmente verídicas. A luta não é provocada pela educação, se iniciou antes desta e transcorre independentemente dela. Portanto, é compreensível que a ingerência nessa luta pressupõe a consideração mais complexa e exata de todos os elementos que determinam a situação da luta no instante dado. Essa mesma circunstância, porém, permite superar a passividade educativa e, organizando os elementos do ambiente de um modo novo e conforme nossa vontade, permite que incorporemos a essa luta forças sempre novas ou, pelo contrário, que excluamos desta e deixemos fora de combate aquelas que considerarmos indesejáveis. Assim, geralmente com a ajuda das doses mais insignificantes de ingerência, obtemos os melhores resultados. Para movimentar um corpo imóvel deve haver um impulso de enorme força. Em compensação, para exercer influência em um sistema complexo de forças em movimento, basta acentuar ou enfraquecer qualquer uma delas para que toda a resultante adquira uma nova direção e um novo sentido. Assim ocorre, por exemplo, com a guerra, na qual até a intervenção de um Estado insignificante pode resolver o desenlace e dar a vitória a um dos beligerantes. Nesse sentido, James comparou a arte da educação à arte militar e disse que, de certa forma, educar equivale a combater." Em certo sentido, pedagogia também implica estratégia. Portanto, aqui também é válida a regra educativa geral. Não pode haver nenhuma ingerência direta na formação do caráter; to- das as falas sobre a influência moral na formação do caráter do educando, sobre o fato de que um bom professor modela a alma de seus alunos como se ela fosse de cera e lhe atribui as formas desejadas, tudo isso continua sendo uma falsidade em que não se deve confiar, ou as pessoas não percebem o mais importante e atribuem à influência moral o que na verdade é realizado por forças completamente diferentes. A influência direta do educador na formação do caráter seria tão absurda e ridícula quanto a influência de um jardineiro que desejasse contribuir com o crescimento de uma árvore puxando-a mecanicamente da terra. O jardineiro não influi diretamente na germinação da planta, puxando-a para cima, mas de forma indireta, através das modificações adequadas do meio. Umedece o solo, aduba-o, organiza o ambiente contíguo, modifica a temperatura, a luz, o ar, etc. e, através disso, obtém os resultados que deseja. Da mesma forma o educador, ao influir no meio circundante, ao organizá-lo da maneira correspondente, determina o caráter que adota o choque das formas de comportamento herdadas da criança com o meio e, assim, adquire a possibilidade de influir na formação do caráter infantil. Ao mesmo tempo, cabe considerar que aqui, como em todas as partes, nada passa e desaparece sem deixar marcas, e que o professor, além da influência da herança, também deve contar com as influências de toda a experiência passada, isto é, com esse mesmo patrimônio acumulado de reações que foi adquirido em períodos anteriores. Nesse sentido, para esclarecer o tema, introduzimos com o nome de "temperamento", entre aspas, os elementos puramente hereditários do caráter que já existem desde o começo, sob a forma de propriedades elementares do caráter. Depois destacamos o que podemos denominar de "caráter estático", isto é, a forma habitual de comportamento que vai sendo elaborada graças à experiência pessoal e que representa sua soma. Por último, temos de diferenciar separadamente o "caráter dinâmico", esse algo fluido ao qual a ciência ainda não deu um nome exato, mas que constitui a realidade mais palpável, autêntica e essencial na criança. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 281 anos. G r o s s o m o d o , há um consenso de que existe N O T A S zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA um transtorno bioquímico básico - excesso de uma amina neurotransmissora, ou presença de 1. PeterFrantsevitchLésgaft (1837-1909) foi um uma amina anormal. Por isso, todas as terapias anatomista, médico e _t:çlucador russo. Desentêm como recurso básico - não único - a presvolveu a educação pública e as escolas noturcrição de fármacos neurolépticos, que ocupam nas para operários, incorporou as mulheres à os receptores dessas substâncias transmissoras docência e criou centros de educação física. e, assim, a maioria dos sinais e sintomas dos 2. Em latim no original. Significa: sobre a base pacientes desaparecem. Ainda estamos muito da sinonímia. longe de saber o que realmente é o que chama3. Sir John Falstaff é um personagem de Shakesmos de "esquizofrenia". peare que aparece em suas obraskjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA T h e M e r r y W ife s 7. Vigotski se refere à m o d ific a ç ã o do to m da voz, o fW in c is o r e H e n r y W . Como acertadamente disse que se torna mais aguda nos homens e mais Auden, o Falstaff melhor desenhado em seu cagraves nas mulheres. ráter é o de T h e M e r r y W ife s o f W in d s o r e o da 8. Vigotski fala de uma mudança nos "caracteres última ópera - P a ls ta ff - de Verdi. sexuais secundários" e de uma mudança na 4. Ernst Kretschmer (1888-1964) foi um eminenorientação sexual, quando diz que a galinha te psiquiatra alemão. Baseando-se na separatransformada em galo "mostrava atração [seção kraepeliniana da psicose esquizofrênica e xual] pelas fêmeas". Ambas as asserções são verda psicose maníaco-depressiva, Kretschmer pudadeiras quando se trata de animais - que careblicou em 1921 seu K o rp e b a u . u n d C h a r a k te r cem de psique -, pois a atração sexual depende (Constituição e caráter). Estabeleceu uma relada ação dos hormônios; isso é sabido, por exemção entre tipos básicos de constituição corporal plo, por todos os que castram uma gata para e quadros psicopatológicos. Sem conceder a essa evitar o cio. Mas o mesmo não acontece com os tese o valor exagerado que Kretschmer lhe deu, seres humanos; o primeiro aspecto ocorre, poqualquer psiquiatra experiente poderia dizer rém não o segundo. Nos humanos, a identidaque essas relações são apresentadas em uma de sexual d e v e s e r c o n s id e r a d a do p o n to de v is ta porcentagem que, em nossa opinião, exigiria p s ic o ló g ic o . Como os seres humanos constroem mais pesquisa para determinar definitivamen(e lhes constroem) sua personalidade a partir te qual é essa relação. O próprio Vigotski, um de contingências, condicionamentos e determitalentos o clínico, afirma neste livro que, nessa nações culturais e ambientais, e não a secretam concepção, "existe uma semente de verdade". de sua estrutura biológica, sua id e n tid a d e g e n é Sobre a relação de Vigotski com a psiquiatria, r ic a (s e x u a l) é p s ic o ló g ic a . Por isso, o suporte cf. L. S. Vigotski, "El pensamiento em Ia esquibiológico com relação a essa questão deve pasy zofrenia", em: L. S. Vigotski, L a G e n ia lid a d FEDCBA sar a um segundo plano no H o m o S a p ie n s . Isso o tr o s te x to s in é d ito s , op. cit., p. 61-78, sobretunão seria assim caso se considerasse que o gêdo nossas "Notas" a esse artigo, p. 79-85. nero é determinado pelos cromossomos - ge5. O transtorno bipolar afetivo costumava ser chaneticamente, e tampouco se se confundisse gêmado de "psicose maníaco-depressiva" ou nero sexual com orientação e comportamento c ic lo tim ia - os doentes eram chamados de sexual. Com relação à orientação sexual, nos "ciclotímicos", "cíclicos", etc. humanos é ridículo que ela seja atribuídaQPONMLKJIHGFEDCBA à in6. O termo " e s q u iz o fr e n ia " é de Eugen Bleuler, que fluência hormonal ou genética, pois é puramente rebatizou o que Kraepelin denominava "demênpsíquica. Essas questões não eram discutidas na cia precoce" - denominação que não é de sua época de Vigotski, com grande influência autoria e que, em sua época, significava "loucuvitoriana; elas só começaram a ser pesquisadas ra precoce". A esquizofrenia é uma psicose que cientificamente em 1966, nos Estados Unidos, apresenta, conforme suas formas clínicas e as por W Masters e V. Johnson, com uma p e r m is características idiossincráticas daqueles que a s ã o e s p e c ia l do governo. Hoje sabemos que exispadecem, vários dos seguintes sinais: alucinatem pessoas heterossexuais, homossexuais, ções auditivas, delírios sem nexo, labilidade na bissexuais, transexuais e também com orientaassociação de idéias, interceptações e outros ção e x c lu s iv a para objetos - fetichistas - ou anitranstornos do curso do pensamento - que gemais - zoofílicos. ralmente se desagrega -, despersonalização e 9. Os comentários feitos por Vigotski aqui soautismo. Raramente começa depois dos 35 anos bre endocrinologia são basicamente corretos, de idade e geralmente surge em torno dos 20 '" " 'f 282ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA porém correspondem aos conhecimentos e às técnicas de pesquisa e terapêuticas existentes há 75 anos e, por isso, contêm simplismos e erros. Desde então, os conhecimentos e as técnicas aumentaram enormemente e se tornaram muito mais complexos. Nos anos 20, essas descobertas emocionavam, porém nem todos reagiam com o evidente entusiasmo de Vigotski. Em 1925, Mikail A. Bulganov, um romancista russo que renunciaraQPONMLKJIHGFEDCBA à sua profissão de médico, escreveukjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA C o r a ç ã o d e c ã o , uma sátira em que se Ia Zavadovski e da burlava dos cientistas àFEDCBA n o m e n k la tu r a . O romancer:arra as vicissitudes que ocorrem quando um pesquisador enxerta testículos de proletário em um cão, que paulatinamente vai se transformando em um homem: o agitador revolucionário autoba- tizado Poligraf Poligrafovitch, que inferniza a vida do cientista acomodado. Este resolve o problema extirpando-lhe os testículos, e ele se transforma novamente em um cão comum. 10. Essa citação é do livro do filósofo russo exilado S. L. Frank, D u s h a c h ie lo v ie k a [ A a lm a d o h o m e m ] , Moscou, 1917, op. cit. 11. A d ia lé tic a da articulação entre o componente inato e o aprendido na constituição do comportamento humano e a estrutura do psiquismo segundo Vigotski está mais bem explicada nos primeiros capítulos de seu livro H is tó r ia d o d e s e n v o lv im e n to d a s fu n ç õ e s p s íq u ic a s s u p e r io r e s (1931), do qual existem duas edições em espanhol. 12. Essa concepção de James pode ser encontrada no Capo 19. o P ro b le m a QPONMLKJIHGFEDCBA d o - T a le n t o e o s O b je tiv o s In d iv id u a is da Educação A P E R S O N A L ID A D E o homem em geral, assim como suas disE A E D U C A Ç Ã O zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA As reiteradas menções ao caráter social do processo educativo não implicam de forma alguma o fato de que, na escola, sejam suprimidos os problemas da personalidadeFEDCBA [lic h n o s t] ou que eles sejam indiferentes. No fim das contas, a educação [v o s p ita n ie ] sempre tem a ver com as diversas personalidades dos alunos, e o ambiente social se forma, ou melhor, se.realiza em uma série de indivíduos diferentes. Subentende-se que o papel e a importância orientadora da personalidade do educando no processo educativo não podem se reduzir a esse "dueto pedagógico" presente na educação individualista, como processo totalmente centrado no professor e no aluno. Anteriormente, a personalidade do aluno constituía o centro do mundo educativo, mas agora ela adquire um novo significado e um novo sentido. O problema da personalidade na educação social pode envolver simultaneamente várias questões diferentes. A primeira delas está ligada às diferenças individuais, próprias de cada aluno. Apesar da generalidade natural da estrutura do corpo humano e do comportamento, cada constituição humana se distingue por qualidades e características especiais únicas, próprias de cada indivíduo, que, essencialmente, representam uma variação desse tipo médio do "homem em geral". Este deve ser consi. derado um recurso metodológico conveniente, uma abstração, e nada mais que isso. tintas partes e aspectos, digamos, o esqueleto humano, a psicologia humana, etc., só existem em sentido abstrato. Nos fatos, na realidade concreta, existe apenas este ou aquele homem, o esqueleto e a psicologia deste ou daquele homem. A atenção dirigida a essas peculiaridades concretas de cada pessoa individual deve se transformar em algo obrigatório para o educador e para o psicólogo. A educação nunca se inicia em um terreno vazio, nunca começa a forjar reações totalmente novas, nunca realiza o primeiro impulso. Ao contrário, sempre parte de formas de comportamento já dados e preparados e se refere apenas às suas modificações, sempre tende a modificar, porém nunca a criar algo totalmente novo. Nesse sentido, a educação é a reeducação do que já foi realizado. Por isso, a primeira exigência de qualquer educação é o conhecimento absolutamente preciso das formas de comportamento herdadas, pois sobre elas se erigirá a esfera pessoal da experiência. E aqui surge com força especial o conhecimento das diferenças individuais. Isso se evidencia sobretudo nos casos em que lidamos com' desvios muito claros e patentes da personalidade com relação à média geral. Imaginemos uma criança cega, surdamuda ou com um defeito orgânico congênito do sistema nervoso central, por exemplo, um oligofrênico. Entende-se facilmente que todas as formas de ensino e educação, ainda que não devam contrariar as leis fundamentais da pe- 284ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA dagogia, devem assumir certa direção e sentido peculiares com relação a essas crianças. Por exemplo, os cegos vão elaborando reflexos condicionados exatamente iguais aos dos videntes, só que com o tato e não com a visão e, como o cego lê com os dedos caracteres em relevo, isto é, toca a apalpa as letras e não as percebe com a visão, todo o processo da leitura e os atos relacionados a ela adquirem, nesse caso, uma índole e uma tendência completamente particulares. Da mesma maneira, os processos de aprendizagem e adaptação à vida laboral do surdo-mudo e do oligofrênico: apresentam diferenças tão evidentes que não podem deixar de ser consideradas pelo professor. Por exemplo, os surdos não aprendem a fala comum desde seu nascimento porque não ouvem as palavras alheias, nem percebem os sons que pronunciam. Para incorporá-los à fala humana e tornar possível a comunicação entre eles e as pessoas normais, sua atenção tem de se fixar nos movimentos labiais que efetuamos ao pronunciar as palavras, deve-se ensiná-los a vincular cada movimento a determinado traçado da palavra e a certo significado. Depois, eles têm de aprender a ler com a visão a fala humana a partir dos lábios [do falante], assim como a lemos em uma folha de papel. Para ensinar um surdo a falar é preciso lhe dar a oportunidade de perceber o que ele pronuncia e controlar suas próprias reações. Como isso não é possível pelos caminhos usuais - a audição -, o ouvido deve ser substituído nesse caso pelos estímulos cinestésicos e táteis: apoiando a mão do aluno sobre a garganta, ele deve apalpar os movimentos realizados durante a fala e estes, ao retomar para o próprio falante, o ajudam a elaborar a fala consciente. Em nós, essa fala vai sendo elaborada com a ajuda da audição, por meio da qual não só pronunciamos mas também ouvimos e, conseqüentemente, avaliamos o que pronunciamos. Da mesma forma, na educação de um oligofrênico, para estabelecer e reforçar nele reações condicionadas, é preciso apelar a recursos psicológicos diferentes dos utilizados na educação de uma criança normal; com freqüência, seus instintos e necessidades mais primitivos devem ser utilizados para lhe ensinar as formas necessárias de conduta. Por exemplo, para ensinar alguns oligofrênicos a se higienizar ou vestir, esse ato deve ser vinculado ao de comer, pois só sob a pressão do estímulo mais intenso da fome essa criança vai ser capaz de sair do estado de imobilidade e será impulsionada a certa atividade. Assim, procedimentos que mereceriam a mais severa condenação, se utilizados com uma criança normal, são os únicos razoáveis e adequados na educação de crianças deficientes mentais [graves] e crianças portadoras de outros defeitos [graves]. Se considerarmos o outro extremo, isto é, as crianças superdotadas, também tropeçaremos na necessidade de modificar alguns métodos e determinadas regras gerais da educação. Tudo isso se manifesta do modo mais grosseiro e simples em algumas formas especiais de talento, como o talento para o desenho, para a música ou para a dança, quando só um ensino especial precoce, iniciado a partir da mais tenra idade, pode garantir o desenvolvimento normal das possibilidades latentes na criança. Por isso, a educação de anormais, sejam eles inválidos ou talentosos, há muito tempo é considerada alheia ao território da pedagogia, isto é, [é considerada] de tal tipo que não tem a ver com as leis gerais da educação. Devemos dizer que esse critério é profundamente errôneo e que essa extraterritorialidade lhe foi atribuída por engano, devido à natural incompreensão de fenômenos que ainda não foram pesquisados. As leis gerais da psicologia só podem continuar sendo leis científicas enquanto forem aplicadas a todos os terrenos da educação. As leis da pressão e da gravidade são absolutamente as mesmas, tanto no caso de estender trilhos em um túnel da montanha ou em um terreno pantanoso. A física de ambos os lugares é totalmente idêntica, ainda que o trabalho prático relacionado à colocação dos trilhos assuma formas totalmente diferentes em cada caso, adequadas a cada lugar. No entanto, essa exigência de formas peculiares de trabalho para cada lugar não significa que existam leis diferentes para cada uma delas, mas que as mesmas leis P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 285 podem ter uma expressão diferente e distinestuda o trabalhador do ponto de vista de sua correspondência com as exigências de um ofítos graus de nível quantitativo. cio particular. Em vez de capacidades abstraAssim, tanto o gênio quanto o oligofrênico tas, esse critério promove pesquisas e provas constituem, na infância, o mesmo objeto da concretas e práticas das capacidades reais no educação, como qualquer outra criança, e as âmbito da escrita, do cálculo e da leitura. leis gerais da pedagogia estão escritas para elas Outra emenda substancial tem a ver com do mesmo modo que para todas as crianças a substituição do conceito dekjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLK d o n s g e r a is e a b s dessa idade. Só partindo de leis pedagógicas tr a to s pelo de a p tid ã o e s p e c ia l e c o n c r e ta . Essa gerais podemos encontrar as formas corretas correção justifica-se com a mesma clareza tanto de individualização, que deve ser comunicada em uma criança portadora de deficiências como à educação de cada uma delas. em um escritor genial. Sem dúvida, todo taTambém é incorreta a idéia de que o problema da individualização só surge com relalento é um dom especial para algo singular. Por exemplo, Tolstoi ocuparia um dos primeição a algo que transcende os limites da norros lugares no caso de uma pesquisa do talenmalidade. Pelo contrário, em cada criança teto literário, mas, em compensação, ocuparia mos algumas formas de individualização, emum lugar muito modesto - talvez um dos últibora não tão taxativamente destacadas e exmos -, caso a pesquisa se ocupasse das aptipressas como na cegueira, na genialidade, na dões musicais, ou da aptidão para o trabalho surdez ou na oligofrenia. Mas um fenômeno de engenheiro, ou do talento matemático. não deixa de ser o mesmo se sua expressão Tchekov era um péssimo médico e um grande quantitativa for reduzida. A exigência da indiartista. Existem diversos casos em que um sernividualização dos recursos educativos, portanretardado mental pode brilhar por uma meto, também constitui uma exigência geral da mória tão impressionante que provocaria a inpedagogia e se estende a todas as crianças. veja de um gênio. Tudo isso significa apenas Daí derivam duas tarefas do professor: uma coisa: não existe nenhum "talento em em primeiro lugar, o estudo individual de togeral", mas predisposições diferentes, especiais, das as características próprias de cada educancom relação a uma determinada atividade. do e, em segundo, a aplicação individual de todos os recursos educativos e da influência do ambiente social a cada um deles. Colocar NOTAS todos os alunos em um mesmo molde é o maior dos erros pedagógicos. A premissa fundamen1. Vigotski usa, literalmente, o termo "idiota". tal da pedagogia exige inexoravelmente a inPelas conotações pejorativas e pelas pautas que dividualização, ou seja, a determinação consatualmente regem a denotação desses quadros, ciente e precisa dos objetivos individuais da optamos pela designação nosográfica "oligoeducação para cada aluno em particular. frenia", com menos conotações e que está mais A psicologia contemporânea está aceitande acordo com os anos 20 que outra própria do contexto do ano 2000. Com relaçãoQPONMLKJIHGFE à exdo cada vez mais essa idéia sobre a especificipressão "criança/pessoa defeituosa", optamos dade dos objetivos individualizados da educapor um critério similar, tanto neste livro quanção e, com relação a esse ponto, tende a rever to no tomo V das O b r a s E s c o g id a s . F u n d a m e n a teoria tradicional sobre o talento concebido to s de D e fe c to lo g ia , de Vigotski, op. cit., na nota como uma capacidade abstrata e geral ou pelo nº 1 do Capo 15 - embora os adaptadores espamenos a introduzir emendas especiais nesse nhóis do texto nem sempre tenham adotado conceito. Burt,? por exemplo, substitui o connosso critério. Pensamos que seria um grave ceito de dom intelectual pelo de aptidão escoerro utilizar, para textos escritos ao início do lar, concedendo um perfil psicológico a todo o século, a expressão "criança/pessoa deficienproblema. Assim, a criança é considerada, do te" ou, como se diz hoje em dia, "criança/pesponto de vista da correspondência com as tasoa com necessidades especiais", denominação que transfere a responsabilidade da pessoa ao refas práticas exigidas pela escola, de um modo meio social, pois este é quem tem de satisfazer totalmente análogo ao da psicotécnica, queZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA 286ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA essas necessidades. Neste último caso, a destinha como saber que Burt se transformaria em contextualização histórica poderia ser até mesum dos mais famosos e interessantes personamo ridícula, pois nos parece impossível não gens da história da ciência. A preocupação chamar de "defectologia" - disciplina cujo obideológica central de Burt deu origem à consjeto são as pessoas com "defeitos" biológicos trução de uma justificação "científica" para susde diversos tipos - ao campo clínico no qual tentar a legitimidade dos privilégios das clastrabalhou Vigotski, chegando a ser diretor do ses sociais exploradoras. Em sua confiável hisinstituto de defectologia mais importante da tória da psicologia russa, David Joravsky afirURSSkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA h á 70 a n o s . Por outro lado, Vigotski ma que não houve nenhuma tendência desse morreu em 1934, e a URSS também morreu. tipo nem um antecedente similar na psicoloNo entanto, essa disciplina continua sendo gia soviética, "como ocorreu com Terman ou chamada de "defectologia" na Rússia; também Burt na psicologia ocidental" (cf. D. Joravsky; se utiliza o termo "psicologia pedagógica" em R u s s ia n P s y c h o lo g y . A c r itic a l h is to r y , Oxford: vez de "psicologia educacional". Por esses moBasil Blackwell, 1989, p. 346; o grifo é nosso). tivos, portanto, o presente livro de Vigotski, Burt "provou", com abundantes evidências publicado em 1926, na URSS, intitula-se P s iempíricas, que a inteligência era herdada e que c o lo g ia p e d a g ó g ic a e não P s ic o lo g ia e d u c a c io as pessoas de raça negra eram cognitivamente n a l: segundo nossas informações, Vigotski foi inferiores às de raça branca. Em 1976, descoum psicólogo russo da década de 20, e não um briu-se que Burt tinha se dado ao luxo de morpsicólogo norte-americano dos anos 90. rer tendo enganado a comunidade científica , 2. [Sir] Cyril Ludowic Burt (1883-1971) foi uma pois o material empírico em que baseou suas figura dominante na psicologia inglesa duranconclusões tinham sido totalmente inventado te mais de 50 anos. Vigotski se refere aqui a e seus colaboradores nunca tinham existido. O uma de suas contribuições no campo da psicomelhor livro sobre Burt é L.S. Heamshaw, C y r il logia educativa. Em sua época, Vigotski nãoQPONMLKJIHGFEDCBA B u r t p s y c h o lo g is t, Nova York: Random, 1981. I I, A s F o rm a s F u n d a m e n ta is d o E s tu d o d a P e rs o n a lid a d e d a C ria n ç a zyxwvutsrqponmlkjihgfedcba /) J -f.íkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA ') -U ,, \FEDCBA { - ( J l ( ': ~ A psicologia atual dispõe de três métoPortanto, a primeira habilidade [regra] \. \ dos [formas] fundamentais para estudar a perdo observador científico reside em conhecer o ,I" QPONMLKJIHGFEDCBA sonalidade da criança. O primeiro pode ser,. conjunto de fatos que devem ser isolados dos denominado "observação científica regulamenrestantes. tada", que consiste em observar as manifestaA segunda condição [regra] do observa- j . l ções individuais de nosso educando de maneidor científico é conhecer a classificação dos ra cientificamente regulada. Para cornpreenfatos observados, isto é, a capacidade de disder o significado e a finalidade desse método tribuir em grupo os que são similares; isso setemos de recordar a diferença existente entre ria como determinar a individualidade de cada a observação científica e a comum. fato e encontrar seu sentido e significado típiTodos observamos diariamente uma cos, No entanto, a máràf'âéurniiláÇã;./'efe fat~s pluralidade extraordinária de fatos, e a obser- 'õbservados totalmente fidedignos ainda não vação científica se distingue dessa observação constituirá o material mais primário para a só por algumas características essenciais. Em ciência. É preciso saber primeiro p,aril que esprimeiro lugar, ao contrário da observação co~~J~S9~j!?r~n(}~~u~I1i,çlQs~ Em outros t"ê~{ mum, a científica pressupõe o estabelecimenpreciso efetuar uma nova seleção, uma segunda seleção das propriedades necessárias dento a p rio ri da seleção dos fatos que são objeto de observação. Suponhamos que um eclipse tro desses fatos e escolhê-los de modo que csdo Sol seja observado por um cidadão comum, sas propriedades se destaquem e apareçam um astrônomo, um zoólogo que se interessa com inconfundível clareza. pelo comportamento dos animais, um psicóloConsidera-se que a terceira regra do ob-1,) go, etc. As observações científicas destacarão servador científico é a exigência de estabeleem cada caso uma série especial de fatos entre cer certa relação entreos diferentes grupos de os numerosos fenômenos relacionados ao eclip- Jatos, isto é, saber compor um .g':ladro integrál e coerente de um aspecto qualquer do processe. Enquanto o cidadão comum vai se guiar pelo seu próprio interesse e pela sucessão casoern estudo; um quadro que contenha em si sual de fatos e transferirá seu olhar de uma todo esse grupo díspar de fatos. vaca assustada para um homem que se persigE, por último, como quarta característica na, e do disco solar escuro para um reflexo cin[regra], consideraremos a habilidade da obzento na água, o observador científico limitaservação científica não só para descrever os rá sua observação a apenas um grupo de fatos, fatos, mas também para explicá-los, ou seja, tentando nunca sair de seus limites. O astrôpara encontrar as causas. e relações situadas nomo acompanhará apenas o escurecimento na, ~a~ d'esses' fâ-tm,: -" ,paulatino do Sol, o zoólogo só o comportarnenA observação-científica psicológica deve to dos animais, etc. levar em conta as mesmas exigências gerais. j »< /"--/" ~'./ - .", 288ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Desejamos esclarecer que aqui não nos ocupaEsse exemplar impresso também pode ser mos da questão geral relativa à metodologia utilizado para toda a escola, desde que a anoda observação psicológica, mas à questão partação seja feita em cadernos separados ernbaicial sobre a metodologia das observações psixo dos correspondentes números de perguncológicas na área da pedagogia, ou seja, do sentas, parágrafos e capítulos. O professor deveQPONMLKJIHGF tido 5dS ~i~?if~c~do que ~s ~bs~~'[vJS?~S p,~!S?- conhecer antecipadamente o plano em seu lógicas podem ter para um professor. Ao mesconjunto para orientar-se em seu uso. mo tempo, supõe-se que, em cadacaso, não Além disso, o processo de acumulação de estaremos nos dirigindo a um psicólogo, mas observações psicológicas transcorre de forma a uma pessoa que apela à psicologia apenas totalmente inadvertida no decorrer da vida como recurso aU:lúliar.--~~-,-doméstica ou do trabalho escolar. O professor, O professor conta com a ajuda de todos o educador ou os pais, transfere cada fato que os tipos possíveis de esquemas-programas de observa no comportamento da criança para um - observação da personalidade, planos para caderno, encontrando previamente o lugar e o pesquisar a psique infantil que, ~()m-diversos número de pergunta correspondentes. Quannomes, visam a um-mesmo objetivo: colocar do, para um determinado fato, não se enconnas mãos do professor um meio que lhe pertra a pergunta adequada, isso significa que o mita subordinar a grande quantidade de obfato não está sujeito à consideração nem à observações que faz diariamente às quatro reservação. Essa anotação, essa acumulação de gras expostas anteriormente e, desse modo, fatos, é realizada durante um período prolon( transformar suas próprias observações em obgado, de seis meses a um ano, e assim se reú< sÚy~çÕ~~pslcoI6gicasêíentíficas/dâpoerson; ne um importante material. Mediante esse proI Íidade dos alunos. ' 'o cedimento, realizamos de forma automática as I .-/-_ ., , . . . ,-....-...._~ ......- _. _ . . . . . - -- ' " Sem fazer referência às particularidades duas primeiras exigências da observação ciende cada um desses planos, queremos destacar tífica; em primeiro lugar, a seleção dos fatos os princípios gerais e os fundamentos de cada necessários é realizada graças à existência de um deles. Todos constituem uma espécie de . u m plano, os fatos não-significativos ou secunsérie de perguntas dirigidas ao professor e dis~-1Ádários são iolàrm'enfe e'iimlnádos dôo çanlpô~(fa tribuídas em diferentes capítulos, subcapítu- ", árénção; em segundo, graças ao sistema de los, parágrafos e números. Por exemplo, diga,inotações adotado, além de acumular fatos, mos que o Capítulo 5 contém material que resjá os classificamos automaticamente, porque ponde a questões que têm a ver com a mernójá estão distribuídos nos itens correspondenria, referentes aos diversos aspectos dessa funtes e, portanto, foram definidos em seu signição, como duração, exatidão, alcance, etc. Ao ficado típico e genérico. mesmo tempo, cada um desses subcapítulos ~~";,s'E(seÍ1tidé( o diário desempenha o "~ ~ --..../' -L 00 - '-~ l pode ser dividido em uma série de perguntas concretas que indicam diretamente ao professor as manifestações que podem ser relacionadas ao caso dado e constituir indicadores para " o mesmo. Por exemplo, surge a seguinte per~ gunta: durante que lapso o aluno retém o material aprendido e assimilado?; o aluno preci, sa de quantas repetições para aprender um ___....i,.poema?Além disso, o plano adota habitualtnente o aspecto de uma caderneta ou cadern*oimpresso em uma metade da página, a fim de q \ e na outra, que está em branco, o professor p ssa anotar, diante de cada pergunta, as observações correspondentes. papel de uma espécie de ~étp~~léU25~;oS~~g~yJst~J na qual os fatos são colocados em compartimentos preparados previamente. Dessa forma, o professor se encarrega dos dois últimos aspectos da observação científica: a sistematização das observações acumuladas e sua explicação. Se levarmos em conta a extraordinária dificuldade do quarto momento, inclusive para uma pesquisa científica solidamente organizada, e a dificuldade de explicar por completo os fatos observados, teremos de admitir que essa ~~j~oê~Y.?_~~.ê~!~~i;a5i~J~r!!:~)?~icial na maioria dos casos suscetíveisde inter'pretação, e a única tarefa a ser completada é a P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 289 total sistematização das observações [o terceiOs méritos dessa forma de observação ro momento]. cientificamente regulada são, primeiro, a naHá vários procedimentos para essa sisteturalidade da observação realizada; segundo, matização, mas o atributo que os une se reduz o esclarecimento científico dos fatos; terceiro, a passar de uma série de fatos concretos a alo paralelismo das observações realizadas com gumas conclusões e formulações gerais com todo o trabalho escolar. relação a determinados aspectos do comporCom efeito, sempre observamos o aluno nas tamento. Suponhamos que, no decorrer de um condições naturais de seu trabalho, e os fatos que ano, acumulamos várias dezenas de fatos que acumulamos sempre se referem aos modos direcomprovam que o aluno reçQrdou grupos de tos de trabalho que lhe são habituais. Em segun]p-ª!~rial_ didático excepcionalmente amplos eQPONMLKJIHGFEDCBA do lugar, esses fatos são novamente classificados __ significativos. Ao mesmo tempo, não conseguide acordo com a atmosfera natural do trabalho mos confirmar a duração da recordação por tal como vão surgindo. E, por último, o aluno nenhum fato que observamos no transcurso do não suspeita'v.'-que é objeto de uma observação.FEDCBA .. /', /" kjihgfedcbaZYXWVUTSRQPON ano. Subentende-se que, ao sistematizar nosPor outro lado, nunca interrompemos nossa ta~ sas observações, extraímos a conclusão naturefa pedagógica para fazer observações especiais, ral de que a fixação das reações desse aluno mas as incluímos como parte componente do prodeve ser reconhecida como excepcionalmente cesso geral da metodologia educativa. desenvolvida e ativa, no sentido do volume das No entanto, esse sistema também posreações que abrange e assimila, mas apresensui uma série de graves insuficiências. A prita uma magnitude sumamente modesta na meira e mais substancial consiste naquilo que duração dessa fixação. deve ser considerado como indefinição e esNesse exemplo percebe-se claramente pontaneidade desse sistema de observações. que, na verdade, a sistematização não envolNão somos donos da situação; pelo contráve nada novo. É importante evitar toda imporio, temos de esperar até que o fato necessásição e invenção, ou fazer qualquer tipo de rio ocorra sozinho. Por isso, é preciso esperar conjeturas, de colheita própria. Nela não deve muito tempo, às vezes anos, pelos fatos nehaver nada que não tiver surgido nos próprios cessários, e por vezes tambérri pode acontefatos, e só se deve passar da descrição dos facer que eles não se manifestem no trabalho tos particulares às formulações gerais. escolar. Por esse motivo, a falta de determi- ,. Ao mesmo tempo, a explicação causal só nados fatos em algum ponto 9\ão_cÇ)!TI2~Ova ' .I é possível e desejável quando a comparação que essas formas de comportamento não ocor-. i~ in /~ "aluno; ela sórnentê nos informa que; entre os diferentes grupos de fatos, que surge ~ elas n-ão podern ser observadas no ambiente, durante a sistematização, sugerir a idéia de que escolar ou familiar. .~ se pode supor a existência de uma dependênA segunda deficiência consiste na bifurcia causal entre algum grupo de fatos. No ponto que caracteriza o componente receptivo da cação da atenção exigida do professor e do educador quando, ao agir ao mesmo tempo reação, quando chegamos, baseando-nos nos fatos, à conclusão de que em nosso aluno os como professor e psicólogo, além de realizar suas tarefas também têm de se ocupar da obreceptores visuais funcionam de forma fraca e servação. É compreensível que, com esse desindolente, e quando paralelamente, na caracdobramento da atenção, ambos os aspectos terização da memória, também chegamos a estabelecer de modo factual que, de todos os do trabalho - tanto a exatidão da observação quanto a elevação da criatividade pedagógitipos de memória, o menos desenvolvido no aluno é o visual, logicamente devemos concluir ca - podem sofrer. Por fim, a terceira deficiência desse sisteque, nesse caso, temos fenômenos vinculados ma é a concentração da atenção do professor causalmente entre si, e que a ~~i~_~l do aluno está insuficientemente desenvolvida em muitos ou vários alunos; em uma observação longa, isso não permite que o professor porque sua percepção visual é fraca. /' -< , '\ / 'V '- ' I , . . . . . . , , '- " '~ ~ '" \ . . / " " '- '- ~ ~ '~ '- '" 'v /, , ....•.. /" . . »< Ó : -. -....... . ...- .. , ., ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA " .' .J" /' .- ." \ \ 290ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA mas complexas do comportamento. Devido a isso, qualquer reação vincula-se a uma série de outras reações, e o comportamento é estudado de forma integral e contínua. Binet' e Simon- criaram uma escala de medição para pesquisar a inteligência da criança em função de sua idade. Essa escala é intec: grada por uma série de testes ou tarefas, con'cordantes com cada nível evolutivo, e considera-se que a solução correta de todos os testes exigidos comprova um desenvolvimento normal da criança para a idade correspondente. Devemos dizer que a exatidão dos testes de Binet quanto à idade é grosseiramente aproximada. Seu ponto de partida é o cálculo de que 50% das crianças dessa idade resolvem corretamenA S P E S Q U IS A S P S IC O L Ó G IC A S te todos os testes, 25% superam seu nível E X P E R IM E N T A IS D A P E R S O N A L ID A D E QPONMLKJIHGFEDCBA evolutivo e 25% estão abaixo dele. Mas, em D A C R IA N Ç A geral, a idade da criança não constitui uma magnitude tão marcante em seu desenvolvimeno método psicológico experimental de to para que possamos julgá-Ia de forma totalestudo consiste em colocar a criança em conmente objetiva e precisa. No entanto, essa não dições especiais, nas quais se propõem a ela é a principal deficiência do sistema, pois aqui, diversas tarefas para avaliar os diferentes ascomo ocorre com qualquer medição, sua unipectos de sua personalidade. Para isso existe dade pode ser selecionada de forma totalmente uma série de procedimentos, dos quais discuconvencional. Para nós, o importante é ter altiremos dois sistemas, por serem os mais freguma norma exata para comparar as crianças qüentes de acordo com nossa experiência. Por entre si e, ao mesmo tempo, essa norma pode outro lado, deve-se levar em consideração que corresponder só em parte aos verdadeiros nítodos os métodos de experimentação psicolóveis evolutivos do desenvolvimento infantil. gica podem ser divididos facilmente em três A prova se realiza pedindo que a criança grupos fundamentais. O primeiro deles são os efetue todos os testes de um nível qualquer. métodos de estimulação em que, modificando Ao mesmo tempo, é preciso encontrar os limia força, a composição e a interdependência dos tes para sua solução, isto é, por um lado, cheelementos do estímulo, determinamos relações gar a tal nível que não possa resolver nenhue ligações entre a causa externa e as reações ma tarefa e, por outro, encontrar um nível em que ela provoca. O segundo abrange os métoque resolverá todas. Para isso é preciso se desdos de expressão, que consistem no estudo de locar para a frente e para trás nos níveis sinais como a modificação do pulso, da respievolutivos, começando pelo que corresponde ração, da mímica e da fala, através dos quais à idade física da criança. Entre ambos os limise exprimem determinados estados psíquicos. tes se situam os níveis em que uma parte das Os terceiros são os métodos de reação, que tarefas será resolvida e outra parte não. consistem em provocar reações condicionadas Depois se faz o seguinte cálculo. Por exema um sinal prévio. plo, um menino resolveu todas as tarefas corEm forma pura, nenhum desses métodos respondentes aos 8 anos de idade, depois 3 tapode ser aplicado a uma criança. Dessa pesrefas para crianças de 9 anos, uma das de 10 e quisa não se espera uma descrição detalhada duas das de 11, e nenhuma das tárefas para e analítica dos fatos, mas uma comprovação crianças de 12 anos. Por cada tarefa resolvida mais ou menos integral dos grupos e das forem qualquer nível calcula-se 1/5 de ano. Por- tenha a possibilidade de recordar que aspectos e quais alunos foram registrados de forma suficiente por ele nas observações e quais ainda não foram representados em seu diário. Essa casualidade e falta de sistematização da observação de um instante para o outro, de um dia para o outro, priva a observação de um caráter ativo e eficaz. Da aspiração a superar essas deficiências surgiu outra forma de observação psicológica, sumamente popular, ligada estreitamente à __pesquisa do talento. Essa segunda forma pode " (' )ser denominada "pesquisa experimental" da ',f:l,personalidade do a-lunô: - - . ---> P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 291 tanto, o cálculo é o seguinte: 8ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA + 3/5 + 1/5 + Esse mesmo objetivo possui o método de Rossolimo, chamado por seu autor de "perfil 2/5 = 9 1/5. Essa cifra determina a "idade mental da psicológico'} porque nele não se estudam as formas integrais do comportamento, mas alcriança". Agora só resta encontrar a diferença entre a idade mental e a física, e expressar o gumas funções psíquicas: a memória, a atenatraso ou o superdesenvolvimento da criança. ção, a vontade, a receptividade, a sagacidade Isso é o que daria a diferença entre a idade etc. Cada função é comprovada com a ajuda física e a mental. Assim, em nosso exemplo de 10 testes. O teste resolvido é marcado com um [sinal] de mais, o não-resolvido com um [seria] 9 1/5 - 8 = 1 1/5; ou seja, esse menino [sinal] de menos; a soma total dos [sinais] mais superou sua idade em 11/5. Depois se calcula para uma determinada função caracteriza sua outra relação entre a idade mental e física, que altura. Isso depois é transferido graficamente também é um indicador do atraso ou da intelipara uma folha dividida em 10 colunas, no qual gência da criança. Por último, presta-se" atenção à quantidaa quantidade de testes resolvidos é marcada de de níveis evolutivos que estão entre os limicom pontos na altura correspondente. tes. A idade mental da criança pode corresponDepois se extrai a média aritmética que deve caracterizar a inteligência geral da criander à sua verdadeira idade ou mesmo pode ça. Além disso, extrai-se separadamente a mésuperá-Ia, mas apesar de todo o seu desenvoldia de acordo com três grupos: a média aritvimento não deve ser admitida como normal, pois a cifra da idade mental pode estar commética dos processos volitivos, da memória e posta por diferentes tarefas, dispersas em tal dos processos associativos. quantidade de níveis evolutivos que esse deExistem formas aproximadamente iguais senvolvimento deve ser qualificado como evide testes para pesquisar as representações elementares em crianças de distintas idades. A dentemente não-uniforme. deficiência comum a esse tipo de pesquisas exEssa é a exposição sucinta do método de perimentais consiste em que se coloca como Binet-Simon. Sua particularidade consiste em fundamento uma noção absolutamente errôque ele tenta investigar processos psíquicos de nea sobre certos dons de inteligência gerais. caráter complexo por meio de seus testes, toNão há dúvida de que essa teoria é baseada na mando formas particulares de comportamento concepção da "psicologia das capacidades", que como elas se encontram na vida, e não já morreu cientificamente. O próprio conceito desmembradas, como quando se estuda sepade dom intelectual deve ser substituído pelo radamente a memória, a atenção e outras funconceito de aptidão especial. ções. Binet seleciona os atos nos quais se exTambém não podemos deixar de destapressa a combinação de reações características car o nexo desses sistemas com a velha escola, de um determinado nível. Por isso, os testes de que baseava todos os recursos educativos em Binet podem ser facilmente adaptados a diferentes países e representar - enquanto não fo- uma aprendizagem intelectual e, portanto, esses sistemas representavam apenas a pesquisa rem criados novos testes para substituí-Ios - um do intelecto, mas não das esferas emocional e recurso de orientação breve, que permite verivolitiva dos alunos. ficar três novos aspectos. Em primeiro lugar, ele Por esse motivo, tais sistemas intelectuaserve para distinguir, entre o conjunto de crianlizavam unilateralmente a personalidade da ças normais, um grupo que, por sua falta de criança e, desse modo, apresentavam-na de fordesenvolvimento, pode ser considerado anorma errônea. Por último, é inerente a esses sismal e tem de ser diferenciado em uma instituitemas a insuficiência de todas as pesquisas ção educativa especial. Em segundo, serve para experimentais, isto é, a artificialidade, pois o demonstrar a maior ou menor gravidade do sujeito da prova é colocado sempre em uma desenvolvimento de uma massa atrasada de situação incomum. Isso não oferece a garantia crianças. E, em terceiro, é útil para acompanhar de que a memória ou a atenção do aluno funo desenvolvimento infantil, medindo a cada ano cionaria na escola exatamente da mesma mao quanto as crianças avançam.RQPONMLKJIHGFEDCBA 292RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P a r a a s de 7 a n o s : Apontar para a mão neira que funcionava no laboratório. Por isso, direita e a orelha esquerda. Copiar uma graapesar de a pesquisa experimental oferecer vura. Realizar 3 tarefas não muito importanvantagens não-comuns - no sentido de ser tes. Dizer qual é a soma de 3 moedas simples e possível provocar em nossa vontade a mudande 3 duplas. Mencionar 4 cores. ça que se deseja no comportamento do aluno P a r a a s de 8 a n o s : Comparar de cor 3 pa-, ela apresenta as deficiências próprias de res de objetos. Contar em ordem inversa de 20 qualquer experimento, ou seja, coloca o aluno a O. indicar as partes que faltam em desenhos. em novas condições e, por isso, não se pode ter certeza de obter conclusões totalmente cerDizer a data. Repetir uma série de 5 números. P a r a a s de 9 a n o s : Dar o troco de 20 detas. Portanto, o método experimental, ao deipois de ter gasto 16. Definir 5 objetos. Denoxar de lado [a naturalidade] da observação, é minar todas as moedas de um mesmo tipo do portador de novas imperfeições. sistema monetário nacional. Nomear os meses A saída de ambos reside em um terceiro respeitando sua ordem. Responder a 3 pergun}-, sistema de pesquisa psicológica, denominado ';'j. ~'experimento natural".ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA tas abstratas fáceis. / ', : . . '- '''''" - A título de -ilustração, reproduzimos o P a r a a s de 10 a n o s : Colocar em ordem 5 caixinhas de diferente peso. Desenhar de cor método de Binet em uma exposição que pertence a K. P.Viesilovskaia. uma planta simples. Encontrar os absurdos em 4 frases. Responder perguntas abstratas mais difíceis. Redigir 2 orações usando 3 palavras o M É T O D O D E B IN E T -S IM O N dadas. P a r a a s de 1 2 a n o s : Opor-se a uma sugesPara determinar o nível de inteligência e tão (por exemplo, mostram-se 6 pares de lide atraso das crianças de diferentes idades, Binet nhas à criança, sendo a longitude do primeiro e Simon indicam as tarefas na seguinte ordem:ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA par de 4 e 5 em, do segundo de 5 e 6 em e do terceiro de 6 e 7 cm. As linhas dos pares restantes são todas de 7 em; se a criança, ao comP a r a c r i a n ç a s de 3 a n o s : Apontar para sua parar o quinto e o sexto pares, continuar afirboca, seu nariz e seus olhos. Repetir uma frase mando que as linhas que estão do lado direito de 6 palavras. Repetir um par de números ensão mais compridas, isso é computado como tre três pares determinados. Denominar alguns resposta sugerida). Redigir 1 oração simples objetos em uma gravura. ou composta com 3 palavras dadas. PronunciP a r a a s de 4 a n o s : Dizer qual é seu sexo. ar em 3 minutos mais de 60 palavras. Definir Citar três objetos de uso doméstico: faca, chatrês conceitos abstratos. Restabelecer a ordem ve, moedas. Repetir uma série de três númeintencionalmente alterada de certas palavras. ros. Comparar suas linhas (de 5 e 6 em e dizer P a r a a s de 1 5 a n o s : Repetir uma série de 7 qual delas é a mais longa. números. Escolher 2 rimas para 1 determinada P a r a a s de 5 a n o s : Comparar dois pares palavra. Construir 1 frase com 26 sílabas. Exde caixinhas de 3 e 12 e de 6 e 15 gramas e plicar o significado de 3 gravuras. Extrair a conmostrar a mais pesada delas. Desenhar um clusão de uma série de fatos." quadrado. Repetir uma frase de 10 palavras. Enumerar 4 moedas simples. Montar um paralelogramo a partir de 2 linhas. A criança que realizar todas as tarefas P a r a a s de 6 a n o s : Dizer que horas são. propostas para uma determinada idade é conDefinir ou descrever de forma simples 5 objesiderada normal; a que realizar apenas as tatos. Desenhar um losango. Somar 13 moedas refas da idade precedente é considerada atraiguais. Comparar dois rostos do ponto de vista sada em um ano. Considera-se que quem reaestético (de acordo com desenhos que estão lizar as tarefas do ano posterior supera em um nos álbuns especiais do teste de Binet-Simon). ano as de sua mesma idade. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 293 oRQPONMLKJIHGFEDCBA E X P E R IM E N T O N A T U R A L ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA nalada com um ponto na circunferência correspondente. Unindo todos os pontos, obtemos o zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA próprio nome desse método parece pauma linha quebrada fechada que é chamada radoxal, pois um experimento sempre pressude "estrelinha de Lazurski" e que nos ajuda a põe formas artificiais de pesquisa, e "experimenjulgar de forma direta, por suas saliências e to natural", levando em conta o significado liteentrâncias, o desenvolvimento de diversos asral das palavras, equivale a "quadrado redonpectos do comportamento do aluno. do" ou "água seca"." Entretanto, esse método Temos de dizer que tal método constitui criado pelo professor Lazurski" constitui uma essa linha média que, evidentemente, está dessíntese da observação e do experimento e serve tinada a desempenhar um papel importante para evitar os aspectos negativos de ambos e no desenvolvimento do experimento pedagóconservar seus aspectos positivos. gico. Entretanto, temos de frisar que os três Lazurski afirma que, quanto mais elevamétodos de estudo psicológico da criança aindo e complexo for o fenômeno pesquisado, da se encontram em estado embrionário e são mais simples e próximo da vida deve ser o utilizados apenas de forma transitória. As três método aplicado. O que ocorre é que os difeformas devem ser revistas e essa reforma deve rentes elementos do comportamento se combasear-se no conceito de reação, isto é, na cabinam de forma tão complicada que é preciso racterização da personalidade da criança em escolher formas sintéticas de observação. interação com seu ambiente. No experimento natural, o professor que pretende efetuar a observação elabora anteciNOTAS padamente um programa e um plano das tarefas realizadas habitualmente, por exemplo, nas l. Já nos referimos a Binet no Capo 7. Binet foi aulas de língua, física, desenho, educação físium psicólogo que estudou as capacidades de ca e jogos. Os alunos, que nem suspeitam que raciocínio e outros processos psíquicos superiosão objeto de um experimento, consideram que res nas crianças, a noção de inteligência e as estão tendo as aulas habituais. Com isso, o tradiferenças individuais - o que fez estudando balho dos alunos transcorre em condições norsuas próprias filhas. Binet teve uma trajetória mais, e eles não sentem sobre si o olhar atento sinuosa. Abandonou a carreira de advogado do experimentador. para se dedicar a estudos médicos em um hosNo entanto, o professor conduz a aula pital. Depois, se incorporou ao laboratório de como experimentador; elaborou previamenpesquisa da Sorbonne, do qual chegou a ser diretor. FundouZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L A n n é e P s y c h o l o g i q u e , a primeite um programa e considera cada resposta do ra revista francesa de psicologia. Foi um dos aluno como certa manifestação que permite fundadores da psicologia experimental franceesta ou aquela interpretação de seu comporsa. Criou um laboratório de docência experitamento. Em geral, para a pesquisa é formamental em Paris e também publicou estudos do um grupo de 4 ou 5 alunos. As perguntas sobre a sugestão e a histeria. Com Th. Simon, podem variar enormemente, e o programa do criou um método para medir a inteligência, exexperimento pode ser aplicado nas formas plicado no presente capítulo. Essa escala de memais diversas e flexíveis. dição da inteligência foi realizada a pedido do É possível unir uma série de diferentes Ministério de Instrução Pública da França, a programas compostos de tal modo que, no repartir de 1905. Cf. A. Binet e Th. Simon, O d e sultado final, seja possível obter uma caractes e n v o lv im e n to d a i n t e l i g ê n c i a n a s c r i a n ç a s , trad. russa de 1911. rização integral do aluno. Ao mesmo tempo, 2. Theodore Simon (1873-1961) foi um psiquiaos dados obtidos são qualificados de acordo tra francês que estudou a relação entre o decom três valorações: normal, acima e abaixo senvolvimento corporal das crianças e sua cada norma. O círculo está dividido em setores, pacidade intelectual. Trabalhou com crianças e cada um deles corresponde a algum aspecto portadoras de deficiências mentais em um lado comportamento. De acordo com a avaliaboratório de psicologia fisiológica, para o qual ção de uma determinada função, esta é assi- , , 294RQPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA também convidou Binet. Juntos, elaboraram a cos de oxímoron são: "neve ardente", "vitoriosa derrota", etc. famosa escala que leva seus nomes. 3. Aqui, Vigotski se refere a G. I. Rossolimo,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA P s ijo 6. Aleksandr Fiodorovitch Lazurski (1874-1917 foi lo g u ic h ie s k i p r o J ili. K o lic h ie s tv ie n o ie is lie d o v a n ie um psicólogo russo que estudou a personalidau n o r m a ln o m i p a q to lo p s i i j i c h i e s k i j p r o t s i e o v ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA de e o caráter. Preocupou-se com a busca de g u ic h ie s k o m s o s to ia n ia j [ P e r fis p s ic o ló g ic o s . U m a métodos confiáveis para pesquisar a psique da p e s q u i s a q u a n t i t a t i v a d o s p r o c e s s o s p s í q u i c o s em criança. A concepção do "experimento natural" está exposta em seu manual: A. E Lazurski, e s t a d o s n o r m a i s e p a t o l ó g i c o s ) , Moscou, 1910. P s ijo lo g u ia o b s c h a ia i e k s p e r im e n ta ln a is [ P s ic o Grigori Ivanovitch Rossolimo (1860-1928) foi de cuja terceira edium neuropsicólogo russo que inventou uma lo g ia g e r a l e e x p e r im e n ta l), ção, publicada em 1925 em Leningrado, Vigotski grande variedade de instrumentos médicos. foi co-editor,junto com A. R. Luria, N. E Dobrinin Criou uma bateria de testes para estabelecer o e V.A . Artiomov, seus colegas do Instituto de estado das funções psíquicas em pacientes com lesões cerebrais. Uma neurite e um reflexo lePsicologia - e autor do prólogo. O prólogo foi vam seu nome. escrito em 1924 (cf. O b r a s ... , op. cit., p. 23-37). 4. Já dissemos no prefácio que a tradução de A primeira edição desse livro tinha sido Silverman tem numerosas supressões, das quais publicada 15 anos antes e considerava-se que o destacamos apenas algumas. E s t a , porém, deve manual podia continuar sendo útil, ante a auser assinalada: precisamente aqui termina o sência de outros, embora fosse necessário Capo 18 na edição norte-americana deste livro. atualizá-Ia. Para isso, Vigotski e colegas supriTudo o que vai daqui até o fim do capítulo simmiram um capítulo - sobre as vivências religioplesmente foi eliminado! sas - e muitos trechos, que iam de um par. de palavras a uma página inteira; entre colchetes, 5 G r o s s o m o d o , Vigotski se refere à figura retórica denominada "oxímoron", Exemplos clássitambém acrescentaram muita coisa . ... ..-_-. . . A P s ic o lo g ia e o P ro fe s s o r do professor. No entanto, no presente livro esboçamos mais de uma vez considerações geD O T R A B A L H O D O C E N T E zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA rais sobre a questão, pois, sem nenhuma disAté aqui nos ocupamos da psicologia do cussão sobre elas, a obra ficaria incompleta. Por isso, na conclusão do livro, corresponde processo pedagógico do ponto de vista do educando. Empenhamo-nos em esclarecer as leis e discutir essas considerações básicas, para cominfluências às quais a educação está subordinapletar e terminar a apresentação. da em relação à criança. As molas psicológicas Devemos dizer que cada teoria da educado processo educacional, ínsitos à psique infanção apresenta suas próprias exigências ao protil, constituíram o tema de todas as nossas confessor. Para a pedagogia de Rousseau, o prosiderações anteriores. Assim é apresentada a fessor é o guardião e o protetor da criança conquestão na maioria dos atuais cursos de psicotra a corrupção e as más influências. Para Tolstoi, [o educador] deve ser necessariamente logia pedagógica. Entretanto, esse estudo é sumamente inuma pessoa virtuosa que, com seu exemplo completo e unilateral. Para abranger totalmenpessoal, contagie a criança. Para a pedagogia é aquele que sabe cumas cética, o educadorZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA te o processo integral da educação e apresenprir o preceito: "Quebre a vontade de sua criantar à luz da psicologia todos os principais asça para que não se arruíne". NoZYXWVUTSRQPONMLKJI D o m o s tr o i' pectos de seu transcurso, também é preciso também são exigidas novas qualidades do edulevar em conta a psicologia do trabalho docador, quando se prescreve: cente e mostrar a que leis ela está sujeita. Isso não pode ser incluído no objetivo deste breve capítulo final; só poderia ser desenvolvido em Castigue seu filho desde a juventude e ficará um curso completo de psicologia pedagógica, tranqüilo na velhice e dará beleza à sua alma. E não desanime no momento de espancá-Ia; porém essa é uma questão do futuro. se bater nele com uma vara ele não morrerá, A ciência ainda não chegou aos dados e mas ficará mais sadio. Espanque-o, portanto, às descobertas que lhe permitiriam encontrar no corpo, e assim livrará sua alma da morte. a chave para a psicologia do professor. Dispomos apenas de dados fragmentários, observaPara Guyau, um professor é um hipnotições descontínuas ainda não organizadas em zador, e os bons professores devem se parecer um sistema, e algumas tentativas de natureza com os hipnotizadores, ou seja, devem induzir puramente prática relacionadas à seleção e submeter a vontade alheia. Para Pestalozzí? psicotécnica dos professores. Cabe observar e Froebel," o educador é o jardineiro das crianque, também no campo da psicotécnica, a elaças. Para Blonski, o educador é um engenheiboração de um psicograma do professor aprero que usa a antropotécnica [antropotejnika] senta maiores dificuldades que para as demais e a pedotécnica, isto é, um engenheiro cuja profissões [cf Capo 16]. ciência do cultivo dos seres humanos funciona Assim, temos de admitir que será difícil como o cultivo das plantas e a criação do gado, escrever agora, na área da psicologia pedagócomo uma ciência semelhante a estas. gica, um capítulo científico sobre o trabalho A NATUREZA P S IC O L Ó G IC A 296ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Muitos compararam o trabalho do professor com o do artista, destacando como fundamentais os aspectos da criação individual. Outros, pelo contrário, como Kornenski," por exemplo, afirmaram que "cabe desejar que o método do ensino humano seja mecânico, isto é, deve prescrever tudo de forma tão definida que tudo o que se aprende e estuda certamente será bem-sucedido". Esse mesmo autor denominou o ensino "máquina [mashina] didática". Pestalozzi apoiou o mesmo critério. Conseqüentemente, vemos que cada no, ção sobre o processo pedagógico está ligada a um critério particular sobre a natureza do trabalho do educador. Por isso, compreende-se que o novo ponto de vista pedagógico que pretende criar um novo sistema de educação também suscite um novo sistema de psicologia pedagógica, isto é, uma disciplina científica que o justifique. Mas subentende-se que o novo sistema de psicologia pedagógica, ou seja, o novo critério sobre a natureza do processo educativo, que tenta esclarecer absolutamente todos os aspectos e elementos a partir de uma concepção unifica da, leve a uma nova concepção do trabalho do professor. Em um dos primeiros capítulos [o Capo4] destacamos que, do ponto de vista de seu próprio trabalho, o professor representa uma pessoa envolvida em um fenômeno essencialmente dual, como qualquer tipo de trabalho humano. O professor atua, por um lado, no papel de simples fonte de conhecimentos, de livro de consulta ou dicionário, de manual ou expositor, em uma palavra, de auxiliar e instrumento da educação. Ao mesmo tempo, é fácil perceber que,justamente esse aspecto do trabalho docente - como já se demonstrou - na escola czarista constituía nove décimas partes do conteúdo de todo o trabalho do professor. Agora, esse papel vai se anulando cada vez mais e é substituído de todas as maneiras possíveis pela energia ativa do próprio aluno, que deve buscar os conhecimentos, buscálos sozinho, mesmo quando os recebe do professor, sem deglutir o alimento que este lhe oferece. Já abandonamos o preconceito de que supostamente o professor deve educar. Estamos longe desse critério, assim como daquele que pressupõe que o homem deve carregar fardos pesados. Nesse sentido, Ellen Key está certa, ao dizer que o verdadeiro segredo da educação reside em não educar. Como todos os outros processos da natureza, o de desenvolvimento está submetido às mesmas leis férreas da necessidade. Portanto, os pais e educadores "têm tanto poder ou direito de prescrever as leis a esse novo ser quanto de indicar às estrelas seu caminho"." O aluno se auto-educa. As aulas do professor podem ensinar muito, mas só inculcam a habilidade e o desejo de aproveitar tudo o que provém de mãos alheias, sem fazer nem comprovar nada. Para a educação atual não é tão importante ensinar certa quantidade de conhecimentos, mas educar a aptidão de adquirir esses conhecimentos e valer-se deles. E isso só se consegue - assim como tudo na vida - no próprio processo de trabalho e da conquista do saber. Como não se pode aprender a nadar permanecendo na margem e, pelo contrário, é preciso se jogar na água mesmo sem saber nadar, a aprendizagem é exatamente igual, a aquisição do conhecimento só é possível na ação, ou seja, adquirindo esses conhecimentos. Portanto, o professor tem um novo e importante papel. Ele tem de se transformar em organizador do ambiente social, que é o único fator educativo. Sempre que ele age como um simples propulsor que lota os alunos de conhecimentos, pode ser substituído com êxito por um manual, um dicionário, um mapa ou uma excursão. Quando o professor dá uma aula ou explica uma lição, ele assume só em parte o papel de professor, precisamente na parte de seu trabalho em que estabelece a relação da criança com os elementos do ambiente que agem sobre ela. Mas sempre que expõe apenas fragmentos de algo preparado, ele deixa de ser professor. O maior perigo ligado à psicologia do professor consiste precisamente no fato de que, em sua personalidade, esse segundo aspecto tende a predominar. Ele começa a se sentir no papel de instrumento da educação, no papel de um gramofone que não temZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFE v e z própria e canta o que o disco lhe indica. Temos de dizer francamente que, desse modo, toda profissão docente imprime traços típicos permanentes , P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 297 em seu portador e cria lamentáveis figuras que tos que respiram atividade e vida. Em qualassumem o papel de apóstolos da redundânquer tarefa docente antes da Revolução [de cia. Não é por acaso que o professor, esse deOutubro], sentia-se um certo cheiro azedo de pósito ambulante de dados, sempre pareceu mofo, como a água estagnada que não flui. E uma figura humorística, objeto de brincadeiisso não era superado pela teoria corrente soras e burlas, e sempre foi um personagem côbre a missão sagrada do professor, sobre sua mico, começando pelas comédias antigas e tercompreensão dos objetivos ideais. minando com os relatos contemporâneos. OZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Os psicólogos exigiram do professor uma H o m e m n o e s t o j o de Tchekov, ou esse [outro] inspiração educativa que, em seu parecer, depersonagem seu que dizia permanentemente finia a personalidade docente. Tratava-se da "o Volga desemboca no Mar Cáspio" e "o cavareceptividade interna do professor. Expriminlo come aveia e feno" são terríveis justamente do com maior clareza esse ponto de vista, porque representam uma imagem vívida de Münsterberg [p. 316J afirma: falta de personalidade, do sentimento e do pensamento definitivamente perdidos." o professor que não sente a beleza e a sanO fato de que o [rio] Volga desemboca tidade de sua vocação, que não entrou na escola porque seu coração está repleto do no Mar Cáspio é de extraordinária importândesejo de ensinar a juventude, mas só para cia científica, de enorme significado educatiter trabalho e se sustentar, esse professor vo; portanto, o ridículo não reside nisso. O riprejudica os alunos e prejudica ainda mais dículo é que esse fato se transformou em uma a si mesmo." capa em torno do homem que a usa durante a vida inteira e, por isso, deixa de existir. Em uma Exigia-se inspiração do professor e, com velha comédia sobre esse tipo de professor de esse entusiasmo, ele devia alimentar o aluno. estojo, diz-se que a verdade não é muito inte[Continua o mesmo autor, p. 317:J ligente se, na maioria das vezes, seus pregadores são tontos. Pode-se dizer do professor que está atrás de O que se expõe aqui de forma caricatural sua mesa o mesmo que do sacerdote que está é, em essência, o traço que apresenta o profesno púlpito: sem fé no coração, está condenasor tratado como uma ferramenta da educado. [...] Em compensação, quando o entusiasÉ sumamente curioso que os mesmos tição.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA mo comove sua alma, tudo se toma vivo e pos de professores pintados por Tchekov taminspirador. [...] Não é preciso distorcer a persbém existam entre os professores que dão aupectiva, não há necessidade de falar dos verlas de estética durante 30 anos sem compreenbos irregulares como se fossem o centro do der nada do assunto e estão plenamente mundo intelectual. Cada coisa deve permaconvencidos de que o importante não é necer em seu lugar e deve ser explica da de tal modo que a importância do saber, tomado em Shakespeare, mas as notas acrescentadas à sua seu conjunto, baseia-se em cada partícula. É obra. A essência do assunto, portanto, não reclaro que o professor se interessa por um maside de forma alguma na escassa quantidade terial particular porque é consciente de sua de conhecimentos, na limitação dos horizonrelação multiforme com outros problemas tes, nem na insignificância dos próprios fatos. mais vastos. O verdadeiro interesse do proA essência do assunto não reside no fato de fessor tem a ver com o que não pode mostrar que o homem não é muito brilhante e sabe ao aluno, porém em sua mente serve como pouco, mas no fato de que a transformação do fundo geral para os elementos que expõe. Por homem em uma "máquina educativa" o ofusoutro lado, o interesse do aluno é estimulado, ca de forma extraordinária, por sua natureza porque o entusiasmo do professor se transfepsicológica. re ao material que ele ensina e que, em caso contrário, seria indiferente. Portanto, a exigência fundamental que as novas condições impõem ao professor é a mais Essas palavras foram ditas por Münsterberg, completa rejeição a esse estojo e, em contraum dos fundadores da psicotécnica, e ele não partida, o desenvolvimento de todos os aspec-RQPONMLKJIHGFEDCBA 298RQPONMLKJIHGFEDCBA L 1 E V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA encontrou nada melhor que a fé entusiasta no valor dos ideais humanos para nela basear o trabalho docente. Desse ponto de vista, o certo se mistura ao incorreto. Ele está profundamente correto quando, em linguagem psicológica, exige do professor certo temperamento emocional inato. Aquele que não é ardente nem frio; mas só temperado, nunca poderá ser um bom professor. Münsterberg [p. 320] também tem razão quando destaca o perigo de que o trabalho docente passe cada vez mais às mãos das mulheres:ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA , . Se a educação dos meninos pequenos durante os anos em que suas características viris se desenvolvem estiver a cargo de mulheres, isso não pode deixar de representar um perigo para os melhores interesses da comunidade. Também é verdade que, devido à correlação econômica de forças, a profissão de professor se transformou no lugar para o qual confluem todos os desadaptados, os frustrados, os que sofreram fracassos em todos os campos da vida. A escola é o cais para o qual a vida leva os barcos que precisam de conserto. Por isso, para a profissão de professor cria-se uma seleção natural de um material humano fraco, impróprio e mutilado. É simbólico o fato de que, em certa época, os soldados que passavam para a reserva se transformavam em professores. Também agora os soldados que já se retiraram da vida representam três quartas partes dos professores. Um professor escreveu o seguinte: É terrível que, entre os professores, haja tantos solteirões de ambos os sexos e, em geral, todos os tipos imagináveis de fracassados. Como é possível confiar a vida das crianças a quem não conseguiu realizar sua própria vida? É preciso dizer francamente que só os mais aptos podem se tornar professores. O ponto de vista atual também coincide nesse ponto. Por outro lado, também há um consenso de que o professor tem de saber muito. Deve dominar por completo o tema que ensina. Diz Münsterberg: Um professor deve beber de uma copiosa fonte. Não é suficiente saber o que, de acordo com suas exigências, os alunos devem saber, nem que prepare à noite, apressadamente, as respostas às perguntas que lhes fará na manhã seguinte. Só pode dar respostas interessantes aquele que pode dar cem vezes mais do que lhe corresponde. Quando o professor explica qualquer poema simples, há uma enorme diferença se ele conhecer ou não toda a literatura; sua aula de ciências naturais pode apresentar os mais simples elementos mas, de qualquer forma, estes fazem imaginar as imensas perspectivas da ciência contemporânea. Isso pode ser comparado com o processo de caminhar; podemos nos sentir seguros quando andamos desde que o caminho seja visível a uma distância de mil passos e esteja livre de obstáculos. Esse exemplo esclarece bem o papel atribuído na atual pedagogia aos conhecimentos especializados. Se para dar um passo real, para apoiar nosso pé, é necessário um espaço sumamente estreito, para que, então, precisamos de um caminho amplo e aberto? O pé não precisa disso, mas a visão sim, para orientar e regular o movimento do pé. O mesmo acontece com o professor que, embora tenha sido eximido de instruir, tem de saber muito mais que antes. [... ] Para orientar os próprios conhecimentos do aluno é preciso saber muito mais que ele. Até agora, o aluno sempre descansava no esforço do professor. Olhava tudo com seus olhos e julgava com sua mente. Está na hora de ele usar seus próprios pés e compreender que o professor pode ensinar muito poucos conhecimentos ao aluno, assim como não é possível uma criança aprender a caminhar por meio de aulas, nem com a mais cuidadosa demonstração da marcha artística de um professor. Deve-se impulsionar a própria criança a andar e cair, sofrer a dor dos machucados e escolher a direção. E o que é verdade com relação a caminhar - que só se pode aprender com as próprias pernas e com as próprias que- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 299 das - também pode ser aplicado a todos os mular o sentido do aluno e inspirá-Ia. Mas aspectos da educação. mesmo quando a inspiração chegava à consEntretanto, existe uma profunda diverciência dos alunos, sempre era mal orientada gência entre a linha da pedagogia czarista e a e se transformava em adoração ao professor, nova no que se refere à teoria da inspiração assumindo formas profundamente antipedaidealista do professor. Münsterberg diz algo gógicas. sumamente correto quando se refere ao vínEm nenhuma parte a doença da pedagoculo de cada fato particular com o valor global gia czarista perfilava-se com tamanha clareza de todo um tema e quando diz que a vivência quanto nos casos em que, em vez de uma guerdo valor deve ser comunicada ao aluno mesra franca entre aluno e professor, surgiam remo quando se estudam os verbos regulares. O lações amistosas. Esse endeusamento do "proerro reside apenas na determinação dos meios fessor predileto", que assumia a forma de adocom cuja ajuda os psicólogos esperavam obter ração, de fato constituía um sério problema o sucesso desejado. psicológico, similar àquilo que, na psicanálise, Eles consideravam que a garantia desse é chamado de "transferência". Os psicanalisêxito estava na inspiração que o professor contas entendem por isso a relação falsa que surtagia, na experiência que está na própria menge entre o neurótico e o médico que o trata, te do professor, no interesse que surge no aluquando se encontra na personalidade do méno inspirado por um professor. Mas esse consdico o mórbido interesse neurótico, quando se titui o maior dos erros psicológicos. Em privinculam a ele os interesses que alimentam a meiro lugar, a inspiração representa psicologineurose e quando essa personalidade forma camente um processo tão raro e difícil de reum tabique entre o meio circundante e o mungular que, sobre essa base, é impossível consdo interno do paciente. truir qualquer tarefa vital. Ou se obtém uma Portanto, a tarefa consiste em provocar falsa inspiração - essa imagem de falsa paixão no aluno sua própria inspiração e não em presquando o professor fala dos verbos irregulares crever ao professor - como se fazia nas circucomo se realmente fossem o centro do univerlares do Ministério Prussiano de Educação so -, ou se consegue uma inspiração que não que se entusiasmasse ao descrever a história contagia, como a de um ator que sofre sinceda pátria. ramente e chora com lágrimas de verdade, mas A inspiração é parente do charlatanismo; provoca riso no espectador. Quantas vezes um o entusiasmo, da fraude. Há uma idade para a inspiração inclusive na poesia, esse eterno reprofessor entusiasta está em uma situação semelhante! fúgio dessa força escura. Dificilmente um emQualquer um de nós também recorda o presário norte-americano confiaria a direção outro nobre tipo de professor, isto é, o Dom de sua fábrica à inspiração do diretor e o coQuixote idealista que se entusiasmava sem cesmando de um barco ao entusiasmo do capisar com os contornos da Líbia ou da ilha de tão. Sempre preferirá um engenheiro especializado e um sábio marinheiro. Está na hora Madagascar, para o imenso regozijo de seus de que também a pedagogia comece a trilhar alunos. esse caminho e busque pessoas que conheçam Na verdade, não basta ser um professor exatamente as leis e a técnica dos caminhos inspirado, porque nem sempre essa inspiração pelos quais se cria na alma infantil a própria chega ao aluno. Seria melhor fazer com que os alunos se entusiasmassem por si mesmos. Cosinspiração. tumava ser ainda pior quando não havia insConseqüentemente, oZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCB c o n h e c im e n to exapiração e - como em um frio ator - aparecia to d a s l e i s d a e d u c a ç ã o é, s o b r e t u d o , o q u e s e e x i g e d o p r o f e s s o r . Nesse sentido podemos aplino professor um fervor afetado, retórico, que car a expressão de Münsterberg de que devem encontrava uma magnífica expressão no estilo de alguns dos manuais da época pré-revolucioexistir muitos tipos de professores e que, apesar disso, o autêntico professor sempre é igual. nária, quando a história ou a geografia era Esse é o professor que constrói seu trabalho exposta em um tom altissonante, a fim de esti-RQPONMLKJIHGFEDCBA 300 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA educativo, não com base na inspiração, mas no conhecimento científico. A ciência é o caminho mais seguro para a conquista da vida. No futuro, todos os professores basearão seu trabalho na psicologia, e a pedagogia científica se transformará em uma ciência exata baseada na psicologia. Segundo Blonski, a pedagogia científica deve se fundarna psicologia pedagógica científica, isto é, biossocial. Desse modo, em vez de ter um curandeiro teremos um cientista. Assim, a primeira reivindicação que apresentamos ao professor é que ele seja um profissional cientificamente formado, que seja um verdadeiro professor antes que um matemático, um lingüista, etc ... Só conhecimentos exatos, cálculo exato e pensamento lúcido podem se transformar em verdadeiros instrumentos docentes. Nesse sentido, o ideal primitivo do professor-babá que exigia que, entre suas qualidades, estivessem a receptividade, a doçura e o desvelo, não corresponde de forma alguma aos nossos gostos. Pelo contrário, para um psicólogo, a escola czarista deve ser condenada pelo mero fato de ter transformado a profissão de professor em algo que requeria muito pouco talento. Reduzia o processo educativo a funções tão monótonas e insignificantes que sistematicamente pervertia o professor da forma mais profunda possível. E não se trata de um paradoxo psicológico o fato de que as notas e a cela de castigo, os exames e a vigilância pervertessem mais o professor que o aluno. O ginásio exercia maior ação educativa sobre os professores que sobre os alunos. E um psicólogo poderia escrever mais de uma página interessante caso decidisse se ocupar da psicologia do professor da época czarista. Agora, à luz da psicanálise, podemos dizer com franqueza que o sistema pedagógico organizado antes da Revolução era um lugar propício para a formação de todas as anormalidades possíveis do professor e, no sentido cabal dessa palavra, criava a neurose docente. Nesse sentido, o personagem de Sologub, Peredonov; não representa uma invenção absurda nem monstruosa." Atualmente, com a crescente complexidade das tarefas exigidas ao professor, a quantidade de recursos que se exigem dele se tor- nou tão infinitamente diversa e se complicou tanto que, se um professor desejar ser um pedagogo cientificamente formado, vai ter de aprender muito. Antes se desejava apenas que conhecesse sua matéria e o programa e que soubesse dar alguns gritos na sala de aula ante um caso difícil. Hoje a pedagogia se transformou em uma arte verdadeira e complexa, com uma base científica. Portanto, exige-se do professor um elevado conhecimento da matéria e da técnica de seu trabalho. Além disso, o próprio método de ensino exige do professor a mesma atividade e o mesmo coletivismo [espírito de grupo] que deve impregnar a alma da escola. O professor deve viver na coletividade escolar como parte inseparável dela e, nesse sentido, as relações entre professor e aluno podem alcançar tal vigor, limpeza e elevação que não encontrarão nada igual em toda a gama social das relações humanas. Mas tudo isso representa apenas a metade do problema. A outra metade consiste em que o professor também tem de responder a uma exigência precisamente oposta. Deve ser professor até o fim e, também, não deve ser apenas professor ou, mais exatamente, deve ser algo além de sua condição de professor. Por mais estranho que possa parecer, o magistério como profissão representa, do ponto de vista psicológico, um fato falso e, sem dúvida, desaparecerá em um futuro próximo. Naturalmente, isso não significa desdizer o qp.e se expôs anteriormente sobre a extraordinária complexidade dos conhecimentos especializados de um professor. O professor do futuro não será um instrutor, mas um engenheiro, um marinheiro, um militante político, um ator, um operário, um jornalista, um cientista, um juiz, um médico, etc. Isso não implica, porém, que tenha de ser um diletante em pedagogia. Na própria natureza do processo educativo, em sua essência psicológica, está implícita a exigência de um contato e de uma interação com a vida que sejam o mais estreito possível. Em suma, só a vida educa e, quanto mais amplamente a vida penetrar na escola, tanto mais forte e dinâmico será o processo educativo. O maior pecado da escola foi se fechar e seZYXWVUTSRQ . - -'-._ , P S IC O L O G IA isolar da vida mediante uma alta cerca. A educação é tão inconcebível à margem da vida como a combustão sem oxigênio ou a respiração no . vácuo. Por isso, o trabalho educativo do pedagago deve estar sempre vinculado a seu trabalho social, criativo e relacionado à vida. Só quem assume um papel criativo na vida pode aspirar à criação na pedagogia. Por isso, futuramente o professor também será um participante ativo na vida. Tanto no âmbito da ciência teórica, do trabalho ou da atividade prática social, sempre relacionará a escola com a vida através do ensino. Dessa maneira, o trabalho pedagógico estará "inevitavelmente unido ao vasto trabalho social do cientista ou do político, do economista ou do artista. Na cidade do futuro certamente não haverá nenhum edifício com a placa de "escola", porque a escola, que significa - no sentido exato da palavra - "ócio"? e que destinava pessoas especiais e um prédio especial para as tarefas "ociosas", passará a pertencer por completo ao âmbito do trabalho e da vida, e estará na fábrica e na praça e no museu, e estará no hospital e no cemitério. Como diz Münsterberg [p. 317]: Em cada sala de aula há uma janela; o autêntico professor observará, de sua mesa de trabalho, o vasto mundo, as inquietações das pessoas, as alegrias e deveres da vida ... [...]. P E D A G Ó G IC A 301 trário: seu papel tem aumentado enormemente, exigindo dele umZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA e x a m e s u p e r i o r de v i d a , para poder transformar a educação em uma criação da vida. ~. A V ID A C O M O C R IA Ç Ã O A lamentável que exista até hoje a convicção de que o processo educativo, que se expressa na relação entre professor e aluno, se esgota na imitação, como se isso fosse o mais importante. Inclusive nos novos sistemas de pedagogia marxista por vezes se diz que o reflexo de imitação é o fundamento da educação: o professor deve fascinar, cativar o organismo que se educa com o conteúdo atraente de seu próprio exemplo; do contrário, todas as tentativas de colocar em movimento o aparelho refletor do educando serão infrutíferos. (A. Zalkindj '? Tudo isso é essencialmente errôneo.ZYXWVUTSRQ À medida que, no mundo dos conhecimentos científicos, o próprio processo pedagógico está se transformando, modifica-se também a noção relativa ao fundamento e à natureza da educação. Acima de tudo, amplia-se o próprio conceito de educação. Não se trata apenas da educação, mas da "refundição do homem", conforme a expressão de Trotski." Mas essa refundição, como já reiteramos, precisa utilizar ao máximo o material inato do comportamento. Por isso, nenhuma das reações da criança deve se perder em vão. James diz o seguinte: E na escola do futuro essas janelas estarão abertas de par em par, e o professor não só olhará, mas também participará ativamente dos "deveres da vida". O cheiro de mofo e podridão em nossa escola devia-se ao fato de que, Peço-lhes que respeitem as reações inatas, innela, as janelas para o amplo mundo estavam clusive quando quiserem destruir seu vínculo hermeticamente fechadas e, sobretudo, fechacom certos objetos, para substituí-los por oudas na alma do próprio professor. tros que desejam transformar em regras. Do Muitos consideram que, no novo sistema ponto de vista da arte do professor, o mau pedagógico, atribui-se um papel insignificante comportamento é um ponto de partida tão ao professor, que esta é uma pedagogia sem válido como o bom comportamento; na verpedagogo e uma escola sem professor. Pensar dade, com freqüência ele é melhor que o bom, que, na escola futura, o professor não fará por mais paradoxal que isso possa parecer. [W nada, equivale à idéia de que o papel do ser James, Talks to T e a c h e r s ... , op. cit. no Capo 1, p.45-46.] humano na produção mecânica se reduziu ou anulou. Superficialmente, pode parecer que na nova escola o professor se transformará em um O caráter criativo do processo pedagógiboneco mecânico. Na verdade, ocorre o con-RQPONMLKJIHGFEDCBA co emerge claramente. Assim é possível com- 302 L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA preender a natureza criativa do processo educativo orientado, não ao mero cultivo dos dons naturais, mas à criação de uma vida humana "supranatural" ., Nesse sentido, a atual pedagogia diverge radicalmente da teoria da educação natural, cujo ideal está no passado. Para Tolstoi e Rousseau, a criança representa um ideal de harmonia que toda a educação posterior só arruína. Para a psicologia científica, a criança surge como um trágico problema na espantosa desproporcionalidade e desarmonia de seu desenvolvimento. Sem cair no paralelismo biogenético, podemos dizer, porém, que a criança recém-nascida é uma condensação da experiência anterior, uma biologia pura, e que durante vários anos de seu desenvolvimento realmente deve percorrer todo o caminho seguido pela humanidade, do macaco ao aeroplano. . Toda a diferença reside no fato de que esse caminho é percorrido pela criança com suas próprias pernas e não de forma paralela aos caminhos da história. Se levarmos em conta a enormidade desse caminho, é compreensível que a criança tenha de realizar uma luta cruel contra o mundo e, nessa luta, o professor terá de pronunciar a palavra decisiva. Nesse momento vem à nossa mente a idéia do ensino como guerra. James afirma: Quase três quartas partes das orientações de reflexos sociais atuais, devido à estrutura caótica da humanidade capitalista, são um sistema de fobias sociais, ou seja, de um hábil distanciamento das ações sociais valiosas; por isso, a educação no organismo de uma sólida resultante social é, em sua maior parte, uma luta encamiçada, oculta ou evidente, entre o educador e o educando. Por isso, a S o c i o g o [isto é] a P e d a g o g i a , a P s i c o t e r a p i a ) não g ia pode nem deve ser apolítica. O verdadeiro sociógogo, isto é, o educador - e não o gramofone - sempre é político. A educação de reflexos sociais é a educação de uma linha de conduta social do organismo, ou seja, a educação política. A pedagogia (a Sociogogia) nunca foi apolítica, pois o trabalho sobre a psique (os reflexos sociais) sempre inculcou, querendo ou não, esta ou aquela linha social, isto é, política, em correspondência com os interesses da classe social dominante que a guiavam. 12 , Por isso, os marcos da educação nunca se abriram tão amplamente quanto agora, quando a revolução empreende a reeducação de toda a humanidade e cria na própria vida uma orientação clara para a educação. Além disso, deve-se levar em conta que a Sociogogia do organismo provoca mudanças conseqüentes e profundas em toda sua orientação social reflexa, isto é, em todos seus reflexos sem exceção, pois todos estão impregnados de elementos sociais. A educação dos critérios, dos sentimentos, dos conhecimentos, das inclinações; tudo isso não passa de uma expressão parcial e incorreta de uma idéia geral sobre a educação do organismo em seu conjunto, em todas as suas funções, particularmente em sua parte social, pois a educação de determinados conhecimentos, sentimentos, etc. é simultaneamente a educação de determinado t i p o s o c i a l de respiração, digestão, etc. As opiniões e os sentimentos não podem ser separados teórica nem praticamente dos "órgãos" e deve-se terminar o antes possível com essa ficção. [ZaIkind] A ciência da psicologia e qualquer pedagogia científica geral baseada nela são muito parecidas com uma ciência da guerra. Em ambas, os princípios fundamentais são sumamente simples e definidos, [...] de modo que quem tiver assimilado os princípios científicos conquistará, tanto no campo de batalha quanto na sala de aula, vitórias permanentes. Mas em ambos os casos deve-se prestar atenção a outra magnitude, que não pode ser calculada, isto é, a mente do adversário. A mente do inimigo, o aluno, tenta paralisar os esforços do professor com o mesmo zelo com que a mente do comandante hostil tende a desbaratar os planos do general cientista. [W James,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA T a lk s t o T e a c h e r s ... , op. cit., p. 16-17.] Temos de acrescentar que também funções Portanto, a pedagogia vai abrindo passagem pelo lado da luta. [Diz] A. Zalkind: do organismo, como o crescimento e a formação dos ossos, dependem em boa parte da educação social. Portanto, a educação surge como o mais vasto problema do mundo, isto é, o problema da vida como uma criação. P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 303 se aclimatar e sua sinceridade pedagógica, as lições educativas derivadas disso, constituem a mesma rede da criação artística que acabamos de descrever. Um pedagogo-educador não pode deixar de ser um artista. Em um pedagoOs elementos fundamentais do processo da go, a total objetividade é um absurdo. O educriação artística não se distinguem, salvo na tensão quantitativa, de qualquer outro ato cador racionalista não educa ninguém. psíquico, nem mesmo do mais simples. Todo É claro para todos que, quanto mais inimpulso no aparelho psíquico do homem, uma tensa for essa sensação de incômodo que remudança insignificante na cadeia dos denopresenta o primeiro impulso para o movimenminados pensamentos, sentimentos, etc., é um to da psique, mais intenso será esse movimenato de adaptação social da personalidade, uma to; por isso, a educação e a criação sempre são manifestação de sua luta social pela autocontrágicas, porque sempre partem do "desconservação. Só o estado, de desconforto social forto" e do infortúnio, da falta de harmonia. A provoca uma mudança no aparelho psíquico. biologia não conhece a teleologia. O mundo O bem-estar absoluto lhe provocaria um sono não se desenvolve com um propósito racional profundo. A fonte de todo movimento da psiparticular. Precisamente, a infância é a etapa que, de uma idéia insignificante a uma descoberta genial, é a mesma. natural da educação porque se trata de uma etapa de enorme matiz trágico, de falta de harmonia e de correspondência entre o orgaQualquer idéia expressada, quadro pintanismo e o ambiente. A música da educação do ou sonata composta nasce de um estado de surge da pugna para resolver uma dissonância.ZYXWVUTS desconforto de seus autores, que tentam, mediÀ medida que envelhecemos, passamos a nos ante a reeducação, modificá-lo, no sentido de sentir mais adaptados e cômodos na vida, ressua máxima comodidade. Quanto maior é a tenta em nós menos espírito criador e, com maior são nesse sentimento de desconforto e, ao mesdificuldade, podemos receber a influência da mo tempo, quanto mais complexo é o mecaniseducação. mo psíquico do homem, mais naturais e Não se encontra em nosso caminho toda irresistíveis serão seus ímpetos pedagógicos e essa pedagogia que açucarava o "dourado temcom maior energia vão abrir passagem para fora. po da serena infância" e adoçava com água de O criador sempre pertence à raça dos rosas o processo pedagógico. Pelo contrário, desconformes. Por isso, a educação nunca pode sabemos que o mais poderoso motorda eduse limitar apenas à razão. Para tais obstáculos cação é o aspecto trágico da infância, como a e comoções deve haver uma afinidade interna fome e a sede são inspiradoras da luta pela entre o educador e o educando e uma proxiexistência. Por isso, a educação não deve oculmidade nos sentimentos e conceitos. A educatar nem velar os duros traços do autêntico "desção é um processo de permanente adaptação conforto" da infância, mas fazer a criança mútua de ambos os campos, em que o lado enfrentá-lo da forma mais aguda e freqüente mais ativo, o que toma a iniciativa, por vezes é possível e estimulá-Ia a vencê-Ia. o dirigente ou o dirigido. Ao mesmo tempo, a vida vai se revelanO processo pedagógico é a vida social atido como um sistema de criação, de permanenva, é a troca de vivências combativas, é uma te tensão e superação, de constante combinatensa luta em que o professor, no melhor dos ção e criação de novas formas de comportacasos, personifica uma pequena parte da clasmento. Assim, cada idéia nossa, cada um de se - com freqüência, ele está totalmente só. nossos movimentos e vivências constituem a Todos os seus elementos pessoais, toda a exaspiração a criar uma nova realidade, o ímpeperiência de sentimentos e pensamentos, além to para a frente, rumo a algo novo. da vontade, são utilizados sem cessar nessa A vida só se transforma em reação quanatmosfera de tensa luta social denominada trado se libera definitivamente das formas sociais balho pedagógico interno. Sua rede de insatisque a deformam e mutilam. Os problemas da fações pessoais, de incômodos, de esforços paraRQPONMLKJIHGFEDCBA Nesse sentido, A. Zalkind tem razão quando encontra afinidades entre o processo da criação artística e todos os outros atos psíquicos: 304RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA educação serão resolvidos quando se resolverem os problemas da vida. Então, a vida do homem se transformará em uma criação ininterrupta, em um ritual estético, que não surgirá da aspiração de satisfazer algumas pequenas necessidades, mas de um ímpeto criador consciente e luminoso. A alimentação e o sono, o amor e o jogo, o trabalho e a política, cada um dos sentimentos e cada uma das idéias se transformarão em objeto da criatividade. O que hoje se realiza nos limitados âmbitos da arte, posteriormente impregnará a vida inteira, e a vida 'Se tornará um trabalho criador. . Abrem-se para o educador infinitas possibilidades para a criação da vida em sua infinita diversidade. Para além dos estreitos limites da tarefa pessoal e da vida pessoal, ele se transformará em um verdadeiro criador do futuro. Então a pedagogia, como criação da vida, ocupará o primeiro lugar. Escreve Trotski: 13 Ao lado da tecnologia, a pedagogia, no sentido amplo da formação psíquica e física das novas gerações, passará a ser a rainha do pensamento social. Os sistemas pedagógicos unirão "partidos" poderosos ao seu redor. As experiências socialmente educativas e a emulação entre os diversos métodos adquirirão dimensões sociais que nem sequer em sonhos podemos imaginar. [...] ral da produção e da ideologia, substituindo a bárbara rotina pela tecnologia e a religião pela ciência. Depois expulsou o inconsciente da política, derrubando a monarquia e as castas com a democracia, com o parlamentarismo racionalista e depois com a transparência total da ditadura dos s o v i e t e s .14 O elemento obscuro tinha se entrincheirado mais solidamente nas relações econômicas; mas também daí o homem o está arrancando com a organização socialista da economia. [...] Por último, no canto mais profundo e escuro do inconsciente, do incontrolado, do subterrâneo, escondia-se a natureza do próprio homem. Não está claro que para aí estão orientados os maiores esforços do pensamento pesquisador e da iniciativa criadora? A espécie humana não deixou de se arrastar em quatro patas diante de Deus, dos Czares e do Capital, para se entregar submissamente às escuras leis da herança e à cega seleção sexual! O homem liberado quer alcançar um maior equilíbrio no funcionamento de seus órgãos, um desenvolvimento e desgaste mais uniformes de seus tecidos, para desterrar o medo da morte dentro dos limites de uma adequada reação racional do organismo ante o perigo; porque não resta dúvida de que a extraordinária falta de harmonia anatômica e fisiológica do homem e a extraordinária falta de uniformidade no desenvolvimento e no desgaste dos órgãos e tecidos é a causa que concede ao instinto vital a forma mórbida e histérica do medo à morte, que nubla a razão e alimenta as estúpidas e degradantes fantasias de outra vida além do túmulo. O homem finalmente começará a harmonizar seriamente seu próprio ser. Ele se proporá a meta de ministrar a mais elevada precisão, racionalidade, economia e, assim, beleza aos O homem se esforçará por dominar seus prómovimentos de seu próprio corpo no trabaprios sentimentos, por elevar seus instintos lho, em seu caminhar e no jogo. Pretenderá ao cume do consciente, por torná-los claros, dominar os processos semiconscientes e inpor canalizar sua força de vontade para suas conscientes de seu organismo: a respiração, a profundidades inconscientes; e, desse modo, circulação do sangue, a digestão, a reproduele mesmo se elevará a um nível mais alto;" ção e tentará, dentro dos limites necessários, a um tipo sociobiológico superior, ou mesmo subordiná-los ao controle da razão e da vona um super-homem. [León Trotsky, L i t e r a t u tade. [...] O hoje estagnadoZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA R o m a s a p i e n s se r a y R e v o lu c ió n , Buenos Aires: EI Yunque, transformará radicalmente e será, por suas 1974, p. 159-161.] próprias mãos, objeto dos métodos mais complexos de seleção artificial e adestramento psíquico e físico. NOTAS Essas perspectivas são conseqüência de todo o desenvolvimento do homem. Primeiro, o homem desterrou o obscuro elemento natu- 1. O D o m o s t r ó i é um tratado de moral, regras de comportamento e economia doméstica elabo- P S IC O L O G IA P E D A G Ó G IC A 305 rado na Rússia no século XVI. Vigotski, que dagogo humanista clássico. Estudou dois anos tanto gostava de citar a Bíblia, aqui não se reem Heidelberg. Quando tinha de retomar à Moravia, gastou todo o seu dinheiro, destinafere a ela; em "Provérbios", 13:24, pode-se ler o seguinte: "Quem não usa a vara, odeia seu do ao pagamento do transporte e da comida, em um 'exemplar do livro De r e v o l u t i o n i b u s filho; quem o ama, o castiga." 2. Johann Heinrich Pestalozzi (Neuhof, 1746o r b i u m c o e l e s t i u m , de Copérnico. Por isso, teve 1827) foi um pedagogo suíço, representante de percorrer centenas de quilômetros a pé em da Ilustração, que dedicou a vida inteiraZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA à educondições miseráveis, e esse episódio demonscação. Sofreu as influências de Rousseau e tra que tipo de pessoa ele era. Comenio Viveu durante a Guerra dos Trinta Anos, perdeu sua Basedow, o pedagogo alemão que criou o movimento pedagógico chamado "filantropismo". casa, sua biblioteca, manuscritos inéditos e sofreu vários exílios. Revolucionou a pedagoPestalozzi fundou orfanatos e escolas para crianças pobres em sua propriedade de Neuhof. gia em geral e o ensino do latim em particular; "Vivia o ano inteiro em companhia de mais de em sua época, foi traduzido para 16 idiomas. 50 crianças, filhas de mendigos; na pobreza Escreveu cerca de 200 obras. compartilhava meu pão com eles e eu mesmo 5. Ellen Key (1849-1926) foi uma educadora suevivia como um mendigo, para ensinar mendica, partidária da educação livre. Aqui Vigotski gos a viver como homens", escreveu em seu se refere a seu livro T h e C e n t u r y o f t h e C h i l d , C ó m o G e r tr u d is e n s e iia a s u s h ijo s cuja primeira edição foi em 1909, em inglês. melhor livro:ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA (edição em espanhol, Leipzig: Brockhaus, 6. Aqui, Vigotski menciona dois personagens de 1890. p. 2). Fracassou financeiramente nessa dois contos diferentes de Tchekov, que apresene em outras futuras experiências similares. Era tam características psicológicas semelhantes. O conhecido em toda a Europa. Froebel, Herbart personagem de H o m e m n o e s t o j o é um professor de grego chamado Belikov, que costumava e outros aprenderam com ele. Sua concepção repetir o vocábulo ''Anthropos'' (cf. A. P.Tchekov, ideal do ensino é a educação em coletividade; desenvolveu idéias sobre seqüências de aprenC o n t o s ... op. cit., p. 1194-1210). Não pudemos dizagens e ampliou a educação fundamental. encontrar o conto cujo personagem repete "o 3. Friedrich W A . Froebel (1782-1852) foi um Volga desemboca no Mar Cáspio". pedagogo alemão que concebeu a educação 7. Essa citação, como o resto das citações de como o desenvolvimento de aptidões que conHugo Münsterberg no presente capítulo, são siderava preexistentes ao homem. Foi um sede seu livro P s y c h o l o g y a n d t h e T e a c h e r , op. cito no Capo 1. Traduzimos do inglês as citaguidor de Pestalozzi. Criou um sistema original de educação pré-escolar: em 1837 fundou ções de Münsterberg e fizemos o mesmo com as de T a l k s to T e a c h e r s ... , de James, op. cito o primeiro K i n d e r g a r t e n [jardim de infância] I 8. Cf. a nota n!! 6 do capo 13. do mundo na cidade de Blankerburg, Turingia. 9. A palavra russa s h k o l a tem sua origem no vocáVigotski diria anos mais tarde que o 'jardim bulo grego c rX 0 /"'l1 ' [ s j o l e l , que significava "ócio". de infância" implicava uma "concepção botâ10. O texto de Zalkind ao qual se refere Vigotski nica do homem". Froebel foi um dos pioneiros neste capítulo é: A . B. Zalkind, O c h i e r k i k u l t u r i a destacar o papel do jogo como elemento educativo. Sua principal obra é D i e M e n s c h n e r r e v o lu ts io n o g o v r ie m ie n i [ E n s a io s s o b r e a c u lt u r a de t e m p o s r e v o l u c i o n á r i o s ] , Moscou, 1924. z i h u n g [ A e d u c a ç ã o do h o m e m ] , de 1826. 11. Essa expressão de Trotski aparece em vários 4. O original russo diz "Kamenski". T r a t a - s e de textos de Vigotski, entre eles P s i c o l o g i a da a r t e , u m a e r r a t a q u e c o r r i g i m o s - o original russo mas neste último, como em todas as edições do presente livro tem várias. Não há nenhuma posteriores à queda em desgraça de Trotski, dúvida de que se trata de Ia. Komenski [em f o r a m r e t i r a d a s a s a s p a s , para evitar a menção russo], ou Jan Amos Komensk [em tcheco], ou a seu autor. Das citações de Trotski neste capíComenius [em latim], ou Juan Amós Comenio tulo podemos dizer basicamente o que comen[em espanhol]. Aqui Vigotski cita o Prólogo de tamos na nota n!! 19 sobre Bukarin no Capo 13, sua obra mais importante, D id a c tic a m agna embora, no tocante a Trotski, as conseqüên(1632), que escreveu em tcheco e que traducias tenham sido mais graves. Liev Davidovitch ziu mais tarde para o latim, e da qual existe Bronstein Trotski nasceu em 1879 dentro do uma versão espanhola de S. López Peces (cf. R a y o n . Um mês mais tarde nasceu na Goérgia Madrid: Réus, 1922, 321 p.). Comenio Iósif [José] Dyugashvili Stalin, cuja primeira (Moravia, 1592-1670, Amsterdã) foi um pe-RQPONMLKJIHGFEDCBA 306RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA língua foi o georgiano. O russo foi a segunda língua de Stalin, que falava com marcante sotaque estrangeiro e nunca pôde redigir corretamente; entre seus escribas, o mais importante foi Piotr Nikolaievitch Pospielov. Trotski era filho de um camponês e uma mistura de ucraniano e russo foi sua primeira língua; na escola nunca aprendeu iídiche nem hebraico, mas o russo falado e escrito, que dominou como poucos. Foi um excelente orador e um agudo teórico marxista. Quando Lênin estava inválido, nos últimos anos de sua vida, rompeu suas relações pessoais com Stalin, e Trotski passou a ser seu mais próximo colaborador. Após a morte de Lênin, nas lutas internas do Partido bolchevique, Stalin se aproximou e se distanciou de Bukarin. Em compensação, Trotski sempre foi seu mais odiado inimigo político e pessoal. Trotski, um hábil militar, mas um torpe e ingênuo tático em assuntos políticos - pouco hábil para as intrigas -, foi derrotado por Stalin, que possuía uma excepcional habilidade tática. Trotski, que tinha liderado com Lênin a Revolução de Outubro e que comandara e triunfara na Guerra Civil, foi expulso da URSS em 1929. Perambulou anos pelo mundo como pária, até que o México lhe ofereceu asilo. Viveu em uma fortaleza nos subúrbios da cidade de México. Embora estivesse permanentemente protegido por um grupo de militantes armados, isso não impediu que Ramón Mercador, um catalão membro dos serviços secretos de Stalin, o assassinasse em 1940, enfiando um machado em seu crânio. Em sua figura, Stalin encarnou todos os demônios inimigos da URSS. P s i c o l o g i a p e d a g ó g i c a de Vigotski não O livroZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA pôde ser reeditado, sobretudo pela presença dessas citações de Trotski, mesmo em plena p e r e s t r o i k a de Gorbachov (G. Vigodskaia, C.p., 1988). Poder-se-ia argumentar que o livro poderia ter sido podado, como se fizera com P s i c o l o g i a da a r t e na década de 60 e com as O b r a s E s c o g i d a s na década de 80, mas isso não era mais viável na atmosfera oficial da g l a s n o s t [transparência] . 12. O grifo dessa citação é nosso. "Sociogogia" [ s o t s i a g o g u i k a ] é um neologismo inventado por Zalkind e está traduzido literalmente. 13. A seguir, Vigotski conclui o presente livro com uma extensa citação: longos parágrafos de "Arte revolucionária e arte socialista", o último capítulo do livro de Liev Trotski, L i t e r a t u r a i R e v o lu ts ia [ L ite r a tu r a e R e v o l u ç ã o ] , Moscou, 1923. Como avisamos no prefácio, restaura- mos as elipses não-indicadas por Vigotski. Na edição norte-americana do presente livro, as aspas de fechamento foram colocadas no final do 1 parágrafo, de modo que o resto do longo texto de Trotski foi mal-interpretado, como se fosse de autoria de Vigotski. 1 4 . S o v i e t e é um vocábulo russo que significa "conselho". Nos primeiros anos da revolução russa, os s o v i e t e s eram integrados fundamentalmente por operários e soldados, a maioria de origem camponesa. A democracia socialista se baseava no poder dos s o v i e t e s ; um famoso slogan de Lênin foi "Todo o poder para os s o v i e t e s " . Durante o stalinismo, seu poder foi transferido para a cúpula do Partido Bo1chevique e se transformaram em meros "conselhos deliberantes" com escassa autonomia, que desempenharam o papel de correias de transmissão das decisões tomadas pelo Estado. Vigotski foi deputado do Soviete do distrito Frunze de Moscou, cerca de 1931, onde participou da elaboração de políticas para a educação pública. A foto de sua carteira de deputado, que encontramos nos arquivos privados de sua filha, na década de 80, em Moscou, está reproduzida em L. S. Vigotski, E l D e s a r r o l l o C u l t u r a l d e l N i n o y o t r o s t e x t o s i n é d i t o s , edição de G. Blanck, Buenos Aires: Almagesto, 1998, p. 30. Na edição de 1970, por exemplo, do D i c c i o n a r i o de l a L e n g u a Espaiiola da Real Academia, não aparece o vocábulo "soviete". Em compensação, as edições publicadas depois do desaparecimento da URSS contêm o termo. 15 Justamente aqui se encontram, no original russo, as aspas de fechamento da citação de Trotski. Se Vigotski tivesse feito isso'de forma deliberada para ficar com a última palavra, teria feito uma paráfrase do que segue. No entanto, esse suposto arremate final coincide totalmente com o que diz o texto de Trotski. Trata-se de um descuido de Vigotski ou de uma e r r a t a da gráfica e por isso a c o r r i g i m o s . Por outro lado, é característico do estilo de Vigotski finalizar um texto com uma citação. Seja qual for o caso, consideramos necessário esclarecer que o conceito de "super-homem" de Trotski e de Vigotski é e s s e n c i a l m e n t e diferente do de Nietzsche. Cf. o artigo "La Modificación Socialista del Hombre" (p. 120-121), incluído na antología: L. S. Vigotski, L a G e n i a l i d a d y o t r o s t e x t o s i n é edição de G. Black, Buenos Aires: d ito s , Almagesto, 1998, p. 109-125. Trotski faz tácitas referências críticas a Nietzsche no capítulo aqui citado. Q ~._ ------ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA . . .. , RQPONMLKJIHGFEDCBA In d ic e O n o m á s tic o Aall, A., 149, 159 Abuljánova, K., 141 Academia de Ciências da Rússia, 57 Academia de Educação Comunista "Krupskaia", 19 Academia Ucraniana de Psiconeurología, 21 Achmanova, O. S., 159 Addison,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA J ., 142 África, 62 Aijenvald, lu., 237, 246 Alemanha, 30,110,158-159, 179-180 Allegro, J . M ., 73 Álvarez, A., 44 América (EE.UU.), 224 American Psychological Association, 159 Andréiev, L. N., 215, 224 Argentina, 28, 246, 247-248, 265-266 Aristóteles, 203, 206-207, 235, 247 Artiomov, V . A., 294 Asia L. Vigódskaia,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA c f Vigódskaia, A. L. Astrada, C., 222 Auden, w. H., 281 Auschwitz, 179 Avenarius, R., 72 Bleuler, E., 281 Blok, A. A., 211, 222, 245 193, 195,202,207,227, Blonski, P . P., 18,37,39-44, 295,300 Bolshaia Serpujovskais, calle, 20 Bonaparte, cfNapoleão L Borges, J. L., 19,26 Boring,E.G., 142, 158 Boyovich, L. L , 20 Braille, L., 259, 261, 265 Bravo, J. M ., 44 Bronshtéin, L., cfTrotski, L. D . Buenos Aires, 206-207, 222, 246-247, 248, 265-266, 304,306 Bühler, Ch., 140, 177 Bühler, K., 22, 180,264-266 Bukarin, N. L , 232, 246, 305-306 Buldin,243 Bulganov, M . A., 282 Bunin, L , 244 Buridan, 1 ., 169, 178 Burt, C. L., 285-286 Byron. Lord G. G., 223 Bacon, F ., 82 Bain, A., 250, 256 Bajtín, M. M., 110, 265 Baldwin, J. M., 72 Baquero, R., 24 Basedow, J. B., 305 Bassin, F . v ., 110 Beer, Th., 177 Beethoven, L. van, 158,234,244,247-248 Bejterev, V. M., 19,56,85,107-108 Belikov, 305 Bell, A. Graharn, 266 Ber, 164 Berlirn, 20, 179 Bersnshtein, N. A., 72 Bielo-rússia, 17, 30 Bijovski, A. la., 246-247 Bijovski, E. P., 246-247 Binet, A., 132, 147,291-292,293-294 Blanck,G., 17,21,24,29,30,45,83,108,110,124,158, 159,177,179,196,206,207,246-247,248,265,306. Blankerburg, kindergarten, 305 Calcuta, 159 Canaã,247 Canárias, ilhas, 179 Carpenter, w. B., 158 Carretero, M ., 124 Cáspio, mar, 297, 305 Catal unha, 266 Charpentier, 141 Chatski, 228, 245 Chernobil, 17 Chomsky, N., 196 Chopin, F ., 234, 247 Christiansen, B., 229, 235, 246 Chukovski. K . L , 244-245 Cid,17 Cole, M ., 19,71,265 Cole, Sh., 19 Coleridge, S. T., 158 Collêge de France, 73 Comenio, cfKomenski. Comissariado do Povo para a Educação Pública, Congreso Panruso de Psiconeurología Il, 1 6 20 308RQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Cooper, J. F., 215, 224 Copérnico, 305 Cuba, 110 Cuvier, G., 206 Dalton, cfPlan Dalton. Darwin, Ch. R., 51-52, 56, 57, 71, 89, 108,206 Darwin, F., 108 Davi, rei, 250 v., 24, 25 Davidov, V.ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA De Yries, H., 57 DeI Río, P., 44 Dennett, D., 206 Descartes, R., 178 Dilthey, w ., 158 Distrito Frunze, de Moscou, 21, 306 Dobkin, S. F., 15, 18,29,45, 110;246,266 Dobrinin, N. F., 294 Dobzhansky, Th., 57 Dódik, cfYigodski, Dódik. Dom Quixote, 299 Dostoievski, F. M., 164, 177,210,217 Dubrovsky, S., 29 Dumas, A ., 20 Ebbinghaus, H., 147, 158 Eco, U., 27 Édipo, rei, 235, 247 Editora St. Lucie Press, 25, 72 Eibl-Eibelsfeldt, 1., 108 Einstein, A ., 18, 196 Eldredge, N ., 57 Elkonin. D. B., 22 Ernílio, 214, 223 Engels, F., 18, 45, 201, 206, ~22 Eremina, S. D., 23 Erie, lago, 92 Eros, 96, 110 Escócia, 256 Esparta, 209, 222 Espinosa, B. de, cfSpinoza, B. Estados Unidos, 180, 196,224 Europa, 18, 165,305 Falstaff, J ., 268, 281 Fechner, G., 71,141 Feigenberg, L M., 246 Feuerbach, L., 45, 196 Filanova, 1., 265 Finlândia, 224 Flichrnan, E. H., 57 Fodor, J., 178, 196 Ford, H., 196 França, 20 Franco, F., 266 Frank, S. L., 82-83, 279, 282 Franklin, B., 72 Freud, S~, 22, 45,109-110,172,179,198-199,206,263 Froebel, F., 110,295,305 Galpierin, P. la., 29 Gaos, J., 142 Gaupp, R., 157, 159,222,224,249 Geórgia, 110 Godunov, B ., 110 Goethe, J. W . von, 236-237, 247 Gogol, N . ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA v ., 110,235 GomeI, 15, 17-18, 19-20,30,33,110 Gorbachov, M., 306 Gould, S. J., 57, 206 Grande Ópera de Paris, 248 Grécia,223 Gregory, R., 24 Griboiedov, A. S., 210, 222, 245 Groos, K ., 111, 130, 141,243 Guershenzon, M.O., 237, 247 Guessen, S. 1.,41,43,45 Gulag,23 Guyau, J. M., 264, 266, 295 Hâckel, E., 89, 108 Hall, G. S., 156, 159 Hamlct, 18,30, 159,223,244,246 Heamshaw, L. S., 286 Hegel, G. W . F., 18, 141,206 Herbart, L. F., 213-220, 223, 305 Hering, E., 251, 256 Hemández, J., 158 Hessen, S., cfGuessen. Highgate, cementerio, 45 Hitler, A ., 159, 180,222 Hobsbawm, E., 23 . Hôffding, H., 44 Hoffman, D., 158 Holanda,20 Humboldt, A. von, 247 Hume, D., 38, 44 Huxley, Th. H., 57 Iásnaia Poliana, 223 Iásnaia Poliana, escuela, 247 Imbert, v., 244 . Ingenieros, J ., 247 Inglaterra, 32, 158,223,224 Instituto de Defectologia (Moscou), 31, 286 Instituto de Educação "Herzen" (Leningrado), 22, 32 Instituto de Medicina Experimental (Moscou), 23 Instituto de Psicología Experimental (Moscú), 17, 19, 20,21 Irving, W., 256 J. S. Isaak, c f Y i g o d s k i , Istambul, 159 Ivanov-Razúrnnik, R. v .. 227, 245 James, w ., 19,41,44-45,109,113-114,115,122,123, 147,154,156, 158, 188,212-213,214,220,221, 223, 231, 240, 248-249, 250, 251, 254, 256, 265266,280,282,301,302. Jarkov, 21, 22, 23,31,247 ,~ '. - ..,~ ~----~_.. .•.....•... P S IC O L O G IA Jaspers,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA K , 141 Jefferson, J., 250, 256 Johnson,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA v ., 281 Joravsky, D., 286 Jrustov, H. F., 72 Julieta, 95, 109 Juventude Comunista, 106 Kamenev, L. B., 246 Karnenski, c f Komenski. Kant, L, 38, 44, 138, 142, 158,222,223 Kashchéi, 153, 159 Keller, H., 261, 266 Kerschensteiner, G . , 1 8 2 Key, E., 296, 305 Kiev, 245-247 Kirquizistão, 21-22 Kbhler, W, 179 Kolbanovski, V. N., 141 Koltushi, 180 Komenski, Ia., 296, 305 Kõnigsberg, 223 Kornilov, K N., 17, 19,21,90,109,157,166,178-179, 271-272,273,276 Korolenko, V. G., 260, 265 Koshtoiants, J. S., 35 Kraepelin, E., 249, 255, 281 Kraevich, 194 Kravtosv, L. S., 32 Kravtsova, E., 32 Kretschmer, E., 268-269, 278, 281 Kreutzer, 244, 248 Krilov, I. A., 226-227, 245 Krupskaia, N. K , 19 Kulikovski, D. N. O., 227., 245 Külpe, 0.,110,177 Laboratorio de Primates, cfCanarias. Laín Entralgo, J., 179 Lakatos, 1., 23 Lange, c .o ., 113, 119,123 Lange,F. A., 38,44 Langer, M., 111 Lapshin, L 1., 123, 178 laroshvski, M. G . , 2 4 4 Lay, A. W, 41, 45, 75 Lazarev, P. P., 49, 57, 177 Lazurski, A. F., 293 Leipzig, 140 Lênin, V. L, 18, 20, 72, 306 Leningrado, 22, 179, 294 Leontiev, A. A., 31-32 Leontiev, A. N., 17, 19-20,23-24,29-30,31-32,45,265 Leontiev, D. A., 32 Lermontov, M. lu., 179, 245 Lésgaft, P. F., 268, 281 Levitin, K , 45, 266 Lewin, K , 20 Líbia, 299RQPONMLKJIHGFEDCBA P E D A G Ó G IC A 309 Lievina, M. A., 22, 32 Lievina, R. 1., 20 Lifanova, T. M., 29, 32 Linneo, C. von, 206 Lipps, Th., 178 Lisenko, T. D., 56 Llanos, A., 73 Locke, J., 27, 38,44 Lomonosov, M. v ., 144-145, 157 Londres, 20 López Peces, S., 305 Lorenz, K , 108 Los Angeles, 180 Lukács, G . , 2 2 2 Lunacharski, A., 21 Luria, A. R., 21-24,31-32, 158, 179,207,294 Luria, L. A., 31-32 Macy, A, Sullivan, cfSullivan, A. Madagascar, 299 Madrid, 207, 223, 244, 265, 305 Maiakovski, V. v .. 144, 157 Makarenko, A. S., 224 Malamud, B., 30 Marburgo, universidade de, 44 Marshall, A., 90, 108 Marte, 62 Martínez, c, 256 Mãrx, K H., 18,43,45,63,72-73, 167-168, 184, 193, 196,201,206 Massachussetts, EE.UU., 179 Masters, W ., 281 Mercador, R., 306 Meumann, E., 41, 43, 45, 138, 147-148,152,158-159, 203,206,213 México, 196, 206, 222, 306 Ministério de Instrução Pública da França, 293 Ministério Prussiano de Educação, 299 Mira e López, E., 141 Mishkin, príncipe, 164 MIT, Mass., 26 Montessori, M., 45 Morgan, Th., 57 Morozova, N. G., 20, 29 Morto, mar, 73 Moscou, 19-20,21-24,26,29,31-32, 179,201,223, , 244,246,247,294,305 Mozart, W A., 110, 146, 158 Müller, 141 Münsterberg, H., 33-34, 39, 41-44,45, 118, 185,252253,254,256,297-299,301,305 Napoleão I (Bonaparte), 54, 122, 124 Natorp, P. G . , 178,219,224 Nekrasov, N. A., 174, 179 Nemecsek, 149, 159 Neuhof,305 Newton, 1., 196 Niágara, río, 92 3 1 0 ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA L lE V S E M IO N O V IC H V IG O T S K I zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA Nicolau lI, czar, 206 Nietzsche, F ., 222, 306 Norte americano, 184, 224 Novodievichi, cementerio, 124 Ochaíta, E ., 265 Ogle, A. w ., 206 Oneguin, E ., 1l0, 228, 245 Onna, A., 57 Oriente, 73 Otelo, 109 Ovsiánniko-Kulikovski, D. N., 227, 245 Ovsov, 150 Paris, 196, 247 Parker, Ch., 158 Parkhurst, H ., 179 Pavlov, L P., 19,53,54,56-57,60,64,65,66,76, 179, 199, 255 Pechorin, 245 Pedra o Grande, czar, 122, 124, 210 Pena, v., 223 Peredonov,227, 245, 300 Pestalozzi, J. H ., 224, 295, 305 Peters, w ., 149, 159 Petrogrado, 16 Piaget, 1., 12, 158 Pioneiros, 16, 110 Plano Dalton, 174, 179 Platão, 96, 109,223 Poligraf Poligrafovitch, 282 Pospielov, P. N., 306 Potebniá, A. A., 265 Pozdnishev, 248 Pushkin, A. S., 100, 1l0, 179,227-228,237,245 Puziriei, A., 29 Radzijovski, L. A., 177 Ramanujan, S., 158 Ramírez, J. D., 265 Rayon,18,30,305 Razmislov, P. L , 21 Reid, M., 215, 224 Reyes, A., 25 Ribes Ifiesta, E., 142 Riviêre, A., 265 Romeu, 95, 109 Rosa, A., 265 Ross, W. D., 207 Rossolimo, G. L , 291, 294 Rousseau, J. J., 214, 223, 295, 302, 305 Rubinstein, M. M., 141,204-205,207,209 Rubinstein, S. L., 24, 141 Rússia, 15, 17-18,23,185,191,194-195,206,224,238, 245,286,305 Saara, deserto, 62, 152, 154 Sacristán, M., 206 Sadosky, M., 44 Sadovnik, 194 107, Sajarov, L S., 20 Salieri, A., 110 Salomão, rei, 178 Sánchez Vázquez, A., 196 Santiniketan, escuela, 159 Santo Agostinho, 178 São João, 247 São Mateus, 246 São Petersburgo, 123, 246 Scaron, P., 63 Schmidt,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA v ., 179 Schopenhauer, A., 96, 110 Schumann, 141 Scribner, S., 71 Sechenov, L M ., 61,71-72,156,165 Sêve, L., 196 Shakespeare, w ., 15, 17, 109, 151, 159, 185,223,231, 244, 247, 297 Shalamov, v., 224 Shaliapin, F . 1 ., 243 Shcherbina, P. M., 260, 265 Sherrington, Ch. S., 64, 65, 68,72,251,256 Shestov, L ., 210, 222 Shif, Y. I., 22 Shpet, G., 44 Sibéria, 177,224 Silverman, R., 25-26, 44, 72, 141, 159, 179,206,294 Silvestri, A., 265 Simon, Th., 290-291 Simpson, G. Gaylord, 57 Sísifo, 190, 196 Skinner, B. F., 124 Skliar, L., 24-25, 26, 29, 265 Slavina, L. S., 20 Smiejova, R. N., cfVigódskaia, R. N. Sócrates, 110,212,223 Sófocles, 247 Sologub, F. K., 227, 245, 300 Soloviov, J. M., 21 Solyenitsin, A., 124, 224 Sorbonne, 293 Spencer, H., 230, 246 Spiioza, B., 15, 18,23, 123, 159, 178,214,223 Staats, A., 124 Stalin, I. v ., 22, 246, 305 Steinach, E., 70, 73 Stern, w ., 147, 158 Stetsenko, A., 25 Stevens, J. A., 224 Stowe, H. E. B., 226, 245 Stravinsky, J., 110 Stuart Mill, J., 256 Sullivan, A., 266 Tagore, R., 157, 159 Talankin, A. A., 21 Tashkent, 21 Tchaikovski, P. I., 110,245 Tchekov, A. P., 122, 124, 150, 159,224,226,233-234, 236,245,247,250,285,297,305 .. .., .. P S IC O L O G IA Teatro Bolshoi, 248 Teatro Colón, 248 Temístocles, 150, 159, 192 Terman, L. M., 286 Thénon, J., 123 Theresienstadt, campo, 179 Thomdike, E. L., 92,100,102, 109,163,176,215,279 Timiriazev, K. A., 18 Titchener, E. B., 139, 142 Tolstoi, L. N., 177,212,222,232,236-237,244,246247, 248, 285, 295, 302 Trotski, L. D., 245-246, 301, 304 Trotsky, León, ifTrotski. Ufá,31 Ujtomski, A. A., 66 União Soviética, cjURSS. Universidade Autônoma de Madri, 265 Universidade da Ucrânia, 21 Universidade de Comell, 142 Universidade de Harvard, 26, 44 Universidade de Moscou, 17 Universidade de Oxford, 245 Universidade de Paris, cjSorbonne. Universidade Popular "Shaniavski", 17,44,246 Urbantschitsch,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA v .. 141 URSS, 17,20-22,31,35,44,179, 196,286,306 Uzbesquistão, 21-22 Uznadze, D. N., 110 Vagner, V. A., 51, 57,86,88, 108 Van der Veer, R., 26 Van Winckle, R., 250, 256 Varshava, B. E., 72 Vatsuro, E. G., 179 Veneza, 95, 109 Verdi, G., 281 Vemadski, v .. 18 Veme,J., 228, 245 Verona, 109 Vidarte, N., 265 Viena, 266 Viesielovski, A., 230, 246RQPONMLKJIHGFEDCBA P E D A G Ó G IC A 311 Viesilovskaia, K. P., 292 Vigodskaia, A. L. (filha), 20, 31 Vigodskaia, G. L. (filha), 20, 23, 24, 28, 29, 31, 32, 306 Vigodskaia, M. S. (irmã),-28 Vigodskaia, R. N. (esposa)", 31, 32,123 Vigodskaia, Z. S. (irmã), 159 Vigodski, David (primo), 18 Vigodski, Dódik (irmão), 30-31, 159 Vigodski, familia, 23, 31 Vigodski, Isaak S. (irmão), 30-31,159 Vigodski, L. S., 17-19 Vigotski, L. S., v-vi, 29-30,15-16,57-58,72-73,82-83, 109-111,123-124,140-142,158-159,177-180,196, 206-207,222-224,244-248,265-266,281-282,285286, 294, 305-306 Volga, rio, 297, 305 Voloshinov, V. N., 110,206 Voronoff, S., 69, 73 Vvedienski, A. 1., 44 Vvedienski. N. E., 72 WalJace, A., 57 Watson, J. B., 19,56,58, 124 Weil, A., 71, 73 Wertsch, J. v ., 265 Witheft, 213 Wundt,ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA w ., 45,72, 118, 123, 126, 140, 142, 158, 166, 256 Wurzburgo, escola, 161, 177 Xenofonte, 223 Yaroshevsky, M., cf laroshevski. Zalkind, A. B., 198-199,200,206,262,263,266,301302, 303, 305-306 Zankov, L. v ., 20 Zaporoyets, A. v., 20 Zavadovski, B. M., 69, 73, 270, 282 Zeigamik, B. v , 23, 29 Zeus, 196 Zinoviev, G., 246 . PSICOLOGIA PEDAGÓGICA Edição Comentada Liev Semionovich Vigotski Nas últimas décadas, a obra de Vigotski tem sido intensamente recuperada, pois sua influência sem dúvida é crescente no panorama atual, tanto no tocante à psicologia cognitiva quanto à educação em geral. Este é um texto claro e abrangente de Psicologia Pedagógica, destinado sobretudo à formação docente, cujo destaque é a grande amplitude de temas abordados (atenção, memória, aprendizagem, pensamento, emoção, sociabilidade, etc.) e à pertinência com que se estuda sua relação com o trabalho educacional, concebido por Vigotski como um compromisso inevitável com toda a sociedade em prol da construção de um cidadão mais comprometido com seu tempo, mais solidário e plenamente humano. Esta edição, organizada, prefaciada e comentada por Guillermo Blanck, reconhecido especialista internacional na vida e obra do genial psicólogo russo, consta de numerosas notas que contextualizam a edição original, oferecendo ao leitor uma fonte rica, completa e educativa das idéias e propostas de Vigotski. • ISBN 85-363-0047-7 livros .: para uma .•. ....- m e lh o r ~ 'quJI.idJde de vida A R T M :D E D IT O R A V is ite n o s s o ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA RQPONMLKJIHGFEDCBA Web site: w w w .a rtm e d .c o m .b r I IIIII 9 788536 300474