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A figura controversa de Carlos Magno.

2020, aPátria - Jornal da Comunidade Científica de Língua Portuguesa | ISSN 2184-2957

Carlos Magno (742-814) sucede no trono depois da morte do seu irmão rival, Carlomano, em 771, tornando-se responsável pela concepção dos padrões governativos e culturais que dominaram toda a Europa durante vários séculos, de que foi exemplo o seu império.

A figura controversa de Carlos Magno O reino franco do século VIII, formou-se pelo empenho e engenho militar de Clóvis e dos seus descendentes. Depois, com Pepino de Herstal, Carlos Martel e Pepino, o Breve, tornou-se o mais forte e poderoso dos reinos bárbaros europeus, e prólogo do império que viria a ser edificado por Carlos Magnos, filho de Pepino, o Breve. Com efeito, Carlos Magno (742-814), ascende ao trono em 771, depois do falecimento do seu irmão rival Carlomano, torna-se herdeiro do reino franco e responsável pela concepção dos padrões governativos e culturais que dominaram toda a Europa durante vários séculos. As suas qualidades de governação proporcionaram ao Ocidente europeu conhecer a primeira época de estabilidade e ordem, após uma época de invasões constantes. A obra de referência sobre a sua vida é a biografia de Einhard. Ali ficaram registadas a sua aparência, o seu carácter, os vários matrimónios contraídos, a sua qualidade de conquistador (“Canção de Rolando”) e a sua capacidade de gerir os interesses das classes dominantes, das quais dependia, nomeadamente da nobreza. As expedições militares ocuparam-lhe a maior parte da vida, obtendo grandes êxitos graças à superioridade da cavalaria, o ponto forte dos exércitos medievais. Das suas campanhas militares destacam-se aquelas que asseguraram territórios entre o rio Reno e Elba, na Bavaria, onde estabeleceu a “Linha Militar de Leste”, no reino dos avaros, a sudeste da Europa, e a Saxónia, onde ficou conhecido por ter executado 4500 saxões num só dia, como represália, pelos sucessivos obstáculos que encontrou durante a conquista do reino e nas tentativas de implementação do cristianismo. Implementa ainda um imposto correspondente à décima parte do trabalho e propriedade do que chegasse ao tesouro real. De todos os seus empreendimentos resultaram um conjunto de reinos sob o domínio da dinastia carolíngia e que cobriam a maior parte da Europa, nomeadamente a Saxônia, a Lombardia, a Germânia, e uma faixa do território da actual Espanha. O maior êxito de Carlos Magno deveu-se à aliança estabelecida com a Igreja e o papado de Roma. Nas campanhas militares deste rei, haviam sempre missionários e pregadores da fé cristã, com a função de converter e baptizar os povos conquistados, enquanto o seu corpo militar e administrativo os submetiam ao seu poder político. Estes eventos revestiram as suas expedições de um sentimento de cruzada a favor da Igreja. Esta, por sua vez, beneficiava ao ver a sua influência espiritual alargada a novos domínios, muitas vezes também doados pelos reis ao papado. Outro momento digno de nota deu-se quando Carlos Magno aproveitou a oportunidade certa para interferir nos assuntos do papado a fim de obter maior poder. Contudo, também o Papa sabia que beneficiaria de uma situação de auxílio. Por esta altura o Papa estava privado da sua autonomia e independência em Itália e, o trono de S. Pedro, encontrava-se, assim, ameaçado. Precisava então de restaurar o seu poder por alguém de autoridade incontestável, um imperador. Deste modo, Carlos Magno, intercede a favor de Leão III (sucessor no papado), no julgamento a que estava condenado por heresia, e consegue que este seja ilibado. O Papa recompensou-o largamente ao coroá-lo como imperador e Augusto do sacro-império romanogermânico, caso que abalou as relações com Constantinopla, que só reconhecia o imperador romano. A coroação de Carlos Magno como imperador do ocidente teve um grande impacto político. A primeira consequência deu-se com a quebra do laço de dependência legal entre o papa e os reis ocidentais e o império Bizantino, dado que o novo imperador passava a ser o legítimo herdeiros dos imperadores romanos, com todos as suas pessoas e territórios. O segundo grande resultado foi a transferência da dignidade imperial para os reis francos, unificando o ocidente europeu sob o mesmo poder político, ou temporal, o dos reis francos e o mesmo poder espiritual, o do cristianismo e o do papado em Roma. A coroação de Carlos Magno como imperador também teve consequência significativas para os seus descendentes, na medida em que nem sempre houve vontade de assumir a governação de todo aquele vasto território, sendo sucessivamente fragmentado. As preocupações destes reis sucessores vinculavam-se sistematicamente às do plano religioso, tanto que o próprio Carlos Magno foi apelidado de rei “teocrático”, exemplo disso foi a obrigação imposta a todos aqueles com mais de 12 anos de lhe jurar fidelidade e, assim, aceitar a lei de Deus. O seu reinado ficou também marcado por um período de renascença cultural, pois este era um soberano preocupado com a ortodoxia religiosa e com a cultura, protegendo ambas através de uma simbiose de influências que procuravam resgatar a essência latina do final do império romano, após a conversão de Constantino em 312. NICHOLAS, D. (1999). O Ocidente Carolíngio: A Europa nos séculos VIII e IX. In A Evolução do Mundo Medieval. Sociedade, governo e pensamento na Europa: 312-1500. Lisboa, Publicações Europa-América. Imagem (asthenop) gratuita em Pixabay Artigo actualizado em 2 de Maio de 2020.