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Projetos de mídia-educação nas ONGs brasileiras

Abstract

A pesquisa faz um mapeamento do estado atual dos projetos de mídia-educação brasileiros realizados no âmbito da educação não-formal por organizações não-governamentais ou outras entidades da sociedade civil. Ao fazer esse mapeamento, o trabalho se propõe não só a traçar as principais características desses projetos em relação a diversas variáveis (idade, lugar, situação social, grupos sociais e professionais) como também a deter sua atenção em alguns aspectos específicos como: o empoderamento da cidadania, o uso de novas tecnologias e a criação de veículos de comunicação comunitária. O estudo quantifica e caracteriza esse panorama mediante uma amostra de 240 projetos de 107 ONGs, que têm suas atividades analisadas, entre outras categorias, pelas três principais dimensões da educação midiática reconhecidas internacionalmente (acesso/uso, compreensão crítica e produção de conteúdos). A análise mostrou a preponderância de atividades de produção de conteúdos audiovisuais e a ênfase à ampliação de direitos e capacidades comunicativas de comunidades e pessoas geralmente excluídas dos meios de comunicação tradicionais. Segundo a observação e análise dos objetivos e metas das ONGs e projetos estudados, considerou-se que a maioria das organizações trabalham com propostas que têm potencial médio e alto de empoderamento da cidadania. Além disso, com base na literatura revisada e no diagnóstico realizado, a pesquisa propõe um modelo com o qual estudar a educação midiática desenvolvida no âmbito da educação não-formal, destacando que o resultado dessas atividades deveriam traduzir-se em formas de comunicação comunitária. Deste modo, o trabalho oferece uma imagem geral da mídia-educação existente fora do ambiente escolar, mas que também pode servir de inspiração para as políticas públicas que venham a se desenvolver sobre o tema, visto que ainda são esparsas e pouco efetivas.

0 UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social – Póscom Projetos de mídia-educação nas ONGs brasileiras Relatório de pesquisa de Pós-Doutorado – Programa PNPD/Capes (Relatório científico) Dra. Mônica Pegurer Caprino Relatório final de Pesquisa realizada por meio do Programa Nacional de PósDoutorado-PNPD (CAPES) Linha de Pesquisa: Comunicação midiática nas interações sociais Professor Supervisor: Profa. Dra. Cicília Maria Krohling Peruzzo Período de realização: Fevereiro de 2015/Janeiro 2016 São Bernardo do Campo, março de 2016 1 RESUMO A pesquisa faz um mapeamento do estado atual dos projetos de mídia-educação brasileiros realizados no âmbito da educação não-formal por organizações não-governamentais ou outras entidades da sociedade civil. Ao fazer esse mapeamento, o trabalho se propõe não só a traçar as principais características desses projetos em relação a diversas variáveis (idade, lugar, situação social, grupos sociais e professionais) como também a deter sua atenção em alguns aspectos específicos como: o empoderamento da cidadania, o uso de novas tecnologias e a criação de veículos de comunicação comunitária. O estudo quantifica e caracteriza esse panorama mediante uma amostra de 240 projetos de 107 ONGs, que têm suas atividades analisadas, entre outras categorias, pelas três principais dimensões da educação midiática reconhecidas internacionalmente (acesso/uso, compreensão crítica e produção de conteúdos). A análise mostrou a preponderância de atividades de produção de conteúdos audiovisuais e a ênfase à ampliação de direitos e capacidades comunicativas de comunidades e pessoas geralmente excluídas dos meios de comunicação tradicionais. Segundo a observação e análise dos objetivos e metas das ONGs e projetos estudados, considerou-se que a maioria das organizações trabalham com propostas que têm potencial médio e alto de empoderamento da cidadania. Além disso, com base na literatura revisada e no diagnóstico realizado, a pesquisa propõe um modelo com o qual estudar a educação midiática desenvolvida no âmbito da educação não-formal, destacando que o resultado dessas atividades deveriam traduzir-se em formas de comunicação comunitária. Deste modo, o trabalho oferece uma imagem geral da mídia-educação existente fora do ambiente escolar, mas que também pode servir de inspiração para as políticas públicas que venham a se desenvolver sobre o tema, visto que ainda são esparsas e pouco efetivas. PALAVRAS-CHAVE Mídia-educação; educação midiática; comunicação comunitária; cidadania. 2 ANTECEDENTES Originalmente, este projeto de pesquisa foi apresentado para ingresso no Programa Nacional de Pós-Doutorado – PNPD/Capes junto ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Metodista com o título “Mídia-educação, inclusão digital e comunicação comunitária: espaços de interconexão”. Com o objetivo inicial de identificar e analisar projetos de mídia-educação relacionados às mídias digitais ou à alfabetização digital, a pesquisa foi se transformando ao longo do período de sua execução, visto que foi observado que havia poucos trabalhos que oferecessem um panorama geral sobre projetos de mídia-educação realizados por organizações da sociedade civil. Além disso, com o avançar do levantamento de dados, julgou-se que seria muito restrito limitar a análise somente aos projetos relacionados com as mídias digitais, ampliando-se o universo de análise para projetos gerais de mídia-educação realizadas por ONGs ou outro tipo de organizações da sociedade civil, desde que estivessem fora do âmbito escolar. O foco na cidadania participativa, no empoderamento do cidadão e na comunicação comunitária foram mantidos, reduzindo-se a questão das tecnologias para uma categoria a mais a ser analisada. Afinal, verificou-se que o termo inicialmente proposto de “inclusão digital” abarcava uma série de iniciativas, projetos e discussões que estavam fora do campo da mídia-educação. As hipóteses iniciais foram em parte mantidas, como a que considerava que os projetos de mídia-educação que enfatizam as TIC acabam por dar mais ênfase ao acesso e ao uso das novas tecnologias, deixando de lado os outros aspectos constituintes da alfabetização midiática: a consciência crítica, a capacidade de análise e avaliação, bem como o processo de criação de mensagens e conteúdos comunicacionais. Do ponto de vista metodológico, o estudo utilizou, como era previsto, a análise documental, os questionários on-line e análise comparativa (quantitativa e qualitativa) dos dados obtidos. Entretanto, a fase inicial prevista para a pesquisa, de construção de uma base de dados com os projetos de mídia-educação realizados pelas ONGs, acabou por ampliar-se, levando em consideração a relevância que esse material adquiriu, bem como a necessidade de caracterizar ONGs e projetos. Essa relevância foi sendo confirmada ao longo da elaboração da pesquisa mediante a apresentação parcial e contínua dos dados preliminares em vários congressos e seminários que debatiam a mídia-educação. 3 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Reprodução da base de dados ONGs que realizam projetos de Mídia-Educação……......…25 Tabela 1 - Situação geográfica das ONGs que realizam atividades de Mídia-Educação…………….....26 Tabela 2 - Período de início de atividades das ONGs que realizam atividades de Mídia-Educação...…26 Figura 2 – Panorama geral das ONGs que realizam Mídia-Educação……………………………..……28 Figura 3 – Tags a partir dos objetivos das ONGs que trabalham com Mídia-Educação………….……29 Figura 4 – Projetos de Mídia-Educação – Contexto e perfil dos destinatários…………………………..31 Gráfico 1 - Meios e processos enfatizados ………………………………………………...………………32 Gráfico 2 – Projetos de Mídia-educação – meios e processos de comunicação enfatizados…………….33 Gráfico 3 – Projetos de Mídia-educação – dimensões enfatizadas……………………………..…………34 Gráfico 4 – Projetos de Mídia-educação – dimensões enfatizadas nos projetos audioiovisuais………...35 Gráfico 5 – Projetos de Mídia-educação – dimensões enfatizadas nos projetos com ênfase em TIC…..38 Figura 5 – Produção de meios de comunicação comunitária pelo projetos de Mídia-educação……..…39 Gráfico 6 - Potencial de empoderamento da cidadania respeito aos objetivos da mídia-educação….…41 Figura 6. Modelo de descrição e análise de atividades de mídia-educação no âmbito da educação não formal…………………………………………………………………………………………………………44 Figura 7 - Rede de inter-relações entre principais aspectos da mídia-educação nas ONGs brasileiras…………………………………………………………………………………………….………45 4 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO……………………………..…………………….………………………5 1.1. A relação entre comunicação e educação….…….…………………………………...…5 1.2. A proposta de trabalho…………………………..………………………………………6 1.3. As hipóteses………………………………………..……………………………………...7 2. CONCEITOS………………………………………..…………………………………….7 2.1. Âmbito internacional………….………………………………………………………....7 2.2. Um pouco de história………….…………………………………………………………9 2.3. O conceito de Mídia-Educação no Brasil.......................................................................11 2.4. O papel na Unesco............................................................................................................11 3. CONTEXTOS SOCIAIS E HISTÓRICOS……….………………………...………….14 3.1. Educação formal e políticas públicas.............................................................................14 3.2. Mídia-Educação no Brasil e na América Latina…….………………………………..17 3.3. Os movimentos sociais e as ONGs……………….……………………………...……..18 3.4. Mídia-Educação no âmbito não-formal……………….………………………..……..19 3.5. Novas tecnologias e inclusão digital…………….………………………………….…..20 4. CIDADANIA, EMPODERAMENTO E COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA…….21 5. MÍDIA-EDUCAÇÃO NAS ONGs BRASILEIRAS……………….…………………..22 5.1. Metodologia.…………………………………………………………………………….23 5.2. Perfil das ONGs…………………………………………………………………………26 5.3. Atividades……………………………………………………………….………………26 5.4. Motivação e objetivos ..…………………………………………………………………27 5.5. Contexto e atores……………………………………...………………………………...29 5.6. Meios e processos de comunicação………………….…………………………………32 5.7. Dimensões…………………………………………...……………………….…….……33 6. DEBATENDO QUESTÕES ……………………………………………………………35 6.1. Comunicação: instrumento ou objeto? .........................................................................35 6.2. O privilégio do audiovisual e a sobrevivência do cinema…...…………………….….35 6.3. Relação com a mídia de massas……………………….…..…………………………...37 6.4. Mídia-educação, ONGs e tecnologias………………..………………………………..38 6.5. Comunicação comunitária……………………..……………………………...……….39 7. CIDADANIA E EMPODERAMENTO: PROPONDO MODELOS….…..………….41 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS…………………………………………..……………….45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………………..…………………47 5 1. INTRODUÇÃO 1.1. A relação Comunicação e Educação A interface entre comunicação e educação é quase tão antiga quanto a existências de meios de comunicação. No fim do século XVII, o então reitor da Universidade de Paris, Charles Rollin, defendia a ideia de que aqueles que produziam textos com tipografia aprendiam a ler com mais facilidade e tinham mais autonomia na escrita, além de desenvolver prazer em aprender (GONNET, 2004). Claro que naquele momento a interface entre Educação e Comunicação se restringia ao uso de um meio de comunicação em sala de aula com o objetivo de facilitar a leitura e, de certa forma, substituir o livro como material didático. Outra referência ao uso de jornais em sala de aula é datada do século XVIII. Nos Estados Unidos, em 8 de junho de 1795, o Eastern Herald, de Portland, publicou um editorial que enfatizava a importância do jornal como instrumento didático e chamava a atenção para o fácil acesso a essa mídia: “Jornais são abundantes e baratos – o livro mais barato que pode ser comprado, e quanto mais você compra, melhor para seus filhos, por que cada parte fornece alguma nova e válida informação” (GARNER; SULLIVAN, 2004). Jacques Gonnet (2004), que foi diretor do CLEMI 1, um dos primeiros organismos governamentais a se ocupar da Educação para a Comunicação, afirma que a interface entre meios de comunicação e ensino se desenvolve a partir do momento em que comunicadores, professores, educadores, pais e alunos se perguntam por que não utilizar notícias para despertar o interesse das crianças e dos jovens estudantes. O mais frequente é que a Educação entenda a Comunicação “em termos subsidiários e meramente instrumentais, concebendo-a somente como veículo multiplicador e distribuidor dos conteúdos que ela pré-determina” (KAPLÚN, 1998, p. 184). Esse uso instrumental seria resultado de uma visão tradicional tanto da Comunicação, que é vista como simples transmissão unidirecional de mensagens, quanto da Educação, com um “modelo escolástico”, com o professor frente aos alunos tentando transmitir conteúdos. Com o pedagogo francês Celéstin Freinet, a relação Comunicação e Educação ultrapassa a simples ideia de usar um meio de comunicação, no caso o jornal, como ferramenta de leitura e ensino. Na França dos anos de 1920, Freinet desenvolvia com seus alunos, entre outras tantas atividades criativas e desafiadoras, técnicas para elaboração de jornais. O trabalho consistia em recolher textos livres diariamente, agrupados posteriormente em uma encadernação especial mensal dirigida a assinantes e à comunidade do entorno escolar. Ao incentivar seus alunos à reflexão e à expressão livre de ideias, à espontaneidade e à iniciativa, Freinet criava um ambiente favorável, de motivação e cooperação. Acreditava que, ao trabalhar com textos direcionados a um leitor concreto a criança conheceria um mundo que vai além dos livros didáticos: ela pensa, reflete e assim, forma-se um cidadão crítico. Esse uso da imprensa escolar permitia a criação de uma cultura própria, baseada nos verdadeiros interesses das crianças expressos nos textos. (FREINET, 1974). Muitos anos depois, Kaplún (1998) irá retomar essa outra maneira da Educação relacionar-se com a Comunicação, enfatizando uma forma de educação em que o processo de ensino/aprendizagem é baseado na participação do educando e que, portanto, também resultaria no uso crítico e criativo da comunicação. 1 A sigla CLEMI significa Centre de liaison de l'enseignement et des médias d'information (CLEMI) e se refere ao organismo do Ministério da Educação da França encarregado da mídia-educação. Ver: www. http://www.clemi.org. 6 Essas ideias foram também desenvolvidas no Brasil em iniciativas isoladas na década de 70. Na época, a experimentação era inovadora: influenciada pela obra de McLuhan, a Secretaria de Educação de São Paulo introduziu, em suas diretrizes curriculares, a produção de jornais, iniciativa que teve continuidade nas décadas de 1980 e 1990, (IJUIM, 2005) e posteriormente passou a ser incentivada pela Associação Nacional de Jornais-ANJ. Surgiram também nos anos de 1970 e de 1980 iniciativas de uso de rádio, TV e videocassete como instrumentos didáticos em sala de aula. Mas a interface entre Comunicação e Educação não se restringiu ao uso de mídia na escola e as atividades para a leitura crítica da mídia e para a apropriação de ferramentas de comunicação ganharam corpo durante os anos de 1970, principalmente na América Latina, como se expõe mais adiante. Com a introdução e a proliferação das tecnologias digitais, a partir dos anos de 1990 o cenário da Educação para a Comunicação se transformou rapidamente, com o surgimento de inúmeras entidades, organizações e grupos que passaram a ocupar-se de atividades mídia-educativas sobretudo no âmbito da educação não-formal. Oficinas de produção de conteúdos comunicacionais, seminários sobre leitura crítica da mídia e diversas atividades para a apropriação de meios e processos de comunicação compõem o amplo panorama atual da mídia-educação no Brasil e que merece ser estudado a fim de que se conheça melhor suas características e tendências. 1.2. A proposta do trabalho Diante deste cenário é que se propôs este estudo, que teve como objetivo traçar um panorama dos projetos de mídia-educação desenvolvidos no Brasil no âmbito da sociedade civil (Organizações Não Governamentais, Organizações da Sociedade Civil de Interesse PúblicoOSCIPS, fundações etc.) e fora do ambiente escolar. Além de descrever e comparar as principais características desses projetos, a preocupação foi verificar se estão direcionados aos aspectos de empoderamento da cidadania, favorecem a inclusão (sobretudo digital) e colaboram com o objetivo de transformar os cidadãos em sujeitos dos processos de comunicação, como seria de se esperar desse tipo de proposta. Assim, essa pesquisa investiga o empoderamento cultural (KELLNER; SHARE, 2005) e comunicativo desde a perspectiva de fazer com que os cidadãos sejam sujeitos ativos dos processos de comunicação e exerçam seus direitos. Afinal, as ações de mídia-educação têm sido consideradas um pré-requisito para a participação efetiva dos cidadãos nas sociedades tecnologicamente avançadas (O´NEILL, 2008). Também se buscou verificar se a mídia-educação está intimamente relacionada com a comunicação comunitária como parece ser e como já foi comentado por Peruzzo (2009), que enfatiza a importância dessa relação e afirma que o exercício das atividades de comunicação comunitária pode ser muito “melhorado” se houver a possibilidade de formação específica para tal fim. A proposta do trabalho inclui lançar também um olhar particular sobre as novas tecnologias da comunicação e da informação e sua importância nas chamadas zonas periféricas, como a América Latina (GONZÁLEZ, 2007). Afinal, as tecnologias parecem ter o potencial de empoderar ainda mais os cidadãos e possibilitar que se tornem novos produtores de informação e conhecimento. 7 1.3. Hipóteses O trabalho propõe a seguinte pergunta geral de pesquisa de âmbito descritivo: Quais são as dimensões e características mais importantes associadas aos projetos de mídia-educação no Brasil no âmbito da sociedade civil? De forma mais específica, pergunta-se:   Em que medida os projetos de mídia-educação têm o enfoque do empoderamento da cidadania e se canalizam em processos de comunicação comunitária como se poderia supor nesse tipo de atividade? O uso das novas tecnologias e das mídias digitais em atividades mídia-educativas estão facilitando e enfatizando a apropriação dos meios e processos de comunicação? Consideram-se as seguintes hipóteses de trabalho: H1: Os projetos de mídia-educação realizados pela sociedade civil se orientam principalmente à produção de conteúdos. H2: Os projetos geralmente se preocupam com o empoderamento dos cidadãos e o protagonismo dos atores envolvidos nos processos de comunicação. H3: As iniciativas estão vinculadas à comunicação comunitária, com uma tendência a oferecer como resultado veículos de comunicação permanentes. H4: Quando as iniciativas dão importância às TIC, normalmente não têm vinculação com outros aspectos comunicativos, restringindo-se à dimensão do acesso e uso das tecnologias. 2. CONCEITOS 2.1.Âmbito internacional É importante esclarecer alguns conceitos básicos quando falamos de mídia-educação, partindo inicialmente das definições aceitas internacionalmente de media literacy (letramento midiático ou alfabetização midiática) e media education (educação midiática ou mídia-educação). O termo em inglês media literacy não tem uma tradução ou adaptação única nos países iberoamericanos. Em Portugal, adota-se a tradução praticamente literal de “literacia mediática”, mas também se usa “educação para os media” para se referir a media education. Nos países de língua espanhola se utiliza educación en medios e mais recentemente se adotou de forma ampla o termo “alfabetización mediática”, para ficar em sintonia com os trabalhos da Unesco e do mundo anglo-saxão. No Brasil, se vê a utilização de várias expressões. Alguns preferem usar o termo letramento midiático a alfabetização midiática, fazendo um paralelo com a questão da alfabetização relacionada à língua materna, que teria uma conotação mais mecânica, de simples codificação e decodificação da linguagem escrita, enquanto o letramento incluiria a ideia da compreensão, de ler e escrever funcionalmente. 2 2 Autores como Magda Soares (SOARES, Magda. Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de Educação, v. 25, p. 5-17, São Paulo, janeiro/abril, 2004) e Angela Kleiman (KLEIMAN, Angela. Os significados do letramento. Campinas: Mercado de Letras, 1995), dentre outros, desenvolvem trabalhos sobre a diferença dos dois termos: letramento e alfabetização. 8 O termo mídia-educação, grafado com hífen, difundiu-se entre vários grupos que estudam o assunto e que, geralmente, relacionam seus trabalhos ao estudos teóricos desenvolvidos na Europa, privilegiando autores como os britânicos David Buckingham e Sonia Livingstone e o italiano Pier Cesare Rivoltella. Ismar de Oliveira Soares e seu grupo, do Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo, optam pelo termo Educomunicação, pois acreditam que esta é uma nova área do conhecimento que abarca um suporte teórico e de ação mais amplo do que a mídia-educação, filiando-se principalmente aos aportes dos teóricos latino-americanos, principalmente de Jesús Martin-Barbero e Mario Kaplún. Nesta pesquisa, se opta por utilizar os conceitos afeitos aos estudos internacionais de media literacy, ainda que não se considere que sejam conflitantes com a educomunicação, principalmente ao tomar-se em conta os documentos mais recentes da Unesco ou os novos enfoques dados ao letramento midiático, a partir de autores que estão abordando, por exemplo, a critical media literacy, como Douglas Kellner (2005). A primeira definição de mídia-educação foi apresentada na França pelo Conselho Internacional do Cinema e da Televisão (CLCT) em junho de 1973 e, segundo Fantin (2006, p. 75) “referiase ao estudo, ensino e aprendizagem dos modernos meios de comunicação como disciplina autônoma no âmbito da teoria e prática pedagógica”. Posteriormente, se amplia a definição incluindo-se o uso criativo da comunicação e considerando as mídias não só como produtos mas como processos culturais e sociais, conforme também pleiteiam os defensores da Educomunicação. Assim, além de “ensinar” os sujeitos a “ler e escrever” criticamente com os meios de comunicação, a mídia-educação também discute temas como igualdade, direitos de acesso, participação e cidadania. (FANTIN, 2006). Cabe mencionar a definição de media literacy e, sobretudo, seus aspectos e dimensões, que serão utilizados como categorias de análise neste trabalho. Em geral, o conceito de alfabetização midiática parte da definição que foi redigida em 1992, durante a National Leadership Conference on Media Literacy, que afirma que media literacy é “a capacidade de acessar, analisar, avaliar e comunicar mensagens em uma variedade de formas” (AUFDERHEIDE, 1992). Como se vê, é um conceito amplo, que adquire ao longo do tempo variadas interpretações, mas que sempre inclui não as dimensões de conhecimento técnico mas também a compreensão crítica e a produção de conteúdos. Este conceito, com pequenas variações, foi assumido posteriormente por vários organismos internacionais, como a Unesco e a Aliança das Civilizações - UNAOC (organismo da ONU que ajuda a promover o entendimento e a cooperação entre as nações). Em uma das muitas variações da definição, se afirma que: media literacy é o termo usado para descrever as competências e habilidades requeridas para o desenvolvimento independente e consciente do cidadão no novo entorno comunicacional – digital, global e multimedia – da sociedade da informação. (Pérez Tornero, 2008, p.103) Vale, ainda, fazer a diferenciação entre os termos media literacy e media education, que algumas vezes são utilizados como sinônimos mas que tem nuances que os diferenciam. O britânico David Buckingham é um dos que diferencia os dois conceitos, argumentando que media education é o processo de ensino-aprendizagem sobre os meios de comunicação e media literacy é o resultado desse processo, ou seja, quando se tem o conhecimento e as habilidades para a “leitura” e “escrita” midiática, se é que se pode chamar assim. 9 Um ponto importante a tomar do conceito de alfabetização midiática construído no âmbito internacional são seus componentes, enfoques ou dimensões, que serão usados aqui como variável de análise. Segundo a definição já mencionada (AUFDERHEIDE, 1992), há quatro componentes fundamentais na alfabetização midiática: acesso, análise, avaliação e criação de mensagens. É importante dizer que cada componente dá suporte aos demais, em um processo dinâmico. Aprender a criar conteúdos ajuda alguém a analisar os conteúdos produzidos profissionalmente por outros; habilidades para analisar e avaliar abrem as portas para novos usos da Internet e expandem o acesso, como destaca Livingstone (2004). Já Buckingham et al. (2005) preferem estabelecer três dimensões a partir do conceito definido pelo Ofcom (2004) 3, segundo o qual a alfabetização midiática é a habilidade para acessar, compreender e criar comunicação em uma variedade de contextos. Dessa forma, compreender abarca os aspectos de análise e avaliação. Para esta pesquisa e para efeitos práticos de categorização, preferiu-se essa divisão por seu mais útil e operativa, visto que “análise e avaliação” são componentes muito próximos e difíceis de serem separados ao se observar um projeto. Assim, se tomam aqui como dimensões: acesso; compreensão crítica e produção de conteúdos. Deve-se destacar alguns aspectos importantes relativos a esses componentes. Como bem lembram Buckingham et al. (2005), o acesso se refere a dois aspectos: o acesso físico a um meio de comunicação ou tecnologia e a questão da habilidade (tanto cognitiva quanto prática) em usá-los e manipulá-los. Assim, quando se mencione a categoria acesso, se incluirá, em realidade, acesso e uso. A compreensão crítica inclui vários aspectos, dos quais se pode ressaltar o entendimento da linguagem midiática e como ela se produz; a compreensão das lógicas produtivas da indústria midiática, suas motivações e a consciência das condições e possibilidades das mídias como ferramentas. Corresponde, portanto, não só à habilidade para ler, compreender e avaliar o conteúdo da mídia, como também a capacidade de compreensão e consciência das condições e possibilidades de produção e suas ferramentas. Quando se fala de criação ou produção de conteúdos e mensagens midiáticas também se faz referência ao desenvolvimento das habilidades e competências necessárias para que isso aconteça. Assim, as competências comunicativas são as habilidades para criar mensagens em diferentes códigos e formatos, ou seja, produzir e distribuir conteúdos utilizando as diferentes mídias disponíveis. Ou seja, inclui habilidades criativas, técnicas, semióticas e sociais. 2.2. Um pouco de história Com origem nos anos de 1920, a media education começou a despontar na França, sobretudo relacionada ao cinema. Em 1922, ocorreu a primeira conferência nacional de departamentos regionais relacionados com a educação para o cinema, a film education (FEDOROV, 2008). Pode-se dizer que os estudos e atividades relacionados ao letramento midiático limitavam-se, inicialmente, a uma espécie de “alfabetização visual” (HOBBS; JENSEN, 2009, p.3). Uma vez que os meios de comunicação eram vistos como um mal que a educação deveria combater, 3 Ofcom é a entidade reguladora independente para a indústria de comunicações no Reino Unido. Faz parte de seu trabalho promover o letramento midiático, tema sobre o qual realiza vários estudos. Ver: http://www.ofcom.org.uk/. 10 media literacy e media education eram entendidas como uma “defesa cognitiva” contra as formas de “conteúdos abusivos” veiculados nos meios de comunicação, tendo por objetivo proteger crianças e jovens contra esse “efeito nocivo”. Assim, a chamada concepção inoculatória (FANTIN, 2006, p. 69) caracteriza-se “pela convicção da força das mídias e na vulnerabilidade da audiência”. Dessa forma, considera a mídia-educação como instrumento para proteger os usuários dos perigos das mídias. Tal concepção dominou os estudos sobre o tema no Reino Unido e nos dos anos 30 aos anos 60. A partir dos anos de 1960, ganha força outra concepção da mídia-educação: a concepção da leitura crítica. O cenário propício ao desenvolvimento dessa corrente são as ditaduras militares da América Latina. Assim, se desenvolve bastante no cenário sul-americano nos anos de 1970 e de 1980, em que a mídia-educação passa a estar ligada às possibilidades de se realizar formas de comunicação alternativa e de resistência. Como instrumento de luta, a mídia-educação se relaciona com o movimento de educação popular e defende a democracia, os direitos humanos e luta contra todas as formas de colonização. (Fantin, 2006) Também em outros países a mídia-educação vai se desenhando, a partir dos anos de 1970, como “uma prática crítica da cidadania” (HOBBS; JENSEN, 2009, p.3). Já não se vê a mídia somente no seu aspecto de influência nociva, sobretudo aos jovens, mas a comunicação passa a ser vista como prática social num âmbito de relações complexas com as demais práticas. O inglês Len Masterman é um dos pioneiros no debate mais amplo sobre a mídia-educação e, segundo Fantin, (Fantin, 2006, p. 68) “defende um processo contínuo de educação para as mídias que vise não apenas uma inteligência, mas uma autonomia crítica”. A progressiva influência dos meios de comunicação na vida dos cidadãos do final do século XX faz com que Len Masterman (1985) defenda o uso dos meios de comunicação na escola. A partir da obra deste autor, “Teaching the media” (MASTERMAN, 1985), foram adotados também alguns conceitos chaves sobre mídia-educação, resumidos em documentos do Center for Media Literacy (CML) 4, dos Estados Unidos: todas as mensagens midiáticas são construídas; as mensagens midiáticas são construídas usando uma linguagem criativa com suas próprias regras; diferentes pessoas experimentam a mesma mensagem midiática de maneiras diferentes; a mídia incorpora valores e pontos de vista; muitas mensagens midiáticas estão organizadas para obter lucro ou poder. A partir da década de 1990, com o incremento das tecnologias digitais, o conceito de media literacy adquire outro elemento fundamental: a capacitação para a participação ativa na produção de conteúdos comunicacionais, sobretudo como alternativa às mídias de massa e tradicionais. A mídia-educação adquire, portanto, uma orientação participativa, que passa a enfatizar a produção social, a comunicação para o desenvolvimento do conhecimento, a interatividade e o diálogo (PÉREZ-TORNERO; VARIS, 2012). Hoje, quase todos os estudos e documentos sobre media literacy abordam a possibilidade do empowerment, ou seja, do “empoderamento” dos cidadãos para uma participação ativa em sociedades democráticas. Também vale mencionar os estudos desenvolvidos por Douglas Kellner e Share (2005) que utilizam o termo Alfabetização Midiática Crítica -AMC (Critical Media Literacy), dizendo que esse tipo de alfabetização dá mais poder individual ao cidadão a respeito de sua cultura, além de permitir que as pessoas criem seus próprios significados e identidades, moldando e 4 Veja no endereço http://www.medialit.org/reading-room/five-key-questions-form-foundation-media-inquiry. 11 transformando as condições materiais e sociais de sua cultura e sociedade (KELLNER; SHARE, 2005, p. 381). 2.3. O conceito de mídia-educação no Brasil Girardello e Orofino (2012) destacam que “a relação entre comunicação e educação no Brasil se constituiu bem antes do uso de termos como “mídia-educação”, “educomunicação” ou mesmo “educação para as mídias”. Para fazer tal afirmação, as autoras se baseiam na ideia de que a obra de Paulo Freire já trazia desde os anos de 1960 “uma teoria da educação como prática social em diálogo com a comunicação e a cultura”. (GIRARDELLO; OROFINO, 2012, p.75). Além da influência de Freire e Kaplún, os estudiosos da mídia-educação/educomunicação no Brasil também destacam os aportes teóricos que autores como Canclini, Orozco e MartínBarbero oferecem à relação entre Comunicação e Educação, sobretudo no que diz respeito à questão da produção critica com o uso de mídias na escolas e a ênfase na atividade das audiências, que passam a ser alvo dos estudos de recepção. (GIRARDELLO; OROFINO, 2012) Como já destacou Belloni (2001), em uma das obras básicas sobre o tema no Brasil, a educação para a comunicação é sobretudo educação para a cidadania. Monica Fantin observa, ainda, que embora não haja consenso sobre o uso e o significado do termo mídia-educação, se pode afirmar que a educação para as mídias “diz respeito à formação de um usuário ativo, crítico e criativo de todas as tecnologias de comunicação e informação e de todas as mídias”. (FANTIN, 2011, p. 28). É importante destacar essa ideia de que a mídia-educação não inclui somente as mídias no sentido estrito de meios de comunicaçáo de massa mas também diz respeito ao processo educativo que inclui o objetivo de dar voz a comunidades e cidadãos e fazer com dominem a capacidade de expressão. Assim, se pode dizer que os objetivos da mídia-educação incluem aprender através das mídias, com ou sobre elas, no que Fantin (2011) chama de uma concepção como objeto de estudo, instrumento de aprendizagem, forma de cultura e também postura mídia-educativa. Para Pier Cesare Rivoltella (apud FANTIN, 2006, p. 66) a relação entre mídia/comunicação e sociedade é tão importante que a educação não pode deixar de trabalhar sua linguagem, assegurando seu conhecimento e uso. Além da escola, os cidadãos em geral também devem ter a oportunidade de saber usar os meios de comunicação, devem ter “consciência reflexiva e responsável de que a paisagem midiática não é só suporte tecnológico mas também cultura”. 2.4.O papel da Unesco Desde os anos de 1960, a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) realiza conferências que têm como tema principal ou incluem para debate a Educação para a Comunicação. Em 1962, realizou uma conferência intitulada International Meetings of Techniques of Teaching Films and Television Appreciation - Screen education, em que colocava em evidência o papel e influência da televisão e demonstrava a preocupação sobre a responsabilidade dos educadores frente a este meio. Seguidamente em outras conferências se expõe a necessidade de educar criticamente em face dos novos meios de comunicação. No Informe McBride (UNESCO, 1984), volta-se a insistir na necessidade de vincular a Comunicação e a Educação. 12 Um grupo de expertos se reuniu em Paris em 1979 e definiu o que já era uma referência internacional para o termo “educação em matéria de Comunicação”, entendendo-se como: todas as formas de estudar, aprender e ensinar a todos os níveis (…) e em toda circunstância, a história, a criação, a utilização e a Educação dos Meios de Comunicação como artes práticas e técnicas, assim como o lugar que ocupam os meios de comunicação na sociedade, sua repercussão social, as consequências da comunicação mediatizada, a participação, a modificação que produzem no modo de perceber, o papel do trabalho criador e o acesso aos meios de comunicação. (AGUADED-GÓMEZ, 1995). Entretanto, o marco para a media education tornou-se a conferencia de Grunwald, de 1982, quando um grupo de expertos de 19 nações se reuniu naquela cidade alemã sob os auspícios da Unesco para debater as relações entre dois campos tão importantes para a sociedade contemporânea como a Comunicação e a Educação. A Declaração de Grunwald sobre Mídia-Educação (Grünwald Declaration on Media Education) enfatizava a importância da Comunicação no mundo da Educação e a necessidade imperiosa de uma educação para os meios (UNESCO, 1982). Nesse documento, já se antevia as novas possibilidades de comunicação com o desenvolvimento das tecnologias digitais. O documento dizia que “em um futuro próximo”, as possibilidades comunicativas passariam a ser avassaladoras devido ao incremento das tecnologias relacionadas aos satélites, aos sistemas de cabo, à combinação de computador e televisão e outras tantas possibilidades que apenas se vislumbravam antes da era da Internet. Em uma postura extremamente visionária para o início dos anos de 1980, os expertos que redigiram a Declaração de Grunwald reconheciam, acima de tudo, “a responsabilidade de preparar um jovem para viver em um mundo dominado pelas imagens, as palavras e os sons”. Uma responsabilidade que, declaravam, devia ser compartilhada entre escola e família (UNESCO, 1982). Além da questão da consciência crítica no entendimento e trato com os meios, a parte final da Declaração fazia um chamamento à ação e se fazia menção à implantação de programas de educação em meios que não só abarcassem a questão da análise de conteúdo mas também a “utilização dos canais disponíveis, baseada em uma participação ativa”. Uma nova conferência promovida pela Unesco em 1990, desta vez na cidade francesa de Toulouse, resultou em nova declaração: “Novas direções na mídia educação” (New Directions in Media Education). Foram 180 delegados de 40 países que participaram de um colóquio sobre o futuro da mídia-educação, patrocinado pela Unesco, British Film Institute e CLEMI. Além das discussões sobre os termos media education e media literacy e sobre a necessidade de implantação efetiva da mídia-educação nos tempos contemporâneos, o documento enfatizava que os consumidores de mídia também eram agora produtores de sentido. “O objetivo educacional é agora o ‘empoderamento’ do espectador para processar as mensagens dos meios de comunicação de massa e produzir significados que são tanto pessoal como socialmente relevantes” (THOMAN, 1990). É neste momento que se dá ênfase à palavra “empoderamento”, que se repetirá em futuros documentos da Unesco sobre media literacy, tendo hoje especial destaque nos estudos da área. Outro documento importante a ser considerado são as recomendações de outra conferência realizada pela Unesco, desta vez em Viena, em 1999. A declaração “Educando para os meios e a era digital” (Educating for the Media and the Digital Age) ressalta os avanços tecnológicos vividos pela sociedade e as características da nova era que se passaria a viver com intensidade a partir daquela virada de século. Esse documento voltava a enfatizar que a mídia-educação 13 deveria permitir às pessoas não só compreender os meios de comunicação como adquirir ferramentas para usar a mídia para comunicar-se por meio de suas próprias mensagens e histórias (KRUCSAY, 1999). A partir de um seminário realizado na cidade espanhola de Sevilha, em 2002, surge outro documento chave da media literacy, intitulado Youth Media Education Seminar (BUCKINGHAM et al, 2002). É ressaltada a necessidade de criação de políticas públicas em várias áreas relacionadas à mídia-educação. Várias outras conferências e documentos foram elaborados posteriormente e as 12 Recommendations for Media Education foram redigidas em 2007, durante encontro comemorativo dos 25 anos da Declaração de Grunwald, reafirmando a importância da educação para a mídia. As 12 recomendações destacam que mídia-educação abarca todo tipo de mídia, independente da natureza e da tecnologia utilizada (UNESCO, 2007). O texto reforça os três eixos que já vinham sendo alvo das definições de media literacy: acesso; análise/avaliação; criação de conteúdos. Em 2011, uma conferência na cidade de Fez, no Marrocos, intitulada The First International Forum on Media and Information Literacy, não só reforçou os conceitos que até então vinham sendo trabalhados pela Unesco como sugeriu a nomenclatura que passou a ser adotada desde então pelo organismo internacional: Media and Information Literacy, que em documentos editados no Brasil foi traduzida para Alfabetização Midiática e Informacional –AMI. Segundo a Unesco (2012); AMI é definida como uma combinação de conhecimentos, atitudes, habilidades e práticas necessárias para acessar, analisar, avaliar, usar, produzir e divulgar informações e conhecimento de forma criativa, legal e ética, que respeite os direitos humanos. Indivíduos alfabetizados midiática e informacionalmente podem usar diversas mídias, fontes de informação e canais em sua vida privada, profissional e pública. Eles sabem quando e qual informação precisam e para quê, onde e como obtê-la. Eles entendem quem criou essa informação e por que, assim como os papéis, responsabilidades e funções dos meios de comunicação, fornecedores de informação e instituições responsáveis pela memória histórica. Um aspecto já mencionado anteriormente e reforçado por essa definição é que a Alfabetização Midiática e Informacional aborda todos os tipos de meios de comunicação (oral, impressão, analógico e digital) e todas as formas e formatos de recursos. Por este conceito, vê-se como é difícil separar alfabetização midiática de alfabetização digital. Ao considerar o conceito de Media and Information Literacy é importante também fazer considerações sobre o papel da Digital Literacy. Embora alguns autores abordem os dois conceitos como distintos, várias definições de digital literacy e a questão da convergências de mídias tornam possível afirmar que o conceito de alfabetização midiática pode perfeitamente abarcar a alfabatização digital. Segundo Martin (2006, apud KOLTAY, 2011, p.216) alfabetização digital é a consciência, atitude e capacidade dos indivíduos de usarem adequadamente as ferramentas e instalações digitais para identificar, acessar, gerenciar, integrar, avaliar, analisar e sintetizar os recursos digitais, construir novos conhecimentos, criar expressões da mídia, e comunicar com os outros, no contexto de situações específicas da vida, a fim de permitir a ação social construtivo; e refletir sobre este processo. 14 Em um dos seus trabalhos, Renee Hobbs (2010) utiliza o termo Digital and Media Literacy, destacando cinco competências básicas, que “trabalham juntas” para o “empoderamento” dos cidadãos na atividade de consumir e criar mensagens: acesso, análise e avaliação, criação, reflexão e ação, sendo essas duas últimas mais relacionadas à ação social. 3. CONTEXTOS SOCIAIS E HISTÓRICOS Para abordar o tema deste trabalho, que são as atividades mídia-educativas realizadas por ONGs brasileiras, é de fundamental importância entender um pouco os contextos sociais e históricos que envolvem a mídia-educação no Brasil e na América Latina, onde as relações entre Comunicação e Educação tomaram configuração bastante distinta ao que acontece nos EUA e Europa. No Hemisfério Norte, a media education se desenvolve sobretudo no âmbito da educação formal, sendo que muitos países têm políticas claras e a educação midiática é tema obrigatório nos currículos escolares já há muitos anos, além de haver organismos específicos que cuidam do assunto, geralmente subordinados aos Ministérios de Educação (HART, SUSS, 2002; MIJN KIND ONLINE /KENNISNET, 2013). Neste caso, o tema é normalmente introduzido desde a educação básica e inclui todas as dimensões, inclusive a produção de conteúdos e mensagens. No contexto da América Latina, onde as políticas públicas de Educação ainda estão voltadas a outras prioridades, o tema da mídia-educação ainda aparece de maneira esporádica em políticas de estado ou nos currículos obrigatórios. Embora o objeto de estudo dessa pesquisa seja a alfabetização midiática na educação não-formal, para compreender melhor esse panorama, também vale saber um pouco sobre a mídia-educação no âmbito da educação formal. 3.1.Educação formal e políticas públicas Os PCNs – os Parâmetros Curriculares Nacionais, elaborados em 1998, desde o início propunham a inclusão na grade curricular dos Temas Transversais e o incentivo à interdisciplinaridade de conteúdos abriu espaço para abordar o tema da mídia-educação, seja o debate a compreensão crítica da mídia, seja a produção de meios de comunicação escolares. Desde sua promulgação, a LDB sofreu inúmeras atualizações, sendo que a última ocorreu em 2013, por meio da lei 12.796. Da mesma forma, surgiu também a necessidade da atualização das Diretrizes Curriculares Nacionais, sobretudo diante da modificação dos ciclos educativos, com o Ensino Fundamental de nove anos e a obrigatoriedade do ensino gratuito dos quatro aos 17 anos. As novas Diretrizes Nacionais Curriculares (BRASIL, 2013) foram publicadas em 2013 e a preocupação com a mídia-educação está presente ao longo do documento de 562 páginas, que afirma que as tecnologias de informação e comunicação devem perpassar transversalmente a proposta curricular desde a Educação Infantil até o Ensino Médio. Entretanto, as Diretrizes não incluem somente a orientação para incluir as tecnologias e mídias de maneira instrumental. Afirmam, também, que a educação básica deve “compreender os efeitos da ‘infoera’, sabendo que estes atuam, cada vez mais, na vida das crianças, dos adolescentes e adultos, para que se reconheçam, de um lado, os estudantes, de outro, os profissionais da educação e a família, mas reconhecendo que os recursos midiáticos devem permear todas as atividades de aprendizagem” (BRASIL, 2013). 15 Assim, o texto não só aponta a necessidade da utilização das mídias e tecnologias educacionais como a preocupação com a exposição ao mundo midiático, com o objetivo de tornar os alunos consumidores críticos dos conteúdos oferecidos pelos meios de comunicação. Além disso, também menciona a produção de mídias na escola. O grande problema, como em muitas áreas no Brasil, é a distância entre a letra da lei e a realidade cotidiana. O texto das DCNs ressalta, por exemplo, que será necessário oferecer a formação adequada aos professor e assegurar a provisão de recursos midiáticos atualizados e em número suficiente para os alunos, o que muitas vezes não se concretiza de maneira adequada. Os números de Pesquisa do CETIC (2014) confirmam que a formação dos professores ainda é deficiente nesse tema. Os dados de 2014 mostram que 61% dos professores entrevistados pela pesquisa não cursaram, em seus cursos de graduação, disciplina específica sobre como usar computador e Internet com alunos e se 75% afirma que realizou algum curso de capacitação acrescentam que o fizeram (e pagaram) por sua conta. No âmbito do uso de tecnologias, o Ministério de Educação brasileiro desenvolve Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia Educacional (ProInfo Integrado), que é uma “formação voltada para o uso didático-pedagógico das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) no cotidiano escolar”. 5 O Programa também está articulado à distribuição dos equipamentos tecnológicos nas escolas e à oferta de conteúdos e recursos multimídia e digitais oferecidos pelo Portal do Professor e outros repositórios institucionais. O principal projeto do Ministério da Educação relacionado com a educação midiática para os professores é o “Mídias na Educação”. Segundo o Ministério, Mídias na Educação é um programa de educação a distância que visa proporcionar formação continuada para o uso pedagógico das diferentes tecnologias da informação e da comunicação – TV e vídeo, informática, rádio e impresso. Nesse caso, o enfoque parece ser o de considerar a mídia como ferramenta didática. Já no âmbito da sala de aula, o Programa Mais Educação passou a constituir-se nos últimos anos como o espaço privilegiado para o desenvolvimento de atividades relacionadas à mídiaeducação. O Programa foi instituído pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e regulamentado pelo Decreto 7.083/10. Caracteriza-se como estratégia do Ministério da Educação para expandir o tempo da jornada escolar para um mínimo de sete horas. Esse programa estabelece a “Comunicação, Uso de Mídias e Cultura Digital e Tecnológica” como um dos macro campos para as atividades de ensino integral. “Comunicação e Uso de Mídias” é entendido como o conjunto de processos que promovem a formação de cidadãos participativos política e socialmente, que interajam na sociedade da informação, na condição de emissores e, não apenas, consumidores de mensagens, garantindo assim seu Direito à Comunicação. A participação ao Programa se faz pela adesão das escolas, que optam por desenvolver atividades nos macrocampos previstos: educação ambiental; esporte e lazer; direitos humanos em educação; cultura e artes; cultura digital; promoção da saúde; comunicação e uso de mídias; investigação no campo das ciências da natureza e educação econômica. O programa prevê repasse de verbas diretamente às escolas, que possuem autonomia para utilizar os recursos, desde que vinculado às políticas de educação integral. 5 Veja: http://portal.mec.gov.br/proinfo/proinfo 16 No âmbito desse programa, mencionam-se os vários meios de comunicação como possibilidades para o uso da escola como jornais, a rádio, o vídeo, a fotografia e os quadrinhos produzidos por estudantes, privilegiando, assim, a produção das mídias escolares, ao estilo de Freinet. A orientações do Programa não restringem, porém, a mídia-educação a esse âmbito, falando de leitura crítica. Assim sendo, pode-se dizer que, na prática, ainda que esteja comtemplada pelas diretrizes curriculares, a mídia-educação aparecerá em programas específicos e voluntários ou projetos extracurriculares, uma vez que não há a determinação específica de como será incluída nos diversos níveis escolares e disciplinas. Também existem algumas políticas públicas para a educação midiática elaboradas no âmbito regional. A Prefeitura de São Paulo, por exemplo, aprovou uma lei em 2004 (Lei nº 13.941 Lei Educom), oficializando o projeto Educom.Rádio, desenvolvido pelo Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo. 6 Esse projeto foi iniciado em 2001 com a finalidade de atender a 12 mil professores, alunos e membros das comunidades educativas de 455 escolas da Secretaria de Educação da Prefeitura de São Paulo. Regulamentado pela citada lei, o Programa Nas Ondas do Rádio também passou a incluir o incentivo à elaboração de projetos educomunicativos nas Unidades Educacionais que envolvam a linguagem impressa (jornal, mural, jornal comunitário, fotografia, fanzine e história em quadrinhos), radiofônica (rádios escolares), audiovisuais (cinema e vídeo) e digitais (blog e podcast), além de outras formas de comunicação que atendam à evolução tecnológica. A partir da mesma Portaria, foi criado o projeto Agência de Notícias “Imprensa Jovem”, em que os estudantes realizam atividades de cobertura de eventos, de produção e de publicação de conteúdo informativo para a comunidade escolar, veiculados nos mais variados suportes. Com 10 anos de atividades, o Imprensa Jovem deve se transformar em Programa autônomo em 2016, pois já conseguiu desenvolver atividades nas escolas de ensino fundamental do município com um total de 150 “agências de notícias”. A meta, com a criação do programa, é implementar, até final de 2016, um total de 300 experiências. 7 De acordo com a Lei aprovada pela Prefeitura, “cabe ao poder municipal criar programas para desenvolver e articular práticas de educomunicação, incluindo a radiodifusão restrita, a radiodifusão comunitária, bem como toda forma de veiculação midiática, de acordo com a legislação vigente, no âmbito da administração municipal”. A lei também diz que o governo deve “capacitar, em atividades de educomunicação, os dirigentes e coordenadores de escolas e equipamentos de cultura do Município”. Una nova possibilidade de inserção da mídia educação está em discussão desde 2015, quando o Ministério da Educação do Brasil disponibilizou para debate público a Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Básico, documento que reúne direitos e objetivos de aprendizagem relacionados a quatro áreas do conhecimento – Ciências da Natureza, Ciências Humanas, Linguagens e Matemática – e seus respectivos componentes curriculares, que devem ser aplicados a todas as etapas da educação básica. A Área de Linguagens da nova BNC tem um total aproximado de 80 componentes curriculares de interesse para a Educomunicação e a Mídia-Educação, segundo análise feita por Ismar de Oliveira Soares mas, como em outras iniciativas, faltam definições sobre a implantação desses objetivos, sobretudo no que se relaciona à formação de professores. 6 Ver: http://www.cca.eca.usp.br/politicas_publicas/sao_paulo. Ver: http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Main/Noticia/Visualizar/PortalSMESP/Arte-e-emocao-marcamcomemoracao-dos-10-anos-da-Imprensa-Jovem. 7 17 Mesmo com essas iniciativas, Alexandra Bujokas de Siqueira (2007, p. 98) destaca que no Brasil “não há uma discussão em torno de um sistema nacional de políticas de mídia-educação”. Talvez a aparente incompatibilidade entre o sistema educativo formal e as atividades de mídiaeducação estejam relacionadas ao fato que no Brasil, como explica Monica Fantin (2012, p. 445), por sua especificidade na história de luta frente aos regimes ditatoriais, as experiências com mídia-educação assumiram um papel estratégico e de resistência frente ao autoritarismo desenvolvendo-se à margem dos sistemas educativos oficiais através de projetos de instituições voltadas para educação e cultura popular. 3.2. Mídia-Educação no Brasil e América latina Além da falta de políticas públicas consistentes para a inclusão da mídia-educação no âmbito da educação formal, o histórico das iniciativas relacionadas com a educação midiática no Brasil e na América Latina mostra que o tema sempre esteve mais afeito ao “trabalho das organizações não governamentais e na ação de núcleos acadêmicos, tanto do campo da Educação quanto da Comunicação” (Soares, 2014). Ao traçar um histórico da “educação em meios” na região, Aguaded-Gómez (1995) também ressaltou a importância dos grupos e lideranças comunitárias (educadores, animadores, associações, etc.), geralmente nos “âmbitos populares”, com um amplo conjunto de experiências, cujos destinatários geralmente são crianças e jovens. Desde os anos 1970 e 1980, a educação midiática já havia ganhado importância em toda a América Latina. Naquele período, a leitura crítica da mídia era o foco central de muitas atividades de comunicação e educação, embora também se iniciassem atividades de formação para a produção de veículos de comunicação alternativos à grande mídia, como explica Monica Fantin (2012). Surgidas nos anos de 1970 com a preocupação principal da leitura crítica da mídia, as experiências posteriormente se veem alinhadas com as reivindicações pelo direito à informação que surgem nos anos de 1980. Assim, a preocupação pela educação em meios inclui a ideia de consolidar canais de comunicação para as classes populares e pretende dar voz às pessoas excluídas dos meios de comunicação de massa. Nesse contexto, e também com o apoio da Unesco, surgem os primeiros grandes projetos de educação para a recepção crítica da mídia, sobretudo a televisão. Em geral, eram promovidos por movimentos cristãos/católicos que se baseavam em documentos do Vaticano, que mostravam preocupação com os meios de comunicação, e também na Teologia da Libertação, que teve grande influência na região. (AGUADED-GÓMEZ, 1995) O PLAN-DENI (Plan de Niños), iniciado em 1968 pela Oficina Católica Internacional de Cinema (OCIC), foi um dos primeiros programas da região e teve grande influência no Brasil, Uruguai, Paraguai, República Dominicana e Equador. Sua proposta era a iniciação das crianças em uma educação audiovisual por meio do cinema. No Brasil, o programa denominou-se Cineduc, e até hoje segue ativo no Rio de Janeiro. (SOARES, 2014). Surgem vários outros programas, estando entre os mais importantes o Programa de Recepção Ativa ante a Televisão, do Centro de Indagação e Expressão Cultural e Artística (CENECA) de Santiago de Chile e o Programa de Educação para a Comunicação da UCBC (União Crista Brasileira de Comunicação Social). 18 Em meio a essas iniciativas, também há de se destacar a atuação de Mario Kaplún, já mencionado anteriormente, com um projeto iniciado nos anos 70 que tinha o objetivo de por em prática a análise crítica da mídia como instrumentos da “educação popular libertadora”. (KAPLÚN, 1993). Dessa forma, os programas de educação para a comunicação se constituíram, também, em forma de luta frente aos regimes ditatoriais, com um papel estratégico e de resistência uma vez que se desenvolviam à margem dos sistemas educativos oficiais. Nessas iniciativas, “o movimento de educação popular atua na defesa e promoção de democracia, dos direitos humanos, dos valores culturais contra as formas de colonização”. (Fantin 2011, p. 32) Começam também a realizar-se importantes eventos e congressos sobre o tema no Brasil. Em São Paulo, aconteceu em 1998 o I Congresso Internacional sobre Comunicação e Educação, promovido pelo NCE – Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo com apoio do WCME – World Council for Media Education. Ismar Soares pleitea que a mídiaeducação deixe de ser vista como uma questão meramente educativa para transformar-se num problema de natureza cultural. A Conferência registra a emergência de um conceito até então desconhecido: a Educomunicação (SOARES, 2014) Em paralelo a conferências que aconteciam no Hemisfério Norte sobre o tema, o Brasil também foi cenário de encontros importantes, como a IV Cúpula Mundial de Mídia para Crianças e Adolescentes, promovida pela prefeitura do Rio de Janeiro com apoio da UNESCO em 2004. Não se pode deixar de mencionar que o desenvolvimento da mídia-educação na América Latina se relaciona com a concepção de educação de Paulo Freire, ou seja, da educação libertadora. Sobre esse modelo de educação, Kaplún (1998, p. 49) explica que De certo modo, se pode dizer que é um modelo gestado na América Latina. Ainda que tenha recebido valiosos aportes de pedagogos e sociólogos europeus e norte-americanos, é em nossa região onde Freire e outros educadores lhe imprimem sua clara orientação social, política e cultural e elaboram-no como uma «pedagogia do oprimido», como uma educação para a democracia e um instrumento para a transformação da sociedade. Esta concepção de educação também incluirá a questão do protagonismo (KAPLÚN, 1998, p. 63), dizendo que “os homens e os povos e negam a seguir sendo receptores passivos” e exigem o direito de “participar, de ser atores, protagonistas na construção da nova sociedade autenticamente democrática”. Um direito de participar que estará, portanto, intimamente ligado ao direito à comunicação. 3.3. Os movimentos sociais e as ONGs Assim como as iniciativas de mídia-educação, a maioria das ONGs da América Latina, principalmente as que atuam com o tema da Cidadania iniciaram seu trabalho na época das ditaduras e se consolidaram após a redemocratização. Ou seja, sua grande expansão aconteceu nos anos de 1980. No final da década de 70 e início dos anos de 1980, os movimentos sociais populares brasileiros, inspirados pela Teologia da Libertação, tiveram atuação marcante na oposição ao regime militar (GOHN, 2004). A partir de 1990, entretanto, começam a surgir novas formas de participação e organização popular, calcadas em reivindicações muitas vezes específicas de grupos, como movimento de mulheres, homossexuais, indígenas etc. 19 Segundo Scherer-Warren e Luchmann (2004), o processo de globalização e a realização de inúmeras Conferências Mundiais das Nações Unidas possibilitaram “a interlocução entre os movimentos sociais e levaram à articulação das organizações civis através de fóruns locais e nacionais, com vistas a uma preparação de suas representações”. Assim, surgem novas articulações entre Estado e sociedade e grande parte das “energias participativas” (SCHERER-WARREN, LUCHMANN, 2004) se desloca para o interior dos novos espaços institucionais, dando novos contornos ao conceito de sociedade civil. As instituições que estão no âmbito do chamado Terceiro setor muitas vezes atuam em parceria com o poder público como se confirma nesta pesquisa e na área da mídia-educação. Se nos anos DE 1970/80, as ONGs eram instituições de apoio aos movimentos sociais e populares (GOHN, 2004), no início dos anos de 1990, o panorama da sociedade civil se amplia incluindo tanto organizações preocupadas com a cidadania quanto outras mais articuladas a empresas e fundações. “Um grande número de projetos sociais passa a ser patrocinado por empresas e bancos, dentro de programas de responsabilidade social, no âmbito da cidadania corporativa” (GOHN, 2004, p. 146). Gohn (2004) classifica as ONGs em dois grupos que chama de ONGs “militantes”, herdeiras, a seu ver, dos movimentos sociais dos anos 70 e 80, e as ONGs “propositivas”, que atuariam segundo ações estratégicas, por meio de lógicas instrumentais, racionais e mercadológicas. As primeiras estariam mais preocupadas com a participação popular e a cidadania e as segundas, sem perfil ideológico definido, normalmente são criadas por iniciativa de empresários, grupos econômicos ou personalidades do mundo artístico e esportivo. Embora nesta pesquisa não se tenha sistematizado as ONGs e projetos estudados desta forma, uma observação superficial na descrição das 107 ONGs seria suficiente para confirmar a existência desses dois tipos de ONG no âmbito da mídia-educação. Poderiam ser mencionadas, por exemplo, fazendo parte do primeiro grupo, as ONGs Associação Cultural e Beneficente Ilê Mulher ou o Centro de Mulheres do Cabo. No segundo grupo, se pode encaixar perfeitamente o Instituto Criar de TV Cinema e Novas Mídias, criado pelo apresentador Luciano Huck ou a Fundação Gol de Letra, dos jogadores de futebol Leonardo e Raí. O termo ONG, na verdade, tornou-se de uso corrente e generalizado, como sinônimo de qualquer tipo de organização privada voltada para a ação social, conforme destaca Landim (2002). Destaca que, sob esse rótulo, tanto estão entidades assistenciais, “prestadores de serviços diversos à pobreza” como se incluem a filantropia empresarial, ou investimento social empresarial. 3.4. Mídia-Educação no âmbito não-formal Gadotti (2005) destaca que o conceito de educação não-formal é amplo e está associado ao conceito de cultura. Por esse motivo, segundo o autor, está “fortemente ligada à aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos e à participação em atividades grupais, sejam esses adultos ou crianças” (GADOTTI, 2005, p. 3). Ou seja, a educação não-formal está normalmente associada à educação popular e à educação comunitária. Os espaços de cidadania construídos pela organizações nos processos de educação não-formal representam, segundo Gohn (2009, p. 34), “uma alternativa aos meios tradicionais de informação que os indivíduos estão expostos no cotidiano, via os meios de comunicaçãoprincipalmente a TV e o rádio”. Deve-se ressaltar que, embora realizada fora do sistema formal, a atividade educacional não-formal é realizada de forma organizada e sistemática e é sobretudo oferecida pelas organizações não-governamentais, com é o caso das iniciativas aqui analisadas. 20 Assim como a comunicação comunitária, a educação não formal é uma ferramenta importante no processo de formação e construção da cidadania. (GADOTTI, 2005). Nesse âmbito, Gohn (2011, p. 341) destaca que as ONGs tomaram um papel fundamental, se fortaleceram na primeira década deste milênio e “tomaram a dianteira na organização da população, no lugar dos movimentos sociais”. Esse cenário faz com que a atuação da sociedade civil seja de fundamental importância no âmbito da educação midiática, como ressalta Soares (2014, p. 19). A necessidade de responder aos desafios modernos apresentados pelos meios digitais parece que tem aumentado ainda mais a importância dos projetos que têm como objetivo capacitar os cidadãos não só a compreender essas tecnologias como também apropriar-se das novas possibilidades de produzir conteúdos e mensagens comunicacionais. As relações entre comunicação comunitária e educação midiática se dão primordialmente no âmbito da educação não-formal, ou seja, aquela que acontece usualmente extramuros escolares, nas organizações sociais, nos movimentos, nos programas de formação sobre direitos humanos, cidadania, práticas indentitárias, lutas contra desigualdades e exclusões sociais (GOHN, 2009). 3.5. Novas tecnologias e inclusão digital Um aspecto importante a ressaltar é o papel que o desenvolvimento tecnológico exerce no cenário da mídia-educação. Conforme destaca Jenkins (2009), é a convergência de mídias que permite aos novos consumidores exercerem um papel ativo, ou seja, que possibilitam o conceito de uma “cultura participativa”. Se as tecnologias parecem empoderar os cidadãos e possibilitar que se tornem novos produtores de informação e conhecimento, nem sempre isso se concretiza. Como destaca González, as populações das chamadas “zonas periféricas”, como a América Latina, muita veze ficam de fora dos benefícios gerados por estas tecnologias, “em especial da formação prática para utilizar as tecnologias com o objetivo de reformatar, recriar, entender e expressar sua própria diferença e especificidade”. (2007, p.37). De fato, as estatísticas sobre o uso das tecnologias no Brasil podem comprovar a afirmação de González. Pesquisa sobre as TIC (CETIC, 2014) mostra que 41% dos domicílios brasileiros dispõem de acesso à Internet. Esses números podem subir a 91% se vamos às classes sociais economicamente mais favorecidas e, se detalhamos por faixa etária, vemos que 89% dos jovens de 10 a 15 anos já usaram Internet de alguma forma, em suas casas ou em outros espaços, como as lan houses. Esse uso, porém, não se traduz necessariamente em processos de apropriação de informação e conhecimento ou participação da cidadania: a mesma pesquisa (CETIC, 2014) aponta que somente 17% dos que usam Internet no Brasil já utilizaram a rede para interagir com autoridades públicas e apenas 20% criaram conteúdos por meio de blogs, páginas na Internet ou websites. A este cenário, somamos o debate da questão da inclusão digital. Como destaca González (2007), a dimensão econômico-financeira não explica a totalidade da problemática da infoexclusão. Sem dúvida, também há também razões educacionais, culturais e políticas que interferem nas condições de acesso (ou não-acesso) às tecnologias, além de influenciar o nível da qualidade de acesso e apropriação pelos segmentos da população, segundo a realidade de cada segmento. 21 Assim, não basta disponibilizar suportes tecnológicos, nem promover programas de capacitação visando a aquisição de habilidades básicas para que ocorra a apropriação dentro do potencial que a rede oferece. Para Gonzáles, desenvolver a cibercultur@ 8 passa por um processo em que se aprende uma série de habilidades transmissíveis que nos permitam operar bem as tecnologias ao nosso alcance frente às necessidades de informação para gerar o conhecimento e para coordenar ações de comunicação que nos permitam romper o ciclo vicioso da dependência tecnológica” (GONZÁLEZ, 2007, p.8). Também podemos tomar outro ponto explorado por Jenkins: o autor faz uma diferenciação interessante entre o conceito de interatividade e de participação. A seu ver, “interatividade é uma propriedade da tecnologia enquanto que participação é uma propriedade da cultura” (Jenkins, 2009, p. 8). Dessa forma, ele afirma que a cultura participativa é aquela que absorve e responde à explosão de novas tecnologias de mídia, e que torna possível aos consumidores médios reelaborar e circular o conteúdo de mídia “em maneiras novas e poderosas”. 4. CIDADANIA, EMPODERAMENTO E COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA O tema do empoderamento e da participação ativa dos cidadãos nos processos comunicacionais já é mencionado há muito tempo nos documentos da Unesco sobre mídia-educação como um dos aspectos fundamentais da alfabetização mediática. A educação midiática trata justamente de “empoderar” as pessoas para serem pensadores críticos e produtores criativos “de uma gama cada vez maior de mensagens com imagens, som e linguagem” (CARLSSON et al., 2008, p. 21). Segundo esse ponto de vista, “a alfabetização midiática ajuda, portanto, a reforçar as capacidades críticas e competências comunicativas que dão significado a existência humana e habilitam o indivíduo a usar a comunicação para a mudança” (CARLSSON et al., 2008, p. 21). Monica Fantin (2011) também destaca a questão da cidadania relacionada à mídia-educação. A relação com o exercício da cidadania se dá porque a mídia-educação implica, antes de mais nada, na adoção de uma postura “crítica e criadora” de capacidades Comunicativas. A partir do pensamento de Rivoltella, Fantin (2011) afirma que, de um lado a mídia-educação pode chamar a atenção da sociedade civil e dos poderes políticos aos valores da cidadania, e de outro, através da sua especificidade, a mídia-educação contribui para construir essa mesma cidadania, no que o pesquisador italiano chama de “duplo exercício da cidadania”, que seria a cidadania de pertencimento e a cidadania instrumental. Assim, a necessidade de adquirir competências, de se alfabetizar para o uso das linguagens e das técnicas de comunicação fazem com que a educação midiática adquira papel importante para as instituições que pretendem valorizar o direito à comunicação e o protagonismo da comunidade como sujeito de seus meios de comunicação. As relações entre educação e comunicação se explicitam, pois as pessoas envolvidas em tais processos desenvolvem o seu conhecimento e mudam o seu modo de ver e relacionar-se com a sociedade e com o próprio sistema dos meios de comunicação de massa. Apropriam-se das técnicas e de instrumentos tecnológicos de comunicação, adquirem uma visão mais crítica, tanto pelas 8 González usa a grafía “@” para designar o caráter aberto e espiral em crescimento do desenvolvimento que implica a palavra. 22 informações que recebem quanto pelo que aprendem através da vivência, da própria prática. (Peruzzo, 1999). Entretanto, é necessário ter em conta que nem sempre a simples produção de conteúdo significa algo que poderá “empoderar” a cidadania, uma vez que essa atividade pode simplesmente reproduzir o que está na mídia de massa (e portanto, reproduzir o mesmo enfoque e a mesma ideologia). Ou seja, é fundamental que o desenvolvimento das habilidades comunicativas esteja conjugado à compreensão crítica. Outro aspecto importante a considerar relacionado a esta temática é a estreita ligação que se pode estabelecer, portanto, entre mídia-educação e comunicação comunitária. Peruzzo (2009, p.38) afirma que os setores envolvidos estão demandando “agregar as possibilidades comunicativas que as Novas Tecnologias de Informação e Comunicação (NTIC) oferecem, sem desprezar as formas mais tradicionais” de comunicação. A comunicação comunitária é entendida aqui como “aquela desenvolvida de forma democrática por grupos subalternos em comunidades, bairros, espaços on-line, por exemplo, segundo seus interesses, necessidades e capacidades. É feita pela e para a comunidade” (Peruzzo, 2008, p. 2). Também se pode acrescentar que a comunicação comunitária se configura em uma grande variedade de feições, formatos e suportes, e que em geral tem como objetivo transmitir conteúdos tratados de maneira diferentes dos que são vistos nos meios de comunicação de massa. Além disso, assume um caráter crítico e propositivo, com participação ativa da comunidade, vínculo local e produção colaborativa. (PERUZZO, 2009) A participação na Comunicação é um mecanismo facilitador da ampliação da cidadania, uma vez que possibilita à pessoa tornar-se sujeito de atividades de ação comunitária e apropriar-se dos meios de comunicação construídos naquele espaço, o que resulta em um processo educativo fora do ambiente a escola. Se esses processos de educação midiática partem de organizações de interesse social, há ainda maior potencial de valorizar o protagonismo do cidadão e colocar os meios de comunicação a serviço do desenvolvimento comunitário (PERUZZO, 2009). 5. MÍDIA-EDUCAÇÃO NAS ONGS BRASILEIRAS Realizada de janeiro de 2015 a fevereiro de 2016, a pesquisa resultou num mapeamento das principais características dos projetos de mídia-educação realizados por organizações da sociedade civil brasileira. O mapeamento realizado aqui, obviamente, não cobre todas as iniciativas de mídia-educação no âmbito da educação não-formal. Há inúmeras iniciativas que foram detectadas mas não fizeram parte da amostra por não se enquadrarem no perfil escolhido. Entre essas iniciativas é importante destacar aquelas realizadas pelos núcleos de extensão de diversas universidades, que em geral trabalham com projetos de mídiaeducação/educomunicação no âmbito escolar, ainda que em atividades extra-classe e em períodos alternativos aos horários escolares. Exemplos interessantes merecem ser ao menos mencionados antes que o trabalho se detenha no detalhamento e análise da amostra escolhida. O mais antigo grupo que trabalha com o tema é o NCE (Núcleo de Comunicação e Educação) da ECA/USP, dirigido por Ismar de Oliveira Soares e que tem apoiado e levado a cabo diversos projetos de educomunicação não só em São Paulo, estando ligado também à criação da Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais de Educomunicação – Abpeducom. 23 Criado em 2003, o Núcleo de Comunicação e Educação Popular (NCEP) da Universidade Federal do Paraná Propõe e assessora ações de comunicação nos Movimentos Populares e Sociais, como a produção de programas para rádios comunitárias, produção de jornais comunitários impressos e online, produção de vídeos, divulgação e coberturas de ações organizativas – além de oficinas para que os participantes dos movimentos sociais possam ser autônomos na realização de suas ações. Desenvolve, também, projetos de Educação para os meios, de educomunicação, junto a escolas públicas estudante sobre as possibilidades de atuação profissional nesse segmento social, além de discutir a relação entre a universidade e a comunidade atendida. Na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o Território de Oportunidades, procura desenvolver o senso crítico dos adolescentes em relação à grande mídia levando-os a fazerem uma leitura crítica dos meios, proporcionando-lhes a possibilidade de aprender e compreender o processo de produção, edição e veiculação de notícias, e contribuir para o seu exercício do direito à comunicação. Também se deve mencionar o núcleo de atividades de mídia-educação ligado ao curso de Especialização em Comunicação Popular e Comunitária da Universidade Estadual de Londrina sob orientação da professora doutora Luzia Yamashita Deliberador. A partir de vários trabalhos de alunos, são geralmente realizados projetos de mídia-educação no ambiente escolar. Também não analisamos aqui as atividades dos telecentros, que agora se espalham pelo país, seja por meio de projetos governamentais ou por iniciativas privadas. Saldanha (2006) relata, por exemplo, as iniciativas de telecentros comunitários realizados em favelas, especialmente na favela Santa Marta, no Rio de Janeiro, que tanto serve à alfabetização digital como à alfabetização midiática. No caso destes telecentros, “formam-se facilitadores/as e promotores/as comunitários/as em aspectos técnicos de informação e comunicação e também em usos estratégicos das tecnologias digitais para a mudança social”. O estudo mais aprofundado desses projetos, e de tantos outros existentes no Brasil, poderiam ser alvo de futuras pesquisa sobre o tema, uma vez que esta pesquisa nem de longe pretende esgotar o amplo panorama da interface entre Comunicação e Educação no Brasil. 5.1. Metodologia A primeira tarefa desenvolvida para esta pesquisa (de janeiro a maio de 2015) foi a identificação de projetos de educação midiática realizados no Brasil por organizações de âmbito civil sem fins lucrativos. Era requisito para integrar a amostra que as atividades fossem realizadas foram do ambiente escolar, considerado, pelas leituras prévias, como o mais rico de iniciativas. Foi realizada uma busca direta em Internet através de várias palavras-chave 9 relacionadas ao tema e feito um rastreamento em sites pertinentes ao tema, como os da ABONG – Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais, Onda Cidadã (Mapeamento da Mídia Alternativa), AMARC – Associação de Rádios Comunitárias, entre outros. Também se realizou uma busca em anais de vários Congresso brasileiros nos quais se pudessem encontrar papers relacionados a trabalhos acadêmicos ou relatos de experiência de ONGs, projetos e iniciativas relacionados à mídia-educação no âmbito da educação não-formal que se enquadrassem nos critérios estabelecidos. 9 Palavras chaves: mídia-educação, ONGs, educação não formal, comunicação comunitária, educomunicação, leitura crítica da mídia, educação para a comunicação, comunidade, cidadania, e suas possíveis combinações. 24 Foram rastreados os seguintes congressos: Conferência Brasileira de Mídia Cidadã, Encontro Brasileiro de Educomunicação, Simpósios de Educação e Comunicação, bem como os GTs relacionados aos temas, de Comunicação e Educação e/ou Cidadania dos congressos gerais de Comunicação, tanto no âmbito nacional (como Intercom e Compós), como no âmbito iberoamericano (como Ibercom), uma vez que normalmente reúnem muitos trabalhos brasileiros. O rastreamento cobriu pelo menos os últimos cinco anos desses eventos e, em alguns casos, um período maior. No caso da Intercom, por exemplo, o rastreamento cobriu o período de 2000 a 2014. Também foram examinadas as dissertações e teses catalogadas pela ABPEducom, que reúne pesquisas de mestrado e de doutorado que estão sendo desenvolvidas ou que já foram concluídas em torno do tema da inter-relação Comunicação/Educação. A relação de pesquisas relacionadas pela ABPEducom reúne trabalho dos pesquisadores do Programa de PósGraduação em Ciências da Comunicação da ECA/USP e do Núcleo de Comunicação e Educação (NCE-USP), aos quais foram agregados pesquisadores de outros centros de investigação científica - nacional e internacional - que enviarem as referências ao blog da ABPEducom. Após a busca direta na Internet, portais e em anais de congressos relacionados com comunicação, educação e cidadania, se observaram nas experiências relatadas os aspectos a serem considerados na pesquisa, como formação, educação em comunicação, e TIC. Foram descartadas iniciativas exclusivamente orientadas ao uso e manutenção de computadores, por exemplo. Foram identificadas incialmente 129 entidades, ONGs e/ou instituições da sociedade civil que trabalhavam com a interface comunicação e educação e que foram catalogadas em uma base de dados que identificava suas características, não só mediante as informações oferecidas pelos artigos e papers correspondente, como também pela consulta realizada a seus correspondentes websites e redes sociais. Esses procedimentos permitiram observar algumas características básicas como: localização, data de início de atividades, objetivos, e papel da interface comunicação e educação para a ONG, assim como se realizavam exclusivamente atividades mídia-educativas. Os procedimentos seguiram um segundo nível de análise (junho-outubro de 2015), em que foram identificados e analisados os projetos realizados por essas ONGs, chegando-se a 302 projetos de alfabetização mediática, observados segundo as categorias estabelecidas a partir da revisão bibliográfica sobre o tema: − Dimensões da mídia-educação: acesso/uso, compreensão crítica, e produção de conteúdos. − Atores envolvidos: destinatários, profissionais envolvidos, apoiadores e patrocinadores. − Meios e processos de comunicação enfatizados: impressos (jornais, revistas, boletins, e outros); meios audiovisuais (cinema, vídeo, TV, rádio/áudio, fotografia, e outros); TIC (Internet, web designer, aplicativos e outros); meios digitais (websites, blogs, mídia social, mídia móvil e outros); monitoramento e seguimento da mídia (monitoramento de temas relacionados com as ONGs, produção de pautas e notícias alternativas, formação de jornalistas etc.). − Tecnologias digitais: nível de importância das TIC e ênfase à inclusão digital. − Comunicação comunitária: relação com a produção de veículos permanentes de comunicação e atores implicados. 25 − Empoderamento: ênfase na defesa de direitos do cidadão; ao protagonismo dos sujeitos, potencial de empoderamento por meio das atividades mídia-educativas. O terceiro nível de análise foi qualitativo, contrastando a informação quantitativa encontrada e por meio dos seguintes procedimentos: i) codificação de objetivos conforme as palavras-chave dos projetos; ii) eliminação de 22 organizações pouco vinculadas com a pesquisa ou que deixaram de trabalhar com o tema da mídia-educação após o levantamento inicial. Finalmente, foram enviados (outubro-dezembro de 2015) questionários (com opção de respostas em formulário word ou on-line) a 107 entidades solicitando confirmação de dados descritivos já recompilados e opinião a respeito de aspectos da pesquisa, como a importância da inclusão digital ou o empoderamento cidadão. O questionário 10 continha perguntas fechadas, de múltiplas respostas, e abertas. Enviado de forma on-line, com a opção de responder via internet ou em formulário word, 22 organizações responderam no prazo estabelecido. Ao se confrontar a informação com os parâmetros requeridos, foram validados para a amostra final 240 projetos de Mídia-educação, realizados por 107 organizações. A base de dados sobre as ONGs incluiu nomes da entidade responsável, descrição, atividades desenvolvidas, localização, contatos e importância da Comunicação e Educação para a ONG. Figura 1 –Fac-símile da base de dados ONGs que realizam projetos de Mídia-Educação Fonte: Elaborado pelo autor De um lado, algumas organizações foram descartadas por terem características que, por um ou outro motivo, não se enquadravam nos critérios da amostra desejada. De outra parte, o que se pode perceber, durante a pesquisa, é que esse cenário é altamente fluido. Páginas-web desapareceram durante o ano de 2015 entidades que responderam ao questionário diziam que já não desenvolviam determinado projeto ou foram encontrados blogs e facebooks que levavam já anos sem atualizar-se. O alto número de reformulações e abandono de projetos parece indicar um efeito da crise econômica brasileira que se agravou no último ano, visto que em geral as ONGs se mantém por meio de patrocínios oferecidos por grandes institutos ligados a empresas privadas ou mesmo a partir de apoio governamental. Esse aspecto poderia ser tema de nova pesquisa. 10 O questionário pode ser consultado no link: https://docs.google.com/forms/d/1MGCDnG7EatBfpW8LOb2ISH98E4tcK0rvsTJYZvzpQFA/viewform 26 5.2.Perfil das ONGs estudadas As 107 organizações não governamentais estudadas em detalhe estão distribuídas em todo o Brasil. Especificamente, 63 (58,9%) são entidades localizadas no Sudeste, enquanto que 27 (25,2%) estão no Nordeste, sendo o restante distribuído em diferentes estados. Tabela 1 - Situação geográfica das ONGs que realizam atividades de Mídia-Educação Região onde está a ONG Nordeste 27 25,2% Sudeste 63 58,9% Centro-Oeste 6 5,6% Sul 10 9,3% Norte 1 1% TOTAL 107 100% Fonte: Elaborado pelo autor 5.3.Atividades Analisadas as 240 iniciativas de educação midiática, observa-se que, em geral, são oficinas e cursos oferecidos que pretendem capacitar para o uso das ferramentas e meios de comunicação ou para proporcionar recursos para a leitura crítica a mídia. Também se caracterizam como seminários, debates, sessões de cinema com debates, no caso de organizações que se dedicam à alfabetização cinematográfica. É também interessante saber quando essas organizações iniciaram as atividades relacionadas com educação e comunicação. Embora se tenha visto que as atividades de mídia-educação no âmbito da educação não-formal tenham surgido com destaques nos anos de 1970 e de 1980, é interessante observar que somente uma minoria das ONGs que hoje se dedicam a mídiaeducação iniciou suas atividades antes de 1990 (15,0%). Afinal, nas décadas anteriores esse tipo de atividade estava mais ligado, como vimos, a movimentos populares e movimentos de base católicos, sendo que as organizações não-governamentais vieram, justamente, se consolidar no período posterior. A maioria das ONGs estudadas nesta pesquisa iniciaram suas atividades entre a década de 1990 (31,8%) ou após o ano 2000 (53,2%), o que se pode atribuir à expansão das novas tecnologias e recursos digitais, que facilitaram principalmente as iniciativas relacionadas à produção de conteúdos, como se verá mais adiante. Vemos a seguir a tabela sobre o período de início de atividades das organizações que foram alvo deste estudo: Tabela 2 - Período de início de atividades das ONGs que realizam atividades de Mídia-Educação 1960 1970 1980 1990 2000 2010 DÉCADA DE INÍCIO ATIVIDADES 2 1,9% 4 3,7% 10 9,3% 34 31,8% 51 47,7% 6 5,6% Fonte: Elaborado pelo autor 27 5.4.Motivação e objetivos Os 240 projetos de ME identificados podem claramente ser divididos em dois tipos, segundo a análise de seus objetivos: aqueles que têm a Comunicação e sua apropriação como principal objetivo e aqueles que utilizam a Comunicação como instrumento de conquista, reivindicação de direitos ou divulgação da própria entidade. Por um lado, 43 organizações (40,2% do total) têm a comunicação como meta principal, e seus objetivos são “dar voz “ aos destinatários e democratizar o uso da comunicação. Em geral, como se verá mais adiante, trabalham com um perfil de público normalmente excluído não só dos meios de comunicação tradicionais como também dos processos de produção de conteúdo (semteto, populações em risco de exclusão social, habitantes de comunidades populares ou favelas etc.). Por outro lado, 64 organizações (59,8%) enfatizam a divulgação de temas sociais e a reivindicação de direitos. São constantemente mencionados os direitos humanos e os direitos da infância, mas também se referem ao objetivo mais genérico de promover a democracia participativa e o fortalecimento da cidadania, ética e valores. Deste modo, estas organizações pretendem difundir temas invisíveis aos meios de comunicação, não só mediante propostas alternativas de comunicação, como também por meio da formação de jornalistas e da produção de sugestões de pautas alternativas para a mídia. A apropriação dos meios e processos de comunicação é direcionada, muitas vezes, para a criação de meios de divulgação das temáticas pertinentes à ONG ou para divulgar a própria entidade. A figura a seguir resume o panorama geral das ONGs levadas em consideração nesta pesquisa: 28 Figura 2 – Panorama geral das ONGs que realizam Mídia-Educação Fonte: Elaborado pelo autor Ao se observar os objetivos das iniciativas de educação midiática estudadas, se pode também resumi-los em algumas palavras-chave bastante significativas para a análise. No âmbito da apropriação dos processos comunicacionais pelos destinatários, encontramos frases como: - Permitir acesso ou apropriar-se da comunicação - Formar para o uso da comunicação - Potencializar a comunicação - Refletir sobre a comunicação - Democratizar e promover a pluralidade da comunicação - Produzir e disseminar informaçao/comunicaçao A nuvem de Tags apresentada permite que se visualize os principais objetivos dos projetos estudados e o destaque dado aos temas mencionados: 29 Figura 3 – Tags a partir dos objetivos das ONGs que trabalham com Mídia-Educação Fonte: Elaborado pelo autor Além dos objetivos diretamente relacionados à comunicação, as iniciativas de mídia-educação também incluem, algumas vezes, objetivos que pretendem a inserção socioeconômica (principalmente os projetos de inclusão digital), mobilização e mudança social, fortalecimento das entidades e desenvolvimento sustentável. Dos 240 projetos analisados, 34 têm explicitamente objetivos relacionados à inserção dos destinatários no mercado de trabalho. Estes objetivos serão conseguidos ou facilitados por meio da comunicação ou da apropriação de meios e processos. Nesses casos, as palavras-chave são outras: - Transformação social - Promover direitos - Promover e difundir ações voltadas para a defesa dos direitos de crianças e adolescentes, buscando a sensibilização e mobilização da sociedade - Desenvolver projetos para a melhoria da qualidade de vida e da renda - Busca dar visibilidade as lutas e movimentos das mulheres etc. - Fortalecer a cidadania - Promover os direitos elementares das crianças - Ajudar coletivamente no processo de transformação social 5.5.Contexto e atores envolvidos O contexto social em que acontecem os projetos estudados é definido não só pelo local em se encontram como também pelos destinatários das atividades desenvolvidas. Pelo menos 25,4% dos projetos acontecem em periferias de grandes cidades, comunidades populares, favelas ou comunidades rurais. São, por exemplo, ações como: Oficinas de Realização Audiovisual, da Associação Cultural Kinoforum (SP); Escola de Comunicação Comunitária, da Associação 30 Escola de Notícias (SP); Oi Kabum! Escola de Arte e Tecnologia, realizada por várias associações em várias cidades do Brasil mas sempre relacionadas ao público da periferia ou de comunidades populares. Outro exemplo é o projeto Do chão da Maré às Nuvens, do Observatório de Favelas (Rio de Janeiro) trabalha com mídias digitais, foto, vídeo, internet e redes sociais junto a adolescentes moradores da favela da Maré, conforme a definição de seu próprio site 11: Trata-se de um espaço de experimentação em cultura digital a partir de um curso de iniciação em fotografia, vídeo e mídias digitais. A ideia é potencializar o repertório de adolescentes contribuindo para a reflexão em torno da sua realidade, na Maré e nas escolas, e apresentá-la por meio das mídias digitais. O projeto tem como meta fomentar um núcleo de produção de linguagem (imagens e falas) que se constitua como um espaço de produção de novos olhares sobre o cotidiano de trocas, de sociabilidades, de criação, de inovação, presente tanto na escola situada neste território como no entorno. O objetivo é que este núcleo seja permanente e constitua-se como um canal de comunicação entre os adolescentes e seu território de origem. Se cruzamos estes dados com o perfil de destinatários, iremos traçando suas características: no geral, 102 projetos (42,5%) se relacionam de alguma forma a populações em risco de exclusão ou marginalizados: moradores de rua, de baixa renda, indígenas, comunidades negras. Podemse mencionar projetos como os levados a cabo pela ONG Thydewá da Bahia; o Instituto Mídia Étnica; Mulher, Mídia Bahia ou o já bastante conhecido Projeto Boca de Rua, da ALICE Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação, no qual moradores de rua participam da elaboração e da venda de um jornal. Quanto à faixa etária, a metade dos projetos (120) são dirigidos a crianças e jovens. Destes, pelo menos quatro trabalham com jovens que cumprem medias sócio-educativas. A ONG Ação Educativa (SP), por exemplo, destina oficinas de fotografia a 1.200 adolescentes que cumprem medida socioeducativa em regime de internação, por meio de seu programa Arte na Casa. Estas oficinas têm como objetivo promover uma intervenção em 27 unidades da Fundação CASA (antiga Febem). Outro exemplo é a Associação Novo Olhar, que atua no bairro da Bela Vista e também trabalha em SP com jovens que cumprem medida sócio-educativa com o Projeto Comunicação Audiovisual na Fundação CASA, que pretende desenvolver competências e habilidades que “potencializem os participantes como seres humanos criativos, capazes de transformar a si e sua realidade”. São promovidas oficinas de comunicação e cidadania, atendendo 360 jovens por ano, de quatro unidades em São Paulo. Somente quatro projetos se destinam explicitamente a idosos: Jornal Almanaque (ALICE), Oldnet (Associação Cidade Aprendiz); Oficinas Imaginação Digital, da ONG Imaginário Digital e Rede Conhecimentos Livres, da ONG Moradia e cidadania. É interessante mencionar que 22 projetos (9,2%) têm como destinatários jornalistas ou profissionais de comunicação, ocupando-se de sua formação quanto a temas que são parte dos objetivos dessas ONGs. Como se abordará mais adiante, esse tipo de ação também pode ser considerado dentro dos objetivos amplos da mídia-educação e da alfabetização midiática. Podem ser destacados projetos como: Monitoramento da mídia e Formação de Jornalistas, da Agência de Notícias da Infância Matraca (Maranhão); Saideira – Encontros Periódicos sobre Comunicação, da ALICE - Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação (Rio Grande do Sul); Monitoramento de mídia, da Central de Notícias dos Direitos da Infância e do 11 Ver: http://of.org.br/projetos/do-chao-da-mare-as-nuvens/. 31 Adolescente – Ciranda (Paraná); Formação comunicadores, do Instituto Mídia Étnica (Bahia); Central de Notícias da Infância, da Oficina de Imagens – Comunicação e Educação (Minas Gerais) e as Oficinas de capacitação em comunicação democrática, da UNIRR – União e inclusão em redes de rádio (São Paulo). Embora se fale aqui de educação não-formal, é interessante observar que 41 projetos (17,1%) estão relacionados de alguma forma ao âmbito da educação formal, pois são destinados a professores, estudantes ou escolas, geralmente das redes públicas de ensino. Podemos dizer, portanto, que mesmo quanto promovida por organizações da sociedade civil a mídia-educação acaba, muitos vezes, por se colar ao sistema formal de educação, ainda que os projetos sejam realizados fora do ambiente da escola. A figura a seguir resume os principais destaques relacionados com os destinatários dos projetos: Figura 4 – Projetos de Mídia-Educação – Contexto e perfil dos destinatários Fonte: Elaborado pelo autor É interessante notar que há também uma mescla de atores de vários âmbitos: organizações nãogovernamentais são muitas vezes apoiadas por grandes empresas e seus institutos (Oi futuro, Fundação Camargo Correa, Instituto Itáu Cultural etc.). Mais de uma entidade se une para fomentar um determinado projeto e algumas vezes também há algum tipo de associação ou apoio ao poder público. Dessa forma, é bastante complexo entender e descrever as redes de atores envolvidos e suas inter-relações, ficando esta tarefa para futuras pesquisas, com a necessidade de entrevistas e questionários. 32 5.6. Meios e processos de comunicação Os projetos normalmente privilegiam em seu trabalho mídia-educativo algum meio ou processo de comunicação, ainda que possam trabalhar simultaneamente em várias frentes. Dos 240 projetos analisados, 147 tem relação com os meios audiosivuais (TV, vídeo, cinema, rádio, produção de audio e fotografia), geralmente incluindo oficinas de capacitação para a produção de conteúdos. Dentre esses 147 projetos, 92 privilegiam o audiovisual como principal recurso e os demais trabalham, em paralelo, com outras mídias. É interessante notar que o privilégio do audiovisual não significa, porém, que os impressos foram abandonados: 41 projetos ainda contam com algum tipo de atividade mídia-educativa relacionada com meios impressos (jornais, revistas ou boletins), ainda que seja em paralelo com outras mídias. Somente 13 projetos elegem exclusivamente o trabalho com meios impressos. Dos 240 projetos analisados, 63 explicitam como prioridade as TIC (sozinhas ou combinadas com outras mídias) e outros 42 (17,5%) incluem as mídias digitais, o que pode ser considerado ainda um número baixo para o momento atual. Vale dizer, entretanto, que mesmo não explicitando como prioridade as mídias digitais ou as TIC, boa parte dos demais projetos faz uso dessas tecnologias como recurso de produção ou para a divulgação dos conteúdos produzidos. Como vimos, a grande maioria dessas iniciativas opta pelo uso dos audiovisuais seja vídeo ou rádio e é evidente que a difusão dessas produções se faz principalmente por meio da Internet e dos sites das próprias organizações. Neste caso, porém, as tecnologias são muito mais um canal auxiliar dos objetivos dos projetos do que seu próprio alvo. Vale ainda comentar outro ponto do gráfico apresentado a seguir: há várias iniciativas (21) que não elegem trabalhar com nenhum meio em específico pois estão mais direcionadas aos processos comunicacionais em geral, com a preocupação de fomentar um pensamento crítico em relação aos meios de comunicação e impulsionar processos de participação da cidadania. Outros 22 fazem o monitoramento das grandes mídias para analisar os temas de interesse da entidade, propõem pautas a jornalistas e elaboram boletins sobre os temas que são alvo das ONGs. O Gráfico 1 mostra o panorama geral relacionado a meios e processos de comunicação: Gráfico 1 - Meios e processos enfatizados Fonte: Elaborado pelo autor 33 O Gráfico 2 mostra a situação de forma mais detalhada: Gráfico 2 – Projetos de Mídia-educação – meios e processos de comunicação enfatizados Fonte: Elaborado pelo autor 5.7. Dimensões Ao se observar outra categoria de análise, as dimensões da alfabetização midiática, pode-se verificar que prevalece a produção de conteúdos e mensagens comunicacionais. Dos 240 projetos analisados, 157 estão alinhados com este âmbito (combinado ou não com os demais). São em geral oficinas e cursos, que pretendem capacitar para o uso das ferramentas e meios de comunicação, principalmente audiovisuais (vídeo e do rádio), como já foi mencionado. A ONG Thidewá, da Bahia, por exemplo, trabalha com a produção de conteúdos relacionados às questões indígenas e privilegia as mídias digitais nos seus diversos projetos, tais como: Oca Digital, Celulares Indígenas, Arco digital e outros. No projeto Livros digitais indígenas, por exemplo, são realizadas oficinas com jovens indígenas de oito comunidades do Nordeste. São oficinas de audiovisual, economia criativa, dança, teatro, contação de histórias, diversidade cultural, que resultam na produção de livros digitais. Em dois livros digitais já realizados, foram produzidas ilustrações, locução, trilha sonora, ilustração, animação. Segundo os diretores da Thidewá, um dos resultados obtidos foi a criação de uma empresa social chamada Da Terra Produções, com objetivo de continuar a série de livros digitais indígenas. Já no projeto Pelas mulheres indígenas, da mesma ONG, são realizadas oficinas presenciais, sobre temas relacionados aos direitos das mulheres, e oficinas de comunicação - texto, foto, vídeo, entrevistas. As mulheres aprenderam a usar o site do projeto para publicarem no blog. Elas receberam tablets para fotografar e filmar em suas comunidades, e publicar o material no blog do projeto. No caso dos projetos que enfocam a compreensão crítica, normalmente realizam debates, seminários e reflexões, além de oficinas que falam sobre o funcionamento dos meios de comunicação e questões ideológicas da indústria de comunicação. Metade dos projetos 34 analisados incluem algum tipo de atividades mídia-educativa relacionada com a compreensão crítica. O projeto de Educação para a Mídia da ALICE - Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação (Porto Alegre, Rio Grande do Sul) é um dos que trabalha com compreensão crítica e “propõe uma leitura clara dos mecanismos de manipulação utilizados pela chamada grande imprensa e também capacitá-los para multiplicar este conhecimento” Com relação à dimensão Acesso e uso da comunicação, são 91 iniciativas relacionadas com essa dimensão. São projetos que estão preocupados com o acesso aos meios de comunicação e/ou tecnologias. É o caso dos cineclubes, como o Cine Nós do Morro, da ONG Nós do Morro (Rio de Janeiro), ou o Cineclube Cláudio Luiz Galvão Malta – CLGM, do Instituto Girassol (Alagoas) e outros. Ou são projetos relacionados com a inclusão digital, como o projeto Estação Digital, da Fundação Conscienciarte (Minas Gerais) ou o projeto Tecnologia de Informação e Comunicação, do Instituto Elo Amigo (Ceará). Também se deve registrar os projetos que trabalham com mais de uma dimensão: o maior número de coincidências ocorre nos projetos orientados a compreensão crítica e a produção de conteúdos mediáticos, posto que isso ocorre em 70 dos 240 projetos analisados. Além disso, 22 projetos combinam atividades de compreensão crítica, acesso, uso e produção de conteúdos. A questão da ênfase à produção é de suma importância pois somente quando “o sujeito educando logra expressar uma ideia de modo que os outros possam compreendê-la, é quando o mesmo a compreende e a apreende verdadeiramente” (Kaplún, 1993). Os dados apresentados confirmam, portanto, a primeira hipótese levantada pela pesquisa, de que os projetos de mídia-educação realizados pela sociedade civil se orientam principalmente à produção de conteúdos. Entretanto, precisamos ter em conta que nem sempre a simples produção de conteúdo significa algo que poderá empoderar a cidadania, uma vez que essa atividade pode simplesmente reproduzir o que está na mídia de massa. Ou seja, é fundamental que o desenvolvimento das habilidades comunicativas esteja conjugado à compreensão crítica. O gráfico a seguir mostra o panorama geral dos projetos com relação às dimensões da mídiaeducação: Gráfico 3 – Projetos de Mídia-educação – dimensões enfatizadas Fonte: Elaborado pelo autor 35 6. DEBATENDO QUESTÕES 6.1. Comunicação: instrumento ou objeto? Como se pôde observar, em alguns projetos estudados, a Comunicação é o centro, o objeto das atividades, sendo que em outros a Comunicação é instrumento para defesa de direitos ou divulgação da própria entidade. Vários projetos trabalham com objetivos relacionados com a difusão de temas “invisíveis aos meios de comunicação” (infância, direitos da mulher, trabalho escravo, demandas da periferia etc.). A relação instrumental de muitas ONGs com a comunicação, apontada pelos dados, confirma aspectos abordados por Kaplún, que já havia afirmado que “para o movimento de base a comunicação não constitui um fim em si, se não um instrumento necessário ao serviço da organização e da educação populares” (1983, p.41). Esta situação pode ser observada naquelas organizações que criam meios de comunicação e se valem deles como propulsores da participação e mobilização cidadã. Passa-se que “uma atitude de resistência aos meios de comunicação a uma atitude de definição de estratégias concretas de intervenção “(GRZYBOWSKI, 2001, p. 30). Segundo Peruzzo (1999), a necessidade de adquirir competências, de se alfabetizar para o uso das linguagens e das técnicas de comunicação fazem com que a educação midiática adquira papel importante para as instituições que pretendem valorizar o direito à comunicação e o protagonismo da comunidade como sujeito de seus meios de comunicação. 6.2. O privilégio do audiovisual e a sobrevivência do cinema A ênfase no audiovisual, como indicado pelos dados, é não só coerente com a tradição da mídiaeducação no Brasil, que se iniciou relacionada à leitura crítica do cinema e da televisão, como se coaduna com o contexto da sociedade atual, na qual se pode perceber a fascinação provocada pela linguagem audiovisual, gerando um poder quase hipnótico (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 47). Fantin também destaca que os audiovisuais tornaram-se um dos protagonistas dos processos culturais e educativos, sendo que por isso a sociedade e a escola precisam trabalhar com essas mídias (FANTIN, 2006, p. 63). Também se deve levar em consideração que a ênfase aos audiovisuais está relacionada à dimensão da produção de conteúdos, como mostra o cruzamento de dados, entre as variáveis e que podemos visualizar no gráfico a seguir: Gráfico 4 – Projetos de Mídia-educação – dimensões enfatizadas nos projetos audiovisuais Fonte: Elaborado pelo autor 36 Quando se fala de audiovisual, é interessante observar também como nesse quadro ainda sobrevive o mundo do cinema, que é objeto de diversos projetos de educação midiática não formal. No levantamento de dados aqui realizado, 35 dos 240 projetos de mídia-educação incluem atividades relacionadas com o cinema. São, em geral, cineclubes, festivais para crianças ou oficinas de cinema. Podem ser mencionadas, como exemplo, as seguintes ONGs e projetos: Associação Casa da Árvore (Telinha de cinema); Associação Cultural Kinoforum (Cinemação/Kino, ação e pensamento); Associação Estaçao Cultura (Locomotivo Cineclube); Campus Avançado (CineolhO – Cineclube), Cineduc - Cinema e Educação (Cursos e oficinas - Curta o Cinema na Escola); Cinema Nosso (Anima aqui!); Fundação Conscienciarte (Cineclube itinerante); Instituto Alana (Ciranda de Filmes/Oficina crítica cinematográfica); Instituto Espaço Arterial (Cine da Hora); Mucca -Mudança com Conhecimento, Cultura e Arte (Cinitinerante); OCA – Organização Cultural e Artística (Cineclube), entre outros. Não se pode esquecer que a alfabetização cinematográfica é uma tradição arraigada em muitos países e é apontada como vital por expertos da mídia-educação contemporânea, uma vez que permite aos cidadãos “a capacidade de aproximar-se de todos aqueles acontecimentos e fenômenos globais que os rodeiam, de uma forma inclusiva, holística e universal”. (REIABAPTISTA, 2012, p.89). Fantin destaca que muito tem sido feito para saber o que acontece com as pessoas, e particularmente com as crianças, numa sala de cinema. (Fantin, 2006, p. 3). Afinal, conforme observa, “o cinema envolve todo o contexto em que se assiste ao filme e significa muito mais do que “apenas” o ato de ver o filme” e que difere bastante da experiência com a televisao. (FANTIN, 2006, p. 132) Na década de 60, por exemplo, as revistas Cahiers du Cinéma e Screen publicavam trabalhos a partir de experiências em associações culturais do tipo cineclubes, círculos de cinema, cineforum, que envolviam a projeção de filmes para um público com um projeto educativo e de sensibilização em relação ao cinema. (RIVOLTELLA, 2005). Na Europa, há uma forte tradição de ensinar sobre filmes e também ensinar com o cinema, utilizando-o em atividades escolares. Até hoje, a Comissão Europeia continua interessada na relação entre educação e cinema, sendo que tem patrocinado várias pesquisas recentemente. 12 Vários países europeus dispõem, inclusive, de organismos específicos que se ocupam de alguma forma da educação cinematográfica e audiovisual, tais como Scottish Film Education (Escócia), British Film Institute (Inglaterra), Finnish Film Fundation (Finlândia), Conseil Supérieur de l'Audiovisuel- CSA (Bélgica), Dutch Film Institute (Holanda) etc. Para justificar a importância do trabalho com o cinema, Rivoltella (apud FANTIN, 2006) justifica afirmando que o cinema é cruzamento de práticas sociais diversas e um instrumento de difusão do patrimônio cultural da humanidade. 12 Uma das mais recentes pesquisa europeias foi a FilmEd – Film Education in Europe - Showing Films and other audio-visual content in European Schools – Obstacles and Best Practices, que pretendia verificar o uso dos filmes ems ala de aula. Veja em: http://bookshop.europa.eu/en/showing-films-and-other-audiovisual-content-ineuropean-schools-pbKK0415037/ 37 6.3. Relação com a mídia de massa Pelos dados da pesquisa, observa-se que muitas ações de mídia-educação realizadas pelas ONGs está relacionada ao âmbito da mídia de massa, ou mídia-hegemônica, como queiramos chamá-la. Nesse contexto, desenvolvem-se atividades que vão desde o acompanhamento de temas na mídia até a tentativa de formação de comunicadores e jornalistas, passando pela produção de pautas e notícias alternativas. Este é um aspecto importante pois, normalmente, se pensa na capacitação dos professores para o uso da comunicação ou para mover-se por esta interface e se deixa de lado a formação práticoreflexiva dos profissionais da comunicação. “Da mesma forma que o espaço escolar precisa trabalhar com as mídias, é imprescindível que os espaços midiáticos pensem nos objetivos educativos. E a formação de comunicadores e de educadores é condição vital para que isso ocorra, pois embora insuficiente, é um ponto de partida”. (FANTIN, 2006, p. 76) Essa relação dos projetos de mídia-educação com os meios de comunicação de massa se configura de várias maneiras: 18 projetos trabalham com o monitoramento de notícias, geralmente relacionadas ao tema que trabalha a ONG (direitos da infância, das mulheres etc). Conforme destaca a Unesco (2013), esse monitoramento é também um dos aspectos da pode abarcar a Alfabetização Midiática de Informacional, monitorando a influência da informação produzida e o bom uso desse conhecimentos pelos meios de comunicação. Junto à terceira dimensão da media literacy, a criação e produção de conteúdos e mensagens, a Unesco também inclui o monitoramento da informação e do conteúdo midiático, uma vez que esse terceiro componente da Alfabetização Midiática e Informacional inclui o uso ético e efetivo da informação, dos conteúdos midiáticos e também requer atitudes para o uso ético dos meios e tecnologias. Assim, segundo a Unesco (2013), fazem parte da dimensão criação e utilização da mídia participar de atividades social-públicas, como cidadão ativo atuando junto a mídia e provedores de informações para garantir o diálogo intercultural e a participação democrática através de vários meios de forma ética, eficaz e eficiente. Também inclui o monitoramento da influência da informação, conteúdo de mídia, produção de conhecimento e utilização, bem como meios de comunicação e fornecedores de informação. Monitorar o impacto da criação e distribuição da informação, conteúdo de mídia e conhecimento, bem como da mídia e outros fornecedores de informação de uso existente Dentre os projetos que propõem o monitoramento da mídia pode-se citar a Agência de Notícias Matraca, de São Luís (Maranhão), que faz uma análise de mídia, “que visa compreender como a imprensa maranhense está tratando as temáticas ligadas aos direitos de crianças e adolescentes e quais as principais fragilidades da cobertura”. Outros exemplos são a Cipó Comunicação Alternativa (Bahia), que tem seu Observatório de Mídia e Direitos Humanos, que elabora monitoramentos e análises sobre violação de direitos humanos por produtos midiáticos impressos e eletrônicos. E o Observatório de Favelas (Rio de Janeiro). Por meio do projeto Mídia e Favela não só faz um levantamento de veículos de mídia alternativa como também faz um balanço de como as favelas e espaços populares são representados em veículos da grande mídia. Feito o monitoramento dos temas que interessam às ONGs, o objetivo é a intervenção: passase a outra atividade mídia-educativa junto à sociedade e aos comunicadores, que inclui tanto a capacitação de jornalistas como a produção de conteúdos alternativos. 38 A Agência de Notícias Matraca, por exemplo, “promove o debate entre os profissionais, estudantes e professores de Comunicação. Os temas escolhidos dizem respeito ao comportamento, contexto, rumos e ética profissional. Esta estratégia pretende aproximar gerações, resgatar a trajetória histórica do Jornalismo, recompor e transmitir valores e, sobretudo, estimular a reflexão crítica e plural entre os profissionais de Comunicação”. Fantin (2006) também destaca que um dos conceitos centrais da mídia-educação é justamente o de “desmascarar a falsa naturalização das mídias revelando seu caráter de construção”. Além dessa análise crítica, a forma de intervenção se dá na produção de pautas alternativas e material jornalístico sobre os temas relacionados com as ONGs e que são distribuídos aos jornalistas. Completa esta ação das ONGs junto aos meios de comunicação as oficinas de capacitação e formação de comunicadores e jornalistas. Entre outros: Agência de Notícias da Infância Matraca; Auçuba Comunicação e Educação do Recife; Cipó Comunicação Alternativa; o Instituto Media Étnica e Oficina de Imagens – Comunicação e Educação realizam esse tipo de formação. 6.4. Mídia-educação, ONGs e tecnologias Dos 240 projetos analisados, somente 63 abordam as TIC (25 como ênfase principal e 38 combinando com outras mídias) e outros 42 trabalham com as chamadas mídias digitais, embora apenas 9 o façam de maneira prioritária. Vale dizer, entretanto, que mesmo não explicitando como prioridade as mídias digitais ou as TIC, boa parte dos demais projetos faz uso dessas tecnologias. Como vimos, a grande maioria opta pelo uso dos audiovisuais seja vídeo ou rádio e faz difusão dessas produções por meio da Internet, sites, blogs e redes sociais. Vale observar, também, o cruzamento das dimensões do letramento midiático com as mídias utilizadas. Os projetos de inclusão digital normalmente estão mais preocupados com o acesso e uso das TIC e deixam de enfatizar as possibilidades de produção que poderiam ser trabalhadas na apropriação dessas tecnologias, confirmando a hipótese 4 apresentado ao início do trabalho. Vemos no gráfico a seguir o detalhamento das iniciativas que incluem as TIC como um de seus aspectos principais: Gráfico 5 – Projetos de Mídia-educação – dimensões enfatizadas nos projetos com ênfase em TIC Fonte: Elaborado pelo autor 39 Somente sete dos 25 projetos que privilegiam as TIC incluem algum aspecto relacionado com a compreensão crítica e seis levam em consideração as possibilidades comunicativas que são consequência da apropriação dessas tecnologias, Outro aspecto importante é que os projetos do âmbito da inclusão digital estão fundamentalmente desenhados para a capacitação profissional e a inserção no mercado de trabalho. Embora este seja um objetivo socialmente importante, como destacou Martín-Barbero (2003), normalmente a tecnologia é vista fora do âmbito da cultura e encarada somente desde sua dimensão instrumental. Ainda que se vinculem a parcelas excluídas e marginalizadas, os objetivos principais da alfabetização digital se formatam sempre relacionados à capacitação profissional e à aquisição de habilidades (fundamentalmente técnicas) requeridas pelo mercado de trabalho. O computador, a Internet e as tecnologias associadas não são vistas como integradas aos processos comunicacionais e tampouco são enfatizadas as possibilidades de comunicação e produção de conteúdos que se vinculam à apropriação dessas mesmas tecnologias, como vimos nos dados apresentados. Assim, alfabetização midiática e alfabetização digital são vistas como coisas totalmente distintas Essas atividades educativas estarão, portanto, muito mais próximas ao modelo de educação que Mario Kaplún descreve como o que está preocupado com os efeitos obtidos. O autor observa que esse modelo, apesar de parecer atrativo tem uma diferença radical com a educação libertadora: “`É tão autoritário e impositivo como o modelo tradicional ou talvez mais”. (1998, p.30). Assim, algumas dessas atividades mídia-educativas voltadas ao acesso e uso das TIC têm muito pouco que ver com o empoderamento da cidadania e se restringem, quando muito, ao treinamento técnico-profissional. 6.5. Comunicação comunitária Se vamos aos detalhes dos projetos um aspecto importante a considerar é sua relação com veículos permanentes de comunicação comunitária. O panorama que se observa mostra que este aspecto ainda está pouco desenvolvido, indicando a tendência correspondente à hipótese 3, porém sem confirmação total. Dos 240 projetos estudados, somente 52 (21,7%) estão associados a algum tipo de veículo de comunicação comunitária com certo caráter permanente: 15 são iniciativas que resultam em programas de televisão (veiculados em canais universitários ou comunitários) ou vídeos. Outros 14 projetos estão relacionados à produção de veículos impressos (jornais, revistas e boletins), e 12 produzem meios radiofônicos. Somente 11 projetos produzem mídias digitais (blogs, páginas web, etc). É de certa forma surpreendente que as plataformas e meios digitais ainda sejam tão pouco utilizados nos projetos mídia-educativos. As tecnologias estão muito mais utilizadas como ferramenta de produção que como canais de comunicação. Pelo que já foi exposto, podemos considerar que a mídia-educação – e sobretudo as atividades realizadas por Organizações não-Governamentais - pode se transformar em instrumento fundamental para o processo de comunicação comunitária, uma vez que permitirá ao cidadão tornar-se, de maneira eficaz, protagonista dos processos e produtos comunicacionais. Entre seus principais objetivos, está de fato, como poderia de se esperar, a ideia de dar voz à cidadania, movimentos sociais e parcelas excluídas da população. Além disso, há ênfase 40 especial à formação da consciência crítica dos jovens em relação aos processos e produtos comunicacionais, na tentativa evidente de influenciar no futuro. A questão do protagonismo dos sujeitos parece ser a chave nesta questão. Conforme destaca Peruzzo (2011), é de vital importância nos processos de comunicação comunitária, de participação democrática e valorização da cidadania, que as pessoas deixem simplesmente seu papel como receptores da comunicação e tomem parte dos processos de produção, planejamento e gestão da comunicação. Os processos de educação midiática servirão para o cidadão tome seu papel ativo nesse tema. Como destaca Gadotti (2005), a educação não-formal está “fortemente ligada à aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos e à participação em atividades grupais, sejam esses adultos ou crianças” (p. 3). Pela análise realizada, observa-se que em geral os projetos de educação midiática realizados por ONGs privilegiam a produção de conteúdo e, na maioria dos casos, têm entre seus principais objetivos dar voz a geralmente excluídas das mídias de massa e/ou tradicionais. Entretanto, essas inciativas ainda não estão suficientemente relacionadas a propostas e processos de comunicação comunitária e veículos de caráter permanente. A figura a seguir resume a situação encontrada com relação à produção de meios de comunicação comunitários: Figura 5 – Produção de meios de comunicação comunitária pelo projetos de Mídia-educação Fonte: Elaborado pelo autor 41 7. CIDADANIA E EMPODERAMENTO: PROPONDO MODELOS Esta pesquisa também trabalhou com a ideia de propor de modelos para descrever e analisar atividades de mídia-educação relacionadas com o âmbito da educação não-formal. A intenção é oferecer possíveis categorias de análise para entender as atividades mídia-educativas, não se tratando exatamente de indicadores para fazer uma avaliação entre projetos “bons” ou “ruins”. O objetivo é mostrar que quanto mais “patamares” a atividade mídia-educativa cumprir, mais chances teria de contribuir para o empoderamento do cidadão por meio da Comunicação e Educação. Para analisar de alguma forma os fatores relacionados com o empoderamento que pode acontecer mediante os projetos de mídia-educação, se procedeu à análise dos objetivos, metas e propostas das 107 ONGs, agrupando-os em quatro grandes blocos: i) Aqueles que pretendem democratizar o acesso à comunicação, à educação, à cultura ou às tecnologias; ii) Os que têm como meta trabalhar pela transformação social, por mudanças na sociedade e pela inclusão social; iii) Aqueles que desejam realizar a inserção socioeconômica dos destinatários, trabalhando a intenção de inseri-los no mercado de trabalho; iv) Os que têm como objetivo garantir e lutar pela cidadania, pelos direitos humanos e os direitos de grupos em risco de exclusão social. Todos estão relacionados, de alguma forma, a algum tipo de empoderamento do cidadão, entretanto, dependendo do trabalho que a ONG pretenda realizar se pode dizer que as atividades mídia-educativas poderiam ser mais ou menos efetivas na tarefa de empoderar o cidadão quanto ao seu papel ativo diante da Comunicação. Assim, oferecer simplesmente acesso às tecnologias, sem que esse objetivo esteja combinado com a ideia de transformação social ou à luta por direitos parece ter um potencial menor de empoderamento do que os projetos que estejam relacionados diretamente a metas que pretendam garantir a democratização da comunicação junto à inclusão social, por exemplo. Dessa forma, se poderia traçar algumas tendências sobre o potencial das atividades mídiaeducativas segundo suas metas ou combinação de metas de natureza distinta e complementares. No Gráfico 6, se observa que 27 das ONGs (25,2%) não só trabalham com objetivos bastante significativos para o empoderamento da cidadania por meio da mídia-educação como combinam metas pertencentes a mais de um grupo e que se complementam entre si como “Democratizar o acesso à comunicação, à educação, cultura, tecnologias” combinados à ideia de “Defesa dos direitos/cidadania” ou ao objetivo de “Trabalhar pela transformação social”. Neste caso, parece obter-se um alto potencial de empoderamento para os cidadãos envolvidos em seus projetos. Segundo essa análise, outras 56 organizações (52,4%) se focalizam somente em um grupo de metas que, ainda que sejam importantes para o exercício da cidadania, não permitem afirmar que garantiriam o empoderamento por meio da alfabetização midiática, uma vez que não combinam aspectos de acesso à Comunicação com objetivos de defesa dos direitos da cidadania, por exemplo. Sem a ideia de transformação social ou defesa de direitos, a apropriação da comunicação poderia estar descolada dos aspectos de empoderamento, transformando-se em simples reprodução dos conteúdos e paradigmas dos meios de comunicação de massas. 42 Ao contrário, só o trabalho com a defesa de direitos não demonstraria o empoderamento do cidadão por meio da apropriação da comunicação. Estas instituições teriam, segundo essa perspectiva, um potencial médio de empoderamento. No caso de combinarem mais de um grupo de metas, o fazem entre um objetivos que não mencionam diretamente a Comunicação. Finalmente, as 24 ONGs restantes (22,4%) poderiam ser vistas como entidades com um baixo potencial de empoderamento mediante as atividades de mídia-educação que realizam, uma vez que trabalham com objetivos mais específicos, como a simples inclusão tecnológica de manejo instrumental ou a inserção no mercado de trabalho, sem reunir as ideias de cidadania, transformação social e comunicação. É necessário dizer, entretanto, que o panorama apontado seria uma tendência, havendo que estudar detidamente cada caso em particular para confirmá-lo totalmente. Cabe destacar que 42,5% têm algum tipo de vinculação com grupos sociais vinculados a populações em risco de exclusão, como moradores de rua, negros, indígenas etc. Esta combinação de fatores permite afirmar, confirmando a hipótese 2, que a maioria dos projetos de mídia-educação realizados pelas ONGs se preocupada com o empoderamento da cidadania e o protagonismo dos sujeitos frente aos processos de comunicação. Gráfico 6 - Potencial de empoderamento da cidadania respeito aos objetivos da mídia-educação Fonte: Elaborado pelo autor 43 De modo geral, é possível dizer que os projetos de alfabetização midiática das ONGs brasileiras estão colaborando para que os indivíduos e comunidades exerçam seus direitos e liberdades no que diz respeito ao acesso à informação, à liberdade de expressão e ao direito à educação e à comunicação. Como reforça a Unesco (2013), a educação midiática deve promover o respeito aos direitos humanos e liberdades, além de empoderar os cidadãos para a tomada informada de decisões. Outra maneira de refletir sobre os aspectos relacionados ao empoderamento e exercício da cidadania por meio das atividades mídia-educativas seria a análise das dimensões e atividades realizadas. Conforme a proposta apresentada na Figura 6, as iniciativas mídia-educativas realizadas na sociedade civil seriam mais completas e eficazes à medida que abarcassem mais dimensões (âmbito quantitativo) e se orientassem até a produção de conteúdos com o que pudessem empoderar a cidadania (âmbito qualitativo). O modelo se baseia na figura de um trapézio, que poderia fazer alusão a um megafone para um cidadão situado na sua base inferior. Está elaborado a partir de vários modelos de indicadores e competências da alfabetização midiática que têm que ser adquiridas pelos cidadãos. Concretamente, se inspira em três estudos integradores que apontam os principais niveis que deveriam ser desenvolvidos por atividades de educação midiática (PRATS, 2006; CELOT, PÉREZ-TORNERO, 2009; PÉREZ-RODRÍGUEZ, DELGADO-PONCE, 2012). O modelo proposto permite visualizar o potencial amplificador que a mídia-educação permite desenvolver nas pessoas, e tem em consideração uma descrição e análise dos projetos a partir da caracterização de suas atividades e dimensões: Dimensão 1 - Acesso e uso, inclui atividades que: − Possibilitam o acesso a produtos, meios ou formas de comunicação (cine, tecnologías, ordenadores, etc.). − Ajudam no uso de ferramentas básicas ou no manuseio instrumental das tecnologias e os meios, desde o ponto de vista operacional. Dimensão 2 - Análise, avaliação e compreensão crítica, com atividades que: − − Decifram linguagens comunicacionais e sua construção. Analisam e oferecem ferramentas para estudar e compreender os conteúdos, os processos de produção e funcionamento dos meios e suas implicações ideológicas. Dimensão 3 - Criação e produção de conteúdos, que incluem atividades que: − − − Analisam e monitoram os conteúdos comunicacionais hegemônicos, capacitando para a geração de mensagens alternativas. Oferecem os conhecimentos necessários para a apropriação de procesos de comunicação, tanto desde o ponto de vista técnico, como de criaçõ de conteúdos, mensagens e contribuições em meios de comunicação de massas por meio de conteúdos gerados pelos usuários. Criam mecanismos que possibilitam que os destinatários possam conceber canais para a geração permanente de conteúdos (meios de comunicação comunitária). É importante dizer também que normalmente um projeto/atividade não realiza atividades que estejam em todos os níveis comentados na figura. Pelo panorama observado, em geral as ONGs desenvolvem diversos projetos complementares entre si: seminários de leitura crítica, oficinas 44 de linguagens, oficinas de produção e outros, que se enquadram nos diversos níveis e categorias comentados pela figura. Em alguns casos, os patamares mais “baixos” das atividades mídiaeducativas são saltados, visto que os destinatários já têm conhecimentos básicos do meio ou tecnologia com o qual vão trabalhar. Por exemplo, não há necessidade de trabalhar com o uso operacional de computadores para trabalhar um projeto de mídia-digital se os destinatários já dominarem a ferramenta. Além de mostrar as características das atividades mídia-educativas que acontecem no âmbito da educação não-formal, o desenho também menciona possíveis exemplos em cada nível. Também podemos destacar que o nível mais “alto” das atividades, aquele que está relacionado com a criação de canais para veiculação permanente de conteúdos, desemboca na criação de veículos de comunicação comunitária. Ou seja, que a mídia-educação pode e deve estar diretamente relacionada com a produção de meios de comunicação comunitária, que passa a ser mais “qualificada” e democrática a partir dos processos de formação e capacitação realizados pelo terceiro setor. Figura 6. Modelo de descrição e análise de atividades de mídia-educação no âmbito da educação não formal Fonte: Elaborado pelo autor 45 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS Mediante o elevado número de projetos de alfabetização midiática que compõem a amostra encontrada durante o trabalho de campo, e pese a que certamente não se cobrem todas as iniciativas de um país com a enorme dimensão do Brasil, se pode afirmar que a mídia-educação realizadas pelas ONGs brasileiras está principalmente focada na produção de conteúdos e que têm ganhado cada vez mais importância durante as últimas décadas. Na Figura 8, se pode observar a distribuição sintética e uniforme (BASTIAN, HEYMANN, JACOMY, 2009) das principais inter-relações existentes entre os projetos de mídia-educação realizados no Brasil pelas organizações não governamentais. Neste “retrato” do mapeamento realizado, observa-se claramente que prevalecem as atividades de produção orientadas a jovens, que os audiovisuais se vinculam a atividades de compreensão crítica e (além da dimensão de produção anteriormente já apontada), assim como se vê relação entre a dimensão de acesso e uso e os projetos associados a TICs. Por outro lado, se detecta que as mídias digitais ainda não ganharam a repercussão que se poderia imaginar. Figura 7 - Rede de inter-relações entre principais aspectos da mídia-educação nas ONGs brasileiras Fonte: elaborado pelo autor Confirma-se que os projetos desenvolvidos nos entornos educativos não formais contribuem para a defesa dos direitos e liberdades dos indivíduos, sobretudo no que diz respeito ao acesso à informação, à liberdade de expressão e ao direito à educação, conforme o pleiteado pela Unesco (2013). Também se pode afirmar que a educação midiática realizada por organizações não governamentais ou outras entidades da sociedade civil pode ser um instrumento fundamental para o desenvolvimento comunitário, uma vez que permite e potencializa a criação de meios meios de comunicação próprios. 46 Em geral, o cenário de mídia-educação no Brasil é bastante distinto ao observado na Europa e América do Norte, o que de nenhuma maneira possa ser encarado como um aspecto negativo. As iniciativas do Hemisfério Norte quase sempre passam pela educação formal, com atividades dirigidas a professores e estudantes. Ainda que isso também se possa observar pontualmente no Brasil, os projetos desenvolvidos pelas ONGs vão ocupar as lacunas existentes nas políticas públicas. Diante disso, é possível pensar que se pode trabalhar objetivos complementares entre políticas públicas formais de educação midiática e iniciativas desenvolvidas pela educação não formal. Parece que as atividades mídia-educativas não formais permitem desenvolver em maior grau certos âmbitos sociais mais distanciados da educação formal, como são o empoderamento cidadão ao longo da vida e o desenvolvimento comunitário. Além disso, podem ajudar a complementar ações de capacitação profissional orientadas à integração socioeconômica dos destinatários, assim como o estabelecimento da defesa de seus direitos e sua capacitação, mediante a dotação de competências, habilidades e destrezas úteis para poder desenvolver-se como cidadãos e trabalhadores de pleno direito. Outro aspecto importantes resultante da pesquisa é verificar como a mídia-educação pode ser importante também para jornalistas e comunicadores, que normalmente se veem acima desse tipo de capacitação visto que já são “profissionais” da Comunicação. A leitura crítica de conteúdos, o objetivo de criar consciência sobre um tema sobre o qual se fala (ou não se fala) é de fundamental importância, tanto quanto o objetivo de gerar consciência crítica sobre os meios, seu funcionamento, linguagem e ideologia. Observou-se que os projetos de educação midiática estão ligados a propostas e processos de comunicação comunitária, mas ao que tudo indica esta relação ainda não está suficientemente desenvolvida e muito mais se poderia construir nesta interface entre movimentos comunitários e mídia-educação. Os objetivos de dar voz às comunidades geralmente excluídas das mídias de massa e/ou tradicionais só podem realmente se efetivar se as atividades educativas resultarem em produções e veículos permanentes de comunicação, que se traduzam em altenativas à “grande mídia”. Quando se observa o grande avanço do uso das tecnologias digitais no cotidiano da sociedade brasileira, é até surpreendente verificar que as atividades de alfabetização digital normalmente não são vistas como mídia-educação, e estão mais ligadas às questões de acesso aos meios digitais e oferecem muito pouco para a apropriação verdadeira de uma ferramenta de comunicação. A inclusão digital, entretanto, também pode e deve ser vista como um processo de educação midiática e resultar em processos de comunicação comunitária. Ser alfabetizado digitalmente não significa ser somente usuário de ferramentas e deter habilidades mecânicas para manejar um computador, um telefone celular ou programas de informática, significa entender os processos de produção de conhecimento que estão subjacentes à rede de computadores, ser crítico aos seus conteúdos e produzir mensagens comunicativas se aproveitando dessas tecnologias. O acesso do cidadão aos meios de comunicação como protagonista deve acontecer em todas as mídias. Neste momento em que se debate a introdução de conteúdos relacionados à mídiaeducação/educomunicação no currículo escolar brasileiro, e se investe na elaboração de das políticas correspondentes, é necessário refletir ainda mais sobre as experiências existentes há várias décadas fora da educação formal. De fato, não basta promover políticas públicas de alfabetização midiática que muitas vezes acabam por se traduzir na simples implantação de ferramentas tecnológicas. Pelo contrário, seria importante se inspirar na filosofia dos projetos 47 de educação mediática do âmbito não formal para produzir propostas de inclusão desses temas nos currículos escolares, o que equivale a dizer que se devem considerar como prioritários o empoderamento e o protagonismo dos sujeitos nos processos de comunicação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUADED GÓMEZ, J. I. La Educación para la Comunicación. 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