International Journal of Fashion Studies
Maria Claudia Bonadio
Federal University of Juiz de Fora, Brazil
O exótico e a moda brasileira1
Abstract: A construção do exotismo associado a diversos elementos de identidades
culturais brasileiras é um assunto que tem sido amplamente investigado em diversos
estudos. Apesar de sabermos que muito do que se vê e faz na nossa moda é
caracterizado por imagens do exotismo, ainda são escassas as reflexões sobre como
nossa moda se tornou exótica. E ainda, nossa moda é exótica apenas para os ‘outros’,
ou ‘nós’ também nos entendemos com tal? Neste artigo, busco respostas possíveis
para essas perguntas traçando um breve histórico que reflete sobre a constituição da
identidade visual da moda brasileira e observando o papel da indústria têxtil e
instituições culturais (em particular, o Museu de Arte de São Paulo), na elaboração
dessa identidade.
Palavras‐chave: Moda brasileira, exotismo, cultura popular, identidade visual,
indústria têxtil, Museu de Arte de São Paulo.
Biografia do autor: Maria Claudia Bonadio é professor na area de Artes e Design da
Universidade Federal de Juiz de Fora. Doutora em História pela Unicamp. Atualmente
desenvolve pós‐doutorado no Museu Paulista da Universidade de São Paulo, no qual
estuda as relações entre arte, design de moda e o Museu de Arte de São Paulo nos
anos 1950. É autora do livro ‘Moda e sociabilidade: mulheres e consumo na São Paulo
dos anos 1920’ (2007) e organizadora do livro ‘História e cultura de moda’ (2001).
e‐mail:
[email protected]
This article appeared in English as Bonadio, M. C. (2014), ‘Brazilian fashion and the “exotic”’,
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Duas cenas
Cena 1
O Museu do Fashion Institute of Technology (FIT) em Nova York inaugurou em 27 de
novembro de 2007, uma exposição denominada Exoticism, que ficou em cartaz até 07
de maio de 2008. Segundo o texto disponível no site da exposição, a intenção era não
só expor as aproximações da moda com o ‘exótico’ ou, na definição do mesmo texto,
‘styles originating in “foreign cultures”’, mas também perguntar ‘for whom is
something exotic and foreign?2’
Com esse objetivo, a mostra reunia roupas européias dos séculos XVIII e XIX
confeccionadas com tecidos estrangeiros, ou neles inspirados; roupas criadas por
designers de moda na primeira metade do século XX e inspiradas em trajes típicos de
países orientais, ou peças que se tornaram populares no período em países como a
China; peças de designers de moda europeus e americanos produzidas nas décadas de
1960 e 1970 sob o rótulo de moda étnica, a qual é definida no texto como ‘styles
inspired by Africa, China, The Middle East, and India, as well as Russia and Spain—
cultures long regarded as being on the periphery of Western Europe.’3.
O último módulo da exposição reunia designers que ganharam destaque a partir da
década de 1990. Período em que a composição das tradicionais semanas de moda se
globalizou e designers de países até então eram considerados periféricos para a moda,
(como por exemplo, da América do Sul), passam a integrar o line‐up desses eventos
(De La Haye and Mendes 2003).
Dentre estes, o brasileiro Alexandre Herchcovitch, designer que ganha projeção
nacional em de meados da década de 1990 a partir da apresentação de coleções de
forte acento underground, inspiradas nas subcultura sado‐masoquista. Em meados da
primeira década do século XXI, tais referências são suavizadas em seu trabalho, ainda
assim a apresentação da peça selecionada pelo FIT, ao enfatizar que suas inspirações
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eram em grande parte provenientes da ‘Afro‐Brazilian culture and the natural history
of the Amazon’ causa estranhamento aos brasileiros que acompanham sua carreira,
pois o designer, ao contrário de muitos de seus conterrâneos que buscam projeção
internacional, não costuma explorar imagens da fauna, flora e cultura afro‐brasileira
em suas coleções, peças publicitárias e desfiles4.
Cena 2
Em 2012, a loja de departamentos americana Macy’s passou a entregar no Brasil os
produtos vendidos pela sua loja virtual. Para anunciar a novidade, entre 16 de maio de
16 de junho, as lojas da rede abrigaram um corner dedicado ao Brasil, no qual eram
vendidos produtos de 18 marcas nacionais. Para a ocasião, Francisco Costa, o brasileiro
e diretor criativo da marca Calvin Klein criou uma coleção especial inspirada no País, e
os artistas plásticos brasileiros Anna Mallmann, Leda Maria, Luiz Sternick, Marcelo
Conrado, Renê Nascimento e Sônia Alvarenga foram convidados a criar produtos
especiais para a marca Macy’s e tiveram suas obras expostas nas lojas de Nova York,
São Francisco, Chicago, Aventura e Miami.
Para divulgar as ações, a empresa disponibilizou em seu site (e também no
Youtube) um vídeo promocional denominado A Magical Journey Brasil, que mostrava
em sua abertura a imagem de uma garota morena vestindo shorts e biquíni pedalando
uma bicicleta, na qual carregava pacotes das marcas nacionais vendidas na loja5. O
cenário era a praia de Ipanema, a mais famosa da cidade do Rio de Janeiro6. Na
sequência o vídeo mostra uma cachoeira e os seguintes dizeres: ‘the bold colors, the
exotic scents, presented by the most talented names from across the land’. Depois de
focar a paisagem, o vídeo mostra os ‘personagens’ – os tais talentos do Brasil – são
eles uma moça morena que aparece trajando minissaia e blusa regata sambando em
um botequim, ao lado de dois sambistas de pele escura (negros ou mulatos) e duas
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negras baianas com trajes típicos do candomblé batendo palmas na praia. Tudo isso,
ao som de uma mistura entre música eletrônica e samba7.
Finalmente, as marcas presentes na loja são apresentadas e dentre elas, marcas
de cosméticos que reproduzem aromas ou usam em sua confecção materiais
provenientes da flora brasileira, acessórios criados a partir de elementos da flora,
como capim dourado, sementes, cascas, entre outros; objetos para a casa decorados
com imagens da fauna; sacolas de praia; fitinhas do Bonfim ‘Brazilets: magical
bracelets secured with 3 knots, representing 3 wishes. When the Brazilets is fall off,
wishes granted’, entre outros.8
O exotismo, a identidade nacional e a moda
As passagens descritas acima não deixam dúvidas, para o olhar estrangeiro – no
caso norte‐americano –, a moda produzida no Brasil é dotada de uma visualidade
calcada na cultura popular nacional e nas paisagens exuberantes. Para tal percepção, a
moda brasileira é compreendida como exótica, não apenas por ser produzida num
espaço geograficamente distante, mas por que de certa forma seria ‘outra moda’, que
não aquela produzida pelas ‘capitais da moda’.
Para entender com mais precisão os sentidos do exotismo associado à moda
brasileira, é preciso esmiuçar um pouco mais o conceito. Etimologicamente, o termo
provém do grego exôtikos e se refere ao que vem de fora, ou que é estrangeiro. A
literatura e tradição artística europeia reforçam essa definição, pois utilizam o termo
de forma a se referir aquilo que pertence a outras culturas, e mais precisamente a
imagens de lugares muito distantes e pouco familiares, como paisagens, costumes e
personagens exógenos. (Van der Grijp 2009)
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O termo também é conceituado na obra Essay on exotism de Victor Segalen
(2002), para a qual este estaria de modo geral associado ao ‘outro’, ou aquilo que por
se diferente é difícil de ser compreendido. Para o autor o exotismo é visível
especialmente em três situaçõe: o exotismo geográfico, no qual a distância do ’outro’ é
determinada a partir da distância espacial, freqüentemente resultando em diferenças
étnicas e culturais; o exotismo temporal, o qual se caracterizaria a partir de um
passado ou futuro idealizados; o exotismo sexual, no qual a diferença se dá sem que
haja um afastamento espacial ou temporal. Este diria respeito à eterna incompreensão
do outro, como por exemplo, as diferenças entre masculino e feminino.
A percepção do Brasil, como exótico remonta aos tempos da colonização
quando escritos de viajantes, naturalistas e missionários irão elaborar ‘descrições,
ainda que permeadas de fantasia, de algumas das peculiaridades físicas e naturais do
continente’, conferindo um caráter ambíguo ao exotismo associado ao Novo Mundo.
Se por um lado o motivo edênico, a ‘fauna e a flora brasileiras, bem como as cores e a
luminosidade de suas Paisagens’ (Corrêa 2011:85) que nos caracterizavam eram vistos
como elementos positivos – sobretudo pelo seu potencial econômico – por outro, os
caráter exótico dos ameríndios foi considerado negativo (por seu comportamento que
não se coadunava com os dos colonizadores, e era por esses considerado exótico no
sentido de bárbaro).
Até o século XIX, o caráter exótico do Brasil era conferido pelo olhar
estrangeiro, porém, a partir de meados daquele século, esse imaginário irá se propagar
no País de forma positiva, através de obras de escritores brasileiros associados ao
Romantismo, os quais buscarão num passado imaginado e na natureza idílica – mais
imaginada do que vivenciada – os temas e cenários de suas produções. Naquela
ocasião ‘Tal opção estética correspondia, (...) à afirmação da autonomia do recém‐
nascido império, que assim demarcava nitidamente sua diferença em relação à
Europa.’ (Murari 1999:51).
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A difusão de imagens do Brasil como espaço de uma natureza paradisíaca,
entretanto, não é exclusividade da literatura romântica e ainda que carregada de
outras conotações, tal visualidade continuaria a se propagar no País, pois a partir do
século XIX, a natureza exuberante será considerada pelo Estado e pelos intelectuais
como um dos mais fortes elementos que caracterizam a nação. Tais imagens ganharão
novo impulso a partir dos anos 1930, com as políticas nacionalistas do Estado Novo,
que valorizam, por exemplo, o samba‐exaltação, que irá gerar músicas de sucesso, (das
quais ‘Aquarela do Brasil’ é o maior exemplo) nas quais belezas naturais do País serão
exaltadas. No mesmo período, e mais fortemente a partir da década de 1950, o
fotojornalismo veiculado nas revistas ilustradas como O Cruzeiro e Manchete (que
seguia o modelo da americana Life), reforçaria tais ideias, ao mostrar ao Brasil o
exotismo das paisagens da nação e do povo mestiço (Seguin des hons 1985: 30)
A paisagem como principal representação da identidade nacional, é uma
imagem tão fortemente difundida que, segundo José Murilo de Carvalho (1998) em
pesquisas de opinião realizadas no final da década de 1990, a natureza maravilhosa, a
paisagem, o verde, as cachoeiras, a orla marítima, as riquezas minerais, eram
apontadas pelos brasileiros como principais fatores do ‘orgulho de ser brasileiro’.
Para traçar um quadro das principais imagens que constituem aquilo que faz
com que os brasileiros se entendam como tal, à paisagem exuberante deve‐se
acrescentar a cultura popular nacional (configurada especialmente através do samba,
carnaval, religiões afro‐brasileiras e cultura indígena), e o sincretismo racial, os quais a
contar da década de 1930 seriam fortemente incorporadas pelo Estado e intelectuais
como constitutivas da identidade nacional. (Ortiz 1985; Vianna 1995)
É diante desse quadro que a moda brasileira, a partir dos anos 1950 irá ancorar‐
se para talhar sua identidade, a qual irá se constituir especialmente de estampas e
ornamentos inspirados na paisagem, cultura popular e mestiçagem. A difusão de tais
imagens na moda irá resultar numa visualidade que, como vimos acima parecem
exóticas. Neste ponto cabe perguntar: Como nos tornamos exóticos? E ainda, nossa
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moda é exótica apenas para ‘os outros’, ou ‘nós’ também nos entendemos como tal?9
Para buscar possíveis respostas (posto, que não se busca aqui esgotar a questão) é
preciso antes de tudo, delinear um breve histórico acerca da constituição da
identidade visual da moda brasileira observando: qual o papel da indústria, das
instituições culturais (neste caso, especialmente o Museu de Arte de São Paulo) na
elaboração dessa visualidade10?
Até meados do século XX, a constituição de uma identidade visual brasileira para a
moda, era uma questão que para o público em geral, e mesmo para a indústria têxtil e
de confecção nacional, não se colocava. Naquele período, a maior preocupação destas
era produzir tecidos e roupas que, na medida do possível, imitassem de perto os
lançamentos da moda feminina parisiense e os preceitos da moda masculina
propagados pelos alfaiates ingleses. Portanto, mesmo com um parque têxtil bastante
obsoleto, cores, modelos e padronagens eram imitados e apenas um ou outro detalhe
era modificado. Para as estamparias, por exemplo, era comum contratar artistas
plásticos que tivessem habilidade para imitar os desenhos usados nos têxteis
internacionais (Neira 2012). Já para as lojas de luxo femininas como a Casa Canadá no
Rio de Janeiro e Casa Vogue em São Paulo, o segredo do sucesso era comprar em Paris
as novidades da alta‐costura, e revender no Brasil – no caso da loja carioca, não sem
antes analisar e copiar o modelo em outros tecidos e com alteração em alguns
detalhes para vender a alguma elegante brasileira com a etiqueta Canadá de Luxe
(Queiroz 1998 e Seixas 2002). Faltam estudos que tratem da moda comercializada
pelas lojas de departamento nacionais como o Mappin, a Casa Slopper e outras que
atendiam às camadas médias da população, mas levando em conta os estudos sobre a
indústria e as casas de luxo, é possível supor que para essas o caminho mais seguro
consistia em vender modelos que também seguissem de perto a moda parisiense, só
que a um custo mais acessível. Prática também adotada por modistas e costureiras
(Maleronka 2007).
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Por esse motivo, a maioria das seções de moda veiculadas nas revistas nacionais até os
1960 atinham‐se na maior parte do tempo, a veicular imagens das novidades da moda
internacional e especialmente parisiense. Nos desfiles que aconteciam nas lojas de
departamentos nacionais e casas de moda de luxo, o procedimento se repetia e as
roupas ali apresentadas mostravam formas, estampas, tecidos e cores, que seguiam de
perto aquilo que era proposto pela alta‐costura parisiense, ou lojas de departamento
norte‐americanas.
Primeiro ato
No que diz respeito à moda, é esse o cenário que o italiano Pietro Maria Bardi
encontra ao desembarcar no País, em 1946. O motivo da viagem era a promoção de
três mostras de arte no Rio de Janeiro: ‘Exposição de pintura italiana antiga (séculos
XIII‐XVIII), ‘Exposição para objetos de arte para a decoração de interiores’ e ‘Exposição
de pintura italiana moderna’. Foi provavelmente na ocasião de uma dessas exposições
(todas com propósito comercial), que Assis Chateaubriand, então o maior empresário
das comunicações do País irá conhecer, o marchand de artes P.M. Bardi. Na ocasião,
Assis Chateaubriand expõe ao italiano o desejo de implantar no Brasil um museu que
abrigasse obras de arte consagradas, com vistas a inserir o Brasil no circuito
internacional das Artes, de modo a evidenciar que o País vinha se desenvolvendo não
só no campo econômico e industrial, mas também na área da cultura. Diante do
convite, em 1947 P.M. Bardi se muda para o Brasil juntamente com a segunda esposa,
a arquiteta Lina Bo Bardi.
Em 04 de outubro de 1947, é inaugurado o Museu Arte de São Paulo (MASP), com
sede provisória no prédio dos Diários Associados (nome do grupo de comunicação
pertencente à Chateaubriand), na rua Sete de Abril no centro de São Paulo e direção
de P.M. Bardi – que permaneceria no cargo até 198811. Para Chateaubriand, o Museu
deveria reunir obras‐primas da arte européia, o que em seu entender não seria difícil,
pois bastava conseguir entre a alta burguesia nacional dinheiro para adquirir a preço
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irrisório obras que as famílias ricas européias se dispunham a vender em razão das
agruras sofridas durante a Segunda Guerra. Assim se formou grande parte do acervo
do Museu, que rapidamente irá se tornar o mais importante Museu de Arte do
hemisfério Sul, e reunirá em seu acervo peças de artistas consagrados pelo mercado e
pela crítica das artes.12
O trânsito de P.M. Bardi no mercado das artes europeu foi determinante para a
constituição do acervo do MASP, mas a percepção deste em relação à função do
Museu de Arte extrapolava a simples reunião e exibição de obras de arte já
consagradas. No seu entender, o Museu deveria ter um caráter universal e didático,
uma ampla atuação no presente, e ser voltado não exclusivamente para uma
determinada corrente artística, antiga ou moderna, mas um museu focado na arte. O
Museu de Arte – como Bardi costumava chamar o MASP – deveria ainda colocar o
público em contato com a arte, arquitetura e tendências do design de forma a
impulsionar a formação profissional nessas áreas – que em seu entender eram
fundamentais para o desenvolvimento da cidade, que a época firmava‐se como
metrópole e mais importante centro econômico do País (Bardi 1951)13.
A partir dessa proposta, o Museu irá abrigar entre 1951 e 1953, o Instituto de Arte
Contemporânea (IAC), que se constituíra de: uma escola de design dirigida por Lina Bo
Bardi. Também nos anos 1950, a conexão entre o museu e o desejo de
impulsionamento do design nacional, ganhará espaço nas páginas da Habitat – revista
das artes do Brasil, então editada por Lina e que funcionava como uma espécie de
espaço para debate e promoção das idéias do diretor e do grupo que atuava no
Museu, ou cujas idéias se coadunavam com a de seus dirigentes.
Como parte desse projeto, entre 1951‐1952, o Museu irá sediar dois desfiles de moda
organizados por iniciativa de P.M. Bardi, a partir dos quais se iniciará a formação de
um acervo de indumentária. O primeiro aconteceu em 1951 e foi denominado ‘Desfile
de Costumes Antigos e Modernos’. Na primeira parte foram exibidos trajes datados do
século XVIII e XIX, bem como a réplica de um vestido do século XVI emprestadas do
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acervo do Costume Institute do Metropolitan Museum of Art e da Union Française des
Artes Du Costume; na segunda parte, o desfile da coleção de Christian Dior então em
divulgação e para encerrar um traje projetado por Salvador Dali, denominado
‘Costume de 2045’, que hoje compõe o acervo do Museu.14
No ano seguinte o Museu abrigará, um novo desfile, este denominado ‘Primeiro
Desfile de Moda Brasileira’, no qual foi apresentada uma coleção constituída de 50
peças, cujos tecidos, estampas e modelos foram todos projetados por designers e
artistas que atuavam IAC e parcialmente produzidos nas oficinas ali instaladas. A
iniciativa contou ainda com o apoio de quatro indústrias têxteis nacionais, as
tecelagens Ribeiro industrial S.A, Industil S.A, Luftalla S.A. e Santa Constância O destino
das peças, ao contrário do que se possa imaginar, não eram as vitrines do museu, mas
a loja de departamentos Casa Anglo‐Brasileira (também conhecida como Mappin), na
qual as peças foram comercializadas. Na ocasião, o Museu abrigou também uma
escola de modelos, com vistas a ensinar o ofício às brasileiras que apresentariam às
roupas no desfile15.
No número 07 da revista Habitat: revista das Artes no Brasil (abril‐julho de 1952, s.p.),
o texto ‘A moda no Brasil’ veiculado alguns meses antes do desfile, que aconteceu no
mês de novembro – não assinado, mas provavelmente escrito a quatro mãos pelo
casal Bardi –, resume as ações do Museu no campo do design e explica em seus
parágrafos finais que o Museu pretendia ingressar no campo da moda a partir da
‘criação de uma escola para costureiros e artesãos que se dedicam aos problemas
colaterais da moda. (...) cogita‐se da criação, no Museu, de um centro de atividades
que possa dar origem, algum dia a uma variedade de moda de inspiração brasileira
liberta de dependências.’ O texto prossegue relatando que processo semelhante
ocorreu na Itália, nos anos que precederam a Segunda Guerra, quando foi criado em
Torino, um Departamento da Moda Italiana, que teria sido recebido com ironia pelos
observadores. O texto esclarece, entretanto, que passados alguns anos, a moda
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italiana ganhou projeção e estabeleceu identidade própria que ‘ao nosso ver, pode
perfeitamente figurar ao lado da moda francesa’.
A questão é retomada no artigo ‘Problema remoto da moda’ veiculado na edição de
número 09 da revista (outubro‐novembro de 1952, s.p.). Também sem assinatura e
novamente um provável texto do casal Bardi, como evidencia a passagem a seguir, na
qual se propõe que a possível originalidade da moda brasileira pode resultar da
apropriação da produção artesanal (um dos pontos cruciais na obra arquitetônica e
produção textual de Lina Bo Bardi [Grinover e Rubino 2010]) e também como veremos
mais adiante, por apresentar o que seria o ‘ponto de vista’ oficial do Museu.
A história da moda importada de fora, infelizmente, uma exigência de países mos quais
o artezanato (sic) não tinha se desenvolvido’ por falta de tradição cultural autóctone e
por falta de condições artísticas originais, capazes de oferecer ao público formas belas
e apropriadas. Entretanto, o que os mais inteligentes compreenderam é o seguinte: a
moda é relativa às condições específicas de cultura, clima, geografia e ainda, de
estrutura anatômica de elementos somáticos e mesmo cor e pele.
Nos parágrafos que se seguem, a ideia da necessidade da criação de uma moda com
acento local é novamente frisada em passagens que propõem que a moda produzida
no País, deveria ser ‘autêntica, correspondente ao ‘tipo brasileiro’ (...) uma moda
apropriada às condições específicas da produção brasileira e da economia em geral
(...). Uma moda conveniente à nossa paisagem, tão rica de inspirações, conveniente
ainda aos modos de viver, de trabalhar, de se divertir (...)’. Antes de encerrar, o texto
frisa que a tentativa dessa criação de uma ‘moda brasileira’ foi efetuada pelo Museu
de Arte de São Paulo (MASP) ‘instituição que considera o campo da moda um campo
verdadeiramente artístico’
No mesmo número da revista, a questão do clima, do folclore local e da paisagem são
novamente mencionadas como peculiaridades a serem respeitadas na criação de um
vestir brasileiro no texto ‘Uma moda brasileira’ de autoria da também italiana Luisa
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Sambonet (esposa de Roberto Sambonet)– responsável pela criação de algumas peças
da coleção exibida no desfile ‘Moda Brasileira’. Também trabalharam nas diversas
fases da criação da coleção, os seguintes profissionais, a alemã Klara Hartoch,
responsável pelo ateliê de tecelagem do Museu, que para a coleção criou tramas
têxteis inspiradas em motivos provenientes da cerâmica marajoara e palhas trançadas
inspiradas na cestaria indigena16; o argentino Carybé, que criou estampas inspiradas
no Candomblé (religião afro‐brasileira); o italiano Roberto Sambonet, que desenhou a
maior parte da coleção, criou estampas de inspiração marajoara, em antúrios (flor
típica dos ambientes tropicais) e foi o responsável pelo projeto gráfico dos convites e
peças gráficas do evento; além do paisagista brasileiro Roberto Burle Marx que
também projetou estampas para a coleção. Outros motivos empregados nas estampas
e ornamentos eram as pipas, as favelas, frutas, doces típicos e animais. (Ver figura 2)
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Figuras 1 e 2: Vestidos Macumba e Pipa, da coleção ‘Moda Brasileira’ (Arquivo do
Museu de Arte de São Paulo)
As peças, estampas e acessórios da coleção foram quase totalmente
concebidas a partir do olhar de artistas e designers estrangeiros, que irão utilizar nas
estampas, tramas, cores e materiais (posto que na modelagem, há pouca ousadia em
relação à moda parisiense), elementos que lhe parecem particularidades da cultura
brasileira. Tais imagens, entretanto, não são particularidades do olhar estrangeiro, pois
se coadunam com as imagens da identidade nacional propagadas pelo Estado desde a
década de 1930 e no período reforçadas a partir do fotojornalismo difundido pela
revista O Cruzeiro, que por seu alcance nacional e grandes tiragens se constituía como
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o principal espaço de difusão de uma determinada ideia de cultura nacional – que para
Assis Chateaubriand (dono do grupo Diários Associados, ao qual a revista pertencia e
era o principal órgão de imprensa) era baseada ‘no exotismo das paisagens e do povo
mestiço’, e em especial nos índios, entendidos pelo empresário como o grande
símbolo da nacionalidade brasileira. (Meyrer 2012)
Tal percepção fica evidente ao observar os temas e imagens que permeiam a coleção
‘Moda Brasileira’, cujas roupas apresentadas no desfile, receberão nomes que em sua
maioria tem origem indígena (ainda que de grupos e tribos diferentes) como
Itapetininga, Caraguatá, Poracás, Jacaré; outros farão referência a elementos da
paisagem, como ‘Praias do Norte’, ou ainda a elementos então considerados marginais
à cultura brasileira como, favela e macumba17. Já as referências à cultura urbana quase
não aparecem, sendo o vestido denominado Jardins – bairro nobre da cidade de São
Paulo – uma exceção. (Ver figura 2)
No catálogo distribuído ao público presente no desfile, além do nome e material com o
qual as peças foram confeccionadas, havia também a indicação do local e situação que
tais roupas deveriam ser usadas – como, por exemplo, as tardes ensolaradas ou as
manhãs no campo –, o que provavelmente é um desdobramento das idéias já
propagadas pelo casal Bardi e Luiza Sambonet, acerca da necessidade da moda se
adequar à paisagem – parecendo seguir assim um dos principais preceitos do design
funcionalista propagado pela Bauhaus, ‘a ideia de que a forma ideal de qualquer
objeto deve ser determinada pela função’. (Cardoso 2004)
Como era de se esperar, a coleção não caiu no gosto do público, para o qual ser
elegante era seguir a moda parisiense, e provavelmente rejeitava os elementos que
compunham a identidade visual explorada na coleção – que de certa forma, reuniam
aquilo que se localizava à margem da cultura de moda cultivada pelas elites urbanas e
parecia estranho, ou o ‘outro’ dentro do próprio território – , especialmente aqueles
que faziam alusão à cultura afro‐brasileira e às mazelas sociais, como os vestidos favela
e macumba, por exemplo. Os preços indicados no catálogo permitem aventar que
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eram as elites o público‐alvo da coleção, para a qual, abandonar os códigos de
elegância já estabelecidos era ainda mais complicado18.
Em catálogo de exposição ‘Traje um objeto de arte?’ realizada no MASP em 1987, há a
indicação de Lina Bo Bardi teria ficado com pelo menos dois desses vestidos. Dos
outros não se tem notícia, ainda que amostras de alguns dos têxteis ali projetados
possam ser encontrados na Biblioteca Archeologica‐Biblioteca d'Arte‐CASVA em Milão.
De qualquer modo, é possível concluir que a iniciativa não logrou, pois a experiência
não se repetiu. As oficinas de tecelagem e a Escola de modelos foram suspensas – ou
pelo menos não foram encontrados dados a respeito delas após 1952.
Anos mais tarde, Bardi declaração à revista Jeans e Sportwear em 1982 daria razão a
Paulo Franco (que colaborou na organização do desfile de ‘Costumes Antigos e
Modernos em 1951, e que no período era proprietário da Casa Vogue, a mais refinada
casa de modas da cidade de São Paulo), que ainda na década de 1950 teria lhe
advertido que tentar criar uma moda brasileira era uma insanidade, pois o consumidor
não estava preparado para tanto. Ainda que as peças da coleção não tenham
alcançado sucesso comercial é possível afirmar que de certa forma teve continuidade,
pois os elementos associados à cultura popular brasileira e às paisagens explorados na
coleção e rejeitados pelo público voltariam a aparecer em outras propostas de
instauração da moda brasileira e, com o passar dos anos se tornariam alguns dos
principais elementos identitários do design nacional de moda produzido no Brasil.
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Segundo ato
Em 1971, portanto quase 20 anos após a realização do desfile de Moda Brasileira, o
MASP irá receber a doação de cerca 70 vestidos estampados por artistas plásticos, que
durante a década de 1960 foram apresentados em desfiles de moda e editoriais de
moda que visavam promover os fios sintéticos fabricados pela Rhodia Têxtil do Brasil19.
Ainda que tais peças não tenham sido resultantes de um projeto encabeçado pelo
Museu, grande parte delas apresenta uma visualidade que se coadunam com a aquelas
expressas na coleção ‘Moda Brasileira’ apresentada no Museu em 1952. Outro ponto
em comum é que ambas foram criadas com a proposta de divulgar e propagar imagens
da moda brasileira fortemente associadas à cultura popular e às paisagens. Imagens
estas mais uma vez propostas a partir da fusão do olhar estrangeiro com as idéias
correntes de identidade nacional, pois tais promoções publicitárias foram elaboradas
pelo também italiano Livio Rangam, diretor de publicidade da Rhodia Têxtil entre
1960‐197020.
A maior diferença entre os projetos é o alcance destes, pois enquanto o primeiro foi
apresentado apenas no Museu em evento único e em razão da comercialização das
peças nenhuma delas pertence hoje ao acervo do MASP; as peças produzidas para as
promoções da Rhodia, até por resultarem de ação publicitária foram vistas por um
maior número de pessoas durante dez anos. Tais peças foram desfiladas durante as
temporadas da FENIT (Feira Nacional da Indústria Têxtil), que costumavam durar 15
dias e atraíam milhares de turistas para São Paulo; e em diversas cidades do País e no
exterior; e também divulgadas em editoriais de moda veiculados em revistas de
circulação nacional21. Ao contrário da coleção produzida no MASP, tais peças não eram
comercializadas, mas exibidas apenas com o propósito de agregar valor de arte e
brasilidade para a marca Rhodia. Buscava‐se, através da associação dos tecidos
fabricados com filamentos sintéticos à arte, conquistar os consumidores brasileiros e
especialmente o ‘segmento ‘mais exigente’ estabelecendo concorrência tanto com os
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tecidos brasileiros em fibras naturais, como os tecidos finos importados’. (Durand
1985: 44)
Tais peças eram criadas a partir da temática das coleções, as quais por sua vez giravam
em torno da associação entre elementos, que pelo menos desde a década de 1930,
eram fortemente associados à brasilidade, as religiões afro‐brasileiras, a flora e a fauna
tropical, os indígenas e também o futebol a partir da década de 1950. (Ver figura 3)
Figura 3: Dois vestidos da coleção Brazilian Primitive da Rhodia (1965). À esquerda
vestido com estampa de aves de Izabel Pons, à direita, estampa de objetos de culto do
candomblé de Aldemir Martins. Ambos fotografados em cenário que faz alusão à
cultura indígena. (revista Jóia, acervo Carlos Eduardo Prates)
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Coleção Café, Brazilian Primitive, Brazilian Style, Brazilian Look, eram alguns dos nomes
das coleções, que além de fazer referência direta ao Brasil, eram em sua maioria
grafados em inglês com o intuito de associar as roupas produzidas com os fios
sintéticos fabricados pela Rhodia, à moda internacional, ou à ‘alta‐costura francesa
brasileira’, como a iniciativa era denominada em reportagem publicitária veiculada na
revista O Cruzeiro em 29/10/96022.
Para reforçar ainda mais o caráter de brasilidade da referida moda, tais coleções eram
apresentadas periodicamente em de editoriais, reportagens e anúncios para jornais e
revistas (femininas e de variedades), os quais eram realizados especialmente em
cenários que frequentemente remetiam ao tema, como cidades‐históricas nacionais
(como Ouro Preto, Congonhas do Campo e Salvador) e cidades repletas de
monumentos arquitetônicos como o Rio de Janeiro ou Brasília, espaços que nas
palavras do historiador francês Pierre Nora (1993) podem ser considerados ‘lugares da
memória’. E ainda, em praias, cavernas, locais pitorescos como uma feira de bananas
no meio da Amazônia e paisagens tropicais, ou seja, espaços que remetem ao motivo
edênico.
Já nos desfiles a exibição das coleções eram entremeadas por apresentações de
diferentes estilos da música brasileira, como o samba, a bossa‐nova, a música popular
brasileira e o jazz com acento local. Passaram pelos palcos desses desfiles artistas de
grande destaque no período, como Nara Leão, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa
e os Mutantes, Sérgio Mendes.
A iniciativa não só resultou em sucesso comercial para a Rhodia Têxtil (Bonadio 2005),
como se tornou referência para a moda brasileira, tendo sido lembrada com
freqüência em eventos contemporâneos de moda, teses e capítulos de livros23. Mas, o
que de fato torna essa produção particularmente significativa, é sua trajetória a partir
de 1971 quando ocorre a doação ao MASP.
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Entre 1960‐1970 foram produzidas aproximadamente 300 vestidos cujas padronagens
foram encomendas a 72 artistas plásticos brasileiros, ou que aqui residiam. Dentre os
artistas convidados a produzir tais padrões havia representantes das mais diversas
correntes artísticas nacionais. Willys de Castro, Ivan Serpa e Hermelindo Fiaminghi, por
exemplo, participam ativamente do movimento concretista brasileiro, o qual
preconizava um ‘abstracionismo rigoroso, geométrico, quase matemático de intensa
pesquisa formal’
24
. (Gabrielli 2001: 297) Manabu Mabe, Iberê Camargo, Fayga
Ostrower, Antonio Bandeira e Isabel Pons são filiados à abstração lírica e gestual,
enquanto Kazuo Wakabayashi, Tomie Othake, Tomoshsige Kusuno e Yuatuta Toyota
pertencem ao expressionismo abstrato. (Fabris 2001:11). Mas, foram os artistas
figurativos como Aldemir Martins e Lula Cardoso Ayres, aqueles que mais criaram
estampas para a Rhodia.
Ainda que muitos dos artistas que elaboraram estampas para as peças da Rhodia
utilizem em seus trabalhos para a Rhodia (e fora dela) elementos que criem
associações diretas ao Brasil (dentre estes, destaco Aldemir Martins, Lula Cardoso
Ayres, Heitor dos Prazeres, Manezinho Araújo e Alfredo Volpi), a inserção de tais peças
nos editoriais produzidos pela equipe de publicidade da empresa, faz com que roupas
que em outro contexto seriam apenas ‘roupas coloridas’ com design da década de
1960, se tornem ‘roupas que expressam as cores do Brasil’ (ou as tais ‘bold color’s
mencionadas no já
citado vídeo da Macy’s), posto que são parte daquilo que tais
promoções irão denominar como ‘Brazilian Look, Brazilian Style, Brazilian Fashion
Team’. Para tais roupas, a ‘brasilidade’ torna‐se adjetivo.
Observando que dentre as peças que chegaram ao acervo do Museu, apenas cerca de
30% possuem estampas que fazem alusão direta aos ditos ‘temas brasileiros’ seria
possível pensar que, a associação dessas peças com uma visualidade brasileira teria se
esvaecido a partir do momento da doação. Entretanto, o que ocorre é exatamente o
oposto. Após a doação para o Museu, tais peças serão cada vez mais utilizadas em
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exposições que celebram a moda brasileira – da qual tais peças se tornariam uma
espécie de marco inaugural. Isso se dá, pois apesar do Brasil contar com peças de
indumentária armazenadas em pelo menos 79 museus diferentes (Silva 2008), apenas
o MASP teve o acervo formado a partir da ideia da necessidade de valorizar e
impulsionar o design nacional. Assim, em sua maioria, as peças pertencentes a esses
acervos, guardam indumentárias que pertenceram a governantes, uniformes, vestes
eclesiásticas e peças de vestuário que pertenceram às elites brasileiras e por isso, são
fontes importantes para entender o consumo de alta‐costura, as tradições militares e
o vestuário utilizado pelos homens de poder no País, mas não para entender a
produção e o design nacional.
O acervo de indumentária do MASP, apesar de modesto nos números (o museu tem
no total cerca de 150 peças), sobretudo quando comparado a instituições
internacionais, até o momento é o mais significativo museu nacional no que diz
respeito à produção de moda local recente, e, sobretudo aquela proveniente de uma
iniciativa que visava impulsionar a indústria nacional e criar um padrão visual e de
qualidade para a moda nacional.
Esse caráter será explorado logo na mostra que irá comemorar a doação do acervo ao
MASP, que ocorrerá em 1971 e receberá o título ‘Retrospectiva da Moda Brasileira’.
Apesar das peças serem então bastante recentes, P.M. Bardi escolherá esse título para
a mostra, provavelmente como forma de reverenciar as peças que ampliariam de
forma significativa o então, ainda mais incipiente acervo de indumentária do Museu,
mas dariam continuidade às propostas do diretor do Museu em torno da visualidade
do design de moda produzido no País, no qual a estamparia calcada no exótico
novamente era protagonista, uma vez que tal as roupas criadas para o desfile ‘Moda
Brasileira’ de 1952, em termos de modelagem, tais peças mantiveram as linhas daquilo
que era ditado pela moda francesa (ou ainda inglesa e italiana, as quais propagaram
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respectivamente a minissaia e o palazzo pijama, peças que aparecem entre os itens da
coleção). (Ver figura 4)
Figura 4: Exposição ‘História da Moda’, MASP, 1971. À esquerda um vestido com
estampa de inspiração marajoara, e na sequência vestido com estampa de ave
brasileira de Aldemir Martins. (Arquivo do Museu de Arte de São Paulo)
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Uma história para a moda
Até a segunda metade da década de 1990, as peças da coleção da Rhodia do MASP
tiveram uma circulação bastante restrita. Porém, a contar desse período, tais objetos
não só ganhariam mais visibilidade, uma vez que passariam a ser integradas a mostras
retrospectivas dos artistas que produziram estampas para as promoções da Rhodia, e
também diversas exposições sobre a história da moda nacional e em alguns casos,
como atração principal.
Entre 19 de novembro de 1999 e 03 de fevereiro de 2000, as peças do MASP
integraram a exposição Arte/Consumo realizada no Itaú Cultural (espaço expositivo de
um dos maiores bancos do País, localizado na Avenida Paulista), na qual compunham o
módulo ‘Metamorfoses do consumo’ – que ocupava todo um andar do prédio –
dedicado à moda, ou seja, em uma exposição que observava as conexões entre arte e
consumo e a moda – importante elo de ligação entre ambos – foi lembrada
exclusivamente através da Coleção da Rhodia do MASP e fotografias elaboradas para
as promoções publicitárias da Rhodia.25
Quatro anos mais tarde, tais peças seriam a principal atração da exposição da
inauguração do I‐Moda Brasil (Instituto Brasileiro de Moda), o qual segundo
informações institucionais abrigaria um centro de formação sobre o setor, museu e
biblioteca, através da parceria entre o MASP e a ABIT (Associação Brasileira da
Indústria Têxtil). O objetivo do Instituto, de certa forma retomava as idéias que
levaram P.M. Bardi a organizar ações relativas à moda no Museu, uma vez que visavam
‘propiciar a formação e disseminar o conhecimento e a cultura de moda e vestuário,
englobando as mais diversas áreas deste segmento: criação, gestão, marketing e
tecnologia.’26
O cenário no qual tais exposições emergem fornece pistas para entender porque esta
coleção irá ganhar visibilidade nesse período. Até o final da década de 1970, o
brasileiro vestia‐se majoritariamente com roupas feitas em costureiras, e só na década
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seguinte é que passará a priorizar a roupas compradas prontas, portanto, é a partir da
década de 1980, que as marcas nacionais do prêt‐à‐porter de luxo irão ganhar maior
destaque. Ainda assim, até a metade dos anos 1990 haverá dificuldades em
estabelecer um calendário para moda nacional através da fixação de semanas de moda
e a maior parte dos lançamentos de moda ainda acontecia na FENIT.27 Esse cenário só
se transformaria a partir de meados da década de 199028.
O início do último decênio do século XX é um momento de forte crise para a moda e
indústria têxtil nacional, o que se dá em razão da redução das barreiras alfandegárias
propostas pelo Governo Federal entre 1990 e 1994, o fim da superinflação, a grande
apreciação do real e a elevação da taxa de juros. É diante desse quadro que a moda
brasileira irá ganhar impulso, o que se dará a partir da fixação de um calendário para
as semanas de moda (ver tabela 1); da busca pela identidade própria pelas marcas do
prêt‐à‐porter de luxo nacional – grupo que ‘constitui a força motriz’ da moda brasileira
e da entrada no mercado da primeira geração de designers de moda formados no
ensino superior (Kontic 2007).
Tabela 1: Principais Semanas de Moda realizadas no Brasil a partir de 1990
Nome do evento
Phytoervas Fashion
Semana Barra Shopping de
Estilo
Morumbi Fashion
Casa de Criadores
Amni Hot Spot
São Paulo Fashion Week
Fashion Rio
Fashion Business
Cidade
Primeira
Edição
São Paulo 1993
Rio de
1996
Janeiro
São Paulo 1996
Status
São Paulo
São Paulo
São Paulo
Rio de
Janeiro
Rio de
Janeiro
2000
2001
2001
2003
Ativo
Extinto em 2006
Ativo
Ativo
2003
Ativo
Extinto em 1996
Extinto em 2001
Em 2001 muda o nome para
São Paulo Fashion Week
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Neste contexto interessa à indústria da moda buscar um passado, uma história, ou
uma espécie de ‘narrativa da moda’ – aqui transponho para a moda, o conceito de
‘narrativa da nação’, uma ‘série de estórias, imagens, panoramas, cenários, eventos
históricos, símbolos e rituais nacionais que simbolizam ou representam as experiências
partilhadas (...)’ (Hall 2003: 52) – aqui representada pela coleção da Rhodia no MASP.
Daí a visibilidade dada ao acervo da Rhodia, que ao integrar diversas exposições, e
especialmente aquela que deveria marcar a abertura do I‐Moda Brasil, se tornam de
certa maneira, não apenas as roupas produzidas pela Rhodia, mas, a história da
indústria de moda do País. Ainda que tal iniciativa não tenha sido única no que diz
respeito à parceria com artistas plásticos, ou designers de moda que trabalharam
questões associadas ‘às coisas do Brasil’ – também nos anos 1960, por exemplo, a
Deodoro Têxtil lançou uma coleção toda estampada por Genaro de Carvalho, e a
estilista Zuzu Angel criou diversas coleções inspiradas em temas nacionais –, a coleção
e as iniciativas da Rhodia Têxtil nos anos 1960, por sua amplitude e musealização
acabou se tornando essa história, ou pelo menos o item mais significativo desta.
A coleção – que, é bom que se deixe claro, é apenas um fragmento daquilo que foi
produzido pela empresa – acabou ganhando inclusive novos significados atrelados à
‘brasilidade’, como se observa na exposição ‘Tropicália: uma revolução cultural’, que
passou por cinco cidades, e três continentes, na qual as peças foram apresentadas
como roupas tropicalistas – o que efetivamente não eram, ainda que possam haver
aproximações visuais entre o Tropicalismo e algumas peças da coleção. De qualquer
modo, tais roupas nunca foram usadas por membros do referido movimento, não
foram projetadas por designers ou artistas ligados ao grupo e algumas foram
produzidas anos antes do surgimento do movimento no País.
O que o interesse por essa coleção revela, é que ao reconhecermos que no passado
produzimos uma moda que, ao invés de se calcar exclusivamente na cópia e adaptação
de elementos estrangeiros explorou, ao menos em suas estampas, destaca elementos
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como as paisagens, cultura indígena, cultura popular e outros elementos associados à
nossa ‘comunidade imaginada’ (Anderson 2008), podemos afirmar que nossa moda
possui uma história, ainda que recente. Atualmente, essa é a nossa principal imagem
associada à moda brasileira. Assim somos reconhecidos, e de certa forma é assim que
nos reconhecemos e nos mostramos no que diz respeito à moda – ainda que existam
exceções, como no já citado caso de Alexandre Herchcovitch, que ao menos para o
olhar do brasileiro, não explora tais características. Não à toa, marcas brasileiras tais
como Carlos Miele e Osklen que buscam projeção internacional se apóiam nesses
elementos em suas publicidades e desfiles.
A associação do exótico como identidade nacional, entretanto, não se restringe
à moda, pois segundo Sandra Pesavento (1999:130)
Contemporaneamente, a identidade nacional oferece‐se como paradigma exportável
que combina elementos essenciais de referência sob o amálgama do estético com o do
exótico: a cor da alma se expõe, com a mestiçagem positivada, a natureza se oferece,
potencializa na sua dimensão aurática de ser única e específica, e a cultura se vende
como mosaico, articulando peças com forte apelo ao consumo. O resultado é uma
combinação original aos olhos dos ‘outros’ e que converte a identidade construída
numa correspondência com a alteridade atribuída pelo estrangeiro ao Brasil.
Eleger as paisagens exuberantes e a cultura popular como nossas peculiaridades na
moda, entretanto, apesar de ser um caminho aparentemente eficaz no que diz
respeito à construção de uma imagem de moda brasileira no exterior, acaba por nos
relegar o rótulo de exótico, o qual parece ainda ser reservado a uma ‘outra moda’, não
produzida pelos centros, mas pela periferia. Tanto é que nas últimas décadas os países
que conseguiram se estabelecer no âmbito da moda internacional, como o Japão e a
Bélgica, o fizeram a partir da utilização em suas criações de procedimentos associados
às vanguardas artísticas, mas não ao exótico (Crane 2011)29.
O exotismo, sobretudo aquele associado às paisagens é uma marca tão forte da moda
brasileira, que é visto até onde efetivamente não está – ou pelo menos não com os
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significados que lhe foram imputados! Ainda que tal imagem seja nosso ‘cartão de
visitas’, ao mesmo tempo nos relega um espaço coadjuvante na moda internacional.
Bom ou ruim, por hora é o espaço e imagem que temos.
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O artigo apresenta resultados de pesquisa realizada com financiamento do Conselho Nacional de
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Carvalho Moraes e Romeu Loreto funcionários da Biblioteca e Centro de Documentação do MASP.
2
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6
A praia de Ipanema ganhou notoriedade internacional a partir do sucesso da música "Garota de
Ipanema" composta em 1962 por Vinícius de Moraes e Antônio Carlos Jobim. A canção do gênero Bossa‐
Nova foi vertida para o inglês e em 1964 incluída no álbum Getz/Gilberto lançado nos Estados Unidos. A
versão cantada chegou ao topo das paradas alcançando o 5o. lugar entre as 100 mais tocadas nos
Estados Unidos e, por duas semanas, o número 1 no ranking de easy listening americano. Em 1967 foi
gravada por Frank Sinatra e Tom Jobim no álbum “Francis Albert Sinatra & Antônio Carlos Jobim.
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Gênero que se popularizou no País e no exterior a partir do início dos anos 2000 e tem na cantora
Fernanda Porto sua principal expoente.
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Capim dourado é uma espécie de capim (Singhnantus sp) que existe somente na região Centro‐Oeste
do Brasil, que após seco, apresenta aspecto dourado e com o qual se faz palha para artesanatos como
bijuteria, acessórios e peças de decoração.
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Outro aspecto do tema, o consumo do exótico associado à moda brasileira na França contemporânea
foi analisado sob o ponto de vista da antropologia em (Leitão 2007).
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Por visualidade entendo ““a set of discourses and practices constituting distinctive forms of visual
experience in historically specific circumstances”. (Chaney 2000: Apud Meneses 2003)
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A sede definitiva do Museu localizada na Avenida Paulista foi inaugurada em 1968. Tal prédio foi
projetado por Lina Bo Bardi.
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A exposição do acervo do Museu realizada em 1953 no Musée de L’Orangerie de Paris pode ser
considerado o primeiro ato em direção a esse reconhecimento, posto que até então, grande parte dos
órgãos de imprensa que não pertenciam aos Diários Associados, acusava Assis Chateaubriand de estar
montando um museu com obras falsas. Assim, a exibição das obras do MASP em uma importante
instituição francesa, não só colaborou na projeção internacional dessa coleção, como trouxe mais
prestígio para a mesma no Brasil.
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É a partir do final dos anos 1940 e início dos anos 1950, que a cidade de São Paulo finalmente atinge a
almejada condição de metrópole (Morse 1970). Nesse contexto de desenvolvimento econômico, a
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cidade passará também a receber novos investimentos em ações culturais, que permitirão a
implementação de novos espaços e grupos, que irão funcionar como espelho da prosperidade
econômica de organizações industriais e de imprensa então instaladas na cidade. (Arruda 2001) Um dos
desdobramentos do novo panorama paulistano será a instalação na cidade do Museu de Arte Moderna
(1948) e do Museu de Arte de São Paulo (1947).
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A Union Française des Artes du Costume é fundada em 1948 por diversos profissionais, sob a liderança
do historiador François Boucher com o intuito de formar um Museu da Moda. Esse objetivo seria
atingido apenas em 1987, quando é fundado o Musée de la Mode et du Costume em Paris.
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No período o campo de atuação para as modelos era bastante restrito e se constituía basicamente de
desfiles realizados em lojas de moda de luxou ou grandes magazines, posto que a produção editorial de
moda, ainda era incipiente no País. (Bonadio 2004) Nestes desfiles eram as vendedoras e algumas
clientes que comumente atuavam como manequim. Neste cenário inexistiam escolas para manequins,
daí a necessidade do MASP criar o curso quando do desfile de 1952.
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A arte marajoara é considerada a mais antiga arte cerâmica do Brasil e resulta da produção artística
dos índios habitantes da Ilha de Marajó, no Pará. Caracteriza‐se especialmente pelo uso de ornamentos
geométricos e padrões simétricos. http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/
index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=5353. Sobre as cestarias indígenas, ver:
http://www.funai.gov.br/projetos/Plano_editorial/Pdf/REPD4‐2/Artigo_3_Lucia_Hussak_Trancados_
indigenas_norte_amazonicos_fazer_adornar_usar.pdf ‐ acesso em 25 de outubro de 2013
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Macumba é a designação genérica dos cultos afro‐brasileiros originários do nagô e que receberam
influências de outras religiões africanas (p.ex., de Angola e do Congo), e tb. ameríndias, católicas,
espíritas e ocultistas.
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Convertendo os valores dos preços anunciados no jornal Folha da Manhã em 09 de novembro de
1952 para reais, teríamos aproximadamente os seguintes valores para cada vestido do anúncio: Poracás
9.600,00, Faisca 84.00,00, Macumba 54.00,00, Carambola 6.600,00, Balaio 9.600,00 e Bala de coco
15.600,00.
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Em 1958, a Companhia Química Rhodia Brasileira, através de sua subsidiária Companhia Brasileira
Rhodiaceta, obtém a exclusividade das patentes para a fiação das fibras de poliéster no Brasil, através
de um acordo firmado junto à Imperial Chemical Industries, da Inglaterra. A partir desse ano e até 1968
a empresa torna‐se “um monopólio virtual sobre o segmento de produção das fibras sintéticas uma vez
que produzia fibra de poliéster, filamentos de nylon 6.6, poliéster e fibras acrílicas” (Corrêa e Santos
2002).
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Livio Rangan (1933‐1984), natural da Itália chega ao Brasil em 1953. Nesse período começou a
organizar grandes espetáculos de ballet e percorrer empresas em busca de patrocínio. Apresentou seus
projetos à Rhodia, ganhou a simpatia dos diretores da empresa e foi contratado para atuar como
gerente de publicidade, cargo que exerceu até 1970.
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A feira é inaugurada em 1958, mas a Rhodia faz sua primeira grande participação apenas em 1963. Os
desfiles da Rhodia, ao mesclarem desfile de moda e cenários espetaculares com apresentações musicais
de músicos brasileiros alavancam a bilheteria da mesma a partir de 1964. (Bonadio 2005).
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O café era naquele momento o principal produto de exportação nacional, associar a moda ao café
visava, portanto, agregar à esta um pouco do prestígio que o café nacional desfrutava no País e fora
dele.
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As promoções da Rhodia foram tema de duas teses de doutorado (Bonadio 2005 e Sant’anna 2010). O
tema também é abordado em um capítulo do livro História da Moda brasileira, de André Luiz do Prado e
João Braga (2012). Lembradas ainda em duas edições da São Paulo Fashion Week – principal semana de
moda do País –, em 2002 o evento sediou uma exposição em homenagem a Livio Rangan e em 2005, a
Rhodia montou um stand no evento para celebrar os 50 anos do início da fabricação do nylon no Brasil,
a cenografia do stand lembrava as promoções da década de 1960.
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Após a apresentação na FENIT (Feira Nacional da Indústria Têxtil), toda a equipe da Rhodia viajava
para realizar desfiles e editoriais de moda em países estrangeiros (que seriam divulgados em revistas
nacionais). (Bonadio 2009).
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Outras exposições que exibiram peças da Coleção Rhodia do MASP foram: O Preço da Sedução (SP,
Março‐Maio 2004); retrospectiva de Hércules Barsotti realizada no Museu de Arte Moderna de São
Paulo, Não‐cor cor (São Paulo, 24 a setembro a 24 de outubro de 2004); retrospectiva Amilcar de Castro
e Willys de Castro, realizada entre maio e agosto de 2009, no Centro Cultural Maria Antônia (São Paulo)
e a exposição itinerante Tropicália: uma revolução na cultura brasileira (1967‐1972), que passou por
cinco museus e quatro países entre 2006 e 2007.
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<http://masp.art.br/default.asp?PG=EXP&IT=22> acesso em 03 de maio de 2004. Até onde se tem
notícia, o I‐Moda Brasil não vingou, pois passados mais de 6 anos, a idéia não saiu do papel e teve na
citada exposição sua única ação, mesmo assim a escolha de tais peças para a abertura de uma exposição
que visava marcar entre outros, a criação de um museu da moda brasileira vale reflexão.
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A busca do deslocamento da vitrine da moda da Feira Nacional da Indústria Têxtil, para as semanas de
moda, é de fato indício da busca pela diferenciação, pois ainda que os setores sejam em parte
imbricados, a realização de eventos dedicados “exclusivamente” à moda eleva o status da produção
nacional.
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No período ocorreram algumas tentativas de sistematização de semanas de moda, as quais,
entretanto, não tiveram continuidade, exemplos são: o Grupo Moda Rio, criado em 1975; Núcleo
Paulista de Moda, 1980; Grupo Mineiro de Moda, formando em 1982 ‐1995.
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Ainda que o exótico possa ser apropriado em coleções de moda associadas às vanguardas artísticas,
como em algumas coleções do designer de moda belga Dries Van Noten. Nesse caso em específico, as
imagens de culturas não ocidentais são utilizadas em roupas muitas vezes assimétricas ou constituídas
de uma mistura de tecidos, que desconstroem os padrões ocidentais de elegância e violam as
expectativas da platéia, portanto, fiel a algumas das características que Diana Crane (2011) atribuí à
moda vanguardista.
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