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Encontros de Design de Lisboa 2014

› O Design como pensamento × Notas Biográficas 10 12 16 22 24 28 46 73 74 82 96 Pág. 8 9 Pref á cio I I En c o n tro s d e D e s ig n d e L i s b o a I I En c o n tro s d e D e s ig n d e L i s b o a * Em alguns dos organismos de arquivos e bibliotecas existe um reportório documental subsidiado na world wide web. PAINEL II COMENTAR O DESIGN 78 › Bibliografia Derrida, Jacques (1972), Marges de la philosophie, Paris: Éditions de Minuit. Flusser , Wilém (1999) The Shape of Things: A Philosophy of Design, London: Reaktion Books. Foucault, Michel (1984),"Qu'est-ce que les Lumières?", Magazine littéraire, no 207, mai pp. 35-39 (Dits Ecrits Tome IV texte n°351)

II ENCONTROS DE DESIGN DE LISBOA . 2014 FACULDADE DE BELAS-ARTES . UNIVERSIDADE DE LISBOA  › COORDENAÇÃO DO LIVRO RAUL CUNCA VICTOR M ALMEIDA › PROJECTO COMUNICAÇÃO COLECTIVO 4.16 › ISBN 978-989-8771-27-8 › DEPÓSITO LEGAL ? EDIÇÃO CIEBA LISBOA, MARÇO 2015 COM O APOIO DE: DOCUMENTAR COMENTAR O DESIGN Pág. 10 Fernando António Baptista Pereira › Prefácio 12 Raul Cunca › Encontros de Design de Lisboa 16 Victor M Almeida › Docomentar o arquivo em design × Documentar o Design 22 PAINEL 1 ›› 24 Viviana Narotzky Keeping it open 28 Helena Barbosa, UA Uma perspectiva sobre documentar e comentar o design através do cartaz 46 Francisco Providência, UA › O que significa Design português? × Comentar o Design 73 PAINEL 2 ›› 74 José Bártolo,ESAD › Documento, História e Arquivo. Apontamentos sobre história do design português 82 Maria Teresa Cruz, UL › O Design como pensamento × 96 Notas Biográficas 8 9 10 Fernando António Baptista Pereira Presidente do Centro de Investigação e de EStudos em Belas-Artes (CIEBA) Presidente do Conselho Científico da FBAUL A segunda edição dos Encontros de Design de Lisboa / Lisbon Design Meetings (EDL/LDM), que se realizou em 2014, subordinada ao tema “Documentar | Comentar o Design”, vê agora publicadas as suas Atas, recolhendo os mais importantes contributos, pelas Secções de Design e de Design de Comunicação e Novos Media do CIEBA (Centro de Investigação e Estudos em Belas-Artes), unidade de I&D a que tenho a honra de presidir. Desde a primeira edição que estes Encontros pretendem criar um espaço regular de comunicação e relexão, a nível académico, mas com total abertura a toda a sociedade, sobre a utilização do design enquanto recurso estratégico na economia e enquanto intervenção qualiicada e qualiicadora nos diferentes palcos sociais, mas também sobre os modos como as instituições de ensino universitário e os centros de investigação o consolidam como área de conhecimento. A presente edição recolheu contributos decisivos para, como pretendiam os seus promotores, explorar os limites documentais do design na tentativa de uma melhor adequação da praxis associada ao ensino/educação e à investigação/ ciência, uma vez que documentar é conferir relevância à crítica e ao estudo do design enquanto fatores de perceção cultural dos artefactos em contexto, sem esquecer, também, que documentar é redimensionar o palco onde o design atua. Com efeito, vivemos uma época marcada não só por uma ativa consciência social de cidadania, que se manifesta através de uma enorme diversidade de canais reais e virtuais, mas também pela plasticidade dos olhares do designer e das suas práticas, pelo que se torna imperativo recolocar, como foi proposto ao longo destes Encontros, a relexão sobre o design mais no «expandido» terreno da capacidade mediadora entre a produção de conhecimentos e as metodologias de intervenção cada vez mais alargadas nos diferentes tecidos e palcos coletivos do que no mais tradicionalmente considerado território da mera produção de objetos e de materiais de comunicação. Num momento em que a produção cientíica desenvolvida no âmbito da FBAUL, nos graus pós-graduados (mestrados e doutoramentos), nas duas áreas do design, a de comunicação e a de design de equipamento, apresenta signiicativos resultados, com diferentes Mestrados nas Áreas e várias teses de Doutoramento defendidas ou a aguardar defesa, este importante esforço de relexão, com relevante colaboração nacional e estrangeira, proporcionou igualmente uma intervenção qualiicada posta à disposição dessa mesma formação pós-graduada de segundo e terceiro ciclos. Estão, pois, de parabéns todos os que puseram de pé estes segundos Encontros de Design de Lisboa / Lisbon Design Meetings (EDL/LDM) e a edição das suas Atas, fazendo votos para que, com esta publicação, se aprofunde a investigação e se preparem as próximas edições.× Prefácio II Encontros de Design de Lisboa A transversalidade de questionamentos e de posições que foi timbre dos trabalhos destes segundos Encontros está, de resto, como temos defendido, no âmago do novo modo como a investigação em Arte e em Design se tem inscrito na FBAUL e no CIEBA, promovendo a formação sustentada de criadores com uma sólida formação universitária que aliam a dimensão criativa à capacidade de relexão e investigação. 11 Os II Encontros de Design de Lisboa 12 Raul Cunca I n v e s t i g a d o r P r i n c i p a l d a S e c ç ã o d e D e s i g n d o CI E B A O texto apresentado na primeira edição dos Encontros de Design de Lisboa, realizados em 2012, termina perspectivando a continuidade deste evento. Esta minha vontade acabou por se concretizar, consolidando estes II Encontros como um espaço dedicado à investigação em design na Faculdade de Belas-Artes e na cidade de Lisboa. Esta segunda edição dos Encontros materializa também uma data emblemática para a história do design em Portugal e para o percurso da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa no ensino artístico em Portugal, marcada pela celebração dos 40 anos dos primeiros cursos superiores públicos de design no nosso país, iniciados em 1974 na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa. Para registar esta efeméride, o tema desta segunda edição foi dedicado ao: documentar | comentar o design, perspectivando o seu conteúdo, quer na direcção de uma leitura sustentada nos percursos de design em Portugal, quer pela sua emergente necessidade de documentar e, posteriormente, comentar o design na sociedade contemporânea, onde esta relação constitui um meio de produzir e disseminar conhecimento. É, precisamente, neste âmbito e na pluralidade dos seus trilhos que se encontram inscritas as intervenções dos oradores nacionais e estrangeiros que deram voz a estes II Encontros de Design, materializadas na presente edição em vias de investigação que vão desde o Open Design, passando pela importância do estudo do cartaz para a história do design gráico e pela procura da identidade para o design português, terminando com uma perspectiva sobre a importância do arquivo como base documental para a história e critica do design, bem como a relevância da matriz gráica do documento como base para um projecto iccionado. A todos aqueles que tornaram possível os II Encontros de Design de Lisboa, agradeço o seu empenho por constituírem cada vez mais, um espaço de pluralidade, no qual se cruzam discentes, docentes e funcionários numa dinâmica comum que permite realizar este evento dedicado ao design, com um reconhecido sucesso e uma plateia crítica e interessada nos renovados desaios colocados a esta disciplina. × II Encontros de Design de Lisboa 13 14 15 Docomentar o arquivo em design 16 Victor M Almeida Investigador da Secção de Design de Comunicação Comentar e documentar determinam ações que se complementam entre si e que se associam, no caso do design, às práticas contemporâneas de analisar, criticar e arquivar os artefactos culturais porque, desde sempre, os indivíduos e as sociedades sentem uma urgência pelo registo de memória, cumprindo um movimento civilizacional de (re)construção permanente do arquivo. Neste contexto compulsivo, emerge a arquivização que, na perspetiva de Jacques Derrida, pode tornar-se mais produtiva do que o assunto que arquiva, i.e. o modo como se transmite a informação estabelece a natureza do conhecimento no sentido do que se pretende arquivar e estudar. Derrida no livro Archive Fever (1995), argumenta que não existe poder político sem controlo do arquivo, ou seja, da memória, e que a consumação da democracia se estabelece na participação e acesso ao arquivo. Na cademia, esse acesso tem resultado em disputas disciplinares interessantes que ao longo do tempo têm contribuído para que o arquivo se diversiique quer na variedade de materiais que o compõem, quer na riqueza das leituras processadas. A transparência do arquivo, evocada como uma posição contrária ao que alguns investigadores consideram como a predisposição para a impossibilidade do arquivo ser neutral, torna-se um fator essencial no modo como qualquer indivíduo pode exercer o seu direito de reconstruir a memória e a história através da sua percepção pessoal. No meio académico contemporâneo, esse olhar mais disponível tem contribuído para a expansão do conhecimento em muitas áreas cientíicas, com destaque, para o design que vem assistindo à importância do contexto social, económico e político na leitura dos artefactos que integram a designada cultura material. Despontam novos campos de estudo que se contaminam entre si e que subsidiam o arquivo em design com novas possibilidades analíticas. A aglutinação dos verbos comentar e documentar – docomentar – expõe a versatilidade do papel do arquivo em design na medida em que traduz uma polissemia de relações interdisciplinares só veriicáveis em áreas de estudo que lidam simultaneamente com os peris culturais macro e micro da sociedade. As ramiicações rizomáticas do processamento de leituras sobre objetos e acontecimentos (conhecimento) conferem a docomentar uma amplitude de olhares participativos quase sempre inesgotáveis. Por sua vez, Helena Barbosa apontou na sua palestra as questões que considerou essenciais para a compreensão da natureza e dos limites da documentação em design. Referiu-se ao projeto CLIP como uma necessidade de criação de uma taxonomia para identiicação e catalogação de documentos e apresentou alguns exemplos retirados da sua investigação sobre a história do cartaz português desde o século XVII até ao século XX. Explicou, também, o processo de investigação assente na revisão da literatura sobre o design português, em especial, sobre o cartaz, seja no recurso a fontes documentais iconográicas seja na criação de uma base de dados com uma amostra representativa distribuída por categorias e subcategorias onde se identiiquem as características principais dos respetivos objetos. II Encontros de Design de Lisboa Em relação aos II Encontros de Design de Lisboa (FBAUL, 2014), Viviana Narotzky iniciou o evento com a conferência Keeping is open. Why design is not what it used to be… onde relembrou o que fora o design no modernismo, com as suas expectativas de integração humana nos processos de produção até à mudança operada a partir das décadas de 1970 e 1980, onde esurge um contrato social diferente em resposta ao contexto pósindustrial. Para a investigadora catalã, este ímpeto é hoje pontualmente contrariado pelo conceito de Open Design onde sobressaem os processos abertos de colaboração entre produtor e consumidor. 17 18 Victor M Almeida Investigador da Secção de Design de Comunicação Para Maria Teresa Cruz as dúvidas permanecem nos limites e implicações do sentido do design na contemporaneidade. O design é visto como “mediador da experiência”, na senda do design thinking e do design social, em contraciclo com uma vertente historicista repleta de conceitos tidos como irrefutáveis. Para Maria Teresa Cruz as dúvidas permanecem nos limites e implicações do sentido do design na contemporaneidade. O design como “mediador da experiência”, na senda do design thinking e do design social, em contraciclo com uma vertente historicista repleta de conceitos tidos como irrefutáveis. A investigadora e docente da Universidade Nova de Lisboa atribui uma vocação transdisciplinar ao design ao considerá-lo como uma área de largo espectro uma vez que poderá estar presente em todos os níveis da organização social correspondendo, assim, à acepção de design thinking de Tim Brown. Nesta perspetiva, propõe que o designer seja olhado como um ilósofo ao qual seja atribuída a tarefa de materializar o pensamento e, assim, estabelecer uma matriz especiica para o real. José Bártolo debateu a noção de arquivo como dispositivo de base documental para a produção de conhecimento. Propôs a valorização do arquivo como base de investigação e, sobretudo, como metaprojeto, i.e. como conceito aberto. Apresentou um conjunto de exemplos desde as experiências de Aby Warburg, passando pelo projeto Mass Observation, e culminando na exposição Almanaque (Galeria Quadra, Matosinhos) onde procurou interpretar a história do design editorial português que medeia entre o início do século XX até aos nossos dias. Bártolo reforçou a importância dos arquivos documentais para a contextualização, análise e interpretação histórica dos artefactos. A comunicação de Lorenzo Imbesi centrou-se nos contributos para a compreensão do design para a sociedade pós-industrial enquadrados pela deinição de condição pósindustrial de Manuel Castells (2010), em que o teórico evidencia a importância do sistema inanceiro mundial e da sociedade em rede, e pela radicalidade da modernidade líquida de Zygmunt Bauman que destaca a fragilidade da sociedade contemporânea orientada para o imediatismo do consumo, da incerteza, da volatilidade e da insegurança em todos os domínios. O conferencista italiano aproveitou o momento para referir que o papel do designer também se encontra em diluição uma vez que se esbatem os limites da autoria, da produção e da reprodução. × II Encontros de Design de Lisboa 19 20 21 22 PAINEL I DOCUMENTAR O DESIGN 23 Viviana Narotzky Helena Barbosa Francisco Providência Viviana Narotzky Keeping it 24 Over the last few years, Open Design has been edging closer to the mainstream. Digital technologies and social networks have reached a point of maturity from which a new industrial culture is emerging. This networked information economy is having a huge impact on the creative ields, revolutionising the processes of creation, mediation, distribution and consumption. There is an emerging landscape of open practices and exchanges that has come out of approaches such as open code, the digital commons, co-creation, sharing, re-mixing and collaborative working. Open processes, distributed creativity and peer-to-peer networks underpin work being developed in areas such as fashion, product and graphic design, cultural institutions and craft. The Industrial Revolution set out to achieve standardization and rationalization through mass-production, generating designed objects that promised mechanized perfection in form and function. The resulting modernist ideals of lasting perfection, of a ‘closed’ or ‘inished’ object ready for consumption, of universal solutions for universal needs, or a standardized and controlled range of options, have been an enduring backbone of design practice throughout the 20C. PAINEL 1 Although they always tend to interact with digital technologies and make use of online social media, the practices involved range from extremely high-tech to fairly low-tech, and often combine the two. These approaches challenge the more traditional deinitions of the profession, the business models based on proprietary designs and mass-production, and they undermine the separation between creator and consumer, professional and amateur. By their very nature, they also necessitate a clear transmission of information, and documenting design practice and process is one of the backbones of Open Design. DOCUMENTAR O DESIGN Furthermore, grassroots online collaboration has become a powerful source of entrepreneurial capital. The US website kickstarter.com is the most famous crowdfunding site, but over the last ive years more than $5billion have been pledged through similar platforms. 25 26 Viviana Narotzky Presidente da ADI-FAD, Associação de Design Industrial de Barcelona We are now leaving behind the rigid premises inherited from modernity’s utopian take on industrial mechanized production, and embracing both the exhilarating lexibility afforded by new technologies and the postmodern understanding of leeting, ever changing identities, contexts and needs. Designers and consumers are repositioning their relationship to the objects and images around them, and to each other.× Helena Barbosa Uma perspectiva sobre e comentar o sign através do cartaz 28 Introdução Esta II edição dos Encontros de Design é dedicada ao tema – “Documentar o Design/ Comentar o Design”. Quando confrontada com o convite pensei qual seria a minha abordagem de modo a ser útil, essencialmente, para os alunos dos diferentes ciclos. “Documento s. m. qualquer objecto elaborado pelo homem com o im de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto; tudo o que serve para provar; testemunho; conirmação (Do lat. Documentu-, “id.”)” (Dicionário da Língua Portuguesa, 1999, p. 565). Se questionarmos alguém relacionado com a área da catalogação, ou que esteja presente em arquivos ou na área da conservação sobre as tipologias dos milhares de documentos que existem na atualidade em diferentes instituições ou organismos, a resposta maioritária será a existência de documentos em papel e documentos digitais. Se por um lado a identiicação destas tipologias está aparentemente correta, por outro retira, a valorização de outras tipologias de artefactos. Considerando, que alguns dos documentos são artefactos de design enquanto PAINEL 1 Parte I Que documentos?: identiicação de tipologias, sua localização e possíveis abordagens DOCUMENTAR O DESIGN Na realidade, fazer investigação independentemente da sua natureza, implica saber como realizá-la, mas, no entanto, tenho veriicado através da minha experiência, que os alunos de licenciatura, mestrado e doutoramento em design apresentam algumas e compreensíveis diiculdades na gestão entre, o que são documentos e as diferentes possibilidades de como se pode comentar o design. Perante este cenário, resolvi dividir a minha apresentação em duas partes: a primeira centrada na palavra documento e a segunda na palavra comentar. Ambas serão analisadas através da perspectiva do design, dando, por im, um exemplo especiico sobre o cartaz, como artefacto (documento), e respectivas metodologias que se declinaram em interpretações (comentar/comentários). 29 30 Helena Barbosa Uma perspectiva sobre documentar e comentar o design através do cartaz testemunhos que provam a realização de objetos criados pelo ser humano, signiica que existem mais documentos, que os documentos considerados tradicionais. Esta ideia aparentemente, ambígua e controversa serve como elemento provocador para a relexão, que inscrevo na minha apresentação. Observando aquilo que será a noção mais convencional de documento, nas diferentes tipologias que recaem dentro da na norma portuguesa de catalogação (NP-405), esta, apresenta a seguinte estrutura: .Documentos impressos .Materiais não livro .Documentos não publicados .Documentos electrónicos Que conteúdos estão implicados nestes quatro tópicos? Ao analisá-los em detalhe eles contemplam os seguintes documentos, que podem ser encontrados em diversos locais: . Documentos impressos (arquivos, bibliotecas)* .. Publicações (ISBN) —monograias —contribuições em monograias —teses e dissertações .. Publicações em série (ISSN) —revistas —artigos em publicações em série —jornais .Materiais não livro (arquivos, bibliotecas)* —entrevista —cartaz —folheto —desenho —gravura .Documentos não publicados (arquivos, bibliotecas)* —documento impresso —manuscrito .Documentos electrónicos (arquivos, bibliotecas, world wide web) —monograias —base de dados —partes de documentos Em alguns dos organismos de arquivos e bibliotecas existe um reportório documental subsidiado na world wide web. * PAINEL 1 É possível veriicar que a gestão destes documentos nos respectivos espaços físicos pode sofrer pequenas alterações em função dos sistemas de arquivo, como por exemplo, usando sistemas: alfabéticos, numéricos, alfanuméricos, cronológicos, temáticos ou cromáticos. Não pretendendo ser exaustiva a este nível, apenas quero reforçar que o entendimento da classiicação de documentos em alguns casos, continua a ser controversa, dada a multiplicidade de hipóteses que os documentos acarretam. Para adicionar entropia ao que foi exposto, é possível veriicar na listagem apresentada que a mesma se circunscreve à identiicação de alguns artefactos, veriicando-se a inexistência de muitos outros. Os documentos devem ser vistos como artefactos polissémicos, e considerando os vários sentidos que podem ir DOCUMENTAR O DESIGN Independentemente da sua natureza, a gestão desses documentos torna-se complexa sobretudo na maneira como os mesmos surgem citados de forma direta ou indireta no decorrer e no inal da tese ou da dissertação. Reiro-me concretamente, às citações de texto diretas, às referências ao texto indiretas, que foram objecto de interpretação, à existência de notas de rodapé, ou legendas, e ainda, à indicação correta das respectivas fontes documentais na vulgarmente designada bibliograia. O tratamento adequado dessa informação, quando se aplicam as regras de identiicação de documentos, tendo em atenção esta estrutura, garante uma parte da qualidade cientíica do trabalho de investigação. Estes são os documentos que normalmente, fazem parte do estado da arte e comprovam a pertinência da investigação por, simultaneamente, explicarem partes que serão desenvolvidas em fase posterior. E na fase posterior dever-se-á remeter para as partes apresentadas anteriormente. Consequentemente, estas diferentes conexões constituem uma rede equilibrada de conhecimentos que devem ser transversais no documento a redigir, contribuindo para a coesão do mesmo. 31 Helena Barbosa Uma perspectiva sobre documentar e comentar o design através do cartaz 32 para além da palavra, ou da imagem, implica que o entendimento de aquilo que é um documento, extravasa a sua deinição mais comum. Ou seja, toda a cultura material e imaterial, enquanto matérias que promovem a comunicação e o conhecimento, devem e estão a ser integrados em alguns dos arquivos, mas, não nos arquivos tradicionais. Os museus são exemplo disso, e existe um manancial de artefactos (produtos gráicos e industriais, ou seja, documentos) que não são contemplados pelos arquivos convencionais. Nesse sentido, os museus ou instituições que integrem qualquer tipologia de artefacto, recorrem a outras estratégias de catalogação, e de indexação referindo características especíicas dos objetos. A este nível existem um conjunto de instituições, como o MOMA, o Design Museum de Londres e outros, que procuram adicionar novas camadas de conhecimento aos seus objetos, mas essencialmente, usam os objetos como lente de aumento para traduzir ou revelar conhecimento extra em relação aos próprios artefactos. No entanto, a classiicação dos objetos é complexa e pouco pacíica. Na tentativa de criar uma regularização para a sua identiicação existe um projeto português que procurou criar uma taxonomia que fosse além, daquilo que reconhecemos como os documentos mais convencionais. O projeto CLIP - Compatibilização de Linguagens de Indexação em Português, cujo título refere a “Terminologia controlada para indexação de documentos na área do design”, editado em 1996, apresenta um conjunto de termos preferenciais e não preferenciais. Essencialmente, o CLIP procura identiicar as diferentes possibilidades anexas à criação ou produção de artefactos num determinado tipo de contexto. Podemos considerar, que este documento pode ser importante para a disciplina de design assim como, o seu entendimento do ponto de vista da sua operacionalidade, mas, no entanto, existe ou continua por fazer, uma adequação taxonómica em função das especiicidades daquilo que se entende por artefacto/documento de design. Então, é impossível dissociar outras dimensões aos documentos, e por isso, colocam-se outras questões: De que forma podemos adensar e contribuir para o conhecimento em design no uso de documentos? Que metodologias? Numa primeira instância, encontraram-se publicações (livros, não artigos) referentes à história do design, à história do design português, aos estudos teóricos sobre o cartaz e ainda aos trabalhos académicos sobre a história do cartaz português, que foram determinantes por apresentarem conceitos e relexões sobre as possibilidades de investigação. PAINEL 1 Embora, o doutoramento tenha sido realizado em 2011, para quem opera na área do design, existia previamente, a consciência de que se deve valorizar a ligação entre história e prática, independentemente, de se estar a realizar um trabalho mais orientado numa ou noutra vertente. Ou seja, a disciplina de design alcança outros desígnios pela convergência destas duas abordagens que nunca devem ser dissociadas, e foi com esse sentido que o doutoramento foi escrito. Mas antes de passar à parte dos comentários, ou da parte escrita, apresento toda a metodologia relacionada com o acesso e organização documental encontrada: DOCUMENTAR O DESIGN Para esta conferência decidi selecionar apenas um exemplo de como documentar e comentar o design. Para isso, apresento o doutoramento que realizei, como forma de dar resposta às questões levantadas. Esse trabalho de investigação relacionou-se com “Uma história do design do cartaz português do séc. XVII ao séc. XX”, cuja abordagem se identiica com uma frase de Clive Dilnot apresentada no decorrer do 9th International Conference of ICDHS - International Committee for Design History & Design Studies – “Tradition, transition, trajectories: major or minor inluences?”, que teve lugar na Universidade Aveiro, em Julho de 2014 “(...) doing work in design, whether as history or practice (and these two things should not be separated) is essential” (Dilnot, 2014, p.57). 33 34 Helena Barbosa Uma perspectiva sobre documentar e comentar o design através do cartaz Em termos metodológicos recorreu-se a fontes documentais bibliográicas e iconográicas. Em relação à primeira, optou-se por recorrer ao catálogo colectivo das bibliotecas portuguesas, acessível pela world wide web, que inclui não só o catálogo da Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), como também, de mais 180 instituições portuguesas públicas e privadas. Para as fontes documentais iconográicas recorreu-se aos dois maiores acervos de cartazes existentes em Portugal, cuja representatividade desse artefacto é signiicativa, mais concretamente a BNP e o arquivo de cartazes existente na Universidade de Aveiro (UA). Posteriormente, selecionaram-se os cartazes pela sua dimensão cultural e não pelo seu grau de excelência, sublinhando-se, assim, a dimensão histórica. Paralelamente, procuraram-se exemplares que fossem anunciadores de algumas particularidades relacionadas com a prática projetual, onde se valorizou a representação do texto, da imagem e a sua relação evolutiva. Para além disso, a selecção contemplou, a autoria, tentando identiicar o universo dos artistas e designers. Em simultâneo, identiicaram-se as tecnologias aplicadas, os impressores e outras características que permitiram a descrição física dos cartazes. Este processo englobou, ainda, a análise dos conteúdos, tendo sido deinidora a dimensão programática, que possibilitou não só o seu alinhamento por categorias e subcategorias, como também a identiicação de características particulares, anexas ao género, que se modiicaram consoante as épocas. Considerou-se também, o contexto histórico e sócio-cultural em que foram produzidos, desde temas relacionados com o design, acontecimentos históricos relevantes, até à divulgação de marcas portuguesas que se tornaram ícones nacionais. Esses critérios deram origem a várias fases da construção da amostra de cartazes, que foi composta da seguinte forma: -Dos 18.951 cartazes da BNP requisitaram-se 2.080, que após os critérios de selecção atrás descritos reduziu-se a amostra para 991 cartazes, e dos 30.000 cartazes do arquivo da UA selecionaram-se 1.626 cartazes que com a aplicação dos mesmos critérios reduziu-se a amostra para 971 cartazes. › Para a visualização dessa amostra seguiu-se a sua organização segundo três vertentes que contemplam: o tempo – relacionado com a tecnologia; as categorias que se inscrevem no programa (cartaz político, cultural e comercial) e por im a autoria. Só assim, seria possível somar uma camada hermenêutica sustentada por um modelo ontológico do processo de design, cobrindo a história e a prática do design. › O total de 1962 cartazes foram aixados em dimensões reduzidas numa parede com 2,5 metros de altura por 3 metros de comprimento tendo sido colocados cronologicamente e segundo a categoria cartaz político, cultural e comercial. Parte II Os comentários: o dilema das possibilidades Comentar v. tr. Fazer comentários; explicar por meio de comentários; criticar; analisar (Do lat. commentãre, por commentãri, “explicar”) (Dicionário da Língua Portuguesa, 1999, p. 388). Comentário s. m. Série de notas explicativas de um texto; informação nova que, num enunciado ou num texto, é transmitida acerca do chamado PAINEL 1 › Após a organização desta informação, foi possível criar os cenários para se realizarem as narrativas. Mas, que comentários? Como comentar? Estas questões levam-me para a segunda parte da minha apresentação. DOCUMENTAR O DESIGN › Paralelamente, criou-se uma base de dados composta por duas partes. Na parte superior importou deinir um conjunto de campos relacionados com o artefacto cartaz, do ponto de vista da sua identiicação, classiicação e descrição física e na parte inferior dessa base de dados criaram-se campos centrados na autoria, programa e tecnologia onde seriam integrados os discursos de dez especialistas convidados para selecionarem os cartazes da parede. 35 36 Helena Barbosa Uma perspectiva sobre documentar e comentar o design através do cartaz tópico ou tema; análise; observações ou explicações a propósito de um facto; crítica mordaz. Comentários pl. Memórias ou narrações históricas em que o autor tomou parte (Do lat. commentãriu, “livro de notas” (Dicionário da Língua Portuguesa, 1999, p. 388). Se olharmos para as deinições apresentadas, e se nos centrarmos na deinição da palavra comentários, aquele que faz investigação pode ser também referência no design a partir do momento em que dá o seu contributo para essa disciplina. Mas, que contributos? Atualmente, existe um trabalho disperso sobre o design em Portugal, produzido em contexto académico que necessita de ser sistematizado. Considerando que nesta nuvem de trabalhos de investigação, se selecionou o doutoramento sobre 400 anos de história de design de cartazes, interessou nesta parte, ilustrar os comentários ou as narrativas afectas a esse tema. Na realidade, o cartaz enquanto interface cultural abre um indeterminado número de possibilidades de abordagens para o seu estudo. Portanto, para a investigação em questão foi importante balizar e explicar como seria comentada a história do design dos cartazes portugueses. Tendo em conta que já foram previamente apresentadas a organização e as propostas de diversas metodologias que justiicam, e propõem um conjunto de intenções sobre a forma como as narrativas desta investigação ocorreram, importa, agora, nesta apresentação ilustrar a estrutura de conteúdos. Então, o capítulo IV, corresponde às narrativas e foi composto por quatro partes, cada uma delas corresponde a um dos séculos, num total de 375 páginas. Este capítulo apresenta uma organização de índice que propõe uma narrativa centrada na tecnologia, programa, autoria e ainda uma referência aos comentários e considerações dos especialistas, sobre os cartazes aixados na parede: “Capítulo IV Uma história do design do cartaz português do séc. XVII ao séc. XX Parte I O séc. XVII e o design do cartaz português: a herança da iluminura a) Materiais b) Projecto c) Sistemas reprográicos I.2 Cartaz e programa a) O cartaz e a legislação a.1) Depósito legal a.2) Aixação b) Os suportes e os cartazeiros c) Especiicações do género I.3 Cartaz e autoria a) Identiicação b) Linguagem tipográica e de imagem I.4 O cartaz sob o olhar dos especialistas Parte III O séc. XIX e o design do cartaz: o cânone da paginação e dos frontispícios I.1 Cartaz e tecnologia a) Materiais b) Projecto c) Sistemas reprográicos PAINEL 1 Parte II O séc. XVIII e o design do cartaz: da iluminura à paginação DOCUMENTAR O DESIGN I.1 Cartaz e tecnologia a) Materiais b) Projecto c) Sistemas reprográicos I.2 Cartaz e programa a) O cartaz e a legislação: a censura b) Os suportes e os cartazeiros c) Especiicações do género I.3 Cartaz e autoria a) Identiicação b) Linguagem tipográica e de imagem I.4 O cartaz sob o olhar dos especialistas 37 38 Helena Barbosa Uma perspectiva sobre documentar e comentar o design através do cartaz I.2 Cartaz e programa a) O cartaz e a legislação a.1) Depósito legal a.2) Censura a.3) Imposto a.4) Aixação b) Os suportes e os cartazeiros c) Especiicações do género I.3 Cartaz e autoria a) Identiicação b) Linguagem tipográica e de imagem I.4 O cartaz sob o olhar dos especialistas I.1 Cartaz e tecnologia a) Materiais b) Projecto c) Sistemas reprográicos I.2 Cartaz e programa a) O cartaz e a legislação a.1) Depósito legal a.2) Censura a.3) Imposto a.4) Aixação a.5) Tiragem b) Os suportes e os cartazeiros c) Especiicações do género I.3 Cartaz e autoria a) Identiicação b) Linguagem tipográica e de imagem I.4 O cartaz sob o olhar dos especialistas” (Barbosa, 2011). Conforme se pode veriicar, a estrutura proposta ao nível dos tópicos para a realização das narrativas é muito próxima entre os séculos, com a diferença de adensamento de conteúdos em função das especiicidades de cada um deles, permitindo dois tipos de leituras: a diacrónica e a sincrónica. Mas, a redação desta narrativa não se podia cingir apenas à documentação encontrada. Era imperativo criar ferramentas que pudessem contribuir para o conhecimento da história do design do cartaz. Foi necessário uma visão operativa de especialistas que se caracterizava por serem designers, cartazistas, professores e investigadores de diferentes instituições de ensino (Aveiro, Coimbra e Porto). A participação de dez especialistas na selecção de cartazes possibilitaram a redução da amostra de 1962 para 239. As convergências na selecção dos cartazes reforçou a importância da presença desses exemplares nesta nova amostra. Obteve-se assim um mapa empírico, mas simultaneamente conceptual, a partir do qual foi possível obter um foco mais claro sobre a narrativa analítica e histórica a desenvolver. PAINEL 1 › O proto-cartaz – que se caracteriza pelos materiais como a pedra, a madeira e a cerâmica. › O cartaz tradicional – composto apenas por papel, é a tipologia que a esfera pública não apresenta dúvidas na classiicação de cartaz. › O cartaz da atualidade – utiliza materiais e tecnologias mais recentes, como o movimento e a luz. › O cartaz do futuro, que irá, potencialmente, herdar os desenvolvimentos tecnológicos postos ao serviço da comunicação e tentará uma maior proximidade à esfera pública com base na promessa tecnológica, explorando a sua percepção e reação, reforçando características de movimento e interatividade hoje emergentes. Em relação aos materiais, sendo a selecção de papel um factor importante na realização de um cartaz veriicou-se a existência de papel artesanal para os três primeiros séculos, e o industrial para os dois últimos, sendo que, as dimensões sobretudo do papel industrial aumentaram, consideravelmente, no séc. XX. Ao nível do papel artesanal foi possível encontrar marcas de água DOCUMENTAR O DESIGN Para além dos especialistas foi necessário realizar entrevistas a oito designers portugueses, cartazistas, que cobrissem diferentes gerações de modo a perceber convergências ou divergências na prática do design. Os seus depoimentos resultaram, também, num instrumento indicado para conhecer a visão dos autores sobre a sua própria obra, contribuindo para um conhecimento mais amplo sobre a prática projectual. No entanto, falar de cartaz implica conhecer o seu território, e a esse nível o terceiro capítulo foi importante para entender a evolução do cartaz e o seu signiicado no tempo, onde se identiicaram quatro tipologias: 39 40 Helena Barbosa Uma perspectiva sobre documentar e comentar o design através do cartaz com conigurações variadas (texto; imagem; texto & imagem) onde se veriicou que maior parte do papel destinado para a impressão de cartazes era proveniente do estrangeiro. Por sua vez, na componente de projeto a paleta dos materiais vai diversiicando cada vez mais à medida que se avança em cada um dos séculos, assim como, para a impressão onde predomina para o séc. XVII e XVIII a xilotipia, xilogravura e tipograia, enquanto para o séc. XIX surge pontualmente a litograia, sendo que no séc. XX o offset é o sistema de impressão mais representado. Relativo às categorias de cartazes (político, cultural, comercial), a sua representatividade aumenta signiicativamente no decorrer do tempo, assim como, as sub-categorias1, revelando que as atividades políticas, culturais e comerciais e culturais apresentam contornos cada vez mais especíicos. O mesmo sucede com a censura dos cartazes, inicialmente controlada pelo Santo Ofício, depois pela Mesa de Desembargo do Paço, e de 1926 a 1974 com o regime salazarista. Se por um lado existiam constrangimentos na forma de comunicar os conteúdos através dos cartazes, por outro, na aixação pública encontraram-se especiicidades que determinavam a sua localização, assim como, existiram um conjunto de equipamentos que evoluíram no tempo como espaços dedicados para serem aixados os cartazes. No que concerne à identiicação da autoria, foi possível constatar que, apesar de dois casos isolados de cartazes do séc. XIX que foram identiicados, o século XX é rico na identiicação de muitos cartazes. Foi também interessante, veriicar a forma como esta autoria se identiicava e se apresentava à esfera pública, usando para 1 Cartaz político: aviso; campanha; comemorações; comícios; editais; manifestações e manifestos. Cartaz cultural: beneicência; cinema; circo; concursos; dança; desporto; encontros; exposições; espetáculos; feiras; festas; jogo; música; teatro; tauromaquia; turismo. Cartaz comercial: adubos; banca; bebidas; seguros; comunicações; ensino; produtos: alimentares- belezadiversos- higiene- limpeza; publicações; saúde; transportes; 2 Design; Arranjo gráico; Desenho; Design gráico; Graismo; Concepção artística; Desenho gráico; Concepção gráica; Cartazvestuário. Conclusão: Evidenciou-se, essencialmente, que a natureza de possibilidades afectas à identiicação e descrição de artefactos de design, devem extravasar sempre dentro do possível, os mimetismos convencionais, como são apresentados pela norma, sendo difícil PAINEL 1 Os depoimentos dos dez especialistas se por um lado vieram reforçar alguns dos conceitos apresentados, por outro, deram uma visão equilibrada sobre os motivos das suas escolhas, cujos discursos usam terminologia e justiicações muito próximas. Considerando que cada um dos especialistas teria que escolher no mínimo trinta e cinco cartazes, percebe-se que a convergência na selecção dos 239 cartazes, sublinha a importância desses mesmos cartazes na amostra. DOCUMENTAR O DESIGN isso diversas designações2. Para além das designações, apurou-se que a sua identiicação sofreu alterações no tempo, desde o uso de marcas, até a assinaturas mais caligráicas com um certo pendor artístico e por im o uso da convencional tipograia. Referente à representação de texto e imagem, apesar da quantidade signiicativa de variações é possível identiicar traços morfogenéticos que caracterizam cada um dos séculos. Sendo o cartaz do séc. XVII caracterizado por um texto em corandel justiicado, com inluências de Aldus Manutius (1449-1515), designado por Garamond (1495) (Fonseca, 2001, p. 12), e a presença de uma vinheta ou capitular. Formalmente, o cartaz do século XVIII é muito próximo do anterior, apresentando uma carga de conteúdos de texto muito pesada, sendo o desenho tipográico próximo do tipo tipo Ibarra criado em Espanha em 1780, com uma pequena variante tipográica e ainda a utilização de um ilete na organização formal, dividindo a mancha de texto em duas colunas. Para o séc. XIX, o cartaz apresenta maior diversidade de tipos, incutindo um dinamismo visual à informação de texto, tornando-se mais apelativo. No séc. XX, a imagem impera, ou seja, a tipograia e imagem fundem-se diluindo o texto na representação, propondo composições mais dinâmicas e onde a cor passou a desempenhar um papel preponderante na representação. 41 impor regularizações sobre o que é o design. Se por um lado existe um conjunto de documentos que se inscrevem na identiicação do que a norma propõe, por outro, ao terem sido adicionadas outras camadas de conhecimento aos documentos, que passou pela hermenêutica, veriicando-se que a informação sobre o design se tornou cada vez mais completa e complexa. Pela descrição apresentada, foi possível perceber que a percepção do que é documentar e comentar na área do design deve englobar a sensibilidade dos sentidos, a nível físico e emocional, que passam inevitavelmente pela memória e a experiência que funcionam como um adensamento e clariicação de ideias sobre o design, contribuindo-se assim para a valorização da disciplina, quer para os especialistas, quer para a esfera pública. 42 Queria terminar com estas frases a minha apresentação: Ganhei muitos amigos com a investigação. E o meu estudo é incompleto... Pois, existem mais documentos e mais comentários por fazer... × › Bibliografia BARBOSA, Maria Helena Ferreira Braga (2011) - Uma história do design do cartaz português do séc. XVII ao séc. XX. Orientação Vasco Branco, Co-orientação Anna Calvera. Aveiro: Universidade de Aveiro, Portugal, 2014. Dicionário da língua portuguesa (1999). 8ª ed. rev. act. Porto: Porto Editora, 1999. 1794 p. ISBN 972-0-05001-2. DILNOT, Clive (2014) – Is there an ethical role for the history of design? Redeeming through history the possibility of a humane world. In BARBOSA, Helena; CALVERA, Anna (2014) - 9th International Conference of ICDHS - International Committee for Design History & Design Studies – “Tradition, transition, trajectories: major or minor inluences?” Proceedings. Aveiro: Universidade Aveiro, 2014. ISBN 978-972-789-421-5. p. 57-80. FONSECA, Fernando Taveira da (2001) – A Imprensa da Universidade no período de 1537 a 1772. In FONSECA, Fernando Taveira [et. al.] – Imprensa da Universidade de Coimbra uma história dentro da história. Coimbra: Imprensa da Universidade, 2001. ISBN 972-8704-02-X. p. 7-52. RESENDE, Jorge Manuel; VENTURA, José; DUARTE, Eduardo (1996) – Terminologia controlada para indexação de documentos na área do design. Lisboa: Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 1996. 13 p. ISBN 972-565-218-5. 43 44 45 Francisco Providência O que ifica De 46 português? “Durante o futuro inteiro, seremos sempre alguém que esteve naquele passado. Não podemos ingir que não vivemos” José Peixoto1 Resumo: O que signiica Design português? A questão simples e complexa que está subjacente à diiculdade em encontrar meia dúzia de objetos sobre os quais construir o Museu do design português é, como desenhar o design português sem cair na tentação de Raul Lino. O projeto de Museograia do Design Português, inanciado pela FCT e atualmente em curso na unidade de investigação ID+, levanta três ordens distintas de questões: 1. qual é o estado da arte da museologia contemporânea? As três questões são complexas e exigem uma relexão interdisciplinar alargada. A museograia do design português pode ser perscrutada sob a pragmática da museograia contemporânea, na pesquisa semântica do signiicado da museograia do design e na sintaxe de um desenho português. Não querendo (nem podendo) responder deinitivamente sobre este assunto, proponho-me ensaiar aproximações ao terceiro tema, a partir da ideia de portugalidade expressa por Fernando Pessoa a propósito da revista Orpheu que cumpre este ano o seu centésimo aniversário. 1 José Luís Peixoto “Todo o vinho já bebido / All the wine already drunk” in UP, TAP Portugal nº 73 (mensal), Lisboa, novembro 2013, p.64. PAINEL 1 3. qual é a gramática do “Design português”? DOCUMENTAR O DESIGN 2. qual é o signiicado epistemológico da museograia do design? 47 Introdução: O Panteísmo na raiz da identidade portuguesa A par do simbolismo francês e do modernismo italiano, o panteísmo português era, para Pessoa, o contributo mais genuíno de Portugal ao mundo, cuja missão estava plasmada no programa do 2º número da Orpheu, que então dirigiu com Mário de Sá Carneiro. 48 Francisco Providência O que significa Design português? A nossa revista acolhe tudo quanto representa a arte avançada (...) descendemos de três movimentos mais antigos — o “simbolismo” francês, o panteísmo transcendentalista português, e a baralhada de coisas (...) de que o futurismo (...) e outros quejandos são expressões ocasionais. (Pessoa, Fernando, [1914] 1966: p.134) 2 Mas o que é o panteísmo português? Na doutrina Panteísta3, não se faz distinção entre Deus e o mundo, Deus é a natureza e, por isso, advoga o regresso do homem ao estado natural, condição para a sua plena realização. Este regresso à natureza manifesta-se na oposição à artiicialidade de um discurso de presunção sobre a realidade. É o conhecimento que vem de Caeiro4, o poeta mestre de todos os seus heterónimos, o sábio que era sábio porque se obrigava ao exercício de 2 Pessoa, Fernando. Páginas íntimas de auto-interpretação. Lisboa: Ática, 1966: p.134 In Ferreira, Luís. Artes gráicas em Portugal em el período de las vanguardias histór 3 Panteísmo, (Pan, do gr. pant, raiz de “todo” + teísmo do gr. théos “Deus” + ismo). 4 Alberto Caeiro da Silva (1889-1915) é o autor iccionado por Fernando Pessoa que o considerava mestre ingénuo dos restantes heterónimos, apesar de ter cumprido apenas uma instrução de nível primário. Caeiro, um rural ribatejano, despreza e repreende qualquer tipo de pensamento metafísico ou ilosóico, propondo a relação direta com o mundo. Para isso impõe-se um exercício de desaprender até chegar à relação mais inocente com o mundo, isto é, a relação mais direta e não mediada pelo conhecimento. Só assim julga poder encontrar a verdadeira felicidade, onde a complexidade e obscuridade darão lugar à pura sensação que nos faz ver de forma objetiva e natural a realidade. “Os meus rebanhos são as minhas ideias e as minhas ideias são todas sensações”. Procurando a mais pura simplicidade natural, vive para a sensação como única realidade. Pessoa limitou-lhe a vida apenas a 26 anos de idade, atribuindo o ano da sua morte ao ano seguinte à publicação do segundo número da revista Orpheu. desaprender, para poder ver sempre tudo como se fosse pela primeira vez. “O essencial é saber ver, / Saber ver sem estar a pensar (...) E nem pensar quando se vê / Nem ver quando se pensa. // Mas isso (...) exige (...) uma aprendizagem de desaprender.”5 Esta descida à compreensão fenomenológica da realidade, esta suspensão do conhecimento para conhecer verdadeiramente com os sentidos, será a diferença em que se disciplina Caeiro e que Pessoa invoca enquanto panteísmo português; é a condição ontológica de ser todo o Universo, que o faz sentir a carência pelo Universo todo que ainda não é. “O Mundo não se fez para pensarmos nele / (Pensar é estar doente dos olhos) (...) // Eu não tenho ilosoia: tenho sentidos... / Se falo na Natureza (...) é porque (...) a amo, e amo-a (...) porque quem ama nunca sabe o que ama / Nem sabe por que ama, (...) Amar é a eterna inocência, / E a única inocência é não pensar...”7 E por isso, Caeiro propõe o regresso à natureza como regresso ao ser. Mas o que é a Natureza? 5 Caeiro, Alberto (1914). O Guardador de rebanhos (poema 24) 6 Idem (poema 46) 7 Idem (poema 2) PAINEL 1 Caeiro advoga a ilosoia de não ter ilosoia nenhuma, como um progresso de regressar às sensações primitivas, de ver em vez de pensar e de ser no estar presente em vez de ser no estar re-presente, que só será possível pela função amorosa da inocência, como se só quem ama pudesse conhecer, negação do positivismo cientíico. DOCUMENTAR O DESIGN “Procuro despir-me do que aprendi, (...) Desembrulharme e ser eu, (...) um animal humano que a Natureza produziu (...) o Descobridor da Natureza (...) o Argonauta das sensações verdadeiras. / Trago ao Universo um novo Universo / Porque trago ao Universo ele-próprio.”6 49 Coisas sem unidade nenhuma. Deus é a Natureza. Mas Deus não é a representação de Deus. Só o homem pensa Deus, por isso caberá ao homem ser a consciência de Deus. Mas Deus transcende a sua representação humana, porque Deus é a Natureza e a natureza não pensa. Deus será então apenas o superego do homem, o seu destino simbólico, a sua realização pensada; se o ser se realiza na natureza e se a natureza não pensa, então o homem pensante é sobrenatural (ou artiicial) e o pensamento uma heresia contra a natureza. 50 Francisco Providência O que significa Design português? O panteísmo português, de que fala Pessoa, será também isto: a forma de estar no mundo em verdade, ou seja a poesia. “Vi que não há Natureza, (...) Que um conjunto real e verdadeiro / É uma doença das nossas ideias. // A Natureza é partes sem um todo”8 e “O único sentido íntimo das cousas / É elas não terem sentido íntimo nenhum (...) se Deus é as árvores e as lores (...) Para que lhe chamo eu Deus?”9 “As coisas não têm signiicação: têm existência. / As coisas são o único sentido oculto das coisas.”10 “Ah, os sentidos, os doentes que veem e ouvem!” “Pensar em Deus é desobedecer a Deus.”12 “Só a Natureza é divina, e ela não é divina...”13 Caeiro professa assim um misticismo de viver naturalmente, ainda que isso seja contrário à sua natureza artiicial; ao desenvolver a linguagem, o homem inventou a ciência enquanto dispositivo de conhecer, superando a sua origem natural. Mas a linguagem provoca o esquecimento do 8 Idem (poema 47) 9 Idem (poema 5) 10 Idem (poema 39) 11 Idem (poema 41) 12 Idem (poema 6) 13 Idem (poema 27) ser, alienando o homem do tempo e do espaço, desassossegando-o. Só a linguagem da poesia permitirá resgatar o ser (Heidegger), fazendo regressar o homem ao ser, à sua realização em liberdade, ou seja, à felicidade. “A minha alma é simples e não pensa. // O meu misticismo é não querer saber. / É viver e não pensar nisso. // Não sei o que é a Natureza: canto-a.”14 “(Louvado seja Deus que não sou bom, / E tenho o egoísmo natural das lores (...) preocupadas (...) só com o lorir (...) É essa a única missão no Mundo, / Essa - existir claramente.”15 “Se eu pensasse nessas coisas, / Deixaria de ver as árvores e as plantas (...) Para ver somente os meus pensamentos... / Entristecia e icava às escuras”16. “A recordação é uma traição à Natureza, / Porque a Natureza de ontem não é Natureza. / O que foi não é nada, e lembrar é não ver.”17 Este será, porventura, o contributo português para o mundo, ou o tal Quinto império pessoano. A poesia como um movimento de olhar para fora, sem querer ver outra coisa se não o fora que se manifesta. E este olhar de fora e para fora que 14 Idem (poema 30) 15 Idem (poema 32) 16 Idem (poema 34) 17 Idem (poema 43) 18 Idem (poema 26) PAINEL 1 “E há poetas que são artistas / E trabalham nos seus versos / Como um carpinteiro nas tábuas!... // Que triste não saber lorir! (...) Quando a única casa artística é a Terra toda / Que varia e está sempre bem e é sempre a mesma.”18 DOCUMENTAR O DESIGN A dimensão poética que propõe Caeiro não é a artística, não vem da tradição técnica dum artesanato das palavras, mas do ser que vive em realização no mundo, bio-gráica, vivendo e morrendo como coisa natural e assim deixando sobre a terra o depoimento da sua pegada. 51 resgata o Homem para o ser, este exercício zen de não pensar para ver, é toda uma estética que sacriica a ideia de beleza comum, à experiência própria de sentir. 52 Francisco Providência O que significa Design português? “Penso e escrevo como as lores têm cor.” “Às vezes (...) Pergunto a mim próprio (...) porque atribuo eu / Beleza às coisas (...) A beleza é o nome de qualquer coisa que (...) eu dou às coisas em troca do agrado que me dão. (...) Que difícil ser próprio e não ver senão o visível!”20 Não deixa de ser paradoxal que talvez o maior pensador português do séc. XX seja poeta e não ilósofo, ou será exatamente nisso que se distinguem as culturas germânica e portuguesa. Uns pensando o pensamento, outros exercitando-o na existência. A poética convoca o corpo (de memórias), um corpo autobiograicamente afetado que, por isso, iltra o conhecimento com a sua própria experiência, domesticando-o. “Os poetas místicos são ilósofos doentes, / E os ilósofos são homens doidos. (...) Por mim, escrevo a prosa dos meus versos / E ico contente, / Porque sei que compreendo a Natureza por fora; / E não a compreendo por dentro / Porque a Natureza não tem dentro; / Senão não era Natureza”.21 O mesmo panteísmo que recusa o conhecimento de querer perceber a natureza por dentro, também faz de todos os homens irmãos sob o mesmo sol. O sol astro quente e luminoso que atrai a terra e lhe dá vida e não outro, mitiicado e transcendente. “Bendito seja o mesmo sol de outras terras / Que faz meus irmãos todos os homens / Porque todos os homens, um momento no dia, (...) regressam (...) ao homem verdadeiro e primitivo / Que via o Sol nascer e ainda o 19 Idem (poema 41) 20 Idem (poema 26) 21 Idem (poema 28) 22 Idem (poema 38) não adorava. / Porque isso é natural - mais natural / Que adorar o ouro e Deus / E a arte e a moral...”22 Poderemos concluir que o tal panteísmo português invocado por Pessoa e cantado por Caeiro no anúncio da modernidade nacional, é ainal a manifestação de carência ante a impossibilidade do todo que terá originado a aventura da globalização marítima, deixando um rasto de híbridos seres e novas culturas, a que poderíamos designar por disposição para o outro. Reconhecem-se no panteísmo português de Pessoa as mesmas qualidades que defendemos perseguidas por Álvaro Siza na sua obra arquitectónica. 1. Pertinência do tema da identidade do desenho português O tema que escolhi vir aqui tratar é, se não impossível, pelo menos bastante difícil. O tema Design português ou O que signiica Design português, sendo difícil e necessário, suscita uma rajada de perguntas: — O que é? Como se diferencia? Quem o diz? Para que serve? PAINEL 1 Híbrido, lacónico e metafórica, o panteísmo português, orgânico e lacónico, parece signiicar um regresso à realidade da terra pelos sentidos, exalando a fraternidade universal, mas procurando na maior simplicidade a forma da natureza na qual se exprime como um poema biológico. DOCUMENTAR O DESIGN Esta dimensão nostálgica tem no verso a alegria do pragmatismo sensorial que se opõe a todo o intelectualismo. Ver por fora e por fora compreender a vida humana enquanto manifestação puramente biológica. Prescindir dos símbolos falsos para encontrar as sensações verdadeiras, sentindo-se natural e irmão de todos os seres. Mas se recusa as metáforas como igura de estilo, Caeiro exprime-se pela metáfora que é a própria sintaxe poética. A sua escrita é a sua vida e a sua vida é toda uma poesia verdadeira e natural. 53 54 Francisco Providência O que significa Design português? Se a questão da identidade portuguesa trouxe tanto esforço estéril à comunidade intelectual nacional, sobretudo a partir do séc. XIX, em consequência da imposição do ultimato britânica que a Inglaterra fez com o apoio dos EUA (1890), subjugando o domínio colonial de Portugal em África — incidente que deu origem à criação do hino nacional (A Portuguesa) como o conhecemos hoje, composto por Alfredo Keil—, ou ganhando contornos de nacionalismo fascista numa Europa em convulsões territoriais durante a primeira metade do séc. XX, ela é, parece ser, uma resposta natural à ameaça de soberania. Fala-se da identidade portuguesa no design, para esconder (ou esquecer) a submissão de Portugal ao desenho dos outros. Não temos dúvida que a airmação da identidade portuguesa constituirá uma dupla icção: a icção de se julgar português e de achar que a isso corresponde um ato de soberania. Será pois a ameaça da submissão económica à Europa, à China ou a Angola que poderá justiicar a atualidade do tema, ainda que esta seja uma questão que Portugal traz consigo mesmo, desde a origem da nacionalidade. A identidade é, também, a evidência do ser no domínio da linguagem. A língua enquanto domínio de conhecimento e consequentemente de liberdade, é domínio político de airmação patriótica. Embora Fernando Pessoa não atribua intenção política ao escrever que a sua língua é a sua pátria, mas a defesa compulsiva de uma sonoridade e sobretudo de uma sintaxe própria, como explica; na verdade a linguagem é o sinal mais íntimo na construção de uma comunidade. Ainda antes de nascermos, crescemos no ventre materno envolvidos pelo ressoar vocal da nossa mãe que nos ensina a língua materna. Da língua materna fazem parte os sabores do que comemos, os mitos que repetimos, os alvos do nosso riso e principalmente a icção do que desejamos ser. Confrontados com o que são, os portugueses têm manifestado o desejo de serem (hospitaleiros, nostálgicos, inventivos, desenrascados, poetas). Mas é quando se deslocam, quando emigram ou viajam que percebem a alteridade da sua diferença. A identidade será então a airmação de uma diferença que corresponde a uma semelhança iccionada e repetida. Essa icção identitária ganha realidade pela materialização das coisas. É disso que se trata no design manuelino, com a ediicação no novo estilo capaz de trazer a evidência da diferença e a reputação da sua origem, expressão internacional da marca Portugal no séc. XVI. Portugal nunca mais voltou a reproduzir essa marca com o mesmo poder que a moeda padrão do comércio intercontinental lhe conferia. A construção de um design português justiica-se também pela necessidade de defender uma origem, produto desta região demarcada (território cultural), sinal da sua diferença (distinguível entre pares) e princípio de coesão pela sua semelhança (comum entre os seus). e o estudo levado a cabo pelo Icep sobre reconhecimento do valor da marca Portugal no mercado de calçado, conirmando uma notoriedade negativa em cerca de 30 % (o mercado tinha mais 30% de intenção de compra se não soubesse que a origem era portuguesa). Estas duas proposições evidenciam, não só a urgência da re-construção de uma identidade portuguesa (ou dos produtos portugueses), como do seu reposicionamento internacional. A questão estará na origem de múltiplas campanhas levadas PAINEL 1 o relatório sobre a economia portuguesa realizado pela McCann Erickson para o 15º governo, concluindo a necessidade de inverter a política industrial de subcontratação para outra de valorização de marca (das exportações portuguesas, menos de 2% eram realizadas com marca própria, ao contrário da Espanha com cerca de 50% e da Itália com 80%); DOCUMENTAR O DESIGN É pela percepção da nossa diferença que domesticaremos o mercado em vez de nos submetermos ao reboque das suas tendências e exigências. A liderança antecipa-se, desenha o futuro porque desenha novas necessidades, conduz o mercado. Mas não bastará fazer o diferente. Duas famosas notícias trouxeram novos motivos de relexão nacional: 55 Francisco Providência O que significa Design português? 56 a cabo pelo Estado, recorrendo a jogadores e treinadores de futebol, artistas internacionalmente consagrados e à divulgação do património, natural, histórico, monumental do país ou da sua representação como reconhecido fornecedor tecnológico. Mas nas mais recentes mensagens televisivas, vende-se Portugal como aprazível lar de terceira idade, convidando os reformados europeus a aplicarem aqui as suas economias. No limite, urge re-construir o mito do desenho português, já não como o desejou o Estado Novo pela cabeça de António Ferro, ou pela mão patriótica de Raul Lino, mas observando a ideologia de uma modernidade vernacular como alternativa ao Modernismo Internacional (da carta de Atenas) e ao Modernismo Nacionalista (do Estado Novo). É a terceira via de uma modernidade vernacular, ou do regionalismo crítico, que a Escola do Porto re-inventou, conciliando a modernidade com a assunção da cultura local, materializada nos nossos mais notados desenhadores como Álvaro Siza ou Souto de Moura, internacionalmente reconhecidos pela distinção do Prémio Pritzker23 respetivamente em 1992 e 2011. 2. Um caso de estudo: a Escola do Porto “Porto Poetic”24, exposição comissariada por Roberto Cremascoli na Galeria Almeida Garrett no Porto recebeu, no seu último dia de exibição (13 Abril de 2014), a visita guiada e comentários do Arqº Eduardo Souto de Moura, enquanto um dos protagonistas da Escola do Porto. A monograia da revista Lotus sobre Álvaro 23 Prémio Pritzker, criado pela fundação Hyatt, é considerado o Nobel da Arquitetura. 24 A exposição trata genérica e documentalmente aquilo que se designa por Escola do Porto, anteriormente exibida na Triennale di Milano (entre 13 de setembro a 27 outubro de 2013). Centrada na obra dos arquitetos Álvaro Siza e Souto de Moura, a exposição apresenta obras dos arquitetos Fernando Távora, Adalberto Dias, Camilo Rebelo / Tiago Pimentel, Carlos Castanheira, Cristina Guedes e Francisco Vieira de Campos, Isabel Furtado e João Pedro Serôdio, João Mendes Ribeiro, José Carvalho Araújo e Nuno Brandão Costa. O critério de seleção destes autores não é totalmente evidente, atendendo às ausências de alguns históricos como José Manuel Soares, Pedro Ramalho, Manuel Correia Fernandes, João Álvaro Rocha ou de outros mais novos como António Portugal, José António Gonçalves e Paulo Providência. Siza25, Professione Poética (1986), foi o primeiro grande impulso para a internacionalização da sua obra e através dela, de toda a Escola do Porto, produzindo uma curiosidade mundial crescente na agenda da imprensa especializada. Mas do que se trata quando se refere a Escola do Porto? Cremascoli justiica a exposição Porto Poético essencialmente na obra dos arquitetos Álvaro Siza e Eduardo Souto de Moura. Mas o Eduardo Souto de Moura vem reforçar a importância do professor e arquiteto Fernando Távora e antes deste de Carlos Ramos. Um vasto conjunto de proissionais, alguns deles desempenhando atividade docente na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, dão continuidade ao modelo regenerativo da antiga Escola do Porto. “A Escola do Porto não é se não um ambiente, uma cultura e um legado inter-geracional de amizade, como diz Souto de Moura, uma cultura 25 Álvaro Siza, Professione poética, ed. Quaderni di Lotus – série editada por Pierluigi Nicolin, 1986. A capa apresenta fotograia de Giovanni Chiaramonte, com representação do edifício Bon jour tristesse, desenhado por Álvaro Siza e construído em Berlim. PAINEL 1 Um dos factores mais relevantes para a coesão e relexão colectiva da Escola do Porto, estará, sem dúvida, nos almoços, jantares e viagens desta comunidade. Aprende-se tanto nas aulas como nas viagens, confessa Souto Moura. A prática da viagem ligando professores com alunos, juntava o lado humano ao lado teórico e prático. (Souto, 2014). DOCUMENTAR O DESIGN Os professores mantinham atividade proissional em atelier próprio, onde recebiam a colaboração de alunos e ex-alunos que, por sua vez, entravam na relexão crítica colectiva de uma comunidade que se encontrava na Arquitetura, que gostava de Arquitetura. Como refere Souto Moura, embora houvesse grandes diferenças e, talvez por isso, as pessoas respeitavam-se. O Siza foi um rebelde em relação ao Távora (o Távora quando se fez a faculdade de Arquitetura tinha enfartes... entrava e dizia: _Isto é “fachadismo!” ... mas vai acabar bem porque ele é muito bom! 57 construída por três gerações de arquitetos (...) que conseguiu deinir uma identidade arquitectónica nacional, internacionalmente reconhecida” (Roberto Cremascoli). Embora Eduardo Souto Moura, na visita guiada de à exposição Porto poetic26 confesse, em tom jocoso, não saber o que é a Escola do Porto..., identiicará a sua fundação histórica. 58 Francisco Providência O que significa Design português? “Carlos Ramos que renovou o corpo docente e introduziu uma nova pedagogia e o Távora e o Viana de Lima que não vão lá fora buscar, mas produzem as próprias vanguardas. O Távora funda (em Portugal) um grupo que como o Team ten (Team X) contesta o movimento moderno. (...) O Távora acerta o passo com a História da Arquitetura, é protagonista da vanguarda e da contemporaneidade da arquitetura portuguesa”.27 Este é reconhecido como o primeiro passo para a airmação de uma modernidade localmente revista, como aconteceu na Finlândia com Alvar Aalto, que Siza admira desde a sua formação. Siza, um jovem tímido e atento que desejava ser escultor, acaba por colaborar como arquiteto no escritório do seu professor Fernando Távora, desenhando uma arquitetura síntese das referências que acompanhavam a sua formação, construindo uma linguagem de citações; por isso pós-moderno, como lhe chama Souto Mouro. As suas inluências do Japão, do Távora, do Aalto, da arquitetura vernacular portuguesa ou dos próprios lugares onde intervém, são transformadas pelo desenho, pelo seu corpo físico e mental através do desenho, adquirindo na mestiçagem, uma robusta unidade de linguagem; apesar de impossível, se a queremos traduzir sintaticamente como enunciado estilístico. “A arquitetura do Siza não tem grandes axiologias (...) é um work in progresso, desenvolvido com gente nova, com os seus colaboradores” (Souto Moura, 2014). 26 Vídeo “Porto Poetic - Visita Guiada“, in http://www.ctchannel.tv/video/146 (visualizado em 5 de novembro de 2014) 27 Idem Ao referir-se à primeira e mais emblemática obra de Siza, o restaurante da Boa Nova em Matosinhos, Souto de Moura admite tratarse de um objecto que reconhece o genius loci (à semelhança da capela que se encontrava já erigida no mesmo local) — “portanto ele percebeu perfeitamente o sítio”—, conclui Souto; ao convocar o imperativo do lugar, está Souto a veicular inconscientemente uma das lições mais insistentes e profícuas de Távora, sobre o espírito do lugar. É este respeito pelo espírito do lugar que leva Siza a tomar tantas e tão distintas formas arquitectónicas ao longo da sua obra, procurando perceber e adoptar a atmosfera, o ambiente, as técnicas e materiais, a cultura e as pessoas de cada sitio. Siza pós-moderno (apropriando-se dos pontos de vista de Wright + Loos + Aalto) desenha uma arquitetura da citação, complexidade e fractura (1984-1999). Souto neo-moderno (elegendo o pragmatismo de Mies como referência), propõe-se mais modular e racional, ainda que alegórico (1999-2014). Na verdade não há uma unidade estilística, mas uma relexão discutida inter-geracionalmente por professores e alunos, que se tornou internacional a partir da divulgação da obra de Siza. Siza que traz consigo Souto Moura. Mas do conjunto de preocupações deste vastíssimo grupo de arquitetos proissionais que passaram pela Escola do Porto (refundando-a e disseminando-a para Coimbra e Guimarães), PAINEL 1 Távora moderno (na linha de Le Corbusier) que substitui Carlos Ramos na direção da escola e conciliará o estilo internacional com o modernismo regional e vernacular (1969-1984). DOCUMENTAR O DESIGN Como síntese da exposição de Cremascoli comentada por Souto Moura, ica a ideia de que a Escola do Porto é o produto de um encadeado de relações construídas no tempo a partir da direção de Carlos Ramos (entre 1952 e 1969). Estes 45 anos de história sobre a morte de Carlos Ramos (1969-2014), foram marcados por três autores: 59 poderemos eleger a partir da sua obra, três traços comuns: 1. O genius loci (espírito do lugar); a adopção da inluência de pessoas e lugares, ou seja de lugares físicos e mentais, de que resultará uma arquitetura de miscigenagem. 2. O desenho poético (invocação do corpo no fazer); o recurso ao desenho como meio de relexão sobre a ex-sistência, do que resultam obras construídas como metáforas autobiográficas. 60 Francisco Providência O que significa Design português? 3. A cultura material (por observação da cultura vernacular); a eleição do primado da maior conservação de energia, que se relete na expressão de simplicidade morfológica e no respeito pelas técnicas e materiais artesanais. A Escola do Porto interessa-nos pela projeção internacional que conquistou, mas há em Portugal muitas outras Escolas do Porto, de cada vez que um grupo de proissionais, unidos pela amizade, pensa em conjunto e trabalha individualmente. A Protodesign, por exemplo, será uma espécie de Escola do Porto em Lisboa. A Escola das Caldas é também uma Escola do Porto, fundada pelos designers e docentes do Politécnico de Leiria em serviço nas Caldas. Curiosamente as suas obras e atitudes são bastante convergentes com as da Escola do Porto. Sobre elas também poderemos identiicar as contaminações morfológicas de outros autores, as metáforas autobiográicas que airmam e uma certa devoção pelos materiais e técnicas que lhes darão exequibilidade. 3. A Escola do Porto vista a partir de fora Recorrendo a outros contributos auxiliares para melhor compreender a identidade portuguesa e privilegiando a observação distanciada do exterior, encontrámos o contributo de Robin Fior. O designer Robin Fior que partiu de Londres em 1972 para viver em Portugal nos quarenta anos seguintes (1972-2012), trouxe à Lusitânia a marca da dimensão crítica, na convicção de que o Design não é neutro; está carregado de ideologia e, por isso, carece de discussão e esclarecimento social, político e estético. Sob um racionalismo impiedoso que na avaliação do mundo não abdica dos seus postulados, considerava o design ao serviço de uma sociedade em transformação e por isso construtivista ou neo-construtivista. Para Robin, o signiicado dos objetos gráicos estava desde logo plasmado na sua sintaxe e por isso, mais na gramática da organização formal da sua retórica visual do que no conteúdo verbal das suas intenções comunicadas. Mas o que parece mais estranho e clarividente no seu texto, é o modo como o termina, exaltando o regionalismo crítico da escola de arquitetura 28 Neologismo de Robin Fior, associando a marca Macintosh à sigla TM ou trade marc e, consequentemente, conotando este dispositivo tecnológico mais à submissão comercial global do que à investigação poética do desenho local. PAINEL 1 Num texto marcadamente escrito a partir de Lisboa (e ainda que Fior se tenha esquecido de nomes importantes como o de João Machado), revela-se com singular clareza na leitura da recente cultura do Design português, criticando os efeitos da “Mac(TM)anização”28, expressão de um país temporária e artiicialmente enriquecido pela integração na comunidade europeia que, motivado pelo protagonismo internacional, acabará refém da tecnologia (sem tempo para pensar) e da globalização (importando o desenho estrangeiro). DOCUMENTAR O DESIGN Na comemoração do 25º aniversário do 25 de Abril de 1974, o nº5 da Revista Camões (órgão do Instituto da cooperação e da língua portuguesa) convidou vinte autores a reletirem em revista sobre a cultura portuguesa nos últimos vinte e cinco anos, sob as mais diversas expressões. É neste contexto que é publicado em 1999 o seu artigo “Graismo Global e Local” - Design gráico em Portugal desde 1974. A relexão é construída numa simbiose entre o relato histórico do observador estrangeiro distanciado e a inscrição subjetiva de um ator implicado, resultando numa espécie de testemunho-testamento, de tomada de consciência sobre o Design em Portugal. 61 62 Francisco Providência O que significa Design português? do Porto, como resolução do problema da interação do io do argumento (semântica) com a estrutura do objeto gráico (sintaxe), a leitura do signiicado com e contra a forma onde está inserido, a leitura do local no global, que deixa como herança para o futuro do Design português. Este vernacular recuperado pelo regionalismo crítico do Porto, constitui ainal, na sua opinião, o acesso a uma genuína modernidade local, capaz de se impor à globalidade. A clarividência do texto mostra um conhecimento atento de Fior sobre a realidade do desenho português. De facto se há uma proposta de modernidade crítica local, que tenha contribuído para o movimento global das ideias, ela reside na produção da Escola do Porto, internacionalmente reconhecida. A propósito, Lembra Souto Moura que Teotónio Pereira em Lisboa, teria tido o mesmo protagonismo de Távora no Porto, não fosse a sua sistemática detenção policial, em consequência do seu empenho social e político contra a ditadura do Estado. 4. O Design português29. A questão simples e complexa que está subjacente à diiculdade em encontrar meia dúzia de objetos sobre os quais construir o museu do design português é, como desenhar o design português sem cair na tentação de Raul Lino. Para não o desenhar fechado em si mesmo, genuíno, coerente e consistente, Álvaro Siza, recorrendo à mesma mediação do desenho, desenhou-o aberto à contaminação cultural do outro, lacónico nos remates invocando o vazio da “pobreza” como luxo e convocando a poética através da metáfora, como primeira razão do fazer. Nestas três condições estará a diferença de um design português fundado na geograia do seu território e na história da sua nação: fundado na hibridização cultural (genotípica) de um lugar sobre-ocupado que, sendo um cadinho de culturas muito diferentes aqui concentradas por força das circunstâncias geográicas de 29 Texto redigido para a deinição do Projeto CIDES.PT / ID+ (18 novembro 2013). cul-de-sac territorial europeu (para quem na Europa seguisse o sol), também serviu de porto de partida e relação com outras culturas ultramarinas e distantes, tanto para oriente como para ocidente, origem de movimentos migratórios que se registam desde a origem da nacionalidade no séc. XII. No entanto, a falta de recursos próprios e consequente pobreza material, criou as condições de isolamento (fenotípico), pragmatismo e escassez ornamental que promovem na sua expressão artística, se não a indiferença, pelo menos a desconiança pelo estilo (com as raras exceções do Manuelino e do Estado Novo). Estes parecem ser os três pilares de um design português: a miscigenagem cultural, o laconismo formal e a metáfora como argumento. Ao contrário do design alemão que promete resistência e eiciência, ou do italiano que promete elegância, o português é o da poesia, quer dizer da criatividade na existência. PAINEL 1 Um “país de poetas” que Prado Coelho reconhece como sinal de diferenciação singular, a par do sarcasmo como igura de estilo nacional. O sarcasmo na assunção da culpa, autofágico e paradoxal, toma a impossibilidade como solução. Assim parece o Pavilhão de Portugal, expressão de dever identitário nacional, desenhado por Siza para a Expo 98, ligando as duas expressões antagónicas de um país culto e renascentista, neoclássico, com outro, pragmático e selvagem, que inventa a arquitetura sem meios, a partir do desejo. DOCUMENTAR O DESIGN Ao longo da história da cultura portuguesa há frequente registo de uma tendência poética que começa pela lírica medieval galaico-portuguesa, tendo a sua maior evidência na Renascença com Camões, consagrando-se na modernidade de Pessoa. A poesia e o fado parecem perfazer um quadro de idealismo mítico, de urgência na abertura ao possível que também se carateriza pela exclusão social, desprezando a realidade (e, por vezes, a vida). 63 Francisco Providência O que significa Design português? 64 Autores como João Machado ou Sebastião Rodrigues poderão ilustrar esta ideia que faz uso de poucos recursos, não abdicando do elevado efeito da metáfora que em cada projeto encontrará o estilo de novos argumentos. Fernando Brízio é talvez dos designers portugueses o mais radical quanto ao imperativo da poesia. Mas também o espelho de mesa de Álvaro Siza, o faqueiro Goa de Joaquim Ribeiro, ou a iligrana de Liliana Guerreiro possam reletir de modo exemplar a portugalidade do desenho. Neste grupo de autores encontramos um registo programático comum: A sintaxe paradoxal da pobreza como luxo; a miscigenagem cultural como identidade; e a poética como programa funcional. Porventura terão as três características fundação numa mesma e comum condição: a escassez de meios materiais ou seja, a pobreza. A miscigenagem nasce da necessidade de partir à procura de condições para a sobrevivência, ou da recepção de quem chega com o mesmo propósito; a poética que inventa novas realidades sobre a realidade, é condição de esperança e motivo de mudança; e a transformação da pobreza como narrativa de luxo, é a tomada de consciência sobre a própria existência. Clotilde Luce, jornalista do L’Express, observa Portugal a partir de França onde nasceu e dos EUA onde reside, reconhecendo que aqui, a falta de recursos inanceiros está na origem de um verdadeiro luxo cultural, como escreve no seu artigo “Em Portugal, a falta de luxo é um luxo”. Acreditando não se tratar de puro cinismo, Luce percebe nos mais ocultos detalhes da cultura material e imaterial portuguesa, uma inteligência estética que inventa o luxo a partir da pobreza, que faz da pobreza um estilo de luxo. O estilo, diz-nos Hanna Schygulla (em entrevista ao JN e a propósito de Fassbinder), faz-se, transformando aquilo que nos falta, numa nova força. Ora parece ser esta condição de pobreza o motor de uma novidade que o mundo talvez desconheça. O lacónico como máxima expressão de luxo. 5. Conclusão: O que caracteriza a identidade do design português? Identidade é o conjunto de caracteres próprios e exclusivos com os quais se podem diferenciar pessoas, objetos e culturas, quer pela diversidade em relação ao exterior, quer pela semelhança de coesão interna. A identidade é, por isso, uma forma de fronteira que separa um interior do seu exterior. Como nas mais primitivas formas de vida celular, é a membrana plasmática que protege a vida do organismo. A sua aplicação à história, à sociologia, à antropologia, ou à gestão, tem produzido diversas e contraditórias deinições. 30 Luce, Clotilde. Au Portugal, l’absence de luxe est un luxe, ed. L’Express, editado em 20.07.2013. in www.lexpress.fr/actualite/monde/europe/auportugal-l-absence-de-luxe-est-un-luxe_1267007.html?xtmc=portugal&xtcr =2#9Df7iYEfKa4Cs9HK.99 (consultado em 12 novembro de 2014). 31 LLANO, Pedro & CASTANHEIRA, Carlos (eds.). 1996. Álvaro Siza: Obras e projectos. Lisboa: Electa / CCB / CGAC PAINEL 1 Há na identidade uma dimensão representacional, projetando uma imagem de si (consciente), e outra genealógica, herdada, que nos é imposta (inconsciente). Hoje prevalecem as imagens “conscientemente” construídas e colocadas em circulação, nas redes sociais. “Num mundo em que todas as coisas são transformadas em imagens, diz-nos Leonídio (O. Leonídio, 2010) que Siza demonstrou ainda ser possível transformar imagens em coisas. DOCUMENTAR O DESIGN A identidade de um país é construída pelos seus cidadãos, como a obstinada airmação histórica de uma necessidade até que se imponha ao outro pela sua diferença. O país sem identidade ica à mercê da colonização alheia e com excesso de identidade (como refere José Gil a propósito de Portugal), esclerosa-se submisso ao seu passado. A identidade ao serviço da vida pressupõe uma atualização dinâmica, que se atualizará interativa, na comunicação com o mundo. A identidade de um país é construída pelos seus cidadãos, como a obstinada airmação histórica de uma necessidade até que se imponha ao outro pela sua diferença. O país sem identidade ica à mercê da colonização alheia e com excesso de identidade (como refere José Gil a propósito de Portugal), esclerosa-se submisso ao seu passado. A identidade ao serviço da vida pressupõe uma atualização dinâmica, que se atualizará interativa, na comunicação com o mundo. 65 Álvaro Siza, talvez o mais relevante agente da cultura portuguesa, responde assim à questão do projeto: “Projectar signiica procurar uma espécie de independência nos diferentes condicionamentos até encontrar um campo de liberdade que inclua as respostas a todos esses condicionamentos”. A criação de um campo de liberdade que é, simultaneamente, a independência a todos os condicionamentos31 e a resposta a todos os condicionamentos, só é possível pela construção gramatical da diferença. 66 Francisco Providência O que significa Design português? — Qual é a diferença estética em Siza? O que é a beleza em Álvaro Siza? É a contingência elevada ao absoluto (da forma). Para isso se apropria do reportório vernacular da arquitetura; copia-o descontextualiza-o como na escada do pavilhão Carlos Ramos, recuperando as escadas (que reduzem a largura em progressão descendente para não interromperem a via) do bairro dos Guindais no Porto. Mas também nos diz Siza que a Arquitetura é a angustia de decidir e que a sua obra é uma negociação permanente entre o classismo e a contemporaneidade. Esta espécie de classicismo que, parecendo moderno não é corbusiano, prefere as obras pequenas às grandes, os percursos às fachadas e a descontinuidade à coerência. Encontra Octavio Leonídio32 a propósito do edifício Iberê Camargo, em Porto Alegre, que Siza se assemelha a Loos. O Loos que Kenneth Frampton descobriu como “(...) o único arquiteto dos anos 1920 cujo trabalho manifestava um sentimento dadaísta (... de) concepção desconexa do espaço”33. Loos foi o projetista que recusou os ideais de clareza, 31 LLANO, Pedro & CASTANHEIRA, Carlos (eds.). 1996. Álvaro Siza: Obras e projectos. Lisboa: Electa / CCB / CGAC 32 Leonídio, Otavio. Álvaro Siza Vieira: outro vazio, In http://www.vitruvius. com.br/revistas/read/arquitextos/11.121/3439 (consultado em 10 novembro 2014) Este texto foi originalmente publicado na revista Log, Nova York, n. 16, Junho 2009. © Otavio Leonídio, 2009. Também publicado em Noz, n. 4, Rio de Janeiro, março 2010. 33 FRAMPTON, Kenneth. GA Document – special issue n. 3. Modern architecture 1920-1945. Tokyo: ADA Ed., 1987, p. 284. positividade e exterioridade característicos do movimento moderno. Com o mesmo carácter enigmático, diz-nos Leonídio que Siza “perscrutou o obscuro e o descontínuo (...) aspectos de uma poética que, jamais tomou a continuidade e a clareza como diretrizes essenciais de projeto”. Por isso, a emoção que os edifícios de Siza despertam, não é de absoluta satisfação, “mas de distúrbio, própria da irritante consciência do fracasso. (O efeito procurado) é o da coexistência paradoxal e enigmática”34. 33 Maurice Nadeau, apud KRAUSS, ibidem., p.113. 34 Providência, Francisco. O que é um design português? In Arquitectura e Vida, nº 85, Setembro de 2007, p.109. PAINEL 1 Não é de um dia para o outro que se inventa um código genético de raiz, mas pela seleção ponderada de cruzamentos e novos híbridos. Não se trata apenas de identiicar sinais de identidade, mas de os compreender em contexto. Isto é, “não basta estagiar na Pininfarina ou dominar os instrumentos de representação. É preciso perguntar melhor, antes de responder: saber perguntar é muito mais difícil do que saber responder, por mais que a cultura portuguesa nos empurre no sentido contrário, avisanos o cientista Manuel Sobrinho Simões”35. (Providência. 2007:109) × DOCUMENTAR O DESIGN Siza propõe assim uma sintaxe da fractura, com que enuncia a sua portugalidade através da arquitetura. Também para Mia Couto, o espaço da língua lusófona não é entendido como lugar de regra mas de transgressão para a construção da própria liberdade. A poesia e o design português deverão ser medidos mais pela capacidade de se transmutarem no novo e no futuro, do que em representações de uma suposta identidade formal, outrora ambicionada. Por isso o Português não se aplicará tanto à semântica quanto à sintaxe. O fazer Português (ser / estar portuguesmente), trata mais do modo como realizar do que dos signiicados do realizado. 67 68 69 70 PAINEL II COMENTAR O DESIGN 71 José Bártolo Maria Teresa Cruz José Bártolo História e 72 sobre história do português. 1. Arquivo A quinta edição da Meggs’ History of Graphic Design inclui um curto capítulo dedicado ao “Design in Spain, Portugal, and Latin America” no qual a produção de design gráico em Portugal é, de forma supericial, historiografada numa resumida narrativa que se inicia com Sebastião Rodrigues, passa por João Machado e Cayatte e encerra nos Alva Design Studio. Defendemos que a História é uma construção interpretativa que decorre de uma determinada historiograia. A historiograia sobre design em Portugal é escassa e dispersa. Até ao inal do século XX essa produção historiográica cingia-se ao trabalho de um pequeno número historiadores de arte, com destaque para José Augusto França, que não relectia conhecimento metodológico especíico da história do design. Não obstante a existência de um Museu de Design em Portugal (o MUDE – Museu do Design e da Moda), o trabalho de arquivo está por fazer. A Hemeroteca Municipal de Lisboa disponibiliza um arquivo fundamental para o estudo das publicações periódicas; mais recentemente a Universidade de Aveiro criou um Arquivo de Cartazes. Porém, terão sido as poucas exposições de design português organizadas nos últimos 15 anos, após a importante exposição Sebastião Rodrigues designer (Fundação Calouste Gulbenkian, 1995), a criar esse arquivo: exposições dedicadas a Daciano da Costa, António Garcia, José Espinho, J. Machado, José Brandão ou a mais recente exposição Almanaque – Um Século Design Português em Revista (Curadoria de José Bártolo, Quadra, Matosinhos, 2013) vêm proporcionado ao público o acesso aos objectos produzidos e um maior conhecimento do processo de trabalho. PAINEL I I COMENTAR O DESIGN Também defendemos que a historiograia só é possível se existir arquivo. O arquivo é base documental a partir da qual se desenvolve o trabalho de análise, contextualização e interpretação históricas. 73 Na Introdução ao volume The Archive incluído na colecção Documents of Contemporary Art, Charles Merewether declara que “one of the deining characteristics of the modern era has been the increasing signiicance given to the archive as the means which historical knowledge and forms of remembrance are accumulated, stored and recovered”. 74 José Bártolo DOCUMENTO, HISTÓRIA E ARQUIVO Apontamentos sobre história do design português Para além da sua importância política, o arquivo assume um fundamental importância espistemológica: ele é a base documental a partir da qual se deve produzir a narrativa historiográica. A qualidade do arquivo deinirá, em grande medida, a qualidade da historiograia é esta, por sua vez, estabelecerá, mesmo que de forma provisória, a História. In The Archaeology of Knowledge (FOUCAULT, 1969), the study of the archive was compared by Michel Foucault to the practice or learning about the past through its material remains. The “archaeologist of knowledge” aims to recover and reconstruct the archive, condição sine qua non da produção historiográica credível. Estudar historicamente o design gráico contemporâneo, i.e., colocando a produção em contexto e perspectivando-a criticamente, signiica estudar uma produção gráica recente o que pode ser feito, sem impedimento do recurso a outras metodologias, através de uma history from below, nomeadamente através do recurso à história oral. Defendemos que a produção historiográica sobre o design português deve ser feita na articulação entre a análise de documentos que constituem arquivos materiais e o gerar de conhecimento imaterial, nomeadamente, através da partilha de informação pelos designers que são protagonistas dessa história. Um número considerável de investigações académicas, maioritariamente teses de Mestrado e Doutoramento, têm recorrido à produção de entrevistas estruturadas para a partir dessa informação produzir conhecimento historiográico. Parte importante da produção gráica portuguesa do século XX encontra-se fora de um enquadramento institucional. A título de exemplo, o valioso espólio da ETP – Estúdio Técnico de Publicidade é parte da colecção particular do designer Carlos Rocha. Preocupante é também o facto de um algum espólio entregue a instituições encontrar-se perdido ou de acesso muito reservado, é o caso do arquivo de Sebastião Rodrigues doado à Fundação Calouste Gulbenkian na sequência da exposição retrospectiva que esta instituição acolheu. 2. Historiograia Como já referimos a 5th edition de Meggs’ History of Graphic Design (Meggs and Purvis, 2011) inclui um curto capítulo dedicado ao “Design in Spain, Portugal, and Latin America” no qual a produção de design gráico em Portugal é historiografada numa resumida narrativa que se inicia com Sebastião Rodrigues e encerra nos Alva Design Studio. O texto escrito por Alston W. Purvis sintetiza uma conjunto de referências que desde 2003 têm sido, gradualmente, partilhadas na internet em blogues como o Ressabiator (da autoria de Mário Moura) e o Reactor (da autoria de José Bártolo) e parcialmente republicadas em artigos de blogues e sites internacionais. 3. História Em processo encontra-se a investigação que resultará numa exposição de Livros portugueses, publicado desde 1900 até à actualidade, com a intenção de introduzir a história da ilustração e do design gráico em Portugal. Com curadoria PAINEL I I COMENTAR O DESIGN Um dos aspectos mais relevantes na investigação historiográica recente, sejam trabalhos de doutoramento, trabalho curatorial ou projectos editoriais como a Coleção D (dirigida pelo designer Jorge Silva para a Imprensa Nacional Casa da Moeda), reside no facto dela revelar a preocupação em estudar o design através de uma metodologia distinta da História da Arte. A valorização do contexto, o interesse em conhecer o processo e a relevância dada ao conhecimento imaterial e à história oral em particular são aspectos a sublinhar nessa atitude de impor uma especiicidade ao estudo do design. 75 José Bártolo DOCUMENTO, HISTÓRIA E ARQUIVO Apontamentos sobre história do design português 76 nossa e Jorge Silva a exposição está prevista inaugurar no inal de Maio na Galeria Quadra de Matosinhos. A exposição vai apresentar, para além de uma vasta selecção de obras organizadas cronologicamente e por autor, elementos de processos e entrevistas em suporte vídeo com diversos designers relevantes pela sua produção editorial (como José Brandão ou Armando Alves). A selecção de autores a destacar na exposição, considerou-se relevante por se acreditar que faltam referências na cultura projectual portuguesa. Qualquer historiograia tende a produzir os seus heróis e o lado heroico da história é interessante gerador de relações entre a produção presente e a produção do passado. Importantes ilustradores e designers, como Alberto Souza, Paulo-Guilherme, João Carlos, Bernardo Marques, Sebastião Rodrigues, Luís Fílipe Abreu ou Martins Barata são, por essa razão, destacados. Argumenta-se neste artigo que a História corresponde a estabilização, por deinição temporária, de uma determinada narrativa historiográica. Considera-se que a produção historiográica está dependente da existência de arquivo. O olhar crítico sobre os arquivos, a base documental que os constitui, a sua taxonomia e condições de acesso está por fazer em Portugal. Consideramos esse trabalho importante, tanto mais que a importância do arquivo tem sido reconhecida com importantes iniciativas como a criação do Arquivo do Cartaz da Universidade de Aveiro (http://arquivo.sinbad.ua.pt/cartazes/). Argumenta-se neste artigo que a História corresponde a estabilização, por deinição temporária, de uma determinada narrativa historiográica. Considera-se que a produção historiográica está dependente da existência de arquivo. O olhar crítico sobre os arquivos, a base documental que os constitui, a sua taxonomia e condições de acesso está por fazer em Portugal. Consideramos esse trabalho importante, tanto mais que a importância do arquivo tem sido reconhecida com importantes iniciativas como a criação do Arquivo do Cartaz da Universidade de Aveiro (http://arquivo.sinbad.ua.pt/cartazes/). Para além de estabelecermos a referida relação entre história, historiograia e arquivo, introduzimos uma futura exposição de design de livros portugueses onde esta tríade assume clara importância. A exposição apresenta um arquivo material, que resulta de uma selecção de cerca 300 livros, textos de análise e enquadramento e vídeos com entrevistas e depoimentos de diversos designers que protagonizaram a história que se quer contar. O nosso artigo valoriza, portanto, a history from below, a oral history, a história dos processos e argumenta sobre a especiicidade da história do design em relação à história da arte. PAINEL I I COMENTAR O DESIGN Se em grande medida podemos ainda falar da história do design em Portugal como uma inexistência ou, pelo menos, falar de uma “história mal vista” e “mal contada” também devemos admitir que pela via da investigação académica e da produção curatorial um conjunto de contributos recentes e recorrentes têm feito um esforço para historiografar o design português. × 77 78 79 Maria Teresa Cruz O Design como 80 mento 1 Cf. Brown, 2009, Introdução, pp. 1-12. Uma das primeiras ocorrências da expressão «design thinking» terá sido contudo no livro do arquiteto e urbanista: Peter Rowe, Design hinking, MIT Press, 1991. PAINEL I I COMENTAR O DESIGN A expansão do design tornou-se uma temática corrente dos debates contemporâneos e também um fenómeno comprovável na prática, à medida que o design se operacionaliza, não apenas nas áreas tradicionais da produção industrial, mas também nos serviços, na gestão, nos sistemas de comunicação e de informação, insinuando-se na produção de modelos em geral, no âmbito da vida e das organizações sociais. Esta expansão sugere uma identiicação do design com a forma geral da racionalidade contemporânea, que vai emergindo em designações de grande abrangência tais como «design thinking» e «social design». Uma tal identiicação vai bem para além da conirmação da dimensão conceptual e da dimensão social do design, que são reconhecidas em todas as suas especialidades, apresentando-o antes como uma espécie de saber fundamental da nossa era, como uma espécie de rationale, ou radical teórico-prático do entendimento do mundo e da ação sobre ele. Nesta perspetiva, conceber um design seria a base de toda a conceptualização e de toda a inventividade nomeadamente envolvidas na compreensão e solução de problemas, na tomada de decisão ou nos processos de gestão. Num livro recentemente publicado, Tim Brown, que terá cunhado o termo de “design thinking” (Brown 2008, 2009) esclarece: «Isto não é um livro de designers para designers; isto é um livro para leaders criativos que procurem inserir o pensamento do design em todos os níveis de uma organização, produto ou serviço»1. Tim Brown é o atual CEO da empresa global de design IDEO, fundada por David Kelley em 1978, com uma longa história de colaboração com a Apple e que, tal como David kelley e Steeve Jobs, é frequentemente apelidado de “um dos pensadores mais inluentes do nosso tempo”. Não se trata pois, nesta perspetiva, de uma mera extensão horizontal do campo do design, mas sim de uma «infusão» metodológica, de um aprofundamento vertical do seu lugar na ordem dos saberes, colocando-o ao nível dos fundamentos universais da ação racional e criativa, como o próprio cimento 81 que une razão e imaginação e as orienta para a ação. Na verdade, trata-se de reclamar que pensar, produzir e planear ações são, no seu fundamento, propriamente design, tendo chegado o momento da plena consciencialização e do pleno reconhecimento deste facto. 82 Maria Teresa Cruz O Design como pensamento Na verdade, es ta revindicação foi feita pela ilosoia há mais de dois milénios atrás, com um sucesso bastante duradouro, chamando a si um saber fundamental sobre a existência humana, e oferecendo às demais disciplinas os princípios do próprio pensamento verdadeiro e da ação racional. Em vez de se ocupar desta ou daquela disciplina, a ilosoia ter-se-á antes ocupado, nas palavras do ilósofo Peter Sloterdijk, do próprio “disciplinamento do humano”. A defesa de um valor matricial do design, coloca-o assim num lugar que está para além das disciplinas, ou na base das disciplinas, lembrando as árvores dos saberes, imagem obsessiva do iluminismo, e explicando inalmente por que razão pode hoje o design dirigir-se a qualquer âmbito da experiência, como uma nova forma de razão positiva ou «O Plano de trabalhos necessários para reorganizar a sociedade»2. Eis o que nunca terá deixado de estar presente desde a Bauhaus, passando pelo teoria do design dos anos 70, onde o foi ganhando cada vez mais vozes essa ideia do design como modelo de racionalidade, reunido à teoria do planeamento (social, urbano, etc.), e injetado hoje também no âmbito da gestão, dos sistemas de informação, da conceção das políticas públicas ou seja, pronto para refundar o mundo. A célebre imagem do «rizoma», de Deleuze e Guattari (1980)3, 2 «Le Plan de travaux nécessaires pour réorganizer la société» é um escrito de Auguste Comte (1822), que ele mesmo considera o seu “opúsculo fundamental”, e que antecede o Cours de Philosophie positive (1830-1842). É sua preocupação, não apenas que o conhecimento se encaminhe para uma ciência positiva, mas também que os saberes partilhem entre si um corpo de princípios comuns, pois só isso permitirá um desenvolvimento coerente da própria sociedade. 3 Mille Plateaux (Paris, Éditions de Minuit, 1980) é o segundo volume de Capitalisme et schizophrénie, uma das obras resultantes da colaboração entre o Gilles Deleuze e Félix Guattari. da árvore desenraizada e da crise dos fundamentos, parece reencontrar-se com novos paradigmas de enraizamento ou, pelo menos, com novos saberes transversais e compreensivos, tais como a teoria dos sistemas, o pensamento da complexidade, as ciências cognitivas ou a ciência da informação. O design é hoje um desses saberes que nos explicam como podemos pensar. O mesmo desaio parece ser hoje repetido pelo design: nova metafísica da vida quotidiana, novo transcendental, nova condição de possibilidade do pensamento como da prática. O design como ilosoia do nosso tempo, como ideação operativa, como única teoria capaz de industriar uma prática universal que responda à desorientação global do século. O design como ilosoia da era híper-industrial - tal será uma visão possível da ilosoia ou da ideologia do momento. É signiicativo que esta radicalização ou aprofundamento vertical do design não parta desta vez em direção a uma emulação da arte -, a qual tem sido, por sua vez, uma espécie de outro, de resto, ou de rival da própria ilosoia. A revindicação do “design como ilosoia” em vez da mais clássica (ou moderna) batalha do “design como arte” revela porventura um desvio estratégico, o desenho de um laço alargado no qual também ela, a arte, se deixará apanhar, caindo por im na alçada do design. O momento que Hegel descreveu como o do im da arte é, signiicativamente, o da sua aliança com PAINEL I I COMENTAR O DESIGN Na verdade, esta revindicação foi feita pela ilosoia há mais de dois milénios atrás, com um sucesso bastante duradouro, chamando a si um saber fundamental sobre a existência humana, e oferecendo às demais disciplinas os princípios do próprio pensamento verdadeiro e da ação racional. Em vez de se ocupar desta ou daquela disciplina, a ilosoia ter-se-á antes ocupado, nas palavras do ilósofo Peter Sloterdijk, do próprio “disciplinamento do humano“ ou do que chama também a “antropotécnica” (2009), voltada para o auto-conhecimento do ser humano, para a descoberta dos seus mais altos desígnios e para a elevação à altura das suas efetivas potencialidades e virtudes. 83 o conceito (Hegel 1975, 1: 11), momento que Arthur Danto traduziu, por sua vez, como o inevitável devir ilosoia da arte (Danto 1998). Se também a arte está a devir ilosoia, e se o design é a ilosoia do nosso tempo, poderemos vir então a assistir à revindicação inesperada da “arte como design”. Na arte contemporânea despontam com efeito sinais desse encaminhamento da arte para a ilosoia, i.e., para a ilosoia do design. 84 Maria Teresa Cruz O Design como pensamento Wilém Flusser terá portanto acertado quando escolheu intitular uma das suas mais importantes relexões sobre o design como «Filosoia do design» (Flusser 1999) a entender, também aqui, não apenas na sua vertente objectiva (como relexão ilosóica sobre o design) mas na sua vertente genitiva (apresentando o modo de pensamento que o design é em si mesmo). Que “o design é a base de toda a cultura», como diz Flusser e que o ser humano «é um design contra a natureza” (Flusser 1993, 19) são os pontos de partida da sua relexão, da qual se pode facilmente deduzir a centralidade que o design vem a ocupar à medida que a cultura e a história do humano se substituem quer à natureza quer à natureza humana. A realização da cultura como reino do artiicial obriga a pressupor não apenas um gesto criador, espontâneo e livre, mas também, e sobretudo, ideação, antecipação e projeto. À medida que o reino do artiicial emerge, colocando à vista a uma história ininterrupta de transformação do mundo, percebemos que tal não é senão o próprio resultado do modo humano de pensar: o de um pensamento que tende a realizar o que pensa. Com efeito, esta ideação ou antecipação de um desenho diicilmente se pode entender de modo criacionista, como uma visão originária de um Deus ou de uma inteligência suprema que tudo teria criado em potência e à partida, pois a criação e a criatura em produção na história parecem estar numa deriva demasiado arriscada, que vai desaiando todas as probabilidades e iguras que poderiam ter sido antecipadas. O que nela se expressa, como há muito suspeitava Nietzsche, não é apenas um desenho ou uma igura que nos estaria reservada em potência no início da história, e que encontraríamos um dia, aperfeiçoada, no im. A história, que não está na verdade dirigida por nenhuma teleologia ou teodiceia, é antes a expressão da potencialidade do pensamento humano e da sua “vontade de poder” (Nietzsche 1968) que é também o que alimenta a sua vontade de arte. Também Gilles Deleuze, em Qu’est-ce-que la Philosophie? (1991) se dirige a uma deinição da ilosoia como experiência e pensamento, airmando que a ilosoia é a “arte da criação de conceitos” (Deleuze 1999, 8), acautelando ainda a sua diferenciação relativamente a outras formas de experiência, nomeadamente aquela que é baseada nos “percepts”, por um lado, e aquela que é baseada nos “affects”, por oposição aos “concepts” enquanto criações ilosóicas. Um dos aspetos mais interessante da releitura que podemos fazer hoje desta obra, é o facto de Deleuze se debater nela com um rival da ilosoia, dir-se-ia menor e inusitado, mas ao qual Deleuze acabará por dar muita atenção na introdução desta obra, tornando-o aí objeto de uma contestação sistemática. Esse outro, que apresentando-se também como “criação de conceitos”, e que Deleuze acaba por confrontar PAINEL I I COMENTAR O DESIGN A ainidade essencial entre pensamento, vontade e arte parece encarnar hoje no design como dispositivo absoluto. Este dispositivo ter-se-á iniciado há muito, com a elevação ao pensamento abstrato, vocacionado para descer depois à terra e traçar nela um plano de mobilização e recomposição geral do existente. Tal é a crítica contemporânea do dispositivo, que se estende da crítica da técnica moderna à crítica da metafísica e que facilmente se poderá estender portanto a toda a ilosoia. Retomando uma imagem de Sloterdijk, desta vez do livro A mobilização Ininita (2004), uma das «rampas de lançamento» deste processo de mobilização foi sem dúvida a do nascimento da ilosoia como desejo de superação dos limites do humano, ou o que descreve também como o «atletismo da ilosoia». Nesse «atletismo» ou ginástica ilosóica (Gymnastic) pontiica como sabemos o movimento elevação ao pensamento abstracto e à produção do conceito. 85 86 Maria Teresa Cruz O Design como pensamento abertamente no seu texto, é o que ele próprio resume como “disciplinas da comunicação”, onde se destacam o marketing, o design e a arte da troca intersubjectiva de opiniões. No seu conjunto, estas são as “máquinas de constituição de universais” ou de “consensos”, do nosso tempo, diz Deleuze (1991, 11-12), das quais a ilosoia se obviamente se distingue, pelo facto de os conceitos que produz serem, ao contrário, entidades “singulares“. A ilosoia, diz Deleuze “não é uma simples arte de inventar, de formar ou de fabricar conceitos, pois os conceitos não são necessariamente formas, descobertas (trouvailles) ou produtos. A ilosoia, mais rigorosamente é a disciplina que consiste em criar conceitos. (…) Criar conceitos sempre novos é o objeto da ilosoia” (Deleuze 1991, 10). Na sua inocência, Tim Brown coloca por sua vez bem à vista o que Deleuze precisamente visara na sua crítica. Em Design Thinking (2009) fala do design como criação de uma “matriz mental” e de “mapas mentais”, como uma “habilidade” que é simultaneamente uma “habilidade de ser intuitivo” mas também uma habilidade para “reconhecer padrões”. Fala ainda, privilegiadamente, da relação entre “intuição, criação e construção” que faz precisamente do design a arte por excelência do projecto e do “poder da prototipagem”, a “metodologia” em geral da economia criativa, e do que chama um “pensamento em grande” (“Think Big”) uma capacidade para pensar o grande desenho, quer dizer, nas palavras de Tim Brown, “dos negócios, dos mercados, da sociedade”. Num discurso cheio de ironias defensivas e de mordacidade, como quem combate apesar de tudo um sério rival, Deleuze classiica semelhantes pretensões ao pensamento e ao conceito como «mauvaise plaisenterie» e tece um longo comentário altivo que merece ser percorrido: “de prova em prova, a ilosoia confrontar-seia com rivais cada vez mais insolentes, cada vez mais calamitosos, que o próprio Platão não teria imaginado nos seus momentos mais cómicos. Enim, o fundo da vergonha terá sido atingido quando a informática, o marketing, o design, a publicidade, todas as disciplinas da comunicação, se apropriaram da palavra conceito e dissera: é a nossa tarefa, somos nós os criativos, somos nós os conceptores! Somos nós os amigos do conceito, metemolos nos nossos computadores. Informação e criatividade, conceito e empreendedorismo: sobre isto há já uma abundante bibliograia. (…) Eis que o conceito se tornou o conjunto de apresentações de um produto (…) Os únicos acontecimentos são exposições, e os únicos conceitos, produtos que se quer vender” (Deleuze 1999, 15) Não deixando de reconhecer que esta condição afecta ainal a ilosoia, diz ainda: Depois desta argumentação é justo que se dê lugar a algum contraditório, que chega, não como um riso, mas como um esgar de sobranceria do próprio Tim Brown, relativamente aos campeões do pensamento: “ These people have no process!” é o que atira para título de um dos seus capítulos. O diálogo improvável e puramente imaginário entre ambos poderia continuar ainda, com PAINEL I I COMENTAR O DESIGN “O movimento geral que substituiu a Crítica pela promoção comercial não deixa de se dar ares de ilosoia. Os simulacros, a simulação de um pacote de massa tornou-se o verdadeiro conceito, e apresentador que expõe o produto, mercadoria ou obra de arte, o apresentador, tornou-se o ilósofo, a personagem conceptual ou o artista. Como poderia a ilosoia, uma velha senhora, alinhar com jovens quadros numa corrida aos universais da comunicação para determinar uma forma mercantil do conceito? É evidentemente doloroso veriicar que “Conceito” designa uma sociedade de design, de serviços e de engenharia informática. Mas quanto mais a ilosoia se confronta com rivais despudorados, mais ela se reencontra a si mesmo no seu próprio seio, mais ânimo sente para cumprir a tarefa, criar conceitos, que são aerólitos, e não mercadorias. E ri-se até às lágrimas. Assim, a questão da ilosoia é o ponto singular onde conceito e a criação remetem um para o outro”. (Deleuze 1999, 15) 87 88 Maria Teresa Cruz O Design como pensamento Deleuze a advertir as pretensas “personagens conceptuais” ou “pretensos artistas” que para criar conceitos é preciso “gosto ilosóico”. Mas deixemos as galhardias em nome do reconhecimento de um debate que não pode senão ser seriamente colocado: o debate acerca da relação entre design e ilosoia, que Deleuze terá levado ele mesmo suicientemente a sério ou não lhe teria dedicado estas páginas combativas do seu Qu’est-ce que la philosophie? Talvez a sua introdução contenha, também ela, uma advertência paralela à de Tim Burton, que não vai porém no sentido de uma mesma inclusão… Este não é um livro apenas para ilósofos, mas também para aqueles que julgam sê-lo, dentro ou fora da ilosoia. Em causa estará, como bem explica Deleuze, que a ilosoia se deve afastar de uma pretensa ciência dos universais, o que contudo terá comandado a ilosoia desde quase sempre. A sua crítica está pois dirigida, antes de mais, a uma certa forma da ilosoia, que ocupa uma grande parte da sua história – a ilosoia como pensamento dos universais, transformandose ela em máquina de produção de universais, isto é, em dispositivo. É pois uma forma da ilosoia que se trata antes de mais de combater e, em consequência, os seus emuladores, cuja emergência não lhe será portanto totalmente estranha. A mensagem para os seus correligionários é pois igualmente contundente: “O primeiro princípio da ilosoia é o de que os universais não explicam nada, devem antes ser explicados” (Deleuze 1999: 12). E contrapõe, como programa ilosóico antitético de uma ciência dos universais, o seguinte:“Conhecer-se a si mesmo – aprender a pensar - fazer como se nada fosse em si mesmo evidente – espantar-se, espantar-se que o ente seja, estas determinações da ilosoia, e muitas outras, constituem atitudes interessantes, embora cansativas a longo prazo” (Deleuze 1999: 16). Nestas palavras, ressoa o espanto valorizado pelo amor socrático do conhecimento, mas também o ethos moderno, a atitude crítica a que Michel Foucault (Cf. Foucault 1984) entregou também ela a crítica dos dispositivos, levada às últimas consequências nas suas análises históricas (dos modos de subjetivação, de disciplinamento, de vigilância, de normalização, do discurso, das instituições, dos saberes e dos regimes de visibilidade), e que Deleuze se propõe ultrapassar em direcção a uma aurora mais criativa da ilosoia: a da ilosoia como criação de conceitos. Em todo o caso, a crítica do dispositivo é sempre, antes de mais, uma crítica da razão, das leis históricas e contingentes postulações das suas postulações universais. É esta ratio que postula, formata, processa e calcula, que tem estado presente ao exame transcendental e ao tribunal da razão crítica, promovidos por Kant, Adorno, Foucault, Husserl, Sloterdijk e vários outros, profusamente integrados no chamado “pensamento crítico”, o qual anseia talvez devir “pensamento criativo”. Num último argumento de resistência, puramente imaginário, poderia ainda Tim Burton (que talvez tenha lido Deleuze) defender a sua “terceira via”, disparando ao mesmo tempo sobre a ilosoia uma PAINEL I I COMENTAR O DESIGN A ilosoia nada há-de ter que ver, portanto, com os “universais da comunicação” que não servem senão para fornecer e obedecer às ”regras de um domínio imaginário dos mercados e dos media”, e que não serão mais do que uma espécie de repetição das duas grandes ilusões da ilosoia, as “do idealismo subjetivo e do idealismo objetivo” (Deleuze 1999, 12). Tim Brown não deixaria de poder contestar ainda algo neste debate iccionado, já que também ele não faz senão socorrer-se do mesmo pharmakon do que o ilósofo Deleuze - o remédio para todos os males, senão uma das substâncias de que os tempos andarão ébrios, senão mesmo intoxicados: a criatividade. Criatividade do design que ele, Tim Brown, argumenta do seguinte modo: o design apresenta uma “terceira via” diz ele, relativamente ao puramente “inspiracional e emocional”, mas também relativamente ao “puramente analítico e racional”, pelo facto de o design por em cena o que descreve como um pensamento “intuitivo”, noção de que também Deleuze se socorre para falar da criação ilosóica de conceitos. Alguma proximidade retórica das respetivas trilogias é como se vê, intrigante e instigante. 89 90 Maria Teresa Cruz O Design como pensamento suspeita insidiosa: a possibilidade da “terceira via” do design, decorre do facto de o design “se expressar em media que não são simplesmente as palavras ou os símbolos”. A suspeita, dir-se-ia, é certeira, e compaginada com algumas críticas de grande autoridade a uma das maiores cegueiras da ilosoia – a cegueira relativamente ao seu próprio médium (mesmo após os seus capítulos analíticos). Pensamos em Jacques Derrida e no seu pensamento da desconstrução (Derrida 1972) onde o logocentrismo aparece como um efeito inevitável da linguagem e da escrita, enquanto media naturalizados da ilosoia, que lhe emprestam uma pretensa autoridade -, a de dizer a verdade, e até a verdade sobre a verdade. A pretensão e perigosidade do design não serão porém menores. A ele não lhe está entregue dizer a verdade em palavras, mas realizá-la, efectivá-la ao mesmo tempo que a simboliza. Sendo da ordem do gesto, tal como a escrita, o design não se inscreve contudo no mero plano da representação nem do imaginário, mas no do real. O gesto do design simboliza, intenciona, imagina, projecta e realiza no plano do mundoe por isso tb não é uma pura arte, embora contribua continuamente para a estilização ou a estetização da experiência. Um dos tropos dramáticos do pensamento contemporâneo, em que o design acabou de entrar, é o do enredo dos dispositivos e das formas de lhes responder, já que a crítica feita está. O diálogo entre a ilosoia e o design é porventura a forma contemporânea do diálogo entre a ilosoia e o dispositivo, como um outro de si mesma. É ao pensar e idealizar a experiência que a razão, como advertiu Hegel, se lança na dialética da sua realização, tornando real (i.e., realizado) o que idealizou, e às vezes em pesadelo o que por via dessa ideação sonhou. Tal é, para o bem e para o mal, a máquina do dispositivo; uma máquina de realização, funcionando a ideação. A sua investida contemporânea mais acabada parece ser o design pois que este pensa, conceptualiza, projecta e realiza.× › Bibliografia Derrida, Jacques (1972), Marges de la philosophie, Paris: Éditions de Minuit. Flusser , Wilém (1999) he Shape of hings: A Philosophy of Design, London: Reaktion Books. Foucault, Michel (1984),”Qu’est-ce que les Lumières?”, Magazine littéraire, no 207, mai pp. 35-39 (Dits Ecrits Tome IV texte n°351) Hegel , G.W.F. (1835), Aesthetics. Lectures on Fine Art, trad. T.M. Knox, 2 vols. Oxford: Clarendon Press, 1975. Nietzsche, Friedrich (1910), he Will to Power, New York: Vintage Books, 1968 Rowe, Peter (1991), Design hinking, Cambridge, Mass.: MIT Press. Simon, Herbert Alexander (1996), he sciences of the artiicial, Mass.: MIT Press. Sloterdijk, Peter (2013) You Must Change Your Life. Cambridge, UK: Polity Press. Sloterdijk, Peter (2004) A Mobilização Ininita. Para uma Crítica da Cinética Política, Relógio d’Água. 91 92 93 PAINEL I Viviana Narotzky Directora da Open Design/Shared Creativity International Conference que ocorre anualmente no contexto do Festival de Design de Barcelona. Escreve e é conferencista sobre temas do design e da cultura material contemporânea, faz curadoria em design contemporâneo e do século XX. Colabora como consultora de design em diversos projectos e trabalhou com diferentes instituições tais como: Fórum Econômico Mundial; Museu de Arte Contemporânea de Barcelona (MACBA); Victoria & Albert Museum de Londres; Televisão de Hong Kong. Entre outros cargos acadêmicos, Doutora Viviana Narotzky é Investigadora Senior do estudo dedicado ao Interior Doméstico desenvolvido pelo Centro AHRC do Royal College of Art, foi Directora do Mestrado em Design na Universidade de Kingston e Professora de História do Design no Mestrado desenvolvido em associação entre o Royal College of Art e o Victoria & Albert Museum. 94 Helena Barbosa Ensina disciplinas em Design – Licenciatura, Mestrado e Doutoramento na Univ. de Aveiro-UA. As suas áreas de interesse incidem na história do design português, cultura material portuguesa, cartazes e museus online. É responsável pelos conteúdos de um museu online de cartazes (30.000) com um projeto que está a ser desenvolvido na UA. É Vice-Presidente do ID+Instituto de Investigação em Design, Media e Cultura; membro do editorial board da revista The Poster, e membro da comissão cientíica da revista Eme: experimental illustration design. Francisco Providência Licenciado em Design de Comunicação pela Faculdade de Belas Artes da UP. Em 1997 aceita o convite para leccionar e integrar equipa que organizará a formação em Design na Universidade de Aveiro, onde dirige o Programa Doutoral em Design (UA+UP). Desenvolve atividade cientíica na unidade de investigação em design ID+ /FCT sob a temática da ontologia e “poética” do design. Do seu curriculum proissional destacam-se projetos como: Museu de Penaiel (2008), Projeto de comunicação urbana da doca de Matosinhos (2011), o Centro Interpretativo da Batalha (2012), Museu do Dinheiro do Banco de Portugal (2012), Centro de interpretação da Afurada (2012) e o Museu de Arte Nova de Aveiro (2012). PAINEL II José Bártolo Desenvolve actividade de docência, investigação e curadoria em design desde 1996. Doutor em Ciências da Comunicação (Universidade Nova de Lisboa, 2006), é Professor Coordenador e Presidente do Conselho Cientíico da ESAD – Escola Superior de Artes e Design e professor do Programa Doutoral em Arquitectura da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto. Membro da Direcção do CECL – Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens da Universidade Nova de Lisboa e Editor da revista Pli Arte&Design. Maria Teresa Cruz Doutorada em Comunicação e Cultura, é directora do Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens e professora no Departamento de Ciências da Comunicação da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Lecciona nas áreas de Teoria da Imagem, da Estética e Teoria dos Media e das Artes Contemporâneas. Os seus interesses de investigação estão actualmente centrados nas artes contemporâneas e no design, nas estéticas pós-media e na mediação do património. 95 96