Trigo versus
0
Intercambio
Questao
Erva-Mate:
Argentina-Brasil e a
Regional de
Misiones (1920-1945)
GRACIELA N. MALGESINI
GABRIELA M. COCONI^
Resumo
Abstract
Desde fins do seculo XIX, a maior parte do intercambio comercial entre Argentina e Brasil foi articulada em base de
reciprocidade "trigo versus erva-mate" relagao esta que se tornou cntica ao entrar
em produgao os ervais de cultivo argentine durante os anos 20. Este trabalho procura analisar as causas e consequencias
economicas dessa situa<pao internacional
conflitiva, assim como as rivalidades interregionais geradas dentro da Argentina (a
regiao ervateira misionera contra a trigal
Since the last years of the XIX^ Century the main part of the Argentine-Brazi-
yerba producer Misiones region against
the wheat producer Pampa Humeda re-
da Pampa Humeda). Este ultimo aspect© ^
focalizado a partir de uma reinterpretagao
da conceppao poh'tica do Estado argentine — militar e cmco-militar — da d^cada
de 1930.
gion - that this process provoked. The latter subject is focused through a new interpretation of Argentine State politics, concerning the military and civil-military governments during the thirties.
As autoras pertencem a Universidad Nacional de la Plata e sao bo/sistas do CONICET — Consejo Nacional de Investigaciones Cientfficas y Tecnicas.
Introdugao
(*)
Agradecemos os valiosos comentdrios que
realizaram A. Canitrot e J, Schvarzer a
uma versao preliminar deste trabalho.
ESTUDOS ECONOMICOS
lian commercial exchange rested on a
"wheat per yerba mate" formula; this harmonic relation turned critical when Argentina's yerbales began to produce during the twenties. Our paper analyses the
economic causes and consequences of this
conflictive international situation, as well
as Argentina's interregional struggles — the
Por volta de 1850, e por mais de oito
decadas, a erva-mate alcanpou destacado
papel no intercambio comercial entre Argentina e Brasil, pai's que neste seculo se
constituiu no principal comprador ameri-
16(2):275-301
MAIO-AGO. 1986
TRIGO VERSUS ER VA-MA TE
cano de trigo argentine^. Grande parte
do intercambio Argentina-Brasil foi articulada em base de reciprocidade1— trigo versus
erva-mate — sendo que esta relagao ver-seia ameapada, no longo prazo, pelo carater
extrativo da exploragao da erva-mate brasileira.
pansao do "ouro verde" ocorrida com base em relagoes de produgao fundamentalmente capitalistas^ — e do crescimento
dos mercados de bens, de capital e de
trabalho — derivado da ampliagao do "espago polarizado" na regiao pampeana —.
o nordeste integrou-se ao processo de formagao da economia nacional^.
A regiao nordeste da Argentina — com
condigoes ecologicas semelhantes as da zona produtora brasileira — retomou uma
tradigao jesuftica antiga e comegou a
plantar erva-mate em grande escala com
vistas ao abastecimento do mercado argentine, cujo centro de gravidade situava-se
no litoral. Em razao dos custos comparatives decrescentes no tempo, o im'cio da
produgao em larga escala no territorio de
Misiones e ao norte de Corrientes ameagava a continuidade da importagao de erva.
Alem disso, do ponto de vista de organizagao do espago, a cultura deste produto
teve um importante efeito multiplicador
que incentivou o surgimento de outras
atividades produtivas e de servigos, ocorrencia que, por sua vez, exerceu uma atragao muito forte tanto sobre imigrantes
europeus e de pafses vizinhos, como tambem sobre grandes capitalistas de outras
regioes (que viriam a investir macigamente
durante o ciclo de maxima rentabilidade)^. Em consequencia, a partir da ex-
A ameaga de cessagao do tradicional
intercambio entre os dois pai'ses desencadeou uma s^rie de conflitos no setor produtor de trigo, o principal bem de expor°
tagao da Argentina para o Brasil, assim
como na esfera de circulagao de mercadorias. Nesta ultima, em vista de interesses
comerciais, os setores exportadores/importadores de trigo, exportadores/importa-
(1)
(3)
O esclarecimento esti fundamentado na
presenga de um setor da forga de trabalho nao integrado ao livre comercio, retirada e recrutada compulsoriamente. Contudo, este fenomeno tinha pouca importancia quantitativa, pois somente ocorria
em relagao a produgao do tipo extrativo
e que se tornara insignificante dentro do
total.
(4)
O conceito de "espago polarizado" 5 desenvolvido por PERROUX, 1964, p.
140-155. Refere-se aos centres ou p6los
regionais com grande poder de atragao e
com dinamica prdpria, a partir de sua
interagao funcional com o restante do
sistema produtivo. Estes espagos estao em
uma posigao privilegiada por apresentarem economias de aglomeragao, com importantes atividades produtivas para o
processo de desenvolvimento. Veja-se
tambǤm ROFMAN, 1974.
(2)
276
Apesar das flutuagoes no com6rcio internacional, desde o inTcio do s^culo XX at6
v^speras da Segunda Guerra Mondial, o
com6rcio entre a Argentina e o Brasil
teve continuidade e aumentou, ainda que
lentamente. O intercambio total da Argentina com o Brasil representou 3,6% e
6% em 1913 e 1938, respectivamente, e
para este ultimo, no seu com^rcio com a
Argentina, nos mesmos anos representou
6% e 8,2%.
A comprovapao da presenga de empresas
importantes de outras regioes, as quais
controlavam a maior parte da superfi'cie
explorada, destrdi a difundida imagem do
predomfnio da exploragao agrfcola familiar em Misiones, territdrio cuja integragao deu-se de modo muito diferente daquele ocorrido em outras regioes, como
por exemplo a regiao do Chaco. Veja-se
BRODERSOHN & SLUTZKY 1978, p.
219.
Considerados os elementos acima expostos, este trabalho procura analisar (baseado nos custos comparativos e no livre
comercio) a crise da relagao de equih'brio
moderado entre dois espagos nacionais —
Brasil e Argentina — em decorrencia de
uma rapida mobilizagao (em parte livre,
em parte forgada pelo Estado) dos fatores
de produgao em diregao a uma regiao
periferica argentina (Misiones), que gerou
uma produgao substitutiva daquele que
era o produto fundamental do comercio
brasileiro com a Argentina: a erva-mate.
Estudos Econdmicos, Sao Peulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini &Coconi
dores de erva-mate e de moagem de trigo
e erva, juntamente com os plantadores de
erva e produtores de trigo, viriam a participar na luta para obter "solugoes justas"
do governo argentine dos anos trinta.
Aprofundando-se a analise para mveis
mais complexes do conflito, observa-se
primeiramente certa rivalidade inter-regional {misionera-pampeana}, porem nao caracterizada como decorrente de interesses
antagonicos, mas como consequencia de
elementos oriundos de uma relagao dinamica e complementar. Em segundo lugar,
encontram-se os "efeitos impulsores" da
regiao pampeana (que atenuaram a desigualdade economica entre esta regiao e o
territorio de Misiones, acelerando a acumulagao de capital local) frente a realizagao externa de um importante setor dessa regiao. Aqui se faz referencia a represalia que o trigo sofreu por
parte do Brasil quando cessaram as compras de erva-mate brasileira, ja que a economia de dois importantes estados brasileiros dependia da exporta(pao da erva-mate para a Argentina, um dos unices mercados mundiais para este produto.
Al^m dos aspectos acima, no presente
estudo procurou-se analisar as poh'ticas
governamentais em relapao ao espectro de
demandas contraditorias, tratando-se todavia de evitar a interpretapao mais difundida sobre o Estado no pen'odo posterior a
1930 ("governo do gado", a "factoria
pampeana" etc.), no qual estao imph'citos
dois reducionismos anah'ticos: o de "classe" que, por sua vez, incluiria outro: o
"regional"^'. Por este meio todas as medidas oficiais encontrariam explicapao na
identificagao do governo como brago polftico dos interesses pampeanos: se assim
fosse, nao seriam compreensiveis, por
exemplo, certas apoes desvinculadas dessa
funpao como as executadas em benefi'cio
dos produtores de erva-mate. Desde outro
ponto de vista, esta versao (a da localiza(5)
O termo "reduccionismo de clase" que se
emprega 6 o de E. LACLAU, retomado
por LECHNER, 1981, p. 321-22.
pao geografica fixa dos grandes capitals a
serem defendidos pelo Estado, concentrados na regiao da pampa humeda) 6 fragmentaria e estatica, pois mascara o comprovado fenomeno de mobilidade de um
segment© de capital dentro do espapo nacional (assim como sua "plasticidade") ao
mesmo tempo em que nada contribui para
a avaliapao do alcance e dimensao reais do
comportamento do Estado. Em smtese,
caso se sustentasse a primeira linha de
interpretapao, a poh'tica em funpao do
complex© conglomerado de interesses em
conflito teria uma explicapao simplista e
rapida.
Ainda que o exame do discurso ideologic© e das apoes oficiais especfficas revele
uma inclinapao bastante definida do governo a favor dos interesses trigueiros e
dos exportadores pampeanos, pode-se notar que ha uma preocupapao paralela em
nao se desgastar a legitimidade poh'tica, resultado inevitavel caso os governantes
apoiassem um unico setor de produpao
em detriment© de outro (ambos capitalistas). A partir disso pode-se explicar a
adopao de medidas claramente "de equih'brio", destinadas em parte a proteger
e reorientar o process© de acumulapao
de capital em Misiones e tambem a conseguir fontes de apoio polftico entre os
setores economicos mais poderosos da
regiao.
Acredita-se que este trabalho — a partir
de uma problematica cronologica e espacialmente limitada — explora uma tematica ampla e polemica. Tal afirmapao diz
respeito, por exemplo, a relapao entre as
regioes nao centrais ou perifericas e sua
integracao a economia nacional, tema hoje
em debate em pelo menos dois nfveis vinculados entre si: a formulacao teorico-poh'tica dos "submodelos regionais"(6) e a
(6)
Refere-se a polemica sobre a origem das
desigualdades regionais tao comuns na
America Latina a partir de suas conexoes
com os submodelos hegemonicos histdricos possi'veis (prim^rio exportador e de
industrializapao substitutiva de importapoes) em funpao da elaborapao de polfti-
Estudos Econdmicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
277
TRIGO VERSUS ER VA-MA TE
analise historico-empmca. Neste segundo
nfvel o tema advem das consequencias da
aplicapao do modelo agroexportador sobre
as economias do "interior" da Argentina
ate 1930. Em contraposigao as teses baseadas no revisionismo histbrico (que priorizam os efeitos destrutivos ou "retardadores" — como consequencia de uma
alianpa estatal hegemonica entre os interesses rurais da regiao pampeana e os comerciais e industriais britanicos)(7)f encontram-se outras linhas de interpretapao
baseadas em estudos de casos regionais e
que consideram os efeitos diversificados
na estrutura produtiva nacional gerados
pela economia primaria exportadora(8).
Este trabalho encaixa-se neste ultimo enfoque, particularmente em torno da ideia
de uma "questao regional" surgida
"ao redor de contradicoes existentes
dentro do Estado, assim como de conf/itos inerentes aos processos de unificagao econdmica e poh'tica",
conforme J. Balln (1978, p. 53). Este
autor, como corolSrio a sua analise de
dois casos (Mendonpa e TucumSn) cuja
integragao a divisao inter-regional do trabalho ocorreu com sucesso, questiona sobre as formas deste processo em outras
provmcias menos favorecidas e sugere que
a probabilidade de exito nestas ultimas
poderia ser dificuitada pela
"congruencia entre os interesses provincial's e as necessidades percebidas pe/o
governo nacional.
e pela oposigao
oferecida por outros grupos po!itiearn en te importantes" (BALAN, 1978, p.
84-85).
0 caso de Misiones, no pen'odo estudado, viria a confirmar, em grande medida,
cas de desenvolvimento. Para a confronta9ao destas teorias veja-se FERRUCCI,
1978.
(7)
Dentro da teoria de revisionismo, veja-se
LASCANO, 1963 e ROSA, 1967.
(8)
Como exemplos: GELLER, 1975; ZAPIOLA, 1975; BRODERSOHN & SLUTZKY. 1978 e BALAN, 1978.
278
a hip6tese acima. Contudo, pelo proprio
processo histdrico do contllto, este caso
insere-se com maior propriedade no conjunto de transformapoes aceleradas a partir dos anos 30, do que nas caracten'sticas
essenciais do pen'odo 1880-1930, tanto a
m'vel da economia agroexportadora (conflitos de intercambio agravados pelos efeitos gerais da depressao e da guerra mundial, dentre outros), como do Estado argentine. Sobre este segundo aspecto, e
presumfvel que as necessidades dos governos nacionais achem-se orientadas para a
concretizapao de uma alianpa poh'tica indispenscivel, pela qual seria logico supor
que a capacidade de congruencia entre
interesses tenha se ampliado o bastante
para atender a maiores demandas regionais/agroindustriais, na medida em que estas viessem a ser uteis para reforpar suas
bases de lealdade e apoio poh'tico.
Por outro lado, a intervencao econdmica direta na maioria das economias regionais, caracten'stica do perfodo em que esta enquadrado este estudo, poderia ser
reinterpretada nao somente como uma
resposta aos requisites de uma atividade
produtiva que foi afetada, mas tambem
como uma forma coercitiva para a consecupao de dois objetivos polfticos compatfveis: a centralizacao e a reunificapao do poder do estado, mediante a transferencia de
uma certa margem de sua grande capacidade de apao e regulapao aos grupos capital istas hegemdnicos da regiao. Deste modo, pretende-se fornecer elementos para
enriquecer o debate sobre as caracten'sticas e a dinamica poh'tica e econdmica dos
governos entre 1930 e a Segunda Guerra
Mundial.
1.
Fatores do Surgimento e Crise
da Produpao Argentina de ErvaMate
Como mencionado, o trigo e a farinha
argentinos, de um lado, e a erva-mate cancheada e beneficiada brasileira, de outro,
compunham os maiores itens de intercambio entre os dois pafses. Ate a decada de
1920, o Hex significou mais de 70% do
Estudos Econdmicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini &Coconi
TABELA1
IMPORTAQAO DE ERVA-MATE BRASILEIRA E EXPORTAQAO DE TRIGO
E FARINHA ARGENTINOS PARA O BRASIL
(1000 ton.)
Anos
Erva-mate
Trigo
Farinha
1920
1922
1924
1926
1928
1930
1932
1934
1936
1938
1940
1942
1944
44,3
38,4
36,7
46,9
51,4
66,8
56,1
33,9
35,0
33,5
27,5
24,0
19,6
191,1
379,0
419,8
364,0
665,1
576,2
281,3
802,0
874,1
1.003,2
863,0
984,0
1.170,5
41,9
51,5
84,7
66,7
99,3
52,0
3,1
67,0
29,6
21,9
7,7
8,7
55„6
■?
Fonte: Anuarios de Comercio Exterior de La Republica Argentina.
valor das exportapoes brasileiras para a
Argentina, enquanto que o trigo e seus
subprodutos representavam a quase totalidade da exportacao argentina para o Brasil.
Dm elemento importante para compreender as circunstancias que condicionavam
esta relapao comercial e, sem duvida, a
disponibilidade e a magnitude dos mercados. No caso da erva-mate os mercados
eram bastante restritos: Argentina, Chile e
Uruguai, cabendo ao primeiro pai's cerca
de 65% do consumo mondial atl 1930. A
importapao argentina alcanpava 70% do
total de erva-mate exportada pelo Brasil, da
qual dependiam as economias dos estados
do Parana e Santa Catarina e, em menor escala, as do Rio Grande do Sul e Mato Grosso. Esta particular situacao permitira'entender as razoes que levaram o governo brasileiro, pressionado pela regiao monocultora
sulista, a agir em defesa dos interesses
dos ervateiros, frente a Argentina.
No caso do trigo (produto de exportapao argentina), em 6pocas de normalidade
comercial, os mercados eram numerosos,
embora as importapoes do Brasil alcancassem um percentual significative (15% na
decada de 1920). Alem disso, para este
pafs o trigo era um produto indispens^vel
e necessariamente importado, porquanto
seu consumo era de cerca de 1 milhao de
ton./ano e sua produpao nao chegava a 50
mil ton./ano. Mesmo que pudesse adquirir
de outros pafses, algumas razoeB determinavam a importapao do trigo argentine:
custos de transporte e comercializapao,
bem como uma incipiente industria moageira, em boa parte uma ramificapao da
Argentina^). Desta forma pode-se explicar a evolupao das importapoes brasileiras de farinha: cresceram em importancia durante as duas primeiras decadas
deste seculo para posteriormente sofrerem uma diminuipao, enquanto que a
importapao de materia-prima se mantinha estavel ou aumentava. Este com(9)
Em especial derivada das empresas Bunge
y Born S.A. A Bunge expandiu seus investimentos na America do Sul, Europa e
Asia a partir de 1920, e posteriormente
nos Estados Unidos. A tendencia deste
grupo era orientar a aplicapao de seus
capitais excedentes em atividades diversificadas, e assim seus interesses no Brasil
— aumentados nas decadas de 30 e 40 —
foram dirigidos para a instalapao de moinhos de farinha e graos de soja, fabricas
de artigos de pintura e de vestu^rio. Ver
MORGAN, 1982, p. 86-87 e 97-98.
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2)275-301, maio/ago. 1986
279
TRIGO VERSUS ER VA-MA TE
portamento era similar aquele observado na Argentina para os moinhos de
texto setorial e regional, devido ao protecionismo dos governos argentinos.
erva-mate
brasileira
(alguns constitufdos por capitais da mesma origem): tendencia a diminuipao da entrada do pro-
A Etapa da Livre Iniciativa
duto beneficiado e aumento relative das
importapoes de Hex cancheado (vide tabela 1).
Correlatamente ao aparecimento de industrias moageiras no Brasil e na Argentina,
responsaveis por uma modificapao no intercambio comercial, nota-se a partir de
1920, um r^pido crescimento da produpao
ervateira na regiao nordeste da Argentina,
que poderia, pelas suas caracten'sticas,
substituir a importapao dos estados de
Santa Catarina e Parang. Nos anos compreendidos entre 1920-25 a colheita passou de 817 ton. para 10.415 ton. continuando em ascensao. Esta situapao traria
reflexos na participapao do mercado argentine da erva-mate dos dois pafses (vide
tabela 2).
A fase de formapao do ciclo da ervamate iniciada em 1920 foi protagonizada,
inicialmente, por um grupo de grandes
empresarios que decidiram aplicar parte
de seus capitais na formapao de uma culture desaparecida desde a safda dos jesuftas da regiao. Posteriormente, em especial
durante a dlcada de 20, outro grupo de
produtores se uniu ao anterior, formado
por pequenos proprietaries e colonos, em
sua maioria imigrantes europeus, cuja contribukpao transformou a regiao de Misiones numa 5rea de quase monocultura. Esse process© aconteceu sem intervengao direta do Estado ate 1925, ou seja, foi
sustentado pela iniciativa privada. Dada
esta situagao, convem definir os fatores ou
condicionantes que criaram expectativas
favoraveis em relatpao h nascente agroindustria ervateira.
TABELA 2
PORCENTAGEM DE MATE
CANCHEADO NACIONAL
E IMPORTADA NO CONSUMO
ARGENTINO
Anos
Nacional
Importa^la
1920
1925
1930
1935
1940
1945
1/2
12,6
31,4
67,9
71,4
83,4
98,8
87,4
68,6
32,1
28,6
16,6
Fontes: Boletin de la Camara de Comercio
Argentino-Brasilena, Ano XV, n9 169,
janeiro de 1930; 17.
PASTORE, 1959, p. 7.
Comisfon Regladora de la Yerba Mate,
1948, p. 19.
A seguir serao analisadas as razdes que
teriam levado a mobilizapao dos fatores
produtivos para Misiones. Na segunda etapa analisar-se-5 o conflito estabelecido
com o produto brasileiro dentro do con280
Nao ha duvidas quanto a larga margem
de ganhos que esse empreendimento propiciava. Esta afirmapao esta baseada na
analise do grupo original de empresarios
que investiu nessa cultura: empresas de
porte a m'vel nacional, provenientes, em
sua maioria, da regiao pampeana e da capital do pafs cis quais se acrescentaram investimentos estrangeiros (casos como o da
Barthe & Cia, La Industrial Paraguaya,
Empresa Matte Larangeira, e Pindapoy
Anglo Yerba State Co.) todas elas caracterizadas por multiplas conexoes financeiras
e economicas (vide tabela 3).
A estes produtores de erva-mate em
Misiones, outros nomes de destaque da
zona pampeana juntaram-se posteriormente: "Cia Eldorado" fundada em 1924 (A.
Schwelm, G. Pasman, E. Tornquist, H.
Leng, A. Gibbs, T Arata, J. Anchorena);
"Cia Introductora de Buenos Aires" fundada em 1919 (Carlos e Eduardo Tornquist, A. Gibbs, G. Pasman, E. van Peborgh); "Plantadora del Nordeste Argenti-
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini & Coconi
TABELA 3
RELAQAO DAS PRINCIPAIS EMPRESAS PLANTADORAS
(1 - etapa da cultura)
Plantador
Martin y Cia.
La Plantadora de yerba mate
(Jose Cullen y Ayerza)
Adolfo Lanusse
Nunez y Gibaja Cia Ltda.
Palacios Hnos.
Menendez Gongalvez (Empresa
Matte Laranjeira).
Pindapoy Anglo Yerba State Co.
Lesnini y Cia.
Larraburu Hnos.
A. Stevenson y Cia.
H.AIbrechtsen
C. Georgiades
La Industrial Paraguaya
Gramajo y Cia.
Kitebgi y Errecaborde
Herrera Vegas
Domingo Barthe
Liebig's Extract of Meat Co.
Lted.
Otto Bemberg (SAFAC)
Ballesty, Gonzalez y Robert
Pereyra Iraola
Data do Inicio do Plantio
1903
1910
1905
1910
antes de 1914
Hectares Cultivados
550 (1)
500
100
600
750
(1)
(1)
(2)
(2)
1917
s/d
s/d
s/d
antes de 1914
antes de 1914
antes de 1919
1914
1919
1924
1910
1916
s/d
s/d
120 (3)
100 (3)
50(1)
90 (1)
300 (3)
s/d
1.000 (2)
200 (3)
530 (3)
961 (3)
s/d
1920
s/d
s/d
223 (3)
500 (3)
190 (3)
s/d
Notas: (1) Numero de hectares em 1914.
(2) Numero de hectares em 1919.
(3) Numero de hectares em 1924.
Fontes: GIROLA, 1920.
GIROLA, 1922.
PASTQRIZA, 1921, P- 23
FERNANDEZ RAMOS, 1934, p. 110, 112 e 116.
no" fundada em 1927 (A. Grisar, A. Martinez de Hoz H. Gibson); "Domingo Barthe
S.A." (M. Montes de Oca, S. Ortiz Basualdo, J. Santamarina, G. Udaondo, V.Zouninus), com moendas em Buenos Aires, Rosario e Posadas; "Financiera e Industrial
de Misiones", fundada em 1930 (F. van
Peborgh, A. Grisar, W. Bell, C.Born); "La
Cultivadora Argentina de Yerba-Mate"
fundada em 1933; "Mackinnon y Coelho
Compahia Yerbatera" (H. Leng, R. Roberts, F. van Peborgh); "Tierras y Yerbales" (Familia Herrera Vega, J. Sosa Martinez, G. Peralta Ramos); "Tierras y Bos-
ques Campos del Cielo" fundada em 1921
(A. Schwelm, G. Pasman, E. Tornquist);
"Cia Yerba Mate Aktiengesellschaft" de
Zurich, fundada em 1927; "Compahia
Yerbatera Liebig" fundada em 1925 (administradores argentinos: W. Bell, A. Grisar, H. Gibson) (ANUARIOS DAS GUIAS
DE SOCIEDADES ANONIMAS,
1920-33),
Urn dos tragos ti'picos destes investidores foi o de dirigirem seus negocios de
acordo com criterios de racionalidade economica e maximizacao de lucros, e disso
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago, 1986
281
TRIGO VERSUS ER VA-MA TE
TABELA 4
PREgO MEDIO ANUAL DE ERVA-MATE NAO BENEFICIADA;
COTAQOES EM BUENOS AIRES E ROSARIO
(em cada 10kg, livres de impostos)
Anos
Paraguai e
Mato Grosso
1915
1916
1917
1918
1919
1920
1921
1922
1923
1924
1925
4,4
4,8
4,3
6,6
7,9
8,5
6,9
6,6
6,8
7,5
8,1
Misiones
3,9(1)
4,5(1)
4,2(1)
4,1
5,3
6,4
4,4
4,2
4,2
4,3
4,7
Parang e
Sta. Catarina
Rio Grande
do Sul
3,6
3,2
3,4
3,9
4,9
6,1
4,5
3,6
3,4
4,0
4,3
3,2
3,0
3,1
4,0
4,8
5,7
3,9
3,9
4,0
4,4
4,1
Nota: {*)Ha coincidencias em diversas fontes de consulta mostrando que os altos pregos verificados
no Rio Grande do Sul, geralmente mais baixos devido a qualidade, sao devidos a uma s^rie
de movimentos revolucionirios que a regiao sofreu desde 1918 e at6 1925, aproximadamente, e que causaram a desorganizagao da produgao e comercializaQao. Os produtores de
erva-mate brasileiros transferiram a eleva?ao dos custos de produgao diretamente para os
pregos de exportagao.
Fontes: Empresa Martin y Cia.
Revista de Economfa Argentina, tomo XXV, p. 51-54. iul. 1930.
se pode deduzir que a produqao de ervamare* criou expectativas de rentabilidade
garantida num setor sempre atento a novos empreendimentos frente as possibilidades de expansao de capital. Leopoldo Bartolome definiu a atuaqao deste "entrepreneur agncola" em Misiones como um
empreendimento
"muito bem adaptado ao si stem a de
ciclos" que /Jescolhe a a/ternativa de
alto risco e procura novas alternativas
de producao" (BARTOLOME
s.d.,
p. 19-20)
Confirmando esta id^ia nota-se que os investidores de maior porte se voltaram ao
plantio da erva-mate aproveitando a fase
inicial de maximos beneffcios e mais tarde, quando houve retrapao da margem de
lucro, diminufram sensivelmente seus investimentos.
282
Se se aceita o pressuposto de que
houve uma conduta logica, existiram, sem
duvida, fortes motives que os levaram a
investir em um produto que devia enfrentar a concorrencia daquele que se importava do sul do Brasil, regiao cujas vantagens comparativas (os ervais eram silvestres) determinavam um menor custo de
produpao. A resposta encontra-se necessariamente vinculada ao m'vel de prepos: se
ate a primeira decada do seculo XX nao
foi interessante tal produpao, isto deveu-se
ao baixo nfvel dos prepos de venda internacionais da erva-mate cancheada, o que
nao seria rentavel para a empresa. Durante
os 20 anos da fase de livre cultivo verificou-se o aumento paulatino e constante
das cotapoes de mercado a m'vel internacional (vide tabeta 4), o que possibilitou
enfrentar os custos referentes ao processo
de implantapao do cultivo (incluindo o
alto investimento inicial, os anos de espe-
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini & Coconi
ra ate a fase de pleno rendimento dos
plantios e os eventuais fracassos surgidos
da inexperiencia). Interessa determinar
neste estudo se a competitividade conquistada pela erva-mate argentlna de cultivo
resultou diretamente de uma poh'tica economica expressa ou se isto decorre das
prdprias condipoes do mercado ervateiro.
a. 0 mercado de erva-mate no infcio do
secu/o XX
A partir do final do seculo XIX e ate
1925, duas situagoes favoraveis se conjugaram para aumentar os pregos. O mercado de consurrio argentino (principal comprador) estava em expansao devido ao aumento da populagao neste pen'odo (o aumento do consume per capita foi de menor relevancia). Simultaneamente, havia
um fendmeno de importancia fundamental; a retragao da oferta de Hex si I vest re
do Paraguai e da Argentina devido ao processo de desmatamento. As dificuldades
de exploragao das culturas permanentes
tornaram a extragao em ambas as regioes
um empreendimento antieconomico. Este
fato — que culminou na redugao da contribuigao paraguaia a baixos percentuais e
no total desaparecimento da participagao
argentina — deixou o atendimento da demanda nas maos dos estados do Sul do
Brasil cujos exportadores nao vacilaram
em aumentar os pregos.
A expansao do mercado nacional poderia ter sido atendida apenas com o aumento da importagao do Brasil, porem muitos
estudos argentinos sobre o tema (Queirel,
1897; Bormeinster, 1899, Allain, 1910;
Conferencia de Gobernadores de los Territories Nacionales, 1913; Garin, 1916; Pastoriza, 1921) prognosticaram uma posigao
relativa mais adequada, a longo prazo, da
erva-mate de cultivo sobre a supostamente
mais vantajosa extragao natural. A id^ia
basica destes estudos era o conceito de
racionalidade economica: exploragoes metodicas, trabalhadas por mao-de-obra fixa
e qualificada, redundariam em maior produtividade
(compensando a longo prazo
os salaries mais altos) e qualidade, obtidos
no longo prazo com custos inferiores aos
da produgao extrativa, que demandava
constantes mudangas de acampamentos,
com mao-de-obra instavel e pouco habituada ao trabalho disciplinado. Por outro
lado, acreditava-se que no aspecto relative
ao alto custo do transporte atraves do
territorio de Misiones, este seria compensado se as exploragSes se localizassem diretamente nas encostas do rio Parana e
ao longo da linha ferrea, como efetivamente ocorreu com as grandes plantagoes
desde 1912. Nao se quer afirmar que estes
estudos marcadamente otimistas tenham
sido realistas em suas analises; porem a
difusao destes conceitos, que exaltavam os
beneffcios da produgao artificial, mostrando a do tipo extrativo como a menos
eficiente — expresses nos informes tecnicos ja mencionados — sem duvida contribuiu para a elaboragao, por parte dos investidores, de uma serie de conjecturas
que sustentaram a sua decisao.
b. Tipo de Cambio
Na ausencia de fatores contraries, a
queda do valor da moeda local leva a um
increment© das exportagoes, encarece os
bens importados e contribui para estimular atividades internas que concorram com
aquelas. Com base neste conceito, poderse-ia explicar o surgimento de produgoes
regionais de substituigao, incentivadas pela
demanda da regiao central. A poh'tica
cambial da Argentina, previa a crise de
1930, manteve a moeda local desvalorizada, de acordo com os interesses dos produtores rurais agroexportadores. Esta vantagem contudo nao existiu no caso da
produgao de erva-mate de Misiones pela
simples razao de que a moeda brasileira, o
"reis" foi se depreciando a um ritmo
maior que o peso argentino. Apesar disto,
este fato nao acarretou necessariamente
uma competitividade maior do artigo importado, pois na realidade a queda no
valor do reis era transferida aos pregos de
venda na zona eXportadora, atenuando as-
Estudos Econdmicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
283
TRIGO VERSUS ER VA-MA TE
TABELA 5
IMPOSTOS DE IMPORTACAO SOBRE A ERVA-MATE
(em cada 10kg, em m$n)
Periodo
Mofda
Cancheada
Diferenga Bruta
(Protegao S ind.
argentina)
1900-23
dez. 1923-mar. 1924
mar. 1924-dez. 1930
1,23
1^9
1,13
0,48
0,59
0,46
0,75
1,00
0,67
Fonte; Revistade Economfa Argentina, tomo XXV, p. 59, jul. 1930.
sim os efeitos do cambio. Este fenomeno
ocorreu durante
1917-1921<10'
1914-1915
e
c. Taxas A/fandegarias
No pen'odo em estudo, indubitavelmente a funpao especffica consignada aos
direitos alfandegarios foi a de proteger a
industria de moagem de erva-mate que
comepara a desenvolver-se em fins do seculo XIX. Consequentemente, os impostos
sobre o produto beneficiado estrangeiro
foram sempre mais elevados que os incidentes sobre a mat^ria-prima. Portanto,
nao houve uma polftica protecionista para
a produpao de Misiones. A trlbutapao sobre a materia-prima (sempre inferior a m^dia real dos impostos de importapao) teve
um proposito fundamentalmente fiscal (vide tabela 5).
Considerando que a carga real dos impostos especi'ficos varia inversamente as
flutuapoes dos prepos das importapoes e
que at^ 1920 as cotapoes do mate cancheado evolui'ram em sentido ascendente,
a incidencia dos impostos sobre os prepos
foi diminuindo progressivamente. Nos cin(10)
284
No perfodo compreendido neste estudo,
a inflagao brasileira nao teve peso suficiente para se contrapor a acentuada desvalorizapao do r^is com respeito ao peso
argentine.
co anos seguintes, os prepos do mate chegaram a seu ponto maximo, como consequencia das perturbapoes poh'ticas e pen'odos de chuvas que desorganizaram a
extrapao nos estados exportadores. Devido
a esta situapao, e a uma diminuipao especial das tarifas alfandeg^rias em marpo de
1924, a incidencia real dos impostos foi
ainda menor (vide tabela 6).
Em relapao ao tipo de cambio, as taxas
alfandegarias nao foram usadas para diminuir a influencia negativa da baixa do r^is,
dado este que reforpa a hipotese da inexistencia de uma polftica protecionista para a producao argentina, ainda que com a
elevapao dos prepos GIF o efeito dessa
barreira nao tenha sido neutralizado pelo
diferencial de cambio. Contudo, tambem
nao se concorda com a ideia de que a Argentina tentava desincentivar a produpao do
nordeste do pafsHI). Pelo contrario, como
se vera adiante, contribuiria para dar a esta
um novo impulse. As baixas taxas alfandegarias que predominaram na epoca (inclusive a baixa de 1924), foram motivadas
provavelmente pela convicpao de que nao
constituiriam um obstaculo ao desenvolvimento da produpao de erva-mate na Argentina.
(11)
O tragado da linha f(§rrea do nordeste da
Argentina at6 Posadas, em 1912, pode ser
considerado como um fator que incentivou a radicagao de atividades produtivas.
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2)275-301, maio/ago. 1986
Ma/gesini &Coconi
TABELA 6
INCIDENCIA DE TAXAS ALFANDEGARIAS NO PREgO MEDIO ANUAL
DA ERVA-MATE SEM BENEFICIAMENTO
Perfodos
Paraguai e
Mato Grosso
lncid§ncia
Porcentual
ad valorem
Parang e
Santa
Catarina
Incidencia
Porcentual
ad valorem
Rio
Grande
do Sul
Incidencia
Porcentual
ad valorem
1915-23
$6,58
7,29%
$4,56
10,52%
$3,95
12,15%
Dez. 1923/
$7,41
7,96%
$4,30
13,72%
$4,32
13,65%
Mar. 1924
Abr. 1924/
$7,82
5,88%
$4,06
11,33%
$4,24
10,84%
Ago. 1930
Fonte: Dados sobre pre?os na Revistade Economfa Argentina, tomo XXV, p. 51-53, jul. 1930
Taxas, ibidem, p. 58-59.
d. A Estrategia dos Estados Exported ores
Com respeito ei situapao das regioes exportadoras um fator importante fol a poii'tica especrtica de fomento a industria
moageira de erva-mate levada a cabo pelos
governos do Parana e de Santa Catarina (o primeiro formado pela aristocracia
de moleiros desse produto). Para impulsionar a exportapao de Hex processado aumentaram-se as taxas sobre a exportacao
da erva cancheada: do mesmo modo elevou-se significativamente o preco do frete
do mesmo artigo, desde os portos de exportapao ate Buenos Aires ou Rosario.
Desta forma os estados brasileiros propunham-se a evitar a expansao da industria
moageira argentlna que tinha como base a
materia-prima importada. Contudo, ao
provocar o encarecimento da erva-mate
cancheada e dificultar sua sai'da, eles contribui'ram para favorecer a colocapao da
erva proveniente de Misiones.
Em sfntese, a mobilizapao dos fatores
de produgao para Misiones com a finalidade de utiliza-los na agroindustria da ervamate nao decorreu de uma poh'tica especi'fica de incentive — a excepao do trapado da estrada de ferro —, nem tampouco
pela influencia decisiva de determinados
fatores institucionais (regime tributario, tipo de cambio). Para isso, combinaram-se
alguns efeitos propulsores desde a regiao
central (reinversao a partir dos excedentes
acumulados de capital) com fatores proprios do mercado de erva-mate, que redundaram numa expressiva elevacao dos
precos de mercado das cancheadas ( incremento da demanda e simultanea diminuipao das regioes ofertantes; visao otimista
em relagao aos resultados do cultivo; elevagao dos pregos no Brasil).
A Intervenpao do Estado Argentine
A potencialidade adquirida pela nova
riqueza regional motivou a intervenpao
das autoridades argentinas, das quais dependia diretamente o territorio de Misiones. Esta intervenpao foi feita basicamente
atraves de duas leis que marcaram as etapas de produpao ervateira (1926-35 e
1936-45). De carater oposto, estas leis
comprovam a evolupao economica tamb6m contraditoria dessa produpao. Em
1926 a lei visava o incentive da produgao
e em 1936 a regulapao e restripao, dada a
eminente crise de superprodupao. Paralelamente a estas, uma serie de medidas
Estudos Econdmicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
285
TRIGO VERSUS ERVA-MATE
temporarias complementou a atuapao do
Estado. A seguir, tentar-se-a esclarecer se
o governo tinha intengoes da sustentar o
intercambio entre os dois pai'ses, Argentina e Brasil, em detrimento de agroindustria do nordeste argentino.
a. 1926-1935
Apos 1925, uma boa parte da producao de erva-mate argentina provinha de
uma imposigao do Estado. Atraves do
"Reglamento de la Ley General de Tierras" e do decreto de margo de 1926,
todos os concessionaries de lotes fiscais
de Misiones foram obrigados a plantar erva-mate, em 20 a 75% de suas 5reas, dependendo do tamanho das terras, sob pena de perda das concessoes. 0 Censo de
1933 constatou que os colonos cultivaram
43,4% das areas destinadas a esse produto
e 47,3% do total de culturas.
Dois anos antes da lei acima, o Governo de Alvear, havia cedido as pressoes dos
exportadores brasileiros e dos interesses
dos triticultores, diminuindo as taxas alfandegarias sobre a erva-mate importada.
Contudo, tem-se explicado que esta atitude isolada nao & suficiente para indicar
uma poh'tica contraditoria. De fato, tal
sagriffcio fiscal nao gerou maiores entradas de erva-mate que as de costume^^.
potecario e Naci6n; esta medida daria lugar ao decreto de cultivo obrigatorio^^.
0 incremento da produgao argentina —
de 550% entre 1923 e 1935 — entrou em
choque com os interesses importadores. A
crise, cujas rai'zes encontram-se muitos
anos antes, tornou-se palpdvel no final de
decada de 20. Ainda que em 1927 o consumo de Hex tenha sido suficiente para
absorver a oferta total, a pregos rentaveis,
a partir desse ano surgiram queixas dos
produtores da regiao com relagao as dificuldades de colocagao e da cotagao declinante de suas colheitas.
Os primeiros dados dispom'veis sobre o
consume real sao de 1930 e permitem
verificar a brecha cada vez maior entre a
oferta e a demanda. Antes desta data so
ha dados estimativos, uma vez que, nas
fontes, as cifras referentes ao consumo
eram, na verdade, resultado da simples
soma da importagao e da produgao nacional (vide tabela 7).
A depreciagao constante dos va I ores da
mat^ria-prima e sintoma da existencia de
anomalias no mercado de erva-mate a partir de meados de 1927. Nesse sentido, o
desequih'brio manifestou-se especialmente
na erva cancheada, cujos pregos, ascendentes ax6 1926, comegaram a decrescer aceleradamente (vide tabela 8).
Por outro lado, desde o inCcio da d6cada de 20, o Governo de Alvear, cuja pasta
da Fazenda estava em maos de Rafael
Herrera Vegas, capitalista fortemente ligado ^ produgao de mate, comegou a incentivar o desenvolvimento daquela atraves
da concessao de cr&ditos dos Bancos Hill 2)
286
De qualquer forma a erva-mate argentina
foi protegida no mesmo nfvel que outros
produtos, como por exemplo o vinho e o
apucar. O caso da erva-mate nao se enquadra em nenhuma das situapoes descritas para 1927 por Carlos F. Dfaz Alejandro: impostos reduzidos para os alimentos que nao competiam com a produpao
nacional e altos para os produtos concorrentes (ALEJANDRO, 1975, p. 288).
Para os produtores locais, que procuraram imediatamente a protegao do Estado,
a desvalorizagao era motivada pela concorrencia agressiva dos exportadores do Parana e Santa Catarina, os quais teriam o
aval de seus respectivos governos. De acordo com esta versao dos fatos, a partir de
(13)
O decreto de 1926 poderia ter atendido
o interesse do Estado em baratear este
produto de consumo popular atraves do
aumento de oferta no mercado. A polftica de taxas alfandegdrias durante o segundo governo radical contribuiu para acelerar a expansao da produgao nacional de
mate, cujas importagoes comegaram a diminuir.
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini & Coconi
TABELA 7
RELAQAO ENTRE A OFERTA E O CONSUMO DE
ERVA-MATE: FORMAQAO DE ESTOQUES
(1.000 ton.)
Anos
Oferta
Consumo
Real
Estoque
Anual
1927
97,2
90,5e
6,7e
6,7
92,8
e
e
5,7
9,1
14,8
90,5
86,2
8,1
17,9
22,9
40,8
85,5
85,5
26,7
67,5
72,7
76,1
94,6
1928
1929
Estoque^
Acumulado
2,3
90,5
e
1930
1931
96,3
98,6
103,7
90,5
1932
1933
112,3
90,7
1934
99,4
95,8
3,4
1935
114,2
95,6
18,5
5,2
Nota : (e) Estimativas.
Fontes: Dados referentes a oferta e consumo real: Revista de Economfa Argentina, tomo XXV, jul.
1930.
BILLARD, 1946.
TABELA8
COTAgAO MEDIA ANUAL DA ERVA-MATE CANCHEADA
(em cada 10kg, m$n)
Anos
Mato Grosso
e Paraguai
Misiones
Parand e
Sta. Catarina
Rio Grande
do Sul
1925
1926
8,05
6,45
4,82
5,32
4,76
5,33
1927
5,26
5,39
5,25
4,37
3,84
4,39
1928
1929
4,32
3,33
3,56
3,56
3,80
4,09
1930
1931
1932
6,20
5,93
6,41
6,34
5,61
3,0
3,15
2,64
3,16
2,71
2,50
s/d
s/d
s/d
1933
1934
4,53
4,57
2,20
2,47
s/d
2,38
2,80
s/d
1935
4,42
2,27
2,67
s/d
1936
1937
4,28
2,06
1,82
2,66
2,47
s/d
s/d
4,65
Fontes: Revista de Economfa Argentina, tomo XXV, jul. 1930.
CRYM, 1936, p. 24.
Estudos Econdmicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
287
TRIGO VERSUS ER VA-MA TE
1928, teriam sido introduzidas quantidades maiores que as habituais de erva-mate
sem beneficiamento, a prepos inferiores,
indicativos de uma poh'tica de dumping
na bolsa de Curitiba, amparada pelo go
verno paranaense. Simultaneamente, este
governo concederia beneffcios aos exportadores para baratear ainda mais os custos. As queixas assinalavam um significativo incremento do contrabando atraves da
fronteira terrestre misionera-riograndense.
Essa concorrencia desonesta e o fato incontestdvel de que o proprio Estado tinha incentivado o cultivo levaram os plantadores a exigir protepao efetiva, que implicava limitar a importagao ao percentual
da demanda nao atendido pelo produto
nacional.
Se bem que a comprovapao das denuncias seja diffcil devido a falta, no pai's, de
dados comprobatorios, a depreciagao era
inegavel. Considerando-se a relapao custobeneffcio, 6 necessario estabelecer uma
distingao entre dois segmentos de produpao. No caso das grandes empresas, o problema deve ser observado sob o ponto de
vista das expectativas de alta rentabilidade
gerada na fase de pregos ascendentes, que
agora nao se viam confirmadas, devido a
concorrencia existente no mercado. Isto
se aplica, em especial, ao caso dos que
iniciaram o plantio entre 1920-25: a crise
de prepos os atingiu quando ainda estavam se capitalizando e suas colheitas eram
exi'guas devido ao fato das plantapoes serem novas. De qualquer forma, esse setor
supostamente havia feito o calculo previo
de risco de investimento. O outro setor
denunciante — colonos radicados em terras fiscais e pequenos proprietaries — havia realizado a plantapao em resposta a
obrigapao com o governo. Para este ultimo setor, cujo m'vel de lucro ja era baixo
durante a epoca de bons prepos, a queda
destes deteriorou sua situapao economica
ate torna-la insustentavel. Deixando de lado esta problematica, 6 evidente que, ante
a queda de prepos, a produpao de mate
nao cultivado nacional tinha deixado de
288
ser competitiva frente a produpao brasileira, que era subsidiada.
A primeira resposta aos apelos dos produtores foi em agosto de 1930, quando
Irigoyen, tentando encontrar um paliativo
para a situapao, anulou a redupao das taxas alfandegcirias de 1924 e ofereceu alguns benefi'cios aos produtores locaisl^),
Todavia, o golpe cfvico-militar de 6 de setembro impediu a aplicapao das medidas
acima.
No infcio dos
sofreu o impacto
A queda abrupta
primaries a m'vel
mente cereais e
1920-25, acelerou
lanpas comercial e
anos 30, a Argentina
da Depressao Mundial.
das cotapbes de bens
internacional, especiallinho, em relapao a
o desequih'brio das bade pagamentos, devido
a deteriorapao dos termos de troca frente
aos manufaturados e ao exodo dos capitais para os Estados Unidos, a partir de
1928. A poh'tica fiscal e monetaria dos
governos conservadores pos-crise pretendeu atuar de forma antici'clica no pen'odo
de depressao mundial visando recuperar o
setor rural pampeano e os diversos grupos
ligados ao setor externo. Este proposito
tendia, indiretamente, a favorecer o desenvolvimento de atividades secundarias e de
produpoes regionais, porem no caso da
erva-mate o contexto criado para alcanpar
essa meta fundamental nao conseguiu
achar uma solupao para a delicada situapao, ]a que aquela foi motive da interapao
de interesses complexes e divergentes. Os
anos compreendidos entre 1930 e 1935
foram marcados por medidas temporarias,
aparentemente contraditorias, que indicavam a constante procura de certo "equih'brio". Os dois governos que determinaram
a vida poh'tica desses anos, coincidindo
essencialmente no manejo das principais
questoes economicas, manifestaram diferentes tendencias no que se referia a ques(14)
Entre estes: construgao de depdsitos fiscais, controle fi'sico-qufmico do produto
estrangeiro e redupao do numero de portos autorizados a exportapao a fim de
evitar o contrabando.
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2)275-301, maio/ago. 1986
Malgesini & Co com'
tao do mate, agindo de acordo com seus
interesses instrumentais e setoriais. O resultado foi uma acentuada descontinuidade e progressiva intervengao da atitude
oficial em relagao a agroindustria misionera. Durante o primeiro ano de governo,
Uriburu tentou recuperar a estabilidade
economica, continuando com a poh'tica
de depreciagao monetaria que deveria ter
atuado como estfmulo ao aumento das
exportagoes e ^ diminuigao das importagoes, o que nao se concretizou porque os
pregos dos produtos agropecuarios diminufam a um ritmo mais acelerado que a
depreciagao do peso. AI6m disso, a demanda externa por esses produtos sofria
restrigoes como conseqiiencia das medidas
protecionistas aplicadas pelos pafses castigados pela crise.
Quando a Gra-Bretanha abandonou em
1931 o padrao ouro, a situagao financeira
ficou insustent^vel para o governo argentino, com crescente deficit extern© e precisando garantir o servigo da di'vida externa
em moeda com lastro ouroHS). Para poder lidar com as variaveis acima, Uriburu
estabeleceu um controle central de cambio e enfatizou a limitagao das importagoes, conseguindo, no ano seguinte, tornar
a balanga de pagamentos favoravel.
E nesse context© que se devem situar
as numerosas medidas alfandegarias e regulamentos sanitarios que protegeram a
produgao de erva-mate nacional^®). Ape(15)
O servigo dos capitals estrangeiros constituiu outro grave problema,
que nao
diminuiu como esperado, chegando a representar quase 40% do valor das exportapoes argentinas em 1933 (O'CONNELL,
1984, p. 491).
(16)
A importagao foi proibida de dezembro
de 1930 at6 margo do ano seguinte, espago de tempo utilizado para que umacomissao deslgnada ad hoc fixasse o total das cotas anuais que poderiam ser oferecidas ao
mercado argentine. AI6m disso, durante o
ano de 1931 foram baixados v5rios regulamentos restritivos de carater qui'micosanitario para o mate importado, que se
transformavam em limitagoes a importagao.
sar das ameagas do governo brasileiro de
restrigoes comerciais como represalia a essa poh'tica "inamistosa" — concretizadas
em agosto de 1931, atraves de um acordo
de intercambio de cafe por trigo com os
Estados Unidos, e proibigao de importar
farinha de trigo argentina durante 18 meses — tais medidas protecionistas se mantiveram enquanto estava no poder o governo provisdrio argentine. E interessante notar que o Poder Executive se baseou na
sua "fungao e dever primordial de defender e proteger os produtos nacionais", especialmente no caso da erva-mate por ter
sido incentivada oficialmente e dirigida a
atender a populagao da provmcia de Corrientes e do territorio de Misiones, cuja
base de desenvolvimento era unicamente
essa agroindustria^^. Outro ponto levantado por Uriburu visando a recuperagao
economica foi a tentativa de fortalecer os
produtores de matlria-prima. Em conseqiiencia disso as industrias mais prosperas
foram aquelas que se utilizavam de materia-prima nacional, enquanto que aquelas
que se utilizavam da importada viram-se
prejudicadas. Coincidindo com esse ponto
de vista, Linhares assinala que nesses anos,
enquanto os moleiros e plantadores de
erva argentinos consolidavam sua posigao,
os importadores perdiam terreno e influencia (LINHARES, 1969, p. 358).
Quando Agustin Justo iniciou seu governo em 1932, o poder de pressao dos
produtores de mate mostrou-se tenue
frente ao dos importadores e beneficiadores de mate estrangeiro, somado ao poder
dos moedores de farinha radicados no
Brasil e os exportadores de trigo (grupos
respaldados pela poderosa empresa Bunge
& Born). Apesar da tendencia de substituigao de importagoes, inclusive com o
desenvolvimento de outras culturas fora
da regiao pampeana, que pela primeira vez
figuravam da pauta de exportagoes, o esforgo do segundo governo dos anos 30 foi
(17)
Refere-se aos decretos de limitagao de
importagao de mate de 31 de dezembro
de 1930 e de 14 de margo de 1931.
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2) :275-301, maio/ago. 1986
289
TRIGO VERSUS ERVA-MA TE
dirigido para a recuperapao da receita do
setor externo tradicional, base para a recuperagao global da economia. Considerando o notlvel declfnio que a colocapao
de trigo e farinha experimentou a partir
de 1928, a possibilidade de incrementar a
exportapao de trigo para o Brasil (que
vinha aumentando a cada ano a excepao
de 1932) determinou que qualquer outro
interesse comercial com o pafs vizinho
ficasse em segundo piano. Consequentemente, o governo procurou criar condipoes
mais favoraveis para a concretizapao deste
proposito, evitando a repetipao da represalia de 1931, contra o principal cereal argentine. Em maio de 1932, liberou-se a
importapao de mate e se revogaram as
restripoes qui'mico-sanitarias implantadas
pelo governo provisorio, que tinha sido
"vrtima do extreme grau de protecionismo" (F. Pinedo). Nesse ano, ao tratar do
tema erva-mate e polftica comercial na
Camara dos Deputados, Vcirios representantes (entre eles Pinedo e Duhau, futures
ministros) fizeram duras cn'ticas a essa
"infeliz tentativa (o infcio da cultura
e a colonizagao de Misiones ne/a respaldadaj que tem perturbado.
as re/agoes comerciais com o Brasil, que era
um comprador nada desprezi'vel, porque nao e desprezi'vel poder co/ocar
600.000 a 700.000 ton. a mais de trigo".
Pinedo qualificou a industria de mate como "a industria parasitaria tlpica" (a
exemplo da do apucar) uma vez que
"sua exuberancia e magnificencia nao
impedem que seja parasitaria a produgao dessa arvore, se em outras partes,
com menos traba/ho e menos capita! se
produz em me!bores condigoes"
.Estes argumentos iam desde os beneffcios de um amplo intercambio mercantil,
visando a colocapao no mercado dos excedentes agncolas, ate a nao promopao de
atividades economicas que nao se sustentassem com suas proprias vantagens com290
parativas. Defendidos pelos representantes
do partido socialista, o interesse dos consumidores fortaleceu ainda mais o crit6rio
de desincentivar culturas parasitarias atrav6s da importapao de similares mais baratos (CONGRESSO NACIONAL, 1932, tomo II, p. 595-96, 610-13 e 637).
Em relapao ao conflito economico-social que afligia a regiao produtora, predominou a tese de evitar a ruma dos plantadores e da cultura do mate, pois o Estado
havia promovido seu cultivo. Concluiu-se
porem, que havia necessidade de eliminar
o incentive, interrompendo o desenvolvimento e orientando os colonos para outras culturas que nao concorressem com a
importapao. De imediato nao se sentiram
os efeitos destas medidas jci que, de fato,
as plantapoes continuaram se expandindo
ate 1935. No entanto, o decreto de Janeiro de 1933 aplicou um tribute adicional
de 10% nas taxas alfandegarias de entrada
do mate. Esta medida nao era considerada
uma afronta ao Brasil, pois acreditava-se que
mais importante que essa tributapao eram
as quedas constantes no cambio brasileiro,
cuja influencia nao era revertida por altas
nos prepos do mate na origem (como
ocorrera na ^poca da pre-crise).
Todavia, os produtores brasileiros viam
a nova tributapao sob outro prisma. Esta
divergencia levou, finalmente, a assinatura
de um tratado comercial visando a obtenpao de um acordo: Argentina se comprometeria a revogar o tribute e a nao tomar
nenhuma medida que direta ou indiretamente implicasse limitapao da importapao
do Hex. O Brasil, em contrapartida, nao
renovaria a proibipao de 1931 relativa a
importapao da farinha de trigo e do trigo
em grao argentinos, deixando livre o comercio para as duas mercadorias. Esse tratado nao foi sancionado no Brasil, talvez
devido ao item referente a introdupao de
farinha, ja que a industria moageira estava
em expansao. Mesmo assim, em outubro
de 1935, outro acordo foi firmado, nos
mesmos termos, detalhando-se que a
quantidade de mate brasileiro destinada
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2) 275-301, maio/ago. 1986
Mafgesini & Coconi
ao consumo argentine nao poderia ser inferior a m&iia das quantidades registradas
nos ultimos tres anosHS). Imediatamente
em parte conseqiiencia da sucessao de medidas oscilantes adotadas na Argentina,
que gerou uma crescente sensapao de
o tribute adicional foi suspense, marcando assim mais uma etapa na tortuosa poh'-
0 complexo processo da decada de
1926-1935 reflete a falta de uma polftica
organizada para o incentive h produgao e
inseguranpa entre os exportadores brasileiros, os quais, conscientes da impossibilidade de derrubar a poderosa produpao de
Misiones, decidiram investir seus capitais
em atividades mais estaveis. Portanto, o
desequilfbrio gerado pelo proprio governo
argentine ocasionou
para com os interesses comerciais mais
amplos. 0 decreto de 1926, da obrigatoriedade do plantio, que levou a produpao
"uma crise de grande magnitude no
Brasil" (LINHARES, 1969, p. 201).
tica da erva-mate.
a cifras que em muito superaram o calculo previsto, tornou-se urn problema sem
solupao, na 6poca. As decisoes contraditorias refletem o descontentamento, era de
uma, era de outra das partes envolvidas
no conflito, cujas possibilidades dependiam de seu proprio poder de pressao
sobre o poder publico e da poli'tica economica vigente. Neste sentido, os promotores da livre importagao de mate (tanto
nacionais como estrangeiros) mostraram-se
suficientemente ativos para impedir a manutengao de medidas restritivas, apesar
dos reclamos dos produtores da regiao
nordeste contraries a esta posipao.
0 result ado da importagao de mate
nesses anos foi o agravamento da crise por
causa da saturapao do mercado e da baixa
dos prepos da mat^ria-prima. Esta situapao
foi proveitosa somente para os beneficiadores e grandes plantadores/beneficiadores, pois estes podiam absover as diferenpas entre as baixas cotapoes e os prepos mmimos de venda ao consumidor.
No entanto, apesar da mudanpa aparentemente desvantajosa para a produpao nacional, verifica-se que a partir de 1933 as
quantidades importadas de mate apresentaram um acentuado declmio em relapao
ao ano anterior, fato este que se intensifica com o tempo. Este fenomeno, que a primeira vista pareceria
(18)
surpreendente, foi
Acordos comerciais entre Argentina e
Brasil de 1933 e 1935. In: UNBA/FCE,
1945.
b. 1936-1945
A partir de 1932 as autoridades argentinas estavam convencidas da necessidade
de se manter o intercambio do mate e
outros produtos brasileiros com o trigo da
pampa humeda. Consequentemente, todas
as medidas que viessem a ser implementadas, ainda que relatives a aspectos secundcirios, deveriam estar direcionadas a
afianpar este intercambio.
A posicao do Brasil como o segundo
maior comprador de trigo e de considerivel quantidade de carne fresca e resfriada,
somada ao prinefpio de "comprar de
quern e nosso cliente", induziu o estabelecimento de uma poli'tica comercial, na
qua! a agroindustria do mate deveria ter
um papel de apoio e nao de oposipao aos
interesses prioritarios da regiao pampeana.
A este importante assunto acrescia-se o
problema da superprodupao — a colheita
nacional superaria o consumo —, agravado
sobremaneira por causa dos estoques que
vinham se acumulando a partir de 1928.
Paralelamente a essa questao, a situapao
cn'tica dos milhares de colonos da Regiao
de Misiones e Corrientes era um tema que
precisava ser considerado.
F rente a esse panorama, o governo —
que ja tinha aumentado seu controle sobre as economias pampeanas e de outras
regioes mediante a criapao de numerosas
instituipoes reguladoras ou de incentive a
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2)-.275-301, maio/ago. 1986
291
TRIGO VERSUS ER VA-MA TE
um amplo leque de atividades produtivas
e de servipo — decidiu estender esse con-
TABELA 9
trole para o setor do mate, com o proposito de obter uma solupao estabilizadora.
Com essa finalidade, a lei 12.236 de outubro de 1935, criou a CRYM (Comision
Regladora de la Yerba Mate); instalada
no ano subseqiiente, tal comissao tinha
como missao adequar os termos da oferta
e da demanda. Para isso, em 1937 entrou
em aqao um orgao a ela subordinado — o
PRODUgAO REAL E PRODUgAO
POTENCIAL ESTIMADA DE
ERVA-MATE ARGENTINA
(1.000 ton.)
Mercado Consignatario de Yerba Mate Nacional Canchada —f que compraria toda a
producao argentina; atuando como intermediario entre o plantador e o beneficiador, entregaria a este quantidades de mercadoria de forma controlada. Desse modo,
evitava-se que o desespero dos produtores
por colocar suas colheitas deprimisse ainda mais as ja baixas cotagoes de materia-prima. Enquanto o prego nao alcangasse nfveis rentaveis, a CRYM outorgaria
aos plantadores uma compensagao equivalente a diferenga entre o prego de custo e
o de venda — incluindo certa margem de
beneffcio — de sorte a solucionar a cn'tica
situagao dos mesmos^). Considerou-se
esse subsTdio indispensavel, visto nao haver previsao de rlpido equilfbrio uma vez
que estava em vigencia o tratado bilateral
de 1935, pelo qual deveriam ser adquiridas, no mmimo, 30 a 35 mil toneladas de
Hex brasileiro nao beneficiado. Embora a
importagao do genero procedente do Brasil — pelos motivos ja mencionados e pela
evolugao que esta provocou na economia
dos estados produtores — viesse diminuindo desde 1933 (as quantidades estabelecidas so foram cumpridas ate 1939, ano
em que se importou 30.667 ton), o subsfdio foi adotado juntamente com outras
medidas restritivas a produgao argentina.
Para nao agravar ainda mais a situagao e
como resultado das teses em pro! da legitimidade da economia da erva-mate que o
(19)
292
Este subsi'dio significou um excelente neg6cio para os plantadores com moinho
prfiprio, pois estes, sem deixar de consegulr bons pregos de venda ao varejo, tamb&n obtinham o subsfdio da CRYM.
Anos
Produgao Real
1937
106,3
140
1938
161
1939
72,5
64,5
178
1940
68,7
192
1941
72,1
202
1942
79,9
s/d
1943
1944
83,9
83,9
99,4
s/d
s/d
1945
Produgao
Potencial
Estimada
s/d
Fontes: Revista de Economfa Argentina, to mo
XXXII, p. 62.
Direccidn de Estimaciones Agropecuarias.
Distribuicidn de la superficiecultivada
por grupos de cultivo 1932/33 1960/61, Buenos Aires,1961, s/p.
setor dirigente argentine vinha manifestarv
do, implementaram-se medidas para evitar
o crescimento "inoportuno" da produgao
nacional. Assim, em 1936 foi aplicado um
imposto de m$n 4 sobre cada planta nova
— virtual proibigao — e, a partir de 1937
(ate 1957) limitaram-se anualmente as colheitas. Tal decisao foi implementada mediante a indicagao de uma cota para cada
produtor, a qual foi estabelecida de acordo com as necessidades do consume, descontada de um percentual correspondente
3 importagao.
Esta solugao, ao implicar uma redugao
dos cultivos (vide tabela 9), considerava
nao somente as perdas absolutas mas tambem sustentava as diminuigoes na rentabilidade das exploragoes.
A depreciagao da erva-mate cancheada
continuou se acentuando at^ 1939 devido
Estodos Econdmicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini & Coconi
TABELA 10
RELAQAO ENTRE OFERTA E CONSUMO DE ERVA-MATE
(1.000 ton.)
Anos
Oferta
Consume
Excedente
Anual
Estoque
1936
1937
119,1
146,9
98,7
20,4
100,3
101,7
45,2
1938
106,1
102,3
3,2
145,5
148,8
1939
95,3
109,8
-14,5
134,2
1940
96,2
106,0
-10,8
123,4
1941
95,7
106,9
-11,2
112,2
1942
110,7
117,9
- 7,2
105,0
1943
1944
102,1
109,8
- 7,7
97,4
103,5
111,0
89,8
1945
103,3
115,7
- 7,5
-12,5
77,4
Fonte: Dados prdprios com base em Mem6rias da CRYM e do Mercado Consignat^rio.
^ persistente saturapao do mercado, nao
so porque a soma da produqao e importagao mantinha-se acima do consumo, como
tambem pelo grave problema dos estoques
acumulados (vide tabela 10). Ao mesmo
tempo em que a cota de erva brasileira
subtraCa urn tergo da demanda, criava o
problema a produgao nacional que se adicionava nos excedentes de anos anteriores.
Entre 1940 e 1945 as cotagoes da materia-prima aumentaram gradativamente, ainda que nao o suficiente para permitir que
fosse eliminada a compensagao outorgada
aos produtores pela CRYM.
De modo geral, at6 1945, a CRYM
optou por subsidiar o plantador argentino
(sem contudo incentiva-lo) tentando impedir que o mesmo sofresse perdas, apesar
de produzir uma cultura que se tornara
antieconomica. Com o objetivo de manter
e ampliar o com^rcio com o Brasil, foi
fixada uma cota mfnima de importagao,
restringindo, dessa maneira, uma atividade
agncola local hiperdesenvolvida.
Da mesma forma que a primeira fase
de intervengao evidenciou a falta de previ-
sao daqueles que forgaram o cultivo da
erva-mate como base do assentamento em
Misiones, as medidas implantadas na fase
seguinte mostraram o peso relative que a
pampa agropecuaria exercia sobre a economia nacional, sendo esta a regiao onde
se depositavam as esperangas de pronta
superagao dos problemas economico-conjunturais da decada de 30. Frente ao "interesse nacional" era precise evitar as interferencias de produgoes secund^rias (que
sob o ponto de vista do Estado geravam
beneffcios duvidosos), e reprimi-los quando, como no caso do mate, perturbassem
a habitual ou possi'vel exportagao de cereais a um dos mercados compradores.
2.
O Intercambio Argentina-Brasil
durante a Segunda Guerra Mundial
Desde o im'cio do governo do Presidente Justo, principalmente a partir da Segunda Guerra Mundial, houve uma notavel
melhoria das relagoes diplom^ticas e comerciais com o Brasil. O conflito belico
trouxe graves problemas as economias dos
dois pai'ses, devido fundamentalmente ao
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
293
TRIGO VERSUS ERVA-MATE
fechamento dos mercados europeus para
os produtos latino-americanos. Para enfrentar a perda de divisas, procuraram exportar os excedentes de produpoes locals
para mercados nao tradicionais. Em conseqiiencia desta situapao, bem como da existencia de vmculos anteriores e da possibilidade de se ampliar um intercambio
complementar, a relapao comercial argentino-brasileira adquiriu uma nova faceta:
procurou-se desenvolver o que alguns chamaram de "panamericanismo empTrico"
Sendo o setor de produpao de cereals
um dos que mais contribufram na formagao do RIB argentine, o Estado optou
pela compra das colheitas e pela "poh'tica
do grao combusti'vel" (MALGESINI &
ALVAREZ, 1982) no ambito interno; no
externo, pelo impulse a exportagao de
trigo para o Brasil.
O trigo, principal bem de exportagao
para este pai's ha muitos anos, passou a
ter maior importancia em relagao ao total
exportado, embora nao em valores absolutes.
TABELA 11
PERCENTUAIS DAS
EXPORTAgOES DE TRIGO E
FARINHA DESTINADAS AO
BRASIL, RELATIVAMENTE AOS
RESPECTIVOS MONTANTES
EXPORTADOS PELA
ARGENTINA
Anos
Trigo
Farinha
1930
1931
24,5
18,1
49,9
23,5
1932
8,0
5,4
1933
19,0
34,9
1934
16,7
1935
23,2
60,6
37,7
1936
1937
54,0
23,4
37,1
32,4
1938
51,7
26,1
1939
1940
1941
20,9
23,7
28,1
16,8
11,0
15,2
1942
45,2
14,6
1943
1944
51,6
16,8
25,1
28,4
1945
Conforme mostra a tabela 11, registrou-se um leve aumento na exportagao
de trigo nos primeiros anos da guerra
mundial, crescendo acentuadamente a partir de 1942. A farinha de trigo, segundo
produto de exportagao ao Brasil, teve
comportamento diferente. Devido ao crescimento da industria de moagem no Brasil
e ao aparecimento de novos mercados
consumidores, especialmente na America
Latina, manteve, com oscilagoes, uma tendencia declinante.
Do total exportado para o Brasil, o
trigo e a farinha, nesta ordem, representaram sempre a maior proporgao. Nota-se
50,3
45,4
Fontes: Elaboragao pr6pria com base nos
Anuclrios de Com^rcio Exterior e Memdrias do Banco Central de la Republica Argentina.
(rubrica de veiculos e maquin^rio, t§xteis,
pedras e vidros, ceramica e produtos qufmicos). Este fato nao minui'a a necessidade de colocar o cereal, pois nenhum dos
outros artigos mencionados, tornados individualmente, significavam mais de 3% do
total exportado. Por outro lado, em valores absolutes, a participagao do trigo aumentou rapidamente em todos os anos.
que durante o pen'odo inicial da guerra a
participagao relativa sofreu um decrescimo, indfcio de certa diversificagao constitui'da por aumentos na exportagao de alguns produtos primaries (frutas frescas,
couro, la e animais em pe) e tambem de
diversos bens manufaturados e derivados
294
A pauta de bens importados do Brasil
apresenta uma diversificagao muito maior
que a da Argentina, relativamente estabilizada em um bem principal. 0 mate, que
se destacara na primeira fase, deixou de
ser a base do intercambio a partir de
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini & Coconi
TABELA 12
PRINCIPAIS EXPORTAgOES BRASILEIRAS PARA A ARGENTINA
(em porcentagem)
Anos
Caf(5
Frutas
Madeiras
Ferro
Caucho
1935
17,4
14,8
16,3
0,003
0,09
1,3
23,1
1937
13,6
23,3
17,6
0,01
0,01
3,0
20,0
1939
1941
1943
12,8
28,4
16,7
13,4
27,1
1,1
8,3
13,8
16,8
8,9
1,3
4,4
6,4
4,8
10,3
10,4
30,0
30,2
7,5
3,3
1945
7,8
7,5
21,5
7,3
38,2
2,8
1,9
2,2
Texteis
Mate
Cancheada
Fonte: Anudrios de Comercio Exterior. 1935-1945.
1937 (vide tabela 12) superado que foi
por outros produtos, nao pelo decrescimo
brusco no volume daquele, mas pelo aumento destes. Obtiveram destaque o caf^
em grao, o fumo, as madeiras, as frutas
frescas, o ferro e o caucho. Nos ultimos
anos de conflito, ocorreu vertiginoso aumento dos texteis de algodao. Entre 1939
e 1945 o mate apresentou urn peso relative medio de 6,36%, tornando-se um produto secundario no total do comercio entre a Argentina e o Brasil.
A nova configurapao do comercio entre
os dois pai'ses indica o virtual desaparecimento do intercambio trigo/erva-mate e
sua substituigao, do lado brasileiro, por
varies produtos que contribufam para a
ampliapao do comercio. Esta relagao consolidou-se durante o pen'odo atraves de
protocolos (de intenpao), recomendapoes
e acordos comerciais celebrados em 1939,
1941, 1942 e 1943. Neles foi estipulada a
concessao de mutuas facilidades de intercambio. Em linhas gerais, afianpavam que
todo excesso de exportagao de um pai's para o outro nao devia induzir a restripao desta e sim ao aumento das importapoes, incentivando um regime de livre intercambio;
ou seja, houve o esti'mulo de um aumento
progressive das trocas; a concessao de creditos mutuos para as compras e acordos de
licenpas para obtenpao, a taxa oficial, dos
recursos necessaries para efetuar os pagamentos. Em 1941, foram estabelecidas
restripoes ao uso de sucedaneos ao cafe
brasileiro e ao trigo argentine. As vantagens concedidas a introdupao desse cereal
foram apontadas em todas as oportunidades, tanto que o Brasil obteve beneffcios semelhantes para os texteis — principalmente de algodao - ferro em lingotes,
caucho e subprodutos, frutas, madeira e
las. Estes acordos levaram a situapao de
intercambio evidenciada nos dados da
tabela 12.
No referente a erva-mate, o tratado de
janeiro de 1940 reiterou os termos dos
acordos efetuados em 1933 e 1935 —
manteve-se a cota mmima de 30 a 35.000
ton., os mesmos impostos alfandegarios e
o compromisso argentine de nao aplicar
medidas restritivas a sua importacao. O
tratado de 1943 estipulou uma cota anual
de 27.000 ton.(20). a comparapao destas
quantidades com as importapoes realizadas
ate 1930 confirma o carater secundario
do Hex no comercio global. O motive
(20)
Sobre estes aspectos veja-se os tratados
de 1939 at(5 1945 em MINISTERIO DE
RELACIONES EXTERIORES DE LA R.
ARGENTINA, 1950, tomo I.
Estudos Econ&micos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
295
TRIGO VERSUS ERVA-MATE
deste produto continuar a ser mencionado
nos acordos de forma especial deve-se a
sua importancia para a economia do estado do Mato Grosso — nos estados do
Paran5 e Santa Catarina o mate ficou reduzido a um papel de somenos importancia (MINISTIzRIO DE RELAQOES EXTERIORES DO BRASIL, 1940, p. 517).
modagao, eliminando-se o competitive e
estimulando-se o complementar. Nesse
sentido, foram introduzidos novos produtos inexistentes ou pouco desenvolvidos
em um e outro pafs, incluindo a importagao de tipos de mate pela Argentina que
nao concorressem com a produgao do territorio de Misiones.
Evidentemente, se o Brasil acabou aceitando a perda do mercado de mate na
Argentina foi porque o intercambio aco-
3. Situacao da Produgao
Mate Argentina
modou-se as novas perspectivas, tanto do
ponto de vista global como no referente as
economias dos estados sulinos. Correlatamente a oferta internacional de trigo sofreu
grandes flutuagoes a partir de 1933devidoa
problemas climiticos e de embarques durante a guerra.
Em 1939, desapareceram os excedentes
anuais (pela primeira vez desde 1928) devido a redugao propositada da produgao
que permitiu manter a proporgao entre a
importagao e o consumo. No perfodo
compreendido entre 1939 e 1945, a concorrencia exercida sobre a produgao nacional de erva-mate cancheada ficou circunscrita, de um lado, ao percentual de
mate importado do Parana e Santa Catarina e, de outro, a influencia dos estoques
existentes, que levaria muito mais tempo
para serem eliminados.
0 Estado do Mato Grosso evidenciava
adaptar-se a nova situagao comercial: a
exportagao de erva-mate cancheada nao se
reduziu, pelo contrario, mostrou um leve
aumento (de 11.500 ton. em 1930 para
14.002 ton. em 1940). Em comparagao
com o total de mate exportado pelo Brasil a participapao matogrossense elevou-se
de 9,87% para 50,83%, no perfodo (DADMAS, 1930, p. 21; CRYM, Memoria
1941, p. 50). For outro lado, o prego
manteve um bom mvel, com firme tendencia altista, o que leva a supor que este
Estado acumulou maiores benefrcios(21).
de
Erva-
Embora os efeitos da importagao diminufssem progressivamente, provocaram
prejufzos enquanto esta nao foi anulada e
nao se pode estipular, quando do estabelecimento das cotas anuais das colheitas argentinas, aquela parcela de consumo que
seria atendida mediante a redugao do estoque acumulado (vide tabela 13).
E importante ressaltar estes fatos visto
que, como se sabe, o real competidor do
mate argentine (quanto a qualidade e tipo) era aquele oriundo do Parang e Santa
Catarina, o mesmo nao ocorrendo com o
produto do Mato Grosso, de qualidade
superior e com sabor diferente do argenti-
O volume de mate importado tinha
sustentagao nos acordos de 1940 e 1943,
vistos anteriormente, ainda que estes nao
fossem seguidos a risca no tocante as
quantidades mmimas que deviam ser importadas.
ne.
Passando a outro aspecto, seria interessante verificar o efeito da estabilizagao
entre a oferta e a demanda alcangada na
economia ervateira, considerando-se que
esta foi, no primeiro tergo deste seculo, a
responsavel pelo impulse economico do
territorio de Misiones e sua principal fon-
Em vista do analisado ate aqui, pode-se
concluir que desde fins da decada de 30 o
intercambio comercial entre a Argentina e
o Brasil evoluiu no sentido de mutua aco(21)
298
Veja-se CRYM, Memdrias, anos de 1936
at6 1945.
te de renda. A esse respeito pode-se adiantar que o papel do Hex nessa regiao
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2):275-301, maio/ago. 1986
Malgesini & Coconi
TABELA 13
PERCENTUAIS DE ERVA-MATE COLOCADAS NO
MERCADO ARGENTINO PELOS DIFERENTES
SETORES OFERTANTES
Anos
Estoque Liberado por ano
Importagoes
dos Estados do
Sul do Brasil
Produgao Nacional
1939
13,23
11,83
74,94
1940
10,83
12,16
77,01
1941
10,49
1942
6,09
9,24
s/d
80,27
-
1943
6,99
s/a
-
1944
6,77
9,45
83,78
1945
10,76
8,05
81,19
Fonte: Elaboragao pr6pria com base em dados de Memdrias da
CR YM e do Mercado Consignat^rio.
parece ter sofrido alterapoes no pen'odo
em questao. Em primeiro lugar, a redupao
da produpao que, derivada do sistema de
cotas, deve ter provocado um correspondente decrescimo das areas cultivadas com
mate. Em segundo lugar, pode-se presumir
que as sucessivas limitacoes estipuladas
ocasionaram problemas nas pequenas explorapoes, no tocante ao mvel de rentabilidade. Finalmente, observa-se na decada
de 40 o surgimento de certa diversificapao
na agricultura misionera, o que poderia
estar indicando que parte dos produtores
tenha abandonado totalmente a cultura
do mate, substituindo-a por outra (por
exemplo, o tung, cuja area de plantio passou de 3.000 a 50.600 ha. entre 1936 e
1946), ou iniciando uma produgao mista.
De acordo com os dados da Revista de
Economi'a Argentina, os colonos de Oberci
e El Dorado (as duas colonias mais importantes do territ6rio) cultivavam simultaneamente naqueles anos o mate, a laranja,
o fumo e diversos produtos agn'colas e
animals para a propria subsistencia. Os
colonos que estavam radicados na regiao
hi pelo menos 15 anos eram os que se
dedicavam mais intensamente ao mate, enquanto que os novos colonos nao julgaram proveitoso iniciar esse cultivo, ou se
viram impedidos pela proibipao de plantio
de erva-mate, estabelecida em 1936 pela
CRYM. E por esses motives que a publi^
capao acima considerou que
"no espaqo de uma geracao e provave!
que nao se possa caracterizar esta regiao ervateira" (REVISTA DE ECONOMIA ARGENTINA, 1943, p. 430-31).;
Concretamente, parece que a produpao do
Hex deixou de ser o eixo economico da
economia do territorio de Misiones (ainda
que se mantivesse como a principal atividade), dando lugar a uma relativa diversificacao agncola.
4. O Estado Argentine e a "Questao
Regional" IViisionera nos Anos 30
Para a solupao da relapao conflitiva misionera-pampeana houve a atuagao de dois
processes relativamente simultaneos e vinculados entre si. O primeiro I externo.
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2)273-301, maio/ago, 1986
297
TRIGO VERSUS ERVA-MA TE
derivado da evolugao economica dos estados do Parana e de Santa Catarina, que se
orientou para a diversificagao de suas atividades, com o abandon© da monocultura
que havia deixado de ser rentavel. No
final dos anos 30, a erva-mate, similar
aquela produzida na Argentina, deixou de
ocupar um papel de destaque nas exportagoes brasileiras, enquanto se manteve a
exporta<?ao do mate tipo "forte" do Mato
G rosso, iniciando assim um processo de
adequacao as necessidades do mercado
consumidor argentino^2)>
0 segundo processo e poh'tico; diz respeito ao intercambio comercial com o
Brasil e a relagao inter-regional. Nesta ultima deve-se ter em mente duas caracten'sticas do setor empresarial de Misiones: a'
confluencia de vultosos capitals nacionais
e estrange!ros e o fato de o primeiro ser
resultado do reinvestimento de recursos
originarios de atividades fundamentals da
regiao central (do setor rural, do comercio
e do setor financeiro). A vinculagao desta
regiao com Misiones deu lugar a um acordo informal de interesses que nem sempre
podiam ser atuantes devido as flutuagoes
da economia internacional (reorganizadoras das aliangas internas) e aos conflitos
entre os diferentes grupos da propria regiao central^'
Durante a decada de 30 o comportamento do Estado com relagao a produgao
(22)
(23)
298
Do ponto de vista dos importadores argentinos, apesar destes terem se desenvolvido com base na importagao da erva
cancheada brasileira, supoe-se que suas
pressdes para com o governo diminufam
na medida em que sua atividade perdia
rentabilidade. Devido a isto e provavel
que os mesmos tenham desviado parte de
seus capitais para outras atividades como
a importagao de mate "forte" ou outros
produtos brasileiros.
O reoresentante tfpico de duplos interesses 6 Rafael Herrera Vegas (Ministro da
Fazenda de Alvear). um dos maiores
plantadores de ervais e propriet^rio de
mais de 110.000 hectares na provfncia de
Buenos Aires (1928).
ervateira sofreu modificagoes pelos motives ja expostos e que se traduziram na
alternancia de polCticas protecionistas e de
livre importagao. Ao avango registrado no
pen'odo Uriburu sobre os interesses do
comercio com o Brasil os empresdrios
agroindustriais tiveram que contrapor o
exito dos grupos filiados a Camara de
Comercio Argentino-Brasileira durante boa
parte do governo do Presidente Justo.
Seus ministros Duhan e Pinedo ja haviam
tido oportunidade de criticar duramente a
"industria parasitlria de Misiones" em
1932 e atuaram de forma coerente ao
manter vmculo prioritario com o Brasil. O
presidente Justo era de opiniao que
"Se queremos vender, nao podemos
deixar de ser compradores daquilo que
pode ser adquirido com a/guma vantage m" (ANALES DE LA UIA, 1933, p.
36).
0 desejo do Estado na defesa dos interesses da regiao central foi resumido claramente pelo Ministro da Agricultura (tambem presidente da CRYM) ao sustentar
que
"o interesse local de uma determinada
produgao nao pode ser um obstaculo
aos grandes interesses do pafs.
Devem-se considerar os interesses regionais
junto com os gerais, com o cuidado de
que ao proteger os regionais, nao se
comprometam os gerais" (CAMARA
DOS DEPUTADOS, 1938, tomo II).
Apesar destes fatos, nao se pode deduzir que o comportamento desses governos
seja um simples reflexo dos assuntos
"prioritarios" da regiao da pampa humeda, ja que sob esse ponto de vista nao
seria possi'vel entender as razoes da poli'tica de compensagao para o nordeste argentine e a tao empenhada procura de equih'brio^^. Talvez seja necessaria uma rein(24)
O "equilfbrio" como objetivo era um
conceito comum a m'vel de discurso, e o
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2)575-301, malo/ago. 1986
Malgesini &Coconi
terpretagao do conceito geral de ''intervenpao economica" nos anos 30, visto que
esta podera esclarecer diversos aspectos
das rela^oes entre o Estado e os diferentes
grupos dentro da classe empresarial argentina.
De um lado, tem-se a nova dimensao
da intervenpao, como sendo um aumento
do poder de iniciativa do Estado, o que
Ihe permitiu estruturar uma area de atividade aparentemente autonoma (MURMIS
& PORTATIERO, 1974, p. 43). De outro,
a concentrapao dos direitos de regulamentagao e poderes de decisao, resultante do
estabelecimento de diversas juntas e comissoes para as reformas impositiva e financeira, pode ser considerado como um
poderoso mecanismo de centralizapao,
atraves do qual a "ajuda" economica a
maioria das atividades produtivas regionais
redundaria em seu virtual controle pelo
governo central. Estas caracterfsticas do
intervencionismo estao intimamente ligadas ao caso de Misiones atraves do papel
poh'tico representado pelos grandes empresarios do setor de erva-mate.
Embora os produtores de mate nao tenham chegado a constituir uma ''burguesia provincial", arraigada regionalmente (a
exemplo da cuyana ou tucumana), e possfvel indentifica-los como grupo hegemonico pela sua capacidade de controle social e inexistencia de outra fonte de poder
local^^. Seguindo esta linha de raciocfnio e considerando a possibilidade de existirem aliangas poh'ticas a m'vel nacional.
Presidente Justo se expressava da seguinte
forma sobre as industrias nacionais: "o
problema deste diffcil aspecto do governo, principalmente em momentos de dis-.
tfirbios na economia universal, est5 em
encontrar o equilfbrio necessario, a forma
exata. "(ANALES DE LA UIA, 1933, p.
36).
(25)
Sua influencia sobre grande parte do territ6rio de Misiones vinha do controle que
exercia sobre uma significativa quantidade de colfinias que se desenvolveram em
terras de sua propriedade (as quais logo
deram origem a povoados importantes).
este setor (ligado a regiao central) deve
ter sido o representante do territdrio de
Misiones. Segundo esta linha de raciocfnio, levanta-se a hipotese de que havia
intenpao por parte do Estado de nao romper com essas bases poh'ticas, fato que
ocorreria caso apoiasse exclusivamente os
interesses comerciais com o Brasil. Uma
tendencia particularista acentuada teria
oferecido perigo i imagem de neutralidade
do governo e consequentemente a sua capacidade de mediar a alianca entre os interesses capitalistas dos diversos grupos
que se formaram nos anos 30.
«
A estavel articulapao do setor ervateiro
com essa alianca nacional teria sua origem
na cessao de parte do poder de centralizapao e controle do Estado sobre a economia de Misiones e isto foi provavelmente
um mecanismo de "compensapao" dos
prejui'zos gerados pela defesa do intercambio entre os dois pai'ses e tambem um
destacado fator de equih'brio.
Os grandes plantadores e moleiros ocuparam os principals postos na CRYM a
partir de 1936. Como diretores, figuraram: Pablo Allain (pelos produtores nao
associados, administrador dos ervais de
Otto Bemberg — mais de 1.000 ha. e um
moinho — tendo exercido o mesmo cargo
em Martin & Cia — mais de 1.000 ha. e
dois moinhos); Dr. Nicolas Avellaneda
(pelos grandes plantadores associados);
Andres Bugnioni (pelos plantadores, autorizado pelas cooperativas, apesar de nao
ser seu representante formal); Andres
Blanco (moleiro); Angel Nunez (importante plantador-moleiro de Pedro Nunez &
Cia, mais de 1.000 ha.); Ernesto Daumas
(membro da diretoria de Martin & Cia de
Rosario, mais de 1.000 ha. e moinhos);
Roberto Fernandez Beyro (pelos beneficiadores) e Jos6 Bogliolo (pelos consumidores)^^. Os pequenos plantadores e co(26)
CRYM. Memdria 1936-8 e Anuarios das
retagoes de sociedades andnimas, varios
anos. Na direcao da CRYM constavam
tambem cinco funcionarios, entre eles o
governador de Misiones.
Estudos Economicos, Sao Paulo, 16(2);275-301, maio/agq, 1986
299
TRIGO VERSUS ERVA-MATE
lonos praticamente ficaram sem representagao, apesar de explorarem a maior parte
dos ervais. Dado o rapido processo de
concentracao economica que se delineava
na regiao e na tentativa de center o poder
dos grandes empresarios agrupados na
CRYM, estes setores marginalizados decidiram estimular o cooperativismo, que
cresceu significativamente.
E possi'vel que este difi'cil processo de
ajuste misionero-pampeano possa inserir-se
em um context© mais amplo. A medida
que as repercussdes da evolucao economica internacional se traduziam, no crescimento da industria argentina, a capacidade poh'tica do Estado foi se reformulando. F Pinedo e o seu "Piano de Reactivacion Economica" apoiava o avango dos
interesses da produgao nacional em 1940,
mudando suas convicgoes liberais sobre as
"industrias ineficientes" e as "vantagens
comparadas"
Finalmente, a intengao do Estado de
nao se privar do apoio de um poderoso
setor empresarial (pela sua importancia regional e volume de seus negocios) somada
a necessidade de assegurar sua legitimidade como orgao formalmente autonomo
se uniram a um terceiro proposito: reformular as bases de integragao da economia
de Misiones em fungao da regiao polarizada pampeana. A CRYM, em conjunto
com os objetivos do governo local, desenvolveu linhas de credit© e subsi'dios paralelamente a contengao da produgao. Foi a
partir do controle quase total de sua economia, na base dos interesses do seu setor
empresarial e da concordancia com os requisites do mercado interne, cujo nucleo
era a regiao central, que a estabilizagao do
funcionamento do territorio periferico do
nordeste da Argentina foi conseguida.
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