-
454
!). Na hipótese, em exame, após a
morte d:> pai ad:>tivo, não se configurou sequer uma situação de fato em que
o pai natural, tendo sob sua guarda e
manutenção a filha menor, pudesse justificar o recebimento da pensão. Se em
matéria de previdência social as condições de fato preponderam multas vêzes
sôbre as situações simplesmente jurídicas, como nos casos de dependência econômica, nada se encontra no processo,
ainda sob êsse aspecto, que pudesse indicar a conveniência de deferir o recebimento da pensão ao pai natural. Ao
contrário, falecido o pai adotivo, a menor ficou na guarda e manutenção de
seu tio, atual tutor, e o motivo da adoção fôra mesmo o abandono em que )
pai natural deixara a filha, conforme
se infere da escritura a fls. 22.
BENS POBLICOS -
10. Em conclusão: o despacho da
Presidência da Caixa de Aposentadoria
e Pensões não encontra apoio em lei.
Deferiu o pagamento da pensão a quem
não representa legalmente a menor
que passou, com a morte do pai adotivr',
ao regime de tutela. O acórdão de fôlhas 82 e 83, do egrégio Conselho Superior de Previdência Social ao manter 2.
pensão concedida à dita menor e determinar à Caixa que entregue tôdas as
cotas, vencidas e vincendas, ao tutor,
bem decidiu a espécie e deve ser mantido. Improcede, assim, o recurso. E' ()
n03SO parecer. - Em 19 de outubro de
1955. - Lineu de Albuquerque Melo,
Consultor Jurídico. - Despacho: Nego
provimento ao recurso de fls. 85-87, na
forma dos pareceres.
Em 10 de novembro de 1955. - NJ,poleão de Alencastro Guimarães.
ENFITEUSE -
OCUPAÇÃO
- O aforamento não deve ser estendido a imóveis públicos senão
quando haja manifesta e comprovada conveniência.
MINISTÉRIO DA FAZENDA
PROCESSO N'
PARECER
O processo refere-se ao terreno rle
mangue extinto, localizado na rua Machado Coelho n' 104, nesta Capital (fôIha3 1 a 2\'.), o qual, em 24 de novembro de 1947, se achava inscrito, segundo
informações prestada pelo Serviço de Registro e Tombamento da Prefeitura d"
Distrito Federal, em nome de AuguStl
Alexandrina da Cunha (fls. 7).
2. Declarando que prometera vender,
a Paulino Soto Gonzales, o prédio e
terreno sitos no local acima, Válter Sarmento da Cunha pediu esclarecimentos
ao Serviço do Patrimônio da União, sôbre se se tratava de terreno alodial ou
158.674-53
foreiro (fls. 1). Decidiu então, o órgão referido, considerar "Válter Sa:-mento da Cunha como ocupante, cobrando-se-lhe, com multa, a taxa que
fôr fixada pela S. C., calculada a partir
de 1951" (fls. 8).
3. Com referência ao disposto no artigo 205 do Decreto-lei n' 9.760, de
5-9-46, consta a fls. 9 "que o terren()
em questão se acha fora da faixa ne
100 metros ao longo da costa marítima,
porém, dentro da circunferência de
1.320 ms. de raio em tôrno do Quartel
do Batalhão de Guardas".
4. Em se tratando de aplicação do
regime de aforameno (fls. 65), as consultas exigidas pelo art. 100 do diploma
-- 455-legal acima invocado deverão ser cumpridas, tendo em vista a proximidade de
estabelecimento militar.
5. Pelo Ofício n· 363, de 9-9-52, da
Secretaria Geral de Finanças da Prp.·
feitura do Distrito Federal (Depart.1mento do Patrimônio), depreende-se que
o imóvel em aprêço não se inclui entrE'
os que "estão livres de desapropriação
vigente ou futura, para execução de projetos de alinhamento aprovados". Não
satisfeitos com esta resposta, o S. P. U.
provocou nova audiência da Prefeitura
do Distrito Federal (fls. 45), a qual
ao que parece, não foi atendida. O ofício de fls. 45, entretanto, vale como
impugnação ao aforamento, uma vez que
não há interêsse para a Fazenda PÚblica em aforar terreno sujeito a desapropriação admitida em projeto já aprovado.
6. Para os fins de constituição de enfiteuse, o terreno foi medido e demarcado (fls. 54) e publicado edital (fls. 5J
e 60), embora ainda não conste do processo se foram efetuadas tôdas as publicações impostas no art. 104, pará·
grafo úni.:o, do Decreto-Iei n· 9.760
7. Válter Sarmento da Cunha pagl>u
taxas de ocupação desde 1921 (fls. 11).
17, 18, 19, 20 e 21) até 1952.
8. Ao terreno foi atribuído o valor
de Cr$ 121.300,00 (fls. 23-v.) e à benfeitoria Cr$ 10.200,00 (fls. 23 v.) .
9. Como se vê, o recente ocupante
que não reside no imóvel, mas na rua
Azevedo Lima n· 82 (fls. 1), nêle possui benfeitoria inferior a 10% de seu
valo~·.
10. O conjunto imobiliário - o te!"reno da União avaliado em Cr$ ..... .
121. 300,00 (fls. 23 v.) e a benfeitoria,
avaliada em Cr$ 10.200,00 (fls. 23 v.)
constituem objeto da escritura de vend:.1
a fls. 33, 34 e 35, realizada em 12 de
dezembro de 1952.
11. V álter Sarmento da Cunha não
se achava inscrito no imóvel; nêle pos-
sui benfeitorias nó valor de apenas Cr$
10.200,00; somente em 4-10-52 pagou
taxas de ocupação e pagou as devidas
desde 1921 (fls. 25); dois meses depois vendeu o imóvel por Cr$ 120.000,00
(fl3. 33).
12. Verifica-se que, na verdade, o
que V álter Sarmento da Cunha vendei}
foi apenas a benfeitoria, avaliada em
dez mil e duzentos cruzeiros. A diferen~a
que vai entre esta fração e a total da alienação (Cr$ 120.000,00) corresponde ao terreno de mangue extintn,
a cujo aforamento não poderia invocar
nenhuma preferência, pois não preenche
nenhum dos requisitos exigidos no artigo 105 do Decreto-lei n· 9.760.
13. Se a situação do interessado assim se apresentava, que fundamento legal, que motivos de interêsse público,
teria a Fazenda Nacional para lhe conceder o aforamento previsto no contrato iá minutado a fls. ? Parcce-n03 (Iue
nenhum e vamos esclarecer as razÕE's
desta nossa afirmativa.
14. O destino da enfiteuse, a sua
essência e razão de ser na ordem jurídica, é o de valorizar, pela cultura 001
a edincação, terrenos a que o dono náo
p~d
dar o aproveitamE'n"o adeouarlo
(Chironi, Istituzioni di Diritto Civüe
Italiano, voI. I, § 199; Lacerda de Almeida, Direito das Coisas, § 79; Lafayette, Direito das Coisas, voI. I, §
141; Carvalho Santos, Códi"o C'vil Brasileiro Interpretado, art. 680; Clóvis Beviláqua, Observações ao art. 680 do Código Civil). Esta é a concepção adotada
em nosso Código Civil, quando declara
que "só podem ser objeto de enfiteuse
terras não cultivadas, ou terrenos, que
se destinem à edificação".
15. A necessidade de melhoramento
do fundo enfitêutico, pelo cultivo ou a
edificação, é o que conserva a modermdade do emprazamento e faz com que,
n') dizer insuspeito de Cogliolo, embora
"condannato deZ romanticismo economico
456 deZ princlptO di quesro secow, é invece
uno dei contratti piú perfetti di fronte
alia prcs nte questione socialistita del
lavoro e delie mercedi".
16. A sabedoria de nossos legislado·
res conseguiu manter, nesse contratv
"sui gene ris" qui propriam habet naturam et figuram os traços que determinaram sua criação e lhe justificam ~
permanência. Sensível aos ensinamentos
da ciência econômica "que lhe não aprova a aplicação a prédios que o trabalh'l
já tornou capitais produtivos", o nosso
direito positivo soube impedir que o emprazamento se degradasse em fonte de
negócios alheios à finalidade do instituto. A forma da lei lhe defende a substância. Dir-se-ia que prevendo as especulações imobiliárias de que em qualquer
época se deparam os aproveitadores sem
escrúpulo, e nesta mais do que em outras, e objetivando impedir terras públicas de nelas serem abrangidas, o artigo 64, do Decreto-Iei n" 9.760, de 5 de
setembro de 1946, declara, em seu § 2":
"o aforamento se dará quando coexistirem a conveniência de radicar-se o indivíduo ao solo e a de manter-se o vínculo da propriedade pública".
17. Ora, o que se vê neste processo
e em vários outros que tivemos o ensejo de examinar, é a mais afrontosa
disparidade, entre o que a lei permite t'
o que dela pretendem interessados em
terras da União. Provemo-lo.
18. V álter Sarmento da Cunha, que
não era ocupante do terreno pelo m,!nos até dois meses antes de venflê-11J
(com o alvará do Serviço do Patrimônio da União, fls. . .. ) a Gonzalez; que
sôbre êle não exercia nenhum dos poderes inerentes ao domínio ou à propriedade, pois que não reside no imóvel
não o aproveita, nem o tinha inscrito
em seu nome; que não invocou sequel',
e que não pode fazê-lo, nenhum dos requisitos preferenciais enumerados no artigo 105 do Decreto-Iei nO 9.760, Valter
Sarmento da Cunha, possuindo no terreno uma benfeitoria avaliada em Cr$
10.000,00, pretende vender o conjunto
imobiliário por Cr$ 120,000,00.
19. O que êle objetiva vender é, em
resumo, um terreno da União, avaliado
em Cr$ 110.000,00 e a sua ínfima benfeitoria, que também merece a fls. l\
designação de prédio. :esse negócio não
se harmoniza com a lei, nem é da conveniência da Fazenda Nacional.
20. E como conseguiu arquitetar e a julgar pelo laudo de fls., essa é ":I.
única arquitetura ponderável que aparece no negócio - esta engenhosa operação?
21. Pagando, em 1952, as taxas de
ocupação desde 1921, de um terreno que
não ocupava, nem ocupa, pois êle se
achava inscrito em outro nome e o alienante reside em outro local;
22. Não residindo no imóvel, não ,l
ocupando, não lhe dando aproveitamento
que justifique a outorga de direitos enfitêuticos, V álter Sarmento da Cunha
não tinha por que se tornar ocupante c,
ainda menos, o que abusivamente pretende: converter em foreiro a pessoa li
quem, dois meses após pagar as taxas
de ocupação no S. P. U., declarou vender
o mesmo imóvel. A menção feita na escritura de fls. a direitos hereditários
não infirma estas considerações, pois )
de cujus não poderia transferir direitos que não possuía, ou que passariam
ao herdeiro nas condições precárias em
que jaziam nas mãos do anterior posseiro.
23. Se o imóvel se achava simplesmente ocupado, o que aliás é desmentid:>
pelos dados constantes do processo, v
que convém e compete à Fazenda PÚblica, é aplicar, à hipótese, os dispositivos legais que disciplinam a ocupação
de imóveis da União. Simplesn~.
Tanto basta para que as direitos de uma
e outra parte sejam garantidos.
457
24. 1!: claro que os mteressados se
inclinarão pelo aforamento, que lhes é
mais propício. Mas não é menos claro
que, em situaçã.:J como a que ora se depara, a Fazenda Pública deve ser inflexível na justa aplicação da lei, que
respeita os interêsses do patrimônio
nacional.
25. Não consta do processo que se
verifiquem, no caso, as condições exigidas no art. 64 do Decreto-lei n 9 9.760,
para a constituição da enfiteuse.
26. Embora a falta de inscrição não
isente o ocupante do pagamento da respectiva taxa (Decreto-lei n 9 9.760, artigo 128, parágrafo único), êste pagamento não deverá ser consentido se
tiver como objetivo e conseqüência, consoante sucede neste processo, criar
uma preferência a aforamento que não
convém à Fazenda Nacional. O que se
pretendeu foi burlar a lei e auferir lucro com um bem dominical. Sem ser
siquer ocupante ou, para sê-Io, pagando
taxas com trinta anos de atraso, Sarmento da Cunha consertou um estratagema para converter Gonzalez em foreiro, o que não deverá obter porqup
os requisitos exigidos no art. 64 do Decreto-lei n 9 9.760, não ocorrem em favor
de nenhum dos dois.
27. Havendo outros processos em
condições análogas a êste, somos levados a entrar em considerações atinente9
à aplicação do regime enfitêutico.
28. Contrato e, como tal, facultativo,
o aforamento não deve ser estendido a
imóveis públicos senão quando haja manifesta e provada conveniência. Desaconselha-o, presentemente, a desmedida
valorização imobiliária que ultimamente
se vem fazendo sentir entre nós e que
não parece já haver alcançado seu índice mais alto. E ainda há mais. Na
legislatura passada, transitava pelo Senado Federal um projeto de lei permitindo o resgate obrigatório dos aforamentos, em condições tão desvantajosas
à Fazenda Federal, que mereceu, d·,)
S. P. U., convincentes e fundamentadas
objeções.
29. Ademais, embora o objetivo principal visado no emprazamento não seja,
por parte da União, a percepção de renda, tal aspecto não pode ser menospl"t!zado. Por isso entendemos que, a não
ser quando coexistam, nos têrmos categóricos da lei, "a conveniência de radicar-se o indivíduo ao solo e a de manter-se o vínculo da propriedade pública",
dever-se-à preferir o regime de ocupação, não somente pelos motivos acima
expostos (item) senão, também, porque
o Serviço do Patrimônio da União nã.)
possui o cadastro, nem dos bens dominicais aforados, nem dos ocupados. E s0mente em face de elementos que permitissem aquilatar, com relativa exatidão,
a importância dêsses bens e sua renda
possível, seria lícito decidir 8Ôbre a aplicação de novos aforamentos, quando não
houve ainda possibilidade de conhecer
os já instituídos, inÚMeros dos quais em
fase de revigoração e outros inCUrsc.9
em comisso não declarado.
30. Em face do exposto, concluímos
que a constituição da enfiteuse somente
se faça naqueles casos em que os requisitos impostos no art. 64 do Decretolei n 9 9.760 sejam provados, o que não
sucede, 1Jerbi gratia, neste processo.
31. Os imóveis, que estiverem ocupados na forma prevista no artigo 61 e seguintes, e art. 127 e seguintes, do mesmo diploma legal, dever-se-ão manter
sob o regime de ocupação, após devidamente regularizada, se preciso. Tal manutenção é aconselhável, não sõmente
porque não convém, pelos fundamentos
atrás aduzidos, sejam agora celebrados
novos contratos de emprazamento, senão
também, porque, na forma que alvitramos, o erário haverá maior arrecadação, atendendo-se a que a taxa de
ocupante se eleva a 10% sôbre o valer
do domínio pleno do imóvel, devendo ser
-
458-
periodicamente atualizada (Decreto-lt'i
n· 9.760, art. 127, § 1..), enquanto ao
aforamento, que é perpétuo por defittição (Código Civil, art. 679), cabe, apenas, a pensão de 0,06% (Decreto-lei nú·
mero 9.760, art. 101).
32. Nada sofrem, com o que ora sugerimos, os interêsses de quem, por um
ou outro regime, se achar na posse d~
itnóveis públicos. Mas, êstes ficarão imunes às especulações e solertes exegeses
de que êste processo é um paradigma
ilustratIvo, inclusive pelas páginas quP.
lhe foram renumeradas, sem que tal e
grave providência fitasse expressa e d~
vidamentc consignada.
Procuradoria Geral da Fazenda PÚblica, em 12 de abril de 1955. - José
Sérgio Majó de Oliveira, Adjunto Je
Procurador.
*
Ao exame desta Procuradoria Geral
foi submetida a minuta de fls. 65 a 68,
referente à constituição de enfiteuse sôbre o terreno acrescido de marinha, situado à rua Machado Coelho n 9 104,
em favor de Paulino Soto Gonzalez, ::&
qual não mereceu aprovação, pelos fundamt!ntos largamente desenvolvidos no
parecer de fls. 72 a 79, onde estão indicadas omissões e irregularidades encontradas e onde se demonstra que no
caso, pretendem abusivamente a outorga
de um aforamento para legalizar especulação rendosa em tôrno de um imóvel
da União Federal. De fato, Válter Satmento da Cunha, alegando possuir benfeitoria correspondente a menos da décima parte do valor do terreno que, no
Serviço de Registro e Tombamento da
Prefeitura do Distrito Federal, estava
inscrito em nome de outrem, embor"l
não residindo no imóvel, conseguiu qU"l
o Serviço do Patrimônio da União .)
considerasse ocupante (fls. 8) e, pagando, em junto de 1952, as taxas de
ocupação de 1921 a 1952, obteve do mesmo Serviço, em novembro dêsse ano, a
cobrança de laudêmio sôbre o valor de
Cr$ 131.500,00, atribuído ao conjunto
imobiliário e autorização para a alienação a Paulino Soto Gonzalez do "direito
de ocupação sôbre o dito terreno", feit3.
por escritura de 12 de dezembro seguinte, juntamente com a venda das benfeitorias, avaliadas em Cr$ 10.200,00 (fôlhas 23 v.). Nenhum comentário precisa ser feito para se ter como certo
que V álter Sarmento da Cunha, sem te~'
qualquer direito sôbre o terreno acrescido de marinha da União Federal, arquitetou e realizou engenhosa operação
imobiliária pela qual transferiu direitos que não tinha e embolsou Cr$
109.800,00, que é a diferença entre o
preço indicado na escritura e o valor
da benfeitoria não pertencente à União.
2. Não se limita o douto parecer emitido pelo Dr. José Sérgio Majó de Oliveira à apreciação do caso de interêsse
de Paulino Soto Gonzales. Também expõe a debate, com a proficiência de sempre, assunto da mais alta relevância e
que grandemente atinge, pelas conclusões gerais, os superiores interêsses patrimoniais da União Federal.
3. f:sse aspecto, que influirá na orientaç'io a ser tomada, em caráter normativo, em matéria de constituição de
enfiteuse sôbre terrenos do patrimônio
nacional, merece o tratamento cuidados/)
que lhe deu o parecer em exame.
4. A tese aí sustentada é no sentido
de que não se celebrem novos contratos enfitêuticos senão nos casos de comprovada verificação dos requisitos lega\d
enumerados no art. 64, § 2·, do Decr"lto-lei n· 9.760, de 5 de setembro de
1946, mantendo-se sob o regitne de ocupação, devidamente regularizada, os im6veis da União Federal que se encontrarem na situação prevista nos arts. 61
e seguintes e 127 e seguintes do aludido
diploma legaL
5. A Procuradoria Geral a ela adere,
integralmente, como também adota, e.n
todos os seus pontos, as considerações
do parecer.
-
459-
6. Não há cabimento, aqui, para desenvolvida exposição histórica do instituto da enfiteuse. E' sabido que as instituições jurídicas nascem das situações
naturalmente criadas pela vida social.
Não constitui exceção o instituto da enfiteuse, que teve origem na necessidade
de ser alcançado o aproveitamento econômico do solo, quando o dono de grandes áreas de terras não poderia consegui-lo sem desmenbrá-las em pequenas
glebas e sem atribuir um direito real aos
que viessem dar efetivo desenvolvimento
a essas glebas, pela cultura e pela edificação. Se o senhor latifundiário não
se encontrava habilitado a aproveitar
as terras; se o desmembramento em lotes não constitui medida suficiente ao
aproveitamento porque o arrendamento
não assegurava garantia bastante ao arrendatário e a venda não encontrava
preço compensador, em virtude da falta
de capacidade financeira dos interessados; só uma solução seria satisfatória,
e esta o direito indicou pela criação do
instituto da enfiteuse. Essa figura jurídica se verifica com o desdobramento
do domínio em seus elementos essenciais
- de um lado o domínio direto e de outro o domínio útil - de modo a permitir
que o titular da propriedade, reservando
aquêle para si, confira a título perpétuo o domínio útil a quem puder dar
efetivo aproveitamento econômico à gleba, com a obrigação do pagamento de
pensão anual fixa, que mais não representa do que o reconhecimento periódico
do direito conservado pelo titular do dom;nio direto.
7. E' o que ensina o parecer precedente: "O destino da enfiteuse, a sua
essência e razão de ser na ordem jurídica, é o de valorizar, pela cultura ')u
a edificação, terras a que o dono não
pode dar o aproveitamento adequado".
8. Se é essa a essência da enfiteuse,
no exame dos textos legais não pode o
hermeneuta esquecê-Ia, porque, com,)
ainda acertadamente adverte o parecer
do Dl'. Sérgio Majó de Oliveira, "A sabedoria de nossos legisladores conseguiu
manter, nesse contrato "sui generis qui
propriam habet naturam et figuram"
os traços que determinaram sua criação
e lhe justificam a permanência. Sensível aos ensinamentos da ciência econômica que lhe não aprova a aplicação d.
prédios que o trabalho já tornou capitais prolutivos, o nosso direito positive.
soube impedir que o emprazamento qe
degradasse em fonte de negócios alheios
à finalidade do instituto. A forma da
lei lhe defende a substância".
9. Mesmo sem ter presente a conceituação jurídica do instituto da enfiteuse,
atestada pela sua origem histórica, o
aplicador da lei não poderia empresta:sentido diferente a texto legal tão claro
como o estampado no § 29 do art. 1}4
do Decreto-lei n 9 9.760:
"O aforamento se dará quando coexistirem a conveniência de radicar-se ;)
indivíduo ao solo e a de manter-se o vínculo da propriedade pública".
10. Dois são, portanto, os requisitos
que devem coexistir para tornar legítima
a constituição da enfiteuse sôbre terrenos do domínio nacional.
11. Onde ocorrerá a conveniência de
"radicar-se o indivíduo ao solo?" E' cla1'0: exclusivamente naqueles casos em
que o aproveitamento econômico do solo,
pela edificação ou pela cultura, não podendo ser realizado pelo Estado, não Q
seria pelo particular - sem possibilidade financeira de tornar-se titular tio
domínio pleno, pela compra, - a menos
que o Estado a êle outorgasse um direito real - o domínio útil - assecuratório da estabilidade que permitiria :\
efetiva utilização do solo.
Bastante duvidosa é a possibilidade
de ser demonstrada essa conveniência
quanto aos terrenos de marinha nes~a
Capital, pois não existirá foreiro algum,
ou pretendente ao emprazamento, sem
reais possibilidades financeiras de adquirir o domínio pleno, e, havendo tal
460 possIbilidade, deixará de existir a conveniência da constituição da enfiteus.',
que pressupõe, para o aproveitamento
econômico, a necessidade da outorga de
uma parcela do domínio a quem nã"
pode adquiri-lo pleno.
12. O outro requisito, cuja verificação deve ocorrer ao lado dêste, é o da
conveniência de "manter-se o vínculo da
propriedade pública". Também êsse re·
quisito dificilmente poderá ser comp':'\.vado, quer em relação às marinhas desta cidade, quer em relação aos terrenos
acrescidos.
13. A manutenção do vínculo da propriedade do Estado poderia justificar-se
ou pela conveniência de ficar subordinada a aquisição do domínio útil por elementos alienígenas à prévia autorizaçã.J
governamental, ou pela possibilidade de
se assegurar o direito de consolidação 1.0
titular do domínio direto.
14. Ora, a necessidade de defesa do
Estado contra a formação de extensos e
compactos núcleos estrangeiros pode
ocorrer nas faixas de fronteiras intt'riores, ou nas zonas litorâneas desertas;
nunca em uma cidade como o Rio de
Janeiro. Ademais, somente os aforamentos de terrenos situados dentro da faixa
de fronteiras, da de cem metros ao longl)
da costa marítima, ou de circunferênci:.1
com 1.320 metros de raio com centro em
fortificações ou estabelecimentos militares dependem de prévia licença do Presidente da República (Decreto-lei número 9.760, art. 205) e essa, normalmente,
é outorgada sem outra formalidade além
das provas da permanência em carábr
definitivo, do exercício de profissão e
do atestado de bons antecedentes e de
fôlha corrida. Se é tão precária a defesa contra possíveis elementos perniciosos de origem estrangeira, não se percebe a razão de impedí-Ios de adquirir,
juntamente com um apartamento, certa
fração ideal do domínio pleno de terrenlJ,
tanto mais quanto não é a plena propriedade do terreno que poderá consti-
tuir perigo à nacionalidade, mas a mera
utilização do imóvel, que poderá ser obtida mediante locação, e o poder público não dispõe de meios legais para
impedí-Ia.
15. Não deve ser esquecido que a
faixa de 33 metros a contar da preamar-média de 1831, que caracteriza os
terrenos de marinha (Decreto-Iei número 9.760, art. 29 ) não chega a atingir tôda a extensão de grande númen
dos lotes de terrenos situados em nossas
praias, mas apenas pequenas faixas nas
testadas, havendo lotes praianos que rle
marinhas não possuem qualquer área..
A êstes últimos não atingirá a medida
defensiva do art. 205 do Decreto-Iei número 9.760. Logo, é claro que tal medida não justificará a manutenção do
regime enfitêutico, nem quanto àqueles
lotes nem quanto aos totalmente constituídos pelos terrenos de marinha.
16. Não é preciso grande esfôrço para
mostrar que a hipótese de consolidação
do domínio pleno, pelo titular do dominio direto - segunda justificativa para
a adoção do regime de aforamento -é pràticamente inocorrente quanto aos
terrenos de marinha e seus acrescidos
desta cidade.
Para consolidar (Decreto-Iei n 9 9.760,
art. 103, § 3 9 ) , ficaria a União FI'!deral obrigada a indenizar ao enfiteuta
o valor do domínio útil acrescido do valor das benfeitorias, conjunto êsse que
se mede pelo valor total do imóvel menos quantia equivalente a vinte foros
e um laudêmio, que é o valor atribuíd'l
ao domínio direto. Ora, todos sabeLl
que o titular do domínio direto não es+á
e nunca estará em situação financeira
capaz de suportar essas indenizações
quanto a apreciável área de terrenos de
marinha. Se o interêsse nacional o exigir, não será somente a consolidação
quanto a determinado terreno, mas, pelo
menos, quanto a faixa respeitável e, nesse caso, o vulto do interêsse determinará
a adoção de medidas legislativas ade-
-
461-
quadas. Ademais, conforme foi salientado, grande número de terrenos de marinha constituem parte insignificante rle
lotes que compreendem, com êles, ter~
nos alodiais ou foreiros à Municipalidade; nesses casos, por meio da consolidação, pela qual indenizará o valor do
domínio útil e das benfeitorias, não terá
a União Federal, em troca, o domínb
pleno do lote, mas apenas o da parte
correspondente às marinhas, ficando na
absurda posição de condômino do prédio
e respectivo terreno, cuja parte alodial
ou foreira à Prefeitura do Distrito Federal se conservará fora de seu domínio.
17. Tudo quanto foi resumidamente
exposto mostra a convicção, em que se
acha a Procuradoria Geral, da impossibilidade de ser comprovada a coexistência dos dois requisitos legais, em relação aos terrenos de marinha e seus
acrescidos da cidade do Rio de Janeiro.
Melhor seria que, de acurado estudo a
ser realizado pelo Serviço do Patrimônio da União, proviesse a demonstração
da conveniência de ser alienado o domínio pleno de terrenos de marinha e acrescidos, situados em determinadas zonas,
para que, neste sentido, se solicta-~
a elaboração de lei. As observações procedentemente feitas no parecer do Doutor Adjunto, inclusive as referentes às
dificuldades de cadastro e de admini:r
tração dêsses terrenos (item 29) abonam essa conclusão.
18. E' Cl'rto que a utilização tradicional dos tprrenos de marinha tem sido
mediante a concessão de enfiteuse. Desde, porém, que venha a ser evidênciada
a conveniência da alienação do domínio
pleno, em certas zonas, terão desaparecido os pressupostos em que assentava
a tradição, que não deve ser confundida com simples rotina, de modo que
a persistência na adoção do regime d~
aforamento, só porque tradicional, não
mais se justificará, devendo ceder lugar a novo preceito legal que torne pos-
sível a alienação da propriedade do Estado.
19. Ao preceito do art. 105 do Decreto-Iei n' 9.760, parece estar sendo
dado entendimento desarrazoado, pelo
qual se supõe existir, em favor dos titulares da preferência, o direito de reclamar da União Federal a outorga d'l
aforamento e, da parte dessa entidade
política, a correlata obrigação de conatituir a enfiteuse. Nada mais errado.
E' inteiramente livre à União Federal
aplicar, ou não, aos terrenos compreendidos em determinada zona, o regime
enfitêutico. l!:sse direito pertence exclusivamente à União, como a ela toca, integralmente, a iniciativa e a apreciaçã'l
da conveniência e da oportunidade. Particular algum, ou entidade outra, é tititular de qualquer parcela dêsse direito,
de sorte que, em relação às pessoas enumeradas no art. 105, não lhes assiste
mais do que uma expectativa de se tornarem enfiteutas, se e quando a Uniã<,
deliberar, em caráter definitivo e a seu
exclusivo critério, instituir sôbre o terreno o regime enfitêutico. Deliberada
a constituição do aforamento, então surgirá para o titular da preferência o direito, a que corresponde, para a União
Federal, a obrigação de não outorgar ~
outrem a enfiteuse, em detrimento d,l
direito de quem a ela tem preferência.
legal.
20. Outro ponto merecedor de reparo
é o referente à competência legal para
decidir sôbre a aplicação do regime enfitêutico. Ela não pertence ao Serviço
do Patrimônio da União, e sim ao Pr~
sidente da República. O sistema legal,
nesse particular, é harmônico e claro.
21. Enuncia a lei em que casos a ul;ilização de bens imóveis da União F~
deral pode dar-se mediante aforament'>o
Está expresso no art. 64, § 2', do Decreto-lei n' 9.760: "quando coexistirem
a conveniência de radicar-se o indivídu:>
ao solo e a de manter-se o vínculo da
propriedade pública". Apurada a co-
462 existência dêsses dois requisitos, quan~f)
aos terrenos situados em determinada
zona, a aplicação do regime enfitêutic'l
não se dará sem que haja prévia autcrização para a mesma. A autorizaçãl)
há de emanar de ato explícito do Presidente da República, a menos que const~
de disposição legal expressa, como
determina o Decreto-lei n· 9.760, no
artigo 99. Concedida a autorização, nn,;
têrmos dêsse dispositivo legal, os ate>';
executórios, de mera aplicação do regime
a cada caso, é que competem ao Serviço
do Patrimônio da União, que fará ':l.S
consultas determinadas no art. 100, se
fôr o caso, e a seguir expedirá as notificações ordenadas no art. 104, procedendo às formalidades complementares
definidas nos arts. 107 e seguinte.
22. Nas minutas organizadas peb
Serviço do Patrimônio da União, como
a que se vê a fls. 60, cláusula 2', se
declara que o aforamento foi concedido
"por despacho do Sr. Chefe da Delegacia do Serviço do Patrimônio", "nos tê',,mos do art. 105, ns ... " do Decreto-lei
n· 9.760. Mas não está certo: o dispositivo citado menciona a preferência i;,
enfiteuse cuja constituição tenha sido
autorizada pelo Presidente da República ou permitida em expressa disposiçã)
legal, como exige o art. 99. Se existe
a lei ou o despacho presidencial autori·
zativo deve figurar no contrato: se não
existe, é indispensável sua prévia ohtenção.
23. De tudo quanto foi dito parece
bem esclarecido que a Procuradoria Geral reputa indispensável a realização de
acurado estudo sôbre a destinação a ser
dada aos terrenos de marinha e seus
acrescidos, principalmente os situados
nesta Capital, a fim de ser definido '3e
é mais conveniente aos interêsses da
União Federal:
a) a alienação do domínio pleno, que
pode compreender apenas os localizados
em determinadas zonas, hipótese que exi·
girá mensagem pela qual seja solicitada
ao Congresso Nacional a feitura de lei
autorizativa;
b) a aplicação do regime enfitêutico,
pela demonstração da coexistência dúa
dois requisitos legais definitivos no § 2·
do art. 64 do Decreto-lei nO 9.760, com
a indicação das zonas em que tal regime
se justificará, lembrado que recente despacho presidencial (Diário Oficial de 12
de abril de 1955, pág. 6.671) impõe
rigor na opção pelo aforamento, quand.>
declara: "os argumentos apresentadoJ
na exposição de motivos não parecem
abonar o estabelecimento do regime d~
enfiteuse na zona em estudo, que repre-.
sentaria pelo caráter perpétuo do instituto a alienação definitiva do domíni.>
útil de terrenos do patrimônio nacional,
cuja valorização futura é de se esperar".
No caso de justificar a escolha do regime de aforamento, se imporá a obtenção de prévia autorização presidencial,
nos têrmos do art. 99;
c) a manutenção do regime de ocupação, devidamente regularizada, na forma legal, o que se afigura preferível
ao regime de aforamento, pelas considerações expendidas no parecer de fôlhas 72 a 79, que a Procuradoria Geral
adota in totum.
24. Encaminhe-se à apreciação da
Diretoria Geral.
Procuradoria Geral da Fazenda PÚblica, em 20 de abril de 1955. - Pedro
Teixeira Soares Júnior, Procurador
Geral.
*
A ocupação é uma situação de fai:o
que a lei procurou regularizar, de modo
a assegurar o interêsse da Fazenda. Foi,
assim, criada como instituto intermediário entre a disponibilidade e o aforamento com caráter transitório.
2. Entretanto, as condições econômIcas vigentes aconselham a permanência
ou o prolongamento desta situaç:ío rebzcs
sic stantibus.
N essas condições, esta Diretoria Geral
aprova as conclusões do parecer da Prl)-
-463 curadoria Geral, à qual restitui o processo.
Em 17 de junho de 1955. Sá Filho, Diretor-Geral.
ASSOCIAÇÃO DE SERVIDORES CIVIS DO BRASIL SÃO DE SERVIÇO PúBLICO
Francis~o
CONCES-
É concedida à Associação de SeTVido1'es Civis do Brasa autorização
para realizar a Exposição Internacional de Indústria e Comércio, nos
têrmos do Decreto-lei n 9 9.880, de 1946.
MINISTÉRIO DO TRABALHO, INDúSTRIA E COMÉRCIO
PARECER
Consta do presente processo o pedido
da Ass3ciação dos Servidores do Brasil,
no sentido de lhe ser dada concessii\J
para organizar e realizar a Exposição
Internacional de Indústria e Comércio,
tudo na forma do disposto no Decretolei nO 9.880, de 16-9-1946, e na do Regulamento aprovado pelo Decreto número 21.980, de 25-10-46.
Estão juntos ao pedido um exemplar
da legislação e Estatuto da mesma associação, cartas dos Presidentes da Confederação Nacional da Indústria e Ih
Confederação Nacional de Comércio, C(\.'l·
cedendo patrocínio à iniciativa; um projeto de regulamento da exposição; plantas das edificações a serem feitas e qua
compreenderão uma área total superipr
a 10.000 m2 para instalação dos stands
e demais dependência da Exposição.
Está junta, ainda, uma relação dos membros da Diretoria, do Conselho Fiscal
e do Conselho Deliberativo da Associação.
Como se vê dos elementos constantes
do pedido, a Associação é uma sociedade civil reconhecida pelo Decreto-lei
)'l. 8.012, de 12-9-4'>, como entidade máxima de direção das atividades sociais
e desportivas dos servidores públicos cc
tôdas as órbitas do Govêrno. Ainda pela
Lei nO 2.339, de 20 de novembro dp.
1954, foi a mesma incIu:da entre as ent;dades consignatárias de que trata a Lei
r- Y 1.046, de 2 de janeiro de 1950.
Em ofício constante do processo
M. T. I. C. 197.974-45 anexo, o Sr. Mi·
nistro da Educação dirige-se ao Sr. Ministro do Trabalho manifestando apoio
à iniciativa, depois de declarar qUE' a
Associação é idônea, financeira e socia!mente.
Isto pôsto :
Parece, à primeira vista, estranho que
uma sociedade de caráter social e não
econômico, chame a si uma atividads
que tem como objetivo, para usar a definição constante do seu projeto de regulamento, "a difusão da produção nacional, demonstrando ainda, através dos
índices, o progresso alcançado não somente pela indústria e pelo comércio,
bem como os níveis de produção estrangeira que possam estimular os empreendimentos nacionais".
As razões dessa iniciativa se encontram no pedido: ao fim dos períodos
de realização das exposições, os prédios
reverterão à plena posse do Centro de
Educação Física e Cultural, instituídJ
pelo Decreto nO 27.413, de 18-11-194!"1
e que constitui um departamento da
Associação (art. I", parágrafo único, do
Decreto nO 27.413 citado).
Mas a lei não estabelece restrições,
nem diz a que entidades se poderá dar
a concessão porque o art. I" do Decreto nO 9.880, de 16 de setembro d~
1946, que instituiu referido certame, d~
clara que o mesmo poderá ser dado em
concessão a entidade brasileira com pel'Bonalidade jurídica, que ofereça condições de êxito ao emprendimento e conte
com o patrocínio da Confederação Na-