sábado, 31 de janeiro de 2009

O que falta

Às vezes não nos falta muito, mas parece que sempre achamos que falta mais do que um pouco.

Completa

Alguns diriam
que ela era
uma mulher completa

Outros alegariam
que faltava-lhe
uma perna

Em casa,
após vestir a calça,
ela dobrava com esmero
o lado da perna vazia

A mulher,
completa ou incompleta,
dava seus passos
de muleta

No domingo,
ela ia ao cinema
e pensava como seria a vida
na próxima segunda-feira.

Sérgio Medeiros

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Soldadinho

Eis que me encontro aqui diante da complexa tarefa de postar algo no blog!

Escolhi então falar sobre o soldadinho, que é um rapaz bravo e corajoso.
Quando era pequeno li um livro sobre outro bravo soldadinho, que nasceu sem uma perna e se apaixonou pela bailarina.


Soldadinho de Chumbo

Um soldadinho de chumbo,
desses que eu nunca vi,
mas se encontram nos livros,
avança solene e segue em frente.

Lá vai o soldadinho,
para mais uma batalha.
Esta, dizem, nem é das mais difíceis.
Dizem, também, que o soldadinho
logo estará de volta.

O soldadinho marcha e faz planos:
pintar a casa de azul,
mandar carta para a mãe
e noivar no fim do ano.

Engraçado esse soldadinho,
que faz seus planos no escuro,
e sonha mais do que eu,
do que você e do que o moço
da loja de seguros.

Sérgio Medeiros

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Amarelo

Muitas vezes eu não sei muito o que fazer ou para onde ir e tenho sempre a sensação que deveria estar fazendo algo diferente ou ir para outro lugar.

Tenho um pensamento do tipo "happiness is always somewhere else" (a felicidade está sempre em algum outro lugar), que se por um lado te faz buscar coisas novas, por outro não te deixa aproveitar muito o momento.


Amarelo

O amarelo dourado
é coberto pelo azul.

O azul cobre e descobre.

Os pés no amarelo fofo
caminham com dificuldade,
para chegar aonde
não sabem se querem ir.

Talvez sigam o vento,
que vem de longe,
e longe sempre é um bom lugar
com o qual se pode sonhar
e fazer planos,
que nunca cairiam bem
se fossem para acontecer
na vila vizinha.

Sérgio Medeiros

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Triste

Como hoje à noite não estou lá muito contente, achei que era uma boa hora para uma poesia nessa linha.

Quando leio esse poema, por alguma razão me lembro de Manuel Bandeira.


Poema triste

Queria fazer um poema triste
Que chorasse baixinho
abafando os soluços
e suas lágrimas no escuro

Um poema que falasse pouco
A tristeza, não nos permite
andar a falar.
Não essa!

Essa é daquelas tristezas
que te deixam lânguido
tristeza que faz você
cansar dos homens

Tristeza que lhe aperta
e te pede estrelas
e te pede luzes
te pede amigos
te pede amores

tristeza que te pede tudo
e te deixa mudo.

Sérgio Medeiros

sábado, 3 de janeiro de 2009

Vovozinha esquecida

Esses dias, fui visitar minha avó. Da última vez que a tinha visitado, ela não lembrava muito de nomes, mas lembrava das pessoas.

Desta vez, lembrava pouca coisa. Eu não estava entre as coisas de que ela se lembrava, eu era apenas "o rapaz".


Vovozinha esquecida

Vovozinha esquecida
não se lembra do netinho.

Mesmo fazendo algum esforço
não consegue lembrar do neto um pouco.

Não lembra que já lhe fez doces,
lhe assou bolachas
e fez suco de carambola.

Agora nem sabe
qual das filhas
é a mãe daquele neto.

Muita coisa para um dia só!
Deixe o neto, que chegou de viagem, descansar.
Vovozinha vai dormir
e com certeza sonhar
com o tempo em que os filhos eram pequenos,
que ainda não era viúva
e cuidava das suas galinhas.

Amanhã, netinho, vou lembrar
você não perde por esperar.

Sérgio Medeiros