This article analyzes the ambiguities present in the memories of Chief Jerônimo recorded in di er... more This article analyzes the ambiguities present in the memories of Chief Jerônimo recorded in di erent research contexts. A leader in the Terreno dos Caboclos during the rst half of the 20th century, before the administrative demarcation of the Xakriabá Indigenous Lands, he worked in a scenario where land use regimes were based mainly on investment in work and concern for the maintenance of a common patrimony. In Santos (1997a), the narratives attribute to the chief a certain carelessness in relation to granting land use rights to the baianos. In another ethnographic situation, marked by family stories, the chief's trajectory is presented, highlighting his empathy and hospitality in welcoming outsiders (Jardim, 2022). We seek to emphasize the complexity of the work of framing memory, analyzed it in a double counterpoint, encompassing the historical transformations and the ethnographic situations that give rise to the narratives.Finally, we show how memories and their frameworks shed highlight on the territorialization processes that crossed the Terreno dos Caboclos, seen as temporalities that communicate with each other, and in their disharmonious and un nished nature.
O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações com... more O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações com o ser xakriabá. Toma-se como objeto as narrativas sobre a trajetória de uma família extensa. A luta pela terra e pela afirmação identitária, entrelaçada a uma abordagem biográfica, recuperam o vínculo dos parentes com o território, os movimentos de idas e vindas em busca de trabalho e o retorno/volta à terra de origem. A análise é guiada pelos conceitos êmicos estar no e viver o território.
O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá... more O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá-os irmãos Célia Xakriabá e Edgar Kanaykõ-sobre suas trajetórias acadêmicas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Egressos do curso de Formação Intercultural para Educadores Indígenas (Fiei), os interlocutores tecem considerações a respeito de seus percursos formativos na primeira turma da licenciatura indígena (2009-2013). Tomo como base suas trajetórias individuais para trazer reflexões sobre como tem sido percebida a presença indígena na Universidade. A orientação metodológica ampara-se na história oral, uma vez que os relatos foram elaborados a partir da organização idiossincrática das memórias pelos sujeitos históricos sobre suas trajetórias acadêmicas. Dá-se ênfase nas experiências individuais explorando uma abordagem etnobiográfica (Gonçalves, Marques e Cardoso, 2012). Ademais, o registro das narrativas foi realizado nos anos 2015 e 2016 e por esse motivo, em retrospecto, os relatos pautaram os desafios enfrentados e as estratégias adotadas pelos estudantes ao inserirem-se no espaço acadêmico e a ausência de um programa específico do governo (como o Programa Bolsa Permanência/ MEC) para subsidiar a permanência dos estudantes na Universidade. Ao trazer vozes que falam de um passado recente sobre uma conjuntura diferente da vivida atualmente pelos estudantes indígenas brasileiros, o artigo pretende trazer contribuições para se pensar em que medida os desafios enfrentados antes do Programa Bolsa Permanência apresentam continuidades e descontinuidades em relação à contemporaneidade.
FLUXOS MIGRATÓRIOS, PRÁTICAS RITUAIS E TRADIÇÃO DE CONHECIMENTO: uma biografia familiar xakriabá, 2022
Este trabalho foi realizado com integrantes de uma família extensa do povo indígena Xakriabá, loc... more Este trabalho foi realizado com integrantes de uma família extensa do povo indígena Xakriabá, localizada na aldeia Barreiro Preto, situada na Terra Indígena Xakriabá, macrorregião norte mineira. Tem como proposta apresentar formas de ser xakriabá através de memórias que retomam relações de parentesco, o estar no território e práticas rituais. A contribuição desta etnografia se dá na compreensão dessas formas não como traduções a partir da fronteira étnica, mas como expressões que destacam a família como unidade sociológica. Parte do investimento etnográfico consistiu em recuperar a trajetória de familiares chegantes a partir de uma abordagem genealógica e biográfica. No caso em análise, esses chegantes, também notados como retirantes, teriam partido da região de Brejo do Amparo (atual município de Januária) e se estabelecido no Terreno dos Caboclos em um contexto de recente promulgação da Lei de Terras (1850). Durante o início do século XX, teriam procurado formas de permanecer no território através de alianças matrimoniais, compadrios/ comadrios e do trabalho na terra. Trouxeram consigo conhecimentos que recuperam experiências anteriores ao fluxo migratório, como a da leitura e escrita e da devoção ao catolicismo. Essas práticas foram ressignificadas, são performadas e transmitidas por seus descendentes, especialmente através das rezas e do Reis, sendo entendidas como herança dos finados. Trazem à cena complexidades que expandem os rituais em si, já que atualizam as relações de parentesco iniciadas pelos chegantes, entre
outros aspectos. O destaque dado às memórias individuais ressalta a agência não como um reflexo da deflagração de um processo identitário, de escolhas políticas pelos diacríticos étnicos, e sim como compartilhamento de valores morais construídos dentro de circuitos rituais interfamiliares.
O trabalho é resultante da pesquisa realizada junto a dois estudantes-pesquisadores xakriabá irmã... more O trabalho é resultante da pesquisa realizada junto a dois estudantes-pesquisadores xakriabá irmãos, Célia e Edgar. Tomo como alvo de estudo as narrativas elaboradas por eles sobre suas trajetórias acadêmicas na licenciatura indígena da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Tendo como material de análise entrevistas que realizei junto aos irmãos xakriabá e arquivos pessoais que reúnem suas produções acadêmicas, busco refletir, de maneira mais geral, sobre como se dá a inserção e permanência de indígenas na universidade. Particularmente, discuto sobre como se deram suas iniciações à vida acadêmica, como se perceberam e se viram percebidos na universidade, assim como a constituição da identidade do eu-pesquisador durante suas formações. Coloco em evidência o processo de elaboração de seus trabalhos acadêmicos (TCC), as narrativas sobre a escolha de seus temas de pesquisa, sobre os possíveis usos da antropologia empreendidos quando em situação de pesquisa, assim como a receptividade de seus trabalhos acadêmicos junto à comunidade acadêmica e indígena. Procuro, com isso, trazer reflexões a respeito da inserção do acadêmico indígena na universidade, suas práticas de pesquisa e trabalhos acadêmicos.
Esse trabalho objetiva tecer considerações sobre a trajetória acadêmica e produção intelectual de... more Esse trabalho objetiva tecer considerações sobre a trajetória acadêmica e produção intelectual de Célia Xakriabá, notória liderança do movimento indígena brasileiro. Célia graduou-se na licenciatura indígena Fiei (Formação Intercultural Para Educadores Indígenas) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tornou-se mestre pelo Mestrado em Sustentabilidade Junto à Povos e Territórios Tradicionais (MESPT) da Universidade de Brasília (UnB) e atualmente cursa o doutorado em Antropologia pela UFMG (PPGAN-Programa de Pós Graduação em Antropologia). Em sua trajetória, a liderança acionou epistemes e recursos linguísticos próprios do regime de conhecimento xakriabá em seus trabalhos acadêmicos. Sua escrita acadêmica, orientada por elementos encontrados majoritariamente na oralidade xakriabá, como o português xakriabá e as Loas, com alguma resistência é entendida como escrita científica. Tal escrita não está prevista na gramática acadêmica ocidental já que recorre a frases longas, a repetição de ideias, a discordâncias verbais e de gênero, ao uso de pronomes que transitam na primeira pessoa do singular (eu) e do plural (nós) e a uma poética para se fazer inteligível. O inusitado da presença indígena traz consigo outras formas de produção de escritas, de conhecimentos, de resistência. Acredito que uma das contribuições intelectuais de Célia está em subverter a ordem hegemônica da escrita entendida como acadêmica. Palavras-Chave: Xakriabá; escrita; meio acadêmico; trajetória. This paper aims to make considerations about the academic trajectory and intellectual production of Célia Xakriabá, notorious leadership of the Brazilian indigenous movement. Celia undergraduated in Fiei (Intercultural Training for Indigenous Educators) at the Federal University of Minas Gerais (UFMG), graduated in the Master of Sustainability with the Traditional Peoples and Territories (MESPT) of the University of Brasilia (UnB) and currently pursuing a doctorate in Anthropology from UFMG (PPGAN-Postgraduate Program in Anthropology). In her trajectory, the leadership has trigger the epistemes and linguistic resources of the xakriabá knowledge regime in her academic work. Her academic writing, guided by elements found mostly in Xakriabá orality, such as Portuguese Xakriabá and the Loas, with some resistance is understood as scientific writing. Such writing is not preview in Western academic grammar as it uses long sentences, repetition of ideas, verbal and gender disagreements, use of first-person of singular (I) and plural (We) pronouns, and the poetics to make it intelligible. The unusual of the indigenous presence brings with it other forms of writing production, of knowledge, of resistance. I believe one of Célia's intellectual contributions is to subvert the hegemonic order of writing understood as academic.
O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá... more O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá –os irmãos Célia Xakriabáe Edgar Kanaykõ -sobre suas trajetórias acadêmicas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Egressos do curso de Formação Intercultural para Educadores Indígenas (Fiei), os interlocutores tecem considerações a respeito de seus percursos formativosna primeira turma da licenciatura indígena (2009-2013). Tomo como base suas trajetórias individuais para trazer reflexões sobre como tem sido percebida a presença indígena na Universidade. A orientação metodológica ampara-se na história oral, uma vez que os relatos foram elaborados a partir da organização idiossincrática das memórias pelos sujeitos históricos sobre suas trajetórias acadêmicas. Dá-se ênfase nas experiências individuais explorando uma abordagem etnobiográfica (Gonçalves, Marques e Cardoso, 2012). Ademais, o registro das narrativas foi realizado nos anos 2015 e 2016 e por esse motivo, em retrospecto, os relatos pautaram os desafios enfrentados e as estratégias adotadas pelos estudantes ao inserirem-se no espaço acadêmico e a ausência de um programa específico do governo (como o Programa Bolsa Permanência/ MEC) para subsidiar a permanência dos estudantes na Universidade. Ao trazer vozes que falam de um passado recente sobre uma conjuntura diferente da vivida atualmente pelos estudantes indígenasbrasileiros, o artigo pretende trazer contribuições para se pensar em que medida os desafios enfrentados antes do Programa Bolsa Permanência apresentam continuidades e descontinuidades em relação à contemporaneidade.
O presente ensaio fotográfico retrata expressões do
catolicismo do povo indígena Xakriabá, locali... more O presente ensaio fotográfico retrata expressões do catolicismo do povo indígena Xakriabá, localizado no município de São João das Missões (norte de Minas Gerais). Apresenta-se imagens de rezas, cultos e cenáculos da aldeia Barreiro Preto e de personagens centrais na perpetuação da tradição católica local. Os regimes de conhecimento acionados para transmitir a Palavra de Deus aos fiéis também são mencionados. Em um breve texto, entremeado às fotos legendadas, destaca-se o catolicismo xakriabá como uma religiosidade engendrada pelos fiéis, frenteiros e rezadores sintetizada na sentença “Aqui o povo faz”.
O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações na ... more O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações na constituição do ser xakriabá. Toma-se como objeto as narrativas sobre a trajetória de uma família extensa. A luta pela terra e pela afirmação identitária, entrelaçada a uma abordagem biográfica, recuperam o vínculo dos parentes com o território, os movimentos de idas e vindas e o retorno/volta à terra de origem. A análise é guiada pelos conceitos êmicos estar no/ viver o território e retorno.
ABSTRACT: The article aims to analyze the relationships between mobility and territoriality and its implications for the constitution of the Xakriabá being. It is taken as an object the narratives about the trajectory of an extended family. A struggle for land and for the identity affirmation, introduced in a biographical approach, recovered or the relatives' bond with the territory, the movements of coming and going and return to the original land. The analysis is guided by the concepts of being in the territory/ living it and return.
Com a intenção de registrar e tornar pública as considerações feitas por Célia Xakriabá
acerca da... more Com a intenção de registrar e tornar pública as considerações feitas por Célia Xakriabá acerca da atual conjuntura governamental brasileira me vi instigada a realizar essa entrevista. Considerando também a relevância da temática sob a qual versa esse dossiê e a restrita circulação das narrativas indígenas em revistas acadêmicas, percebo as colocações de Célia Xakriabá como significativas para repensarmos o nosso lugar como não indígenas ante o cenário político que se configura. As narrativas encontradas aqui foram guiadas por perguntas elaboradas previamente e abordam as ameaças declaradas aos povos indígenas desde que o presente governo assumiu a presidência. Célia, uma liderança jovem de atuação expressiva no movimento indígena nacional, percebe os discursos oficiais como ações que promovem o desmantelamento de políticas que até então garantiam o direito dos povos indígenas ao território, à educação e à saúde. Também nota que, em retaliação a expressividade indígena contrária a retirada de direitos conquistados, artifícios extra oficiais são mobilizados atentando a integridade física dos povos indígenas. Essas questões e outras estão presentes na entrevista. Antes de apresentar a entrevista em si, retomo alguns elementos biográficos de Célia, assim como breves comentários acerca da história do povo Xakriabá.
This article analyzes the ambiguities present in the memories of Chief Jerônimo recorded in di er... more This article analyzes the ambiguities present in the memories of Chief Jerônimo recorded in di erent research contexts. A leader in the Terreno dos Caboclos during the rst half of the 20th century, before the administrative demarcation of the Xakriabá Indigenous Lands, he worked in a scenario where land use regimes were based mainly on investment in work and concern for the maintenance of a common patrimony. In Santos (1997a), the narratives attribute to the chief a certain carelessness in relation to granting land use rights to the baianos. In another ethnographic situation, marked by family stories, the chief's trajectory is presented, highlighting his empathy and hospitality in welcoming outsiders (Jardim, 2022). We seek to emphasize the complexity of the work of framing memory, analyzed it in a double counterpoint, encompassing the historical transformations and the ethnographic situations that give rise to the narratives.Finally, we show how memories and their frameworks shed highlight on the territorialization processes that crossed the Terreno dos Caboclos, seen as temporalities that communicate with each other, and in their disharmonious and un nished nature.
O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações com... more O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações com o ser xakriabá. Toma-se como objeto as narrativas sobre a trajetória de uma família extensa. A luta pela terra e pela afirmação identitária, entrelaçada a uma abordagem biográfica, recuperam o vínculo dos parentes com o território, os movimentos de idas e vindas em busca de trabalho e o retorno/volta à terra de origem. A análise é guiada pelos conceitos êmicos estar no e viver o território.
O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá... more O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá-os irmãos Célia Xakriabá e Edgar Kanaykõ-sobre suas trajetórias acadêmicas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Egressos do curso de Formação Intercultural para Educadores Indígenas (Fiei), os interlocutores tecem considerações a respeito de seus percursos formativos na primeira turma da licenciatura indígena (2009-2013). Tomo como base suas trajetórias individuais para trazer reflexões sobre como tem sido percebida a presença indígena na Universidade. A orientação metodológica ampara-se na história oral, uma vez que os relatos foram elaborados a partir da organização idiossincrática das memórias pelos sujeitos históricos sobre suas trajetórias acadêmicas. Dá-se ênfase nas experiências individuais explorando uma abordagem etnobiográfica (Gonçalves, Marques e Cardoso, 2012). Ademais, o registro das narrativas foi realizado nos anos 2015 e 2016 e por esse motivo, em retrospecto, os relatos pautaram os desafios enfrentados e as estratégias adotadas pelos estudantes ao inserirem-se no espaço acadêmico e a ausência de um programa específico do governo (como o Programa Bolsa Permanência/ MEC) para subsidiar a permanência dos estudantes na Universidade. Ao trazer vozes que falam de um passado recente sobre uma conjuntura diferente da vivida atualmente pelos estudantes indígenas brasileiros, o artigo pretende trazer contribuições para se pensar em que medida os desafios enfrentados antes do Programa Bolsa Permanência apresentam continuidades e descontinuidades em relação à contemporaneidade.
FLUXOS MIGRATÓRIOS, PRÁTICAS RITUAIS E TRADIÇÃO DE CONHECIMENTO: uma biografia familiar xakriabá, 2022
Este trabalho foi realizado com integrantes de uma família extensa do povo indígena Xakriabá, loc... more Este trabalho foi realizado com integrantes de uma família extensa do povo indígena Xakriabá, localizada na aldeia Barreiro Preto, situada na Terra Indígena Xakriabá, macrorregião norte mineira. Tem como proposta apresentar formas de ser xakriabá através de memórias que retomam relações de parentesco, o estar no território e práticas rituais. A contribuição desta etnografia se dá na compreensão dessas formas não como traduções a partir da fronteira étnica, mas como expressões que destacam a família como unidade sociológica. Parte do investimento etnográfico consistiu em recuperar a trajetória de familiares chegantes a partir de uma abordagem genealógica e biográfica. No caso em análise, esses chegantes, também notados como retirantes, teriam partido da região de Brejo do Amparo (atual município de Januária) e se estabelecido no Terreno dos Caboclos em um contexto de recente promulgação da Lei de Terras (1850). Durante o início do século XX, teriam procurado formas de permanecer no território através de alianças matrimoniais, compadrios/ comadrios e do trabalho na terra. Trouxeram consigo conhecimentos que recuperam experiências anteriores ao fluxo migratório, como a da leitura e escrita e da devoção ao catolicismo. Essas práticas foram ressignificadas, são performadas e transmitidas por seus descendentes, especialmente através das rezas e do Reis, sendo entendidas como herança dos finados. Trazem à cena complexidades que expandem os rituais em si, já que atualizam as relações de parentesco iniciadas pelos chegantes, entre
outros aspectos. O destaque dado às memórias individuais ressalta a agência não como um reflexo da deflagração de um processo identitário, de escolhas políticas pelos diacríticos étnicos, e sim como compartilhamento de valores morais construídos dentro de circuitos rituais interfamiliares.
O trabalho é resultante da pesquisa realizada junto a dois estudantes-pesquisadores xakriabá irmã... more O trabalho é resultante da pesquisa realizada junto a dois estudantes-pesquisadores xakriabá irmãos, Célia e Edgar. Tomo como alvo de estudo as narrativas elaboradas por eles sobre suas trajetórias acadêmicas na licenciatura indígena da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Tendo como material de análise entrevistas que realizei junto aos irmãos xakriabá e arquivos pessoais que reúnem suas produções acadêmicas, busco refletir, de maneira mais geral, sobre como se dá a inserção e permanência de indígenas na universidade. Particularmente, discuto sobre como se deram suas iniciações à vida acadêmica, como se perceberam e se viram percebidos na universidade, assim como a constituição da identidade do eu-pesquisador durante suas formações. Coloco em evidência o processo de elaboração de seus trabalhos acadêmicos (TCC), as narrativas sobre a escolha de seus temas de pesquisa, sobre os possíveis usos da antropologia empreendidos quando em situação de pesquisa, assim como a receptividade de seus trabalhos acadêmicos junto à comunidade acadêmica e indígena. Procuro, com isso, trazer reflexões a respeito da inserção do acadêmico indígena na universidade, suas práticas de pesquisa e trabalhos acadêmicos.
Esse trabalho objetiva tecer considerações sobre a trajetória acadêmica e produção intelectual de... more Esse trabalho objetiva tecer considerações sobre a trajetória acadêmica e produção intelectual de Célia Xakriabá, notória liderança do movimento indígena brasileiro. Célia graduou-se na licenciatura indígena Fiei (Formação Intercultural Para Educadores Indígenas) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tornou-se mestre pelo Mestrado em Sustentabilidade Junto à Povos e Territórios Tradicionais (MESPT) da Universidade de Brasília (UnB) e atualmente cursa o doutorado em Antropologia pela UFMG (PPGAN-Programa de Pós Graduação em Antropologia). Em sua trajetória, a liderança acionou epistemes e recursos linguísticos próprios do regime de conhecimento xakriabá em seus trabalhos acadêmicos. Sua escrita acadêmica, orientada por elementos encontrados majoritariamente na oralidade xakriabá, como o português xakriabá e as Loas, com alguma resistência é entendida como escrita científica. Tal escrita não está prevista na gramática acadêmica ocidental já que recorre a frases longas, a repetição de ideias, a discordâncias verbais e de gênero, ao uso de pronomes que transitam na primeira pessoa do singular (eu) e do plural (nós) e a uma poética para se fazer inteligível. O inusitado da presença indígena traz consigo outras formas de produção de escritas, de conhecimentos, de resistência. Acredito que uma das contribuições intelectuais de Célia está em subverter a ordem hegemônica da escrita entendida como acadêmica. Palavras-Chave: Xakriabá; escrita; meio acadêmico; trajetória. This paper aims to make considerations about the academic trajectory and intellectual production of Célia Xakriabá, notorious leadership of the Brazilian indigenous movement. Celia undergraduated in Fiei (Intercultural Training for Indigenous Educators) at the Federal University of Minas Gerais (UFMG), graduated in the Master of Sustainability with the Traditional Peoples and Territories (MESPT) of the University of Brasilia (UnB) and currently pursuing a doctorate in Anthropology from UFMG (PPGAN-Postgraduate Program in Anthropology). In her trajectory, the leadership has trigger the epistemes and linguistic resources of the xakriabá knowledge regime in her academic work. Her academic writing, guided by elements found mostly in Xakriabá orality, such as Portuguese Xakriabá and the Loas, with some resistance is understood as scientific writing. Such writing is not preview in Western academic grammar as it uses long sentences, repetition of ideas, verbal and gender disagreements, use of first-person of singular (I) and plural (We) pronouns, and the poetics to make it intelligible. The unusual of the indigenous presence brings with it other forms of writing production, of knowledge, of resistance. I believe one of Célia's intellectual contributions is to subvert the hegemonic order of writing understood as academic.
O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá... more O presente artigo tem como objetivo apresentar narrativas elaboradas por dois estudantes xakriabá –os irmãos Célia Xakriabáe Edgar Kanaykõ -sobre suas trajetórias acadêmicas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Egressos do curso de Formação Intercultural para Educadores Indígenas (Fiei), os interlocutores tecem considerações a respeito de seus percursos formativosna primeira turma da licenciatura indígena (2009-2013). Tomo como base suas trajetórias individuais para trazer reflexões sobre como tem sido percebida a presença indígena na Universidade. A orientação metodológica ampara-se na história oral, uma vez que os relatos foram elaborados a partir da organização idiossincrática das memórias pelos sujeitos históricos sobre suas trajetórias acadêmicas. Dá-se ênfase nas experiências individuais explorando uma abordagem etnobiográfica (Gonçalves, Marques e Cardoso, 2012). Ademais, o registro das narrativas foi realizado nos anos 2015 e 2016 e por esse motivo, em retrospecto, os relatos pautaram os desafios enfrentados e as estratégias adotadas pelos estudantes ao inserirem-se no espaço acadêmico e a ausência de um programa específico do governo (como o Programa Bolsa Permanência/ MEC) para subsidiar a permanência dos estudantes na Universidade. Ao trazer vozes que falam de um passado recente sobre uma conjuntura diferente da vivida atualmente pelos estudantes indígenasbrasileiros, o artigo pretende trazer contribuições para se pensar em que medida os desafios enfrentados antes do Programa Bolsa Permanência apresentam continuidades e descontinuidades em relação à contemporaneidade.
O presente ensaio fotográfico retrata expressões do
catolicismo do povo indígena Xakriabá, locali... more O presente ensaio fotográfico retrata expressões do catolicismo do povo indígena Xakriabá, localizado no município de São João das Missões (norte de Minas Gerais). Apresenta-se imagens de rezas, cultos e cenáculos da aldeia Barreiro Preto e de personagens centrais na perpetuação da tradição católica local. Os regimes de conhecimento acionados para transmitir a Palavra de Deus aos fiéis também são mencionados. Em um breve texto, entremeado às fotos legendadas, destaca-se o catolicismo xakriabá como uma religiosidade engendrada pelos fiéis, frenteiros e rezadores sintetizada na sentença “Aqui o povo faz”.
O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações na ... more O artigo pretende analisar as relações entre mobilidade e territorialidade e suas implicações na constituição do ser xakriabá. Toma-se como objeto as narrativas sobre a trajetória de uma família extensa. A luta pela terra e pela afirmação identitária, entrelaçada a uma abordagem biográfica, recuperam o vínculo dos parentes com o território, os movimentos de idas e vindas e o retorno/volta à terra de origem. A análise é guiada pelos conceitos êmicos estar no/ viver o território e retorno.
ABSTRACT: The article aims to analyze the relationships between mobility and territoriality and its implications for the constitution of the Xakriabá being. It is taken as an object the narratives about the trajectory of an extended family. A struggle for land and for the identity affirmation, introduced in a biographical approach, recovered or the relatives' bond with the territory, the movements of coming and going and return to the original land. The analysis is guided by the concepts of being in the territory/ living it and return.
Com a intenção de registrar e tornar pública as considerações feitas por Célia Xakriabá
acerca da... more Com a intenção de registrar e tornar pública as considerações feitas por Célia Xakriabá acerca da atual conjuntura governamental brasileira me vi instigada a realizar essa entrevista. Considerando também a relevância da temática sob a qual versa esse dossiê e a restrita circulação das narrativas indígenas em revistas acadêmicas, percebo as colocações de Célia Xakriabá como significativas para repensarmos o nosso lugar como não indígenas ante o cenário político que se configura. As narrativas encontradas aqui foram guiadas por perguntas elaboradas previamente e abordam as ameaças declaradas aos povos indígenas desde que o presente governo assumiu a presidência. Célia, uma liderança jovem de atuação expressiva no movimento indígena nacional, percebe os discursos oficiais como ações que promovem o desmantelamento de políticas que até então garantiam o direito dos povos indígenas ao território, à educação e à saúde. Também nota que, em retaliação a expressividade indígena contrária a retirada de direitos conquistados, artifícios extra oficiais são mobilizados atentando a integridade física dos povos indígenas. Essas questões e outras estão presentes na entrevista. Antes de apresentar a entrevista em si, retomo alguns elementos biográficos de Célia, assim como breves comentários acerca da história do povo Xakriabá.
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outros aspectos. O destaque dado às memórias individuais ressalta a agência não como um reflexo da deflagração de um processo identitário, de escolhas políticas pelos diacríticos étnicos, e sim como compartilhamento de valores morais construídos dentro de circuitos rituais interfamiliares.
catolicismo do povo indígena Xakriabá, localizado no
município de São João das Missões (norte de Minas
Gerais). Apresenta-se imagens de rezas, cultos e
cenáculos da aldeia Barreiro Preto e de personagens
centrais na perpetuação da tradição católica local.
Os regimes de conhecimento acionados para
transmitir a Palavra de Deus aos fiéis também são
mencionados. Em um breve texto, entremeado às
fotos legendadas, destaca-se o catolicismo xakriabá
como uma religiosidade engendrada pelos fiéis,
frenteiros e rezadores sintetizada na sentença “Aqui
o povo faz”.
ABSTRACT: The article aims to analyze the relationships between mobility and territoriality and its implications for the constitution of the Xakriabá being. It is taken as an object the narratives about the trajectory of an extended family. A struggle for land and for the identity affirmation, introduced in a biographical approach, recovered or the relatives' bond with the territory, the movements of coming and going and return to the original land. The analysis is guided by the concepts of being in the territory/ living it and return.
acerca da atual conjuntura governamental brasileira me vi instigada a realizar essa entrevista. Considerando
também a relevância da temática sob a qual versa esse dossiê e a restrita circulação das
narrativas indígenas em revistas acadêmicas, percebo as colocações de Célia Xakriabá como significativas
para repensarmos o nosso lugar como não indígenas ante o cenário político que se configura.
As narrativas encontradas aqui foram guiadas por perguntas elaboradas previamente e abordam
as ameaças declaradas aos povos indígenas desde que o presente governo assumiu a presidência.
Célia, uma liderança jovem de atuação expressiva no movimento indígena nacional, percebe os discursos
oficiais como ações que promovem o desmantelamento de políticas que até então garantiam
o direito dos povos indígenas ao território, à educação e à saúde. Também nota que, em retaliação
a expressividade indígena contrária a retirada de direitos conquistados, artifícios extra oficiais são
mobilizados atentando a integridade física dos povos indígenas. Essas questões e outras estão presentes
na entrevista. Antes de apresentar a entrevista em si, retomo alguns elementos biográficos
de Célia, assim como breves comentários acerca da história do povo Xakriabá.
outros aspectos. O destaque dado às memórias individuais ressalta a agência não como um reflexo da deflagração de um processo identitário, de escolhas políticas pelos diacríticos étnicos, e sim como compartilhamento de valores morais construídos dentro de circuitos rituais interfamiliares.
catolicismo do povo indígena Xakriabá, localizado no
município de São João das Missões (norte de Minas
Gerais). Apresenta-se imagens de rezas, cultos e
cenáculos da aldeia Barreiro Preto e de personagens
centrais na perpetuação da tradição católica local.
Os regimes de conhecimento acionados para
transmitir a Palavra de Deus aos fiéis também são
mencionados. Em um breve texto, entremeado às
fotos legendadas, destaca-se o catolicismo xakriabá
como uma religiosidade engendrada pelos fiéis,
frenteiros e rezadores sintetizada na sentença “Aqui
o povo faz”.
ABSTRACT: The article aims to analyze the relationships between mobility and territoriality and its implications for the constitution of the Xakriabá being. It is taken as an object the narratives about the trajectory of an extended family. A struggle for land and for the identity affirmation, introduced in a biographical approach, recovered or the relatives' bond with the territory, the movements of coming and going and return to the original land. The analysis is guided by the concepts of being in the territory/ living it and return.
acerca da atual conjuntura governamental brasileira me vi instigada a realizar essa entrevista. Considerando
também a relevância da temática sob a qual versa esse dossiê e a restrita circulação das
narrativas indígenas em revistas acadêmicas, percebo as colocações de Célia Xakriabá como significativas
para repensarmos o nosso lugar como não indígenas ante o cenário político que se configura.
As narrativas encontradas aqui foram guiadas por perguntas elaboradas previamente e abordam
as ameaças declaradas aos povos indígenas desde que o presente governo assumiu a presidência.
Célia, uma liderança jovem de atuação expressiva no movimento indígena nacional, percebe os discursos
oficiais como ações que promovem o desmantelamento de políticas que até então garantiam
o direito dos povos indígenas ao território, à educação e à saúde. Também nota que, em retaliação
a expressividade indígena contrária a retirada de direitos conquistados, artifícios extra oficiais são
mobilizados atentando a integridade física dos povos indígenas. Essas questões e outras estão presentes
na entrevista. Antes de apresentar a entrevista em si, retomo alguns elementos biográficos
de Célia, assim como breves comentários acerca da história do povo Xakriabá.