Por: Juan Torres López
Professor da Faculdade de C. Económicas da Universidade de Sevilha.
in: Ganas de escribir 17 de Abril de 2013
Mais trampas do Banco Central Europeu para encobrir Merkel
Há alguns dias publiquei um artigo mostrando como o presidente do Banco Central
Europeu havia apresentado aos líderes europeus dados sobre a evolução da
produtividade e dos salários em diferentes países que estavam manipulados ou
manifestavam uma tremenda falta de conhecimentos de questões económicas básicas
( Las trampas de Draghi para bajar salarios ). Qualifiquei esse
facto como uma aldrabice, porque dessa forma se confundiam as pessoas para poder
levar por diante propostas que não têm nenhum outro fundamento a não ser a
ideologia neoliberal de quem as propõe.
Agora temos novamente que denunciar outra publicação do Banco Central Europeu cujos resultados confundem a população e são difundidos para ajudar a política reaccionária da Sra. Merkel e seu governo, determinados a justificar a sua guerra económica contra a Europa dizendo aos seus compatriotas que a negligência dos países do Sul da Europa obriga as famílias alemãs, que são as mais pobres, a pagar os seus excessos.
Diversos meios de comunicação tão influentes como The Wall Street Journal, Financial Times e o Frankfurter Allgemeine têm reproduzido nos últimos dias um trabalho publicado pelo Banco Central Europeu na revista Statistics Paper ( "The Eurosystem Household Finance and Consumption Survey, Results from the First Wave" ) em que se quantifica a riqueza das famílias dos países europeus mostrando que a das alemãs é menor do que a dos outros países da periferia europeia.
Os títulos destes artigos são significativos: "Ricos cipriotas, pobres alemães" Reiche Zyprer, arme Deutsche ), em Frankfurter Allgemeine ; "Os mais pobres da Europa? Olhe para o Norte." ( Europe's Poorest? Look North ) em The Wall Street Journal; ou " Os pobres alemães cansados de resgatar a zona euro "( Poor Germans tire of bailing out eurozone ) no Financial Times.
Mas este estudo que serve para proclamar aos quatro ventos como é injusto que sejam precisamente os alemães a pagar a dívida destes países que têm famílias mais ricas, tem truque. Como acabam de demonstrar os pesquisadores Paul De Grauwe e Juemey Ji num artigo publicado no Social Europe Journal ( Are Germans Really Poorer Than Spaniards, Italians And Greeks? ), os dados que o Banco Central Europeu apresenta neste estudo não permitem tirar semelhantes conclusões, porque se referem à mediana da riqueza das famílias estudadas e não à riqueza média.
Para aqueles que não estão habituados a estes conceitos, mostrarei a diferença com um exemplo simples.
Suponhamos que se trata de comparar a riqueza das famílias de dois países A e B e que a riqueza das cinco famílias do país A é 12, 13, 14, 15, 16 e a das famílias do país B é de 7, 8, 9, 10, 71.
A mediana é o valor da variável que tem acima e abaixo o mesmo número de observações. Assim, no país A a riqueza mediana seria 14 e no país B seria 9.
Vejamos porque é incorrecto dizer que as famílias do país A são mais ricas do que os do B, ou que o país A é mais rico que o B.
Se em lugar da mediana tomarmos a média (média das observações, ou seja, o resultado da divisão do valor total pelo número de famílias) conclui-se que a riqueza familiar média no país A é 14, enquanto nas famílias do país B é 21.
O que aconteceu é lógico: a mediana "escondeu" a grande riqueza que se acumula na quinta família do país B.
Este simples exemplo permite verificar, portanto, que o que importa não é a mediana (neste caso, da riqueza), mas sim ter em conta a diferença que há entre a mediana e a média porque essa diferença é que indica o grau de desigualdade entre as variáveis observadas.
No exemplo, vê-se claramente que o país B que aparece como mais pobre se a riqueza for medida pela mediana, é na realidade muito mais rico.
No seu comentário ao estudo do BCE, de Grauwe e Ji mostram que, se se levar em conta a desigualdade, os resultados a que se chega são outros. Assim, provam que a diferença entre a riqueza dos 20% das famílias mais ricas e os 20% das mais pobres é 149 para 1, na Alemanha, uma desigualdade entre dez e quinze vezes maior do que a registada em Espanha, Itália, Grécia ou Portugal, por exemplo.
Portanto, não se pode dizer, como se faz, que as famílias alemãs, como um todo, são mais pobres do que as dos outros países. Ao dizer isso, está-se a esconder que na Alemanha a riqueza das famílias está muito mais concentrada que nos outros países e que uma pequena parte das famílias, os muito ricos, detém a maior parte da riqueza.
Além disso, de Grauwe e Ji indicam que observar apenas a riqueza das famílias, quando se pretende tirar conclusões sobre como é injusto um país resgatar outro, também não é muito adequado. Afirmam, justamente, que se deveria levar em conta, para além da riqueza das famílias, aquela que detêm as empresas e o governo.
Acontece que na Alemanha a parcela da riqueza total que corresponde às famílias, em relação à das empresas e do sector público, é menor que em outros países europeus.
Se a riqueza for vista como um todo, e não apenas na família, por exemplo, através do stock de capital per capita, acontece que a da Alemanha é quase o dobro da que corresponde a países como Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda e até Itália.
Em suma, mais uma vez o Banco Central Europeu engana, difundindo uma visão parcial da realidade, que é usada pelos grandes meios de comunicação para apoiar a estratégia do governo alemão, orientada para favorecer cada vez mais as suas grandes corporações e bancos.
O BCE é um instrumento dos grandes grupos empresariais e financeiros da Europa, cujo melhor representante político é o actual governo alemão, e neste momento isso é demonstrado pela ajuda na ocultação de que o que acontece na Alemanha não é que o país como um todo, ou todas as suas famílias, estejam a empobrecer por causa dos países do Sul. É outra coisa: há cada vez mais famílias alemãs a empobrecer, mas porque a riqueza se concentra em cada vez menos ricos alemães. Alemães ricos, que também o são devido à pilhagem que as suas empresas e bancos, com a inestimável ajuda do Banco Central Europeu, efectuam nos países do Sul.
Merkel e o seu governo são não só o inimigo número um da Europa como também da imensa maioria dos alemães.
Agora temos novamente que denunciar outra publicação do Banco Central Europeu cujos resultados confundem a população e são difundidos para ajudar a política reaccionária da Sra. Merkel e seu governo, determinados a justificar a sua guerra económica contra a Europa dizendo aos seus compatriotas que a negligência dos países do Sul da Europa obriga as famílias alemãs, que são as mais pobres, a pagar os seus excessos.
Diversos meios de comunicação tão influentes como The Wall Street Journal, Financial Times e o Frankfurter Allgemeine têm reproduzido nos últimos dias um trabalho publicado pelo Banco Central Europeu na revista Statistics Paper ( "The Eurosystem Household Finance and Consumption Survey, Results from the First Wave" ) em que se quantifica a riqueza das famílias dos países europeus mostrando que a das alemãs é menor do que a dos outros países da periferia europeia.
Os títulos destes artigos são significativos: "Ricos cipriotas, pobres alemães" Reiche Zyprer, arme Deutsche ), em Frankfurter Allgemeine ; "Os mais pobres da Europa? Olhe para o Norte." ( Europe's Poorest? Look North ) em The Wall Street Journal; ou " Os pobres alemães cansados de resgatar a zona euro "( Poor Germans tire of bailing out eurozone ) no Financial Times.
Mas este estudo que serve para proclamar aos quatro ventos como é injusto que sejam precisamente os alemães a pagar a dívida destes países que têm famílias mais ricas, tem truque. Como acabam de demonstrar os pesquisadores Paul De Grauwe e Juemey Ji num artigo publicado no Social Europe Journal ( Are Germans Really Poorer Than Spaniards, Italians And Greeks? ), os dados que o Banco Central Europeu apresenta neste estudo não permitem tirar semelhantes conclusões, porque se referem à mediana da riqueza das famílias estudadas e não à riqueza média.
Para aqueles que não estão habituados a estes conceitos, mostrarei a diferença com um exemplo simples.
Suponhamos que se trata de comparar a riqueza das famílias de dois países A e B e que a riqueza das cinco famílias do país A é 12, 13, 14, 15, 16 e a das famílias do país B é de 7, 8, 9, 10, 71.
A mediana é o valor da variável que tem acima e abaixo o mesmo número de observações. Assim, no país A a riqueza mediana seria 14 e no país B seria 9.
Vejamos porque é incorrecto dizer que as famílias do país A são mais ricas do que os do B, ou que o país A é mais rico que o B.
Se em lugar da mediana tomarmos a média (média das observações, ou seja, o resultado da divisão do valor total pelo número de famílias) conclui-se que a riqueza familiar média no país A é 14, enquanto nas famílias do país B é 21.
O que aconteceu é lógico: a mediana "escondeu" a grande riqueza que se acumula na quinta família do país B.
Este simples exemplo permite verificar, portanto, que o que importa não é a mediana (neste caso, da riqueza), mas sim ter em conta a diferença que há entre a mediana e a média porque essa diferença é que indica o grau de desigualdade entre as variáveis observadas.
No exemplo, vê-se claramente que o país B que aparece como mais pobre se a riqueza for medida pela mediana, é na realidade muito mais rico.
No seu comentário ao estudo do BCE, de Grauwe e Ji mostram que, se se levar em conta a desigualdade, os resultados a que se chega são outros. Assim, provam que a diferença entre a riqueza dos 20% das famílias mais ricas e os 20% das mais pobres é 149 para 1, na Alemanha, uma desigualdade entre dez e quinze vezes maior do que a registada em Espanha, Itália, Grécia ou Portugal, por exemplo.
Portanto, não se pode dizer, como se faz, que as famílias alemãs, como um todo, são mais pobres do que as dos outros países. Ao dizer isso, está-se a esconder que na Alemanha a riqueza das famílias está muito mais concentrada que nos outros países e que uma pequena parte das famílias, os muito ricos, detém a maior parte da riqueza.
Além disso, de Grauwe e Ji indicam que observar apenas a riqueza das famílias, quando se pretende tirar conclusões sobre como é injusto um país resgatar outro, também não é muito adequado. Afirmam, justamente, que se deveria levar em conta, para além da riqueza das famílias, aquela que detêm as empresas e o governo.
Acontece que na Alemanha a parcela da riqueza total que corresponde às famílias, em relação à das empresas e do sector público, é menor que em outros países europeus.
Se a riqueza for vista como um todo, e não apenas na família, por exemplo, através do stock de capital per capita, acontece que a da Alemanha é quase o dobro da que corresponde a países como Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda e até Itália.
Em suma, mais uma vez o Banco Central Europeu engana, difundindo uma visão parcial da realidade, que é usada pelos grandes meios de comunicação para apoiar a estratégia do governo alemão, orientada para favorecer cada vez mais as suas grandes corporações e bancos.
O BCE é um instrumento dos grandes grupos empresariais e financeiros da Europa, cujo melhor representante político é o actual governo alemão, e neste momento isso é demonstrado pela ajuda na ocultação de que o que acontece na Alemanha não é que o país como um todo, ou todas as suas famílias, estejam a empobrecer por causa dos países do Sul. É outra coisa: há cada vez mais famílias alemãs a empobrecer, mas porque a riqueza se concentra em cada vez menos ricos alemães. Alemães ricos, que também o são devido à pilhagem que as suas empresas e bancos, com a inestimável ajuda do Banco Central Europeu, efectuam nos países do Sul.
Merkel e o seu governo são não só o inimigo número um da Europa como também da imensa maioria dos alemães.