Teoria da cadeia lateral
A teoria da cadeia lateral (do alemão Seitenkettentheorie) é uma teoria proposta por Paul Ehrlich (1854–1915) para explicar a resposta imune nas células vivas. Ehrlich teorizou ainda nos princípios da sua carreira como investigador que a estrutura química poderia ser utilizada para explicar porque ocorria a resposta imunitária como reação a uma infeção. Acreditava ele que as toxinas e antitoxinas eram substâncias químicas numa época em que se sabia muito pouco sobre a sua natureza. A teoria explica a interação dos anticorpos e dos antígenos no sangue, e como os anticorpos são produzidos.[1]
História
[editar | editar código-fonte]Em 1891, Paul Ehrlich começou a trabalhar no recentemente criado Instituto Robert Koch de Berlim por convite do próprio Robert Koch.[2] Em 1896 foi criado um novo ramo instituição, o Instituto para a Investigação e Comprovação do Soro (Institut für Serumforschung und Serumprüfung) em Frankfurt, e Ehrlich foi o seu director fundador.[3] Investigou sobre as antitoxinas para a difteria e a sua união a anticorpos no sangue. Hipotetizou que os anticorpos se unem aos antígenos por meio de estruturas químicas especiais que chamou de "cadeias laterais" (entretanto, mais tarde ele próprio viria a denominá-las "receptores"). Tomando prestado um conceito usado por Emil Fischer em 1894 para explicar a interação entre uma enzima e o seu substrato, Ehrlich propôs que a união do receptor a um agente infeccioso era como o acoplamento entre uma chave e uma fechadura. Publicou a primeira parte da sua teoria da cadeia lateral em 1897, e na sua forma completa em 1900 numa conferência que dirigiu à Sociedade Real de Londres.[4]
Postulado
[editar | editar código-fonte]A teoria de Ehrlich pode resumir.se aos seguintes postulados:[5]
- Os anticorpos produzem os leucócitos do sangue de forma normal e actuam como cadeias laterais (receptores) na sua membrana plasmática.
- Cada anticorpo possui uma especificidade para interagir com um determinado antígeno.
- A interação antígeno-anticorpo ocorre por uma união exata por meio das cadeias laterais.
Conceito
[editar | editar código-fonte]Ehrlich supôs que as células vivas tinham cadeias laterais da mesma maneira que os corantes tinham cadeias laterais que estavam realacionadas com as suas propriedades para dar cor. Estas cadeias laterais podem ligar-se a uma determinada toxina (ou a um antígeno), de igual mode que Emil Fischer propunha para as enzimas e substratos, "como uma chave e uma fechadura."[6]
Ehrlich teorizou que uma célula que esteja a ser atacada por uma toxina produz mais cadeias laterais adicionais que se unem à toxina, e que estas cadeias laterais adicionais desprendem-se para formar os anticorpos que circulam pelo corpo. Segundo esta teoria, a superfície dos glóbulos brancos do sangue está coberta por muitas cadeias laterais que formam ligações quimicas com os antígenos. Para qualquer determinado antígeno, existe pelo menos uma destas cadeias laterais que se unem a ele, o que estimula a célula a produzir mais cadeias desse mesmo tipo, que depois seriam liberadas na corrente sanguínea como anticorpos. Segundo Ehrlich, um anticorpo poderia ser considerado uma etiqueta ou marca tridimensional microscópica de forma irregular, que se uniria a um antíxgeno específico, mas não a outras células do organismo. Foram estes anticorpos que Ehrlich veio a descrever como "balas mágicas", ums agentes que se unem especificamente a toxinas ou patógenos sem danificar o corpo.[7][8]
Ehrlich sugeriu que a interação entre um agente infeccioso e o receptor unido à célula induziria a célula a produzir e libertar mais receptores com a mesma especificidade. Segundo a teoria de Ehrlich, a especificidade do receptor era determinada antes da sua exposição ao antígeno, e o antígeno selecionava o receptor apropriado. Finalmente, provou-se actualntemente que todos os aspectos da teoria de Ehrlich eram essencialmente correctos, com excepção de que o “receptor” pode existir tanto na forma de molécula de anticorpo solúvel como do receptor unido à membrana, e não é este último o que se liberta, mas antes que o anticorpo solúvel se segrega a partir do interior da célula.
Referências
- ↑ Witebsky, Ernest (1954). «Ehrlich's side-chain theory in the light of present immunology». Annals of the New York Academy of Sciences. 59 (2): 168–181. PMID 13229205. doi:10.1111/j.1749-6632.1954.tb45929.x
- ↑ Kasten, FH (1996). «Paul Ehrlich: pathfinder in cell biology. 1. Chronicle of his life and accomplishments in immunology, cancer research, and chemotherapy.». Biotechnic & Histochemistry. 71 (1): 2–37. PMID 9138526. doi:10.3109/10520299609117128
- ↑ Valent, Peter; Groner, Bernd; Schumacher, Udo; Superti-Furga, Giulio; Busslinger, Meinrad; Kralovics, Robert; Zielinski, Christoph; Penninger, Josef M.; Kerjaschki, Dontscho; Stingl, Georg; Smolen, Josef S.; Valenta, Rudolf; Lassmann, Hans; Kovar, Heinrich; Jäger, Ulrich; Kornek, Gabriela; Müller, Markus; Sörgel, Fritz (2016). «Paul Ehrlich (1854-1915) and His Contributions to the Foundation and Birth of Translational Medicine». Journal of Innate Immunity. 8 (2): online. PMID 26845587. doi:10.1159/000443526
- ↑ Zielinska, Edyta (2013). «Side-Chain Theory, circa 1900». The Scientist. online
- ↑ Silverstein, Arthur M (1989). A History of Immunology. Oxford: Elsevier Science. p. 95. ISBN 978-0-080925837
- ↑ Kindt, Thomas J.; Capra, J. Donald (1984). The Antibody Enigma. Boston, MA: Springer US. p. 6. ISBN 978-1-46844676-0
- ↑ Tan, SY; Grimes, S (2010). «Paul Ehrlich (1854-1915): man with the magic bullet» (PDF). Singapore Medical Journal. 51 (11): 842–843. PMID 21140107
- ↑ Chuaire, Lilian; Cediel, Juan Fernando (2009). «Paul Ehrlich: From magic bullets to chemotherapy». Colombia Médica. 39 (3): online
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Silverstein, Arthur M. (2001). Paul Ehrlich's Receptor Immunology the Magnificent Obsession. Burlington: Elsevier. 202 páginas. ISBN 978-0-080538518
- Günther, O (1966). «Changes in Ehrlich's side-chain theory». Deutsche Medizinische Wochenschrift (em alemão). 91 (26): 1197–1201. PMID 5328273. doi:10.1055/s-0028-1110731
- Anonymous (1980). «Membranes, receptors, and the immune response. 80 years after Ehrlich's side chain theory». Progress in Clinical and Biological Research. 42 (1): 1–387. PMID 7393927
- Doerr, HW (1996). «Paul Ehrlich's concept of immune defense». Deutsche Medizinische Wochenschrift (em alemão). 121 (30): 958–961. PMID 8765706. doi:10.1055/s-0029-1233819
- Silverstein, AM (1999). «Paul Ehrlich's passion: the origins of his receptor immunology». Cellular Immunology. 194 (2): 213–221. PMID 10383824. doi:10.1006/cimm.1999.1505
- Prüll, CR (2003). «Part of a scientific master plan? Paul Ehrlich and the origins of his receptor concept». Medical History. 47 (3): 332–356. PMC 1044632. PMID 12905918. doi:10.1017/S0025727300057045