Cannabis no Brasil
Cannabis no Brasil é ilegal, mas não há pena de prisão para uso pessoal desde 2006.[1]
História
[editar | editar código-fonte]A cannabis foi introduzida no Brasil pelos colonizadores portugueses, no início de 1800. A sua intenção pode ter sido para cultivar a fibra do cânhamo, mas os escravos sequestrados da África estavam familiarizados com o consumo de cannabis e uso psicoactivo, levando o Conselho Municipal do Rio de Janeiro, em 1830, para proibir trazendo de cannabis para a cidade, e punir o seu uso por qualquer escravo.[2]
Império
[editar | editar código-fonte]A maconha no Brasil Império apresentava um status ambíguo, pois ocorria de algumas localidades a efetuação de uma proibição como na cidade do Rio de Janeiro que através do Código de Posturas de 1830 feito pela Câmara Municipal[3] baniu a utilização da planta para fins utilitários, já em outras áreas como na cidade de São Paulo houve um verdadeiro uso de maneira ampla da cannabis e seus derivados[4], com tais conjecturas ocorrendo devido a estrutura pública monárquica brasileira que era centralizada politicamente e descentralizada administrativamente.
Para além disso durante o século XIX na época do Segundo Reinado houve ainda o cultivo da cannabis, especialmente do cânhamo para fins destinados ao setor secundário, com a sua aplicação sendo remetidas a produção de produtos têxteis, à exemplo de cordas e papéis, onde a procura destas matérias-primas foi tipificada como algo que manteve-se em alta durante toda a Belle Époque, tanto a nível interno como para exportação, além disso a maconha era vista como um importante produto que tinha propriedades terapêuticas e era usado para tratar uma variedade de doenças, incluindo dores, náuseas e problemas digestivos[5].
Era Vargas
[editar | editar código-fonte]No ano de 1932 na vigência do Governo Provisório após uma conferência, o então presidente Getúlio Vargas estabeleceu o Decreto nº 20.930, de 11 de janeiro de 1932, na qual enquadrava a Cannabis como “substância tóxica entorpecente”, banindo dessa forma a maconha de modo irrestrito, tendo mesmo o uso da fibra do cânhamo na fabricação de tecidos e cordas passando por uma proibição abrangente, estabelecendo assim o início da proibição sistemática no Brasil[6], além disso em 1938 no período do Estado Novo através do Decreto-lei nº 891, de 25 de novembro de 1938[7], foi estabelecido uma ampla campanha de perseguição contra várias substâncias psicoativas dentre às quais incluía a maconha com o Artigo 281 do Código Penal de 1940 estabelecendo a pena de reclusão, de um a cinco anos, e multa de 10 a 50 vezes o maior salário-mínimo vigente no país[8].
Ditadura militar
[editar | editar código-fonte]No início da ditadura militar, o presidente Humberto de Alencar Castello Branco através da Lei nº 4.451, de 4 de novembro de 1964 reforçou e endureceu as penalidades estipuladas no Código Penal de 1940[9], que foram novamente reafirmadas e enrijecidas durante o governo Artur da Costa e Silva por meio do Decreto-lei nº 385, de 26 de dezembro de 1968[10], onde nessa ordem legal equiparou-se penalmente o usuário com o traficante, sendo tal conjectura reafirmada pela Lei nº 5.726, de 29 de outubro de 1971[11] durante a vigência do governo Emílio Médici, e somente revista na administração Ernesto Geisel pela Lei dos Tóxicos de 1976, que separava a tipificação de traficante em seu Artigo 12 estabelecendo pena de 3 a 15 anos de reclusão para criminosos ligados ao mercado de drogas, enquanto usuários eram penalizados com uma forma de detenção que seria de 6 meses a 2 anos[12].
Período contemporâneo
[editar | editar código-fonte]No Brasil, não existe mais a pena de prisão ou reclusão para o consumo, armazenamento ou posse de pequena quantidade de drogas para uso pessoal, inclusive maconha. Também não há pena de prisão para quem "para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância". O artigo 28 da lei n.º 11.343/2006,[13] de 23 de agosto de 2006 prevê novas penas para os usuários de drogas. As penas previstas são: advertência sobre os efeitos das drogas (saúde, família e etc); prestação de serviços à comunidade ou medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
Em 25 de junho de 2024, o Supremo Tribunal Federal descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal e fixou o limite de até 40 gramas ou 6 plantas fêmeas, de forma a diferenciar usuário de traficante.[14]
Uso medicinal
[editar | editar código-fonte]Desde 2015, medicamentos de cannabis com mais de 0,2% de THC podem ser prescritos para pacientes em estado terminal ou aqueles que esgotaram outras opções de tratamento. Inicialmente, esses medicamentos só podiam ser importados com autorização especial da Anvisa, mas em 2019 as regras foram relaxadas para permitir a venda nas farmácias. Produtos com menos de 0,2% de THC podem ser prescritos com menos restrições.[15][16]
Em janeiro de 2017, o Brasil emitiu sua primeira licença para um medicamento à base de cannabis, permitindo a venda de Mevatyl em sua forma de spray oral (conhecido internacionalmente como Sativex).[17] Em março de 2020, o estado de Pernambuco emitiu a primeira licença nacional para o plantio caseiro de maconha para fins medicinais.[18]
Marcha da Maconha
[editar | editar código-fonte]No Brasil ocorrem passeatas chamadas de "marcha da maconha" desde 2002. Em 2007, um grupo de membros do Growroom se articulou e criou um site e uma identidade visual em torno do nome "Marcha da Maconha". A partir daí houve uma tentativa de fazer a Marcha da Maconha no Brasil em doze capitais no dia 04 de maio de 2008, mas houve uma grande repressão devido decisões judiciais que proibiam a Marcha na maioria delas. Os juízes alegaram desde apologia ao uso de drogas até formação de quadrilha. A marcha deveria ocorrer em Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, João Pessoa, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo, mas só ocorreu legitimamente em Recife, onde houve confusão e prisões.[19][20]
Entre 2009 e 2010 a Marcha da Maconha ocorreu pacificamente e sem maiores problemas em várias cidades, como Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Belo Horizonte. Ainda assim, em muitas casos ocorreu forte repressão, o que impediu que as marchas fossem realizadas na maioria das cidades brasileiras. Em 2009, os manifestantes foram impedidos de realizar a Marcha da Maconha por decisões judiciais nas cidades de Curitiba, Goiânia, Salvador, Fortaleza e João Pessoa.[21]
Em 2011, porém, a justiça voltou a proibir a Marcha da Maconha em São Paulo, Belo Horizonte, Brasília e Curitiba, embora ela tenha ocorrido em Goiânia, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Recife, Vitória e Niterói, entre outras. Em 15 de junho de 2011, entretanto, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, pela legitimidade da manifestação por meio da Arguição de descumprimento de preceito fundamental ADPF 187, entendendo que ela não faz apologia ao crime e considerando que sua proibição é uma ameaça à liberdade de expressão, garantida pela Constituição.[22][23] Na Marcha para Jesus de 2011 Silas Malafaia falou contra esta decisão, insinuando que após isto seriam aprovadas marchas a favor de crimes.[24] Em 2012, a marcha ocorreu sem incidentes em São Paulo, com público estimado pela Polícia Militar em 2 mil pessoas.[25]
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ Professor Anita Kalunta-Crumpton (28 de junho de 2015). Pan-African Issues in Drugs and Drug Control: An International Perspective. [S.l.]: Ashgate Publishing, Ltd. pp. 242–. ISBN 978-1-4724-2214-9
- ↑ Robert Clarke; Mark Merlin (1 de setembro de 2013). Cannabis: Evolution and Ethnobotany. [S.l.]: University of California Press. pp. 182–. ISBN 978-0-520-95457-1
- ↑ «Do Brasil Colônia às regras atuais: veja a linha do tempo das legislações que proibiram o uso da maconha no Brasil». O Globo. 7 de março de 2024. Consultado em 19 de abril de 2024
- ↑ Nascimento, Douglas (9 de outubro de 2015). «A presença e o uso da cannabis na São Paulo Antiga » São Paulo Antiga». São Paulo Antiga. Consultado em 19 de abril de 2024
- ↑ «Cannabis and Brazil». www.alchimiaweb.com (em inglês). Consultado em 20 de abril de 2024
- ↑ «Preconceito atrapalha debate sobre Cannabis medicinal, diz historiador». Senado Federal. Consultado em 25 de junho de 2024
- ↑ «Portal da Câmara dos Deputados». www2.camara.leg.br. Consultado em 25 de junho de 2024
- ↑ «Portal da Câmara dos Deputados». www2.camara.leg.br. Consultado em 25 de junho de 2024
- ↑ «L4451». www.planalto.gov.br. Consultado em 25 de junho de 2024
- ↑ «Portal da Câmara dos Deputados». www2.camara.leg.br. Consultado em 25 de junho de 2024
- ↑ «L5726». www.planalto.gov.br. Consultado em 25 de junho de 2024
- ↑ «Legislação Federal - Senado Federal». legis.senado.leg.br. Consultado em 25 de junho de 2024
- ↑ Presidência da República Federativa do Brasil. «Lei n.º 11.343/2006]»
- ↑ Mateus Coutinho (26 de junho de 2024). «Supremo define 40 gramas de maconha para diferenciar usuário de traficante». UOL Notícias. Consultado em 26 de junho de 2024
- ↑ Ponieman, Natan (3 de dezembro de 2019). «Brazil Regulates Sale Of Medical Marijuana Products». Benzinga. Consultado em 9 de dezembro de 2019
- ↑ «Brazil approves sale of medical cannabis in pharmacies». Yahoo News. AFP. 3 de dezembro de 2019. Consultado em 9 de dezembro de 2019
- ↑ Reuters Editorial (16 de janeiro de 2017). «Brazil issues first license for sale of a cannabis-based drug». Reuters. Consultado em 11 de fevereiro de 2017
- ↑ Diário de Pernambuco (27 de março de 2020). «Defensoria consegue primeira autorização definitiva para plantio de maconha em PE». Diário de Pernambuco. Consultado em 27 de março de 2020
- ↑ Wikinotícias, ed. (4 de maio de 2008). «Marcha da Maconha proibida na maioria das capitais do Brasil». Consultado em 19 de setembro de 2021
- ↑ G1, ed. (3 de maio de 2008). «Justiça proíbe Marcha da Maconha em 9 capitais brasileiras»
- ↑ MPF, ed. (21 de junho de 2009). «Ação direta de inconstitucionalidade visando a que seja proferida decisão de interpretação conforme a Constituição do art 33 da Lei nº 11.343/2006» (PDF). PGR. Consultado em 15 de maio de 2019
- ↑ «STF decide a favor da Marcha da Maconha». O Globo. Consultado em 16 de junho de 2011
- ↑ http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1955301
- ↑ «Marcha para Jesus vira ato contra união homoafetiva». IG. 23 de junho de 2011. Consultado em 23 de junho de 2011.
Na sequência, Malafaia passou a atacar a decisão do STF de liberar as marchas da maconha no Brasil. "Amanhã se alguém quiser fazer uma marcha em favor da pedofilia, do crack ou da cocaína vai poder fazer. Nós, em nome de Deus, dizemos não."
- ↑ «Marcha da Maconha chega ao fim em SP sem incidentes, diz PM». G1. 28 de maio de 2012. Consultado em 24 de fevereiro de 2013