Slides Sobre o Livro A Formação Das Almas

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A formação das almas: o

imaginário da república no Brasil


José Murilo de Carvalho
Utopias republicanas
 - Benjamin Constant (suiço-francês, teórico do
republicanismo): dois tipos de liberdades:
 a) a liberdade dos antigos, tipo Grécia e Roma,
especialmente em Esparta, com ampla
participação pública do cidadão na praça;
 b) a liberdade dos modernos, via representação,
com foco nos direitos civis e individuais;
 - Tal debate esteve presente na formação da
República nos EUA e também esteve presente no
debate de nossos republicanos que adaptaram os
modelos norte-americano e francês para o caso
nacional;
As duas liberdades
 - Um modelo foi produzido nos EUA;
predominou uma visão utilitarista de acordo com
Hume; a predominância de interesses, paixões
egoístas na sociedade; daí a ênfase na organização
das instituições, do equilíbrio de poder – com
destaque para o Judiciário representado pela
Suprema Corte (como pano de fundo a
concepção de que “da soma dos interesses
individuais, a formação da boa sociedade”; além de
uma ideia de amor à glória pessoal);
 - Para Arendt, nos EUA (treze colônias) a
revolução igualitária já havia ocorrido ao longo de
sua história, por isso os temas das liberdades
políticas não eram cruciais;
 - Outro modelo, ou modelos vinham da
França:
 a) o jacobinismo que tinham como ideia
geral a participação nacional e popular –
expressando a vontade geral do povo
(Rousseau);
 b) a Terceira República, após anos 70, com a
ênfase nas instituições e preocupações com
a estabilidade governamental (preocupações
de B. Constant e dos positivistas);
 - A influência francesa chegará ao Brasil via,
sobretudo, os positivistas, especialmente através
de Comte e seu “Apelo aos Conservadores”, com
ênfase na ordem para o progresso;
 - Outro traço importante no comtismo,
especialmente após a década de 50, é a ideia de
pátria como comunidade ou mátria, aquela que
cuida de todos os seus filhos (nem individualismo,
nem vontade geral); recuperação das expressões
de um certo comunitarismo católico medieval;
 - O modelo que melhor expressaria esta solução
seria uma ditadura republicana;
A herança imperial
 - O Império absorveu aspectos da tradição
francesa (instituições nacionais imperiais); anglo
americana (relativo poder as províncias, juízes de
paz, júri popular, partidos nacionais), na sua
organização institucional;
 - Mas a maior preocupação foi a manutenção da
integridade territorial e controle social;
 - Somente com o indianismo procurou-se
construir uma ideia de nação; mas, relegou a
questão dos escravos, da escravidão e dos
libertos para ser enfrentada pelos republicanos;
A opção republicana
 - três opções foram focos dos embates:
 a) dos proprietários rurais, especialmente de
São Paulo, através do PRP: o modelo
americano e seu individualismo; significava a
lei do mais forte em uma sociedade
absolutamente desigual, diferente dos EUA;
 b) outra saída era a dos republicanos
radicais, vindo de segmentos de classe média,
sem recursos para disputar com os
proprietários na sociedade civil, defendiam
maior participação política; mas seu
jacobinismo não tinha base social;
 - Outra saída foi proposta por positivistas;
suas ideias contra a monarquia, pela
separação entre igreja e estado e de uma
forte presença estatal para a realização da
ordem e progresso, conectava-se por um
lado com o republicanismo e de outro
lado com a tradição estatista portuguesa
desde Pombal;
 a) - Influência sobre os militares;
 b)- os positivistas do RS;
A cidadania e a estadania
 -Com exceção dos republicanos radicais a
ênfase recaía sobre o poder do estado:
 a) a forte tradição estatista desde a colônia e
reforçada pelo Império e por uma sociedade
pouco diversificada economicamente;
 b) a desigualdade extrema como condição
negativa ao desenvolvimento de uma ideia de
virtude espartana, com a liberdade dos
antigos;
 c) a República em meio à especulação
financeira;
 d) a ausência de individualismo anglo-saxão que
favoreceria o espírito de iniciativa; excessiva
dependência do Estado;
 e) a tradição lusa do comunitarismo via Estado
como regulador dos apetites pessoais e
individuais;
 f) apesar presença de alguns elementos que
favoreciam a retórica positivista, suas proposições
chegavam a pequenos círculos (a família, a
promoção do bem comum, a presença da
mulher), tudo caia no vazio ou era absorvido em
uma lógica conservadora, perdendo o seu ímpeto
possivelmente social transformador;
 - Para Carvalho, na sociedade brasileira
havia uma grande dificuldade para o
desenvolvimento dos dois tipos de liberdade.
Seja qual fosse a escolha, faltava o
sentimento de comunidade de destino: “ Este
Estado não é uma nacionalidade; este país
não é uma sociedade; esta gente não é um
povo. Nossos homens não são cidadãos” (A.
Torres);
 - A ideia da cidadania não vicejou entre nós.
Tiradentes: um herói para a
República
 - Uma república sem povo e sem lutas
não favoreceu a construção de um herói;
 - A construção de um herói precisa de
narrativas não arbitrárias;
 - A falta de participação popular, sugere a
necessidade de maior empenho na
constituição de um panteão cívico, que
venha representar um ideal a ser
construído, uma origem mítica da
comunidade;
 - O caso brasileiro não possuía muitas
possibilidades, nem entre os civis, nem entre
os militares;
 - Talvez o nome mais representativo fosse o
de Deodoro da Fonseca, mas sua indecisão
mesmo quanto a República e muito
identificado com exército pouco unia e nem
tinha apelo popular; Floriano Peixoto, não
unia nem os militares, Constant era mais
professor que político ou herói;
 - Nesta ausência de heróis, ocorrerá a
recuperação de Tiradentes como
representante mítico da República;
 - Sua saga não estava no esquecimento, fazia
parte da memória coletiva; especialmente no
Rio de Janeiro e em Minas Gerais;
 - Fora recuperado em vários momentos, ao
longo do Império, dos movimentos anti-
monarquistas que fundaram em várias
localidades o Clube Tiradentes;
 - também foi recuperado por memorialista e
historiadores;
 - foi cantado em verso e prosa por diversos
poetas e romancistas;
 - sua luta não era separatista e podia ser
apropriada por uma ideia do nacional;
 - sua execução foi cercada por importante
sentimento de compaixão;
 - seu comportamento foi testemunho de
honra, resignação;
 - sua “conversão” mística na prisão; seu
perdão ao carrasco; sua condução ao
cadafalso; seu esquartejamento, como
suplício de seu corpo; a ausência de um
retrato; permitiu a construção de um Cristo
Cívico – representado em várias obras da
época;
 - O herói Tiradentes foi criado ao longo do
período imperial e apropriado pelo novo
regime , sendo sua figura reforçada como
mito nacional nas primeiras décadas da
República;
República-mulher: entre Maria e
Marianne
 - Na constituição do imaginário revolucionário
francês foi criado enquanto alegoria da república
a imagem de uma mulher, em contraposição à
representação masculina do rei;
 - Desde 1792, a mulher “Liberdade”, inspirada em
Roma, representou a República francesa;
 - Sua figura foi imortalizada na obra de Delacroix,
após as jornadas de 1830;
 - Enfrentou disputa com o culto mariano (quando
ganhou nome de Marianne) e sofreu
deslizamentos com a pacificação da república;
 - No caso, brasileiro também houve as
tentativas de representação da República
pela figura de mulher;
 - Mas a situação enfrentou algumas
dificuldades:
 a) não houve participação popular e ou
feminina na Proclamação da República;
 b) não foi a república de nossos sonhos;
logo se tornou prostituta representada
nos pasquins e jornais;
 c) a representação artísticas do feminino
no fim de século XIX girava em torno do
tema da sensualidade;
 d) os positivistas foram os que mais
investiram na construção de
representação com a figura de Clotilde de
Voux (musa e mulher de Comte), que
evidentemente pouco poderia dizer sobre
a nossa tradição intelectual ou cultural
popular;
 - O vazio seria representado por outra
figura feminina: a Nossa Senhora
Aparecida;
 - a tradição mariana na cultura católica
brasileira;
 - uma santa popular e negra;
 - sua imagem foi canonizada em 1900;
 - e sagrada Padroeira do Brasil em 1930;
Bandeira e hino: o peso da tradição
 - Também houve disputa em torno da
bandeira e do hino nacional; de uso
obrigatório, a disputa foi mais intensa e
mais curta no tempo;
 - No caso da bandeira a vitória foi dos
positivistas e no caso do hino a vitória foi
da tradição: escolheram o hino do
Império;
A bandeira “marca cometa”
 - O inesperado 15 de novembro, não tinha
bandeira, também não tinha hino;
 - Cantava-se a Marselhesa, hino dos
revolucionários franceses;
 - Por que não se adotou também a bandeira
tricolor francesa: branca, vermelha e azul ?;
 - A bandeira tricolor passara a fazer parte da
ideia de nação francesa e já tinha perdido o
pendor revolucionário; já a Marselhesa era o
hino mundial dos revolucionários;
 - Nas manifestações de 15 de novembro e
dias seguintes apareceu três propostas de
bandeiras: uma que simulava a bandeira
dos EUA, em cores do império (verde,
amarelo e quadrilátero negro); outra a
bandeira do Clube de Tiradentes; e uma
terceira proposta pelos positivista, aquela
que sairia vitoriosa, com a divisa “ordem e
progresso”;
 - Os positivistas ortodoxos (Teixeira
Mendes e Miguel Lemos) foram mais
ousados, na formulação e na articulação
política, envolvendo Benjamin Constant, na
defesa de sua proposta;
 - Divulgaram e defenderam sua proposta,
não apenas junto ao Governo, como
mobilizaram segmentos militares e
ameaçaram quem ousasse criticar ou
macular a “marca cometa”; maior resistência
ficaria por conta do dístico “ordem e
progresso”
O “ta-ra-ta-ta-tchin”: vitória do
povo
 - Já em relação ao Hino, a vitória foi toda da
tradição;
 - O hino do Império já era, no final do
século, totalmente popular;
 - Tentativas de incorporação da música da
Marselhesa com letra brasileira (Silva Jardim,
1889), acabaram por não ter resultados
efetivos;
 - Também não entusiasmou o concurso que
fora idealizado e acabou por resultar no
Hino à República, em 1790;
 - A vitória do Hino do Império acabou
ocorrendo por manifestações de aclamação
popular em diferentes ocasiões;
 - Por exemplo, na apresentação do Maestro
americano, de ascendência francesa Louis
Moreau Gottschalk com apresentação de
650 músicos no dia 24 de novembro de
1889, supostamente a pedidos da platéia que
fora ao delírio;
 - à música de Francisco Manuel foi dada mais
tarde a letra de Osório Duque Estrada;
Os positivistas e a manipulação do
imaginário
 - Os positivistas ortodoxos foram
efetivamente o grupo que mais se
envolveu nas disputas simbólicas para se
criar um imaginário social e popular para
a República;
 - Duas são as razões do sucesso:
 a) o universo da doutrina comtista;
 b) a estratégia política dos positivistas
brasileiros;
O imaginário comtista
 - Já encontramos na primeira fase de Comte
a influência de Saint Simon sobre a criação
de uma utopia comtista que substituísse o
imaginário comunitário católico feudal;
 - Mas foi após 1848, sob influência de
Clotilde de Voux, que notaremos uma
viraram religiosa no comtismo e suas
pregações na formação de uma comunidade
moral, a mátria, onde as mulheres e o
espírito afetivo e altruístico teriam destaque;
 - A superioridade do sentimento e do amor
sobre a razão; da comunidade sobre o
indivíduo; da raça negra, sentimental, sobre a
raça branca; a riqueza moral sobre a
material;
 - A organização religiosa de um novo
calendário e suas festividades;
 - A busca da arte como representações das
perfeições a serem construídas socialmente;
 - Constituem um universo rico às tentativas
de produção de um imaginário social;
A tática bolchevista dos ortodoxos
 - Diferentemente do que postulavam os
positivistas franceses, que imaginavam ser
o proletariado o ator fundamental de
criação da sociedade positivistas;
 - O núcleo ortodoxo brasileiro, avaliava
que não havia ainda um proletariado para
tal realização no Brasil;
 - Sua inserção maior era entre as camadas
médias de funções técnicas e científicas
no Brasil;
 - Consideravam que a partir da atuação de tais
grupos tinham real e efetivo poder de influência
sobre os núcleos decisórios do país;
 - Por meio de uma postura moral, de certa forma
sectária, por exemplo, a proibição de participar em
qualquer instância de órgãos de governo, alcançavam
uma estatura que de certo modo era simpática em
amplos setores;
 - Se por um lado, tal postura significava uma
incapacidade de maior número de adeptos, os
ortodoxos procuraram constituir uma espécie de
grupo político de vanguarda, altamente organizado,
como uma espécie de grupo bolchevique de classe
média...
Manipuladores de símbolos
 - Os positivistas imaginavam ser o caso
brasileiro propício a saltos históricos em
direção à sociedade positivista;
 - A sua influência sobre o Regime que
nascia, com a presença destacada de
Benjamin Constant, era uma sorte que
queriam potencializar para que as
mudanças ocorressem de modo celerado;
 - Para tanto precisavam do uso da
propaganda para a criação de um nova
mentalidade positivista, não apenas no
meio das mulheres e do proletariado, mas
também da classe alta que estaria aberta
às suas influências;
 - Daí a energia despendida com livros,
jornais, polêmicas, formação e uso de
símbolos, a partir do comtismo e com sua
organização política efetiva;
A formação das almas: o imaginário
da república no Brasil
 José Murilo de Carvalho

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