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Polticas Pblicas de Assistncia Social brasileira: avanos, limites e desafios Larissa Dahmer Pereira1 Introduo Ao abordarmos as polticas pblicas de assistncia social, seus avanos, limites e desafios, imprescindvel pontuar a concepo da qual se parte acerca das polticas pblicas. As polticas pblicas so compostas por polticas de cunho social e econmico e foram construdas ao longo do desenvolvimento da ordem burguesa, com a emergncia do Estado-Nao, a partir do sculo XVI. A transio de uma sociedade de organizao feudal para a ordem burguesa teve no Estado um sujeito fundamental, que permitiu a

territorializao da poltica, o controle monetrio, a garantia de proteo propriedade privada dos meios de produo e o disciplinamento brutal de homens livres como pssaros2 para a venda de sua fora de trabalho futura indstria capitalista. O Estado, desde sua origem, nasce voltado para o fortalecimento da nascente ordem burguesa e promove aes para a sua consolidao. O sculo XVIII marca, atravs das Revolues Industrial (1769), Americana (1776) e Francesa (1789), a passagem definitiva para a nova ordem burguesa, cujo princpio o da acumulao e o fundamento a propriedade privada dos meios de produo. Aquele sculo inaugura a era dos direitos civis, necessrios ordem burguesa, pois era preciso o direito de ir e vir, de vender livremente a sua fora de trabalho e, principalmente, ter a garantia - atravs da fora estatal - da segurana propriedade privada. O sculo XIX assistir emergncia da classe trabalhadora, organizada, que passou - frente s terrveis condies de vida - a exigir o direito de organizao em sindicatos e de participar da vida poltica, at ento reservada

Assistente Social. Doutoranda da ESS/UFRJ. Coordenadora do http://www.assistentesocial.com.br. 2 Marx, K. O Capital crtica da economia poltica. 3 Ed. So Paulo: Nova Cultural, 1988.

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2 aos detentores de renda e propriedade. Este sculo, atravs de lutas sangrentas, v nascer os direitos polticos. J o sculo XX testemunha o nascimento dos direitos sociais, resultado das inmeras lutas enfrentadas pela classe trabalhadora desde meados do sculo XIX. Tal processo de nascimento do que conhecemos hoje como cidadania3 (direitos civis, polticos e sociais) desenvolveu-se na Inglaterra, centro do desenvolvimento capitalista, e espraiou-se, de formas diferenciadas e de acordo com as lutas de classes, nos demais pases. O Estado foi fundamental para regular os inmeros conflitos das lutas de classes, regulamentando leis polticas e sociais, mas mantendo sua funo primordial: a de manter e fortalecer a ordem capitalista e, ao mesmo tempo, transfigurar-se como um ente (ilusrio) acima das classes sociais. Alm do importante papel poltico, o Estado desenvolveu desde o seu nascedouro aes econmicas cruciais para o desenvolvimento da empresa capitalista. A passagem para o sculo XX, com a transio do capitalismo de tipo concorrencial para o monopolista, fez o Estado assumir, de vez por todas, a sua funo de empresrio da classe capitalista. Assim, desenvolveu polticas pblicas com recursos pblicos, oriundos da extrao de mais-valia da classe trabalhadora voltadas para o processo de monopolizao capitalista. A partir da dcada de 1930 com a crise de 1929 at os anos 1960/1970, configurou-se o que conhecemos por padro fordista-keynesiano: um padro de produo em massa voltado para o consumo em massa articulado feroz ao estatal de impulso da economia capitalista, atravs de aes voltadas para a rea de infra-estrutura, polticas fiscal, monetria, salarial e, por fim, polticas sociais, que proporcionaram salrios indiretos classe trabalhadora, liberando parte de seus salrios para a realizao do consumo em massa. Este processo foi estratgico para o equilbrio das insatisfaes da classe trabalhadora e a ameaa concreta de construo de outra sociedade (socialista) no contexto de um mundo bipolar. Por sua vez, trataram-se tambm

Marshall, T. H. Cidadania, Classe Social e Status. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1967.

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3 de demandas efetivas e conquistas da classe trabalhadora por melhores condies de vida4. O padro fordista-keynesiano manteve-se at o final dos anos 1960, ao deparar-se com um esgotamento dos mercados europeu e japons. A dcada de 1970 marca a ecloso de nova crise capitalista e preciso realizar um reordenamento societrio global. A partir deste perodo temos o

desenvolvimento de processos de reestruturao produtiva, a mundializao do capital financeiro e o avano da ideologia neoliberal por todo o globo. O Estado, mais uma vez, o sujeito principal que ir transferir recursos, antes voltados para o provimento de polticas sociais, para os interesses do capital, sobretudo o financeiro. Ir, ainda, desregulamentar a legislao trabalhista e social, abrir mercados, e proporcionar as leis necessrias para o processo global de reao burguesa crise capitalista, o que afetar a classe trabalhadora em suas condies de vida e trabalho e em suas formas tradicionais de organizao. A partir daquele perodo at o momento atual, o desemprego e a precarizao do trabalho tornam-se ameaas constantes na vida dos trabalhadores5.

Polticas pblicas no Brasil: breve histrico O processo supra-referido ocorreu de diversas formas nos diferentes pases capitalistas, concomitante eroso do bloco sovitico. No Brasil um pas capitalista perifrico entramos no mundo industrial somente a partir da dcada de 1930. O Estado foi o impulsionador central daquele processo - no contexto ideolgico nacional-desenvolvimentista - com polticas econmicas voltadas para a indstria, na nascente zona urbana, e que mantinham o poder do latifndio, no campo. O padro brasileiro de polticas sociais baseou-se na

Oliveira, F. de Os direitos do antivalor a economia poltica da hegemonia imperfeita. Petrpolis: Vozes, 1998. Vianna, M. L. W. A americanizao (perversa) da seguridade social no Brasil: estratgias de bem-estar e polticas pblicas. Rio de Janeiro: Revan, UCAM,IUPERJ, 1998. 5 Harvey, D. Condio Ps-Moderna uma pesquisa sobre as origens da mudana cultural. 7 Ed. So Paulo: Edies Loyola, 1992; Antunes, R. Adeus ao Trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 5. Ed. So Paulo: Cortez; Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1998; Chesnais, F. A Mundializao do Capital. So Paulo: Xam, 1996.

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4 cidadania regulada6: isto , tinham acesso proteo social somente aqueles que detivessem a carteira de trabalho, com profisso e sindicato reconhecidos pelo Estado varguista. Aqueles que no detinham a carteira de trabalho e/ou questionassem a ordem vigente eram tratados com violenta represso estatal. Este padro de poltica social subjugada poltica econmica - atravessou o governo e a ditadura Vargas (1930/1945), o perodo populista (1946/1963), a longa ditadura militar (1964/1984) e s foi modificado com a promulgao da CF887 A Assistncia Social foi historicamente, no contexto brasileiro, detida pelas instituies religiosas e utilizada como moeda de troca poltica, seja na zona urbana, seja na zona rural, com o poder dos coronis. O Estado varguista criou grandes instituies, como a LBA8, que no fugiu lgica da benemerncia, do primeiro-damismo e do favor aos pobres: a poltica social de assistncia sempre foi, portanto, cunhada pela tica do favor, a servio da manuteno da misria e dos interesses das elites brasileiras. O processo de constituio da cidadania no Brasil foi marcado pela restrio das liberdades civis, enquanto o Executivo ficou com o papel de criar os direitos sociais, como um distribuidor repressor e paternalista de empregos e favores. A ao poltica voltava-se para a negociao direta com o governo, sem passar pela mediao das representaes polticas. A cultura poltica brasileira foi, portanto, mais orientada para o Estado do que para o fortalecimento de representaes polticas na sociedade civil: a estadania em contraste com a cidadania9. Somente com os ventos democrticopopulares da dcada de 1980 e a promulgao da CF88 inaugurou-se um padro de proteo social afirmativo de direitos sociais enquanto direitos de cidadania. Contudo, tem-se, na dcada de 1990, um avano fenomenal do projeto neoliberal, que se espalhou pelo mundo e realizou, com o seu programa de ajuste fiscal, um verdadeiro desajuste social por toda a Amrica Latina10.

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Santos, W. G. Cidadania e Justia. 2 edio Rio de Janeiro: Campus, 1987. Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988. Disponvel em http://www.presidencia.gov.br 8 Legio Brasileira de Assistncia Social. 9 Carvalho, Cidadania no Brasil o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2001. 10 Soares, L. T. Ajuste neoliberal e desajuste social na Amrica Latina. Rio de Janeiro: Vozes/CLACSO/LPP-UERJ, 2001.

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5 No Brasil, o governo Collor (1990/1992) inaugurou a entrada do projeto neoliberal no pas, com intensos processos de desregulamentao, abertura dos mercados, incentivos reestruturao das empresas e a disseminao ideolgica por toda a sociedade brasileira de que a causa dos males sociais centrava-se no gigantismo do Estado e a soluo seria reduzi-lo ao mximo, transferindo suas funes para empresas, supostamente mais eficientes. No campo das polticas sociais, o governo Collor simplesmente ignorou os preceitos constitucionais, atravs da desconsiderao do Sistema de Seguridade Social inscrito na CF88. Nesta, a Seguridade Social compreendida como um conjunto integrado de aes de iniciativa dos poderes pblicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos Sade, Previdncia e Assistncia. Assim, a Seguridade Social requer uma proposta de oramento elaborada de forma integrada e um Ministrio da Seguridade Social11, o que no foi realizado. O governo Collor fragmentou a Seguridade Social em ministrios diferentes, dando-lhe margem para realizar, na Sade, um boicote oramentrio sistemtico ao SUS12. Na Previdncia, lanou um pacote de reforma previdenciria j em 1992, cuja funo era retirar direitos dos trabalhadores conquistados na CF88. Na Assistncia, vetou a LOAS13, desrespeitando a CF88. A Carta Magna insere a Assistncia Social no conjunto do sistema de Seguridade Social e afirma-a como uma poltica pblica, direito de todos, dever do Estado e da sociedade. Contudo, para o artigo 203 referente Assistncia Social traduzir-se em polticas pblicas, seria necessrio a LOAS, vetada pelo governo Collor e sancionada somente no governo Itamar, em 1993, aps o impeachment de Fernando Collor de Melo e intensas mobilizaes sociais. O governo Itamar sancionou a LOAS, mas preparou o terreno para a continuidade da poltica neoliberal, agora com um verniz intelectualizado. Foi assim que FHC14 assumiu o Ministrio da Fazenda, lanou o Plano Real e
Soares, 2001. Sistema nico de Sade (SUS). 13 Lei Orgnica da Assistncia Social (LOAS). Brasil. Lei n.8742, de 7 de dezembro de 1993 Dispe sobre a organizao da Assistncia Social e d outras providncias. Lei Orgnica da Assistncia Social. 14 Fernando Henrique Cardoso.
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6 elegeu-se, em 1994, para a Presidncia da Repblica. Com o governo FHC, pode-se afirmar que as polticas neoliberais foram eficientemente implantadas pelo Estado brasileiro: (i) no plano econmico, atravs de ajuste fiscal, privatizao da maior parte do patrimnio pblico, desregulamentao

trabalhista, abertura dos mercados, apoio total ao capital financeiro; (ii) no plano poltico, o Estado operou uma verdadeira

disseminao ideolgica de que era preciso transferir para a sociedade civil o Terceiro Setor - as tarefas do Estado. Assim, implementou, com relativo sucesso, o projeto de reforma do Estado brasileiro15, diminuindo suas funes bruscamente (para a classe trabalhadora) e mantendo-se sempre alerta para responder s demandas do capital16; (iii) no plano social, realizou um verdadeiro desmonte do que foi construdo ao longo do perodo da cidadania regulada (1930/1984). Na Sade, manteve o boicote oramentrio ao SUS; na Previdncia, realizou reformas no regime dos funcionrios pblicos e tornou mais rgidas as regras previdencirias, e, na Assistncia Social, criou o Programa Comunidade Solidria, passando ao largo do que a LOAS estabelece. O Comunidade Solidria recebia recursos, sem controle social do Conselho Nacional de Assistncia Social e configurou-se como uma poltica assistencialista, indo na contra-corrente dos avanos inscritos na CF88 e na LOAS (1993)17. O governo FHC no cumpriu com a lei, ignorando a

15 MARE (Ministrio de Administrao e Reforma do Estado)/Presidncia da Repblica/Cmara da Reforma do Estado. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Braslia, 1995. Disponvel em http://www.presidencia.gov.br/publi_04/COLECAO/PLANDI.HTM Acesso em maro de 2006. 16 Como, por exemplo, com o resgate de bancos endividados, atravs do PROER (Programa de Estmulo Reestruturao e ao Sistema Financeiro Nacional), lanado atravs de Medida Provisria n. 1.179/1995. 17 Raichelis, R. Esfera Pblica e Conselhos de Assistncia Social caminhos da construo democrtica. 2 edio So Paulo: Cortez, 2000.

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7 necessidade de construo do SUAS18, para que os preceitos indicados pela CF88 e LOAS fossem efetivamente

concretizados. Aps oito anos, o governo FHC operou um verdadeiro desmonte da nao19 e, desgastado com promessas de melhoria na vida da populao, foi derrotado, em 2002, pelo ento candidato Luiz Incio Lula da Silva. Embora com promessas de mudanas, sobretudo na rea social, o governo Lula manteve a fragmentao das polticas de Seguridade Social, com a criao, no primeiro ano de governo, do MESA - responsvel pela implantao do Programa Fome Zero - e a manuteno dos MA, MPS e MS20. No incio de 2004, com a reforma ministerial e as dificuldades enfrentadas pelo Programa Fome Zero para a efetivao de aes, o governo dissolveu o MESA e o MAS e criou o MDS21, que rene as competncias do MESA, do MAS e da Secretaria-Executiva do Programa Bolsa-Famlia. Outra ao governamental foi a manuteno dos MS e MPS, com oramentos separados, o que possibilitou a justificativa do dficit da Previdncia22 para a realizao da Reforma da Previdncia, uma das primeiras aes polticas do primeiro ano do governo Lula. A Reforma da Previdncia, inserida na PEC-4023 e realizada sob o argumento da justia social, no incluiu os 40 milhes de trabalhadores sem qualquer cobertura previdenciria, mas limitou-se a realizar um novo disciplinamento no regime de previdncia dos servidores pblicos, com o rebaixamento do teto dos benefcios, o que abriu um enorme mercado extremamente lucrativo - para a Previdncia Complementar. Na Sade, o atual governo mantm a reteno de recursos e investimentos para a rea, ao mesmo tempo em que direciona aes voltadas para a regulamentao dos
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Sistema nico de Assistncia Social (SUAS). Ministrio do Desenvolvimento Social/Secretaria Nacional de Assistncia Social (MDS/SNAS) Norma Operacional Bsica NOB/SUAS, Braslia, Julho de 2005. Disponvel em http://www.mds.gov.br/nob.asp Acesso em agosto de 2005 19 Lesbaupin, Y. (Org.) O Desmonte da Nao - Balano do governo FHC RJ, Ed. Vozes: 1999. 20 Ministrio Extraordinrio da Segurana Alimentar (MESA), Ministrio da Assistncia Social (MAS), Ministrio da Previdncia Social (MPS) e Ministrio da Sade (MS). 21 Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS). 22 ANFIP (Associao Nacional dos Auditores Fiscais da Previdncia Social). Anlise da Seguridade Social em 2003. Fundao ANFIP de Estudos da Seguridade Social, Braslia, 2004. Disponvel em www.anfip.org.br. Acesso em 11/11/2004. 23 Proposta de Emenda Constitucional 40/2003.

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8 Planos Privados de Sade, o que esvazia o SUS e favorece os empresrios do setor privado. No campo da Assistncia Social, foi realizada, em dezembro de 2003, a IV CNAS24, em carter extraordinrio, o que significou um avano no que diz respeito retomada da valorizao de espaos de controle social25. A plenria final da IV CNAS aprovou a PNAS26, que prev a construo e implantao do SUAS, cujo modelo de gesto descentralizado e participativo. A implantao do SUAS objetiva o rompimento com a fragmentao programtica entre as esferas governamentais e a articulao e proviso de proteo social bsica e especial para os segmentos populacionais usurios da poltica de Assistncia Social no pas. Seus princpios e diretrizes apontam para a universalizao do sistema; a territorializao da rede; a descentralizao poltico-administrativa; a padronizao dos servios de assistncia social; a integrao de objetivos, aes, servios, benefcios, programas e projetos; a garantia da proteo social; a substituio do paradigma assistencialista e a articulao de aes e competncias com os demais sistemas de defesa de direitos humanos, polticas sociais e esferas governamentais. A proposta do SUAS um avano e concretiza um modelo de gesto que possibilita a efetivao dos princpios e diretrizes da poltica de assistncia, conforme definido na LOAS. O princpio organizativo da Assistncia Social baseado num modelo sistmico aponta para a ruptura do assistencialismo, da benemerncia, de aes fragmentadas, ao sabor dos interesses coronelistas e eleitoreiros. Afirma a Assistncia Social como uma poltica pblica, dever do Estado e direito de todos os cidado e cidads, com a afirmao do controle social por parte da sociedade civil. A deliberao referente PNAS e a construo do SUAS expressa um esforo coletivo que, desde a promulgao

Conferncia Nacional de Assistncia Social (CNAS). importante lembrar que,no governo FHC, o Conselho Nacional de Assistncia Social passou a convocar a CNAS de quatro em quatro anos e no mais bianualmente, como prev a LOAS (art. 18, inciso VI). Esse prolongamento dos intervalos entre as Conferncias foi estratgico, proporcionando um explcito esvaziamento poltico. A ltima Conferncia, a terceira, realizou-se somente em 2001. 26 Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS). MINISTRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL/SECRETARIA NACIONAL DE ASSISTNCIA SOCIAL (MDS/SNAS) Poltica Nacional de Assistncia Social. Braslia, novembro de 2004. Disponvel em http://www.mds.gov.br/nob.asp Acesso em agosto de 2005.
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9 da CF88 e da LOAS, em 1993, vem se empenhando na tarefa de colocar a Assistncia Social brasileira no campo da garantia dos direitos sociais. Em setembro de 2004, o MDS, atravs da SNAS27, tornou pblica a verso final da PNAS, aps a realizao de seminrios que publicizaram a discusso, o que deve ser ressaltado como positivo, dada a mudana de postura do atual governo em relao ao anterior, que centralizava as decises e no colocava em debate suas propostas para a rea de Assistncia Social. Yasbek28 ressalta como aspectos positivos da nova PNAS a incorporao das demandas da sociedade na rea da assistncia social, a inovao em trabalhar com a noo de territrio, a centralidade da famlia e de sua proteo e, sobretudo, pela perspectiva de constituio do SUAS. Quanto aos aspectos negativos, aponta a viso de que a famlia pobre precisa ser reestruturada do ponto de vista moral e afetivo, sem considerar o quadro econmico mais amplo, como se o problema de misria fosse da famlia. Outro ponto negativo a desconsiderao de que essa populao pertence a uma classe social e de que a questo social uma questo poltica. O SUAS aprovado pelo Conselho Nacional de Assistncia Social em julho de 2005 atravs da Norma Operacional Bsica/SUAS um sistema descentralizado, participativo e no-contributivo, que organiza e regula as responsabilidades das esferas de governo e da sociedade civil em relao poltica de assistncia social e afirma que a assistncia social uma poltica pblica e compe o sistema de seguridade social. A NOB/SUAS/2005 indica as seguintes prerrogativas para a construo efetiva do SUAS: 1) a gesto compartilhada, o co-financiamento e a cooperao tcnica entre os trs entes federativos. 2) diviso de

responsabilidades entre os entes federativos para instalar, regular, manter e expandir as aes de assistncia social como dever de Estado e direito do cidado. 3) fundamenta-se nos compromissos da PNAS/2004; 4) orienta-se pela unidade de propsitos, principalmente quanto ao alcance de direitos pelos

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Secretaria Nacional de Assistncia Social. YASBEK, M. C. Entrevista Com a professora Maria Carmelita Yasbek, sobre Sistema nico de Assistncia Social e a Poltica de Assistncia Social no governo Lula. Caderno Especial n5/dezembro/janeiro de 2005. Disponvel em www.assistentesocial.com.br. Acesso em 20/03/2005.

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10 usurios; 5) regula em todo o territrio nacional a hierarquia, os vnculos e as responsabilidades do sistema cidado de servios, benefcios, programas, projetos e aes de assistncia social, de carter permanente e eventual, sob critrio universal e lgica de ao em rede hierarquizada (mbitos municipal, estadual e federal). 6) respeita a diversidade das regies. 7) reconhece as diferenas e desigualdades regionais, considerando-as no planejamento e execuo das aes. 8) articula sua dinmica s organizaes e entidades de assistncia social reconhecidas pelo SUAS. O SUAS apresenta como eixos estruturantes: (i) Precedncia da gesto pblica da poltica; (ii) Alcance de direitos scio-assistenciais; (iii) Matricialidade scio-familiar; (iv) Territorializao; (v) Descentralizao poltico-administrativa; (vi) Financiamento partilhado entre os entes federados; (vii) Fortalecimento da relao democrtica Estado-sociedade civil;(viii) Valorizao da presena do controle social; (ix) Participao popular; (x) Qualificao de recursos humanos; (xi) Informao, monitoramento, avaliao e sistematizao de resultados. Para a efetivao da proteo social, o SUAS dispe de duas modalidades de proteo: bsica e especial: (a) a proteo social bsica (PSB) objetiva prevenir situaes de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades, com fortalecimento dos vnculos familiares e comunitrios. Destina-se populao que vive em situao de vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privao e/ou fragilizao de vnculos afetivos relacionais e de pertencimento social. A PSB tem por referncia o servio de acompanhamento de grupos territoriais at 5.000 famlias sob situao de vulnerabilidade em ncleos com at 20.000 habitantes e ser operada pelo CRAS29, por rede de servios scio-educativos; BPC30; benefcios eventuais; servios e projetos de insero produtiva. (b) A proteo social especial (PSE) objetiva prover atenes scioassistenciais a famlias e indivduos em situao de risco pessoal e social, por ocorrncia de abandono, maus tratos fsicos e/ou psquicos, abuso sexual, uso de substncias psicoativas, cumprimento de medidas scio-educativas, em situao de rua, dentre outras.
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Centro de Referncia de Assistncia Social. Benefcio de Prestao Continuada (BPC).

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11 Ambos os tipos de proteo tem como suposto o princpio de proteo social pr-ativa, o que significa no mais considerar os usurios dos servios de assistncia social como objetos de interveno, mas sim como sujeitos de direitos. O SUAS aponta ainda a implantao de um sistema de vigilncia scioassistencial, que consiste no desenvolvimento da capacidade e de meios de gesto assumidos pelo rgo pblico gestor da assistncia social para conhecer a presena de pessoas em situao de vulnerabilidade. A rede scio-assistencial indicada no SUAS um conjunto integrado de aes de iniciativa pblica e da sociedade que ofertam e operam benefcios, servios, programas e projetos, o que supe a articulao entre todas estas unidades de proviso de proteo social sob a hierarquia de bsica e especial e ainda por nveis de complexidade. O SUAS supe a gesto compartilhada de servios, como uma poltica federativa entre Unio, Distrito Federal, estados e municpios, o que exige a utilizao de instrumentos de cooperao entre os entes federativos, como convnios, consrcios, comisses de pactuao, dentre outros. Os tipos e nveis de gesto so caracterizados como gesto inicial, gesto intermediria e gesto plena, o que determinar o valor do piso de proteo social que o municpio receber e as competncias de cada municpio. Por fim, o financiamento do SUAS aponta para: a) a descentralizao poltico-administrativa, com autonomia dos entes federativos, mas mantendo o princpio de cooperao. b) os Fundos de Assistncia Social os repasses s podem ocorrer via Fundo. c) o SUAS como referncia. d) condies gerais para transferncia dos recursos federais: d.1. nveis de gesto, d.2. comprovao de execuo oramentria, d.3. acompanhamento e controle da gesto dos recursos atravs do Relatrio Anual de Gesto, d.4. manuteno do Cadastro nico atualizado e realimentado, d.5. repasse dos recursos do Fundo Nacional de Assistncia Social para os servios, programas, projetos e benefcios, identificados entre os nveis de proteo bsica e especial. e) Mecanismos de transferncia: e.1. repasse de recursos fundo a fundo, de forma sistemtica e automtica. e.2. nova sistemtica de convnios, com aplicativos informatizados para co-financiamento de projetos eventuais. f) Critrios de partilha, como www.cpihts.com

12 proteo social bsica e especial, e de transferncia; g) o co-financiamento entre municpios, estados e Unio, respeitando-se os princpios de

subsidiariedade e cooperao e a diversidade existente entre municpios, metrpoles, estados e Unio. Possibilidades da Poltica de Assistncia Social: avanos e limites Ao longo do presente texto, procurou-se mostrar que polticas pblicas so compostas por polticas econmicas e sociais e tm no Estado o seu formulador e executor. No Brasil, historicamente, as polticas sociais estiveram submetidas s necessidades da poltica econmica, a servio dos interesses das elites e do processo de produo capitalista. Considera-se que as polticas sociais, na ordem burguesa, tero sempre limites, relativos ao prprio sistema capitalista. Portanto, preciso, para compreender os limites e possibilidades de avano da poltica de assistncia social, apreender o significado da Poltica Social no capitalismo, em determinado contexto histrico e segundo as lutas de classes internas s particularidades de cada pas. No Brasil, a dcada de 1990 significou uma verdadeira festa para o capital financeiro, a despeito do empobrecimento contnuo da classe trabalhadora. O governo Lula, que historicamente tem suas razes fincadas em bandeiras democrtico-populares, foi coerente, no campo da Assistncia Social, quando possibilitou a aprovao da PNAS e a construo do SUAS, mas, contraditoriamente, permanece com aes dicotmicas, que separam a poltica social da poltica econmica, proporcionando lucros recordes ao capital financeiro, e, com isto, subordina os direitos sociais lgica mercantil31. Portanto, na vida real e no no plano ideolgico, do discurso por mais que se afirme os direitos sociais, a cidadania, etc, estes encontram-se extremamente limitados, dada a perpetuao do direcionamento neoliberal poltica econmica, com o consequente resultado de se produzir uma poltica social pobre para os pobres.

INESC. A Era FHC e o Governo Lula: transio? Braslia, INESC, 2004. Disponvel em www.inesc.org.br. Acesso em 13/11/2004. & ______. Oramento & Polticas Pblicas. Boletim n.9, Ano V, maro de 2006. Disponvel em www.inesc.org.br Acesso em abril de 2006.

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13 Neste contexto, ressalta-se a necessidade dos diversos sujeitos coletivos captarem a Poltica Pblica em sua totalidade, o que significa analisar a poltica social intimamente articulada poltica econmica. No campo da Assistncia Social, alerta-se para a importncia de iniciativas polticas que afirmem os princpios da Seguridade Social, e, particularmente, do seu carter sistmico, o que significa a fuga de uma tica setorialista das polticas sociais, para no cairmos na armadilha de uma compensar a outra. Outra questo importante a defesa da Seguridade Social articulando-a aos interesses mais gerais da sociedade e ao questionamento da evaso das riquezas geradas pela classe trabalhadora brasileira para o cumprimento das metas de ajuste fiscal. Ressaltamos que os espaos de controle social Conselhos e Conferncias so fruns privilegiados para a defesa da Seguridade Social e da Poltica de Assistncia Social. Tratar, portanto, a poltica social separada da poltica econmica cair na iluso de que uma possvel sem a outra. A existncia de uma poltica econmica neoliberal possvel e indica a ausncia e/ou drstica reduo da poltica social. Mas, uma poltica social de cunho universalista e baseada nos princpios da Seguridade Social exige uma poltica econmica radicalmente oposta da que vem sendo implementada at os dias atuais.

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