Da Seita Dos Nazarenos A Igreja de Jesus Cristo

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Da seita dos Nazarenos Igreja de Jesus Cristo

Apesar do que vimos antes, o grande problema da Igreja primitiva no foi a tenso entre a comunidade de Jerusalm e o contexto judaico em que se movia, mas sim a diviso, dentro da prpria Igreja, entre a Igreja judaica e a Igreja pag. Essa seita dos Nazarenos (Act 24, 5) no era mais que um grupo de judeus algo subversivos que reconheciam no Nazareno Jesus o Messias anunciado e esperado pelos antepassados do povo bblico. Se continuasse fechada em si prpria e no seu judasmo, a Igreja tinha os dias contados! Mas o Esprito de Jesus no dorme A Palavra comea a ser anunciada em contexto pago, e o Esprito comea a dinamizar comunidades que se renem para celebrar e viver a Ressurreio de Jesus Cristo, libertos dos atilhos da Lei judaica, desconhecedores da circunciso e distantes do Templo de Jerusalm. Nasce a Igreja universal de Jesus Cristo, aquela dos confins do mundo (Act 1, 8), cujo rosto mais visvel o de Paulo, assim como Pedro e Tiago, o irmo do Senhor (Gal 1, 19), so o rosto mais visvel da Igreja de Jerusalm. A prpria estrutura do livro dos Actos dos Apstolos mostra esta caminhada: at ao captulo 12, tudo gira volta de Jerusalm e da aco de Pedro. A partir do captulo 13 tudo passa a girar volta de Paulo e das suas viagens missionrias s comunidades pags, at ao fim do livro. Dois captulos importantes nesta transio so o captulo 9, com a narrao simblica da converso de Paulo, e o captulo 15, com o encontro entre as duas tendncias da Igreja nascente para procurar caminhos de futuro. Paulo entra no livro no captulo 9, e Pedro sai do livro no captulo 15 Muda o rosto da Igreja!

A primeira tenso interna narrada por Lucas com traos que tentam amenizar a crueza das divises no seio da comunidade de Jerusalm. Conviviam nela judeus convertidos de Jerusalm, e judeus convertidos que estavam ou tinham estado na Dispora (na emigrao, diramos hoje). Estes, pelo contacto com a cultura grega e a distncia de Jerusalm, tinham uma viso mais livre da observncia da Lei e relativizavam o culto sacrificial do Templo. Eram os Helenistas (helenik: Grcia). Lucas narra que havia alguma discriminao por parte dos Apstolos em relao aos helenistas da comunidade. Por isso, houve a necessidade de eleger sete homens de boa reputao, cheios do Esprito e de sabedoria (Act 6, 3). Sintomaticamente, os sete escolhidos tm nomes gregos, e no hebraicos! No fundo, eles eram os apstolos dos helenistas (Act 6, 5-6). Foi a partir deste grupo que o Esprito comeou a ter liberdade de aco para inspirar sonhos novos, misses novas e uma nova linguagem para dizer a F na Ressurreio de Cristo. Mas, para estes, os membros do Sindrio de Jerusalm (conselho de governo, formado por ancios zelosos da Lei e chefes do Templo) no tinham a mesma pacincia que para Pedro e Joo, tambm eles discpulos e anunciadores de Jesus, mas assduos ao Templo e observantes da Lei dos antigos Por isso, o primeiro Mrtir da histria da Igreja um dos sete apstolos helenistas: Estvo (Act 7). Transbordava do Esprito Santo (Act 6, 5) e abertamente proclamava a Palavra de Jesus Ressuscitado, chegando a compreenses e concluses s quais nenhum Apstolo antes tinha chegado. O judasmo oficial sente-se ameaado, atacado dentro da sua prpria casa pela Palavra de Estvo que pe em causa a Lei antiga e o Templo em que os judeus querem fechar Deus. Mas, pior que tudo, foi Estvo ter tocado nas feridas: J os vossos pais mataram os que predisseram a vinda do Justo (Jesus), aquele que vs tambm

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trastes e assassinastes, vs que tendes a Lei mas no a cumpris! (Act 7, 52-53). Estas palavras precederam o apedrejamento Tambm a ele, como a Jesus, mataram-no fora da cidade (Act 7, 58), e tambm ele, como Jesus, morreu pedindo perdo para os seus assassinos (Act 7, 60). O velho Israel perseguiu e matou Estvo; mas no podia matar o Esprito que o animava. A morte dos profetas sempre fecunda. Deus no quer a morte dos profetas, porque Deus no quer o pecado nem o inspira no corao do Homem. Mas Deus ama a fidelidade dos profetas, aquela que, s vezes, os faz at aceitar a morte injusta sem se demoverem da Verdade. E dessa fidelidade, Deus capaz de fazer maravilhas por isso que, para aqueles que amam a Deus e procuram ser-Lhe fiis, tudo concorre para o bem! (Rom 8, 28) Os companheiros de Estvo, com medo, fogem de Jerusalm, espalham-se por toda a Judeia e chegam Samaria, a regio dos pagos por natureza aos olhos dos judeus. Consigo, apesar de todos os medos, levavam a Palavra e o Esprito de Jesus Ressuscitado (Act 8, 1): Os que tinham sido dispersos foram de aldeia em aldeia anunciando a Boa Nova. Foi assim que Filipe desceu a uma cidade da Samaria e a comeou a anunciar Cristo (Act 8, 4). A Igreja deixou de ser uma seita judaica de Jerusalm, e tornouse a Igreja de Jesus para o mundo. A fora do Alto acompanha Filipe, que anuncia o Evangelho na Samaria, rompendo todas as barreiras do velho judasmo oficial. O acolhimento da Palavra na Samaria inesperadamente grandioso, o Esprito faz maravilhas entre aquele povo, Jesus Cristo anunciado e acolhido como Salvador e eram muitos os que se faziam baptizar. Os prprios Pedro e Joo vieram de Jerusalm Samaria para impor as mos sobre todos eles, como sinais continuadores de Cristo e instrumentos do Esprito Santo (Act 8, 14-17). Depois, voltaram para Jerusalm Mas o Esprito no cessa, e inesperadamente coloca Filipe no caminho de um etope, eunuco e alto funcionrio da rainha Candace, da Etipia (Act 8, 26-40). Anunciou-lhe a Palavra e baptizou-o em Nome de Jesus com gua da berma da estrada, sinal do Baptismo no Esprito. O eunuco (castrado, estril) seguiu o seu caminho, cheio de alegria, smbolo da nova fecundidade do Esprito Santo dada a toda a Humanidade. A Igreja comea, com a fuga motivada pelo assassnio de Estvo, a espalhar-se por todo o Imprio. Aos olhos da comunidade de Jerusalm, a Igreja comea a paganizar-se Mas importante o modo como Lucas coloca Pedro a abrir-se, ainda que cautelosamente e com incoerncias, aos pagos, antes de introduzir definitivamente na histria o apstolo dos pagos (Act 18, 6), Paulo. Existia em Cesareia um centurio romano chamado Cornlio. As suas boas obras eram conhecidas por Deus, que lhe envia Pedro como recompensa (Act 10, 1-5). Mas, se Pedro a recompensa de Cornlio, Cornlio tambm um grande presente de Deus a Pedro, uma oportunidade privilegiada de mudar o corao e reconhecer a novidade de Deus. Num sonho, Pedro descobre que o mundo no se divide entre puros e impuros, nada nem ningum se deve considerar como manchado. Num sonho, Deus desmorona na mente de Pedro os preconceitos e medos legais tpicos de um judeu observante da Lei: O que foi purificado por Deus, no o consideres tu impuro! (Act 10, 15); Deus no faz acepo de pessoas, mas em qualquer povo, quem o teme e pe em prtica a justia, -lhe agradvel (Act 10, 35). Pedro anuncia a Palavra em casa de Cornlio, e o Esprito desceu sobre todos quantos escutavam a Palavra. Imediatamente, Pedro ordenou que fossem baptizados na gua, em Nome de Jesus Cristo, aqueles que j tinham recebido o Baptismo no Esprito (Act 10, 44-48). Depois, os Apstolos e irmos da Judeia, ouvindo dizer que tambm os pagos tinham recebido a Palavra de Deus, censuraram Pedro! (Act 11, 1-15). Pedro no argumenta! Simplesmente constata o poder de Deus e a novidade do Esprito: Eles

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receberam o Esprito Santo como ns! Acima de divergncias teolgicas, a Igreja tem que permanentemente fundar-se na fidelidade e obedincia aco do Esprito Santo.

Entretanto, tambm Paulo anunciava o Evangelho de Jesus aos pagos, sem Lei de Moiss nem Templo de Jerusalm. Fundava comunidades de crentes incircuncisos, que encontravam em Jesus o incio de uma Nova Humanidade. A capital desta Igreja pag, a Jerusalm dos pagos foi-se tornando Antioquia. o rosto visvel da Igreja independente, a Igreja livre e universal de Jesus, aquela em que os crentes pela primeira vez comearam a ser chamados Cristos (Act 11, 26), ou seja, a ganhar uma identidade prpria, a no ser apenas uma seita judaica. Paulo e Barnab tornaram-se os lderes da Igreja de Antioquia (Act 11, 19-26), e foi por ela que foram enviados a anunciar o Evangelho como Apstolos de Jesus (Act 13, 1-3).

Rui Santiago cssr

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