LINGUAGEM E LINGUÍSTICA

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Linguagem e Linguística

Introdução aos conceitos básicos sobre a linguagem e suas características, abordando sucintamente os
estudos da linguagem e a definição da Linguística como ciência da linguagem.
Prof. Nataniel dos Santos Gomes
1. Itens iniciais

Propósito
Compreender alguns conceitos acerca dos estudos da linguagem no contexto do surgimento da Linguística
para se familiarizar com o campo do estudo científico da linguagem.

Objetivos
• Descrever o conceito de linguagem.
• Identificar as características da linguagem humana.
• Distinguir os estudos da linguagem no período pré-linguístico.
• Reconhecer a Linguística como ciência da linguagem.

Introdução
O interesse pela linguagem há muito tempo está presente na história da humanidade, manifestando-se na
literatura, na filosofia e até mesmo em tradições religiosas muito antigas, como no relato da criação do mundo
por meio da palavra ou da linguagem, encontrado no livro bíblico de Gênesis. O interesse vem da tentativa de
entender como as experiências podem ser trocadas, como se pode falar do que existia antes de nós ou do
que ainda nem surgiu.

A linguagem é um fenômeno impressionante. Ela está presente em praticamente todos os momentos, do


nascimento até o fim da vida. Durante sua jornada, o ser humano transita pelos mais variados e complexos
sistemas de comunicação. A linguagem é capaz de fazer tudo isso com alguns poucos elementos, como
veremos mais adiante, permitindo a produção e a compreensão de informações.

O autor C. S. Lewis, por exemplo, na saga As Crônicas de Nárnia, descreve a fundação do mundo mágico de
Nárnia. Os personagens são levados a outra dimensão, na qual o leão Aslam está criando seu fantástico
universo. Para começarmos este conteúdo, assista ao vídeo que apresenta um interessante trecho do livro O
sobrinho do mago, deste autor.

Conteúdo interativo
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1. Linguagem e signo

Linguagem
O termo linguagem tem vários significados. É usado com mais frequência para caracterizar o processo de
comunicação.

Comunicação
Comunicação vem do latim communicare, que significa tornar algo comum. É por meio da comunicação
que os seres humanos partilham diferentes informações entre si, sendo essencial para a vida em
sociedade.

Nesse sentido, as línguas naturais, ou seja,


aquelas que se desenvolvem de forma
espontânea em uma comunidade, como o
português, o inglês e o francês, entre outras,
são instrumentos que servem para a
comunicação entre os falantes de uma língua,
entendida aqui, inicialmente, como um sistema
vocal utilizado por membros de um grupo social
ou de uma comunidade de falantes.

Assim, a linguagem é, neste primeiro sentido,


uma habilidade que os seres humanos têm de
se comunicar por intermédio de línguas.
Bandeiras representando as diversas línguas.
Nem todas as línguas são naturais. Existem
também as chamadas línguas artificiais, criadas
por um grupo de indivíduos, sem passar por um
processo de mudança ou de transformação resultante da vida cultural de algum povo. São, portanto, línguas
inventadas. Por exemplo:

• Os fãs da franquia cinematográfica Star Trek criaram diversas línguas artificiais, inventadas.

• O esperanto é uma língua internacional, artificial ou planejada, que não pertence de modo natural a
nenhuma comunidade ou país.

Esperanto
Língua artificial e universal criada em 1887 por Ludwik Lejzer Zamenhof (1859 - 1917), médico polonês
de origem judaica, que ainda na adolescência elaborou a primeira versão do esperanto. No Brasil, o
esperanto é utilizado desde 1890. O alfabeto dessa língua é composto por 28 letras, baseado no
alfabeto latino. Cada letra corresponde a um único som. A gramática do esperanto possui apenas 16
regras básicas. Por ser uma língua planejada, um de seus princípios é evitar a polissemia, por isso, as
palavras possuem apenas um sentido. Há vários livros publicados e vídeos na Internet falados em
esperanto.

Atenção para não confundir línguas artificiais com línguas mortas, que são aquelas não mais faladas, mas que
apresentam registro documental, podendo ser estudadas na atualidade. Um dos exemplos mais citados é o
latim que, apesar de não ser falado como primeira língua ou língua materna em nenhum lugar do mundo,
possui vasto material disponível.
Como a linguagem pode ser classificada?

De acordo com o sistema de sinais que a linguagem utiliza, ela pode ser classificada em:

Linguagem verbal

Caracteriza-se pelo uso de sinais verbais para a comunicação, ou seja, vale-se da palavra
falada ou escrita. Nesse caso, as línguas naturais, como o português, o inglês, o espanhol, o japonês,
o árabe etc., são exemplos de linguagem verbal, seja na modalidade escrita ou oral.

Linguagem não verbal

Caracteriza-se pelo uso de outros tipos de sinais, que não sejam as palavras, tais como as cores, os
gestos, os desenhos e os sinais sonoros. Alguns exemplos encontrados em nosso cotidiano são os
sinais de trânsito que orientam os motoristas, as bandeiras nas pistas de Fórmula 1, as expressões
faciais e os silvos dos guardas no trânsito.

Vamos fazer um teste? O que você pensa ao se deparar com a imagem a seguir?

Automaticamente você deve tê-la associado a algum tipo de perigo e risco. De fato, ela transmite uma
informação. Esse tipo de elemento é chamado de ícone, que em grego significa imagem. O ícone é um sinal
que se assemelha ao objeto por ele representado, como a fotografia, o desenho e a estátua.

Agora, quando você vê uma nuvem escura no céu, com o que a associa?
Podemos associá-la à noção de que provavelmente vai
chover. A nuvem é um exemplo de índice, ou seja, um sinal
indicador, pois, segundo Yoda e Nagata (2018), indica algo
tendo como fundamento a existência concreta deste e está
diretamente ligado ao objeto.

Qual é a principal diferença entre as duas manifestações,


ícone e índice? Confira agora:

Ícone Índice

Ao usar o desenho de uma caveira, evidencia Ao usar o exemplo da nuvem escura,


sua elaboração intencional para transmitir evidencia a falta da intenção de se
uma informação a um receptor. estabelecer comunicação.

Os conceitos de ícone e índice foram desenvolvidos por Charles Sanders Peirce (1839-1914), filósofo,
linguista, físico e matemático norte-americano, considerado um dos fundadores da Semiótica Moderna. A
Semiótica pode ser definida como a ciência ou doutrina formal dos signos ou, como afirma Santaella (1983), a
ciência de toda e qualquer linguagem. O signo, por sua vez, pode ser definido como uma coisa que representa
uma outra coisa: seu objeto. Ele só pode funcionar como signo se carregar esse poder de representar,
substituir uma outra coisa diferente dele.

Signos
Para saber mais sobre a diferença entre ícone e índice, assista ao vídeo a seguir.

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Linguagem e interação
Até aqui, você deve ter percebido que o conceito de linguagem é bem abrangente, pois engloba todos os
sinais ou signos utilizados na expressão ou na comunicação, incluindo a linguagem verbal e a não verbal. A
língua, nesse contexto, é considerada uma das possibilidades ou manifestação da linguagem e, por isso, pode
ser identificada com a linguagem verbal.

As diferentes formas de linguagem, incluindo a língua, a mais importante delas, vão além da expressão do que
temos em mente e da sua função como meio ou instrumento para nossa comunicação.

A linguagem deve ser entendida como uma forma ou um processo de interação entre os seres
humanos.

A língua é usada para se praticar ações, agir sobre o outro ou reagir ao que se ouviu. Interagimos por meio da
língua e produzimos sentido dentro de um contexto social, histórico e ideológico. Imagine a seguinte situação:

1
Jonas está tomando café da manhã tranquilamente em sua casa. De repente, percebe que pode estar
atrasado para chegar ao trabalho e pensa: “Não vou chegar a tempo!”
2
Sem um relógio ou celular por perto, pergunta para a sua esposa: “Você sabe que horas são?”

3
Parece claro que a intenção de Jonas é ser informado sobre qual horário o relógio está marcando, e
não se a sua esposa sabe ou não o horário. Sua interlocutora, compreendendo o que Jonas tem em
mente, olha o celular e responde: “São seis e meia!”.

Parece simples, mas essa situação envolve a interação entre a mente e a realidade sociocultural do emissor e
receptor para produzir e entender as estruturas e os significados da língua.

Veja, a seguir, como se realiza esse processo:

Emissor Receptor

O indivíduo que fala realiza uma atividade O indivíduo que recebe a informação, também
sociocognitiva extremamente complexa, passou por uma tarefa bastante complexa,
codificando os pensamentos em palavras, que decodificando os sons da fala que são dirigidos
são combinadas para formar frases, as quais a ele, de modo a identificar as palavras e frases
são pronunciadas, modularizando o som que sai para conseguir interpretar as informações.
da boca, para um receptor em determinado
contexto.

Mais do que isso, para informar exatamente o horário, em vez de apenas e simplesmente responder: “sei que
horas são”, foi preciso identificar a intenção da pergunta: “você sabe que horas são?”. A linguagem humana,
então, pode ser descrita como um fenômeno geral e abrangente que se refere a todo e qualquer sistema de
expressão, comunicação e interação humana utilizando-se de diversos e variados signos.

Se qualificamos a linguagem como humana, quer dizer que os animais não se comunicam nem
possuem linguagem?

Há estudiosos que identificaram padrões de comunicação entre certas comunidades de outros seres vivos, o
que poderia levar ao questionamento sobre a possibilidade de se falar em linguagem animal. De acordo com
Petter (2003), um desses pesquisadores foi o zoólogo alemão Karl von Frisch que, em 1959, publicou um
estudo sobre o sistema de comunicação das abelhas.

A abelha-operária, quando encontra alimento, volta à colmeia e leva a informação às outras abelhas por meio
do tipo de voo que realiza.
Se o sustento está próximo, ela voa em Se o sustento está longe, ela voa em
círculos. forma de oito.

Uma conclusão possível é que as abelhas podem reter informação em algum tipo de memória, produzir essa
mensagem por meio de comportamentos e compreender a informação. Mas, o que alguns chamariam de
linguagem animal, de acordo com Petter, “não se deixa analisar e decompor em elementos menores.”
(PETTER, 2003, p.16-17).

A abelha não produz um diálogo, não cria uma mensagem a partir de uma outra. Seu conteúdo é único, no
caso, o alimento, e não possui variação, exceto pelo tipo de voo sobre a distância em que o sustento está. Por
isso, “a comunicação das abelhas não é uma linguagem, é um código de sinais”. Isso seria evidenciado pelas
seguintes características:

• conteúdo fixo;
• mensagem invariável;
• relação a uma só situação;
• transmissão unilateral;
• enunciado indecomponível.

Assim, teríamos de ampliar bastante o conceito de linguagem para afirmar que os animais possuem uma
linguagem. Perceba que a linguagem que nós, seres humanos, utilizamos, em particular a língua, possui
características que não são encontradas em outras formas ou outros padrões de comportamentos animais.

Diferença entre ícone e índice


Para saber mais sobre a diferença entre ícone e índice, assista ao vídeo a seguir.

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Vem que eu te explico!


Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

A linguagem e seus conceitos

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Abordagem interacionista da linguagem

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Verificando o aprendizado

Questão 1

Assinale a alternativa que apresenta a descrição mais completa do conceito de linguagem.

A linguagem é o processo de comunicação constituído pelas línguas naturais.

A linguagem é a expressão do pensamento por meio da língua.

A linguagem é um fenômeno geral e abrangente que engloba qualquer sistema de expressão, comunicação e
interação humana por meio da diversidade de signos.

A linguagem é a capacidade, tanto dos seres humanos quanto dos animais, de dialogar e interagir por meio
das línguas artificiais.

A linguagem é o sistema de signos verbais que permitem a comunicação por meio da fala.

A alternativa C está correta.


A linguagem humana se refere a todo e qualquer sistema de expressão, comunicação e interação humana
utilizando-se de diversos e variados signos. Assim, a linguagem não se reduz à língua, à linguagem verbal
ou mesmo às línguas naturais, pois abrange linguagens que utilizam outros tipos de signos, como a
linguagem da música, da dança ou do gestual.

Questão 2

Alguns dos sinais ou signos que constituem a linguagem podem ser descritos "como":

A
Icônicos, porque são sinais que têm semelhança com o objeto que representam, como o ícone de uma caveira
representando perigo e risco.

Indicadores, porque são sinais que indicam o sentido abstrato de uma palavra, como o índice exemplificado na
palavra nuvem.

Verbais, porque estão centrados apenas na palavra falada.

Não verbais, porque estão centrados apenas na palavra escrita.

Simbólicos, pois são sinais que correspondem de forma exata ao referente ou à realidade, possuindo
semelhança física com o objeto.

A alternativa A está correta.


Alguns sinais ou signos são icônicos, ou seja, são denominados de ícones. O ícone é um sinal que tem
semelhança com o objeto que ele representa, como ocorre no caso da imagem da caveira para representar
perigo. Assim, o ícone ocorre quando o signo representa o objeto por semelhança de qualidades.
2. Características da linguagem humana

A linguagem humana
As quatro características
Das propriedades mais específicas que cooperam para que a linguagem humana seja flexível e versátil, há
quatro características que frequentemente são apontadas:

Dualidade ou dupla articulação Arbitrariedade

Independência de estímulo Produtividade

Essas características tornam a linguagem, do ponto de vista linguístico, exclusiva dos seres humanos. Vamos
conhecê-las!

A dualidade
Também chamada de dupla articulação. A partir do século XIX, os estudiosos da linguagem passaram a
entender que a língua é articulada, constituindo-se em uma das características que a tornam diferente da
forma de comunicação dos animais.

O termo articulação vem do latim articulus, que tem tanto o sentido de “junta dos ossos” ou “nó das plantas”
quanto o sentido de “ligação, conexão, relação das partes de um discurso; membro de uma frase” (SARAIVA,
2000).

A articulação na linguagem refere-se ao fato de os enunciados poderem ser desmembrados em


partes, já que surgem do resultado da união de elementos que podem ser encontrados em outros
enunciados.

Dito de outra forma, pronunciamos as palavras porque os sons que as compõem se combinam ou se articulam.
Veja a sentença a seguir:

Os atletas correram a maratona.

Essa frase pode ser dividida em unidades menores, como:


Os atletas

correram a

maratona

Para formar frases, o falante escolhe, entre os vocábulos que estão em sua mente, aqueles que em
determinado contexto têm o efeito desejado, articulando-os de acordo com as regras da sentença naquela
língua. Cada um dos vocábulos constitui um elemento autônomo, podendo aparecer em outras sentenças da
língua, dependendo das necessidades do usuário.

Continuando a análise da frase, cada um desses vocábulos resulta da união morfológica, ou seja, a sentença
pode ser reduzida a unidades menores, como em:

União morfológica
A morfologia estuda a estrutura, a formação, a flexão e a articulação dos vocábulos. A união morfológica
designa, então, a articulação entre as formas mínimas elementares da estrutura dos vocábulos, incluindo
os radicais e os morfemas. O morfema é a menor unidade de funcionamento na composição (estrutura)
da palavra ou do vocábulo, sendo, portanto, a unidade linguística mínima que possui significado
(RIBEIRO, 2013).

Plural Singular

os atletas oø atletaø

O símbolo ø é usado para indicar uma ausência ou uma forma nula, no caso, a ausência da consoante -s. Na
Matemática, este mesmo símbolo é usado para representar o conjunto vazio.

Perceba a oposição entre a presença do -s (em “os” e “atletas”) e a sua ausência (em “o” e “atleta”). Lembre-
se de que o símbolo ø é usado para indicar uma ausência ou uma forma nula, no caso, a ausência da
consoante -s, que gera uma diferença de valor no vocábulo, deixando de ter a marca de plural e indo para o
singular. A conclusão à qual você deve chegar é que o -s é uma desinência de número usada para indicar o
plural. Situação parecida acontece com a forma verbal “correram”. Vamos observar a seguir:
Desinência
Um morfema ou elemento final que indica as variações ou flexões de nomes (substantivos, adjetivos
etc.) e verbos.

correra/m

corre/ø∅

corr/e

Note que o -m indica que o verbo está na 3ª pessoa do plural; o -ra- é uma marca de pretérito; o -e- indica
que se trata de um verbo da 2ª conjugação. Todos esses elementos, os chamados morfemas, dão sentido aos
vocábulos ou à estrutura gramatical. Eles se identificam com radicais, vogais temáticas, prefixos, sufixos e
outros elementos da estrutura gramatical.

A frase pode ainda ser dividida em unidades menores: os fonemas. Essa divisão se relaciona com a base
sonora das palavras, ou seja, são partes que compõem a estrutura fonológica do vocábulo e apresentam
funções diferentes. Se fizermos a troca de um fonema por outro, teremos um outro vocábulo.

Fonemas
Segmento mínimo ou a menor unidade, no campo fônico (som), destituída de sentido, ou seja, não
apresenta isoladamente um significado, um conceito ou uma ideia (RIBEIRO, 2013). Os fonemas não
correspondem necessariamente às letras da grafia usual e são representados por letras entre barras.
Também são considerados uma subdivisão da sílaba e são estudados pela fonologia (CÂMARA Jr.,
1996).

A palavra Os fonemas da palavra

Maratona /m/, /a/, /r/, /a/, /t/, /o/, /n/, /a/

Assim, podemos entender que a linguagem verbal ou a língua é articulada, pois as sentenças são o resultado
da união de elementos menores. A dupla articulação ou dualidade acontece porque as unidades mínimas se
combinam ou se articulam em dois níveis:
Morfemas

A primeira articulação, as combinações dos morfemas, dá significação ou sentido gramatical.

Fonemas

A segunda articulação, as relações combinatórias dos fonemas, tem apenas função distintiva.

Qual a vantagem da dupla articulação? A grande vantagem da dupla articulação da linguagem é que ela
permite uma melhor adaptação das línguas às necessidades da comunicação humana, facilitando o processo
e diminuindo o esforço do falante.

Essa economia fica clara quando vemos que a formação do masculino e do feminino se dá por meio de
palavras diferentes, como em homem/mulher, boi/vaca e outros. Na maioria das vezes, o processo é mais
econômico e utilizamos apenas uma mudança morfológica para flexionar, por exemplo, o número ou o gênero
das palavras: cantor, cantora, cantores.

A arbitrariedade
Este conceito diz respeito à relação existente entre a forma e o significado, entre o sinal e a mensagem. A
linguagem opera com elementos que buscam retratar a realidade. Vejamos alguns exemplos:

A série fônica “amor” representa um


sentimento.

A sequência de sons “cavalo” serve para


representar o conceito que temos do
animal.

Assim, a linguagem humana se vale de um processo de representação ou simbolização, mas esse processo é
arbitrário, ou seja, não há nenhuma relação direta entre a sequência de sons e o seu significado, não há uma
relação natural, por exemplo, entre o nome e o sentido que ele designa.
Exemplo
É arbitrário o fato de utilizarmos a palavra maçã para um referente que corresponde à fruta que você
conhece e que todos nós podemos comer. Não há um motivo natural, uma relação de causa e efeito para
chamarmos de maçã um determinado fruto. Prova disso é que utilizamos palavras diferentes em outros
idiomas para fazermos referência ao mesmo fruto: em inglês, usa-se a palavra apple; em alemão, usa-se
a palavra apfel; em francês, usa-se a palavra pomme, em espanhol, usa-se a palavra manzana.

A arbitrariedade na língua é, assim, uma manifestação da referência simbólica que a língua faz à realidade. Os
elementos da linguagem não constituem a realidade em si, eles fazem referência à realidade, ou representam
a realidade, por meio dos signos linguísticos. (DALLIER, 2015)

A independência de estímulo
A independência de estímulo na linguagem humana está relacionada ao fato de não haver conexão entre as
palavras e as situações em que elas são utilizadas. Segundo Lyons (1987), não há uma previsibilidade de se
dizer determinadas palavras em função da situação vivenciada pelo falante, assim como se prevê um
comportamento habitual, a partir das próprias situações.

Exemplo
Você não pronuncia a palavra livro todas as vezes que vê ou folheia um livro. Por outro lado, é possível
que essa palavra seja dita em situações nas quais as pessoas não estejam vendo ou folheando um
livro.Da mesma forma, não é provável que, ao passar por inúmeras situações preocupantes, você
pronuncie a palavra preocupado todas as vezes. A probabilidade de usar essa palavra não seria maior
nessa situação do que a de utilizá-la em outro contexto.

A independência de estímulo também tem a ver com a criatividade no uso da língua.

De acordo com Lyons (1987), um enunciado que falamos em dada ocasião é, em princípio, não
predizível, e não pode ser descrito apropriadamente, no sentido técnico desses termos
(independência de estímulo e criatividade), como uma resposta a algum estímulo identificável,
linguístico ou não linguístico.

Assim, uma criança, quando está adquirindo a língua, não produz os enunciados apenas a partir dos estímulos
externos que recebe.

A produtividade
A produtividade de um sistema linguístico possibilita a construção e a interpretação de novas frases ou novos
textos. Assim, a partir de um número limitado de elementos, a linguagem nos mostra possibilidades infinitas
de combinação.
O conjunto limitado de letras ou de sons da
língua portuguesa, por exemplo, permite a
produção de uma infinidade de frases ou
textos.

Isso quer dizer que com apenas 26 letras do


nosso alfabeto podemos escrever tudo o que
quisermos ou imaginarmos.

Assim, em função da produtividade, a


linguagem não apresenta um limite definido,
não exige a mera reprodução de mensagens
previamente compartilhadas.

Cada falante de uma língua pode fazer, e


acabará fazendo, combinações únicas e, ainda assim, será compreendido, desde que a mensagem utilize o
mesmo código que o receptor domina (BORBA, 1998). Lyons (1987) afirma que a produtividade linguística
também se manifesta no fato de a criança, ainda muito cedo, produzir construções gramaticais que jamais
ocorreram antes em sua experiência.

Essas características da linguagem humana têm sido objeto de estudo de vários pesquisadores,
principalmente a partir do estabelecimento da ciência da linguagem – a Linguística – no começo do século XX.
Mais à frente, você conhecerá alguns estudos que antecedem o surgimento da Linguística para, depois,
conferir como e por que ela surgiu.

Características da linguagem
Para saber mais sobre as características da linguagem, assista ao vídeo a seguir.

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Vem que eu te explico!


Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

A arbitrariedade na linguagem

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A independência de estímulo na linguagem

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Verificando o aprendizado
Questão 1
Identifique as características ou propriedades que tornam a linguagem, do ponto de vista linguístico, exclusiva
dos seres humanos.

Dupla articulação, arbitrariedade, dependência de estímulo e improdutividade.

Flexibilidade, versatilidade, causalidade e dualidade.

Dualidade ou dupla articulação, arbitrariedade, independência de estímulo e produtividade.

Dualidade, arbitrariedade, previsibilidade e produtividade.

Interatividade, não arbitrariedade, dependência de estímulo e produtividade.

A alternativa C está correta.


A linguagem humana se caracteriza por possuir dois níveis de estrutura que se combinam, o que é
denominado de dualidade; também apresenta uma relação na motivada, arbitrária, entre o som e o sentido
das palavras, o que é denominado arbitrariedade; além disso, a forma como respondemos por meio da
língua a um determinado estímulo não é automática e previsível, o que é denominado independência de
estímulo; por fim, a linguagem humana tem como característica a possibilidade de combinar e recombinar
elementos, o que é chamado de produtividade.

Questão 2

A combinação na língua entre unidades mínimas tanto por meio dos morfemas, que dão significação ou
sentido gramatical, quanto por meio dos fonemas, que têm função distintiva, é uma característica da
linguagem identificada com a

produtividade.

arbitrariedade.

independência de estímulo.

D
dupla articulação.

versatilidade.

A alternativa D está correta.


A dupla articulação ou dualidade acontece porque as unidades mínimas se combinam ou se articulam em
dois "níveis": o dos morfemas e o dos fonemas. A primeira articulação, as combinações dos morfemas, dá
significação ou sentido gramatical. A segunda articulação, as relações combinatórias dos fonemas, tem
apenas função distintiva.
3. Os estudos pré-linguísticos

Estudos sobre a linguagem


Antiguidade
Os estudos sobre a linguagem tornaram-se
cada vez mais importantes e abundantes nas
últimas décadas. Embora o século XX tenha
sido um marco para o estabelecimento de uma
ciência da linguagem, é relevante conhecer
alguns estudos realizados ao longo de muito
tempo, remontando inclusive à Antiguidade
Clássica.

Saiba mais
Antiguidade Clássica É um período bem abrangente da história da europa que se inicia com a poesia
grega de Homero, aproximadamente no século VIII a.C., e se estende até a queda do Império Romano, no
século V d.C. A Antiguidade Clássica, desse modo, compreende as civilizações grega e romana em um
período de grande riqueza filosófica, literária e artística.

Os primeiros estudos são denominados paralinguísticos, pois eram mais voltados às análises filosóficas e às
abordagens da natureza biológica da linguagem, em vez de se limitarem a aspectos próprios da linguagem.
Platão e Aristóteles são exemplos de pensadores que estudaram a linguagem privilegiando uma análise
filosófica. Veja:

Platão

Filósofo grego que nasceu em Atenas por volta do ano 427 a.C. e morreu na mesma cidade em 347
a.C.. Ele entendia que a linguagem afastava o homem do mundo das ideias, o lugar da verdade, por
isso toda fala deveria ser comprometida com a verdade. Platão foi, provavelmente, o primeiro a
classificar as palavras em nomes e verbos (BRANDÃO, 1976).

Aristóteles

Filósofo grego, discípulo de Platão, nascido em Estagira, em 384 a.C., e falecido em Atenas, em 322
a.C. Compreendia a linguagem como suporte para reflexão filosófica e meio de manifestação de
valores e crenças. Pela linguagem se deveria buscar a verdade (exigência de certezas) e descobrir de
modo especulativo o que é adequado para persuadir em cada situação (BRANDÃO, 1976).

Grécia
Na Grécia, havia a ideia de explicar a relação entre o conceito e a palavra utilizada para designá-lo. Uma
questão importante era: haveria alguma relação entre a palavra e seu significado? Também havia discussões
sobre o processo de funcionamento das línguas. Vejamos, por exemplo, dois embates que ocorriam sobre
essa discussão.

Naturalistas e convencionalistas Analogistas e anomalistas

Discutiam se o processo da língua era algo Discutiam se os processos linguísticos seguem


normal ou se ele obedecia a determinadas analogias, imitações ou se, por outro lado, são
convenções estabelecidas pela sociedade. tão desorganizados que não obedecem a
nenhum princípio.

Ainda na Antiguidade Clássica, houve outra tradição de estudo da linguagem, dessa vez, preocupada em
definir o certo e o errado no modelo utilizado pelas classes letradas, o que deu origem aos estudos
gramaticais. Entre os gregos, Dionísio da Trácia (170 a.C. – 90 a.C.) organizou a primeira gramática sistemática
do grego por volta do século II a.C. Nessa gramática, ele categorizou as classes de palavras em:

• Nome;
• Verbo;
• Particípio;
• Artigo;
• Pronome;
• Preposição;
• Advérbio;
• Conjunção.

Ele também atribuiu certas categorias gramaticais a essas classes, que são:
Tipo

Primitivo e derivado.

Forma

Simples e composta

Gênero

Neutro, feminino e masculino

Número

Singular, plural e dual

Caso

Nominativo, acusativo, genitivo, dativo etc.

Sobre a categoria caso, vale dizer que consiste em uma noção gramatical relacionada ao valor ou à função
sintática que uma palavra possui na frase. O caso é representado por uma terminação, ou seja, a palavra muda
sua forma para indicar a alteração do seu valor ou da sua função na frase. Por exemplo:

• O caso nominativo tem valor de sujeito ou de predicativo do sujeito.


• O acusativo corresponde ao objeto direto.
• O genitivo, ao complemento nominal.
• O dativo possui valor de objeto indireto.

Lembrando também que a descrição gramatical era baseada em determinado modelo ou paradigma.

Roma
No século II a.C., o filósofo Marco Terêncio Varrão (116 a.C. – 27 a.C.) dedicou-se aos estudos gramaticais na
tentativa de classificar a gramática como ciência e arte. Varrão fazia a distinção entre variação natural (flexão)
e variação voluntária (derivação). Vejamos:

Flexão

Quando uma palavra recebe marcas de tempo, de modo e gênero, fica caracterizada a flexão.
Derivação

Quando palavras novas surgem a partir de uma outra. Por exemplo, em português, o verbo cantar
aparece no dicionário apenas na forma infinitiva porque as outras seriam variações do mesmo verbo,
como cantei, cantava, cantamos etc. Porém, o mesmo dicionário apresenta cantar, cantor, cantoria e
cantata, todas essas formas oriundas de uma primitiva.

Varrão também propôs um sistema dividido em classes de palavras a partir de contrastes de flexão ou
variação. Como outros estudiosos gregos, Varrão reconheceu que o caso e o tempo eram as categorias que
primariamente serviam para diferenciar os vocábulos com flexão das línguas clássicas. (ROBINS, 1983).

Tradição hindu
Também houve a preocupação na Antiguidade, da parte de vários estudiosos, de compreender a língua dos
textos clássicos. Fora da cultura ocidental antiga, também houve estudos sobre a linguagem, como aconteceu
na tradição hindu.

Por volta do século IV a.C., entre os hindus, já eram


realizados estudos sobre a linguagem por meio dos mitos e
das lendas. Também havia eruditos que buscavam entender
o funcionamento da língua. Inicialmente, como afirma Lyons
(1979), eram discussões religiosas inspiradas nos hinos
sagrados dos hindus, com o objetivo de não permitir que o
texto sagrado fosse corrompido. Tempos depois, Panini, um
antigo gramático hindu, passou a fazer descrições
cuidadosas da língua.

No século II a.C., outro gramático, Pantañjali, explicou as


regras e os estudos realizados por Panini. De acordo com
Câmara Jr. (2011), esses dois gramáticos hindus lançaram a
base da gramática do sânscrito, uma língua ancestral do
Nepal e da Índia.

Segundo Robins (1983), todos esses antigos estudos da linguagem ofereceram uma terminologia que foi
traduzida e adaptada ao latim, passando a constituir os fundamentos de quase dois mil anos de teoria
gramatical e de ensino e estudo do grego e do latim.

Assim, boa parte da nomenclatura adotada nos estudos gramaticais e linguísticos atuais surge na Antiguidade
e, à medida que as pesquisas avançam, evidencia-se a necessidade de novos termos para dar conta dessas
demandas explanatórias.

Segunda metade do século V


No início da Idade Média, na segunda metade do século V, Prisciano de Cesareia, um gramático romano que
ministrou aulas em Constantinopla, ampliou o conceito de classes de palavras para:

• Nome (incluindo adjetivos);


• Verbo;
• Particípio;
• Pronome;
• Advérbio;
• Preposição;
• Interjeição;
• Conjunção.

De acordo com Robins (1983), Prisciano também percebia, como os demais gramáticos da Antiguidade, que a
letra era ao mesmo tempo a menor unidade gráfica e a menor unidade fonológica.
Meados do século XIII
Ao avançarmos no período da Idade Média, em meados do século XIII, encontramos os estudiosos conhecidos
como modistas, voltados para o entendimento do modo como os termos da língua passam a ter significação.
Eles perceberam que a estrutura das línguas é universal, o que existe em uma língua, existe na outra, em
termos de estrutura.

Surgem, então, as chamadas gramáticas especulativas, que tinham o objetivo de integrar a descrição
gramatical à teoria filosófica da escolástica, tomando como base o que Prisciano já havia feito.

Escolástica
Método para pensar e aprender que conciliava a fé cristã com o pensamento racional.

Atenção
Os gramáticos especulativos ensinavam que a palavra não representa diretamente a natureza da coisa
significada, mas apenas como ela existe de uma maneira ou de um modo: uma substância, uma ação,
uma qualidade. (BORBA, 1998)

Essa gramática baseava-se na ideia de que a língua é um espelho que reflete a realidade subjacente aos
fenômenos do mundo físico. Desse modo, tentava-se determinar de que forma a palavra se vinculava à
inteligência e à coisa que ela representava.

Século XVI
De acordo com Petter (2003), houve uma
numerosa tradução de livros sagrados para
diversas línguas no século XVI graças à
Reforma Protestante, ainda que o latim se
mantivesse como língua universal.

Ao mesmo tempo, os viajantes trouxeram seus


conhecimentos das línguas com as quais
tiveram contato, desconhecidas na Europa até
aquele momento.

No início desse século, foi lançado o primeiro


dicionário poliglota do mundo.

Séculos XVII e XVIII


Entre os séculos XVII e XVIII, a preocupação com os modelos anteriores continua. Por isso, em 1660, na
França, surge a Gramática de Port-Royal, escrita pelo padre, teólogo e filósofo Antoine Arnauld e pelo monge
e gramático Claude Lancelot. Essa gramática passa a ser o modelo para muitas gramáticas daquele momento.
O consenso na época é que a linguagem estava fundada na razão e refletia o pensamento, logo, os princípios
de análise deveriam ser universais para qualquer língua.

Lyons (1987) afirma que, nesse período, a preocupação era “demonstrar que a estrutura da língua é um
produto da razão e que as diferentes línguas são apenas variedades de um sistema lógico e racional mais
geral”.

Século XIX
O conhecimento cada vez maior da linguagem provoca o interesse pelas línguas faladas, ao invés de análises
abstratas sobre a linguagem, como era o costume anteriormente. Segundo Petter (2003), é nesse período que
surgem as chamadas gramáticas comparadas e a linguística histórica. Torna-se evidente que as línguas
passam por transformações ao longo do tempo, independentemente da vontade dos falantes, seguindo as
necessidades próprias da língua. Vejamos alguns autores que se destacaram nessa época:

Wilhelm von Humboldt

No início do século XIX, o filósofo e linguista prussiano Wilhelm von Humboldt, fundador na Alemanha
da Universidade de Berlim, “procurou estabelecer o mecanismo e a natureza da linguagem por meio
de raciocínios gerais que se aplicam ao funcionamento das línguas em particular”.

Humboldt entendia a língua como energia ou força criadora de cada um, não sendo apenas um
produto a ser utilizado pelos falantes. Desse modo, a língua exerceria grande influência no modo
como os falantes percebem e organizam a realidade, o mundo dos objetos, e em torno disso sua
própria mente ou pensamento. (BORBA, 1998)

Franz Bopp

No começo do século XIX, o alemão Franz Bopp, linguista e professor na Universidade de Berlim,
publica um estudo comparando o grego, o latim, o persa e o germânico. Tem-se o início da chamada
linguística histórica, que ressaltava as semelhanças entre as línguas, evidenciando que muitas delas
tinham um ancestral comum.

De acordo com Petter (2003), a descoberta de semelhanças entre essas línguas e grande parte das
línguas europeias evidenciou que existia entre elas uma relação de parentesco, que elas constituíam,
portanto, uma família, a indo-europeia, cujos membros tinham uma origem comum, o indo-europeu,
ao qual se pode chegar por meio do método histórico-comparativo.

Os estudos no século XIX, identificados com a linguística histórica e atrelados à gramática comparada,
levavam em conta a mudança das línguas e procuravam descobrir sua história, comparando, por exemplo,
línguas europeias a outras mais antigas ou ancestrais. Tudo isso contribuiu para o fortalecimento de um
sistema próprio para tratar exatamente da linguagem (o que chamamos de metalinguagem), para o
estabelecimento de símbolos e para o desenvolvimento de recursos para descrição de uma língua. Além disso,
os estudos ao longo do século XIX prepararam o terreno para o surgimento da Linguística como ciência da
linguagem no início do século XX.

Linha do tempo
Para saber mais sobre os estudos da linguagem ao longo do tempo, assista ao vídeo a seguir.

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Quando começam os estudos sobre a linguagem?

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Os estudos históricos e comparativistas

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Verificando o aprendizado

Questão 1

No período chamado pré-linguístico, especialmente na Grécia e Roma antigas, os primeiros estudos da


linguagem se distinguem por "serem":

estudos paralinguísticos, porque se caracterizavam por análises filosóficas e abordagens da natureza


biológica da linguagem, em vez de examinar os aspectos próprios da linguagem.

estudos gramaticais históricos e comparativistas, porque abordavam a evolução das línguas e comparavam
línguas mortas a línguas vivas.

estudos modistas, porque se ocupavam do modo como as palavras produzem sentido.

estudos históricos e etimológicos, porque investigavam a formação das línguas europeias a partir de um
tronco linguístico comum.

estudos semióticos que utilizavam conceitos teóricos sofisticados e complexos.

A alternativa A está correta.


Os primeiros estudos são denominados paralinguísticos, pois eram mais voltados para análises filosóficas e
abordagens da natureza biológica da linguagem, em vez de se limitarem a aspectos próprios da linguagem.
Platão e Aristóteles são exemplos de pensadores que estudaram a linguagem privilegiando uma análise
filosófica.

Questão 2

No século XIX, os estudos pré-linguísticos devem ser distinguidos "como":


A

investigação científica da linguagem, que valorizava o estado da língua, em vez de se ocupar de suas
mudanças históricas.

estudos que não contribuíram para o estabelecimento de uma metalinguagem ou linguagem própria no estudo
da língua.

estudos de gramática especulativa identificados com a filosofia escolástica e a retomada de pensadores como
Platão e Aristóteles.

estudos identificados com a linguística histórica e a gramática comparada, que prepararam o terreno para o
surgimento da Linguística como ciência da linguagem no início do século XX.

investigação científica, sistemática e metódica a partir do estabelecimento de área reconhecida


academicamente.

A alternativa D está correta.


Os estudos da linguagem no século XIX correspondem à linguística histórica e estão relacionados com a
gramática comparada, focando na mudança das línguas e na descoberta de sua história, comparando, por
exemplo, línguas europeias a outras mais antigas ou ancestrais.
4. O estabelecimento da Linguística

A Linguística como ciência da linguagem


Até o início do século XX, os estudos
linguísticos não possuíam autonomia, pois
estavam submetidos a outras áreas, como a
Lógica, a Filosofia, a História e a Literatura.
Mas, a partir desse momento, os estudos
linguísticos começam a se preocupar apenas
com os fatos da linguagem, usando métodos
científicos para estabelecer hipóteses e
sistematizando os dados, com um quadro
teórico para tal empreitada. Surge, então, a
Linguística Moderna, ou simplesmente
Linguística, a ciência da linguagem, tendo como
marco de sua fundação os estudos de
Ferdinand de Saussure.

Saiba mais
Ferdinand de Saussure Ferdinand de Saussure (1857-1913) foi um importante filósofo e linguista suíço.
Na Alemanha, estudou química, física, grego, latim, sânscrito, celta e indiano. Com apenas 24 anos, na
França, começou a ensinar linguística histórica em uma universidade. Seus cursos ficaram famosos e, em
1891, voltou para Genebra, sua cidade natal, onde ministrou aulas até 1911. As aulas entre 1907 e 1911,
conhecidas como Curso de Linguística Geral, são a base para a Linguística Moderna.

Segundo Alkmin (2004), desde as tradições antigas de estudo da linguagem até o surgimento da Linguística,
os estudos se vinculavam ao contexto e às questões de sua época. Por isso,

“As teorias da linguagem, do passado ou atuais, sempre refletem as concepções particulares do


fenômeno linguístico e as compreensões distintas do papel deste na vida social”.

Assim, nos diferentes momentos históricos, “as teorias linguísticas definem, a seu modo, a natureza e as
características relevantes do fenômeno linguístico. E, evidentemente, a maneira de descrevê-lo e de analisá-
lo”.

Veja algumas definições ou conceitos para a Linguística:

Definição de Silva

A ciência que investiga os fenômenos relacionados à linguagem e que busca determinar os princípios
e as características que regulam as estruturas das línguas. (SILVA, 2007)
Definição de Franchi

A ciência que se se interessa pelo conjunto estruturado dos recursos linguísticos que expressa as
relações, funções e categorias relevantes para a interpretação dos enunciados (dimensão sintática);
pelos modos de representação da realidade, tomados como sistema de referência para essa
interpretação (dimensão semântica); pelos mecanismos que relacionam essa interpretação a
determinados estados de fato, nas coordenadas espaço-temporal e interpessoal (dimensão dêitico-
referencial), e a determinadas situações de uso, inclusive para avaliar os enunciados, do ponto de
vista de sua adequação a determinadas ações e a determinados propósitos (dimensão pragmático-
discursiva) ou do ponto de vista de sua verdade ou falsidade (dimensão lógica). (FRANCHI, 1990)

Definição de Cunha, Costa e Martellota

A ciência que tem um objeto de estudo próprio: a capacidade da linguagem, que é observada a partir
dos enunciados falados e escritos. Esses enunciados são investigados e descritos à luz de princípios
teóricos e de acordo com uma terminologia específica e apropriada. A universalidade desses
princípios teóricos é testada através da análise de enunciados em várias línguas. A Linguística tende a
ser empírica, e não especulativa ou intuitiva, assim, tende a basear suas descobertas em métodos
rígidos de observação. Ou seja, a maioria dos modelos linguísticos contemporâneos trabalha com
dados publicamente verificáveis por meio de observações e experiências. Estreitamente relacionada
ao caráter empírico da Linguística está a atitude não preconceituosa em relação aos diferentes usos
da língua. Essa atitude torna a Linguística, primordialmente, uma ciência descritiva, analítica e,
sobretudo, não prescritiva. (CUNHA; COSTA; MARTELLOTA, 2008)

A Linguística surge como uma forma de descrever e de compreender o mistério de uma pessoa ser capaz de
se comunicar com outra por intermédio de sinais que são percebidos sensorialmente, ou seja, ela se volta para
o estudo dos códigos que usamos para realizar a comunicação. Ocupa-se, inicialmente, da descrição e da
análise da estrutura e do funcionamento da língua, a partir da observação dos fatos linguísticos.

O Linguista e seu método


Se a Linguística é a ciência que estuda a linguagem, quem é o linguista?

Cunha, Costa e Martellota (2008) afirmam que o linguista é o profissional ou pesquisador que trabalha “suas
observações sobre a linguagem, relacionando-as a uma teoria linguística construída para esse propósito. A
partir dessa teoria, criam-se métodos rigorosos para a descrição das línguas”.

Os estudos da Linguística não têm necessariamente a ver com a aprendizagem de muitas línguas,
em ser um poliglota, mas o linguista deve ser capaz de discutir sobre uma ou mais línguas, conhecer
seu funcionamento, suas semelhanças e suas diferenças.

Diferentemente da gramática normativa, a gramática que aprendemos na escola, a Linguística está mais
preocupada em explicar e descrever fatos, indo além do conceito de certo e errado, descrevendo padrões
sonoros, lexicais e gramaticais existentes na língua, sem avaliar se seu uso é bom ou ruim, belo ou feio. Sobre
isso, imagine a seguinte situação:
Exemplo
Jorge gosta de música clássica e Ana prefere ouvir músicas eletrônicas. Ambos jamais poderão dizer que
o seu estilo musical é melhor ou pior que o do outro, pois aí entram critérios subjetivos, de gosto pessoal
e de formação cultural de cada pessoa.Em relação ao uso da língua, as variações existem, mas não
tornam aquele modelo melhor ou pior do que outro. Por isso, as variações da pronúncia, do vocabulário e
da sintaxe dos moradores de uma zona rural com pouco acesso à escola não são julgados engraçados
ou errados pela Linguística, mas são analisados e explicados dentro de um quadro teórico específico.

Qual a metodologia que o linguista utiliza?

A metodologia do linguista foca principalmente na língua


oral de determinada comunidade, mas em segunda
instância pode analisar a escrita também. A prioridade da
língua oral na Linguística difere da abordagem tradicional ou
mesmo da gramática escolar, mais preocupadas com o
modelo literário utilizado na língua. Dado o prestígio da
língua escrita na maioria das sociedades do mundo, é difícil
convencer o leigo da importância do estudo da oralidade,
indo além do modelo escrito, tipográfico.

A Linguística desenvolveu uma metodologia com a intenção


de descrever e analisar a língua a partir de conjunto de
dados coletados, o corpus. Esse conjunto não é formado
apenas por frases corretas do ponto de vista da gramática
normativa, mas de tudo aquilo que é efetivamente realizado. Essa postura teórica e metodológica dá à
Linguística o seu caráter científico fundamentado na observação dos fatos linguísticos e na objetividade, livre
de estigmas sociais ou mesmo culturais.

Segundo Cunha, Costa e Martellota (2011), pode-se afirmar que a Linguística executa duas tarefas principais:

“O estudo das línguas particulares como “O estudo das línguas como um meio
um fim em si mesmo, com o propósito de para obter informações sobre a natureza
produzir descrições adequadas de cada da linguagem de um modo geral”.
uma delas”.

A Linguística, portanto, entende que nenhuma língua é intrinsecamente superior ou inferior à outra, porque
todo sistema linguístico é capaz de transmitir de forma adequada a cultura do povo que fala determinada
língua. Assim, uma língua minoritária, falada por alguns povos indígenas, por exemplo, não é inferior a uma
língua falada por milhões de usuários, como o inglês.

As áreas da Linguística
Segundo Petter (2003), a área da Linguística pode ser dividida da seguinte maneira, levando em conta o foco
de análise:
Linguística descritiva (ou sincrônica)

Trata de uma língua, descrevendo-a simultaneamente no tempo, analisa as relações existentes entre
os fatos linguísticos em um estado da língua, além de fornecer dados que confirmam ou não as
hipóteses. Modernamente, ela cede lugar à Linguística Teórica, que constrói modelos teóricos, mais
do que descreve.

Linguística histórica (ou diacrônica)

Analisa as mudanças que a língua sofre através dos tempos, preocupando-se, principalmente, com as
transformações ocorridas.

Linguística teórica

Procura estudar questões sobre como as pessoas, usando suas linguagens, conseguem comunicar-
se; quais propriedades todas as linguagens têm em comum; qual conhecimento uma pessoa deve
possuir para ser capaz de usar uma linguagem e como a habilidade linguística é adquirida pelas
crianças.

Linguística Aplicada

Utiliza conhecimentos da Linguística para solucionar problemas, geralmente referentes ao ensino de


línguas, à tradução ou aos distúrbios de linguagem.

Linguística Geral

Engloba todas as áreas, sem um detalhamento profundo. Fornece modelos e conceitos que
fundamentarão a análise das línguas.

A partir disso, surgiram outras vertentes como:

Sociolinguística Neurolinguística

Busca analisar a relação da língua e da Estuda o comportamento da língua no cérebro,


sociedade. no processamento das informações.

Psicolinguística Etnolinguística

Tenta explicar a aquisição da linguagem, seja a Trabalha a relação da língua e da cultura, entre
língua nativa ou uma estrangeira. outras áreas.

Assim, ao longo do século XX, a área da Linguística foi se constituindo de forma interdisciplinar, com o
interesse e a contribuição dessas áreas do conhecimento.

Divisões da Linguística
Para saber mais sobre as subdivisões da Linguística, assista ao vídeo a seguir.

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O estudo científico da linguagem

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O linguista e seu método

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Verificando o aprendizado

Questão 1

O caráter científico da Linguística deve ser reconhecido porque:

a Linguística desenvolveu uma metodologia com a intenção de avaliar a língua, a partir de um conjunto de
dados coletados, para estabelecer o que é correto e quais usos da língua são superiores e quais são
inferiores.

a observação dos fatos linguísticos a partir da subjetividade do pesquisador permite identificar qual sistema
linguístico não é capaz de transmitir a cultura do povo que o utiliza.

a língua é estudada do ponto de vista da gramática normativa, com uma metodologia que prescreve o certo e
o errado no uso da linguagem.

a metodologia utilizada tem a intenção de descrever e analisar a língua, a partir de dados coletados,
estabelecendo uma postura teórica e metodológica fundamentada na observação dos fatos linguísticos e na
objetividade.
E

é empregado o método histórico que busca reconstruir a história das línguas e o estabelecimento de sua
origem.

A alternativa D está correta.


A Linguística desenvolveu uma metodologia própria para descrição e análise da língua a partir da
observação do sistema da língua e da coleta de dados dessa língua. Assim, a Linguística se estabeleceu
como área e disciplina acadêmica, não mais limitada ao estudo da história da língua ou da abordagem
etimológica e gramatical.

Questão 2

Assinale a alternativa que apresenta uma afirmação identificada com o caráter científico da Linguística e do
trabalho do linguista.

O linguista é o pesquisador que especula sobre a linguagem, relacionando suas observações com o senso
comum.

A partir de determinada teoria, criam-se métodos de análise para estabelecimento de regras gramaticais das
línguas.

Os estudos da Linguística devem, obrigatoriamente, conduzir ao aprendizado de muitas línguas a fim de


formar poliglotas.

O linguista deve ser capaz de pesquisar uma ou mais línguas, descrevendo seu funcionamento e elementos
comuns ou distintos.

O linguista deve atuar a partir das teorias e métodos estabelecidos na filosofia ou ciências sociais, que
tradicionalmente estudam a linguagem.

A alternativa D está correta.


Cunha, Costa e Martellota (2008) afirmam que, se a Linguística é a ciência que estuda a linguagem, o
linguista é o profissional ou pesquisador que trabalha suas observações sobre a linguagem, relacionando-
as a uma teoria linguística construída para esse propósito. A partir dessa teoria, criam-se métodos
rigorosos para a descrição das línguas. Assim, os estudos da Linguística não têm necessariamente a ver
com a aprendizagem de muitas línguas, em ser um poliglota, mas o linguista deve ter a competência de
discutir sobre uma ou mais línguas, conhecer seu funcionamento, suas semelhanças e suas diferenças.
5. Conclusão

Considerações finais
O que você aprendeu neste conteúdo?
Como todas as outras ciências, a Linguística serve para ampliar o conhecimento e a compreensão da
realidade, do mundo. No caso da Linguística, o que se quer conhecer e pesquisar é uma das mais importantes
características do ser humano: a linguagem. As aplicações dos estudos linguísticos surgem em decorrência do
conhecimento construído. Por meio da pesquisa dos linguistas, pode-se compreender as estruturas e o
funcionamento das línguas, inclusive daquelas mais desconhecidas e remotas; elaborar teorias sobre a
aquisição da linguagem; reconhecer os fenômenos de mudança e de variação na língua; obter subsídios ou
fundamentos para metodologias de ensino das línguas; descobrir as relações entre linguagem e pensamento,
linguagem e sociedade, linguagem e cultura, entre outras possibilidades.

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Acompanhe a entrevista com o professor Mário Perini, da UFMG, Sobre língua, linguagem e Linguística, feita
pela Revista Virtual de Estudos da Linguagem - ReVEL, vol. 8, n. 14, 2010.

Para uma visão mais ampla e detalhada da história dos estudos linguísticos, leia o artigo Evolução dos estudos
linguísticos, da professora Lucia F. Mendonça Cyranka, da UFJF, publicado na Revista Práticas de Linguagem.
v. 4, n. 2, jul./dez. 2014.

Referências
BORBA, F. S. Introdução aos estudos linguísticos. 12. ed. Campinas: Pontes 1998.

BRANDÃO, R. O. A tradição sempre nova. São Paulo: Ática, 1976.

CÂMARA JR., J. M. Dicionário de linguística e gramática. 15. ed. Petrópolis: Vozes, 1996.

CÂMARA JR., J. M. História da linguística. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 2011.

DALLIER, L. C. Linguística. Rio de Janeiro: SESES, 2015.


LYONS, J. Introdução à linguística teórica. São Paulo: Edusp, 1979.

LYONS, J. Linguagem e Linguística: uma introdução. Rio de Janeiro: LTC, 1987.

MARTELLOTA, M. E. Dupla articulação. In: MARTELOTTA, M. E. (org.). Manual de linguística. 2. ed. São Paulo:
Contexto, 2011.

RIBEIRO, M. P. Gramática aplicada da língua portuguesa. 22. ed. Rio de Janeiro: Metáfora, 2013.

ROBINS, R. H. Pequena História da Linguística. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1983.

SANTAELLA, L. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1983.

SARAIVA, F. R. S. Dicionário latino-português. 11. ed. Rio de Janeiro: Garnier, 2000.

SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, Edusp, 1969.

YODA, F.; NAGATA, V. Semiótica. FEA/USP, 08 mai. 2018.

WILSON, V.; MARTELLOTA, M. E. Arbitrariedade e iconicidade. In: MARTELOTTA, M. E. (org.). Manual de


linguística. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2011.

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