LEGISLACAO01

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 26

LEGISLAÇÃO AMBIENTAL

AULA 1

Profª Victória R. C. Monteiro Zanona


CONVERSA INICIAL

Nesta aula será apresentada uma introdução sobre a legislação


ambiental, iniciando com um histórico das principais tragédias e conferências
sobre o meio ambiente já realizadas, alguns marcos ambientais e como estes
marcos e fatos estão relacionados com a legislação. Em seguida, serão
abordados alguns conceitos e os princípios do direito ambiental e será
demonstrada a estrutura da legislação, ou seja, como são organizadas as leis,
decretos e resoluções.
Serão apresentadas ainda nesta aula, as primeiras leis ambientais que
surgiram no Brasil e o artigo 255 da Constituição Federal de 1988, o qual foi
apresentado em um capítulo pela primeira vez na constituição, para tratar sobre
o meio ambiente, e portanto, é muito relevante para o estudo da legislação
ambiental.

TEMA 1 – CONFERÊNCIAS, MARCOS AMBIENTAIS E AS LEIS

O conceito legal do meio ambiente está contido na Política Nacional do


Meio Ambiente, da Lei 6.938/1981 que o definiu como sendo “o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (BRASIL, 1981, p.2). Em
outras palavras, podemos entender o meio ambiente como tudo que está ao
nosso redor e que permite que a vida aconteça.
A partir da interação do homem com o meio ambiente tiveram início os
processos de degradação da natureza, principalmente pela exploração dos
recursos naturais e pelas modificações da paisagem natural. Portanto, por volta
da década de 60 começou-se a tomar consciência sobre os problemas
ambientais que vinham sendo causados (WATANABE, 2011).
A preocupação com o meio ambiente que dá origem à consciência
ambiental, começou a surgir devido ao acontecimento de algumas tragédias
ambientais. O mundo todo começou a entender que a preservação do meio
ambiente era um tema a ser discutido e, portanto, começaram a ocorrer
conferências mundiais para tratar sobre o assunto. Muitos dos resultados dessas
discussões, entre os países participantes das conferências, foram registrados
em relatórios e documentos.

2
1.1 Principais tragédias ambientais

A primeira tragédia ambiental que teve uma grande repercussão no


mundo todo e é comumente relatada pela literatura, é o acidente de Minamata,
no Japão. Este acidente ocorreu por volta de 1956 devido a um lançamento de
efluentes de uma indústria que continha mercúrio na Baía de Minamata,
causando intoxicação nas pessoas que se alimentaram dos peixes. A
contaminação acabou causando sérios problemas de saúde pois atingiu o
sistema nervoso central dos indivíduos, ficando o episódio conhecido como “O
Mal de Minamata” ou “Doença de Minamata”. Até o ano de 1997, mais de dois
mil casos da doença haviam sido reportados (MICARONI et al., 2000; CERUTI,
2010).
Outro acidente que chamou a atenção aconteceu em Seveso, na Itália em
1976. Uma explosão ocorreu em uma indústria química, havendo liberação de
uma nuvem de poluição contendo substâncias como triclorofenol e dioxinas. A
nuvem se espalhou por alguns quilômetros atingindo mais de 700 famílias
(FONTES et al., 2015; CERUTI, 2010).
Na década de 80, outro acidente com uma indústria ficou marcado, o
acidente de Bhopal, na Índia, em 1984. Neste caso, ocorreu um vazamento de
quarenta toneladas de gases tóxicos, como o isocianato de metila, de uma
fábrica de agrotóxicos. Esse acidente é considerado por alguns o maior acidente
químico da história, pois mais de três mil pessoas morreram além de diversos
animais, sendo que mais de quinhentas mil pessoas foram atingidas
(BARREIRA, 2007; FONTES et al., 2015).
Em 1986, dois anos após o acidente na Índia, ocorreu um acidente na
cidade de Basiléia, na Suíça, que contaminou o rio Reno, um dos mais
conhecidos da Europa. Diversos produtos químicos que estavam armazenados
pegaram fogo, e a água utilizada para conter o incêndio, carreou os poluentes
que acabaram chegando ao rio. Toda a comunidade aquática do rio foi afetada,
vários quilômetros rio abaixo (MAVAIEIE JÚNIOR et al., 2019).
Não podem deixar de ser citados os desastres nucleares, sendo o
principal, o ocorrido também em 1986, em Chernobyl, na Ucrânia. O acidente
ocorreu pela explosão de um reator nuclear. O incêndio no reator durou dez dias
e contribuiu para espalhar mais ainda o material radioativo, contaminando uma

3
extensa área, causando a morte de dez mil pessoas e afetando 600 mil
trabalhadores (BARREIRA, 2007; LIMA et al., 2020).
No Brasil, na cidade de Goiânia, em 1987, aconteceu um acidente com o
composto radioativo Césio 137. Dois catadores de materiais recicláveis
encontraram um equipamento em um prédio abandonado, que costumava ser
uma clínica de radioterapia. Os catadores removeram a proteção de chumbo do
equipamento e liberaram o Césio 137, que chamou a atenção por sua luz azul
brilhante. Cerca de 250 pessoas foram contaminadas e quatro morreram
(CHAVES, 2007; BARREIRA, 2007). Esse acidente demonstra o quão grave
podem ser as consequências do abandono de resíduos perigosos por
empreendimentos que encerram suas atividades.
Existem ainda acidentes significativos envolvendo o derramamento de
petróleo, que de acordo com Barreira (2007) geravam as “marés negras” que
atingiam a costa dos países e matavam aves e outros animais do ecossistema.
O primeiro derramamento de grande repercussão aconteceu no Alasca, em
1989, em que foram derramados quarenta e três mil metros cúbicos de óleo cru
no mar. Em 2019, o Brasil registrou quatro vazamentos de óleo, sendo um no
Rio de Janeiro, com a liberação de 4.900 litros de óleo no mar. Outro ocorreu no
Espírito Santo, com o maior vazamento, de 260 mil litros de óleo. Aconteceram
ainda vazamentos nas cidades de Búzios, Arraial do Cabo, Cabo Frio e Campos
dos Goytacazes. Ainda, no ano de 2020, um oleoduto se rompeu na Baía de
Guanabara e liberou 1.300 metros cúbicos de óleo (EUZEBIO et al., 2019).
Infelizmente a lista de tragédias ambientais segue crescendo. Dois
acidentes envolvendo a mineração no Brasil ocorreram nos últimos anos. Em
2015, uma barragem de rejeitos da mineração se rompeu, na cidade de Mariana,
em Minas Gerais. Foram lançados 45 milhões de metros cúbicos de rejeitos,
matando dezenove pessoas e causando enorme destruição. A enxurrada de
rejeitos percorreu mais de 660 quilômetros do rio Doce atingindo até o litoral do
Espírito Santo, contaminando também a área costeira do mar (SILVA et al., 2020;
SARTI, 2021). Um retrato do acidente é apresentado na Figura 1.

4
Figura 1 - Rio Doce, rio de lama em Minas Gerais, Brasil, desastre Mariana.

Crédito: Leonardo Mercon/Shutterstock.

No ano de 2019, o estado de Minas Gerais foi mais uma vez atingido por
um grave acidente ambiental, desta vez ocorrido na cidade de Brumadinho. Este,
de acordo com Silva et al. (2020, p.21), “é considerado um dos maiores acidentes
de trabalho ampliado da indústria minerária brasileira”. Uma barragem de rejeitos
de minério de ferro se rompeu provocando a morte de 270 pessoas, sendo que
cinco ainda estão desaparecidas (PORTAL G1, 2022). Os rejeitos atingiram o
Córrego do Feijão e o rio Paraopeba afetando cerca de dezoito municípios,
causando impactos ambientais, socioeconômicos e na saúde (SILVA et al.,
2020).
1.2 Conferências e marcos ambientais
Previamente a realização das conferências, alguns acontecimentos
podem ser considerados marcos para a questão ambiental, como o lançamento
do livro “Primavera Silenciosa” por Rachel Carson, em 1962. O livro abordava a
questão da utilização de pesticidas e agrotóxicos e seus impactos no meio
ambiente e na saúde. Também na década de 60, surgiu o conceito do limite do
crescimento econômico, pelo chamado Clube de Roma, para evitar que os

5
recursos naturais se esgotassem. No entanto, esta ideia não teve muitos adeptos
(BARREIRA, 2007; WATANABE, 2011).
A partir dos diversos acontecimentos, discussões e da percepção dos
problemas ambientais, a comunidade internacional reagiu e foi organizada a
primeira conferência para o meio ambiente denominada Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada pela Organização Mundial
das Nações Unidas (ONU), que convocou diversos países a participarem, no ano
de 1972, em Estocolmo, na Suécia (BARREIRA, 2007).
Esta primeira conferência foi muito relevante para a questão ambiental,
pois auxiliou no desenvolvimento da consciência ambiental da sociedade e dos
governantes. Foi estabelecido o dia 5 de junho como o Dia Mundial do Meio
Ambiente, e também foi criado o Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente, o PNUMA (BARREIRA, 2007; BRASIL, 2012).
Em 1983, foi criada a Comissão Mundial de Desenvolvimento e Meio
Ambiente, presidida pela médica Gro Harlem Brundtland, ficando a comissão
conhecida como Comissão Brundtland, que emitiu o relatório “Nosso Futuro
Comum” em 1987, no qual apareceu pela primeira vez o conceito do
desenvolvimento sustentável (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2020). De acordo
com o relatório, o desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que supre
as necessidades do presente sem comprometer a habilidade das futuras
gerações de suprirem as suas próprias necessidades (WORLD COMMISSION
ON ENVIRONMENT AND DEVELOPMENT, 1987). Um conceito de extrema
importância para a questão ambiental e para a legislação.
A segunda conferência ocorreu 20 anos após a primeira e foi realizada no
Rio de Janeiro, no Brasil, sendo então chamada de Rio-92, Eco-92 ou Cúpula da
Terra. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento reuniu 172 países, dez mil jornalistas e representantes de
1.400 ONGs e auxiliou na consolidação do conceito do desenvolvimento
sustentável. Esta conferência teve diversos desdobramentos, como a instituição
da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, a
Convenção da Diversidade Biológica, a Declaração de Princípios sobre
Florestas, a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a
Convenção das Nações Unidas sobre Combate à Desertificação e a Agenda 21
(BRASIL, 2012).

6
Foi chamada de Rio+10 ou Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento
Sustentável a conferência que aconteceu 10 anos após a Rio-92, realizada no
ano de 2002 em Johanesburgo, na África do Sul. Foram analisados os resultados
alcançados até então e discutidos novos caminhos. Foram destacados os
problemas da globalização e buscou-se obter um plano de ação global (DINIZ,
2002).
Vinte anos após a Rio-92, a conferência da ONU para o meio ambiente
volta a ocorrer no Brasil, e é então denominada de Rio+20. O objetivo desta
conferência foi renovar o compromisso com o desenvolvimento sustentável,
avaliando a evolução e as necessidades. Os temas principais abordados foram
“a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação
da pobreza” e a “estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável”
(BRASIL, 2012). Além disso, foi decidido iniciar um processo para lançar os
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável ou “Sustainable Development Goals”,
que acabaram sendo lançados em 2015, como a Agenda 2030, a qual contém
17 objetivos e 169 metas a serem alcançadas até o ano de 2030. Os objetivos
são apresentados na Figura 2.

Figura 2 – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, agenda 2030.

Crédito: Helen18255/Shutterstock.

Apesar de haverem algumas críticas as conferências, por não trazerem


um real avanço, pelas promessas dos países e seus governantes, e da falta de
colocarem em prática o desenvolvimento sustentável e não demonstrarem

7
comprometimento com o meio ambiente, mesmo frente aos efeitos já
observados da degradação ambiental (GUIMARÃES e FONTOURA, 2012), é
importante que continuem acontecendo, para que os assuntos tão relevantes se
mantenham em pauta e se aprofundem as discussões.
A mais recente conferência aconteceu em 2022, e o encontro retornou a
cidade de Estocolmo, na Suécia, onde foi realizada a primeira conferência,
cinquenta anos atrás. Por isso, foi denominada de Estocolmo +50. O tema foi
“um planeta saudável para a prosperidade de todos e todas – nossa
responsabilidade, nossa oportunidade”. Os palestrantes reivindicaram um
compromisso real para solucionar as preocupações ambientais de maneira
urgente, buscando uma economia sustentável. Além disso, foram feitos pedidos
para que se acelere a implantação da Agenda 2030 (UNEP, 2022).

1.3 Impactos das conferências e tragédias para a legislação ambiental

Após a apresentação das principais tragédias e conferências relacionadas


ao meio ambiente, é importante refletirmos sobre os seus impactos e sua relação
com a legislação ambiental.
Muitos documentos e relatórios são escritos nos encontros e conferências
realizados, e estes documentos servirão como base e orientarão os países nas
ações em prol do meio ambiente, inclusive na formulação de leis. As
conferências também podem influenciar na criação de comissões para discutir
os temas internamente no país e então deliberar sobre novas normas e
resoluções necessárias.
Como um primeiro exemplo, pode ser citada a Convenção de Minamata,
instituída em 2013 e assinada por 128 países. Trata-se de um tratado
internacional, cujo nome remete ao acidente na Baía de Minamata, e tem o
objetivo de proteger a saúde e o meio ambiente dos perigos causados pelo
mercúrio. Uma das atividades consideradas pela Convenção é a diminuição da
comercialização de lâmpadas de mercúrio, por exemplo (SILVA et al., 2017).
Relacionado ao acidente de Seveso, na Itália, foi publicado na União
Europeia, em 1982, a Diretiva de Seveso, que apresenta como objetivos prevenir
acidentes envolvendo substâncias perigosas e limitar as consequências para o
homem e para o meio ambiente (FONTES et al., 2015).
Com relação as questões nucleares, existe desde 1957 a Agência
Internacional de Energia Atômica que implementa normas para diminuir os riscos
8
associados a energia nuclear. Porém, nos anos de 1986 e 1987, logo após o
acidente de Chernobyl, foram criadas a Convenção sobre a Rápida Notificação
de Acidentes Nucleares e a Convenção sobre Assistência em caso de Acidente
Nuclear ou Emergência Radiológica (LIMA et al., 2020).
Ainda, como último exemplo, pode ser citada a Convenção Internacional
sobre Preparação, Resposta e Cooperação para Poluição por Óleo, instituída
após o grande derramamento de óleo ocorrido no Alasca. Foi definido que
qualquer acidente do tipo deve ser avisado imediatamente as autoridades
marítimas, os navios devem ter equipamentos para conter vazamentos e
simulações devem ser realizadas periodicamente para evitar falhas (EUZEBIO
et al., 2019).
Sendo assim, a partir da participação dos países nas diversas convenções
internacionais, as normas passam a ser aplicadas e utilizadas, influenciando ou
passando a fazer parte das legislações federais, estaduais ou municipais.

TEMA 2 – DIREITO AMBIENTAL

O direito ambiental é um ramo relativamente novo do direito, foi


desmembrado do direito administrativo e se tornou independente a partir da Lei
6.938/1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente (SIRVINSKAS,
2010). Barreira (2007) ressalta que este ramo está relacionado ao direito
internacional ambiental, tendo em vista que as discussões se iniciaram em nível
mundial e levaram a diferentes tratados e convenções.
O direito ambiental pode ser entendido como um ramo da ciência do
direito que protege o meio ambiente ecologicamente equilibrado e é constituído
por um conjunto de regras jurídicas (GUIMARÃES FILHO, 2005). Outra definição
para o direito ambiental é a de que é “a ciência que estuda, analisa e discute as
questões e os problemas ambientais e sua relação com o ser humano, tendo por
finalidade a proteção ao meio ambiente e a melhoria das condições de vida no
planeta” (GUIMARÃES FILHO, 2005, p.10), ou ainda “um conjunto de regras e
princípios que criam obrigações e direito de natureza ambiental para os estados,
organizações intergovernamentais e os indivíduos” (BARREIRA, 2007).
O direito ambiental engloba vários ramos do direito atuando na área
administrativa, civil e penal, por exemplo, e por isso é considerado que apresenta
um aspecto horizontal. Por outro lado, o caráter vertical está associado a
abrangência do direito público e também particular, com maior tendência para o
9
público. O direito ambiental também é considerado interdisciplinar, pois depende
de conceitos técnicos de outras ciências como ecologia, biologia, geografia,
engenharias ambiental e florestal, para que o meio ambiente possa ser protegido
em juízo (BARREIRA, 2007; SIRVINSKAS, 2010).

2.1 Conceitos

Além do conceito de direito ambiental, é importante esclarecermos os


conceitos de legislação. A legislação é “um conjunto de leis acerca de
determinada matéria. A ciência das leis. Todas as normas jurídicas das três
esferas do governo” com o objetivo de manter a ordem (CERUTI, 2010, p.24).
A legislação ambiental, está relacionada ao conjunto de leis que abordam
a questão ambiental. Dentro da legislação ambiental, tem-se principalmente as
leis, que estabelecem critérios, condições, restrições e penalidades, e os
decretos, que trazem um detalhamento das leis e orientações para a sua
aplicação, regulamentam as leis, mas são hierarquicamente inferiores à elas
(CERUTI, 2010). Fazem parte da legislação ambiental ainda, as resoluções e as
normas.

2.2 Princípios do direito ambiental

Um princípio está relacionado a um valor fundamental, uma base, um


alicerce, uma regra geral. O princípio extrai a essência das normas e pode ser
entendido como a regra fundamental de uma ciência. De forma similar, os
princípios do direito ambiental contém a essência das normas ambientais e
constituem a base do direito ambiental. Os princípios facilitam o estudo e análise
de certos fundamentos do direito e visam garantir a qualidade de vida, de acordo
com o desenvolvimento sustentável (GUIMARÃES FILHO, 2005).
É importante ressaltar que não existe um consenso sobre os princípios
entre os autores, ou seja, eles não são idênticos e variam de autor para autor,
no entanto, a essência dos princípios é a mesma. De acordo com Barreira
(2007), os princípios que regem o direito ambiental se originaram nas
conferências, que influenciaram internamente os países.
Na sequência são apresentados os principais princípios do direito
ambiental.
• Princípio do Direito Humano Fundamental

10
De acordo com Barreira (2007), este princípio diz que o homem tem direito
ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e que todos os outros princípios
derivam deste. Ele se originou na declaração de Estocolmo, da conferência de
1972 e foi reafirmado na Rio-92. Sirvinskas (2010) reforça que o meio ambiente
deve ser ecologicamente equilibrado para todas as formas de vida.
• Princípio do Desenvolvimento Sustentável
Este princípio teve origem no Relatório de Brundtland quando foi definido
o conceito do desenvolvimento sustentável e portanto, tem um alcance mundial.
Este princípio diz que o desenvolvimento econômico deve ser conciliado com as
questões sociais e ambientais, que o desenvolvimento não deve comprometer o
meio ambiente e que os recursos devem ser usados de forma racional
(BARREIRA, 2007; SIRVINSKAS, 2010).
• Princípio Democrático
O surgimento deste princípio está associado a Declaração de Estocolmo
e dá o direito ao cidadão de participar das políticas públicas ambientais por meio
de plebiscitos, referendos, iniciativa popular, direito de informação e petição,
ação civil pública, ação popular, entre outros (BARREIRA, 2007; SIRVINSKAS,
2010).
• Princípio da Precaução
Este princípio proíbe intervenções no meio ambiente cujas consequências
não sejam completamente conhecidas. Caso não exista certeza absoluta, ou
evidência científica das consequências, a decisão deve ser tomada em favor da
proteção ao meio ambiente (BARREIRA, 2007; CERUTI, 2010).
• Princípio da Prevenção
O princípio da prevenção é muito similar ao da precaução, mas a diferença
ocorre, de acordo com Ceruti (2010), pois neste caso os impactos ambientais já
são conhecidos. Segundo Barreira (2007) quando houver perigo comprovado,
utiliza-se a prevenção para eliminar o risco. Como exemplos, tem-se o processo
de licenciamento e os estudos ambientais exigidos para atividades
potencialmente poluidoras.
• Princípio da Responsabilidade
Este princípio pode ser entendido como a responsabilidade pelas ações
ou omissões que venham a prejudicar o meio ambiente, sendo submetido às
sanções cabíveis (CERUTI, 2010). Ou ainda, pode ser entendido conforme a
responsabilidade social, que tem sido exigida em instituições, empresas e

11
projetos dos mais diversos tipos, que devem demonstrar sua responsabilidade
ambiental e sua política ecológica, até mesmo para conseguir financiamentos
(SIRVINSKAS, 2010).
• Princípios do Poluidor Pagador e Usuário Pagador
Basicamente, o princípio do poluidor pagador exige que quem poluiu terá
que pagar pela recuperação da poluição ou dano causado. De acordo com
Sirvinskas (2010), esse princípio se originou do documento da Eco-92, que dizia
que as vítimas de poluição ou os danos materiais devem ser indenizados. No
caso do usuário pagador, fica estabelecido que quem utiliza um determinado
recurso, deve pagar por ele, devido as condições de escassez dos recursos
naturais (BARREIRA, 2007; CERUTI, 2010).
• Princípio do Equilíbrio
Este princípio diz que todas as consequências de uma intervenção ao
meio ambiente devem ser analisadas e a análise sempre deve favorecer o meio
ambiente, ou seja “pender para o lado ambiental” (SIRVINSKAS, 2010).
• Princípio do Limite
De acordo com o princípio do limite, a administração pública deve fixar
parâmetros e estipular padrões e limites de qualidade ambiental do ar, da água,
dos ruídos entre outros, sendo que normalmente os limites seguem padrões
internacionais (SIRVINSKAS, 2010; CERUTI, 2010).
• Princípio do Não Retrocesso
Esse princípio é bastante relevante, pois ele impede que novas leis ou
atos que sejam criadas venham a desconstituir conquistas ambientais, ou seja,
não pode acontecer o retrocesso, não podem ser perdidas conquistas que
levaram tempo para serem alcançadas (GUIMARÃES FILHO, 2005).
A partir da análise dos princípios do direito ambiental expostos, pode-se
entender que todos eles são voltados para a proteção de qualquer espécie de
vida no planeta, contribuindo com uma qualidade de vida satisfatória para as
pessoas das gerações atuais e futuras (SIRVINSKAS, 2010).

TEMA 3 – ESTRUTURA DAS LEIS

Antes de iniciarmos o estudo das leis, é interessante conhecermos como


elas são organizadas, para facilitar o entendimento. Apesar de simples, é
importante reforçar estes conceitos de estruturação da lei, sua divisão e
organização.
12
Normalmente a lei é dividida em três partes, a epígrafe, a ementa e o
corpo da lei. A epígrafe apresenta a identificação da lei, com a natureza, o
número e a data. Na ementa é feita uma descrição curta do seu conteúdo. E o
corpo da lei apresenta o seu conteúdo em si. Dependendo do tamanho e da
complexidade da lei, ela pode ser dividida em livros, títulos, capítulos, seções e
subseções, sendo que o texto é composto por artigos, parágrafos, incisos,
alíneas e números (ou itens) (CERUTI, 2010).
O artigo trata somente sobre um assunto e é a unidade básica da lei, toda
lei tem pelo menos um. É uma forma prática de se encontrar alguma informação
dentro da lei pois eles não se repetem. Os artigos são identificados por números
ordinais até o 9º (art. 1º, art. 2º, e assim por diante) e, depois por números
cardinais (art. 10, art. 11). O enunciado do artigo é chamado de caput. O artigo
pode ser simples, quando não precisa de complementos ou complexo, quando
contém parágrafos com explicações ou quando o próprio caput contém incisos,
que enumeram as frases (ALMEIDA, 2002; CERUTI, 2010).
O parágrafo, por outro lado, é uma subdivisão ou desdobramento do
artigo, e está sempre relacionado a ele e é representado pelo símbolo §. Da
mesma forma que o artigo, o parágrafo é indicado por números ordinais até o
nono (9º) e a partir do dez, por números cardinais. Se um artigo possuir apenas
um parágrafo, ele é denominado de parágrafo único. O parágrafo pode se
subdividir em incisos (ALMEIDA, 2002; CERUTI, 2010).
Os incisos são uma divisão dos parágrafos ou artigos, usados nos casos
em que é preciso enumerar alguma regra, por exemplo. Eles são representados
por algarismos romanos (inciso I, inciso II, etc.). O inciso também pode se
desdobrar em alíneas. As alíneas são, portanto, um desdobramento dos incisos
ou dos próprios parágrafos, e são identificadas por letras minúsculas seguidas
de parênteses. Por fim, as alíneas também podem ser subdivididas, em itens
que são representados pelos algarismos arábicos, comuns (1, 2, 3, etc.)
(ALMEIDA, 2002; CERUTI, 2010).
A fim de elucidar as estruturas apresentadas, serão apresentados alguns
exemplos de trechos de leis, identificando artigos, parágrafos, incisos, alíneas e
itens.
• Partes da Lei

13
Inicialmente, apresenta-se uma análise tendo como base a lei da
biodiversidade. Epígrafe: “LEI Nº 13.123, DE 20 DE MAIO DE 2015”. Na
sequência, tem-se a ementa:

Regulamenta o inciso II do § 1º e o § 4º do art. 225 da Constituição


Federal, o Artigo 1, a alínea j do Artigo 8, a alínea c do Artigo 10, o
Artigo 15 e os §§ 3º e 4º do Artigo 16 da Convenção sobre Diversidade
Biológica, promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998;
dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, sobre a proteção e o
acesso ao conhecimento tradicional associado e sobre a repartição de
benefícios para conservação e uso sustentável da biodiversidade;
revoga a Medida Provisória nº 2.186-16, de 23 de agosto de 2001; e
dá outras providências (BRASIL, 2015, p.1).

Em seguida, o conteúdo da lei é apresentado, no corpo da lei, que inicia-


se com o capítulo I e as disposições gerais.
• Artigos, parágrafos, incisos, alíneas e itens
Conforme apresentado, os artigos podem ser simples ou complexos,
quando apresentam complementos. Inicialmente, tem-se um exemplo de artigo
simples: “Art. 5º É vedado o acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento
tradicional associado para práticas nocivas ao meio ambiente, à reprodução
cultural e à saúde humana e para o desenvolvimento de armas biológicas e
químicas” (BRASIL, 2015, p.4).
Como exemplo de artigo complexo, apresenta-se um artigo com parágrafo
único, retirado da Lei 12.123/2015:

Art. 3º O acesso ao patrimônio genético existente no País ou ao


conhecimento tradicional associado para fins de pesquisa ou
desenvolvimento tecnológico e a exploração econômica de produto
acabado ou material reprodutivo oriundo desse acesso somente serão
realizados mediante cadastro, autorização ou notificação, e serão
submetidos a fiscalização, restrições e repartição de benefícios nos
termos e nas condições estabelecidos nesta Lei e no seu regulamento.
Parágrafo único. São de competência da União a gestão, o controle e
a fiscalização das atividades descritas no caput, nos termos do
disposto no inciso XXIII do caput do art. 7º da Lei Complementar nº
140, de 8 de dezembro de 2011 (BRASIL, 2015, p.4).

Os artigos podem conter ainda parágrafos e incisos, assim como no artigo


oitavo exemplificado abaixo, que contém três parágrafos, e o parágrafo terceiro
contém três incisos:

Art. 8º Ficam protegidos por esta Lei os conhecimentos tradicionais


associados ao patrimônio genético de populações indígenas, de
comunidade tradicional ou de agricultor tradicional contra a utilização e
exploração ilícita.
§ 1º O Estado reconhece o direito de populações indígenas, de
comunidades tradicionais e de agricultores tradicionais de participar da
tomada de decisões, no âmbito nacional, sobre assuntos relacionados
à conservação e ao uso sustentável de seus conhecimentos

14
tradicionais associados ao patrimônio genético do País, nos termos
desta Lei e do seu regulamento.
§ 2º O conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético de
que trata esta Lei integra o patrimônio cultural brasileiro e poderá ser
depositado em banco de dados, conforme dispuser o CGen ou
legislação específica.
§ 3º São formas de reconhecimento dos conhecimentos tradicionais
associados, entre outras:
I - publicações científicas
II - registros em cadastros ou bancos de dados; ou
III - inventários culturais.

Por fim, apresenta-se um recorte de um artigo quase completo, o artigo


25, da Lei 12.123/2015, que contém parágrafos, incisos e alíneas, que não
necessariamente estão nesta ordem, já que o próprio caput contém incisos:

Art. 25. O acordo de repartição de benefícios deverá indicar e qualificar


com clareza as partes, que serão:
I - no caso de exploração econômica de produto acabado ou de
material reprodutivo oriundo de acesso a patrimônio genético ou
conhecimento tradicional associado de origem não identificável:
a) a União, representada pelo Ministério do Meio Ambiente; e
b) aquele que explora economicamente produto acabado ou material
reprodutivo oriundo de acesso ao patrimônio genético ou ao
conhecimento tradicional associado de origem não identificável; e
II - no caso de exploração econômica de produto acabado ou de
material reprodutivo oriundo de acesso a conhecimento tradicional
associado de origem identificável...
§ 1º Adicionalmente ao Acordo de Repartição de Benefícios, o usuário
deverá depositar o valor estipulado no § 3º do art. 24 no Fundo
Nacional para a Repartição de Benefícios - FNRB quando explorar
economicamente produto acabado ou material reprodutivo oriundo de
acesso a conhecimento tradicional associado de origem
identificável...(BRASIL, 2015, p.11).

A partir disso, fica facilitada a leitura e entendimento das leis e como elas
são apresentadas, já que os textos na maioria das vezes seguem essa estrutura
básica, havendo variações apenas na ordenação, leis mais longas apresentarão
mais de um capítulo ou títulos, com diversos artigos que dependendo da
complexidade, se dividirão em parágrafos, incisos, alíneas e itens, assim como
demonstrado.

TEMA 4 – PRIMEIRAS LEIS AMBIENTAIS

Desde os primórdios da civilização o homem vem interferindo na natureza


e utilizando os recursos naturais para a sua própria sobrevivência, com uma
visão completamente exploratória e de que os recursos naturais eram infinitos.
Porém, a partir da observação de algumas consequências dessas ações,

15
começam a surgir normas para moderar as atitudes humanas (BORGES;
REZENDE e PEREIRA, 2009).
Sendo assim, no Brasil, as primeiras normas relacionadas ao meio
ambiente surgiram há muito tempo atrás, em datas próximas ainda ao
descobrimento do país, pois de acordo com Borges, Rezende e Pereira (2009),
tais normas foram importadas de Portugal.
Com certeza as normas antigas eram muito diferentes das leis que
conhecemos hoje, tanto em questão de formato quanto em questão de conteúdo.
Porém, a legislação evoluiu e permanece em constante evolução, conforme
veremos nesta disciplina.
Inicialmente, tem-se que no período do descobrimento existiam as
ordenações Afonsinas, de Dom Afonso IV, que proibiam o corte de árvores
frutíferas, por exemplo. Existiram também as ordenações Manuelinas, na época
de 1521, que adicionam à proibição do corte das árvores, a proibição da caça
aos animais, como lebres e coelhos, causando-lhes dor, e também, o comércio
de abelhas sem a preservação das colmeias. E ainda, as ordenações Filipinas,
que proibiam que se jogassem materiais que pudessem contaminar peixes e
sujar rios e lagoas e proibiam a pesca em determinados locais, períodos ou
usando certos instrumentos (BARREIRA, 2007).
De acordo com Resende (2006), ainda em 1605 foi editado o “Regimento
do Pau Brasil” para limitar a exploração desta espécie em 600 toneladas ao ano,
a fim de manter os preços elevados na Europa. No entanto, foram criadas
também reservas a fim de preservar algumas árvores para a propriedade real.
De qualquer forma, relata-se que foi a primeira lei de proteção das florestas.
É importante lembrarmos que o Pau Brasil foi uma árvore muito importante
para economia e para a cultura do Brasil, inclusive foi a árvore que deu nome ao
nosso país e que atualmente se encontra ameaçada de extinção. Foi
considerada árvore nacional pela Lei nº 6.607/1978 (MACEDO et al., 2018). Uma
imagem desta importante espécie é apresentada na Figura 3.

16
Figura 3 – Pau Brasil, árvore símbolo brasileira

Crédito: ado Photos/Shutterstock.

Ainda, uma Carta Régia foi lançada em 1797, e apresentou preocupação


com a preservação da fauna, águas, solos e das matas para que não se
arruinassem e não se destruíssem. Para coibir a exploração das matas ao longo
da costa brasileira, a coroa portuguesa declarou como sua propriedade essas
áreas, tendo em vista a reserva dessas florestas para o atendimento às suas
próprias necessidades (RESENDE, 2006).
Segundo Borges, Rezende e Pereira (2009), por volta de 1800 foi criado
um cargo de “juiz conservador” e foi criada a “patrulha montada” para fiscalizar
a extração da madeira e manter as florestas para a coroa portuguesa. Em 1802,
relata-se que já foi criada uma iniciativa para o reflorestamento da zona costeira
brasileira, sendo que em 1811 foi criado do Jardim Botânico do Rio de Janeiro,
visando aclimatar plantas e estudar a flora brasileira de valor econômico. Assim,
o Jardim Botânico é considerado o antecessor das unidades de conservação.
De maneira similar, em 1821, na legislação sobre o uso da terra,
recomendava-se que todas as terras mantivessem como matas e arvoredos, um
sexto da área para os recursos de lenha necessários, sem nunca derrubá-los ou
queimá-los. Sendo assim, entende-se que essa norma deu origem mais tarde as

17
reservas legais das propriedades, assunto que será abordado mais à frente
(BORGES, REZENDE e PEREIRA, 2009).
Até esse período relatado, é possível perceber que a maioria das
iniciativas de proteção ao meio ambiente talvez fossem mascaradas nos
interesses de exploração e obtenção de lucros por meio dos recursos naturais,
pois não se tinha ainda uma consciência ambiental tão forte para a preservação.
No ano de 1916, foi promulgado então o Código Civil Brasileiro, que tinha
por objetivo resolver conflitos de vizinhança, mas trouxe várias normas com uma
visão um pouco mais ecológica, destacando-se o artigo 584 que proibia
construções que pudessem poluir ou inutilizar a água de poço ou outras fontes,
reconhecendo a importância da água (BARREIRA, 2007; FREIRIA, 2015).
Segundo Freiria (2015) após o Código Civil ter sido promulgado, no início
do século XX, é que a sociedade começa a desenvolver lentamente a
consciência de que os recursos não são inesgotáveis, e então surgem algumas
leis para proteção de bens ambientais como a água e a madeira, por exemplo.
Como primeiro exemplo dessa época, pode ser citado o Regulamento da
Saúde Pública, lançado em 1923, pelo Decreto nº 16.300/23. De maneira geral,
esse decreto tinha como objetivo impedir que as indústrias prejudicassem a
saúde dos moradores de sua vizinhança, promovendo um afastamento de
indústrias que causassem incômodos ou fossem nocivas (BARREIRA, 2007).
Alguns anos após, na década de 30, diversas leis foram lançadas, como
o primeiro Código Florestal, de 1934, pelo Decreto 23.793, o Regulamento da
Defesa Sanitária Vegetal, com o Decreto 24.114/1934, o primeiro Código das
Águas, pelo Decreto 24.643/1934, o Decreto-Lei nº 25/1937 que organizou a
proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, o Decreto-Lei nº 794/1938
que instituiu o primeiro Código da Pesca e, finalizando a década, o Decreto-Lei
nº 2.848/1940 que instituiu o Código Penal (BARREIRA, 2007).
Porém, por mais que essas novas leis e decretos tenham representado
avanços, de acordo com Freiria (2015) os textos ainda estavam mais focados na
exploração de tais recursos. O autor cita que um dos capítulos do código florestal
de 1934, por exemplo, era denominado “Exploração de Florestas”, conceituando
como produtos florestais a lenha, as raízes, as cascas, os frutos, etc. Eram
apresentados também critérios para explorar florestas que fossem de domínio
público. Por outro lado, exigia-se a reserva de um quarto da propriedade com
florestas.

18
De maneira similar, o Código das Águas regulamentava o aproveitamento
industrial da água e o aproveitamento hidráulico, com a exploração para a
geração de energia elétrica. O Código da Pesca seguia na mesma conduta,
regulamentando a indústria da pesca, as empresas pesqueiras, os pescadores
profissionais e amadores, as permissões, concessões, proibições e infrações
(FREIRIA, 2015).
Em 1937, foi criado ainda, o primeiro parque nacional do Brasil, em
Itatiaia, no Rio de Janeiro. Entre 1938 e 1965 foram criados quatorze parques
nacionais e uma reserva florestal na Amazônia. Após alguns anos, porém, na
década de 60 foram criadas legislações ainda mais importantes abordando as
questões ambientais (BORGES, REZENDE e PEREIRA, 2009). Algumas delas
serão apresentadas na sequência.
Em 1964, a Lei nº 4.504 lançou o Estatuto da Terra apresentando direitos
e obrigações relacionados aos imóveis rurais, com o objetivo de executar a
reforma agrária e promover uma política agrícola. O Estatuto pretendia ainda
orientar as atividades agropecuárias, promover uma melhor distribuição de terra.
A lei destaca ainda que nas terras devem ser adotadas práticas adequadas
segundo as condições ecológicas e recuperar áreas degradadas protegendo os
recursos naturais (BRASIL, 1964), o que já demonstra uma maior preocupação
ambiental.
Em 1965 foi lançado o segundo Código Florestal, que revogou na íntegra
o Código Florestal anterior, de 1934 (FREIRIA, 2015) e será abordado com
detalhes mais adiante.
No ano de 1967 foi publicado o Decreto-Lei nº 227, com o Código de
Mineração, no qual foi definido que a União, ou seja, o Governo Federal é o
responsável por administrar os recursos minerais, a indústria, a distribuição, o
comércio e o consumo (FREIRIA, 2015).
Ainda em 1967 foi publicada a Lei nº 5.197, denominada Lei de Proteção
a Fauna, que instituiu o Conselho Nacional de Proteção a Fauna e aborda a
necessidade de proteger os animais silvestres, como relatado no artigo 1º:

Os animais de quaisquer espécies em qualquer fase do seu


desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro,
constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e
criadouros naturais são propriedades do Estado, sendo proibida a sua
utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha (BRASIL, 1967,
p.1).

19
A Lei nº 5.197/67 proibia ainda as atividades de caça profissional e o
comércio de espécies silvestres. Ainda em 1967, foram publicados os Decretos
nº 248 e nº 303, que criaram a primeira Política Nacional de Saneamento Básico
e o Conselho Nacional de Controle da Poluição Nacional. No entanto, ambos os
decretos foram revogados no mesmo ano, com o lançamento da Lei nº
5.318/1967 (FREIRIA, 2015).
A Lei nº 5.318/1967, diz respeito à Lei do Saneamento Básico, que
instituiu a Política Nacional de Saneamento Básico e o Conselho Nacional de
Saneamento. De acordo com Freiria (2015), essa lei foi uma resposta ao
crescimento populacional e ocupação das cidades, sendo necessária uma maior
organização dos sistemas de água e esgoto. Esse tema também será abordado
mais detalhadamente adiante.
Como pode-se observar a década de 60 trouxe muitas informações e
avanços com relação a legislação ambiental. Nos anos subsequentes, novos
marcos importantes também ocorreram e a partir deste momento, as principais
leis brasileiras serão apresentadas separadamente ou agrupadas por temas.

TEMA 5 – A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E O ARTIGO 225

Para dar início ao estudo mais detalhado da legislação brasileira, iremos


começar com a principal norma do Brasil, que é a Constituição Federal. De
acordo com Borges, Rezende e Pereira (2009), foi a partir dela que o direito
ambiental se consolidou.
A Constituição foi promulgada em outubro de 1988 e tem grande
importância para a questão ambiental, pois foi a primeira vez que um capítulo foi
dedicado inteiramente ao meio ambiente. Segundo Ceruti (2010) isso ocorreu
devido ao aumento da preocupação com o meio ambiente, e a necessidade de
disciplinar este tema pela sua importância no mundo todo.
As questões ambientais são discutidas então no Capítulo VI da
Constituição Federal de 1988, em um artigo único, o Artigo 225, que contém
parágrafos e incisos. O caput do artigo é considerado um dos trechos mais
importantes e sua redação é a apresentada a seguir: “Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL,
1988).
20
Em outras palavras, o Artigo 225 define que o meio ambiente equilibrado
é um direito de todos e que a preservação do mesmo é necessária para que
todos tenham qualidade de vida. Além disso, coloca-se que não só o governo,
mas também as pessoas tem o dever de defender e preservar o meio ambiente,
portanto, a responsabilidade é de todos. E a preservação deve ser pensada não
só no tempo atual, mas também no futuro, o que é o próprio conceito do
desenvolvimento sustentável. A partir disso, pode-se entender o quão importante
este artigo foi e continua sendo para a questão ambiental.
Um ponto interessante apresentado por Sirvinskas (2010) é o de que o
equilíbrio ecológico não significa que o meio ambiente deve ser inalterado, mas
sim que deve haver harmonia entre a sanidade e as populações, ecossistemas,
comunidades e biosfera.
Na sequência, o Artigo 225 é constituído por seis parágrafos, sendo que
o parágrafo primeiro relata em sete incisos algumas ações que o poder público
deve tomar, a fim de garantir esse direito do meio ambiente ecologicamente
equilibrado a todos:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o
manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do
País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de
material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e
seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a
alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada
qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que
justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio
ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade
de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas
que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção
de espécies ou submetam os animais a crueldade (BRASIL, 1988, p.1).

Muitas dessas ações serão ainda objetos de legislações específicas,


como as unidades de conservação relacionadas ao inciso III, o estudo de
impacto ambiental, relatado no inciso IV e a educação ambiental abordada no
inciso VI.
O parágrafo segundo define que após a exploração dos recursos minerais
o meio ambiente degradado deve ser recuperado. No terceiro, obriga-se aos

21
causadores de infrações ao meio ambiente a repararem os danos, além de se
sujeitarem às sanções penais e administrativas (BRASIL, 1988).
Nos parágrafos quarto e quinto, define-se que a floresta amazônica, a
mata atlântica, a serra do mar, o pantanal mato-grossense e zona costeira são
patrimônios nacionais, devendo ser preservados. E que as terras pertencentes
aos Estados, necessárias a proteção dos ecossistemas são indisponíveis. E por
fim, no sexto parágrafo exige-se que a localização de usinas nucleares deve ser
definida por lei federal (BRASIL, 1988).
Como pode-se perceber, o Capítulo VI não é extenso, porém é de
fundamental importância, uma vez que a Constituição Federal é a lei máxima de
um país, e portanto, todas as outras leis estão abaixo dela, hierarquicamente.
Ainda, de acordo com Sirvinskas (2010), o Artigo 225 está relacionado com os
princípios apresentados pela Declaração de Estocolmo de 1972, escrita na
Conferência de Estocolmo, primeira conferência da ONU para o meio ambiente.
E o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado pode ser considerado
um direito fundamental e de todos, por isso também chamado de direito difuso.

FINALIZANDO

Nesta primeira aula foram apresentadas as principais tragédias


ambientais que levaram o mundo a começar as reflexões sobre as questões
ambientais. Entre elas podem ser citadas o acidente na Baía de Minamata, os
acidentes de Seveso, Bhopal, Basiléia, Chernobyl, Goiânia, além dos acidentes
com petróleo e de mineração, ocorridos mais recentemente.
As preocupações com o meio ambiente também foram expressadas pelas
importantes conferências para o meio ambiente realizadas, sendo a primeira a
Conferência de Estocolmo, e na sequência ocorreram a Rio-92, a Rio+10, a
Rio+20 e a Estocolmo+50, todas trazendo importantes questões para debate e
reivindicando por melhorias ambientais.
Todas essas tragédias e conferências tiveram um impacto importante no
surgimento do direito ambiental, pois diversos documentos e relatórios
influenciaram os governos e serviram como base para a criação das leis
ambientais.
Foram apresentados na sequência os conceitos e os princípios do direito
ambiental, que constituem a essência das normas e facilitam o estudo do tema,
contribuindo para a preservação do meio ambiente. E a estrutura das leis, como
22
os significados de artigos, parágrafos, incisos e alíneas, para facilitar o
entendimento dos textos legais.
Por fim, foi apresentado um histórico das primeiras leis ambientais,
importadas de Portugal, e um pouco da evolução da legislação ambiental, até a
década de 60. A primeira legislação apresentada em detalhes foi justamente o
Capítulo VI e o Artigo 225 da Constituição Federal, dedicado exclusivamente ao
meio ambiente.

23
REFERÊNCIAS

ALMEIDA, G. F. DE. Estrutura do texto legal, 2002. Disponível em:


<https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5569498/mod_resource/content/1/Estr
utura do texto legal.pdf>.
BARREIRA, P. A. Apostila de Direito Ambiental, 2007. Goiânia-Goiás.
BORGES, L. A. C.; DE REZENDE, J. L. P.; PEREIRA, J. A. A. Evolução da
Legislação Ambiental no Brasil. Revista em Agronegócios e Meio Ambiente,
v. 2, n. 3, p. 447–466, 2009.
BRASIL. Lei no 4.504 de 30 de novembro de 1964. Câmara dos Deputados,
Brasília, DF, 1964.
BRASIL. Lei no 5.197, de 3 de janeiro de 1967. Presidência da República.
Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos. Brasília-DF, 1967.
BRASIL. Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981. Presidência da República,
Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos 1981. Brasília- DF.
BRASIL. Contituição Federal de 1988. Diário Oficial da União, Brasília- DF, 5
out .1988.
BRASIL. Rio+20: Como chegamos até aqui. Comitê Nacional de
Organização, 2012. Rio de Janeiro - RJ. Disponível em:
<http://www.rio20.gov.br/>.
BRASIL. Lei no 13.123, de 20 de maio de 2015. Presidência da República,
Secretaria Geral, Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2015.
CAETANO, C.; MANSUR, R. Brumadinho: Polícia Civil identifica ossada
encontrada por bombeiros - agora são 5 desaparecidos. Disponível em:
<https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2022/05/03/brumadinho-policia-
civil-identifica-ossada-encontrada-por-bombeiros-agora-sao-5-
desaparecidos.ghtml>. Acesso em: 28/8/2022.
CERUTI, F. C. Apostila de Legislação Ambiental, 2010. Irati-PR.
CHAVES, E. G. GOIÂNIA É AZUL: o acidente com o césio 137. Revista UFG,
v. 9, n. 1, p. 9, 2007. Disponível em:
<https://revistas.ufg.br/revistaufg/article/view/48158>.
DINIZ, E. M. Os resultados da Rio +10. Geography Department, University of
Sao Paulo, v. 15, p. 31–35, 2002.
EUZEBIO, C. S.; RANGEL, G. D. S.; MARQUES, R. C. Derramamento de
petróleo e seus impactos no ambiente e na saúde humana. Revista Brasileira
de Ciências Ambientais (Online), , n. 52, p. 79–98, 2019.
FONTES, M. N.; GOMES, J. DOS S.; LIMA, M. S.; ROVERI, V.; ZAUBERAS,
R. T. Trajetória da análise de acidentes industriais ampliados e as normas
internacionais: um estudo de suas causas e consequências. Revista
Eletrônica de Divulgação Científica da Faculdade Don Domênico, 2015.
FREIRIA, R. C. Aspectos Históricos Da Legislação Ambiental No Brasil: Da
24
Ocupação E Exploração Territorial Ao Desafio Da Sustentabilidade. História e
Cultura, v. 4, n. 3, p. 157–179, 2015.
GUIMARÃES FILHO, S. J. DE M. Direito Ambiental 1000 perguntas. 2o
Edição ed. Rio de Janeiro - RJ: Editora Rio, 2005.
GUIMARÃES, R. P.; FONTOURA, Y. S. DOS R. DA. Rio + 20 ou Rio-20 ?
Crônica de um fracasso anunciado. Ambiente e Sociedade, v. XV, n. 3, p. 19–
39, 2012.
JÚNIOR, P. A. M.; DURAN, D. A. R.; BENETTI, A. D. Contaminação da água
em desastres tecnológicos. XXIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos.
Anais... . p.1–10, 2019. Foz do Iguaçu - PR: Associação Brasileira de Recursos
Hídricos.
LIMA, I. H. S. DE; MELO, G. P.; CARNEIRO, P. F. P.; ANDRADE, M. E. A.
Acidente Nuclear De Chernobyl: Os Efeitos Biológicos Da Radiação. Ciências
BIológicas e de Saúde - Cadernos de Graduação, v. 6, p. 107–120, 2020.
MACEDO, T. M.; SILVA, A. V. S. DA; GONÇALVES, M. L. DE A.; AGUIAR-
DIAS, A. C. A. DE. Pau-Brasil: Como Conservar Sem Conhecer? Diversidade
e Gestão, v. 2, n. 2, p. 189–197, 2018.
MICARONI, R. C. DA C. M.; BUENO, M. I. M. S.; JARDIM, W. DE F.
Compostos de Mercúrio. Revisão de Métodos de Determinação, Tratamento e
Descarte. Quimica Nova, v. 23, n. 4, p. 487–495, 2000.
ONU. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <https://brasil.un.org/pt-
br/91223-onu-e-o-meio-ambiente>. Acesso em: 28/8/2022.
RESENDE, K. M. Legislação florestal brasilera: uma: reconstituição
histórica, 2006. 150f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Florestal).
Universidade Federal de Lavras, Lavras, 2006.
SARTI, A. B. Análise comparativa do impacto dos acidentes ambientais de
Brumadinho e Mariana na ação da empresa Vale a partir da análise
técnica, 2021. 79f. Monografia (Graduação em Administração). Instituto
Federal do Espírito Santo, Venda Nova do Imigrante, 2021.
SILVA, M. A. DA; FREITAS, C. M. DE; XAVIER, D. R.; ROMÃO, A. R.
Sobreposição de riscos e impactos no desastre da Vale em Brumadinho.
Ciência e Cultura, v. 72, n. 2, p. 21–28, 2020.
SILVA, R. R. DA; BRANCO, J. C.; THOMAZ, S. M. T.; CESAR, A. Convenção
de Minamata: análise dos impactos socioambientais de uma solução em longo
prazo. Saúde Debate, v. 41, n. Especial, p. 50–62, 2017.
SIRVINSKAS, L. P. Manual de direito ambiental. 8o Edição ed. São Paulo -
SP: Editora Saraiva, 2010.
UNEP. Estocolmo +50 termina com chamado por transformação ambiental
e econômica urgente. Disponível em: <https://www.unep.org/pt-br/noticias-e-
reportagens/comunicado-de-imprensa/estocolmo50-termina-com-chamado-por-
transformacao#:~:text=Estocolmo%2B50%3A um planeta saudável,junho de
2022%2C para marcar>. Acesso em: 28/8/2022.

25
VISSER, W.; BRUNDTLAND, G. H. Our Common Future (‘The Brundtland
Report’): World Commission on Environment and Development. United
Nations, 1987.
WATANABE, C. B. Fundamentos Teóricos e Prática da Educação
Ambiental. Instituto Federal do Paraná - Escola Técnica Aberta do Brasil,
2011.

26

Você também pode gostar