05 - As Três Características 1-14 - The Sword of Song
05 - As Três Características 1-14 - The Sword of Song
05 - As Três Características 1-14 - The Sword of Song
(1902)
por Aleister Crowley
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As Três Características
“Ouçam o Jātaka!” disse o Buda. E todos eles prestaram atenção. “Há muito
tempo, quando o Rei Brahmadatta reinava em Bārānasī1, vivia sob seu admirável go-
verno um tecelão chamado Sūrya Ji2 e sua esposa Caṇḍī3. E na plenitude de seu tempo
ela deu à luz um filho homem, e eles o chamaram de Perdu’ R Abu4. Bem, a criança
cresceu, e as lágrimas da mãe caíam, e a ira do pai crescia: pois de forma alguma o
menino teria sucesso em seu negócio de tecelagem. O tear avançava alegremente, mas
no ritmo de um mantra, e a seda escorregava por suas mãos, mas como se contasse suas
contas. Por causa disso, o trabalho era prejudicado e os corações dos pais sofriam por
causa do menino. Mas está escrito que o infortúnio não sabe a hora de acabar, e que a
semente do sofrimento é como a semente da figueira-da-índia. Ela cresce e tem a esta-
tura de uma montanha e, ai de mim! ela lança novas raízes na terra machucada. Pois o
menino cresceu e se tornou um homem; e seus olhos brilharam com a lascívia da vida
e do amor; e o desejo o incitou a ver o mundo e suas muitas maravilhas. Portanto, ele
partiu, levando a reserva de ouro de seu pai, guardada para ele para aquele dia amargo;
e ele tomou belas donzelas, e foi servo delas. E ele construiu uma bela casa e habitou
nela. E ele não pensou. Mas ele disse: ‘De fato, eis uma mudança aqui!’
“Ora, acontece que depois de muitos anos ele olhou para sua amada, a noiva de
seu coração, a rosa de seu jardim, a joia de seu rosário; e eis que a beleza verde-oliva
da pele lisa escureceu, e a carne se soltou e os seios firmes caíram, e os olhos perderam
igualmente o brilho de alegria e a fagulha da risada e o resplendor suave do amor. E
ele estava ciente de sua palavra, e disse sofrendo: ‘De fato, eis uma mudança!’ E ele
voltou seu pensamento para si, e viu que em seu coração também havia uma mudança:
de modo que ele bradou: ‘Quem sou então?’ E ele viu que tudo isso era sofrimento. E
ele voltou seu pensamento para fora e viu que todas as coisas eram semelhantes nisso;
que nada pode escapar da tríplice miséria. ‘A alma’, disse ele, ‘a alma, o eu, é como
todos estes; é impermanente como a efêmera flor da beleza na água que nasce, brilha e
morre antes que o sol nasça e se ponha novamente.’
“E ele tornou seu coração humilde e cantou a seguinte estrofe:
1
A fórmula comum para começar um Jātaka, ou história de uma encarnação anterior do Buda. Brahmadatta reinou por
120.000 anos.
2
O Sol.
3
A Lua.
4
Perdurabo. O mote de Crowley.
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“E com o ritmo ele desmaiou, pois seu velho mantra fluiu para dentro dos vasos
há muito selados da memória subconsciente, e ele caiu no oceano calmo de uma grande
Meditação.
II.
“Jehjaour5 era um magista poderoso; sua alma era trevosa e má; e sua lascívia
era por vida e poder e espalhar ódio sobre os inocentes. E aconteceu que ele fitou uma
bola de cristal na qual lhe foram mostrados todos os temores dos tempos que ainda não
haviam nascido na Terra. E por sua arte ele viu Perdu’ R Abu, que tinha sido seu amigo:
não importa o que fizesse, o cristal sempre mostrava aquela jovialidade sensual e frí-
vola como um Medo para ele: mesmo para ele, o Poderoso! Mas os egoístas e os maus
são covardes; eles temem as sombras, e Jehjaour não desprezava sua arte. ‘Avance no
tempo, ó bola!’ ele bradou. ‘Desça pela correnteza dos anos, servo atemporal e hedi-
ondo de minha vontade! Taph! Tath! Arath!6’ Ele soou as invocações triplas, as sílabas
misteriosas que prendiam o espírito à pedra.
III.
“A que Deus ele deveria apelar? Seu próprio deus, Hanuman, estava em silên-
cio. Sacrifício, oração, tudo era em vão. Então Jehjaour rangeu os dentes, e toda a sua
5
Allan MacGregor Bennett (cujo mote na “Ordem Hermética da Aurora Dourada” era Iehi Aour, ou seja, “Que haja
Luz”), agora Ānanda Metteyya, a quem é dedicado o volume em que esta história foi publicada.
6
Taphthartharath, o espírito de Mercúrio.
3
AS TRÊS CARACTERÍSTICAS
“Ora, o ódio tem poder, embora não o mesmo poder do amor. Então aconteceu
que em seu desespero ele caiu em um transe; e no transe Māra7 apareceu para ele.
Nunca seus feitiços haviam conseguido invocar uma potência tão terrível do abismo da
matéria. ‘Filho’ gritou o Maldito, ‘sete dias de ódio imaculado pela paixão mais branda,
sete dias sem um pensamento de piedade, estes servem para me chamar’. ‘Mate meu
inimigo para mim!’ uivou o desgraçado. Mas Māra tremeu, ‘Pergunte a Gaṇeśa sobre
ele!’ vacilou, por fim, o demônio.
“Jehjaour acordou.
IV.
“‘Sim!’ disse Gaṇeśa sombriamente, ‘o jovem desistiu de mim completamente.
Ele me diz que sou tão mortal quanto ele, e ele não pretende mais se preocupar comigo.’
‘Ai dele!’ suspirou o enganoso Jehjaour, que não se importava mais com Gaṇeśa e
quaisquer indignidades que pudessem ser oferecidas a ele do que seu inimigo. ‘Tam-
bém era um dos meus melhores devotos!’ murmurou, ou melhor, trompeteou o anacro-
nismo elefantino. ‘Veja’, disse o mago astuto, ‘eu vi Perdu’ R Abu outro dia, e ele disse
que havia se tornado Śrotāpatti. Isso é muito sério. Em apenas sete nascimentos, se ele
seguir o caminho, ele deixará de renascer. Portanto, você só tem esse tempo para re-
conquistá-lo para seu culto’. O astuto feiticeiro não mencionou que dentro desse tempo
também sua própria ruína se concretizaria. ‘O que você aconselha?’ perguntou a divin-
dade irritada e poderosa, mas pouco inteligente. ‘O tempo é nosso amigo’, disse o fei-
ticeiro. ‘Utilize sua influência nos Salões de Nascimento para que cada nascimento seja
o mais longo possível. Ora, o elefante é o mais longevo de todos os animais’ – ‘Temos
um acordo!’ disse Gaṇeśa com grande alegria, pois a ideia lhe pareceu engenhosa. E
ele se afastou pesadamente para encerrar o caso imediatamente.
V.
“Agora o grande elefante caminhava com passos majestosos na floresta, e
Jehjaour se fechou com seus caldeirões e parafernálias e se sentiu muito feliz, pois
sabia que seu perigo não estava perto até que Perdu’ R Abu se aproximasse da condição
de Arahant. Mas, apesar das elefantas jovens andando suavemente que Gaṇeśa teve o
cuidado de jogar em seu caminho, apesar dos brotos tenros de pasto e das amêndoas de
cacau macias, este elefante não era como os outros elefantes. As estações falavam a ele
7
O arquidemônio dos budistas.
4
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“Agora ele ainda era um elefante jovem quando entrou na selva, viajando ale-
gremente, com uma canção alegre em seu nucléolo, nada menos que um Bacilo.
VI.
“Após uma breve consulta; o Śrotāpatti reencarnou como um papagaio. Pois o
papagaio, disse o malvado Jehjaour, pode viver 500 anos e nunca se dar conta.
“Então uma maravilha alada cinzenta voou para a selva. Um pássaro tão alegre,
pensou o Deus, não poderia evitar ser influenciado pelas paixões comuns e render-se à
tal majestade como a sua.
“Mas um dia entrou na selva uma estranha figura selvagem. Ele era um homem
vestido à estranha moda tibetana. Ele tinha túnicas vermelhas e um chapéu, e pensava
em coisas obscuras. Ele girava uma roda de orações em suas mãos; e sempre, conforme
caminhava, ele murmurava as palavras místicas ‘Auṃ Maṇi Padme Hūṃ’8. O papa-
gaio, que nunca tinha ouvido a fala humana, tentou imitar o velho Lama e ficou sur-
preso com seu sucesso. O orgulho primeiro se apoderou do pássaro, mas não demorou
muito para que as palavras tivessem seu próprio efeito, e foi meditando sobre as con-
dições da existência que ele repetiu eternamente a fórmula.
∴
“Uma casa no distante Inglistan9. Uma senhora idosa e um papagaio cinza em
uma gaiola. O papagaio ainda murmurava de forma inaudível o mantra sagrado. Agora,
agora, o momento do Destino estava próximo! As Quatro Nobres Verdades brilharam
na mente daquele papagaio; as Três Características pareciam luminosas, como três es-
pectros no túmulo de um assassino: incapaz de se conter, recitou em voz alta a sentença
8
“Auṃ maṇi padme hūṃ” = “Ó a Joia do Lótus! Auṃ!” A mais famosa das fórmulas budistas.
9
«Uma forma de chamar a Inglaterra usada na Índia, Paquistão e alhures.»
5
AS TRÊS CARACTERÍSTICAS
misteriosa.
“A velha senhora, quaisquer que sejam seus defeitos, poderia agir prontamente.
Ela tocou a campainha. ‘Sara!’ disse ela, ‘tire essa criatura terrível daqui! Seu linguajar
é positivamente horrível.’ – ‘O que devo fazer com ele, mãe?’ perguntou o ‘general’.
‘Auṃ Maṇi Padme Hūṃ’, disse o papagaio. A velha tapou os ouvidos. ‘Quebre seu
pescoço!’ disse ela.
VII.
“‘Você é um tolo e um idiota!’ disse o Deus enfurecido. ‘Por que não torná-lo
uma coisa espiritual? Um Nat10 vive 10.000 anos’. ‘Faça dele um Nat então!’ disse o
magista, já começando a temer que o destino fosse forte demais para ele, apesar de toda
sua astúcia. ‘Há alguém trabalhando contra nós no plano físico. Precisamos transcendê-
lo’. Mal havia dito e já havia sido feito: uma família de Nats em uma grande árvore em
Anurādhapuraya teve um pequenino estranho, muito esperado pela mamãe e papai
Nats.
“De fato, a família era abençoada. A quarenta e cinco pés11 de distância havia
uma dágaba12 muito antiga e sagrada: e os filhos da luz se reuniam em torno dele no
frescor da noite, ou no glamour enevoado do amanhecer, e se voltavam com amor e
piedade para com toda a humanidade, não, até mesmo para com o menor grão de poeira
lançado nas tempestades extremas do Saara!
10
O nome birmanês para um espírito elemental.
11
O Governo, para o interesse dos próprios budistas, reserva todo o terreno a menos de 50 pés de uma dágaba. O incidente
descrito nesta seção realmente ocorreu em 1901.
12
«Também chamada de estupa, chedi e pagode; um monumento construído sobre os restos de uma figura religiosa
importante, costumeiramente num formato de abóbada ou torre.»
13
Sião.
6
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“Jehjaour ouviu isso e estremeceu. Perdu’ R Abu só tinha três anos de idade.
VIII.
“Realmente parecia que o destino estava contra ele. Pobre Jehjaour! Em deses-
pero, ele choramingou com seu parceiro: ‘Ó Gaṇeśa, só estaremos seguros no mundo
dos Deuses. Que ele nasça como uma flautista diante do trono de Indrā!’ – ‘Esta tarefa
é difícil’, respondeu a divindade alarmada, ‘mas usarei toda a minha influência. Sei
uma ou duas coisas sobre Indrā, por exemplo —’
“Assim foi feito. Belo era o rosto da jovem quando ela já nasceu madura do
ventre da Matéria, em sua jornada de vida de cem mil anos. De todas as flautistas de
Indrā, ela tocava e cantava mais doce. No entanto, alguma lembrança, turva como um
fantasma pálido que voa pelas longas avenidas de deodar e luar, envolveu o cérebro
dela; e sua canção era sempre de amor e de morte e de música do além.
“E um dia, enquanto ela assim cantava, a verdade profunda envolveu o ser e ela
conheceu as Nobres Verdades. Então ela voltou sua flauta para a nova música, quando
– que horror! – havia um mosquito na flauta. ‘Trauteado! Trauteado!’ ela começou.
‘Zumbido! Zumbido!’ foi o mosquito das próprias partes vitais de seu tubo delicado.
“Indrā não estava se um disco14. Ai de mim! Jehjaour, já estás preparando tuas
armadilhas? Ela só havia vivido oito meses.
IX.
“‘Como você é incompetente!’ rosnou Gaṇeśa. ‘Felizmente estamos em uma
posição melhor desta vez. Indrā foi guilhotinado por seu assassinato covarde; portanto,
seu lugar está vago’. ‘Eureca!’ gritou o mago, ‘a própria virtude dele o salvará do des-
tino de seu predecessor’.
“Contemplem então Perdu’ R Abu como Indrā! Mas, ó, puxa vida! que memó-
ria ele estava adquirindo! ‘Parece-me’, ele meditou, ‘que tenho mudado muito ultima-
mente. Bem, eu sou virtuoso – e eu li na nova tradução do Dhammapada15 feita por
14
Um disco giratório é a arma simbólica de Indrā.
15
Ele o abandonou. Alguns fragmentos foram reimpressos, suprā «nos Collected Works of Aleister Crowley, Vol. II».
7
AS TRÊS CARACTERÍSTICAS
Crowley que a virtude é aquilo que mantém alguém estável. Portanto, acho que posso
esperar a posse de meu Mahākalpa com uma simplicidade quase arcadiana. Você disse
Senhora Bhavānī, garoto? Sim, estou em casa. Traga o bétele!’ ‘Jeldi16!’ acrescentou
ele, com alguma vaga lembrança do Governo Britânico, quando era um bebê Nat.
“A Rainha dos Céus e o Senhor dos Deuses mastigaram bétele por muito tempo,
conversaram sobre o tempo, as colheitas, o caso Humbert17 e a lei em relação aos au-
tomóveis, com facilidade e afabilidade. Mas estava longe da mente piedosa de Indrā
flertar com sua distinta convidada! Em vez disso, ele pensava na natureza vazia do
Cofre, a mudança do dinheiro e da posição; a tristeza dos banqueiros que confiavam e,
acima de tudo, a ausência de um Ego nos Irmãos Crawford.
“Enquanto ele estava assim meditando, Bhavānī ficou bastante brava com ele.
O Sprētae Injūriā Fōrmae18 mastigou os órgãos vitais dela com dores insuportáveis:
então, sacudindo-o com força pelo braço, ela Explicou Claramente a Ele. ‘Ó Madame!’
disse Indrā.
“Esta parte da história já foi contada antes – sobre José; mas Bhavānī simples-
mente estendeu a língua, abriu a boca e engoliu-o de uma vez só.
“Jehjaour simplesmente chafurdou. Indrā havia morrido em sete dias.
X.
“‘Há apenas mais um nascimento’, gemeu ele. “Desta vez precisamos vencer
ou morrer’. ‘A Goetia19 espera que cada Deus cumpra o dever dele’, lunografou com
entusiasmo para o Svarga20. Mas Gaṇeśa já havia partido.
“O Deus com cabeça de elefante estava de ótimo humor. ‘Nunca diga morrer!’
ele gritou alegremente, ao ver a aparência abatida de seu companheiro conspirador.
‘Isso resolverá o problema. Não há mudanças no Arūpa Brahmāloka21!’ – ‘Não me
rupe as minhas rúpias22!’ uivou o necromante. ‘Levante-se, idiota!’ rugiu o Deus. ‘Eu
16
«Também jilty, jildy, uma expressão usada pelos soldados britânicos estacionados na Índia. Significa “rápido!”.»
17
«O caso da golpista francesa Thérèse Humbert (1856-1918). Ela supostamente teria salvado a vida de um milionário
americano chamado Robert Crawford, que ficaria eternamente grato. Dois anos depois ele teria falecido, e deixado um
cofre com sua fortuna como herança para a família Humbert, desde que a irmã de Thérèse pudesse se casar com um dos
sobrinhos de Crawford quando tivesse a idade apropriada. Durante muitos anos Thérèse fez empréstimos e levou uma
vida de luxo tendo o cofre como garantia. Finalmente, quando suspeitas se levantaram e finalmente a abertura do cofre
foi ordenada, ele estava vazio.»
18
«Latim para “insulto da beleza desprezada”.»
19
O mundo da magia negra.
20
Céu.
21
O céu mais alto dos hindus. Lugar sem forma de Brahma é seu nome.
22
«Escrito como rupe me no rupe no original. Não encontramos tradução do inglês para a palavra rupe. Acreditamos que
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fiz Perdu’ R Abu ser eleito Mahābrahmā’. – ‘Ó Senhor, de verdade?’ disse o mago,
parecendo um pouco menos taciturno. ‘Sim!’ gritou Gaṇeśa impassível, ‘que Êon após
Êon passe pelos corredores abobadados e ecoantes da Eternidade: empilhe Mahakalpa
sobre Mahakalpa até que um Asankhya23 de Crores24 tenha morrido: e Mahābrahmā
ainda se sentará sozinho e meditará em seu trono de lótus’. – ‘Bom, bom!’ disse o
mago, ‘embora pareça que haja uma reminiscência do Bhagavad Gītā e da Luz da
Ásia25 em algum lugar. Certamente você não lê Edwin Arnold?’ – ‘Eu leio’, disse o
Deus desconsolado, ‘nós, Deuses hindus, temos que ler. É a única maneira de termos
uma ideia clara de quem realmente somos’.
“Bem, aqui estava Perdu’ R Abu, após seu último fiasco, instalado como um
Mahābrahmā Digno, Respeitável, Perfeito, Antigo e Aceito, Justo e Regular. Seu único
afazer era meditar, pois enquanto ele fizesse isso, os mundos – todo o sistema de 10.000
mundos – seguiriam pacificamente. Ninguém teria compreendido melhor a lição da
Bíblia – sobre os horríveis resultados para a humanidade de uma inoportuna, embora
possivelmente bem-intencionada, interferência por parte de uma divindade.
“Bem, ele se enrolou, o que era bastante inteligente para uma abstração amorfa,
e começou. Havia uma grande dificuldade em sua mente – um obstáculo logo após a
palavra ‘Pule!’ Claro que havia realmente vários deles: ele não sabia onde os quatro
elementos cessavam, por exemplo26: mas sua própria identidade era a verdadeira preo-
cupação. As outras perguntas ele conseguiria silenciar; mas esta estava muito perto de
seu Cakra de estimação27. ‘Aqui estou’, ele meditou, ‘acima de qualquer mudança; e
ainda uma hora atrás eu era Indrā; e antes disso sua flautista; e então um Nat; e então
um papagaio; e então um Hāthī – Ó, o Hāthī empilhando teca no riacho lamacento e
escorregadio!’, cantou Parameśvara. Ora, porque isso retrocede mais e mais, como uma
biografia fora de ordem, e não há nenhum tipo de conexão entre uma e outra. Olá, o
que é isso? Veja, há um homem santo perto daquela árvore Bo. Ele vai me dizer o que
tudo isso significa’. Pobre velho e tolo Senhor do Universo! Se ele tivesse levado sua
memória mais um passo trás, ele saberia tudo sobre Jehjaour e a conspiração, e que ele
era um Śrotāpatti e teria apenas mais um nascimento e poderia muito bem ter adicio-
nado as 311.040.000.000.000 de miríades de êons que transcorreriam antes do almoço
em regozijo com sua aniquilação iminente.
9
AS TRÊS CARACTERÍSTICAS
“‘Até os limites mais extremos do espaço corre a voz de Eras inéditas, exceto
na unidade concentrada do abstrato formulado pelo pensamento; e eternamente essa
voz formula uma palavra que é glifada no vasto oceano de vida ilimitada29. Fui claro?’
– ‘Perfeitamente. Quem diria que tudo era tão simples?’ O Deus pigarreou e prosseguiu
com certa timidez, até envergonhado:
“‘Mas o que eu realmente queria saber era sobre minha encarnação. Como é
que eu subi tão repentinamente da mudança e da morte para o imutável?’
“‘Criança!’ respondeu Gautama, ‘seus fatos estão errados – você não pode es-
perar fazer deduções corretas’. – ‘Sim, você pode, desde que seus métodos lógicos não
sejam sólidos. Essa é a maneira cristã de obter a verdade’. – ‘Realmente!’ respondeu o
sábio, ‘mas muito pouco eles obtêm. Aprenda, ó Mahābrahmā (pois eu vejo além deste
disfarce), que todas as coisas existentes, mesmo de ti até este grão de areia, possuem
Três Características. Estas são Mutabilidade, Sofrimento e Insubstancialidade’.
“‘Tudo bem quanto à areia, mas e quanto a Mim? Ora, eles me definem como
imutável’. ‘Você pode definir uma observação sarcástica como sendo um triângulo de
dois lados’, replicou o Salvador, ‘mas isso não prova a existência real de tal oxímoro30.
A verdade é que você é uma espécie de ser muito espiritual e vítima da longevidade. A
vida dos homens é tão curta que a sua parece eterna em comparação. Mas – ora, você
é alguém legal para se conversar! Você estará morto daqui a uma semana’.
“‘Bem, até logo, meu velho’, disse Gautama, ‘eu realmente preciso ir. Tenho
um encontro com o Irmão Māra na Árvore Bo. Ele prometeu apresentar suas filhas
encantadoras –’
28
Pés.
29
Esta peça surpreendente de babsoeira bombástica é literalmente de uma nota de S. L. Mathers para o “A Kabbalah
Revelada”.
30
Uma contradição de termos.
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XI.
“O ‘Décimo Nono Mahākalpa’ trouxe seu número de abril. Havia um artigo de
Huxlananda Svāmī32.
“Mahābrahmā nunca foi muito mais do que uma ideia. Ele viveu só seis dias.
XII.
“Na hora da grande Iniciação”, continuou o Buda, no meio dos Quinhentos Mil
Arahants, “o perverso Jehjaour juntou-se a Māra para impedir a descoberta da verdade.
E nas quedas de Māra ele caiu. Naquele momento todas as correntes de seu contínuo e
concentrado Ódio recuaram sobre ele e ele caiu no Abismo do Ser. E nos Salões do
Nascimento ele foi lançado no Inferno mais Baixo – ele se tornou um clérigo da Igreja
da Inglaterra, mais longe do que ele já havia estado antes da Verdade e da Luz e da Paz
e do Amor; mais e mais profundamente enredado na rede da Circunstância, atolado na
lama de Taṇhā33 e Avidyā34 e todas as coisas inferiores e vis. O falso Vicikicchā35
finalmente o pegou!
XIII.
“Sim! A hora estava próxima. Perdu’ R Abu reencarnou como filho de pais
ocidentais, ignorante de todo o seu maravilhoso passado. Mas um estranho destino o
trouxe a esta aldeia”. O Buda fez uma pausa, provavelmente para causar uma impres-
são.
Um jovem ali, o único entre eles que ainda não era um Arahant, empalideceu.
Ele era o único de nascimento ocidental em toda aquela multidão.
31
Arnold, Light of Asia.
32
«Em abril de 1860, Thomas Henry Huxley publicou um artigo chamado de “A Origem das Espécies”, baseado nas
teorias de Charles Darwin, no periódico The Westminster Review.»
33
Sede: ou seja, desejo em seu sentido maligno.
34
Ignorância.
35
Dúvida.
11
AS TRÊS CARACTERÍSTICAS
E ele percebeu.
“Filhos”, respondeu o Glorioso, “não sejais tolos de pensar que a morte é ne-
cessariamente um mal. Não vim fundar um Clube dos Cem Anos e incluir os mosquitos
entre os membros. Neste caso, manter Perdu’ R Abu vivo seria fazê-lo cair nas mãos
de seus inimigos. Meu Primeiro Preceito é apenas uma regra geral39. Na maioria dos
casos, deve-se certamente abster-se de destruir a vida, isto é, arbitrária e deliberada-
mente: mas não consigo beber um copo d’água sem matar incontáveis miríades de seres
vivos. Se vocês conhecessem como eu as condições da existência: luta mortal e inevi-
tável, cada forma de vida é o inimigo inerente e imitigável de todas as outras, com
36
“Bem-aventurança da não existência”. Um dos nomes orientais de Crowley.
37
O Buda tinha orelhas tão longas que podia cobrir todo o rosto com elas. As orelhas se referem ao Espírito no simbolismo
hindu, de modo que a lenda significa que ele poderia ocultar os elementos inferiores e habitar apenas neste.
38
Aqui está a pequena fenda dentro do alaúde que alienou Crowley do trabalho ativo nas linhas budistas; o ortodoxo não
consegue entender sua atitude.
39
Uma ideia mais provável que o absurdo brilhantemente lógico de Pansil, supra «The Sword of Song».
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poucas, poucas exceções, vocês não apenas deixariam de falar sobre a maldade de cau-
sar a morte, mas perceberiam a Primeira Nobre Verdade, que nenhuma existência pode
estar livre do sofrimento; a segunda, de que o desejo pela existência só leva ao sofri-
mento; que a cessação da existência é a cessação do sofrimento (a terceira); e vocês
buscariam na quarta o Caminho, o Nobre Caminho Óctuplo.
“Eu sei, ó Arahants, que vocês não precisam desta instrução: mas minhas pala-
vras não ficarão aqui: elas seguirão adiante e iluminarão todo o sistema dos dez mil
mundos, onde Arahants não crescem em cada árvore. Irmãozinhos, a noite recaiu: seria
bom dormirmos”.
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AS TRÊS CARACTERÍSTICAS
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