Uso de Agrotóxico No Povoado Lagoa Dagua Ribeirópolis-SE

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USO DE AGROTÓXICOS NO CAMPO E SEUS IMPACTOS NA SAÚDE

DOS TRABALHADORES EM RIBEIRÓPOLIS-SERGIPE

SANTOS, G. N.1; FEITOSA, F. S.¹; SANTOS, P. S.1; OLIVEIRA, V. D. 1;


1Grupo PET - Geografia, Universidade Federal de Sergipe, Campus Itabaiana, E-mail:
[email protected]; [email protected]; [email protected];
[email protected]; [email protected] .

RESUMO: O presente estudo investiga o intenso uso de agrotóxicos no povoado Lagoa


D’Água, em Ribeirópolis, Sergipe, onde a economia local é sustentada pela agricultura familiar.
Apesar da necessidade de ampliação do uso de agrotóxicos visando aumentar e garantir a
produção, os camponeses enfrentam sérios riscos à saúde devido à falta de Equipamentos de
Proteção Individual (EPI), o mesmo uso precário, durante a aplicação. A pesquisa, realizada a
partir da vivência de um dos autores, mapeou 129 propriedades, e mostra que todas utilizam
agrotóxicos, com 72 delas sem qualquer proteção e em 44 com proteções inadequadas. Essa
prática prejudica diretamente a qualidade de vida dos camponeses e destaca a urgência de
medidas de conscientização e proteção (destaque na conclusão). Entretanto os interesses de
mercado acabam prevalecendo diante da destruição da natureza e da precariedade laborativa
dos trabalhadores.

Palavras-chave: agrotóxicos; natureza; precariedade do trabalho; Lagoa D’Água.

USE OF PESTICIDES IN THE FIELD AND THEIR IMPACTS ON WORKERS'


HEALTH IN RIBEIRÓPOLIS-SERGIPE

ABSTRACT: This study investigates the indiscriminate use of pesticides in the Lagoa D’Água
community in Ribeirópolis, Sergipe, where the local economy is sustained by family farming.
Despite the intensified use of pesticides aimed at increasing production, farmers face serious
health risks due to a lack of Personal Protective Equipment (PPE) during application. The
research, conducted based on one author's experience, mapped 129 properties, revealing that
all utilize pesticides, with 72 having no protection and 44 using inadequate protective measures.
The analysis indicates that this practice directly harms the quality of life for farmers and
highlights the urgent need for awareness and protective measures.

Keywords: Pesticides; nature; precariousness of work; Lagoa D'Água.

1. INTRODUÇÃO

O uso de agrotóxicos se constitui em um problema de saúde pública, pois afeta quem os


utiliza nas fábricas, na aplicação aos cultivos, quem consome alimentos, bebe água
contaminada, ou que viva em áreas próximas a sua utilização. Na última década o aumento de
agrotóxicos no país foi bem superior à média mundial. De acordo com o Tribunal Superior do
Trabalho (2024) o Brasil é o país que mais consome agrotóxicos no planeta, tendo em vista que
a produção de diversas culturas agrícolas sem uso do mesmo é praticamente inviável, pois são
diversas as pragas existentes e o mercado consumidor exigem padrões que sem o uso dos
agrotóxicos não são alcançados. Ademais, para que haja o controle de plantas invasoras e
algumas pragas, é utilizado o agrotóxico também nas propriedades voltadas para a pastagem.
O povoado Lagoa D'Água, localizado no agreste de Sergipe, no município de
Ribeirópolis tem sua economia baseada na agricultura familiar, sendo caracterizado pela
presença de minifúndios. Estes se destacam na produção de verduras, hortaliças e tubérculos,
que por sua vez vem fazendo o uso de agrotóxicos.
Primeiramente, destaca-se que a partir de 1930 houve uma introdução dos agroquímicos
no campo, em especial os agrotóxicos, intensificando-se sua utilização a partir da Segunda
Guerra Mundial com o objetivo de aumentar a produção agrícola (SILVA et al., 2005).
Entretanto, apesar de combater diversas pragas e elevar a produção, o uso desses agroquímicos
também trouxe diversos problemas para a sociedade, principalmente para os produtores que
estão em contato direto com esses químicos, que fazem a aplicação dos mesmos sem
equipamento de proteção necessário, colocando sua própria saúde em risco (OMS, 2020).
Diante da necessidade dos padrões de qualidade exigidos os produtores são pressionados
a usarem agrotóxico degradando sua saúde. O Instituto Nacional do Câncer (INCA) informa
que o contato direto com agrotóxicos pode causar alguns efeitos sobre a saúde humana, sendo
estes agudos ou crônicos. Os efeitos iniciais, próximos ao momento do contato envolvem, tosse,
dificuldade para respirar, irritação na garganta, náuseas e entre outros. Já os efeitos crônicos
são aqueles que se apresentam após uma exposição contínua, a longo prazo, comuns em pessoas
que trabalharam por muitos anos aplicando produtos agroquímicos, entre eles estão: problemas
respiratórios graves, alteração do funcionamento do fígado e dos rins, incapacidade de gerar
filhos, malformação e problemas no desenvolvimento intelectual e físico das crianças. Além
disso, os agroquímicos estão constantemente relacionados ao desenvolvimento de câncer
(INCA, 2022).
Assim, o presente trabalho tem como objetivo compreender quais propriedades no
povoado fazem uso de agrotóxicos e seus desdobramentos, dentre aquelas que utilizam,
verificar se o uso é feito com equipamento de Proteção Individual (EPI), que tem como
finalidade proteger o aplicador reduzindo a sua exposição ao ambiente tóxico.

2. METODOLOGIA

O trabalho fundamentou-se em geógrafos e pesquisadores de áreas afins a partir de teses,


dissertações e artigos que trabalham na perspectiva da relação sociedade-natureza mediada pelo
trabalho de forma unitária. As pesquisas de campo foram feitas com um dos autores deste artigo
que é agricultor do povoado e vivencia a realidade estudada; com isso, foi possível a elaboração
de um mapa no software QGIS versão 3.22.5, com o propósito de analisar espacialmente o
quantitativo de propriedades que fazem o uso do agrotóxico. Além disso, categorizou-se as
propriedades conforme seu uso em agrícola ou pastagem. Ao analisar os perigos para a saúde
durante a aplicação de agrotóxicos, buscou-se avaliar a condição dos camponeses ao aplicar os
agroquímicos, através de entrevistas com os trabalhadores das propriedades para saber quais
proprietários rurais utilizavam agrotóxicos em seus cultivos ou pastos e se estes utilizavam EPI.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Das propriedades mapeadas é interessante de se notar o quantitativo exacerbado das que
não fazem o uso completo do EPI (ver figura 1). Assim, o uso indevido do agrotóxico
juntamente com o mal uso do EPI se torna muito perigoso, como aponta Veiga:

Os equipamentos utilizados na agricultura, além de


não protegerem integralmente o trabalhador, ainda
agravaram os riscos e perigos, pois, nos casos
estudados, tornaram-se fontes de contaminação
por agrotóxico. (VEIGA, 2007, p. 67).

Figura 1 - Delimitação de propriedades e categorização do uso indevido de agrotóxicos no povoado Lagoa


D'Água em Ribeirópolis - SE

Fonte: Autores, (2024)

Das 129 propriedades mapeadas no povoado Lagoa D’água 39 são áreas voltadas para
pastagem e o restante para agricultura, porém, nenhuma delas deixa de fazer uso dos
agrotóxicos, uma vez que as demandas do mercado e a realidade do campo não permite uma
agricultura orgânica. Além disso, destas que fazem o uso, 72 não fazem uso de nenhum tipo de
proteção e 44 fazem uso de proteção inadequada, que podem ir desde o uso de apenas máscaras
de algodão à luvas de tecido, deixando a maior parte do corpo exposta ao agrotóxico.
É interessante notar também que todos os pastos mapeados tem sua aplicação de
agrotóxico sem qualquer tipo de proteção. Além disso, como mostra o mapa, se destaca a única
propriedade que faz o uso completo do EPI, sendo este uso de acordo com as recomendações
da Organização Mundial da Saúde.
Assim, vê-se que há a necessidade da população camponesa de se proteger ao aplicar os
agrotóxicos, uma vez que estes causam intoxicação direta aos camponeses, sendo estas agudas
ou crônicas (AMBSCIENCE, 2024).

4. CONCLUSÕES

A produção camponesa, marcada historicamente pelo uso da adubação orgânica,


instrumentos manuais e uso de animais como suporte, foi alterada em décadas de modernização
seletiva e excludente. Tal processo tem como imperativo o uso incessantemente maquinário
tecnológico, sementes selecionadas e alteradas geneticamente, agrotóxicos cada vez mais
potentes (inseticidas, fungicidas e herbicidas); isso modifica a relação da unidade familiar
camponesa com o formato do seu trabalho e com um meio ambiente ecologicamente perturbado
e com superpragas. A crescente dependência do mercado pelos camponeses impõe as decisões
dos ciclos agrícolas em outra temporalidade, obrigando-os às práticas de manejos nocivas aos
trabalhadores e à natureza.
O funcionamento do trabalho familiar passa a ser marcado pela precariedade, tanto pela
instabilidade dos preços do mercado, que nem sempre cobre custos e garante renda esperada,
ou mesmo pelo comprometimento da saúde em virtude do uso de venenos sem proteção
satisfatória. A pesquisa do povoado Lagoa D'Água revela que todas as propriedades fazem uso
do agrotóxico e, ao ser feita a pulverização manual os resíduos são levados pela atmosfera, mas
os trabalhadores são os primeiros a contactarem o veneno.
A contaminação pode ocorrer no momento da diluição, a mistura, a aplicação e o
descarte de agrotóxicos, bem como durante a execução de limpeza de recipientes e manuseio
de culturas. As trabalhadoras e os trabalhadores rurais entram em risco durante a reentrada nas
propriedades que fizeram uso, seja durante a colheita ou até na limpeza de equipamentos. Além
dos trabalhadores, ressalta-se que o resto da natureza: ar, solo, água, alimentos, a fauna e a flora
também são profundamente contaminadas.
Pesquisas científicas em todo o mundo atestam as consequências do uso de agrotóxicos
em diversas doenças, como: leucemias e outros cânceres; alterações neurológicas (como o Mal
de Parkinson); lesões no fígado, pele e pulmão; alergias, alterações hormonais, problemas
comportamentais e de saúde mental, dores de cabeça, dentre outras. Os trabalhadores
pesquisados relatam ter como sintomas frequentes: dor de cabeça, náuseas, dificuldade para
dormir, depressão, fraqueza, alergias, esquecimento, dificuldade em respirar, diarreia, dor no
estômago, dentre outros.
O lucro com o envenenamento é incalculável e sinaliza a irracionalidade capitalista dos
grandes conglomerados: Syngenta (Suiça), Dupont (Estados Unidos), Dow Chemical (Estados
Unidos), Bayer (Alemanha), Novartis (Suiça), Basf (Alemanha) e Milenia (Holanda/Israel),
sobre a natureza e a força humana que trabalha. Embora as pequenas propriedades façam menos
uso de veneno que os setores do agronegócio, inclusive o Cerrado brasileiro concentra o uso,
cada vez mais esse processo vem se intensificado em pequenas propriedades, pois os
trabalhadores que não usam veneno, ainda que minimamente, tendem a ter prejuízos maiores.
Ainda que não seja o foco da pesquisa, parte-se do entendimento que a questão agrária e a
soberania alimentar são pautas urgentes e associadas ao debate dos agrotóxicos.
Por fim, não importam as condições as quais os trabalhadores estejam sujeitos e as
consequências para seu processo saúde-doença; nem se há uma intensificação do seu ritmo e de
suas forças físicas, cognitivas e afetivas ou a contaminação por agrotóxicos. O que interessa é
que os produtos cheguem dentro dos padrões ao mercado consumidor e gerem lucro.

5. REFERÊNCIAS

AMBSCIENCE. Consequências do uso de agrotóxicos para a saúde e o meio ambiente.


Disponível em: https://ambscience.com/consequencias-do-uso-de-agrotoxicos-para-a-saude-e-
o-meio-ambiente/. Acesso em: 24 set. 2024.

INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Exposição


no trabalho e no ambiente: agrotóxico. Disponível em: https://www.gov.br/inca/pt-
br/assuntos/causas-e-prevencao-do-cancer/exposicao-no-trabalho-e-no-ambiente/agrotoxico.
Acesso em: 20 set. 2024.

SILVA, J. M. D.; NOVATO-SILVA, E.; FARIA, H. P.; PINHEIRO, T. M. M. Agrotóxico e


trabalho: uma combinação perigosa para a saúde do trabalhador rural. Ciência & Saúde
Coletiva, v. 10, p. 891-903, 2005.

VEIGA, M. M. et al. A contaminação por agrotóxicos e os Equipamentos de Proteção


Individual (EPIs). Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, v. 32, n. 116, p. 57–68, jul. 2007.

WORLD HEALTH ORGANIZATION. Chemical safety: pesticides. Disponível em:


https://www.who.int/news-room/questions-and-answers/item/chemical-safety-pesticides.
Acesso em: 20 set. 2024.

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