Dispepsia Funcional

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Research, Society and Development, v. 10, n.

13, e498101321618, 2021


(CC BY 4.0) | ISSN 2525-3409 | DOI: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v10i13.21618

Dispepsia Funcional: um estudo epidemiológico e clínico


Functional dyspepsia: a clinical and epidemiological study
Dispepsia funcional: un estudio clínico y epidemiológico

Recebido: 10/10/2021 | Revisado: 16/10/2021 | Aceito: 17/10/2021 | Publicado: 20/10/2021

Wianne Santos Silva


ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8006-8934
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Gabriel Ponciano Santos de Carvalho
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7476-7907
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Anna Marcela Lima Fonseca
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5519-965X
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Kellyn Mariane Souza Sales
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6233-5103
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Giovanna Pimentel Oliveira Silva
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4981-8466
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Thaissa Carvalho Viaggi
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0026-7149
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Beatriz Carvalho Aragão
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2805-9675
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Ana Monize Ribeiro Fonseca
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7565-8435
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Allef Francisco Lira da Rocha Braga
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7326-0012
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]
Anna Sophia Almeida Gouveia
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6019-4204
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
E-mail: [email protected]
Sender Jankiel Miszputen
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4487-5004
Universidade Federal de São Paulo, Brasil
E-mail: [email protected]
Leda Maria Delmondes Freitas Trindade
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4300-4274
Universidade Tiradentes, Brasil
E-mail: [email protected]

Resumo
Introdução: A dispepsia funcional é uma síndrome gastrointestinal desafiadora pelos diversos fatores que podem gerá-
la e pelos critérios exigidos para diagnosticá-la. Entretanto, é possível entender o perfil epidemiológico e clínico de
seus portadores, bem como identificar a influência de algumas condições em suas manifestações. Objetivo: avaliar a
prevalência da dispepsia funcional e caracterizar os aspectos epidemiológicos e clínicos. Metodologia: estudo
prospectivo, transversal, tipo survey inquérito, com pacientes dispépticos encaminhados ao serviço de endoscopia
digestiva alta. A amostra foi composta por 859 indivíduos com diagnóstico clínico de dispepsia, sendo aplicados
questionários autoexplicativos: sociodemográfico, Inventário de Ansiedade de Beck, Inquérito de Depressão de Beck
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e o questionário de ROMA III. Resultados: do total de entrevistados, 36 (4,19%) preencheram os critérios ROMA IV
para dispepsia funcional, que engloba duas síndromes clínicas diferentes: a síndrome do desconforto pós-prandial e a
síndrome da dor epigástrica. A faixa etária média foi 31,5 anos (19,2-39,7), 23 (63,9%) eram procedentes de Aracaju,
32 (88,8%) do sexo feminino, 21 (60%) solteiros e 19 (54,3%) consideravam-se de cor parda. Foram identificados 19
(52,8%) pacientes portadores de ansiedade e 9 (25%) com depressão. Segundo os critérios, 10 (27,8%) apresentaram
síndrome do desconforto pós-prandial, 07 (19,4%) a síndrome da dor epigástrica e 19 (52,8%) os dois subtipos
clínicos simultaneamente. Conclusão: a dispepsia funcional foi mais prevalente entre as mulheres, indivíduos
solteiros, cor parda e portadores de ansiedade. Não houve significância estatística quanto ao tipo de apresentação
clínica, embora a manifestação concomitante dos dois subtipos, tenha sido mais prevalente.
Palavras-chave: Dispepsia; Epidemiologia; Sinais e sintomas.

Abstract
Introduction: Functional dyspepsia is a challenging gastrointestinal syndrome due to the various factors that may
generate it and the criteria required to diagnose it. However, it is possible to understand the epidemiological and
clinical profile of these patients, as well as to identify the influence of some conditions on their manifestations.
Objective: to assess the prevalence of functional dyspepsia and its characterize the epidemiological and clinical
aspects. Methodology: prospective, cross-sectional, survey-type study, with dyspeptic patients referred to the upper
digestive endoscopy service. The sample consisted of 859, with a clinical diagnosis of dyspepsia, and self-explanatory
questionnaires were reported: sociodemographic, Beck Anxiety Inventory, Beck Depression Survey and the ROMA
III questionnaire. Results: 36 (4.19%) of the total respondents met ROMA IV criteria for functional dyspepsia, which
encompasses two different clinical syndromes: postprandial discomfort syndrome and epigastric pain syndrome. The
average age group was 31.5 years old (19.2-39.7), 23 (63.9%) were from Aracaju, 32 (88.8%) were female, 21 (60%)
were single and 19 (54.3%) considered themselves brown. We identified 19 (52.8%) patients with anxiety and 9
(25%) with depression. According to the criteria, 10 (27.8%) postprandial discomfort syndrome, 07 (19.4%) epigastric
pain syndrome and 19 (52.8%) both simultaneous clinical subtypes. Conclusion: a functional dyspepsia was more
prevalent among women, single dependents, brown skin color and people with anxiety. There was no statistical
significance regarding the type of clinical presentation, although the simultaneous manifestation of the two subtypes
was more prevalent.
Keywords: Dyspepsia; Epidemiology; Signs and symptoms.

Resumen
Introducción: La dispepsia funcional es un síndrome gastrointestinal desafiante debido a los diversos factores que
pueden generarlo y los criterios necesarios para diagnosticarlo. Sin embargo, es posible comprender el perfil
epidemiológico y clínico de sus pacientes, así como identificar la influencia de algunas afecciones en sus
manifestaciones. Objetivo: evaluar la prevalencia de dispepsia funcional y caracterizar los aspectos epidemiológicos y
clínicos. Metodología: estudio prospectivo, transversal, tipo encuesta, con pacientes dispépticos remitidos al servicio
de endoscopia digestiva alta. La muestra estuvo conformada por 859, con diagnóstico clínico de dispepsia, y se
reportaron cuestionarios autoexplicativos: sociodemográfico, Inventario de Ansiedad de Beck, Encuesta de Depresión
de Beck y cuestionario ROMA III. Resultados: 36 (4,19%) del número total de encuestados cumplieron los criterios
ROMA IV para dispepsia funcional, que engloba dos síndromes clínicos diferentes: síndrome de malestar posprandial
y síndrome de dolor epigástrico. El grupo de edad promedio fue de 31,5 años (19,2-39,7), 23 (63,9%) eran de Aracaju,
32 (88,8%) eran mujeres, 21 (60%) eran solteras y 19 (54,3%) se consideraban morenos. Identificamos 19 (52,8%)
pacientes con ansiedad y 9 (25%) con depresión. Según los criterios, 10 (27,8%) síndrome de malestar posprandial, 07
(19,4%) síndrome de dolor epigástrico y 19 (52,8%) ambos subtipos clínicos simultáneos. Conclusión: la dispepsia
funcional fue más prevalente entre mujeres, solteros dependientes, piel morena y personas con ansiedad. No hubo
significación estadística con respecto al tipo de presentación clínica, aunque la manifestación concomitante de los dos
subtipos fue más prevalente.
Palabras clave: Dispepsia; Epidemiología; Signos y síntomas.

1. Introdução
Dispepsia Funcional (DF) é uma doença, de etiologia multifatorial, cujas queixas clínicas se localizam na parte
superior do abdômen, com manifestação periódica podendo cronificar. Possui sinais e sintomas característicos como: dor
abdominal, saciedade precoce, plenitude gástrica pós prandial e azia, com a ausência de uma causa orgânica identificável por
meios diagnósticos convencionais (Vinaccia, Quiceno, Medina, Castañeda, & Castelblanco, 2014).
A endoscopia digestiva alta (EDA) é um procedimento que permite a avaliação e análise direta do trato digestivo
superior e possibilita o diagnóstico diferencial entre as dispepsias orgânica e funcional (Ferri, 2019). De acordo com os

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critérios de Roma IV, além de apresentar um ou mais sintomas gastrointestinais, no diagnóstico da DF deve-se excluir
alterações estruturais (inclusive na EDA) que justifiquem o quadro clínico (Stanghellini et al., 2016; Santos, 2019).
Os critérios de Roma IV classificam o quadro clínico da DF em dois subtipos de acordo com os sintomas mais
prevalentes: a síndrome do desconforto pós-prandial (SDPP) e a síndrome da dor epigástrica (SDE). A SDPP se refere à
presença de sensação incômoda de desconforto após uma refeição habitual e de saciedade precoce, que pode interferir no seu
término, enquanto a SDE é a presença de dor ou queimação em região epigástrica. Apesar de a subdivisão ter por objetivo
auxiliar o manejo terapêutico da doença, não significa que uma queixa deva necessariamente ocorrer de forma isolada da outra,
visto que as duas podem aparecer concomitantemente (Coelho et al., 2018).
Dentre os inúmeros diagnósticos diferenciais que existem para pessoas que apresentem sintomas como saciedade
precoce, desconforto pós prandial e dor ou queimação epigástrica, a dispepsia não ulcerosa ou funcional é a mais frequente e
afeta cerca de um quarto da população mundial. Esse distúrbio é responsável por cerca de 3% a 5% das consultas de cuidados
primários em saúde e, apesar de ser uma problemática muito comum na saúde coletiva, ainda possui uma baixa procura pela
assistência médica, sendo que apenas 8% dos doentes procuram atendimento médico. (Ferreira, Bello, & Gomes, 2018; Ferri,
2019).
Apesar de possuir uma fisiopatologia complexa e sem etiologia específica, a DF pode ser entendida como uma
associação entre alterações do funcionamento do sistema imune e nervoso do organismo e as repercussões na motilidade
gastroduodenal, principalmente quando ligado ao eixo “cérebro-intestino” (Drossman, 2016). Pelas interferências autonômicas
eferentes ou pelo desequilíbrio do eixo neuroendócrino, hipotálamo-hipófise-adrenal, os fatores emocionais e psicológicos,
atuam nos receptores do sistema nervoso entérico com repercussão sobre o esvaziamento gástrico, peristaltismo intestinal e as
secreções digestivas, o que provoca o surgimento de sintomas gastrointestinais em diferentes segmentos do canal alimentar. A
secreção anormal de hormônios liberadores de corticotrofina responde por alteração nos níveis de sensibilidade à dor
periférica, o que pode explicar seu aumento em situações de estresse, em consequência ao aumento do cortisol (Mayer, Labus,
Tillisch, Cole, & Baldi, 2015; Moloney et al., 2016).
A DF é reconhecidamente desafiadora, no que diz respeito à estimativa da sua prevalência, tanto pela baixa procura
da assistência primária pelo paciente portador de sintomas, quanto pelos critérios diagnósticos variáveis utilizados na maioria
dos estudos sobre o tema e pela sua etiologia mal definida. Além disso, a síndrome dispéptica possui fatores de riscos
importantes para sua manifestação, como o sexo feminino, a idade e a infecção por Helicobacter pylori (Harer & Hasler,
2020).
Este estudo representa parte de um projeto sobre dispepsia, que teve como proposta avaliar a prevalência da Dispepsia
Funcional, caracterizar os aspectos epidemiológicos e clínicos em portadores de sintomas dispépticos, submetidos a
endoscopia digestiva alta, em duas clínicas privadas do município de Aracaju, Sergipe.

2. Metodologia
Trata-se de um estudo prospectivo, transversal, analítico, descritivo, do tipo survey inquérito sobre dispepsia
funcional (DP), iniciado no ano de 2015 em Aracaju, Sergipe, Brasil. Em 2018 o projeto inicial passou por modificações na
sua construção metodológica. De setembro de 2018 até dezembro de 2019 realizou-se nova coleta de dados em duas clínicas
privadas de endoscopia digestiva. A amostra do tipo probabilística por conveniência foi composta por 859 indivíduos
encaminhados ao serviço de endoscopia digestiva alta (EDA), com diagnóstico clínico de dispepsia.
Os exames endoscópico e histopatológico foram realizados por profissionais previamente definidos para manter o
mesmo padrão de avaliação. Considerou-se como critérios de inclusão indivíduos maiores de 20 anos, de ambos os sexos, com

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diagnóstico clínico de dispepsia e ausência de lesão estrutural nos laudos endoscópicos e histopatológicos, e os de exclusão,
mulheres grávidas, indivíduos com antecedentes de doenças físicas ou mentais limitantes ao processo de compreensão para a
aplicação dos questionários. Todos os participantes foram abordados pelos pesquisadores, na sala de espera, antes de serem
submetidos a EDA. Os laudos endoscópicos eram entregues aos pacientes após finalizado o exame. Os pesquisadores tinham
acesso imediato aos mesmos e, posteriormente, ao laudo histopatológico, mediante autorização prévia, ao assinarem o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido. Os entrevistados foram codificados para posterior contato e identificação dos laudos
histopatológicos.
Antes da realização da endoscopia foram aplicados, sob a orientação dos pesquisadores, quatro questionários
autoexplicativos com perguntas abertas e fechadas: questionário sociodemográfico e clínico, Inventários de Ansiedade (BAI) e
de depressão de Beck (BDI) e o questionário de ROMA III. Para identificar o perfil sociodemográfico e clínico definiu-se
como variáveis: idade, procedência, sexo, estado civil, cor da pele, hábitos sociais e antecedentes de saúde.
O Inventário de Ansiedade de Beck (BAI), composto por 21 questões de múltipla escolha, avalia a gravidade de
sintomas comuns à ansiedade. As respostas quanto a caracterização de sintomas ansiosos podem ser: 0 para ausentes, 1 suaves,
2, moderados e 3 para forma severa. A presença de ansiedade foi estimada a partir do somatório das respostas: 0 a 10 não como
ausência de sintomas ansiosos, 11 a 63 identificando algum grau de ansiedade.
O Inventário de Depressão de Beck (BDI), composto por 21 questões de múltipla escolha, contendo 4 itens cada uma,
e pontuação de 0, 1, 2 e 3, buscou medir a severidade do quadro depressivo. Os pontos de corte utilizados foram: entre 0 e 13
depressão mínima ou ausência, entre 14 e 19 leve, entre 20 e 28 moderada e acima de 28 como depressão severa.
Considerando que, em 2016, foram publicados os Critérios de ROMA IV, e que, até o início da nova versão deste
projeto ainda não havia um novo questionário validado em português, optou-se por utilizar o questionário de ROMA III (Von
Reisswitz, Mazzoleni, Sander, & Francisconi, 2010) acrescentando as atualizações conceituais do ROMA IV para as variáveis
dependentes: existência de plenitude pós-prandial e saciedade precoce para caracterizar a Síndrome do Desconforto Pós
Prandial (SDPP) e a dor e/ou queimação epigástrica e azia para caracterizar a Síndrome da Dor Epigástrica (SDE).
A SDPP foi considerada quando o paciente referiu queixa de saciedade precoce e empachamento após uma refeição
de tamanho habitual, respondidas nos itens 03, 04, 05 e 06 do questionário. A SDE foi considerada quando o paciente referiu
queixa de desconforto ou dor em queimação em epigástrio, equivalentes aos itens 01, 02 e de 07 a 13.
Utilizou-se o software R Core Team 2020. As variáveis categóricas foram descritas por meio de frequência absoluta e
relativa percentual e, as variáveis contínuas, por mediana e intervalo quartil. A hipótese de independência entre variáveis
categóricas foi testada pelos testes Qui-Quadrado de Pearson ou Exato de Fisher, e as diferenças entre medianas foram testadas
pelo teste de Mann-Whitney. O nível de significância adotado foi de 5%. Estudo aprovado pelo CEP/UNIT, parecer nº
2.832.329.

3. Resultados
Do total de 859 entrevistados que apresentavam sintomas dispépticos, 766 (89,1%) tinham alterações endoscópicas,
726 (84,4%) alterações histopatológicas e 36 (4,19%) pacientes não apresentaram lesão estrutural, tanto do ponto de vista,
macro quanto microscópico, incluindo a pesquisa de H. pylori negativa na biópsia, preenchendo portanto, os critérios para o
diagnóstico de dispepsia funcional, segundo Critérios de Roma III e IV.
A faixa etária mediana dos portadores de dispepsia funcional foi de 31,5 anos (19,2-39,7) sendo estatisticamente
significativo (p=0,002) o predomínio do sexo feminino, representando 32 (88,8%) da amostra total (p=0,002). Eram

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procedentes de Aracaju 23 (63,9%), 21 (60%) solteiros e 19 (54,3%) se consideravam de cor parda. Faziam uso de bebidas
alcoólicas 5 (13,9%) participantes e 20 (58,8%) possuíam ensino médio completo (Tabela 1).

Tabela 1. Aspectos sociodemográficos dos dispépticos funcionais. Aracaju 2018-2019.


DISPEPSIA FUNCIONAL

Dados
Válidos Sim Não
n (%) (n=36) (n=824) p-valor
Idade, mediana (IIQ) 859 (99,9) 31,5 (19,2-39,7) 37,0 (30-46) <0,001 W
PROCEDÊNCIA, n (%)
Aracaju 627 (72,9) 23 (63,9) 604 (73,3) 0,467 Q
Interior de Sergipe 123 (14,3) 7 (19,4) 116 (14,1)
Outro Estado do Brasil 110 (12,8) 6 (16,7) 104 (12,6)
SEXO, n (%)
Feminino 560 (65,1) 32 (88,9) 528 (64,1) 0,002 F
Masculino 300 (34,9) 4 (11,1) 296 (35,9)
ESTADO CIVIL, n (%)
Solteiro 304 (35,6) 21 (60) 283 (34,6) 0,018 Q
Casado 476 (55,7) 14 (40) 462 (56,4)
Viúvo 20 (2,3) 0 (0) 20 (2,4)
Outros 54 (6,3) 0 (0) 54 (6,6)
COR DA PELE, n (%)
Branca 207 (24,8) 8 (22,9) 199 (24,9) 0,867 Q
Parda 425 (51) 19 (54,3) 406 (50,8)
Preta 171 (20,5) 6 (17,1) 165 (20,7)
Amarela 29 (3,5) 2 (5,7) 27 (3,4)
Indígena 2 (0,2) 0 (0) 2 (0,3)
Álcool, n (%) 267 (94,3) 5 (13,9) 262 (94,2) 1,000 F
Tabagismo, n (%) 40 (14,1) 1 (20) 39 (14) 0,536 F
Drogas Ilícitas, n (%) 1 (0,4) 0 (0) 1 (0,4) 1,000 F
GRAU DE INSTRUÇÃO, n (%)
Analfabeto 7 (0,8) 0 (0) 7 (0,9) 0,925 Q
Ensino Fundamental Incompleto 32 (3,8) 1 (2,9) 31 (3,8)
Ensino Fundamental Completo 99 (11,7) 3 (8,8) 96 (11,8)
Ensino Médio Completo 447 (52,7) 20 (58,8) 427 (52,4)
Ensino Superior Completo 264 (31,1) 10 (29,4) 254 (31,2)
Legenda: n – frequência absoluta. % – frequência relativa percentual. IIQ – intervalo interquartil. W – Teste de Mann-Whitney. Q –
Teste Qui-Quadrado de Pearson. F – Teste Exato de Fisher. Fonte: Autores.

De acordo com a classificação clínica da DF, foram subdivididos de acordo com os sintomas: Síndrome do
Desconforto Pós Prandial (SDPP), Síndrome da Dor Epigástrica (SDE) e a apresentação concomitante entre as duas (SDPP e
SDE). Assim, 10 (27,8%) pacientes eram portadores apenas de SDE, 07 (19,4%) apenas SDPP e 19 (52,8%) referiam sintomas
correspondentes às duas síndromes concomitantemente (Figura 1).

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Figura 1. Classificação clínica da Dispepsia Funcional de acordo com os sintomas. Aracaju 2018-2019.

Fonte: Autores.

Dos pacientes com SDPP, ao somar o padrão isolado com o que corresponde à intersecção, 26 (72,2%) se sentiam
desconfortavelmente cheios (saciados) após uma refeição de tamanho habitual pelo menos 1 vez nos últimos 3 meses e desses,
10 há mais de 6 meses; 8 (22,2%) referiram ser incapazes de terminar uma refeição de tamanho habitual pelo menos 1 vez nos
últimos 3 meses e 5 (62,5%) há mais de 6 meses.
Da mesma forma ao somar todos os entrevistados que se enquadraram na SDE com a intersecção, 29 (80,5%) tiveram
pelo menos uma vez no mês, nos últimos três meses, dor ou desconforto no meio do peito não relacionado a problemas
cardíacos; 22 (61,1%) manifestaram azia pelo menos 1 vez nos últimos três meses e 20 (57,1%) apresentaram dor ou
desconforto nos últimos três meses. Desses, 8 (42,1%) referiram permanecer com essa dor por mais de seis meses; 18 (50%)
deles notaram que a dor ocorria e desaparecia completamente no mesmo dia, às vezes, nos últimos 3 meses. Quanto a
intensidade dessa dor, 4 (20%) pacientes a descreveram como suave, 10 (50%) moderada, 5 (25%) severa e 1 (5%) muito
severa. Questionados sobre o uso de antiácido para alívio, 4 (20%) responderam nunca ou raramente notar alívio, 9 (45%)
reconheciam algum alívio e desses, 3 (15%) referiam aliviar às vezes, 1 (5%) muitas vezes, 2 (10%) na maioria das vezes e 3
(15%) sempre. Sete (35%) deles não faziam uso de antiácidos.
Dentre os pacientes com queixa de dor epigástrica, quanto a frequência e fator de melhora, afirmaram que passava ou
melhorava o sintoma após evacuação ou eliminação de gases: 6 (30%) às vezes, 2 (10%) na maioria das vezes e 4 (20%)
sempre. Identificaram também aliviar com movimentos ou trocas de posição do corpo: 8 (40%) nunca ou raramente, 5 (25%)
às vezes, 1 (5%) muitas vezes, 3 (15%) maioria das vezes e 3 (15%) sempre.
Queixavam-se que nos últimos seis meses a dor era constante no meio ou na área superior direita do seu abdome, 9
(25%) pacientes e, quando questionados quanto a duração de mais de 30 minutos, responderam que: nunca ou raramente 3
(27,3%), às vezes 1 (9,1%), muitas vezes 2 (18,2%), maioria das vezes 3 (27,3%) e sempre 2 (18,2%). Quanto ao aumento de
intensidade dessa dor até ficar muito forte e contínua, os respondentes afirmaram: nunca ou raramente 3 (30%) pacientes, às
vezes 4 (40%), muitas vezes 2 (20%) e maioria das vezes 1 (10%). Se essa dor desaparece entre os episódios, do seu
aparecimento responderam que: nunca ou raramente 3 (30%), ás vezes 3 (30%), maioria das vezes 1 (10%) e sempre 3 (30%).
Se essa dor impediu de realizar suas atividades usuais ou levou-o a ir urgentemente ao médico ou a um serviço de emergência,
afirmaram que: nunca ou raramente 6 (60%), às vezes 2 (20%) e sempre 2 (20%) (Tabela 2).

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Tabela 2. Aspectos clínicos dos dispépticos funcionais segundo os critérios diagnósticos de Roma III. Aracaju, 2018-2019.
DISPEPSIA FUNCIONAL
Dados válidos Sim Não
n (%) n (%) n (%) p-valor
1. Nos últimos 3 meses, com que frequência você teve dor ou
desconforto no meio do seu peito (não relacionada a problemas
cardíacos)?

Nunca 492 (57,6) 17 (47,2) 475 (58,1) 0,302 Q


Menos de um dia por mês 48 (5,6) 5 (13,9) 43 (5,3)
Um dia por mês 48 (5,6) 3 (8,3) 45 (5,5)
Dois a três dias por mês 56 (6,6) 2 (5,6) 54 (6,6)
Um dia por semana 35 (4,1) 1 (2,8) 34 (4,2)
Mais de um dia por semana 128 (15) 7 (19,4) 121 (14,8)
Todos os dias 47 (5,5) 1 (2,8) 46 (5,6)
2. Nos últimos 3 meses, com que frequência você teve azia (um
desconforto ou dor de queimação no seu peito)?
Nunca 286 (33,7) 14 (38,9) 272 (33,5) 0,101 Q
Menos de um dia por mês 53 (6,2) 5 (13,9) 48 (5,9)
Um dia por mês 49 (5,8) 4 (11,1) 45 (5,5)
Dois a três dias por mês 96 (11,3) 2 (5,6) 94 (11,6)
Um dia por semana 80 (9,4) 1 (2,8) 79 (9,7)
Mais de um dia por semana 201 (23,7) 9 (25) 192 (23,6)
Todos os dias 84 (9,9) 1 (2,8) 83 (10,2)
3. Nos últimos 3 meses, com que frequência você se sentiu
desconfortavelmente cheio (saciado) depois de uma refeição de
tamanho habitual?
Nunca 329 (38,8) 10 (27,8) 315 (38,8) 0,804 Q
Menos de um dia por mês 48 (5,7) 3 (8,3) 45 (5,5)
Um dia por mês 37 (4,4) 7 (19,4) 34 (4,2)
Dois a três dias por mês 91 (10,7) 3 (8,3) 88 (10,8)
Um dia por semana 77 (9,1) 2 (5,6) 75 (9,2)
Mais de um dia por semana 165 (19,5) 8 (22,2) 157 (19,3)
Todos os dias 101 (11,9) 3 (8,3) 98 (12,1)
4. Você teve esta sensação desconfortável de estar cheio após as
refeições por 6 meses?
Não 244 (45,2) 12 (54,5) 232 (44,8) 0,390 F
Sim 296 (54,8) 10 (45,5) 286 (55,2)
5. Nos últimos 3 meses, com que frequência você foi incapaz de
terminar uma refeição de tamanho habitual?
Nunca 632 (75,8) 28 (77,8) 604 (75,7) 0,827 Q
Menos de um dia por mês 26 (3,1) 2 (5,6) 24 (3)
Um dia por mês 29 (3,5) 1 (2,8) 28 (3,5)
Dois a três dias por mês 38 (4,6) 1 (2,8) 37 (4,6)
Um dia por semana 26 (3,1) 0 (0) 26 (3,3)
Mais de um dia por semana 57 (6,8) 2 (5,6) 55 (6,9)
Todos os dias 26 (3,1) 2 (5,6) 24 (3)

6. Você teve esta incapacidade de terminar refeições de tamanho


habitual por 6 meses ou mais?
Não 114 (50,4) 3 (37,5) 111 (50,9) 0,497 F
Sim 112 (49,6) 5 (62,5) 107 (49,1)
7. Nos últimos 3 meses, com que frequência você teve dor ou
queimação no meio do seu abdome, acima do seu umbigo, mas não
no seu peito?
Nunca 326 (38,3) 15 (42,9) 311 (38,1) 0,746 Q
Menos de um dia por mês 38 (4,5) 3 (8,6) 35 (4,3)
Um dia por mês 62 (7,3) 2 (5,7) 60 (7,3)
Dois a três dias por mês 92 (10,8) 5 (14,3) 87 (10,6)
Um dia por semana 77 (9) 3 (8,6) 74 (9,1)
Mais de um dia por semana 200 (23,5) 6 (17,1) 194 (23,7)
Todos os dias 57 (6,7) 1 (2,9) 56 (6,9)
8. Você teve esta dor ou queimação por 6 meses ou mais?
Não 235 (44,3) 11 (57,9) 224 (43,8) 0,247 F
Sim 295 (55,7) 8 (42,1) 287 (56,2)

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9. Esta dor ou queimação ocorre e depois desaparece


completamente durante o mesmo dia?
Nunca ou raramente 84 (15,9) 3 (14,3) 81 (15,9)
0,631 Q
Às vezes 131 (24,8) 4 (19) 127 (25)
Muitas vezes 34 (6,4) 3 (14,3) 31 (6,1)
Maioria das vezes 96 (18,1) 3 (14,3) 93 (18,3)
Sempre 184 (34,8) 8 (38,1) 176 (34,6)
10. Normalmente, quão severa era a dor ou queimação no meio do
abdome, acima do seu umbigo?
Muito suave 14 (2,7) 0 (0) 14 (2,8) 0,939 Q
Suave 123 (23,4) 4 (20) 119 (23,5)
Moderada 246 (46,8) 10 (50) 236 (46,6)
Severa 108 (20,5) 5 (25) 103 (20,4)
Muito severa 35 (6,7) 1 (5) 34 (6,7)
11. Essa dor ou queimação era aliviada com o uso de antiácidos?
Nunca ou raramente 82 (15,5) 4 (20) 78 (15,4) 0,767 Q
Às vezes 104 (19,7) 3 (15) 101 (19,9)
Muitas vezes 30 (5,7) 1 (5) 29 (5,7)
Maioria das vezes 64 (12,1) 2 (10) 62 (12,2)
Sempre 127 (24,1) 3 (15) 124 (24,4)
Não uso antiácidos 121 (22,9) 7 (35) 114 (22,4)
12. Essa dor ou queimação normalmente melhorava ou passava
após a evacuação ou eliminação de gases?
Nunca ou raramente 275 (52,3) 8 (40) 267 (52,8) 0,502 Q
Às vezes 114 (21,7) 6 (30) 108 (21,3)
Muitas vezes 17 (3,2) 0 (0) 17 (3,4)
Maioria das vezes 60 (11,4) 2 (10) 58 (11,5)
Sempre 60 (11,4) 4 (20) 56 (11,1)
13. Com que frequência essa dor ou desconforto aliviou com
movimentos ou trocas de posição do seu corpo?
Nunca ou raramente 294 (55,7) 8 (40) 286 (56,3) 0,678 Q
Às vezes 102 (19,3) 5 (25) 97 (19,1)
Muitas vezes 28 (5,3) 1 (5) 27 (5,3)
Maioria das vezes 50 (9,5) 3 (15) 47 (9,3)
Sempre 54 (10,2) 3 (15) 51 (10)
14. Nos últimos 6 meses, com que frequência você teve dor
constante no meio ou na área superior direita do seu abdome?
Nunca 545 (64,3) 26 (74,3) 519 (63,8) 0,710 Q
Menos de um dia por mês 40 (4,7) 1 (2,9) 39 (4,8)
Um dia por mês 42 (5) 2 (5,7) 40 (4,9)
Dois a três dias por mês 54 (6,4) 3 (8,6) 51 (6,3)
Um dia por semana 42 (5) 1 (2,9) 41 (5)
Mais de um dia por semana 88 (10,4) 2 (5,7) 86 (10,6)
Todos os dias 37 (4,4) 0 (0) 37 (4,6)
15. Esta dor durou 30 minutos ou mais?
Nunca ou raramente 101 (32,1) 3 (27,3) 98 (32,2) 0,287 Q
Às vezes 68 (21,6) 1 (9,1) 67 (22)
Muitas vezes 19 (6) 2 (18,2) 17 (5,6)
Maioria das vezes 49 (15,6) 3 (27,3) 46 (15,1)
Sempre 78 (24,8) 2 (18,2) 76 (25)
16. Essa dor aumentou de intensidade até ficar muito forte e
contínua?
Nunca ou raramente 117 (37,4) 3 (30) 114 (37,6) 0,372 Q
Às vezes 76 (24,3) 4 (40) 72 (23,8)
Muitas vezes 34 (10,9) 2 (20) 32 (10,6)
Maioria das vezes 21 (6,7) 1 (10) 20 (6,6)
Sempre 65 (20,8) 0 (0) 65 (21,5)
17. Esta dor desapareceu completamente entre os episódios?
Nunca ou raramente 73 (23,8) 3 (30) 70 (23,6) 0,979 Q
Às vezes 84 (27,4) 3 (30) 81 (27,3)
Muitas vezes 13 (4,2) 0 (0) 13 (4,4)
Maioria das vezes 23 (7,5) 1 (10) 22 (7,4)
Sempre 114 (37,1) 3 (30) 111 (37,4)
18. Essa dor o impediu de realizar suas atividades usuais ou levou-
o a ir urgentemente ver um médico ou ir a um serviço de
emergência?

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Nunca ou raramente 201 (64,4) 6 (60) 195 (64,6) 0,262 Q


Às vezes 67 (21,5) 2 (20) 65 (21,5)
Muitas vezes 14 (4,5) 0 (0) 14 (4,6)
Maioria das vezes 14 (4,5) 0 (0) 14 (4,6)
Sempre 16 (5,1) 2 (20) 14 (4,6)
Legenda: n – frequência absoluta. % – frequência relativa percentual. Q – Teste Qui-Quadrado de Pearson. F – Teste Exato de Fisher.
Fonte: Autores.

Ao aplicar os questionários de Beck para diagnóstico de ansiedade e depressão notou-se que 19 (52,8%) dentre os
dispépticos funcionais preencheram os critérios para ansiedade e 9 (25%) para depressão, sendo a forma leve a apresentação
mais comum entre esses pacientes. (Tabela 3).

Tabela 3. Nível de ansiedade e depressão entre os dispépticos funcionais. Aracaju 2018-2019.


DISPEPSIA FUNCIONAL
Dados válidos Sim Não
n (%) n (%) n (%) p-valor
Ansiedade (BAI)
Ausente 472 (54,9) 17 (47,2) 455 (55,2) 0,824
Leve 214 (24,9) 11 (30,6) 203 (24,6)
Moderado 112 (13,0) 5 (13,9) 107 (13,0)
Grave 62 (7,2) 3 (8,3) 59 (7,2)
Depressão (BDI)
Mínimo 694 (80,7) 27 (75) 667 (80,9) 0,236
Leve 89 (10,3) 7 (19,4) 82 (10)
Moderado 56 (6,5) 1 (2,8) 55 (6,7)
Grave 21 (2,4) 1 (2,8) 20 (2,4)
Legenda: n – frequência absoluta. % – frequência relativa percentual. Teste Qui-Quadrado de Pearson. Fonte: Autores.

4. Discussão
Palavra de origem grega "δυς-" [dys-] dificuldade e "πέψη" [pepsi] digestão, a dispepsia é definida como dificuldade
ou distúrbio da digestão, que é representada por um conjunto de sintomas relacionados ao trato gastrintestinal superior
manifestando-se como dor, queimação ou desconforto, saciedade precoce e plenitude pós prandial. Contudo, para ser
diagnosticado como dispepsia funcional, esse distúrbio não deve apresentar alterações na endoscopia digestiva alta e na leitura
das biópsias, que justifiquem a queixa clínica (Oliveira, Fernandes, Silva, Lima, & Brito, 2019). O estudo demonstrou que na
população entrevistada apenas 36 (4,19%) pacientes preencheram os critérios para o diagnóstico de Dispepsia Funcional (DF).
A DF é diagnosticada baseando-se no quadro clínico do paciente e na exclusão de outros diagnósticos. Tal conceito
foi discutido pelo Consenso Roma III que definiu a síndrome dispéptica funcional como sendo a alteração clínica originada na
região gastroduodenal associada à ausência de doença orgânica, sistêmica ou metabólica que a justifique. O Consenso Roma
IV, lançado em 2016, reavaliou todos os critérios e manteve, quase sem alteração, os estabelecidos anteriormente pelo
Consenso Roma III (Ferri, 2019). Apesar de terem sido aplicados os de Roma III, a análise dos sintomas e dos critérios
diagnósticos para DF não foram prejudicadas, visto que a atualização não alterou diretamente a avaliação diagnóstica através
deste instrumento.
As doenças do trato gastrointestinal superior, incluindo dispepsia, são comuns em adultos jovens e em idosos, embora
a prevalência diminua com a idade acima de 60 anos (Walker & Talley, 2019). Segundo Vargas et. al. (2016), o distúrbio
funcional é a causa mais comum de dispepsia entre os jovens. Nesta pesquisa, a faixa etária se mostrou mais prevalente entre a
segunda e a quarta década de vida, demonstrando maior frequência entre os adultos jovens.
Autores citam que sintomas dispépticos e azia são mais prevalentes na população urbana adulta brasileira (Almeida et
al., 2017). Nossos dados revelaram que mais de 60% dos portadores de DF eram procedentes de Aracaju, maior centro urbano

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local. Nota-se também que são mais prevalentes no sexo feminino, ao considerar que as mulheres estão mais expostas a
situações de estresse, tanto no âmbito social como também familiar, o que gera uma sobrecarga de atividades que as tornam
mais suscetíveis ao aparecimento de diversos sintomas, incluindo os digestivos (Negre & López, 2014; Sayuk & Gyawali,
2020; Zelaya, Benítez, & Turcios, 2020). No presente estudo, as mulheres representaram a grande maioria entre os portadores
de dispepsia funcional.
Existem fatores de risco que são comuns nos dispépticos funcionais, seja naqueles que apresentam SDPP quanto nos
portadores de SDE, tais como idade mais jovem e o estado civil solteiro, quando comparados aos demais (Fang et al., 2015).
Em um levantamento brasileiro realizado por Almeida et al. (2017) com 548 indivíduos participantes, no qual mais da metade
relatou queixa dispéptica, a maior frequência identificada foi entre os solteiros. Corroborando com este trabalho, nossos
resultados também demonstraram uma alta prevalência entre os indivíduos solteiros, quando comparado aos casados,
divorciados e viúvos. Observou-se também que a cor parda e os indivíduos com ensino médio completo foram mais
prevalentes entre os portadores de DF.
Segundo Narváez e Gayoso-Cervantes (2016), o consumo de álcool e tabaco podem ser possíveis fatores de risco para
dispepsia. Entretanto, não existe consenso quanto à associação de ingestão de álcool como um fator provocador ou não do
quadro dispéptico (Duncanson, Talley, Walker, & Burrows, 2017). O tabagismo, segundo Wei et al. (2020), é um fator de risco
para alterações esofagogástricas estruturais, compatíveis com a dispepsia orgânica e não com a funcional. Embora não haja um
padrão nessas relações, o presente estudo demonstrou que a minoria dos portadores de DF referiu fazer uso de bebida alcoólica
e, um número menor, tabaco.
Do ponto de vista clínico, a DF pode ser classificada em dois grandes grupos segundo o ROMA IV: a síndrome do
desconforto pós-prandial (SDPP) e a síndrome da dor epigástrica (SDE). De acordo com Caballero-Mateos e Cerezo (2018) a
classificação surgiu para auxiliar na identificação e manejo da doença, em que agrupou os sintomas de empachamento pós-
prandial e a saciedade precoce na SDPP, e de dor e queimação epigástricas na SDE. Entretanto, é importante salientar que as
duas síndromes podem aparecer concomitantemente, visto que podem ser apresentadas mutuamente e, mesmo que se
sobreponham, não se excluem (Santos, 2019).
Um estudo realizado nos Estados Unidos da América, no Canadá e no Reino Unido, com 2100 indivíduos, mostrou
que o subtipo mais comum da DF é a SDPP, atingindo mais que a metade da população de dispépticos estudada (Aziz et al.,
2018). Em nossa casuística foi observada maior frequência do padrão clínico de SDE quando comparado com a SDPP.
Contudo, a maioria dos dispépticos funcionais manifestaram, de forma mais frequente, os dois subtipos concomitantemente, ou
seja, sintomas de desconforto pós prandial e de dor epigástrica paralelamente.
A presença de comorbidades em indivíduos com sintomas dispépticos e psiquiátricos é uma realidade comumente
observada, com apresentação clínica e etiologia complexas (Trovão, 2020). Os pacientes com DF, num estudo realizado por
Enck et al. (2017) com testes psicométricos, obtiveram maiores índices de ansiedade, depressão e somatização do que aqueles
que não tinham sintomas digestivos. Essa relação evidencia o processamento patológico de estímulos viscerais associados a
fatores psicossociais (Tshabalala, Tomita, & Ramlall, 2019). Neste estudo, ao aplicar os inventários de Beck para ansiedade e
depressão com intuito de avaliar a associação entre os sintomas dispépticos com transtornos psiquiátricos, evidenciou-se que
mais da metade dos dispépticos funcionais referiram algum transtorno mental associado.
Os transtornos psiquiátricos, como depressão e ansiedade costumam aparecer frequentemente entre os pacientes com
doenças gastrointestinais funcionais (Aro, Talley, Johansson, Agréus, & Ronkainen, 2015). Alguns autores ainda sugerem que
pacientes com síndrome do sofrimento pós-prandial e algum prejuízo na acomodação gástrica possuem uma maior chance de
apresentar ansiedade (Talley, 2017). O presente estudo corrobora tais achados ao revelar que a maioria dos portadores de DF
foram caracterizados como ansiosos, de acordo com o Inventário de Ansiedade de Beck (BAI), e 25% com depressão, pelo
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Inventário de Beck para Depressão (BDI), confirmando a importante correlação entre doenças mentais e os sintomas
gastrintestinais, principalmente nos dispépticos funcionais.

5. Conclusão
Evidenciou-se que o DF foi mais prevalente em mulheres, jovens e solteiras. A associação entre dispépticos
funcionais com ansiedade e depressão, mostra-se como um possível componente envolvido na etiologia da DF. A presença dos
sintomas de acordo com os critérios de diagnóstico de Roma III/IV apresentou uma predominância da SDE quando comparada
com a SDPP, porém, a variante clínica mais comum foi a concomitante, ou seja, a que manifesta paralelamente tanto a SDE
quanto a SDPP.
Portadores de dispepsia funcional, tendem a apresentar algum componente emocional associado às manifestações
clínicas, o que requer novas pesquisas no sentido de aplicar questionários que avaliem não somente os aspectos psicológicos
destes pacientes, mas também os níveis de estresse e de qualidade de vida, a fim de delinear melhor o perfil do dispéptico
funcional e evidenciar formas mais eficazes de diagnóstico e conduta para esta síndrome cada vez mais comum em consultas
gastroenterológicas.

Agradecimentos
Ao corpo integrante das clínicas participantes do estudo, a Gastroclínica, em especial à Sra. Irene Mendes Ribeiro
Chaves e Joana Mendes Ribeiro Chaves Rezende e a Clínica do Aparelho Digestivo em nome da Dra Marta Maria Barbosa da
Silva e Dr. Jilvan Pinto Monteiro.

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