Do Índio

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29.

Do Índio

Direito Constitucional PC-SC (Pré-edital)


Prof. Nelma Fontana

29 Do Índio
Documento última vez atualizado em 28/09/2024 às 07:00.

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Índice
29.1) Do Índio 3

29.2) Lista de Questões 10

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Do Índio

A primeira Constituição brasileira a assegurar direitos aos povos indígenas foi a de 1934
(chamados ainda de silvícolas). A partir daí, todas as demais constituições garantiram o direito
de posse das terras pelos índios tradicionalmente ocupadas.

Nos termos do artigo 3º, inciso I, do Estatuto do Índio, todo indivíduo de origem e ascendência
pré-colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas
características culturais o distinguem da sociedade nacional é considerado índio.

No texto constitucional, a palavra “índios” não aparece no plural sem razão. O propósito do
legislador foi o de reconhecer diferentes etnias e o de retratar uma diversidade indígena
intraétnica e interética, uma vez que índios em processo de aculturação permanecem índios
para o fim de proteção constitucional.

Para deixar mais claro: o substantivo índios contempla tanto os silvícolas (os que estão em
estado primitivo de habitação da selva) e os índios em processo de aculturação (os que têm
alguma convivência extra tribo).

Nos artigos 231 e 232 da Constituição Federal, os direitos dos povos indígenas foram
classificados em três categorias: 1) direito à diferença; 2) direito à terra; 3) direito de ingressar
em juízo em defesa de seus interesses. Vejamos as situações:

Direito à Diferença

No artigo 231 da Constituição Federal, são reconhecidos aos índios sua organização social,
costumes, línguas, crenças e tradições.

Pela primeira vez, assegurou-se constitucionalmente aos povos indígenas o direito à diferença.
Como já dito, desde a Constituição de 1934, há a garantia de posse da terra tradicionalmente
utilizada pelos índios, mas o texto de 1988 foi o primeiro a assegurar o direito à diferença, o
reconhecimento de costumes, crenças, tradições e línguas.

Em respeito à diferença, o artigo 210 da Lei Maior garante às comunidades indígenas a


utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem na ministração do
ensino fundamental. Na mesma linha, o artigo 215, § 1º, da CF/88 protege, dentre outras, as
manifestações das culturas indígenas.

O reconhecimento à diferença, entretanto, não autoriza a qualquer das organizações sociais


indígenas, ao conjunto delas, ou à sua base peculiarmente antropológica a dimensão de
instância transnacional, pelo que nenhuma das comunidades indígenas brasileiras detém
estatura normativa para comparecer perante a Ordem Jurídica Internacional como povo
independente e nem como Pátria.

Direito à terra

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Os índios têm direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Dito de outra
forma, o direito de posse permanente das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios
independe de qualquer reconhecimento oficial, uma vez que tal o direito é anterior à formação
do próprio Estado.

O que define a terra como indígena não é propriamente a demarcação feita pelo Estado, mas a
presença de alguns elementos descritos no artigo 231, § 1º, da CF/88. Nesses termos, entende-
se por terras tradicionalmente ocupadas pelos índios: 1) aquelas por eles habitadas em
caráter permanente; 2) as utilizadas para suas atividades produtivas; 3) as imprescindíveis à
preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e 4) as necessárias a sua
reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

Com efeito, presentes os elementos acima descritos, o direito à terra não depende de nenhum
ato constitutivo, de modo que a demarcação de uma área indígena é ato meramente
declaratório, cujo objetivo é tornar explícita a extensão da área para garantir o pleno exercício
do direito das comunidades indígenas.

Note que o substantivo "terras" é termo que assume compostura sociocultural (e não
política).

Conforme entendimento consubstanciado na Súmula 650/STF, o conceito de "terras


tradicionalmente ocupadas pelos índios" não abrange aquelas que eram possuídas pelos
nativos no passado remoto.

No § 2º do artigo 231 da CF/88, nota-se mais um elemento para a caracterização das terras
indígenas: o elemento fático, uma vez que os índios precisam estar na posse da terra.
(“terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”). Observe que além do verbo no presente, o
“tradicionalmente” refere-se, não a uma circunstância temporal, mas ao modo tradicional de os
índios ocuparem e utilizarem as terras e ao modo tradicional de produção, segundo seus usos,
costumes e tradições.

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Pet 3.388 assentou como marco temporal para
reconhecimento de “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios” a data da promulgação
da Carta Constitucional (05/10/1988), ou seja, não se incluem no conceito de terras
indígenas aquelas ocupadas por eles no passado remoto (seria boa parte do Brasil) e nem
as que venham a ser ocupadas no futuro.

Contudo, após anos de discussão, o Supremo Tribunal Federal rejeitou, a tese do marco
temporal para a demarcação de terras indígenas. O Plenário decidiu que a data da
promulgação da Constituição Federal não pode ser utilizada para definir a ocupação
tradicional da terra por essas comunidades.

A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, com repercussão
geral (Tema 1.031).

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No § 2º do artigo 231 da CF/88, nota-se mais um elemento para a caracterização das terras
indígenas: o elemento fático, uma vez que os índios precisam estar na posse da terra. (“terras
tradicionalmente ocupadas pelos índios”). Observe que além do verbo no presente, o
“tradicionalmente” refere-se, não a uma circunstância temporal, mas ao modo tradicional de os
índios ocuparem e utilizarem as terras e ao modo tradicional de produção, segundo seus usos,
costumes e tradições.

Como forma de contraponto ao STF (efeito backlash), o Legislativo aprovou a Lei n°


14.701/2023, prevendo a data da promulgação da Constituição Federal como marco temporal
para fins de reconhecimento da demarcação das terras indígenas tradicionalmente ocupadas.
Entretanto, os trechos da lei que previam tais disposições foram vetados pelo Presidente Lula,
sob argumentos de contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade. Tal tema ainda
está em discussão, uma vez que partes do Legislativo buscam a derrubada do veto.

Cabe também conhecer o conceito de renitente esbulho. No julgamento do caso “Raposa


Serra do Sol”, o STF criou uma exceção à do marco temporal, ainda vigente, de maneira que
mesmo se à data de promulgação da CF/88 os índios não estivessem ocupando a terra porque
dela foram expulsos, ainda assim será considerada indígena se o conflito possessório tiver
iniciado no passado, mas tiver persistido até o marco demarcatório temporal da data da
promulgação da Constituição de 1988 (Pet 3388).

Em resumo, as “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios” são aquelas que acumulam dois
requisitos: 1) temporal: os índios habitavam a terra à data da promulgação da CF/88
e 2) tradicionalidade da ocupação: uma efetiva relação dos índios com a terra. Logo, não
alcançam aquelas ocupadas em passado remoto.

Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal, ao trazer o conceito de renitente esbulho, no
julgamento do caso “Raposa Serra do Sol”, criou uma exceção à regra acima, de maneira que
mesmo se à data de promulgação da CF/88 os índios não estivessem ocupando a terra porque
dela foram expulsos, ainda assim será considerada indígena se o conflito possessório tiver
iniciado no passado, mas tiver persistido até o marco demarcatório temporal da data da
promulgação da Constituição de 1988 (Pet 3388).

Ora, na situação descrita, os índios foram vítimas de esbulho (retirada forçada por meio de
violência) e até a data da promulgação da CF/88 não haviam se conformado com o fato, de
modo que a controvérsia possessória, além de motivo de conflitos frequentes, foi alvo de
judicialização. Percebe-se, então, que o esbulho foi renitente (contumaz, insistente, repetitivo),
uma vez que os índios ofereceram resistência e continuaram lutando pela terra, mesmo dela já
tendo sido expulsos.

Cuidado! Renitente esbulho não se confunde com ocupação passada ou com desocupação
forçada no passado. Para que se caracterize o renitente esbulho, no momento da
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promulgação da CF/88, os índios ainda deveriam estar lutando pela terra, pois se dela tiverem
desistido não será configurada a terra indígena.

Para o STF, se comprovada a histórica presença indígena na área, descabe qualquer


indenização em favor do Estado (ACO 362).

Na situação concreta, o Estado de Mato Grosso ajuizou, contra a União e a Fundação Nacional
do Índio – FUNAI, ação ordinária de indenização por desapropriação indireta, sob a alegação de
que as rés teriam incluído, dentro do perímetro do Parque Indígena do Xingu, sem a obediência
ao procedimento expropriatório devido, terras devolutas pertencentes ao Estado.

O STF, entretanto, a partir da análise de laudos e outros documentos, entendeu que as áreas
que passaram a constituir o Parque Indígena do Xingu, quando da criação e consolidação de
limites, eram habitadas historicamente por indígenas, motivo pelo qual o Estado não faz jus a
nenhuma indenização.

Nos termos do § 2º do artigo 231 da Constituição Federal, as terras tradicionalmente ocupadas


pelos índios, embora pertencentes à União (artigo 20, XI, da CF), destinam-se a sua posse
permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos
nelas existentes.

Vale ressaltar que, para o STF, a exclusividade de usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos
lagos nas terras indígenas é conciliável com a eventual presença de não índios, bem assim
com a instalação de equipamentos públicos, a abertura de estradas e outras vias de
comunicação, a montagem ou construção de bases físicas para a prestação de serviços
públicos ou de relevância pública, desde que tudo se processe sob a liderança institucional da
União, controle do Ministério Público e atuação coadjuvante de entidades tanto da
administração federal quanto representativas dos próprios indígenas. Dessa forma, é vedado às
comunidades indígenas interditar ou bloquear estradas, cobrar pedágio pelo uso delas e
inibir o regular funcionamento das repartições públicas (Pet 3388).

O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a


lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem se efetivar com autorização do
Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação
nos resultados da lavra, na forma da lei (§3º, 231, CF).

Cabe à lei ordinária (e não complementar!) fixar as condições específicas para exploração
mineral e de recursos hídricos nas terras indígenas (art. 176, § 1).

As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios pertencem à União. Trata-se de propriedade


vinculada ou reservada, que se destina a garantir aos índios o exercício dos direitos que lhes
foram reconhecidos constitucionalmente, a fim de que, desse modo, o Estado proporcione às
comunidades indígenas bem-estar e condições necessárias à sua reprodução física e cultural,
segundo seus usos, costumes e tradições.

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Com efeito, as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são inalienáveis e indisponíveis, e
os direitos sobre elas, imprescritíveis (§ 4º, 231, CF).

Nessa linha, as comunidades indígenas não podem ser removidas de suas terras, salvo, "ad
referendum" do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em
risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso
Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco (§ 5º, 231,
CF).

Os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras tradicionalmente
ocupadas pelos índios são nulos e extintos, não capazes de produzir efeitos jurídicos. Da
mesma forma, a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes,
exceto nos casos relevante interesse público da União, segundo o que dispuser a lei
complementar, resulta atos nulos e extintos. Em quaisquer dos casos, a nulidade e a extinção
não geram direito de indenização e nem de ações contra a União, salvo, na forma da lei,
quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé (§ 6º, 231, CF).

O § 7º do artigo 231 da Constituição Federal exclui das terras indígenas o disposto no artigo 174,
§ 3º e § 4º. Assim, o Estado não favorecerá, em terra indígena, a organização da atividade
garimpeira em cooperativas e nem dará, consequentemente, a tais cooperativas prioridade na
autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis
em terras indígenas.

Importa indicar ainda que há uma grande polêmica acerca do julgamento do RE 1.017.365 (ainda
não finalizado), estando pendente a determinação (ou não) da utilização da “Tese do Marco
Temporal”, cujo marco temporal seria a promulgação da CF/88, isto é, segundo a referida tese,
somente as áreas ocupadas ou reivindicadas pelos povos nativos até a promulgação da
Constituição de 1988 poderão ser considerados territórios indígenas.

Capacidade processual

Importante modificação trazida pela Constituição Federal de 1988 foi a respeito da capacidade
civil dos índios, uma vez que até a entrada em vigor do novo texto, os índios não integrados
deveriam ser tutelados pela União, por meio do órgão federal de assistência aos silvícolas.

O artigo 232 da Constituição Federal dispôs que os índios, suas comunidades e organizações
são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses,
intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.

Conclusão lógica é a de que a Constituição Federal, ao reconhecer a capacidade processual


das comunidades indígenas, reconheceu também a capacidade jurídica plena dos índios.

Vale lembrar que é responsabilidade do Ministério Público defender judicialmente os direitos


indígenas (artigo 129, V, da CF/88) e que a competência para processar e julgar a disputa sobre
direitos indígenas é de juízes federais (artigo 109, XI, da CF/88).
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Questão 2022 | 4000817464

“Um protesto de grupos indígenas bloqueou pontos de estradas de Aracruz, no Norte do


Espírito Santo, até o meio da tarde desta quinta-feira (31). Ficaram interditados, por cerca
de cinco horas, trechos da ES-010, ES-257 e na Rodovia Primo Bitti (entrada de Caieiras
Velha)” (G1/Globo, 31/01/2019).

A Constituição da República Federativa do Brasil destinou um capítulo específico à


proteção das comunidades indígenas, sendo INCORRETO afirmar que

as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente,


A) cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas
existentes.

são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e
B)
tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

as terras tradicionalmente ocupadas são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre


C)
elas, imprescritíveis.

é vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, "ad referendum" do
Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua
D)
população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso
Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.

os índios, suas comunidades e organizações são representados pelo Ministério Público,


E)
com exclusividade, para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses.

Solução

os índios, suas comunidades e organizações são representados pelo Ministério


Gabarito: E) Público, com exclusividade, para ingressar em juízo em defesa de seus direitos
e interesses.

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As alternativas “a”, “b”, “c” e “d” estão de acordo com o artigo 231 da Constituição
Federal e reproduzem a literalidade dos dispositivos. Veja:

Letra A: “§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em
caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à
preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua
reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.”

Letra B: “Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas,
crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente
ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus
bens.”

Letra C: “§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os


direitos sobre elas, imprescritíveis.”
Letra D: “§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, "ad
referendum" do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em
risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do
Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse
o risco.”

Por outro lado, a letra E não se compatibiliza com o disposto no artigo 232 da CF/88,
segundo o qual “os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para
ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público
em todos os atos do processo.”

 Para assistir ao vídeo correspondente, acesse o LDI.

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Lista de Questões

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Referências e links deste capítulo

1 https://cj.estrategia.com/cadernos-e-simulados/cadernos/b3986587-a1c3-4789-a9da-
526fd34c33ae

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