Artigo - o Dever de Informação Ao COAF e o Erro de Proibição
Artigo - o Dever de Informação Ao COAF e o Erro de Proibição
Artigo - o Dever de Informação Ao COAF e o Erro de Proibição
“The duty of information before the Council for Financial Activities Control (COAF)
and the error of law: an analysis from the combat and prevention policies of money
laundering”
RESUMO
O presente estudo trata da análise de formas de prevenção e
combate ao crime de lavagem de dinheiro. A Lei nº 9613/98, além de prever as
condutas incriminadas como lavagem de dinheiro, criou medidas preventivas e órgãos
de controle, dentre esses, o COAF, o controle de atividades financeiras. Com essa
finalidade de prevenção, passou a descrever todas as pessoas, físicas ou jurídicas, que
praticam atividades consideradas suspeitas, seja pelos valores envolvidos, seja pela sua
natureza. O controle e prevenção parte da obrigatoriedade dessas pessoas informarem,
no prazo de vinte e quatro horas, à autoridade competente, as condutas suspeitas e
políticas internas de transparência e conformidade, práticas de compliance. A previsão
expressa no caso inobservância dessas obrigações é a suspeita pelo crime de lavagem de
dinheiro. Porém, indubitavelmente, dentre as práticas suspeitas, há tanto pessoas físicas
quanto jurídicas que não possuem a consciência das consequências de sua omissão,
conhecimento ou mecanismos internos. A partir daí que se inicia uma revisão do
conceito e noção do erro de proibição e a sua incidência no caso da não informação ao
COAF. O desconhecimento do dever de informação às autoridade competentes ou a
2
ABSTRACT
1
Com o argumento de amparar a sociedade de novos riscos ganha espaço um movimento de política
criminal que passou a defender a incriminação de condutas de perigo, em nome de uma prevenção, com o
aumento de penas e medidas que relativizam uma série de direitos e garantia. (BONETTI, 2006, p. 62).
Esse movimento visa justificar medidas de urgência, com a propaganda de soluções imediatas e de
segurança plena (JAKOBS, 2008).
2
Entende-se por Direito Penal Econômico o conjunto de normas jurídicas que protegem a ordem
econômica, entendida como sendo a regulação jurídica da produção, distribuição e consumo de bens e
serviços. No sentido estrito, trata-se do conjunto de normas jurídico-penais que protegem a ordem
econômica, tida como regulação jurídica do intervencionismo estatal na economia. Pode-se afirmar que a
primeira grande guerra mundial determinou o embrião do que posteriormente viria a ser o Direito Penal
Econômico. O Estado se viu obrigado a intervir no mercado, passando a ser instrumento controlador da
vida econômica. Tratou-se, em resumo, da passagem do Estado liberal para o Estado social. Com isto, um
novo tipo de criminalidade foi diagnosticado, envolvendo a ordem econômica. (LOPES, 2011).
3
Ao invés de um Estado nacional, passa-se a se falar de organizações internacionais, como Banco
Mundial, Fundo Monetário Nacional e grandes grupos econômicos. Também, os modelos sociais pós-
industriais foram acompanhados de fenômenos econômicos, como eliminação de restrições às transações
comerciais e ampliação dos mercados que deram lugar à aparição de novas formas de delito.
5
4
Circular BANCO CENTRAL DO BRASIL - BACEN nº 3.331 de 16.11.2006 (...) SEÇÃO: 2 -
Movimentações 1. Para fins e efeitos deste capítulo, caracterizam: a) ingressos de recursos no País os
débitos efetuados pelo banco depositário em contas tituladas por pessoas físicas ou jurídicas, residentes,
domiciliadas ou com sede no exterior, exceto quando se tratar de movimentação direta entre duas contas
da espécie; b) saídas de recursos do País os créditos efetuados pelo banco depositário em contas tituladas
por pessoas físicas ou jurídicas, residentes, domiciliadas ou com sede no exterior, exceto quando os
recursos provierem de venda de moeda estrangeira ou diretamente de outra conta da espécie. 2. O banco
depositário dos recursos deve registrar no Sisbacen, transação PCAM260, opção 2, no mesmo dia em que
forem realizadas, todas transferências internacionais em reais de valor igual ou superior a R$ 10.000,00
(dez mil reais). 3. Os registros de que trata o item anterior abrangem também: a) os débitos e créditos
realizados em contrapartida à liquidação de operações de câmbio, de valor igual ou superior a R$
10.000,00 (dez mil reais), classificadas sob a natureza-fato "63009"; b) as movimentações diretas de
recursos entre contas de residentes, domiciliados ou com sede no exterior (natureza-fato 63102), de valor
igual ou superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), ainda que estas não caracterizem transferências
internacionais em moeda nacional; c) as movimentações realizadas em contrapartidas a operações de
câmbio não classificadas como disponibilidades no País. (...) 6. Pode ser realizada com utilização de
qualquer instrumento de pagamento em uso no mercado financeiro, inclusive em espécie, a
movimentação de valor inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). (...) (fonte:
http://www.bcb.gov.br/rex/layouts/port/leiaute5818.asp, acesso em 14 de março de 2016).
5
Art. 9o Sujeitam-se às obrigações referidas nos arts. 10 e 11 as pessoas físicas e jurídicas que tenham,
em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou
não:(Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012): I - a captação, intermediação e aplicação de recursos
financeiros de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira;II – a compra e venda de moeda estrangeira ou
ouro como ativo financeiro ou instrumento cambial;III - a custódia, emissão, distribuição, liqüidação,
negociação, intermediação ou administração de títulos ou valores mobiliários. Parágrafo único. Sujeitam-
se às mesmas obrigações:I – as bolsas de valores, as bolsas de mercadorias ou futuros e os sistemas de
negociação do mercado de balcão organizado; (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012); II - as
seguradoras, as corretoras de seguros e as entidades de previdência complementar ou de capitalização; III
- as administradoras de cartões de credenciamento ou cartões de crédito, bem como as administradoras de
consórcios para aquisição de bens ou serviços; IV - as administradoras ou empresas que se utilizem de
cartão ou qualquer outro meio eletrônico, magnético ou equivalente, que permita a transferência de
fundos; V - as empresas de arrendamento mercantil (leasing) e as de fomento comercial (factoring); VI -
as sociedades que efetuem distribuição de dinheiro ou quaisquer bens móveis, imóveis, mercadorias,
serviços, ou, ainda, concedam descontos na sua aquisição, mediante sorteio ou método assemelhado; VII -
as filiais ou representações de entes estrangeiros que exerçam no Brasil qualquer das atividades listadas
neste artigo, ainda que de forma eventual; VIII - as demais entidades cujo funcionamento dependa de
autorização de órgão regulador dos mercados financeiro, de câmbio, de capitais e de seguros; IX - as
pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, que operem no Brasil como agentes, dirigentes,
procuradoras, comissionárias ou por qualquer forma representem interesses de ente estrangeiro que exerça
qualquer das atividades referidas neste artigo; X - as pessoas físicas ou jurídicas que exerçam atividades
de promoção imobiliária ou compra e venda de imóveis; (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012) XI -
as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem jóias, pedras e metais preciosos, objetos de arte e
antiguidades. XII - as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem bens de luxo ou de alto valor,
intermedeiem a sua comercialização ou exerçam atividades que envolvam grande volume de recursos em
espécie; (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012) XIII - as juntas comerciais e os registros
públicos; (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012) XIV - as pessoas físicas ou jurídicas que prestem,
mesmo que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou
assistência, de qualquer natureza, em operações: (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012)a) de compra e
venda de imóveis, estabelecimentos comerciais ou industriais ou participações societárias de qualquer
natureza; (Incluída pela Lei nº 12.683, de 2012)b) de gestão de fundos, valores mobiliários ou outros
ativos; (Incluída pela Lei nº 12.683, de 2012)c) de abertura ou gestão de contas bancárias, de poupança,
investimento ou de valores mobiliários; (Incluída pela Lei nº 12.683, de 2012)d) de criação, exploração
ou gestão de sociedades de qualquer natureza, fundações, fundos fiduciários ou estruturas
10
análogas; (Incluída pela Lei nº 12.683, de 2012)e) financeiras, societárias ou imobiliárias; e (Incluída pela
Lei nº 12.683, de 2012)f) de alienação ou aquisição de direitos sobre contratos relacionados a atividades
desportivas ou artísticas profissionais; (Incluída pela Lei nº 12.683, de 2012)XV - pessoas físicas ou
jurídicas que atuem na promoção, intermediação, comercialização, agenciamento ou negociação de
direitos de transferência de atletas, artistas ou feiras, exposições ou eventos similares; (Incluído pela Lei
nº 12.683, de 2012)XVI - as empresas de transporte e guarda de valores; (Incluído pela Lei nº 12.683, de
2012)XVII - as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem bens de alto valor de origem rural ou
animal ou intermedeiem a sua comercialização; e (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012)XVIII - as
dependências no exterior das entidades mencionadas neste artigo, por meio de sua matriz no Brasil,
relativamente a residentes no País. (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012).
6
Compliance, palavra originada da língua inglesa, tem o significado, no âmbito jurídico, de
“conformidade com o Direito” (gesetzmäβig, em alemão). Basicamente é a prática de uma empresa ou
pessoa de se manter dentro do que a lei estabelece. (BONACCORSI, 2013). É um conceito amplamente
utilizado no exterior, principalmente naqueles países em que a lei é rigorosa quanto a seu
descumprimento, tendo em vista que é mais barato investir na prevenção do que em uma possível
condenação. E é através desta idéia de prevenção que se pode entender o criminal compliance. O
principal ponto do criminal compliance é a responsabilidade penal. Trata-se de evitar que os atos da
empresa gerem essa responsabilidade. Não basta “manipular” os fatos criminosos para que não atinjam a
empresa e seus diretores, pois diferentemente do âmbito empresarial, o crime gera uma responsabilidade
que pode se estender até os subordinados, ou seja, os empregados, o que pode gerar problemas tão
desastrosos quanto se a responsabilidade fosse dos diretores.
7
Art. 11. As pessoas referidas no art. 9º: I - dispensarão especial atenção às operações que, nos termos
de instruções emanadas das autoridades competentes, possam constituir-se em sérios indícios dos crimes
11
previstos nesta Lei, ou com eles relacionar-se; II - deverão comunicar ao Coaf, abstendo-se de dar
ciência de tal ato a qualquer pessoa, inclusive àquela à qual se refira a informação, no prazo de 24 (vinte
e quatro) horas, a proposta ou realização: (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012): a) de todas as
transações referidas no inciso II do art. 10, acompanhadas da identificação de que trata o inciso I do
mencionado artigo; e (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012); b) das operações referidas no inciso
I; (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012); III - deverão comunicar ao órgão regulador ou
fiscalizador da sua atividade ou, na sua falta, ao Coaf, na periodicidade, forma e condições por eles
estabelecidas, a não ocorrência de propostas, transações ou operações passíveis de serem comunicadas
nos termos do inciso II. (Incluído pela Lei nº 12.683, de 2012). § 1º As autoridades competentes, nas
instruções referidas no inciso I deste artigo, elaborarão relação de operações que, por suas características,
no que se refere às partes envolvidas, valores, forma de realização, instrumentos utilizados, ou pela falta
de fundamento econômico ou legal, possam configurar a hipótese nele prevista.
8
Interessante perceber que, desde as valorações de Beck quanto à implementação dos variados tons das
crises futuras – crise ecológica, crise financeira global e a crise advinda do terrorismo transnacional –,
parece ser evidente que o Estado não mais se basta. Os custos locais, para não se falar nos custos globais,
são tremendos, a ponto de bradar, por outro lado, também por necessidades de controles éticos. Tais
valores éticos podem, e devem, também ser postos como balizas para a autorregulação. Considerados
assim, e tendo-se em vista que a estipulação de determinados códigos de conduta empresariais poderá
sorrir como novo firmamento da cultura empresarial, começa-se a verificar a possibilidade de edificação
de um novo Direito Penal em um novo marco preventivo, ou, verdadeiramente, um Direito Penal com
foco no criminal compliance. (SILVEIRA, SAAD-DINIZ, 2015, p. 73 e 74).
12
9
“Historicamente é de se observar que os Estados Unidos da América do Norte conheceram várias
tentativas de regulação dos mercados. Fundamentalmente é de se ter que, após a crise de 1929, deram-se
momentos nos quais se consagrou uma certa imposição de obediência e um certo padrão de
comportamento, muito longe de uma autorregulação. Crises mais recentes, como das empresas Enron,
Arthur Andersen, WorldCom, entre outras, propiciaram novas formas preventivas de controle,
culminando, em 2002, com a aprovação da Sarbones-Oxley Act (SOX). Essa normativa, como se sabe,
inaugurou, entre tantos pontos, a obrigatoriedade dos administradores delegados e dos diretores
financeiros de incluir nas declarações, semestrais e anuais, ao controle acionário, o compromisso de
retidão de todas aquelas informações, sob pena de crimes punidos com até 20 anos de reclusão.”
(SILVEIRA, Renato de Mello Jorge Silveira; SAAD-DINIZ, Eduardo. Compliance, Direito Penal e Lei
Anticorrupção. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 115 e 116).
13
seu Good Practice Guidance on Internal Controles, Ethics and Compliance10, uma
série de elementos que devem ser observados pelas empresas na implementação de seu
programa de compliance. Este manual estava inserido na Recomendação para combate
ao Suborno de Funcionários Públicos Estrangeiros. Direcionado, sobretudo para as
empresas, estabelecia uma serie de práticas que visavam aperfeiçoar o controle interno
das empresas, evitando-se que a corrupção afetasse as atividades empresariais, com
risco de atribuição de crime.
10
Podemos citar dentre as recomendações do manual da OCDE as seguintes : forte, explícito e visível
apoio e comprometimento da gerencia sênior aos controles internos da empresa, programa de Compliance
e ética ou de medidas de prevenção e detecção de suborno estrangeiro; 2. política corporativa integrada e
clara que proíbe o suborno estrangeiro. 3. cumprimento dos controles internos relacionados, a
observância dos programas de Compliance é dever dos indivíduos em todos os grãs da organização; 4.
Fiscalização dos programas de Compliance e ética relativas a suborno estrangeiro, incluindo o poder de
comunicar as irregularidades para organismos de controle independentes, tais como comitês de auditoria
interna dos conselhos de administração ou dos órgãos de fiscalização, atribuição conferida a um ou mais
funcionários sênior das empresas , com um nível adequado de autonomia de gestão, recursos e autoridade;
5. programas de Compliance e ética destinados a prevenir e detectar o suborno estrangeiro, aplicável a
todos os membros da diretoria e da adminitração, e aplicável a todas as entidades sobre as quais a
empresa tem controle efetivo, incluindo as subsidiárias, relativo às seguintes áreas: i) presentes; ii)
hospitalidade, entretenimento e despesas; iii) viagens de cliente; iv) contribuições políticas; v) doações e
patrocínios; vi) pagamentos de facilitação; e vii) solicitação e extorsão; 6. programas de Compliance e
ética destinados a prevenir e detectar o suborno estrangeiro aplicável, onde for necessário e sujeito às
disposições contratuais, a terceiros, como agentes e outros intermediários, consultores, representantes,
distribuidores, prestadores de serviços e fornecedores, consórcios e sócios de Joint Venture, incluindo, os
seguintes elementos essenciais: i) Due Diligence devidamente documentada com base no risco referente à
contratação, bem como a supervisão adequada e regular dos parceiros de negócios; ii) comunicação aos
parceiros de negócios do atendimento por parte da empresa em cumprir com as leis sobre as proibições
contra o suborno estrangeiro, e do programa de Compliance e ética da empresa para prevenir e detectar o
suborno; e iii) buscar compromisso recíproco de parceiros de negócios. 7. sistema de procedimentos
contábeis e financeiros, incluindo um sistema de controles internos, razoavelmente desenvolvido para
garantir a manutenção 57 justa e precisa dos livros contábeis, registros e contas, para garantir que eles não
possam ser utilizados para fins de suborno estrangeiro ou para que se esconda tal prática; 8. medidas
destinadas a garantir uma comunicação periódica, e documentada de formação e capacitação para todos
os níveis da organização, sobre o programa de Compliance e ética da mesma relativas a suborno
estrangeiro, aplicando-se, no que couber, para as subsidiárias; 9. medidas adequadas para promover um
incentivo que estimula a observância dos programas de Compliance e ética contra o suborno em âmbito
internacional, em toda a estrutura da organização; 10. procedimentos disciplinares adequados para
abordar, entre outras coisas, violações, em todos os níveis da organização, das leis contra o suborno
estrangeiro e do programa de Compliance e ética da mesma relativas ao suborno estrangeiro; 11. medidas
eficazes para: i) orientar e aconselhar aos conselheiros, diretores, funcionários, bem como parceiros de
negócios, em conformidade com o programa de Compliance e ética da organização. ii) a denúncia interna
e, se possível confidencial, e proteção dos, conselheiros, diretores, funcionários, e, se for caso, dos
parceiros comerciais, não estão dispostos a violar as normas profissionais ou éticas sob instrução ou
pressão de superiores hierárquicos, bem como para os diretores, funcionários, e, se for caso, aos parceiros
de negócios, disposto a relatar violações da lei ou normas ou ética profissional que ocorram dentro da
empresa, de boa fé e de forma devidamente fundamentada; e iii) empreender medidas apropriadas em
resposta essas comunicações internas de improbidade; 58 12. revisão periódica dos programas de
Compliance e ética, destinadas a aperfeiçoar a sua eficácia na prevenção e detecção de suborno
estrangeiro, levando em conta a mudança no tratamento do tema, e a alteração na legislação.
14
11
Nas palavras de Francisco Munhoz Conde, o conhecimento da ilicitude não precisa referir-se ao
conteúdo exato do preceito penal infringido ou sanção concreta do fato. Basta que o autor tenha base
suficiente para saber que o fato está juridicamente proibido e que é contrário às normas mais elementares
que regem a convivência” (CONDE, 1988, p. 157-158). Conforme a concepção finalista da teoria do
delito, para que determinada conduta seja reprovada no âmbito do Direito Penal, não há necessidade da
consciência atual da ilicitude, mas apenas a possibilidade de obtê-la. Daí que se fala que a consciência da
ilicitude é a capacidade do agente de uma conduta proibida, apreender a ilicitude de seu comportamento.
De acordo com a mesma concepção, a consciência da ilicitude é elemento da culpabilidade. Assim, só se
pode reprovar a prática de um fato típico e ilícito, quando o agente a realizou com conhecimento atual ou
potencial da ilicitude (BRODT, 1995, p. 41). A culpabilidade, por sua vez, é a reprovação. Ou seja, a
censura que se faz ao agente que, com consciência atual ou potencial da ilicitude, praticou uma conduta
típica e ilícita quando as circunstâncias em que atuou permitissem que seu comportamento estivesse de
acordo com a ordem jurídica.
15
12
Desde el Derecho romano se distingue entre el error de derecho y el error de hecho, y siguiendo a
Savigny se ha dicho que el primero recae sobre una regla de derecho, es decir, sobre el derecho objetivo,
en tanto que el segundo versa sobre hechos jurídicos; es decir, sobre las condiciones exigidas en el hecho
para la aplicación de una regla jurídica. (ASÚA, 1963, p. 392).
16
também a de internalização das mesmas. Isso pode ser justificado nas condutas onde se
verificam limitação cultural ou até em condutas laborais habituais e cotidianas
(ZAFFARONI,2004).
13
Essas inúmeras resoluções, recomendações administrativas e novas leis penais dá margem ao termo
“hipertrofia” legislativa que foi utilizado em artigo publicado, em 1898, por Reinhart Franck,
salientando que o uso de regras, penas e das tipificações das condutas tem sido abusivo, e por isso
perdeu parte do seu crédito e, portanto, de sua forma intimidadora, já que o corpo social deixa de reagir
do mesmo modo que o organismo humano não reage a um remédio administrado abusivamente.
(FRANCK, Reinhart citado por LUISI, 2003. p. 40).
17
contem hoje com programas de Compliance, não são as únicas abrangidas pela
obrigação
Cabe ao Estado desenvolver estratégias para garantir a
imprescindibilidade do dever de informação. Age amparado por erro de proibição a
omissão aos deveres de compliance. Para a aplicação do art. 11 da Lei de lavagem de
capitais e os indícios de configuração do crime o agente deve, no momento da omissão,
reunir condições objetivas de internalizar subjetivamente a relação lógica entre a
omissão da observância do dever de programas de combate e prevenção à lavagem de
dinheiro.
Não apenas a inobservância do dever deve ser suscetível de
representação pelo agente, mas também os limites jurídicos da sua atitude concreta. Ou
seja, é fundamental que no estágio em que ocorreu a inobservância, seja de
conhecimento inequívoco da sociedade empresária que o desatendimento das
comunicações podem produzir consequências jurídicas de natureza penal, e não apenas
administrativa.
Além disso, a equiparação da operação supostamente irregular
ao delito de lavagem de capitais, mesmo respeitando a sua especialidade típica, somente
se justificaria se fosse possível ao corpo diretivo da instituição financeira ter condições
objetivas de identificar o risco concreto de imputação na modalidade acessória. A
deficiência legislativa, somada à falta de previsão expressa do dever de garantidor na
referida legislação impedem a tomada de uma consciência material do injusto penal.
Vale ressaltar que a regulamentação dos programas de
compliance, para fins de imputação penal, somente se justificaria em um suposto
modelo de tipo aberto, ante a previsão expressa do efeito de sua inobservância dentro da
estrutura do próprio tipo penal. Todavia, isso não se encontra presente no presente
julgado. Isso se justifica por uma série de razões.
A primeira delas corresponde ao fato de que a Lei nº 9.613/98
dispõe de normas de natureza híbrida, conjugando em seus dispositivos matérias de
natureza penal, administrativa e processual. Capturar uma norma de caráter nitidamente
administrativo e ampliá-la conferindo caráter penal viola de maneira frontal o principio
da legalidade, constructo principiológico que sintetiza o saber pretoriano presente nos
brocardos “odiosa restrigenda, favorabilia amplianda” (restrinja-se o odioso, amplie-se
o favorável), “ubi lex voluit dixit, ubi noluit tacuit” (quando a lei quis, determinou;
sobre o que não quis, guardou silêncio):
18
5. CONCLUSÃO
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