Geotecnologia e História Ambiental Goias

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 8

ARA DESENVOLVER

A TERRA
MEMÓRIAS E NOTÍCIAS
DE GEOCIÊNCIAS
NO ESPAÇO LUSÓFONO

Quinta-Ferreira, M., Barata, M. T.,


Lopes, F. C., Andrade, A. I.,
Henriques, M. H., Pena dos Reis, R.
& Ivo Alves, E.
Coordenação

IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


2012
22
GEOTECNOLOGIA E HISTÓRIA AMBIENTAL:
O USO DE DETECÇÃO DE MUDANÇA TEMPORAL NA PRODUÇÃO
SUCROALCOOLEIRA EM GOIÁS, BRASIL

GEOTECHNOLOGY AND ENVIRONMENTAL HISTORY:


THE USE OF TIME CHANGE DETECTION IN PRODUCTION
OF SUGARCANE IN GOIÁS, BR AZIL

S. D. e Silva1, N. C. da Silva 2, E. S. Campos2 & O. A. de Carvalho Junior3.

Resumo: Esse trabalho apresenta uma metodologia para analisar a expansão


agrícola da cana­‑de­‑açúcar para produção sucroalcooleira na microrregião de Ceres,
Estado de Goiás, região Centro­‑Oeste brasileira. Essa região, originariamente de ve-
getação de Cerrado florestal era conhecida, até a primeira metade do século XX como
Mato Grosso de Goiás, em função da extensa área de floresta que foi devastada para
produção agrícola. O estudo objetiva examinar a mudança temporal do uso da terra
a partir de imagens de sensores remoto e construção de mapeamento temático de uso
da terra e cobertura vegetal com imagens do satélite Landsat 5, coletados no período
de 2005 a 2011 no município de Itapuranga, Estado de Goiás. Consideramos rele-
vante ferramenta para estudos relacionados a História Ambiental na medida em que
permite a detecção de mudança em diferentes tempos.

Palavras­‑chave: Expansão sucroalcooleira, História Ambiental do Cerrado, Geotecno-


logia, Série Temporal.

Abstract: This paper presents a methodology to analyze the agricultural expansion of


sugar cane to the production of sugar and ethanol in the microregion of Ceres, State of Goiás,
Midwest of Brazil. This region, originally of Cerrado vegetation forest was known until the
first half of the twentieth century as Mato Grosso of Goiás, because of the extensive forest area
which was devastated by the agricultural production. The study aims to examine the land use

1
Universidade Paulista. Email: [email protected].
2
UniEVANGELICA.
3
Departamento de Geografia da UnB.
time changes from remote sensor data and the construction of thematic mapping of land use
and land cover with Landsat 5 satellite imagery, collected from 2005 and 2011 in the munic‑
ipality of Itapuranga, State of Goiás. We consider the remote detection a relevant tool for stud‑
ies related to Environmental History as it allows the recognition of change in different times.
228
Keywords: Expansion of sugarcane, Change Detection, Environmental History of the
Cerrado, Geotechnology.

1 ­– Introdução

Na busca por fontes renováveis de energia, tem­‑se estimulado cada vez mais a produ-
ção de bioenergias, capazes de atender não somente a crescente demanda energética mun-
dial como também a necessidade urgente na redução dos danos ambientais resultantes
da poluição causada pela queima de combustíveis derivados do petróleo. O mapeamento
do uso da terra e da paisagem vegetal pode ser feito a partir de sensores colocados em
satélites por meio da geração de imagens o que permite conhecer a fisionomia da terra,
mensurar o tamanho de áreas degradadas, quantificar a área ocupada por safra agrícola
ou alagada em função do represamento de algum curso de água, dentre outros. Logo, as
técnicas de Sensoriamento Remoto tornam­‑se cada vez mais eficazes a proteção ambiental
do planeta e ao desenvolvimento do homem em diferentes espaços (JENSEN, 2009).
O presente trabalho procura apresentar os efeitos da devastação do Cerrado decorrente
da expansão da produção sucroalcooleira a partir do geoprocessamento de imagens (dados)
coletadas de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) tendo como
recorte espacial a microrregião de Ceres em Goiás (localizada na mesorregião do Centro
Goiano), e mais particularmente o município de Itapuranga, no período entre 2005 a 2011,
período em que verificou­‑se uma grande expansão agrícola para fins sucroalcooleiros.

2­– O conceito de devastação e o seu uso nos estudos do cerrado

O cerrado destaca­‑se como um dos principais domínios macro paisagísticos do Brasil


e estende­‑se por diferentes regiões do território brasileiro, realizando contatos e tran-
sições com outros biomas (Fig.1). Mas essa vegetação caracteriza­‑se pela diversidade
fisionômicas que vai desde áreas de campo limpo (herbáceo/subarbustivo) ao cerradão
(floresta). Segundo Coutinho (1990) a diversidade na paisagem do Cerrado deve­‑se, em
grande parte, ao reflexo dos diferentes tipos de solo, bem como da incidência de ações
antrópicas no cenário natural. As características ecológicas e geográficas apresentadas
remetem a expressiva dimensão territorial e riqueza do bioma cerrado, mas também há
de se considerar o intenso processo de devastação ambiental que se iniciou ainda nas
primeiras décadas do século XX e que vem alterando de forma avassaladora o cerrado.
O uso do termo devastação é apresentado por Martinez (2006) como um termo
recorrente na literatura e bibliografia pertinente, e que esteve presente na historiografia
brasileira a partir da primeira metade do século XX. A utilização desse conceito em nosso
texto justifica­‑se na vinculação deste com modelos agronômicos e historiográficos que
nos permite identificar a expansão agrícola no Cerrado.
229

Figura 1 ­‑ Mapa 1: Biomas Brasileiros. Fonte: IBGE.

No Brasil a “[...] agricultura de tipo monocultor, como a cana­‑de­‑açúcar, é apontada


como o principal vetor da ocupação territorial e da suspensão da cobertura vegetal
do país” (MARTINEZ, 2006, p. 56) indicando o uso do termo “devastação”. O autor
ainda considera a relevância dessa temática na História Ambiental, na medida em que
essa abordagem possibilita retomar um conjunto de problemas intrínsecos à formação
da sociedade brasileira, como o uso e a ocupação do solo, as práticas agrícolas e a intensi-
dade da apropriação da terra e dos recursos naturais, bem como a degradação ambiental
que lhe seguiu, dentre outros. A conceituação que mais aproxima o termo dos estudos
historiográficos é apresentada por Martinez (2006) como uma forma de exploração da
natureza que é marcada por um conjunto de características, como, por exemplo, o utili-
tarismo exacerbado e predatório do solo, marcado por drásticas intervenções no ecossis-
tema, de finalidade mercantil e caracterizado pela ausência de racionalidade no manejo
dos recursos explorados.

3­– A expansão sucroalcooleira em Goiás

A expansão das plantações canavieiras na microrregião de Ceres em Goiás é um fato


construído historicamente, que carrega em si todo um contexto jurídico, sociológico
e científico. Esta região experimentou um aumento demográfico significativo a partir
das décadas de 1940, quando políticas governamentais foram implantadas para garan-
tir a imigração e povoamento dessa nova área agrícola, que forneceria matérias primas
e alimento para abastecer os grandes centros urbanos em expansão no país. Porém,
a partir da década de 1980, foi verificado o deslocamento da produção de alimentos para
a produção dos biocombustíveis. O setor sucroalcooleiro em Goiás, iniciado na década
de 1970, quando foram instaladas unidades produtoras nas regiões Centro­‑Norte e Su-
doeste. A expansão do sistema de produção de energia alternativa foi se implantando no
restante do estado de Goiás de forma mais lenta, sendo que no final da década de 1990
não havia mais que 15 indústrias instaladas no Estado. A partir dos anos 2000 ocorreu
um novo fluxo migratório de empresas e de trabalhadores para Goiás, sendo que a partir
de 2006 o Estado passou a fazer parte do Plano Nacional de Agroenergia, contando em
2009 com 30 unidades industriais de produção de açúcar e álcool (SILVA et al., 2011).
Os estudos de geoprocessamento da Canasat (2010) apontam para uma expansão sig-
nificativa de áreas cultivadas, verificando um incremento de 184% em áreas cultivadas en-
230
tre as safras agrícolas 2005/2006 para 2010/2011, na microrregião de Ceres, onde localiza­
‑se Itapuranga. Os dados da Canasat (2010) apontam que o município de Itapuranga
apresentava em 2005/06 uma área plantada de 406 hectares, saltando para 6.450 hectares
para o período de 2010/11, uma expansão agrícola de 1.588%. Isso se deve ao fato de que
a usina localizada no município havia sido fechada em função da crise do Proálcool e re-
abriu recentemente com a retomada dos investimentos em etanol, sob o controle de outra
empresa, a Vale Verde Empreendimentos Agrícolas Ltda (MAPA, 2010).

4 ­– Metodologia para detecção de mudança de uso de solo

O grupo de pesquisa em análise temporal do Programa de Mestrado em Sociedade,


Tecnologia e Meio Ambiente da UniEVANGÉLICA está desenvolvendo um sistema
(Software) para análise de mudanças em imagens de séries temporais que permite a quan-
tificação das transformações espaciais registradas por imagens de sensores remotos em
diferentes tempos. O sistema está em operação para dados bitemporais utilizando uma
abordagem de classificação não­‑supervisionada denominado Mapas de Características
Auto­‑Organizáveis (KOHONEN, MÄKISARA, 1989) e está se ampliando o método
para séries multitemporais e para utilização de algoritmos supervisionados (CARVALHO
et al., 2011). A metodologia para o desenvolvimento deste tipo de análise passa pelas se-
guintes fases: 1. Levantamento de imagens multitemporais de uma mesma região de inte-
resse; 2. Caracterização e seleção de amostras de alvos a serem analisados; e 3. Utilização
do software para aplicação de algoritmos de detecção de mudanças nas imagens.

Figura 2. Localização do município de Itapuranga no estado de Goiás, Brasil e imagem de satélite de


09/04/2005.
As figuras 2 e 3 mostram composições RGB com as bandas 3, 4 e 5 do sensor Te-
matic Mapper (TM) do satélite Landsat 5, respectivamente dos anos de 2005 e 2011 da
região do município de Itapuranga localizado no estado de Goiás, Brasil.
231

Figura 3. Localização do município de Itapuranga no estado de Goiás, Brasil e imagem de satélite de


26/04/2011.

Com a instrumentação do software de análise de mudanças, as diferenças de dis-


tribuições de alvos de interesse entre as imagens de satélites das figuras 1 e 2, podem
ser quantificadas. Assim, as evoluções e regressões de monoculturas, tais como cana
de açúcar, soja e outras de interesses sociais e econômicos podem ser mapeadas e analisa-
das do ponto de vista quantitativo e qualitativo.

5 ­– Conclusões

Esse estudo é parte de um projeto de pesquisa aprovado pelo Programa Nacional


de Cooperação Acadêmica – Novas Fronteiras (CAPES/PROCAD­‑NF nº 21/2009) cujo
objetivo geral é analisar a evolução dos processos de mudanças na cobertura do solo em
áreas de Cerrado no Estado de Goiás e seus impactos socioambientais, tendo como recorte
temporal a década de 1970, marco da expansão das fronteiras agrícolas na região Centro­
‑Oeste do Brasil. Nossa intenção, no pouco espaço que o texto permite, é apresentar parte
dessa discussão, envolvendo as ferramentas de geotecnologias como apoio na discussão
das mudanças temporais, sob a orientação dos pressupostos da História Ambiental. Assim,
o exercício da multidisciplinaridade nos estudos ambientais ampliam os olhares e as abor-
dagens dos diferentes objetos que as diferentes disciplinas procuram investigar. Portanto,
consideramos relevante socializar experiências, mesmo que pesquisas situem em estagio
prévio de observação e uso de diferentes procedimentos e ferramentas científicas.
Desse forma, consideramos que, a partir da expansão desordenada da cultura
de cana­‑de­‑açúcar, principalmente, na última década, aconteceu e vem acontecendo
progressivamente, a degradação do cerrado pelo processo de ocupação humana aliado a
falta de políticas públicas de meio ambiente. Diante desse cenário, as áreas nativas vêm
232
diminuindo e várias espécies de fauna e flora são extintas a cada dia.
As imagens de satélite são consideradas fontes seguras por apresentarem informações
úteis, que permitem uma visão espacial, espectral e temporal da superfície terrestre.
A resolução espacial indica o tamanho do menor objeto que é possível representar em
uma imagem; a resolução espectral indica a quantidade de regiões do espectro eletro-
magnético nas quais o sensor é capaz de gerar uma imagem em níveis de cinza; a resolu-
ção temporal refere­‑se ao intervalo de tempo em dias ou horas, no qual o sistema demora
para obter duas imagens consecutivas da mesma região sobre a terra.
A partir daí, é possível coletar dados de grandes áreas, minimizar os custos e obter
resultados estatísticos que sirvam de referencial para a tomada de decisões e políticas
de meio ambiente que possam garantir o desenvolvimento e a preservação ambiental
de uma determinada região (FLORENZANO, 2007).
O conhecimento amplo de uma determinada paisagem é de vital importância para
adequar ou propor políticas ambientais de preservação e desenvolvimento sustentável
a partir das transformações impostas pelo homem. Nesse sentido, as últimas décadas
tem evidenciado grande desenvolvimento econômico e degradação ambiental provocadas
por destruição de grandes áreas vegetais rurais justificadas pelo intenso processo de ur-
banização dos munícipios brasileiros.
Em Goiás, esse processo não foi diferente. Nesse viés, a microrregião do Município
de Ceres – Goiás ocupa uma área de aproximadamente, 13.163,014 Km² e abrange
vinte e dois municípios: Barro Alto, Carmo do Rio Verde, Ceres, Goianésia, Guaraíta,
Guarinos, Hidrolina, Ipiranga de Goiás, Itapaci, Itapuranga, Morro Agudo de Goiás,
Nova América, Nova Glória, Pilar de Goiás, Rialma, Rianápolis, Rubiataba, Santa
Isabel, Santa Rita do Novo Destino, São Luís do Norte, São Patrício e Uruana.
A região possui intensa ação antrópica e são preocupantes os problemas já enfrenta-
dos pelas comunidades locais tais como: processos erosivos, contaminação dos manan-
ciais hídricos por agrotóxicos, pecuária extensiva desordenada, despejo de esgoto nos
mananciais hídricos, remoção de areia e argila para a construção civil, dentre outros.
Nesse sentido, o estudo da paisagem vegetal por técnicas de sensoriamento remoto
torna­‑se eficaz, tanto para permitir um monitoramento que detecte os problemas de devas-
tação e desmatamento de modo a facilitar a obtenção de informações eficazes tanto para a
fiscalização ambiental, quanto para a implementação de programas de recuperação do am-
biente degradado garantindo um melhor desenvolvimento para as populações envolvidas.

Referencias Bibliográficas

CANASAT (2010) ­‑ Mapeamento de cana via imagens de satélite de observação da terra. Relatório de área
de cana, safra e reforma na região Centro­‑Sul. http://www.dsr.inpe.br/mapdsr/index.jsp. (consultado em
25.07.2010)
CARVALHO Júnior O.A., GUIMARÃES R.F., GILLESPIE A.R., SILVA N.C., GOMES R.A.T (2011). A New
Approach to Change Vector Analysis Using Distance and Similarity Measures. Remote Sensing.
CASTILHO, Denis (2009). A dinâmica socioespacial de Ceres/Rialma no âmbito da modernização em Goiás:
território em movimento, paisagens em transição. Dissertação de Mestrado em Geografia. Universidade
Federal de Goiás. Goiânia, UFG.
FLORENZANO, Teresa Galloti (2007). Iniciação em Sensoriamento Remoto: Imagens de Satélite para Estu-
dos Ambientais. 2. ed. São Paulo, editora: Oficina de Textos. 233
IBGE (2011) – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. IBGE lança o Mapa de Biomas do Brasil e o
Mapa de Vegetação do Brasil, em comemoração ao Dia Mundial da Biodiversidade. http://www.ibge.gov.
br/home/presidencia/noticias/noticia. (consultado em 02.01.2011)
INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS ESPACIAIS – INPE. (2012). Divisão de Geração de imagens.
Disponível em http://www.dgi.inpe.br/CDSR/. Acesso em: fevereiro de 2012.
JENSEN, John R (2009). Sensoriamento Remoto do Ambiente. 1. ed. São Paulo: Editora Parêntese, 2009. 672 p.
KOHONEN T. e; MÄKISARA K. 1989. The self­‑organizing feature maps. Physica Scripta, 39: 168.
MAPA ­‑ MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO (2010). Relação das Uni-
dades produtoras Cadastradas no Departamento da Cana­‑de­‑açúcar e Agroenergia.. http://www.agricultura.
gov.br/portal/page/portal/Internet­‑MAPA/pagina­‑inicial/vegetal/culturas/cana­‑de­‑acucar. (consultado em
25.07.2010)
MARTINEZ, Paulo Henrique (2006). História Ambiental no Brasil: pesquisa e ensino. São Paulo; Cortez.
SCHOWENGERDT, R. Antony (2007) ­‑ Remote Sensing ­‑ Models and Methods for Image Processing,
Editora Academic Press.
SILVA, Sandro Dutra e; PIETRAFESA, José Paulo; TAVARES, Giovana Galvão (2011). As fronteiras do pro-
gresso e a devastação da natureza: frentes, marchas e expansão desenvolvimentista na exploração agrícola
do Cerrado em Goiás. Anais do II Workshop Internacional de História do Ambiente: desastres ambientais
e sustentabilidade & GISDAY 2011. Florianópolis, SC.

Você também pode gostar