Capitulo 6
Capitulo 6
Capitulo 6
– Não posso negar que esteja melhor; entretanto, sofro intensamente. Muitas dores na
zona intestinal, estranhas sensações de angústia no coração. Nunca supus fosse capaz de
tamanha resistência, meu amigo. Ah! Como tem sido pesada a minha cruz!... Agora que
posso concatenar ideias, creio que a dor me aniquilou todas as forças disponíveis...
Chegado a essa altura, o vendaval da queixa me conduzira o barco mental ao oceano largo
das lágrimas.
– Aprenda, então, a não falar excessivamente de si mesmo, nem comente a própria dor.
Lamentação denota enfermidade mental e enfermidade de curso laborioso e tratamento
difícil. É indispensável criar pensamentos novos e disciplinar os lábios. Somente
conseguiremos equilíbrio, abrindo o coração ao Sol da Divindade. Classificar o esforço
necessário de imposição esmagadora, enxergar padecimentos onde há luta edificante, sói
identificar indesejável cegueira d'alma. Quanto mais utilize o verbo por dilatar
considerações dolorosas, no círculo da personalidade, mais duros se tornarão os laços que
o prendem a lembranças mesquinhas. O mesmo Pai que vela por sua pessoa, oferecendo-
lhe teto generoso, nesta casa, atenderá aos seus parentes terrestres. Deve mos ter nosso
agrupamento familiar como sagrada construção, mas sem esquecer que nossas famílias
são seções da Família universal, sob a Direção Divina. Estaremos a seu lado para resolver
dificuldades presentes e estruturar projetos de futuro, mas não dispomos do tempo para
voltar a zonas estéreis de lamentação. Além disso, temos, nesta colônia, o compromisso de
aceitar o trabalho mais áspero como bênção de realização, considerando que a
Providência desborda amor, enquanto nós vivemos onerados de dívidas. Se deseja
permanecer nesta casa de assistência, aprenda a pensar com justeza.
Nesse ínterim, secara-se-me o pranto e, chamado a brios pelo generoso instrutor, assumi
diversa atitude, embora envergonhado da minha fraqueza.
Fez-se longa pausa. A palavra de Clarêncio levantara-me para elucubrações mais sadias.
Enquanto meditava a sabedoria da valiosa advertência, meu benfeitor, qual o pai que
esquece a leviandade dos filhos para recomeçar serenamente a lição, tornou a perguntar
com um belo sorriso:
Contente por me sentir desculpado, à maneira da criança que deseja aprender, respondi,
confortado:
Deus, porém, quer que todas as suas criaturas progridam e, portanto, não
deixa impune qualquer desvio do caminho reto. Não há falta alguma, por mais leve
que seja, nenhuma infração da sua lei, que não acarrete forçosas e inevitáveis
conseqüências, mais ou menos deploráveis. Daí se segue que, nas pequenas
coisas, como nas grandes, o homem é sempre punido por aquilo em que pecou.
Os sofrimentos que decorrem do pecado são-lhe uma advertência de que
procedeu mal. Dão-lhe experiência, fazem-lhe sentir a diferença existente entre o
bem e o mal e a necessidade de se melhorar para, de futuro, evitar o que lhe
originou uma fonte de amarguras; sem o que, motivo não haveria para que se
emendasse. Confiante na impunidade, retardaria seu avanço e,
conseqüentemente, a sua felicidade futura.
O SUICÍDIO E A LOUCURA
15. O mesmo ocorre com o suicídio. Postos de lado os que se dão em estado de
embriaguez e de loucura, aos quais se pode chamar de inconscientes, é
incontestável que tem ele sempre por causa um descontentamento, quaisquer que
sejam os motivos particulares que se lhe apontem. Ora, aquele que está certo de
que só é desventurado por um dia e que melhores serão os dias que hão de vir,
enche-se facilmente de paciência. Só se desespera quando nenhum termo divisa
para os seus sofrimentos. E que é a vida humana, com relação à eternidade,
senão bem menos que um dia? Mas, para o que não crê na eternidade e julga que
com a vida tudo se acaba, se os infortúnios e as aflições o acabrunham,
unicamente na morte vê uma solução para as suas amarguras. Nada esperando,
acha muito natural, muito lógico mesmo, abreviar pelo suicídio as suas misérias.
18. Quando o Cristo disse: “Bem-aventurados os aflitos, o reino dos céus lhes
pertence”, não se referia de modo geral aos que sofrem, visto que sofrem todos os
que se encontram na Terra, quer ocupem tronos, quer jazam sobre a palha. Mas,
ah! poucos sofrem bem; poucos compreendem que somente as provas bem
suportadas podem conduzi-los ao reino de Deus. O desânimo é uma falta. Deus
vos recusa consolações, desde que vos falte coragem. A prece é um apoio para a
alma; contudo, não basta: é preciso tenha por base uma fé viva na bondade de
Deus. Ele já muitas vezes vos disse que não coloca fardos pesados em ombros
fracos.
O MAL E O REMÉDIO
19. Será a Terra um lugar de gozo, um paraíso de delícias? Já não ressoa mais
aos vossos ouvidos a voz do profeta? Não proclamou ele que haveria prantos e
ranger de dentes para os que nascessem nesse vale de dores? Esperai, pois,
todos vós que aí viveis, causticantes lágrimas e amargo sofrer e, por mais agudas
e profundas sejam as vossas dores, volvei o olhar para o Céu e bendizei do
Senhor por ter querido experimentar-vos... Ó homens! dar-se-á não reconheçais
o poder do vosso Senhor, senão quando ele vos haja curado as chagas do corpo e
coroado de beatitude e ventura os vossos dias? Dar-se-á não reconheçais o seu
amor, senão quando vos tenha adornado o corpo de todas as glórias e lhe haja
restituído o brilho e a brancura? Imitai aquele que vos foi dado para exemplo.
Tendo chegado ao último grau da abjeção e da miséria, deitado sobre uma
estrumeira, disse ele a Deus: “Senhor, conheci todos os deleites da opulência e
me reduzistes à mais absoluta miséria; obrigado, obrigado, meu Deus, por
haverdes querido experimentar o vosso servo!” Até quando os vossos olhares se
deterão nos horizontes que a morte limita? Quando, afinal, vossa alma se decidirá
a lançar-se para além dos limites de um túmulo? Houvésseis de chorar e sofrer a
vida inteira, que seria isso, a par da eterna glória reservada ao que tenha sofrido a
prova com fé, amor e resignação? Buscai consolações para os vossos males no
porvir que Deus vos prepara e procurai-lhe a causa no passado. E vós, que mais
sofreis, considerai-vos os afortunados da Terra.
O Cristo vos disse que com a fé se transportam montanhas e eu vos digo que
aquele que sofre e tem a fé por amparo ficará sob a sua égide e não mais sofrerá.
Os momentos das mais fortes dores lhe serão as primeiras notas alegres da
eternidade. Sua alma se desprenderá de tal maneira do corpo que, enquanto se
estorcer em convulsões, ela planará nas regiões celestes, entoando, com os anjos,
hinos de reconhecimento e de glória ao Senhor.
Ditosos os que sofrem e choram! Alegres estejam suas almas, porque Deus
as cumulará de bem-aventuranças. – Santo Agostinho. (Paris, 1863.)
29 MEDICINA DO FUTURO
(Emmanuel, Emmanuel, cap. 23. Emmanuel, Palavras de Emmanuel, cap. 29.)