PARGENDLER & SALAMA. Direito e Consequëncia No Brasil

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Direito e consequência no Brasil: em busca de um

discurso sobre o método

DIREITO E CONSEQUÊNCIA NO BRASIL: EM BUSCA DE UM DISCURSO


SOBRE O MÉTODO
Law and consequence in Brazil: in search for a discourse on the method
Revista de Análise Econômica do Direito | vol. 1/2021 | Jan - Jun / 2021
DTR\2021\8878

Mariana Pargendler
Professora Associada da Escola de Direito da FGV-SP (FGV Direito SP) e Coordenadora
do Núcleo de Direito, Economia e Governança da FGV Direito SP
[email protected]

Bruno Meyerhof Salama


Professor Adjunto da Universidade da California, Berkeley e Global Fellow da FGV Direito
SP [email protected]

Área do Direito: Fundamentos do Direito


Resumo: Proliferam hoje instituições de pesquisa e trabalhos acadêmicos em direito que
— diferentemente do método jurídico tradicional, mas à semelhança das demais ciências
sociais — objetivam investigar os efeitos das normas jurídicas sobre a realidade
econômica e social. No presente artigo, sustentamos que, no Brasil, a adoção de novas
metodologias na produção jurídica liga-se à transformação no modo de aplicação do
direito, que vem crescentemente consagrando a utilização de argumentos
consequencialistas em juízo. Examinamos, então, os três vetores de caráter ideológico
(o triunfo do progressismo), organizacional (a centralidade do Poder Judiciário no arranjo
político) e técnico-jurídico (o reconhecimento da força normativa dos princípios) que
forjaram tal transformação no contexto brasileiro. Daí decorre que a aplicação do direito
cada vez mais exija não apenas a averiguação de fatos pretéritos para determinar a
incidência do suporte fático de regras, mas também juízos probabilísticos sobre fatos
futuros a fim de concretizar os fins jurídicos consubstanciados em princípios —
propiciando, assim, o surgimento de um potencial novo campo de pesquisa para os
juristas. Todavia, a persistência de uma incerteza radical sobre o funcionamento do
mundo — inclusive sobre as consequências de diferentes normas jurídicas — inviabiliza o
consequencialismo extremado como técnica de decisão sobre a organização social. Em
razão da inabilidade das ciências sociais em ditar o funcionamento do sistema jurídico,
subsistirá o papel do jurista como formulador de doutrina como não ciência.

Palavras-chave: Consequencialismo – Estado regulatório – Ciência do direito – Empiria


Abstract: Today, a growing number of research institutions and academic works in law
seek to investigate the effects of legal rules on social and economic reality, a goal that
differs from that of traditional doctrinal scholarship but is similar to the aspirations of
other social scientists. In this Article, we argue that, in Brazil, the adoption of new
methodologies in legal scholarship relates to a transformation in the mode of legal
interpretation towards greater acceptance of the use of consequentialist arguments in
court. As a result, judicial interpretation increasingly requires not only the verification of
past facts that are abstractly described in legal rules, but also probabilistic judgments
about future facts in order to carry out the legal objectives embodied in legal principles.
Nevertheless, the persistence of radical uncertainty about the workings of the world —
including the factual consequences of legal rules — thwarts the use of extreme
consequentialist reasoning as a decision method for social organization. In view of social
sciences’ inability to dictate how the legal system is to operate, the role of legal scholars
as authors of doctrine as non-science will subsist.

Keywords: Consequentialism – Regulatory State – Legal science – Empirics


Para citar este artigo: PARGENDLER, Mariana; SALAMA, Bruno Meyerhof. Direito e
consequência no Brasil: em busca de um discurso sobre o método.Revista de Análise
Econômica do Direito. vol. 1. ano 1. São Paulo: Ed. RT, jan.-jun. 2021. Disponível em:
Página 1
Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

inserir link consultado. Acesso em: DD.MM.AAAA.


Sumário:

I. Introdução - II. Direito e ciência: a evolução do papel do jurista - III. O jurista como
cientista social - IV. As consequências como condição de incidência normativa - V. O
papel da doutrina jurídica como não ciência - VI. Conclusão - VII. Referências

I. Introdução
1
O fossoque separa a pesquisa em direito da pesquisa em outras áreas do saber humano
nunca foi tão estreito quanto hoje. Embalada pela cantilena da interdisciplinaridade, a
produção acadêmica em direito tem crescentemente lançado mão do método prevalente
em outras ciências naturais e sociais, conferindo maior ênfase à formulação de teorias
2
“falseáveis” e ao desenvolvimento de estudos empíricos e experimentais aptos a
3
testá-las . O fenômeno, aliás, é hoje observável em toda parte: não apenas nos Estados
4
Unidos, onde se originou, mas também na Europa continental, para onde se espalhou .

Sintomaticamente, em nosso país, proliferam instituições destinadas a fomentar estudos


empíricos em direito com o duplo objetivo de descrever o direito posto e de examinar os
5
efeitos concretos das normas jurídicas e decisões judiciais . Multiplicam-se, também, os
trabalhos empíricos em direito, tanto qualitativos como quantitativos, assim como os
6
fóruns destinados a debater e incentivar esse tipo de produção acadêmica . Estudos
7 8
teóricos em “direito e...” têm, igualmente, ganhado terreno no Brasil nos últimos anos .

Tal fenômeno, entretanto, veio desacompanhado de uma reflexão mais aguda sobre esse
9
tipo de investigação . A que se deve no Brasil o crescente interesse de profissionais e
estudiosos do direito por trabalhos empíricos e interdisciplinares? Seriam eles nova
manifestação de “ideias fora do lugar”, traço marcante da crítica social à produção
10
acadêmica brasileira? Ou, ao contrário, estaria a doutrina jurídica, nos moldes
tradicionais, com seus dias contados? O presente trabalho busca oferecer elementos
para o enfrentamento dessas difíceis questões.

Nossa hipótese básica é a de que, no Brasil, a paulatina adoção de novos métodos de


pesquisa jurídica liga-se à transformação no modo de aplicação do direito. A utilização
de argumentos consequencialistas em juízo, em particular, é hoje cada vez mais um
aspecto necessário do percurso retórico para a interpretação e aplicação das normas
jurídicas. Esta hipótese se divide em três aspectos: (i) um ligado aos seus vetores; (ii)
outro ligado à sua fenomenologia jurídica; e (iii) um terceiro ligado aos seus limites.

Vetores. A paulatina mudança no método da produção acadêmica em direito no Brasil se


11
explica menos por fatores internos à academia, sublinhados pela literatura estrangeira ,
e mais por fatores decorrentes da profunda transformação e ampliação do fenômeno
jurídico no último século. A transição de um Estado liberal a um Estado democrático
regulatório, aliada à concomitante transformação na teoria e prática jurídicas — de um
modelo formalista e baseado em regras a um modelo aberto e baseado em princípios —,
fizeram crescer entre nós a demanda por estudos científicos aptos a embasar
argumentos consequencialistas.

Fenomenologia jurídica. Quer se goste ou não, ponderações sobre as prováveis


consequências fáticas de determinadas normas jurídicas — antes consideradas dados
extrajurídicos que interessariam somente a áreas correlatas (sociologia, economia,
psicologia etc.) — hoje se fazem cada vez mais presentes na interpretação do direito no
12
Brasil . Isso principalmente porque o caráter teleológico dos princípios jurídicos exige,
para a sua melhor aplicação, juízos sobre a adequação entre meios e fins — juízos estes
que necessariamente dependem de ilações sobre os efeitos concretos de um ou outro
regime jurídico. Assim, a própria incidência normativa dependerá intimamente de suas
prováveis consequências futuras.

Limites. Apesar do recurso à discussão das consequências, subsistirá o papel do jurista


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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

como formulador de doutrina como não ciência. Especificamente, defendemos que a


cientificização da produção jurídica (sobretudo no que tange ao exame dos efeitos
concretos das regras jurídicas) encontra limites muito claros, em razão de dois motivos
13
insuperáveis : (i) a incerteza radical sobre o funcionamento do mundo (no que se
incluem as consequências concretas de diferentes normas jurídicas); e (ii) a
conhecidíssima “guilhotina de Hume” (de acordo com a qual não se pode deduzir o que
14
“deve ser” com base em uma proposição sobre o que “é”) . Dito de forma simples: a
perfeita engenharia do mundo é impossível, e mesmo que fosse possível talvez não fosse
desejável, legítima ou legal. Por conseguinte, tem-se a ilegitimidade e inconveniência
(esta última, inclusive sob a ótica consequencialista) da utilização do cientificismo e
consequencialismo extremados como forma de organização jurídica e social, ou seja, a
cientifização da pesquisa em direito não pode substituir o juízo de ponderação não
científica (logo, dogmática e propriamente doutrinária) do jurista — tal como, aliás, a
progressiva cientifização da produção acadêmica em economia não teve o condão de
15
erradicar a doutrina econômica naquela disciplina .

Evidentemente, parte do que foi dito anteriormente se resolve apenas no campo da


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semântica . É possível distinguir diferentes sentidos das formulações teóricas e
17
empíricas em direito, segundo o método empregado nas demais ciências . Segundo a
célebre acepção de ciência do direito formulada por Hans Kelsen, os estudos científicos
18
em direito buscariam, objetivamente, descrever as normas jurídicas . A diferença dessa
abordagem relativamente à expressiva parcela da pesquisa empírica contemporânea
refere-se à expansão do universo jurídico objeto de estudo, assim como à crescente
utilização de métodos quantitativos. No passado, o esforço descritivo usualmente tinha
por objeto normas jurídicas ou decisões judiciais individualizadas. Hoje, por força de
diversos fatores — como a centralidade assumida pelo Poder Judiciário, a descrença no
papel do juiz como simples “boca da lei”, a massificação dos litígios, o advento das
agências reguladoras, o prestígio das formas alternativas de soluções de conflitos, entre
tantos outros —, tais estudos descritivos da realidade jurídica frequentemente tomam
por objeto não somente o texto legal, mas também a análise de um largo número de
19
decisões em sede judicial, arbitral ou administrativa .

Outra acepção refere-se ao estudo da interação entre direito e realidade social,


destinando-se a descrever os efeitos concretos de normas jurídicas e decisões judiciais
-sobre a organização social, econômica e política. Outrora predominantemente
conduzidos por estudiosos de outras áreas do conhecimento (especialmente, sociologia,
economia e ciência política), tais estudos são hoje não apenas crescentemente
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consumidos, mas também produzidos por juristas . Mudam, assim, não apenas os
autores, bem como os leitores. O tipo de argumentação aceitável em um debate jurídico
se amplia, e a fronteira entre o jurídico e o não jurídico se torna mais porosa. O
resultado tem sido espantoso: opera-se uma progressiva redução do espaço que separa
os estudos descritivos do direito, de um lado, e a expansão de estudos sobre as
consequências do direito na realidade econômica e social, de outro.

O presente texto oferece elementos para uma narrativa que dê sentido à aparente
cientificização da produção jurídica. Ainda que aqui esteja a semente para uma
teorização ulterior mais ampla, a ênfase recai, em particular, sobre o contexto
jurídico-político brasileiro. Dividimos o restante deste texto da seguinte maneira. A seção
I, introdutória, apresenta o que pode ser chamado de uma narrativa “padrão” ou
“tradicional”, a respeito da relação entre direito e ciência. A seção II formula uma
explicação dos fatores que determinam a importação de métodos de outras ciências ao
estudo jurídico no Brasil. A seção III discute as correspondentes modificações na técnica
de aplicação do direito a permitir que o exame das consequências da norma jurídica
condicione a sua incidência ou não ao caso concreto. A seção IV apresenta razões
epistemológicas e teóricas pelas quais a “cientificização” da produção jurídica não é
inevitável nem ilimitada. A seção V conclui.

II. Direito e ciência: a evolução do papel do jurista

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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

O argumento de que a produção em direito tenha se tornado cada vez mais científica é
em parte apenas semântico e comparativo. O que significa dizer que os trabalhos se
tornaram mais “científicos”? Além disso, qual o referencial de tal assertiva: teria a
produção jurídica se tornado mais científica comparativamente a quê?

Estas são, sem dúvida, questões difíceis e com implicações profundas e variadas. Existe
(ou poderia existir) uma ciência do direito? Em caso positivo, qual o seu objeto e
método? Em caso negativo, qual seria, afinal de contas, o papel do jurista ou do
acadêmico em direito? Não cabe aqui reconstruir historicamente esse debate — tema,
aliás, indevidamente omitido por parte da literatura norte-americana recente, que se
limita a descrever as definições de ciência em geral sem se ater a obras específicas
21 22
sobre o alegado caráter científico (ainda que sui generis ) do direito . Neste trabalho,
por ora, cumpre apenas observar que cada uma dessas questões envolve complexidades
e sutilezas das mais variadas e que serão apenas tangenciadas na análise que segue.

Iniciemos pela discussão da noção de uma eventual “ciência do direito”. Seu objeto e
método permanecem amplamente contestados, dificultando a formação de uma
comunidade acadêmica. Deve ser estudado o direito nos livros (law in the books) ou o
direito em ação (law in action)? As abordagens do fenômeno jurídico à luz de outras
disciplinas (economia, sociologia, história etc.) interessam ou não à ciência do direito?
23
Seria a “ciência do direito” encarregada de prever como decidirão os tribunais? Estaria
ela também destinada a prever as consequências econômicas, políticas e sociais de
determinadas regras jurídicas ou posicionamentos jurisprudenciais?

Do ponto de vista histórico, o problema da cientificidade do estudo do direito é recente.


Juristas gostam de lembrar que o seu ramo tem mais de dois milênios, em comparação
com pouco mais de dois séculos de economia. De fato, o estudo do direito precede não
somente o estudo da economia, mas também a própria formulação do conceito de
ciência. Observa James Gordley que, assim como a filosofia começou com os gregos, a
física, com Galileu e Newton, e a economia moderna, com Adam Smith, a tradição
24
jurídica ocidental remonta ao direito romano . O jurisconsulto romano ocupava-se do
direito, porém, não tinha pretensão alguma de fazer ciência. O que fazia ele então?
25
A atribuição clássica do jurista na tradição ocidental foi a de produzir doutrina . Aponta
Humberto Ávila que incumbia à doutrina, em Roma, “atribuir sentido a dispositivos
legais, direcionando a conduta dos seus destinatários. Ela era seguida porque tinha
autoridade legal e era importante porque orientava tanto a atividade dos operadores
26
como a conduta dos destinatários” . Desde Augustus, as opiniões de célebres juristas
romanos gozavam de autoridade e força obrigatória — ou seja, para todos os efeitos
27
práticos, eram leis . A célebre “Lei das Citações”, de 426, não somente reconheceu de
forma expressa a autoridade das opiniões de Gaio, Papiniano, Paulo, Ulpiano e
Modestino, como também estabeleceu mecanismos decisórios em caso de divergência
entre os autores: prevaleceria a concepção da maioria deles, todavia, em caso de
28
empate, predominaria a opinio de Papiniano .

Com a progressiva transformação do direito e da prática jurídica, o papel do jurista não


se manteve estanque. Sua função como doutrinador e o caráter prescritivo de suas
lições persistiram ao longo do tempo, em diferentes moldes. A prática de utilizar a
opinião de juristas como fonte de lei se estendeu pela Idade Média e chegou aos nossos
29
tempos. Um bom exemplo pode ser encontrado na doutrina de Bártolo de Saxoferrato ,
o grande jurisconsulto medieval e notável comentarista do direito romano cuja doutrina
foi (durante séculos e até a idade contemporânea) tratada como fonte subsidiária de
30
direito em sistemas jurídicos europeus . O singular método de Bártolo pressupunha ser
possível compatibilizar os costumes locais com certos ensinamentos supostamente
universais e encontráveis no direito romano. Judith Martins-Costa nota que o uso de
doutrina estrangeira com força de autoridade reflete a premissa de que as sentenças
judiciais possam refletir as opiniões de autores de diversos sistemas jurídicos, como se
31
existisse um direito comum supranacional .
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

No século XX, porém, tal modelo mostrava nítidos sinais de exaustão, e isso por pelo
32
menos duas razões . Primeiro, a democratização das formas de governo ao redor do
mundo, assim como o movimento de codificação, operaram parcial substituição do
doutrinador pelo legislador, não só na dicção, mas também na própria sistematização do
direito. A institucionalização da mutabilidade do direito pela positivação, por sua vez, foi
33
causa de ansiedade relativamente ao caráter científico do direito . Segundo, a crescente
busca pelos juristas do ideal científico levou-os a conduzir sua análise sob a retórica da
descrição do sistema, em vez da retórica da prescrição. Contudo, a cultura dos manuais
jurídicos que rapidamente se formou passou a esconder os problemas jurídicos concretos
por trás de definições abstratas. Não tardou até que o descolamento entre a teoria e a
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prática do direito passasse a ser objeto de severa crítica .

Tal como a democratização da vida política e social — a suscitar dúvidas sobre o


“argumento de autoridade” refletido nas posições doutrinárias —, a preocupação com o
caráter científico do estudo do direito é bastante recente e remonta ao século XIX. Foi,
porém, no século XX que a preocupação ganhou força. O status do estudo do direito
35
dentro da comunidade científica — antes presumido sem maiores dificuldades —
entrou em jogo, conduzindo à proliferação de estudos e teorias destinados a moldar a
36
chamada “ciência do direito” .

Em sua Teoria pura do direito, uma das mais célebres obras sobre o tema, Hans Kelsen
propugna a existência de uma ciência do direito, traçando-lhe os métodos e objeto. Seu
“princípio metodológico fundamental” seria justamente “garantir um conhecimento
apenas dirigido ao direito e excluir deste conhecimento tudo quanto não pertença ao seu
objeto, tudo quanto não se possa, rigorosamente, determinar como Direito”, assim
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libertando “a ciência jurídica de todos os elementos que lhe são estranhos” . Para
Kelsen, o conceito de direito objeto da ciência jurídica restringe-se às “normas jurídicas”,
e a “conduta humana só o é na medida em que é determinada nas normas jurídicas
como pressuposto ou consequência, ou — por outras palavras — na medida em que
38
constitui conteúdo de normas jurídicas” . Por fim, conclui que a ciência jurídica “apenas
pode descrever o Direito; ela não pode, como o Direito produzido pela autoridade
39
jurídica (através de normas gerais ou individuais) prescrever seja o que for” . Em
suma, para Kelsen, a ciência do direito tem como método a descrição e por objeto o
direito, entendido exclusivamente como sinônimo do conjunto de normas jurídicas
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acompanhadas de sanção e emanadas de autoridade estatal .

Os estudos empíricos em dogmática jurídica — por exemplo, os levantamentos


quantitativos de decisões judiciais ou agências reguladoras que buscam descrever a
aplicação de um ou outro instituto — são, de certa maneira, a “versão 2.0” da ciência
jurídica sob perspectiva pura ou interna nos moldes kelsenianos. Seu objetivo continua
sendo a descrição do direito, porém, para tanto, o método utilizado foi atualizado para
melhor refletir o modus operandi do sistema jurídico de hoje. Outro esforço, à primeira
vista drasticamente diferente, é aquele que busca discernir os efeitos concretos das
normas jurídicas no mundo dos fatos. Veja-se, como exemplo desta última modalidade
popularizada nos Estados Unidos e crescentemente utilizada no Brasil, o clássico estudo
41
de Robert Ellickson Of Coase and cattle .

O objetivo deste último trabalho está longe de ser a descrição da lógica interna de
determinado instituto (no caso, a responsabilidade civil dos proprietários de gado pelos
danos causados pelos animais à propriedade de fazendeiros vizinhos) e a sua posição no
ordenamento jurídico. Pretende o autor, em vez disso, verificar como diferentes normas
jurídicas sobre tal situação afetam o comportamento econômico e social — investigação
esta necessariamente baseada em dados empíricos extrajurídicos e, portanto,
manifestamente impura. E não só: seu estudo conclui, em consonância com o teorema
de Coase, que com baixos custos de transação para negociações o regime jurídico é
verdadeiramente irrelevante e, surpreendentemente, até mesmo desconhecido, abrindo
caminho para frutífera literatura sobre o papel das “regras sociais” (social norms) como
substituto ao regramento jurídico.
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Contudo, conforme será exposto a seguir, a diferença entre descrever as normas


jurídicas e descrever as consequências das normas jurídicas sobre a realidade vem se
reduzindo nos últimos tempos. A razão para tanto é a expansão dos elementos que são
considerados jurídicos, isto é, aptos a responder à questão fundamental do sistema
42
jurídico — segundo a concepção de Niklas Luhmann, a distinção entre o lícito e ilícito .
A razão para tanto é que, sob o primado das políticas públicas consubstanciadas em
princípios constitucionais, cada vez mais os prováveis efeitos de certas regras ou
regimes jurídicos deixam de ser dados extrajurídicos, passando a ocupar um papel
43
central na argumentação jurídica e na aplicação do direito .

III. O jurista como cientista social


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A transformação da literatura jurídica é notória . Qual a explicação do fenômeno? A
resposta pode ser remontada a uma discussão antiga a respeito da autonomia da
empreitada acadêmica ante as condições sociais que motivam e constrangem os
pesquisadores. Seria a pesquisa acadêmica um recanto autônomo, seara própria de
indivíduos curiosos voltados ao extraordinário empreendimento que é a busca do
conhecimento? Ou será que a pesquisa científica deve ser vista como uma parte de uma
conjuntura cultural mais ampla, uma faceta de uma realidade bem mais complexa a lhe
influenciar decisiva e constantemente?

Os defensores da primeira posição costumam atribuir a cientifização da pesquisa em


direito a fatores, por assim dizer, de “oferta”. Sugere-se, nesse sentido, que o fenômeno
se deva sobretudo a circunstâncias internas à academia — e não raro, acrescente-se, à
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academia norte-americana e à sua influência em nível internacional . De fato, a visão
sobre a academia como relativamente alheia à vida jurídica e social não é de todo
absurda. Uma série de fatores — como as práticas de contratação, o regime de trabalho
com garantia de estabilidade e a governança das instituições universitárias —
possibilitam, em tese, que estudos acadêmicos sejam, ao menos imediatamente, inúteis
ou até mesmo disfuncionais.

É tanto ou mais plausível, porém, que os estudos em direito — que, antes de mais nada,
referem-se a uma prática e a uma profissão — reflitam também a estrutura sociopolítica
subjacente. Esta observação conduz, então, a uma ponderação sobre fatores de
“demanda”, por assim dizer, a estimular a pesquisa acadêmica cientificizada. Em
particular, se é difícil demonstrar causalidade, é mais facilmente detectável a relação
46
(em maior ou menor grau, a depender do contexto ) entre a transformação na
articulação social do direito e a paulatina mudança na produção jurídica no último
século.

No quadro político brasileiro, essa modificação é impulsionada por três fatores


marcantes, a saber: (a) o triunfo da ideologia progressista; (b) a mudança
organizacional do modelo estatal; e (c) a transição de um modelo formalista e baseado
em regras para um modelo aberto e fundamentado em princípios. Como examinado
adiante, cada uma dessas três considerações constitui, a nosso ver, um vetor autônomo
da cientificização porque gera uma demanda por estudos científicos aptos a embasar
argumentos consequencialistas.

A.. O vetor ideológico: triunfo do progressismo

O século XX marca a ascensão do progressismo à condição de ideologia basilar do Estado


contemporâneo. O progressismo é basicamente a ideologia do adiantamento,
desenvolvimento e evolução; sua antítese é o conservadorismo. O progressismo traduz a
crença na capacidade humana de deliberadamente ordenar o mundo. Em suas versões
mais radicais, traz os chamados “perigos” do iluminismo e expressa a crença equivocada
de que a ordem social possa ser plenamente engendrada por uma ou algumas pessoas.
Nas suas versões mais moderadas, contudo, traz apenas uma justificativa a mais para a
regulação. As origens intelectuais do progressismo remontam ao início da era clássica
grega, mas o impulso definitivo lhe foi dado pelo vigor construtivista a partir do século
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

XVII, quando a humanidade adentrara efetivamente a era do racionalismo, do


cientificismo e do positivismo. No Brasil, a subida de Getúlio Vargas é o fato histórico a
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marcar o triunfo do progressismo como ideologia estatal dominante . Consagrou-se,
48
deste modo, o “uso instrumental do direito” como ferramenta de “engenharia social” .

No novo contexto intelectual, o debate entre progressistas e conservadores foi


paulatinamente deixando o campo retórico das visões transcendentais ou metafísicas do
sagrado e passando a se articular na linguagem do incentivo, da utilidade e da
felicidade. O grande contendor do progressismo, no plano das ideias, passou assim a
49
estar no chamado conservadorismo utilitarista histórico . Esta é a posição que equipara
a conservação de instituições a uma medida de prudência e cautela, já que as
instituições trariam uma espécie de sabedoria indizível das gerações passadas.

O Estado que clama para si a missão de ordenar e aperfeiçoar a sociedade — em


50
síntese, o Estado regulatório — é a encarnação institucional da ideologia progressista .
Seus impactos sobre o direito são de duas naturezas. Primeiro, o Estado regulatório
trouxe para a esfera propriamente jurídica uma série de atividades que não estavam
previamente disciplinadas juridicamente de modo específico. Exemplos vão da
discriminação no trabalho à proteção do meio ambiente, passando por regras de
segurança e saúde pública, entre muitas outras. A juridificação — isto é, o
disciplinamento em lei de regras nessas áreas — obrigou os profissionais do direito,
inclusive os docentes e pesquisadores, a conhecer temas da biologia, política e
economia, originalmente tidos como irrelevantes do ponto de vista jurídico, e a integrar
saberes desses campos à formulação do direito.

Segundo, e para além desses temas específicos, o progressivismo do Estado regulatório


também afetou a prática e a teoria jurídica de uma forma mais ampla. O tema é bem
51
descrito por Fábio Konder Comparato :

“o ‘government by policies’, em substituição ao ‘government by law’, supõe o exercício


combinado de várias tarefas, que o Estado liberal desconhecia por completo. Supõe o
levantamento de informações precisas sobre a realidade nacional e mundial, não só em
termos quantitativos (para o qual foi criada a técnica da contabilidade nacional), mas
também sobre fatos não redutíveis a algarismos, como em matéria de educação,
capacidade inventiva e qualidade de vida. Supõe o desenvolvimento da técnica
previsional, a capacidade de formular objetivos possíveis e de organizar a conjugação de
forças ou a mobilização de recursos — materiais e humanos — para a sua consecução.
Em uma palavra, o planejamento.”

Esta busca por objetivos concretos — estejamos nós falando da diminuição da violência
doméstica ou da eficiência econômica, da melhoria da saúde pública ou da redução do
desmatamento — pode, na terminologia de hoje, ser confortavelmente chamada de
política pública. A política pública propõe ao jurista o desafio de integrar meios jurídicos
e fins normativos, e é neste momento que o saber jurídico tradicional se mostra
insuficiente. Um exemplo recente ilustra por que. A Lei 11.340, de 7 de agosto de 1996
— conhecida como Lei Maria da Penha, em homenagem à ativista e vítima de violência
doméstica que motivou a adoção do diploma —, foi instituída, de acordo com seu
preâmbulo, para criar

“mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do
§ 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.”

Surgem aqui dois problemas diferentes: uma coisa é saber se os fins a que a lei se
propõe — coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher — são legítimos (e é
evidente que são); outra, bastante diferente, é saber se os meios jurídicos previstos pela
Lei Maria da Penha são hábeis a realizar o seu fim normativo da lei. É conhecido o
argumento de muitos, e de não menos do que Immanuel Kant, de que seria próprio ao
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ofício do jurista “aplicar apenas as leis existentes, mas não investigar se estas
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necessitam de um melhoramento” . Tal é a tradição liberal herdada de antanho, mas
claramente posta em xeque em tempos recentes. Tanto assim que o tema dos meios
previstos na Lei Maria da Penha foi recentemente objeto de decisão pelo Supremo
Tribunal Federal (STF).

No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.424, questionou-se, inter alia,


a constitucionalidade de se condicionar as ações penais públicas à representação da
vítima relativamente aos crimes objeto da lei. A Corte Suprema, por maioria, conferiu
interpretação conforme a Constituição aos arts. 12, I, 16 e 41 da Lei Maria da Penha
para dispensar a representação da vítima nos crimes em que tal formalidade é exigida
pela Lei 9.099, de 1995 (LGL\1995\70), por entender que a ampla exigência de
representação acabaria por “esvaziar a proteção constitucional assegurada às mulheres”,
sendo, assim, meio inapto à consecução do fim desejado. A divergência entre a posição
majoritária e o voto vencido do Ministro Cezar Peluso centra-se justamente nas
presumidas consequências concretas, no mundo dos fatos, da exigência legal de
representação da vítima — juízo típico das ciências sociais e estranho ao saber jurídico
tradicional.

No entender do Ministro Lewandowski, “as mulheres, como está demonstrado


estatisticamente, não representam criminalmente contra o companheiro ou marido em
razão da permanente coação moral e física que sofrem e que inibe a sua livre
manifestação da vontade”, o que justificaria a eliminação do requisito de representação.
O Ministro Gilmar Mendes acompanhou o voto vencedor, mesmo afirmando “ter
dificuldade em saber se a melhor forma de proteger a mulher é a ação penal pública
condicionada à representação da agredida ou a ação incondicionada”. O Ministro Joaquim
Barbosa, por sua vez, afirmou ser “dever do Supremo, levando em consideração dados
sociais, rever as políticas no sentido da proteção”, e assim por diante.

Já o voto vencido do Ministro Cezar Peluso, para além de citar “estudos de várias
associações da sociedade civil e também do Ipea” sobre a vantagem do processamento
das ações pelos juizados especiais, decidiu pela constitucionalidade da ampla exigência
de representação. Explicou que a inclusão de semelhante requisito no texto legal não foi
leviana, e sim produto de consideração de “elementos trazidos por pessoas da área da
sociologia e das relações humanas”, inclusive “por meio de audiências públicas, que
apresentaram dados capazes de justificar essa concepção da ação penal”. Em síntese,
sob o louvável pretexto de se proteger as mulheres, a análise dos “efeitos práticos da
decisão” revelaria o caráter contraproducente do voto majoritário relativamente à
53
proteção e autonomia das mulheres .

Generalizando, pode-se dizer que a ascensão do government by policy propõe ao jurista


problemas para os quais o conhecimento jurídico tradicional — interpretar leis e
redigi-las, sustentar um argumento para um debate judicial ou desconstruir a coesão de
argumentos sobre a interpretação das leis — oferece poucas respostas. A política pública
é eminentemente finalística, isto é, está eminentemente voltada à consecução de fins
concretos. Sua legitimidade, portanto, prende-se não apenas aos procedimentos
seguidos para a sua feitura, mas também à plausibilidade de que os efeitos pretendidos
possam ser de fato alcançados.

O ponto básico é o seguinte: para se analisar a pertinência entre meios jurídicos e fins
normativos não basta interpretar a lei nem recorrer a intuições de justiça. É preciso, ao
contrário, apelar a uma ferramenta descritiva do mundo. Na terminologia empregada por
Tercio Sampaio Ferraz Jr., seria possível, então, vislumbrar-se um crescimento na
importância de normas sujeitas ao controle de validade finalística relativamente às
54
normas sujeitas ao controle de validade condicional . É neste momento que o
conhecimento científico sobre o mundo social passa a ser, por assim dizer, “demandado”
pelos profissionais do direito. Abre-se, assim, um novo campo de atuação possível para
o estudioso do direito, qual seja, o de empregar os métodos e conhecimentos produzidos
pelas ciências sociais para prever os efeitos concretos de diferentes normas e regimes
Página 8
Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

55
jurídicos . Embora este métier específico seja recente, ele se coaduna confortavelmente
com a função histórica do jurista na tradição romano-germânica como guia e auxiliar do
56
aplicador do direito .

B.. O vetor organizacional: o Judiciário no centro do arranjo político

Como dissemos, a integração de métodos científicos à teoria jurídica, por incipiente que
seja, também pode ser atribuída à mudança organizacional do modelo estatal. Em
muitos países democráticos do Ocidente (e talvez na maioria deles), o Estado regulatório
acabou por alçar (às vezes aberta e às vezes veladamente) o Poder Judiciário à condição
de ente ativo na formulação da política pública. Isto quer dizer que o government by
policy a que aludimos alhures passou a ter, no Poder Judiciário, um ator protagonista, e
não apenas coadjuvante.

Repare-se bem: a transformação no modelo de Estado a que aludimos supra não


explica, por si só, a cientificização da produção acadêmica jurídica. É certo que uma
regulação que não atenda plausivelmente aos seus fins normativos não será
politicamente palatável. Mas daí não segue, desde logo, que estejamos diante de um
problema jurídico (no sentido próprio da atividade do profissional ligado ao direito).
Afinal, se ao Judiciário couber apenas o papel de fazer valer a regra gestada em outras
esferas de poder, então toda a teorização jurídica deverá ser apenas interpretativa e
voltada a encontrar os percursos intelectuais que permitirão ao juiz cumprir, da forma
mais fiel possível, a regra que se lhe apresenta em um litígio. Quando o papel do
Judiciário no grande balé institucional da formulação política é acanhado, toda a
teorização jurídica apta a influenciar a decisão do juiz tende a ser formalista ou pautada
57
pelas exigências de justiça apenas no caso concreto .

Ocorre que este Poder Judiciário, exclusivamente reativo, passivo e despreocupado com
as repercussões amplas de suas interpretações, é cada vez menos observável nos
estados de boa parte do Ocidente. O caso norte-americano é muito conhecido, mas a
experiência brasileira das últimas duas décadas é igualmente emblemática para ilustrar
como a mudança no arranjo político cria uma demanda por certo tipo de produção
acadêmica jurídica em constante flerte com as ciências sociais.
58
No Brasil pós-1988, o Poder Judiciário passou da periferia ao centro do arranjo político .
Os tribunais — e o Supremo Tribunal Federal (STF) em particular — foram alçados à
59
condição de Poder Moderador, como bem observou Oscar Vilhena . Assim, o papel de
árbitro dos grandes conflitos institucionais e políticos que historicamente coubera ao
Exército passou a ser ocupado pelo STF. Ao mesmo tempo, o Poder Judiciário acabou
cada vez mais desempenhando um papel relevante no delineamento das políticas
públicas no Brasil — ora negativamente, contrabalançando o excesso, ora positivamente,
contrabalançando a inação; e, nos dois casos, contribuindo decisivamente para a criação
de incentivos (e desincentivos) para toda sorte de atividades. É como se o Judiciário
tivesse sido empurrado — muitas vezes a contragosto, ocasionalmente com certo júbilo
— para a posição de ator relevante, e diversas vezes decisivo, no grande quadro
institucional de formulação da política pública.

Engana-se quem pensa que a interface das ciências sociais com o direito seja, então,
fenômeno apenas norte-americano. Por causa dessa centralidade do Poder Judiciário no
arranjo político brasileiro, multiplicaram-se os estudos sobre o STF, tanto nas faculdades
de direito quanto nos programas de sociologia, história e ciência política. Há também um
aspecto concreto que toca à vida de todos, às vezes, de forma teatral. Tão logo
proferidas, algumas decisões do Supremo migram para os editoriais jornalísticos, para as
pesquisas de opinião, para as redes sociais e para as conversas do dia a dia. Embora a
relevância do STF não seja propriamente nova, sua atual proeminência é incomparável.

Nos dizeres de Oscar Vilhena, vivemos hoje em uma supremocracia: o processo de


expansão da autoridade dos tribunais ao redor do mundo teria ganhado, no Brasil,
60
contornos ainda mais acentuados . Quando Kelsen procurou justificar a necessidade de
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

cortes constitucionais no continente europeu, recorreu a uma argumentação


eminentemente negativa: caberia a elas resguardar a autoridade da Constituição diante
61 62
de leis e atos que desafiassem seu conteúdo . Isso parece ter mudado . O controle de
políticas públicas e a edição de súmulas vinculantes, por exemplo, revelam, também por
aqui, a dissolução das funções estatais preconizadas pelos clássicos da teoria do Estado
63
.

C. O vetor jurídico: a consequência como ligação entre meio jurídico e fim normativo

Evidentemente, este quadro repercutiu também na técnica jurídica. No último século, o


pilar dos sistemas jurídicos ocidentais migrou do direito privado ao direito público.
Concomitantemente, a aplicação direta de princípios — atualmente, reconhecidos como
verdadeiras normas jurídicas vinculantes e autoaplicáveis — tornou-se cada vez mais
64
frequente . A simples descrição “pura” de regras, prescindindo do exame da conduta
humana, e a aplicação do raciocínio lógico-dedutivo ficam prejudicadas nesse novo
contexto.

A aplicação do teste de proporcionalidade para solucionar conflitos entre princípios


65
(entendidos por Alexy como “mandamentos de otimização” , ou seja, normas que
estabelecem que algo deva ser realizado, diante das possibilidades fáticas e jurídicas
presentes, na maior medida possível) incorpora à técnica decisional jurídica elementos
tradicionalmente vistos como “extrajurídicos” e ligados às consequências de diferentes
regimes. Na lição de Humberto Ávila, “[o] postulado da proporcionalidade não se
confunde com a ideia de proporção nas suas mais variadas manifestações”. Em vez
disso:

“[e]le se aplica apenas a situações em que há uma relação de causalidade entre dois
elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de tal sorte que se possa
proceder aos três exames fundamentais: o da adequação (o meio promove o fim?), o da
necessidade (dentre os meios disponíveis e igualmente adequados para promover o fim,
não há outro(s) meio(s) menos restritivo(s) dos direitos fundamentais afetados?) e o da
proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoção do fim
66
correspondem às desvantagens provocadas pela adoção do meio?).”

O problema é que a correta aplicação de princípios mediante o teste de


proporcionalidade depende, em muitos casos, e talvez na maioria deles, de dados
empíricos ou pelo menos de juízos probabilísticos sobre os esperados efeitos concretos
67
de diferentes normas . Assim, a questão distintiva do sistema jurídico relativamente
68
aos demais sistemas — a diferenciação do lícito do ilícito — tem sido respondida não
somente pelo apelo à interpretação de normas abstratas, mas também com fundamento
em juízos de causalidade sobre o efeito das normas no mundo dos fatos. Esta é,
anote-se, uma observação sobre a prática e a praxe da operação do direito no Brasil: um
dado sociológico e não uma proposição filosófica.

IV. As consequências como condição de incidência normativa

A utilização do saber científico na aplicação do direito está longe de ser fenômeno


recente. Por certo, é lição clássica de história do direito que, na Idade Média, a
averiguação da ocorrência ou não de determinados fatos era delegada a instâncias
sublimes, mediante a utilização dos chamados ordálios ou juízos divinos. A sobrevivência
na prova — a do ferro em brasa ou da água fervendo, ordálios unilaterais, ou em duelo,
ordálio bilateral — indicaria a inocência do acusado relativamente ao ato criminoso
69
imputado . Entretanto, com o avançar do pensar racionalista — e dos correlatos
avanços da prática jurídica para acomodar meios mais sofisticados e racionais de prova
—, o saber científico foi crescentemente chamado para auxiliar na verificação da
ocorrência de fatos que integram o suporte fático da norma.

A.. O papel das ciências na determinação dos fatos que integram o suporte fático

A primeira e mais rudimentar espécie de utilização do saber científico na aplicação do


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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

direito refere-se à averiguação concreta de fatos que constituem o suporte fático (


70
Tatbestand) de normas jurídicas . A ciência é aqui convocada para determinar a
verificação ou não, no mundo da vida, de fato previsto, in abstracto, pela regra jurídica.
Exemplificativamente, o médico legista opinará como perito, na fase instrutória do
processo, sobre a ocorrência, o horário e a causa do evento morte, esta última elemento
do suporte fático de diversas regras jurídicas de direito penal e sucessório, por exemplo.
O saber técnico do engenheiro é igualmente considerado a fim de determinar-se a
existência de erro de cálculo na formulação de projeto de construção, sendo este último
elemento hábil à configuração de culpa e do nexo causal como requisitos para a
responsabilidade civil do construtor pela queda de um prédio (art. 186 do Código Civil
(LGL\2002\400)).

Nesse sentido, aos avanços das ciências duras e à oferta de testes científicos, a baixo
custo, corresponde um aumento por sua demanda na esfera jurídica. As evidências
científicas, assim, paulatinamente substituíram as presunções absolutas (jure et de jure)
antes impostas por regra legal em época na qual os benefícios da produção de prova
eram certamente superados por seus custos. Para ilustrar, sob o Código de Hamurabi,
que vigeu no século XVIII a.C. na antiga Mesopotâmia, se um construtor edificasse uma
casa para homem livre e a casa caísse causando a morte do dono da casa, o construtor
71
poderia ser morto . Esta pena fazia parte do esquema de regulação vigente à época e,
presumivelmente, estava associada à ideia de que um “arquiteto” nesta situação
provavelmente tomaria muito cuidado para evitar que a casa caísse. A ideia de
responsabilização baseada na culpa — e, para se averiguar a culpa, é preciso relativa
sofisticação técnica — só viria muitos séculos depois com a releitura humanista da ética
72
aristotélica .

A mudança no tratamento jurídico e as presunções relacionadas à filiação também


ilustram essa tendência. Ao passo que, sob a égide do Código Civil de 1916 (arts.
338-340), vedava-se ao marido contestar a paternidade de filho de sua esposa, desde
que com ela houvesse coabitado “nos primeiros cento e vinte e um dias, ou mais, dos
trezentos que houverem precedido ao nascimento do filho”, tal óbice foi expressamente
73
afastado pelo Código Civil de 2002 . De forma semelhante, desapareceu o papel do
casamento como fonte de legitimação e de reconhecimento jurídico da prole, sendo
constitucionalmente garantido o tratamento igualitário a todos os filhos (Constituição
Federal, art. 226, § 6o). Para além de razões de ordem moral, uma razão determinante
para a transformação é, sem dúvida, o avanço da ciência e da técnica —
especificamente, a ampla disponibilidade, a baixo custo, do exame de DNA apto a
74
determinar a filiação natural .

Ressalte-se, porém, que esse primeiro estágio de cientificização da aplicação do direito


não trouxe repercussões significativas para o funcionamento do direito e o ofício de seu
operador. Afinal, o saber científico acionado é, sem exceção, fornecido por peritos em
outras áreas do conhecimento, em momento processual oportuno. O advogado pode,
sem maiores hesitações, informar seu cliente sobre as consequências jurídicas de um
resultado positivo ou negativo de um exame de DNA. Da mesma forma, uma vez
produzida a prova técnica, o silogismo judicial opera de modo habitual.

B.. O papel da ciência quando a consequência de um fato integra o suporte fático

Um segundo estágio, com implicações mais profundas, refere-se à crescente adoção de


normas cujo suporte fático inclui não apenas a ocorrência de um fato pretérito,
considerado de forma estática, mas as consequências efetivas desse fato. Aqui a ciência
(social) — sobretudo a economia — é chamada a examinar as consequências positivas
ou negativas de um dado fato ou conduta, que, por sua vez, determinará a incidência ou
não da norma. O direito concorrencial comparado fornece-nos profícuo exemplo desta
nova técnica regulatória.

No passado, o direito antitruste apresentava regras claras (as chamadas per serules do
direito norte-americano) que caracterizavam como ilícitas determinadas condutas.
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Assim, no período de 1911 a 2007, as cláusulas contratuais em contratos de distribuição


que fixavam preço mínimo para a revenda de determinado produto eram consideradas
ilegais no direito norte-americano. Mais recentemente nos Estados Unidos — e hoje
igualmente no Brasil e na União Europeia —, adota-se um regime que repudia o controle
formal (legalista) implícito nas regras per se. Em vez disso, a ilicitude ou não do arranjo
dependerá dos seus presumíveis (ou comprovados, a depender do caso) efeitos
concretos pró ou anticompetitivos, conforme o poder de mercado empiricamente
verificado das empresas em questão. Trata-se da chamada “regra da razão” (rule of
reason), na expressão norte-americana, referida pelo direito europeu, de forma mais
75
explicativa, como “effects-based analysis” .

Assim como o avanço da genética conduziu ao abandono de presunções em matéria de


direito de família, o progresso da economia permitiu a eliminação de presunções
absolutas no direito concorrencial. Enquanto o modelo fundado em regras presume as
consequências de determinadas condutas (banindo condutas que tendem a ter efeitos
negativos), a effects-based analysis traz para o processo a discussão sobre a prova dos
efeitos da conduta em cada caso. A fim de determinar a existência ou não de tais efeitos
anticompetitivos que integram o suporte fático da norma, economistas e econometristas
atuam como peritos. Tal mudança, contudo, não é isenta de riscos: no modelo anterior,
a licitude ou não da conduta era previsível ex ante, pois decorria da mera leitura e
interpretação da norma; já no regime atual, a ilicitude decorre de dados e cálculos
complexos apenas compreensíveis pelos especialistas na área, com possível dano ao
ideal da previsibilidade que pauta o Estado de direito.

C. O papel da ciência quando as consequências de uma norma determinam sua aplicação

A verdadeira revolução no papel do jurista — cujas repercussões para o funcionamento


do sistema jurídico ainda não foram suficientemente apreendidas — decorre justamente
de seu papel como aplicador de princípios e implementador de políticas públicas. O fator
diferenciador, relativamente ao tirocínio jurídico tradicional, que subjaz à aplicação de
princípios e aos juízos de proporcionalidade, é justamente a integração das
consequências da norma como elemento que determina a validade ou incidência da
norma no caso concreto, isto é, a norma incidirá ou não a depender de suas presumíveis
consequências futuras.

Nas regras jurídicas tradicionais, os fatos referidos no suporte fático estão no passado.
Assim é no crime de homicídio, para apenas citar um exemplo simplório (“Art. 121.
Matar alguém: Pena — reclusão, de seis a vinte anos”). Radicalmente diferente é a
técnica utilizada na aplicação de princípios, na ponderação dos quais são
necessariamente apreciados os efeitos futuros de um ou outro cenário para, então,
optar-se pela incidência ou não da regra. Tanto assim que, ao pontuar as limitações do
modelo de incidência ponteano à aplicação de princípios jurídicos, observaram os
atualizadores do Tratado de direito privado que — diferentemente das regras, “normas
imediatamente descritivas de comportamento” — “os princípios são normas
imediatamente finalísticas, já que, ao invés de descreverem comportamentos,
estabelecem um ‘estado ideal de coisas’ (isto é, um fim) cuja realização implica a adoção
76
de determinados comportamentos” .

É neste contexto que se faz necessário recorrer às ciências sociais — sobretudo à teoria
dos preços da microeconomia — para prever, com um mínimo de racionalidade, quais
estados de coisas resultarão da aplicação de um ou outro regime jurídico. Exemplo disto
é dado pela decisão do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.946. Nela se
discutia se o art. 14 da Emenda Constitucional 20, de 1998 (LGL\1998\68), que fixava
em R$ 1.200,00 o limite máximo para o valor dos benefícios do regime geral de
77
previdência social, seria constitucional relativamente à licença gestante . O caso é
paradigmático não apenas por reconhecer a inconstitucionalidade da emenda
constitucional (ainda que sem redução de texto), como também por alicerçar sua
fundamentação precisamente nas prováveis consequências deletérias de uma
interpretação literal da norma quanto à posição da mulher no mercado de trabalho.
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Assim observou o Tribunal:

“Na verdade, se se entender que a Previdência Social, doravante, responderá apenas por
R$ 1.200,00 (hum mil e duzentos reais) por mês, durante a licença da gestante, e que o
empregador responderá, sozinho, pelo restante, ficará sobremaneira facilitada e
estimulada a opção deste pelo trabalhador masculino, ao invés da mulher trabalhadora.

Estará, então, propiciada a discriminação que a Constituição buscou combater, quando


proibiu diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão, por
motivo de sexo (art. 7o, inc. XXX, da C.F./88), proibição, que, em substância, é um
desdobramento do princípio da igualdade de direitos, entre homens e mulheres, previsto
no inciso I do art. 5o da Constituição Federal.

Estará, ainda, conclamado o empregador a oferecer à mulher trabalhadora, quaisquer


que sejam suas aptidões, salário nunca superior a R$ 1.200,000, para não ter de
78
responder pela diferença.”

A decisão de conferir interpretação conforme a Constituição, excluindo a licença gestante


do alcance da regra do art. 14 da Emenda Constitucional 20, de 1998 (LGL\1998\68),
deveu-se à percebida falta de adequação entre meio jurídico (limitação do pagamento da
licença-maternidade pela previdência social, transferindo-se o respectivo ônus ao
empregador) e o fim normativo consagrado pelo Texto Maior de combater a
discriminação à mulher no mercado de trabalho. Nesse contexto, conclui a Corte que, “à
falta de norma constitucional derivada, revogadora do art. 7o, XVIII [que consagra
“licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e
vinte dias”], a pura e simples aplicação do art. 14 da E.C. 20/98, de modo a torná-la
insubsistente, implicará um retrocesso histórico, em matéria social-previdenciária, que
79
não se pode presumir desejado” .

Vejamos outro exemplo: a decisão do STF que discutiu a compatibilidade entre a


penhorabilidade do bem de família do fiador, prevista pelo art. 3o, VII, da Lei 8.009, de
1990 (LGL\1990\21), e a garantia do direito à moradia prevista pelo art. 6o da
Constituição Federal, com a redação conferida pela Emenda Constitucional 26, de 2000
(LGL\2000\205). Segundo o voto vencedor, de relatoria do Ministro Cezar Peluso, que
reconheceu a constitucionalidade da regra, “os proprietários no Brasil são poucos”,
justificando-se, assim, o “estímulo à habitação arrendada” presumivelmente promovido
pela regra questionada. Conclui, então, que a eventual declaração da
inconstitucionalidade do referido dispositivo, “romperia (sic) equilíbrio do mercado,
despertando exigência sistemática de garantias mais custosas para as locações
residenciais, com consequente desfalque do campo de abrangência do próprio direito
80
constitucional à moradia” .

A decisão, portanto, não somente alude a fatos da realidade social fora do alcance
imediato da norma em questão (por exemplo, a proporção de brasileiros que são
proprietários de imóveis), mas também tira ilações de causalidade entre a regra de
penhorabilidade do bem de família do fiador e a operação do mercado de locações. É
bem verdade que nem sempre o STF ou outros tribunais do país utilizam expressamente
a retórica da lei como mecanismo de “estímulo” a determinados comportamentos, tal
qual a decisão mencionada. Contudo, com frequência se atingem os mesmos objetivos
pelo vocabulário da “proporcionalidade” — e é talvez por isso que ainda não se tenha
refletido de forma cuidadosa sobre como lidar com as afirmativas empíricas controversas
81
suscitadas por este tipo de exame .

É certo, porém, que semelhante técnica de decisão gera demanda por estudos científicos
— teóricos, empíricos ou experimentais — nos moldes das demais ciências. Caso tivesse
sido detectado, por exemplo, que a penhorabilidade do bem de família do fiador não
apresentava qualquer influência positiva no mercado de locações de modo a promover o
acesso à moradia de não proprietários, seria possível que a Corte tivesse decidido de
forma diferente. As decisões suprarreferidas — relativas à Lei Maria da Penha, à Emenda
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Constitucional 26 e à Lei do Bem de Família – são meramente ilustrativas das


considerações consequencialistas, não raro amparadas em raciocínio econômico, de que
se tem valido o STF.

D. Judiciário e consequencialismo

Falamos em consequencialismo aliado a raciocínio econômico, duas ideias pouco


estudadas no Brasil, e, por isso, aqui cabe uma advertência: o raciocínio
consequencialista é muitas vezes econômico em um sentido bem específico, a saber, no
sentido de que os precedentes judiciais criam incentivos. Mas o que são, afinal,
82
incentivos? Incentivos são preços implícitos. Nos mercados, indivíduos procuram
maximizar seus benefícios realizando escolhas que minimizem seus custos e maximizem
seus benefícios. Por exemplo, em geral, os consumidores irão consumir menor
quantidade de um bem quando o preço subir, e maior quantidade quando o preço cair.
Ora, o ponto, então, é o de que precedentes judiciais criam incentivos justamente
porque estabilizam expectativas sobre as regras do jogo. E, ao fazê-lo, alteram os custos
relativos de diferentes condutas. Tornam, portanto, certas condutas mais prováveis que
outras. É deste modo que a jurisprudência afeta condutas futuras da coletividade.

De fato, há hoje no Brasil uma multiplicidade de casos em que a Corte tece juízos sobre
os prováveis efeitos concretos de diferentes normas para, então, concluir sobre a sua
compatibilidade ou não com a ordem constitucional brasileira. Bem ilustram esse método
as decisões do STF sobre (i) a inconstitucionalidade da Lei 8.620/1993 (LGL\1993\28),
que responsabilizava o sócio de responsabilidade pelo inadimplemento de contribuições
83
previdenciárias pela sociedade, por violação ao princípio da livre-iniciativa ; (ii) a
constitucionalidade do dispositivo da lei de falências que impõe limites quantitativos à
84
prioridade concedida às dívidas trabalhistas ; (iii) a exigência constitucional de
85
estender-se os efeitos jurídicos da união estável às uniões homoafetivas ; (iv) a
86
constitucionalidade da adoção de cotas raciais por universidades brasileiras ; e até
87
mesmo (v) a inconstitucionalidade da criminalização de aborto de feto anencéfalo .
Cada um desses casos reflete seja a utilização efetiva, seja a potencial demanda por
estudos que fundamentem ou neguem os substratos fáticos e os juízos de causalidade
realizado pela Corte como fundamento à sua decisão nos casos concretos.

Em suma, tudo que se disse anteriormente significa que o Poder Judiciário de muitos
países, incluindo-se o Brasil, está envolvido até o pescoço com a formulação de políticas
públicas. E assim — quer gostem, quer não gostem, quer o façam aberta ou
veladamente — seus integrantes estão irresistivelmente impingidos a pensar seriamente
sobre relações de adequação entre meios jurídicos e fins normativos, relações essas que
não podem ser obtidas somente com a filosofia, a lógica, a filologia ou a gramática.
Como se vê, trata-se de um Poder Judiciário, ousamos dizer, ávido por estudos que
articulem a interpretação do texto da lei com suas prováveis repercussões práticas.

É bem verdade, por sua vez, que as implicações do novo modelo de aplicação do direito
em muito ultrapassam a transformação da produção acadêmica em direito para atingir,
igualmente, o funcionamento do processo judicial. No sistema tradicional de
interpretação silogística, aplicam-se regras a fatos pretéritos, os quais são objeto da fase
instrutória e de eventual audiência de instrução com a oitiva das partes e testemunhas.
Tal como se dá com a literatura jurídica, são visíveis, embora ainda incipientes, no
âmbito processual, as mudanças no sentido da adequação dos procedimentos ao papel
central do Poder Judiciário na formulação de políticas públicas. Exemplo notável de um
primeiro passo rumo a tal adaptação teve lugar com a previsão legal e a crescente
88
realização de audiências públicas — mecanismo típico de órgão formulador de políticas
públicas — pelo STF em sede de ação direta de constitucionalidade ou
inconstitucionalidade, um dos fóruns para a influência da produção do jurista-cientista
89
social .

Ressalte-se, ademais, que a ênfase anteriormente conferida à incorporação da produção


do jurista-cientista social pelo Poder Judiciário deve-se ao fato de ser este órgão,
Página 14
Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

presumivelmente, o último reduto da aplicação do direito desligada de uma preocupação


com os efeitos fáticos da decisão. Este fenômeno é ainda mais acentuado — e, portanto,
a correspondente produção acadêmica ainda mais demandada — em outros órgãos
estatais, como as agências reguladoras e demais autarquias. Embora o Brasil não
consagre a exigência de elaboração formal de uma análise de custo-benefício (
cost-benefit analysis) previamente à implementação de instrumentos normativos em
90
sede administrativa, tal como ocorre nos Estados Unidos , a versão nacional mais
branda — a chamada análise de impacto regulatório — vem progressivamente ganhando
91
espaço . A par disso, as decisões de agências reguladoras brasileiras — conquanto
formalmente adstritas à aplicação da lei e da normatização infralegal — lançam mão com
grande frequência de argumentos relativos aos efeitos concretos de sua decisão.

Os exemplos nesse sentido são tantos que inviabilizam uma análise mais detida.
Vejamos, a título ilustrativo, a decisão do Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários
(CVM) no paradigmático caso Tractebel. Ao interpretar o art. 115, § 1º, da Lei 6.404, de
92
1976 (LGL\1976\12) (Lei das Sociedades por Ações), a Comissão concluiu que basta a
configuração do conflito formal de interesses entre o controlador e a companhia para
93
obstar àquele o exercício do direito de voto em assembleia . Para além de aludir ao
texto legal do referido dispositivo, o diretor relator referiu que, em busca de “uma
solução ótima para o problema em questão”, a análise começa por “avaliar os
incentivos”. Diante do “risco ex ante de que ele não se comporte segundo os interesses
dos minoritários”, conclui que, “se nenhuma medida for tomada para alinhar interesses”,
“o minoritário deixará de contratar com a companhia”, pois “sua riqueza poderá ser
transferida para outra empresa do controlador”.

Além disso, a decisão expressamente rechaça o argumento contrário de que “tal


restrição de voto teria efeitos deletérios na dinâmica empresarial e na formação de
contratos entre as partes interessadas”, afirmando inexistir “comprovação empírica
deste argumento, nem embasamento teórico”. Citou, ainda, o estudo dos economistas
Djankov e colaboradores, o qual propõe o mecanismo de restrição de voto como forma
94
eficiente de proteção da minoria acionária . A utilização do raciocínio econômico e de
estudos empíricos que tratam dos efeitos de regras jurídicas como incentivos dificilmente
poderia ter sido estampada de forma mais clara.

V. O papel da doutrina jurídica como não ciência

Até aqui, argumentamos que o surgimento do que se poderia chamar de jurista


“cientista social” explica-se pela transformação dos modelos de Estado e de aplicação do
direito nos últimos 50 anos. A pergunta que ora se põe é a seguinte: a produção jurídica
nos moldes das ciências sociais irá absorver as demais modalidades de produção
95
jurídica? Estará a doutrina jurídica , tão bem representada por manualistas e
comentaristas, com seus dias contados? A resposta é, a nosso ver, negativa. Apesar da
crescente demanda por trabalhos que examinem os efeitos das normas jurídicas no
mundo real, o jurista enquanto formulador de doutrina não falsificável (logo, livre do
método científico e da empiria, e, portanto, propriamente dogmática) deve subsistir.

A transposição para o direito do espírito científico — hipótese, experimentação,


verificação, conclusão — tem limites muito claros, e a produção doutrinária não científica
preenche um papel fundamental. Em primeiro lugar, a divisão do trabalho e a
especialização são relevantes. Em virtude da sua formação, os juristas não possuem, em
princípio, vantagem comparativa ao realizarem trabalho empírico. É bem verdade que
seu contato direto com as entranhas da burocracia estatal e seu manejo diário de
ferramentais institucionais como contratos e ações judiciais lhes dá acesso e lhes
despertam a curiosidade para questões e temas que dificilmente ocorreriam aos
economistas e sociólogos. Ainda assim, a desvantagem do ponto de vista do aparato
metodológico pode facilmente transformar bons juristas em maus economistas ou maus
sociólogos. Um ponto adicional é que a própria amplitude com que se produz doutrina
não científica em direito dá, por si só, a dimensão da sua importância; na terminologia
econômica, chamaríamos isso de preferência revelada pelo mercado consumidor (e
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discurso sobre o método

96
estamos aqui a tratar, claro, do “consumo” de doutrina jurídica não científica) .

É possível, contudo, caminhar um pouco mais na análise deste “apetite” por doutrina
jurídica entre os profissionais ligados à feitura, interpretação e aplicação do direito. Ao
contrário do que possa parecer, os problemas da doutrina jurídica como não ciência são
comuns àqueles observáveis na doutrina econômica. O ponto é sutil e talvez
contraintuitivo, porque é bastante comum pensar-se na economia como ciência e no
direito como dogma. Esta simplificação, contudo, é enganosa.

Desde a obra clássica de John Neville Keynes (pai de Maynard Keynes, seu filho ilustre)
97
já se entende que a economia tem três dimensões : uma dimensão positiva
(propriamente científica), uma dimensão normativa (ramo da ética aplicada) e uma arte
98
(sua aplicação) . Dizer que a economia tem uma dimensão científica significa que o seu
objeto de estudo pode — em princípio, pelo menos — ser dominado pela técnica e pelo
cálculo. Dizer que possui uma dimensão ética significa reconhecer que existem
problemas que não se resolvem mesmo que dominássemos completamente as relações
99
de causa e efeito no mundo . Aqui a formulação radical de Tolstoi é esclarecedora: “A
ciência carece de sentido, pois não tem resposta alguma para a única questão que nos
100
interessa — ‘Que devemos fazer? Como devemos viver?’” Por fim, dizer que a
economia tem uma dimensão de arte significa que a utilização de ideias econômicas na
formulação e execução da política pública não é, nem nunca foi, um empreendimento
propriamente científico. E há mais: no campo da arte, ao contrário da ciência, não existe
nenhum progresso.

Um exemplo utilizado por Neville Keynes — estamos falando de algo escrito em 1891 —
ilustra bem esta tripartição da economia. Consideremos o fenômeno do pagamento de
101
juros . Uma questão, dizia Neville Keynes, é entender por que se pagam juros e que
fatores determinam a sua taxa: esta é uma investigação positiva, logo uma questão para
a ciência econômica. Outra questão diz respeito ao que seja uma taxa de juros justa
(aquela que reflete o custo de oportunidade? Ou será que certas pessoas deveriam
poder pagar juros inferiores por critérios de justiça distributiva? etc.). Esta questão não
é científica, mas diz respeito ao que Neville Keynes chamou de “ética da economia
102
política” . Um terceiro problema, distinto dos dois anteriores, é o debate aplicado (em
vez de apenas teórico) sobre se o Estado deve interferir sobre acordos privados acerca
do pagamento de juros, e, em caso positivo, que meios deve empregar para que o
103
objetivo ético desejado possa ser atingido, pelo menos aproximadamente . A
formulação de preceitos econômicos (economic precepts) desse tipo é objeto da “arte da
economia política”.

É possível dar ainda mais concretude a tais ideias ilustrando-as com um exemplo
familiar. Consideremos as crises econômicas do mundo em desenvolvimento das
décadas de 1980 e 1990. Um diagnóstico científico foi o de que os países em crise
haviam sido excessivamente protecionistas e seus governos demasiadamente
interventores e perdulários (evidentemente, havia diagnósticos científicos bastante
distintos, até mesmo opostos, como é comum nas ciências sociais). Um problema ético
imbricado com este diagnóstico era se os apertos fiscais alegadamente necessários para
melhorar a condição econômica desses países seriam justos com suas populações
pobres. Um terceiro problema — nem científico nem ético, mas apenas aplicado — era
encontrar a doutrina econômica própria para lidar com as crises econômicas. Como se
sabe, uma das doutrinas econômicas mais influentes no período — composta por dez
104
mandamentos claros e inteligíveis chamados de “Williamson’s Ten Points” — foi
aquela apelidada de “Consenso de Washington”.

De fato, as doutrinas econômicas receberam, ao longo dos séculos, apelidos não menos
curiosos do que muitas doutrinas jurídicas muito comuns até hoje. Um exemplo
emblemático pode ser encontrado na conhecida doutrina do laissez-faire, laissez-passer,
ainda cunhada pelos fisiocratas franceses. Embora menos em voga em tempos recentes,
acostumamo-nos aqui a ouvir falar da “industrialização por substituição de importações”,
popularíssima no Brasil depois da Segunda Guerra Mundial, e de seu desdobramento
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discurso sobre o método

posteriormente à crise econômica de fins da década de 1970 — “exportar é o que


importa”. Outras doutrinas econômicas entraram para a história com termos mais
técnicos, como o mercantilismo, o socialismo, o desenvolvimentismo e assim por diante.
Cada um desses pensares econômicos continha um diagnóstico que se propunha
científico, uma filosofia ética e um conjunto de proposições de caráter prático, do tipo
regras de bolso, que compunham sua doutrina.

E anote-se: essas proposições práticas — por exemplo, no caso de Consenso de


Washington, privatizar, proteger direitos de propriedade, adotar o câmbio flutuante,
redirecionar o gasto público para os setores de saúde e educação etc. — jamais
resultaram, nem poderiam ter resultado, de um juízo puramente científico. Ao contrário,
traduziam uma composição pragmática entre visões sobre o funcionamento do mundo
(daí a inspiração científica), considerações de natureza ética (daí as preocupações com a
justiça) e conveniência sociopolítica (como sói ser no campo da política pública).

Dissemos tudo isso principalmente para mostrar que a economia, “rainha das ciências
105
sociais” , possui doutrina não científica — e acrescentamos: possui doutrina não
científica da mesmíssima forma que o direito. Os motivos pelos quais a economia
necessita, ela também, de doutrina não científica, agora já é possível explicar, se
relacionam a cada uma das três dimensões do pensar em economia, como segue.

Primeiro, a economia, na sua vertente científica, ainda está em situação de atraso


relativo ante as ciências ditas duras. Dito de forma simples, ainda estamos bastante
106
longe de termos modelos econômicos preditivos confiáveis . Isto vale tanto para os
modelos relacionados diretamente ao objeto básico da economia — produção,
distribuição e consumo de bens e serviços — quanto para os modelos econômicos que se
valem da rational choice (ou teoria da escolha pública) aplicada a variáveis institucionais.

Os motivos para tanto são diversos. Dizem respeito, ao menos em parte, à existência de
instituições informais (como normas sociais de comportamento, códigos de conduta,
convenções, valores, crenças, tabus, costumes, religiões etc.) cujo funcionamento não é
ainda plenamente compreendido. É por isso que, como explica Douglass North, a
elaboração de uma teoria das instituições requereria uma teoria sobre a formação das
107
crenças humanas . O problema, contudo, é que a humanidade ainda não possui uma
boa teoria das crenças humanas. Assim, teorias sobre incentivos e consequências
continuarão sendo, na melhor das hipóteses, aproximações. Na física e nas demais
ciências hard, os modelos são igualmente aproximações, mas contam com a significativa
vantagem dos experimentos, os quais tendem a ser impraticáveis (ou pouco
representativos) no caso das ciências sociais. Se as aproximações da ciência econômica
são, em termos do seu poder preditivo, equiparáveis aos modelos da física, é objeto de
discussão, mas não nos parece ser o caso.

Segundo, ainda que se tivesse uma ciência dos meios adequada — isto é, ainda que
fosse possível modelar adequadamente as coisas do mundo econômico e, portanto,
saber como de fato o mundo é —, nada saberíamos sobre como o mundo deveria ser. Na
108
proposição clássica de Hume, de um “is” nunca se pode derivar um “ought to” . Ora, o
universo da pesquisa empírica é o da tentativa de descrição de como o mundo é; mas o
universo do direito trata de como o mundo deveria ser. E assim já se vê que, mesmo
que se formule — cientificamente — uma proposição sobre o funcionamento do mundo,
só por uma perversão da lógica se poderia desde logo dizer algo sobre como o mundo
deveria ser.

Aqui o percurso intelectual de Richard Posner, arauto da Law & Economics, é


109
emblemático . No início da década de 1980, Posner escreveu um livro —
provavelmente seu pior livro — cujo título não deixa dúvidas: A economia da justiça (The
110
economics of justice) . A tese do livro era a de que a eficiência deveria ser um
horizonte ético adequado para o direito e a prática institucional de um modo geral.
Verdade que Posner ressalvou que tal tese somente faria sentido prático no contexto
norte-americano, mas ainda assim de toda parte vieram ataques à tese. Foram precisos
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discurso sobre o método

dez anos de intenso debate com diversos adversários para que Posner finalmente
reconhecesse seu erro, o que foi feito em Problemas de filosofia do direito (The problems
111
of jurisprudence, de 1990) . Os contornos deste debate importam menos; sua
implicação é o que realmente interessa: não há, nem jamais poderia haver, razão
científica para justificar a eficiência como um ideal superior aos demais.

Terceiro, nenhuma posição prática pode ser justificada cientificamente, e as razões para
tanto são profundas e variadas. Duas delas já foram vistas: o mundo em que impera a
esperança (e talvez a crença) na ciência é também o mundo da perda das ilusões em
uma ordem teleológica simplesmente dada e cujos fins estão fora de questão. Nas
palavras de Weber, este é o mundo do “desencantamento”, porquanto “as diferentes
112
ordens de valores do mundo estão entre si numa luta sem solução possível” . A outra
razão é justamente a incapacidade da ciência social de permitir que possamos
abandonar o fardo das nossas ideologias, substituindo-o por uma bem mais elegante
atividade de processamento de dados. E isto não é tudo porque, para além dos
problemas de valores e cálculo. há também a política, isto é, o jogo de interesses.

Todo o quadro supramencionado nos conduz ao problema da radical incerteza sobre o


mundo, e assim já é mais fácil entender por que há hoje, e sempre haverá, demanda por
doutrinas não científicas. Um cientista, seja ele de que tipo for, pode se dar ao luxo de
produzir conhecimento sem nenhuma aplicação prática imediata. (Se a física teórica
tivesse de manter relevância prática a cada avanço, os conhecidos experimentos mentais
de Einstein seriam pura perda de tempo!) O pensar teórico em direito, contudo, tem a
particularidade de ter por objetivo a lei — e a lei há de ser aplicada.

Retomamos, então, o que dissemos antes. Historicamente, reservou-se ao direito o


papel de manter a ordem. Nos últimos séculos, em muitos lugares, inclusive no Brasil,
agregou-se também um caráter progressivista, isto é, a função não apenas de manter a
ordem, mas também de impulsionar a melhora, a mudança, o desenvolvimento, o
avanço. O novo contexto exige do jurista um pensar para frente, uma visão prospectiva
sobre o incentivo e sobre a pertinência entre meio e fim.

O juiz tem o imperativo de decidir o caso concreto. Ele deve agir com prudência e deve
sopesar os valores envolvidos. E, de mais a mais, o juiz não está de modo algum livre
113
para substituir as ideias da comunidade pelas suas próprias . Por isso, no contexto de
Estado atual, ao interpretar e aplicar a lei, é necessário sopesar as prováveis
consequências das diversas interpretações que o texto permite — daí o input do pensar
científico. Mas isto não é tudo. É preciso atentar também para a importância de se
defender os valores democráticos, a Constituição, a linguagem jurídica como um meio de
comunicação efetiva e a relativa separação de poderes. O decisor é assim, sempre e
inevitavelmente, um artista, jamais um cientista. E a doutrina não científica continuará
sendo, por muito tempo, e talvez até o fim dos tempos, uma ferramenta das mais
convenientes para este decisor. Seu referencial não é a verdade, mas sim a clareza, a
persuasão, a significância e a aplicabilidade.

VI. Conclusão

No Brasil, há sinais de transformação no método e estilo da produção jurídica. Embora


esta pesquisa “cientificizada” em direito siga pontualmente cânones gestados no exterior
— e nem sempre o seu conteúdo seja útil, idôneo ou rigoroso —, seria impróprio pensar
114
que estas seriam simplesmente novas “ideias fora do lugar” . Muito ao contrário, a
empiria e a aproximação com outras ciências revelam particularidades e circunstâncias
próprias do atual estágio do direito brasileiro.

É comum imaginar-se que evoluções deste tipo decorram apenas de desenvolvimentos


internos à academia, mas não parece ser este o caso. Para ficarmos com uma metáfora
cara aos economistas, aqui defendemos que a mudança no padrão de reflexão jurídica
está ligada menos a fatores de “oferta” (notadamente, a competição entre os
“produtores” de análise jurídica que buscam sofisticar suas análises de modo a torná-las
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discurso sobre o método

mais aceitas ou influentes) e mais a fatores de “demanda” (em particular, padrões


ideológicos, políticos e jurídicos que geram “consumidores” interessados por análise
jurídica com viés consequencialista).

Essa discussão tem paralelos com outros ramos do saber. Por exemplo, os teóricos
explicam a inovação a partir de duas teorias rivais: para os adeptos do
115
technological-push, a inovação gera sua própria demanda ; já para os adeptos do
116
demand-pull , é a demanda do mercado que determina a direção da inovação.
Também na macroeconomia se põe dilema parecido: para engendrar o crescimento
econômico a melhor tática é reduzir as barreiras à produção ou incentivar o consumo?
Também assim se dá com a importação do método das ciências sociais para a produção
acadêmica em direito.

Este texto buscou mostrar que, para além dos fatores de oferta, que se põe no plano da
competição entre acadêmicos, há também importantes fatores de demanda: em primeiro
lugar, o triunfo do progressivismo na política (e, logo, o advento do Estado regulatório);
em segundo lugar, o deslocamento do Poder Judiciário para o centro do arranjo político
no modelo de Estado de diversos países; e, em terceiro lugar, a modificação na técnica
jurídica com a crescente utilização de princípios jurídicos em vez de regras jurídicas.

Adiante, no entanto, pusemo-nos a pensar sobre os limites do método científico no


direito. Ali tomamos a comparação entre a economia — aquela que se pretende a mais
científica das ciências sociais — e mostramos que, tanto na economia quanto no direito,
há uma grande demanda por doutrina como não ciência. Os economistas que não
atentam para este fato parecem atuar como o proverbial “jovem” na carta de Hélio
117
Pellegrino a Fernando Sabino :

“O homem, quando jovem, é só, apesar de suas múltiplas experiências. Ele pretende,
nessa época, conformar a realidade com suas mãos, servindo-se dela, pois acredita que
ganhando o mundo, conseguirá ganhar-se a si próprio. Acontece, entretanto, que
nascemos para o encontro com o outro, e não o seu domínio.”

Celebremos, portanto, a convergência metodológica — parcial, rude, às vezes


deselegante — entre o direito e as ciências sociais. Mantenhamo-nos com espírito
jovem; mas fujamos da infantilidade.

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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

1 *Artigo originalmente publicado em: Revista de Direito Administrativo, v. 262, p.


95-144, 2013.

2 Na filosofia da ciência, a falseabilidade é a característica básica para tornar uma


proposição propriamente condizente com o método científico. Uma proposição (ou
hipótese) falseável é aquela que, se for falsa, então a observação e a experimentação
irão, em algum momento, demonstrar a falsidade. Por exemplo: a proposição todos os
cisnes são brancos é falseável porque é possível encontrar um cisne de outra cor que
mostrará a falsidade da proposição. Já a proposição todos os homens são seres humanos
é não falseável e sim definicional (ou tautológica), porque nenhuma observação do
mundo poderá demonstrar que existe algum homem não humano. O grande problema
nas chamadas ciências sociais é que muitas das suas proposições são teoricamente
falseáveis, mas não o são na prática. Por exemplo, a proposição a economia de mercado
aumenta a eficiência econômica é teoricamente testável, mas as variáveis são tantas a
ponto de tornar a proposição, na prática, não falseável.

3 Este fenômeno é ainda mais acentuado nos Estados Unidos, país no qual, desde o
movimento do realismo jurídico do início do século XX, a análise dogmática tradicional
paulatinamente perdeu seu inicial prestígio. A esse respeito, ver, a título meramente
exemplificativo, POSNER, Richard. The decline of law as an autonomous discipline:
1962-1987. Harvard Law Review, n. 4, v. 100, p. 761-780, 1987; EDWARDS, Harry T.
The growing disjunction between legal education and the legal profession. Michigan Law
Review, n. 91, p. 34-70, 1992-1993; ULEN, Thomas. A Nobel Prize in legal science?
Theory, empirical work, and the scientific method in the study of law. University of
Illinois Law Review, n. 4, p. 875-920, 2002; COOTER, Robert. Maturing into normal
science: the effect of empirical legal studies on law and economics. University of Illinois
Law Review, n. 5, p. 1475-1483, 2011.

4 Ver, por exemplo, a European Association of Law & Economics, que no ano de 2012
realiza seu 29o encontro anual. Disponível em: [www.eale.org].

5 Vê-se, a título exemplificativo do fenômeno no Brasil, a instituição da Associação


Brasileira de Jurimetria, em 2009, com o objetivo de “investigar e incentivar a aplicação
da estatística e da probabilidade no estudo do direito e de suas instituições” (Disponível
em: [www.abjur.org.br/quem-somos-historico.php]. Acesso em: 26.08.2012.); a recente
criação, pela Direito GV, do Centro de Pesquisa Jurídica Aplicada, o qual visa a “produzir
dados consistentes no exame quantitativo do desempenho de órgãos e instituições
básicos do Estado de Direito, na análise qualitativa de decisões e opiniões, e outras
formas adequadas de diagnóstico da realidade social” (Disponível em:
[www.direitogv.com.br/centro-pesquisa-juridica-aplicada]. Acesso em: 26.08.2012.); a
iniciativa da FGV Direito Rio com o projeto “Supremo em Números”, cujo objetivo, “em
oposição ao modelo de análise qualitativa mais difundido, é fundamentar quantitativa e
estatisticamente discussões sobre a natureza, a função e o impacto da atuação do STF
na democracia brasileira” (Disponível em: [www.supremoemnumeros.com.br/sobre/].
Acesso em: 26.08.2012). Vê-se, também, a atuação do Conselho Nacional de Justiça, ao
qual, por mandamento constitucional, compete “elaborar semestralmente relatório
estatístico sobre processos e sentenças prolatadas, por unidade da Federação, nos
diferentes órgãos do Poder Judiciário”, assim como “elaborar relatório anual, propondo
as providências que julgar necessárias, sobre a situação do Poder Judiciário no País e as
atividades do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Supremo
Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da
sessão legislativa” (Constituição Federal, art. 103-B, § 2o, VI e VII).

6 Como exemplos de fóruns especializados, vê-se o Colóquio de Estudos Empíricos,


promovido pela FGV Direito Rio, já em sua quarta edição, e o Encontro de Pesquisa
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Empírica em Direito, cuja segunda edição ocorreu em setembro de 2012 na Faculdade de


Direito de Ribeirão Preto da USP. Para exemplos de trabalhos acadêmicos nesta
temática, ver notas 19-20 infra.

7 A interdisciplinaridade é muitas vezes tratada como a seara do “direito e...”, com o


segundo substantivo variando a depender da disciplina em questão. Na academia
norte-americana a obra de referência sobre o tema é GALANTER, Marc; EDWARDS, Mark
Alan. Law and society & law and economics: common ground, irreconcilable differences,
new directions: introduction: the path of the law ands. Wisconsin Law Review, n. 1.997,
v. 3, p. 375-389, 1997.

8 Destaca-se, nesse sentido, a expansão do movimento de Direito e Economia, cujo


respectivo congresso anual brasileiro se encontra em sua quinta edição (Disponível em:
[www.abde.com.br]).

9 Para uma exceção a essa regra, no que toca ao exame das justificativas para o “estudo
empírico da dogmática”, ver RODRIGUEZ, José Rodrigo. Pesquisa empírica e estado de
direito: a dogmática jurídica como controle do poder soberano. Disponível em:
[www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/manaus/teoria_do_direito_jose_rodrigo_rodriguez.pdf].
Acesso em: 26.08.2012. Ver também GRECHENIG, Kristoffel; GELTER, Martin. A
divergência transatlântica no pensamento jurídico: o direito e economia norte-americano
vs. o doutrinalismo alemão. In: SALAMA, Bruno M. (Org.). Direito e economia: textos
selecionados. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 325-394. Nos Estados Unidos, berço do mais
recente desenvolvimento dos estudos interdisciplinares, há alguma bibliografia avaliando
o fenômeno. Ver, por exemplo, COLLIER, Charles W. The use and abuse of humanistic
theory in law: reexamining the assumptions of interdisciplinary legal scholarship. Duke
Law Journal, n. 41, 1991; POSNER, Richard A. Legal scholarship today. Harvard Law
Review, n. 115, 2002; RUBIN, Edward L. On beyond truth: a theory for evaluating legal
scholarship. California Law Review, n. 80, 1992; EDWARDS, Harry T. The growing
disjunction between legal education and the legal profession. Michigan Law Review, n.
91, 1992.

10 Cf. SCHWARZ, Roberto (Org.). Ao vencedor as batatas. São Paulo: Duas Cidades,
1992 (notando também que “[a]o longo de sua reprodução social, incansavelmente o
Brasil põe e repõe ideias europeias, sempre em sentido impróprio”).

11 Ver nota 46 infra e o texto que a acompanha.

12 Neste ponto, nossa análise é meramente descritiva e baseada em um diagnóstico


sobre um modo de argumentação crescentemente empregado na jurisprudência. É certo
que, do ponto de vista normativo — isto é, à luz de quais argumentos devem valer nos
tribunais —, a questão é altamente controvertida e escapa ao objeto deste trabalho. Em
última análise, o debate consubstancia o paralelo, no mundo jurídico, do embate
filosófico entre éticas deônticas (fundadas na noção de dever) e utilitaristas (que
valorizam as consequências das ações). Observe-se, porém, que até mesmo filósofos do
direito que defendem a argumentação consequencialista tendem a fazê-lo tão somente
para admitir o apelo às consequências lógicas da decisão judicial (i.e., implicações
jurídicas da universalização das razões dadas), porém, não às suas consequências
fáticas, isto é, o impacto probabilístico das decisões no comportamento humano. Ver,
e.g., MACCORMICK, Neil. On legal decisions and their consequences: from Dewey to
Dworkin. New York University Law Review, v. 58, n. 2, p. 239-258, 1983. Para um
exame da utilização de argumentos consequencialistas lógicos no direito tributário
brasileiro, ver PISCITELLI, Tathiane dos Santos. Argumentando pelas consequências no
direito tributário. São Paulo: Noeses, 2011.

13 Em que pese a existência de tentativas heroicas. Ver, por exemplo, UNGER, Roberto.
Passion. Nova York: The Free Press, 1984. p. vii (indicando que sua aspiração
metodológica é “to reconceive and reconstruct the ancient and universal practice of
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

attributing normative force to conceptions of personality or society so that this practice


can better withstand the criticisms that philosophy since Hume or Kant has leveled
against it”).

14 A dicotomia entre o mundo dos fatos e dos valores é um tema clássico em filosofia.
Fala-se em “guilhotina” porque a construção de Hume determina “partir em dois” os
argumentos éticos, separando seus componentes normativos (i.e., juízos sobre o que
deve ser) e seus pressupostos sobre o funcionamento do mundo (i.e., juízos sobre o que
é). Ver HUME, David. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir o
método experimental de raciocínio nos assuntos morais. Trad. Deborah Danowski. São
Paulo: Imprensa Oficial; Unesp, 2001. livro III, parte I, seção I.

15 Conforme exposto na seção III infra, a cientifização da produção acadêmica em


economia tampouco eliminou o papel da doutrina econômica. Sobre o tema, ver ARIDA,
Pérsio. A história do pensamento econômico como teoria e retórica. In: REGO, José
Marcio. Retórica na economia. São Paulo: Editora 34, 1996; e MCCLOSKEY, D. N. The
rhetoric of economics. Madison: University of Wisconsin Press, 1998.

16 Ao tratar da aproximação da produção jurídica ao modelo de estudo científico


utilizado pelas ciências naturais e sociais não há como escapar de algumas ressalvas de
praxe. O conceito de ciência é historicamente determinado (passando por múltiplas
acepções ao longo do tempo até as hoje correntes concepções de Karl Popper e Thomas
Kuhn). Mais recentemente, o movimento pós-modernista sustenta que a realidade é, em
larga medida, mera construção social contingente, denunciando, assim, a ausência de
objetividade ou neutralidade como óbice à aspiração da ciência em descrever a
realidade. Inexistindo realidade, tampouco há que se falar em “estudos empíricos”. Esta
parece-nos, no entanto, posição extremada.

17 Há, por certo, autores expressivos que reconhecem o caráter científico do direito ao
mesmo tempo que enfatizam as diferenças entre a ciência jurídica e as demais ciências.
Para as concepções da ciência do direito como ciência sui generis, vide nota 36 infra e o
texto a que se refere.

18 É certo que Kelsen não afasta, nem tampouco condena, a existência de formas de
produção jurídica (peças judiciais, obras doutrinárias ou decisões judiciais) que não
atendam rigorosamente aos ditames de sua teoria pura, mas tão somente lhe nega o
atributo de trabalho científico em direito. Ver notas 37-40 infra.

19 Ver, exemplificativamente, Fundação Getulio Vargas. Ministério da Justiça. Série


Pensando o Direito: Dano Moral, n. 27, Convocação 01/2010. Disponível em:
[www.portal.mj.gov.br/main.asp?View=%7B329D6EB2-8AB0-4606-B054-4CAD3C53EE73%7D].
Acesso em: 26.08.2012; MACHADO, Maira R. Pesquisa em debate: a aplicação da lei de
crimes financeiros nos tribunais brasileiros. Cadernos Direito GV, v. 33, p. 1-226, 2010;
PRADO, Viviane Muller; ROSSI, Maria Cecilia; SILVEIRA, Alexandre Di Miceli; PEREIRA,
Thomas Henrique Junqueira de Andrade; MARTINS, Leandro. Decisões da CVM em
matéria societária no período de 2000 a 2006. In: WALD, Arnoldo (Org.). Doutrinas
essenciais: direito empresarial. São Paulo: Ed. RT, 2011. v. III, p. 69-88.

20 No direito comparado, sobretudo no norte-americano, os exemplos são tantos que


inviabilizam a individualização. Entre nós, ver, exemplificativamente, GOUVÊA, Carlos
Portugal. Derechos sociales en contra de los pobres. In: AMARAL JÚNIOR, Alberto do et
al. El constitucionalismo en transición. Buenos Aires: Libraria, 2012. v. 1, p. 13-36;
GORGA, Érica. Changing the paradigm of stock ownership from concentrated towards
dispersed ownership? Evidence from Brazil and consequences for emerging countries.
Northwestern Journal of International Law and Business, n. 29, 2008; e PÜSCHEL, Flávia
Portella et al. A quantificação do dano moral no Brasil: justiça, segurança e eficiência.
Relatório apresentado ao Ministério da Justiça no âmbito do projeto Pensando o Direito,
2011. Há, ainda, uma terceira acepção, relativa aos estudos que buscam descrever e
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

prever a aplicação do direito por meio da análise dos fatores extrajurídicos (tais como
orientação ideológica, gênero, raça, origem etc.) que explicam o comportamento judicial.
Embora não sejam esses estudos o centro da análise que segue, até mesmo eles
crescentemente interessam aos estudiosos e aplicadores do direito. Veja-se, por
exemplo, o estudo de Laarni Escresa e Nuno Garoupa sobre os fatores determinantes do
comportamento judicial nas Filipinas e sua influência sobre paradigmática decisão da
Suprema Corte daquele país sobre o impeachment de um juiz da Suprema Corte em
razão de sua parcialidade. GUILLERMO, Laarni Escresa; GAROUPA, Nuno. The role of the
Supreme Court in unstable democracies: the case of the Philippine Supreme Court, an
empirical analysis 1986-2010. Asian Journal of Law and Economics, v. 3, n. 1, apr. 2012.

21 Cf. LOPES, José Reinaldo de Lima. Regla y compás, o metodología para un trabajo
jurídico sensato. In: COURTIS, Christian (Ed.). Ensayos sobre metodología de la
investigación jurídica. Madrid: Editorial Estrata, 2006. p. 41-68, esp. p. 50 (“el derecho
— más allá de ser un ‘saber’ reglado, que se puede aprender y transmitir — no es una
‘ciencia’ con las pretensiones (sentidos) que el término ciencia tiene en los últimos
trescientos años en Occidente. El derecho no usa el método hipotético-deductivo y, por
ello, sus técnicas de investigación no se confunden ni con los trabajos de matemática, ni
con los de las ciencias naturales, no con los de las ciencias históricas y humanas. Por
eso, al derecho no se lo denomina, en los términos modernos, ciencia. Cuando hablamos
de un trabajo jurídico científico queremos decir algo más modesto: se trata de un
trabajo elaborado de acuerdo con las reglas académicas del derecho, producido en
universidades. […] Tanto el derecho como la filosofía son saberes, y son campos de
saber con principios, puntos de partida y reglas, es decir, con una cierta gramática que
controla su producción”); e p. 53 [“[p]or ende, lo mejor para definir el objeto de un
trabajo [jurídico] es percibir que su resultado debe ser una conclusión de carácter
práctico-normativo, una guía para la acción del tipo ‘esto debe hacerse porque es lo
debido’, o ‘esto no debe hacerse porque está prohibido’, o aun ‘esto puede hacerse ya
que está autorizado’, o ‘esto debe cambiarse porque es injusto’ (antisonómico), etc. […]
Como puede verse una vez más, el objeto de estudio — incluso el jurídico — no es el
objeto natural, sino un cierto ‘sentido’ del objeto natural (o de cualquier objeto)”).

22 Ulen, por exemplo, cita Karl Popper, Thomas Kuhn e Thomas Bayes, porém, não cita
Kelsen, Hart ou outros nomes célebres na teoria do direito. Há uma diferença — sutil,
contudo, fundamental — entre discordar e não tomar conhecimento daquilo que já existe
em teoria jurídica. Cf., ULEN, Thomas. A Nobel Prize in legal science? Op. cit. Há, no
entanto, algumas publicações interessantes sobre o tema nos Estados Unidos. Por
exemplo, do argentino SPECTOR, Horacio. The future of legal science in civil law
jurisdictions. Louisiana Law Review, n. 65, 2005.

23 A atividade de prever o que o juiz fará nem sempre é jurídica. Segundo Oliver
Wendell Holmes, o direito seria a previsão de como decidirão os tribunais. HOLMES JR.,
Oliver Wendell. The path of the law. Harvard Law Review, n. 10, p. 460-461, 1897 (“
[t]he prophecies of what the courts will do in fact, and nothing more pretentious, are
what I mean by the law”). Em tempos mais recentes, porém, o avanço de estudos
econométricos demonstrou que a previsão das decisões judiciais pode ser alcançada por
meios absolutamente distintos da forma de saber tradicionalmente entendida como
“jurídica”. Veja-se, nesse sentido, a aposta feita sobre a previsão dos resultados de
decisões da Suprema Corte norte-americana entre professores de direito, com amplo
conhecimento de direito constitucional e das decisões pretéritas dos membros do
tribunal, e professores de ciência política, com apoio em modelos econométricos
baseados em fatores extrajurídicos, tal como a afiliação política do presidente que
nomeou o juiz, o tribunal de origem e a direção ideológica da decisão.
Surpreendentemente, os cientistas políticos ganharam a aposta, acertando o resultado
em 75% dos casos, contra a taxa de apenas 59,1% de acerto dos professores. Cf.
AYRES, Ian. How computers routed the experts. Financial Times, 31.08.2007.

24 GORDLEY, James. The State’s private law and legal academia. American Journal of
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Comparative Law, n. 56, p. 639, 2008.

25 Este aspecto foge obviamente do âmbito de reflexão de Ulen, o qual concentra sua
análise nos Estados Unidos, país de sistema de common law, tradição na qual o papel da
doutrina é historicamente menos relevante do que na tradição romano-germânica. Ainda
assim, a partir de Blackstone, os trabalhos de célebres juristas de common law
passaram a assemelhar-se ao paradigma romano, sistematizando as decisões judiciais e
criando categorias doutrinárias de modo a explicá-las. Ibid., p. 641.

26 ÁVILA, Humberto. Notas sobre o papel da doutrina na interpretação. In: Instituto de


Estudos Culturalistas (Ed.). Cadernos para Debates n. 4:Conversa sobre a Interpretação
no Direito (Estudos em Homenagem a Miguel Reale), Canela, p. 141, 2011.

27 Ibid.

28 RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Dogmática e crítica da jurisprudência (ou da


vocação da doutrina em nosso tempo). Revista dos Tribunais, v. 891, p. 70, jan. 2010.

29 Atualmente, no Brasil, a referência a Bartolo (e à sua corruptela, o bartolismo)


muitas vezes reflete uma característica histórica do direito brasileiro, a saber, a de que
as doutrinas e análises jurídicas são recebidas menos por sua força argumentativa, e
mais por seu número de patronos, especialmente estrangeiros e preferencialmente
italianos ou alemães.

30 Ver PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Fontes e evolução do direito civil


brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1982. p. 30-31.

31 MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo


obrigacional. São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 241. Ver também MARTINS-COSTA, Judith;
BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São
Paulo: Saraiva, 2002. p. 193 (notando que “em nossa profunda mentalidade,
paradoxalmente, articulou-se ao legalismo a atenção à doutrina como fonte de produção
de modelos hermenêuticos, mesmo os derivados da experiência estrangeira. Para os
efeitos de uma possível história das mentalidades jurídicas, o termo ´bartolismo´ indica,
pois, esse fenômeno cultural, marca permanente de nossa forma mentis estar
fortemente arraigada a ideia de a doutrina não apenas desenvolver o papel de formadora
dos cânones de interpretação, mas o de tornar-se fonte prescritiva”).

32 Para uma descrição desses dois fatores, ver ÁVILA, Humberto. Op. cit.

33 Ver FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. 6. ed. rev. e ampl.
São Paulo: Atlas, 2010. p. 50 (“A percepção da mutabilidade teve consequências
importantes para o saber jurídico. No início do século XIX, essa percepção provocou, a
princípio, uma perplexidade. Afinal, dirá alguém, referindo-se à ciência do direito, que
ciência é esta se basta uma penada do legislador para que bibliotecas inteiras tornem-se
maculatura?” (KIRSCHMANN, 1966:26.)

34 Ver, por exemplo, LOPES, José Reinaldo de. Regla y compás, cit., p. 55 (“[l]a cultura
de los manuales impide justamente eso: que los problemas reales y prácticos se
conviertan en problemas jurídicos”).

35 BERMAN, Harold J. The origins of Western legal science.Harvard Law Review, n. 90,
p. 895, 1977 (observa que as primeiras universidades surgiram no século XII, época na
qual o direito era estudado como “ciência”, isto é, como um conjunto de conhecimentos
coerente, específico e dotado de metodologia própria). Evidentemente, esta era uma
ciência de conhecimento sobre o objeto; não propriamente dotada daquilo que hoje se
convencionou chamar de “espírito científico”. Relativamente ao contexto brasileiro,
sustenta Marcos Nobre que historicamente “vigorava o ‘princípio da antiguidade’, já que
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

no Brasil o direito é a disciplina universitária mais antiga”. Dessa forma,


comparativamente às outras disciplinas de ciências humanas, o direito “parecia se
arrogar dentre estas a posição de ciência rainha”. NOBRE, Marcos. Apontamentos sobre
a pesquisa em direito no Brasil. Cadernos Direito GV, n. 1, p. 4-5, 2004. Disponível em:
[www.cebrap.org.br/v2/files/upload/biblioteca_virtual/NOBRE_Apontamentos%20sobre-%20a%20Pesqu
Acesso em: 31.07.2012.

36 Entre nós, ver FERRAZ JR., Tercio Sampaio. A ciência do direito. 2. ed. São Paulo:
Atlas S.A., 1980. p. 45 (descreve a ciência do direito como um “pensamento
tecnológico”, o qual embora compartilhe algumas características com o pensamento
científico stricto sensu, dele se diferencia, pois seus problemas “têm uma relevância
prática (possibilitar decisões: legislativas, judiciárias, administrativas, contratuais etc.)
que exige uma interrupção na possibilidade de indagação das ciências em geral, no
sentido de que a tecnologia dogmatiza os seus pontos de partida e problematiza apenas
a sua aplicabilidade na solução de conflitos”); REALE, Miguel. Lições preliminares de
direito. 25. ed. 2. tir. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 82 (defende que “há diversos tipos de
ciência, igualmente legítimos, cada qual fiel a seus métodos e processos em função da
natureza daquilo que estudam”, razão pela qual “no quadro de um pluralismo
metodológico, o Direito é uma ciência tão legítima como as demais”).

37 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 1.

38 Ibid.

39 Ibid., p. 82 (“A ciência jurídica é conhecimento e não constituição (elaboração) do


Direito. Na jurisprudência tradicional, porém, domina a opinião de que a ciência jurídica
também pode e deve elaborar o Direito. É típico a este propósito o que escreve
ENGISCH, Karl. Einführung in das juristische Denken. Stuttgart, 1956. p. 8: ‘Constitui
[...] privilégio quase excessivo da ciência jurídica, entre as ciências culturais, não ter de
se limitar a acompanhar ou a seguir o Direito, indo ao lado e atrás dele, mas ser-lhe
permitido colaborar no ajustamento do próprio Direito e da vida, tanto da vida do Direito
como da vida subordinada ao Direito’. Aí está uma confusão entre ciência jurídica e
política do Direito.”)

40 Um erro comum é supor-se que Kelsen teria defendido que a interpretação do direito
pudesse ser meramente jurídica. Ao contrário, Kelsen entendeu que “a interpretação da
lei em casos concretos dependeria inevitavelmente de questões de “política jurídica” (cf.
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito, cit., p. 396. Richard Posner identifica aqui uma
abertura da teoria kelseniana para integração com as ciências sociais (cf. POSNER,
Richard. Law, pragmatism, and democracy. Cambridge, MA: Harvard University Press,
2003. p. 250-291). Essas conclusões são exploradas em SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim
da responsabilidade limitada: história, direito e economia. 2013. (no prelo, ainda
inédito). epílogo.

41 ELLICKSON, Robert C. Of Coase and cattle: dispute resolution among neighbors in


Shasta Count. Stanford Law Review, n. 38, p. 623 e ss.,1986.

42 A respeito da concepção luhmanniana, cf. NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã:


uma relação difícil. São Paulo: Martins Fontes, 2006. p. 80. Cf., no mesmo sentido,
LOPES, José Reinaldo de Lima. Raciocínio jurídico e economia. Revista de Direito Público
da Economia, n. 8, p. 140, 2004 (“[o] ponto de vista jurídico é essencialmente o de
cumprir uma regra”).

43 Ver, nesse sentido, ARGUELHES, Diego Werneck. Argumentos consequencialistas e


Estado de direito: subsídios para uma compatibilização. p. 17. Disponível em:
[www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/Anais/Diego%20Werneck%20Arguelhes.pdf].
Acesso em: 14.02.2013 (sustenta que argumentos consequencialistas podem ser
reconstruídos como argumentos institucionais ou estritamente jurídicos sempre que a
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

norma em questão vise à promoção de um determinado estado de coisas).

44 Embora o presente artigo utilize os termos “produção acadêmica” e “literatura


jurídica” indistintamente, é importante ressaltar que, no Brasil, expressiva parcela das
publicações em direito se deu (e, em certa medida, ainda se dá) fora das universidades.
Autores influentíssimos, como Pontes de Miranda ou Hely Lopes Meirelles, entre tantos
outros, jamais ocuparam cátedras universitárias. Tal fenômeno remonta à época do
Império, na qual os mais proeminentes juristas, de um modo geral, eram políticos, não
acadêmicos. Cf. PARGENDLER, Mariana. A evolução do direito societário: lições do Brasil.
São Paulo: Saraiva, 2013. (no prelo)

45 Ver, e.g., Ulen, THOMAS. A Nobel Prize in legal science? cit., nota 5 (“My sense [...]
is that the increasing theorization of and academic emphasis in legal scholarship are due
to internal factors having to do with the history of legal scholarship and legal education’s
being situated within great research universities, not to external or market forces in the
legal services market”).

46 É certo que o desenvolvimento de estudos aptos a embasar argumentos


consequencialistas é mais acentuado nos Estados Unidos do que em outros países. Ver,
exemplificativamente, GAROUPA, Nuno; ULEN, Thomas S. The market for legal
innovation: law and economics in Europe and the United States. Alabama Law Review, n.
59, p. 1555 et ss., 2008 (descrevendo a maior influência do movimento de direito e
economia nos Estados Unidos relativamente à Europa e atribuindo o fenômeno ao menor
grau de concorrência na academia jurídica no contexto europeu).

47 Neste sentido, o art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, editada em 1942 e até
hoje em vigor, é bastante ilustrativo: “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins
sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.”

48 As expressões vêm de LOPES, Regla y compás, cit., nota 44, p. 149. Cumpre
ressalvar, porém, que a utilização das consequências fáticas como fundamento de
decisões jurídicas — inclusive com alusão às consequências econômicas de um ou outro
regime —, já era particularmente notável nas decisões do Conselho de Estado no século
XIX, o qual, embora fosse um órgão formalmente consultivo, desempenhava as funções
de um verdadeiro Poder Moderador. Para alguns exemplos desse tipo de argumentação
do Conselho de Estado na seara do direito societário, cf. PARGENDLER, Mariana. Politics
in the origins: the making of corporate law in nineteenth-century Brazil. American
Journal of Comparative Law, v. 60, n. 3, p. 830, 2012 (citando, entre outros exemplos, o
voto contrário à posição majoritária do Conselho que interpretara restritivamente o
Código Comercial de modo a vedar a constituição de sociedades em comandita por ações
no direito brasileiro, o qual justificou ser tal proibição um equívoco “em um país novo,
em que é necessário promover associações de comércio e de indústria”).

49 Sobre a ideologia conservadora e o utilitarismo histórico, ver SALAMA, Bruno


Meyerhof. Sobre a proibição de drogas e a ideologia conservadora. Revista Discente
Direito GV, 2013. (no prelo)

50 A ideologia progressista, aliás, está manifesta no art. 3o da Constituição de 1988. In


verbis: “Art. 3o Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I
— construir uma sociedade livre, justa e solidária; II — garantir o desenvolvimento
nacional; III — erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais
e regionais; IV — promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

51 COMPARATO, Fábio Konder. Para viver a democracia. São Paulo: Brasiliense, 1989. p.
102.

52 KANT, Immanuel. A paz perpétua. Um projeto filosófico, p. 33. Textos Clássicos de


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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Filosofia: Covilhã, 2008. Disponível em: [www.lusosofia.net]. Acesso em: 18.10.2012.

53 Todas as citações supraindicadas referem-se à notícia veiculada no site do Supremo


Tribunal Federal, porquanto o acórdão ainda não foi publicado. Notícias STF:
quinta-feira, 9 fev. 2012. Supremo julga procedente ação da PGR sobre Lei Maria da
Penha (09.02.2012). Disponível em:
[www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=199853]. Acesso em:
26.08.2012.

54 Segundo o autor, o controle de validade condicional é mais “formal e automático”,


pois se refere à “relação autoridade/sujeito (cometimento) de uma norma”,
desvinculando meios e fins. Já a validade finalística, por prescrever que “certas
finalidades sejam alcançadas”, demanda “consideração mais cautelosa de aspectos
empíricos (verificação de se os fins foram atingidos)”. FERRAZ JR., Tercio Sampaio.
Introdução ao estudo do direito. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2010. p. 152-154
(acrescentando, ainda que, “[n]o direito contemporâneo prepondera a validade
condicional, embora ocorram também casos de validade finalística”).

55 Foge ao objeto de trabalho discutir as vantagens e desvantagens comparativas de


juristas e cientistas sociais (economistas, sociólogos, psicólogos etc.) na avaliação das
consequências do direito na realidade social.

56 Não é esta, necessariamente, a função atual dos legal scholars no contexto


norte-americano. Cf. nota 96 infra.

57 Sobre o ponto, ver SALAMA, Bruno Meyerhof. Vetores da jurisprudência na


interpretação dos contratos bancários no Brasil. Revista de Direito Bancário e do
Mercado de Capitais, n. 57, jul.-set. 2012; RODRIGUEZ, Jose R. The persistence of
formalism: towards a situated critique beyond the classic separation of powers. The Law
and Development Review, v. 3, n. 2, p. 41-77, May 2010. Há, evidentemente, exceções,
a depender do conteúdo da lei e da estratégia adotada pelo Judiciário. Os juízes italianos
alegadamente resistiram ao fascismo aplicando de forma mais literal possível a
legislação existente. Cf. CALABRESI, Guido. Two functions of formalism: in memory of
Guido Tedeschi. University of Chicago Law Review, v. 67, p. 479, 2000. O mesmo
fenômeno é observável em inúmeros outros casos, inclusive em muitas das posições
conservadoras da Suprema Corte dos Estados Unidos.

58 Esta discussão consta de Salama, O fim da responsabilidade limitada, cit.

59 VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremo Tribunal Federal: o novo Poder Moderador. In:
MOTA, Carlos Guilherme Mota; SALINAS, Natasha S. C. Os juristas na formação do
Estado-nação brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010.

60 Cf. VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia. Revista Direito GV, n. 8, p. 441-463,


2008.

61 V. KELSEN, Hans. Verfassungs-und Verwaltungsgerichtsbarkeit im Dienste des


Bundesstaates. Trad. Alexandre Krug. Jurisdição constitucional. São Paulo: Martins
Fontes, 2003. p. 123-186.

62 Novamente VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia, cit., p. 454-456.

63 ACKERMAN, Bruce A. The new separation of powers. Harvard Law Review, n. 113, p.
633-729, 2000.

64 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios


jurídicos. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 15-16. Contraste-se o entendimento
contemporâneo com a visão dos princípios constitucionais dominante entre os juristas no
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

passado. Pontes de Miranda, ao comentar o art. 145 da Constituição de 1946, que


tratava dos princípios conformadores da ordem econômica, conclui que “o texto é mera
recomendação. Não há sanção para infração dele. Os legisladores que a ele não
obedeçam, escapam a qualquer restrição legal”. PONTES DE MIRANDA, Francisco
Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1946. Rio de Janeiro: Henrique Cahem Editor,
1947. v. IV, p. 9.

65 ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte (1985). Trad. Virgílio Afonso da Silva. Teoria
dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 91: (“O ponto decisivo na
distinção entre regras e princípios é que princípios são normas que ordenam que algo
seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas
existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização, que são
caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a
medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas
também das possibilidades jurídicas.”)

66 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, cit.

67 Neste sentido, POSNER, Richard A. Overcoming law. Cambridge, MA: Harvard


University Press, 1995. p. 7 (defendendo sua versão de adjudicação pragmática como
aquela em que o juiz “is drawn to the experimental scientist, whom [the pragmatist
judge] urges us to emulate by asking, whenever a disagreement arises: What practical,
palpable, observable difference does it make to us?”). Contra, ver DWORKIN, Ronald. In
praise of theory. Arizona State Law Journal, v. 29, p. 353, 1997. E, ainda, MACEDO
JUNIOR, Ronaldo Porto. Posner e a análise econômica do direito: da rigidez neoclássica
ao pragmatismo frouxo. In: LIMA, Maria Lúcia L. M. Pádua (Coord.). Trinta anos de Brasil
: diálogos entre direito e economia. São Paulo: Saraiva, 2012.

68 Cf. NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã, cit., nota 44, para uma análise da visão
de Niklas Luhmann.

69 Cf. LOPES, José Reinaldo de Lima. O direito na história. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
p. 88.

70 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Atual. de


Judith Martins-Costa, Gustavo Haical e Jorge Cesa Ferreira da Silva. São Paulo: RT,
2012. t. I, p. 77 (“O suporte fáctico (Tatbestand) da regra jurídica, isto é, aquele fato,
ou grupo de fatos que o compõe, e sobre o qual a regra jurídica incide, pode ser da mais
variada natureza: por exemplo, a) o nascimento do homem, b) o fato físico do mundo
inorgânico, c) a doença, d) o ferimento [etc.] [...]. É incalculável o número de fatos do
mundo, que a regra jurídica pode fazer entrar no mundo jurídico, — que o mesmo é
dizer-se pode tornar fatos jurídicos”). Acrescenta Pontes, ainda, que “a probabilidade
dos fatos, positivos ou negativos, pode ser suporte de regras jurídicas. Sempre que a
regra jurídica se satisfaz com o risco, o perigo, ou a ameaça, faz suficiente suporte
fáctico seu a probabilidade. Ibid., p. 85.

71 Código de Hamurabi: “229.If a builder build a house for some one, and does not
construct it properly, and the house which he built fall in and kill its owner, then that
builder shall be put to death”. Disponível em:
[www.avalon.law.yale.edu/ancient/hamframe.asp]. Acesso em: 29.08.2012.

72 Cf. GORDLEY, James. Foundations of private law: property, tort, contract, unjust
enrichment. Oxford: Oxford University Press, 2006. p. 159.

73 “Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos
de sua mulher, sendo tal ação imprescritível.”

74 Por certo, o direito à contestação da paternidade genética, por parte do suposto


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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

genitor, tem sido flexibilizado quando presente, no caso concreto, a chamada


“paternidade socioafetiva”. A ratio desse posicionamento jurisprudencial é, mais uma
vez, a valorização dos fins refletidos em princípios em detrimento de regras legais, a
refletir a preocupação com as consequências deletérias para o suposto filho que tem o
vínculo afetivo contestado. Ver Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.059.214, 4ª T., rel.
Min. Luis Felipe Salomão, j. 16.02.2012, DJ 12.03.2012 (citando a conclusão do laudo
elaborado por psicóloga de que “a ré está vivendo, há dois anos, uma situação
traumática. Sua identidade pessoal foi ameaçada por Pedro Paulo, teve prejuízo em sua
autoestima e no seu sentimento de confiança pelas pessoas que a cercam”).

75 GERADIN, Damien; PEREIRA NETO, Caio Mario. From “per se” to “effects-based”
analysis of vertical restraints adopted by dominant firms: the examples of EU and
Brazilian competition law (working paper não publicado, 2012).

76 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado, cit., t. I, p.


80 (inclusão dos atualizadores).

77 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADIn 1.946/DF, TP, rel. Min. Sydney Sanches, j.
03.04.2003.

78 Ibid., ementa.

79 Ibid.

80 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 407.688-8, TP, Rel. Min. Cezar Peluso, j.
08.02.2006.

81 ARGUELHES, Diego; PARGENDLER, Mariana. Custos colaterais da violência no Brasil:


rumo a um direito moldado pela insegurança? Revista Direito GV, 2012. (no prelo). Ver,
também, SCHUARTZ, Luis Fernando. Norma,contingência e racionalidade. Rio de Janeiro:
Renovar, 2005. p. 218: (“O problema com a ‘fórmula da ponderação’ está menos na sua
aptidão para modelar adequadamente o ‘balanceamento’ de princípios tal como levado a
efeito por juízes e tribunais e mais no que ela pressupõe quanto à obtenção dos dados
necessários para que possa efetivamente ser aplicada. O problema, noutras palavras,
não está no lado dos resultados nem na definição da ‘regra de transformação’ que a
fórmula exprime, mas em como assegurar o acesso aos valores concretos das variáveis
relevantes que servem de dados para efetuar os cálculos da maneira especificada na
fórmula.”)

82 Para uma explicação detalhada, ver SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é pesquisa em
direito e economia? Caderno Direito GV, n. 22, mar. 2008.

83 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 526.276, TP, rel. Min. Ellen Gracie Northfleet,
j. 03.11.2010 (“O art. 13 da Lei 8.620/93 também se reveste de inconstitucionalidade
material, porquanto não é dado ao legislador estabelecer confusão entre os
patrimônios das pessoas física e jurídica, o que, além de impor desconsiderac�ão ex
lege e objetiva da personalidade jurídica, descaracterizando as sociedades limitadas,
implica irrazoabilidade e inibe a iniciativa privada, afrontando os arts. 5o, XIII, e 170,
parágrafo único, da Constituic�ão.”) A conclusão de que a responsabilização dos
sócios pelas dívidas sociais inibe a iniciativa privada é um juízo de causalidade
falsificável — e, com efeito, contestado por alguns estudos empíricos. Veja-se, por
exemplo, o estudo empírico de Mark Weinstein, segundo o qual não há evidências de que
o sentido de que o advento da responsabilidade limitada na Califórnia entre 1929 e 1931
teve qualquer efeito no valor das ações de companhias abertas californianas.
WEINSTEIN, Mark. Share price changes and the arrival of limited liability in California.
Journal of Legal Studies, v. 32, n. 1, p. 1-25, 2003.

84 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADIn 3.934, TP. rel. Min. Ricardo Lewandowski, j.
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

27.05.2009. Nas palavras do Ministro relator, “forçoso é convir que o limite de conversão
dos créditos trabalhistas em quirografários fixado pelo art. 83 da Lei 11.101/2005 não
viola a Constituição, porquanto, longe de inviabilizar a sua liquidação, tem em mira,
justamente, a proteção do patrimônio dos trabalhadores, em especial dos mais débeis do
ponto de vista econômico”.

85 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADIn 4.277, TP, rel. Min. Ayres Britto, j.
05.05.2011. O voto do Ministro Marco Aurélio faz referência expressa ao fato de o Brasil
ocupar o primeiro lugar no ranking de homicídios anuais contra homossexuais para
fundamentar a sua decisão pela procedência da ADI, em mais um passo para o Brasil
vencer “a guerra desumana contra o preconceito”.

86 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF 186, TP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, j.
26.04.2012. Segundo veiculado no sítio do STF, o Ministro Gilmar Mendes fundamentou
sua decisão no baixo número de negros nas universidades brasileiras e na “dificuldade
quase lotérica” de seu acesso à universidade. Disponível em:
[www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=206042]. Acesso em:
26.08.2012.

87 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF 54, TP, rel. Min. Marco Aurélio de Mello, j.
11.04.2012 (fundamentando sua decisão, inter alia, nos “[d]ados apresentados na
audiência pública”, os quais “demonstram que a manutenção da gravidez nesses casos
impõe graves riscos para a saúde da mãe, assim como consequências psicológicas
severas e irreparáveis para toda a família”).

88 A Constituição refere-se às audiências públicas com a sociedade civil quando trata da


competência das comissões das casas do Congresso Nacional (art. 58, § 2o, II).
Disponível em: [www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=204680].
Acesso em: 26.08.2012.

89 Art. 9o, § 1o, e art. 20, § 1º, da Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999, in verbis
(“Em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de
notória insuficiência das informações existentes nos autos, poderá o relator requisitar
informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer
sobre a questão, ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas
com experiência e autoridade na matéria.”) Outras inovações institucionais têm sido
sugeridas pela doutrina e mais certamente virão. Veja-se, nesse sentido, GOUVÊA,
Carlos Portugal. Democracia material e direitos humanos. In: AMARAL JR., Alberto do;
JUBILUT, Liliana Lyra. O STF e o direito internacional dos direitos humanos. São Paulo:
Quartier Latin, 2009. p. 99-121. O autor defende a criação de um “Conselho
Constitucional de Desenvolvimento Social e Econômico”, encarregado de “apresentar
relatórios públicos de análise distributiva de custo-benefício de suas políticas públicas”, a
cujo saber técnico o Judiciário poderia recorrer na implementação de políticas públicas
por via judicial. Ibid., p. 118.

90 Com a adoção da cost-benefit analysis, incumbe aos tribunais examinar se tal


ponderação foi efetivamente realizada de forma adequada pelo órgão regulador. Cf. a
recente e controvertida decisão do DC Circuit nos Estados Unidos, a qual invalidou os
regulamentos recém-promulgados pela Securities and Exchange Commission, segundo
mandamento do Dodd-Frank Act, por considerar que a Comissão não considerou
adequadamente as consequências econômicas das novas regras, assim violando o
Administrative Procedure Act. Business Roundtable v. SEC, 647 F.3d 1144 (DC. Cir.
2011).

91 O estudo de Salgado e Borges detalha a origem histórica da análise de


custo-benefício em sede regulatória e a sua progressiva introdução no país, afirmando
que “o Decreto no 4.176, de 28 de marc�o de 2002, [...] representa o esboc�o de uma
primeira iniciativa em AIR [análise de impacto regulatório] no Brasil”. SALGADO, Lucia
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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

Helena; BORGES, Eduardo Bizzo de Pinho. Análise de Impacto Regulatório: uma


abordagem exploratória. IPEA: Texto para Discussão n. 1463, 2010. p. 19. Relatam os
autores, ainda, a realização de nada menos do que 2.402 audiências públicas pelas
agências reguladoras federais entre 1998 e 2008.

92 Assim dispõe o mencionado dispositivo: “o acionista não poderá votar nas


deliberações da assembléia-geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que
concorrer para a formação do capital social e à aprovação de suas contas como
administrador, nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular,
ou em que tiver interesse conflitante com o da companhia.”

93 CVM. Processo Administrativo n. RJ 2009-13179. Interessado: Tractebel Energia S.A.


Assunto: Recurso contra entendimento da SEP, a respeito da possibilidade do acionista
controlador, GDF Suez Energy Latin America Participações Ltda., votar na assembleia
sobre a aquisição de ações da Suez Energia Renovável S.A. Diretor-relator: Alexsandro
Broedel Lopes, j. 09.09.2010.

94 Ibid. Cf., também, DJANKOV, S.; LA PORTA, R.; Lopez-De-SilaneS, F.; SHLEIFER, A.
The law and economics of self-dealing. Journal of Financial Economics, n. 88, p. 430,
2008.

95 O conteúdo e o estilo da doutrina variam ao longo do tempo e nas diferentes


tradições jurídicas. Para uma excelente reflexão sobre o significado e a evolução
histórica da noção de doctrine no direito francês, cf. JESTAZ, Philippe; JAMIN,
Christophe. La doctrine. Paris: Dalloz, 2004. No contexto brasileiro, fala-se hoje em uma
“crise da doutrina”, ocasionada, entre outros fatores, pela drástica expansão no número
de publicações jurídicas nos últimos anos — expansão esta que não raro se deu em
detrimento da qualidade dos estudos. A esse respeito, ver RODRIGUEZ JUNIOR, Otavio
Luiz. Dogmática e crítica da jurisprudência, cit., p. 86-87.

96 Embora, em tempos atuais, a proporção de trabalhos de cunho doutrinário seja mais


elevada fora dos Estados Unidos, tal não quer dizer que inexista demanda naquele país.
Uma anedota alegadamente verídica narra uma conversa entre um juiz da Suprema
Corte norte-americana e um professor de direito constitucional. Diante de um debate
sobre a utilização da experiência comparada como inspiração, o juiz sugeriu que seria
extremamente útil se os professores escrevessem artigos sobre a experiência de
diferentes países com um ou outro instituto — ao que o professor teria respondido: “eu
não sou seu assistente de pesquisa; você é como um inseto que eu estudo.”

97 KEYNES, John Neville. The scope and method of political economy. Londres:
Macmillan, 1891.

98 Para uma discussão detalhada do tema, ver SALAMA, Bruno Meyerhof. The art of law
& macroeconomics. University of Pittsburgh Law Review, n. 2, v. 74, 2012. (no prelo).
Disponível em: <www.works.bepress.com/bruno_meyerhof_salama/70> (“Neville
Keynes wrote [The scope and method of political economy] in reaction to a controversy
over the epistemological character and method of economics that was central to
economic thinking in his time — and in fact, one that haunts the economic profession
until today. The controversy is related to whether economics is a scientific endeavor that
establishes hypotheses based on the deduction of assumed truths about the world (such
as that men rationally maximize utility), or whether economics is an examination of the
workings of institutions considered in a specific historical setting [...] he proposed that
economics should be viewed as partly a positive science concerned with finding truths
about how the world works; partly an ethical inquiry; and partly an art concerned with
practical precepts for action. What Neville Keynes did, therefore, was to posit the
existence of a third dimension — the ‘art’ of economics — which should be added to the
two standard ones (positive and normative economics”).

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Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

99 É, por isso, aliás, que faz sentido pensar na análise jurídica como tendo — para além
da discussão exclusivamente descritiva ou prescritiva — também uma dimensão
avaliativa. Sobre o tema, ver BLACKBURN, Pierre. Logique de l’argumentation. 2. ed.
Saint-Laurent: ERPI, 1994. p. 77-79.

100 Apud WEBER, Max. A ciência como vocação. In: WEBER, Max. Três tipos de poder e
outros escritos. Lisboa: Tribuna da História, 2005. p. 18. Disponível em:
[www.lusosofia.net].

101 KEYNES, Maria Lúcia L. M. Pádua. The scope and method of political economy, cit.,
p. 21.

102 Ibid., p. 22.

103 Ibid., p. 22, 32-33.

104 WILLIAMSON, John. What Washington means by policy reform. In: WILLIAMSON,
John (Ed.). Latin American readjustment: how much has happened. Washington:
Institute for International Economics, 1989.

105 Tal expressão, que é de uso corrente, refere-se ao fato de a produção acadêmica
em economia ter, ao longo do século XX, emulado o método das ciências “duras” em um
maior grau do que qualquer outra ciência social.

106 Piada: a economia é uma ciência parecida com a cartomancia, apenas um pouco
menos precisa.

107 Cf. examinado SALAMA, Bruno Meyerhof. Sete enigmas do desenvolvimento em


Douglass North. In: VIEIRA, Oscar Vilhena; DIMOULIS, Dimitri. Desenvolvimento e
Estado de direito. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 55-56.

108 Cf. Ver HUME. Tratado da natureza humana, cit. Ver também SEARLE, John R. How
to derive “ought” from “is”. The Philosophical Review, v. 73, n. 1, p. 43-58, 1964.

109 Para um exame desta trajetória, ver SALAMA, Bruno Meyerhof. A história do declínio
e queda do eficientismo na obra de Richard Posner. In: LIMA. Maria Lúcia L. M. Pádua
(Coord.). Trinta anos de Brasil, cit.

110 POSNER, Richard. A economia da justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2010.

111 POSNER, Richard. Problemas de filosofia do direito. São Paulo: Martins Fontes,
2007.

112 WEBER, MAX. A ciência como vocação, cit., p. 23-24.

113 Conforme analisado em Salama, O fim da responsabilidade limitada, cit.

114 SCHWARZ, Roberto (Org.). Ao vencedor as batatas, cit., nota 12.

115 FREEMAN, C. The economics of industrial innovation. Penguin: Harmondsworth,


1974.

116 DOSI, G. Technological paradigms and technological trajectories: a suggested


interpretation of the determinants and directions at technical change. Research Policy, v.
11, n. 3, p. 147-162, jun. 1982.

117 SABINO, Fernando. O encontro marcado. De uma carta de Hélio Pellegrino. 30 mar.
2006. Disponível em:
Página 36
Direito e consequência no Brasil: em busca de um
discurso sobre o método

[www.judias.multiply.com/recipes/item/187?&show_interstitial=1&u=%2Frecipes%2Fitem].
Acesso em: 31.07.2012.

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