A Casa Dos Bebês - Inclusão Na Educação Infantil

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

A casa dos bebês: uma experiência inovadora no município de Cafelândia-SP.


ALVES, Cristiane Paiva; BATAGLIA, Patrícia U. R.; SANTOS, Bruna A. Sasso dos;
MIGUEL, Priscila Caroline. Gradus Editora, 2024. 118p.. : il. (algumas color.).

978-65-81033-62-0 CDD 360.00

Palavras-chave: 1 - Ensino; 2 - Infância; 3 - Pesquisa.

A Gradus Editora adota a licença da Creative Commons CC BY: Atribuição-Não


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FICHA TÉCNICA
Editor-chefe — Lucas Almeida Dias
Diagramação e Projeto gráfico — Natália Huang Azevedo Hypólito
Revisão — Lucas Almeida Dias

COMITÊ EDITORIAL
Prof. Dr. Douglas M. A. de A. P. dos Santos Profa. Dra. Cintya de Oliveira Souza
Profa. Dra. Ana Cláudia Bortolozzi Profa. Dra. Andreia de B. Machado
Profa. Dra. Manuela Costa Melo Prof. Dr. Carlos Gomes de Castro
Profa. Dra. Ana Beatriz D. Vieira Profa. Dra Janaína Muniz Picolo
Dr. Yan Corrêa Rodrigues Prof. Dr. Thiago Henrique Omena
Prof. Dr. Luís Rafael Araújo Corrêa Prof. Dr. Fábio Roger Vasconcelos
Prof. Dr. Leandro A. dos Santos Prof. Dr. Gustavo Schmitt
Profa. Dra. Daniela Marques Saccaro Prof. Dra. Renata Cristina L. Andrade
Profa. Dra. Gladys del C. M. Morales Profa. Dra. Márcia Lopes Reis
SUMÁRIO

PREFÁCIO — “Assim como Você!”


(Caminhos Inclusivos para Pequeninos)................................................. 9

APRESENTAÇÃO — Pra Começo de Conversa…................................. 17

FUNDAMENTANDO A NOSSA CONVERSA

CAPÍTULO 1 — Espelho, Espelho Meu


e a Chamadinha (a Acolhida dos Bebês) . ............................................ 29

CAPÍTULO 2 — Primeiro uma Coisa e


Depois Outra… (a Rotina dos Bebês) .................................................. 33

CAPÍTULO 3 — “Não Fazendo Tudo o que Quer, Mas Querendo Tudo o


que Faz” (o Trabalho com as Atividades Diversificadas na Creche)........ 37

CAPÍTULO 4 — Eu Também Sei Falar!


(a Questão da Linguagem Infantil)...................................................... 43

CAPÍTULO 5 — Hum, que Delícia! (o Momento da Alimentação)...........49

CAPÍTULO 6 — “Meu Pé Meu Querido Pé” (o Banho e o


Cuidar Relacionado ao Brincar e ao Educar) ...................................... 53

CAPÍTULO 7 — “É Meu!” e o que o Brinquedo me Ensina (Considerações


sobre o Egocentrismo e o Social no Momento do Brincar) .................. 57
CAPÍTULO 8 — “Faz-de-conta que…”
(o jogo simbólico em questão)........................................................... 69

CAPÍTULO 9 — Lê Pra Mim! (a Hora da Historinha) ........................... 73

CAPÍTULO 10 — “Pés no Chão” (Brincar ao Ar Livre) ......................... 81

CAPÍTULO 11 — Que Soninho zZZ (o Momento do Descanso)............... 89

CAPÍTULO 12 — Bebês Enfileirados com Lápis e Papel nas Mãos? (o


Sentido da Avaliação na Creche: um Guia para Avaliação e Dispositivos
para o Registro do Desenvolvimento das Crianças).............................. 95

CONSIDERAÇÕES FINAIS — Pra Terminar, Sem Terminar… .............103

CURIOSIDADES — Vocês Sabiam que?............................................105

APÊNDICE — Quadro-Resumo: Aspectos do


Desenvolvimento Global da Criança de 0 a 2 anos. ............................107
Agradecimentos

Agradecemos ao apoio e aceite de parceria da Prefeitura


Municipal de Cafelândia, em especial da Equipe da Diretoria
Municipal de Educação, que não mediu esforços para que a parceria
fosse realmente concretizada;
À toda equipe da Creche Escola Cecília De Castro Delafiori de
Cafelândia/SP, que abraçou conosco a ideia da “Casa dos Bebês”.
Sem vocês, nada disso seria possível…

Dedicamos este livro…


A todos os bebês…
Que nos motivaram a pensar em uma “Casa dos Bebês”, uma casa
onde os sonhos ficam mais aconchegantes…

Agradecimentos 5
Autoras

Cristiane Paiva Alves - Terapeuta Ocupacional, professora da


UNESP de Marília, vice-líder do Grupo de Estudos Pesquisas em
Psicologia Moral e Educação Integral
Patricia Unger Raphael Bataglia - Psicóloga, professora da UNESP
de Marília, líder do Grupo de Estudos Pesquisas em Psicologia Moral
e Educação Integral
Bruna Assem Sasso dos Santos - Pedagoga, professora da Unesp
de Marília e membro do Grupo de Estudos Pesquisas em Psicologia
Moral e Educação Integral
Priscila Caroline Miguel - Psicóloga, Doutoranda em Educação,
Docente Bolsista no Curso de Pedagogia na UNESP de Marília
e membro do Grupo de Estudos Pesquisas em Psicologia Moral e
Educação Integral

Prefácio

Maewa Martina Gomes da Silva e Souza - Professora Assistente


da UNESP - Marília/SP, vinculada ao Departamento de Educação
e Desenvolvimento Humano, palestra sobre inclusão às agentes
educacionais

Colaboradoras do projeto apresentado no livro

Ana Lúcia Garcia Parro - Diretora Municipal de Educação


Ana Paula de Oliveira Martins Azevedo - Coordenadora Pedagógica
da Creche
Katiane Siqueira Lima Botelho Fontana - Educadora do Berçário
da Creche

Autoras e colaboradoras 7
Loraine Merli Correa de Mello - Educadora do Berçário da Creche
Maiara Fernanda Venturini Ferreira - Educadora do Berçário da
Creche
Maria Cláudia Takada de Oliveira - Diretora da Creche
Maria Izabel Cava Pari de Paula (“Nina”) - Supervisora da Diretoria
Municipal de Educação de Cafelândia
Simone Cristina Soares - Educadora do Berçário da Creche

8 A Casa dos Bebês


PREFÁCIO
“Assim como Você!” (Caminhos Inclusivos para Pequeninos)

Por Maewa Martina Gomes da Silva e SOUZA

É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança!


(Provérbio africano).

O educador começa a compreender que, quando a criança adentra a


cultura, não só toma algo dela, não só assimila e se enriquece com o que
está fora dela, senão que a própria cultura reelabora em profundidade a
composição natural de sua conduta e dá uma orientação completamente
nova a todo curso de seu desenvolvimento. (Vygotski, 2000, p. 305).

O processo de inclusão na Educação Infantil desempenha um papel


crucial no desenvolvimento global das crianças, proporcionando
benefícios duradouros que reverberam ao longo de suas vidas.
Essa prática não se limita apenas ao ambiente educacional, mas
estende-se à formação de cidadãos conscientes e respeitosos. Apesar
dos desafios já conhecidos, se buscamos o desenvolvimento de uma
sociedade mais equitativa e justa, precisamos constantemente tratar
desse objetivo fundamental para garantir que todas as crianças tenham
acesso a oportunidades educacionais – não apenas – de qualidade.
Nesse sentido, esse texto abarca contribuições não exaustivas sobre
a promoção da inclusão na Educação Infantil, considerando esse
processo dinâmico, o qual, por sua vez, exige um comprometimento
contínuo e de constantes adaptações às necessidades específicas
de cada grupo de crianças.
Desde já, ressaltamos a urgência em respeitarmos a diversidade
e a valorização das diferenças como princípios-chave para o
desenvolvimento de práticas inclusivas cada vez mais exitosas.

Prefácio 9
Com isso, poderíamos falar sobre diversos aspectos que
contribuiriam para esse processo de inclusão, ou seja, falarmos
sobre a formação dos professores, a colaboração com profissionais
de apoio, o envolvimento dos pais e da comunidade. Poderíamos
falar sobre adaptações, desde as referentes aos ambientes físicos
acessíveis até as prováveis adaptações curriculares e materiais
didáticos inclusivos. Poderíamos ainda elencar questões sobre como
atender às necessidades específicas, pensando na identificação
e implementação de planos de apoio individualizado e, por fim,
ainda falarmos sobre métodos de avaliação que considerem
diferentes formas de expressão e aprendizado. Apesar de todas
essas possibilidades, optamos por falar sobre a importância de
desenvolvermos uma perspectiva holística e colaborativa para
criarmos ambientes educacionais que atendam a todos, não apenas
às crianças Público-Alvo da Educação Especial (PAEE).
Conheçamos essa perspectiva adotada, bem como as várias
razões que destacam a importância da inclusão:

1 – Desenvolvimento Socioemocional:

A Educação Infantil é um período complexo para o desenvolvimento


socioemocional das crianças. A inclusão permite que elas interajam
com colegas de diferentes origens, personalidades e características,
promovendo a aceitação da diversidade e o respeito pelas diferenças.
Essa interação contribui para a formação de relações saudáveis e a
construção de habilidades interpessoais fundamentais.
Souza (2010), em estudos com crianças de quatro a seis, sobre
o que elas pensavam sobre as quatro categorias de deficiência,
tradicionalmente conhecidas como deficiência visual, intelectual,
física e auditiva, identificou que os pequenos percebem a diferença
desses colegas, mas, independentemente disso, anseiam por um
relacionamento próximo, por desenvolverem a amizade, para

10 A Casa dos Bebês


terem mais amigos e se divertirem. Entretanto, essa característica
é modificada, uma vez que a criança passa a ser influenciada por
adultos que apresentam conceitos inadequados ou incorretos sobre
as pessoas PAEE, fazendo com que essa mesma criança, na pré-
adolescência e adolescência, passe a se distanciar dos colegas que
havia feito anteriormente (Souza, 2014; 2019).
Esses dados são cruciais para pensarmos no nosso papel enquanto
pais, profissionais, comunidade, no que se refere a proporcionar uma
influência mais favorável frente às atitudes sociais em relação à
inclusão, proporcionando a essas crianças um ambiente acolhedor e
instrutivo quanto ao desenvolvimento de suas emoções.

2 – Promoção da Autoestima:

Falando em desenvolvimento socioemocional, podemos chegar à


autoestima e, com ela, ao sentimento de pertencimento tão necessário
para a toda sociedade, mas especialmente para as crianças.
O sentimento de pertencimento é fundamental para o
desenvolvimento saudável das crianças. Em um ambiente inclusivo,
cada criança se percebe como parte integrante do grupo,
independentemente de suas características individuais. Isso
fortalece a autoestima e promove um senso positivo de identidade,
especialmente se essa interação for proporcionada de modo
intencional e bem assistida, como na indicação realizada por Vieira
e Denari (2012), ao elaborarem um programa informativo para
professores sobre alunos com deficiência intelectual.

3 – Estímulo à Aprendizagem:

Nem precisamos falar sobre a importância da inclusão para o


desenvolvimento da aprendizagem de todos. Mas vamos pincelar

Prefácio 11
sobre o assunto para reforçar esse aspecto que maciçamente é tão
valorizado dentro do ambiente escolar.
Ambientes inclusivos incentivam uma abordagem pedagógica
diversificada, adaptando-se às necessidades individuais de cada
criança (Cruz, 2010).
Nesse sentido, ao reconhecer e respeitar os estilos de
aprendizagem variados, a inclusão propicia um ambiente profícuo
ao desenvolvimento cognitivo, estimulando a curiosidade, o interesse
pelo conhecimento, aprofundando a comunicação, desenvolvimento
motor, dentre outras áreas do desenvolvimento, fortalecendo a
autoconfiança e autoestima na classe comum, assim como em
ambientes complementares e especializados (Reganhan e Manzini,
2009; Cia e Rodrigues, 2014).

4 – Preparação para a Diversidade da Sociedade:

A sociedade é intrinsecamente diversa e a Educação Infantil é


o ponto de partida para preparar as crianças para o mundo que
as aguarda. A inclusão oferece uma oportunidade única para que
elas experimentem e compreendam a diversidade desde cedo,
desenvolvendo habilidades e atitudes necessárias para interagir em
uma sociedade plural (Conceição, 2014).
Estudos de Mendes (2010) em creches demonstram que a inclusão
deve começar ainda com as crianças pequenas, valendo-se desse
momento especial em que a criança passa a ter a escola como uma
espécie de janela de oportunidades para o mundo, conhecendo,
explorando, vivenciando a diversidade da forma mais genuína.
Esse estudo se deu após uma maciça investigação realizada em
creches brasileiras, baseando-se na possibilidade de primeiro intervir
na porta de entrada da criança no sistema educacional, de modo
a, através da formação de professores, desencadearem ações que

12 A Casa dos Bebês


permitiram um avanço sistemático, gradual e contínuo de proposta
de inclusão escolar (Mendes, 2010).

5 – Construção de uma Cultura de Respeito:

A inclusão na Educação Infantil contribui para a construção de uma


cultura de respeito e aceitação mútua. Ao criar um ambiente inclusivo,
as crianças aprendem a valorizar as diferenças, a reconhecer suas
próprias singularidades e a respeitar o próximo, formando as bases
para uma sociedade mais justa e igualitária (Vieira e Denari, 2012).
Em contrapartida, percebemos que mesmo reconhecendo
a riqueza da promoção da inclusão para a construção de uma
cultura de respeito, a escola atual tem provocado ou acentuado
desigualdades pessoais, sociais, culturais e políticas (Mendes,
2010). O que demonstra o quanto cada um dos atores desse cenário
precisa se dedicar.
Sabemos que precisamos de reformas profundas no sistema
educacional, mas não podemos aguardar apenas um tipo de medida
para pensar juntos nas melhores estratégias. Por isso, podemos iniciar
esse processo de modo interno, não apenas sensibilizando todos os
atores, mas especialmente validando essa importância e urgência.
Podemos começar repensando nossas crenças e concepções
e após essa reflexão interna, buscar estratégias sobre os fatores
que podemos melhorar em nós mesmos. Aqui, trouxe apenas cinco
pontos para valorizarmos, mas sabemos que existem muitos outros
para avançar.
Com isso, nosso objetivo foi demonstrar a importância da inclusão
na Educação Infantil. Poderíamos ter abordado algumas variáveis que
interferem diretamente. Entretanto, optamos pela base, pelo início,
pelos aspectos psicossociais, abordando tal relevância em cinco
fatores necessários para nosso desenvolvimento biopsicossocial.
Percebemos que a inclusão na Educação Infantil vai além do
simples acesso à sala de aula. É um investimento na construção de

Prefácio 13
um futuro mais inclusivo, respeitoso e harmonioso. Ao proporcionar
experiências ricas e diversas desde a infância, a inclusão não apenas
nutre o crescimento acadêmico, mas também semeia as bases para
uma sociedade que celebra a diversidade em todas as suas mais
ricas formas.

Indicações de Leituras

CIA, F.; RODRIGUES, R. Ações do professor da sala de recursos multifuncionais


com os professores das salas comuns, profissionais e familiares de crianças
pré-escolares incluídas. Práxis Educacional, Vitória da Conquista, v. 10, n.
16, p. 81-103, 2014.

CONCEIÇÃO, A. de N. Construindo um ambiente inclusivo: estudo


sobre mudanças de concepções de deficiências e atitudes sociais de
crianças em relação à inclusão. 2018. 65 f. Trabalho de Conclusão de Curso
(Especialização em Educação Especial e Inclusiva) - Universidade Estadual
Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília, 2018.

CRUZ, M. Desmistificando o mito da turma homogênea: caminhos duma


sala de aula inclusiva. Revista Educação Especial, Santa Maria, v. 23, n.
36, p. 27-42, 2010.

MENDES, E. G. Inclusão marco zero: começando pelas creches. Junqueira


& Marin. Araraquara, SP., 2010.

REGANHAN, W.; MANZINI, E. Percepção de professores do ensino regular


sobre recursos e estratégias para o ensino de alunos com deficiência.
Revista Educação Especial, Santa María, v. 22, p. 127-138, 2009.

SOUZA, M. M. G. da S. e. Concepções de crianças não deficientes


acerca das deficiências: estudo realizado com crianças de 4 a 6
anos de idade. 2010. 132 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de

14 A Casa dos Bebês


Pedagogia) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e
Ciências, Marília, 2010.

SOUZA, M. M. G. da S.e. Estudo evolutivo de concepções de crianças


e adolescentes sem deficiência sobre as deficiências e suas atitudes
sociais em relação à inclusão. 2014. 132 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e
Ciências, Marília, 2014.

SOUZA, M.M. G. da S. e. Concepções de deficiência e atitudes sociais


de crianças e adolescentes sem deficiência pertencentes a contextos
sociais diferentes. 2019. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade
Estadual Paulista Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília, 2019.

VIEIRA, C. M.; DENARI, F. E. Programa informativo sobre deficiência mental e


inclusão: mudanças nas atitudes sociais de crianças sem deficiência. Revista
Brasileira de Educação Especial, v. 18, n. 2, 2012, p. 265-282. Disponível
em: http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
65382012000200007&lng=pt&tlng=pt. Acesso em 3 dez. 2023.

VYGOTSKI, L. S. Problemas del desarrollo de la psique. Obras Completas


– tomo três. Cuba: Pueblo y Educación, 2000.

Prefácio 15
APRESENTAÇÃO
Pra Começo de Conversa…

É com muita alegria que apresentamos este livro como um resultado


da parceria estabelecida entre a Diretoria de Educação de Cafelândia
(SP) na pessoa da Dra. Ana Lucia Garcia Parro (Diretora Municipal de
Educação) e do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicologia Moral e
Educação Integral (GEPPEI) nas pessoas das líderes Patricia Bataglia
e Cristiane Paiva Alves. Em 2022, realizamos a primeira reunião em
que foi solicitada uma formação sobre inclusão e em particular sobre
o Autismo para as educadoras e educadores da cidade.
Propusemos um trabalho mais ampliado em que o tema da inclusão
estivesse presente, mas que contemplasse todas as crianças da rede.
Temos como princípio no grupo que a educação integral, quando
praticada de verdade, inclui a todas as crianças, sejam aquelas
com desenvolvimento padrão ou com necessidades educacionais
especiais. Para atender a uma necessidade específica sobre elucidar
as educadoras e educadores sobre o autismo, convidamos a uma das
colegas participantes do GEPPEI, a psicóloga Vilma Aparecida Bianchi
para ministrar uma palestra tratando especificamente sobre o tema.
Em paralelo, conversávamos para entender como poderíamos nos
aproximar do grupo. Surgiu a ideia de começarmos pelo grupo de
agentes educacionais que atuam na Educação Infantil e Creches
da cidade. Em um primeiro encontro, fizemos um levantamento de
expectativas, dúvidas e necessidades e constatamos que teríamos que
trabalhar com subgrupos e inicialmente com as agentes da creche.
Marcamos um segundo encontro apenas com as agentes das
creches e apresentamos uma aula inicial sobre o desenvolvimento
da criança de 0 a 5 anos. Foi interessante, mas não sentimos que o
caminho seria tão frutífero se não nos aproximassemos mais da prática
das profissionais. Pedimos então que a Dra. Ana Lucia selecionasse

Apresentação 17
uma creche que seria nosso polo para formação de multiplicadores
de um trabalho de educação integral a partir da creche.
Foi assim que nos aproximamos da Creche Escola Cecília de
Castro Delafiori em 2023. Temos realizado visitas mensais no período
letivo, nos comunicado via grupo de Whatsapp, realizado algumas
reuniões online e realizamos também algumas reuniões com a
gestora, supervisora e coordenadora pedagógica.
Em determinado momento, uma feliz coincidência possibilitou que
chamássemos a Dra. Maewa para uma palestra sobre educação
inclusiva para alguns educadores da rede e a Dra. Maewa gentilmente
escreveu o prefácio deste livro.
O que apresentamos na sequência são os primeiros resultados
do trabalho realizado que constituíram algo como um livro de Boas
Práticas para a Educação na Creche: A Casa dos Bebês - Uma
Experiência Inovadora no Município de Cafelândia. Ainda temos
muito a trabalhar, mas com a parceria que estabelecemos com essas
agentes que são extremamente delicadas, dispostas, carinhosas,
criativas e receptivas às orientações, não há como dar errado.

Uma Pequena Descoberta Vira um Grande Aprendizado

Gostaríamos de contar um pouco sobre a capa do livro que retrata


uma casa de bebês. Um lugar aconchegante. Isso nos remete a
sonhos, e, sonhos nos remetem a um trecho da música “Prelúdio” de
Raul Seixas: “Sonho que se sonha só. É só um sonho que se sonha só.
Mas sonho que se sonha junto é realidade”. Pois é, aqui tratamos da
materialização de um sonho… Um sonho, que só se tornou realidade,
porque sonhamos e perseveramos juntos.
A creche - que para nós sempre vai ser a “Casa dos bebês”, começou
de um sonho, um sonho de tornar aquele espaço imenso, em um lugar
aconchegante, a extensão da casa dos nossos pequenos. Afinal, a
creche é onde eles passam boa parte do tempo, experimentando

18 A Casa dos Bebês


o mundo com as profissionais. Nós pudemos também passar bons
momentos ao lado deles.
No intento do sonho se tornar realidade, trabalhamos muito, e tudo
o que fizemos só foi possível, porque trabalhamos juntos. Aqui tem
um pedacinho de cada uma das organizadoras desse material, da
equipe gestora, das agentes (ah, como elas não mediram esforços
para tornar ainda mais agradável esse espaço e literalmente botaram
a mão na massa, ou melhor nos pinceis, nas tesouras e enfim, na
motivação da nossa capa)… Sim, elas construíram uma “cabaninha”
para os bebês e que gostoso é ver essa “cabaninha” estampar a
capa desse livro…

Fonte: Acervo pessoal das autoras

O nosso sonho só tornou-se realidade, porque deixamos um


pedacinho de cada uma de nós nesse projeto e não vamos ficar

Apresentação 19
citando nomes, porque muita gente sonhou e trabalhou para que
isso acontecesse. Seria injusto esquecer de mencionar alguém aqui.
Foram tantas pessoas que sonharam e hoje essa “cabaninha” além
de ilustrar a capa, representa os nossos sonhos e que nela possam
também ter muitos sonhos dos bebês que por ela passarem. Ela
nos remete à “vida” e “vida” sempre vai nos remeter aos pequenos,
motivação da “Casa dos Bebês”.
Ah… o título dessa sessão “Uma pequena descoberta vira um
grande aprendizado” é uma frase pintada em uma das paredes da
Casa dos Bebês pelas agentes do Berçario I.

Fonte: Acervo da creche.

Fundamentando a Nossa Conversa…

A seguir, algumas palavras sobre a Base Nacional Comum Curricular


no que se refere à educação de bebês, crianças bem pequenas e
crianças pequenas. Esse material foi tratado em uma das reuniões

20 A Casa dos Bebês


com a gestora, coordenadora, supervisora e diretora municipal
de educação já que subsidia a construção do planejamento de
atividades das creches da cidade.

O que é a Base Nacional Comum Curricular?

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) possui caráter normativo


e define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens
essenciais1 que todos os alunos devem desenvolver, de modo que
sejam assegurados seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento,
de acordo com o PNE (Plano Nacional de Educação). Assim como
as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica, a BNCC
também está orientada pelos princípios éticos: valorização da
autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao
bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades
e singularidades; b) princípios políticos: dos direitos de cidadania,
do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática, e, c)
princípios esté éticos: valorização da sensibilidade, da criatividade,
da ludicidade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais
(Brasil, 2017; Miguel, 2021).
Tal documento é considerado como:
Referência nacional para a formulação dos currículos dos sistemas e das
redes escolares dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e das
propostas pedagógicas das instituições escolares, a BNCC integra a política
nacional da Educação Básica e vai contribuir para o alinhamento de outras
políticas e ações, em âmbito federal, estadual e municipal, referentes
à formação de professores, à avaliação, à elaboração de conteúdos
educacionais e aos critérios para a oferta de infraestrutura adequada para
o pleno desenvolvimento da educação. (Brasil, 2017, p. 8).

1 As aprendizagens essenciais definidas na BNCC devem assegurar aos estudantes


o desenvolvimento de dez competências gerais, que asseguram os direitos de
aprendizagem e desenvolvimento (Brasil, 2017).

Apresentação 21
Ao longo da Educação Básica, as aprendizagens essenciais
definidas pela BNCC devem então assegurar aos estudantes o
desenvolvimento de dez competências2 gerais, que possuem como
pressuposto a garantia, no âmbito pedagógico, dos direitos de
aprendizagem e desenvolvimento e é importante ressaltar que as
competências gerais da Educação Básica, se inter-relacionam e se
desdobram no tratamento didático proposto para as três etapas da
Educação Básica (Educação Infantil - abrange as creches, Ensino
Fundamental e Ensino Médio), que assim como na Lei de Diretrizes e
Bases (Brasil, 2016) se articulam na construção de conhecimentos, no
desenvolvimento de habilidades e na formação de atitudes e valores
(Brasil, 2017; Miguel, 2021).
Destaca-se, então, que a BNCC não pode ser compreendida como
uma proposta curricular, mas como um conjunto de pressupostos e
princípios que devem reger a elaboração de propostas curriculares
pelas Secretarias de Educação (Miguel, 2021).
Assim como na Lei de Diretrizes e Bases (Brasil, 2016), a Base
Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017) entende a Educação
Infantil como primeira etapa da Educação Básica, ou seja, o início
e o fundamento do processo educacional. O documento aborda
também que a entrada na creche ou na pré-escola é, na maioria das
vezes, a primeira separação das crianças dos seus vínculos afetivos
familiares para uma situação de socialização estruturada.
A BNCC ainda ressalta que
Nas últimas décadas, vem se consolidando, na Educação Infantil, a
concepção que vincula educar e cuidar, entendendo o cuidado como
algo indissociável do processo educativo. Nesse contexto, as creches e
pré-escolas, ao acolher as vivências e os conhecimentos construídos pelas
crianças no ambiente da família e no contexto de sua comunidade, e articulá-

2 A BNCC define competência como a mobilização de conhecimentos (conceitos


e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes
e valores para utilização na resolução das demandas da vida cotidiana, do pleno
exercício da cidadania e do mundo do trabalho (Brasil, 2017).

22 A Casa dos Bebês


los em suas propostas pedagógicas, têm o objetivo de ampliar o universo de
experiências, conhecimentos e habilidades dessas crianças, diversificando
e consolidando novas aprendizagens, atuando de maneira complementar à
educação familiar- especialmente quando se trata da educação dos bebês
e das crianças bem pequenas, que envolve aprendizagens muito próximas
aos dois contextos (familiar e escolar), como a socialização, a autonomia e
a comunicação (Brasil, 2017, p. 36, destaque das autoras).

Levando em consideração a citação acima, a BNCC (Brasil, 2017)


complementa que para potencializar os processos de aprendizagens
e o desenvolvimento das crianças, são essenciais à prática do diálogo
e o compartilhamento de responsabilidades entre a instituição
de Educação Infantil e a família. Para tanto, é necessário que a
instituição conheça e trabalhe com as culturas plurais, dialogando
com a riqueza/diversidade cultural das famílias e da comunidade.
Em consonância com a DCNEI (Brasil, 2009), a BNCC (Brasil,
2017), considera como eixos estruturantes das práticas pedagógicas
dessa etapa da Educação Básica as interações e a brincadeira,
que são definidas como experiências que possibilitam a construção
bem como a apropriação de conhecimentos por meio de ações e
interações das crianças com seus pares e com os adultos, auxiliando
nas aprendizagens, desenvolvimento e socialização.
Nota-se claramente no documento a preocupação com a constituição
de sujeitos de aprendizagem, valorizando-se a identidade cultural, as
histórias de vida, as experiências e o convívio como forma de construção
de ideias e valores a respeito de si, dos outros e da natureza. Sem essas
perspectivas de desenvolvimento pessoal e coletivo as crianças terão o
seu processo de formação moral e intelectual prejudicado e com poucas
perspectivas de consolidação das noções de respeito e desenvolvimento
moral (Miguel, 2021, p.99).

Sendo assim, a BNCC (2017) coloca que para assegurar os direitos


de aprendizagem na Educação Infantil, impõe-se a necessidade de

Apresentação 23
uma intencionalidade educativa3 às práticas pedagógicas, tanto
na creche quanto na pré-escola. Dessa forma, o documento se refere
a parte do trabalho do educador como o de refletir, selecionar,
organizar, planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e
interações, além de observar a trajetória de desenvolvimento de
cada criança e de todo o grupo, isto é, as conquistas, avanços,
possibilidades e aprendizagens; sem intenção de selecionar, promover
ou classificar as crianças em “aptas” e “não aptas”, “prontas” ou
“não prontas”, “maduras” ou “imaturas”. Tais elementos observados
pelos educadores na Educação Infantil possuem a finalidade de
reorganizar tempos, espaços e situações visando sempre a garantia
dos direitos de aprendizagem de todas as crianças.

Os Campos de Experiências e as Creches:


Marcos Teóricos e Aspectos Legais
Na Educação Infantil, etapa que compreende também as crianças
da creche, as aprendizagens e o desenvolvimento das crianças, tem
como eixos estruturantes as interações e a brincadeira, que visam
assegurar os seis direitos de aprendizagens e desenvolvimento, sendo
eles: 1) convivência de forma harmoniosa com crianças e adultos,
em pequenos e grandes grupos; 2) brincar cotidianamente de
diversas formas; 3) participar ativamente, com adultos e crianças das
escolhas das brincadeiras, dos materiais e dos ambientes; 4) explorar
movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores etc.; 5) expressar-
se de diferentes formas suas necessidades, emoções, sentimentos,
dúvidas e hipóteses por meio de diferentes linguagens e, por fim,
3 Essa intencionalidade, de acordo com a BNCC, consiste na organização e
proposição, por parte do educador, de experiências que permitam às crianças
o conhecimento de si e do outro, conhecer e compreender as relações com a
natureza, com a cultura e a produção científica, através de práticas de cuidados
pessoais, nas brincadeiras, nas experimentações com materiais variados etc.
(Brasil, 2017)

24 A Casa dos Bebês


6) conhecer-se e construir, paulatinamente sua identidade pessoal,
social e cultural (Brasil, 2017, p. 38).
A BNCC (2017, p. 40) estabelece que: “a definição e a denominação
dos campos de experiências também se baseiam no que dispõem
as DCNEI em relação aos saberes e conhecimentos fundamentais a
serem propiciados às crianças e associados às suas experiências”.
Em se tratando de um texto que busca relacionar a BNCC às crianças
das creches, considerando o desenvolvimento da moralidade e do
valor respeito em especial, o campo de experiência que mais nos
ajuda a compreender tal intento é o “eu, o outro e nós”, que de
acordo com a BNCC (2017) é na interação com os pares e com os
adultos que as crianças constroem um modo peculiar de agir, sentir
e pensar e começam a descobrir que existem outros modos de vida,
pessoas diferentes que por sua vez, possuem outros pontos de vista.
Concomitante à sua participação em relações sociais e de
cuidados pessoais, as crianças constroem sua autonomia e senso
de autocuidado, de reciprocidade e de interdependência com o
meio. Por isso, é preciso que na Educação Infantil haja a criação de
oportunidades para que as crianças entrem em contato com outros
grupos sociais e culturais, outros modos de vida, diferentes atitudes
etc., pois a partir dessas experiências, elas podem ampliar o modo
como percebem a si mesmo e aos outros, valorizar sua identidade,
respeitar ao outro e reconhecer as diferenças que possuímos
enquanto seres humanos (Brasil, 2017; Miguel, 2021).
Para Silva, Alves e Guisso (2022), as creches como ambiente de
cuidado, surgiram a partir da necessidade das mulheres ingressarem
no mercado de trabalho e por conseguinte, as crianças necessitavam
de um lugar onde receberiam o cuidado necessário enquanto suas
mães exerciam suas funções e no contexto brasileiro, por muito
tempo, “[...] estas instituições funcionavam com uma proposta
assistencialista, sendo uma conquista dos movimentos populares, e
também das mães [...]” (p.45).

Apresentação 25
Para Abramowicz e Wajskop (1999), foi a partir dos anos 1970, que
as creches passaram a ser concebidas e reivindicadas como lugar
de educação e cuidado das crianças de 0 a 6 anos, deixando de
ter apenas como responsabilidade cuidar, assistir e higienizar e
atualmente ela é entendida como um contexto formal de educação
e apoio às necessidades das crianças, por serem espaços passíveis
de se tornarem um ambiente de ampliação de seus modos de
socialização e sociabilidade.
A creche tem como proposta o desenvolvimento integral da criança, sendo
assim, a escola tem o papel de mediar essas aprendizagens, e é na escola
que a criança brinca, e aprende com as brincadeiras, ela propicia à criança
o crescimento saudável [...] (Silva; Alves e Guisso, 2022, p. 46).

Já Moreno (2007), argumenta que a creche, por se constituir na


primeira etapa da educação básica “[...] deve levar em conta o
brincar como um direito da criança, pois este constitui um espaço
sócio-moral fértil na construção de saberes, considerando-se
também, o direito da mesma aos minutos do tempo presente, a ser o
que ela é [...]” (p. 58).
Nos Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Infantil
(RCNEI) 1998, p. 23), temos o educar como
[...] propiciar situações de cuidado, brincadeiras e aprendizagens orientadas
de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das
capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros
em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso,
pelas crianças, ao conhecimento mais amplo de realidade social e cultural.
(Brasil, 1998, p. 23)

Nesse contexto, Lepre (2021) considera o trabalho pedagógico


nas creches ainda um desafio por esbarrar em visões que precisam
ser ressignificadas por todos que nela atuam. Visões estas de cunho
assistencialistas que priorizam o cuidado, como se esse não fosse
parte do educar. Para a BNCC (2017), os bebês encontram-se na
faixa etária entre zero e um ano e seis meses, aproximadamente.

26 A Casa dos Bebês


E sobre os motivos que os bebês vão para a creche, deve-se a
diversos fatores: desde a necessidade das famílias trabalhadoras em
poder ter espaços de cuidado e educação para os filhos enquanto
trabalham até o reconhecimento de que as creches podem ser um
ambiente de estimulação, interação, desenvolvimento e aprendizagem
para os bebês.
Por fim, é importante considerar que a indissociabilidade entre
o educar e o cuidar, pressupõe a ética do cuidado e considerar
os bebês em toda a sua complexidade, “[...] visando a inserção
desses novos membros da cultura no mundo simbólico e das trocas
sociais [...]” (Lepre, 2021, p.188). Sendo assim, os bebês são sujeitos
ativos, de conhecimento, que se comunicam por meio de diferentes
linguagens, tais como o olhar, os gestos, o choro, assim como as
diversas vocalizações pré-verbais.

Indicações de Leitura

ABRAMOVICZ, A.; WAJSKOP, G.. Educação infantil: creches-atividades


para crianças de 0 a 6 anos. São Paulo: Moderna, 1999.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB. 9394/1996.

BRASIL, Secretaria de Educação Infantil. Referenciais Curriculares


Nacionais da Educação Infantil. Vol.1. Brasília: MEC/SEI. 1998.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica.


Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília:
MEC/SEB, 2010.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base


Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC/SEB, 2017.

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação/Câmara


de Educação Básica. Parecer nº 20/2009. Discute as Diretrizes Curriculares

Apresentação 27
Nacionais para a Educação Infantil. Brasília, DF, 11 de novembro de 2009.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content
&view=article&id=12745:ceb-2009&catid=323:orgaos-vinculados>. Acesso
em: 20 fev. 2011.

LEITE FILHO, A. G.; NUNES, M. F. Direitos da criança à Educação Infantil:


reflexões sobre a história e a política. In: KRAMER, S.; NUNES, M. F.;
CARVALHO, M. C. (org.). Educação Infantil: formação e responsabilidade.
Campinas: Papirus, 2013. p. 67-88.

LEPRE, R. M. Uma proposta teórico-metodológica de Educação em Valores


voltada ao trabalho pedagógico com os bebês na creche. In: LEPRE,
R. M.; ALVES, C. P.; BATAGLIA, P. U. R.; ARRUDA, A. C. J. Z. de. (org.).
Desenvolvimento Moral e Educação em Valores: Estudos e Pesquisas.
Bauru: Gradus Editora, 2021. p.187-205.

MIGUEL, P. C. O desenvolvimento moral e o valor respeito na Educação


Infantil. Marília: Oficina Universitária/Selo Cultura Acadêmica, 2021.

MORENO, G. L. Organização do Trabalho Pedagógico na Instituição de


Educação Infantil. In: PASCHOAL, J. D. (org.). Trabalho Pedagógico na
Educação Infantil. Londrina: Humanidades, 2007. p. 54-62.

SILVA, E. C. S. da.; ALVES, L. A. F.; GUISSO, S. M. O Desenvolvimento da


autonomia em crianças da creche a partir de propostas metodológicas
para trabalhar os campos de experiências previstos na BNCC. Revista
Interdisciplinar da FARESE, v. 1, n. 01, p.43-68. 2022. Disponível em: <https://
revista.grupofaveni.com.br/index.php/revistainterdisciplinardafarese/
article/view/5>. Acesso em: 23 mar. 2024.

28 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 1
Espelho, Espelho Meu e a Chamadinha (a Acolhida dos Bebês)

Um dos momentos que eu mais gosto é a hora da chamadinha, que é um


momento que as crianças interagem bastante com a gente. Eles ficam
bastante animados, quando a gente vai chamando os nomes… batendo as
palminhas… tem criança que começa a dançar junto, e, assim, é bem legal.
A gente vê o rostinho deles quando a gente chama o nome e é bem bacana
ver a interação deles com a gente.
(Simone, agente do Berçário I, áudio de 21/03/2024)

Por que colocar um espelho na sala do berçário?


Chamada? Isso não é mais para o Fundamental I?
Vamos lá!
A fase desses bebês, de zero a dois anos, é uma verdadeira revolução.
Dos reflexos primitivos até a fala!!! Tanta coisa acontecendo!!!
De um sentimento oceânico em que o bebê não necessita buscar
nada, já que a satisfação vem imediatamente, até o surgimento de
representações mentais que possibilitam a linguagem, há um caminho
breve em número de anos, mas imenso em construções.
Até os 12 meses aproximadamente, ao olhar no espelho a criança
não identifica que aquela imagem é a dela, ou seja, que ela está
duplicada: ela real e ela imagem. Tanto assim, que se o educador
faz uma marquinha com tinta em seu rosto e ela se vê no espelho,
não lhe ocorre passar a mão pelo seu rosto para tirar a mancha.
Poucos meses depois, repetida a mesma experiência, o resultado é
completamente diferente. A criança se vê no espelho, reconhece que
é ela própria e busca pela mancha em sua pele ao olhar para a
imagem no espelho.
O que aconteceu?
Piaget descreve passo a passo a formação da imagem mental
a partir da interiorização dos esquemas de imitação. Ou seja, a

Espelho, espelho meu e a chamadinha 29


criança imita gestos e sons e quando faz isso assimila tais ações
a seus esquemas motores. Também, modifica tais esquemas para
incorporar novos objetos e novos sons e gestos. Tais esquemas de
imitação originam representações da realidade. É por isso que a
experiência da criança com o espelho ou com imagens de pessoas e
objetos ausentes é importante para seu desenvolvimento.
Ver as imagens dos colegas, das educadoras e de si próprio,
relacionar a imagem à pessoa real ou ao ausente possibilita à
criança construir as imagens mentais que serão fundamentais para a
função simbólica que é constituída pela relação entre um significado
e um significante. Assim, a foto de um amigo que não veio hoje é o
significante. O significado é o próprio amigo ausente. A vinculação
entre ambos é a função simbólica que é a base para a linguagem.
Quando dizemos elefante, esse é o significante cujo significado
está ausente, mas mesmo assim, conseguimos nos referir a ele pela
linguagem, graças à função simbólica.
Mas como trabalhamos isso a partir do espelho no berçário ou
da chamadinha?
O educador na creche pode organizar sua rotina de modo que
uma das primeiras atividades do dia seja a chamadinha. As fotos
de todos os bebês e das educadoras devem ser disponibilizadas
de modo que as crianças possam identificar os amigos a partir das
fotos. Por exemplo, coloque todos os bebês no tatame de modo que
todos possam se ver.
Educadora - Vamos ver quem veio hoje. (Pega uma das fotos e
mostra para todas as crianças) - Quem é essa criança? A Ana? Onde
está a Ana? (mostrar a Ana, levar a foto até um mural onde as fotos
possam ficar coladas de modo separado - os que vieram e os que
não vieram hoje).
No início do ano, os bebês são muito pequenos e não se
reconhecerão. Mas, é importante mostrar as fotos de cada criança.
Isso se torna parte da rotina o que é muito importante nessa fase por
outros motivos que serão expostos em outro capítulo. No decorrer

30 A Casa dos Bebês


do ano, as educadoras vão percebendo que a atenção à foto se
amplifica, que o reconhecimento de si e do outro começa a existir e
que a evocação a partir da foto se forma. É isso que esperamos com
essa atividade.

Chamadinha com as Fotos dos Bebês -


no Início e Após as Intervenções do Projeto

Fonte: acervo da creche.

Indicação de Leitura

Piaget, J. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho,


imagem e representação (Cabral, A.; Oiticica, C.M., Trad.). 2a Ed. Rio de
Janeiro: Zahar; Brasília: INL, 1975, 370 p.

Espelho, espelho meu e a chamadinha 31


CAPÍTULO 2
Primeiro uma Coisa e Depois Outra… (a Rotina dos Bebês)

Logo no início do dia, após o acolhimento de cada bebê, guardando


a mochila e vendo alguma necessidade imediata, colocamos os
bebês em roda e conversamos sobre o que vai acontecer no dia.
No início do ano, com os bebês ainda bem pequenos, não haverá
grande participação na elaboração da rotina, mas é importante
lembrar que por volta dos 5 meses, a criança já começa a estruturar
as noções de espaço, tempo, causalidade e permanência do objeto.
Ou seja, o mundo começa a ganhar uma certa organização em
termos do que acontece antes e depois, dos espaços que a criança
ocupa e que os objetos ocupam, das relações entre sua ação e os
efeitos que causa no ambiente e da independência dos objetos.
Aos 5 meses aproximadamente, o bebê ainda não tem a noção
de que os objetos continuam existindo fora do seu campo visual. Um
brinquedo quando desaparece sob uma almofada deixou de existir.
Nesse momento, a criança começa a estabelecer algumas relações
entre o que ela faz e o que acontece, por exemplo, ela balança seu
corpo e a cortina da sala faz um movimento por causa do vento.
Então a criança repete seu movimento corporal esperando ver de
novo o movimento da cortina. Os dois eventos, obviamente não estão
relacionados fisicamente, mas é interessante notar que a criança
estabelece essa relação.
Na questão do tempo, a criança começa a relacionar eventos com
“um antes e depois”, por exemplo: “primeiro vem a comida e depois o
suco”, isso já é o nascimento da noção de tempo. No espaço também
começamos a perceber que a criança dirige sua mão para o objeto
desejado, ou seja, os primeiros deslocamentos e coordenações
espaciais começam a ser possíveis.
Nesse sentido, a apresentação de fotos ou objetos que representam
as fases do dia podem colaborar para a construção do real na

Primeiro uma coisa e depois outra… 33


criança. Mais para o final do ano, as próprias crianças podem montar
o painel da rotina. Isso também funciona para acalmar a ansiedade,
organizar as tarefas e reduzir conflitos, já que começam a entender
que primeiro vem uma coisa e depois outra.
Vejamos alguns exemplos de como apresentar a rotina para os bebês.
Estamos falando de crianças de 4 meses a 5 anos e portanto não
cabe de modo algum usarmos apenas da escrita para organizar a
rotina. Podemos usar objetos, por exemplo, colar em um painel com
velcro de modo que a ordem possa ser alterada e que os objetos
sejam colados um por vez:

Outra forma de demonstrar a rotina ou construir junto com a turma


qual será essa rotina, é tirar fotos dos vários momentos do dia e colar
em uma sequência temporal:

34 A Casa dos Bebês


Fonte: acervo da creche.

Pode-se ainda, pedir que as crianças desenhem os vários momentos


do dia, elejam o mais representativo e dessa forma fazer a exposição
dos desenhos na sequência da rotina.

Fonte: acervo pessoal das autoras.

Primeiro uma coisa e depois outra… 35


Uma forma alternativa (que não julgamos ser a melhor por não ter
a identidade do grupo) é imprimir da internet os vários momentos:

Fonte: imagens retiradas da internet.

Indicações de Leituras

CAMPOS, Maria Malta, et al. Políticas e Práticas na Educação Infantil:


Creches e Pré-Escolas. São Paulo: Cortez, 2011.

36 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 3
“Não Fazendo Tudo o que Quer, Mas Querendo Tudo o que
Faz” (o Trabalho com as Atividades Diversificadas na Creche)

Apesar de não terem, necessariamente, a formação em Pedagogia,


as orientações a seguir se baseiam em suposições pedagógicas e
científicas, sobre as quais acreditamos facilitar o desenvolvimento
das crianças, em suas dimensões individual e coletiva ou em
grupo. Precisamos esclarecer que todas as sugestões presentes
aqui não são rígidas, muito menos possuem o caráter fechado ou
dogmático. Pelo contrário, servem apenas como orientação, visando
o aperfeiçoamento do trabalho já desenvolvido com tanta maestria
por todas as Agentes de Atividade Infantil (AAIs), atuantes nas
unidades de ensino do município. Até mesmo a forma de encaminhar
as propostas, principalmente a que agora iremos abordar, depende
das respostas dadas pelas crianças (nem sempre verbais, quando
tratamos de bebês que ainda não falam, mas gesticulam, olham
aprovando ou reprovando os nossos intentos).
Esse ponto inicial é central: toda atividade planejada para ser
desenvolvida com a criança, precisa partir do que ela já está
fazendo. Assim, se a criança está brincando com um livro e chegou a
hora de ir para o banho, e ela apresenta resistência para abandonar
a primeira atividade, é dever do adulto integrar (ligar), de alguma
forma, as duas - no exemplo mencionado, pode pegar um livro cujo
material pode ser molhado com o intuito deste marcar a transição
entre os dois momentos. A ideia é que o educador busque sempre
a proposta de incluir outros (novos e diferentes) elementos ao que a
criança vem realizando, pois, dessa forma, é possível assegurar que a
criança está motivada para fazer aquilo naquele momento.
Nesse sentido, é imprescindível que o educador organize tanto
o espaço como os materiais a serem utilizados, com antecedência,

“Não fazendo tudo o que quer, mas querendo tudo o que faz” 37
para que, embora ocorram imprevistos, improvisos não sejam
necessários!!! Para tanto, é importante estar muito claro os objetivos
que pretende alcançar e os meios ou etapas daquela atividade, uma
vez que o planejamento exigirá antecipações e preenchimento de
possíveis adversidades no decorrer da mesma.
Na sua comunicação com a criança, o educador precisa ser
muito claro e objetivo, para que não haja confusão ou não ocorram
distorções no entendimento de todos, grandes ou pequenos. Também
sugerimos que exista sempre uma grande variedade de materiais, de
encorajamento às crianças para serem ativas e curiosas, de perguntas
direcionadas a elas, conversas despretensiosas e outras também
intencionais com o objetivo de ensinar alguma coisa, e multiplicidade
de momentos nos quais os pequeninos possam responder às suas
necessidades afetivas, em que os adultos favorecem as interações
carinhosas e respeitosas, com demonstrações práticas entre eles, a
fim de criar e intensificar elos e outras condições favoráveis para os
seus desenvolvimentos.
O trabalho pedagógico agora proposto prevê diferentes tipos
de atividades, ocorrendo nos mais variados momentos da rotina.
Consoante ao Programa de Educação Infantil e Ensino Fundamental
(PROEPRE), de Assis e Assis (2013a, 2013b, 2013c), em que, em um
dia de aula, períodos de atividades diversificadas, de atividades
coletivas, de atividades independentes, e de atividade individuais, são
distribuídos harmonicamente na rotina diária, de forma às crianças
se apropriarem mais e mais das tarefas e de suas responsabilidades.
O que são cada um desses tipos de atividades?
As atividades diversificadas: são aquelas com no mínimo duas
propostas de atividades diferentes uma da outra, e que ocorrem ao
mesmo tempo! As atividades diversificadas precisam ocorrer de 40 a
50 minutos, sendo o ideal que aconteçam em todas as turmas/salas
da instituição escolar, uma vez no período da manhã e um no da tarde,
todos os dias. Durante a execução das atividades diversificadas, as
crianças ficam livres para escolher entre uma e outra.

38 A Casa dos Bebês


Realizadas individualmente ou em grupos, enquanto uns
constroem com blocos ou sucatas, outros brincam com areia e
água, jogam bola, correm, pulam corda, entre outras. Valorizamos
as atividades em grupos pois favorecem a interação social e a
cooperação. No momento de tais atividades, o(s) educador(es)
é(são) o(s) coordenador(es)! Observa as crianças e intervém
oportunamente para explorar o que elas estão fazendo, propondo-
lhes perguntas desafiadoras, que as fazem refletir, duvidar,
perceber que é preciso testar, etc.

Fonte: registro do acervo pessoal de uma das


autoras enquanto professora numa creche em 2014.

Tais atividades oportunizam às crianças satisfazer suas


necessidades e interesses, além de trabalharem segundo os seus
próprios ritmos, consolidarem a noção de tempo, realizarem escolhas,
tomarem decisões, serem independentes e muito mais.
As atividades coletivas: são realizadas por toda a turma ao
mesmo tempo, sob orientação dos educadores, os quais propiciam
a troca de pontos de vista e a aprendizagem de normas de
convivência social, além de oportunizar às crianças a experiência
da vida democrática.

“Não fazendo tudo o que quer, mas querendo tudo o que faz” 39
Fonte: registro do acervo pessoal de uma das autoras enquanto professora numa
creche em 2019.

A chamadinha, o planejamento da rotina, os momentos de


alimentação, de arrumação da sala, ouvir histórias, cantar, ou
a Hora da Avaliação do Dia,são alguns exemplos de atividades
frequentemente desenvolvidas por toda a turma.
As atividades individuais: durante esse tipo de atividade,
um educador trabalha individualmente com cada criança, ou
com um grupo reduzido de alunos, enquanto as outras realizam
atividades diversificadas!

Fonte: registros do acervo pessoal de uma das autoras enquanto professora numa
creche em 2013.

40 A Casa dos Bebês


A atividade individual pode ser escolhida pela criança ou sugerida
pelo(a) educador(a), e permite a interação direta do adulto com
a criança, a fim de acompanhar o seu raciocínio e perceber a
compreensão que ela tem sobre o que está realizando, e, portanto,
possibilita ao educador conhecê-la melhor.
As atividades independentes: num curto espaço de tempo, as
crianças trabalham individual ou coletivamente sem a supervisão
direta do adulto. Geralmente, essas atividades têm muito
sucesso quando partem de conteúdos de interesse especial da
criança. Tal como os outros tipos de atividade, nestas, a criança
também pode escolher livremente, a partir de algumas ou várias
opções disponibilizadas pelo adulto, e igualmente possibilitam o
desenvolvimento da responsabilidade, da iniciativa e da autonomia,
porque propiciam à criança aprender a trabalhar sem a orientação
direta do(s) educador(es).

Fonte: registro do acervo pessoal de uma das autoras enquanto estagiária numa
creche em 2011.

“Não fazendo tudo o que quer, mas querendo tudo o que faz” 41
O Tempo de Atividade

As decisões, a favor ou contra a uma maior ou menor flexibilidade


do horário das atividades na rotina da creche, precisam ser baseadas
nos objetivos educacionais que se tem em cada realidade.
O objetivo de se pensar e programar o tempo para cada
atividade é que as crianças estejam intelectualmente, socialmente
e moralmente ativas, e mais e mais autorreguladas. Não
necessariamente fazendo o que querem, mas querendo o que precisa
ser feito!

Indicações de Leituras

ASSIS, M. C. de.; ASSIS, O. Z. M. de. (org.). PROEPRE: fundamentos teóricos


da educação infantil de 0 a 3 anos. 7. ed. Campinas, SP: Book Editora, 2013a.

ASSIS, M. C. de.; ASSIS, O. Z. M. de. (org.). PROEPRE: fundamentos teóricos


da educação infantil II. 7. ed. Campinas, SP: Book Editora, 2013b.

ASSIS, M. C. de.; ASSIS, O. Z. M. de. (org.). PROEPRE: prática pedagógica.


4. ed. Campinas, SP: Graf. FE (UNICAMP); LPG, 2013c.

42 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 4
Eu Também Sei Falar! (a Questão da Linguagem Infantil)

Assim como destaca Jean Piaget, um dos principais estudiosos


do desenvolvimento infantil do século XX, em um de seus livros em
que compila textos, inclusive abordando a questão da aquisição do
pensamento e da linguagem da criança, e suas relações (Piaget,
1964/2006), um bebê com apenas alguns meses de vida comparado,
com uma criança de dois ou três anos, na posse de expressões verbais
elementares, faz-nos parecer evidente que a linguagem modificou
veementemente sua inteligência. Mas será que a criança só passará
a ser inteligente com o surgimento da linguagem? É em vão qualquer
esforço pedagógico para com os bebês, haja vista que eles ainda
não sabem falar? Vamos ver que não!
No começo, a linguagem da criança é puramente emocional, ou
seja, limita-se à simples expressão pela repetição de letras, sílabas,
que pouco a pouco vai se coordenando, até a formação das primeiras
palavras, frases e expressões que refletem a sua maneira de conceber
e interpretar a realidade que a cerca de maneira global.
O que será preciso acontecer para que a criança comece a falar?
É primordial destacar que, para nós, a linguagem da criança não
nasce com ela (isto é, a criança não herda de sua genética uma
estrutura linguística que, ao “amadurecer”, proporcionará a ela o ato
comunicativo mais pra frente)...
Ah, mas Fulaninho é filho de pais letrados, por isso aprendeu a falar
cedo! Ou: Ciclaninho é irmão de Beltraninho, por isso não aprendeu
a falar ainda…
Não!!! Aprender a falar ou não, não está vinculado (ou condicionado)
à hereditariedade do sujeito. Bem como aprender a falar não precisa
esperar o tempo da criança, ou “só quando ela estiver pronta”, como

Eu também sei falar! 43


se fosse ocorrer de maneira automática e programada, dependendo
apenas da maturação das estruturas orgânicas do indivíduo.
Tampouco surgirá em função do contato puro e direto com a
linguagem do seu grupo social (passada através da transmissão
ou aprendida porque o sujeito absorveu o que lhe falaram), ideia
expressa como no exemplo a seguir:
Eu, como professora, vou falar, falar e falar, um monte, com os
bebês, e como eles não sabem nada e não conseguem falar ainda,
vão precisar absorver tudo o que eu falo, repetindo, tal qual eu digo
e inúmeras vezes, pois somente assim poderão um dia chegar a falar.
Também não!!! Isso porque, por mais que possa parecer que
aprendemos principalmente pelos sentidos, isto é: vendo outras
pessoas fazendo as coisas, ou ouvindo outras pessoas falando, etc.
na verdade, Piaget vai mostrar -em vários de seus estudos- que
aprendemos mesmo “fazendo por nós mesmos”! Ou seja, o sujeito
aprendiz precisa “agir”! Agir sobre os objetos… Agir sobre a linguagem!
Assim, antes de aprender a falar de modo acertado, o bebê irá
passar por um longo processo de descobertas, experimentações, sustos,
tentativas e erros, que culminará, próximo aos dois anos de idade, no
aparecimento da linguagem verbal, a qual estará, até então, a meio
caminho de sua finalidade social ou de comunicação verdadeira.
Claro que o choro, o riso, o grito e os balbucios, por exemplo, são
meios de expressão de dores, alegrias, medos, solidão ou reflexos
incoordenados das expressões orais, nas quais a criança bem
pequenininha já age sobre o mundo que a cerca, na busca incessante
por dar sentido e incorporar elementos para a sua própria ação. A
linguagem, nesse ponto, ainda com uma função intrinsecamente
emocional e individual, mesmo que esteja inserida em um meio social,
cercado de pessoas que reagem a tais expressões iniciais da criança,
até este momento, não pode ser considerada de cunho social ou
comunicativo, como também não pode ser desvalorizada como um
saber válido para a criança nesse período.

44 A Casa dos Bebês


E será justamente a imersão nesse meio social, no qual as pessoas
que rodeiam a criança (adultos, pais, professores, familiares, outras
crianças, enfim) farão questionamentos e exigirão dela (re)elaborações
cada vez mais organizadas, despertando necessidades voltadas
para a comunicação, mais clara, mais objetiva e coordenada, para
se fazer entendido por quem a escuta. A linguagem é, portanto, um
elemento social e intervém nos domínios representativos da criança
(ou do seu pensamento), e se enquadra como uma das dimensões,
juntamente com outras (como o desenho, a imitação, o jogo de faz-
de-conta e a imaginação), que precisa ser trabalhada na creche.
Partimos da premissa de que a comunicação sempre parte de uma
necessidade. Se a criança começar a falar “á” e o adulto já lhe vir
com um copo de água, ela jamais sentirá a necessidade de terminar a
palavra ou quiçá construir uma frase inteira para expressar sua sede.
Então, precisamos tomar cuidado para não fornecer respostas
ou soluções à criança, antes mesmo de ouvir sobre suas intenções
terminadas. Caso essa necessidade de compartilhar não venha
espontaneamente, precisamos, enquanto adultos, gerar essa
necessidade fazendo perguntas a elas!
Você disse á! O que você está querendo? Beber “água”? Então
diga: “á-gua”, “eu quero água”!
Já quando ocorrer o contrário, isto é, quando a criança fizer
perguntas sobre, por exemplo, “o que é isso?”, precisamos considerar
que a sua intenção não é a de descobrir, meramente, o nome dos
objetos, mas a funcionalidade que desempenham (ou para que servem),
para então estabelecerem relações com suas utilizações, realizando
generalizações ou individualizações acerca de suas aplicações.
Por exemplo, se a criança pergunta “o que é isso?” - e aponta para
uma cadeira. Ao invés de somente responder “isso é uma cadeira”,
acrescentar a função dela, como “que serve para nós nos sentarmos
e encostarmos as costas”...
Outro aspecto significativo, é quando não desmerecemos,
criticamos ou fazemos brincadeiras com as falas dos pequeninos,

Eu também sei falar! 45


só porque ainda não estão no padrão adulto ou com a pronúncia
precisa de certas palavras e/ou frases. Dessa maneira, ainda que
não entenda o que a criança fala, o adulto pode perguntar de formas
diferentes ou pedir para que mostre (ou aponte) o que está desejando
comunicar, até se fazer entendida.
Outrossim, é preciso que o adulto fale naturalmente com a
criança, e não se expresse com alteração no tom de voz, ou com
linguajar mais infantilizado - como no caso de se dirigir verbalmente
aos bebês. Por fim, é fundamental o respeito à vez “de voz” (vez
de falar e ser ouvida) da criança e a valorização de seu esforço
e conquistas progressivas. O ambiente de ensino e aprendizagem
com bebês também precisa considerar tais aspectos, nos quais as
relações afetivas e intencionalmente comunicativas entre os adultos
e os pequeninos, tornem-se, gradualmente,
Por isso, tão importante quanto falar para a criança, é falar
com a criança, em todos os momentos do dia!!! Até os que
parecem ser os mais “banais”... Pode até parecer que não, mas é
muito válido possibilitar que a criança também expresse, livremente,
por meio da oralidade, suas vontades, suas ordens e apontamentos
gerais. A nós, adultos, cabe solicitar sua participação, fazer-lhe
questionamentos sobre “o que você está fazendo?” ou “por que
escolheu usar isso e não aquilo?”, é um rico caminho a se trilhar. Pedir
para que ela conte sobre o que está brincando, e dê explicações
sobre as suas escolhas e ações, fará com que ela pense no que
está a fazer, pense para falar, e isso ajudará muito na organização
e reorganização de seus pensamentos… Novamente e para frisar
mesmo: o professor ou adulto pode e deve fazer isso, mesmo que a
criança ainda não fale convencionalmente!!!
Nessa perspectiva, a inteligência acontece antes do aparecimento
da linguagem na criança, sendo, por isso mesmo, muito necessário o
trabalho pedagógico com as criancinhas desde muito cedo, embora
pareça que, em um primeiro momento, estaremos a falar e elas não
estarão a compreender.

46 A Casa dos Bebês


Agente Maiara conversando com a criança de menos de um ano de idade

Fonte: acervo da creche do município de Cafelândia.

Aprendemos a falar, falando! E, ainda que isso não se dê, logo


cedo, de forma tão certinha ou na perfeita utilização da linguagem,
a linguagem verbal acaba sendo resultado das construções e
aquisições realizadas pela criança, desde o seu nascimento, as
quais lhe possibilita organizar as noções de objeto, espaço, tempo e
causalidade a nível prático, em uma inteligência igualmente prática
e muito mais abrangente.

Indicações de Vídeo/Leitura

Vídeo de uma mãe de criança com desenvolvimento atípico (com


síndrome de down) no qual compartilha dicas que adota para

Eu também sei falar! 47


desenvolver a fala da filha: <https://www.instagram.com/reel/
C71tckNpAxp/?igsh=MWl1c28xYzYxd3V3Zw==>. Acesso em: 5 jun. 2024.

Livro de Piaget que é um compilado de textos, apresentações em palestras


etc. e que aborda esse e outros assuntos importantes: PIAGET, J. Seis
estudos de psicologia. 5. reimpressão. 24. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2006. (Obra originalmente publicada em 1964).

48 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 5
Hum, que Delícia! (o Momento da Alimentação)

A alimentação é uma atividade que fazemos desde o momento


do nascimento, iniciando com a amamentação e progredindo com
a inserção de alimentos sólidos, de forma gradual, a alimentação
tem papel essencial no desenvolvimento saudável dos bebês, e faz
parte da rotina diária da creche. Neste capítulo vamos pensar sobre
essa atividade corriqueira e suas possibilidades para implementar
o desenvolvimento não apenas nutricional dos bebês, mas também
sensorial, de linguagem e de novas descobertas.Todos os momentos
da rotina podem ser aproveitados para brincar, cuidar e educar, até
as atividades mais simples tem um grande potencial, pois, os bebês
estão sempre dispostos a aprender e interagir. Ou seja, é mais uma
oportunidade para promover o desenvolvimento integral dos pequenos.
O início do momento da alimentação na rotina pode ser marcado
com o uso de canções, de preferência a mesma música todos os dias
para que os bebês criem a relação da música com o momento da
alimentação. Uma sugestão de música é “Sopa”, da Palavra Cantada,
que diz: “o que é que tem sopa do neném”...e alguns passos podem
ser seguidos para que o momento seja agradável.
O ambiente de alimentação deve ser seguro e ao mesmo tempo
aconchegante. Podem ser utilizados cadeirões adequados que
posicionem bem os bebês e eles podem ser dispostos em círculo para
que permita que eles se vejam e sintam-se parte do grupo, o que
também facilita a supervisão. A decoração colorida e com ilustrações
temáticas que chamam a atenção dos bebês, transforma o espaço
de alimentação em um lugar de descoberta sensorial.
Educadores têm a difícil tarefa de equilibrar o cuidado, a educação
e o brincar na atividade de alimentação. Esse equilíbrio pode acontecer
durante as refeições, abaixo apresentamos algumas sugestões:

Hum, que delícia! 49


Ensinar: Mostrar como usar colheres, incentivando os bebês a
usá-las sozinhos, sob supervisão cuidadosa, deixar os bebês mexerem
nos alimentos e tentarem usar utensílios de maneira supervisionada
promove habilidades motoras, outra forma de ensinar, é falar o nome
dos alimentos, bem como de suas texturas e gostos. É importante que
os educadores ofereçam suporte, e ao mesmo tempo deem espaço
para que os bebês experimentem e aprendam por si mesmos.
Cuidar: Garantir que cada bebê receba os alimentos apropriados
para sua fase de desenvolvimento, observar as reações a novos
alimentos, dando suporte e acolhimento nos momentos difíceis.
Observar também se o bebê costuma rejeitar certas texturas, pois
isso pode indicar alguma dificuldade na integração sensorial. Se
ocorrerem situações como essas com frequência, é importante
informar aos responsáveis. Nem sempre as reações a novos alimentos
são positivas, pois cada bebê é único e pode ter preferências ou
necessidades alimentares diferentes. O cuidado individualizado
durante as refeições envolve reconhecer e respeitar essas diferenças,
ajustando a forma de lidar para cada bebê.
Brincar: Transformar alimentação em um momento lúdico, fazer
brincadeiras como o famoso “aviãozinho” com a colher, e outras
brincadeiras e interações que podem tornar divertido, pois o brincar
no momento da alimentação ajuda os bebês a desenvolverem
uma relação positiva com a comida. Contar histórias curtas sobre
os alimentos do dia, cantar musiquinhas sobre frutas e legumes ou
brinquedos que imitam comida podem ser introduzidos para tornar o
momento da alimentação educativo e divertido.

Dicas Importantes:

Evitar mamadeiras: Prefira oferecer líquidos em copinhos de


transição, com tampa, pois o uso de mamadeiras pode estragar os
dentes, e também, aumentar o risco de infecções.

50 A Casa dos Bebês


Atenção durante as refeições: Ofereça os alimentos e observe
como os bebês se comportam. A partir dos nove meses, os bebês
começam a desenvolver habilidades motoras manuais, como pegar
e soltar objetos, é um momento muito interessante, mas, precisa
de mais atenção para não levar objetos ou pedaços grandes de
alimentos à boca.
Incentivo à alimentação Independente: Aos 12 meses, muitos
bebês já conseguem se alimentar sozinhos; incentive essa habilidade,
oferecendo alimentos que possam ser segurados com mais
facilidade com as mãozinhas e deixe que explorem esse momento de
independência.
Manuseio de talheres: Incentive o uso de talheres assim que a
criança estiver pronta. Esta prática ajuda no desenvolvimento da
coordenação motora e da autonomia.
Evite acidentes: Preste atenção se os alimentos estão muito
quentes e o tamanho dos pedaços de alimentos, essa atitude é
essencial para prevenir queimaduras e engasgos.
Cuide da higiene: veja sempre se todos os utensílios estão
devidamente higienizados, lembre-se de lavar bem as mãos antes da
alimentação, e ensinar os bebês a lavarem as mãozinhas também.
Bebês, mesmo banguelas, podem higienizar a boca com fraldinha
úmida ou gaze, e os bebês maiores podem usar escovas de dentes e
pastas adequadas à idade.
Pudemos perceber que a alimentação dos bebês nutre não só
seus corpinhos, mas é um momento especial que pode ser utilizado
para interação, diversão, aprendizado e desenvolvimento de muitas
habilidades e hábitos. Os educadores são essenciais para usar
essas oportunidades para cuidar, educar e ensinar novos conceitos
e habilidades aos bebês, sempre com atenção, cuidado e carinho
garantindo um ambiente seguro, acolhedor e alegre. Abaixo, estão
descritos momentos como esses:

Hum, que delícia! 51


Loraine (Agente do BI), 21/03/2024, vídeo (40seg):
Ravi, um “papazinho”… Vamos comer uma cenourinha… Hoje tem
batatinha, macarrão… Olha que delícia. Papazinho do Ravi… Que
a tia Lê que fez, com todo amor e carinho. Tem macarrãozinho…
[Balbucio do bebê] Bá bá bá. É o papá né.

Loraine (Agente do BI), 21/03/2024, áudio (57seg):


O meu momento preferido é a hora do papá, porque é uma hora
que a gente tem muita conexão, né, que é a hora do “papazinho”,
que eles estão ali descobrindo… querendo ou não, na idade que
eles estão, a comida é uma descoberta né, que eles estão saindo
do momento do aleitamento, pra hora do papá. Conhecendo as
comidas, as frutinhas, os suquinhos. É uma experiência, eu acho que
é uma experiência bem gostosa. Que a gente fica bem contente.
Tem uns que “come” (sic) muita, muito bem, e tem outros que comem
razoável, mas é tudo faz parte da introdução, né. É bem divertida
a introdução. Principalmente quando a gente vê que tem uma
comidinha que, assim, eles gostam muito… e é aí que a gente percebe
que eles comem mais ainda! É que ali a gente fica limitado, né. Não
pode fazer uma BLW [sigla para a expressão “Baby-Led Weaning”,
cuja tradução no português é “desmame guiado pelo bebê”], e tudo
mais, não dá pra pegar, tocar, sentir, mas é bem gostoso a hora do
papá com eles, a gente se diverte. A hora que a gente mais ri no dia
é a hora do papá.

Indicações de Materiais

Música “Sopa” do Palavra Cantada - Link: https://www.youtube.com/


watch?v=x5Dm5FcvIOw

Guia “Alimentação da Educação Infantil” - Link: https://www.educacao.


df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2021/07/Guia_Projeto_Alimentacao.pdf

52 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 6
“Meu Pé Meu Querido Pé” (o Banho e o
Cuidar Relacionado ao Brincar e ao Educar)

A hora do banho é muito mais do que uma atividade de cuidado!


Não é o momento de rapidinho tirar a poeira. É o momento de conversa, de
carinho, de verbalização sobre as partes do corpo, é uma atividade prazerosa!!!
O relato da Agente Katiane expressa muito bem isso:

Katiane (Ag BI), 21/03/2024, vídeo (47seg):


[O vídeo inicia com o bebê de costas para a câmera, olhando
diagonalmente para a direita e para cima, fixando o olhar na agente]
Sabonete, vai passar na barriguinha... [Bebê se vira para frente
-permanecendo de costas para câmera- e mexe na água olhando
para baixo] Embaixo do braço... na mãozinha... Olha o pezinho
dele! Que gostoso! Que pezinho branquinho, né... Que gostoso!
Ai que água gostosa, olha! [reação do bebê, balbucia, e, sorrindo,
vira o rosto para olhar a agente] É, tá gostoso?! Que delícia! Que
gostoso! Vamo lavar esse rostinho?! Vamo lavar o rostinho né… [Bebê
bate uma das mãozinhas na água, repetidas vezes] Delícia, bate a
mãozinha óh! [Agente batendo suavemente as mãos na água] Óh,
bate a mãozinha... Vamo lavar o cabelinho?!

Katiane (Ag BI), 21/03/2024, áudio (17seg):


Relato pessoal: Como é gostoso esse momento do banho... é
a melhor hora! É a hora do contato, do carinho, da interação... é
maravilhoso! Eu amo a hora do banho.

O ser humano não é cognitivo, afetivo, social separadamente, da


mesma forma que o trabalho com os bebês, crianças bem pequenas

“Meu pé meu querido pé” 53


e pequenas, não é cuidado separado de educação. O banho é o
momento de higiene e cuidados físicos, na mesma medida em que
trabalha o afeto e aspectos do desenvolvimento cognitivo.
Por vezes identificamos uma grande preocupação em cumprir o
momento do banho de modo eficiente e rápido, quando na verdade
é uma atividade que envolve uma atenção ao próprio corpo como em
raras outras oportunidades. Ao lavar e ensaboar as educadoras da
creche podem chamar atenção para o nome das partes do corpo, e
também propiciar que as crianças sintam e toquem seus corpos com
a atenção voltada para isso e não apenas como um incidente.
Além de todo o ganho no aspecto do conhecimento do próprio
corpo o que favorece o desenvolvimento psicomotor é inegável que o
afeto nesse momento tem resultados importantes para a construção
da auto-estima e de uma auto-imagem positiva.
Para todo esse resultado não são necessários banhos prolongados
a ponto de interferirem no restante da rotina. Ainda que breves, os
banhos devem ser acompanhados de uma conversa com os bebês,
o que aliás não é exclusivo desse momento. Não esperamos que a
linguagem se construa sem que falemos com as crianças. Mas isso é
assunto para outro capítulo.
Mais uma indicação que pode ser muito útil com crianças que são
resistentes a sair de uma brincadeira para ir para o banho. Podemos
usar de objetos que façam essa transição, como por exemplo, usar
livrinhos de plástico para serem “lidos” no momento do banho ou
bichinhos de borracha que atraiam a criança para esse momento que
muitas consideram desprazeroso ou que interrompem uma atividade
prazerosa que não gostariam de abandonar.
Ainda é possível que para esses momentos de transição as
educadoras usem uma música que fale de modo divertido do
momento do banho. Usamos como título desse capítulo um trecho
de uma música usada em um programa de televisão extinto da Rede
Cultura chamado Castelo Rá-tim-bum. Segue a letra:

54 A Casa dos Bebês


Música: Meu pé
é meu querido pé
é
(De Hélio Ziskin)

Tchau preguiça
Tchau sujeira
Adeus cheirinho de suor
Oh...

Lava lava lava


Lava lava lava
Uma orelha uma orelha
Outra orelha outra orelha
Lava lava lava lava
Lava a testa, a bochecha,
Lava o queixo
Lava a coxa
E lava até...

Meu pé
Meu querido pé
Que me aguenta o dia inteiro

Oh Oh
E o meu nariz
Meu pescoço
Meu tórax
O meu bumbum
E também o fazedor de xixi
Oh...

La la
Laia laia la
Laia la la la

“Meu pé meu querido pé” 55


Laia la
La la la la la
Hum... Ainda não acabou não
Vem cá vem... vem
Uma enxugadinha aqui
Uma coçadinha ali
Faz a volta e põe a roupa de paxá
Ahh!

Banho é bom
Banho é bom
Banho é muito bom
Agora acabou!

Indicações de leituras

SCARPINATI, Rosane. Cuidar, educar e brincar: um estudo sobre o papel do


educador de creche na educação infantil. São Paulo: Editora Unesp, 2004.

56 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 7
“É Meu!” e o que o Brinquedo me Ensina (Considerações sobre
o Egocentrismo e o Social no Momento do Brincar)

Como vimos em capítulos anteriores, a passagem da ação


ao pensamento se deve à função simbólica. Tal função tem um
papel importante na regulação dos conflitos afetivos (que mesmo
entre os mais pequenos, também acontecem, não é mesmo?) e na
formação da representação mental em geral e em especial, na
linguagem (caso tenha dúvidas, volte ao capítulo em que tratamos
disso). É a função simbólica que permite, um pouco mais tarde, a
condição do pensamento.
E qual seria a relação da atividade simbólica com o brinquedo? E
o que o brinquedo pode ensinar quando os nossos pequenos estão
naquela fase de que “tudo é meu” e dividir os brinquedos com os
colegas é uma tarefa bem árdua, convenhamos?
O egocentrismo consiste na dificuldade da criança em se
“descentrar”, isto é, considerar dois ou mais aspectos e coordenar
tais aspectos, ou até mesmo considerar outro ponto de vista que não
seja o seu. Para Piaget ([1994] 1932), isso acontece por conta da
ausência, ao mesmo tempo, da consciência de si e da objetividade da
realidade (porque para a criança pequena, diferente de nós adultos
que temos uma interpretação “objetiva” ou mais “fiel” do mundo, a
realidade é “distorcida” ou transformada em função da satisfação
de suas necessidades e de sua própria atividade - que é que o autor
denominou de “assimilação deformante”).
Dessa forma, apenas quando a criança tomar consciência de si
e do objeto é que ela conseguirá se diferenciar e se descentrar, ou
seja, superar o egocentrismo: diferenciando o seu ponto de vista e
suas ideias da dos outros ou dissociando o eu do outro (ou ainda o
eu dos outros objetos), uma vez que no tocante ao conhecimento da

“É meu!” e o que o brinquedo me ensina 57


realidade ou do mundo físico que a cerca, a criança concebe sua
participação como fundamental para o acontecimento de fenômenos,
até porque todas as coisas do mundo real estão impregnadas em si
mesma, e confunde as ligações dos meios e dos fins (nas relações
entre causa-efeito) de maneira mágica, como se o universo a tivesse
como centro.
O autor que deu nome ao fenômeno, Piaget, admitiu (em uma
de suas respostas, a um de seus principais críticos) que, apesar do
termo egocentrismo indicar a incapacidade inicial da criança em
se descentrar ou de se deslocar de uma dada perspectiva, teria
sido melhor ter dito simplesmente “centrismo”... Mas que, como
tal centração inicial é sempre relativa à própria ação e posição
do sujeito, acabou dizendo “egocentrismo” - sendo esse sempre
inconsciente, nada tendo a ver com o significado comum do termo
de “hipertrofia da consciência do Eu” (ou de “supervalorização do
Eu”). Pelo contrário, quanto mais “egocêntrico” o sujeito for, menos
terá consciência de que a sua maneira de pensar é diferente das
dos outros ao seu redor, e assim “mais indiferente” será em relação à
opinião, vontade, desejo e pensamento dos outros.
Lembrando que não podemos negar que essa característica faz
parte do desenvolvimento tanto intelectual como moral dos nossos
pequenos, e então fica mais fácil se entendermos esse momento
como uma característica desse desenvolvimento que é um fenômeno
de indiferenciação entre o seu próprio ponto de vista e o do outro
(pode passar, fiquem calmos, mas a gente pode dar uma ajuda nesse
processo, tudo bem?).
Como a ação vem antes da consciência, no nível moral, se
objetivamos proporcionar o desenvolvimento da autonomia da
criança, a gente não vai acreditar no poder de belos discursos (de
que nada resolvem viu, já adianto), mas sim levar as nossas crianças
a vivenciar situações onde ela poderá construir sua autonomia. Não
é através de posturas autoritárias e relações marcadas pelo respeito
unilateral, que as crianças construirão sua autonomia.

58 A Casa dos Bebês


Elas precisam de relações de cooperação e de respeito mútuo,
ou seja, precisam ser incentivadas a trabalhar em grupos, desde
pequenas e por exemplo, em uma situação em que eles vão brincar
com boliche feito de garrafas pet, devemos incentivar que eles
brinquem e vibrem com as conquistas dos coleguinhas, que sejam
feitos coletivamente “combinados” de cada um esperar a sua vez, de
que vão procurar não bater nos amigos, etc. Chamamos a atenção
para os combinados, pois eles precisam ser feitos junto com as
crianças, sem imposições. Afinal, é uma construção coletiva.
Uma dica: é preciso planejar atividades que favoreçam a
cooperação entre as crianças, através de jogos de grupo, pois
tais jogos e atividades são indispensáveis para que elas tenham
oportunidade de confrontar o seu ponto de vista com o de seus
colegas. As atividades cooperativas auxiliam na descentração, ou
seja, favorecem que a criança saia do seu ponto de vista e se coloque
na perspectiva do amiguinho, contribuindo, assim, para a passagem
dessa forma “egocêntrica” de pensar e agir.
É comum que as crianças que tendem a ficar restritas a seu
ponto de vista, acreditam que todas as pessoas pensam como ela,
por isso mesmo acaba afirmando sem provas, e nem se esforçam
em convencer as outras pessoas, pois, em suas concepções, não
existe a possibilidade dos outros terem opiniões diferentes de suas
percepções. Apegam-se ao que é mais visível, generalizando às
situações diferentes, fatos marcantes de determinadas experiências,
ficando presas à percepção de seus sentidos (como por exemplo,
caso chupem um abacaxi azedo, todos os abacaxis serão concebidos
como azedos, embora saibamos que não é bem assim…).
Durante a manifestação do egocentrismo, existem algumas
características que podem ajudar o adulto a identificá-lo na maneira
de pensar e conceber das crianças, tais como quando ela:
— admite as coisas exatamente como elas lhes aparecem,
confundindo o que é subjetivo (peculiar, ou aquilo que é mais particular
e implícito) com o que é objetivo (ou aquilo que está dado de forma

“É meu!” e o que o brinquedo me ensina 59


mais explícita), apresentando os elementos de forma intuitiva ou sem
explicação = isso se chama realismo do pensamento;
— devido à não diferenciação do que é abstrato e do que é real,
os nomes dos objetos estão ligados materialmente à coisas, por
exemplo: achar que a palavra sofá é parecida com a palavra cadeira,
pois ambos servem para sentar = isso está ligado ao que conhecemos
como realismo nominal;
— acredita que todas as coisas existem para cumprir um fim sem
qualquer relatividade e até mesmo “antropocêntrico” (isto é, o ser
humano é o centro de tudo, inclusive crucial para o entendimento
do mundo), exemplo: quando pergunta para que serve um cama e
a criança responde “para eu dormir” = isso também é conhecido
como finalismo;
— tende a atribuir vida aos objetos, como quando tropeça em um
carrinho e diz “carrinho, bobo!” ou briga com/bate no objeto, pois
para ela, tudo ao seu redor é vivo e consciente = já isso é o que
denominamos de animismo;
— considera os objetos como produto da fabricação humana ou
de uma entidade sobrenatural/divina (“Papai do céu”), assim como
quando diz que uma montanha foi produzida por um homem muito forte
e grande que amontoou muita terra = por fim, isso é o artificialismo.
Do ponto de vista do adulto observador, pode até parecer
que a criança está tendo atitudes “sociais”, por estar no meio de
outras crianças, e parecer até “conversar” com os coleguinhas e
educadoras, mas o fato de se dirigirem aos outros não quer dizer que
estejam verdadeiramente estabelecendo trocas (quer sejam verbais
ou de pontos de vista e de suas perspectivas). Por isso, acabam
permanecendo centradas na própria criança e na sua própria
atividade, ou seja, egocêntricas.
Os adultos podem até indagar se a criança que não divide o
seu brinquedo estaria sendo “egoísta”, ao invés de “egocêntrica”…
Haveria diferenças entre um conceito e outro ou se tratariam da

60 A Casa dos Bebês


mesma coisa, afinal? Porém, damos spoiler ao afirmarmos ser uma
tremenda fatalidade chamar os pequeninos de egoístas… Por quê?
Como pudemos notar com as apresentações acima, o egocentrismo
não se restringe ao fato da criança não compartilhar seus pertences
ou brinquedos coletivos, até mesmo porque ela não compreende
que o coleguinha também tem desejo de brincar e igualmente não
se coloca em seu ponto de vista para diferenciá-lo e coordená-lo
com o seu próprio, mas vai muito além disso. Até quando consegue
diferenciar sua vontade da de outra criança, é um obstáculo enorme
a questão de não conseguir coordenar tais fatores. O egoísmo é
consciente, sabido por quem o pratica, bem diferente de - talvez
até oposto a - o egocentrismo, haja vista que este é mais complexo,
espontâneo, não é voluntário e em nada perceptível para o sujeito,
ou seja, é inconsciente, e, portanto, não egoísta!
E por que é importante ressaltarmos tais definições e trazer à tona
esse esclarecimento conceitual?
“O entendimento dessa
incapacidade pode ser decisivo na
intervenção do professor, que pode
entendê-lo de forma superficial e
exigir, pela autoridade, que a criança
o obedeça, seja dividindo o objeto em
questão ou pedindo desculpas etc,
ou pode agir no sentido de favorecer
a descentração, possibilitando que a
criança se coloque no ponto de vista
do outro envolvido” - afirmou Sasso,
na página 99 de seu Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC) do curso
de licenciatura plena em Pedagogia,
no ano de 2013, quando pesquisou
sobre a linguagem egocêntrica para
os dois principais e pioneiros autores

“É meu!” e o que o brinquedo me ensina 61


que abordam a temática, Vigotski e Piaget, as representações de
professoras e também as implicações educacionais advindas da
repreensão de tal linguagem infantil, principalmente no momento do
descanso das crianças.
É claro que nem toda a inteligência é atividade lógica! E a
imaginação é uma função essencial da inteligência que confirma
bem essa afirmação.
A atividade simbólica dá livre curso aos jogos fictícios, que
primeiramente estão voltados ao próprio corpo (a criança finge
dormir, comer, chorar etc.) e no decorrer do segundo ano, as ações
fictícias (o esquema simbólico) começa a ser deslocado aos objetos
(a boneca agora é quem dorme, come, chora etc., por exemplo).
Alguns meses mais tarde, uma mesma caixa de sapato pode ser um
carrinho, um chapéu, um prato e aí, começam os desempenhos de
papeis imaginários dos personagens fictícios.

Fonte: acervo da creche

62 A Casa dos Bebês


É importante levarmos em conta que a imagem mental é um
“esboço” da imitação e que nos primeiros meses de vida do bebê
(período sensório-motor), o bebê tende a imitar mais uma pessoa
conhecida a uma desconhecida e a pessoa mais velha é um modelo
a ser imitado.
Sendo a imitação uma das formas de percebermos a função
semiótica, precisamos criar, com os bebês situações favoráveis
para que eles façam imitações, e por conseguinte, construam sua
capacidade de representação. Sendo assim, reforçamos que a
imitação é um comportamento infantil natural que precisa ser
estimulado nos espaços educativos, inclusive nas creches.
E é legal lembrar de que também somos modelos para a imitação
e por isso, precisamos observar como nos comportamos frente a elas.
Se queremos que elas tenham bons hábitos, devemos cuidar sempre
do nosso comportamento perto delas.
Outro aspecto importante é pensarmos também em propor
atividades que favoreçam a cooperação entre as crianças, através
de atividades em grupo. Por exemplo, se uma criança pega uma
caixa de papelão e diz que é seu veículo, podemos criar com ela a
história de que é um ônibus e que vai levar outros passageiros, que
são os coleguinhas da sala. Sendo assim, uma atividade que no início
foi pensada por uma criança, pode agregar mais e de certa forma,
possibilitar que eles brinquem juntos.
Os brinquedos devem ser selecionados de acordo com o objetivo
estimulador (lembram-se da intencionalidade educativa da BNCC?) e
não precisam ser tão bonitos do ponto de vista do adulto, mas práticos
para a experimentação. Como com os bebês, todos eles passam
pela boca, como uma forma de “provar e conhecer”, precisam estar
limpos e desinfetados; não devem ser perigosos e/ou tóxicos; não
devem ser pequenos demais porque podem ser engolidos, colocados
no nariz ou no ouvido, e é interessante ter diversas texturas, formas,
cores, consistências, odores e sons.

“É meu!” e o que o brinquedo me ensina 63


Obviamente, seria ingênuo da nossa parte dizer que esse processo
de descentração é um processo simples e a curto prazo. Sim, é
isso que vocês vivem na prática: as crianças brincam, mas também
brigam muito. E vocês devem estar se perguntando: qual a relação
do brinquedo com o egocentrismo? Uma hora é porque várias querem
o mesmo brinquedo e a cooperação ainda não está bem formada,
outra é porque eles não querem um coleguinha brincando junto ou
até mesmo disputam a atenção dos (as) educadores (as).
No período sensório-motor, que vai até os dois anos em média, o
bebê ainda não consegue fazer uma diferenciação entre o eu e os
objetos. Por exemplo, o seio da mãe e uma extensão do seu próprio
corpo. O “mundo” deles resume-se às impressões, sensações e às
suas ações. Não conseguem perceber a existência dos outros, uma
vontade diferente da dele, muito menos o que é certo ou errado.
Por exemplo, quando ele quer alguma coisa, chora e exige que sua
vontade seja atendida na hora - sua inteligência ainda é prática.
Para se ter uma ideia melhor, até por volta dos 9-12 meses, o bebê
é tão egocêntrico que quando o objeto sai do seu campo visual,
ele simplesmente deixa de existir, até que ele consiga construir a
noção de objeto permanente (no final do manual, temos um quadro
explicando mais detalhadamente).
Sendo assim, é necessário pensar que existem três principais
causas para o bebê bater no coleguinha:

a) comunicação: (exemplos: quando a criança bate no amiguinho


ou empurra quando quer um brinquedo ou quando disputa o colo
da educadora) – fica claro que é a comunicação, mas como ele
ainda não sabe falar, ele usa de meios físicos para conseguir o
que quer. Se fosse com os adultos, certamente pediriam licença, ou
pediriam o brinquedo emprestado. Mas a criança precisa aprender
a se comunicar.
E cabe a nós ensiná-los a falar, a expressar verbalmente o que quer
e fazemos isso quando falamos com ela e damos exemplos de como

64 A Casa dos Bebês


ela pode falar. Uma dica: use sempre a linguagem na forma positiva
(evite: “não bate”, “não morde”, “não faça isso”; e sim, “pede para o
amigo”, “divide com ele”, “conversa” ou “no amigo, a gente faz carinho”
etc.). Enfim, use palavras simples de fácil repetição e entendimento;

b) exemplo: quando o bebê não está apresentando um


comportamento desejável, pode ser que ele esteja presenciando
isso em alguns lugares em que ele frequenta. Vale lembrar que para
a criança fazer o “certo” é uma construção e como já dissemos,
leva tempo, mas para aprender a bater é rápido, ela vê e já passa
a reproduzir. Nesses casos, vale a pena conversar com a família,
explicar o que a criança está fazendo e juntos observarem quais os
modelos ela tem ou até mesmo se ela não os tem. A criança não quer
machucar a outra, se ela está batendo é porque precisa de ajuda e
também deve ser acolhida, assim como a criança que apanhou;

c) expressar-se: a criança expressa o que sente e em muitas


situações podem ocorrer e causar mudanças ou dificuldades na
forma da criança se expressar. Por isso, é muito importante trabalhar
com elas a educação dos sentimentos, que pode ser brincando e
fazendo as carinhas de feliz, bravo, triste, chorando, com fome
etc., pode ser com plaquinhas de carinhas tipo palitoche ou outros
recursos possíveis na escola.
Às vezes pode acontecer também da criança criar seu companheiro
imaginário, fruto da sua fantasia e de seu egocentrismo. Com ele,
brinca tranquila, recriando situações possíveis de sua realidade,
conversando com ele e o moldando de acordo com os seus desejos
e necessidades.
O companheiro imaginário é alguém que lhe obedece, não
contesta e é consequência de sua incapacidade de coordenar
pontos de vista e cabe às agentes da creche propor, possibilitar,
acompanhar, orientar, compartilhar e não fazer pela criança, aquilo
que ela já é capaz de fazer. Como já vimos, as crianças constroem

“É meu!” e o que o brinquedo me ensina 65


seu conhecimento de mundo, a partir, nos primeiros anos de vida, de
suas atividades motoras essenciais, sua manipulação e não através
da nossa. Fazer pelas crianças ou para elas, não leva a nada!
E os conflitos podem e devem sempre ser oportunidades de
aprendizagem.

“Jardim de infância” – Pedro Bial


Tudo o que hoje preciso realmente saber, sobre como viver, o que fazer e como
ser, eu aprendi no jardim de infância. A sabedoria não se encontrava no topo de
um curso de pós-graduação, mas no montinho de areia da escola de todo dia.
Estas são as coisas que aprendi lá:
1. Compartilhe tudo. 2. Jogue dentro das regras.
3. Não bata nos outros. 4. Coloque as coisas de volta onde pegou.
5. Arrume sua bagunça. 6. Não pegue as coisas dos outros.
7. Peça desculpas quando 8. Lave as mãos antes de comer e agradeça
machucar alguém. a Deus antes de deitar.
9. Dê descarga. (Essa regrinha é 10. Biscoitos quentinhos e leite fazem bem
importante!) para você.
12. Leve uma vida equilibrada: aprenda um
pouco, pense um pouco...desenhe... pinte...
11. Respeite o outro.
cante... dance... brinque... trabalhe um
pouco todos os dias.
13. Tire uma soneca à tarde. (Isso
14. Quando sair, cuidado com os carros.
é muito bom!)
15. Dê a mão e fique junto. 16. Repare nas maravilhas da vida.
17. O peixinho dourado, o hamster, o camundongo branco e até mesmo a
sementinha no copinho plástico, todos morrem... nós também .

66 A Casa dos Bebês


Pegue qualquer um desses itens, coloque-os em termos mais adultos e
sofisticados e aplique-os à sua vida familiar, ao seu trabalho, ao seu governo, ao
seu mundo e aí verá como ele é verdadeiro, claro e firme.
Pense como o mundo seria melhor se todos nós, no mundo todo, tivéssemos
biscoitos e leite todos os dias por volta das três da tarde e pudéssemos nos
deitar com um cobertorzinho para uma soneca. Ou se todos os governos
tivessem como regra básica devolver as coisas ao lugar em que elas se
encontravam e arrumassem a bagunça ao sair.
Ao sair para o mundo é sempre melhor darmos as mãos e ficarmos juntos.
É necessário abrir os olhos e perceber que as coisas boas estão dentro de
nós, onde os sentimentos não precisam de motivos nem os desejos de razão. O
importante é aproveitar o momento e aprender sua duração, pois a vida está
nos olhos de quem souber ver.
Fonte: https://profuncionarioal.blogspot.com/2009/03/texto-de-pedro-bial-
sobre-educacao.html. Acesso em: 27 maio 2024.

Indicações de Leituras

ASSIS, M. C. de.; ASSIS, O. Z. M. de. (org.). PROEPRE: fundamentos teóricos


e prática pedagógica para a educação infantil. Campinas: Graf. FE
(UNICAMP), 2002.

BATTRO, A. M. Dicionário terminológico de Jean Piaget. São Paulo:


Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais, 1978.

COMO lidar com crianças que batem, beliscam e empurram no Berçário


e na Creche. Bebê Ativo, 19 fev. 2020. Disponível em: https://bebeativo.
com.br/como-lidar-com-criancas-que-batem-beliscam-e-empurram-no-
bercario-e-na-creche/. Acesso em: 25 maio. 2024.

DEVRIES, R.; ZAN, B. A ética na educação infantil: o ambiente sócio-


moral na escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

PIAGET, J. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, [1994] 1932.

“É meu!” e o que o brinquedo me ensina 67


SASSO, B. A.; DE MORAIS, A. O egocentrismo infantil na perspectiva de
Piaget e representações de professoras. In: Schème - Revista Eletrônica
de Psicologia e Epistemologia Gené éticas. v. 5, n. 2, ago-dez, 2013.
Disponível em: <https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/scheme/
article/view/3571>.

68 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 8
“Faz-de-Conta que…” (o Jogo Simbólico em Questão)

Música: João e Maria


(de Chico Buarque, Nara Leão e Sivuca)

Agora eu era o herói


E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy
Era você além das outras três

Eu enfrentava os batalhões
Os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque
E ensaiava um rock para as matinês

Agora eu era o rei


Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigado a ser feliz

E você era a princesa que eu fiz coroar


E era tão linda de se admirar
Que andava nua pelo meu país

Não, não fuja não


Finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião
O seu bicho preferido

Vem, me dê a mão
A gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade
Acho que a gente nem tinha nascido

“Faz-de-conta que…” 69
Agora era fatal
Que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal
Era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que é que a vida vai fazer de mim?

Não tem atividade mais prazerosa do que assistir (e também se


engajar com as crianças em) um jogo simbólico. É assim que chamamos
a brincadeira de faz-de conta. Essa atividade que começa a partir
da imitação no sensório-motor tem uma evolução que vai desde a
substituição de um objeto por outro, como por exemplo, pegar uma
garrafinha de água e fazê-la de microfone, até uma brincadeira mais
elaborada, coletiva em que uma criança faz o papel de vendedora
de uma loja e outra de compradora, por exemplo.
O jogo simbólico indica uma capacidade fundamental no
desenvolvimento da inteligência, que é a imagem mental. Por isso
quando dizemos para a criança: “como faz o cachorrinho” e a
criança imita o cachorro, isso mostra que a criança evocou a partir
de um significante (no caso, a palavra cachorrinho) o significado
correspondente, que é a imagem construída do cachorro real.
Dentre as atividades proporcionadas pelos educadores da creche
uma que deve estar sempre presente é o faz de conta. Não precisamos,
para isso, de materiais caros ou complexos. Uma caixa de papelão
facilmente se transforma em um carro, um pote de margarina e um
calço de sapato se transformam em prato e colher e um frasco de
shampoo vazio em um avião.
É importante destacar o como melhor conduzir esse tipo de
atividade. Não basta espalhar brinquedos no chão e esperar que
as crianças brinquem. É claro que a exploração e a brincadeira
acontecerão, mas a intervenção adequada pode enriquecer as
possibilidades de aprendizagem e desenvolvimento com o jogo

70 A Casa dos Bebês


simbólico, além de ajudar na resolução de conflitos que possam
surgir durante a atividade.
Instigar as crianças a explorarem os objetos e interagirem com
eles e com outras crianças de novas formas traz maior qualidade ao
próprio jogo. Se a criança apenas bate uma tampa de pote em outra,
podemos sugerir que empilhem e montem uma torre de tampas, ou
que façam de conta que estão comendo algo que está na tampa.
Podemos também sugerir que uma criança dê comidinha para a outra
ou que a boneca está doente e que a estamos examinando com um
estetoscópio de brinquedo e depois uma criança pode examinar a
outra etc.
Enfim, a interação com objetos e com o outro não é suficiente.
Da instituição educativa espera-se mais do que o cuidado e a
oportunidade de interação. Espera-se a intervenção intencional que
possa provocar, desequilibrar e enriquecer as crianças.

Indicação de Vídeo
Música do Palavra Cantada: “Faz de conta” Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=C2RmtCEIQSg>. Acesso em: 22 abr. 2024.

“Faz-de-conta que…” 71
CAPÍTULO 9
Lê Pra Mim! (a Hora da Historinha)

Essa foi a primeira historinha que a gente leu pra eles. Eles
adoraram. Eles tavam brincando no outro canto da sala e
aí, quando eu peguei o livro, e comecei a mexer a boquinha
do fantoche, todos vieram pra cima querendo pegar, tocar
no fantoche, e eles ficaram olhando, enquanto eu contava a
história... Foi muito bonitinho.
Alguns prestavam atenção, outros só queriam pegar mesmo no
livro... Mas foi bem interessante. Vamos repetir mais vezes.
(Maiara, Agente do BI, áudios de 21/03/2024)

Por razões econômicas e sociais, muitos brasileiros têm contato


com a leitura apenas na escola. E é nesse espaço escolar que as
crianças e os jovens podem ser conquistados para o livro e para a
leitura, seja esta por prazer ou por necessidade. Rubem Alves afirma
que, assim como a cena do pai ou da mãe lendo para o filho ficará
guardada para sempre em sua memória afetiva, o professor pode
continuar (ou iniciar) esse processo de leitura afetuosa: ele lê, a
criança ouve extasiada e, seduzida, ela pedirá “Por favor, me ensine!
Eu quero poder entrar no livro por conta própria...”.
A leitura de histórias aproxima a criança do universo letrado
e colabora para a democratização de um de nossos mais valiosos
patrimônios culturais: a escrita. E segundo a Base Nacional Comum
Curricular - BNCC - (Brasil, 2018), a Educação Infantil no contexto da
Educação Básica é o início e o fundamento do processo educacional.
A entrada na creche ou na pré-escola significa, na maioria das vezes,
a primeira separação das crianças dos seus vínculos afetivos familiares
para se incorporarem a uma situação de socialização estruturada.

Lê pra mim! 73
Nas últimas décadas, vem se consolidando, na Educação Infantil, a
concepção que vincula educar e cuidar com o brincar, entendendo o
cuidado e a brincadeira como indissociáveis do processo educativo.
Nesse contexto, as creches e pré-escolas, ao acolher as vivências
e os conhecimentos construídos pelas crianças no ambiente da
família e no contexto de sua comunidade, e articulá-los em suas
propostas pedagógicas, têm o objetivo de ampliar o universo
de experiências, conhecimentos e habilidades dessas crianças,
diversificando e consolidando novas aprendizagens, atuando de
maneira complementar à educação familiar – especialmente quando
se trata da educação dos bebês e das crianças bem pequenas, que
envolve aprendizagens muito próximas aos dois contextos (familiar e
escolar), como a socialização, a autonomia e a comunicação.
Desta forma, e considerando que na Educação Infantil as
aprendizagens e o desenvolvimento das crianças têm como eixos
estruturantes as interações e a brincadeira, assegurando-lhes os
direitos de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e
conhecer-se, a organização curricular da Educação Infantil, a BNCC
está estruturada em cinco campos de experiências, no âmbito dos
quais são definidos os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento.
Os campos de experiências constituem um arranjo curricular que
acolhe as situações e as experiências concretas da vida cotidiana
das crianças e seus saberes, entrelaçando-os aos conhecimentos
que fazem parte do patrimônio cultural.
A definição e a denominação dos campos de experiências também
se baseiam no que dispõem as Diretrizes Curriculares Nacionais
da Educação Infantil (DCNEI, Resolução CNE/CEB nº 5/2009), em
relação aos saberes e conhecimentos fundamentais a ser propiciados
às crianças e associados às suas experiências. Considerando esses
saberes e conhecimentos, segue abaixo os campos de experiência
que o presente projeto se norteará, bem como os objetivos de
aprendizagem e desenvolvimento, consoantes à BNCC:

74 A Casa dos Bebês


a) Campo de experiência: O eu, o outro e o nós.
É na interação com os pares e com adultos que as crianças
vão constituindo um modo próprio de agir, sentir e pensar e
vão descobrindo que existem outros modos de vida, pessoas
diferentes, com outros pontos de vista. Conforme vivem suas
primeiras experiências sociais (na família, na instituição escolar, na
coletividade), constroem percepções e questionamentos sobre si e
sobre os outros, diferenciando-se e, simultaneamente, identificando-
se como seres individuais e sociais.

b) Campo de experiência: Escuta, fala, pensamento


e imaginação
Desde o nascimento, as crianças participam de situações
comunicativas cotidianas com as pessoas com as quais interagem.
As primeiras formas de interação do bebê são os movimentos do
seu corpo, o olhar, a postura corporal, o sorriso, o choro e outros
recursos vocais, que ganham sentido com a interpretação do outro.
Progressivamente, as crianças vão ampliando e enriquecendo seu
vocabulário e demais recursos de expressão e de compreensão,
apropriando-se da língua materna – que se torna, pouco a pouco,
seu veículo privilegiado de interação.
Na Educação Infantil, é importante promover experiências nas quais
as crianças possam falar e ouvir, potencializando sua participação
na cultura oral, pois é na escuta de histórias, na participação em
conversas, nas descrições, nas narrativas elaboradas individualmente
ou em grupo e nas implicações com as múltiplas linguagens que a
criança se constitui ativamente como sujeito singular e pertencente
a um grupo social.
A partir disso, elencamos a atividade de leitura feita pelo
educador (Agente de Atividade Infantil - A.A.I) da sala como
sendo uma atividade permanente em todas as turmas, abordando
diferentes gêneros e, quando possível, com o portador do gênero
em mãos. Igualmente, enquadra-se como atividade permanente o

Lê pra mim! 75
momento da leitura em que os alunos leem, ainda que os iniciantes
não o façam convencionalmente! Sim, para tanto, é preciso que os
livros e outros materiais impressos sejam de diferentes gêneros para
que as crianças conheçam a diversidade e tenha, ocasionalmente, a
liberdade de escolher o gênero que mais o atrai (um gibi, uma revista
em quadrinhos, um livro de piadas, etc.).
As “Rodas de leitores”, nas quais as crianças (mesmo as bem
pequenas) podem compartilhar opiniões (favoráveis ou não) sobre os
livros e textos lidos e indicá-los (ou não) aos colegas… Proposta de
intervenção: “quem gostou dessa história levanta a mão!” ou “quem
não gostou desse livro faz cara de bravo!”, etc.
Além do mais, as educadoras têm liberdade para proporem à
coordenação pedagógica, a extensão de convites feitos a algum
escritor local, por exemplo, a fim dele falar com as crianças sobre as
suas atividades e instigá-las a ler e a escrever! Já com as crianças
maiores, podem propor atividades de produção de texto coletivo
(sobre músicas, parlendas, poesias, etc.), onde o adulto será o escriba
e o texto ficará exposto na sala para que possa ser retomado em
outros momentos ou até mesmo consultado pelas crianças a qualquer
instante que tiverem interesse.

Momento da Leitura de História com as Crianças do Berçário I

Fonte: acervo da creche do município.

76 A Casa dos Bebês


Após a leitura de histórias com os bebês, por exemplo, a
educadora pode dar a oportunidade para que as crianças recontem
o que ouviram (de novo, independentemente se as crianças já sabem
falar ou não), ou até mesmo imitem o som de uma personagem,
onomatopeias, ou uma palavra especial do contexto da leitura, tais
como: “cabrum”,”abracadabra”, “au-au”, “zipt zupt”, entre outros. A
fim de possibilitar aos pequenos a oportunidade de reproduzir esse
momento tão enriquecedor de repertório apresentado na e com a
história partilhada.
As educadoras também poderão organizar espaços (internos e
externos) e disponibilizar livros infantis para as crianças manusearem
e “lerem” por si próprias, familiarizando-se com os materiais e
desenvolvendo, desde tão cedo, o hábito leitor:

Fonte: registro do acervo pessoal de uma das autoras


enquanto professora numa creche em 2014.

O Projeto Lê pra Mim, uma Parceria das Escolas com as Famílias


Ainda na intenção supramencionada, e para potencializar as
aprendizagens e o desenvolvimento das crianças, a prática do diálogo
e o compartilhamento de responsabilidades entre a instituição de

Lê pra mim! 77
Educação Infantil e a família são essenciais. Além disso, a instituição
precisa conhecer e trabalhar com as culturas plurais, dialogando
com a riqueza/diversidade cultural das famílias e da comunidade.
A “literacia familiar” é uma ação importante para que a escola,
junto com a família, possa ressignificar no processo de alfabetização
e de incentivo à leitura, pois a aprendizagem da linguagem oral, da
leitura e da escrita começa em casa, na convivência entre pais e
filhos. Independente da renda ou escolaridade da família, estudos
apontam que ações com a participação da família são importantes
para o sucesso escolar. As interações entre pais e filhos poderão se
tornar parte da rotina semanal da família, fazendo do aprendizado
da literatura um evento alegre e contribuindo para a garantia do
sucesso das crianças na escola e na vida.

Fonte: foto divulgada pela DME de Cafelândia em rede social.

78 A Casa dos Bebês


Nessa direção, em dois dias na semana, ou conforme cronograma
estabelecido pela unidade escolar, uma criança leva a maleta (ou
pasta) de leitura da turma, contendo vários textos em diferentes
suportes (gibis, revistas em quadrinhos, livro de piadas, livro infanto-
juvenil, etc.) para casa. A família (ou um integrante da família que saiba
ler) compartilhará uma história da maleta escolhida com a criança, e
juntos, realizam o registro no caderno coletivo da turma, preenchendo
a ficha individual das leituras feitas durante a posse da maleta.
O projeto entrou em vigor em todas as creches do município
de Cafelândia, já no mês de março de 2024, e as famílias estão
engajadas com a proposta. A seguir, apresentamos um registro do
caderno de uma das turmas de Berçário I:

Fonte: acervo da creche do município.

Lê pra mim! 79
O envolvimento das crianças, desde muito pequenas, em atividades
de leitura, além de incentivá-las a ler -mesmo quando ainda não sabem
ler-, estimula o gosto pela leitura e fomentando a formação leitores
competentes, é uma excelente estratégia para envolver as famílias
dos iniciantes em atividades de leitura, possibilitando a aquisição de
competências leitoras (por meio do trabalho com gêneros literários
diversos), explorando os vários campos de experiência de forma
interdisciplinar, e aproximando os educandos do universo escrito e
dos portadores de escrita para que possam manuseá-los.
Fora que propiciar o contato das crianças, logo cedo, com o
universo letrado, da escrita em sua função social e comunicativa,
ampliando paulatinamente seus repertórios de histórias conhecidas,
relacionando múltiplos aspectos da complexidade humana e
incentivando-as a manifestar seus sentimentos, trará contribuições
significativas no conhecimento da língua escrita e de enriquecimento
do vocabulário infantil, indo muito para além do âmbito cognitivo,
abrangendo também o afetivo, o social e o moral dos pequeninos.

Indicação de leitura

SASSO DOS SANTOS, B. A.; DE PAULA, M. I. C. P. Lê pra mim - Projeto de


leitura para educação infantil / creches, desenvolvido em parceria com a
Diretoria Municipal de Educação da Prefeitura Municipal de Cafelândia/
SP, com a Supervisora de Ensino “Nina”, 2024.

80 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 10
“Pés no Chão” (Brincar ao Ar Livre)

Os bebês amam explorar para descobrir os detalhes do mundo


ao seu redor, eles tem o olhar encantado para o mundo. Quando
permanecem em ambientes fechados, mesmo que com objetos para
explorar, não conseguem usar todo o potencial que têm, por isso,
nada melhor que proporcionar a eles brincadeiras ao ar livre, para
que possam se movimentar livremente, experimentar novas sensações,
fazer novas descobertas e conexões. Neste capítulo, vamos mergulhar
nos benefícios de brincar em ambientes externos, com dicas para criar
um ambiente seguro e divertido para atividades sugeridas.
Brincar ao ar livre é ótimo para que os bebês se movimentam com
maior liberdade. Eles podem ensaiar movimentos necessários para
seu desenvolvimento físico como engatinhar, rolar, sentar e tentar se
levantar para ensaiar os primeiros passos. Essas atividades quando
feitas em superfícies variadas como terra, grama, e areia, podem
estimular também a aprendizagem sensorial. Além das pequenas
inclinações e irregularidades do terreno que podem ajudar na
adaptação dos movimentos e maiores habilidades para andar com
segurança. Os desafios do ambiente natural são perfeitos para
fortalecer músculos, melhorar o equilíbrio e a coordenação. E não
podemos esquecer do sol, que ajuda na produção de vitamina D,
essencial para a formação de ossos fortes.
A natureza é um parque de diversões gratuito e muito importante.
Os bebês podem tocar e sentir diferentes superfícies, ouvir o canto dos
pássaros, ouvir e sentir o vento e perceber mudanças de temperatura
e paisagens que ocorrem nas estações do ano. São experiências
ricas para o desenvolvimento sensorial, ajudando os pequenos a
entenderem melhor o mundo. Pense na carinha deles ao tocar em
folhas, flores ou pedras e descobrir novas texturas e temperaturas!

“Pés no chão” 81
Fonte: acervo pessoal de uma das autoras.

Ao ar livre, os bebês começam a aprender também a fazer escolhas,


como para onde ir ou qual brinquedo e elementos da natureza pegar.
Eles se sentem felizes com as conquistas, e desenvolvem confiança
em suas novas habilidades. Sempre com o cuidado e supervisão de
um adulto. A criança pode levar objetos e elementos da natureza à
boca. Por isso, é importante a escolha de áreas seguras no ambiente
externo. Prepare o ambiente, procurando por possíveis perigos como
objetos que podem machucar, insetos ou plantas tóxicas. A escolha
dos brinquedos para o ambiente externo, pode ser de objetos que
levem a exploração e movimentação, como bolas e brinquedos de
empurrar, blocos de construção, baldes e pás, e outros.

Sugestões de Atividades

Brincadeiras na Grama:
Deixe os bebês engatinhar para explorar a grama, tocar para sentir
a textura nas mãos e pés, e usar a grama como opção de superfície
macia para os primeiros ensaios dos passinhos.

82 A Casa dos Bebês


Caixa de Areia:

Não há necessidade de locais muito amplos, um pequeno tanque


de areia pode proporcionar muita diversão. Os bebês podem usar
pás, baldes e outras ferramentas para brincar, desenvolvendo a
coordenação motora fina e a criatividade. Os adultos podem mostrar
outras maneiras de brincar com a areia, como encher e esvaziar
potinhos, usar forminhas ou mesmo carimbar as mãozinhas na areia,
sentindo a areia.

“Pés no chão” 83
Passeios e Caminhadas:
Leve os bebês para caminhar ao ar livre. Pode usar carrinhos
de bebê ou deixar que os bebês que já estão começando a andar
explorem o ambiente com segurança. Aproveite o passeio para
conversar com os bebês sobre o que vocês estão vendo, apontando
para árvores, flores, animais,para o céu e outros elementos da
natureza.Um recurso interessante para fazer o passeio de modo
seguro é usar a “centopéia” (vide Figura abaixo). Cada bebê segura
em uma das alças que saem do “pé” da centopéia.

Jogos com Bola:


Brincar com bolas grandes e macias ajuda no desenvolvimento da
coordenação olho-mão. Role a bola para o bebê e incentive-o a
rolar de volta. Esta atividade simples pode ser adaptada de várias
maneiras para manter o interesse do bebê, como jogar a bola para
diferentes distâncias ou tentar acertar um alvo.

Brincadeiras com Água:


Nos dias mais quentes, as brincadeiras com água podem ser
extremamente agradáveis e estimulantes. Forneça recipientes de

84 A Casa dos Bebês


diferentes tamanhos para que os bebês possam encher, despejar e
brincar com a água. Esta atividade ajuda a desenvolver a coordenação
motora e oferece uma experiência sensorial refrescante.

Dicas para Educadores

Varie as Atividades:
Mantenha a variedade nas brincadeiras ao ar livre para que os
bebês possam explorar diferentes aspectos do ambiente. Alterne
entre atividades mais ativas e momentos de descanso e observação.
A diversidade nas atividades ajuda a manter o interesse dos bebês e
proporciona diferentes oportunidades de aprendizado.

Incentive a Interação Social:


Quando possível, promova brincadeiras em grupo. A interação
com outros bebês é importante para o desenvolvimento social e
emocional. Brincadeiras em grupo ensinam habilidades valiosas como
compartilhar, esperar a vez e colaborar uns com os outros.

Respeite o Tempo do Bebê:


Cada bebê tem seu próprio ritmo. Respeite o tempo de cada
um, permitindo que explorem e brinquem de acordo com suas
preferências e necessidades. Alguns bebês podem precisar de mais
tempo para se adaptar a novos ambientes, enquanto outros podem
ser mais aventureiros desde o início.

Observe e Responda:
Preste atenção às reações dos bebês durante as brincadeiras
ao ar livre. Se um bebê parecer desconfortável ou sobrecarregado,
ofereça um momento de calma e segurança. Por outro lado, se um
bebê mostrar entusiasmo por uma determinada atividade, incentive
e expanda essa experiência.

“Pés no chão” 85
Envolva os Responsáveis:
Incentive os pais a participarem das atividades ao ar livre sempre
que possível. A presença e o envolvimento dos pais fortalecem o
vínculo afetivo e proporcionam uma sensação de segurança para
os bebês. Além disso, os pais podem aprender novas maneiras de
brincar e interagir com seus filhos em casa. Uma ideia é chamar os
responsáveis para fazer um horta na creche.

Brincar ao ar livre é ótimo para criar momentos de alegria e


diversão, e ao mesmo tempo contribui significativamente para o
desenvolvimento integral dos bebês. Ofereça essas experiências
regularmente e observe como cada pequeno explorador interage
com o ambiente que oferece um mundo de possibilidades para
a exploração e aprendizados. Cada momento ao ar livre é uma
oportunidade valiosa para o desenvolvimento dos bebês. Experimente!

86 A Casa dos Bebês


Indicações de Leituras

No site criança e natureza, existem muitos materiais para leitura sobre o


assunto. Link: https://criancaenatureza.org.br/pt/. Acesso em: 18 jun. 2024.

“Pés no chão” 87
CAPÍTULO 11
Que Soninho zZZ (o Momento do Descanso)

Além de aprender e brincar, os nossos pequenos passam parte


do tempo no berçário, onde podem tirar uma soneca logo após o
almoço. O sono diurno não só relaxa e aumenta a disposição, mas
também influencia nos processos cognitivos e até na liberação do
hormônio do crescimento. Como podemos ver, esse momento é
importante para o desenvolvimento físico e mental dos pequenos. Por
isso, é necessário que as nossas creches estejam preparadas para
propiciar uma boa hora da soneca.

Fonte: acervo da creche

Como deve ser o momento do soninho para as crianças na creche?


O que podemos fazer quando a criança não quer dormir, sendo que

Que soninho zZZ 89


essa é uma atividade da rotina? São algumas questões que permeiam
o imaginário dos profissionais que atuam diretamente com os bebês.
Nossa intenção não é esgotar o assunto, mas provocar reflexões e
auxiliar sobre as perguntas acima colocadas.
Sim, a hora do soninho faz parte da rotina das creches, mas nem
sempre coincide com o sono da criança. Aí, começa um desespero,
não só do bebê, mas também de quem a assiste. Para começo de
conversa, vai uma dica: querer obrigar uma criança dormir é uma
batalha invencível para o adulto. Então, já que os bebês custam a
se ajustar em relação à hora do sono, isto é, eles só dormem quando
estão cansados, precisamos mudar a nossa atitude em relação a isso.
É muito comum, por exemplo, que os bebês demorem a se ajustar
em relação à hora do sono e cantar, embalar, carregar com todo o
carinho, pode acalmá-lo e fazê-lo adormecer.
É importante que criemos um ambiente gostoso, aconchegante
e podemos até colocar canções de ninar em um volume baixo, bem
gostoso, que de fato seja bem confortável. Outra estratégia pode
ser histórias contadas à voz bem baixa, que pode auxiliar a criança
a conciliar o sono tranquilamente. Podemos ficar perto daqueles
que estão com mais dificuldades em se acomodar, passar perto dos
colchonetes – que são mais
apropriados porque favorecem
a locomoção e a procura por
estímulos logo que despertam
- e demonstrar a eles toda a
ternura que despertam em nós.
O sono pode vir, mas o que
fazer se isso não acontecer?
Uma outra ideia é que cada
creche tenha o seu chupetário,
porque a criança que faz uso
de chupeta, pode sentir que
o ritual do soninho na creche

90 A Casa dos Bebês


se assemelha o cuidado em casa e, se não for possível dormir, os
pequenos devem entender a importância do repouso e permanecer
em um ambiente, que pode ser um cantinho da sala, onde ele possa
interagir com brinquedos ou outros objetos de forma segura e
tranquila, sem prejudicar a soneca da turma.
O ideal é que a creche tenha uma sala específica para o sono
dos bebês. O local deve ser bem arejado, garantindo o conforto e
a tranquilidade. O ambiente pode ter também a intensidade de luz
diminuída para propiciar o sono.
E voltando ao assunto anterior, como deve ser o espaço para os
bebês que não querem tirar o momento do soninho? Como sugestão,
pode ser um canto com almofadas, livros, jogos de encaixe, entre
outras alternativas.
E antes do momento do soninho, uma providência que pode nos
ajudar é não estimular demais os pequenos, pois isso pode deixá-los
tensos e agitados e, consequentemente, não conseguirem pegar no
sono. Como podemos ver, o momento do soninho, como qualquer
outra rotina da creche, também precisa de planejamento.
DeVries e Zan (1998), colocam algumas diretrizes que podem nos
ajudar para que a hora do soninho não seja um momento estressante,
nem para os pequenos e nem para vocês, profissionais que atuam na
creche. Seguem aqui, algumas delas:

1. Estabeleça um ambiente silencioso e tranquilo: já comentamos


aqui um pouco sobre o ambiente (sala silenciosa, tranquila e bem
arejada), mas as autoras também dão a dica de colarem na porta um
aviso “Não perturbe, bebês descansando” para minimizar as chances
de interrupções, especialmente durante o momento que os pequenos
acabaram de adormecer;

2. Torne o ambiente para o descanso tão confortável quanto


possível: aqui é importante ressaltar a importância de colocá-los
para dormir em colchonetes;

Que soninho zZZ 91


3. Estabeleça rituais específicos para a hora do descanso:
as autoras sugerem que a rotina normal dos rituais possibilita a
organização do tempo pelos pequenos. Músicas, histórias e cafunés
podem ser parte do ritual da hora do descanso. Tenham em mente
que essas dicas de rituais servem para facilitar a transição para o
ritmo sossegado para a hora do soninho;

4. Saliente que as crianças precisam de repouso a fim de serem


saudáveis e felizes: nós podemos explicar para os pequenos, por
exemplo, que “os bebês precisam descansar, para poderem ficarem
fortes”, ou ainda, “quando não descansam, ficam cansadinhos e
tristes no período da tarde”. Contudo, o nosso trabalho deve sempre
ser o de tentar que elas durmam, mas atente-se às dicas acima para
os bebês que não conseguem dormir naquele dia;

5. Mostre-se solidário com o esforço das crianças para


adormecerem: nós podemos conversar com as crianças e dizer a elas
que entendemos que às vezes é difícil deixar de brincar para dormirem
ou então, que logo depois do soninho, teremos atividades divertidas;

6. Respeite as necessidades fisiológicas e emocionais das


crianças: tem crianças que demoram um pouco mais para pegar no
sono, outras só adormecem com a chupeta, algumas relaxam mais
quando estão próximas aos amiguinhos e vamos fazer um combinado?
Faremos o possível para respeitar as necessidades tanto fisiológicas
bem como emocionais de cada um de nossos pequenos, pode ser?
E para respeitar as diferenças individuais, uma sugestão é que na
hora do sono, tentem manter a mesma equipe, pois essas pessoas
garantirão a previsibilidade das rotinas e estarão familiarizadas com
as peculiaridades de cada criança;

7. Assuma uma atitude de que você está ali para ajudar


no descanso das crianças: até que todas as crianças estejam

92 A Casa dos Bebês


relaxando tranquilamente, nossa tarefa e ajuda-las, acompanhando
esse processo. Uma forma de ajudar é circular pela sala, fazendo
cafunés ou simplesmente permanecendo perto delas, mas tomando
muito cuidado para não transmitir a mensagem, de que mesmo elas
não querendo, elas devem dormir;

8. Use os problemas da hora do descanso como oportunidades


para ajudar as crianças a assumirem as perspectivas dos
outros: quando as crianças são um pouco maiores, podemos explicar,
por exemplo, que o silêncio é necessário para a hora do soninho,
porque as outras crianças estão tentando descansar e o barulho
pode atrapalhar.

Como podemos ver nesse capítulo, a hora do sono faz parte


da rotina da creche, mas quando a criança não consegue dormir,
podemos lançar mão de alternativas bem legais para que elas
façam, respeitando o espaço para os pequenos que querem
dormir. Esse momento requer um ambiente calmo e confortável, e
além de tudo silencioso. A hora do soninho não precisa e não deve
ser um momento estressante nem para os pequenos e nem para
nós. Esperamos ter ajudado e caminhemos juntos na tentativa da
construção de boas práticas nas creches. Afinal, a educação é um
processo de construção coletiva.

Indicações de Leituras

Vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=D50DL72W0Y0 (Canal Nova


Escola - Tema: “Soninho na Creche”).

ASSIS, M. C. de.; ASSIS, O. Z. M. de. (org.). PROEPRE: fundamentos teóricos


e prática pedagógica para a educação infantil. Campinas: Graf. FE
(UNICAMP), 2002.

Que soninho zZZ 93


DEVRIES, R.; ZAN, B. A ética na educação infantil: o ambiente sócio-
moral na escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

94 A Casa dos Bebês


CAPÍTULO 12
Bebês Enfileirados com Lápis e Papel nas Mãos? (o Sentido da
Avaliação na Creche: um Guia para Avaliação e Dispositivos
para o Registro do Desenvolvimento das Crianças)

Para quê, quando, quem, o quê, como e porquê avaliar na creche?!


Será mesmo necessário falar de avaliação até mesmo com e para
os bebês?
Para quem convive com crianças bem pequenas, parece-nos que,
como em um piscar de olhos ligeiro, os bebês cresceram de tal modo
que nós nem vimos o tempo passar! Quando nos damos conta, eles
estão se revirando, subindo e fazendo coisas que há pouco tempo,
nem chegavam perto de tamanha proeza… Assim, em uma semana
em que apresenta dificuldades para se manter sentado sozinho, por
exemplo, pouco tempo depois, não apenas se segura na posição,
como também ousa tentar se contorcer, pendurar, e até se erguer ou
se manter de pé apoiado em um imóvel.
O caso da menininha (de 9 meses) que começou a se sentar “tarde”,
somente após o ingresso na creche (por volta do mês de fevereiro de 2024),
e a família nem percebeu. Após 2 meses de frequência na creche, a tutora
comentou com a agente que recebe as crianças na porta: nossa, ela está
sentando! E as agentes já haviam percebido o processo cerca de 20 dias
antes. No dia de nossa visita, 23/04, ela já estava ficando em pé sozinha
para se apoiar na parede.
(Texto inspirado na narrativa da diretora Maria Cláudia, no encontro
formativo no dia 23 de abril de 2024)

Noções do Desenvolvimento para “Avaliar”: o Guia Portage e o que a


Criança já faz?
Para constatação e acompanhamento do desenvolvimento das
crianças na creche, indicamos como indicador e orientador do

Bebês enfileirados com lápis e papel nas mãos? 95


“olhar” dos agentes educacionais e demais educadores (professores,
coordenadores pedagógicos, diretores escolares e supervisores
educacionais), o “Inventário Operacionalizado Portage” (ou Guia
Portage), que é um instrumento tanto para a avaliação como para o
acompanhamento das crianças de 0 a 6 anos de idade.
Isto porque o instrumento apresenta detalhadamente algumas
propostas de atividades, que visam a estimulação infantil, para
as áreas de Socialização, Cognição, Linguagem, Autocuidados
e Desenvolvimento Motor. No primeiro semestre de 2024, ao
ministrarmos, pela primeira vez, a disciplina optativa “Formação de
educadores para a creche”, ao quarto ano do curso de Pedagogia
da UNESP de Marília, propomos às alunas regularmente matriculadas
que observassem bebês de 4 a 12 meses, seguindo a listagem de
comportamentos previstos para a faixa etária em questão.
Após uma tarde de acompanhamento de uma criança, e tiragem
de dúvidas com as agentes que estão diariamente com a criança
em específico, puderam constatar que a menininha de 9 meses de
idade, estava indo muito bem nos aspectos da socialização, cognição,
autocuidados e desenvolvimento motor, porém acenderam o sinal de
alerta quanto à linguagem da mesma! A partir de tal observação, a equipe
gestora da unidade escolar, a qual a criança pertence, foi informada,
solicitando uma atenção especial para o aspecto comunicativo e que,
inclusive, investigassem acerca da qualidade da audição da bebê.
Na semana seguinte, após entrarem novamente em contato, foram
notificadas de que estava tudo bem em relação ao desenvolvimento
biológico e funcional do aparelho auditivo da criança, mas que as
agentes que lidam estariam estimulando-a mais quanto à linguagem
verbal, haja vista a defasagem identificada! Sugerimos a realização
da observação sistemática de todas as demais crianças, quer seja
por parte da coordenadora ou da diretora, a fim de que os objetivos
prioritários para cada uma, sejam alcançados.
Destacamos que os objetivos em cuja avaliação a criança obter
“A.V.” (às vezes), devem ser especialmente trabalhados até que

96 A Casa dos Bebês


sejam alcançados. Até mesmo os objetivos já alcançados deverão
ser sempre retomados. É importante que, quem está diariamente
com as crianças, selecione dois objetivos de cada área, no mínimo,
para desenvolver com cada uma das crianças, e, a medida que cada
objetivo for alcançado, o mesmo deverá ser substituído por outro da
mesma área, na mesma folha.
Claro que o trabalho com as crianças na creche, não deve se
restringir apenas aos objetivos presentes no guia… Afinal, trata-se
de um “guia”, de uma trilha, e não de um trilho! Por isso mesmo, deve
haver dinamismo para trabalhar as dificuldades que forem surgindo,
e, uma vez que ninguém é igual a ninguém, precisamos sempre
considerar a individualidade de cada criança, sempre ponderar
aproveitar o interesse da criança naquele momento para tornar as
atividades mais relevantes para ela…
Vale ressaltarmos que o inventário Portage não é um livro de
receitas, e sim um sistema de apoio aos educadores, suporte para
ajudar, de forma organizada e sistematizada, a descobrir o que a
criança já aprendeu e o que podemos ensiná-la a seguir. Ao final
do presente livro, com muito zelo, também apresentamos um quadro-
resumo, sobre aspectos amplos e específicos do desenvolvimento
infantil, sobretudo do nascimento aos 2 anos de idade, que pode
ser usado como base para o planejamento do trabalho para com os
bebês, no dia-a-dia da creche.

A importância da “avaliação do dia”

Em nosso primeiro dia de Formação em Serviço com as educadoras do Berçário


IIA, realizamos algumas propostas, e após passarmos o dia todo acompanhando
o trabalho desenvolvido junto às crianças de aproximadamente 1 ano e meio,
tivemos pela primeira vez com aquela turminha, o momento da “avaliação do
dia”... Com grande entusiasmo, e ainda sentados em roda, sobre as almofadas e o
tapete de TNT, em um dos cantos da sala, chamei as crianças para relembrarmos

Bebês enfileirados com lápis e papel nas mãos? 97


“o que tínhamos feito no dia”. Foi quando, inesperada e surpresamente, a Alice (no
auge de seus 1 ano e tantos meses) respondeu: “bagunça, tia!”.

A Avaliação do Dia, nada mais é, portanto, do que quando os


educadores, novamente reunidos, sentados em roda e no chão
com as crianças, ainda que bem pequenas, lembram de todas as
atividades desempenhadas no dia! Do momento da entrada, com a
acolhida, até o presente momento que deverá anteceder o momento
da despedida.
Na hora da Avaliação do Dia que os quadros expostos da rotina do
dia, mais uma vez, serão revisitados a fim de serem avaliados pelas
crianças, orientadas pelos adultos, obviamente: esse momento aqui,
qual foi? E ele aconteceu ou não aconteceu hoje? Tivemos ou não
tivemos isso? [reconstruir os acontecimentos] E como foi? Foi legal
ou não foi legal? [e evocar o que sentiram] etc. Esta hora é oportuna
para que os adultos, com uma linguagem simples e positiva, conversem
sobre como foi a participação de todos nas atividades realizadas.
É propício que o adulto ajude as crianças a darem nome às
situações, e conforme for passando o tempo, ir cada vez mais
aperfeiçoando a linguagem com elas, acrescentando adjetivos ou
detalhes, nas diversas e principais situações vivenciadas no dia: como
por exemplo, lá pelo mês de junho, quando o clima começa a ficar
mais friozinho e a chover esporadicamente, podem instigar: “Nossa,
hoje na hora do almoço, que saímos lá para refeitório no pátio, como
estava o tempo? Ensolarado ou chovendo? Sim, começou a chover!!!
E como faz a chuvinha?! Chuáa… E você Tiana, gosta de chuva, sim
ou não? [Fazer o gesto de positivo e negativo com as mãos]”.
A evocação das ações no momento da Avaliação do Dia, estimula a
representação, isto é, a capacidade de apresentar novamente, criando
a oportunidade para a criança refletir sobre o que fez no tempo que
esteve na creche. Essa reconstituição de tudo o que aconteceu durante
o dia é um passo importante para a construção de conhecimentos
mais elaborados que a escola trabalha anos para frente, tanto táem

98 A Casa dos Bebês


relação ao conhecimento da realidade, do mundo físico, social e
cultural, à moralidade, como também às interações socioafetivas da
criança com outras crianças e entre a criança e o professor.
Além do mais, o educador ali presente também pode se autoavaliar
na frente das crianças e dos demais colegas de trabalho, pois ao
fazer comentários sobre si mesmo, o adulto demonstra ser capaz de
considerar a criança como a um igual, a quem deve explicações,
possibilitando a ela que também perceba o adulto como alguém
que não acerta sempre, o que muito contribui para a sua formação
humana, inclusiva e emancipadora.

Dispositivos para o Registro do Desenvolvimento das Crianças

A utilização de Portfólios para os registros individuais na


Educação Infantil, é bem discutida no meio pedagógico, pois auxilia
na verificação da progressão de cada criança, em determinado
período considerado (geralmente, em um ano). Como por exemplo: a
marca da mãozinha do bebê na primeira e na última semana de aula
do ano letivo… Mudou de tamanho? Parece que não, mas observe os
registros do tamanho do pé no começo do ano e término do mesmo
ano, quanta diferença!!!
Fotos de atividades desempenhadas por cada criança, bem
como anotações peculiares de seu desenvolvimento, são elementos
importantes tanto para a avaliação do desenvolvimento infantil
quanto para a validação do trabalho desenvolvido por vocês junto
aos pequeninos, cotidianamente.

O Livro da Vida como Estratégia de Registro no Berçário

Ainda sobre algumas das estratégias para registrar as vivências, só


que mais em relação ao desenvolvimento coletivo e/ou diário da

Bebês enfileirados com lápis e papel nas mãos? 99


turma (e não somente ou restrito ao desenvolvimento particular de
cada criança), trazemos uma super inovação: a questão da utilização
do “livro da vida” para com, também, os bebês!
O Livro da vida é uma técnica proposta pelo pedagogo e pedagogista
francês Célestin Freinet (1896-1966) a partir da qual, em um caderno
da turma, os alunos registram suas impressões e descobertas sobre si
e sobre o seu cotidiano escolar, por iniciativa própria e/ou de forma
dirigida. Embora usualmente utilizado pelas crianças maiores ou que
já realizam registros com certa autonomia, ou até mesmo sozinhas,
concebemos que a estratégia pode ser adotada como espécie de
“diário de bordo”, até mesmo com as crianças bem pequenas.
Realizado, diariamente, ao fim da rotina por uma das funcionárias
presentes, acerca de:
a) algo que foi diferente naquele dia (bom ou ruim), exemplo: “Hoje,
dia 00/00/0000, aconteceu uma coisa muito triste… estava planejado
irmos ao parquinho brincar, mas bem na hora de sairmos da sala,
começou a chover…” ou “Gostamos muito e queremos bis de momentos
como o que tivemos hoje…”, entre outros. O caso vivenciado e relatado
por nós acima, sobre o momento da “avaliação do dia” envolvendo a
resposta inédita da Alice, por exemplo, no dia da formação, certamente,
poderia ser ou se tornar um registro do Livro da Vida!
b) a narrativa de um fato interessante sobre alguma criança, como
por exemplo: “Hoje, no momento da roda, a Francesca (nome fictício),
que nunca tinha falado, imitou o nome do coleguinha tal, durante a
chamadinha!!! Eu e a tia X ficamos muito felizes com o ocorrido!”, ou “o
Vicenzo (idem) que sempre se nega a experimentar novos alimentos,
enfim provou da batata doce da sopinha servida no almoço”, etc.
O legal é fazer o rodízio sobre elementos a serem apontados sobre
cada criança, para não ficar algo muito individualizado e específico
de uma criança só;
c) o registro também pode ser feito por meio da colagem de
uma foto com uma breve descrição da situação escolhida! Ou até
mesmo com a colagem de algum outro elemento que caracterize

100 A Casa dos Bebês


certa atividade que foi importante para o grupo, como colar a flor
encontrada no parque, por uma criança, e que rendeu altos papos
entre as agentes e as crianças na caixa de areia; ou o chapeuzinho
usado no momento da roda pelo aniversariante daquele dia, enfim…
Esses são somente exemplos de possibilidades a serem exploradas!!!
Um aspecto importante a ser destacado é em relação ao tamanho
das páginas: quanto menor for a faixa-etária da turma, maior
precisam ser as páginas a serem utilizadas!!! O ideal é que, para
as crianças do Berçário, por exemplo, sejam realizados os registros,
todos os dias e a cada dia, em folhas no tamanho A3 (em, no mínimo ¼
ou até mesmo em ½ folha de cartolina), armazenadas em um fichário ou
ficheiro (em último caso, pode ser utilizada como alternativa, mas de
preferência nas turmas com crianças um pouco maiores, uma daquelas
pastas catálogo - com plástico para armazenamento de folha A4),
que ao término do ano letivo comporão o Livro da Vida da Turma.
Não se esqueça de, em cada folha, indicar a data e o(a) autor(a)
do registro daquele dia. E não precisa ser um relato extenso e muito
menos com linguagem rebuscada. De forma alguma! Quanto mais
“pessoal” e acessível for, mais com a carinha do grupo que vocês
pertencem a coleção ficará.

Bebês enfileirados com lápis e papel nas mãos? 101


Convidamos você a conversar com a coordenadora e/ou diretora
de sua instituição para decidirem sobre a confecção do Livro da Vida
da sala, e aproveitamos para informar que cada uma tem liberdade
para elaborar a capa do livro, bem como escolher as cores/temas
que julgarem pertinente. As crianças podem e devem participar
ativamente de tais processos, carimbando as mãos ou os pés, por
exemplo, rabiscando ou pintando a parte interna e externa do livro.
A cada reunião com os pais e responsáveis das crianças, o livro
poderá ser exposto e compartilhado, para que as famílias sintam-
se integradas às vivências de dentro da creche, com as crianças e
com vocês.

Indicações de Leituras

Inventário Operacionalizado Portage, disponível para download em:


<https://files.institutoitard.com.br/pdf/Guia_Portage_Inventario_
Operacionalizado_Escala_em_PDF.pdf>. Acesso em 22 abr. 2024.

102 A Casa dos Bebês


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pra Terminar, Sem Terminar…

O objetivo do material apresentado foi mostrar a partir de


diferentes pontos de vista como as atividades da rotina da creche
podem ser ricas oportunidades de desenvolvimento físico, cognitivo,
social e emocional dos bebês. Pudemos perceber como o adulto é
essencial para promover o desenvolvimento em um ambiente seguro,
estimulante, lúdico e inclusivo.
Trouxemos alguns conteúdos teóricos que fundamentam as
nossas ações na creche e que mostram a importância do equilíbrio
entre brincadeira, cuidado e educação com os bebês. Também
foram utilizadas imagens e exemplos de reflexões e experiências
das educadoras da Creche Escola Cecília De Castro Delafiori de
Cafelândia-SP. Com a construção desse material, percebemos que
todo caminho se inicia com um pequeno passo, pois através de
conversas e trocas de ideias conseguimos aprender, nos divertir e
cuidar do ambiente e das práticas para que os bebês e educadores
pudessem se beneficiar.
Esperamos que a leitura tenha trazido novas descobertas e
reflexões para outros educadores e que se divirtam e aproveitem
assim como os relatos a seguir expressam:

“Quando nos foi proposto esta experiência, tivemos um pouco


de receio, pois era uma coisa nova. Em quase 9 anos de creche
trabalhando no automático achávamos que estávamos fazendo da
maneira certa, pois até então nunca tínhamos tido a oportunidade de
termos um curso que proporcionasse um aprendizado tão completo
e que nos fizesse mudar a maneira de pensar e trabalhar. Maiara
Fernanda Venturini Ferreira

Pra terminar, sem terminar… 103


Somos gratas à equipe por toda a atenção, carinho, amor e
paciência com a gente, sempre prontas a nos ajudar e tirar todas as
nossas dúvidas. Katiane Siqueira Lima Botelho Fontana
O incentivo que nos foi passado fez com que tivéssemos confiança
para colocar em prática o que nos foi proposto. Simone Cristina
Soares

Agradecemos pela oportunidade de participar dessa experiência


incrível que vamos levar para a nossa vida pessoal e profissional.”
Loraine Merli Correa De Mello

(Agentes de Atividade Infantil, do Berçário)

“Fazer parte desse projeto foi muito gratificante e trouxe


benefícios excelentes para nossa creche, por meio dele conseguimos
garantir para nossos bebês todos os seus direitos de aprendizagem,
cuidados e desenvolvimento. Hoje, mais do que nunca podemos dizer
que somos exemplos de que creche não é um local apenas para
cuidados e sim um ambiente de aprendizagem, que acontece em
todos os momentos da rotina, desde o momento da chamadinha até
a hora do banho e soninho! E tudo isso foi possível graças à parceria
incrível das professoras Patrícia, Bruna, Cristiane e Priscila.”
Maria Cláudia Takada de Oliveira (diretora da creche)

104 A Casa dos Bebês


CURIOSIDADES
Vocês Sabiam que?

Para o Piaget, psicólogo, filósofo e biólogo, que viveu de 1896 a


1980 e cujas contribuições teóricas servem de apoio para a reflexão
das práticas educacionais, o conhecimento é construído e vejam
logo abaixo algumas palavras que são comuns quando pensamos no
desenvolvimento das nossas crianças:

Assimilação: quando há a incorporação de um novo elemento (ou


de uma novidade) ao esquema de ação já consolidado;
Acomodação: é a mudança ou a alteração, a transformação,
do esquema de ação (isto é, quando ocorre a reestruturação das
estruturas mentais) para “dar conta” das novas informações;
Equilibração: é a reconstrução da organização mental para
restabelecer o equilíbrio interno perdido, na tentativa de assimilar e
acomodar os novos conhecimentos;
Esquema de ação: forma do sujeito agir sobre o mundo à sua volta,
que pode ser generalizada e aplicada a situações diferentes.
Representação: é “apresentar de novo”, só que em um novo plano
ou dimensão. Assim, ocorre quando a criança soluciona problemas
(um ato de inteligência) só que se utilizando de um sistema de
esquemas conceituais (ou representativos), no lugar dos sistemas
puramente sensoriais-motores (ou práticos).

Indicações de Leituras

ASSIS, M. C. de.; ASSIS, O. Z. M. de. (org.). PROEPRE: fundamentos teóricos


e prática pedagógica para a educação infantil. Campinas: Graf. FE
(UNICAMP), 2002.

Vocês sabiam que? 105


PIAGET, J; INHELDER, B. A psicologia da criança. Rio de Janeiro: Difel, 2018.

SASSO, B. A. Desenvolvimento cognitivo e suas etapas: Piaget e Wallon.


In: SASSO, B. A. Psicologia do desenvolvimento. São Paulo: Editora Senac,
2022.p. 63-87.

TOGNETTA, L. R. P. A formação da personalidade ética: estratégias de


trabalho com afetividade na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2009.

106 A Casa dos Bebês


APÊNDICE

Quadro-Resumo: Aspectos do Desenvolvimento Global da Criança de 0 a 2 anos


ETAPA I: 0-1 mês
adaptação puramente reflexiva do recém-nascido
ao mundo, por meio de exercícios reflexos. Há uma
indiferenciação total entre o sujeito (bebê) e o objeto
(físico e social que o cerca). Temos também uma
Desenvolvimento
correspondência entre a vida biológica e vida mental -
da inteligência:
sucção, preensão, marcha, moro…); indissociação do eu do
mundo exterior: o mundo é um caos e caminhará para o
cosmos: o bebê vai conhecendo o mundo e se adaptando a
ele por meio dos únicos instrumentos que dispõe.
Noção de objeto: Não existe comportamento especial em
relação aos objetos desaparecidos. Não há diferenciação
entre criança/objeto.
Noção do tempo: Não se tem ordem temporal, mas um
Construção do
sentimento vago de duração imanente às próprias ações.
Real
Noção do espaço: Ligada à própria ação do bebê sem
qualquer diferenciação.
Noção da causalidade: Causa e efeito próprios dos
reflexos.
Imitação: não há.
Linguagem: o bebê se comunica basicamente por meio do
corpo (comunicação corporal e gestual). O choro é como
Formação do
uma reação biológica para a dor e/ou fome. Vocalizações
símbolo
esporádicas e reflexas. O bebê acorda e se assusta com
sons intensos, assim como também pode se acalmar com a
voz da mãe.
os afetos são instintivos; o choro é indiscriminado (por
Desenvolvimento exemplo, não sabemos se é fome ou dor) e ainda não
afetivo: reconhece o meio, mas se relaciona com ele por meio das
primeiras emoções.

Apêndice 107
Movimentos Reflexos: Presença de reflexos primitivos
como sucção, preensão, marcha e Moro.
Desenvolvimento Postura: O recém-nascido mantém os membros fletidos e o
físico: corpo em posição fetal.
Tônus Muscular: Hipertonia dos músculos flexores e
hipotonia dos músculos extensores.
Desenvolvimento Do nascimento ao 1º mês – não responde a qualquer
da visão: estímulo no campo visual, exceto luz. Algum grau de fixação.

ETAPA II: 1-4 meses


temos o início das reações circulares primárias
(diferenciação entre a assimilação e a acomodação), dos
Desenvolvimento
primeiros hábitos e das primeiras adaptações adquiridas;
da inteligência:
não há coordenação entre os esquemas e diferenciação
entre meios e fins, isto é, não há intencionalidade nas ações.
Noção de objeto: ainda não existe comportamento
especial em relação aos objetos desaparecidos.
Noção do tempo: ainda não se tem ordem temporal, mas
Construção do
um sentimento vago de duração imanente às próprias ações.
Real
Noção do espaço: ainda ligada à própria ação do bebê
sem qualquer diferenciação.
Noção da causalidade: Causa e efeito próprios dos reflexos.
Imitação: o bebê imita o que ele próprio já faz. Por
exemplo: a criança gosta de pegar as mãozinhas (uma mão
pegar a outra). O adulto imita o que ela está fazendo e
ela intensifica o gesto. Isso, nessa fase se dá de modo não
sistemático, ou seja, algumas vezes ela imita o gesto ou
som que o adulto está provocando e outras vezes não.
Formação do
Linguagem: o bebê continua a se comunicar basicamente
símbolo
por meio do corpo (comunicação corporal e gestual). O
choro passa a ser diferenciado, por exemplo: o choro de
fome é diferente do choro de dor! Já as suas vocalizações
também apresentam variações, em relação à altura e
duração. O bebê apresenta atenção aos sons, além de
reagir à fala humana: olhando, sorrindo e vocalizando.

108 A Casa dos Bebês


os hábitos geram sensações de prazer/desprazer
(agradável/desagradável - a mãe alimenta ou a mãe
Desenvolvimento
demora em alimentar…), o choro já se torna um hábito,
afetivo:
não é mais instinto e há um interesse pelo próprio corpo
(condutas egocêntricas)
Movimentos e Coordenação: Início da coordenação olho-
mão e melhor controle da cabeça.
Controle da cabeça: Aos 3 meses, o bebê consegue
Desenvolvimento
manter a cabeça erguida quando está de bruços.
físico:
Desenvolvimento motor grosso: Movimentos intencionais
com os braços e pernas, começando a alcançar e agarrar
objetos.
1° mês – Segue movimento lento de objetos. Começa a
coordenação dos dois olhos (binocular);
2 meses – Atenção a objetos a 20cm ou mais;
3 meses – Aperfeiçoa o movimento dos olhos e binocular.
Desenvolvimento
Reage a cores diferentes. Atenção nos objetos somente
da visão:
quando os manipula;
4 meses – Fixa os olhos sobre a mão e permanece
mostrando interesse por objetos pequenos e brilhantes.
Tenta se mover em direção ao objeto no seu campo visual.

ETAPA III: 4-8 meses


início da intencionalidade dos atos; emprega uma série
Desenvolvimento de procedimentos para fazer durar os espetáculos
da inteligência: interessantes; diferencia progressivamente os seres humanos
dos objetos físicos e os esquemas são secundários.
Noção de objeto: o bebê começa a procurar por objetos
ausentes (que estão na sua frente), mas não há a ideia
Construção do de permanência (age como se sua ação determinasse
Real a trajetória do objeto). A coordenação da visão e da
preensão prepara para a descoberta do objeto; procura
objetos que saem do seu campo visual

Apêndice 109
Noção do tempo: início do começo da consciência de
um antes e depois na sequência; começa a capacidade
de reter um fenômeno que acabou de acontecer
(passado imediato), além da apreensão da seriação de
acontecimentos quando a ação intervém na sequência.
Noção do espaço: a criança não segue a trajetória do
objeto, mas sim da mão.
Noção da causalidade: é mágico-fenomenista (“qualquer
coisa é capaz de produzir qualquer coisa” e as causas estão
centradas na ação, sem considerar os contatos espaciais) e
o bebê age e espera que ocorra o efeito. Não há um vínculo
entre os objetos, mas sim entre a sua ação e seu fenômeno.
Imitação: nesse momento não há alterações significativas
nas características da imitação, a não ser que as imitações
do que o próprio bebê já fazia, passa a ser sistemática.
Linguagem: há um rápido aumento na quantidade de
combinações vogais e consoantes. O balbucio é uma parte
Formação do
importante para a preparação para a linguagem falada.
símbolo
A partir dos 6 meses de idade, é típico que os bebês
experimentem todos os tipos de sons. Há um balbucio
diferenciado, com repetição de diferentes sílabas, além
de “jogos vocálicos” e “auto-balbucio”, nos quais o bebê
parece brincar com os sons que emite.
os afetos ainda são perceptivos; o sorriso é fruto dos
Desenvolvimento
primeiros espasmos como reação ao movimento e depois
afetivo:
ao que reage
Rolar: Aos 5-6 meses, o bebê rola de costas para a barriga
e vice-versa.
Desenvolvimento Sentar com apoio: Aos 6-7 meses, o bebê consegue
físico: sentar-se com apoio.
Desenvolvimento motor fino: Melhor controle de preensão,
passando de preensão palmar para preensão com os dedos.
5 meses – Desenvolve coordenação olho-mão: esforços
Desenvolvimento
sucessivos de agarrar. Procura intencionalmente os objetos
da visão:
com os olhos, mesmo que seja apenas para brincar com a luz.

110 A Casa dos Bebês


6 meses – Reconhece pessoas. Vira os olhos para a direita
e esquerda.
7-8 meses – Tenta pegar objetos além do alcance.
Convergência dos olhos.

ETAPA IV: 8-12 meses


já começamos a perceber a coordenação dos esquemas
secundários e sua aplicação às novas situações;
intencionalidade nas ações meios-fins (construção da
inteligência); diferenciação entre os esquemas meios e
fins (aplicações de meios conhecidos às novas situações/
Desenvolvimento
experimentação de diferentes esquemas conhecidos,
da inteligência:
ajustando-os aos fins desejados); persegue determinado fim
e afasta os objetos perturbadores. O ato inteligente está
constituído, ou seja, não se trata de reproduzir resultados
interessantes, mas de atingi-los por novas combinações (ex.:
para pegar um objeto, a criança afasta um anteparo).
Noção de objeto: a busca do objeto desaparecido é ativa,
mas ainda não temos por definitivo a noção de objeto.
Noção do tempo: já temos a apreensão dos
acontecimentos em série, mesmo sem a intenção da própria
ação; o bebê recorda o acontecimento e não a ação
passada, porém de forma frágil.
Noção do espaço: passagem dos grupos subjetivos para
Construção do os grupos objetivos e descoberta das operações reversíveis
Real (a criança já consegue executar uma mesma ação nos dois
sentidos de percurso, mas tem consciência de que se trata
da mesma ação).
Noção da causalidade: início da apresentação e
objetivação da causalidade (de forma elementar) e
também da possibilidade de um objeto ser fonte da ação;
ataque a barreiras para alcançar o objetivo e espera que
os adultos o sirvam.

Apêndice 111
Imitação: a imitação passa a ser de novos gestos e sons
e de partes do corpo que a criança não visualiza, como
franzir o nariz, fazer bico…
Linguagem: além de vocalizar, os bebês também apontam
Formação do para o que desejam - combinando os sons com os gestos.
símbolo Seus repertórios de sons passam a ser aqueles da língua
falada em casa ou na creche. Repetem sons emitidos
pelos outros, principalmente pelos adultos. Respondem a
imperativos rotineiros e atendem acompanhando de gestos,
como “dá tchau”, “joga beijo”, e assim por diante.
não há o reconhecimento de quem a criança é e nem do
outro (ex.: joga objetos para ver suas reações, impõe sua
Desenvolvimento
força sobre os objetos que se movimentam); os sentimentos
afetivo:
são ligados às próprias atividades de acordo com os
sucessos e fracassos dos atos intencionais.
Engatinhar: Aos 8-10 meses, o bebê começa a engatinhar.
Sentar sem apoio: Aos 9-10 meses, o bebê consegue
Desenvolvimento
sentar-se sem apoio.
físico:
Ficar em pé: Aos 11-12 meses, o bebê pode começar a ficar
em pé com apoio e dar passos com ajuda.
9 meses – Observa a expressão das pessoas próximas e
tenta fazer o mesmo.
A partir do 1° ano – Boa acuidade visual para perto e
Desenvolvimento longe. Tem a consolidação da visão pelos dois globos
da visão: oculares (binocular). Também há a focalização e a
acomodação (processos responsáveis pela mudança do
poder refrativo do olho, os quais garantem que a imagem
seja focalizada na retina).

ETAPA V: 12-18 meses


o ato é inteligente (se percebe nitidamente a
diferenciação entre fins e meios); a sua conduta tem uma
intencionalidade; descoberta de novos meios em função
Desenvolvimento da experimentação ativa; aprimoramento da coordenação
da inteligência: dos esquemas e exploração dos objetos e suas relações
espaciais. A criança observa mais detalhadamente as
ações que realiza sobre os objetos bem como os objetos
sobre os quais exerce suas ações.

112 A Casa dos Bebês


Noção de objeto: considera os deslocamentos sucessivos
do objeto independentemente do contexto original.
Distingue-se em relação ao objeto mas não se representa
em relação a ele (ex. quer abrir uma porta de armário e se
apoia nela ao mesmo tempo).
Noção do tempo: a ideia de que a seriação de
acontecimentos independem da sua ação é fortalecida; os
Construção do acontecimentos ficam retidos na memória por um período
Real de tempo maior.
Noção do espaço: sistema (meio) homogêneo de relações;
grupos objetivos e ordena eventos mas dependente da
percepção (ex.: bola aparente e bola do outro lado - o
evento bola embaixo da poltrona não é considerado, pois
não é tratado como parte do processo).
Noção da causalidade: ainda não representa causas
independentes da percepção.
Imitação: imitações novas e de partes do corpo que o
bebe não visualiza, de modo sistemático.
Linguagem: A partir de um ano e meio, a criança começa
a combinar duas palavras, para se referir a uma sentença
mais complexa, como por exemplo: “mã, au-au” - como se
Formação do quisesse dizer “mamãe olha o cachorro”. Há um aumento
símbolo significativo e rápido de suas expressões e compreensões
linguísticas. Dá ordens simples e compreende também
as situações rotineiras se referindo a elas com gestos e
palavras, assim como quando diz “mai leti”, enquanto abre
e fecha uma de suas mãos estendida, desejando pedir “me
dê mais leite”.
não há o reconhecimento de quem ela é (tão pouco do
outro) - centra-se num único ponto que é ele mesmo
(egocentrismo). Ex: joga objetos para ver suas reações;
impõem sua força sobre os objetos que se movimentam. Os
Desenvolvimento
movimentos estão ligados às próprias atividades de acordo
afetivo:
com os sucessos e fracassos dos atos intencionais. A criança
começa a fazer as primeiras escolhas - já tem intenção
na escolha do objeto que leva ao valor (as primeiras
valorizações da criança são as suas próprias ações).

Apêndice 113
Caminhar: Entre 12-15 meses, o bebê começa a caminhar
sozinho.
Desenvolvimento Subir escadas: Aos 16-18 meses, o bebê pode tentar subir
físico: escadas com ajuda.
Desenvolvimento motor fino: Melhor uso dos dedos para
pegar pequenos objetos, começando a usar a pinça fina.
Desenvolvimento
Igual ao exposto no quadro anterior (dos 12 aos 18 meses).
da visão:

ETAPA VI: 18-24 meses


invenção de novos meios por combinação mental
(assimilação recíproca de esquemas); presença da
representação procedente da interiorização das ações
motoras; internalização dos esquemas de representação;
Desenvolvimento
a coordenação dos esquemas começa a ser realizada
da inteligência:
interiormente (no nível mental, e não mais somente como
ações exteriores), a ação da criança sobre os objetos passa
a se realizar por meio de intermediários simbólicos e ela já
começa a prever suas manobras antes de experimentá-las.
Noção de objeto: já temos a representação dos
deslocamentos invisíveis do objeto (mesmo quando eles estão
escondidos), além da representação simbólica interiorizada.
Noção do tempo: recordação de acontecimentos cada vez
mais remotos; organização de acontecimentos temporais
de acordo com pontos de referência externos. O objeto ou
conjunto de objetos e o eu ganham assim uma história, pois
estão situados em um local, num dado momento e poderão
Construção do ser inseridos num passado e num futuro previsíveis, uma vez
Real que a criança passa a ser capaz de evocar situações mais
ligadas à sua percepção direta.
Noção do espaço: a criança passa a representar tanto
o objeto quanto a si mesma e pode se situar num espaço
entre as coisas que a cercam.
Noção da causalidade: a causalidade é representativa,
mas temos resíduos da causalidade dos tipos precedentes;
as causas são observadas pelos seus efeitos; prevê efeitos
pela observação.

114 A Casa dos Bebês


Imitação: imitação na ausência do modelo.
Linguagem: Ao término do período sensório-motor, a
gramática começa a se desenvolver, sendo esperado que
Formação do
a criança formule frases simples, com 2 ou 3 palavras. A
símbolo
criança nomeia figuras, compreende ordens em diferentes
situações, e seu vocabulário permeia cerca de 200
palavras.
os instintos estão se tornando hábitos e agora a intenção
Desenvolvimento vagarosamente vai se coordenando com o interesse e mais
afetivo: para o final do período, começa o reconhecimento da
autoridade e se tem por ela amor e medo.
Correr e pular: Aos 18-24 meses, a criança começa a
correr e a pular.
Desenvolvimento Subir e descer escadas: Começa a subir e descer
físico: escadas sem ajuda, usando alternância de pés.
Desenvolvimento motor fino: Maior destreza ao manipular
objetos pequenos, empilhar blocos e usar utensílios básicos.
Idem. Porém, o desenvolvimento anatômico do olho
somente estará completo por volta dos 3 anos. Sobre outros
Desenvolvimento
aspectos, tais como a definição das cores, profundidade,
da visão:
acuidade visual, maturação do sistema visual e tamanho do
globo ocular, dar-se-á até os 8 anos.

Apêndice 115

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